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1
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
EDUCAÇÃO INFANTIL: CUIDAR=EDUCAR.
ESSE É O CAMINHO.
Por: Patrícia da Silva Rocha Sampaio
Orientador
Prof. Edla Trocoli
Niterói
2012
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
EDUCAÇÃO INFANTIL: CUIDAR=EDUCAR
ESSE É O CAMINHO.
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Educação Infantil e
Desenvolvimento
Por: Patrícia da Silva Rocha Sampaio
3
AGRADECIMENTOS
A Deus que ao longo da minha vida
tem sido meu guia. Segundo a minha
mãe que ainda me carrega em seus
braços. Terceiro ao meu filho amado
Victor Hugo, minha vida. Quarto minha
amiga/irmã Olga que abriu sua
biblioteca aos meus estudos e minha
filha do coração Ana Beatriz por ter
cuidado com tanto amor do irmãozinho
nos momentos em que eu estava
escrevendo este trabalho.
4
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho a todos os alunos
que ano a ano tem me mostrado que vale
a pena continuar. Obrigada!
5
RESUMO
A História da Educação é tão antiga quanto a História da
Humanidade. Na verdade ambas podem se confundir, pois na medida em que
a humanidade se transformou a Educação seguiu seus passos e se modificou.
A presente monografia tem como objetivo principal tratar das duas
principais dimensões da Educação Infantil na atualidade, o cuidar e o educar.
O trabalho pretende demonstrar que embora pareçam ser coisas
distintas, na verdade tratam de uma só na medida em que tanto o cuidar
quando o fazer pedagógico, ou seja, o educar podem ser entendidos como
parte do próprio currículo da Educação Infantil.
Para tanto, em um primeiro momento o estudo fará um breve
resumo da História da Educação com o intuito de apresentar ao leitor o
caminho que a mesma percorreu até os dias atuais.
Em um segundo momento, apresentará as concepções de infância e
a trajetória da Educação Infantil.
Finalmente, travará um diálogo entre o cuidar e o educar
demonstrando que não são antagônicos, muito pelo contrário representam “as
duas faces da mesma moeda”. Ressaltando que a coexistência dos dois não
diminui o trabalho do professor.
6
METODOLOGIA
No presente trabalho o procedimento metodológico utilizado foi à
análise bibliográfica do tema, utilizando os livros: História da Educação e
Pedagogia de Maria Lucia de Arruda, Editora Moderna; Reinventar a escola de
Vera Maria Candau, Editora Vozes; Currículo: políticas e práticas de Antonio
Flavio Oliveira, Cortez Editora; Educar e Cuidar de Walter Benjamin in
Profissionais de educação infantil: gestão e formação org. Sonia Kramer, Ática;
História das Idéias Pedagógicas de Moacir Gadotti, Editora Ática; Educação
Infantil de Zilma de Moraes Ramos de Oliveira, Editora Moderna; História Geral
da Pedagogia de Francisco Larroyo, Mestre Joes; História da Educação de
Giles Thomas Ramson, EPU; História da Educação de Maria Lucia Arruda
Aranha, Editora Moderna; Vygotsky, aprendizado e desenvolvimento um
processo sócio-histórico de Martha Khol Oliveira, Editora Scipione; Freinet
Evolução Histórica e Atualidades de Rosa Maria Whitaker Ferreira, Editora
Scipione; História da Educação no Brasil de Otaíza de Oliveira Romanelli,
Editora Vozes;
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I - A Evolução do Pensamento Pedagógico 9
CAPÍTULO II - História dos Conceitos de Infância e Educação Infantil 19
CAPÍTULO III – O Cuidar e o Educar na Educação Infantil 33
CONCLUSÃO 44
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 48
ÍNDICE 50
8
INTRODUÇÃO
Desde os primórdios os homens têm a necessidade de passar para
os indivíduos mais jovens as regras que regem o grupo no qual estão vivendo.
Autores como Moacir Gadotti1 afirmam que essa pode ser considerada, mesmo
que sem sistematização a primeira forma de Educação.
Com o passar do tempo o aumento populacional e as modificações
na própria economia e estrutura social mudaram e com isso a maneira de
educar também modificou.
A percepção da Educação enquanto ciência é bastante nova
comparada a História da Humanidade, entretanto é possível vislumbrar
grandes avanços.
Um desses saltos foi, sem dúvida, a compreensão de que a
educação das crianças de zero a seis anos também deve ser entendida como
uma fase da educação do indivíduo, por isso deve ser sistematizada como
objeto de estudo.
É importante ressaltar que esse movimento só foi possível a partir da
evolução do próprio conceito de infância, quando a criança passou a ser
percebida como um indivíduo com histórias e possibilidades, portanto detentora
de direitos.
Embora a compreensão de que a Educação Infantil é mais uma
etapa da vida escolar e que, portanto, deva ser tratada com a mesma
importância seja nova, alguns teóricos já se debruçaram sobre o tema.
Tomando como referência esses estudos o presente trabalho vai se
debruçar sobre a idéia de que na Educação Infantil o cuidar e o educar
precisam ser colocados lado a lado para que a própria educação nessa fase
aconteça de maneira integral
1 Gadotti, Moacyr. História das Ideias Pedagógicas. 8. Ed, São Paulo: Ática, 1999.pág.23
9
CAPÍTULO I
A EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO PEDAGÓGICO
A Educação surgiu desde que o primeiro grupo de homens surgiu na
Terra. Em contrapartida, o pensamento pedagógico é mais recente, pois este
só aconteceu a partir do momento em que estudiosos começaram a se
debruçar sobre os aspectos inerentes ao processo educativo.
O renomado professor Moacir Gadotti2 em seu livro “História da
Ideias Pedagógicas”, publicado pela Editora Ática fez um apanhado da
evolução do pensamento pedagógico e é tomando por base essa belíssima
obra, além de outras de não menos expressão, que traçaremos uma linha
apresentando modestamente como esse pensamento foi construído.
Nas comunidades primitivas a educação tinha como objetivo passar
para as novas gerações hábitos dos mais antigos. Como não havia um espaço
destinado a esse propósito e nem pessoas especializadas nessa atividade
pode-se afirmar que os mais velhos ensinavam aos mais jovens.
No oriente, o pensamento pedagógico estava diretamente ligado ao
pensamento religioso. Algumas doutrinas surgiram, dentre elas o taoísmo, o
hinduísmo e o judaísmo.
No taoísmo as pessoas eram induzidas a viver pacificamente.
Confúcio seguiu essas regras e criou o Confucionismo, religião adotada na
China até a Revolução. Ele priorizava a memorização e a hierarquização.
No hinduísmo, o maior objetivo da educação era a manutenção do
sistema de castas. É importante frisar que mulheres e pessoas sem casta eram
impedidas de receber qualquer tipo de educação.
No judaísmo o ensino acontecia através da repetição e revisão. Sua
maior ideia era propagar o amor a Deus e a obediência aos pais. Um dos livros
22 Gadotti, Moacyr. História das Ideias Pedagógicas. 8. Ed, São Paulo: Ática, 1999.
10 sagrados dos hebreus era o Talmude, nele existe uma passagem que diz que a
criança deveria ir à escola a partir dos seis anos de idade.
Não se pode deixar de lembrar que, embora existam poucas fontes
históricas, foram os egípcios que criaram as primeiras casas de instrução, que
eram locais destinados a ensinar determinadas “disciplinas”. Eles ensinavam,
dentre outras coisas: leitura, escrita, religião, música,...
Segundo Francisco Larroyo em seu livro História Geral da
Pedagogia “... o primeiro povo oriental que tomou consciência da arte de
ensinar, sem elevar-se, evidentemente, à teoria pedagógica foi o Egito”. 3
O pensamento pedagógico grego era voltado para formação do
homem integral, com o corpo e a mente desenvolvidos na mesma proporção.
Esse homem deveria ter a capacidade de governar uma sociedade que de
certa maneira vivia uma contradição, pois ao mesmo tempo em que era
dependia de escravos para se manter, foi a primeira a apresentar a idéia de
democracia.
Não se pode negar que a Grécia foi o “berço” de filósofos
importantíssimos e suas diversas tendências pedagógicas: Pitágoras priorizava
a Matemática como centro de todas as ciências; Hipócrates privilegiava a
retórica; Xenofontes lançou a apostou em uma educação voltada para as
mulheres; Platão difundiu a noção de ensino público.
