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UESC
Universidade Estadual de Santa Cruz Programa Regional de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente
Mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente
REVELANDO A MARAMBAIA: UMA PRÁTICA PARTICIPATIVA DE EDUCAÇÃO
AMBIENTAL COM PEQUENOS PRODUTORES RURAIS NA APA COSTA DE ITACARÉ – SERRA GRANDE
JÚLIA MARIA SANTANA SALOMÃO
ILHÉUS, BAHIA
2001
JÚLIA MARIA SANTANA SALOMÃO
REVELANDO A MARAMBAIA: UMA PRÁTICA PARTICIPATIVA DE EDUCAÇÃO
AMBIENTAL COM PEQUENOS PRODUTORES RURAIS NA APA COSTA DE ITACARÉ – SERRA GRANDE
Dissertação apresentada ao Programa Regional de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Sub-programa Universidade Estadual de Santa Cruz, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente. Sub-área de concentração: Planejamento e Gestão Ambiental no Trópico Úmido
Orientadora: Profa. Dra. Denise César Homem d'El-Rey
ILHÉUS, BAHIA 2001
MAPA 3 - ASSENTAMENTO MARAMBAIA: ZONEAMENTO CONFORME O PLANO DE MANEJO DA APA
QUADRO 5 - IDENTIFICAÇÃO DE PROBLEMAS PELA COMUNIDADE DO ASSENTAMENTO MARAMBAIA PROBLEMAS CAUSAS SOLUÇÕES RESPONSÁVEIS Débito com o BNB
- Empréstimo para a plantação do coco
- Anistia do débito pelo INCRA; - Elaboração de Laudo Técnico para subsidiar a solicitação da Associação dos Parceleiros de Anistia do débito.
Associação dos Parceleiros da Marambaia; INCRA; BNB; CEPLAC; EBDA; COOTEBA/LUMIAR; EMBRAPA; UESC
Falta de Incentivo Agrícola para a sobrevivência da comunidade
- Ausência de um projeto de desenvolvimento para os pequenos produtores rurais - Ausência de assistência técnica - Falta de insumos agrícolas (adubo, sementes) - Falta de equipamentos agrícolas (arado, trator)
- Elaboração de projetos de cultivos agrícolas além da plantação de mandioca (feijão, pupunha, milho, amendoim, soja) - Produção de adubo orgânico - Criatório de animais de pequeno porte (peixe, galinha, codorna, porco, etc) -Hortas comunitárias e individuais - Eletrificação Rural - Ampliação do Viveiro de Mudas de espécies nativas, ornamentais e medicinais - Irrigação - Ecoturismo
Associação dos Parceleiros da Maramabaia; UESC; Grupos Ambientalistas (a exemplo do Jupará); IESB; CEPLAC; COELBA; BAHIAPESCA; BAHIATURSA/SUDETUR
Lixo - Destinação final do lixo da cidade de Itacaré (lixão a céu aberto) em lotes de parceleiros da Maramabaia pela Prefeitura Municipal.
- Contatar a Prefeitura para a suspensão da atividade - Elaboração de projetos de reaproveitamento de cascas de frutas, verduras, restos de alimentos para a compostagem e aplicação nas roças; fabricação de adubo orgânico e alimentação alternativa - Limpeza em forma de mutirão da área comunitária do assentamento e esclarecimento da disposição do lixo nos lotes dos parceleiros
Associação dos Parceleiros da Marambaia; Prefeitura Municipal de Itacaré; CEPLAC – EMARC; Grupos Ambientalistas; IESB/Programa de Educação Ambiental e Ecoturismo CRA; Voluntários
Falta de Incentivo à cultura local
- Falta de recursos financeiros - Falta de Instalações Físicas
- Construção de um espaço para funcionamento da Oficina Artesanal; - Definição de um Ponto de Comercialização dos produtos produzidos na Maramabaia (vassoura, xaxim com casca de coco, doces caseiros, farinha, beiju, artesanto de conchas e de casca de coco, etc)
Associação dos Parceleiros da Marambaia; CONTUR – Conselho de Turismo de Itacaré; CAR; BNB; Prefeitura Municipal; IESB
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1. INTRODUÇÃO
Esta dissertação apresenta os desafios enfrentados na luta pela sobrevivência por uma
comunidade rural – Assentamento de Reforma Agrária “Marambaia”, inserida na Área de
Proteção Ambiental – APA Costa de Itacaré-Serra Grande, no Estado da Bahia, cujo sistema
de trabalho predominante é a agricultura de subsistência familiar.
A pesquisa teve a intenção de compreender como os pequenos produtores rurais
(assentados) da Marambaia se relacionam com o meio ambiente, como percebem as
condições de uma Unidade de Conservação (APA) em seu ambiente de vida e de orientar a
busca de soluções para a melhoria da sua qualidade de vida.
O interesse pelo tema surgiu da experiência como socióloga, no exercício da prática
profissional no Centro de Recursos Ambientais – CRA, cujas funções são desenvolvidas na
APA Costa de Itacaré – Serra Grande, voltadas principalmente para ações de Educação
Ambiental, envolvendo diversos segmentos sociais na área de abrangência da APA. Das
preocupações surgidas sobre a necessidade de estimular a participação e mobilização das
comunidades para uma efetiva gestão participativa, consideramos relevante a realização de
uma pesquisa junto a um grupo localizado na APA, tendo como estudo de caso um
Assentamento de Reforma Agrária, situado próximo à cidade de Itacaré e que se insere na
referida APA.
Para tanto, optou-se pela adoção da pesquisa-ação, entendida como uma estratégia
metodológica da pesquisa social, pois, além da participação dos pesquisadores, condição
fundamental de investigação, quando os “pesquisadores não querem limitar suas
investigações aos aspectos acadêmicos e burocráticos da maioria das pesquisas
convencionais”, conforme colocado por THIOLLENT, 1995, buscou-se não apenas uma
intervenção conjunta na área, através de levantamento de dados, ou de relatórios destinados a
arquivo, mas, de uma relação de diálogo entre o pesquisador (saber científico) e os
pesquisados (saber popular) em todo processo da produção de um novo conhecimento, a
partir da prática coletiva e da aproximação da teoria e a prática.
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Consideramos que a pesquisa-ação se constitui, também, em uma das estratégias de
Educação Ambiental nos assentamentos de reforma agrária, pois, consiste em gerar na
comunidade um processo de auto-diagnóstico e de auto-transformação, com vistas não
somente a conscientização dos seus problemas, e do conhecimento de suas causas, mas do
levantamento de propostas e soluções para as necessárias mudanças.
Na aplicação desta metodologia de pesquisa-ação, a pesquisadora e os pesquisados
(assentados) exercem relevante papel enquanto seres ativos e participantes no processo de
mudança de percepção e na atitude dos assentados perante seus problemas ambientais, que de
certa forma influenciam nas suas condições de sobrevivência.
Por outro lado, a opção pela abordagem participativa permitirá o aumento de poder da
comunidade, uma espécie de empoderamento, através de um trabalho coletivo que se
constitui em grande parte das iniciativas, objetivos e interesses definidos pelos sujeitos
envolvidos no processo, bem como da sua competência e de reconhecimento, com direito à
voz, pelos representantes do poder no processo de tomada de decisões em relação às políticas
públicas relacionadas à conservação ambiental.
Através do aprendizado da relação entre o saber científico e o conhecimento empírico
que a pesquisa-ação estabelece, tornam-se capazes de não apenas discernir os reais objetivos
locais daqueles derivados da “falsa consciência” dos problemas e das suas soluções, como
também relacioná-los com os objetivos globais.
A presente pesquisa reflete a articulação entre o aprofundamento teórico adquirido
durante todo o curso de mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente e as
experiências práticas vivenciadas junto à comunidade rural da Marambaia.
Os objetivos propostos no Projeto de Dissertação foram: a) identificar o entendimento
dos sujeitos (pequenos produtores rurais) quanto ao seu papel na relação homem-natureza,
voltado para a minimização do processo de degradação dos recursos naturais no
Assentamento Marambaia; b) co-diagnosticar ambiente de vida in situ; c) definir ações
relacionadas aos problemas ambientais de sua comunidade que suscitem transformação; d)
compartilhar abordagens metodológicas participativas com os pequenos produtores rurais do
assentamento Marambaia, potencializando o saber popular e sua capacidade de ação, com
3
vistas ao desenvolvimento de atividades alternativas e sustentáveis para a melhoria do seu
ambiente de vida; e) perceber o impacto do processo educativo nas mudanças de
compreensão dos problemas socio ambientais.
Para alcançar os objetivos pretendidos, elaboramos algumas questões que nortearam a
prática de Educação Ambiental na comunidade, quais sejam:
• Quais os aspectos sociais, econômicos e culturais da comunidade relacionados ao
ambiente de vida local?
• Como buscar soluções para a problemática do ambiente de vida tão dinâmica e
complexa aparentemente distanciada do cotidiano das pessoas?
• Como facilitar a percepção da situação de degradação da qualidade de vida e
possíveis alternativas de interações harmônicas entre a ação humana e o ambiente
vivido?
• Como conciliar a conservação dos recursos naturais e o desenvolvimento de
alternativas sustentáveis que garantam a geração de renda aos pequenos produtores
rurais do assentamento Marambaia?
• De que formas pode ser estimulada a participação e mobilização da comunidade em
torno da melhoria socio ambiental?
• De que forma a Educação Ambiental se constitui uma estratégia para viabilizar o
desenvolvimento sustentável nos assentamentos de reforma agrária?
Estas indagações são respondidas ao longo de todo o trabalho desenvolvido,
especialmente nos Capítulos “Conhecendo a Marambaia” e “Enfrentando dificuldades e
conquistando sonhos: uma prática participativa com pequenos produtores rurais".
Em que pese os requisitos de tempo exigidos pela metodologia de pesquisa-ação
escolhida, a viabilidade de se atingir os objetivos e as questões formuladas foi garantida pela
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dedicação integral ao trabalho, durante oito meses de convívio intenso, investigando,
observando, agindo e participando do cotidiano da comunidade.
Esta dissertação compreende cinco capítulos. O primeiro capítulo diz respeito aos
desafios para o desenvolvimento sustentável na agricultura de pequenos produtores rurais, a
partir: de uma análise de pontos polêmicos explicitados por alguns autores sobre
Ecodesenvolvimento e Desenvolvimento Sustentável; da relação Meio Ambiente e Reforma
Agrária, envolvendo correlações de força entre as atuais condições de vida dos assentados e a
necessidade do exercício da cidadania na luta pela melhoria da qualidade de vida, no
cotidiano de um assentamento rural.
O segundo capítulo aborda as bases filosóficas e teóricas da Educação Ambiental,
desde o histórico da trajetória da Educação Ambiental no mundo ao seu desdobramento no
Brasil; o papel dos movimentos sociais rurais e dos movimentos ambientalistas na busca pela
cidadania e pelo direito à vida; a importância da Educação Ambiental como instrumento de
cidadania; e a metodologia da pesquisa-ação como uma estratégia de educação ambiental nos
assentamentos de reforma agrária.
O terceiro capítulo refere-se à caracterização do ambiente de vida da Marambaia,
considerando que o conhecimento do ambiente natural e do ambiente construído do
assentamento Marambaia, bem como da sua inserção no Zoneamento Econômico e Ecológico
da APA, como sendo de fundamental importância para o contexto da investigação. Encerra a
visualização dos possíveis impactos sobre os modos de vida local e a necessidade de
envolvimento e incorporação do saber popular nos Planos de Manejo e na Gestão da APA,
como condição essencial para que este tipo de planejamento transforme-se em um real
instrumento de gestão do espaço e dos recursos naturais.
O quarto capítulo compreende a aplicação da metodologia utilizada, ou seja, a
pesquisa-ação, apresentando a prática participativa desenvolvida com os pequenos produtores
rurais da Marambaia, tendo como eixo a reflexão-ação entre os sujeitos envolvidos na
problemática em questão. A opção pela metodologia participativa está pautada em trabalho
específico para camadas populares, desenvolvido pelo Grupo de Estudos em Educação
Ambiental (GEA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, explicitado no artigo
“Uma Proposta Metodológica para Pesquisa em Educação Ambiental”, de ANDRADE e
5
LOUREIRO e HOMEM d´El REY, 1993. O trabalho para fins de sistematização das
informações e organização do conhecimento apresenta uma organização básica para uma
ação prática e de pesquisa, adaptadas para a execução desta investigação A proposta
metodológica compreendeu seis fases que se interligam, estando muito mais vinculadas ao
próprio enfoque do que à cronologia, conforme comprovado por ANDRADE, 1993, em sua
pesquisa de Dissertação de Mestrado. A metodologia proposta deve ser entendida não como
uma seqüência rígida de procedimentos, mas como uma prática social. A prática social
vivenciada pelos sujeitos (pesquisadora e pesquisados), possibilitou mudanças nas
percepções dos parceleiros sobre os problemas socio ambientais da comunidade e na
necessidade do fortalecimento das ações comunitárias para a busca de alternativas
sustentáveis de transformação da realidade. As ações desenvolvidas foram consideradas
operacionalmente adequadas e viáveis, contribuindo para a conscientização, mobilização e
organização da comunidade, no sentido da melhoria do seu ambiente de vida. A aplicação da
Educação Ambiental conforme os pressupostos estabelecidos constitui um grande desafio.
Porém, enfrentando as dificuldades e conquistando sonhos, foi possível concretizar a prática
participativa com os pequenos produtores rurais da Marambaia, contribuindo, assim, para o
processo de construção da cidadania.
O quinto capítulo aborda as considerações finais da investigação, versando sobre uma
síntese dos principais aspectos identificados durante toda a trajetória desse estudo, que se
constituem em pontos de partida para a elaboração de projetos voltados para a agroecologia,
o turismo rural e ecológico, dentre outros, visando o planejamento integrado de
desenvolvimento sustentável na comunidade. Os resultados desta investigação apontam
diversos elementos que devem ser levados em consideração para se garantir uma proposta de
Educação Ambiental, através da prática participativa nos assentamentos de reforma agrária e
que, favorecendo a construção da cidadania, contribuam para a transformação do ambiente de
vida das comunidades rurais.
No conjunto, as abordagens resultam em uma contribuição para o conhecimento e a
prática de Educação Ambiental, aqui representados pelos pequenos produtores rurais do
Assentamento Marambaia, servindo como experiência para outros estudos e trabalhos de
caráter educativo e participativo. Como optou-se por uma vertente de trabalho mais baseada
numa vivência prática do que em questões teóricas, talvez haja uma lacuna a ser superada
para um maior aprofundamento de integração entre a teoria e a prática.
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Finalmente, esta dissertação apresenta-se não como um produto acabado, mas como
um ponto de partida ao debate e às discussões em torno da luta pela sobrevivência enfrentada
pelas comunidades rurais no seu ambiente de vida, onde a questão da sustentabilidade
ambiental x reforma agrária remete ao fato de que a participação dos pequenos produtores
rurais na conservação ambiental, nestes novos tempos, não deve se restringir à proibição de
desmatamento e de uso inadequado do solo, mas, sobretudo, à orientação e mobilização
coletiva para o uso de alternativas de manejo sustentável e de produção e renda, no sentido de
minimizar as pressões sociais sobre o uso dos recursos naturais e garantir a melhoria do seu
ambiente de vida.
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CAPÍTULO 1. DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA
AGRICULTURA DE PEQUENOS PRODUTORES RURAIS
“Reconectar-se com a teia da vida significa
construir, nutrir e educar comunidades
sustentáveis, nas quais podemos satisfazer
nossas aspirações e nossas necessidades sem
diminuir as chances das gerações futuras”.
F. Capra (1997)
A visão que tem acompanhado o homem ao longo do tempo é de que a natureza é
sempre pródiga e duradoura e que os recursos naturais são infinitos. Assim, ao longo do seu
processo histórico e civilizatório o homem vem cada vez mais vivendo num ambiente de vida
degradado e exaurido.
Com o objetivo de gerar riquezas, vem transformando florestas em campos
improdutivos, formando verdadeiros desertos, poluindo e degradando os recursos hídricos e
costeiros, extinguindo centenas de espécies animais e vegetais, destruindo e modificando o
ambiente, muitas vezes de forma irreversível.
Esta visão tem contribuído para que se perca a noção de harmonia e o olhar do ser
humano não é de ver a natureza como parte integrante de sua sobrevivência e evolução.
A análise da depredação e conservação dos recursos naturais requer a conjugação de
diversos “olhares” sobre a problemática ambiental, que nos dará a visão de conjunto, a visão
sistêmica da nossa realidade.
DUBOS, 1972, nos alerta para a necessidade da interrelação entre as ciências
ambientais e sociais, quando diz:
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“Tanto para as ciências relativas ao meio Ambiente quanto para as ciências sociais é imperiosa a necessidade de desenvolver métodos para o estudo de sistemas dinâmicos, porque os padrões das reações biológicas e psíquicas do homem se modificam tão rapidamente quanto os padrões sociais. Os sistemas ambientais não se desenvolvem ou funcionam no vácuo social. Podem atingir seus objetivos – melhorar a saúde e proporcionar felicidade – somente se forem adequados às necessidades e aos recursos da comunidade, bem como às condições especiais criadas pelo Meio Ambiente como um todo”.
A necessidade de interferir nestas relações torna-se explícita a partir do momento em
que se percebe que as transformações a partir da ação do homem sobre a natureza implicam
em prejuízos não só ao meio ambiente, mas, sobretudo ao ser humano.
1.1. ECODESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
A relação entre desenvolvimento e meio ambiente constitui-se numa preocupação em
nível mundial. Exemplo disso é o documento intitulado “Nosso Futuro Comum”, 1988,
elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, da Organização
das Nações Unidas – ONU, que propõe novas estratégias para a conservação do meio
ambiente e para o desenvolvimento. O documento aponta para a necessidade do
Desenvolvimento Sustentável, promovendo um processo de mudanças políticas na
exploração dos recursos naturais, na direção dos investimentos, na orientação do progresso
tecnológico e na modificação das instituições para adequá-las às necessidades presentes e
futuras.
Por outro lado, assinala que os órgãos econômicos devem ser responsáveis por suas
ações, zelar pelo meio ambiente afetado por suas decisões e fazer frente aos efeitos de um
desenvolvimento equivocado. Assinala, ainda, que a ineficiente ação administrativa no trato
da questão ambiental, está propiciando o surgimento de uma série de acontecimentos que
nada mais são do que a resposta da natureza a tantos desmandos cometidos ao ambiente, a
partir, sobretudo, da Revolução Industrial.
A definição das bases de sustentação de um possível estilo de desenvolvimento que
garanta a conservação do meio ambiente e a melhoria da qualidade de vida, vem sendo
discutida há alguns anos, tendo como marco o ano de 1972, a partir da I Conferência das
Nações Unidas sobre o Ambiente Humano. Nesta Conferência, os 113 países participantes se
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comprometeram a implementar ações de controle ambiental e de conscientização da
população, visando a melhoria da qualidade ambiental e da vida humana.
Após 20 anos, em 1992, realizou-se a II Conferência Mundial sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, quando se reafirmou o conceito de desenvolvimento sustentável, definido
pelo Relatório Brundtand como:
“Aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades”.
O conceito de desenvolvimento sustentável se faz presente em todos os fóruns de
debates, documentos oficiais e publicações científicas, termo este que foi legitimado e
absorvido pela comunidade ambientalista após a Conferência da Rio-92. Porém julga-se que
houve uma evolução do conceito do Ecodesenvolvimento para o Desenvolvimento
Sustentável e que, portanto, as duas expressões poderiam ser consideradas e utilizadas como
sinônimos.
LAYRARGUES, 1977, contesta esta afirmativa e procura desmistificar o debate sobre
os estilos de desenvolvimento promovendo uma análise comparativa entre os princípios do
Ecodesenvolvimento e o do Desenvolvimento Sustentável, onde se percebe as diferenças
entre ambas.
Segundo o autor, o conceito de Ecodesenvolvimento, lançado por Maurice Strong em
junho de 1973, consistia na definição de um estilo de desenvolvimento adaptado às áreas
rurais do Terceiro Mundo, baseado na utilização criteriosa dos recursos locais, sem
comprometer o esgotamento da natureza, pois nestes locais ainda havia a possibilidade de tais
sociedades não se engajarem na ilusão do crescimento mimético (imitação do
desenvolvimento Norte-americano).
Na década de 80, o economista Ignacy Sachs citado por LEYRARGUES, 1997,
apropriando-se do termo Ecodesenvolvimento, o desenvolve conceitualmente, criando um
quadro de estratégias para o ecodesenvolvimento, partindo da premissa de que este modelo se
baseia em três princípios: eficiência econômica, justiça social e prudência ecológica. O
conceito de Ecodesenvolvimento “a satisfação das necessidades futuras” deve ser garantida,
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isto é, deve haver uma solidariedade diacrônica sem que, no entanto, se comprometa a
solidariedade sincrônica (que ocorre ao mesmo tempo) com a geração presente, já por demais
sacrificada pelas disparidades sociais da atualidade.
Para tornar este conceito operacional, destaca a necessidade de:
• Amplo conhecimento das culturas e dos ecossistemas, sobretudo em como as pessoas
se relacionam com o ambiente e como elas enfrentam seus dilemas cotidianos;
• Envolvimento dos cidadãos no planejamento das estratégias, pois eles são os maiores
conhecedores da realidade local.
Esclarece Sachs, In: LAYRARGUES, 1997, que o “ecodesenvolvimento é um estilo de
desenvolvimento que, em cada ecoregião, insiste nas soluções específicas de seus problemas
particulares, levando em conta os dados ecológicos, da mesma forma que os culturais, as
necessidades imediatas como também aquelas a longo prazo... Em vez de atribuir um espaço
excessivo à ajuda externa, dá um voto de confiança à capacidade das sociedades humanas
de identificar os seus problemas e de lhes dar soluções originais, ainda que se inspirando em
experiências alheias”. (p. 7)
Seguindo o raciocínio de Sachs, o autor acima citado, diz que devemos, então, para
implementar uma estratégia de desenvolvimento comprometida com a prudência ecológica e
justiça social “impor-nos voluntariamente um teto do consumo material, procurando
gratificação em esferas não-materiais da nossa vida e desse enfatizando a dimensão cultural
da natureza humana, ou ficaremos presos na corrida acelerada da aquisição de um número
cada vez maior de bens”. (p. 8)
Com relação ao conceito de Desenvolvimento Sustentável, o autor apresenta um relato
histórico, onde assinala que a Assembléia Geral da ONU, de 1983, criou a Comissão Mundial
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, presidida por Gro Harlem Brundtland, cujo
relatório intitulado Nosso Futuro Comum tinha como objetivo:
• Propor estratégias ambientais de longo prazo para se obter um desenvolvimento
sustentável por volta do ano 2000 e daí em diante;
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• recomendar maneiras para que as preocupações com o meio ambiente se traduza em
maior cooperação entre os países em desenvolvimento e entre países em estágios
diferentes de desenvolvimento econômico e social e leve à consecução de objetivos
comuns e interligados que considerem as inter-relações de pessoas, recursos, meio
ambiente e desenvolvimento.
A premissa básica definida pela Comissão Brundtland é de que, independente da
existência de atores sociais implicados na responsabilidade da degradação ambiental, a busca
de soluções seria uma tarefa comum à toda humanidade; ou seja, a partir da já consolidada
constatação de que o planeta é um só e finito, existiriam preocupações e desafios comuns à
humanidade, que demandariam esforços também comuns a todos.
O autor afirma que “na tentativa de generalizar os fatos, esta premissa omite um
contexto histórico e cria o ‘homem abstrato’. Em consequência, retira o componente
ideológico da questão ambiental, que passa a ser considerada com uma certa dose de
ingenuidade e descompromissso, frente à falta de visibilidade do procedimento histórico que
gerou a crise ambiental. (LAYRARGUES, 1997)
O destaque do Relatório é sem dúvida a elaboração de um novo conceito. O autor
considera que “O conceito de desenvolvimento sustentável tem, é claro, limites – não limites
absolutos, mas limitações impostas pelo estágio atual da tecnologia e da organização social,
no tocante aos recursos ambientais, e pela capacidade da biosfera de absorver os efeitos da
atividade humana”.
Para a Comissão Mundial, a pobreza generalizada já não é inevitável. A pobreza não é
apenas um mal em si mesma, mas para haver um desenvolvimento sustentável é preciso
atender às necessidades básicas de todos e dar a todos a oportunidade de realizar suas
aspirações de uma vida melhor.
O Relatório Brundtland dá uma ênfase especial às conseqüências da pobreza sobre o meio
ambiente, quando afirma:
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“a pobreza é uma das principais causas e um dos principais efeitos dos problemas ambientais no mundo. Portanto, é inútil tentar abordar esses problemas sem uma perspectiva mais ampla, que englobe os fatores subjacentes à pobreza mundial e à desigualdade internacional”.
Tal idéia é rebatida por LAYRARGUES, 1997, ao considerar que a partir dessa
posição ocorre uma “intensa propaganda em torno do círculo vicioso da pobreza, com o
propósito de justificar a necessidade da continuidade do crescimento econômico e omitir o
peso da responsabilidade ambiental do consumo excessivo do Norte, a poluição da riqueza”.
Além disso, o autor verifica que esta idéia sugere a crença de que o crescimento
econômico pode continuar indefinidamente no mesmo ritmo, desde que ocorram mudanças
tecnológicas no sentido de tornar, sobretudo os insumos energéticos mais econômicos e
eficientes.
No entanto, diz o autor, que “por mais que as tecnologias modernas se adequem a
esta premissa, permanece a dúvida da possibilidade em ocorrer mudanças sociais e culturais
que acompanhem voluntariamente estas transformações, uma vez que uma das
características da sociedade industrial de consumo é justamente o desperdício”. (op. cit.).
Prosseguindo nas diferenças conceituais e ideológicas entre os dois conceitos, o autor,
diz:
• “Enquanto o Ecodesenvolvimento postula com relação à justiça social que seria necessário estabelecer um teto de consumo, com um nivelamento médio entre o Primeiro e o Terceiro Mundo, o Desenvolvimento Sustentável afirma que seria necessário estabelecer um piso de consumo, omitindo o peso da responsabilidade da poluição da riqueza.
• Enquanto o Ecodesenvolvimento reforça o perigo da crença ilimitada na tecnologia moderna e prioriza a criação de tecnologias endógenas, o Desenvolvimento Sustentável continua acreditando firmemente no potencial da tecnologia moderna e ainda propõe a transferência de tecnologia como critério de “ajuda” ao Terceiro Mundo.
• Enquanto o Ecodesenvolvimento coloca limites à livre atuação do mercado, o Desenvolvimento Sustentável afirma que a solução da crise ambiental virá com a instalação do mercado local na economia das sociedades modernas”. (p. 10)
O autor, após definir as principais diferenças entre os conceitos diz que “o
desenvolvimento sustentável assume claramente a postura de um projeto ecológico
13
neoliberal, que sob o signo da reforma, produz a ilusão de vivermos um tempo de mudanças,
na aparente certeza de se tratar de um processo gradual que desembocará na
sustentabilidade sócio-ambiental”. (LAYRARGUES, 1997)
Reservadas as diferenças ideológicas e conceituais existentes entre o conceito de
Ecodesenvolvimento e Desenvolvimento Sustentável, para efeito desta pesquisa utilizaremos
o termo “Desenvolvimento Sustentável”, pois compreendemos que este vem sendo
popularizado a partir, sobretudo, da Rio-92, ganhando espaço nas discussões, debates e
estudos promovidos pelos diversos setores sociais.
Como diz SACHS, 2000, “Quer seja denominado ecodesenvolvimento ou
desenvolvimento sustentável, a abordagem fundamentada na harmonização de objetivos
sociais, ambientais e econômicos não se alterou desde o encontro de Estocolmo até as
conferências do Rio de Janeiro, e acredito que ainda é válida, na recomendação dos oito
critérios distintos de sustentabilidade parcial. (p. 54)
Os oito critérios de sustentabilidade citado por SACHS, 2000 são: Critério social, Critério
Cultural, Critério Ecológico, Critério Ambiental, Critério Econômico, Critério de Política
Nacional e Critério de Política Internacional.
O desafio do “Desenvolvimento Sustentável” nos países do “Terceiro Mundo” é uma
preocupação que está expressa no Relatório da Comissão de Desenvolvimento e Meio
Ambiente da América Latina e Caribe, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento – PNUD e o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, com a
colaboração da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe – CEPAL e do
programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA. O Relatório intitulado
“Nossa Própria Agenda”, 1990, enfatiza que:
“Em países como os nossos, onde a pobreza está estruturalmente ligada à escassez, um aspecto fundamental do desenvolvimento sustentável é a satisfação das necessidades básicas da população, sobretudo dos grupos de baixa renda. Ao contrário do que ocorre nas nações ricas, em nosso caso é conveniente, do ponto de vista ambiental, dar preferência a certos tipos de consumo. A satisfação das necessidades básicas, sobretudo alimentares, exige que demos atenção prioritária à formulação de políticas agrícolas que garantam um abastecimento adequado. Outras prioridades essenciais para o desenvolvimento sustentável na região são as políticas relativas à saúde, educação moradia, água potável, esgotos e coleta e eliminação de resíduos”. (p. 115)
14
Alerta, ainda, o Relatório que “tampouco será possível o desenvolvimento sustentável
sem uma verdadeira democracia. Se não conseguirmos desenvolver um tipo de democracia
que possibilite maior participação da sociedade e se não conseguirmos modernizar a
estrutura obsoleta de nossos governos a fim de torná-los mais eficientes, será impossível
remover os entraves ao desenvolvimento viável em termos econômicos, sociais e
ecológicos”. (p. 116)
A Comissão da América Latina e Caribe entende o desenvolvimento sustentável
como:
“um processo de mudança social em que a exploração dos recursos, as opções de investimento, o progresso tecnológico e as reformas institucionais se realizam de maneira coordenada, ampliando as atuais e futuras possibilidades de satisfazer as necessidades e aspirações humanas”.
Para tanto, considera que o grande desafio para o desenvolvimento sustentável é
definir o conceito “de qualidade de vida para nós mesmos, baseado sobretudo em tecnologias
que sejam compatíveis com nossos ecossistemas e condições sócio-culturais, que satisfaçam
as necessidades de nosso povo”. (NOSSA PRÓPRIA AGENDA, 1990).
Em se falando de qualidade de vida e meio ambiente, COIMBRA, 1985, apresenta
uma definição descritiva de qualidade de vida, entendendo que “à medida que o Homem
opera mudanças sobre a Natureza, ele é simultaneamente modificado por ela. Por
conseguinte, cada um dos termos dessa relação tem sua participação peculiar nos
procedimentos de que resultarão os índices de qualidade de vida”. Desse modo, qualidade de
vida para o autor é:
“a somatória de todos os fatores positivos, ou ao menos de parte significativa dos mesmos, que determinado meio reúne para a vida humana em conseqüência da integração Sociedade-Meio Ambiente, e que atinge a vida como fato biológico, de modo a atender às suas necessidades somáticas e psíquicas, assegurando índices adequados ao nível qualitativo da vida que leva e do meio que a envolve”.
A melhoria da qualidade de vida é uma meta a ser alcançada com o desenvolvimento
sustentável e para seu alcance nos países da América Latina e Caribe, a Comissão estabelece
as diretrizes necessárias para a formulação das estratégias, quais sejam:
- erradicação da pobreza
- uso sustentado dos recursos naturais
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- zoneamento agroecológico
- desenvolvimento tecnológico compatível com a realidade social e natural
- uma nova estratégia econômico-social
- organização e mobilização social
- reforma governamental.
Ao propor estas diretrizes, a Comissão para a América Latina e Caribe, reconhece que se
deve atacar simultaneamente todas as faces do problema, isto é, as diretrizes da estratégia são
interrelacionadas e se reforçam mutuamente.
Por exemplo, coloca a Comissão, que “Será extremamente difícil, racionalizar a gestão
dos recursos enquanto a maioria da população continuar vivendo em condições de pobreza
extrema. Por outro lado, para corrigir tal situação será preciso adotar novas estratégias
econômico-sociais que também afetarão a maneira pela qual utilizamos os nossos recursos.
Analogamente, na batalha contra a pobreza teremos de organizar e mobilizar a sociedade para
atingir esta meta. Igualmente importantes será, é claro as reformas para democratizar os
governos”. (NOSSA PRÓPRIA AGENDA, 1990).
Assim, conforme análise da Comissão, enquanto quase metade da população continuar
vivendo em estado de extrema pobreza, não haverá o desenvolvimento sustentável na
América Latina e Caribe. Reconhece que o desenvolvimento humano e a utilização racional
dos recursos naturais se constituem no ponto central da estratégia para a viabilização do
desenvolvimento sustentável. O combate a pobreza como ponto focal deve ser um “legítimo
objetivo nacional tanto do estado quanto para a sociedade de um modo geral”. (op. cit.)
Com relação ao desenvolvimento humano, a estratégia definida para a eliminação da
pobreza está pautada em dois componentes, o econômico e o social.
O componente econômico de combate a pobreza, segundo o Relatório da Comissão,
envolve medidas para que alcance os seguintes objetivos :
• recuperar o crescimento econômico.
16
• priorizar e reestruturar os recursos e atividades no interesses dos pobres e proteger as necessidades básicas dos grupos economicamente vulneráveis em benefício do crescimento econômico.
• reestruturar o setor produtivo para ajudar a gerar a renda e emprego e a aumentar a produção de pequena escala, sobretudo dos pequenos agricultores e empresários engajados em atividades industriais e de serviços no setor informal,
• aumentar a equidade e a eficiência da estrutura social reformulando os gastos públicos, a fim de dar prioridade aos serviços básicos que custam pouco e têm forte efeito multiplicador”. (op.cit).
Já o componente social, envolve os seguintes aspectos:
• a redistribuição da renda através da prestação de serviços eficientes à população de baixa renda (saúde, educação e sistema previdenciário capaz de proteger todos os segmentos da população em casos de desemprego, invalidez, aposentadoria, acidentes, etc.)
• na área sanitária, desenvolver programas de medicina preventiva e de primeiros socorros, juntamente com organizações comunitárias entre os segmentos de baixa renda.
• o aumento do nível de renda das populações desprivilegiadas passa pela ampliação do sistema de ensino para atender a toda a população, pela criação de programas de formação profissional para aumentar a produção e a produtividade, bem como de programas de educação ambiental.
• a necessidade de melhorar as condições das áreas residenciais de baixa renda. (op.cit.)
Nos termos do Relatório da comissão, a utilização racional dos recursos naturais
constitui-se em uma estratégia para superar a estagnação. Contudo, consta do Relatório que
“a relação entre a sociedade e a natureza é tão complexa que, além dos fatores que
influenciam direta ou indiretamente a maneira como são utilizados os recursos naturais, a
degradação desses recursos reflete realidades econômicas e sociais que não podem ser
ignoradas”. (op. cit.).
Dentre as atividades produtivas na batalha contra a pobreza, para melhorar a qualidade
de vida da população e atingir o desenvolvimento sustentável, o Relatório aponta “a
agricultura e a pecuária”, pois são estas atividades que mais causam danos ecológicos na
região. Aponta que atualmente as maiores ameaças aos nossos principais ecossistemas são: o
desmatamento para aumentar as áreas cultivadas ou extrair madeira; a erosão do solo e a
diminuição da fertilidade causada por técnicas de cultivo inadequadas; a poluição das águas
pelo agrotóxicos; a desertificação progressiva das terras mais áridas, causada pelo pastoreio
excessivo e técnicas impróprias de plantio e a salinização do solo nas zonas de irrigação”.
17
Para tanto, recomenda como estratégias: aumento da produtividade agrícola, introdução
de técnicas ecológicas prudentes na agricultura e coerência com outras políticas de
desenvolvimento.
Cabe mencionar que, com relação à formulação e implementação de políticas
econômicas, é importante, no Relatório, a modificação do papel do Estado para que se
possibilite o desenvolvimento sustentável na agricultura, ressaltando-se atenção especial à
necessidade de distribuição eqüitativa dos meios de produção e dos produtos agrícolas. Sob
este aspecto, reconhece a importância das políticas de reforma agrária para prover terra e
assistência técnica a todos os agricultores.
Evidentemente, a concentração de grandes propriedades rurais nos países da América
Latina e Caribe e, no Brasil, é reconhecidamente alta. Porém, mesmo em países “onde houver
distribuição de terras, os agricultores não têm influência sobre os preços, os insumos e a
tecnologia, nem acesso aos mercados”. Reconhece o Relatório que “certos programas de
distribuição de terras até mesmo estimulam a destruição das florestas”. (op. cit.).
Em se tratando de reforma agrária, o Relatório reconhecendo as dificuldades para a
utilização sustentável dos recursos naturais nestas áreas, aponta que “a reforma agrária pode
adaptar-se às características específicas de cada ecossistema, à atual ou futura organização
social ou às necessidades e aspirações dos beneficiários. Para tanto, recomenda que os
governos assumam a tarefa de promover os projetos de desenvolvimento sustentável através
de cooperativas ou empreendimentos agrícolas que utilizem tecnologias compatíveis com os
ecossistemas e os métodos de cultivo. (op. cit.)
Neste particular, cabe mencionar a Agenda 21, documento aprovado pela RIO-92, que
estabelece um pacto pela mudança de estilo de desenvolvimento global para o século XXI.
A Agenda 21 brasileira selecionou seis áreas temáticas de problemática sócio-ambiental,
a saber: agricultura sustentável, cidades sustentáveis, infra-estrutura regional, gestão dos
recursos naturais, redução das desigualdades sociais e ciência e tecnologia para o
desenvolvimento sustentável.
18
Estes temas, a partir dos debates realizados com diversos segmentos sociais de todas
regiões do Brasil, resultaram em documentos específicos onde estão expressas as principais
estratégias concebidas em nível nacional. Aprofundando a participação da sociedade na
elaboração da Agenda 21 brasileira, estão sendo realizadas reuniões regionais pautadas nestes
documentos preliminares para o aperfeiçoamento da mesma.
Destacando o documento “Agricultura Sustentável”, um dos temas de interesse desta
pesquisa, apresentamos as principais estratégias definidas para o domínio da Mata Atlântica e
das florestas e campos meridionais, que, em virtude do contexto desta investigação estão
situados em áreas remanescentes de Mata Atlântica do Sul da Bahia, onde se localiza o
Assentamento de Reforma Agrária “Marambaia”, por sua vez inserido na APA Costa de
Itacaré – Serra Grande.
Segundo o documento intitulado “Agricultura Sustentável”, a proposta estratégica
definida para Mata Atlântica, florestas e campos meridionais está baseada no
“estabelecimento de pactos territoriais orientados para a promoção da agricultura sustentável,
tendo como princípio a criação ou o fortalecimento de mecanismos participativos de
planejamento e de gestão ambiental, tendo como unidade preferencial as bacias
hidrográficas”. (Agricultura sustentável, MMA, 2000).
As estratégias gerais devem ser confrontadas com as características socio ambientais de
cada agroecossistema que exigem soluções específicas definidas localmente.
A Agenda 21 brasileira entende o pacto territorial para a agricultura sustentável, como
uma articulação de esforços em áreas de interesses comum (saúde, educação, conservação
ambiental) e do estabelecimento de compromissos com ações coletivas.
Segundo o documento, “em 1997, das cerca de 14 milhões de pessoas residentes no meio
rural, 4 milhões exercem atividades não agrícolas tais como, prestação de serviços, com
destaque para empregos domésticos, serviços sociais, ensino de primeiro grau, comércio de
mercadorias, indústria de transformação e da construção civil”. (op. cit.).
A partir da análise sobre as experiências já existentes na região da Mata Atlântica e das
Florestas e Campos Meridionais, que se basearam nos mecanismos de participação da
19
sociedade nas discussões e na execução de políticas públicas, o documento destaca as
criações dos Comitês de Gestão de Microbacias Hidrográficas, em torno das quais, os
agricultores da Região Sul, se organizaram, mudaram suas condutas produtivas e também
receberam recursos públicos subsidiados. O fato resultou em mudança nos problemas
ambientais da região, a exemplo de erosão dos solos e o despejo nos rios dos dejetos de
animais. Os estados mencionados, onde se consolidaram estas experiências de sucesso foram
Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
O documento aponta, também, as experiências de articulação entre órgãos
governamentais, agricultores, sindicatos e ONG´s que foram desenvolvidas em Minas Gerais,
no processo de criação do Parque Nacional da Serra do Brigadeiro, onde o zoneamento prevê
a permanência de milhares de moradores no entorno do parque e a conservação dos recursos
naturais. Além da experiência em São Paulo, de instalação de vinte comitês de bacias
hidrográficas com o envolvimento do governo e da sociedade civil na gestão dos recursos
hídricos e nos caminhos para o desenvolvimento local. (op. cit.).
