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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES UCAM PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO “A VEZ DO MESTRE” DISCIPLINA: IMPLANTAÇÃO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA NA ESCOLA PÚBLICA MARIA ANGÉLICA BENTO GUSMÃO Rio de Janeiro 2004

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

UCAM

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

DISCIPLINA: IMPLANTAÇÃO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA NA ESCOLA

PÚBLICA

MARIA ANGÉLICA BENTO GUSMÃO

Rio de Janeiro

2004

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

UCAM

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

DISCIPLINA: IMPLANTAÇÃO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA NA ESCOLA

PÚBLICA

MARIA ANGÉLICA BENTO GUSMÃO

Monografia apresentada à

Universidade Cândido Mendes

como requisito parcial para

conclusão do curso de Pós-

Graduação em Administração

Escolar.

Orientador: Vilson Sérgio de Carvalho

Rio de Janeiro, Fevereiro de 2004.

DEDICATÓRIA Dedico este trabalho aos meus amigos

invisíveis que me inspiraram e ao meu

esposo que, carinhosamente, apoiou-me

em todos os momentos.

AGRADECIMENTOS

Agradeço ao meu orientador, Professor

Vilson Sérgio de Carvalho pelo carinho e

atenção dispensados na orientação do

trabalho e a minha prima Diná Maria

Ribeiro de Albuquerque , pela ajuda na

realização do projeto.

EPÍGRAFE

“É preciso não esquecer nunca o preceito básico

que somente numa sociedade verdadeiramente

democrática será possível o florescimento de uma

escola democrática e popular, que satisfaça a

todas as legítimas aspirações do povo e de seus

professores e educadores.”

Paschoal Lemme

SUMÁRIO

Dedicatória..........................................................................................................

Agradecimentos..................................................................................................

Epígrafe...............................................................................................................

Resumo................................................................................................................

Introdução..........................................................................................................08

Capítulo I............................................................................................................10

Capítulo II...........................................................................................................19

Capítulo III..........................................................................................................31

Conclusão...........................................................................................................41

Referências Bibliográficas..................................................................................44

Anexo 1...............................................................................................................46

RESUMO

A Gestão Democrática possibilita demonstrar relações de mando e

submissão, fazendo surgir o sujeito coletivo, que decide, age e pode atuar na

transformação social. A Gestão Democrática é uma escolha que tem

conseqüências na atuação do diretor. Ele deixa de ser autoridade única da

escola e também não é mais o administrador burocrático, preocupado apenas

com a manutenção do prédio, preenchimento de papéis e suprimento de

recursos humanos e materiais. Na proposta participativa, o diretor passa a ser o

grande articulador das ações de todos os segmentos, o condutor do projeto da

escola, aquele que prioriza as questões pedagógicas e que mantém o ânimo de

todos na construção do trabalho educativo, logo, realizar uma Gestão

Democrática significa acreditar que todos juntos têm mais chances de encontrar

caminhos para atender às expectativas da sociedade a respeito da atuação da

escola, é possível estabelecer relações mais flexíveis e menos autoritárias entre

educadores e clientela escolar.

INTRODUÇÃO

A Gestão Democrática da Escola Pública é o ponto de partida para

uma mudança qualitativa do Ensino Público.As dificuldades da

implantação desta Gestão prepassam pela cultura autoritária do ensino,

ausência de recursos financeiros, desmotivação de professores e falta de

uma estrutura que favoreça a participação dos pais, entre outros fatores.

Qual a importância de relações horizontais, de solidariedade e

cooperação entre as pessoas, para que não se estabeleça relações

hierárquicas de mando e submissão para que exista uma verdadeira

Gestão Democrática?

O importante é promover a integração de todos os agentes

educativos possíveis, para uma educação democrática. Mais importante

do que controlar ou reprimir é criar mecanismos que tornam a escola

democrática. Por esse caminho, pais, alunos, professores e diretores

poderão deliberar em conjunto, para assim atender às reais necessidades

de seus educandos, não esquecendo que a escola é uma instituição que

pode contribuir para a Transformação Social.

Temos de organizar a estrutura escolar, onde o diretor deixe de ser

o herói e o vilão de cada escola e passe a dividir o direito e a

responsabilidade de decidir com os pais, alunos professores e

funcionários. Devemos tentar vencer as dificuldades existentes na

implantação de uma Gestão Democrática, em conseqüência de ransos

acumulados com o tempo.

É importante que se faça uma análise das atitudes comportamentais

consideradas negativas e positivas para o desenvolvimento da Gestão por

parte do Administrador. Valorizando as atitudes de relacionamento

consideradas favoráveis ao equilíbrio emocional dos envolvidos na

Gestão e a efetiva contribuição e participação de todos, a

representatividade que cabe a cada grupo envolvido na questão,

poderemos transformar a escola que temos, para que a mesma não seja

reprodutora de certa ideologia dominante sim cumpra a função no sentido

de concorrer para uma transformação social, fazendo com que todos se

apropriem de um saber historicamente acumulado e desenvolvam a

consciência crítica.

Há necessidade de reorganizarmos a autoridade no interior da

escola. Na medida em que se conseguir a participação de todos os

setores da escola - educadores, alunos, funcionários e pais, nas decisões

sobre seus objetivos e seu funcionamento, haverá melhores condições

para pressionar os escalões superiores a adotar a escola de autonomia de

recursos. Cabe ao Administrador, portanto, articular meios que permitam

a escola organizar-se democraticamente, com vista a objetivos

transformadores.

Com esse propósito, o Capítulo I, preocupou-se em revelar as

dificuldades na implantação da Gestão Democrática, o Capítulo II mostrou

a importância da participação de todos os envolvidos na Gestão Escolar,

o Capítulo III descreveu a evolução da Gestão Educacional e finalmente

concluiu-se que a Gestão Democrática, além de seu valor intrínseco, tem

agora o apoio da legislação vigente, mas por estarmos vivendo um novo

tempo na educação brasileira, com imensos desafios a serem enfrentados

com determinação, espírito crítico e clarividência,somente implementando

a Gestão Democrática, que garanta a participação de todos, teremos

condições de levar a escola brasileira a encontrar o verdadeiro caminho.

CAPÍTULO I

DIFICULDADES NA IMPLANTAÇÃO DA GESTÃO

DEMOCRÁTICA

Na estrutura formal de nossa escola pública está quase totalmente

ausente a previsão de relações humanas horizontais, de solidariedade e

cooperação entre as pessoas, observando-se, em vez disso, a ocorrência

de uma ordenação em que prevalecem relações hierárquicas de mando e

submissão. O mais alto posto dessa hierarquia é ocupado pelo diretor,

verdadeiro chefe da unidade escolar e responsável por último por tudo o

que acontece aí dentro. Essa condição lhe dá uma imensa autoridade

diante das demais pessoas que interagem no interior da escola, mas

quase nenhum poder de fato, já que a autoridade que ele exerce é

concedida pelo Estado, a quem deve prestar conta das atividades pelas

quais é responsável. Assim, independentemente de sua vontade, o diretor

acaba assumindo o papel de preposto do estado diante da instituição

escolar e de seus usuários.

Premido pelos inúmeros e graves problemas originários das

inadequadas condições em que o ensino escolar tem que se desenvolver

e instado a presta conta de tudo ao Estado, diante do qual acaba

colocando como culpado primeiro por qualquer irregularidade que aí se

verifique, o diretor escolar desenvolve tendência de concentrar em suas

mãos todas as medidas e decisões, apresentando m comportamento

autoritário que já vai se firmando no imaginário dos que convivem na

escola como característica inerente a cargo que exerce.

Esta situação tende a confirmar um maior afastamento ainda do

diretor com relação àqueles que dependem de suas ações, quando sua

escolha para o cargo, como acontece cm grande parte dos sistemas

públicos de ensino do país, se faz sem passar por processos eletivos.

Assim, quando se trata de mera nomeação política, sem estar submetia a

nenhum plano de carreira que preveja a realização de concurso público, a

escolha se dá por critério inteiramente subjetivo, ao arbítrio dos que

detêm o poder, e visa a favorecer seus interesses políticos – partidários, e

não a propiciar uma solução adequada à gestão da escola, em direção aos

interesses de seus usuários. Por outro lado, quando o diretor possui uma

estabilidade adquirida pela via exclusiva do concurso, sem submeter-se a

um processo eletivo que lhe prove a liderança e lhe conceda legitimidade

diante dos demais funcionários da escola e de seus usuários, a tendência

é o desenvolvimento de um descompromisso co relação aos interesses

dos usuários, porque continua sendo o Estado, pela via do concurso, que

advém a autoridade, e não de um compromisso assumido, num processo

democrático de disputa eleitoral, junto ao pessoal escolar e à população

usuária da escola. Trata-se, na verdade, de um processo esdrúxulo em

que, por conta do conhecimento técnico, o diretor – cuja função, como

preposto do Estado, possui caráter marcadamente político – escolhe a

unidade escolar, mas nem sta nem as que dela fazem uso podem escolher

o diretor.