“Consequentemente, a primeira finalidade do Estado consiste em
formular e executar o processo educativo.” 4
Platão também se dedicou a teorizar sobre o mundo das idéias.
Finalmente, Aristóteles, defendeu a hipótese que de acordo com o
caráter, o hábito e o ensino o homem pode se tornar melhor ou pior, depende
das condições que forem apresentadas a ele.
33Larroyo, Francisco. História Geral da Pedagogia. São Paulo: Mestre Joes, 1982, vol.1, pág82.
4 Giles, Thomas Ramson. História da Educação. São Paulo: EPU, 1987. Pág. 20.
11
O ensino grego era dividido em: escola primária onde se aprendia a
ler, escrever e contar; estudos secundários, que englobava educação física,
educação artística, estudos literários e estudos científicos e finalmente o ensino
superior dividido entre retórica e filosofia.
Também dependente da existência dos escravos a sociedade
romana, no início, também reservava aos patrícios, grandes proprietários de
terra, a possibilidade de estudo. Contudo, com as grandes “conquistas” e o
crescimento do Império os romanos foram obrigados a estender os estudos
para outras classes menos abastadas, mas de suma importância para a
manutenção da sociedade, como, comerciantes, soldados, artesões e
burocratas.
O pensamento romano, assim como o grego era humanista, todavia
com o passar do tempo o ensino passou a ser muito próximo ao militarismo.
O Estado Romano, foi de fato o primeiro a tomar para si a
responsabilidade pela educação. Para isso chegou a criar a função de
supervisores-professores cujo objetivo era vigiar as escolas.
No período da República existiam três graus de escolarização:
escolas ludi-magister, de ensino elementar; escolas do gramático, onde se
ensinava a “humanitas” 5 e educação superior onde se ensinavam Direito,
Filosofia além da retórica.
Com o declínio e queda do Império Romano a humanidade entrou
em outro período histórico, a Era Medieval. Durante muito tempo chamado de
época das trevas o período medieval foi marcado pela aproximação do Estado
com a Igreja, gerando com isso a retomada do poder pela mesma. Poder em
todos os sentidos inclusive no que diz respeito ao pensamento pedagógico.
5 “A cultura universalizada pode ser expressa na palavra humanitas – no sentido literal de
humanidade, mais propriamente, de educação, cultura do espírito. Aranha, Maria Lúcia Arruda. História
da Educação. São Paulo: Editora Moderna, 1997.pág. 62.
12
Deus passou a ser o centro dos estudos6, logo no início criou-se a
separação entre o que o povo e o clero deveriam aprender. A educação
elementar tinha como objetivo catequizar as massas para que aceitasse
mansamente a nova ordem social, a educação monástica era ensinada para o
clero nos conventos e monastérios e a educação superior era para os
funcionários do Império. Paralelamente a isso a nobreza passou a cuidar de
sua educação atividades que julgavam ser importantes para a formação do
cavaleiro ideal.
Nesse ínterim surgiu no oriente uma nova religião o Islamismo.
Enquanto a Igreja Católica priorizava a fé, o Islã valorizava a razão histórica.
Do “encontro” entre essas duas correntes pedagógicas surgiu uma terceira a
“escolástica” que era um meio termo entre as duas. “A escolástica inicia a
sistematização da doutrina, recorrendo cada vez mais ao recurso da razão.” 7
Nesse período surgiram diversas universidades.
Com o desenvolvimento de novas “tecnologias”, a “descoberta” de
novos mundos e a ascensão da burguesia, novamente a sociedade passou por
modificações que influenciaram o pensamento pedagógico renascentista.
Houve uma retomada o pensamento greco-romano e a educação ganhou uma
roupagem mais prática e voltada para o homem e o corpo.
Nesse ínterim, uma nova religião surgia, o protestantismo e
imediatamente a Igreja Católica viu-se obrigada a criar uma maneira de
reeducar aqueles que não tinham fé cristã ou aqueles que haviam se desviado.
Surgiu então a educação jesuítica.
6 “O ponto de partida é sempre a verdade revelada por Deus,...” . Aranha, Maria Lúcia Arruda.
História da Educação. São Paulo: Editora Moderna, 1997.pág. 71.
7 Aranha, Maria Lúcia Arruda. História da Educação. São Paulo: Editora Moderna, 1997.pág. 73.
13
“Com a didática, os jesuítas mostravam-se bastante
exigentes, recomendando a repetição dos exercícios para
facilitar a memorização”. “Outra característica do ensino
jesuítico era a emulação, ou seja, o estímulo à
competição entre indivíduos e classes” 8
Com o advento da Idade Moderna, o pensamento pedagógico
afastou-se do religioso e voltou-se para a razão, ciência e o realismo. Nessa
época Locke deu início ao chamado Iluminismo e Descartes criou um novo
modelo de método científico. Embora o ensino ainda fosse de acordo com as
classes sociais aconteceram movimentos onde os menos favorecidos exigiam
acesso à vida escolar. Algumas congregações religiosas voltaram seus
esforços na educação de classes populares.
No pensamento Iluminista pregava-se um ensino público, igualitário
e totalmente dissociado da Igreja. Rousseau lançou a ideia da escola nova e
em seus estudos dividiu a educação em três momentos: idade da natureza
(infância); idade da força (adolescência) e idade da sabedoria (maturidade).
Froebel criou os jardins da infância e defendeu a idéia de que a educação
deveria valorizar os interesses das crianças e que o brinquedo nessa fase da
vida é uma forma de expressão. Pestalozzi defendeu a mudança social através
da educação. Criou um instituto para órfãos, pois acreditava que as classes
populares deveriam receber educação formal para que pudessem ser agentes
de mudanças sociais.
Com a consolidação de uma sociedade burguesa, surgiu o
positivismo, cujo maior pensador foi Comte. De acordo com esse pensamento
o sistema educacional segue os três estágios pelos quais a humanidade
atravessou. Segundo ele, o homem deveria se afastar da Igreja e se aproximar
8 Aranha, Maria Lúcia Arruda. História da Educação e da Pedagogia. São Paulo: Editora
Moderna, 2006 .pág. 129.
14 de uma “religião maior9, a humanidade. Esse movimento deu ênfase a moral e
a utilidade da educação.
É importante ressaltar que o fato do positivismo ter dado tanta
ênfase a ciência impulsionou a chamada “ciência” da educação.
Paralelamente, aconteceu a Revolução Russa e com ela a educação
socialista, cuja ideia principal era um ensino público, igualitário e gratuito para
toda a sociedade. Lenin declarou a papel da educação na transformação da
sociedade. Seu plano de estudo tinha como objetivo conduzir homens para a
vida na sociedade que estava se consolidando e para o trabalho. Gramsci
colocou que deve haver um equilíbrio entre o trabalho intelectual e o trabalho
manual e que disciplina é fundamental, mas a escola deve se afastar do
autoritarismo. Vygostsky valorizou a expressão oral.
“A linguagem é o sistema simbólico básico de todos os grupos
humanos. A questão do desenvolvimento da linguagem e suas relações com o
pensamento é um dos temas centrais das investigações de Vygotsky”.10
No cenário da educação despontou a escola nova, também
chamada de escola ativa, valorizava a ação e os interesses vitais da criança
durante o processo educativo. O aluno passou a ser o centro do processo
educativo. Acreditava que a sociedade estava se transformando e que a
educação era agente dessa mudança. Kilpatrick criou a metodologia através de
projetos. Decroly trabalhou com os centros de interesse dos alunos.
Montessory construiu seu método que a princípio foi aplicado em crianças com
necessidades especiais, mas depois passou a ser utilizado em crianças ditas
normais. Piaget estudou o desenvolvimento infantil e defendeu a máxima de
9 “O apogeu dessa tese é a religião da humanidade. A filosofia positiva passa, então a
preconizar também uma teoria de reforma da sociedade e uma religião”. Sêga, Rafael Augustus. Ordem
e Progresso. Mais do que um simples lema na bandeira, as idéias positivistas de Auguste-comte
impregnaram a nascente República brasileira. Revista História Viva. Março 2004.pág. 74.
1010 Oliveira, Martha Khol. Vygotsky, aprendizado e desenvolvimento um processo sócio-
histórico. São Paulo: Scipione, 1997. Pág. 34.
15 que a escola deveria respeitar as fazes do desenvolvimento das crianças.