Com base nestas experiências, recomenda a necessidade de se fortalecer e disseminar
estas experiências por outras regiões do país. Porém, coloca que o foco das intervenções deve
ser o envolvimento dos agricultores, pois sua participação em todas as etapas de
planejamento é que vai garantir a sustentabilidade agrícola.
Convém ressaltar uma indicação feita pelo documento, com relação à viabilização do
desenvolvimento sustentável no meio rural:
“Diante dos desafios que a transição a uma agricultura sustentável abrange, a Agenda 21 brasileira considera fundamental que todas as instâncias de formação – o ensino formal, a capacitação profissional e a assistência técnica – sejam permeadas pelos princípios da educação ambiental, nas mais variadas implicações práticas atreladas a este conceito”.
Porém, alerta o documento para o fato de que “a participação ativa das organizações
sociais do campo – diretamente atrelador ao fortalecimento da agricultura familiar – não é,
por certo, o único ingrediente ao desenvolvimento de pactos territoriais voltados à
agricultura sustentável”.
20
Há que se investir também na geração de novos conhecimentos e novas tecnologias
voltadas para a sustentabilidade da agricultura, onde as áreas de reforma agrária também
devem ser contempladas, tendo como princípio a participação dos assentados (pequenos
produtores rurais) em todo o processo.
Na tentativa de colocar em prática o conceito de desenvolvimento sustentável no meio
rural, algumas iniciativas vêm sendo implementadas. Dentre estas, destaca-se a do
Movimento Sindical de Trabalhadores Rurais, que através da Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Agricultura – CONTAG, em seu Programa de Formação de Dirigentes e
Técnicos em Desenvolvimento Local baseado na Agricultura Familiar (1977), demonstra o
interesse do movimento em estabelecer um processo interativo com os demais setores da
sociedade para juntos construírem um projeto que assegure o bem-estar coletivo, ou seja, o
Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável. Reconhece a executiva da
CONTAG que “para a implantação, avanço e consolidação desse projeto é fundamental
estabelecer um amplo processo de alianças, buscando o apoio dos demais movimentos e
organizações da sociedade civil, técnicos e intelectuais”.
Para tanto, define o desenvolvimento sustentável como:
“Um processo de mudança e elevação das oportunidades sociais que compatibilize o crescimento econômico, a conservação dos recursos naturais e a igualdade social”.
Considera, ainda, que “o grande desafio colocado para administrações
comprometidas com a melhoria das condições de vida da população e com a democratização
do governo, e para os movimentos sociais, é o de garantir a construção de políticas públicas
de desenvolvimento que consigam articular o projeto local com o projeto global. Mas que,
sobretudo garantam processos participativos com democracia, transparência e controle
social, equidade e redistribuição, eficácia e eficiência”. (CONTAG, 1997).
Portanto, este novo projeto de desenvolvimento sustentável no meio rural deverá
garantir a ampliação da cidadania e da organização social, a sustentabilidade dos recursos e
da vida, através da geração de emprego e renda. Pois, como expressa a CONTAG, 1997,
“Sem a ampliação das oportunidades de renda no meio rural, qualquer proposta de
desenvolvimento sustentável global estará fadada ao fracasso”.
21
Compreende a CONTAG, 1997, que a Reforma Agrária constitui em uma das “vigas-
mestras” para que sejam alcançados os objetivos do Projeto Alternativo de Desenvolvimento
Rural Sustentável, pois “desprezar o campo, sonegar-lhe políticas públicas adequadas ao seu
progresso significa perenizar os cinturões de miséria que hoje envolvem os centros urbanos e
impactam de forma nefasta no exercício da cidadania, tanto daqueles que vivem no campo
quanto dos que moram nas cidades”.
1.2. MEIO AMBIENTE E REFORMA AGRÁRIA
A utilização dos recursos naturais para atividades econômicas na agricultura tem sido
objeto de avaliação permanente das entidades civis quanto aos efeitos danosos, por vezes
irreversíveis ao meio ambiente e, conseqüentemente ao ser humano. Rios e riachos são
assoreados em conseqüência dos desmatamentos das matas ciliares; áreas extensas planas e
de encostas são degradadas com os desmatamentos da mata nativa para a implantação de
atividades agrícolas e de pecuária.
A reforma agrária hoje no Brasil é acusada como um dos “vilões” da degradação
ambiental. É certo que não se pode aceitar tal acusação com a ênfase que a ela tem sido
atribuída, contudo, é preciso analisar o nível de preocupação que os responsáveis pela
implantação dos projetos de reforma agrária tem dispensado às questões ambientais. Por
outro lado, deve-se também analisar os riscos ambientais da agricultura que são provocados
não só pelos pequenos produtores rurais, mas sobretudo, pelos grandes proprietários de terra.
Como bem enfatiza TREVIZAN, 2000, ao considerar “que grandes e pequenos
produtores representam igualmente riscos ambientais, por razões diferentes”.
Os riscos ambientais, apontados pelo autor, ocorrem pelos seguintes fatores:
- “Desejo de acumular rapidamente; - Necessidade de sobrevivência; - Desconhecimento das reações que os componentes ambientais desenvolvem, em
função da interação que estabelecem entre si (Inclui-se o elemento humano como um dos componentes ambientais)”. (op. cit.)
22
Estes fatores influem de maneira diversa no uso da terra. De um lado, os grandes
produtores com a utilização da tecnologia convencional, através da mecanização e do uso
abusivo de agrotóxicos que garanta a acumulação de capital em curto espaço de tempo,
promovem a degradação do solo e o desmatamento em larga escala. De outro, os pequenos
produtores que promovem a degradação em virtude da má combinação de cultivos e do
manejo inadequado do solo. (TREVIZAN, 2000).
O autor, fazendo uma comparação entre os dois tipos de agressão ambiental provocada
pelos grandes e pequenos produtores rurais, conclui que:
“Infelizmente, sistemas de cultivos com intensa mecanização, do plantio à colheita, próprios de sistemas capitalizados, dificultam a opção por sistemas que combinem uso intenso do solo com sustentabilidade do mesmo. Assim, o uso intensivo de recursos, prática comum dos pequenos produtores, não representa, necessariamente, maior risco ambiental; ao contrário pode tornar-se um mecanismo de maior conservação. Exige-se, porém, investimento em pesquisa adequada às necessidades dos pequenos produtores e viabilizar a eles acesso à informação”. (op.cit.).
Porém, consideramos importante não só possibilitar o acesso à informação aos
pequenos produtores rurais (assentados), mas envolvê-los em todo processo de pesquisa para
que as alternativas sustentáveis na agricultura familiar estejam embasadas também no seu
saber empírico, ou seja, estabelecer uma relação dialógica entre os técnicos e os assentados,
onde os técnicos assumam o papel de assessores-comunicadores, facilitadores. Para isso,
torna-se importante fortalecer os já existentes sistemas alternativos de formação e reeducação
de técnicos para o trabalho em áreas de assentamento de reforma agrária, desenvolvidos pelos
movimentos sociais rurais, ONG´s e outras instituições civis.
Na Bahia, dados estatísticos estimam que são mais de 300 mil hectares de terra já em
uso por pequenos produtores em áreas de reforma agrária.
Técnicas adequadas de manejo do solo, definição de áreas de reserva florestal,
manutenção das matas ciliares, florestamento e reflorestamento, notadamente com espécies
nativas, recuperação de áreas degradadas são algumas atitudes que podem ser tomadas
visando a compatibilização da conservação ambiental e a produção agrícola em áreas de
reforma agrária. Porém, a experiência tem demonstrado o contrário. Só ultimamente é que se
observa uma tímida preocupação do INCRA (órgão responsável pela implantação da reforma
23
agrária no Brasil) em inserir a questão ambiental no processo de desapropriação de áreas
agrícolas para o assentamento.
Compreende-se a dificuldade de em geral adotar medidas preventivas, uma vez que os
assentamentos muitas vezes se efetivam antes da emissão de posse com a utilização da área
pelos ocupantes, bem como, a maioria das áreas destinadas à Reforma Agrária sofrem
degradação pela ação criminosa dos que detinham as propriedades da terra antes e durante o
processo desapropriatório.
Ocorre, também, que na tentativa de se tornar considerada “propriedade produtiva” e.
dessa maneira não se configurar como passível de desapropriação para efeitos de reforma
agrária, têm ocorridos desmatamentos em extensas áreas provocados pelos grandes
proprietários.
Entretanto, a Constituição Federal de 1988, ao fixar norma a respeito da função social
da propriedade, no seu art. 186 afirma que esta função é evocada, quando, entre outros
requisitos seja observado o “aproveitamento racional e adequado e, a utilização adequada
dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente”.
A preocupação com a proteção ambiental nos programas de reforma agrária remonta o
Estatuto da Terra (Lei nº 4.504 de 30/11/64), que afirma que uma propriedade desempenha
sua função, entre outras questões, quando “assegura a conservação dos recursos naturais”
(inciso c, parágrafo 1º, art. 2º), e ainda estabelece que a desapropriação por interesse social
tem por fim, também, “efetuar obras de renovação, melhoria e valorização dos recursos
naturais” (inciso F, art. 18). O Estatuto da Terra ainda condiciona que nas propriedades
desapropriadas deve-se destinar áreas para reflorestamento ou para a conservação de reservas
florestais, assim como preservar ecossistemas considerados de preservação permanente como
as encostas íngremes, as matas ciliares, as nascentes de rios, etc.
Porém, por falta de orientação técnica por parte dos órgãos competentes, os
assentados pela necessidade de sobrevivência desencadeiam um processo de degradação dos
recursos naturais disponíveis. Em algumas situações a ocupação se dá em encostas íngremes
com plantio de culturas com pequena capacidade de proteção do solo, a exemplo da
mandioca, com o uso frequente de queimadas.
24
FLECK, 1986, observa que “Os assentamentos, ressalvadas situações específicas de
solo, clima. Condições de produção agrícola, organização dos trabalhadores rurais,
situações dos governos estaduais, etc., têm em comum, com raríssimas exceções, condições
precárias em relação: a) à localização em terras de baixa fertilidade; b) ao atendimento
precário por parte dos governos estaduais e federal no que tange às condições gerais para
seu desenvolvimento, como infra-estrutura básica para a produção agrícola e condições
gerais de saúde, habitação, educação, lazer, etc. É como dizem os próprios assentados:
‘Parece que fazem tudo para não dar certo’.”
Tendo este referencial, citamos TREVIZAN, 2000, onde analisa que para se
dimensionar os riscos ambientais em assentamentos de reforma agrária, deve-se levar em
consideração diversas questões para se definir as condições possíveis de degradação ou
conservação ambiental, considerando a diferença no processo de ocupação a partir da ação do
Movimento organizado e a ação de pequenos produtores de forma individualizada e
desorganizada.
Para tanto, propõe o autor:
a) “Uma análise dos riscos decorrentes do Movimento propriamente dito - deve-se considerar a filosofia
e ideais que orientam o Movimento e a concepção da relação homem – natureza nele existentes; b) Uma análise das características específicas do assentamento – é importante considerar, além dos
projetos, as características físicas (topografia, solo), características históricas do mesmo, o processo de tomada de decisão dentro do assentamento e os projetos propostos para o assentamento;
c) Uma análise dos riscos devidos às características pessoais dos assentados, independente do
movimento – identificar as condições sociais de cada assentamento (nível de escolaridade, procedência rural/urbana, experiência profissional do assentado e as relações institucionais do assentado). (op. cit.)
TREVIZAN e ALGER, 2000, a partir do estudo de casos desenvolvidos em
assentamentos de sem-terra, no sul da Bahia, estabelecem uma comparação entre os grupos
de assentados vinculados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra – MST com os
grupos de assentados denominados independentes, concluindo “que os grupos desvinculados
de movimentos organizados estão mais expostos a riscos de degradação do seu
ecossistema”.
25
Desse modo, afirmam que “os movimentos sociais de luta pela terra desempenham, na
verdade, importante papel para a sustentabilidade de um ecossistema, particularmente no
que se refere aos aspectos sociais, econômicos e naturais, representando substancial
contribuição para a sociedade”. (op. cit.).
Portanto, como diz GEHLEN, 1986, o assentamento de reforma agrária “é a escola em
que todos participam. Ela vitaliza as relações sociais, de trabalho, de lazer, de troca, etc.
Constitui-se num espaço de (re) unificação do saber experimental (prática) com o saber
elaborado, técnico-científico (teórico). Cria as condições para uma relação fértil, geradora de
um saber renovado e de novas relações, articulando e cimentando a união que se materializa
em formas específicas de organização”.
Sendo uma “escola”, os desafios colocados para a viabilização do desenvolvimento
sustentável nos assentamentos de reforma agrária passa também pela compreensão dos
diversos aspectos que interferem na relação meio ambiente – reforma agrária que
compreende a dimensão ética, social, econômica, política, cultural, físico-natural, enfim, uma
análise holística da realidade.
No entanto, não basta somente conhecer e compreender, é necessário também querer
fazer, ou seja, reconhecer os problemas e promover as mudanças em benefício dos
assentados, buscando a participação e o aumento do nível de organização das pessoas
envolvidas no processo, para que elas mesmas promovam as transformações necessárias. É
um processo de “auto-conhecimento, auto-organização e auto-transformação”, garantindo a
autonomia dos sujeitos.
Compreendendo a idéia de “holos” (KOESTLES, 1978), in SANTOURIS (1991),
HOMEM D´EL REY, 1996, afirma:
“O homem é um ser vivo da natureza, parte do “holos” – cada todo da natureza; um todo feito de suas partes, ainda que ele mesmo seja parte de um todo maior, que por sua cultura estabelece relações interdependentes em todas as suas atividades e com isso constrói seu ambiente de vida”.
A participação dos pequenos produtores rurais (assentados) assume um caráter de
resgate da cidadania, onde o empoderamento dos assentados constitui uma condição essencial
26
para que a sua voz seja ouvida e reconhecida pelos técnicos e pelos representantes do
governo no processo de tomada de decisões em relação às políticas públicas voltadas para a
sustentabilidade sócio-ambiental. E sem sombra de dúvida, propostas dos movimentos sociais
rurais e dos assentados para isto não faltam.
O fortalecimento das ações comunitárias dos pequenos produtores rurais (assentados)
é uma das garantias também para que eles superem o anacronismo das relações sócio-
ambientais de produção agrária vigentes.
O sucesso de viabilização do desenvolvimento sustentável em assentamentos de
reforma agrária do ponto de vista dos interesses populares está condicionado à participação
enquanto conquista de espaço e poder. (GEHLEN, 1986).
E esta participação deve se dá dentro de um movimento social ou nas formas de
organizações coletivas (Associações, Cooperativas, etc), de um projeto sócio-político como
estratégia de um projeto alternativo que garanta a autonomia de decisão dos assentados com
relação à construção de um novo projeto para o campo e em áreas de reforma agrária, que
tenha como modelo a agricultura familiar sustentável.
Para a construção desse novo projeto de agricultura familiar sustentável, vários
desafios precisam ser superados desde os desafios exógenos até os desafios endógenos que
influem no ambiente de vida das comunidades de pequenos produtores rurais.
Conforme aponta a CONTAG, 1997, ao analisar o modelo de desenvolvimento rural
no Brasil que de 1950 a 1980 modernizou a agricultura com grandes complexos agro-
industriais, através de créditos subsidiado realizou-se grandes investimentos baseados em
novas tecnologias (mecanização e uso abusivo de agrotóxicos – insumos químicos).
Com este modelo a maioria da agricultura familiar foi excluída deste
“desenvolvimento”, passando a liberar mão-de-obra para garantir o fortalecimento das
agroindústrias. Este modelo também contribuiu para a expulsão do homem do campo para a
cidade, aumentando o estado de pobreza e miséria enfrentada nos centros urbanos.
27
Com a globalização no início dos anos 90, o Brasil participando deste processo,
coloca suas políticas públicas, especialmente a econômica, como instrumento de garantia de
concentração e internacionalização de capitais, tendo como conseqüência o desemprego e a
exclusão sócio-econômica da maioria da população. Conforme a CONTAG, 1997, “no meio
rural, isto vem ocorrendo nos últimos 30 anos, com o aprofundamento do processo de
exploração dos agricultores familiares, pelas péssimas condições de vida e de trabalho dos
assalariados rurais e pela marginalização dos trabalhadores rurais sem terra”.
Aponta, ainda, a CONTAG, 1997, que um dos fatores que agrava a situação “é a
redução dos instrumentos da política agrícola com a desestruturação e sucateamento dos
serviços públicos de assistência técnica, de pesquisa, de financiamento, de formação
profissional, de armazenamento e de comercialização”, o que constitui um grande entrave ao
desenvolvimento da agricultura.
Além disso, coloca que o projeto neoliberal brasileiro se consolida a partir de uma
reforma administrativa que diminui os investimentos públicos nos setores sociais e
econômicos, iniciando uma série de privatizações das empresas nacionais.
Com relação a importância econômica e social da agricultura familiar, o documento
da CONTAG, 1997, afirma que “a agricultura familiar é um setor estratégico para a
manutenção e recuperação do emprego, para a redistribuição da renda, para a garantia da
soberania alimentar do país e para a construção do desenvolvimento sustentável”.
Como dissemos anteriormente, propostas dos movimentos sociais rurais não faltam, e
o projeto de “Desenvolvimento Local Sustentável baseado na Agricultura Familiar –
Construindo um Projeto Alternativo”, elaborado pela CONTAG e pelas suas Federações
Estaduais é um exemplo disso.
Portanto, não colocando em dúvida a capacidade dos trabalhadores rurais em
viabilizar o desenvolvimento sustentável nos assentamentos de reforma agrária,
consideramos que para tal é imprescindível que os governos invertam o foco de intervenção
de suas políticas públicas sociais e econômicas e respondam as reais necessidades e
interesses da maioria da população, onde os processos de desenvolvimento devem ser
28
orientados por diretrizes comuns, mas adequadas às realidades específicas do meio ambiente
e da sociedade em cada local, conforme pondera o documento da CONTAG, 1997.
O documento ainda recomenda que o “objetivo central de um projeto de
desenvolvimento é a ampliação das oportunidades de ocupação que gerem renda no meio
rural. Como um modelo baseado na agricultura familiar deve buscar seu fortalecimento pelas
políticas agrícola, social e econômica e sua ampliação pela política de reforma agrária”.
Portanto, este novo projeto de desenvolvimento, pautado na sustentabilidade sócio-
ambiental deve ser articulado com todos os segmentos da sociedade e para isto é necessário
que as organizações urbanas e rurais constituam alianças (parcerias) em todos os níveis para a
construção conjunta e integrada de um projeto global, pois a participação popular é um
instrumento essencial de decisão dos caminhos e das prioridades do desenvolvimento.
29
CAPÍTULO 2. EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO ESTRATÉGIA PAR
VIABILIZAR O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NOS ASSENTAMENTOS
DE REFORMA AGRÁRIA
“O desafio da educação ambiental é sair da
ingenuidade e do conservadorismo (biológico e
político) a que se viu confinada e propor
alternativas sociais, considerando a
complexidade das relações humanas e
ambientais”.
Marcos Reigota (1995)
A Educação Ambiental assim colocada se configura numa perspectiva de educação
para a cidadania, pois busca romper com o individualismo e com a indiferença, enaltecendo o
espírito coletivo e comunitário no processo educativo, mostrando o quanto se entrelaça com
os valores sociais que almejam a dignidade humana e o respeito à vida. (HERCULANO,
1995).
REIGOTA, 1995, ao abordar alguns elementos de reflexão para a prática de Educação
Ambiental dentro de um contexto social, político e ecológico, considera que:
“A educação ambiental tem contribuído para uma profunda discussão sobre a educação contemporânea em geral, já que as concepções vigentes não dão conta da complexidade do cotidiano em que vivemos neste final de século”.
Por outro lado, DIAS, 1999, considera que o grande desafio colocado para a
promoção do Desenvolvimento Sustentável, é:
“saltar da utopia para assumir o papel de estratégia para a sobrevivência da espécie humana e a EA (Educação Ambiental) passa a representar um importante componente dessa estratégia em busca de um novo paradigma, de um novo estilo de vida...”, ...”O direito à informação e o acesso às tecnologias capazes de viabilizar o desenvolvimento sustentável constituem, assim, um dos pilares desse processo de formação de uma nova consciência em nível planetário, sem perder a ótica local, regional e nacional. O desafio da EA, neste particular, é o de criar as bases para a compreensão holística da realidade”.
30
Neste capítulo, buscaremos apresentar as bases filosóficas e teóricas da Educação
Ambiental, traçando os caminhos da Educação Ambiental no mundo e no Brasil, o papel dos
movimentos sociais rurais e ecológicos na busca da cidadania e pelo direito à vida, os
pressupostos e objetivos da educação Ambiental como instrumento de cidadania e de
viabilização do desenvolvimento sustentável e a importância da metodologia da pesquisa-
ação como estratégia para a prática participativa em Educação Ambiental nos assentamentos
de reforma agrária.
2.1. CAMINHOS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO MUNDO E SEUS REFLEXOS NO
BRASIL
Para o entendimento da relação entre a Educação Ambiental e a construção da
cidadania torna-se essencial a descrição da sua trajetória a partir da abordagem dos diversos
eventos técnicos e políticos internacionais realizados, no sentido de compreender o seu
desdobramento no Brasil.
A expressão Educação Ambiental foi colocada pela primeira vez, em 1965, na Grã-
Bretanha, na Conferência de Keele, a qual recomendou que a educação ambiental fosse
incluída no processo educativo dos cidadãos.
Em 1968, surge a idéia de fundar uma sociedade para a Educação Ambiental durante
a Conferência sobre Educação, em Leichester, Grã-Bretanha. Porém, a primeira lei sobre
Educação Ambiental foi aprovada pelos Estados Unidos em 1970.
Por ocasião da Reunião Internacional promovida pela União Internacional para a
Conservação da Natureza, em Paris, em 1970, ficou definido que a Educação Ambiental:
“É um processo que consiste em reconhecer e aclarar conceitos com o objetivo de fornecer aptidões e atitudes necessárias para compreender e apreciar as inter-relações entre o homem, sua cultura, seu meio biofísico. Ela compreende também a prática na tomada de decisões e na elaboração de um código de comportamento acerca das questões relacionadas com a qualidade do meio ambiente”.
A década de 70 se constituiu num marco histórico das preocupações mundiais
relacionadas com as questões ambientais e a sobrevivência da espécie humana. Dentro dessas
preocupações a Educação Ambiental surge como um novo paradigma, fundamentado na
31
visão holística – “compreensão de que a totalidade é mais do que as partes somadas, é o
conjunto destas em suas relações dinâmicas e dialéticas”. (LOUREIRO, 2000)
Neste novo paradigma, a Educação Ambiental envolve a percepção integral da
realidade reforçando a idéia de que não é possível compreender as relações dos homens com
a natureza sem estudar e aprofundar os condicionamentos históricos e sócio-culturais a que
estão submetidas as suas formas de pensar e agir. Das relações do homem/natureza é que se
constitui o mundo humano, o mundo da história, da cultura. Este mundo, contudo, está em
permanente movimento.
Portanto, a questão ambiental não pode ser entendida apenas através dos recursos
naturais que compõem o ambiente, mas, também das sociedades humanas que a partir das
relações sociais nele interage modificando-o conforme suas necessidades.
Desse modo, entende-se que o problema ambiental á antes de tudo um problema
humano, onde não é possível estudar os ecossistemas desconsiderando a relação
homem/natureza.
A Educação Ambiental objetiva modificar as relações entre o homem e a natureza
como garantia da melhoria da qualidade de vida. A necessidade de interferir nessas relações
torna-se explícita a partir do momento em que se percebe que as modificações a partir da
ação do homem implicam em prejuízos à natureza e também à vida.
Ao longo do seu processo civilizatório o ser humano foi se distanciando da natureza
encarando-a não mais como um todo em equilíbrio, mas como uma gama de recursos
disponíveis capazes de serem transformados em bens consumíveis. No entanto, observou-se
que este modelo de desenvolvimento pautado na exaustão dos recursos naturais não era
sustentável, conforme indicava o Relatório “Os limites do Crescimento” publicado pelo
Clube de Roma, em 1969, no qual as previsões sobre o futuro do planeta eram catastróficas,
considerando o ritmo e as formas como estavam sendo gerenciados os recursos ambientais.
A repercussão do relatório culminou com a realização da I Conferência das Nações
Unidas sobre o Ambiente Humano, realizada em Estocolmo na Suécia, em 1972, onde dentre
as recomendações se destaca uma que estabelece às nações “a necessidade de ser
32
implementada uma educação de caráter interdisciplinar, voltada para os problemas atuais e
urgentes e que prepare as populações para viverem e se desenvolverem em um mundo
interdependente e em harmonia com as leis da natureza”.
A partir desta Conferência a Educação Ambiental passou a ser considerada como uma
estratégia relevante na formação de novos valores e comportamentos. Em sua declaração de
princípios, expressa a convicção de que as gerações presentes e futuras tenham reconhecido o
direito fundamental à vida num ambiente sadio. O princípio 19 explicita:
“É indispensável um trabalho de educação em questões ambientais dirigido às gerações jovens como aos adultos, e que preste a devida atenção ao setor da população menos privilegiada, para ampliar as bases de uma opinião bem informada e de uma conduta dos indivíduos, das empresas e da coletividade, inspirada no sentido de sua responsabilidade quanto à proteção e melhoramento do meio em toda sua dimensão humana”.
Portanto, surgiu da tomada de consciência em nível mundial de que a dimensão das
atividades predatórias na utilização dos recursos ambientais provoca uma série de
conseqüências desastrosas colocando em risco a sobrevivência da humanidade.
Com esta preocupação as discussões em relação ao caráter da Educação Ambiental
passaram a ser desencadeadas e no seminário realizado em Tammi, em 1974, concluiu-se que
a Educação Ambiental “permite alcançar os objetivos de proteção ambiental e que não se
trata de um ramo da ciência ou uma matéria de estudos separada, senão o marco de uma
educação integral permanente”. (MMA, Educação Ambiental - Curso Básico à Distância,
2000).
Entre 1973 e 1975, a UNESCO e o PNUMA promoveram diversos seminários,
destacando-se o Seminário Internacional de Educação Ambiental que resultou na Carta de
Belgrado, em 1975. Este documento recomendou a “necessidade de uma nova ética global,
capaz de promover a erradicação da pobreza, da fome, do analfabetismo, da poluição, da
exploração e da dominação humana”. Este documento indo mais além coloca que as nações
ricas não devem persistir na busca do progresso material às custas da exclusão social de parte
da população mundial (terceiro mundo), mas redirecionar as formas de desenvolvimento
colocando o conhecimento científico e tecnológico acumulado em benefício de toda a
humanidade.
33
A realização em 1977, da I Conferência Intergovernamental sobre Educação
Ambiental, convocada pela UNESCO e PNUMA, em Tbilisi – Geórgia, tornou-se um marco
histórico dos processos educativos em relação ao ambiente. Nesta Conferência definiu-se o
conceito de Educação Ambiental, os objetivos, funções estratégicas e os pressupostos de
ação. Compreendeu o meio ambiente “não somente como o meio físico, mas, também, o meio
social e cultural, e relaciona os problemas ambientais com os modelos de desenvolvimento
adotados pelo homem”. Enfatizou, ainda, que a Educação Ambiental “deve preparar o
indivíduo mediante a compreensão dos principais problemas do mundo contemporâneo,
possibilitando-lhe conhecimentos técnicos e as qualidades necessárias para desempenhar
uma função produtiva com vistas a melhorar a vida e proteger o meio ambiente
considerando os valores éticos”.
A Conferência de Tbilisi definiu a Educação Ambiental como:
“Uma dimensão dada ao conteúdo e à prática de educação, orientada para a resolução dos problemas concretos do ambiente, através de enfoques interdisciplinares e de uma participação ativa e responsável de cada indivíduo e da coletividade”.
Postula, Tbilisi, que as diretrizes da Educação Ambiental devem “levar em conta a
totalidade do ambiente, ser contínua e permanente, adotar perspectiva interdisciplinar e
fomentar a participação do aluno na organização de suas próprias experiências e
oportunidade para tomar decisões”.
Destas diretrizes quatro conceitos se delineiam: Totalidade do ambiente, processo
contínuo e permanente, interdisciplinaridade e participação. HOMEM D´EL REY, 1977,
assinala que “compreender a realidade e atuar sobre ela, com ela, é a essência da prática,
do fazer da Educação Ambiental que se apóia nesses quatro grandes pressupostos”. Afirma
ainda, que “estes quatro conceitos têm sido utilizados sem uma compreensão muito clara e
objetiva do seu significado”.
Porém ressalva que “Se a EA é um processo de auto-conhecimento e auto-
transformação do ser humano, seu caráter contínuo e, permanente é inquestionável, porque
a vida é dinâmica em sua rede de relações nos diferentes nichos ecológicos que compõem a
natureza”.
34
A Educação Ambiental coloca-se então, como um elemento importante no
desenvolvimento sustentável não como mais um conteúdo programático de capacitação de
recursos humanos, mas, sobretudo como uma atitude de vida.
Com o objetivo de fortalecer as orientações formuladas na Conferência de Tbilisi,
realizou-se em 1987 a Conferência de Moscou, onde foi formulado um plano de ação para a
década de 90, estabelecendo-se como prioridades:
a) Desenvolvimento de um modelo curricular;
b) Intercâmbio de informações sobre o desenvolvimento de currículo;
c) Desenvolvimento de novos recursos instrucionais;
d) Promoção de avaliações de currículos;
e) Capacitar docentes e licenciados em EA;
f) Capacitar alunos de cursos profissionalizantes;
g) Melhorar a qualidade das mensagens ambientais veiculadas pela mídia ao grande
público;
h) Criar um banco de programas audiovisuais;
i) Desenvolver museus interativos;
j) Capacitar especialistas ambientais através de pesquisa;
k) Utilizar unidades de conservação ambiental na capacitação regional de especialistas;
l) Promover a consultoria interinstitucional em âmbito internacional;
m) Informar sobre a legislação ambiental. (PEDRINI, s. d.).
Em 1992, após 20 anos da I Conferência Internacional, realizou-se a II Conferência
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, quando se reafirmou o conceito de
desenvolvimento sustentável, definido pelo relatório Brundtland como “aquele que atende às
necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras
atenderem as suas próprias necessidades”.
Como resultado desta Conferência se destaca a Agenda 21 que em suas resoluções
considera as questões educacionais como fundamentais para a conservação dos recursos
naturais e a adoção de uma nova ética ambiental do desenvolvimento. Em seu capítulo 36.1,
expressa que:
35
“O ensino, o aumento da consciência pública e o treinamento estão vinculados virtualmente a todas as áreas do programa da Agenda 21 e ainda mais próximas das que se referem à satisfação básica, fortalecimento institucional e técnico, dados e informações, ciência e papel dos principais grupos. A Declaração e as recomendações da Conferência Intergovernamental de Tbilisi sobre Educação Ambiental, organizada pela UNESCO e PNUMA, celebrada em 1977, ofereceram os princípios fundamentais para as propostas deste documento”.
A educação para o desenvolvimento sustentável contida na Agenda 21 se baseia na
“conscientização, entendida como compreensão das relações entre sociedades humanas e a
natureza, entre meio ambiente e desenvolvimento, entre níveis globais e locais; no
comportamento, visto como desenvolvimento de atitudes menos predatórias e de habilidades
técnicas e científicas orientadas para a sustentabilidade”. (MMA, 2000)
A Agenda 21 define como áreas prioritárias para a Educação Ambiental:
• A reorientação da educação na direção do desenvolvimento sustentável, onde
caracteriza a importância da educação escolar básica como condição para o
desenvolvimento econômico e social e a conservação do meio ambiente;
• A ampliação da conscientização pública, que compreende as ações destinadas às
comunidades urbanas e rurais, visando sensibilizá-las sobre os problemas ambientais
e de desenvolvimento, criando canais de participação na busca de soluções urgentes e
atribuindo responsabilidade pessoal e coletiva em relação ao meio ambiente;
• Incentivo ao treinamento, destinado a formação e a capacitação de recursos humanos
para atuarem na conservação do meio ambiente e como agentes do desenvolvimento
sustentável, inclusive em relação a implementação das prioridades anteriores.
Portanto, a difusão, a adoção e a adaptação pelos diversos setores sociais das propostas da
Agenda 21 contendo as orientações e recomendações do Seminário Internacional sobre
Educação Ambiental ocorrida em Belgrado, em 1975 e a Conferência Intergovernamental
sobre Educação Ambiental ocorrida em Tbilisi, em 1977 constitui-se num caminho a ser
seguido rumo ao desenvolvimento sustentável.
36
A Agenda 21, conforme DIAS, 1999, é “um Plano de ação para a humanidade, que
nomeia o Desenvolvimento Sustentável como uma estratégia de sobrevivência e a Educação
Ambiental como um instrumento crítico para a sua promoção”.
Paralelamente à realização oficial da II Conferência Mundial, outro evento organizado
pelas ONGs, denominado Fórum Global – Fórum Internacional de Organizações Não-
Governamentais e Movimentos Sociais, discutia as questões ambientais, onde aprovou-se o
Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global,
comprometendo os signatários “com o processo educativo transformador através de
envolvimento pessoal, de nossas comunidades e nações para criar sociedades sustentáveis e
equitativas’.
No Tratado, as ONG´s consideram que a Educação Ambiental para uma sustentabilidade
eqüitativa é um processo de aprendizagem permanente, baseado no respeito a todas as formas
de vida. Tal educação afirma valores e ações que contribuem para a transformação humana e
social e para a preservação ecológica. Ela estimula a formação de sociedades socialmente
justas e ecologicamente equilibradas, que conservam entre si relação de interdependência e
diversidade. Isto requer responsabilidade individual e coletiva em nível local, nacional e
planetário. (Tratado de EA para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global).
Como se vê, esse Tratado traz ao bojo da discussão questões fundamentais que o
diferenciam das práticas desenvolvidas pelos governos, tecendo críticas ao estilo de
desenvolvimento vigente:
“Consideramos que a preparação para as mudanças necessárias depende da compreensão coletiva da natureza sistêmica das crises que ameaçam o planeta. As causas primárias de problemas como o aumento da pobreza, da degradação humana e ambiental e da violência podem ser identificadas no modelo de civilização dominante, que se baseia em superprodução e superconsumo para uns e em subconsumo e falta de condições para produzir por parte da grande maioria”. (Tratado de EA para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global).
Por outro lado, indica a necessidade da participação comunitária na construção do seu
futuro, planejando e implementando suas próprias alternativas, colocando a educação
ambiental como uma estratégia na conquista de melhorias da qualidade de vida e de tomada
de consciência pessoal e coletiva que assegure a harmonia entre os seres humanos e desses
com outras formas de vida.
37
Em seus princípios da Educação para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade
Global considera que a educação ambiental deve tratar as questões globais, suas causas e
inter-relações a partir de uma perspectiva sistêmica em seu contexto histórico-social, ou seja,
a partir da realidade local, relacionando os aspectos primordiais ao desenvolvimento e ao
meio ambiente.
Dentre as diretrizes explicitadas pelo Tratado, merece destacar a importância de se
fortalecer as organizações e movimentos sociais como espaços privilegiados para o exercício
da cidadania e melhoria da qualidade de vida e do ambiente.
Após dez anos de realizada a Conferência de Tbilisi, a UNESCO e o Governo da
Grécia promoveram em 1997, em Tesslonica, a Conferência Internacional sobre Ambiente e
Sociedade: Educação e Conscientização Pública da Sustentabilidade, congregando
representantes de organizações governamentais, não governamentais e sociedade civil
reafirmando a importância da Educação Ambiental e a conscientização pública para se atingir
os objetivos do desenvolvimento sustentável.
Esta Conferência indica a necessidade de se reorientar a educação ambiental para a
sustentabilidade em todos os níveis de ensino e que todas as áreas do conhecimento devem
focalizar seus interesses para o desenvolvimento sustentável e o ambiente, numa abordagem
holística interdisciplinar.
À luz dos diversos eventos técnicos e políticos de Educação Ambiental realizados
internacionalmente, percebe-se que a evolução da educação ambiental acompanha o
aprofundamento do conceito de meio ambiente, que antes se restringia aos aspectos naturais
e, que, ao longo do processo foi se modificando, ampliando e compreendendo a estreita
relação entre o homem e a natureza, a sociedade e o ambiente.
A especificidade da educação ambiental em relação a outras formas de educação
consiste no fato de que ela tem um enfoque voltado para a solução dos problemas ambientais,
um enfoque educativo interdisciplinar, uma integração da educação com a comunidade e uma
educação sistemática, participativa e permanente voltada para o futuro.
38
A EA assume, então, um caráter estratégico na formação da cidadania,
compreendendo-se que a percepção dos indivíduos em relação ao seu ambiente seja ele
natural ou socialmente construído, significa entender estes indivíduos com identidade
histórica e social. Através da interdisciplinaridade a educação ambiental fundamenta o
processo educativo, visando a formação integral do cidadão para encontrar soluções coletivas
aos graves problemas ambientais.
Portanto, a educação ambiental torna-se um instrumento imprescindível para a
construção da sociedade sustentável e democrática, entendida segundo VIEZZER e
OVALLES, 1995, como “uma sociedade baseada na solidariedade, afetividade e
cooperação, visando a justa distribuição de seus frutos entre todos”.
No Brasil, a questão ambiental vem adquirindo importância nos últimos anos,
principalmente com o surgimento dos movimentos sociais ambientalistas, passando a
merecer atenção no quadro das políticas públicas.
Durante as últimas décadas a Educação Ambiental vem se destacando como um
instrumento fundamental de mobilização e participação da sociedade em ações planejadas e
efetivas que visam a tomada de consciência das causas e consequências da problemática
ambiental.
A origem da Educação Ambiental no Brasil segundo REIGOTA, 1995, remonta a
segunda metade dos anos 70, num contexto social, cultural, político e ecológico de
reorganização dos movimentos sociais contra o aparato repressivo militar. Neste contexto, de
redemocratização do país, o autor situa o surgimento do pensamento ecologista brasileiro
contemporâneo, onde alguns profissionais e intelectuais contribuíram na discussão da questão
ambiental e da necessidade da Educação Ambiental, “com muita dificuldade, mas também
com muita determinação, essa nova geração de profissionais, influenciada pelos
precursores, foi conquistando espaços nos meios de comunicação de massa, nas escolas,
universidades, nos movimentos sociais, etc. sempre colocando a problemática ecológica em
geral e a educação ambiental em particular nos debates políticos e acadêmicos e nas
atividades pedagógicas cotidianas”.
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A inclusão de um capítulo específico sobre o meio ambiente na Constituição Federal
Brasileira, se destaca como um novo direito social e do resultado do aumento da informação
ambiental dos cidadãos e na definição do uso dos recursos naturais em atendimento aos seus
reais interesses e necessidades.
A Constituição Federal, 1988, ao dedicar um dos seus capítulos à questão ambiental
coloca novos desafios políticos e organizacionais à administração pública e à sociedade.
Essas competências passam a ser responsabilidade da União, dos Estados, dos Municípios e
de toda a coletividade.
No capítulo VI do Meio Ambiente, a Constituição Federal, no seu art. 225, reza:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder pública e a coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Em seu parágrafo I, expressa:
“Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe-se ao Poder Público: Promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente.
A compreensão deste capítulo da Constituição nos remete ao conceito de cidadania
política e participação. O primeiro conceito é compreendido como o conjunto de direitos e
deveres do cidadão para o exercício da soberania sobre o território de sua nacionalidade. O
conceito de participação, segundo LOUREIRO, 1992, “é igualdade de poder no processo,
respeito pelas experiências acumuladas por cada indivíduo e construção coletiva em busca
da cidadania plena”. Portanto, a cidadania é conquista da participação. Como sujeitos
sociais devemos entender que a conquista dos direitos se dá com participação e consciência
crítica.