Entretanto, embora necessária, não basta à eleição de dirigentes

escolares desvinculada de outras medidas que transformem radicalmente

a estrutura administrativa da escola, assim como não basta instituir

conselho de escola com a participação de professores, funcionários,

alunos e pais, mesmo com atribuições deliberativas, como acontece no

sistema público estadual paulista, se a função política de tal colegiado fica

inteiramente prejudicada pela circunstância de que a autoridade máxima e

absoluta dentro da escola é o diretor que em nada depende das

hipotéticas deliberações desse conselho .

Do modo como está instituído hoje em vários sistemas de ensino

do país, o conselho de escola fica, quase sempre, na dependência da

vontade política do diretor para funcionar adequadamente, de maneira a

servir como veículo de democratização da escola. Embora, em termos

legais, esse colegiado seja deliberativo e se coloque ao lado do diretor,

fazendo parte (supostamente) da direção, o diretor da escola, premido

pelas circunstâncias acima mencionadas, fazendo uso de sua autoridade

como responsável último pela unidade escolar e diante da insuficiente

pressão por participação da parte dos demais setores da escola, acaba

por montar ele próprio um conselho apenas formal e inoperante, que só

decide questões marginais e sem importância significativa para os

destinos da escola, ficando o diretor sozinho para tomar as decisões, já

que sabe ser ele quem arcará com as responsabilidades.

Seria necessário, em vez disso, um sistema em que a direção fosse

exercida por um conselho, em que o diretor perderia, em conseqüência, o

papel imperial que tem hoje, sendo apenas um de seus membros que, com

mandato efetivo, assumiria por certo período a presidência desse

colegiado diretivo, mas dividindo entre seus membros a direção da

unidade escolar. Isso implicaria ser o colegiado, e não seu presidente, o

responsável último pela escola.

A instalação de um conselho escola, constituído por representantes

eleitos pelos vários setores da escola, com efetiva função de direção em

regime de cooperação entre seus membros, parece ser uma medida que

avança bastante no sentido de superar a atual direção monocrática da

escola pública. Entretanto, a necessária transformação radical da

estrutura hierarquizante e autoritária da escola pública brasileira não pode

deter-se nesta medida. É preciso que a escola seja adequadamente

estruturada para atingir objetivos educativos em seu todo, quer em

relação às atividades – meio (direção, serviços de secretaria, assistência

escolar e atividades complementares, como zeladoria, vigilância,

atendimento aos alunos e pais), quer no que diz respeito à própria

atividade – fim, representada pela relação ensino-aprendizagem que se dá

predominantemente (mas não só) em sala de aula. O que se reivindica é

uma organização escolar em que o trabalho e as relações em seu interior

se dêem de modo a não contradizer a característica do próprio ato

educativo enquanto relação humano-genérica (Heller,1985) por excelência,

pois é nessa relação entre sujeitos que se dá a transmissão e apropriação

do saber historicamente produzido,característica exclusiva da espécie

humana.

Uma estrutura administrativa da escoa adequada à realização de

objetivos educacionais e acordo com os interesses das camadas

trabalhadoras deve também prever mecanismos que facilitem e estimulem

a participação de pais e membros da comunidade em geral nas decisões

aí tomadas. Hoje a instituição escolar encontra-se quase totalmente

impermeável a qualquer forma de participação da população usuária,

como se fosse essa população que mantivesse o Estado com seus

impostos e como se a escola não devesse servir precisamente a seus

usuários, procurando agir de acordo com seus interesses, manifestados a

partir de sua participação nas tomadas de decisões que aí se dão.

A participação da população nas decisões que se tomam na escola

ganha sentido diante da necessidade de que o caminho para a sociedade

verdadeiramente democrática não se restrinja ao voto periódico para

ocupantes de cargos parlamentares e executivos do Estado. Para que este

se sinta pressionado a agir em benefício dos interesses dos cidadãos, é

preciso que se proceda ao seu controle democrático. E tal controle deve

dar-se em todas as instâncias, em especial aquelas mais próximas da

população, onde se concretizam os serviços que ele tem o dever de

prestar, como escola. Como afirma Noberto Bobbio, 1989, a

democratização da sociedade precisa incluir ocupação de novos espaços,

isto é, de espaços até agora dominados por organização tipo hierárquico

ou burocrático. Para que isto seja possibilitado na escola, impõe-se a

necessidade de se instalarem mecanismos institucionais visando

participação política de grupos e pessoas envolvidos com as atividades

escolares – processos eletivos de escolha de dirigentes, colegiados com a

participação de alunos, pais e pessoal escolar associação de pais e

professores, grêmio estudantil, processos coletivos de avaliação

continuada dos serviços escolares, etc., tudo isso articulado por uma

estrutura que, em termos administrativos, propicie uma efetiva utilização

racional dos recursos disponíveis na concretização de fins educativos

e,em termos políticos, conduza uma democrática coordenação de

esforços humano coletivo, apta a reivindicar do Estado os recursos

necessários e a estar em consonância com os interesses das majoritárias

camadas trabalhadoras usuárias da escola pública fundamental.

É importante pensar na função social da escola pública, para que

possamos cumprir adequadamente um papel consciente de socialização

da cultura e ao mesmo tempo de contribuição para a democratização da

sociedade.

Há apenas algumas décadas, quando a escola pública fundamental

abrigava os filhos das camadas médias e altas da sociedade, sua função

primordial era preparar os jovens encaminhando-os para as ocupações

médias do mercado de trabalho, ou oferecer-lhes condições para

concorrer a uma vaga na universidade. Como os grupos sociais a que

servia tinham poder de pressão junto ao Estado, este provia o sistema

escolar dos recursos necessários, oferecendo condições adequadas para

o desenvolvimento das atividades escolares e pagando salários

condignos aos mestres que, inclusive gozavam de considerável prestígio

e status social em retribuição ao papel importante que exerciam na

preparação intelectual dos filhos das famílias mais privilegiadas. Em

acréscimo, os educadores escolares podiam experimentar certa realização

profissional, na medida que podiam perceber, de forma mais ou menos

imediata, a concretização dos objetivos a que se propunham com sua

ação educativa.

Essa situação configurava o que se convencionou chamar de

escola de qualidade, que tem levado equivocadas manifestações

saudosistas a respeito do resgate da boa qualidade de ensino,

supostamente perdida com a democratização do acesso à escola pública.

Não percebem os propugnadores desse resgate que o ensino que era

qualitativamente bom para determinados grupos sociais pode não ser

para os que hoje acorrem aos bancos escolares. Do ponto de vista das

famílias de mais alta renda, usuárias da escola pública de três ou quatro

décadas atrás, não há dúvida de que se tratava de um ensino de boa

qualidade, já que, como vimos, atendia satisfatoriamente a seus

interesses. Não significa, porém, que não fosse um ensino em grande

medida autoritário, calcado em métodos tradicionais e refratários de

inovações que visassem a introduzir formas dialógicas e democráticas de

apropriação do saber. Não é de se estranhar, assim, que a própria Escola

Nova tenha sido sistematicamente rechaçada naquilo que trazia de mais

essencial em termos políticos e filosóficos, que era a concepção do

educando enquanto sujeito, construtor autônomo de seu saber.

Para as camadas sociais que faziam uso do ensino público, elas

mesmas abrigando em seu seio o autoritarismo e ocupando posições

dominantes na sociedade, não era crucial que seus filhos exercitassem na

escola a autonomia e se instrumentalizassem para conquistar esses

direitos de cidadãos. Eles já tinham seus direitos garantidos pela posição

social que ocupavam. O mais importante era que as novas gerações se

apropriassem dos conteúdos transmitidos pela escola, que lhe dariam

condições de exercer com êxito seus papéis profissionais e políticos na

hierarquia social. Para essas camadas, a situação, hoje, pouco mudou

com referência ao ensino, já que elas conseguem escolas particulares,

especialmente naquelas consideradas de alto padrão, o mesmo ensino

conteudista pautado pelos mesmos métodos tradicionais e autoritários de

sempre.

Com a democratização do acesso à escola pública, esta passa a

apresentar condições cada vez piores de funcionamento, o que leva à

transferência para a rede escolar privada dos filhos dos grupos sociais de

melhor situação econômica e com maior poder de pressão sobre o

Estado. A rede pública passa, então, a atender a população totalmente

diversa daquela à qual estava habituada a servir, só que, agora, sob

precárias condições de funcionamento, já que o Estado brasileiro, porta

voz, em muito maior medida, dos interesses das elites econômicas, tem-

se mostrado inteiramente desinteressado pela apropriação do saber por

parte das camadas pobres e majoritárias da população que procuram a

escola pública fundamental.