Cousinet deu ênfase às atividades em grupo. Skiner enfocou o
condicionamento,
Paulo Freire questionou a Escola Nova e trouxe a tona o caráter
político da educação. Segundo ele a escola poderia dominar ou libertar o
indivíduo. A educação poderia ser centrada na figura do professor detentor de
todo o conhecimento ou poderia ser focada no aluno. Escreveu livros clássicos
como “Pedagogia do Oprimido” e “Pedagogia da Autonomia” e é sem dúvida
um dos pensadores mais importantes do Brasil.
O pensamento pedagógico fenomenológico-existêncialista
influenciado por grandes filósofos da modernidade colocava a importância da
educação para que a criança compreendesse a própria existência. Pantillon foi
um dos pensadores desse movimento.
Os pensadores do antiautoritarismo sobrepunham a liberdade
perante a autoridade. Segundo eles a educação deveria ser voltada e realizada
pela criança, capaz de gerir sua educação desde que esteja em um ambiente
de liberdade e respeito e tendo como facilitador o professor. Criticaram
veementemente toda e qualquer forma de castigo, pois perceberam que nesse
tipo de contexto a criança não consegue ser livre. Freinet expoente desse
pensamento pedagógico enfatizou a importância do trabalho manual inclusive
como meio disciplinar sem as punições tão utilizadas na escola até então.
“A atividade espontânea, pessoal e produtiva, eis o ideal
da escola ativa... Partir da atividade espontânea das
crianças; partir de suas atividades mentais, de suas
afeições, de seus interesses, de seus gostos
predominantes. Partir de suas manifestações morais e
sociais tais como se apresentam na vida livre e natural de
todos os dias, segundo as circunstâncias, os
16
acontecimentos previstos ou imprevistos que sobrevêm,
eis o ponto inicial da educação.”
“Freinet lhe havia revelado o ponto nevrálgico da
educação: a atividade. Sim, era o caminho que iria levar
Freinet, anos depois, à “pedagogia do trabalho”.11
O pensamento pedagógico crítico, como o próprio nome afirma faz
uma séria crítica ao papel da educação e da escola na sociedade. Segundo
esses pensadores a escola reproduz as relações sociais e que dessa forma
consolida as relações de poder e dominação, pois obrigam as classes menos
favorecidas aceitar a cultura instituída pela classe dominante. Para eles a
educação serve a perpetuação do capitalismo em si. Bourdier e Passeron
afirmaram ser essa prática uma forma de violência simbólica.
Faz-se mister ressaltar o pensamento pedagógico do terceiro mundo
ou do chamado mundo em desenvolvimento. Primeiro não podemos esquecer
de que durante o processo de colonização os colonizadores impuseram sua
cultura às regiões colonizadas. Na África impuseram seus idiomas, no entanto,
a língua escrita não foi propagada pela total falta de aplicabilidade naquele
modelo social.
Na América Latina só impuseram seu modelo cultural com o objetivo
de controle e mantiveram dessa maneira até mesmo durante o processo de
construção dos movimentos de independência dos países.
Dessa forma as teorias educacionais se desenvolveram só surgiram
quando o processo de independência já havia se consolidado. Apesar das
diferenças a maioria visava à educação como o meio pelo qual seria possível
construir uma sociedade democrática. Alguns pensaram na educação das
massas, outros na valorização da cultura anterior ao processo de colonização.
11 Sampaio, Rosa Maria Whitaker Ferreira. FREINET Evolução Histórica e Atualidades. 2ed, São
Paulo: Ed. Scipione. Pág. 5.
17
Na América latina Francisco Gutiérrez pensou na pedagogia da
comunicação, Rosa Maria Torres na alfabetização popular, Maria Teresa
Nidelcoff no professor-povo.
Destaque para Emilia Ferreiro, pois, suas idéias ganharam amplitude
mundial. Criou o Construtivismo, que não é um método, mas, modernizou a
forma como o processo de construção da leitura e escrita deve se completar.
Para o construtivismo o professor deve observar as fases descritas por Piaget
e permitir que o aluno seja ativo na aquisição do seu conhecimento, deve
construí-lo.
No Brasil somente no final do século XIX a educação começou a se
afastar da religião.
Maria Lacerda de Moura em Lições de Pedagogia propôs um
pensamento libertário e defendeu a inclusão da educação física, dos sentidos e
do crescimento físico.
Em 1932 diversos pensadores assinaram o “Manifesto dos pioneiros
da educação nova” visando à instituição de um Plano Nacional de Educação.
Em 1944 pela primeira vez foi publicada uma revista sobre educação “Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos”.
Dentre tantos outros feitos Anísio Teixeira abordou a questão da
escola pública.
Em 1961, foi sancionada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional.
Surgiram então dois movimentos, um pela educação popular outro
pela escola pública. Acontece que ambos passaram a ser percebidos como
complementares e não antagônicos. Surgiu então o movimento da educação
pública popular. Este determina que o Estado precise que se responsabilizar
pela educação, contudo tem que abrir espaço para a participação da
sociedade. Florestan Fernandes foi um expoente desta ideia.
Outros estudiosos se destacaram.
18
Luiz Pereira criticava aqueles que achavam que somente a
educação é capaz de resolver os problemas da sociedade.
Rubem Alves imprimiu um caráter afetivo às aulas.
Darcy Ribeiro criou os chamados CIEPs, cujo objetivo era mudar o
modelo das escolas públicas brasileiras. Com paredes baixas, material didático
próprio, atividades complementares, alimentação de qualidade e formação
continuada para os professores essa escola pretendia educar em um sentido
integral.
Dois pensamentos pedagógicos coexistiam até então, o católico,
pregando valores espirituais, liberal, mais voltado para o processo de
construção da democracia. Surge então o pensamento progressista que coloca
a educação na linha de frente das mudanças sociais necessárias para a
construção de outro modelo social. Sem dúvida alguma destacamos Paulo
Freire como um dos grandes defensores deste.
Segundo Paulo Freire a educação nunca é neutra, sempre tem um
cunho político. Pode ser bancária, centrada no professor detentor do
conhecimento que repasse conteúdos e valores que buscar perpetuar a
situação social vigente, ou ela é libertadora, centrada no aluno capaz de ser
agente ativo da sua própria educação, tornando-se um ser crítico capaz de
perceber as nuances da sociedade na qual está inserido promovendo com isso
diversas transformações.
Finalmente é importante tratar da educação sob a perspectiva do
multiculturalismo, ou seja, da diversidade cultural. Essa perspectiva também
traz a noção de que mais importante do que o conteúdo é o significado. Os
conteúdos terão que representar algo para aqueles que o estão estudando. A
educação pós-moderna pretende trazer a igualdade e a autonomia do
educando, ao mesmo tempo em que defende o equilíbrio entre o local e o
universal.
19
CAPÍTULO II
HISTÓRIA DOS CONCEITOS DE INFÂNCIA E
EDUCAÇÃO INFANTIL
Assim como as concepções de Educação acompanharam as
transformações sociais e mudaram ao longo do tempo a noção de infância e a
forma como as crianças são percebidas na sociedade também modificou.
Para compreender a trajetória e as modificações que a Educação
Infantil sofreu ao longo do tempo é absolutamente fundamental perceber o
papel que a criança exerce na sociedade em cada período da História.
Ao longo de muitos séculos, pode-se dizer que desde a era primitiva
a criança não era percebida como criança, ou seja, tão logo saiam do seio
materno e começavam a se locomover eram vistas como mini adultos. Esse
fato pode ser comprovado em quadros e fotos antigas através das roupas com
as quais as mesmas eram retratadas. Geralmente eram iguais as dos adultos,
talvez um pouco mais curtas. Também é possível perceber que até mesmo a
estrutura das habitações, sem espaços reservados para os menores,
automaticamente os habilitava a transitar no meio dos adultos como se adultos
fossem.
Nos primórdios da humanidade a incumbência de educar aos
menores, ou seja, de ensinar as regras do jogo social e de sobrevivência cabia
a todos, contudo com o passar do tempo essa regra modificou e
gradativamente foi passando para as mulheres, primeiro para as mães, depois
para as amas e até mesmo para instituições que abrigavam as crianças
quando eram rejeitadas por algum motivo.