Para exercer a cidadania a partir deste dispositivo é necessário compreender que o art.
225 explicita a obrigatoriedade do Estado em promover a conscientização pública para a
proteção ambiental e estabelecer programas sistemáticos de educação ambiental em todos os
níveis de ensino e nos meios de comunicação de massa. Salienta-se que, a defesa do meio
ambiente é, também, de co-responsabilidade de todos os cidadãos.
40
É neste contexto, que no processo educativo as decisões políticas resultantes da
participação popular, dos conflitos de interesses e das demandas sociais devem levar ao
compromisso de todos os segmentos sociais na compatibilização entre o desenvolvimento e o
meio ambiente.
Porém, em que pese o texto constitucional incumbir ao poder público a promoção da
Educação Ambiental, verifica-se que muito pouco tem sido feito para a concretização desse
dispositivo. Como bem observa LOUREIRO, 2000, “a escassez de recursos para investir na
formação de quadros, na capacitação em Educação Ambiental e em sua viabilização nas
diversas instâncias do aparato público, reflete a falta de disposição política para
transformar o que existe institucionalmente”.
Porém, reconhecendo que a Educação Ambiental não estava sendo devidamente
aplicada como política pública, o governo federal instituiu os seguintes programas:
a) Programa Nacional de Educação Ambiental – PRONEA
O Ministério da Educação e do desporto – MEC e o Ministério do Meio Ambiente,
dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal – MMA, com a interveniência do Ministério da
Ciência e Tecnologia – MCT, formularam, em 1994, o Programa Nacional de Educação
Ambiental – PRONEA, na tentativa de cumprir mandato constitucional estabelecido no art.
225 daquele instituto legal, bem como os compromissos internacionais assumidos pelo país.
O PRONEA foi elaborado contemplando sete linhas de ação com objetivos e ações
estratégicas próprias a cada uma delas, procurando, assim, determinar subsídios políticos para
que outras instâncias da administração pública possam adequar seus programas de governo,
buscando o desenvolvimento da EA no Brasil. Propõe, ainda, diretrizes para viabilizar ações
em nível da sociedade civil como um todo. As linhas de ação definidas referem-se: 1)
Educação Ambiental através do ensino formal – capacitar o sistema de educação formal,
supletivo e profissionalizante em todos os níveis e modalidades de ensino; 2) Educação no
processo de gestão ambiental – orientar os gestores públicos e privados para que incorporem
a gestão ambiental em suas atividades; 3) Realização de campanhas específicas de Educação
Ambiental para usuários de recursos naturais – conscientizar os usuários dos recursos
naturais para a utilização responsável dos recursos, garantindo-lhes sustentabilidade e
41
promoção da qualidade de vida; 4) Cooperação com os que atuam nos meios de comunicação
e com os comunicadores sociais – viabilizar aos que atuam nos meios de comunicação as
condições adequadas para que contribuam na formação da consciência ambiental; 5)
Articulação e integração das comunidades em favor da educação Ambiental – mobilizar
iniciativas comunitárias adequadas à sustentabilidade; 6) Articulação intra e interinstitucional
– promover e apoiar a cooperação e o intercâmbio interinstitucional no campo da Educação
Ambiental; 7) Criação de uma rede de centros especializados em Educação Ambiental,
integrando universidades, escolas profissionais, centros de documentação em todos os
estados da Federação – viabilizar o aprofundamento de aspectos conceituais e metodológicos
da Educação Ambiental, desenvolver materiais didáticos, armazenar e difundir informações.
(LOUREIRO, 2000).
b) Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs
O Ministério da Educação e do Desporto – MEC, em 1997, formulou os Parâmetros
Curriculares Nacionais – PCN´s, referentes às quatro primeiras séries da Educação
Fundamental, através da inserção da questão ambiental como tema transversal, objetivando
apontar metas de qualidade que ajudem o aluno a enfrentar o mundo atual como cidadão
consciente, participativo, reflexivo e autônomo, conhecedor de seus direitos e deveres.
Recomenda que na seleção de conteúdos presentes no documento, os educadores deverão
considerar sua natureza interligada às outras áreas do currículo e a necessidade de serem
tratados de modo integrado, não só entre si, mas entre eles e o contexto histórico e social em
que as escolas estão inseridas. Com relação aos conteúdos de meio ambiente para os 1º e 2º
ciclos, a questão ambiental deve centrar-se no desenvolvimento de valores, atitudes e
posturas éticas e no domínio de procedimentos mais do que na aprendizagem de conceitos.
Pois os vários conceitos que o professor se baseará para tratar de assuntos ambientais
pertencem às áreas disciplinares. Mais do que um elenco de conteúdos, a temática ambiental
consiste em oferecer aos alunos instrumentos que lhes possibilitem posicionar-se em relação
às questões ambientais. Os conteúdos foram reunidos em três blocos gerais: Os ciclos da
natureza, Sociedade e Meio ambiente, Manejo e Conservação Ambiental. O MEC recomenda
aos educadores que na elaboração e execução de um projeto educativo, o tema meio ambiente
deve trazer uma visão ampla que envolva não só os elementos naturais do meio ambiente,
mas também os elementos construídos e todos os aspectos sociais envolvidos na questão
ambiental.
42
c) Lei nº 9795/99 – Política Nacional de Educação Ambiental, decretada pelo
Congresso Nacional, em 28 de abril de 1999.
Em seu art. 1º define a Educação Ambiental:
“Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida”.
Em seu art. 2º considera que “A Educação Ambiental é um componente permanente
da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada em todos os níveis e
modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal”.
Com a promulgação desta Lei, a Educação Ambiental se constitui em um instrumento
educativo na busca do desenvolvimento sustentável, definindo seu caráter interdisciplinar e
transversal, bem como a co-responsabilidade da sociedade na sua promoção, e inclusive,
respeitando as diretrizes e os pressupostos da Conferência de Tbilisi. Destaca em seu art. 4º
que “a Educação Ambiental é um processo educativo participativo, democrático, humanista,
que aborda o ambiente em sua totalidade e que associa ética-trabalho-educação, visando a
sustentabilidade”. Conforme PEDRINI, s.d.,“o importante a destacar é que esta é a
primeira lei na América Latina que torna oficial a Educação Ambiental como um
instrumento educativo para a busca de padrões sustentáveis de sociedade”.
PEDRINI, (s.d.), ao analisar a trajetória da Educação Ambiental, principalmente
quanto aos trabalhos realizados no Brasil, tece alguns comentários e preocupações relativos
aos discursos oficiais e a prática. Indica a necessidade de se reverter a prática de trabalho
pontual e desacompanhada de reflexão e seu registro.
Por outro lado, HOMEM D´ EL REY, 1996, coloca algumas questões importantes
sobre a prática em Educação Ambiental:
“Projetos de pesquisa de EA em sua maioria, limitam-se às informações, sem investir no que interferem no processo educativo. Como vivenciar os pressupostos da EA com paradigmas de Ciências que negam a abordagem de totalidade e a subjetividade no processo de conhecimento da realidade?
43
Na tentativa de contribuir na análise do processo de efetivação da Educação
Ambiental no Brasil, HOMEM D´ El REY, 1996, ressalta que “a dificuldade na
concretização da teoria da EA na prática é que as propostas estão desvinculadas do
ambiente de vida das pessoas. Para quem vive em favela e precisa morar nas encostas é
abstrato dizer-lhe que as chuvas podem causar deslizamento de terra, derrubar sua casa,
causando prejuízo e morte. Para quem vive a cidadania da sobrevivência o concreto é o aqui
e o agora, é o hoje; o risco de amanhã é distante, abstrato”.
Portanto, torna-se necessária uma educação que questione as “velhas fórmulas de
vida”, ou seja, uma educação holística que proponha a busca de ações concretas para
transformar nossa casa, nossa rua, nosso bairro, nossas comunidades, sejam elas no campo,
na fábrica, na escola, no escritório. (VIEZZER e OVALLES, 1995).
REIGOTA, 1995, ao analisar os princípios da Educação Ambiental alerta para a
necessidade de tornar claro qual é o papel político da educação ambiental, que segundo o
autor “representa ao mesmo tempo uma crítica e uma alternativa aos processos pedagógicos
conservadores. Mas a sua crítica/alternativa não se limita ao espaço educativo. Elas se
ampliam ao modelo econômico, social e cultural vigente, assim como às formas de se fazer
política, ciência e arte, sem esquecer ainda que ela pretende influir no cotidiano, propondo
relações sociais e afetivas baseadas na ética, na justiça e na sustentabilidade”.
Desse modo, a Educação Ambiental deve ter como base referencial uma nova
concepção ética, reforçando o elo de solidariedade entre os homens pela mudança de
comportamento nos padrões de produção e consumo e nos modos de vida, ou seja, uma
postura ética de transformação da sociedade. O enfoque crítico e o espírito criativo que a
caracteriza são indispensáveis para a tomada de consciência sobre a problemática sócio-
ambiental e suas soluções, conforme aponta GUERRA, 2000.
Assim, deve cada vez mais reforçar a organização da sociedade em todos os níveis,
redirecionando a integração do homem com o seu ambiente, no sentido de estabelecer novos
estilos de desenvolvimento que assegurem a melhoria da qualidade de vida e a satisfação das
reais necessidades da população.
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2.2. PAPEL DOS MOVIMENTOS SOCIAIS E MOVIMENTOS ECOLÓGICOS NA
BUSCA PELA CIDADANIA E PELO DIREITO À VIDA
A formação histórica, social e política da sociedade brasileira se efetivaram através de
mecanismos que negaram a esmagadora maioria da população o direito de exercer sua
cidadania – participar nas decisões, O que predominou foi a subordinação, a não participação
na solução dos problemas enfrentados.
Apesar da marca dominadora nas relações de poder estabelecidas com a população, diversas
lutas são empreendidas por distintos segmentos sociais, no sentido de modificar estas
relações, seja no plano político, econômico, social e ambiental, resgatando o conceito de
cidadania como condição essencial de expressão do desejo de participar e decidir.
A compreensão desse desejo fica clara ao se analisar o ideal básico que substancia o agir dos
Novos Movimentos Sociais - NMS, conforme aponta SCHERER-WARREN, (1993, p-54):
“O sentimento de uma tripla exclusão relativa – econômica, política, cultural/ideológica – sempre presente na história brasileira, mas que se acentua consideravelmente durante os anos mais duros do regime militar, está no bojo dos movimentos que vão se organizando. Assim, defende-se o direito de participar do consumo de bens e equipamentos coletivos, através dos Movimentos sociais Urbanos; o direito a permanecer na moradia e na terra ocupada, pelo Movimento dos Favelados; o direito à terra para o trabalho, pelo Movimento dos Sem Terra ou de preservar as terras produtivas, pelo Movimento das Barragens; o direito a não serem discriminados culturalmente, pelos Movimentos Éticos e assim por diante. Mas o relevante é que nestes movimentos defende-se também o direito de participar de decisões que afetam o destino de seus membros e o respeito por suas formas culturais. Portanto, o sentimento de exclusão relativa, ou a consciência da carência relativa, conduz às reivindicações, as quais são assumidas como um direito”.
Desse modo, os movimento sociais através de suas lutas empreendidas buscam
redefinir a cidadania, apontando novas formas de relações sociais, negando a forma
autoritária assumida historicamente pelo Estado. Para tanto, vêm definindo estratégias de
atuação alicerçadas em uma prática política e social renovada, a partir de princípios
defendidos pelos educadores populares, precisamente vinculados à FASE, “... essa cidadania
coletiva e orgânica das massas pressupõe a conquista de um direito essencial (que deve ser
inalienável) pelos movimentos populares: o direito de conquistar (e gerir) direitos”.
(SCHERER-WARREN, 1993).
45
Conceituando o movimento social, TREVIZAN, 2000, afirma que “Todo movimento
social é uma forma de comportamento coletivo, embora nem todo comportamento coletivo
constitua um movimento social. Nesta categoria incluem-se aqueles comportamentos que
buscam mudanças radicais ou reformistas, podendo apresentar vários níveis de
organização”. A partir desta conceituação, o autor considera que “por sua organização e
objetivos, o movimento de luta pela terra apresenta todas as características de um
movimento social”.
Para garantir a conquista destes direitos, a participação comunitária torna-se essencial
como forma de luta e de modo de vida. Como exemplo, pode-se citar o Movimento dos Sem
Terra - MST que estabeleceu uma nova forma coletiva de exercer a cidadania que é “o
coletivismo enquanto forma de organização social, reivindicando a posse coletiva da terra
através da Reforma Agrária”. (SCHERRER-WARREN, 1993).
Para efeito dessa análise será dado destaque aos movimentos sociais relacionados às
questões rurais e ambientais, que segundo SHERER-WARREN, 1993, se enquadram nos
denominados Novos Movimentos Sociais – NMS, “que almejam atuar no sentido de
estabelecer um novo equilíbrio de forças entre Estado (aqui entendido como o campo da
política institucional: do governo, dos partidos e dos aparelhos burocráticos de dominação)
e sociedade civil (campo da organização social que se realiza a partir das classes sociais ou
de todas as outras espécies de agrupamentos sociais fora do Estado enquanto aparelho),
bem como no interior da própria sociedade civil nas relações de força entre dominantes e
dominados, entre subordinantes e subordinados”.
a) Movimentos Sociais Rurais
Os movimentos sociais rurais estiveram presentes em toda a história da formação da
sociedade brasileira.
Traçando uma trajetória dos movimentos sociais rurais no Brasil, a estudiosa do assunto,
SCHERER-WARREN, 1993, dá uma excelente contribuição histórica a este rico processo de
luta pela conquista da cidadania e pelo direito à vida. Com base no estudo realizado pela
autora, consideramos relevante destacar os principais acontecimentos históricos ocorridos no
meio rural no decorrer da formação social brasileira.
46
a) Século XVII – movimentos com orientação separatista para a libertação dos escravos.
Os quilombos nordestinos possibilitaram a fuga dos negros submetidos à opressão da força
de trabalho escravo e a restauração da cultura de um povo. O quilombo dos Palmares cujo
líder Zumbi tornou-se o símbolo da resistência contra a discriminação dos negros no Brasil.
b) Século XVIII e início do século XIX – são palco dos movimentos nativistas
(Cabanagem, Balaiada, Farroupilha, Praieira) que contavam principalmente com a
participação de proprietários rurais. Opunham-se à centralidade do poder político e
econômico das elites portuguesas e seguiam orientações separatistas.
c) 2ª metade do século XIX e 1ª metade do século XX – O messianismo e o banditismo
social às vezes expressando-se como duas faces de um mesmo movimento, ocuparam o
cenário da história do Brasil, destacando-se as revoltas de Canudos, Juazeiro, Muckers,
Contestado e o Cangaço. Tratavam de manifestações e lutas que, diante das más condições de
vida dos camponeses tentavam estabelecer uma nova ordem social, tendo freqüentemente a
estrutura social do passado como referência.
d) No século XX, a partir da década de 40 – as lutas pela posse e uso da terra se
multiplicam. Inicialmente ocorrem os movimentos dos posseiros entre os quais se destacou o
Levante de Trombas e Formoso, no interior de Goiás (1948-60) que contou com a mediação
do PCB que pretendia disseminar o movimento em vista da realização de uma reforma
agrária radial.
Segundo a autora, a partir da década de 50 a luta pela terra começa a ultrapassar o nível das
ações localizadas e a empreender articulações regionais de alcance nacional. “A I
Conferência Nacional dos Trabalhadores Agrícolas é realizada em São Paulo, em 1953, e no
ano seguinte, durante a II Conferência é criada a União dos Lavradores e Trabalhadores
Agrícolas do Brasil – ULTAB, que inicia a luta nacional por uma reforma agrária ampla,
contando com o apoio do PCB”. (WARRWN-SCHERER, 1993)
Continuando sua análise, a autora documenta que as Ligas Camponesas sob a
liderança de Francisco Julião vêm engrossar esta luta a partir do Nordeste e o Movimento dos
Agricultores Sem Terra – MASTER com Brizola a partir do RGS (1960).
47
A Igreja Católica entra em cena e passa a organizar os camponeses através dos
sindicatos rurais. Os sindicatos de trabalhadores rurais se multiplicam por todo país, passando
a ser legalizados pelo Estado e, unificando-se em 1963, através da Confederação Nacional
dos Trabalhadores Rurais – CONTAG.
As lutas contra as más condições de vida e pela restauração social ainda que de um
passado idealizado como nos movimentos messiânicos, dão lugar às lutas pela manutenção
da condição de camponês. Ou seja, pela posse e uso adequado da terra.
Todas esta lutas têm, pois, como referencial fundamental a própria sobrevivência do
grupo social.
Após o Golpe Militar de 1964, há um período em que apenas o sindicalismo rural
(trabalhador e patronal) continua se disseminando pelos municípios brasileiros, porém com
características cada vez mais assistencialistas. A repressão militar sob a forma de ameaça não
permite e formação de outros movimentos sociais no campo até a 2ª metade da década de 70.
A partir do final da década de 70, verifica-se um grande crescimento do número de
organizações e manifestações no campo. Dentre estas, destacam-se os acampamentos e
assentamentos dos Sem-Terra que lutam por uma reforma agrária imediata.
A autora apresenta exemplos de movimentos que lutam pela manutenção de suas
terras e que são os que mais têm aproximação com os movimentos ecológicos e de defesa do
meio ambiente, quais sejam: a) Movimentos dos camponeses atingidos por barragens; b)
Movimentos dos indígenas; c) Movimento dos seringueiros. Porém, reconhece que a
problemática ambiental só muito recentemente começa a penetrar a área de estudo dos
movimentos sociais rurais.
Dos estudos elaborados sobre os movimentos sociais rurais e a questão ambiental,
destacamos a contribuição de TREVIZAN, 2000, que ao analisar a relação entre degradação
ambiental, grandes proprietários rurais e pequenos produtores rurais familiares, afirma que
“o pressuposto de que pequenos produtores representam maior ameaça ao ambiente devido
ao uso de sistemas intensivos de plantios não pode ser mantido”.
48
Isto porque, conforme o autor, “nas suas diferenças em se relacionar com os recursos
naturais, tanto as classes privilegiadas quanto as desfavorecidas atuam no processo de
deterioração do meio, embora ajam por razões também diferentes. As primeiras
desequilibram o meio ambiente devido ao seu elevado consumo, especialmente dos recursos
energéticos, ou pela avidez em acumular, no menor tempo possível, um maior volume de
capital. Os mais desfavorecidos da sociedade degradam os recursos naturais devido à luta
desesperada pela sobrevivência”. (TREVIZAN, 2000).
A luta pela sobrevivência das camadas populares assume, portanto, uma dimensão
existencial. É uma forma de luta pela solução dos problemas mais emergentes, aqueles que
afetam, cotidianamente, a qualidade de vida dos cidadãos, sejam eles do campo ou da cidade.
TREVIZAN e ALGER, 2000, em seu artigo sobre “Os Movimentos Sociais de Luta
pela Terra e a Sustentabilidade”, publicado nos Anais do XXXVIII Congresso Brasileiro de
Economia e Sociologia Rural, analisam que “à medida em que os movimentos sociais de luta
pela terra se organizam e se estruturam, vão também ultrapassando a simples meta de
conquista pela terra, e passam a lutar por direitos, a elaborar novos sonhos de vida e definir
estratégias para a conquista dos mesmos”, isto é, lutam pela garantia do exercício da
cidadania.
O Assentamento de Reforma Agrária da Marambaia, no Sul da Bahia, contexto desta
investigação, é desvinculado tanto do Movimento dos Sem Terra – MST, quanto do
Movimento de Luta pela Terra – MLT. Porém, está vinculado a outras instituições. Os
assentados participam do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itacaré, e mantém vínculos
com a Federação dos Trabalhadores Rurais na Agricultura – FETAG, através da sua forma de
organização, a Associação dos Parceleiros da Marambaia.
Na época da conquista da terra (1983/86), os trabalhadores rurais (em torno de 100)
com pouca capacidade de organização, tiveram o apoio do Sindicato de Trabalhadores Rurais
de Itacaré, de membros do PCdoB e de parlamentares da oposição (PMDB), segundo
informações das lideranças comunitárias da Marambaia. O INCRA procedeu a
desapropriação da área emitindo a posse aos 32 assentados em 1986, prestando assistência
técnico-social, contando com a orientação técnica nos projetos agrícolas da CEPLAC de
1987 a 1993. A partir deste ano, o INCRA contratou a equipe técnica da Cooperativa de
49
Trabalho do Estado da Bahia – COOTEBA, vinculada ao Programa Nacional de Reforma
Agrária – Projeto LUMIAR, cujo contrato foi encerrado no início do ano 2000.
Durante o desenvolvimento desta pesquisa (junho a fevereiro de 2000), os assentados
não tiveram assistência técnica de nenhum órgão governamental ligado à agricultura. No
entanto, estando situados na Área de Proteção Ambiental – APA Costa de Itacaré – Serra
Grande, o Instituto de Estudos Sócio-Ambientais do Sul da Bahia - IESB, uma Organização
Não Governamental – ONG, contando com o aporte financeiro da Fundação pela
Biodiversidade – FUNBIO / Fundação FORD, vem desenvolvendo no assentamento, a partir
de outubro de 2000, o projeto “Comunidades Rurais e Florestas da APA”, construindo um
modelo de desenvolvimento sustentável, na linha da capacitação em assuntos ligados à
agroecologia, cuja experiência está relatada no capítulo “Conhecendo a Marambaia”.
Desse modo, o estudo de casos desenvolvido por TREVIZAN e ALGER, 2000, nos oito
assentamentos estudados no sul da Bahia, nos forneceu elementos para uma maior
compreensão sobre a sustentabilidade no Assentamento Marambaia, e da necessidade do
desenvolvimento de práticas educativas participativas com os assentados como estratégia de
fortalecimento das ações comunitárias na busca da concretização dos seus sonhos, das suas
aspirações, da sua cidadania.
b) Movimentos Ambientalistas
Em se tratando de luta ambiental, o processo de conscientização sobre os problemas
ambientais, no Brasil, é recente. O surgimento do movimento social ecológico na América
Latina se dá na década de 70, em Porto Alegre – Brasil, com a fundação da Associação
Gaúcha de Proteção do Ambiente Natural - AGAPAN, em 1971, encabeçado pelo Eng.
Agrônomo José Lutzenberger, tendo como principal questão a denúncia do uso abusivo de
agrotóxicos e outras formas de poluição do solo, do ar e dos recursos hídricos, colocando a
ecologia como ciência da sobrevivência e difundindo uma nova moral ecológica (VIOLA,
1990).
Analisando o movimento ambientalista, VIOLA e LEIS, (1998), dizem que inicialmente
este movimento foi de caráter bissetorial, composto por intelectuais da classe média com
baixa participação e representação na sociedade, cuja característica principal foi a denúncia
50
dos danos cometidos ao meio ambiente. Com o aumento da preocupação pública com a
problemática ambiental, o movimento ecológico a partir da década de 80, transforma-se em
um “movimento multissetorial”, composto por oito setores, desde o ambientalismo stricto
sensu ao ambientalismo dos educadores”.
A década de 90, representa um novo estágio do ambientalismo brasileiro em virtude da
preparação da Rio-92, quando foram discutidas questões relacionadas a compatibilização
entre o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental.
Neste evento, o movimento ambientalista reuniu-se de forma paralela ao evento oficial e
aprovaram 36 tratados, dentre os quais se destaca o Tratado de Educação Ambiental para
Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, iniciando-se um processo de pensar a
educação de forma holística e a partir da vida.
Segundo FERREIRA, 1996, a RIO-92, tanto na sua preparação como na sua realização
“gerou um diálogo intenso e duradouro entre militantes verdes de todo o mundo e outros
movimentos sociais, de natureza cultural, corporativa, religiosa, trabalhista, étnica, de
gênero”.
Ainda, conforme a autora, “o engajamento nesse processo pode ser traduzido como a
expressão de um novo projeto social, que ultrapassa os limites setoriais, para a construção de
um espaço comum de luta, no qual a qualidade ambiental não é mais uma causa em si, mas
um componente de um compromisso mais amplo com o futuro e com a sustentabilidade”.
VIOLA e LEIS (1998), estudiosos do movimento ambientalista brasileiro, consideram
que após a Rio-92, o movimento vem atravessando uma fase de “desorientação”, a partir,
sobretudo dos seguintes aspectos:
- “carência de uma agenda estruturada e concreta da questão da sustentabilidade para a sociedade brasileira; - falta de elementos teóricos e analíticos a respeito de como construir-se uma coalizão sócio-política sustentabilista no Brasil (que defina quais são os atores favoráveis, quais os atores abertamente contrários, quais os elementos programáticos a serem negociados, quais os atores mais inclinados a serem persuadidos e que atualmente encontram-se num campo neutro, e qual o timing do processo; - bases organizativas ainda precárias com tendência a sobredimensionar as superestruturas; - comunicação ainda parcial e deficitária intersetores (do ambientalismo);
51
- produção limitada e baixa circulação da informação”...
Porém, apontam para a necessidade do movimento ambientalista procurar saídas para
o impasse atual do movimento, na linha de assumir as questões acima colocadas, tornando
suas propostas mais realistas e concretas, menos utópicas e radicais. (VIOLA e LEIS,1998).
Por outro lado, colocam também que o movimento deve estabelecer uma atuação
voltada para as políticas públicas que viabilize a sustentabilidade ambiental, incluindo em
suas preocupações a: política agrária, política industrial, política energética, política de
ciência e tecnologia, política financeira.
Em que pese a análise crítica feita por VIOLA e LEIS (1998), visando uma maior
estruturação dos movimentos ecológicos no Brasil e envolvimento da população na luta
ambiental, há que se reconhecer o relevante papel de grupo de pressão exercido por estes
movimentos às agressões cometidas ao ambiente, principalmente por parte dos setores
produtivos.
Ao lado dos movimentos ambientalistas, surgem as Organizações Não
Governamentais – ONG´s, compostas na sua maioria por profissionais das mais diversas
áreas do conhecimento, que vêm realizando estudos técnicos voltados para a questão
ambiental, notadamente na linha da biodiversidade. Estas ONG´s também prestam orientação
técnica aos diversos grupos populares e executam projetos de Educação Ambiental para a
Cidadania, objetivando o aumento da conscientização ambiental das populações.
Enfim, tanto os movimentos sociais rurais, quanto os movimentos ambientalistas e
ONG´s desempenham um papel significativo na sociedade brasileira, o de colocar-se ao lado
das camadas populares na busca do exercício da cidadania e pelo direito à vida, preenchendo
como afirma TREVIZAN e ALGER, 2000, “uma lacuna que o Estado não consegue (ou não
interessa) atender”.
Conforme HABERMAS, 1990, citado por FERREIRA, 1996; “o fato dos movimentos
sociais contemporâneos assumirem traços culturais altamente inovadores não é mero acaso.
Sua razão de ser é a ameaça a identidades coletivas bem demarcadas. Embora, na maioria das
vezes, tais identidades permaneçam vinculadas a particularismos e especificidades
52
excessivas, estas são obrigadas a cotidianamente incorporar, em si mesmas, o conteúdo
normativo da modernidade... se o estado nacional democrático era até então a única
possibilidade de formação de identidades que fogem a especificidades, aquele capaz de unir o
particular ao universal, a alternativa dos movimentos sociais com o mesmo papel, pode ser
muito mais eficaz à auto-organização e emancipação da sociedade”
2.3. OS PRESSUPOSTOS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL E SUA IMPORTÂNCIA
COMO INSTRUMENTO DE CIDADANIA
A Educação Ambiental deve ser entendida a partir de alguns pressupostos que devem
nortear toda a ação concreta em busca de uma real participação da comunidade em torno das
questões ligadas ao seu ambiente de vida.
Reportamos aqui, a uma afirmativa de FREIRE, 1997, que diz::
“Um esforço de educação, compreendida em sua perspectiva verdadeira não é outra senão a de humanizar o homem na ação consciente que este deve fazer para transformar o mundo”.
À luz desta reflexão, que a primeira vista parece filosófica, é que o autor ressalta que
devemos iniciar as preocupações com o conhecimento da dimensão humana e das diferentes
formas como o homem conhece as suas relações com o mundo e a natureza.
Desse modo, parece inadiável, que a questão ambiental deve ser entendida como a
história das relações, entre o homem e a natureza, tendo o homem como o centro da
discussão.
...”não o homem abstrato, mas o homem concreto, que não existe senão na realidade concreta que o condiciona... Conhecer não é o ato através do qual um sujeito transformado em objeto, recebe dócil e passivamente os conteúdos que os outros lhe impõe. O conhecimento, pelo contrário, exige uma presença curiosa do sujeito em face do mundo. Requer sua ação transformadora sobre a realidade”... (FREIRE, 1977)
Portanto, qualquer tentativa que pretenda a participação comunitária para a
conservação ambiental, envolve a problemática das relações dos homens e o mundo e das
relações com outros homens, no sentido de possibilitar o aprofundamento da tomada de
consciência da realidade em que se situam. E, esta realidade, só pode ser entendida em sua
53
totalidade, ou seja, a partir da interrelação existente entre a natureza e os aspectos políticos,
sociais, econômicos e culturais, com que se defronta o ser humano.
Para se falar em educação ambiental, é preciso ter claro qual a definição de educação
e de educação ambiental? Quais os conceitos implícitos no processo de educação ambiental?
Quais as características de educação ambiental?
SEARA, 1992, analisando a amplitude da educação ambiental, compreende a
educação como:
“A educação, entendida como processo pedagógico que orienta o indivíduo na expressão de suas potencialidades, conjuga uma série de meios e métodos para desenvolver no educando, sobretudo sua capacidade crítica, seu espírito de iniciativa e seu senso de responsabilidade”.
A partir desse conceito de educação, o autor considera que os objetivos da educação
ambiental são o de “formar uma cidadania com visão objetiva do funcionamento da
sociedade, motivada para a vida coletiva e consciente de que a qualidade de vida das
gerações futuras depende das escolhas que o cidadão fizer em sua própria vida”.
Diante da complexidade que permeia a questão ambiental, compreendendo uma
infinidade de relações físicas, químicas, biológicas, econômicas, políticas, sociais, culturais
que interferem na natureza, sobretudo a partir da ação do homem, a educação ambiental não
deve se transformar em “panacéia para todos os problemas, risco que se corre nestes tempos
em que a preocupação com o meio ambiente se tornou muito aguda e generalizada”.
(SEARA, 1992).
Portanto, as características de um trabalho de educação ambiental devem estas
consubstanciadas numa perspectiva crítica, contextualizada e transformadora, propiciando o
caráter formativo e não só informativo da Educação, bem como uma prática voltada para as
diferentes realidades de vida, conforme propõe ANDRADE, 1993, em sua Dissertação de
Mestrado.
Sendo o tema gerador da educação ambiental o “ambiente”, consideramos importante
definir o seu conceito. Para tal, utilizamos o entendimento expresso na Apostilla “Viva a
54
Floresta Viva”, elaborada pelo Instituto de Pesquisa e Educação Ambiental – LARUS,
patrocinada pelo Governo de Santa Catarina, que para conceituá-lo parte da idéia de que “a
questão ambiental é a contradição entre o estilo dos atuais modelos de desenvolvimento e
sua sustentação. Este estilo é marcado pela concentração de riquezas e a geração de
pobreza na sociedade e pela poluição e degradação da natureza. Hoje, temos claro que nem
a sociedade resiste à tanta pobreza, nem a Biosfera à tamanha degradação”. Desse modo, o
conceito de ambiente fundamenta-se em que:
“A Biosfera possui apenas duas organizações fundamentais: os ecossistemas da natureza e os sistemas culturais das sociedades humanas. Cada uma delas se comporta de modo diferente. Assim, o ambiente é o resultado das relações entre estas duas organizações. É o resultado das relações entre a sociedade e a natureza.”.
O conceito de educação ambiental adotado nesta pesquisa se pauta nos princípios
definidos pela Conferência de Tbilisi, 1977 que definiu a Educação Ambiental como:
“Uma dimensão dada ao conteúdo e à prática de educação, orientada para a resolução dos problemas concretos do ambiente, através de enfoques interdisciplinares e de uma participação ativa e responsável de cada indivíduo e da coletividade”.
Com estas definições, os pressupostos básicos que norteiam a prática de Educação
Ambiental desenvolvida por esta pesquisadora com os pequenos produtores rurais da
Marambaia, estão fundamentados em ANDRADE e LOUREIRO, In HOMEM D´EL REY,
1993, onde recomendam “a necessidade de repensarmos as nossas relações na natureza,
nossas propostas de vida e sua ética, é que, na Educação Ambiental, propomos alguns eixos
centrais, que são pronunciados por todos, porém pouco compreendidos na origem, tornando-
se “chavões” de discurso que só colaboram para que ela se transforme em uma prática
social limitada, isolada, sem atender aos interesses e necessidades do povo na busca de uma
outra qualidade de vida”.
Os pressupostos da Educação Ambiental, definidos pelos autores estão baseados nas
postulações da Conferência de Tbilisi, 1977, e que foram adotados pela pesquisadora, são:
• Unidade Ecológica – baseada na Hipótese Gaia “consiste na percepção das relações
existentes no planeta como uma teia, em que qualquer alteração local tem efeitos
globais”... “A percepção da Unidade Ecológica, portanto, corresponde a uma visão
55
holística, que ressaltamos, não deixa de comportar a dialética”...(ANDRADE,
1993).
O paradigma holístico se contrapõe à visão fragmentada do paradigma cartesiano
ainda existente em nossa cultura. O “Holos” significa que “cada parte é um todo”, a
compreensão do conceito de totalidade – holismo (compreensão da realidade que
articula o todo nas partes e as partes no todo, pois vê tudo como um processo
dinâmico, diverso e uno), nos remete ao conceito de interdisciplinaridade, que
possibilita a integração das diversas áreas do conhecimento, a partir da construção de
um novo conhecimento, sem que nenhum abandone ou negue a sua especificidade.
• Interdisciplinaridade – A temática ambiental envolve a interação dos fatores, físicos,
biológicos, sociais, políticos, econômicos, culturais. Portanto, a abordagem
interdisciplinar possibilita a adoção de estratégias para a formação integral do cidadão
na busca de soluções coletivas aos graves problemas socio ambientais. A
interdisciplinaridade propicia a participação de todos os envolvidos no processo
educativo, pois estabelece o diálogo com outro saber, num exercício de pensar e
construir coletivamente um novo saber.
• Participação – Constitui-se na condição essencial para o exercício da cidadania, pois
reconhece a voz competente no outro, não apenas para opinar ou responder
questionários para subsídios dos técnicos em suas pesquisas, mas, sobretudo para
decidir junto sobre o que fazer, como fazer e quando fazer, como bem orienta
HOMEM D´EL REY, 1996. Numa prática de Educação Ambiental, o pressuposto
participativo é imprescindível pois, “a participação é um direito inalienável da
pessoa na tomada daquelas decisões que afetam seu destino, na busca do
desenvolvimento pleno do indivíduo encarado não como elemento isolado, mas como
membro de um corpo social”. (BORDENAVE, 1987).
• Processo contínuo e permanente – Sendo a Educação Ambiental um processo, que
ocorre durante todos os momentos e em todos os espaços sociais, o seu caráter
permanente e contínuo é inquestionável, conforme expressa HOMEM D´EL REY, 1996,
56
pois segundo a autora, a Educação Ambiental, “é um processo de auto-conhecimento e
auto-transformação do ser humano”.
Os quatro pressupostos teóricos acima referidos aliados à necessidade da prática de
Educação Ambiental se voltar para a realidade concreta na busca da resolução dos problemas
vivenciados pela comunidade envolvida no processo, consubstanciam o papel da Educação
Ambiental na construção da cidadania em busca de um ambiente digno de se viver.
A partir dos pressupostos que servem como princípios básicos ao trabalho educativo na
área ambiental, SEARA, 1997, considera importante destacar os objetivos da EA para a
concepção e a execução dos programas de EA, quais sejam:
Conscientização: ajudar os indivíduos e os grupos sociais a tomarem consciência de
como o ambiente global e local interage com suas atuações cotidianas. Desta forma amplia-se
o nível cognitivo dos indivíduos e grupos sociais, facilitando o processo de conscientização
deles sobre o meio ambiente e seus problemas.
Conhecimentos: ajudá-los a compreender o ambiente global, a multiplicidade de relações
que existe entre os elementos que o constituem, o homem inclusive, a responsabilidade e o
papel crítico reservado a ele. É preciso despertar o sentimento e a emoção das pessoas frente
às questões sócio-ambientais.
Atitudes: levá-los a desenvolver valores sociais, sentimentos de interesse pelo ambiente e
motivação forte para tomar parte na tarefa de conservá-lo e melhorá-lo.
Competências: desenvolver entre eles competência específica que tornem operativos os
conhecimentos e as atitudes adequadas através das ações concretas sobre o ambiente.
LOUREIRO, 1992, em sua Dissertação de Mestrado, afirma que a “Educação Ambiental
é um processo educativo, de formação da cidadania que visa a Qualidade de Vida dos
envolvidos. Assim a especificidade da Educação Ambiental é trazer para a Educação o
respeito à Vida como seu eixo central, promovendo a superação da dicotomia sociedade-
natureza em um processo crítico de construção da cidadania”.
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O processo crítico de construção da cidadania, segundo o autor, passa pela adoção da
interdisciplinaridade na prática educativa, pois “é uma resposta clara contra essa sociedade
injusta em sua estrutura e que aliena o homem de si e em suas relações, que produz o
individualismo exacerbado e limita o lado criativo e coletivo de todos nós”. (LOUREIRO,
1992).
Em um trabalho junto às camadas populares, LOUREIRO, 1992, observa que um dos
“primeiros elementos a se aflorar é a arrogância das classes dominantes que ao impor seu
projeto de exclusão social, levou as classes populares a uma luta perversa pela
sobrevivência. Esse processo induziu os moradores de áreas carentes a uma postura dúbia:
há momentos de profundo individualismo, valendo de tudo para se conseguir concretizar um
objetivo, simultaneamente ao desejo de organização comunitária como caminho reconhecido
para se melhorar as condições de vida”.
Portanto, os desafios a serem enfrentados numa prática participativa de educação
ambiental com pequenos produtores rurais (excluídos socialmente) são muitos. E uma das
maiores dificuldades é como confrontar a teoria com a prática da Educação Ambiental, pois
observamos que a maioria das propostas educativas junto às camadas populares está
desvinculada do ambiente de vida das pessoas, dos reais interesses e necessidades da
população.
Neste contexto de luta pela sobrevivência vivenciada pelos pequenos produtores rurais de
um assentamento de reforma agrária (Marambaia), consideramos importante ressaltar o
ensinamento fornecido por HOMEM D´EL REY, 1996, quando afirma:
“Por isso dizemos que vivenciar a EA exige uma pedagogia diferente da utilizada na escola. Essa pedagogia diferente, capacitadora, nós do GEA (Grupo de Estudos em Educação Ambiental – UFRJ) chamamos de ‘pedagogia de desafios’, porque trabalhar a EA contextualizada, participativa, capacitadora, conseqüentemente, emancipatória, é atuar no confronto da correlação de forças que interagem na problemática de vida das pessoas”.
Portanto, avançar neste processo de construção de uma educação ambiental popular, ou
melhor, utilizar a “pedagogia dos desafios”, exige a adoção de modelos metodológicos que
respondam aos desafios da sobrevivência. Várias são as metodologias existentes no campo
científico, porém concordamos com LOUREIRO, 1992, de que “as metodologias
58
participativas são as mais adequadas para a construção do conhecimento através da práxis
social e da aproximação teórica e prática”. Por ser um desafio, devemos enfrentá-lo.
2.4. A PESQUISA-AÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NOS
ASSENTAMENTOS DE REFORMA AGRÁRIA
Lutar pela sobrevivência e conquistar sonhos de uma vida melhor são os desafios
colocados aos assentados de reforma agrária, que vivem numa sociedade onde a exclusão
social é uma tônica do estilo de desenvolvimento adotado no país.