Embora tenha mudado o alunado da escola pública, esta parece

continuar acreditando que a única finalidade defensável para um ensino

de qualidade é preparar as pessoas para ocupar postos profissionais de

maior prestígio ou para entrar na universidade. Influenciados pela

ideologia liberal burguesa, segundo a qual é possível, igualmente a todos,

subir na escala social através do esforço pessoal, via educação escolar,

concepção esta que, inclusive, levou amplas camadas da população a

procurar o ensino básico, nossos educadores escolares e muitos

intelectuais que discutem a educação parecem acreditar que a queda na

qualidade do ensino da escola pública consiste precisamente no fato de

ela, hoje, não conseguir alcançar para os atuais usuários o objetivo que

alcançava para as décadas passadas. No âmbito da escola pública, isto

tem levado os profissionais da educação, em especial os professores, ao

desânimo e à total falta de perspectiva para o seu trabalho. O mais grave é

que, na descrença em alcançar este objetivo, a prática escolar acaba, em

geral, não se orientando por objetivos nenhum.

Esta situação mostra-se particularmente grave em termos de

perspectivas para a administração educacional, já que se torna totalmente

impossível pensar em administração, entendida como a utilização racional

de recursos para a realização de fins determinados (Paro, 1968), se esses

fins inexistem ou são inteiramente desconsiderados. É preciso refletir a

respeito da necessidade de um novo objetivo para a escola pública, já que

nova é a sua população usuária. Mas isso não significa reivindicar um

ensino mais pobre para as populações pobres, no pressuposto de que

estas podem se contentar com menos ou que têm menos competência

intelectual para se apoderar de um saber mais elaborado, mas sim buscar

o provimento de um ensino adequado aos interesses dessa população,

interesses esses que são diversos, e em muitos aspectos antagônicos,

aos dos grupos que antes faziam uso da escola fundamental. Em vez

disso, notamos que a escola pública tem utilizado praticamente os

mesmos currículos, os mesmos programas, os mesmos métodos e

conteúdos, e distribuídos em períodos maiores, com a suposição de que a

população pobre é menos capaz, e tem aprendizado mais lento.

Temos que parar e refletir que a finalidade da educação pública

deve ser a aceitação de que a apropriação do saber como um valor

universal coloca-se como um direito inquestionável de toda a população.

Neste sentido, o provimento às amplas camadas que hoje buscam a

escola pública de um ensino de boa qualidade deve ser um direito não

dependendo de justificações de ordem econômica, ideológica ou de

qualquer espécie. Assim a escola pública é algo defensável e necessário

aos seus usuários, porque simplesmente vai prepará-los para o trabalho,

ou para a universidade, contribuindo para o desenvolvimento econômico

ou diminuindo a delinqüência social, etc. Embora todas essas razões

possam justificar o oferecimento de ensino público de boa qualidade, não

pode ser a falta ou o questionamento de qualquer uma delas que invalida

a razão primeira de que o acesso à cultura é direito universal do indivíduo

enquanto ser humano que pertence a determinada sociedade.

É urgente que se estabeleçam padrões mínimos de qualidade a

serem alcançados por meio do oferecimento de conteúdos relevantes e de

métodos pedagógicos consentâneos com os objetivos democráticos da

escola, ao mesmo tempo em que se desenvolvam processos coletivos de

avaliação de todo o processo escolar que permitam subsidiar e controlar a

efetiva busca desses objetivos. No que concerne à qualidade da força de

trabalho empregada na escola, é indispensável que se atente para os

determinantes sócio-econômicos, políticos e culturais que condicionam a

baixa qualificação do pessoal docente, as precárias condições em que

estes têm de desempenhar seu trabalho e a inadequação de suas práticas

pedagógicas aos interesses populares. Há que se pensar numa

transformação radical no modo como a escola organiza suas atividades,

dotando-as de uma estrutura administrativa que, sendo propícia à

realização dos fins sociais da educação, favoreça a participação em sua

gestão dos diferentes grupos e pessoas envolvidos nas atividades

escolares, deixando-se perpassar pela sociedade civil em sua função de

controle democrático do Estado. As instituições precisam ter condições

de descartar-se do passado.

Em 1996 a UNESCO empreendeu um grande esforço de repensar a

educação, no contexto da mundialização das atividades humanas, através

da Comissão Mundial para o século XXI que resultou no amplo relatório de

Jacques Delors, que propõe quatro pilares que deverão basear a

educação: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos

e aprender a ser.

Edgard Morin (2000), com sua excepcional visão integradora da

totalidade pensou os valores na perspectiva da complexidade

contemporânea, abordando novos ângulos, muitos dos quais ignorados

pela pedagogia atual, para servirem de eixos norteadores da educação.

Morin identifica sete valores fundamentais com os quais toda a cultura e

toda a sociedade deveriam trabalhar segundo suas especificidades. Esses

valores são respectivamente as Cegueiras Paradigmáticas, o

Conhecimento Pertinente, o Ensino da Condição Humana, o Ensino das

Incertezas, a Identidade Terrena, o Ensino da Compreensão Humana e a

Ética do Gênero Humano.

Para Morin, o destino planetário do gênero humano é ignorado pela

educação. A educação precisa ao mesmo tempo trabalhar pela unidade da

espécie humana de forma integrada com a idéia de diversidade. O

princípio da unidade/diversidade deve estar presente em todas as esferas.

É necessário educar para os obstáculos à compreensão humana,

combatendo o egocentrismo, o etnocentrismo e o sociocentrismo, que

procuram colocar em posição subalternas questões relevantes para a vida

das pessoas e da sociedade.

Agindo assim, deixando para trás os ransos do passado,

poderemos tentar colocar em prática uma Gestão Democrática, com a

ajuda e participação de todos e acima de tudo respeitando as

individualidades de cada um. Teremos com certeza uma escola de

qualidade, atendendo aos anseios de todos.

CAPÍTULO II

PARTICIPAÇÃO E GESTÃO ESCOLAR

A questão da participação, em especial a partir de 1968, está

permanente presente na discussão a respeito das formas de administrar.

É difícil definir as causas desta importante mudança. Significou nada mais

nada menos que uma revisão dos pressupostos teóricos do taylorismo e a

sua substituição, mesmo que muito lentamente, por valores

contemporâneos, como flexibilidade, tolerância com as diferenças,

relações mais igualitárias, justiça e cidadania. Nunca mais o padrão de

relacionamento autoritário, hierárquico e formalista do taylorismo

recuperou seu antigo prestígio (Gutierrez, 1997).

O mundo passo por mudanças culturais após a Segunda Guerra,

atingindo uma espécie de clímax com as manifestações de 68. O

comportamento individual, a estrutura familiar, a sexualidade e as

instituições foram fortemente questionadas. Era de se esperar que as

organizações reagissem a esse processo, procurando adequar-se ao seu

tempo. Um dos resultados palpáveis foi a introdução da idéia de

participação como alternativa administrativa e estratégica.

O filósofo alemão Habermas, ao definir participação, permite

encaminhar o debate num sentido ao mesmo tempo promissor e original.

Diz ele: “Participar significa que todos podem contribuir, com igualdade

de oportunidades, nos processos da vontade” (Habermas, 1975:159), ou

seja, participar consiste em ajudar a construir comunicativamente o

consenso quanto a um plano de ação coletivo.

As diferentes experiências classificadas como fortemente

participativas, de gestão democrática, autogestionárias, economia social e

terceiro setor ou cooperativismo de trabalho apresentam uma solução de

problemas recorrentes, cuja solução não admite receitas fáceis e

padronizadas. Por outro lado, se os problemas não são novos e originais,

a organização participativa precisa se renovar para lidar com aspectos

específicos da globalização. Numa perspectiva estritamente conceitual,

transferir a autoridade e a responsabilidade pela gestão de um bem

público para o grupo diretamente envolvido no trabalho é uma prática

democrática e socialmente justa, desde que não se escondam por trás do

incentivo a ação de natureza corporativa, e tampouco a intenção por parte

do Estado de se desfazer de suas obrigações para com a população. Isto

significa dizer que, da perspectiva da participação, a questão da

propriedade deve ser vista com pragmatismo, como algo flexível que

muda com o transcorrer do tempo. Mais importante são as relações

internas, o nível de transparência, o grau de autonomia e responsabilidade

dos membros e a possibilidade de interferir efetivamente na construção

de um plano consensual de ação coletiva.

As características individuais também são importantes para uma

questão participativa bem sucedida. É comum ouvir queixas, entre os

diretores da escola, referentes à necessidade de ter que trabalhar com um

grupo heterogêneo e em cuja formação ele na pode interferir. A

incorporação bem sucedida de pessoas em qualquer organização

depende de um período de adaptação, durante o qual o novo elemento

conhece e adota padrões típicos de comportamento. A administração

tradicional, com o taylorismo, o fordismo e a tecnoburocracia, resolve

esta questão por meio de coação física e principalmente psicológica ou de

violência simbólica, para usar a expressão cunhada por Bordieu, em

função de suas intenções manipulativas e exploradora. Esta crítica, de

resto bastante conhecida, não que dizer que a adaptação individual às

experiências amplamente participativas não vai requerer esforços

pessoais e organizacionais importantes, principalmente nos seguintes

aspectos: adequação à cultura e históricas específicas do grupo;

envolvimento intenso com o trabalho; crítica e superação de uma

formação autoritária e burocrática inculcada pelo meio social em sentido

amplo (familiar, escolar, profissional, político, etc.).