20
“Tais arranjos envolveram desde o uso de redes de
parentesco, nas sociedades primitivas, ou de “mães
mercenárias”, já na Idade Antiga, até a criação de “rodas”
– cilindros ocos de madeira, giratórios, construídos em
muros de igrejas ou hospitais de caridade que permitiam
que bebês fossem neles deixados sem que a identidade
de quem os trazia precisasse ser identificada – para
recolhimento dos “expostos” ou a deposição de crianças
abandonadas em “lares substitutos” ...”12
A autora acima citada, Zilma Moraes afirma que:
“As ideias de abandono, pobreza , culpa, favor e caridade
impregnam, assim, as formas precárias de atendimento a
menores nesse período e por muito tempo vão permear
determinadas concepções acerca do que é uma
instituição que cuida da educação infantil, acentuando o
lado negativo fora da família”.13
Ao longo dos séculos XV e XVI as concepções a cerca da infância
começaram timidamente a sofrer algumas transformações. “Autores como
Erasmo (1465-1530) e Montaigne (1483-1553) sustentavam que a educação
deveria respeitar a natureza infantil, estimular a atividade da criança e associar
o jogo á aprendizagem”.14
12 Oliveira, Zilma de Moraes Ramos de. Educação Infantil fundamentos e métodos. 7 ed. São
Paulo: Ed. Cortez, 2011. Pág.59.
13 Idem.
14 Ibidem.
21
Com a passagem do ruralismo para o urbanismo as classes
desfavorecidas foram as que mais sentiram, pois, muitos ficaram sem ofício,
muitos tiveram que mudar de residência e começar outra vida. Diante dessa
situação caótica, muitas crianças foram abandonadas e mesmo aquelas que
continuaram com seus pais ficaram em uma situação absolutamente precária.
Surgiram em países como Inglaterra e França instituições cujo
objetivo era cuidar das crianças que haviam sido abandonadas ou de pais
trabalhavam nas fábricas por até 16 horas por dia e, portanto, não tinham com
quem ficar.
Essas instituições eram assistencialistas, logo, não tinham um
caráter pedagógico. Seu intento era diminuir os danos cuidados causados pela
falta de higiene e alimentação.
Segundo Luiza Helena L. Ribeiro do Valle “a educação infantil surgiu
com um caráter assistencial em saúde, não relacionada com o fator
educacional.” 15
Embora em algumas delas fosse de praxe ensinar um pouco de
leitura e escrita seu objetivo maior era passar hábitos, valores.
“O básico, todavia, para os filhos dos operários era o
ensino da obediência, da moralidade, da devoção e do
valor do trabalho, sendo comuns propostas de atividades
realizadas em grandes turmas, muitas delas com cerca de
200 crianças”.16
15 Valle, Luiza Helena L. Ribeiro. Brincar de Aprender. Pág. 62.
16 Oliveira, Zilma de Moraes Ramos de. Educação Infantil fundamentos e métodos. 7 ed. São
Paulo: Ed. Cortez, 2011. Pág. 61.
22
Com o advento da Revolução Industrial a sociedade sofreu
profundas modificações e surgiram novas necessidades inclusive no que diz
respeito à educação. Ao longo dos séculos XVIII e XIX o pensamento
pedagógico ganhou impulso, diversos estudiosos passaram a compreender a
função social da educação enquanto agente transformador da realidade social.
A estrutura familiar modificou deixando de ser uma casa com muitos
adultos e crianças circulando entre eles e passou a ser formada principalmente
por pai/mãe/filhos.
Com isso a infância passou a ser percebida como uma fase distinta
na vida do homem e as crianças, pelo menos aquelas que nasciam em famílias
com condições financeiras favoráveis passaram a ser compreendidas de uma
nova maneira.
“A criança passou a ser o centro de interesse educativo
dos adultos: começou a ser vista como um sujeito de
necessidades e objeto de expectativas e cuidados,
situada em um período de preparação para o ingresso no
mundo dos adultos, o que tornava a escola (pelo menos
para aqueles que podiam frequentá-la) um instrumento
fundamental”.17
Em contrapartida as crianças oriundas das classes populares não
eram vistas da mesma forma, portanto não tinham os mesmos direitos.
Com o movimento denominado “escolas novas” a ideia de um ensino
mais centrado na criança fortaleceu. Com base em estudiosos do passado
propuseram uma nova visão a cerca das crianças e da forma como deveriam
ser ensinadas.
17 Oliveira. Op. Cit. pág. 62.
23 Comênio, que viveu entre1592 e 1670 foi “revisitado”, pois em seus
escritos falou da educação na criança de zero a seis anos. Segundo ele, o
primeiro nível de ensino era “colo da mãe”. Dizia também que ao longo dos
próximos anos a criança deveria: ter sua criatividade incentivada; ter a
oportunidade de explorar o mundo a sua volta; aprender através da brincadeira
e dentre outras coisas, utilizar materiais feitos de acordo com sua faixa etária.
Foi o primeiro a comparar a criança a uma flor que deveria ser
regada, logo foi o primeiro a realmente chamar o espaço destinado à educação
infantil de “Jardim de Infância”.
Rousseau (1712-1778) também serviu de inspiração para esse
movimento, pois, foi o primeiro a afirmar que a infância não preparava para a
vida adulta, era em si uma fase e portanto tinha valor. Pregava a liberdade e
que as crianças deveriam aprender de acordo com o próprio ritmo e com sua
própria capacidade.
Logo em seguida Pestalozzi (1746-1827) deu maior ênfase ao fato
de que a educação e a disciplina deveriam ser pautadas no amor. Defendeu o
trabalho manual importante para a destreza das crianças e reforçou a ideia de
que o ambiente de ensino deveria ser o mais natural possível.
Em 1837 Froebel inaugurou o primeiro Jardim de Infância. Este era
diferente das instituições existentes até então, pois tinha um caráter
pedagógico.
“O modo básico de funcionamento de sua proposta educacional
incluía atividades de cooperação e o jogo, entendidos como a origem da
atividade mental...” 18
Froebel criou músicas, jogos, brinquedos. Incentivou atividades
artísticas como poesia, modelagem, pintura e manuais como a plantação de
uma horta. Trabalhava com materiais que não mudavam a forma e materiais
que mudavam a forma e com eles as crianças tinham liberdade para se
18 Oliveira. Op. Cit. Pág. 67.
24 expressar e consequentemente aprender. Sua forma de ensinar foi tão
inovadora que preocupou o governo e em 1851 seu Jardim de Infância foi
fechado.
Apesar disso, suas ideias se propagaram e em 1856 Margaretha
Schurz abriu nos EUA o primeiro Jardim de Infância nesses moldes. A língua
utilizada era o alemão.
Em 1860 a educadora Elizabeth Palmer Peabody inaugurou um
Jardim de Infância de língua inglesa no solo americano.
Em 1894 as irmãs Agazzi criaram um método de ensino utilizado
para ensinar crianças das classes populares na Itália, com base nos estudos
de Froebel.
Ano após ano os estudos desses autores foram se disseminando na
sociedade e aos poucos seus métodos e ideais foram incorporados em
instituições voltadas para atender as diversas classes sociais.
Ao final da Primeira Guerra Mundial a situação das crianças na
Europa estava preocupante. Muitas ficaram órfãs e foram para instituições.
Como diversos médicos tomaram para si a tarefa de cuidar dessas crianças
institucionalizadas vários programas voltados para saúde, higiene e
estimulação precoce foram postos em prática.
Em 1907 Ovídio Decroly criou em Bruxelas uma escola após um
período de sete anos aplicando seu método baseado nos “centros de
interesses” em crianças “com problemas”.19
O trabalho com os centros de interesse passava por três etapas,
observação, associação e expressão. Seu método preconizava a observação
das crianças para que fossem divididas em turmas homogêneas.
Maria de Montessori, médica psiquiatra criou na Itália um dos
métodos de ensino mais famosos até os dias de hoje. A princípio o método que
19 Valle, Luiza Helena L. Ribeiro. Brincar de Aprender. Pág. 62.
25 utiliza materiais próprios, estimula a participação ativa dos alunos e é voltado
para atividades práticas do dia a dia, foi aplicado em crianças consideradas
excepcionais internadas em um sanatório, contudo, após o sucesso o mesmo
foi aplicado em crianças ditas normais. Assim foi criada a “casa das crianças”.
Nesse período ganha destaque a chamada “Escola Nova” cuja maior
característica é passar da visão centrada no adulto para a participação ativa e
direta da criança durante o processo de educação.