Em se tratando de uma comunidade rural, onde os seus mais elementares direitos não
estão garantidos, falar da problemática ambiental parece ser a primeira vista uma questão
distante do seu cotidiano de vida. Isto é um grande desafio, porém não devemos utilizar o
argumento de que não estando resolvidas as condições sociais mínimas das pessoas, qualquer
proposta de Educação Ambiental está fadada ao fracasso. Por que afinal, o que é educação?
E, por conseguinte, o que é a educação ambiental?
FREIRE, 1993, expoente da educação popular, nos ensina que:
“Não haveria educação se o homem fosse um ser acabado. O homem pergunta-se: quem sou?, de onde venho? Onde posso estar? O homem pode refletir sobre si mesmo e colocar-se num determinado momento, numa certa realidade: é um ser na busca constante de ser mais e, como pode fazer esta auto-reflexão, pode descobrir-se como um ser inacabado, que está em constante busca. Eis aqui a raiz da educação”.
Em se tratando de educação ambiental, cabe aqui mencionar VIEZZER e OVALLES,
1995, que afirmam “a educação popular ambiental se baseia na premissa de que é na
reflexão sobre a ação individual e coletiva em relação ao meio ambiente que se dá o
processo de aprendizagem. ‘A beleza de ser um eterno aprendiz’, na expressão de
Gonzaguinha, adequa-se particularmente à educação ambiental. Porque a relação dos seres
humanos com o meio ambiente nunca é um assunto acabado. ‘É a vida’.
Portanto, o que vai garantir o sucesso ou não de um trabalho educativo ambiental
popular é o “olhar sobre a realidade”, no caso o ambiente de vida dos assentados. Este
enxergar o ambiente precisa segundo HOMEM D´EL REY, 1997 “ser com os olhos de todos
59
os sujeitos e para todos os lados. As prioridades precisam ser definidas em conjunto e a
responsabilidade da implementação do processo, compartilhada por todos”.
TREVIZAN, 2000, afirma que “o discurso da biodiversidade, da sustentabilidade
ambiental para futuras gerações, do mau cheiro, etc., pode ser convincente num contexto de
classe média e alta, de bem alimentados e despreocupados com o agora. Mas, num ambiente
social de fome, miséria e desespero pela sobrevivência, tal discurso não ecoa ou provoca
indignação”.
Concordamos com o autor, pois algumas propostas de educação ambiental se pautam
no discurso, na teoria, numa visão fragmentada do ambiente, ou seja, prioriza o aspecto
natural, desvinculada da realidade social e cultural. Além de algumas propostas serem
impostas, numa postura de que a verdade científica é a única, sendo a comunidade um mero
objeto de pesquisa. Uma educação ambiental pautada nesta prática, aí sim, “não ecoa” ou
“provoca indignação”.
Contudo, existem experiências de educação ambiental no Brasil, realizadas em
contextos onde a comunidade, mesmo em estado de precárias condições de vida, deu um
salto qualitativo e coletivamente conseguiu resolver os problemas vivenciados. É bem
verdade, que a maioria dessas experiências foram desenvolvidas em áreas urbanas (favelas,
bairros populares, morros, etc.,). Porém algumas também se realizaram em áreas rurais
(seringueiros, áreas de inundações por Barragens, etc.).
Parece que o diferencial está no tipo de metodologia adotada, na postura e no
compromisso do profissional e nos objetivos pretendidos das propostas de educação
ambiental popular.
Os métodos de educação popular, tão bem desenvolvidos por Paulo Freire e por
diversos movimentos sociais no campo e na cidade, podem ser adotados em uma prática de
educação ambiental, pois preconiza a formação de cidadãos críticos e conscientes no seu
papel de transformar a realidade. Se a realidade socio ambiental é de fome e de miséria, a
deterioração do ambiente se dá em virtude do uso dos recursos naturais pela comunidade para
responder as suas necessidades imediatas de sobrevivência. Portanto, uma proposta de
60
educação ambiental de caráter popular e de ação política deve se adequar e esta realidade e
não desvinculada dela.
Desse modo, a opção pela pesquisa-ação se baseia em THIOLLENT, 1995, que a
entende como “uma estratégia metodológica de pesquisa social, onde a participação dos
pesquisadores é explicitada dentro da situação de investigação e quando os pesquisadores
não querem limitar suas investigações aos aspectos acadêmicos e burocráticos da maioria
das pesquisas convencionais”.
Estas modalidades de pesquisas participativas têm como premissa básica facilitar às
pessoas os meios para que possam conduzir mais livremente as transformações que se fazem
necessárias a um processo educativo.
A ação transformadora da realidade é uma premissa básica da pesquisa-ação que
segundo THIOLLENT, 1985 “tem sido concebida principalmente como metodologia de
articulação do conhecer e do agir (no sentido de ação social, ação comunicativa, ação
pedagógica). De modo geral o agir remete a uma transformação de conteúdo social,
valorativamente orientada no contexto da sociedade. Paralelamente ao agir existe o fazer
que corresponde a uma ação transformadora de conteúdo técnico delimitado”.
Porém, vale mencionar que as metodologias participativas são bastante criticadas no
meio acadêmico e científico, pois muitas vezes “são confundidas com ativismo político,
espontaneísmo e populismo, que desencadeiam um processo anti-científico, e
inevitavelmente fogem ao saber e às categorias analíticas indispensáveis”. (ANDRADE, et al,
1994).
Entretanto, pesquisadores como Michel Thiollent, Carlos Rodrigues Brandão, João B.
Pinto, Pedro Demo e outros vêm desenvolvendo pesquisas sociais com base na metodologia
participativa, dando significativas contribuições ao meio científico, “tornando a modalidade
importante opção metodológica nas áreas humanas e sociais e, especificamente, em educação
voltada para as classes populares”. (LOUREIRO, 1992).
Vencido este preconceito “academicista”, reafirma-se a necessidade de dizer que
“podemos optar por instrumentos de pesquisa não aceitos pela maioria dos pesquisadores de
61
rígida formação à moda antiga, sem por isso abandonar a preocupação científica”, como
bem coloca THIOLLENT, 1985.
Isto porque uma pesquisa-ação não se constitui apenas pela ação e participação, mas
também produz conhecimentos, vivencia experiências, contribui nos debates e discussões
sobre a temática abordada. (THIOLLENT, 1985).
Desse modo, consideramos que a pesquisa-ação se constitui em uma das estratégias
de educação ambiental nos assentamentos de reforma agrária, pois consiste em gerar na
comunidade um processo de auto-diagnóstico e de auto-transformação, com vistas não só a
conscientização dos seus problemas, mas que também conheçam as causas e proponham
soluções para as necessárias mudanças.
Na aplicação desta metodologia de pesquisa-ação os pesquisadores e pesquisados
(assentados) exercem relevante papel enquanto seres ativos e participantes no processo de
mudança de percepção e na atitude dos assentados perante seus problemas ambientais, que de
certa forma influenciam nas suas condições de sobrevivência.
Por mais difícil que seja colocar a temática ambiental no âmbito das discussões do
ambiente de vida dos assentados, vale a pena tentar. Por que só no enfrentamento dos
problemas é que juntos encontraremos as saídas, os caminhos para a sustentabilidade socio
ambiental. Assim, a educação ambiental de caráter popular pode ser um “instrumento crítico”
de viabilização do desenvolvimento sustentável nos assentamentos de reforma agrária.
62
CAPÍTULO 3. CONHECENDO A MARAMBAIA
“O desenvolvimento de uma consciência crítica que
permite ao homem transformar a realidade se faz cada
vez mais urgente. Na medida em que os homens,
dentro de sua sociedade, vão respondendo aos desafios
do mundo, vão temporalizando os espaços geográficos
e vão fazendo história pela sua própria atividade
criadora”.
Paulo Freire (1983)
A escolha da comunidade rural estudada incidiu sobre uma área de reforma agrária
denominada Marambaia, localizada a 6 Km da cidade de Itacaré, no entroncamento da BA –
001 da estrada Ilhéus-Itacaré e da BA-654 da estrada Ubaitaba-Itacaré, no Litoral Sul da
Bahia, uma das poucas regiões do Brasil onde se encontram ainda significativos
remanescentes da Mata Atlântica.
A Mata Atlântica do Sul da Bahia vem sendo estudada por pesquisadores nacionais e
internacionais, em virtude do alto grau de biodiversidade verificada na região, principalmente
na zona cacaueira, conforme aponta ARAÚJO, et al, 1998 “A região sul da Bahia, mais
especificamente entre os rios Jequitinhonha e Contas, conserva a parcela mais significativa
deste Bioma no Nordeste do Brasil, apresentando uma grande riqueza de espécies da fauna e
flora, sendo considerada por diversos estudiosos como um dos principais centros de
endemismo da Mata Atlântica”.
MENEZES et al, 1992, aponta que o sul da Bahia, “comparado com outras regiões da
costa brasileira, destaca-se por abrigar importantes remanescentes da floresta tropical úmida
conhecida como Mata Atlântica. A região caracteriza-se por apresentar um alto grau de
endemismo florístico e faunístico, o que lhe confere destaque especial nas preocupações
mundiais com a preservação da biodiversidade”.
63
Neste contexto de florestas remanescentes da Mata Atlântica, foi implantado em
1986, pelo MIRAD/INCRA, o Assentamento da Marambaia, através do Decreto nº 9.319 de
29/08/86, com emissão de posse expedida em 07/10/86, composto inicialmente por 32
famílias, com área total de 809,57 hectares, sendo 25 hectares a área média por parcela e 7
hectares a área comunitária.
O recente documento elaborado pela Prefeitura Municipal de Itacaré “Agricultura de
Itacaré: uma proposição 2001-2004 (Versão Preliminar), analisa a situação da agricultura no
município e aponta que depois de mais de 300 anos de exploração dos recursos naturais da
Região Cacaueira da Bahia, o município atravessa uma profunda crise econômica e social
decorrentes da crise da monocultura do cacau repercutindo de forma dramática na massa de
trabalhadores rurais desempregados acarretando sérias limitações no sistema produtivo local
com desdobramentos negativos para o conjunto da sociedade. Para efeito de planejamento, o
espaço físico de Itacaré composto de 739 Km2 foi dividido em três sub-áreas: Sub-área 1
(faixa interiorana); Sub-área 2 (faixa central) e Sub-área 3 (faixa litorânea).
Conforme o documento, a comunidade rural da Marambaia está situada na Sub-área 3
(faixa litorânea), onde estão concentrados os melhores atrativos naturais de Itacaré: praias
paradisíacas emolduradas por um relevo destacado, onde se verifica a ocorrência de
remanescentes da Mata Atlântica, a zona estuarina do Rio de Contas, a foz do Rio Jeribucaçu
e a foz do Rio Tijuípe com trechos de manguezais que reúnem uma rica diversidade
biológica. Portanto, neste espaço aplica-se o conceito de desenvolvimento sustentável. Por
isso, aponta o documento que ao se estabelecer as políticas de governo municipal para a
agricultura deve-se cuidar dessa faixa litorânea para não subordinar a dimensão ambiental ao
livre arbítrio dos fluxos econômicos e do mercado.
Porém, o documento alerta para o fato de que nessa área residem exemplos gritantes
de “domínio da natureza”, de forma equivocada, através da derrubada intensa e
indiscriminada dos maciços florestais da Mata Atlântica para a implantação das comunidades
rurais da Marambaia (1986) e Camboinha, bem como da Matinha e da Mata Grande.
Seguindo-se um processo predatório que ameaça a integridade das populações locais, o que
exige medidas preventivas com o objetivo de se estabelecer um pacto social ambiental
envolvendo os agentes sociais, econômicos e políticos na busca de um novo marco para o
mercado e para o meio ambiente.
64
A Marambaia, a partir de 1993, assim como outros aglomerados humanos existentes
no eixo de Itacaré e Serra Grande, passou a integrar-se aos domínios da Área de Proteção
Ambiental - APA Costa de Itacaré-Serra Grande, criada pelo Governo do Estado da Bahia
através do Decreto nº 2.186 de 07/06/93, cujo Plano de Manejo foi aprovado pelo Conselho
Estadual de Meio Ambiente – CEPRAM, Resolução nº 1.334 de 19/12/96 e pelas Câmaras de
Vereadores, Leis nº 175/96 (Uruçuca) e nº 118/97 (Itacaré). O Plano de Manejo da APA é
composto por três componentes: Diagnóstico Ambiental, Zoneamento Ecológico e
Econômico e Plano de Gestão.
A administração da APA inicialmente foi exercida pela Secretaria da Cultura e
Turismo, através da Coordenação de Desenvolvimento do Turismo - CODETUR e, com o
Decreto Estadual nº 7527/99 a gestão de 23 APAs estaduais passou para a competência do
Centro de Recursos Ambientais – CRA, órgão executor da Política Estadual de Meio
Ambiente do Estado da Bahia.
3.1. Caracterizando o ambiente natural e o ambiente construído
Para a caracterização do ambiente foram utilizadas as informações sobre os aspectos
físico-naturais descritos no Diagnóstico Ambiental da APA que compõe o Plano de Manejo,
1998 e que de uma maneira geral incidem na Marambaia. As informações referentes às
condições de vida (educação, saúde, moradia, saneamento) foram coletadas através de
entrevistas realizadas junto às lideranças locais e de consulta a dados secundários a exemplo
do Plano de Desenvolvimento Sustentável - Marambaia elaborado pela COOTEBA-
LUMIAR, 2000 e do Projeto Comunidades Rurais e Florestas da APA Itacaré – Serra Grande
do IESB/FUNBIO, 2000.
3.1.1. O ambiente natural
A vegetação predominante na microrregião de Itacaré, que também está representada
no Assentamento da Marambaia é a Mata Atlântica Ombrófila Densa, constituída por uma
formação vegetal de folhagem sempre verde, sem resistência a seca. Apresenta-se como
vegetação secundária em três estágios: inicial, médio e avançado de regeneração.
65
No estágio inicial, a vegetação permeia de forma irregular o assentamento alternando
com outras vegetações no estágio médio e avançado.
No estágio médio, a vegetação arbórea e/ou arbustiva predomina sobre os extratos
herbáceos, podendo constituir extrato de diferentes alturas.
No estágio avançado apresenta fisionomia arbórea dominante sobre os demais
extratos.
No assentamento, os recursos florestais são naturais e manejados. Nas formações
florestais as matas remanescentes são compostas por capoeiras finas e grossas e árvores de
grande porte. Espécies raras e endêmicas da Mata Atlântica existentes na APA, também se
fazem representar na Marambaia como: cedro, embaúba, ipê, jacarandá-da-baía, jequitibá,
gindiba, sapucaia, jatobá, maçaranduba, matataúba, pau pombo, piqui, piaçava, sucupira,
angelim, imbirussu, passuaré, aderno, condurú, mussitaíba. Encontram-se também na
Marambaia muitas orquídeas, bromélias, cipós.
Figuras 1 e 2 - Árvores e cipós no Lote do parceleiro Beca
Nas áreas manejadas o solo é ocupado por pequenas pastagens e por cultivos agrícolas
como o urucum, piaçava, dendê, coco-da-baía, mandioca, laranja, abacaxi, cultivadas de
forma individualizada em virtude do assentamento ter sido parcelado em 32 lotes. Estudos
realizados pelo COOTEBA/LUMIAR, 2000, apontam que os cultivos financiados ocupam
menos de 1/3 das áreas agricultáveis, conforme quadros abaixo:
66
QUADRO 1 - TIPOS DE CULTIVOS AGRÍCOLAS
CULTIVOS FONTE DE FINANCIAMENTO
Nº DE PLANTAS
ÁREA PLANTADA
PRODUÇÃO ANUAL
Coco Programa da Terra -BNB 12.306 82 ha 146 frutos/ha
Dendê Programa da Terra –BNB 476 04 ha -----------
Cravo Programa da Terra –BNB 67 01 ha -----------
Guaraná Programa da Terra –BNB 115 01 ha -----------
Café Programa da Terra –BNB 57 01 ha -----------
Urucum Programa da Terra –BNB 3.140 05 ha 05 kg/ha
Abacaxi Recurso próprio 2.470 02 ha -----------
Laranja Recurso próprio 318 01 ha -----------
Piaçava Recurso próprio 2.247 12 ha -----------
Mandioca Proagri/BNB ---------- 99 ha 08 sc/farinha/ha
TOTAL -------- ---------- 208 ha ---------- FONTE: COOTEBA/LUMIAR, 2000
Ainda, segundo a COOTEBA/LUMIAR, 2000, a ocupação do solo no contexto geral
do Assentamento apresenta o seguinte quadro:
QUADRO 2 - OCUPAÇÃO DO SOLO
ATIVIDADES ÁREA/HA
Pastagem Natural 35,00 ha
Pastagem Artificial 24,00 ha
Reserva Legal * 149,57 ha
Reserva Permanente * 100,00 ha
Infra-estrutura 23,00 ha
Área Inutilizável 5,00 ha
Área s/ utilização 265,00 ha
Área cultivada 208,00 ha
TOTAL 809,57 ha FONTE: COOTEBA/LUMIAR, 2000
* As áreas referentes a reserva legal e permanente foram estimadas da diferença das demais áreas.
67
Da área total do assentamento que corresponde a 809,57 hectares, verifica-se que
208,00 hectares estão ocupados por cultivos agrícolas, predominando o cultivo da mandioca
que ocupa 99,0 hectares e o coco com 82,0 hectares. (COOTEBA/LUMIAR, 2000).
Segundo o Plano de Manejo da APA esta unidade de conservação é caracterizada pelo
alto grau de biodiversidade. Estudo realizado sobre a fauna detectou a ocorrência de 211
espécies de vertebrados, dentre estes, representados com maior diversidade a avifauna com
122 espécies, seguido dos répteis, mamíferos e anfíbios com 48, 37 e 5 espécies
respectivamente. A fauna tem importância fundamental na sobrevivência dos ecossistemas
devido às inter-relações biológicas. Entre 50% a 90% das espécies arbóreas e arbustivas são
visitadas por dispersores de semente, correspondendo a 80 % da fauna de aves e mamíferos.
(BAHIATURSA, 1998).
Com relação à fauna existente na Marambaia, os parceleiros informam que “tem
diversos animais na área como a cutia, mico, ouriço, tatu, caititu, paca, preguiça, papa mel,
tamanduá, teiú, sariguê, raposa, cobras (pico de jaca, jaracussú, surucucu, pingo de ouro,
coral), pássaros (jacu, pássaro preto, chororó, juruti). Porém fazem a ressalva de que
“depois do asfaltamento da estrada (BA 001), alguns bichos desapareceram, tem caçadores
que vêm de fora para caçar na área, principalmente a araponga. Esses caçadores moram no
Capitão e vêm caçar na Marambaia”.
Os tipos de relevos da microrregião são: a) área de baixa vulnerabilidade à erosão,
correspondente aos topos conservados dos tabuleiros; b) área de moderada vulnerabilidade,
predominante em toda microrregião e correspondem aos interflúvios abaulados com
declividade em tono de 15%; c) área de alta vulnerabilidade correspondente às planíceis
marinhas e fluviais e às vertentes íngremes e d) área de vulnerabilidade crítica,
correspondente aos terrenos lamosos de alta impermeabilidade. Na área do assentamento
predomina o relevo de tabuleiro apresentando morros com ondulações média e forte que são
separados por vales.
O clima predominante é o Tropical Úmido, sem estação seca acentuada e temperatura
média anual entre 210 C e 250 C. A precipitação pluviométrica é de regime regular, com mais
abundância entre os meses de outubro e dezembro e uma pluviosidade de 1.750 mm a 2.000
68
mm anuais. Os ventos predominam na direção sudeste, com uma velocidade entre 0,93 m/s e
1,37 m/s. A incidência solar média anual indica 6,7 horas/dia.
Os materiais que originaram os solos da microrregião são formados por sedimentos da
formação barreira, de rochas ácidas, de sedimentos de origem marinha e de materiais
oluviocoluvionares.
A área do assentamento apresenta diversas classes de solos: Latossolo amarelo;
Podzol mais hidromórficos; Latossolo vermelho-amarelo; Cascalhento distrófico a moderado;
Areia quartzosa distrófica e Latossolo vermelho-amarelo distróficos. Na sua maior parte (80
%), o solo corresponde ao Solo Laterita (cascalho), que flora a 20 cm da superfície da terra.
A classe de solo predominante é o Latossolo Vermelho Amarelo cascalhento distrófico, de
baixíssima sustentabilidade à agricultura tradicional. A análise química, coletada em áreas do
assentamento, pela COOTEBA/LUMIAR em 1999, constatou acidez elevada com PH de 3,5
a 4,5.
Os principais cursos d´agua que banham a microrregião são: Rio de Contas, Riacho
das Piabas, Rio Canoeiro, Rio da Ribeira Grande, Riacho Três Irmãs e o Rio Jeribucaçu que
atravessa o Assentamento Marambaia e que contribui para o abastecimento da cidade de
Itacaré. No assentamento existem muitas nascentes como a do rio Canoeiro, localizado
próximo às margens da BA 001 Ilhéus-Itacaré e da área comunitária do assentamento e
córregos Dos Netos e Duas Irmãs.
Figura 3 - Rio Jeribucaçu
69
3.1.2 O ambiente construído
A Marambaia como já mencionado, é um assentamento de reforma agrária, decretado
pelo INCRA com emissão de posse expedido em 1986, para assentar 32 famílias, tendo cada
parcela, a área média de 25 hectares, onde pelo projeto do assentamento ficou condicionado
que cada área destinasse 20% demarcados como reserva legal, atendendo ao Código Florestal
Lei Federal nº 4.771/65. A área comunitária corresponde a 7,0 hectares, onde existem os
seguintes equipamentos: o Centro Comunitário José Carlos Arruti Reis com três salas onde
são realizadas as reuniões, as festas, os eventos e, também, duas salas de aulas improvisadas,
a Casa de Farinha Comunitária construída através do convênio INCRA/CAR, um Posto
Telefônico, um Bar/Mercearia, um Viveiro de Mudas Comunitário, uma Igreja Adventista.
Encontra-se em fase de conclusão a construção de outra Casa de Farinha.
A organização social da comunidade é exercida através da Associação dos Parceleiros
da Marambaia, fundada desde a emissão de posse pelo INCRA. Os 32 associados
representam as famílias assentadas que se reúnem mensalmente na segunda-feira de cada
mês, onde são discutidas coletivamente todas as questões referentes ao assentamento.
Figuras 4, 5 e 6 – Reunião da Associação dos Parceleiros da Marambaia
70
A Marambaia constitui-se em um espaço geográfico e social onde vivem
aproximadamente 250 pessoas, entre homens, mulheres, jovens e crianças. Nos 32 lotes
distribuídos em 809,5 hectares há aqueles cujos lotes se situam próximos à área comunitária
entre as margens das estradas BA-001e BA-654 e a maioria distante do eixo da estrada, o que
dificulta o acesso dos parceleiros aos serviços públicos.
O depoimento de uma parceleira mostra quem são seus moradores:
“Inicialmente eram 32 famílias, onde 3 são mulheres. Hoje já estamos chegando a mais de 250 pessoas, mais de 50 mulheres e mais ou menos 100 crianças, que vem lutando no mesmo chão, sofrendo sem colégio, falta de iniciativa do governo.” (D.Otília Nogueira - parceleira)
Todas as famílias têm o perfil de trabalhador rural, que com o desemprego ocasionado
pela crise da lavoura cacaueira, partiram na busca de terra para trabalhar. Antes do processo
de ocupação da área viviam como empregados nas fazendas de cacau em Itacaré e em
cidades circunvizinhas.
Hoje, esses pequenos produtores rurais vivem em condições precárias de vida, sem
assistência técnica, sem apoio à saúde, à educação, ao saneamento – água encanada e esgotos
domésticos, sem energia elétrica, apesar da rede elétrica atravessar a área comunitária do
assentamento. Enfim, com baixos níveis de bem-estar social e excluídos do processo sócio-
econômico.
No assentamento as duas salas improvisadas pela Associação dos Parceleiros atendem
em torno de 76 alunos de 1ª a 4ª séries do ensino fundamental contando com a ajuda da
Prefeitura de Itacaré que disponibilizou duas professoras para o ensino. Os alunos não
recebem a merenda escolar que aliado à dificuldade de deslocamento das crianças dos seus
lotes para a área comunitária constituem-se nos principais fatores da evasão escolar, além da
utilização da mão-de-obra infantil nos trabalhos agrícolas e, principalmente na fabricação da
farinha. No período noturno, através do Programa de Alfabetização Solidária, iniciou-se a
alfabetização de adultos com baixa freqüência dos parceleiros em virtude da distância que
existe entre o local de moradia (lotes) e o Centro Comunitário. O nível de escolaridade é
baixo entre os assentados e nenhum deles tem 2o grau, mesmo que incompleto. A maioria
71
aprendeu a ler e a escrever de forma autodidata, pois não tiveram oportunidade de freqüentar
a escola, fato comum no meio rural.
Figura 7 – Sede do Centro Comunitário Figura 8 - Jovens da Marambaia em
intervalo entre aulas, no Centro Comunitário
QUADRO 3 - ESCOLARIDADE
SEXO ALFABETIZADO 1º GRAU FAIXA
ETÁRIA Masc. Fem. Total Sim Não Incom. Comp.0 a 6 anos 07 21 28 10 18 - -
7 a 13 anos 21 26 47 45 02 - -
13 a 17 anos 28 21 49 43 03 01 02
17 a 50 anos 31 29 60 44 11 02 03
> 51 anos 15 11 26 14 12 - -
TOTAL 102 108 210 156 46 03 05 FONTE: COOTEBA / LUMIAR, janeiro de 2000
O quadro acima indica a distribuição populacional do assentamento, estimada em
aproximadamente 210 pessoas residentes, das quais 102 são do sexo masculino e 108 do sexo
feminino. Estima-se que existam 80 crianças e 50 jovens que auxiliam os pais nas atividades
laborativas. Esse segmento populacional não tem opções na área de trabalhos alternativos que
busque integrar o ensino à iniciação profissional. As opções de lazer são poucas,
restringindo-se ao banho no rio e à pesca.
72
As moradias em sua maioria são de taipas e tábuas com cobertura de telhas ou
amianto, apenas as edificações da área comunitária são construídas de alvenaria. Os cômodos
das casas são pequenos, constituídos de uma sala e dois quartos e uma cozinha, geralmente
do lado de fora da casa e o fogão é à lenha na maioria das casas e as necessidades fisiológicas
“são feitas no mato”. A maioria das moradias não possui sanitários.
Figuras 9 e 10 – Moradias dos parceleiros da Marambaia
A água é adquirida através do deslocamento dos parceleiros aos rios e córregos
(fontes) próximos aos lotes, muitas vezes distando um quilômetro da casa. Nos rios e
córregos lavam, tomam banho e pegam a água de beber, sem nenhum tratamento para o
consumo humano.
Figura 11 – Rio Jeribucaçu e seus usos pela comunidade
A ausência de saneamento na área constitui-se um fator agravante para a saúde de
seus moradores, contribuindo para a precariedade das condições de vida dos habitantes da
Marambaia. O problema de saúde é sempre enfocado dentro da necessidade do serviço de
saúde e não da necessidade do estado de saúde. Ainda é muito marcante a idéia de saúde
como algo biológico. No final dos anos setenta o conceito de saúde foi sendo revisto,
73
trabalhado e ampliado para algo que se relacione à qualidade de vida, apesar de a OMS ter
afirmado desde 1946, que "saúde é um completo bem estar físico, mental e social e não
apenas ausência de doença e incapacidades". Com essa compreensão, observa-se uma
estreita relação entre saúde e saneamento ambiental, entendido como um conjunto de ações
que tendem a conservar e melhorar as condições do ambiente em benefício da saúde.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde - OMS, a precariedade dos serviços
de saneamento básico no Brasil é hoje responsável por cerca de 80% das doenças que
atingem a população e algo em torno de 65% das internações hospitalares.
O lixo doméstico é jogado a céu aberto nos fundos das casas e na maioria das vezes
queimados, possibilitando a contaminação do lençol freático, dos rios e dos córregos, que
aliado à falta de esgotamento sanitário, têm se constituído em uma ameaça à saúde dos seus
moradores.
Para agravar a situação a administração municipal há quatro anos vem utilizando
áreas dos lotes dos parceleiros situados no Km 4 para a destinação final do lixo da cidade, o
que vem causando revolta na comunidade, pois segundo depoimento de D. Otília “nós
pedimos que a Prefeitura jogasse o sargaço da praia nas roças porque servia como
adubação e não todo o lixo da cidade, o chorume vai para o água do riacho que chega na
presa onde todo mundo usa misturado com lixo de hospital. Peço as autoridades competentes
uma providência quanto a isso, a construção de um Aterro Sanitário em Itacaré”.
Figura 1 – Destinação Final do lixo da cidade de Itacaré em áreas de parceleiros
74
O assentamento não dispõe de serviços de saúde, tendo seus moradores que se
deslocar 6 km, de ônibus, bicicletas, carroças ou até mesmo a pé, para o Hospital e Centro de
Saúde de Itacaré e em casos mais graves aos serviços de saúde das cidades de Ilhéus e
Itabuna. “Nós que somo da área rural, trabalhador, além do trabalho arde ainda a caminhada à cidade em busca de médico e às vezes volta sem ser atendido. È muito difícil”. (Sr. Juraci – Parceleiro).
Estudo realizado pela COOTEBA/LUMIAR, 2000, destacou que no assentamento não
há registro de epidemias e doenças crônicas que causassem morte na comunidade local.
Porém, notificou a existência de doenças infecto-contagiosas e outras doenças em pessoas
acima de 40 anos de idade em decorrência dos esforços físicos no trabalho rural e a falta de
assistência médica. Registrou-se a ocorrência de anemia, deficiência visual, hipertensão,
diabetes, tuberculose, doença mental, problemas na coluna, hérnias de disco, diarréias,
doenças respiratórias e de pele.
Parte das famílias costuma realizar exames de rotina quando solicitados, mas também
utilizam com muita freqüência os remédios caseiros, conforme depoimentos:
“Esta planta se chama gelol. A gente prepara no álcool para dá massagem nas dores e as dores desaparecem, nas circulações das veias, das varizes e desaparecem tudo logo passando o gelol com álcool nas pernas. Essa planta aqui é o elixir paregó que serve para ressecamento ”. (Beca)
“Temos plantas medicinais para o intestino, febre, problema de pele, o que temo é planta medicinal”. (Otília)
O sistema de trabalho é a agricultura familiar, cuja principal atividade econômica de
subsistência da comunidade é o cultivo da mandioca que se baseia no método tradicional de
corte e queima da floresta e da capoeira representando uma ameaça à conservação das
florestas de suas propriedades e das áreas vizinhas pelos riscos de queimada, prática
culturalmente utilizada pelos parceleiros. Atualmente, o Plano de Manejo da APA e as
legislações federal e estadual de meio ambiente fazem restrições e até proibições quanto ao
uso da terra da forma como tradicionalmente os parceleiros fazem para o cultivo da
mandioca.
75
Figura 13 - Roça de mandioca em Lote de Parceleiro da Marambaia
A farinha é a principal fonte de renda da maior parte das famílias assentada
beneficiada de forma comunitária na Casa de Farinha (Farinheira). Cada família contribui
com 10% para a manutenção da Farinheira em regime de arrendamento. A casa de Farinha é
também utilizada por produtores rurais da Camboinhas, Taboquinhas e Uruçuca que pagam
15% da renda gerada pela venda da farinha à Associação dos Parceleiros da Marambaia. Eles
trazem a mandioca descascada e utilizam os equipamentos da casa de Farinha. Porém, a
situação vem se agravando, causando um estado de desânimo na comunidade, conforme
expressa o responsável pela Casa de Farinha:
“A nossa produção na farinheira reduziu muito. Antes, alguns anos e meses atrás, a produção seria de 18, 19 a 20 sacos de farinha que a Associação disputava de renda. Hoje, por motivos de não poder mais desmatar, a renda reduziu para 8 sacos, demonstrando a situação nossa de como estamos vivendo aqui por motivo de também existir essa lei de preservação que nós somos de acordo. Não podemos destruir esse ambiente, esse verde que é muito lindo, Por esse motivo que a situação está sendo caótica”. (Juraci).
Como a produção agrícola do lote não dá sustentação econômica alguns moradores
sobrevivem de outras fontes de renda como aposentadorias, atividades de pedreiros,
carpinteiros, ambulantes, artesãos, carroceiros.
“Eu trabalho, vou para a feira sobreviver. Seu Indalício está sendo carroceiro para ter sobrevivência. Eu vou para Ubaitaba para ganhar R$10,00 por dia para poder ter sobrevivência. Nós temos urucum, pinha, banana, mandioca, temos tudo, mas não dá sobrevivência”. (Beca)
76
Figuras 14, 15 e 16 – Casa de Farinha Comunitária
No assentamento não existe um sistema de criação coletiva de animais, mas criatórios
de pequeno porte (domésticos) em fundos de quintal, a exemplo de galinhas, porcos, patos,
para o consumo familiar.
Os meios de transportes utilizados pelos parceleiros são: ônibus, caminhão, bicicleta
ou conforme as condições econômicas à caminhada até o centro da cidade.
Em seus momentos de descanso os parceleiros costumam pescar, brincar, prosear,
freqüentar a Igreja Adventista – a maioria é evangélica. Segundo depoimento “antigamente
tinham muitas festas, principalmente do São João, no Natal, Reis. Hoje, a Marambaia não
faz mais festas, talvez pelo fato de ter muitos evangélicos. E esse fato tem enfraquecido as
festas tradicionais no assentamento. A tradição cultural da Marambaia é a do Bicho Peludo
que hoje chamamos de Bicho da Mata Atlântica”.
77
Figuras 17 e 18 - Peça musical “O Bicho da Mata Atlântica”
O artesanato é uma atividade desenvolvida na Marambaia de forma individual.
Recentemente com a formação do “Grupo Alegria – Artesanato da Terra” composto por
mulheres, homens e jovens, a atividade vem sendo realizada de forma coletiva através do
reaproveitamento da casca de coco para a fabricação de vasos, flores e xaxins; coco seco para
fabricação de farinheiras, açucareiros, cinzeiros, etc; conchas para arranjos; cipós para cestos,
que estão sendo comercializados na Feira de Artesanato de Itacaré, nas lojas e numa Barraca
Artesanal “Mico Leão”, no Lote 18 da Marambaia, próximo às margens da BA – 001.
Figuras 19, 20 e 21 – Grupo Alegria – Artesanato da Terra
78
Cabe mencionar que o assentamento está localizado próximo à cidade de Itacaré, cuja
principal atividade econômica é o turismo, onde se encontram ambientes de alto valor cênico
(falésias rochosas, associadas a remanescentes de Mata Atlântica, planície costeira com
restinga), oferecendo potencialidades para o desenvolvimento do turismo sustentado de alto
padrão qualitativo, que conforme o entendimento da BAHIATURSA, 1998, “são
estratégicos para a inserção do Estado da Bahia no mercado turístico internacional”.
A comunidade absorvendo a idéia do turismo como estratégia de desenvolvimento
para o município e estando numa localização privilegiada, próxima à entrada da cidade,
considera que uma das soluções para melhorar o atual quadro sócio-econômico das famílias
assentadas é criar alternativas econômicas que atendam a demanda do ecoturismo, a exemplo
de: a) fabricação de peças artesanais com o reaproveitamento de recursos naturais
encontradas nas roças: raízes, sementes, frutos e fibras vegetais, tronco e galhos de árvores
mortas; b) implantação de Trilhas Ecológicas nas roças; c) comercialização de sub-produtos
da farinha de mandioca. Para tanto, estão se mobilizando para a criação de um Centro
Cultural e Artesanal na área comunitária da Marambaia, resgatando e conservando a cultura
local.
3.2. Inserindo a Marambaia na APA Costa de Itacaré – Serra Grande
A Área de Proteção Ambiental – APA é uma categoria de Unidade de Conservação do
Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC, definida pela Lei Federal nº 6.902
de 27/04/81 e Lei Nº 9,985, DE 18/07/2000 que regulamenta o art. 225, Parágrafo 1º, incisos
I, II, III e IV da Constituição Federal , onde se busca conciliar os interesses ambientais com o
desenvolvimento econômico. É a gestão do território com base em suas características
ambientais a partir das quais se estabelecem normas de convívio entre o ecossistema natural e
o meio antrópico.
A nova lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC estabeleceu
que a Área de Proteção Ambiental – APA enquadra-se no grupo das Unidades de Uso
Sustentável, definindo-a como “uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação
humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente
importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como
79
objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e
assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.”
O objetivo primordial de uma APA é proteger os atributos determinantes à sua
instituição, e através de sua manutenção e recuperação, promover a diversidade dos
ambientes para a melhoria da qualidade de vida das populações humanas, que deixa de ser
apenas a conseqüência das medidas de proteção ao meio ambiente para se tornar um objetivo
a ser alcançado. (SMA: IBAMA, 1996).
A APA abriga uma região costeira de relevante importância ecológica para a
preservação ambiental, com relevo de falésias e planícies costeiras, associada à vegetação de
Mata Atlântica e restinga; conjunto de praias de formação singular; manguezais; matas
ciliares e bolsões de desova de tartarugas marinhas nas praias de Barra do Sargi e de Pé de
Serra. (Plano de Manejo, 1998)
Estão incluídos na APA o povoado de Serra Grande, município de Uruçuca, a área
urbana e a orla sul de Itacaré. Esses municípios têm respectivamente população de 23.164 e
15.970 habitantes (Anuário Estatístico da Bahia, 1998), sobrevivendo, basicamente de
atividades agrícolas de pequena produção, pesca artesanal, atividades madeireiras, pequeno
comércio e atividades ligadas ao turismo.
Conforme o Plano de Manejo encontram-se na APA os seguintes ecossistemas: Mata
Atlântica, Restinga e Manguezais.
Como elementos integrantes das áreas antropizadas têm-se: a) Áreas agrícolas –
culturas importantes como as de cacau, dendê, coco, piaçava, cana-de-açúcar, banana e
culturas de subsistência, substituindo áreas de Mata Atlântica; b) Pastagens – se distribuem
de maneira descontínua permeadas por outros cultivos de natureza agrícola ou de Mata
Atlântica; c) Atividades de silvicultura – reflorestamento com seringueira e o pinheiro
utilizado para fins comerciais; d)Exploração madeireira de caráter extrativista.
A APA apresenta forte atuação antrópica com vários núcleos urbanos, loteamentos,
sítios e chácaras de veraneio. As áreas com ocupação humana situam-se no povoado de Serra
80
Grande, no município de Uruçuca e nas proximidades da cidade de Itacaré, apesar de
ocorrerem também de forma dispersa por toda a região.
Segundo o IESB/FUNBIO, 2000, a APA Itacaré / Serra Grande possui duas realidades
fundiárias: a) a existência de comunidades de pequenos produtores rurais praticando
queimadas, corte de madeiras e caça, e vivendo sob condições de vida precárias, o que
ameaça a sustentabilidade social e ambiental desta área protegida; b) a existência de médias e
grandes fazendas adquiridas por empresários, nos últimos cinco anos, com o intuito de
preservação e/ou para um futuro uso turístico, seja para si ou para a implantação de hotéis
fazenda.
Neste contexto, conforme já foi mencionado, situa-se a comunidade rural da
Marambaia, cujo processo de ocupação se deu em áreas remanescentes de Mata Atlântica
original, com solos de tabuleiros de baixíssima fertilidade que segundo estudiosos do assunto
são desaconselháveis para culturas de subsistência, o que atesta depoimentos de membros da
comunidade como o da antiga líder comunitária, D. Otília:
“Pensava que aqui era uma maravilha pra gente sobreviver, mas a terra não ajuda... o solo embaixo é só pedra... o que temos é terra com muita pedra, cascalho... a terra é de péssimo nive. Não vou dizer que é ruim, pois foi esta que Deus nos deu e seja bem vinda porque nela temos o maior amor, nela estamos vivendo e os nossos filhos criando”...