Este último aspecto, a superação da formação autoritária e

burocrática de cada um, só pode ser bem sucedida porque a realidade que

nos cerca é essencialmente contraditória, ou seja, ao mesmo tempo em

que se convive com as políticas conservadoras e violentas que induzem à

infantilização das pessoas, também assistimos a experiências

progressistas, principalmente nos campos da educação, cultura e

sociabilidade espontânea, que incentivam a participação responsável

dentro de grupos com posturas críticas, o amadurecimento moral e o auto

conhecimento. As propostas de gestão não convencionais dependem do

resgate e reconversão internos deste espaço social caracterizado por

relações igualdo resgate e reconv resgate e reco pressupondo que este

tipo de organização deva necessariamente incentivar o crescimento

pessoal, intelectual e técnico de cada membro, como forma de garantir o

aumento da eficiência de um coletivo onde todos possuem grande

autonomia de ação. Ou seja, procurar trilhar o caminho inverso das

organizações burocráticas, onde a infantilização dos membros viabiliza o

controle heterogêneo, a manipulação e a alienação.

Falando das potencialidades e obstáculos da participação da

população na gestão da escola públicos implicam elucidar os

determinantes imediatos de tal participação que se encontram dentro e

fora da escola. Com relação aos determinantes internos à unidade escolar,

poderemos falar de quatro tipos de condicionantes: materiais,

institucionais, políticos, sociais e ideológicos. Ao falarmos dos

condicionantes materiais de uma gestão participativa na escola, estamos

referindo-nos às condições objetivas em que se desenvolvem as práticas

e relações no interior da unidade escolar. Embora não se deva esperar

que mesmo condições ótimas de trabalho proporcionem, por si, a

ocorrência de relações democráticas e cooperativas, da mesma forma não

se deve ignorar que a ausência dessas condições pode contribuir para o

retardamento de mudanças que favoreçam o estabelecimento de tais

relações. Que parece se dar na realidade de nossas escolas públicas é

que, na medida em que, para a consecução de seus objetivos com o

mínimo de eficácia, faltam recursos de toda ordem, o esforço despendido

para remediar tais insuficiências tem competido com o esforço que se

poderia empregar para se modificarem as relações autoritárias que vigem

dentro da instituição escolar. É preciso, todavia, tomar cuidado para não

se erigirem essas dificuldades materiais em mera desculpa para nada

fazer na escola em prol da participação. Isso parece acontecer com certa

freqüência na escola pública e se evidencia quando, ao lado das

reclamações a respeito da falta de recursos e da precariedade das

condições de trabalho, não se desenvolve nenhuma tentativa de superar

tal condição ou de pressionar o Estado no sentido dessa superação. Em

relação a esse propósito, é preciso na esquecer que as mesmas

condições adversas que podem concorrer, em termos materiais, para

dificultar a participação podem também, de outro modo, contribuir para

incrementá-la, a partir da adequada instrumentalização dessas condições.

Isto pode dar-se quer a partir das insatisfações das pessoas e grupos

envolvidos (pessoal escolar, alunos e comunidades) que, ao tomarem

consciência das dificuldades, podem desenvolver ações para superá-las,

quer por conta das novas necessidades colocadas como tais problemas,

que exigem, para sua superação, a participação de pessoas que, de outra

forma, dificilmente estariam envolvidas com elas. Este último aspecto diz

respeito mais precisamente à oportunidade que especialmente pais e

membros da comunidade têm de, ao se envolverem com a ajuda na

resolução de problemas da escola, adquirem mais conhecimento e

familiaridade com as questões escolares, de modo a também poderem

influir nas decisões que aí se tomam.

Dentre os condicionantes internos da participação da escola, os de

ordem institucional são, sem dúvida nenhuma, de importância

fundamental. Diante da atual organização formal da escola pública,

poderemos constatar o caráter hierárquico da distribuição da autoridade,

que visa a estabelecer relações verticais, de mando e submissão, em

prejuízo de relações horizontais, favoráveis ao envolvimento democrático

e participativo. Em função de tudo isso, e tendo em conta que a

participação democrática não se dá espontaneamente, sendo antes um

processo histórico de construção coletiva, coloca-se a necessidade de se

preverem mecanismos institucionais que não apenas viabilizem, mas

também incentivem práticas participativas dentro da escola pública. Isso

parece tanto mais necessário quanto mais consideramos nossa

sociedade, com tradição de autoritarismo, de poder altamente

concentrado e de exclusão da divergência nas discussões e decisões.

Com respeito à diversidade de interesses dos grupos que se

relacionam no interior da escola, há de se reconhecer, preliminarmente, a

identidade de interesses sociais estratégicos por parte dos professores,

demais funcionários, alunos e pais, já que na escola pública que atende as

camadas populares, todos são trabalhadores, no sentido mais amplo do

termo. Todavia, isto não significa que os atos e relações no interior da

instituição escolar se dêem de forma harmoniosa e sem conflitos, já que a

consciência de tais interesses mais amplos não se dá de forma freqüente,

nem imediata. Em sua prática diária, as pessoas se orientam por seus

interesses imediatos e estes são conflituosos entre os diversos grupos

atuantes na escola. Na perspectiva de uma participação dos diversos

grupos na gestão da escola, parece que não se trata de ignorar ou

minimizar a importância desses conflitos, mas de levar em conta sua

existência, bem como suas causas e suas implicações na busca da

democratização da gestão escolar, como condição necessária para a luta

por objetivos coletivos de mais longo alcance como o efetivo

oferecimento de ensino de boa qualidade para a população.

A participação democrática da escola pública sofre também efeitos

dos condicionantes ideológicos aí presentes. Por condicionantes

ideológicos imediatos da participação estamos entendendo todas as

concepções e crenças sedimentadas historicamente na personalidade de

cada pessoa e que movem as suas práticas e comportamentos no

relacionamento com os outros. Assim, se estamos interessados na

participação da comunidade na escola, é preciso levar em conta a

dimensão em que o modo de pensar e agir das pessoas que aí atuam

facilita, incentiva ou dificulta, impede a participação dos usuários. Para

isso, é importante que se considere tanto a visão da escola a respeito da

comunidade, quanto a sua postura diante da própria participação popular.

A visão negativa a respeito dos pais e alunos das escolas públicas

pertencentes às camadas populares é de extrema relevância, já que tal

concepção acaba se refletindo no tratamento dispensado aos usuários do

cotidiano da escola. No relacionamento com os pais e outros elementos

da comunidade, quer em reuniões, quer em contatos individuais, a

postura é de paternalismo ou de imposição pura e simples, ou ainda a de

quem está “aturando” as pessoas, por condescendência ou por falta de

outra opção. De um modo ou de outro, prevalece a impressão de que os

usuários, por sua condição econômica e cultural, precisam ser tutelados,

com se lhes faltasse algo para serem considerados cidadãos por inteiro.

Esse comportamento reproduz também no processo pedagógico em sala

de aula, onde a criança é encarada não como sujeito da educação, mas

como obstáculo que impede que esta se realize. Assim, não parece difícil

deduzir a implicação dessa postura para a participação da comunidade

nas decisões escolares. Uma escola perpassada pelo autoritarismo em

suas relações cotidianas muito dificilmente permitirá que a comunidade aí

se faça presente para participar autonomamente das relações

democráticas.

Diante dessa visão depreciativa da comunidade, muitos usuários se

sentem diminuídos em seu auto conceito, o que os afasta da escola para

não verem seu amor próprio constantemente ferido. Outros conseguem

perceber o preconceito com que estão sendo tratados, o que pode

contribuir também para afastá-los quando sentem que não há condições

de diálogo com a escola. Uma segunda e importante dimensão dos

condicionantes ideológicos da participação presentes no interior da

escola diz respeito à própria concepção da participação que têm as

pessoas que aí trabalham. Esse aspecto é de particular importância, pois

se trata de saber a que as pessoas estão se referindo quando se dizem a

favor ou contra a participação, merecendo que nos detenhamos nele mais

demoradamente.

A questão de natureza da participação quanto ao tipo de

envolvimento das pessoas que participam, se na execução, se na tomada

de decisões, não estão desvinculados, mas trata-se de ser bastante claro

qual objetivo se tem em mente. Se pretende-se restringir a participação da

comunidade à execução que, em sentido mais amplo, pode incluir desde a

participação direta, por meio de ajuda nas atividades escolares, até a

contribuição em dinheiro ou doações em espécie, ou se o que deseja é a

efetiva partilha do poder na escola, o que envolve a participação na

tomada de decisões. A esse respeito, o que se observa é que o discurso

da participação quer entre políticos e administradores da cúpula do

sistema de ensino, quer entre o pessoal e a direção, está muito marcado

por uma concepção de participação fortemente atrelada ao momento da

execução. Não se trata, todavia, de descartar a participação na execução

como se ele fosse um mal em si, pois ela pode constituir até mesmo uma

estratégia para se conseguir maior poder de decisão. O que temos

observado a esse respeito é que, na medida em que a pessoa passa a

contribuir quer financeiramente, quer com seu trabalho na escola, ela se

acha em melhor posição para cobrar o retorno de sua colaboração e isso

pode dar-lhe maior estímulo na defesa de seus direitos e resultar em

maior pressão por participação nas decisões. Além disso, a participação

de pais (e especialmente mães, como tem sido mais freqüente) na

realização de pequenos reparos, em serviço de limpeza, na preparação da

merenda, ou ainda na organização ou cumprimento das tarefas ligadas a

festas, excursões e outras atividades, acaba por lhes dar acesso a

informações sobre o funcionamento da escola e sobre fatos e relações

que aí se dão e que podem ser de grande importância, seja para

conscientizarem-se da necessidade de sua participação nas decisões,

seja como elemento para fundamentar suas reivindicações nesse sentido.