Surgiram os estudos de Piaget sobre as fases do desenvolvimento
das crianças, Vygotsky sobre a zona de desenvolvimento proximal, ou seja,
sobre o fato de que crianças menores aprendem na interação com crianças
maiores e Wallon e a importância da afetividade no processo de educação.
Além desses surgiram os estudos Freinet, que embora não sejam voltados
para crianças de zero a seis anos foram amplamente difundidos entre os
educadores que atuam nessa faixa etária, pois afirmam que as aulas não
devem ficar restritas ao ambiente da sala de aula, ou seja, instituiu as aulas-
passeio, além de trabalhos artísticos e manuais visando o desenvolvimento
completo dos alunos.
Após a Segunda Guerra Mundial e a grande preocupação com o
impacto que outra guerra poderia causar nas gerações mais novas acontece à
promulgação pela ONU da Declaração Internacional dos Direitos das Crianças.
Com isso, a criança passou a ser legalmente amparada e tornou-se
definitivamente sujeito de direitos.
Novamente as teorias que apóiam a estimulação precoce ganham
impulso, assim como a aprendizagem através dos jogos e brincadeiras.
Nos EUA a Educação Infantil enquanto fase do processo escolar
passou por diversos momentos até os dias de hoje.
Sofreu um retrocesso, quando os estudos John Bowlby20 afirmaram
que o afastamento da mãe traz prejuízos irremediáveis as crianças, nem
20Bowlby, John. Apego. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
26 quando as feministas quiseram garantir vagas no mercado de trabalho e
exigiram creches para deixarem seus filhos avançou.
Avançou por ocasião da propagação dos estudos a cerca do
Construtivismo de Constance Kamii, da Psicogênese da Língua Escrita de
Emília Ferreiro e das pesquisas de Trevarthen e Bruner pois, “... os autores
salientaram forte valorização das relações interpessoais, da individualidade, do
equilíbrio emocional, do aprender a pensar e resolver problemas com
autonomia”.21
Modificou quando as mulheres, mais qualificadas e preparadas para
lidar com os papéis de trabalhadoras e mães passaram a priorizar a qualidade
do tempo que tinham para ficar com seus filhos e o ambiente no qual estes
estavam inseridos, visando melhor desenvolvimento de suas capacidades
físicas, intelectuais e emocionais.
Chegou ao ponto em que infância passou a ser valorizada a ponto
de abrir no espaço econômico um nicho reservado somente a elas.
Além disso, passou a ser percebida como um sujeito ativo no próprio
processo de aquisição do conhecimento.
Na Europa, a discussão não é mais se a criança pequena deve ou
não freqüentar as instituições de educação infantil, é se as escolas devem ser
para as crianças das classes populares ou se deve ser extensiva a todas sem
distinção.
Outros pontos permeiam essa discussão. As idades iniciais para o
atendimento na rede obrigatória de ensino variam de lugar para lugar. As pré-
escolas e creches podem ser ou não obrigatórias as redes primárias. O modelo
adotado nas creches e pré-escolas pode se basear no desenvolvimento da
criança ou for pautada em atividades mais formalizadas.
21 Oliveira. Op. Cit. Pág.80.
27
A discussão ainda passa na idéia de que a escola tem que levar em
consideração as diferentes culturas que estão “chegando” a Europa através
dos estrangeiros que para lá se dirigem em busca de trabalho.
No que diz respeito ao Brasil a Educação Infantil acompanhou os
movimentos mundiais. Nas comunidades primitivas ou pré-colonização cabia
ao grupo a educação dos menores. Após a colonização coube as mulheres
assumir o papel de educador. Assim como nos países desenvolvidos as
crianças não tinham um papel diferenciado na sociedade, eram adultos que
ainda precisavam crescer.
Em 1726 e 1738 foram construídas nos moldes das européias as
rodas dos expostos em Salvador e Rio de Janeiro respectivamente.
Em 1875, por iniciativa particular foi fundado na cidade do Rio de
Janeiro o primeiro Jardim de Infância.
Com abolição dos escravos e Proclamação da República e a
formação dos novos modelos sociais e econômicos, o número de crianças
abandonadas à própria sorte aumentou consideravelmente e algumas
iniciativas de proteção as crianças começaram a surgir.
Em 1896 a Companhia de Fiação Corcovado construiu a primeira
creche do Brasil. Seu objetivo era atender aos filhos dos trabalhadores da
empresa.
Os ideais da Escola Nova começaram a chegar da Europa e as
concepções de infância começaram a mudar.
Em 1919 foi criado o Departamento da Criança no Brasil, cuja
preocupação maior era cuidar da saúde dos menores.
Nos anos 20 e 30 as mulheres ingressaram no mercado de trabalho
e com isso, passaram a reivindicar creches e pré-escolas públicas para seus
filhos. Paralelamente, vários cursos de Formação de Professores foram
criados.
Em 1930, Getúlio Vargas cria as Leis Trabalhistas.
28
Em 1932, 26 educadores brasileiros assinaram o Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nova. No que diz respeito à Educação Infantil o
manifesto preconiza que as escolas pré-primárias devem ser à base do sistema
escolar.
“Criticando o sistema educacional então vigente, de
estrutura dual, já que se dividia em dois subsistemas – o
ensino primário e profissional, para os pobres, e o ensino
secundário e superior, para os ricos – o Manifesto acaba
propondo a substituição desse sistema por outro, de
estrutura unificada, que pode assim resumir-se em suas
linhas gerais:
1. Na base do sistema, as escolas pré-
primárias e o ensino primário, único.”22
Nos anos 40 as ideias higienistas e filantrópicas se disseminaram no
Brasil, dominando inclusive a educação das crianças na fase pré-escolar.
Em 1941 foi criado o SAM – serviço de atendimento ao menor, cujo
objetivo foi proteger os menores das mazelas que um ambiente familiar
desestruturado podia causar na sua formação.
Em 1942 o Departamento Nacional da Criança criou a Casa da
Criança.
Com a Consolidação das Leis Trabalhistas as mães ganharam o
direito a creches próximas ao seu local de trabalho para permitir a
amamentação, ocorre que na realidade essa medida não foi efetivamente
colocada em prática.
No ano de 1946 a UNICEF cria o Fundo das Nações Unidas e com
programas de ajuda a diversos países inclusive o Brasil.
22 Romanelli, Otaíza de Oliveira. História da Educação do Brasil. 32 ed. Petrópolis, RJ: Editora
Vozes, 2007. Pág.148.
29
Em 1961 foi promulgada a LDB 40/24. O artigo 23 determina que “A
educação pré-primária destina-se aos menores de até sete anos e será
ministrada em escolas maternais ou jardins-de-infância”.
Em 1967 o Plano de Assistência ao pré-escolar, proposto pela
UNICEF passou a incluir a Educação Infantil.
Nos anos 70 surgiu uma nova ideia, a da Educação Compensatória
que afirmava que era função das pré-escolas, creches e parques infantis
através estimulação precoce e do preparo para a alfabetização suprir as
carências culturais que as crianças das classes populares tinham. Esse modelo
reforçava a visão assistencialista da educação.
Fato é que o número de creches, classes pré-primárias e jardins de
infância aumentaram consideravelmente, mas naquelas destinadas aos filhos
da classe média existiam propostas de desenvolvimento afetivo e cognitivo
enquanto que naquelas voltadas para os filhos da classe operária predominava
o atendimento assistencialista e compensatório.
Em 1977 o Projeto Casulo, coordenado pela Legião da Brasileira de
Assistência previu a assistência as crianças de até seis anos de idade tinha
como objetivo liberar as mulheres para o mercado de trabalho afirmando que
seus filhos estavam protegidos, educados e alimentados.
No ano de 1981, para ganhar o espaço do Projeto Casulo, o
Governo Federal utilizou a mão de obra de mães voluntárias para atender as
crianças em idade pré-escolar através do MOBRAL. Esse projeto significava
muitas crianças atendidas e baixos custos.
Com a passagem da Ditadura para a Democracia diversos
movimentos populares aconteceram e com isso os anseios da sociedade
mudaram. Mulheres que antes reivindicavam um lugar para deixar seus filhos
enquanto estavam trabalhando passaram a exigir que este lugar não fosse um
mero depósito de crianças, mas que tivesse qualidade.
A Constituição de 1988, passou a prever em seu art. 208 “O dever
do Estado com a educação será efetivado mediante garantia de: IV
atendimento em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de
idade”.