Corroborando com o pensamento de D. Otília, o presidente da Associação dos
Parceleiros da Marambaia, Sr. Petronílio, diz que:
“A terra é fraca, só dá roça quando bota fogo. A terra nova dá muito abóbora, banana da terra, dá muita fartura, mas depois de três anos em diante a terra começa a esfracassar e não dá mais nada a não ser com adubo e a vida fica um pouco pecuária (precária) porque a terra não é boa e nós estamos respeitando a lei do meio ambiente”.
Recente estudo elaborado pelo IESB – Projeto FUNBIO, 2000, confirma a
constatação empírica dos parceleiros, ao assinalar “que os solos das áreas das comunidades rurais, a
exemplo da Marambaia, apresentam baixa fertilidade e a grande maioria possui espessas camadas de laterita.
A classe de solo predominante é o Latossolo Vermelho Amarelo cascalhento distrófico, de baixíssima
sustentabilidade à agricultura tradicional”.
81
3.2.1. Zoneamento Econômico e Ecológico da APA e a inserção da Marambaia
O Zoneamento contempla 17 zonas, com diretrizes de planejamento específicas para cada
uma delas, articuladas no projeto de desenvolvimento concebido para esta Unidade de
Conservação. Estas zonas estão inseridas em três categorias:
• Categoria de Preservação – engloba áreas de alta fragilidade ambiental, onde a
presença humana deve ser inibida, minimizada ou adequada ao uso preservacionista;
• Categoria de Conservação – engloba áreas onde as atividades humanas devem se
desenvolver com muito controle, devido à fragilidade ecológica ou presença de
ecossistemas protegidos pela legislação ambiental;
• Categoria de Uso sustentável – engloba áreas de ambientes ainda preservados e em
estágios de antropização com vocações e tendências econômicas.
Para efeito deste estudo julgou-se oportuno situar os limites da área do Assentamento no
Zoneamento Ecológico e Econômico da APA, com o intuito de verificar em quais zonas está
inserida a área da Marambaia e, a partir da ação desenvolvida, dar conhecimento aos
parceleiros sobre os parâmetros de proteção ambiental e o uso indicado de manejo de suas
terras, preocupação esta que não foi levada em conta quando da criação da APA. Isto se deve
ao fato da percepção que os parceleiros têm da presença da APA em suas áreas, como bem
expressa o presidente da Associação dos Parceleiros da Marambaia:
“Acho que deveria antes de decretar a lei da APA, deveria sentar com as pessoas para discutir alternativas de vida do homem do campo. O pessoal da Marambaia não foi ouvido antes do decreto de criação da APA. Acho que a APA até o momento só trouxe proibição e nada de positivo. É importante, mas a lei dos homens pensou no verde, mas não pensou na vida dos homens da roça”. (Sr. Petronílio Valverde)
Em virtude da ausência de participação da comunidade no processo de criação da
APA, esta Unidade de Conservação representa para os parceleiros da Marambaia uma
mudança ao seu modo de vida, mas ao mesmo tempo compreendem a importância da
preservação do meio ambiente, conforme depoimento abaixo:
“A gente temos sofrido muito, Já trabalhamos, já devastamos muito a mata, já plantamos muita mandioca e não temos tido renda. A renda da mandioca é passageira. Mas hoje esta mata se tornou Mata Atlântica. E uma Mata Atlântica é proibido fazer desmatamento, é proibido fazer queimada. Por isso que estamos atrás de fazer outro tipo de desenvolvimento”. (Petronílio – Pres. Associação)
82
Isto se deve ao fato de que ao longo do tempo as Unidades de Conservação em nível
nacional e estadual foram sendo criadas e administradas sem considerar os interesses e
necessidades dos atores sociais e, diante das restrições estabelecidas legalmente, estes atores
sempre se posicionaram contrários, ocorrendo ao mesmo tempo uma desintegração social das
comunidades e uma descaracterização dos ecossistemas.
FERREIRA, 1996, em sua Tese de Doutorado aponta que “Em algumas
oportunidades, estes instrumentos de planejamento criam uma base institucional mínima para
a compatibilização do desenvolvimento regional com as demandas sociais por conservação
dos sistemas florestais nacionais... mas, na maior parte das vezes, os moradores e o poder
local das regiões transformadas em unidades de conservação são praticamente colocados a
margem deste processo, o que inviabiliza a construção de um espaço público legítimo para a
atuação dos esferas competentes do estado”.
Porém, o SNUC confere a APA como “Unidade de Uso Sustentável” ao lado da
Reserva Extrativista um importante papel na busca de novos caminhos tanto de integração
com as populações locais, como de técnicas de manejo dos recursos naturais. Isto porque
essas populações possuem conhecimentos gerados pela prática que devem ser resgatados e
respeitados em virtude da sua relevância para a conservação ambiental, pois se constituem
em interlocutores no processo de construção de técnicas de manejo sustentáveis, conforme
enfatiza LEROY, 1997:
“Se um modelo de agricultura sustentável para um país tropical está em gestação, ele deve se basear e produzir, tanto no plano agronômico, quanto no de gestão, através de uma combinação de tradição e de inovação, de saber adquirido pela experiência e de saber técnico-científico”.
Desse modo, o estabelecimento de uma Área de Proteção Ambiental – APA, em um
determinado território deve levar em consideração a participação dos diversos atores sociais
como condição essencial da gestão para a sustentabilidade.
A área da Marambaia, no Zoneamento Ecológico e Econômico da APA, está inserida
nas seguintes zonas: ZAF – Zona Agro-florestal (Categoria de Conservação), ZAG – Zona da
Agricultura (Categoria de Uso sustentável), ZPR – Zona de Proteção Rigorosa (Categoria de
83
Preservação), ZUD – Zona de Uso Diversificado (Categoria de Uso sustentável), NUA –
Núcleo Urbano de Apoio (Categoria de Uso sustentável), ZT1 - Zona Turística I, conforme
quadro abaixo:
Pelo zoneamento, a maioria da área da Marambaia (85,2%) está inserida nas
categorias de Conservação e Uso Sustentável, ou seja, 52,2% na Zona Agroflorestal – ZAF e
33,0% na Zona de Agricultura - ZAG, conforme Quadro 4.
Assim, pelo Plano de Manejo, estão enquadradas na categoria de Conservação as
áreas onde as atividades humanas devem se desenvolver com muito controle, devido à
fragilidade ecológica ou presença de ecossistemas protegidos pela legislação ambiental,
compreendendo fazendas de cacau, com predominância dos sistemas agroflorestais
conhecidos como “cabruca”, remanescentes de formações florestais, descontínuas e esparsas,
nascentes e córregos, ecossistemas estuarinos, áreas úmidas, vegetação de restinga arbustiva
e herbácea associada com coqueirais, praias, encostas e falésias. Na categoria de Uso
Sustentável enquadram-se as áreas com a presença de ambientes ainda preservados e em
diversos estágios de antropização, onde estão presentes fazendas de cacau no sistema
“cabruca”, remanescentes de formações florestais descontínuas e esparsas, nascentes e
córregos, áreas úmidas, vegetação de restinga arbustiva e herbácea, associada com coqueiral,
áreas cultivadas com frutíferas diversas, áreas rurais antropizadas, pastagens, pomares,
núcleos urbanos.
QUADRO 4 – MARAMBAIA NAS CATEGORIAS DO ZONEAMENTO DA
APA ZONEAMENTO CATEGORIA PERCENTUAL
ZTI – Zona Turística I Uso Sustentável 0,6
ZAF – Zona Agroflorestal Conservação 52,2
ZAG – Zona de Agricultura Uso Sustentável 33,0
ZPR – Zona de Proteção
Rigorosa
Preservação 7,5
ZUD – Zona de Uso
Diversificado
Uso Sustentável 3,1
NUA – Núcleo Urbano de Apoio Uso Sustentável 3,6
TOTAL 100,0
Fonte, IESB, 2000
84
Portanto, os assentados da Marambaia a partir dos parâmetros estabelecidos de proteção e
uso indicado no Plano de Manejo da APA, podem compatibilizar a conservação dos recursos
naturais existentes na área com atividades econômicas sustentáveis, conforme indicado no
Zoneamento Ecológico e Econômico da APA (ver Anexo III), a exemplo de: a) cultivos
típicos dos sistemas agroflorestais; b) cultivos agrícolas de subsistência com técnicas
alternativas apropriadas aos ambientes tropicais, sem o uso intensivo de agrotóxicos e
fertilizantes; c) beneficiamento agrícola; d) apicultura; e) piscicultura, uso partoril em regime
de semiconfinamento; f) turismo ecológico com trilhas e infraestrutura de apoio; g) comércio
e serviços diversos; h) Implementação de cultivos agrícolas convencionais e formadores de
estrato arbustivo e arbóreo, priorizando-se as frutíferas e j) Exploração econômica da mata,
com base no Plano de Manejo Florestal devidamente aprovado pelo órgão competente.
Assim, para a mudança das práticas tradicionais de uso da terra para a agricultura em
práticas baseadas na sustentabilidade ambiental, os assentados precisam de orientação técnica
e informações sobre as alternativas de manejo sustentáveis.
O Programa de Desenvolvimento do Turismo do Estado da Bahia – PRODETUR,
objetivando assegurar o desenvolvimento do turismo com base na sustentabilidade ambiental,
definiu pela criação de oito Áreas de Proteção Ambiental – APAs nas Zonas Turísticas, que
na sua maioria estão localizadas na faixa litorânea do Estado da Bahia. Dentre estas, destaca-
se a APA Costa de Itacaré – Serra Grande, que juntamente com a APA Lagoa Encantada
integra a Zona Turística Costa do Cacau instituída pela BAHIATURSA.
A APA Costa de Itacaré – Serra Grande situa-se ao Norte da Costa do Cacau,
aproximadamente a 30 Km de Ilhéus, ocupando uma faixa litorânea de 28 Km de extensão,
totalizando uma área de 14.925 hectares, envolvendo parte dos municípios de Uruçuca e
Itacaré. Limita-se ao Norte, pela foz do Rio de Contas, no município de Itacaré; ao Sul, pelo
Riacho Sargi, no município de Uruçuca; a Oeste, numa linha eqüidistante a 6 Km da linha de
preamar e à Leste pelo Oceano Atlântico, conforme mapas 1, 2 e 3 a seguir:
85
MAPA 1 – LOCALIZAÇÃO DA APA NO ESTADO DA BAHIA
86
MAPA 2 – LOCALIZAÇÃO DO ASSENTAMENTO NO ZONEAMENTO DA APA
N
2 0 2 4
Kilometros
Assentamento MarambaiaLocalização de acordo com as Zonas de Manejo
14°30' 14°30'
14°20' 14°20'
39°5'
39°5'
39°00'
39°00'-39
-39
Assentamento Marambaia
Estadas
Rios
Rio de Contas
Oceano Atlântico
Zoneamento
NUA
NUC
ZAF
ZAG
ZEP
ZOC
ZOM
ZOR
ZPP
ZPR
ZPV
ZPVS
ZT1
ZT2
ZTE
ZUD
ZVT
NAO IDENTIFICADA
LEGENDAS
Itacaré
Rio de Contas
BA 0
01
BA 0
01
OceanoAtlântico
AssentamentoMarambaia
SerraGrande
Rio Can
deeir
o
Rio Jeribucassú
Rio
Capit
ão
Rio Tiju
ípe
Rio Tiju
ipinh
o
Fonte : Plano de Manejo da APA Costa de Itacaré-Serra Grande (Bahiatursa-CRA, 1998)
87
88
3.3 Experiências de integração ao Plano de Manejo da APA: Projetos desenvolvidos pelo Poder Público e por ONG´s
3.3.1. Experiência do Poder Público
O Estado da Bahia, através do Centro de Recursos Ambientais – CRA, vem
administrando a partir de 1999, vinte e três (23) APAs, cuja experiência foi analisada em
estudo elaborado por MURICY, 1999, intitulado “APA – Gestão do Território com base em
suas características ambientais”, tendo como base o papel do poder público e das
comunidades na busca de alternativas que conciliem proteção ambiental e atividades
antrópicas. Segundo a autora, estas 23 APAs estaduais são representativas dos biomas Mata
Atlântica, Caatinga e Cerrado, numa área de aproximadamente 1.900.000 hectares,
correspondentes a 3 % do território do Estado, onde se está iniciando uma experiência de
gestão ambiental participativa, envolvendo o Estado, os governos municipais e as
comunidades locais. Dentre as estratégias de ação que norteiam a gestão das APAs apontadas
no estudo, merece destaque aquelas que dizem respeito ao estímulo da participação da
comunidade:
• Consolidação das APAs através da definição clara dos critérios e elementos de
manejo, baseados no conhecimento das características locais;
• Divulgação da APA na finalidade de instrumento de gestão, através dos meios de
comunicação, para sedimentar, junto às comunidades envolvidas, o conceito de
desenvolvimento aliado à proteção do ambiente;
• Educação Ambiental voltada para as questões enfrentadas pela comunidade no que se
refere aos impactos ambientais das suas atividades produtivas e desenvolvimento de
novas alternativas de produção, emprego e renda;
• Planejamento sócio-econômico, já que a manutenção de áreas protegidas envolve
obrigatoriamente o combate à pobreza para mitigar as pressões sociais sobre o solo e
o uso dos recursos. A comunidade não poderá preservar as suas riquezas naturais na
ausência de alternativas de produção e renda;
O instrumento de gestão adotado pelo CRA pretende “por em prática os conceitos atuais
de desenvolvimento sustentável, descentralização das ações ambientais, gestão integrada e
participação da comunidade”. (MURICY, 1999).
89
Desse modo, além das atividades de fiscalização, licenciamento e educação ambiental, a
Administração da APA Costa de Itacaré – Serra Grande, vem estabelecendo articulações com
os diversos setores sociais, no intuito de se atingir um maior nível de participação e co-
responsabilidade por parte da comunidade, poderes públicos municipais, estaduais e federais,
universidade, ONG´s, setor privado e entidades civis na gestão da APA.
Exemplo disso é a formação do Conselho Gestor da APA, criado em maio de 2000,
envolvendo vinte membros dos diversos setores sociais de Itacaré e Serra Grande (Uruçuca),
assim representados: Administrador da APA (Centro de Recursos Ambientais - CRA);
Prefeitura Municipal de Itacaré; Prefeitura Municipal de Uruçuca; Conselho Municipal de
Turismo de Itacaré; Conselho Municipal de Turismo de Uruçuca; Companhia de
Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia – CONDER; Superintendência de
Desenvolvimento do Turismo – SUDETUR; Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Renováveis – IBAMA; 4 representantes da sociedade civil de Itacaré; 4
representantes da sociedade civil de Serra Grande; Instituto de Estudos Sócio-Ambientais do
Sul da Bahia – IESB; 1 Organização Não Governamental atuante na APA; 1 representante da
Câmara de Vereadores de Itacaré e 1 representante da Câmara de Vereadores de Uruçuca.
Vale mencionar, que um dos membros da sociedade civil de Itacaré é o Sindicato de
Trabalhadores Rurais – STR, cujo representante é antiga líder comunitária do Assentamento
Marambaia, que se faz presente em todas as reuniões opinando sobre os diversos aspectos
que envolvem não só o meio rural (local), como também aqueles que afetam a qualidade
sócio-ambiental de um modo global.
O Estatuto aprovado em seu art. 2º define como objetivos:
a) Fortalecer institucionalmente a gestão da APA;
b) Apreciar propostas de obras que alterem as características atuais da APA;
c) Assessorar tecnicamente a análise de questões ambientais relevantes para a
comunidade;
d) Indicar fatos ou infrações que agridam o ambiente da APA;
e) Emitir propostas para a solução de problemas ambientais da APA;
f) Apreciar propostas de alteração do zoneamento econômico-ecológico da APA;
90
g) Propor planos, programas, projetos e ações à órgãos públicos e instituições públicas
ou privadas com o objetivo de garantir a conservação e/ou melhoria ambiental da
APA;
h) Acompanhar o desenvolvimento dos planos, programas, projetos e ações propostos;
i) Fortalecer o processo de conscientização, mobilização e participação dos diversos
segmentos sociais das comunidades envolvidas;
j) Democratizar as informações referentes à gestão da APA;
k) Criar um fundo para captação de recursos para a gestão da APA;
l) Fomentar, fortalecer e credenciar pessoas ou grupos voluntários de defesa ambiental;
m) Incentivar projetos sócio-econômicos que sejam compatíveis com o Plano de Manejo
da APA.
O Conselho se reúne mensalmente de forma ordinária e julgando relevante a abordagem
de um algum tema, seus membros são convocados para uma reunião extraordinária.
As reuniões do conselho são abertas a todos os interessados de Itacaré e Serra Grande
(Uruçuca), que neste um ano de existência vem se tornando uma referência de discussão
sobre os diversos aspectos ambientais que envolvem a APA. Além dos membros
permanentes, o conselho tem estruturado a formação de Grupos de Trabalhos Temáticos,
abertos a qualquer pessoa interessada, com a função de participar das reuniões, assessorar
tecnicamente a análise de questões sócio-ambientais relevantes para a comunidade, indicar
fatos ou infrações que agridam o ambiente da APA e emitir propostas para a solução de
problemas da APA.
Este Conselho Gestor da APA Costa de Itacaré – Serra Grande é uma experiência
pioneira no Estado da Bahia, constituindo-se em um canal de participação da sociedade na
gestão de uma unidade de conservação. A Bahia, com este conselho funcionando e
comprovado na prática, assume a dianteira em mais esta iniciativa, construindo, assim, um
instrumento de gestão democrático e adaptado à realidade socio ambiental.
91
3.3.2. Experiência de ONG´s
Visando cumprir os objetivos de gestão participativa da APA, em 1998, o Governo do
Estado da Bahia através da BAHIATURSA/SUDETUR estabeleceu parceria com o Instituto
de Estudos Sócio-Ambientais do Sul da Bahia – IESB, Organização Não Governamental –
ONG, para o desenvolvimento do Programa de Educação Ambiental e Ecoturismo – PEAE.
Como um dos produtos do Programa é o trabalho educativo junto às comunidades
rurais, o IESB, através do PEAE da APA Itacaré / Serra Grande realizou nos meses de
setembro e outubro de 1999, junto à comunidade rural da Marambaia um Diagnóstico Rural
Participativo – DRP. Com a realização deste diagnóstico foram detectados diversos
problemas vivenciados pela comunidade que comprometem a sustentação das famílias nas
propriedades e a conservação das florestas das mesmas.
A partir desta constatação o IESB a pedido dos parceleiros implantou o Viveiro
Comunitário de Produção de Mudas Nativas, que representa uma oportunidade de geração de
renda na comunidade, como bem observa José Martins - um dos parceleiros responsável pelo
viveiro: “O viveiro de mudas surgiu em 1999, através da APA, bem orientado por Salvador Ribeiro, de fazer mudas. E através dessas mudas podemos ganhar um dinheirinho. Estamos continuando a fazer o viveiro para ganhar um dinheirinho. Temos muitas mudas como imbirussú, cedro, nós temos várias espécies de mudas”.
Ainda com base neste diagnóstico, o IESB com o aporte financeiro do Fundo
Brasileiro para a Biodiversidade - FUNBIO e da Fundação FORD, vem executando a partir
de outubro de 2000, o Projeto “Gestão participativa de recursos naturais e florestas –
Construindo um modelo de desenvolvimento sustentável das comunidades rurais de Itacaré –
Serra Grande”. Dentre estas comunidades vem sendo contemplada pelo projeto a comunidade
rural da Marambaia.
O projeto tem como objetivos: a) melhorar as condições de vida das comunidades
rurais da APA Itacaré / Serra Grande concomitantemente com a conservação das florestas e
dos recursos naturais das propriedades; b) organizar as comunidades, de forma participativa;
c) empreender inovações tecnológicas no sistema de produção e novos procedimentos de
comercialização; d) melhorar a renda e a qualidade de vida das famílias produtoras; e)
ampliar o valor local pelas florestas e recursos naturais comunitários; f) transferir esta
92
experiência para outras comunidades rurais do Sul da Bahia; g) implementar o
monitoramento ambiental nas propriedades rurais da APA e no interior do Parque do
Conduru.
No momento vêm sendo realizadas atividades de capacitação da comunidade através
de cursos de produção de mudas florestais e de implantação de viveiros de mudas individuais
tanto de espécies nativas, como medicinais e ornamentais, buscando outras alternativas
econômicas para a comunidade.
Além disso, o Projeto vem assessorando a comunidade na implantação de Trilhas
Ecológicas nos lotes dos parceleiros da Marambaia, a exemplo da “Trilha Janela da Gindiba”,
inaugurada em 28.12.00, que foi implantada com os objetivos de aumentar a renda de um
pequeno agricultor; ampliar a oferta de produtos ecoturísticos; conservar a Mata Atlântica e
promover a Educação Ambiental, conforme depoimento abaixo:
“Moro aqui há 16 anos, o projeto que nós temos para desenvolver é de falar na trilha de cada árvore que tem para o turista, que planta é aquela se é imbelão, se é cocó. Todas as ramagens, os cipós, os imbelão”. (Beca – parceleiro da Marambaia, que implantou a Trilha Janela da Gindiba em seu lote).
Vale salientar que a comunidade rural da Marambaia vem buscando estabelecer
parcerias com Órgãos Governamentais e Organizações Não Governamentais- ONG´s na
busca de melhoria da qualidade de vida, conforme depoimento prestado por antiga líder
comunitária:
“Sempre lutamos com a enxada e a terra...é muito importante essa preservação pra ver se a gente sobrevive disso que a gente tem aqui, nossa riqueza natural, isso aqui é um paraíso, é uma maravilha...nós tamos bem localizado a 6 Km da cidade de Itacaré que tem muitas praias bonitas e a Mata Atlântica dentro dela. A Marambaia é uma parte da Mata Atlântica. Por isso estamos querendo uma melhor vida para nossos filhos e para o nosso povo.” (Otília Nogueira)
Consideramos que o conhecimento do ambiente natural e do ambiente construído do
assentamento Marambaia, bem como da sua inserção no zoneamento da APA é de
fundamental importância, pois permite visualizar o contexto da investigação, os possíveis
impactos sobre os modos de vida local e a necessidade de envolvimento e incorporação do
saber popular nos planos de manejo como condição essencial para que este tipo de
93
planejamento transforme-se em um real instrumento de gestão do espaço e dos recursos
naturais.
Assim sendo, uma prática participativa com a comunidade da Marambaia, implica em
conhecer a realidade cotidiana de vida e compreendê-la, bem como conhecer seu ambiente de
vida, no sentido de buscar de forma compartilhada (saber popular x saber técnico) as
soluções e decisões para uma nova relação entre o homem e a natureza.
94
CAPÍTULO 4. ENFRENTANDO DIFICULDADES E CONQUISTANDO SONHOS:
UMA PRÁTICA PARTICIPATIVA COM A COMUNIDADE DA MARAMBAIA
“O elemento popular ´sente´, mas nem sempre
compreende ou sabe; o elemento intelectual `sabe´,
mas nem sempre compreende, ou sobretudo,
`sente´(...) o erro do intelectual consiste em crer que
ele pode saber sem compreender, e, sobretudo, sem
sentir e se apaixonar (não somente pelo saber, mas
pelo objeto do saber) (...)”
Gramsci (1978)
Esta pesquisa tem a intenção de compreender como os pequenos produtores rurais de
um assentamento de reforma agrária (Fazenda Marambaia), localizado na APA Costa de
Itacaré-Serra Grande se relacionam com o meio ambiente e como eles percebem as
influências de uma Unidade de Conservação em seu ambiente de vida e quais as soluções
encontradas para a melhoria da sua qualidade de vida, no sentido de compatibilizar a
conservação ambiental e as atividades produtivas.
Para efeito dos resultados esperados em uma pesquisa junto aos assentamentos de
reforma agrária, consideramos que a opção pela pesquisa-ação é a mais adequada, entendida
por THIOLLENT, 1985, como:
“Um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou problema estão envolvidos de modo cooperativo e participativo”.
Entende THIOLLENT, 1985, que a pesquisa-ação é uma estratégia metodológica da
pesquisa social, onde a participação dos pesquisadores é explicitada dentro da situação de
investigação e quando os pesquisadores não querem limitar suas investigações aos aspectos
acadêmicos e burocráticos da maioria das pesquisas convencionais. Portanto, não se trata de
95
um simples levantamento de dados ou de relatórios a serem arquivados posteriormente. Mas,
de uma relação dialógica entre o pesquisador (saber científico) e os pesquisados (saber
popular) em todo processo da pesquisa.
PINTO, 1986 apresenta alguns pressupostos e exigências da metodologia da pesquisa-
ação que em seu conjunto podem diferenciar a metodologia da pesquisa-ação de outras
abordagens e modalidades de pesquisa participativa, dando-lhe um sentido próprio:
- “A Pesquisa-Ação não é neutra. Requer dos que a praticam um compromisso claro com as classes dominadas e exploradas da sociedade em que vive; - É uma opção epistemológica e metodológica; - Não deve ser entendida como uma lógica acabada, um método completo, e ainda menos com um receituário: é uma prática social, constituída por outras práticas (prática científica e prática pedagógica); - Enquanto prática coletiva ela busca a produção coletiva de conhecimentos para uso coletivo; - Enquanto prática pedagógica ela é uma aprendizagem que busca integrar o potencial de conhecimento e criatividade da cultura popular com conhecimento científico; - Enquanto prática política, a estratégia central e a participação na produção de conhecimentos, na organização e articulação de grupos, na ação coletiva, conscientemente concertada; - Embora seu ponto de partida seja a realidade específica dos grupos, seu conhecimento requer a ampliação e superação, através do desvelamento de suas relações com o contexto sócio-econômico e político da sociedade global e com a própria história. Para isso, é essencial a teoria, como iluminadora da prática; - Enquanto prática científica, embora não seja seu objetivo mais importante, a pesquisa-ação pode contribuir para o formulação e crítica de teorias, para a invenção de novas técnicas de pesquisa e instrumentos de análise e, sobretudo para a compreensão daquilo que é relevante para a transformação da sociedade”.
Por outro lado, LOUREIRO, 1992 destaca que a metodologia participativa é a mais
propícia para um trabalho de Educação Ambiental, pois “a metodologia participativa
engloba inúmeras tendências e estilos participativos: pesquisa-ação, pesquisa participante,
investigação-ação, entre outras. Contudo, o que é central é que todas têm como eixo uma
proposta de transformação a partir da realidade vivenciada e de construção no processo,
sendo forte a crítica aos modelos tradicionais e seu uso como instrumento de dominação e
manutenção do sistema
A metodologia adotada para responder às questões levantadas nesta dissertação e
cumprir os objetivos pretendidos está pautada no trabalho desenvolvido junto às camadas
populares pelo Grupo de Estudos em Educação Ambiental (GEA) da Universidade Federal
do Rio de Janeiro – UFRJ, explicitado no artigo “Uma Proposta Metodológica para Pesquisa
96
em Educação Ambiental” – ANDRADE e LOUREIRO e HOMEM d´El REY, 1993, que
para fins de sistematização das informações e organização do conhecimento apresenta uma
organização básica para uma ação prática e de pesquisa, que foram adaptadas para a execução
desta investigação.
A proposta metodológica compreendeu seis fases e apesar disso, estas se sobrepõem e
estão muito mais vinculadas ao próprio enfoque do que à cronologia, conforme comprovado
por ANDRADE, 1993, em sua pesquisa de Dissertação de Mestrado.
A organização básica parte do pressuposto de que se entende a metodologia proposta
não como uma seqüência rígida de procedimentos, mas como uma prática social. Em sua
vertente educativa a proposta compreende a seguinte estruturação:
1ª FASE: CONHECIMENTO DA REALIDADE DA COMUNIDADE ENVOLVIDA
• Inserção do Pesquisador
• Revelando a história de ocupação
2ª FASE: REARTICULAÇÃO DA PRÁTICA DE PESQUISA À TEORIA EM
EDUCAÇÃO AMBIENTAL
3ª FASE: DIAGNÓSTICO DO AMBIENTE DE VIDA
4ª FASE: PLANEJAMENTO E IMPLEMENTAÇÃO DAS AÇÕES
5ª FASE: AVALIAÇÃO DAS PRÁTICAS EDUCATIVAS VIVENCIADAS
6ª FASE: SOCIALIZAÇÃO DOS RESULTADOS DA PESQUISA
4.1. PESQUISANDO E AGINDO
A primeira fase da investigação que corresponde ao processo de inserção do
pesquisador e o conhecimento da realidade do Assentamento Marambaia teve início em
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junho de 2000 e, se consolidou a partir do I Seminário da Marambaia – Reforma Agrária,
Turismo e Meio Ambiente, promovido pela Associação dos Parceleiros da Marambaia.
4.1.1 – CONHECENDO A REALIDADE DA COMUNIDADE ENVOLVIDA
a) Inserção do pesquisador
A inserção na comunidade da Marambaia constitui-se na parte inicial do processo de
pesquisa, pois possibilita a integração do pesquisador com o grupo local e o conhecimento da
realidade em seus múltiplos aspectos para a realização dos objetivos pretendidos. É o ponto
de partida e dele depende o desenrolar de toda a pesquisa. É o momento onde se estabelece o
compromisso entre sujeito-sujeito, do momento de convivência e do estabelecimento de laços
orgânicos com a comunidade de forma participativa. (LOUREIRO, 1992)
Destaca-se que é nesta fase que se estabelece uma relação não só intelectual, mas,
sobretudo afetiva, onde a confiança mútua e afinidade são condição necessária para a
aceitação da pesquisa pela comunidade.
A inserção é uma condição prévia indispensável para o desenrolar de toda as fases da
pesquisa, entendida por BOFF, 1986:
“Quando se fala em inserção, entende-se por esse conceito uma presença ou contacto físico com o universo popular. Trata-se aí de participar concretamente da vida do povo, de conviver com ele, de estabelecer com ele um laço orgânico”.
Para que a inserção se constituísse em um “ponto de arranque” da pesquisa, algumas
dificuldades tiveram de ser superadas para que os objetivos da investigação se
concretizassem. A presença da pesquisadora no Assentamento da Marambaia iniciou-se em
junho de 2000, em virtude da função profissional exercida pela pesquisadora em atividades
de Educação Ambiental, no Centro de Recursos Ambientais – CRA, órgão gestor da APA
Costa de Itacaré – Serra Grande. Os primeiros contatos foram estabelecidos com os
parceleiros na Casa de Farinha Comunitária para sondar os principais problemas existentes na
comunidade e observamos que a nossa presença gerava desconfianças, principalmente pelo
silêncio às nossas perguntas.
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Com relação ao silêncio das camadas populares frente à presença de um agente
externo em sua comunidade, este se dá em virtude da postura de alguns técnicos de se
considerarem “donos da palavra” e, portanto, detentores do saber e do poder, como enfatiza
ADORNO et al, 1997, “Na nossa sociedade, é mais ou menos difundido e aceito pelo senso
comum, a relação existente entre o possuir conhecimento, o saber algo e o poder...Este
poder, diferentemente do poder político, ou do poder do Estado, embora na maior parte das
vezes o legitime, coloca-se na esfera do cotidiano, na esfera das relações entre as pessoas e
as instituições...”
Percebendo esta dificuldade, procuramos verificar quais os motivos da resistência inicial,
que em termos gerais foram:
a) Por se tratar de um assentamento de reforma agrária cuja história de luta foi marcada
por perseguições e discriminações e por experiências negativas e desgastantes com
alguns profissionais que deram assistência técnica ao assentamento, consideramos
natural que a presença de qualquer agente externo fosse visto com desconfianças;
b) Sendo identificada pela comunidade como técnica do CRA, cuja ação de fiscalização
é uma atribuição e como a APA se constitui para eles em uma intervenção do estado
em sua área (relação de poder), pois no processo de criação dessa Unidade de
Conservação não se discutiu os seus interesses e necessidades, remetem à APA a
responsabilidade da atual condição de precariedade de vida, pois não podem desmatar
e queimar a terra para a implantação das roças de mandioca, que se constitui na
principal atividade econômica do assentamento, a nossa presença, portanto, foi
considerada uma ameaça.
Na verdade, a “desconfiança” dos parceleiros e a “ameaça” que um agente externo
poderia representar na comunidade, refletiu a estratégia do silêncio inicial adotada pela
comunidade como uma forma de contrapor à prática de imposição tanto da Estado quanto de
profissionais que se consideram detentores do saber e do poder dominantes sobre as camadas
populares.
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Neste sentido, remetemos à citação de GRAMSCI, 1978, expressa no início do capítulo,
referente ao problema da relação entre saber, sentir e compreender, ou seja, “em crer que o
intelectual pode ser verdadeiro intelectual se distingue e está separado do povo-nação, se não
sente as paixões elementares do povo, compreendendo-as, explicando-as e justificando-as em
uma situação histórica determinada, unindo-as dialeticamente às leis da história... “
(GRAMSCI, 1978).
Portanto, a inserção do pesquisador numa pesquisa-ação é a de participar da vida da
comunidade estabelecendo com ela os laços de afinidade, tornando-se um “intelectual
orgânico” e não uma presença física marcada pelo autoritarismo e imposição do seu “saber” e
“poder”. Esta postura técnica de respeito ao saber popular, das suas aspirações de vida, dos
seus mitos e utopias é uma condição essencial para que a comunidade se torne uma aliada
forte na conservação dos recursos naturais.
Leonardo Boff, 2000, em Saber Cuidar: Ética do Humano – Compaixão pela terra,
evidencia que o dado originário em um trabalho com o povo, não é o “logos” (razão e as
estruturas de compreensão):
“mas o pathos, o sentimento, a capacidade de simpatia e empatia, a dedicação, o cuidado e a comunhão com o diferente. Tudo começa com o sentimento. É o sentimento que nos faz sensíveis ao que está à nossa volta, que nos faz gostar ou desgostar. É o sentimento que nos une às coisas e nos envolve com as pessoas. É o sentimento que produz encantamento face à grandeza dos céus, suscita veneração diante da complexidade da Mãe-Terra”...
Diante destes fatos, optamos por uma estratégia de aproximação inicial com antiga
líder comunitária da Marambaia (D. Otília) e com o presidente da Associação dos Parceleiros
da Marambaia (Sr. Petronílio) para apresentar as intenções do estudo e verificar a
possibilidade da realização do mesmo nesta comunidade. O presidente considerou
interessante a proposta e sugeriu que em Reunião Ordinária da Associação expuséssemos os
objetivos da pesquisa para todos os parceleiros.
Na 1ª segunda-feira do mês de julho de 2000 fomos convidados pelo presidente da
Associação para expor o projeto de pesquisa. Após discussões sobre o estudo com os
participantes da reunião, tivemos a autorização e a aceitação do grupo para o
desenvolvimento do trabalho.
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Com isto começamos o processo de integração com a comunidade através de visitas
periódicas à área, conversas informais com as pessoas e aos poucos fomos estabelecendo os
vínculos de confiança, principalmente com os parceleiros que trabalham na Casa de Farinha,
com a antiga líder comunitária e com o presidente da Associação. Assim, fomos participando
do seu dia-a-dia e estreitando o contato com a comunidade, sempre respeitando sua cultura e
sua forma de organização popular, muitas vezes, reforçando-os. Foi sendo então, quebrado o
“gelo” inicial e se fortalecendo o elo de coesão e amizade entre as partes, o que permitiu a
compreensão dos vários aspectos que envolvem a presença de um agente externo à vida
cotidiana da comunidade.
A importância de se estabelecer vínculos afetivos e compromissos entre os técnicos e
a população garantirá a fluidez da prática educativa. Remetemos a Paulo Freire, que diz:
Nutre-se de amor, de humanidade, de esperança. De fé, de confiança. Por isso somente o diálogo comunica. E quando os dois pólos do diálogo se ligam assim, com amor, com esperança, com fé no próximo, se fazem críticos na procura de algo e se produz uma relação de “empatia” entre ambos. Só ali há comunicação. ´O diálogo é, portanto, o caminho indispensável´, diz Jaspers, “não somente nas questões vitais para nossa ordem política, mas em todos os sentidos da nossa existência”. (FREIRE, 1983).
O diálogo, portanto, é a base de toda comunicação e da participação. BOFF, 1986
recomenda que “na educação dialógica ou dialogal, o agente e o povo refletem juntos,
coletivamente, sobre os problemas comuns. Já que se trata de questões que tocam a todos,
todos têm coisas a dizer e comunicar. Trata-se, pois, de fazer sempre uma reflexão coletiva,
uma discussão participada por todos”.
Paralelamente à inserção começamos a conhecer as percepções dos parceleiros sobre
seu ambiente de vida e sobre algumas ações possíveis a serem realizadas.
Para tanto, adotamos um procedimento técnico denominado “estratégia do silêncio”
que foi aplicado por ADORNO et al, 1997, junto a um grupo de mulheres de Itapecerica da
Serra, em São Paulo, através da pesquisa participante realizada pela Faculdade de Saúde
Pública no Centro de Saúde Salvador Leone.
A “estratégia do silêncio”, adotada pelos pesquisadores da Faculdade de Saúde
Pública, consistia em iniciar a reunião com uma declaração sucinta de seu objetivo –
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preparação conjunta da pesquisa – seguindo-se a apresentação dos componentes do grupo,
após o que não se diria mais nada, aguardando-se os movimentos dos representantes da
comunidade. A ansiedade assim criada pela ausência da palavra do “líder natural” poderia
permitir o questionamento da relação entre o conhecimento e o poder. (ADORNO, et al,
1997).
A adoção desta estratégia, permitiu problematizar a questão da fala em geral e
resgatar a especificidade da fala do dominado, superando-se (a nível superficial, é claro) a
relação vivida pelo dominado em termos de falar “mal” / não falar – pensar “mal” / não
pensar”. (op.cit.).
Baseada nesta estratégia adotamos uma atitude de ouvir e auscultar o que a
comunidade tinha para dizer, estimulando-a a falar sobre a sua vida, seus problemas, suas
angústias, seus desafios, ou seja, partindo sempre da realidade concreta tal como a
comunidade a vive e sente.
Fomos, portanto, estabelecendo uma prática dialógica e participativa e, neste processo
de aprendizagem, de repasse de informações, fomos aprendendo com eles e modificando na
prática algumas concepções que no plano teórico pareciam corretas. Isto é, fomos
construindo práticas e conhecimentos, vivenciando processos e sentindo suas preocupações e
suas estratégias de sobrevivência na área.
O fato de os parceleiros (apáticos, descrentes, desunidos) sentindo-se ameaçados pela
APA (CRA) e outras instituições em sua sobrevivência, principalmente pela autoridade da
legislação ambiental, receberem o apoio de uma profissional do CRA, que aluna do Mestrado
realizava seus estudos de pesquisa no local, adotando como estratégia uma aproximação que
“rompesse o silêncio”, o colocar-se como um facilitador, disposto a compreendê-los em suas
necessidades, conhecer sua história de vida e conquistas, seus anseios, suas utopias,
comprometendo-se a ajudá-los na construção de um mundo melhor, porque os estimulava a
buscar a força da luta, nas próprias crises (débito com o BNB) que se instalaram na
comunidade, constituía em um espaço promissor de formação de vínculos afetivos e de
solidariedade entre técnico e população, segundo o propugnado por GRAMSCI, 1978 (no
início deste capítulo), a relevância do confronto entre os saberes técnico e popular, para a
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geração de um novo saber que se solidifica nos processos educativos e nas relações de
respeito mútuo.
Uma das estratégias utilizadas pela comunidade para a melhoria da qualidade de vida
foi a realização do I Seminário da Marambaia, tendo como temas a Reforma Agrária, o
Turismo e o Meio Ambiente. Para tanto, a Associação dos Parceleiros da Marambaia
contando com o Grupo de Apoio à Presidência realizou em 11 de agosto de 2000 o referido
evento, objetivando discutir e buscar coletivamente soluções aos problemas enfrentados, a
exemplo da titulação da terra, créditos agrícolas, habitação, saúde, educação, uso da terra,
ecoturismo e conservação ambiental.
A solicitação por parte do Grupo de Apoio a esta pesquisadora representa a evidência
do reconhecimento técnico e da confiança, resultante dos vínculos afetivos e competência
para a busca de soluções; Este fato significou para a autora que estava aceita pela
comunidade e que poderia dar início às primeiras ações de sua investigação, trocando idéias
com eles sobre a pesquisa e como viabilizá-la. Prestamos, então, colaboração técnica aos
promotores do evento o que fortaleceu ainda mais a nossa inserção na comunidade. (ver
Recorte do Jornal da APA, anexo II).