A questão da participação na execução envolve ainda uma

importante contradição que parece comum no discurso dos que se põem

contra a participação da população na gestão da escola pública. Trata-se

da pretensão de negar a legitimidade à participação dos usuários na

gestão do pedagógico, por conta do aludido baixo nível de escolaridade e

da ignorância dos pais a respeito das questões pedagógicas, ao mesmo

tempo em que se exige que os mesmos pais participem (em casa, no

auxílio e assessoramento a seus filhos) da execução do pedagógico,

quando o inverso nos parecia razoável. Embora não sejam formados em

Pedagogia, em Matemática ou em Geografia, parece que os pais têm sim

conhecimento suficiente para exercer certa fiscalização e contribuir, pelo

menos em parte, na tomada de decisões a respeito do funcionamento

pedagógico da escola. Aqui não parece ser fundamental um conhecimento

didático-pedagógico específico e especializado. O pai ou a mãe têm

condições de saber que uma sala de 25 alunos é mais produtiva do que

uma sala com 40, como é capaz de entender que a falta de merenda

atrapalha o desempenho dos alunos em seu dia de aula e a ausência de

professor é nociva ao desenvolvimento do currículo escolar. Por outro

lado, não se pode exigir que eles participem do que não têm condições de

dar conta e que é obrigação da escola fazê-lo: a execução do pedagógico

é atribuição de pessoas, como professores, adrede preparadas para esse

fim.

O suposto, presente na fala de muitos diretores e professores, de

que a população possui baixa escolaridade e desconhece o próprio

funcionamento formal da unidade escolar não deveria servir de argumento

para se afastar da escola a comunidade, com a alegação de que ela não

tem condições técnicas de participar de sua gestão. Tal alegação supõe a

redução da administração escolar em seu componente estritamente

técnico, quando a grande contribuição dos usuários na gestão da escola

deve ser de natureza eminentemente política. É como mecanismo de

controle democrático do Estado que se faz necessária a presença dos

usuários na gestão da escola. Para isso, o importante não é seu saber

técnico, mas a eficácia com que se defende seus direitos de cidadãos,

fiscalizando a ação da escola e colaborando com ela na pressão junto aos

órgãos superiores do Estado par que este ofereça condições objetivas

possibilitadoras da realização de m ensino de boa qualidade.

Outro componente importante presente na visão da escola pública

sobre a participação diz respeito à descrença acerca da possibilidade

dessa participação. Associada a essa descrença na participação da

população e a uma concepção de participação que inclui apenas sua

dimensão “executiva” está a ausência quase total de qualquer previsão de

rotina ou eventos que ensejem a participação da comunidade na escola.

Como a própria instituição escolar não possui mecanismos institucionais

que, por si, conduzam efetivamente a um processo de participação

coletiva em seu interior, a inexistência dessa previsão por parte da

direção ou dos educadores escolares fecha mais uma porta que poderia

levar à implementação, na escola, de um trabalho cooperativo.

A primeira impressão que a palavra autonomia nos passa é a de

uma soberania ilimitada, como uma forma de organização e gestão

independente de qualquer tipo de limite ou restrições externas. Em termos

jurídicos, porém, o conceito de autonomia não tem essa significação. “A

autonomia não significa independência nem soberania. Seu exercício,

embora pleno, restringe-se a esferas específicas previamente delimitadas

pelo ente maior, dentro das quais e para as quais são produzidas pelo

ente autônomas normas próprias e integrantes do sistema judicial global”

(Ranieri, 1994:27). Cândido Giraldez Vietez considera que “a autogestão

ou a auto-administração, em seu sentido restringido, é um método de

participação avançada em que os trabalhadores não apenas influem na

vida da organização, senão que são eles próprios os responsáveis diretos

e imediatos pela tomada de decisões da organização, ou seja, são eles

mesmos os gerentes da organização...” (Vietez, 1996:141).

A escola é um universo específico cuja realidade, assim como a

ação de seus atores, só pode ser compreendida a partir de um

conhecimento prévio. Contudo, não deixa, de guardar pontos em comum

tanto no que diz respeito à natureza conceitual da participação, como com

relação à experiência prática da gestão participativa no terceiro grau. O

primeiro aspecto a ser destacado, para evidenciar a especificidade da

escola pública, é a sua intensa relação com a comunidade, quer na prática

cotidiana da administração, quer no que se refere à enorme

heterogeneidade cultural que caracteriza a sociedade brasileira. Ou seja, a

escola pública acaba lidando com o Brasil real, o Brasil da miséria, da

pobreza em todos os seus sentidos, de uma forma muito mais direta e

urgente que a universidade ou a empresa. Isto significa dizer que quando

falamos em gestão participativa no âmbito da escola pública estamos nos

referindo a uma relação entre desiguais onde vamos encontrar uma escola

sabidamente desaparelhada do ponto de vista financeiro para enfrentar os

crescentes desafios que se apresentam e, também, uma comunidade não

muita preparada para a prática da gestão participativa da escola, assim

como do próprio exercício da cidadania em sua expressão mais prosaica.

A participação na administração da escola está, pelo menos

teoricamente, garantida por meio do funcionamento do Conselho de

Escola, cuja forma mais atual é resultado de uma longa e dura luta política

que data do início da década de 80, com o sentido de dotar a escola de

autonomia para poder elaborar e executar seu projeto educativo.

Preocupado com essas questões, Daniel Garcia Flores, em sua

dissertação de mestrado, desenvolve cuidadosa pesquisa de campo

objetivando conhecer as razões do mau funcionamento do conselho de

Escola ou, em outras palavras, por que este Conselho não atinge a

participação, transparência e democracia que, do ponto de vista formal,

poderia atingir. Em artigo onde procura sintetizar suas conclusões, Daniel

Flores afirma que: “grande porcentagem dos entrevistados declara nada

conhecer sobre as atribuições legais e sobre o funcionamento dos

Conselhos de Escola; os alunos apresentam maior índice de

desconhecimento, mas há também professores que declaram não ter

conhecimento desses aspectos. Apenas o funcionário, o supervisor e o

delegado respondem conhecer tudo a respeito do Conselho de Escola.

Nossa indagação é, portanto: será o Conselho de Escola uma entidade tão

burocratizada, que seja melhor conhecida por funcionários, supervisores

e delegados? E que espécie de atuação pode ter um Conselho cuja

maioria dos membros não sabe nada a respeito de sua abrangência,

competência, área de atuação e poder de decisão? O segundo bloco de

perguntas procurou detectar a participação de cada entrevistado nas

reuniões e decisões do Conselho de escola. As respostas obtidas

demonstram algumas críticas nesse aspecto, apesar de na maioria dos

entrevistados achar importante os assuntos tratados e considerar que

pode fazer alguma coisa pela escola através da participação do Conselho

de Escola. Há, enfim, uma boa imagem dos participantes sobre ele. A

participação, no entanto, não é a mesma entre os diferentes grupos. Os

professores pelas respostas, parecem ser mais participativos. O terceiro

bloco de questões pretendeu dar um espaço para as sugestões dos

participantes sobre a melhoria do papel e do poder do Conselho de

Escola. As sugestões foram muitas, relevando uma vontade geral de que o

Conselho seja realmente aquilo que se espera dele: uma instância de

participação dos diferentes segmentos interessados na melhoria da

escola pública, através da atuação dos seus maiores interessados: pais,

alunos, professores, funcionários e autoridades educacionais. As maiores

críticas estão no emperramento desta participação, passando pela

manipulação dos Conselhos de Diretores, extrema burocracia, chegando à

má-vontade em participar, denunciada por diferentes elementos “(in

Vieitez, 1997:122)”.

Particularmente significativa nesta última colocação é a referência à

função do diretor enquanto condutor do processo decisório pelos

Conselhos. Isto, na verdade, é um dos resultados da as pesquisa, onde

fica evidente o poder do diretor para encaminhar o Conselho no sentido

de assumir posições coerentes com a sua visão do que é melhor naquelas

circunstâncias. De qualquer forma a atuação do diretor é essencialmente

contraditória e difícil.