30
Em 1990 o Estatuto da Criança e do Adolescente eleva as pessoas
nessas faixas etárias à condição de cidadãos.
Em 1996 é promulgada a LDB 9394/96 que coloca a Educação
Infantil como a primeira etapa da educação básica. Sua finalidade passa a ser
o desenvolvimento integral das crianças (zero a três anos - creche e quatro
anos a cinco anos e 11 meses – pré –escola). Cabendo a professores com
formação no segundo grau ou universitária acompanhar e registrar o
desenvolvimento de cada criança sem o objetivo de promoção.
Essa LDB trouxe mudanças, pois ao colocar a Educação Infantil
como etapa da Educação Básica retira dela o caráter meramente
assistencialista. Tanto creches quanto pré-escolas passaram a ser
compreendidos como espaços escolares e o ao lado do cuidar foi colocado o
educar.
“Expande o conceito de educação básica, vinculando o processo
formativo ao mundo do trabalho e à prática social exercida nas relações
familiares, trabalhistas, de lazer e de convivência social.” 23
Com o passar do tempo, os órgãos competentes perceberam que
educação Infantil, na prática as creches e pré-escolas estavam perdidas e sem
saber como gerir as novas responsabilidades. Nesse momento o MEC formula
um Referencial Curricular Nacional e o Conselho Nacional de Educação
formula as Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil.
O Parecer CNE/CEB 22/98 e a Resolução CNE/CEB 1/99
reforçaram o rompimento com o caráter meramente assistencialista e também
o fato de que a Educação Infantil não era só para os filhos das classes
trabalhadoras, era um direito de todas as crianças.
Tais documentos trazem orientações a cerca da organização,
desenvolvimento e avaliação das propostas pedagógicas nas escolas de
Educação Infantil. Funcionando como guias práticos de como as mudanças
preconizadas na lei poderiam acontecer no dia a dia das salas de aula.
23 Oliveira, Zilma de Moraes Ramos de. Educação Infantil fundamentos e métodos. 7 ed. São
Paulo: Ed. Cortez, 2011. Pág. 117.
31
O Parecer CNE/CEB 20/09 e a Resolução CNE/CEB 5/09 reforça a
proposta pedagógica voltada para o desenvolvimento integral das crianças de
zero a cinco anos, garantindo tanto aquisição de conhecimento quanto
proteção e saúde. Trata também das crianças que estão fora dos centros
urbanos como: indígenas, quilombolas e que moram no campo. Aborda a
questão das crianças com necessidades educacionais especiais e combate
toda e qualquer forma de preconceito. E aborda a questão do multiculturalismo.
Tais documentos também têm uma dimensão sociopolítica e
pedagógica:
“Na observância destas Diretrizes, a proposta pedagógica
das instituições de Educação Infantil deve garantir que
elas cumpram plenamente sua função sociopolítica e
pedagógica:
I – oferecendo condições e recursos para que as crianças
usufruam SUS direitos civis, humanos e sociais;
II – assumindo a responsabilidade de compartilhar e
completar a educação e cuidado das crianças com as
famílias;
III – possibilitando tanto a convivência entre crianças e
entre adultos e crianças quanto à ampliação dos saberes
e conhecimentos de diferentes naturezas;
IV – promovendo a igualdade de oportunidade
educacionais entre as crianças de diferentes classes
sociais no que se refere ao acesso a bens culturais e às
possibilidades de vivência da infância;
V – construindo novas formas de sociabilidade e de
subjetividade comprometidas com a ludicidade, a
democracia, a sustentabilidade do planeta e com o
rompimento de relações de dominação etária,
32
socioeconômica, étnico-racial, de gênero, regional,
lingüística e religiosa”.24
24 Oliveira. Op. Cit.. Páginas 121 e 122.
33
CAPÍTULO III
O CUIDAR E O EDUCAR NA EDUCAÇÃO
INFANTIL
A primeira questão a ser suscitada nesse capítulo é o próprio título
do mesmo. Por que utilizar o termo educação infantil e não creches e pré-
escolas?
O termo Educação Infantil foi escolhido por ser uma síntese do
pensamento construído ao longo do presente trabalho.
Originariamente o que diferenciava a creche da pré-escola era tão
somente o horário de funcionamento e a faixa etária atendida. Havia quem
afirmasse que a creche tinha um cunho assistencialista e a pré-escola um
objetivo educacional.
“Creche” e “pré-escola” são, em geral, distinguidas ora
pela idade das crianças incluídas nos programas – a
creche se definiria por incluir crianças de 0 a 3 anos e a
pré-escola de 4 a 6 – ora pelo seu tipo de funcionamento
e pela sua extensão em termos sociais – a creche se
caracterizaria por uma atuação diária em “horário
integral”, e a pré-escola, por um funcionamento
semelhante ao da escola, em “meio período”. Há ainda
uma terceira classificação que diz respeito à vinculação
administrativa: a creche se subordinaria, assim, a órgãos
34
de caráter médico ou assistencial, e a pré-escola ao
sistema educacional”. 25
O termo Educação Infantil foi utilizado por englobar os dois tipos de
instituição que estão sendo estudadas na presente monografia.
Como explicitado nos primeiros capítulos as mudanças da Educação
acompanharam diretamente as mudanças ocorridas na sociedade.
Não é nenhum absurdo afirmar também que Educação vivencia os
mesmos preconceitos e diferenças que a sociedade.
Foram justamente essas diferenças que contribuíram para dar início
e mais tarde fomentar a discussão entre o cuidar e o educar nas instituições
que atendem crianças de zero a seis anos.
Fato é que desde os primórdios dos tempos a educação recebida
pelas classes populares era bem diferente daquela recebida pelos membros
mais abastados da sociedade.
Desde o início as instituições que atendiam crianças filhas de
operários tinham um propósito diferente daquelas que atendiam os filhos dos
seus patrões.
O surgimento das instituições que cuidam de crianças pequenas, a
princípio tinha um cunho absolutamente assistencialista.
As primeiras creches surgiram para dar conta e cuidar das crianças
abandonadas.
Depois serviram de “depósito” para os filhos das mulheres que
precisavam trabalhar fora para garantir o sustento da família.
25 Kramer, Sonia. O papel social da pré-escola – 1985. In Educação ou tutela? A criança de 0 a 6
anos. Souza, Solange Jobim e Kramer, Sonia. São Paulo: Loyola, 1988. Pág20.
35
“A proposta de creche, portanto, até época bastante
recente, não conseguiu romper com a representação idílica
da socialização da criança pequena pela maternagem
compulsória, não sendo tida como uma instituição
destinada à educação de todas as crianças, mas apenas
como um equipamento substituindo certas mães: aquelas
que trabalham fora”. 26
Mais tarde, sobre a supervisão de membros ligados a área da
saúde, as creches passaram a ter como objetivo principal suprir as carências
de alimentação e higiene das classes menos favorecidas.
Levando em consideração somente esse aspecto dessas instituições
é praticamente impossível compreender qualquer dimensão pedagógica
nessas instituições.
Por outro lado na medida em que a sociedade ia ganhando novos
contornos, estudiosos das mais diversas áreas: Pedagogia; Psicologia;
Sociologia; Antropologia; Filosofia e Medicina intensificavam seus trabalhos
sobre a Educação e com isso as propostas de ensino e currículo foram
variando.
Com isso, membros das classes mais abastadas começaram a
perceber a importância da escolarização na primeira infância dos seus filhos e
com isso começaram a surgir os chamados Jardins de Infância. Obviamente
independentemente da “orientação pedagógica” adotada, estes sempre tiveram
como função precípua a educação formal.
Por outro lado, as leis foram sendo promulgadas e pouco a pouco os
textos que foram surgindo deixaram de utilizar o nome creche e passaram a
utilizar pré-escola.
26 Rosemberg, Fulvia. O movimento de mulheres e a abertura política no Brasil: o caso da creche
– 1984. Cadernos de Pesquisa. São Paulo: Fundação Carlos Chagas, (51):73-9, Nov. 1984. Pág.90.
36
Não é um absurdo afirmar que o termo pré-escola, de alguma forma,
cria uma certa homogeneidade entre creches e Jardins de Infância.
Nos anos 70 as pré-escolas foram vistas como meio de garantir a
permanência das crianças na escola primária, ou seja, serviam para evitar
futuramente a evasão escolar.