Figuras 22 e 23 - I Seminário da Marambaia “Reforma Agrária, Turismo e o Meio Ambiente”
(11.08.2000)
Para a realização do evento a Associação fez articulações com os técnicos dos órgãos
governamentais que atuam na área; INCRA, CRA, CONDER, CEPLAC, Prefeitura
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Municipal de Itacaré e técnicos de Organizações Não Governamentais – ONG´s: IESB,
FETAG, COOTEBA/LUMIAR.
Na abertura do evento as palavras do presidente da Associação demonstram o
interesse da comunidade em estabelecer parcerias com todos aqueles que possam ajudá-los na
busca de alternativas viáveis para o enfrentamento das atuais condições de vida em que se
encontram.
“Antes a Marambaia era melhor. O que queremos é a tecnologia. Nós sabemos trabalhar, mas não conhecemos o que a terra pode nos dar. Nós não demo retorno à terra pois estamos sem condições de trabalhar. Nós queremos que os técnicos tragam a solução. Não temos assistência técnica e nem temos condições financeiras. Estamos inadimplentes com o BNB. Vem agora a Lei da APA para conservar o ambiente, as matas, o verde e não temos condições de usar a terra. Temos lutado muito, mas temo esperança. Estamos fazendo este seminário com as autoridades do governo e dos chefes políticos esperando que as nossas condições sejam resolvidas.” (Sr. Petronílio – Pres. Associação).
Dando continuidade ao que esperavam do seminário, a coordenadora do Grupo de
Apoio à Presidência, disse:
“A Marambaia representa a área pioneira de reforma agrária aqui no município e nessa região. No início éramos um grande grupo e bastante jovem onde foram selecionadas 32 famílias numa área de 800 hectares, lá se vão 15 anos. Sempre enfrentamos dificuldades e todo tipo de incompreensão, às vezes do governo, às vezes da própria sociedade. Hoje, mais velhos estamos diante de novos desafios – defender a permanência dos nossos filhos na nossa terra, lutar pelo direito de continuar existindo como cidadãos, aqui, no lugar escolhido para nossa morada e convivência.” (D. Otília – antiga líder comunitária).
Antes de iniciar as palestras dos técnicos, foram apresentadas pela Associação as
questões que gostariam que fossem discutidas pelos participantes, quais sejam:
“Nós atravessamos uma fase de dificuldade ou melhor mais uma e tentamos ordenar algumas questões para apreciação nesse seminário, a exemplo de :
• Tratamento especial no endividamento dos nossos parceleiros com o BNB, e de todas as demais áreas aqui representadas;
• Liberação de documentos pendentes; • Alternativas para convivência da reforma agrária com o meio ambiente; • Infra-estrutura para a criação de animais de pequeno porte; • Formação de viveiros para produção de mudas florestais, ornamentais, de fruteiras e de espécies de
valor medicinal; • Criação de estrutura para produção de adubo orgânico e ração; • Incentivos para recuperação de áreas degradadas; • Criação de uma oficina de artesanato; • Estrutura para o aproveitamento de frutas e verduras; • Meios para exploração dos recursos hídricos e outros potenciais da nossa área; • Apoio técnico para organização da agrovila;
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• Apoio técnico para formação de trilhas e demais roteiros para o ecoturismo; • Apoio para a saúde, educação, água, saneamento e urbanização do núcleo comunitário.”
A realização deste Seminário surtiu um efeito positivo na comunidade, pois mesmo
estando com a auto-estima baixa em virtude do débito com o BNB, do sentimento de
abandono em que se encontravam e das desconfianças com relação aos técnicos, tiveram a
competência de delinear a possibilidade de estabelecer parcerias para a execução de alguns
projetos que respondam aos seus interesses e necessidades. Desse modo, consideramos
importante destacar as principais colocações apresentadas pelos técnicos, ou seja, os
compromissos assumidos entre os possíveis aliados (atores sociais) e os encaminhamentos
efetivados após o Seminário:
a) Com relação ao turismo, o representante da ILHÉUSTUR fez a seguinte proposta: A cidade de Itacaré tem um diferencial na Costa do Cacau, pois a região detém a Mata Atlântica que é um produto turístico, fácil de vender. Como trabalhar uma área de assentamento de reforma agrária para o turismo? Esse é um grande desafio. A Marambaia deve se organizar para se integrar ao turismo de Itacaré. Para isso deve definir pelo turismo rural e ecológico, desenvolver o artesanato, o folclore, conservar os recursos naturais existentes, ou seja, montar um projeto que possa atrair turistas para a área.
A possibilidade de elaboração de um projeto voltado para o ecoturismo constitui-se
em um desafio para a comunidade, pois não detém a devida capacitação para tal. Porém,
conhecendo as potencialidades dos recursos naturais existentes na área têm a intenção de
divulgar as matas, fazer trilhas, divulgar as plantas, as muitas madeiras e árvores de copas
bonitas. Estamos querendo fazer outro tipo de desenvolvimento, o desenvolvimento que
queremos é o desenvolvimento turístico. Nós precisamos de conhecimento, de pessoas que
venham aqui nos informar a gente se identificar melhor”. (Sr. Petronílio – Pres. da
Associação).
Com essa preocupação a comunidade coloca-se aberta a um novo tipo de trabalho
onde o estabelecimento de alianças mútuas pode resultar em uma efetiva operacionalização
de seus sonhos.
b) Com relação à questão urbana, o representante da CONDER - Companhia de
Desenvolvimento Urbano, apresentou o tipo de intervenção do órgão na área:
A cidade de Itacaré por sua topografia e limites geográficos tem como vetor de crescimento a área em direção ao núcleo da Marambaia. A CONDER fez um levantamento topográfico
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do Núcleo da Marambaia para montar estudo de disciplinamento da ocupação, desde quando na área está previsto o “Portal da Cidade”. Encontra-se em fase de estudo a possibilidade da CONDER realizar o projeto da agrovila, estabelecendo o núcleo urbano do assentamento.
A comunidade concordou que a Marambaia seja o “Portal da Cidade”, porém os
parceleiros exigiram que a Associação seja a entidade responsável pelo gerenciamento do
Portal da Cidade que prevê o estacionamento dos ônibus, as lojas de artesanato, a lanchonete,
etc. Para tanto, solicitam a capacitação para que possam gerir com eficiência a atividade. O
compromisso de realização do projeto de “agrovila” pela CONDER está sendo concretizado
com a participação dos parceleiros, dos técnicos da CONDER e do CRA onde foram
discutidos conjuntamente os parâmetros de ocupação e uso definidos no zoneamento e no
Plano de Manejo da APA. O projeto encontra-se em fase final de elaboração, onde está
sendo discutido o Termo de Compromisso com os parceleiros, o INCRA, a CONDER e o
CRA. Finalizado, a Associação irá buscar o apoio dos poderes públicos para a execução do
Projeto.
c) Com relação ao meio ambiente, a representante do CRA e administradora da APA
Costa de Itacaré – Serra Grande, disse:
As ações do CRA compreendem a fiscalização, o licenciamento e a gestão participativa da APA. Para esta gestão é necessário o envolvimento de todos os atores sociais inseridos na APA e para isso a comunidade deve ver a APA como um aliado, pois esta unidade de conservação compatibiliza a conservação ambiental com as atividades produtivas. Portanto, qualquer intervenção do órgão na área será discutida com a comunidade na tentativa de buscar alternativas que melhorem as atuais condições de vida.
A postura dos técnicos do CRA tem sido de buscar o envolvimento dos parceleiros em
todas as atividades do órgão na área. Prestando esclarecimentos, discutindo os problemas,
facilitando as articulações entre os órgãos públicos e ONG´s, com o objetivo de garantir a
participação da comunidade na gestão da APA.
d) Com relação à assistência técnica, o técnico da CEPLAC fez as seguintes
considerações:
A CEPLAC prestou assistência técnica ao assentamento de 1987 a 1993, quando a CEPLAC se retirou da área em virtude da contratação pelo INCRA da equipe da COOTEBA/LUMIAR, vinculada ao Programa Nacional de Reforma Agrária. Participamos da implantação do assentamento e detectamos que a área tem limitações de solo e na época dificuldade de acesso para escoamento da produção. Com o asfaltamento da estrada BA-
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001 esta dificuldade foi superada, permanecendo a limitação do solo. A CEPLAC implantou o projeto do coco. O pequeno produtor tinha que trabalhar com quatro culturas: cravo, café, coco e pastagem. A CEPLAC está aberta para a possibilidade de prestar assistência técnica ao assentamento. Para isso a Associação deve formalizar a solicitação à diretoria da CEPLAC.
Reconhece o técnico da CEPLAC que os projetos agrícolas implantados com o
assessoramento técnico do órgão não surtiram os resultados esperados, em virtude das
condições do solo da área. Porém, colocou que o órgão está disponível para voltar a prestar
assistência técnica aos parceleiros, em outro patamar, os seja, efetivamente implantar na
prática as orientações de alternativas técnicas de manejo do solo, que garanta a
sustentabilidade das famílias e do ambiente.
e) Com relação ao desenvolvimento sustentável, o diretor do IESB, apresentou os
projetos desenvolvidos na área:
O IESB através do Programa de Educação Ambiental e Ecoturismo vem desenvolvendo um trabalho na área a partir da realização do Diagnóstico Rápido Participativo – DRP, onde foi implantado o Viveiro de Mudas Comunitário com a produção de 3.000 mudas que serão compradas pelo Hotel Transamérica. Encaminhamos um projeto que foi aprovado pela FUNBIO e Fundação FORD para a execução de alternativas econômicas para as comunidades rurais da APA, estando contempladas as comunidades da Camboinhas e Marambaia. A aplicação dos recursos será discutida com as comunidades a partir dos seus interesses e necessidades.
O compromisso assumido pelo IESB está sendo colocado em prática através do
projeto “Comunidades rurais e florestas da APA Itacaré – Serra Grande”, cuja experiência foi
relatada no capítulo anterior.
f) Com relação ao endividamento dos parceleiros da Marambaia, o representante do
INCRA, informou:
O objetivo do INCRA é auto-gestão da comunidade que traga a melhoria da qualidade de vida. As famílias já estão tituladas e a Marambaia está preste de ser emancipada. A Associação dos Parceleiros e a FETAG solicitam o perdão da dívida com o BNB, peço que essas entidades façam uma exposição de motivo ao INCRA solicitando o perdão da dívida para que possamos negociar com o Banco. Estão previstos pelo INCRA a implantação de um Poço Artesiano através do convênio celebrado entre o INCRA e a CDA e de uma Barragem, fruto do convênio entre o INCRA e a CAR. A previsão é de que estes projetos sejam iniciados nos meses de setembro/outubro. Neste momento entrego ao presidente da Associação cópias dos convênios celebrados.
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O INCRA colocou-se como aliado dos parceleiros para as negociações junto ao BNB
de anistia do débito. Os estudos técnicos para a elaboração do projeto de construção da
Barragem estão sendo providenciados pela CAR em articulação com o CRA para o devido
licenciamento da obra.
Após as palestras, a representante da Federação dos Trabalhadores na Agricultura-
FETAG, ressaltou a importância da organização e da união dos assentados da Marambaia
para a melhoria das suas condições de vida e disse que os projetos apresentados pelos
técnicos do governo são fruto da luta dos parceleiros, ratificando que a Associação deve ser
ouvida em qualquer projeto de intervenção na área.
Ao final do evento foi apresentada a peça folclórica da Marambaia “O Bicho da Mata
Atlântica”, que consiste em uma encenação com expressão corporal e musical.
O sucesso alcançado com a realização do Seminário iniciou o processo de elevação da
auto-estima da comunidade e da necessidade de fortalecimento dos sentimentos de união e
organização entre os parceleiros.
Assim, o conhecimento da realidade vivenciada na comunidade aprofundou-se cada
vez mais e, conjuntamente estabelecemos um calendário de reuniões para a definição de um
plano de ação, visando as possíveis soluções aos problemas detectados pela comunidade.
Ao lado disso, procuramos conhecer o processo de ocupação da área, através de
registros da Associação, dos projetos elaborados pelos órgãos e entidades civis e entrevistas
informais com lideranças locais, aprofundando o resgate histórico do assentamento
Marambaia.
b) Revelando a história de ocupação
A história do assentamento da Marambaia está relacionada ao direito à vida (trabalho
na terra) e à dignidade (exercício da cidadania), reivindicados pelos movimentos rurais,
especialmente pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG e,
na Bahia, pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura – FETAG, e partidos políticos de
oposição que empunhavam a bandeira de luta “Reforma Agrária Já!”.
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“Normalmente, durante e após o processo de conquista da terra, algum órgão é designado para a implantação do assentamento... Entretanto dos anos 79 até meados de 1985, quando não se falava muito em reforma agrária ou esta apenas aparecia em algum programa dos partidos de esquerda, e com o Governo brasileiro de certa forma “cansado” com os sucessivos fracassos da colonização da Amazônia, o tratamento dado por estes órgãos aos assentamentos era de completo descaso para “ver no que é que dava”.” (FLECK, 1986, p.53)
A luta pela conquista da terra (Fazenda Marambaia) inicia-se em 1983, tendo como
protagonistas desta história, de um lado 45 famílias de trabalhadores rurais da região que
reivindicavam uma parcela de terra para trabalhar e de outro, o dono da Fazenda, “um gringo
que vivia em Itacaré da exploração de madeira” .
No intuito de conhecer o processo de ocupação da área nada melhor do que ouvir os
próprios protagonistas desta história. Para tanto destacamos os depoimentos de antiga líder
comunitária e do atual presidente da Associação dos Parceleiros da Marambaia, participantes
do processo de ocupação da terra:
“Eu sou Otília e com outras pessoas Brás, Cláudio, Arlito, Sebastião, Raimundo de Bajé, Severo, Bonfim, Antoniozinho, Idalício, Sebastião de Antoniozinho, Crispinho, estavam conversando no Km 15 de Itacaré, quando chegou o gringo Sr. Radin para dizer que queira utilizar a terra de forma produtiva para impedir a reforma agrária. Nos pediu para fazer roça na mata. Fizemos uma reunião e pedi que aguardassem a minha ida a Salvador para pegar informações sobre a área. Em Salvador, fui à FETAG e consegui uma passagem para Brasília e chegando lá procurei o presidente do INCRA, o Sr. Paulo Iakota. Fui à Câmara de Deputados e conversei com o deputado Elquisson Soares e pedi informações e soube que a área tinha 18 anos sem pagar ao INCRA e então pedi o confisco da terra, dizendo que em Itacaré a cidade não oferecia condições de vidas aos nativos e que os proprietários só faziam tirar madeira do mato. Voltei para Itacaré e junto com os meus amigos ocupamos a área e botamos roça. Depois disso o gringo pediu as roças mandando que nós assinasse um contrato. Mas, nos não assinamos. Para mostrar que sua terra era produtiva, o gringo encaminhou um relatório para o INCRA dizendo que tinha 50 hectares de cacau, 50 hectares de seringa, 150 hectares de pasto e 50 vacas. O INCRA mandou técnicos à área e só encontrou resquícios de serraria e áreas queimadas. O gringo então pegou a área e deu de meia a Luís Mendes para que ele tirasse a gente de lá. Luís Mendes pegou a polícia, a justiça, colocou pistoleiros na área, e nós resistimos. Neste conflito tivemos perdas de pessoas, como a morte de Deraldo, Evangelista ficou inválido, Manuel recebeu tiros, mas está vivo, Marcos foi cortado à facão, eu fui agredida por um delegado, 11 soldados e 12 pistoleiros com oito dias de parida e nesta luta toda saiu a desapropriação da área pelo INCRA em 1986. Ocupamos em 1983 e lutamos durante três anos. Nesses três anos dormimos no mato com os filhos, com medo dos pistoleiros, dormia entrincheirados, passamos fome, não tinha o que vestir, a sandália era amarrada de cordão. Tudo isso para ter o direito do pedaço de terra que é a nossa vida”. (D. Otília – antiga líder comunitária)
Este depoimento retrata a situação de conflito de classes pela posse de terra que ao
longo dos anos vem ocorrendo no Brasil. De um lado, os setores oligárquico-latifundiários,
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em que a terra significa o espaço de poder, cuja apropriação segundo GEHLEN, 1986 “é a
materialização ou personificação desse poder. Por isso a desapropriação (ou liberação
dessas terras de seu controle) significa também a expropriação de seu poder, a eliminação
deles como classe social. Por isso sua determinação de usar armas e violência contra quem
os ameaça”. De outro, os agricultores sem terra, que lutam pela conquista da cidadania e por
um espaço onde possam trabalhar e viver, isto é, a luta pelo direito a terra é uma luta pela
dignidade (cidadania) e pelo direito à vida, onde dela possam tirar o sustento (sobrevivência)
de suas famílias.
“Eu sou Petronílio presidente da Associação dos Parceleiros da Marambaia e em 1981, 82, existia uma crise muito forte aqui em Itacaré para a gente comprar uma verdura, carne de porco. Um dia o Sr. Adelino na reunião do Sindicato disse: oi gente, surgiu uma fazenda em Itacaré, a Fazenda Marambaia, ela tem 914 hectares. Quem quiser arrumar um pedaço de terra é só dar uma assinatura e nós vai fazer um levantamento e levar para o INCRA desapropriar a fazenda e assentar as famílias. O sindicato conseguiu 150 assinaturas. O presidente fez um levantamento e mandou para o INCRA. Nós esperamos um ano e meio e D. Otília não tinha ainda chegado em Itacaré. O Sr. Adelino disse que chegou uma mulher de reforma agrária que é D. Otília e ela conhece o que é reforma agrária e é capaz de vocês tomar essa terra da mão do homem. O dono só vinha desmatar, tirar a madeira e voltar para o estrangeiro. Ele morava na Suíça e assim a gente encostamos em D. Otília e em 1983 foi uma batalha muito grande, mas também o INCRA nos deu cobertura e em 1986 o INCRA veio e desapropriou aqui a Marambaia e fez o assentamento de 32 famílias porque o tamanho da área não dava para as 45 famílias e assim nós tivemos uma vida muito importante. Criamos a feira de Itacaré, exportamos muita farinha daqui para Ilhéus e Itabuna. Também não existia ainda a APA, não existia ainda a proibição de trabalhar na Mata Atlântica. A gente tava trabalhando mas tava fazendo o desmatamento, mas não conhecia que existia essa proibição. Aí nós começamos a parar para obedecer a lei e aí começou a fraqueza, a gente foi diminuindo, acabando as forças, a renda”. (Sr. Petronílio – Pres. da Associação)
Um aspecto relevante deste depoimento diz respeito às legislações ambientais que
proíbem o desmatamento a exemplo da Lei Federal nº 4.771, de 15/09/65 “Código Florestal”
e o Decreto nº 750, de 10/02/93, “que dispõe sobre o corte, a exploração e a supressão de
vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica”.
Para os assentados estas leis e a Lei de criação da APA proíbem, mas não oferecem
alternativas para a sobrevivência. Conservar o verde ainda que às custas da vida dos homens
é uma concepção que, hoje, vem se modificando a partir da proposta de desenvolvimento
sustentável. A categoria de Unidade de Conservação denominada APA, “convive com a
propriedade privada e sua gestão objetiva conciliar interesses econômicos e ambientais,
partindo assim para a prática do desenvolvimento sustentável. Configura uma unidade de
conservação em situação mais complexa, por admitir a ocupação e uso controlado, sendo
110
necessário conciliar as suas funções produtivas e sociais com a proteção ambiental, sem
ferir o direito de propriedade nem as leis de proteção ambiental”. (MURICY, 1999).
Portanto, há que ser estabelecida uma relação dialógica entre os poderes públicos e a
comunidade, onde a consideração desta questão meio ambiente x reforma agrária remete ao
fato de que a participação dos pequenos produtores rurais na conservação ambiental, nestes
novos tempos, não é somente de serem proibidos de desmatar, mas, sobretudo, de serem
orientados para o uso de alternativas de manejo sustentável do solo e de alternativas de
produção e renda, no sentido de minimizar as pressões sociais sobre o uso dos recursos
naturais e garantir a melhoria da qualidade de vida.
Com a desapropriação pelo INCRA, em 1986, as 32 famílias das quais três eram
mulheres, organizaram-se e criaram a Associação dos Parceleiros da Marambaia que passou a
ter representação e legitimidade da comunidade perante os órgãos públicos, entidades civis e
à sociedade. Por duas gestões D. Otília presidiu a Associação, sendo sucedida por Zenaide,
Valdomiro, Genivaldo e atualmente Sr. Petronílio.
Com a estruturação de sua forma de organização, os parceleiros através da Associação
foram contemplados por vários projetos de investimento na área, com o objetivo de garantir a
sobrevivência das famílias assentadas. Porém, estes projetos não tiveram uma devida
orientação técnica e insumos agrícolas necessários o que ocasionou o fracasso de alguns
deles, refletindo a atual situação de precariedade de vida no assentamento.
Em 1988, através do DESENBANCO ocorreu o primeiro financiamento para
implantação do coco da baía e mandioca, os parceleiros cumpriram todas etapas previstas no
financiamento: implantação das culturas, colheita e pagamento dos débitos. O Presidente da
Associação diz: “O INCRA abriu crédito pelo PROCERA para produção de 1 hectare de coco, ½ hectare de cravo, ½ hectare de dendê e ½ hectare de café para cada família. Das 25 hectares de cada lote, 20% é para cultivo e 5% reserva florestal, essa foi a orientação do INCRA.” (Sr. Petronílio – Pres. da Associação).
Em 1993, a CEPLAC, órgão responsável pela assistência técnica ao assentamento
elaborou projetos financiados pelo Programa da Terra envolvendo investimento e custeio
agrícola, objetivando a continuidade dos trabalhos de manutenção do coco da baia e
111
implantação de novas culturas: cravo, dendê, café, sendo que apenas 28 assentados
contraíram o empréstimo de até 13.298 URV´s (R$3.191,52). COOTEBA/LUMIAR.
“Em 1996 tivemos o crédito PROCERA e o agente financiador foi o BNB para plantação de coco que foi dividido em duas parcelas. Esta dívida não foi liquidada. Para o plantio do coco tivemos a assistência técnica da CEPLAC, sendo 2% de contrapartida de cada projeto. No início dois técnicos da CEPLAC deram assistência técnica semanalmente. Faziam reunião para explicar o projeto, mas teoricamente e depois as pessoas seguiam as explicações nas roças. O pessoal seguia ao pé da risca as formas de plantio, mas não obtinha resultados, porque não tiveram assistência técnica na prática”. (Sr. Genivaldo – Vice-presidente do STR de Itacaré).
De um modo geral a relação entre o agente técnico e o agente popular nos projetos de
financiamento no assentamento se expressou pela imposição do “saber” e da “verdade” do
técnico que transmitia os conhecimentos teoricamente sem o rebatimento na prática, sem o
confronto com o saber do fazer popular. Evidentemente, este encontro de saberes não
ocorreu, dificultando ou até mesmo não se efetivando os objetivos propostos nos projetos. A
postura dos técnicos foi de endoutrinamento, como diz BOFF, 1986, “É, portanto, uma
forma autoritária de educação, pois supõe que uma parte saiba, fale e ensine e a outra
ignore, escute e aprenda”.
Em virtude da incapacidade financeira para o pagamento da dívida junto ao Banco do
Nordeste – BNB, em 1998, a Associação dos Parceleiros da Marambaia encaminhou ofício
ao INCRA comunicando e justificando a falta de produtividade do plantio do coco e,
conseqüentemente a falta de recursos dos parceleiros para o pagamento da dívida contraída.
A Comissão Estadual do PROCERA/LUMIAR então solicitou que a CEPLAC
elaborasse um Laudo Técnico da real situação do projeto implantado pelo órgão no
assentamento.
“Sem nenhum respaldo por parte da CEPLAC, muito menos alternativa para solucionar os problemas, a Equipe Técnica BahiaSul/COOTEBA com o apoio da comunidade interviu no sentido de conduzir as atividades de campo onde foi elaborado um Laudo Técnico caracterizando a situação correspondente”. (COOTEBA/LUMIAR, 2000).
Em 1998, a comunidade passou a ter a assistência técnica da equipe
BahiaSul/COOTEBA, vinculada ao Programa LUMIAR/INCRA, que direcionou suas
atividades na preservação e manutenção das culturas existentes, nas atividades sociais, na
112
capacitação e organização da Associação e na inserção do assentamento no contexto
mercadológico.
Em abril de 1999, com o respaldo da resolução nº 2564/98, o INCRA conseguiu a
prorrogação do saldo devedor do assentamento Marambaia contemplando as 32 famílias
assentadas.
Em junho de 1999, a Cooperativa de Trabalho do Estado da Bahia –
COOTEBA/LUMIAR, vinculado ao Programa Nacional de reforma Agrária emitiu o Laudo
Técnico retratando a atual situação técnica e econômica do assentamento baseando-se no
projeto de Investimento Agrícola implantado no ano de 1996, implantado pela CEPLAC.
O Laudo faz uma análise técnica das características do solo, onde predomina o laterita
(cascalho) com 20 cm de profundidade da superfície do solo o que dificulta o
desenvolvimento radicular da planta (coco). O laudo técnico constatou que a falta do preparo
do solo e a má qualidade da muda tem sido o que mais comprometeu o desenvolvimento da
cultura e a sua capacidade de pagamento. Com as mudas sem certificação e contaminadas por
doenças (Podridão Parda) e helmintosporiose, os assentados obtiveram perda de 20% de suas
plantas. Além disso, no assentamento ainda não há uma estrutura de escoamento nem de
beneficiamento da produção.
A conclusão do Laudo Técnico elaborado pelo COOTEBA/LUMIAR afirma que,
“entendemos que os assentados e assentadas do Projeto Marambaia encontram-se
prejudicados, uma que, em virtude dos erros consecutivos cometidos pela CEPLAC, estes se
encontram com incapacidade para pagamento, ainda que prorrogado, do crédito
PROCERA/INVESTIMENTO, o que impossibilita, a obtenção de novos créditos e o
conseqüente desenvolvimento econômico e social da área. Solicitamos, pois que a Comissão
Estadual do PROCERA/LUMIAR seja sensível à questão exposta e que envie uma sub-
comissão para junto com a equipe técnica e os assentados chegarmos à alguma solução
viável e alentadora neste importante projeto de assentamento”.
Com base neste laudo, a dívida foi prorrogada por mais dois anos, estando previsto o
vencimento em abril de 2001. Aproximando-se a data para o pagamento da dívida e cientes
da incapacidade de saldá-la, os assentados solicitam do INCRA a anistia do débito junto ao
113
BNB, “mas precisamos do laudo da CEPLAC, EBDA, BNB, INCRA, COOTEBA/LUMIAR,
EMBRAPA, UESC. Com base nestes laudos se for favorável a Marambaia quem vai pagar o
débito é uma comissão de fundo do INCRA”. Para isso a Associação está articulando a vinda
dos técnicos à área para que conhecendo a realidade tenham condições de subsidiar o INCRA
para o pedido de anistia do débito.
O débito ao BNB constitui-se no maior problema para a comunidade, pois os
parceleiros estão preocupados em perder as suas terras para o banco. Entendem que “o
primeiro passo para o pessoal se equilibrar e andar de acordo com a APA é a anistia do
débito, a partir daí vamos tomar novo rumo, não queremos desmatar, estamos querendo um
meio para garantir a sobrevivência na área”. (Sr. Genivaldo – Vice Presidente do STR de
Itacaré).
Atualmente, com a suspensão do Projeto COOTEBA/LUMIAR na área, a
comunidade encontra-se sem assistência técnica de qualquer órgão público. Porém merece
ser destacado o importante trabalho que vem sendo realizado pelo IESB – Projeto
FUNBIO/FORD, uma Organização Não Governamental-ONG, cujo objetivo é conciliar a
melhoria da qualidade de vida das comunidades rurais, concomitantemente com a
conservação dos recursos naturais e remanescentes da Mata Atlântica.
“Eu vejo o projeto do IESB com bons olhos, porque tem que se começar lá de baixo para chegar no estágio maior. Não se pode realizar o sonho de uma só vez. Tem que começar aos pouquinhos”. (Sr. Genivaldo – Vice Pres. do STR de Itacaré).
Diante da falta de assistência técnica governamental e sentindo-se excluídos do
processo de desenvolvimento, os parceleiros da Marambaia acreditam que a “a união e a
parceria” garantirão uma melhoria das atuais condições de vida, como coloca o presidente da
Associação:
“Nós queremos cumprir a lei da APA, só que nós não temos condições para sobreviver e para cumprir essa lei para conservar o meio ambiente. Ai, nós queremos o que? Juntamente com as autoridades competentes informações, como nós vamos fazer para melhorar as condições aqui na Marambaia. Nós queremos divulgar as cachoeiras, divulgar nossas riquezas. Com a ajuda primeiro de Deus, dos técnicos, dos estudantes da UESC. É isso que nós estamos precisando, da ajuda de técnicos para nosso desenvolvimento. Nós precisamos de pessoas que venham aqui nos informar a gente se identificar melhor... É preciso também a nossa união trabalhando todo mundo junto... a gente tem que ter fé, tomar mais conhecimento, criar coragem pra gente desenvolver... O desenvolvimento agora
114
é o turismo e o trabalho turístico tem que vim assim de uma forma divulgando qualquer coisa de bom que nós tiver aqui...” (Sr. Petronílio Valverde)
Na verdade, o depoimento é um testemunho da indiferença dos órgãos públicos frente
às dificuldades dos parceleiros, que sem assistência (orientação) técnica só encontra na força
de sua união a estratégia para conquistar seus projetos. É interessante observar que a situação
de crise está gerando a ousadia para que eles possam vencer e desenvolver sua comunidade e,
nesta caminhada buscam alianças com os “´técnicos”, que detendo o conhecimento possam
ajudá-los na elaboração e concretização dos seus sonhos de uma vida melhor.
4.1.2 - REARTICULANDO A PRÁTICA DE PESQUISA À TEORIA EM
EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Para o aprofundamento do estudo em questão, paralelamente ao conhecimento da
realidade vivenciada, realizamos uma revisão de literatura com o objetivo de obter uma maior
consistência teórica que respaldasse a prática e sistematizasse a construção do conhecimento.
Para tanto, desenvolvemos uma pesquisa bibliográfica sobre os temas referentes a Educação
Ambiental, Movimentos Sociais Rurais e Ecológicos, Reforma Agrária, Desenvolvimento
Sustentável e Cidadania, que possibilitou a formação do quadro teórico que embasa esta
investigação. A formação de um corpo teórico consistente e que seja comprovada na prática
foi possível a partir da reflexão de confronto entre a revisão teórica, o conhecimento da
realidade vivenciada e a experiência prática da pesquisadora.
É importante assinalar o caráter de prática social que tem a metodologia de pesquisa-
ação, no qual a produção de conhecimentos, orientados pela teoria, se conjuga a uma prática
educativa mediante a qual se busca a transformação, em primeiro lugar, da própria
consciência da realidade e, em seguida da própria realidade dos sujeitos do processo.
(PINTO, 1986).
Nesta fase de rearticulação da prática de pesquisa à teoria procuramos compreender os
raciocínios dos sujeitos (parceleiros) e confrontá-los com os raciocínios teóricos, pois a
comparação dos dois tipos de raciocínios constitui uma importante fonte de informação para
se detectar até que ponto existe uma real intercompreensão, a possibilidade de diálogo e de
transformações nos modos de pensar sobre determinados problemas. Além disso, é possível
115
avaliar diversos graus de aproximação ou de adequação dos conhecimentos em questão.
(THIOLLENT, 1985).
Esta adequação dos conhecimentos foi possível através da relação dialógica
estabelecida, onde os parceleiros a partir do senso popular tiveram voz reconhecida e o
pesquisador a partir do conhecimento de diversos elementos de teorias e experiências
anteriormente adquiridas teve condições para a concretização dos conhecimentos teóricos,
obtida de modo participativo na relação entre o pesquisador e os participantes.
As premissas básicas de sustentação da pesquisa estão fundamentadas na pesquisa-
ação como prática social com o propósito de ao mesmo tempo ter um caráter aplicado e
educativo, não buscando apenas conhecer ou compreender as relações existentes, mas
transformá-la com base em conhecimentos relevantes para a definição de ações. (PINTO,
1986).
PINTO, 1986, ainda aponta que, “este tipo de pesquisa por ser participativa tem um
caráter novo e inovador desta prática, na medida em que o conhecimento científico se
produz na própria ação e ao mesmo tempo contribui para ela”.
Segundo o autor, a metodologia da pesquisa-ação como prática social ressalta a
necessidade da síntese, da unidade do diverso, ou seja, a prática social tem como fim a
transformação da sociedade e essa transformação só pode se dar como prática política que
busque unificar a prática científica e a pedagógica em um só objetivo. É a tomada de
consciência dos interesses objetivos e da organização na ação.
A aplicação deste tipo de pesquisa social a uma prática de Educação Ambiental,
objeto desta investigação, está respaldada nos princípios da participação e na visão holística e
interdisciplinar do ambiente.
A participação aqui entendida se baseia na igualdade de poderes que não é outra senão
o respeito mútuo, a solidariedade e a compreensão entre o saber científico e o saber popular,
num processo de vivência conjunta e participativa como garantia do exercício da plena
cidadania. (HOMEM D´EL REY, et al, 1991).
116
Esta capacidade de reflexão – ação sobre a problemática ambiental é condição
essencial para que os envolvidos no processo assumam compromissos de mudanças,
conforme afirma Paulo Freire:
Não é possível um compromisso autêntico se, àquele que se julga comprometido, a realidade se apresenta como algo dado, estático e imutável. Se este olha e percebe a realidade enclausurada em departamentos estanques. Se não a vê e não a capta como uma totalidade, cujas partes se encontram em permanente interação. Daí sua ação não poder incidir sobre as partes isoladas, pensando que assim transforma a realidade, mas sobre a totalidade. É transformando a totalidade que se transformam as partes e não o contrário. (FREIRE, 1983).
Portanto, a visão holística e interdisciplinar colocada ao relacionamento do homem
com a natureza tem como pressuposto a inter-relação entre as partes, envolvendo todos os
aspectos que compõem o ambiente (econômicos, políticos, sociais, ecológicos, científicos,
éticos e políticos), através da adoção de uma visão crítica das questões que afetam a
qualidade de vida das comunidades e a ação participativa na busca de soluções. (DIAS,
1999).
4.1.3 - DIAGNOSTICANDO O AMBIENTE DE VIDA
O diagnóstico do ambiente de vida foi sendo realizado com os parceleiros desde o
momento da inserção do pesquisador na comunidade. Nesta fase de diagnóstico foram
adotados alguns procedimentos metodológicos para a identificação das expectativas, dos
problemas enfrentados, das características da comunidade, no intuito de sistematizar as
informações referentes à percepção e compreensão da comunidade sobre a situação ambiental
do assentamento e as propostas de soluções.
O processo de diagnóstico envolveu a combinação de diversas técnicas empregadas
em pesquisas qualitativas, tendo como base a participação dos sujeitos (parceleiros),
propiciando a oportunidade de se colocarem enquanto indivíduos e coletivamente diante dos
problemas detectados para uma ação de transformação.
Com a finalidade de coletar maiores informações, dar maior consistência ao
diagnóstico e à percepção pelos parceleiros e o que isto representa para a comunidade,
utilizamos a observação participante e a entrevista não-diretiva, conforme estabelecido por
HOMEM D´EL REY et al, 1990.
117
Segundos os autores, a observação participante pode ser entendida como um primeiro
passo de envolvimento do pesquisador nas situações reais e interferências nos processos
sociais locais.
Conforme MEDEIROS (1885) citado por HOMEM D´EL-REY et al, 1990, é na
relação entre sujeitos, dentro do contexto natural da comunidade, que o pesquisador coleta
dados. Assim, ele é parte do cenário sob observação, ao mesmo tempo modificando e sendo
modificado por este contexto.
A entrevista não diretiva possibilita uma maior abertura e liberdade, pois o
entrevistado fica mais à vontade para se expressar, proporcionando o aprofundamento
qualitativo da pesquisa. Ela não pode ser entendida como algo vago, porque há uma
problematização e um fio condutor que permeia todo o processo.
Os dois procedimentos técnicos foram utilizados em reuniões e debates coletivos,
aplicando-se diversas atividades estimuladoras de práticas participativas como visitas à
campo, trabalhos de grupos, buscando incrementar os conhecimentos das características,
causas e atores sociais envolvidos nos aspectos ambientais, estimulando uma prática geradora
de mudanças na percepção e atitudes da comunidade, sendo todas as informações registradas
em caderno de campo.
O tratamento das informações coletadas foi feito a partir da definição de análise de
conteúdos baseando-se nos princípios expostos por MINAYO (1989), citada por HOMEM
D´EL REY, 1990, pois estes princípios buscam “desvendar os sentidos de um texto ou
depoimento, que muitas vezes não estão em primeiro plano e que são compostos por aspectos
extradiscursivos que constituem o espaço cultural, social, político e econômico em se
inserem”.
Estes momentos se constituíram num grande desafio, pois nem sempre o
entendimento do pesquisador sobre os problemas ambientais coincide com a visão destes
problemas por parte da comunidade. O interesse inicial demonstrado pela comunidade se
referiu aos aspectos específicos do seu dia-a-dia, o que a princípio pode denotar uma certa
“despreocupação” dos parceleiros com temas relativos ao meio ambiente, apesar de em todas
118
as reuniões se colocarem preocupados com a interferência da “Lei da APA” sobre a sua
sobrevivência enquanto pequenos produtores rurais.
“O INCRA nos assentou aqui nessa terra para sobreviver fazendo plantio de subsistência... e para nós sobreviver aqui dentro nessa área e viver alegre, nós tem que ter uma renda, fazer um trabalho para alcançar algumas renda para nossas famílias viver aqui. Porque de outra maneira nós não temo como sobreviver porque não se trabalha. Tem que conservar agora a terra, conservar o verde, conservar nossas águas, conservar as nossas matas. Isso para um trabalhador rural que está acostumado a ferir a terra para sobreviver dela , temos grande dificuldades de sobreviver.” (Sr. Petronílio – Pres. da Associação)
Este depoimento revelou que o maior problema ambiental percebido pela comunidade
está relacionado com a conservação ambiental, representada pela APA na qual o
assentamento está inserido e a sobrevivência deles na terra onde escolheram para viver e que
dela dependem para a sua existência.
Como expressa ANDRADE, 1993 “A visão holística é que permite a realização de um
diagnóstico através de variáveis em todos os aspectos. Parte-se de uma visão local que é
transferida para uma visão global, do todo, ou seja, da percepção de que aqueles problemas
locais estão relacionados a problemas muito mais amplos”.
Na metodologia participativa o pesquisador deve socializar seus conhecimentos e não
impô-los à comunidade. Esta prática, portanto tem um caráter político na medida em que
propicia a igualdade de poder tanto nas discussões quanto nas decisões. Os conhecimentos
técnico-científicos têm o mesmo valor que os conhecimentos da vivência prática da
comunidade, onde se respeita a sua cultura, os seus interesses e necessidades.
O diagnóstico feito previamente através das observações do pesquisador não diferiu
em muito do diagnóstico que foi construído com a participação direta dos parceleiros. Há que
se registrar, porém, que durante a realização do diagnóstico houve uma certa predominância
das idéias esboçadas pelas lideranças em detrimento de uma participação mais ampla dos
envolvidos no processo.
Para a definição dos problemas entendidos como “situações objetivas reconhecidas
pelos indivíduos como fonte de agravos ou de infelicidade” aplicou-se o método Delbecq-
Van de Ven que foi adaptado e simplificado em virtude da especificidade das situações em
119
estudo, permitindo o desvelamento dos principais problemas percebidos pelos parceleiros
sobre o seu ambiente de vida.
Na aplicação deste método optou-se pela realização de reuniões coletivas para a
discussão dos problemas ambientais existentes na comunidade, onde a pesquisadora assumiu
o papel de coordenador (animador) do grupo explicando a dinâmica que seria utilizada.