Toda e qualquer organização que tente implantar e desenvolver

práticas de natureza participativa vive sob a constante ameaça da

reconversão burocrática e autoritária dos seus melhores esforços. As

razões para isto são as diversas: história de vida dos membros,

supervalorização ideológicas das formas tradicionais de gestão,

demandas políticas difíceis de conciliar, etc. de tudo isso, contudo, um

ponto deve ser destacado: a participação se funda no exercício do diálogo

entre as partes. Esta comunicação ocorre, em geral, entre pessoas com

diferentes formações e habilidades, ou seja, entre agentes dotados de

distintas competências para a construção de plano coletivo e consensual

de ação. Na prática da gestão escolar, esta diferença, que entre si não é

original nem única, assume a dimensão muito maior do que a grande

maioria das propostas de gestão participativa e autogestão que pode ser

observada.

Vale a pena observar ainda que a nova Lei das Diretrizes e Base da

Educação (LDB, Lei nº 9397, de 20 de dezembro de 1996) procura,

diferentemente da legislação e prática de ensino anteriores, “flexibilizar e

descentralizar as estruturas educacionais”. Finalmente, conclui-se que o

universo da escola é particularmente complexo e específico; o diálogo só

pode ser verdadeiro e frutífero a partir de um esforço de aproximação

onde todos tentem perceber e conhecer o outro em seu próprio contexto e

a partir da sua própria história constitutiva. Ou seja, ver o outro tal qual

ele mesmo se vê, e não apenas como eu o vejo a partir da minha

especificidade. Isto significa dizer que para entender a escola pública,

este objeto de investigação absorvente e que lida com as prioridades

humanas mais urgentes possíveis, ainda mais num país que apresenta

estas carências sociais, é necessário praticar constantemente o exercício

da participação de todos os seus sentidos: internamente na prática

administrativa, na inserção política transformadora e emancipadora, no

diálogo intelectual com todas as outras áreas de conhecimento e,

provavelmente a dimensão mais difícil, de cada um consegue mesmo por

meio do auto conhecimento, procurando tornar-se uma pessoa mais

sensível, tolerante e atenta ao diferente, aos seus direitos e à contribuição

que ele seguramente tem para dar. Em resumo, buscar contribuir

comunicativamente o consenso pelo diálogo com todos os evolvidos, e

não apenas com aqueles que pensam como nós. É preciso recusar, como

escreveu Bourdieu (1983), “a pregar aos convertidos”.

CAPÍTULO III

EVOLUÇÃO DA GESTÃO EDUCACIONAL

É inegável que os seres humanos sempre tiveram tendências para a

formação de grupos. Na nossa escola não é diferente, apesar da cultura

nossa valorizar o individualismo. Assim como acontece com o líder, uma

equipe bem formada pode diferenciar-se. Para a formação de equipes há

alguns princípios básicos a serem considerados: saber dirigir, motivar,

treinar, delegar e reconhecer. Numa equipe bem formada será preciso que

todos os componentes se sintam donos dela. O desejo e a necessidade de

dirigir precisam ser calcados em m princípio: não basta dirigir a equipe,

será preciso que ela queira ser dirigida. Elogiar faz bem. O açúcar leva

mais longe que o vinagre. Motivar é algo que podemos fazer, começando

por nós mesmos. Outro cuidado que o líder diferenciado deve ter é

oferecer ao grupo um apoio construtivo em vez de crítica construtiva.

Também o treinamento é fundamental para que melhore a capacidade das

pessoas para a função a que se propõem. Confúcio já dizia – “Vejo e

esqueço. Ouço e me lembro. Faço e entendo”. Líder sabe delegar e

fornecer informações de duas maneiras: fazendo perguntas e dando

orientações.

Questionamos a mudança de paradigma de administração para

gestão, que vem ocorrendo no contexto das organizações e dos sistemas

de ensino, como parte de um esforço fundamental para a mobilização e

articulação do talento humano e sinergia coletiva, voltados para o esforço

competente de promoção da melhoria do ensino brasileiro e sua evolução.

Do mesmo modo analisamos questões relacionadas à condução e

orientação das questões educacionais e delineia perspectivas para a

orientação do trabalho e gestão competente, à luz de um paradigma

dinâmico, mobilizador do talento humano e responsável pela

transformação das instituições educacionais. Gestão é uma expressão

que ganhou corpo no contexto educacional acompanhando uma mudança

de paradigma no encaminhamento das questões desta área. Em linhas

gerais, é caracterizada pelo reconhecimento da importância da

participação consciente e esclarecida das pessoas nas decisões sobre a

orientação e planejamento de seu trabalho. O conceito de gestão está

associado ao fortalecimento da democratização do processo pedagógico,

à participação responsável de todos nas decisões necessárias e na sua

efetivação mediante um compromisso coletivo com resultados

educacionais cada vez mais efetivos e significativos.

A dinâmica intensa da realidade e seus movimentos fazem com que

os fatos e fenômenos mudem o significado ao longo do tempo, as

palavras usadas para representá-los deixam de expressar toda a riqueza

da nova significação. Daí porque a mudança de designação de

administração para gestão educacional. Entendemos a questão do

desenvolvimento de qualidade de ensino demanda uma orientação mais

global e abrangente, com visão de longo prazo, do que tópica, localizada

nas estimulações de momento e próximas. Isso porque se tem observado,

ao longo da história de nossa educação, que não se tem promovido a

melhoria da qualidade e ensino por meio de ações que privilegiam ora a

melhoria de metodologia do ensino, ora o domínio do conteúdo pelos

professores e sua capacitação em sentido mais amplo, ora a melhoria das

condições físicas e materiais da escola. Qualquer ação isolada tem

demonstrado resultar em mero paliativo aos problemas enfrentados, e a

falta de articulação entre eles explicaria casos de fracasso e falta de

eficácia na efetivação de esforços e despesas para melhorar o ensino,

despendidos pelo sistema de ensino. Observamos que existem escolas

com excelentes condições físicas e materiais, em que os alunos

vivenciam uma escolaridade conservadora, outras, em que o trabalho

consciente de professores competentes perde-se no conjunto de ações

pedagógicas desarticuladas, outras ainda que, embora tenham uma

proposta pedagógica avançada e bem articulada, não conseguem traduzi-

la em ações, por falta de sinergia coletiva. Casos como esses indicam que

embora existam certos instrumentos e condições para orientar um ensino

de qualidade, estes se tornam eficazes por falta de ações articuladas e

conjuntas. Firmamos, pois, o parecer de que falta, para a promoção de

qualidade da educação, uma visão global do estabelecimento de ensino

como instituição social, capaz de promover sinergia pedagógica de que

muitas das melhores instituições estão carentes. Essa sinergia seria

conduzida pela equipe de gestão da escola, sob a liderança de seu diretor,

voltada para a dinamização e coordenação do processo co-participativo,

para atender às demandas educacionais da sociedade dinâmica e

centrada na tecnologia e conhecimentos.

A promoção de uma gestão educacional democrática e participativa

está associada a compartilhamento de responsabilidades no processo da

tomada de decisão entre os diversos níveis de segmentos de autoridade

do sistema educacional. Desse modo, as unidades de ensino poderiam,

em seu interior, praticar a busca de soluções próprias para seus

problemas e, portanto, mais adequadas às suas necessidades e

expectativas, segundo os princípios de autonomia e participação,

indicadas por Valérien (1993), com duas das três principais características

da gestão educacional. A terceira característica seria autocontrole, que

equilibraria a autonomia da participação, para que a unidade de ensino

não venha a cair no espontaneísmo e laissez-faire. Acrescentamos um

quarto princípio de responsabilidade, demonstrado pelo contínuo

processo de comprovação pública de seu trabalho e de esforços para

melhorá-lo. Em nome de uma ação democrática e autônoma, muitos

membros de unidades sociais apresentam ressentimento contra toda e

qualquer norma que possa estabelecer ordem e direcionamento ao seu

trabalho. A esse respeito cabe-nos refletir sobre o significado subjacente

ao seguinte pensamento: as normas existem para obediências dos tolos e

orientação dos sábios (Oech, 1993). A gestão educacional cultiva relações

democráticas, fortalecendo princípios comuns à orientação, norteadores

da construção da autonomia competente. A nova ótica do trabalho de

direção do estabelecimento de ensino lembra a necessidade e importância

de que as decisões a respeito do processo de ensino sejam efetivadas na

própria instituição de ensino, envolvendo quem vai realizar esta prática e

seus usuários. Essa proposição de autonomia não deve eliminar a

vinculação da unidade de ensino com o sistema educacional que o

sustenta. A autonomia é limitada, uma vez que as ações que promovem a

força do conjunto só são possíveis mediante uma coordenação geral, que

pressupõe, além da necessária flexibilidade, a normatização entendida em

seu espírito maior e não em sua letra menor.

O termo gestão tem sido utilizado, de forma equivocada, como se

fosse simples substituição ao termo administração. Comparando o que se

propunha sob a denominação de administração e o que se propõe sob a

denominação de gestão e ainda, a alteração geral de orientações e

posturas que vêm ocorrendo em todos os âmbitos e que contextualizam

as alterações no âmbito da educação e da gestão, concluímos que a

mudança é radical. Conseqüentemente, não se deve entender que o que

esteja ocorrendo seja uma mera substituição de terminologia das antigas

noções a respeito de como conduzir uma organização de ensino.