Esse foi o momento em que surgiu a ideia de Educação
Compensatória.
“...atendimento para as crianças oriundas das famílias de
baixa renda, visando com isso, a equalizar as
oportunidades educacionais, não apenas no sentido do
acesso, mas também, no intuito de garantir a permanência
dessas crianças na escola, fornecendo-lhes uma formação
mais consistente, que compensasse a marginalização e
carência cultural a que estavam submetidas em seu
meio”.27
Entretanto, não se pode deixar de mencionar que, mesmo às
avessas, ou seja, de uma forma distorcida e até mesmo preconceituosa, a
chamada Educação Compensatória serviu para imprimir um caráter
pedagógico nas instituições que atendiam as crianças pequenas.
Paralelamente a isso as mulheres que antes exigiam apenas um
lugar para abrigar seus filhos enquanto trabalhavam, começavam a garantir
outro espaço na sociedade civil e com isso começaram a exigir ensino de
qualidade.
27 Abrantes, Paulo Roberto.O Pré e a Parábola da Pobreza.in Cadernos do CEDES. Org. Kramer,
Sonia e Abramovat, Mirian. São Paulo:Cortez Editora, 1984. Pág. 17.
37
Esse processo, aliado ao surgimento de Leis que garantiam aos
menores direitos fizeram definitivamente a passagem do assistencialismo para
o pedagógico. Dessa forma se consolidou a ideia de Educação Infantil.
Nesse ínterim, a educação básica passou a ser de competência dos
Municípios e muitos deles tomaram para si a responsabilidade de gerir as
antigas creches comunitárias passando a considerá-las unidades de educação
infantil.
É importante observar que a LDB ainda prevê que as creches são
para crianças de zero a três anos e as pré-escolas de quatro a cinco anos,
ocorre que ambas passaram a ser Educação Infantil
Na educação Infantil a criança passou a ser considerada um sujeito
de direitos. Um ser integral com história, cultura, hábitos, valores e saberes
adquiridos em sua vida. Todos esses aspectos passaram a ser considerados e
valorizados.
A Educação Infantil deixou de ser uma preparação para a escola
primária, passou a ser considerada uma fase da educação. Seu maior objetivo
passou a ser o desenvolvimento integral da criança.
“Entendemos a Educação Infantil como um tempo de
formação e que esse tempo vivido pelas crianças
proporciona o seu desenvolvimento. As crianças não
estão se preparando para crescer, elas estão crescendo
em todos os seus aspectos”. 28
Nas creches as pessoas que antes apenas cuidavam das crianças e
muitas vezes não tinham nenhuma formação profissional voltada para
28 Beachamp, Jeanete. Integração de creches e pré-escolas e habilitação de professores:
qualidade na Educação Infantil. Revista Criança. São Paulo: S. P. pág.11.
38 Educação, passaram a ser educadoras e com isso tiveram que entender a
dimensão pedagógica do seu ofício.
Esses profissionais precisaram se adaptar a idéia de nada do que
faziam era dissociado da idéia de educar.
Os profissionais da Educação Infantil precisaram absorver a noção
de que ao alimentar, dar banho ou colocar para dormir uma criança estavam
transmitindo informações importantes para o seu desenvolvimento.
“Na instituição de ensino, o cuidado é essencial, embora
não baste a operacionalização de ações voltadas à
satisfação mecânica das necessidades básicas de
alimentação, repouso ou higiene. Embora indispensáveis
em si mesmas, essas situações são também, ou
sobretudo, momentos privilegiados de contato social nos
quais as crianças são chamadas a compor os enredos de
práticas que, além de as organizarem em sua rotina
individual, sãs solicitam em suas possibilidades potenciais
de aprendizagem”. 29
Compreender que ao brincar de mímica e imitação com as crianças
estavam proporcionando a possibilidade de exercitarem papéis que
futuramente serão importantes para o seu convívio.
“É também pela imitação que a criança aprende. Toda a
sua possibilidade de construir conhecimento está
referendada nos modelos que estiverem a seu dispor”.30
29 Camargo, Fátima.Criança e educação: uma trajetória cultural e institucional.Revista Criança.
São Paulo: S. P. pág. 12.
30Idem. pág. 13.
39
Aceitar que cada vez que sentavam na rodinha para conversar com
os alunos estavam desenvolvendo sua oralidade, seu vocabulário.
“A conquista da linguagem, que constitui um enorme
avanço no desenvolvimento da criança, especializa sua
ação sobre o mundo e, em particular, sobre o outro,
enquanto amplia as possíveis pautas interativas e
comunicativas com ele”. 31
Contudo, para que esses profissionais compreendessem esse
processo na plenitude não bastava uma simples conversa ou lei.32
Era imprescindível que esses profissionais estudassem. Mas como?
Diante dos baixíssimos salários, da dupla, às vezes tripla jornada de trabalho, e
o que é pior da falta de vontade por parte de alguns, como fazer esses
profissionais estudassem?
O Governo Federal e as demais instâncias governamentais foram
obrigadas a proporcionar a esses profissionais cursos, palestras, debates,
enfim tiveram que promover meios para que esses profissionais se
adequassem a lei. Dentre eles podemos citar o PRÓ INFANTIL e a Plataforma
Freire do MEC.
31 Camargo, Op. Cit. pág. 13.
32 “A lei também determina que todos os profissionais que atuam na Educação Infantil sejam
habilitados até o final da Década da Educação, em 2007” Beachamp, Jeanete. Integração de creches e
pré-escolas e habilitação de professores: qualidade na Educação Infantil. Revista Criança. São Paulo: S. P.
pág.10.
40
“A garantia de que esses processos se efetivem implica
investimento na formação de professores: é preciso
profissionalizar o trabalhador da Educação Infantil,
oferecendo formação inicial (como é o PRÓ INFANTIL do
MEC”.33
Acontece que diante dessa passagem outra questão
automaticamente surgiu. Independentemente se a criança fica quatro, como no
caso das pré-escolas ou oito horas como nas creches, as crianças precisam de
cuidados. Precisam ser alimentadas ou ensinadas a se alimentar com
autonomia. Necessitam de ser limpas ou instruídas a se manter dessa forma.
Enfim, precisam de cuidados.
A quem estava delegada a competência de cuidar dessas crianças?
Esses cuidados seriam obrigação dos professores?
Sim, cabia aos professores cuidar das crianças que estavam sob
sua responsabilidade. Mas isso trouxe para uma parcela da categoria um
sentimento de desmerecimento profissional. Segundo esses profissionais para
que era necessário passar anos nos bancos das faculdades se era para eles
fazerem coisas que qualquer um podia fazer.
Acontece que, esse raciocínio remonta uma tradição, ou melhor, um
ranço existente na Educação. Retoma a noção de que ensinar é simplesmente
passar conteúdos formalmente estabelecidos em um currículo. Traduz a
máxima de que o professor é “dono” do conhecimento e cabe a ele transmiti-lo
através de suas explicações.
Entretanto, conforme foi mencionado nos capítulos anteriores desse
trabalho, esse é um conceito equivocado, antigo. O pensamento mais atual da
Pedagogia demonstra que o professor é um mediador, um facilitador do
33 Beachamp, Po. Cit. pág.11.
41 processo de aquisição do conhecimento pelo aluno e não um “aplicador de
atividades”. Cabe ao professor estimular o aluno a ser um cidadão, um ser
“pensante” capaz de mudar a sua prática social.
“Para implantar este modelo de educação infantil que
educa e cuida devemos, pois, afastar-nos de duas
concepções inadequadas: a concepção que educar é
apenas instruir e alimentar a cabeça através de lições, ou
ensinamentos das disciplinas; e que cuidar é um
comportamento que as mulheres desenvolvem
naturalmente em suas casas.”34
Cabe ao professor ressignificar a noção que tem a cerca do que é
conteúdo.
“Os conteúdos são referidos a essa função básica mais
total da educação básica. Não perdem seu lugar. Essa
ressignificação dos conteúdos, dos programas, é
fundamental. Diríamos que se passa a redescobrir sua
centralidade, sua pluralidade de funções. Constrói-se uma
nova relação com o conhecimento e vai-se redescobrindo
que conteúdos e programas não esgotam a totalidade das
funções cognitivas, socializadoras e culturais da escola
básica, bem como que essas funções perpassam a
34 Rosemberg, Fulvia. Educação Infantil, Educar e Cuidar e a Atuação Profissional. Palestra
proferida no III Seminário “Infância na Ciranda da Educação”, Belo Horizonte, Junho 1996.