O método Delbecq-Van de Ven, segundo CANDEIAS (1984) “como indicador de
tipo subjetivo, utilizado para diagnóstico social, fundamenta-se na utilização de grupos
nominais”. Este método foi adaptado pela pesquisadora pois os parceleiros preferiram
trabalhar inicialmente em um só grupo.
Portanto, conforme o método Delbecq-Van de Ven, as etapas do trabalho consistiram em:
a) Formação do Grupo – O grupo foi organizado a partir de uma reunião com a
Associação dos Parceleiros da Marambaia para discussão do assunto referente à
inadimplência deles com o BNB. Os participantes por sua própria opção não foram
divididos em grupos de discussão, preferiram trabalhar em um só grupo, pois
consideraram que assim teriam maior rendimento “estamos acostumados em
trabalhar todos juntos”.
b) Formulação da pergunta ao grupo - Em virtude do baixo nível de escolaridade dos
participantes, as perguntas foram formuladas oralmente, sendo discutidas cada uma
individualmente, a saber:
- Quais os principais problemas ambientais da Marambaia?
- Quais as causas desses problemas?
- Que soluções apresentam para resolver os problemas?
- Identifiquem os responsáveis para a solução dos problemas.
c) Identificação dos problemas - A partir das perguntas formuladas o grupo teve um
tempo para reflexão onde as respostas de cada membro do grupo por pergunta
formulada, foram sendo registradas em quadro de giz e papel metro, sem ordem de
prioridade. Ou seja, identificação dos problemas mais relevantes que exigiam
120
mudanças urgentes. Neste etapa, cada membro participa de forma igualitária não
havendo discussão a respeito do significado de cada uma das respostas.
d) Apresentação das respostas e esclarecimento a respeito do significado das respostas –
Nesta etapa são elucidadas as dúvidas, promovendo-se discussões a respeito do que se
pretende dizer com cada uma das respostas, sua lógica e importância. CANDEIAS,
1984, sugere que estas discussões devem-se referir apenas a esclarecimentos e nunca
a argumentações.
d) Priorização dos problemas mais relevantes – A partir da listagem original das
respostas que foram registradas em quadro de giz e papel metro, solicitou-se que cada
participante selecionasse os cinco problemas mais importantes.
f) Discussão e definição das prioridades para se começar os trabalhos – Esta etapa foi
adaptada do método definido por CANDEIAS, 1984, que sugere o voto e discussão
preliminar do voto das prioridades do grupo. Trabalhamos na linha de buscar o consenso
do grupo, a partir do qual os participantes consideraram como prioritários os seguintes
problemas:
• O débito com o BNB contraído em 1996 para o cultivo de coco;
• A falta de incentivo agrícola para a sobrevivência da comunidade;
• O lixo causado pela destinação final (lixão) no Km4 em lotes de parceleiros da
Marambaia;
• A falta de incentivo à cultura local.
Nas reuniões realizadas para a identificação dos problemas esteve presente uma média de
vinte parceleiros, entre homens, mulheres e jovens (filhos de parceleiros). O Quadro 5 mostra
o resultado das problematizações discutidas e as soluções propostas para as necessárias
mudanças.
121
122
Os problemas considerados prioritários pela comunidade e suas soluções podem ser agrupados
em dois blocos:
a) As condições gerais para o desenvolvimento da comunidade (sobrevivência) a partir da
falta de infra-estrutura básica para a produção agrícola e condições gerais de saúde,
habitação, educação (ausência de políticas públicas);
b) A viabilidade das propostas de soluções dos problemas necessita de articulações,
ampliando-se assim a prática educativa, que envolve diversos setores: Organização local
(Associação dos Parceleiros da Marambaia); poderes públicos municipais, estaduais e
federais; Organizações Não Governamentais – ONG´s; Entidades Civis; Grupos
Ambientalistas, que de imediato tornam-se difíceis de serem atendidas no âmbito de
nossas possibilidades de orientação e disponibilidade de tempo para o estudo.
Analisando os problemas detectados pelos parceleiros na Marambaia, a princípio estes
problemas parecem não ter um caráter ambiental, mas quando eles afirmam que o débito com o
BNB e a falta de incentivo agrícola para a sobrevivência são os mais importantes problemas
ambientais da comunidade, raciocinam numa perspectiva ambiental, pois a terra é de baixa
fertilidade e o manejo do solo é inadequado, o que agrava as atuais condições de vida, aliada a
falta de políticas públicas: ausência do governo para as áreas de assentamento de reforma
agrária.
Justificam os parceleiros que a inadimplência junto ao BNB está relacionada à falta de
orientação, como diz o Presidente da Associação, “a assistência técnica foi só de teoria, as
mudas de coco estavam doentes, falta de insumos e equipamentos agrícolas”, enfim:
“Aqui o coco não dá produção, a terra não ajuda, tem muito cascalho, é assim a luta nossa, quando tira a terra fica as pedra. O dia que faz mais vende, o dia que faz meno se veve. A gente veve lutando, não tem de onde tirar a renda”. (D. DINA – parceleira)
A luta pela sobrevivência assume, portanto, uma dimensão ambiental que envolve
aspectos políticos, econômicos, sociais, culturais, éticos, ou seja, os problemas ambientais são
123
frutos das contradições inerentes ao processo do modelo de desenvolvimento capitalista adotado
no país e, especialmente da política de implantação da reforma agrária, que tem se caracterizada
pela luta do homem do campo pela posse de terra e muito pouco por iniciativas governamentais.
A complexidade dos problemas detectados que envolvem os aspectos sociais,
econômicos, políticos e culturais para a compreensão básica do meio ambiente em sua totalidade
reforçou a necessidade de um enfoque crítico acerca da realidade vivida pela comunidade, no
intuito de se desenvolver um pensamento crítico acerca da sua problemática. Segundo
GUERRA, 2000, “quando há responsabilidade crítica, os indivíduos passam a adquirir um
compromisso permanente de melhorar o meio humano e a qualidade vida. Conseqüentemente,
desenvolvem-se atitudes favoráveis à resolução dos problemas emergentes”.
A Educação Ambiental apresenta-se então como uma estratégia de viabilização de
propostas sustentáveis, pois preconiza a formação de cidadãos críticos e conscientes, capazes
para decidir e atuar na busca da transformação do seu ambiente de vida. Para tanto, as
metodologias participativas em programas de Educação Ambiental proporciona a integração
direta e ativa dos indivíduos no planejamento das ações e/ou atividades educativas a serem
desempenhadas, propiciando um comprometimento maior das pessoas durante a implementação
do programa. (GUERRA, 2000).
Segundo ANDRADE e LOUREIRO e HOMEM D´EL REY (1994), “O processo
educativo ambiental não subestima a cultura popular, ao contrário, estimula a participação
democrática de todos os estratos da sociedade. Ao desenvolver-se construindo um novo saber,
resultante do confronto entre o conhecimento científico e o popular, enfatizando a necessidade
da co-responsabilidade de todos na construção de um mundo novo”.
O levantamento dos problemas ambientais foi o passo inicial para a formulação do plano
de ação que foi construído coletivamente, onde o pesquisador assumiu o papel de facilitador das
discussões e os parceleiros os atores do processo. Neste processo, a autonomia da comunidade
foi garantida, na tentativa de evitar o assistencialismo e o paternalismo ainda predominantes nos
trabalhos dos técnicos em comunidades populares.
124
HERCULANO, 1995, dá uma contribuição aos educadores ambientais quando assinala
que “educar não é adestrar tecnicamente cada indivíduo, mas formar pessoas, de acordo com
valores, idéias e ideais que brotam da vida espiritual de uma coletividade, isto é, consiste em
formar membros de uma comunidade, que a ela darão sustento e perenidade”.
Portanto, a base de sustentação da práxis social está fundamentada na participação efetiva
dos maiores interessados, no caso os parceleiros da Marambaia que “sentem na pele e na
barriga” o preço da exclusão social.
Assim, respeitando a sabedoria popular e incentivando a discussão coletiva dos
problemas estabeleceu-se um aprendizado sobre as metas (O que fazer?), as atividades (Como
fazer?), os responsáveis (Quem vai fazer?), a participação (Como se organizar? e Como
mobilizar?). Questões estas que nortearam a elaboração do planejamento da ação.
Como diz STROCH, (s.d.) “Os métodos de pesquisa participativa das ciências sociais
propõem que o investigador veja o mundo estudado através dos olhos dos atores sociais que o
integram, e dos significados que estes atribuem às situações sobre as quais agem”.
Portanto, o planejamento foi sendo construído de forma interativa onde se buscaram
soluções compartilhadas, através da construção coletiva de conhecimentos e vivências, com
vistas ao enfrentamento dos desafios para tentar por em prática os princípios do desenvolvimento
sustentável.
4.1.4 - PLANEJANDO E IMPLEMENTANDO AS AÇÕES
a) Planejamento das ações
Respeitando o nível de mobilização dos parceleiros e de suas lideranças, bem como as
experiências vivenciadas pela comunidade na procura de uma melhoria de vida, como
articulações com órgãos públicos e ONG´s para a execução de projetos, prosseguimos na
metodologia participativa de envolvimento dos sujeitos, utilizando-se de reuniões coletivas para
125
o detalhamento do plano a partir das ações e soluções de cada problema identificado. Através do
planejamento e implementação das ações estimulamos os parceleiros a partir da elevação de sua
auto-estima.
HOMEM d´El Rey, 1994, considera que:
“o planejar da ação educativa na situação ambiental compreende a determinação dos objetivos que estejam relacionados ao que se pretende alcançar da problemática diagnosticada, da seleção de conteúdos e mensagens e de estratégias educativas”.
Neste sentido, para a elaboração do plano de ação foram realizadas reuniões coletivas
onde os parceleiros, através da metodologia participativa adotada no processo educativo tiveram
espaço para se manifestar e priorizar os problemas mais emergentes para se iniciar o trabalho.
Ao problemas definidos prioritários definidos por eles foram: débito com o BNB e falta de
incentivo agrícola para a sobrevivência da comunidade, tendo como critério a urgência e a
necessidade de mudanças. O Quadro 6 indica o Plano de Ação elaborado pela comunidade.
126
QUADRO 6 - PLANO DE AÇÃO DA MARAMABAIA
PROBLEMA O QUE FAZER? COMO FAZER? QUEM VAI FAZER?
1. Débito com o BNB 1.1 - Realização de
Mutirão para a
limpeza dos
coqueiros nas roças
dos parceleiros, nas
2as e 3 as feiras. Esta
ação foi denominada
de “Mutirão da
Anistia”.
- Estabelecer um rodízio
entre os parceleiros para
a limpeza dos coqueiros,
iniciando-se com os 12
presentes e mobilizar os
outros parceleiros
interessados nesta ação.
- Formar uma comissão
para junto com a
Associação conseguir os
laudos técnicos,
colocando-se como
voluntários da ação D.
Otília, Sr. Beca, Sr.
Nivaldo, Sr. Petronílio.
Associação dos Parceleiros da
Marambaia.
Comissão de mobilização e articulação
composto pelos 4 parceleiros.voluntários.
Todos os parceleiros interessados.
2. Falta de Incentivo
agrícola para a
sobrevivência da
comunidade
2.1 - Implantar o
desenvolvimento
turístico (Ecoturismo)
em áreas adequadas
da Marambaia
- Realização de palestras
sobre Ecoturismo.
- Identificação de áreas
adequadas nos lotes dos
parceleiros interessados.
- Visitas em trilhas
existentes em Itacaré:
Trilha Interpretativa
Alto da Esperança na
Camboinha; Fazenda
Villas de São José.
- Visita ao Centro
Artesanal de Ilhéus.
- Articulação com o
IESB/PEAE para
capacitação e execução
Associação dos Parceleiros da
Marambaia
IESB/PEAE
BAHIATURSA / SUDETUR
ILHÉUSTUR
127
2.2 - Implantar hortas
comunitárias e
individuais na linha
da agricultura natural
2.3 - Implantar
projetos comunitários
de criatórios coletivos
de peixes e animais
de pequeno porte.
2.4 - Dar
continuidade ao
projeto de Viveiros de
Mudas Florestais,
implantado pelo IESB
e parceleiros.
2.5 - Realizar um
Vídeo sobre a vida da
Marambaia (sua
gente, suas riquezas
naturais) para mostrar
ao mundo o que
somos e o que
queremos.
das trilhas nos lotes dos
parceleiros
- Visitas a experiências
de agricultura natural a
exemplo do Pólo
Agrícola de Cruz das
Almas.
- Capacitação e
elaboração de projetos
de viabilidade
- Estabelecimento de
parcerias com o
Governo do Estado
(BAHIAPESCA, CAR)
e CEPLAC
- Articulação com o
IESB/Projeto FUNBIO
para a capacitação e
implantação dos viveiros
nos lotes dos parceleiros
interessados
- Discussão prévia com
os parceleiros para a
elaboração do roteiro e
execução do vídeo.
Associação dos Parceleiros da
Marambaia
IESB / Projeto FUNBIO
Assoc. dos Parceleiros da Marambaia
CEPLAC, CAR, BAHIAPESCA e
empresários da região
Assoc. dos Parceleiros da Marambaia
IESB/Projeto FUNBIO
Associação dos parceleiros da
Marambaia
Associação dos Parceleiros da
Marambaia
UESC
CRA
128
O Plano de Ação na verdade serviu de bússola (instrumento meio) para a realização de
atividades para a solução dos problemas detectados. Para a sua viabilidade consideramos que o
plano teria ações a curto, a médio e longo prazo.
Por isso duas ações em virtude de diversos fatores como, disponibilidade de tempo dos
parceleiros para as articulações com os órgãos públicos e entidades civis, desestímulo de alguns
parceleiros, falta de recursos financeiros, entre outros, deveriam ser implementadas,
posteriormente, quais sejam: a) Implantar hortas comunitárias e individuais na linha da
agricultura natural e b) Implantar projetos comunitários de criatórios coletivos de peixes e de
animais de pequeno porte.
Trabalhamos, portanto, na perspectiva de realizar ações de curto prazo como: a) mutirões
de limpeza dos coqueiros, b) implantação de ecoturismo em áreas adequadas na Marambaia, c)
reforço para a continuidade ao projeto de viveiros de mudas florestais desenvolvido pelo
IESB/FUNBIO e d) realização de um vídeo sobre a Marambaia. Com relação às outras ações
mencionadas acima definimos a necessidade de se trabalhar em busca de alianças com
instituições governamentais e não governamentais.
Esta fase consistiu na escolha dos procedimentos técnicos adequados para se alcançar os
objetivos pretendidos pela investigação. As estratégias planejadas se basearam na metodologia
definida por ANDRADE e LOUREIRO e HOMEM D´EL REY, 1993 no artigo “Uma Proposta
Metodológica para Pesquisa em Educação Ambiental, que são agrupadas em três categorias:
• Comunicação – produção e difusão dos conhecimentos na comunidade a partir da
realização de um vídeo sobre a Marambaia;
• Organização – formação de grupos de articulação para a viabilização de ações conjuntas
como comissões de trabalho, mutirões;
• Capacitação – treinamento na prática dos parceleiros envolvidos nas ações, através de
palestras, cursos.
129
b) Implementação das ações educativas
O planejamento elaborado pelos parceleiros com a pesquisadora requereu a construção de
novos paradigmas a partir do resgate do saber empírico que foi reconhecido pela pesquisadora,
direcionando os objetivos explicitados pelos sujeitos da ação para a viabilidade de mudanças no
seio da comunidade.
Dada a riqueza do processo de implementação do plano elaborado e dos desafios
enfrentados, torna-se interessante descrever os caminhos percorridos pelos parceleiros para a
efetivação das ações e das mudanças ocorridas.
1- Mutirão de limpeza dos coqueiros
O mutirão é uma prática de organização e mobilização utilizada pela comunidade da
Marambaia desde a época da luta pela conquista da terra. Sendo o débito com o BNB um
problema que aflige a todos os parceleiros, deixando-os com a auto-estima baixa e preocupados
“em perder a terra para o Banco” que com muito sacrifício foi conquistada, encontraram no
mutirão de limpeza dos coqueiros uma estratégia de mobilização e de união em torno de um
objetivo comum: a anistia do débito. Para que os laudos técnicos confirmem a inviabilidade do
projeto implantado pela CEPLAC e de mostrar na prática que não desviaram o dinheiro,
estabeleceram um cronograma de limpeza que foi iniciado no mês de setembro e concluído em
dezembro de 2000. Inicialmente foram envolvidos 12 parceleiros, sendo agregados outros no
decorrer do processo.
O mutirão é uma prática comumente utilizada pelos grupos populares e, particularmente, na
comunidade da Marambaia. BOFF, 1986 diz:
“Em termos das etapas da caminhada, a experiência mostra que um grupo vai normalmente das tarefas de nível comunitário (entreajuda), passando pelas lutas de bairro (melhorias), chegando às do sindicato até à questão do sistema político global”.
130
Ainda, segundo o autor, existem vários tipos de ação concreta para se organizar um
trabalho junto a uma determinada comunidade e o mutirão se constitui em um tipo de ação
autônoma do povo.
Portanto, trabalhando em mutirão, como estratégia de organização que se deu a partir da
“entreajuda” dos parceleiros interessados, resgataram a auto-estima e o espírito de luta,
acreditando em “dar a volta por cima” aos problemas existentes na comunidade. Este fato
refletiu-se no comportamento dos parceleiros que passaram a ter maior confiança no seu poder
de transformação, como bem expressa D. Otília em entrevista concedida ao Jornal da APA, nº
15, (em anexo) durante um mutirão:
“Todo mundo trabalhando esta terra, fazendo mutirões e, principalmente, não desperdiçando mais nada, acredito que possamos “dar a volta por cima”. Agora nós temos que lutar com a união e com a parceria. Enquanto não temos isso, é como “molhar em ferro frio”. Temos que educar o povo, porque aqui só pensam em mandioca, mas com instrução podemos aproveitar melhor a mandioca: das cascas fazer adubo, fazer ração, da tapioca transformá-la em bolachinha de goma, em beiju e tantas outras coisas...Mas para isso precisamos voltar a aprender, porque aqui todos nascemos no pé-da-enxada e agora já temos a certeza de que só plantando mandioca nunca vamos sair do buraco em que nos encontramos”. (Maiores detalhes da entrevista no recorte do Jornal da APA, anexo).
Figuras 24 e 25 - Mutirão de Limpeza dos coqueiros
A avaliação dos trabalhos de mutirão foi sendo realizada no decorrer dos trabalhos a
partir da observação e conversas informais realizadas nos momentos de descanso. De um modo
geral, os parceleiros consideraram que a estratégia adotada foi bastante positiva. Em reunião
131
informal realizada durante o horário de descanso em um mutirão registramos impressões de
alguns parceleiros que falaram:
“O trabalho é ótimo. Por enquanto estamos com a área de Dadu, Petronílio, Francisco. Cada dia apronta a área de um. São dois mutirões por semana. O mutirão está desenvolvendo. Praticamente com o mutirão atingimos o nosso objetivo. Que nessa fase é a anistia do débito com o BNB. Antes o EBDA deu um laudo técnico com base nas visitas técnicas feitas nas áreas que estavam sujas, sem roçagem. Agora estamos fazendo a limpeza dos coqueiros, retirando os capins”. (Sr. Beca – parceleiro)
A fala deste parceleiro revela a forma como se organizaram para a realização da atividade
demonstrando que essa é uma prática que faz parte do seu dia-a-dia organizativo.
“O mutirão já era uma atividade realizada pelos parceleiros. A forma do mutirão é: se o camarada tem um serviço para fazer ele tem a ajuda de todos e termina o serviço e o parcelerio tem condições de sobreviver. Por exemplo, o IBAMA passou pelo local e viu o trabalho de mutirão. Se o parceleiro tivesse sozinho, talvez, o IBAMA parasse para saber o que estava sendo feito na roça”. (Sr. Nivaldo – parceleiro)
Revela o parceleiro que o mutirão como atividade coletiva apresenta um poder de força e
de união.
O mutirão deve ir avante, porque está dando resultado. A todo fim que a gente queira com o mutirão temos resultado. Dois tição não pode dar labareda, quando ajunta quatro tição ou mais, a labareda acende, desenvolve e cozinha a comida. Isso é o nosso dito sobre o mutirão na Marambaia. Agora todos estão sem dinheiro e o mutirão é uma forma de organizar o trabalho para poder sobreviver. Antes quando tinha dinheiro, cada um fazia seu serviço sozinho. Agora é diferente. (Sr. Edvaldo – parceleiro)
É muito importante iniciar-se o processo pedagógico a partir das experiências vividas
pelos parceleiros. O mutirão do ponto de vista educativo, mobiliza, organiza e tem um objetivo
comunitário (coletivo). Estabelece relações de ajuda, fomenta a formação de vínculos e fortalece
o poder criativo da comunidade, porque ela aprende a resolver seus problemas com o que ela
própria tem disponível, no caso, a força de trabalho e a conquista do primeiro passo para a
solução de um problema maior: a dívida do BNB.
Com os mutirões realizados, a Associação pretende articular-se com os órgãos públicos,
ONG´s, universidade para que sejam emitidos laudos técnicos que embasem a solicitação ao
INCRA para a anistia do débito com o BNB.
132
Esta primeira iniciativa da comunidade revela a compreensão de que é necessário cuidar,
apresentar-se “limpo”, “claro”, para oferecer-se ao julgamento dos técnicos, por exemplo, como
comprovar que a terra é imprópria se o terreno está sujo e ela não se desnuda para revelar-se
como ela é de fato: de pedras e cascalhos. É possível cultivar o coqueiro nessa terra, como fazê-
lo? Mostram, portanto, aos técnicos a necessidade de orientação e assistência não só teórica, mas
principalmente na prática.
2. Implantação do desenvolvimento turístico (Ecoturismo) em áreas adequadas da
Marambaia
Esta ação utilizou como estratégias a capacitação e o fortalecimento da organização
comunitária. Estando o assentamento da Marambaia inserido no município de Itacaré cuja
principal atividade econômica é o turismo e diante das limitações e potencialidades de usos
previstos no Zoneamento Ecológico Econômico da APA, a comunidade na tentativa de se
adequar a “este novo sistema”, considera que um dos caminhos para a sua sustentabilidade na
área é a implantação de “Trilhas Ecológicas” nas roças consideradas adequadas para esta
atividade.
“O desenvolvimento que queremos é o desenvolvimento turístico. Como a gente fazer esse desenvolvimento turístico? Nós temos a intenção de divulgar nossas matas, fazendo trilhas, divulgar as plantas, as bromélias, as muitas madeiras bonitas, muitas madeiras de copas bonita...”. “O pessoal do INCRA quer fazer um projeto de 15 Km de trilhas. Só que nós não temos o conhecimento. Nós não conhecemos como fazer as trilhas. Nós precisamos da ajuda dos técnicos. Hoje para se ter um trabalho, nós seguindo a orientação técnica agente faz dentro das normas, nós fazemos tudo bem organizado”. (Sr. Petronílio – Presid. da Associação)
Na verdade, este depoimento do Presidente da Associação revela uma mudança de
pensamento (antes se sentia revoltado, com baixa estima e tinha uma incompreensão da
conservação do ambiente) para o reacender da chama da luta por um ambiente de vida melhor
conservado e o uso dessa natureza para dar conhecimento ao outro (dividir com o outro) e daí,
conseguir seu sustento. Além disso, o reconhecimento de suas limitações (não saber técnico) e
“gritar” por parcerias (adquirir saber técnico) e construir utopias, transformando a sua vida,
conquistando seu auto-desenvolvimento, respeitando a “lei dos homens” (IBMA, CRA/APA) e
da natureza.
133
Com este pensamento se organizaram e solicitaram uma palestra sobre o ecoturismo que
foi realizada com a nossa articulação no dia 04.10.00 tendo como facilitador o Sr. Cláudio Lôpo
(atual Secretário de Turismo, Meio Ambiente e Agricultura da Prefeitura de Itacaré) que possui e
opera a Trilha Interpretativa Alto da Esperança, localizada na Camboinha, área de reforma
agrária implantada pelo Governo do Estado - CAR/CORA, cuja experiência foi repassada para
os parceleiros participantes da reunião de trabalho.
O facilitador definiu o ecoturismo como uma atividade turística de mínimo impacto e que
se dá de forma sustentável. Para a execução desta vertente turística na comunidade é necessário
identificar suas potencialidades de atrativos naturais e alternativas de conservação da mata.
Após discussões sobre o assunto, o facilitador fez um desenho no chão e pediu aos
participantes que analisassem e mostrassem o que enxergavam além do quadrado, ou seja,
procurou ampliar o horizonte de vida deles, enxergar o futuro a partir das potencialidades
existentes na Marambaia.
Figuras 26 e 27 – Capacitação em Ecoturismo
Como resultado foi definido pelos parceleiros um plano de execução das trilhas ecológicas a
partir das potencialidades existentes da Marambaia, levando em conta:
• A localização do Assentamento (proximidade da cidade de Itacaré e da Estrada Parque);
134
• Os recursos naturais (remanescentes de Mata Atlântica, cachoeiras, rios e riachos,
variedade de pássaros e outros animais da fauna regional, plantações de fruteiras, plantas
medicinais e ornamentais);
• A Casa de Farinha Comunitária (conhecimento dos aspectos da cultura local – processo
de fabricação da farinha e venda de produtos originados da mandioca);
• O Viveiro de Mudas Florestais (vendas de diversas mudas nativas);
• Artesanato local (vassouras de piaçava, vasos e flores de casca de coco, conchas e cestos
de cipó).
QUADRO 7 - PLANO DE EXECUÇÃO PARA O ECOTURISMO
SERVIÇOS EXISTENTES VENDA DE PRODUTOS
Casa de Farinha (turista observar como se
faz a farinha e produtos derivados dela)
Venda da farinha, beiju, tapioca, bolos,
biscoitos, etc
Trilhas Ecológicas (Sr. Beca em fase de
execução) e (D. Otília e Sr. Antônio,
Nivaldo a ser realizada)
Mudas de espécies nativas, ornamentais e
medicinais
Água de coco
Artesanatos da terra e vassouras de piaçava
Viveiro de Mudas Mudas de espécies nativas
No final ficou definido a necessidade de criação de Grupos de Trabalho para a limpeza da
área comunitária, artesanato e serviços de comercialização dos produtos.
Foi criado um Grupo de Artesanato intitulado “Alegria” composto por 14 pessoas cujas
atividades serão detalhadas posteriormente.
Com relação às Trilhas Rurais Ecológicas, ficou definido pelos parceleiros que as trilhas
serão implantadas de forma individual nos lotes que apresentam potencialidades para o
ecoturismo. Desse modo, o Sr. Beca, antigo parceleiro, interessado em implantar uma trilha no
seu lote articulou-se com o Eng. Florestal Salvador Ribeiro, coordenador do Projeto
135
FUNBIO/IESB – Comunidades Rurais e Florestas da Área de Proteção Ambiental Itacaré/Serra
Grande, para orientação técnica e capacitação.
Com este assessoramento foi inaugurada a 1ª trilha ecológica do Assentamento
Marambaia, no dia 28.12.00, com os objetivos de “aumentar a renda de um pequeno produtor,
ampliar a oferta de produtos ecoturísticos, conservar a Mata Atlântica e promover a Educação
Ambiental”.
Sob o patrocínio do FUNBIO – Fundo Brasileiro para a Biodiversidade e Fundação
FORD e com a execução do IESB – Instituto de Estudos Sócio-Ambientais do Sul da Bahia, a
“Trilha Janela da Gindiba”, “foi desenhada para mostrar aos visitantes as mais belas e
importantes espécies florestais da Mata Atlântica do Sul da Bahia. Ao longo do trajeto será
possível observar árvores centenárias, tais como: Angelim pedra, a sapucaia, o conduru, a
gindiba, o pequi, a juerana prego, a maçaranduba, a caneleira, a sucupira, o pau de óleo e outras.
Além das árvores encontraremos os cipós gigantes, as várias espécies de bromélias e as
palmeiras anãs”. (Convite de Inauguração da Trilha).
“Moro aqui há 16 anos, o projeto que temos para desenvolver é de falar na trilha de cada árvore que tem para o turista, que planta é aquela, se é imbelão, se é cocó. Todas as ramagens, os cipós, os imbelão”. (Sr. Beca – parceleiro e dono da Trilha “Janela da Gindiba”).
A fala do Sr. Beca mostra o reconhecimento que tem do seu saber em relação à natureza e
que poderá ser socializado pelos visitantes. Ele se coloca como Guia de sua Trilha.
Esta iniciativa apesar de ser de caráter individual demonstra um avanço de organização
quando todos aceitaram e aplaudiram a “Trilha Janela da Gindiba” no lote de um parceleiro,
porque significava um primeiro passo para o projeto de turismo que traria melhoria para todos.
136
Figuras 28 e 29 - Trilha Ecológica “Janela da Gindiba” (Lote parceleiro Beca)
Esta iniciativa é mais um passo à frente na busca de alternativas sustentáveis aos
pequenos produtores rurais da Marambaia. Encontra-se em fase de execução pelo
IESB/FUNBIO o projeto da trilha conjugada nos lotes de D. Otília e Sr. Antônio.
É uma experiência que merece ser registrada, pois pode servir de modelo demonstrativo
de geração de renda aos pequenos produtores rurais da Marambaia e região. Porém, ao lado das
atividades individuais, faz-se necessário buscar alternativas comunitárias que reforcem a
organização coletiva dos parceleiros.
Vale ressaltar que percorrendo o caminho do ecoturismo, estimulamos o resgate da
prática artesanal na área e, em dezembro/00, foi formado o Grupo Alegria – Artesanato da Terra,
composto de 14 pessoas, entre crianças, jovens, homens e mulheres. O Grupo pretende vender os
produtos artesanais confeccionados, bem como doces caseiros aos turistas que vêm à cidade de
Itacaré.
O artesanato é outra ação comunitária a ser fortalecida, pois a iniciativa partiu deles
próprios, na busca do desenvolvimento sustentável.
137
“Nós temos o pensamento de fazer um projeto de artesanato para o desenvolvimento de nossa comunidade. Temos interesse em fazer outros projetos porque os companheiros estão parados”. (Sr. Petronílio - Pres. da Associação dos Parceleiros da Marambaia)
Figura 30 - Recursos naturais das roças utilizados para a confecção das peças artesanais
Figura 31 – Peças artesanais fabricadas pelo Grupo Alegria de Artesanato
138
Assim, passo a passo, vão sendo colocadas, em prática, as idéias e concretizados sonhos
que, mesmo diante de tantas dificuldades, os parceleiros mostram-se confiantes e capazes de
fazer e decidir os seus destinos.
3. Viveiros de Mudas Florestais
Em 1999, o IESB através do Programa de Educação Ambiental e Ecoturismo – PEAE,
realizou um Diagnóstico Rápido Participativo - DRP na Marambaia, onde se percebeu que a
situação da comunidade era insustentável: falta de recursos para investimento na área agrícola,
degradação dos recursos naturais, fragilidade da organização comunitária, conflitos de
lideranças, parceleiros interessados em resolver problemas individuais e não coletivos, etc. Com
esta análise da realidade, surgiu a idéia do cultivo de um Viveiro de Mudas Comunitário em
virtude da possibilidade de mercado na região (o Hotel Transamérica e empreendimentos
hoteleiros de Itacaré) para a compra das mudas. Inicialmente 10 parceleiros se uniram para
administrar o viveiro, hoje participam 8 parceleiros.
Reforçamos o trabalho do IESB junto aos parceleiros discutindo a importância da
parceria para a concretização de alternativas sustentáveis de geração de renda para a
comunidade. Esta ação utilizou a estratégia de organização e capacitação da comunidade.
“O viveiro de mudas surgiu em 1999, através da APA, bem orientado por Salvador, de fazer mudas. E através dessas mudas podemos ganhar um dinheirinho... Aqui no viveiro de mudas da Marambaia qualquer pessoa que quiser comprar mudas pode procurar a gente, Juraci, Zé Martim que nós temos mudas para vender”. (José Martins - filho de parceleiro)
Com o início do Projeto do IESB/FUNBIO/Fundação FORD - Comunidades Rurais e
Florestas da Área de Proteção Ambiental Itacaré/Serra Grande, em novembro de 2000, a
comunidade da Marambaia é contemplada e citada no projeto como uma experiência
consolidada:
“Já experimentamos atividades comunitárias em Marambaia, seja com o Diagnóstico Rural
preliminar, seja com um desdobramento do mesmo que foi a produção em mutirão de mudas de
essências nativas. Quatro mil mudas foram produzidas no verão de 2000, resultando em uma
139
receita aproximada de 3 mil reais. Apenas parte desta receita foi efetivada até abril de 2000,
mas já existem potenciais consumidores para o restante das mudas.” (Projeto
IESB/FUNBIO/FORD, 2000).
Figuras 32 e 33 - Viveiro de Mudas Comunitário
Uma das vertentes do Projeto é a Implantação de viveiros comunitários para a produção
de mudas de espécies nativas, ornamentais e frutíferas que foi fundamentado por estudos prévios
elaborados pela equipe do IESB que “mostram que se uma família produzisse e vendesse 200
mudas de espécies nativas por mês a preço de mercado teria um rendimento de R$ 150,00 quase
o dobro da renda média atual das comunidades. Para esta produção seria necessário apenas 2
horas de trabalho/homem/dia, sendo que este trabalho pode ser facilmente executado pelas
mulheres e adolescentes, valorizando o papel destes grupos na comunidade. A experiência com
viveiro de mudas comunitário no assentamento Marambaia teve ampla aceitação e a empolgação
da comunidade está sendo grande”. (IESB/FUNBIO, 2000).
Com estes dados e com o incentivo da pesquisadora, os parceleiros consideram
importante a continuidade do Viveiro de Mudas Comunitário. Porém, existindo ainda algumas
resistências ao trabalho associativo, a pedido deles estão sendo implantados viveiros individuais
de mudas florestais, ornamentais e medicinais.
140
Para tanto, em 18 de outubro de 2000, no Centro Comunitário da Marambaia, a equipe do
IESB realizou uma capacitação das comunidades rurais com o I Curso de Produção de Mudas
Florestais, envolvendo os pequenos produtores rurais interessados da Camboinhas e Marambaia.
Estando a pesquisadora participando da capacitação, observamos que durante o curso os
participantes demonstraram interesse pelo tema, participaram das discussões, repassaram
informações sobre o seu saber prático e com relação a Marambaia apresentaram a proposta de
implantação de um Biofertilizante Coletivo para os viveiros, onde a partir do conhecimento da
técnica vivenciada coletivamente, cada parceleiro poderá fazer o seu particular para uso nas suas
roças.
Figuras 34 e 35 - Capacitação em Produção de Mudas (Projeto IESB/FUNBIO)
Vale salientar que no processo educativo o engajamento de ONG´s no desenvolvimento
comunitário com propostas viáveis, a partir do universo vivido pela população é de fundamental
importância. O IESB/FUNBIO vem cumprindo esse papel, por ter o projeto “Comunidade Rurais
e Florestas” um caráter de educação ambiental, sua estratégia apóia-se na capacitação de ensinar
a fazer, discutindo todas as etapas. No caso do IESB, um vínculo de parceria já se formou com
os parceleiros da Marambaia. Outras propostas, portanto, devem ser fortalecidas pelo CRA –
órgão gestor da APA e pela UESC.
141
4. Vídeo “REVELANDO A MARAMBAIA”
A idéia de se fazer um vídeo sobre as condições sócio-ambientais da Marambaia surgiu
dos próprios parceleiros. Para eles, o vídeo representa um recurso para a revelação da sua
história, de como vive sua gente, de suas riquezas naturais e potencialidades para o ecoturismo,
da sua cultura e quais os caminhos encontrados para a sua sustentabilidade. Com este
sentimento, realizamos uma reunião onde planejamos e discutimos com os parceleiros a
elaboração do vídeo.
A comunicação como estratégia educativa é de fundamental importância e o vídeo
constitui-se num importante veículo de mobilização e de conscientização da comunidade. Neste
sentido, promovemos um encontro com as lideranças comunitárias para se discutir o roteiro
preliminar, onde foram estabelecidos os principais aspectos que deveriam ser enfocados e os
locais aonde gostariam que fossem feitas as imagens. O vídeo, portanto, foi sendo construído
pelos próprios atores sociais (parceleiros da Marambaia). É um produto também feito por eles,
onde o papel da pesquisadora foi o de facilitar o processo de sua construção.
Paralelamente a estas discussões a pesquisadora exerceu o papel de articuladora para a
concretização do sonho. Apresentada a proposta à Coordenação do Mestrado de
Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente foram providenciadas as condições objetivas para
a viabilização do trabalho. A Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC disponibilizou
profissionais de comunicação, os equipamentos de filmagem e o recurso financeiro para a sua
edição. O Centro de Recursos Ambientais – CRA forneceu o apoio logístico. Assim, foi possível
concretizar o sonho de “mostrar para o mundo nossa situação de vida e o que precisamos para
melhorar”. (D. Otília – parceleira).
142
Figuras 36 e 37 - Filmagem do Vídeo “Revelando a Marambaia”
Garantida a produção do vídeo pela UESC, realizamos a partir do roteiro preliminar
definido com os parceleiros, as filmagens. Durante três dias, participando do processo, todos nós,
a pesquisadora, os parceleiros, os cinegrafistas e o diretor do vídeo visitamos e filmamos a área
comunitária, algumas roças, as cachoeiras, as trilhas, as nascentes, rios e ribeirões realizando
entrevistas com os parceleiros e colhendo depoimentos.
Como todo o processo de execução do vídeo foi discutido com a comunidade realizamos
uma reunião para a apresentação das filmagens realizadas, com o intuito de mostrar e debater
com os parceleiros as principais imagens e os depoimentos que deveriam compor a edição final.
A partir daí, a equipe técnica de produção providenciou os ajustes técnicos, a trilha sonora e
outros efeitos utilizados em um documentário.
Este vídeo, então, passa a integrar a pesquisa, cuja elaboração e execução constituiu-se
em uma prática educativa, servindo inclusive como instrumento de avaliação das ações
desenvolvidas com a comunidade.
143
Figuras 38 e 39 - Reunião para discussão das imagens para a edição do Vídeo
A Associação dos Parceleiros da Marambaia pretende divulgar o vídeo junto aos órgãos
públicos, ONG´S, Universidades, junto às autoridades competentes e aos técnicos para possíveis
negociações de financiamento para os projetos já existentes e dos outros que pretendem
desenvolver para a melhoria da qualidade de vida.
Por isso considerou importante dizer no vídeo o que está fazendo para mudar as suas
condições precárias de vida: Trilhando caminhos para a sustentabilidade, precisam de orientação
técnica, de capacitação e de recursos financeiros, verdadeiros canais abertos e dispostos a um
novo tipo de trabalho.
Como disse um parceleiro:
“para amanhã não ter que passar isso aqui para alguém que vai
explorar o que precisamos. O que queremos é ter sobrevivência para
continuar aqui”. (Sr. Beca – parceleiro).
Os caminhos para a sustentabilidade encontrados pela comunidade e revelados no vídeo são
os seguintes:
144
Figura 40 - PRODUÇÃO DE MUDAS (florestais, ornamentais e medicinais)
Viveiro de Mudas (Lote 18 de Sra. Otília)- Projeto IESB/FUNBIO
Figura 41 e 42- EXTRAÇÃO DE PIAÇAVA e FABRICAÇÃO DE VASSOURAS
Fabricação de vassouras (Parceleiro Nivaldo)
145
Figura 43 - ADUBO ORGÂNICO (BIOFERTILIZANTE) - Lote 18 (Projeto
IESB/FUNBIO)
Biofertilizante
Figura 44 - ARTESANATO
146
Figura 45 - TRILHAS ECOLÓGICAS (Cipós e árvores da Trilha Janela da
Gindiba)
O vídeo “Revelando a Marambaia” serve como material educativo, exercendo um papel de
mobilização muito grande na comunidade. Ele estimula e incentiva a participação e discussão
dos temas revelados no vídeo como a qualidade de vida, a sobrevivência da comunidade, as
riquezas naturais, os caminhos (pistas) encontradas para a sustentabilidade socio ambiental,
favorecendo a tomada de consciência dos indivíduos frente ao seu ambiente de vida, conforme
indicado por CARVALHO e VIEZZER, 1991, “A comunicação como processo social consiste em
processos de emissão/recepção de mensagens, através de determinados meios, para a reunião de pessoas ou grupos
que visam atingir determinados fins”.