Revitalizar a visão de administração da década de 70, orientada pela ótica

da administração científica (Perel, 1977; Treckel, 1967) seria ineficaz e

corresponderia a fazer mera maquiagem modernizadora. É importante

notar que a idéia de gestão educacional desenvolve-se associada a outras

déias globalizantes e dinâmicas em educação, como, por exemplo, o

destaque à sua dimensão política e social, ação para a transformação,

globalização, participação, práxis, cidadania, etc. Pela presente

complexidade das organizações e dos processos sociais nelas

ocorrentes, caracterizada pela diversificação e pluralidade de interesses

que envolvem a dinâmica das interações no embate desses interesses,

não se pode conceber que estas organizações sejam administradas pelo

antigo enfoque conceitual de administração científica, pelo qual tanto as

organizações, como as pessoas que nela atuam, são consideradas como

componentes e uma máquina manejada e controlada de fora para dentro.

Ainda segundo esse enfoque, os problemas recorrentes seriam

sobretudo encarados como carência de “imput” ou insumos, em

desconsideração ao seu processo e dinamização de energia social para

promovê-lo.

Os sistemas educacionais e os estabelecimentos de ensino, como

unidades sociais, são organismos vivos e dinâmicos, e como tais devem

ser entendidos. Assim, ao se caracterizarem por uma rede de relações

entre os elementos que nelas interferem, direta ou indiretamente, a sua

direção demanda de um novo enfoque de organização. E é essa

necessidade que a gestão educacional tenta responder. A gestão abrange,

portanto, a dinâmica do seu trabalho, como prática social, que passa a ser

o enfoque orientador da ação diretiva executada na organização de

ensino. A expressão “gestão educacional”, comumente utilizada para

designar a ação dos dirigentes, surge, por conseguinte, em substituição a

“administração educacional”, para representar não apenas novas idéias,

mas sim um novo paradigma, que busca estabelecer na instituição uma

orientação transformadora, a partir da dinamização de rede de relações

que ocorrem, dialeticamente, no seu contexto interno e externo.

Assim,como mudança paradigmática está associada à transformação de

inúmeras dimensões educacionais, pela superação, pela dialética, de

concepções dicotômicas que enfocam ora o diretivismo, ora o não-

diretivismo; ora a heteroavaliação, ora a auto-avaliação; ora a avaliação

quantitativa, ora a qualitativa; ora a transmissão do conhecimento

construído, ora a sua construção, a partir de uma visão da realidade.

Conseqüentemente, não se trata, apenas, de simples substituição

terminológica, baseada em considerações semântica. Trata-se, sim, da

proposição de um novo conceito de organização educacional. A gestão

ressalta-se, não se propõe a depreciar a administração, mas sim a superar

suas limitações de enfoque dicotomizado, simplificado e reduzido, e a

redimensioná-la, no contexto de uma concepção de mundo e de realidade

caracterizado pela visão da sua complexidade e dinamicidade, pela qual

as diferentes dimensões e dinâmicas são utilizadas como forças na

construção da realidade e sua superação, sem precisar reinventar a roda.

Como resultado, a ótica da gestão não prescinde nem elimina a ótica da

administração educacional. Apenas a supera, dando a esta um novo

significado, mais abrangente e de caráter potencialmente transformador.

Daí porque as ações propriamente administrativas continuarem a fazer

parte do trabalho dos dirigentes de organizações de ensino, como,

controle de recursos, de tempo, etc.

O conceito de gestão educacional, diferentemente de administração

educacional, abrange uma série de concepções na abarcadas pelo de

administração. Pode-se citar, dentre outros aspectos: a democratização

do processo de determinação dos destinos dos estabelecimentos de

ensino e seu projeto político-pedagógico; a compreensão da questão

dinâmica e conflitiva das relações interpessoais da organização, o

entendimento dessa organização como uma entidade viva e dinâmica,

demandando uma atuação especial de liderança; o atendimento de que a

mudança dos processos pedagógicos envolve alterações nas relações

sociais de organização; a compreensão de que o avanço das

organizações se assenta muito mais em seus processos sociais, sinergia

e competência, do que sobre insumos ou recursos. Esse conceito

pressupõe, ainda, a consciência de que a realidade da instituição pode sr

mudada sempre e somente na medida que seus participantes tenham

consciência de que são eles que a produzem com seu trabalho a medida

que ajam de acordo com essa consciência (Kosik,1976). O significado de

práxis, embutido nesse pensamento, estabelece a importância de se

dirigir a instituição não impossitivamente, mas, sim, a partir dela mesma,

em sua relação integrada com a comunidade a que deve servir. Isso

porque “o homem, para conhecer as coisas em si, deve primeiro

transformá-las em coisas para si” (Kosik, 1976, p. 18). Essa consciência

sobre gestão, superando à de administração, resultado do movimento

social, associado à democratização das organizações, demanda a

participação ativa de todos que atuam na sociedade para a tomada de

decisão, pelo planejamento participativo, e a capacidade de resposta

urgente aos problemas da existência e da funcionalidade das

organizações.

Alguns aspectos fazem parte da mudança de paradigma de que

falamos e devem ser considerados pelos que compõem a organização, a

fim de que possam dela participar criticamente e contribuir para o seu

desenvolvimento. Esses aspectos não ocorrem, na realidade, de forma

isolada, são intimamente relacionados entre si, na construção de novas e

mais potentes realidades. Devemos superar o enfoque da administração e

construirmos o de gestão mediante alguns avanços, que marcam a

transformação da ótica limitada, anteriormente apontada. O senso comum

é marcado pela ótica limitada da dicotomização que orienta uma visão da

realidade de modo absoluto e isolado. Separamos, por exemplo, “ele” de

“nós”, em que “eles” são os agentes responsáveis pelo que de ruim

acontece e, “nós” somos colocados como vítimas de suas ações, ou

como pessoas que agem de maneira sempre justa e correta. De acordo

com essa ótica, os professores não conseguiriam ensinar eficazmente

quando os alunos não quisessem ou não estivessem preparados para

aprender, o dirigente da instituição de ensino não conseguiria promover

um avanço na qualidade do ensino quando os professores não

colaborassem, a secretária não manteria seu trabalho em dia quando o

dirigente não lhe desse orientação. Estas são, no entanto, muitas das

queixas apresentadas no dia-a-dia de organizações de ensino e sugerem

uma falta de compreensão da interação de ações e de atitudes existentes

no processo social de sua organização. É fundamental a superação dessa

ótica e o relacionamento de que cada um faz parte da organização e do

sistema educacional como um todo, e de que a construção é realizada de

modo interativo entre os vários elementos que constroem em conjunto ma

realidade social. Por isso mesmo, interferem no seu processo de

construção, quer tenham, ou não, consciência desse fato. Caso a

orientação pessoal seja pela ótica de alienação, indicada anteriormente,

essa será reforçada pela própria atuação, construindo um círculo vicioso

auto justificado.

À medida que vigora na escola o entendimento de que ela é uma

criação pronta e acabada de um sistema maior, que determina o seu

funcionamento e sobre o qual seus membros não têm nenhum poder de

influência ou muito pouco, esses membros consideram, da mesma forma,

que pouca ou nenhuma responsabilidade têm sobre a qualidade de seu

próprio trabalho. Esse entendimento está associado à fragmentação do

trabalho geral da escola em papéis, funções e tarefas e respectiva

distribuição de atribuições. Em acordo com essa ótica, os participantes

tendem a delimitar as suas responsabilidades a tarefas burocraticamente

determinadas e de caráter fechado, deixando de ver o todo e de sentir-se

responsáveis por ele, e de contribuir para a sua construção ou

reestruturação. Nesse caso, é possível identificar profissionais altamente

eficientes em seu âmbito de ação, mas totalmente ineficazes como

resultado de sua orientação circunscrita e limitada. É o caso, por exemplo,

de um professor que ensina bem o conteúdo de sua disciplina, mas que

não contribui para a formação de seus alunos; de um diretor de escola,

que cumpre a legislação e zela pelo seu cumprimento, assim como das

determinações burocráticas do sistema, mas que não interfere na

dinâmica dos processos sociais de sua escola. A esse respeito temos

“quando os membros de uma organização concentram-se apenas em sua

função, eles não se sentem responsáveis pelos resultados quando todas

as funções atuam em conjunto” (Senge, 1992, p. 29). Em conseqüência, é

da maior importância, a conscientização da necessidade de redefinição de

responsabilidades e não a redefinição de funções. Aquelas centram-se no

todo, estas, nas partes isoladas.