42
totalidade das práticas, dos rituais, dos tempos, dos
espaços, das relações e estratégias cotidianas”.35
O professor precisa compreender que se é função da Educação
Infantil desenvolver na totalidade o aluno, é conteúdo da mesma desenvolver
hábitos de higiene, de alimentação, de sono. Como educador ele precisa
desenvolver nos alunos, respeitando sua faixa etária, autonomia necessária
para o exercício dessas atividades.
Todavia para aceitar essa função o professor tem que romper com
outro preconceito, o de que “cuidar de crianças é muito fácil, qualquer um faz,
não precisa ser profissional para isso”.
“Cuidar e educar crianças pequenas em instituições
coletivas é uma profissão. Como também necessita
formação prévia (que contemple conhecimentos sobre
este duplo efetivo), formação em serviço (principalmente
através de cursos e supervisão), espaço e instrumentos
de trabalho adequados, remuneração condizente com a
importância do trabalho”. 36
Em última análise ele precisa fazer o mesmo exercício que o
profissional leigo que trabalhava nas creches precisa fazer para compreender
35 Arroyo, Miguel. Experiências de inovação educativa: o currículo na prática da escola. In
Currículo: Políticas e práticas/ Antonio Flavio Barbosa Moreira (org.) – Campinas: SP: Papirus, 1999 –
(Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico). Pág.161.
36 Rosemberg, Fulvia. Educação Infantil, Educar e Cuidar e a Atuação Profissional. Palestra
proferida no III Seminário “Infância na Ciranda da Educação”, Belo Horizonte, Junho 1996.
43 que na Educação Infantil as questões ligadas ao cuidado são pedagógicas e
que, portanto, não desmerecem o profissional.
44
CONCLUSÃO
Desde que os homens surgiram na Terra e perceberam que
precisavam se organizar para sobreviver surgiu à necessidade de passar para
os mais novos as experiências vividas pelo grupo para que àquelas que fossem
negativas não repetissem. Nesse momento surgiu o ato de educar.
Com o passar do tempo, a sociedade foi ganhando novos contornos,
novas necessidades e novas maneiras de educar.
Acontece que ha muito tempo a função da educação deixou de ser
para sobrevivência, surgiram conteúdos que tornavam os homens que os
detinham mais importantes que os demais. Nesse momento a educação
passou a ser, exclusiva de determinados grupos.
Esses grupos se alternavam, ora era exclusiva dos homens ricos,
ora dos homens da Igreja, ora da nobreza. O importante é ressaltar que
geralmente ela estava ligada a classe social que estava exercendo o poder.
Outro fato importante é que até bem pouco tempo as mulheres não
tinham direito a nenhuma instrução formal.
Contudo, como a Educação exercia um papel importante na
sociedade despertou o interesse de muitos profissionais e com isso, o estudo
de todos os seus aspectos: psicológicos, antropológicos, sociológicos,
médicos, pedagógicos e filosóficos se intensificaram ao longo do tempo.
O capítulo I do presente trabalho fez um breve apanhado desses
estudos.
De um modo geral a Educação, ao longo dos tempos, foi dividida em
faixas etárias. Essas divisões variaram de acordo com o tempo, local e até
mesmo com o enfoque pedagógico, no entanto, um ponto em comum entre a
maioria delas é que geralmente a “primeira fase” era sempre nos primeiros
anos de vida.
45
Utilizamos a expressão “primeiros anos de vida” e não infância
propositalmente, pois, nem sempre essa existiu. É uma verdade incontestável
que o ser humano sempre nasceu bebê e cresceu, mas, nem sempre a infância
existiu. Ou melhor, nem sempre ela foi considerada.
Durante muitos e muitos anos tão logo eram desmamados os
pequenos eram considerados adultos em miniatura. Eram vestidos,
alimentados e, muitas vezes, participavam de eventos sociais como se adultos
fossem.
A “infância”, se é que está existia era tão reduzida que muitos
noivados e casamentos tinham protagonistas pessoas de onze, doze anos.
Durante anos esse foi o padrão, mas com as mudanças ocorridas
na sociedade e com os estudos aos poucos as crianças foram sendo
observadas e percebidas dentro de suas peculiaridades. Nesse processo elas
passaram a ser tratadas de uma maneira diferente da dos adultos.
Acontece que, mesmo com todas essas mudanças o poder e a
influencia das classes dominantes provocou uma nova diferenciação. Os filhos
das classes mais importantes começaram ser tratados com mimos e regalias,
enquanto os filhos dos pobres continuavam tendo apenas o necessário para
sobreviver, quando sobreviviam.
Um direito logo adquirido pelos filhos dos “importantes” foi o de
estudar, ou seja, de ingressar no mundo dos letrados através dos Jardins de
Infância.
Já os filhos dos “sem importância” foram jogados nas instituições
que os abrigavam enquanto suas mães eram obrigadas a trabalhar para
garantir seu sustento.
Uma vez que os filhos das classes populares continuaram tendo um
número elevado de óbitos, as instituições que cuidavam deles passaram a ter
um cuidado maior com saúde, alimentação, vacinação, enfim, consolidaram
seu papel assistencialista.
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Essa divisão creche para os pobres e Jardim de Infância para os
ricos perdurou durante muito tempo até que os movimentos sociais
aconteceram e os próprios trabalhadores começaram a exigir que seus filhos
tivessem a mesma Educação que as demais crianças.
Nesse ínterim, alguns organismos internacionais passaram a ter
como preocupação as crianças e aos poucos surgiram leis que as protegiam.
Leis e normas como: Declaração Internacional dos Direitos das
Crianças, Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei de Diretrizes e Bases da
Educação mudaram a situação da criança. Elas passaram a ser cidadãs,
passaram a ter direitos e com isso, modificaram seu status na sociedade.
Esse foi o tema abordado no capítulo II da presente monografia.
Com a LDB 9394/96 a educação voltada para as crianças de zero a
seis anos de idade passou a ser chamada de Educação Infantil.
A Educação Infantil passou a ser considerada primeira etapa da
Educação Básica. Ela deixou de ser preparatória e passou a ser importante por
ser responsável pelo desenvolvimento integral das crianças nessa faixa etária.
A lei preconizou que o ensino de zero a três anos fosse realizado
nas creches e de quatro anos a cinco anos em pré-escolas. Importante
ressaltar que ambas tinham as duas dimensões da Educação Infantil, o cuidar
e o educar.
Acontece que essas mudanças na Educação Infantil causaram
algumas discussões a cerca do papel do profissional da Educação Infantil.
Por um lado, os profissionais, que trabalhavam nas creches, de uma
hora para outra, foram obrigados a mudar sua prática para incluir o educar, ou
seja, para conferir um caráter pedagógico à mesma. Esses profissionais, pelo
menos na teoria, foram obrigados a se estudar.
Por outro lado, os professores se viram obrigados aceitar que não
bastava mais repassar os chamados conteúdos aos alunos. Eles tiveram que
aceitar que cuidar também faz parte da práxis pedagógica.
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Os professores também foram obrigados a compreender que, uma
vez que, o objetivo da Educação Infantil e desenvolver as crianças em todas as
suas dimensões: física, emocional, relacional, psicológica, cognitiva, o fato de
ter que cuidar das mesmas não diminuía em nada seu valor profissional.
Coube aos professores perceber que somente na Educação Infantil
os alunos têm a oportunidade de desenvolver determinadas áreas do
conhecimento e que, portanto, essa é de suma importância na vida das
mesmas. Logo, seja no cuidar, seja no educar o profissional que atua na
Educação Infantil é fundamental para a Educação.
Desta forma, o presente trabalho teve como objetivo demonstrar que
não existe outro meio de se educar crianças de zero a cinco anos. Na
Educação Infantil o educar e o cuidar são indissociáveis.
Educação infantil: cuidar é igual a educar. Esse é o caminho.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO PEDAGÓGICO 9
CAPÍTULO II
HISTÓRIA DOS CONCEITOS DE INFÂNCIA E EDUCAÇÃO INFANTIL 19
CAPÍTULO III
O CUIDAR E O EDUCAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL 33
CONCLUSÃO 44
REFERÊNCIAS BIBILIOGRÁFICAS 48
ÍNDICE 50