“Educação é um processo longo e contínuo”. Essa afirmação é um

lugar comum. É preciso, portanto, superar a tendência de agir

episodicamente, de modo centrado em eventos, em casuísmos, que

resultam na construção de rotinas vazias de possibilidades de superação

das dificuldades do cotidiano. É necessário prestar atenção a cada

evento, circunstância e ato, como parte de um conjunto de eventos,

circunstâncias e atos que devem ser orientados para resultados a curto,

médio e longo prazo. Isso porque as menores ações produzem

conseqüências que vão além do horizonte próximo e imediato. “Pense

grande e aja no pequeno” é a afirmação de Amir Klink (1993), navegador

solitário de grande sucesso que, para obter sucesso em seus

empreendimentos ousados e corajosos, valoriza cada pequeno detalhe em

seu potencial de contribuir para ou prejudicar a realização de sua meta

maior. A crescente complexidade do trabalho pedagógico levou à

instituição de funções diferençadas no sistema de ensino e na escola,

atribuídas a profissionais diversos. No entanto, nem sempre os membros

da organização educacional estiveram preparados para essas formas mais

complexas de ação e passaram a simplificá-las e a esteriotipá-las,

burocratizando-as e estabelecendo, desnecessariamente, hierarquias e

segmentações inadequadas. Assim, o que poderia ter correspondido a um

avanço na educação, promoveu um dispêndio de recursos e de energia,

sem resultados positivos e operacionais paralelos. O exagero da

burocracia e da hierarquia teve como conseqüência, no dia-a-dia das

unidades de ensino, situações como ouvir-se: “vamos fazer, porque a

diretora disse!”; de ver-se uma secretária escolar não sair da secretaria,

ouse o faz, dar atendimento a um aluno de má vontade, porque essa não é

a sua função. A superação da visão burocrática e hierarquizadora de

funções e posições, evoluindo para uma ação coordenada, passa,

necessariamente, pelo desenvolvimento e aperfeiçoamento da totalidade

dos membros do estabelecimento, na compreensão da complexidade do

trabalho educacional e percepção da importância da contribuição

individual e da organização coletiva.

A complexidade do processo do ensino depende, para seu

desenvolvimento e aperfeiçoamento, de ação coletiva, de espírito de

equipe, sendo este o grande desafio da gestão educacional. A prática

individualizada e mais ainda a individualista e competitiva empregadas em

nome da defesa de áreas e territórios específicos, muitas vezes

expressada de forma camuflada e sutil, devem ser superada

gradativamente em nome de uma ação coletiva pela qual, no final, todos

saiam ganhando, aprimorando-se no exercício da democracia ativa e da

socialização como forma de desenvolvimento individual. A

descentralização dos processos de direção e tomadas de decisões em

educação, a democratização dos processos de gestão da escola,

estabelecidos na Constituição Nacional, e a conseqüente construção da

autonomia da escola demandam o desenvolvimento do espírito de equipe

e a noção de gestão compartilhada nas instituições de ensino, em todos

os níveis. A própria concepção de gestão educacional como um processo

de mobilização do talento e da energia humana necessários para a

realização dos objetivos de promover nas instituições educacionais

experiências positivas e promissoras de formação de seus jovens alunos

demanda a realização de trabalho conjunto e integrado. Por outro lado, é

importante considerar que a sinergia de um grupo em instituições

educacionais constitui-se em forte elemento cultural que, por si mesmo

educada e forma os seus alunos.

Mais importante que mudar o termo é mudar a concepção

subjacente ao rótulo utilizado. Cabe-nos ressaltar, portanto, que, com a

denominação de gestão, o que se preconiza é uma nova ótica de direção,

voltada para a transformação das instituições e de seus processos, como

meio para a melhoria das condições de funcionamento do sistema de

ensino e de suas instituições. Não se pretende, no entanto, fazer tabula

rasa e sugerir que muitos cuidados enfatizados pela prática da

administração seriam totalmente inúteis. É importante lembrar que apenas

mudar denominações, em si, nada significa. É necessário que a nova

forma de representação denote originalidade e efetiva atuação. Mas, negar

ou menosprezar tudo o que a ótica anterior demonstra, corresponderia a

negar uma dimensão básica da realidade, uma vez que uma nova ótica é

sempre desenvolvida para superar a anterior, mantendo por base os seus

princípios, para determinar o progresso e a evolução.

CONCLUSÃO

A Constituição Federal estabelece o dever partilhado da família, da

sociedade e do Estado – o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, lei

Federal nº 8069/90). Também inclui a comunidade em assegurar o direito à

educação, inclusive, portanto, à educação escolar, a todas as crianças e

adolescentes. O cumprimento desse dever implica uma maior

responsabilidade dos profissionais da educação em assegurar a

qualidade do ensino público, princípio constitucional, integrando a família

e a comunidade (relações sociais do entorno da escola) nesse processo.

A Gestão Democrática da escola pública é também um princípio

garantido pela legislação recente desde 1988, com a promulgação da

Constituição Federal e, significa, mais do que um direito da família e

comunidade de participarem dos processos de gestão, um novo desenho

para a organização da escola, um caminho que permite o cumprimento

daquele dever. Fica claro que esse caminho deve ser trilhado e

descoberto por cada escola. A partilha do dever da família, da

comunidade, da sociedade e do Estado (e aqui incluem-se os

profissionais da educação, investidos de sua função pública), implica uma

partilha de poder no interior da instituição escolar. Por isso, é

fundamental a definição dos papéis de cada participante nesse processo,

como já afirmamos. A partilha de dever/poder indica, então, a ampliação

do papel da família. É dever dos pais ou responsáveis, implícito na relação

família-escola, independentemente de qualquer legislação, acompanhar a

vida escolar de seus filhos. Contudo, a participação da família na vida

escolar de seus filhos, ajudando a construir o projeto político-pedagógico

e trazendo seus saberes para dentro da escola, extrapola o papel que

tradicionalmente lhe é imposto; torna-se direito, visando ao cumprimento

de um dever. Cabe à família e à comunidade definir suas atribuições como

partícipes da gestão escolar, mas, sobretudo, compete aos diretores, aos

outros técnicos e aos professores orientá-los e estimulá-los, assumindo

seu papel como profissionais comprometidos com a educação de seus

alunos, com a autoridade que esse papel lhes instrui.

A implementação da Gestão Democrática não se faz pela simples

instalação do Conselho de Escola, com assento assegurado a todos os

participantes (inclusive alunos a partir de determinada idade). Como já

vimos, a escola é um conjunto de relações sociais específicas que a

constituem, perpassadas por relações sociais mais gerais. Elas vêm

carregadas de todas as contradições da sociedade, como também, no

modo como essa sociedade se organiza. A democracia é um princípio de

difícil realização, pois ainda não penetrou no modo de viver da imensa

maioria das pessoas, inclusive daquelas que fazem a escola e, portanto, a

organização das instituições sociais. É necessário, para definir a

participação de cada um na gestão escolar, identificar quem são essas

famílias e essas comunidades, quais os saberes que trazem e o que

significam esses saberes. Percebemos, assim, que o trabalho pedagógico

realizado pelo diretor, supervisores, orientadores e, principalmente,

professores cresce e, ao mesmo tempo que extrapola a sala de aula (e os

muros da escola), define-se nela. Se esse trabalho não for prioridade e

não se qualificar, a Gestão Democrática, além de não ter razão de existir,

não se realiza, pois só tem sentido quando temos em vista a mudança da

função social que tem se atribuído à escola. Além disso, trazer os saberes

do aluno, família e comunidade para dentro da escola proporciona novos

conhecimentos quanto à gestão escolar, haja vista que, muitas vezes, a

própria comunidade já possui instâncias organizadas de proposição e/ou

deliberação que podem auxiliar a escola a definir e implementar seu

Conselho Escolar. Em contrapartida, a escola, fortalecendo-se como

instituição social democrática, também exerce uma ação pedagógica junto

à comunidade. Enfim, a Gestão Democrática significa a conquista da

autonomia por parte do aluno, da família e da comunidade. Trazer a

cultura local para o interior da escola significa transformar os saberes da

comunidade em conteúdo de trabalho para o professor. O saber da

comunidade não deve entrar na escola apenas como “folclore”, isto é,

como um saber secundário que deve ser conhecido, cultuado e,

imediatamente, superado pelo chamado “saber científico”.

Para que a Gestão Democrática se realize é necessário que todos os

profissionais que dela fazem parte, não apenas os professores assumam

uma postura investigativa em seu trabalho, criando instrumentos que

possam auxiliá-los a identificar e reconhecer esses saberes. Assim, os

saberes da comunidade devem entrar na escola cotidianamente, não

somente por meio de atividades culturais, festas, reuniões. A escola,

sendo espaço de difusão e sistematização de conhecimentos, deve

privilegiar o desenvolvimento das práticas pedagógicas como a pesquisa,

a criação e recriação de metodologias, o registro diário das ações (tanto a

dos profissionais da educação, quanto à produção dos educandos da

comunidade, por meio da realização de cursos, seminários, encontros,

oficinas pedagógicas). Toda essa produção, ao ser trazida para a sala de

aula, possibilita a apropriação de linguagens que permitam a

ressignificação das coisas, dos lugares, das pessoas, enfim de uma nova

relação social.

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ANEXO I