147
Figura 46 - Lançamento do vídeo no Centro Comunitário da Marambaia (16.02.2001)
A pesquisadora apresentou e, em seguida, entregou o vídeo à Associação dos Parceleiros
da Marambaia, em evento de lançamento realizado no dia 16 de fevereiro de 2001, ocasião em
que foi reafirmada pela comunidade a necessidade de união e de parceria para o
desenvolvimento da Marambaia.
Figuras 47 – Apresentação do Vídeo pela pesquisadora
148
Figura 48 - Participação da comunidade no lançamento do vídeo
4.1.5 - AVALIANDO AS PRÁTICAS EDUCATIVAS VIVENCIADAS
Esta fase permeou todas as etapas da metodologia, no sentido de acompanhar o
desenvolvimento das ações, momento em que foram identificados os possíveis desvios para as
devidas correções. Para tanto, utilizaram-se reuniões, observações, conversas informais e o
próprio vídeo “Revelando a Marambaia”.
O planejamento e a implementação das ações constituíram-se em etapas fundamentais
ocasião em que os parceleiros participantes foram aos poucos compreendendo a necessidade de
ir além dos problemas, apontando meios que viabilizassem a solução dos mesmos. A
metodologia participativa utilizada possibilitou à comunidade a oportunidade de analisar as
situações com que se confrontam, sistematizando seus conhecimentos e criando instrumentos de
mudanças.
A partir das atividades desenvolvidas, os parceleiros se sentiram fortalecidos e
resgataram o espírito de luta e de mobilização para a solução dos seus problemas. A articulação
feita pela comunidade para a realização do I Seminário da Marambaia, envolvendo os órgãos
149
públicos, entidades civis, ONG´s e técnicos é um exemplo de que só com a organização, a união
e a parceria será possível superar as dificuldades enfrentadas no seu cotidiano de vida.
A idéia de que a área de conservação ambiental, identificada por eles como APA é a
responsável pela atual situação de pobreza em que vivem foi sendo aos poucos modificada,
apesar da resistência e descrença de alguns parceleiros de que os projetos implantados como
trilhas ecológicas, viveiros de mudas atendem às suas necessidades de sobrevivência na área.
Mesmo avaliando as ações durante o desenvolvimento das mesmas, consideramos
importante realizar uma reunião de avaliação geral dos trabalhos desenvolvidos, onde constatada
a baixa escolaridade dos participantes, aplicamos uma dinâmica que facilitasse a descontração e
integração do grupo, permitindo que todos presentes se colocassem e expressassem seus
pensamentos. Nesta reunião, não houve uma presença significativa de toda a comunidade, mas
de pelo menos 10 lideranças comunitárias.
A dinâmica das máscaras quebra a inibição e garante um maior envolvimento do grupo.
Para tanto, animamos o grupo com perguntas de como se sentiam antes e depois dos trabalhos.
Distribuímos papel e lápis de hidrocor para que todos fizessem um desenho representando seus
sentimentos. Depois, cada um colocava o papel no rosto como uma máscara e falavam o
significado do desenho. Perguntados sobre como se sentiam antes dos trabalhos realizados?
responderam:
Dina – Não me sentia bem mal.
Otília – Triste, chorando e procurando uma solução.
Cláudio – Triste
Dadu – Não me sentia bem.
Chico – Não me sentia bem.
Domingos – Não me sentia bem, por ser proibido de trabalhar, o governo proibiu com a Lei da
APA, mas deveria apresentar um projeto de sobrevivência antes de decretar a APA.
Henrique – Não me sentia bem, entristecido com o débito para pagar.
Beca – Com muita preocupação.
150
Petronílio – Zangado. Eu não estava alegre, porque não me conformo com passar fome, nem
chamar a terra comadre. Disse Deus: Maldita seja a terra.
Figura 49 – Avaliação com máscaras (antes do trabalho educativo)
Os sentimentos dos parceleiros, antes dos trabalhos educativos implementados na
comunidade, eram de apatia, de descrença e de desconfiança, denotando o estado de espírito
existente entre eles, ou seja, a baixa estima, a desesperança que os incapacitava de enxergar as
possíveis soluções aos seus problemas. Não por acaso recomenda DIAS, 1999, que, “para se
abordar a temática ambiental, além das informações essenciais para a compreensão do seu
metabolismo e das suas ameaças e alternativas de soluções, precisamos trabalhar com a
sensibilidade das pessoas, se se pretende ser eficiente”. (Grifo nosso).
Trabalhar com as emoções, portanto, foi uma estratégia educativa que permitiu uma
mudança de espírito, ou seja, elevação da auto-estima. Estas mudanças podem ser verificadas a
partir das respostas com relação a como se sentiam depois dos trabalhos desenvolvidos:
Dina – Estou no fiel da balança, esperando que Deus abençoe e que tudo corra bem para nós.
Otília – Sentada com a mão no queixo esperando um novo horizonte, em que o governo desfaça
a burrada que fez antes e criando um projeto na Marambaia que funcione e salve nossa
situação.
Henrique – Me sinto bem melhor.
Domingos – Me sinto feliz em saber que tenho condições de ter a minha casa.
151
Emília – Está quase tudo igual como era antes.
Beca – Eu me sinto bem com a direção da APA e a incentivação de Julia.
Dadu – Me sentido alegre e firme.
Petronílio – Eu tenho uma esperança agora com o incentivo do IESB e de D. Julia que vêm
dando ajuda e ciência de como trabalhar trazendo algumas explicação como desenvolver.
Espero melhorar com o viveiro de patioba.
Cláudio – Me sinto mais livre. Como um pássaro.
Chico – Me sentindo melhor. Espero que o governo abra uma solução para melhorar.
Figuras 50, 51 – Avaliação com máscaras (painéis com desenhos)
Figura 52 e 53 - Antes e depois do trabalhos educativos
152
Além desta avaliação geral, utilizamos o vídeo “Revelando a Marambaia”, como instrumento
de avaliação, pois a partir, também, da análise dos depoimentos coletados durante as filmagens,
consideramos que a prática educativa vivenciada possibilitou as seguintes mudanças no seio da
comunidade:
• Mudanças de percepção com relação à presença da Área de Proteção Ambiental –
APA na Marambaia e da importância da conservação dos seus recursos naturais
como garantia para a melhoria do seu ambiente de vida:
Inicialmente, a visão da comunidade era de que a APA e as leis de preservação ambiental,
representada para eles, pelo CRA e o IBAMA, são os grandes responsáveis pela “situação
caótica” em que se encontram. Com as informações que foram sendo repassadas durante as
reuniões, seminários, encontros e palestras os parceleiros começaram a ampliar seus
conhecimentos, incorporando alguns conceitos ambientais e aplicando na prática a relação entre
a questão ambiental e os aspectos sociais, econômicos e políticos.
“Nós paramos para obedecer a lei da APA, para obedecer a lei do meio ambiente, de conservar o meio ambiente. Nós então entramos num novo sistema”. (Sr. Petronílio – Pres. da Associação). “Nós queremos cumprir a lei da APA, só que nós não temos condições para sobreviver”. (Petronílio) “Esta árvore é uma passuaré, ela cresce mais do que essa aí, por este motivo deve ser preservada, porque preservamos o futuro de nossos filhos, quem sabe dos nossos netos”. (Sr. Juraci – Responsável pela Casa de Farinha Comunitária).
“Aqui tem muitas árvores maravilhosas: imbirussú, passuaré, maçaranduba, sucupira, aderno, sapucaia, são madeiras de lei e outras que eu não sei o nome, conduru, faveco, madeiras importantes e que tem muito valor na nossa comunidade”. (Petronílio)
“Este é o nosso pensamento, de fazer os trabalhos, divulgar as nossas cachoeiras, levar o pessoal para dentro das matas, lá dentro das roças, das matas, juntamente com o filme para mostrar quantas madeiras bonitas nós temos. Na nossa região tem muitos lajedos, pedras bonitas que precisam ser divulgadas. Temos nascentes aqui do rio Canoeiro, a nascente das Duas Irmãs. Tudo isso são lugares que a gente acha que é grandes riquezas”. (Petronílio).
153
Estes depoimentos demonstram o reconhecimento por parte dos parceleiros da
importância de se preservar e conservar o ambiente como garantia de sua sobrevivência e do
futuro dos seus filhos.
“Nós agora acabamos de filmar a cachoeira. E vocês tão vendo quantas coisas bonitas belas nós temos aqui. Temos aqui mais de 50 bromélias, várias orquídeas, cachoeiras, madeiras, trilhas, rios, árvores gigantescas. Aqui é uma maravilha. Só está faltando um empurrãozinho, uma ajuda, alguém que se interesse, que nos ajude para ver se a gente cresce um pouco aqui.” (D. Otilia) “Aqui nós temos muitas plantas ornamentais, muitas ervas medicinais para fazer mudas e vender dizendo como fazer o remédio, o banho”. (D. Otília)
A fala de D. Otília mostra o conhecimento que tem das potencialidades naturais,
existentes na área, e que além de atrativos para os visitantes, servem, ao mesmo tempo, à
contribuição de capacitação e de apoio técnico para o desenvolvimento do ecoturismo.
“Eu quando via uma árvore cair eu quase caia com ela pois achava um absurdo a gente derrubar para sobreviver, mas a gente era forçado a derrubar, até o INCRA nos forçava, pois quem mais derrubasse menos pagava. É muito importante essa preservação pra ver se a gente sobrevive disso que a gente tem aqui, nossa riqueza natural”. (D. Otília)
Isto demonstra a relação existente entre preservação e luta pela sobrevivência. Eles
adotavam a política do órgão responsável pela implantação da reforma agrária, que não inseria
em seus projetos a conservação ambiental. Agora reconhecem a necessidade da conservação
ambiental para se alcançar melhoria de vida.
“Aqui nos lotes de alguns parceleiros são jogados o lixo da cidade. Lá embaixo é um rio onde o pessoal da Marambaia pega sua água para beber. Eles vão esparramando o lixo não só aqui, mas em vários pontos da Marambaia. Esse problema não é nosso, esse problema é da cidade. Em Itacaré não se tem um Aterro Sanitário”. (D. Otília)
Este depoimento resume a revolta da comunidade com o desrespeito do governo em
relação ao ambiente das populações pobres.
“Praticamente nós devemos preservar isso aqui, não desmatar mais, pois a preservação é uma coisa importante. Eu desmatei, pois não sabia o que era a desmatação, Mas, hoje que tenho o conhecimento não entro na floresta nem para tirar uma vara”. (Sr. Beca) “Este é rio Jeribucaçu e este rio ajuda o abastecimento de água da cidade de Itacaré... as casas de roça são afastadas dele e as fezes não são jogadas nele. É um rio muito importante. A gente
154
tem preocupação para preservar ele, pois hoje é difícil ter água limpa no nosso planeta”. (D. Otília)
“A nossa intenção é não devastar a floresta. Hoje, sabemos que a floresta traz vida, água, oxigene, sem oxigene não podemos sobreviver”. (Sr. Beca).
Os depoimentos acima indicam que, apesar de toda a dificuldade enfrentada no processo
de discussão sobre a inserção da APA no seu ambiente de vida, ocorreram alguns avanços no
nível de consciência ambiental de parte considerável da comunidade, pois antes, a palavra
“ambiente” não tinha significado prático, a problemática local de luta pela sobrevivência não era
relacionada com a questão ambiental, conforme explicita ANDRADE,1993:
“Para uma população tão marcada pela situação sócio-econômica difícil, desenvolver a Educação Ambiental sem abordar ou mesmo promover melhorias das condições de vida é o mesmo que não dizer nada”.
Propiciamos uma troca de conhecimentos sobre a importância da APA e de como
poderiam continuar na área desenvolvendo alternativas sustentáveis de uso da terra. Para tanto,
mostramos que conforme o Zoneamento Econômico e Ecológico, onde estão inseridas as áreas
da Maramabaia, são indicados os usos permitidos em cada zona. A área da Marambaia, em sua
maioria, está inserida nas categorias de uso sustentável e de conservação, permitindo o
desenvolvimento de atividades que utilizem o manejo sustentável, a exemplo de alternativas
agroflorestais. (ver Capítulo 2).
Com estas orientações vislumbraram que a APA não representava um entrave ao
desenvolvimento da comunidade, mas sim uma perspectiva de com ela propor um novo tipo de
trabalho para a melhoria das suas condições de vida.
Portanto, as mudanças ocorridas na percepção dos parceleiros podem ser visualizadas na
ação concreta, pois como diz BOFF, 1986, “querer fazer mais que o possível é como querer ‘dar
o passo maior que a perna’. É queimar as etapas”. Isto é, no processo educativo deve-se valorizar
cada passo dado pela comunidade, o importante é começar e todo começo é como uma semente,
que precisa ser cuidada e acompanhada em sua evolução. Uma comunidade cresce a partir dos
problemas que sente e que tem possibilidade de solucionar.
155
• Mudanças de comportamento e elevação da auto-estima para a execução de
projetos alternativos e sustentáveis
No início da nossa inserção na área percebemos um desânimo na comunidade para a
realização do trabalho, estavam desacreditados na sua capacidade de mudar e muitas vezes
diziam “que já estavam cansados de lutar pela terra, que já estavam velhos, que eram
discriminados e perseguidos pelo governo e pela sociedade, que já não tinham mais forças para
trabalhar”. No entanto, com as dinâmicas realizadas nas reuniões foram estimulados a
participar, a decidir e verificaram que a sua voz era reconhecida. Com isso, os horizontes se
abriram e se sentiram prestigiados e prontos para o início de uma ação transformadora da sua
realidade.
“É preciso ter fé, criar mais coragem para a gente desenvolver, porque sabemos que aqui não tem mais nada pra lutar em roça. O desenvolvimento agora é turístico. (Petronílio) “A minha esperança é que ainda haja um projeto aqui na Marambaia para nossa sobrevivência. O ganho está escasso. Começamos com o viveiro”. (Petronílio)
Estas falas revelam a mudança de comportamento com relação às atuais condições de
vida na Marambaia. A elevação da auto-estima fica evidenciada com as palavras de fé, coragem
e esperança de um novo tipo de trabalho que garanta a sustentabilidade das famílias dos
parceleiros.
“A piaçava deve ser cortada de 2 em 2 anos. Tem que ter muito cuidado. Tem que puxar de baixo para cima. Se a pessoa tira ligeiro mata a piaçava. .. o que mata é a pressa. A piaçava é nativa. É uma das fonte de renda que pode acontecer aqui mais tarde. Se tirar com cuidado é uma fonte de renda na comunidade”. (Petronílio). “Eu faço vassouras de piaçava para sobreviver da arte do artesanato. Assim como eu aprendi do meu pai, posso ensinar para as crianças e eles podem começar aprendendo e trabalhando. Graças a Deus não fico sem o meu trocado, vendo por R$1,00 ou R$2,00. Faço para a Prefeitura, para os mercados. Assim como eu aprendi pode chegar ao ponto de deixar algumas pessoas da comunidade sabendo fazer a vassoura”. (Sr. Nivaldo)
Ao ensinar como deve ser feito o extrativismo da piaçava nas roças, e a fabricação de
vassouras de piaçava, vislumbra-se a possibilidade da profissionalização da nova geração pela
própria comunidade.
156
“Isto aqui é a casca de coco para fazer artesanato. A gente queremos fazer viveiro para fazer mudas ornamentais e ervas medicinais”. (D. Otília) “Nós temos a intenção de divulgar nossas matas, fazendo trilhas, divulgar as plantas, as bromélias, as muitas madeiras bonitas, fazer o desenvolvimento turístico”. (Sr. Petronílio) “Através dessas mudas é o meio de ganhar um dinheirinho”. (Sr. José Martins) “Este biofertilizante é para dar cobertura ao viveiro. Colocamos matéria orgânica que tem nas roças, sal, calcário e leite, depois esperamos ficar podre para usar como adubo nas mudas e nas roças”. (D. Otília)
Com estes depoimentos ficam demonstradas as mudanças do estado psicológico dos
parceleiros que no início da prática educativa era de apatia e de desesperança na sua capacidade
de busca de uma vida melhor. FREIRE, 1983, ao analisar o inacabamento do ser humano
considera que o homem está em constante busca e uma educação sem esperança não é educação.
Assim, ao nos colocarmos ao seu lado estimulando-os a buscar na sua história de luta, na sua
resistência frente aos desafios, no espírito guerreiro da comunidade a força para continuar
buscando melhorias de vida, foram aos poucos se fortalecendo como pessoa e como grupo.
Como disse uma parceleira “a nuvem negra deve ser substituída por uma nova luz”.
• Mudanças para o fortalecimento das ações comunitárias e a busca de parcerias
Durante o processo de planejamento e implementação das ações observou-se uma certa
fragilidade nas formas de organização e administração, principalmente da Associação, causando
dificuldades para a ação comunitária, a exemplo de conflitos de interesse entre os parceleiros,
disputa de poder das lideranças, falta de conhecimento do processo associativo e baixo nível de
mobilização e participação da comunidade. Porém, à medida que as atividades foram sendo
desenvolvidas o espírito coletivo foi se fortalecendo, gerando o resgate da união e da luta como
condição básica para a concretização dos objetivos da comunidade.
“Nós temos riquezas, com nossa união podemos fazer poços, artesianos, pois temos muitos olhos d´agua, na minha terra tem muitas águas, até mineral para a gente vender”. (Petronílio)
157
“Nós temos que lutar com a união e com a parceria para fazer nossos criatórios de galinhas e de porcos e melhorar os plantios, poderíamos plantar cupuaçu, pupunha, açaí e a jaqueira”. (D. Otília) “O que queremos é a parceria pois a união nós já temos aqui, agora o que está faltando é a parceria”. (D. Otília) “Chamei o IESB, Dr, Rui, o pessoal do Boto Negro para virem aqui para fazer um trabalho para desenvolver a Marambaia”. (Sr. Petronílio) “Estamos procurando parceria, ajuda do INCRA, dos empresários que tem mais condições que a gente, ajuda dos órgãos que tem mais condições que a gente. Queremos criar também animais de pequeno porte, criar peixe, criar coisa que a gente possa comer e sobreviver, turismo, mercado, barraca de beira de estrada, criar três mini indústria para aproveitar as frutas. Criar adobo orgânico, húmus de minhoca, fazer a nossa ração sem química e sem agrotóxico”. (D. Otília)
Em que pese uma certa “desestruturação” da comunidade em ações comunitárias, a
palavra de ordem da Marambaia é “União e Parceria”. Com este lema a comunidade vem
buscando aliados tanto de órgãos públicos municipais, estaduais e federais, quanto de ONG´s.
Por isso a prática participativa desenvolvida na comunidade culminou em um plano de ação que
orienta e alimenta a esperança da caminhada para a concretização dos seus sonhos, de suas
utopias, como bem enfatiza BOFF, 1986 “à condição que seja uma viagem ao futuro a partir do
presente e em função dele, o sonho utópico dá saúde e vigor à prática”.
Entendemos que uma comunidade para avançar necessita unir forças não só dentro dela, mas
também é preciso se unir a outras forças fora dela. Com esta compreensão estimulamos e
reforçamos a Associação da Marambaia como entidade legítima dos interesses da comunidade.
Com a Associação e demais parceleiros foram sendo possível para a comunidade a efetivação de
parcerias e vínculos com o IESB/FUNBIO, através do projeto “Comunidades Rurais e Florestas”
(viveiro de mudas e trilhas ecológicas) com o CRA e a CONDER que elaborou o projeto da
“Agrovila” e necessita para a sua efetivação de negociação com o INCRA e a Prefeitura
Municipal de Itacaré. Além da formação do Grupo de Artesanato que conta com 14 pessoas da
comunidade.
158
• Mudanças em busca de capacitação e orientação técnica
Um dos problemas para a operacionalização dos projetos na comunidade é a falta de
capacitação e orientação técnica voltadas para a substituição dos métodos tradicionais de cultivo
para métodos alternativos que garantam a sustentabilidade da comunidade.
“Nós não temos experiências em turismo, pois somo trabalhador rural, sempre lutamos com a enxada e a terra”. (D. Otília) “Para cumprir essa lei para conservar o meio ambiente nós precisamos de conhecimento, precisamos de pessoas que venham aqui nos informar a gente se identificar melhor”. (Petronílio) “Se nós não tiver informação. Tiver ajuda das pessoas, dos próprios turistas, dos técnicos dos órgãos, nós não temos grande esperança. Nós queremos sobrevier aqui com o turismo”. (Petronílio) “Só sabemos trabalhar, plantar mandioca, só sabemos cultivar a terra, nós não conhece o turismo. Mas nós sabemos que o desenvolvimento é o turismo. O trabalhador rural não sabe fazer o trabalho turístico. Aí, precisamos de orientação das pessoas competentes que já conhece o que é o turismo para nós poder alcançar um projeto de subsistência para nós poder sobreviver e fazer o turismo mais adequado”. (Petronílio) “Temos plantas medicinais para o intestino, febre, problema de pele, o que temos é planta medicinal. O que está faltando é incentivo, assistência técnica, pessoas que queira juntar com a gente para nos ajudar”. (D. Otília)
Estes depoimentos apresentam o reconhecimento por parte dos parceleiros do saber
técnico e da necessidade de orientação técnica.
Estas pistas identificadas pela comunidade precisam ser operacionalizadas. Todavia algumas
capacitações através de cursos vêm sendo desenvolvidas pela Prefeitura Municipal de Itacaré,
através da Secretaria de Meio Ambiente, Turismo e Agricultura, a exemplo do Curso de
Piscicultura realizada pela administração municipal e UESC. Além de cursos voltados para
atividades agroflorestais desenvolvidos pelo IESB/FUNBIO.
• Mudanças de uma relação de subserviência para uma relação emancipatória entre
os parceleiros com os órgãos públicos e ONG´s.
159
Fortalecidos enquanto grupo e expressando o que desejam e esperam dos poderes públicos e
das ONG´s, a Associação dos Parceleiros da Marambaia com a ajuda da pesquisadora elaborou
um plano de ação onde foi considerada a necessidade do apoio técnico e político para o
desenvolvimento da comunidade a partir de:
• Anistia do débito com o BNB
• Projeto de criatório de animais de pequeno porte (galinhas, porcos, patos, etc.)
• Projeto de piscicultura
• Eletrificação Rural
• Projeto de Apicultura
• Engarrafamento de água mineral existente na área da Marambaia
• Um Posto Médico
• Um Prédio Escolar
• Suspensão do lixão da cidade no Km 4 e nas áreas dos parceleiros da Marambaia
• Cursos de Adubo Orgânico para uso nas roças e a implantação de um Biofertilizante
comunitário
• Mini indústria de doces caseiros, vinhos e licores;
• Uma Panificadora Comunitária;
• Mini indústria de ração animal
• Um Centro Comercial e Artesanal
• Uma mini usina de reaproveitamento e reciclagem de lixo
• Execução do Projeto da “Agrovila” na área (local previsto pelo INCRA para o núcleo
urbano) elaborado pela CONDER para melhorar as condições de moradia.
Prosseguindo o processo de avaliação das práticas educativas vivenciadas pela comunidade
realizamos um encontro com o Grupo de Articulação e Mobilização criado para dar apoio à
Associação, onde foram formuladas perguntas para reflexão que foram incorporadas ao Plano de
Ação da Associação para negociação e alianças com outras instituições, conforme quadros 8, 9 e
10 a seguir:
160
QUADRO 8 - O QUE ACHAMOS IMPORTANTE NOS TRABALHOS O que achamos mais importante nos trabalhos realizados?
- Mutirão de Limpeza dos coqueiros nas roças da maioria dos parcelerios, resgatando a nossa auto-estima e a
nossa organização de foram coletiva, com a finalidade de obter laudos técnicos e a anistia do débito com o
BNB;
- Realização de um Vídeo sobre a Marambaia, onde definimos o roteiro e os aspectos da nossa história, da
nossa gente e a sobrevivência na área e os nossos sonhos.
- Articulações com o CRA e a CONDER para o apoio à Agrovila (Loteamento). A CONDER elaborou o
Projeto da Agrovila e encontra-se em fase de discussão com o INCRA para a execução;
-Execução das Trilhas Ecológicas em lotes dos parceleiros Sr. Gilberto (Beca) e de D. Otília e Antônio, com a
colaboração do técnico Salvador Ribeiro do IESB. A Trilha “Janela da Gindiba” do parceleiro Beca foi
inaugurada em 28.12.00 e as outras encontram-se em fase de conclusão;
-Projeto para a construção pela CAR da Barragem para abastecimento de água da comunidade;
- Elaboração de um livro de Literatura de Cordel de autoria de D. Otília Nogueira sobre a Vida do Projeto
Marambaia e A Natureza editados pela UESC / EDITUS;
- Palestra sobre Potencialidades do Ecoturismo na Marambaia, sendo o facilitador o Sr. Cláudio Lôpo que
opera uma Trilha Ecológica na Camboinhas;
- Ampliação do Viveiro de Mudas, através do Projeto do IESB/FUNBIO.
161
QUADRO 9 - O QUE ESPERAMOS
O que esperamos?
1. Desenvolvimento da nossa comunidade através de:
- Anistia do débito com o BNB;
- Criatório de animais de pequeno porte: peixes, galinhas, porcos, etc;
- Eletrificação Rural;
- Apicultura;
- Engarrafamento de água mineral existente na área da Marambaia.
2. Um Posto Médico
3. Um Prédio Escolar
4. Suspensão do lixão da cidade no Km 4 nas áreas de parceleiros da Marambaia, pela Prefeitura de Itacaré.
QUADRO 10 - O QUE PRETENDEMOS FAZER
O que pretendemos fazer?
1. Cursos de adubo orgânico para uso nas nossas roças e a implantação de uma mini indústria;
2. Mini indústria de doces caseiros, vinhos e licores;
3. Uma Panificadora Comunitária;
4. Mini indústria de ração animal;
5. Mini indústria para fabricação dos sub produtos da mandioca, além da farinha: beiju, biscoitos, tapioca,
etc;
6. Um Centro Comercial e Artesanal;
7. Uma mini usina de reaproveitamento e reciclagem de lixo;
8. Execução do Projeto da “Agrovila” para melhorar as nossas condições de moradia.
162
Em síntese, de um modo geral, avaliamos que a prática vivenciada possibilitou
significativas mudanças nas percepções dos parceleiros sobre os problemas ambientais da
comunidade e no fortalecimento das ações comunitárias para a busca de alternativas de
transformação da realidade. As ações desenvolvidas foram consideradas adequadas e viáveis
operacionalmente, contribuindo para a conscientização, mobilização e organização da
comunidade no sentido da melhoria do seu ambiente de vida. Assim, contribuiu também para o
processo de construção da cidadania.
Alguns passos na direção da possível sustentabilidade sócio-ambiental da Marambaia e
adequação ao Plano de Manejo da APA vêm sendo dados pela comunidade, tanto em nível
individual, quanto em nível coletivo. As alternativas sustentáveis apontadas e que no momento
foram possíveis de ser iniciadas pela comunidade são: a) as trilhas ecológicas, b) o artesanato da
terra, c) o reforço ao viveiro de mudas comunitário e o incentivo aos viveiros individuais, d) a
possibilidade de extração “equilibrada” da piaçava, e) a fabricação de vassouras que vem sendo
feita de forma individual pode ser reforçada em nível comunitário e f) o incentivo ao
biofertilizante comunitário. Outras alternativas apontadas pela comunidade e que estão expressas
no quadro “o que esperamos e o que pretendemos fazer”, ainda não foram desencadeadas.
163
4.1.6 – SOCIALIZANDO OS RESULTADOS DA INVESTIGAÇÃO
Concluídos os trabalhos da investigação, consideramos importante socializar os
resultados parciais junto aos participantes da ação social educativa discutindo os principais
aspectos abordados, no intuito de permitir uma “visão de conjunto” que não seria possível ao
nível da coleta e da execução das práticas vivenciadas, como bem explicita THIOLLENT, 1985,
“Trata-se de fazer conhecer os resultados de uma pesquisa que, por vez, poderá gerar reações e
contribuir para a dinâmica da tomada de consciência e, eventualmente, sugerir o início de mais
um ciclo de ação e de investigação”.
Os resultados preliminares desta investigação foram apresentados de forma externa, na
Mesa Redonda “A prática de educação Ambiental com Comunidades Populares”, na Disciplina:
Educação Ambiental da Turma III do Mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente
da UESC.
Retornamos os resultados da investigação à comunidade, através de um Seminário de
Socialização durante qual foi lançado o “Revelando a Marambaia”. Em forma de painéis
apresentamos de forma sintética as informações parciais coletadas e discutidas com a
comunidade.
O sonho do vídeo foi concretizado no dia 16.02.2001, onde foi lançado no Centro
Comunitário da Marambaia, em Itacaré, contando com a presença do Presidente da Associação
dos Parceleiros da Marambaia – Sr. Petronílio Valverde, de famílias dos parceleiros (crianças,
jovens, mulheres e homens), do Vice- Prefeito de Itacaré – Dr. Edgar Reis, de Secretários
Municipais de Itacaré – Cláudio Lôpo e Roberto Setúbal, da Pró Reitora de Extensão da UESC –
Profª. Jane Voisin, da Administradora da APA Leila Muricy, do Diretor Técnico do IESB – Rui
Rocha, do Coordenador do projeto IESB/FUNBIO “Comunidades Rurais e Florestas da APA” -
Salvador Ribeiro e Valéria, de representantes do SEBRAE e de trabalhadores rurais de Itacaré,
demonstrando a capacidade dos parceleiros em aglutinar parcerias para a concretização dos seus
projetos de vida.
164
Na ocasião foi inaugurada a Barraca do Grupo Alegria – Artesanato da Terra, composto
por 14 pessoas (jovens, mulheres e homens) da Marambaia, sob a coordenação da D. Otília, com
a exposição de peças artesanais confeccionadas a partir do reaproveitamento dos recursos
naturais encontrados nas roças (sementes, raízes, tronco e galhos de árvores mortas, frutos e
fibras vegetais). De forma organizada surgem com bastante criatividade os produtos artesanais
como: bolsas, maquetes, cortinas, animais, copos, etc., que são comercializados na Marambaia e
na cidade de Itacaré.
Ao final do evento nos colocamos enquanto pesquisadora e agradecemos a participação
da comunidade no desenvolvimento de todas as etapas da pesquisa dizendo que os parceleiros da
Marambaia são co-autores não só do Vídeo, mas também da pesquisa “Revelando a Marambaia:
uma prática participativa de Educação Ambiental com pequenos produtores rurais na APA Costa
de Itacaré – Serra Grande”. Aprendemos que além da “razão e da compreensão” existe a
emoção, o sentimento, o cuidado, o respeito, a dedicação, a comunhão, a empatia, a
solidariedade que nos une às coisas e às pessoas e que são importantes para a viabilização da
sustentabilidade sócio ambiental e da conservação do planeta “Terra”. Vocês, num momento de
crise revelaram que são capazes de enfrentar desafios e conquistar sonhos de caráter individual e
coletivo. Estamos, portanto, eu e minha Prof.ª Orientadora – Denise d´El Rey, a UESC, o CRA e
demais aliados ao lado de vocês na construção da cidadania, na busca da melhoria da qualidade
de vida e na conservação do seu ambiente de vida. Somos, portanto, seus parceiros e confiamos
na união de vocês e no fortalecimento das ações educativas e comunitárias na Marambaia, como
condição essencial para a gestão participativa da APA Itacaré – Serra Grande.
Durante o lançamento do Vídeo, a comunidade expressou o desejo de mostrar as suas
condições de vida junto à emissora de televisão local. Para concretizar o solicitado mais uma vez
agimos como facilitadora do processo e, entramos em contato com o Setor de Jornalismo da TV
Santa Cruz (Rede Globo) que, além de se mostrar bastante interessado no assunto em pauta,
realizou uma reportagem na comunidade que foi “ao ar” no dia 21.02.2001 em rede regional e
estadual nos programas “Bahia Meio Dia” e “BA TV” e no dia 18.02.01 no programa BAHIA
RURAL.
165
Assim, proporcionamos a produção de um “vídeo” que além de servir como material
educativo na comunidade, pode ser utilizado junto às emissoras de televisão em programas
educativos em nível regional, estadual e quiçá nacional.
Portanto, parece-nos que, na medida do possível, retornamos as informações entre os
participantes que dialogaram, participaram e agiram em todo o processo de investigação,
fortalecendo a tomada de consciência da comunidade rural da Maramabaia.
Figuras 54, 55 e 56 – Seminário de Socialização dos resultados da investigação
166
Figuras 57, 58 e 59 - Inauguração da Barraca do Grupo Alegria – Artesanato Da Terra”
Vice Prefeito de Itacaré, Sr. Edgar Reis e Assessor da Prefeitura e Ex-Prefeito, Sr. Roberto
Setúbal inaugurando a Barraca de Artesanato
167
Figuras 60 e 61 - Filmagem da Tv Santa Cruz (Rede Globo) na Marambaia (18.02.2001)
Repórter entrevistando o Pres. da Associação da Marambaia – Sr. Petronílio
Filmagem da TV Santa Cruz com as crianças da Marambaia
168
CAPÍTULO 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS OU UM PONTO DE PARTIDA?
Tendo em vista as avaliações sobre a prática participativa desenvolvida com a
comunidade rural da Marambaia, consideramos que a investigação cumpriu os objetivos
pretendidos, cujos resultados podem ser aproveitados em outras experiências, principalmente
junto às comunidades populares que estão inseridas em Áreas de Proteção Ambiental.
Uma das maiores dificuldades enfrentadas no decorrer do estudo foi a de se promover a
participação e estimular a mobilização, pois muitos fatores contribuem para isso, a exemplo de:
a) experiências técnicas negativas anteriores com propostas de trabalho desvinculadas da
realidade concreta e feitas de “cima para baixo”, b) a seleção de prioridades em nível individual
ocasionada pelo próprio processo de exclusão social, onde as necessidades básicas ainda não
estão satisfeitas, acarretando uma certa acomodação para os trabalhos comunitários, c) conflitos
de interesse e de poder entre as lideranças comunitárias, enfraquecendo muitas vezes a
organização dos trabalhos.
Todavia, fomos conjuntamente enfrentando os desafios, conforme pode ser observado no
capítulo 4 e, concretizando a prática participativa, através das reuniões coletivas e de lideranças,
entrevistas não diretivas, conversas informais, capacitações em cursos, envolvimento com o dia-
a-dia da comunidade, inclusive dando lugar para a efetivação das contribuições individuais e
coletivas.
Nas reuniões as falas e idéias dos participantes eram todas aproveitadas, tentando sempre
se chegar a propostas consensuais entre o grupo. Nas entrevistas não diretivas e nas conversas
informais, as questões eram colocadas a partir dos próprios depoimentos dos entrevistados que
foram considerados na íntegra para efeito de análise, de coleta de dados e produção do
conhecimento.
169
O envolvimento (inserção) da pesquisadora no dia-a-dia da comunidade proporcionou
uma visão contextualizada da realidade do ambiente de vida, com o que foi possível
compreender e incorporar as contribuições individuais e coletivas da comunidade, seus mitos,
suas crenças e suas utopias, enfim seu engajamento no processo participativo e educativo.
Um aspecto relevante na prática vivenciada foi o seu caráter educativo transformador,
onde coletivamente fomos capacitando e aprendendo, investigando e agindo durante todo o
processo. Em todos os momentos da prática buscávamos construir um novo conhecimento, a
partir da troca de informações e de integração entre a pesquisadora e pesquisados, entre as
pessoas, técnicos e instituições que atuam na comunidade.
Entendendo que a educação é um processo de longo prazo e de caráter permanente,
consideramos que em pouco tempo (oito meses) de vivência com a comunidade, pudemos obter
avanços significativos, constituindo-se, portanto a investigação em um ponto de partida para
futuros estudos para a pretendida sustentabilidade sócio-ambiental do assentamento de reforma
agrária da Marambaia.
Em se falando de processo educativo como práxis social, consideramos que a Educação
Ambiental foi desenvolvida, pois sempre se procurou a conscientização dos problemas
ambientais e a viabilidade de possíveis soluções, através da mobilização e participação da
comunidade para o enfrentamento das dificuldades e a conquista dos seus sonhos.
Um dos mais graves problemas da exclusão social está relacionada à falta de informação
e orientação técnica que, segundo ANDRADE, 1993, em sua tese de dissertação de Mestrado,
afirma “a falta de informação propicia a concentração de poder por parte das classes dominantes
que, por deterem os conhecimentos construídos na sociedade como um todo, inclusive entre as
classes populares, mantém a estrutura social injusta em que vivemos”. Entendemos que na
prática pudemos caminhar com pequenos passos para a superação desta lacuna.
170
Consideramos, ainda, que como resultado do processo de Educação Ambiental
possibilitamos a instrumentalização da comunidade para o enfrentamento das lutas pelas
transformações das atuais condições sociais e econômicas, que sabemos, fogem ao controle da
comunidade, pois é papel do Estado ou da sociedade como um todo e que não é cumprido para
as camadas populares. A Educação Ambiental por si só não resolverá os graves problemas de
exclusão social, mas a sua aplicação segundo os pressupostos propugnados nesta pesquisa se
constitui em um desafio. E, sendo desafio, sua concretização proporcionará a construção da
cidadania, conforme explicitado por LEONARDI, 1997:
“A educação ambiental como formação da cidadania ou como exercício de cidadania tem a ver, portanto, com uma nova maneira de encarar a relação homem/natureza. O conceito de natureza passou a incluir os seres humanos que são, em essência, seres sociais e históricos, e o conceito de homem passou a incluir a natureza biofísica. É por isso que se fala atualmente na necessidade de construir uma nova relação homem/natureza, ou até um novo contrato entre os dois, já que, na verdade, ambos pertencem a uma mesma entidade ontológica”.
A metodologia escolhida, ou seja, a pesquisa-ação de fato constitui em uma estratégia de
educação ambiental, pois consiste em gerar na comunidade um processo de auto-diagnóstico e
auto-transformação, com vistas não só a conscientização dos seus problemas, mas que também
conheçam as causas e proponham soluções para as necessárias mudanças.
Na aplicação desta metodologia de pesquisa-ação os pesquisadores e pesquisados
(assentados) exerceram relevante papel enquanto seres ativos e participantes no processo de
mudança de percepção e na atitude dos assentados perante seus problemas sócio-ambientais, que
de certa forma influenciam nas suas atuais condições de sobrevivência.
Por mais difícil que seja colocar a temática ambiental no âmbito das discussões do
ambiente de vida dos assentados, vale a pena tentar. Por que só no enfrentamento dos problemas
é que juntos encontraremos as saídas, os caminhos para a sustentabilidade sócio-ambiental.
Assim, a educação ambiental de caráter popular pode ser um “instrumento crítico” de
viabilização do desenvolvimento sustentável nos assentamentos de reforma agrária. Portanto,
esta metodologia pode ser reaplicada em novos trabalhos, a partir de uma adaptação de acordo
com a realidade e necessidades específicas de cada comunidade.
171
Optamos por um trabalho pautado na prática contextualizada de Educação Ambiental
participativa, o que talvez no decorrer do mesmo tenhamos cometido falhas e deixado lacunas na
articulação entre a teoria e a prática. Esperamos que outros trabalhos venham suprir o necessário
aprofundamento teórico, respaldando esta experiência.
Com este estudo não pretendemos aprofundar todos os aspectos que envolvem a questão
ambiental e, especificamente a Educação Ambiental como instrumento de cidadania, ou seja, a
interdependência entre os fatores políticos, sociais, culturais, biológicos, econômicos, éticos, que
conforme LIMA, 1994 “constituem o objeto de estudo da Ecologia Humana”, nem tampouco
solucionar todas as demandas sociais na luta pela sobrevivência e as conseqüências decorrentes
da pobreza e da miséria existentes na comunidade rural da Marambaia, que sabemos está
relacionada com o modelo excludente, concentrador de terra e de renda adotado pelo país.
Com esta investigação foi possível articular e concretizar pequenos passos, através de
uma prática educativa e participativa onde se esboçou um plano de ação construído com a
comunidade em que estão expressos os caminhos rumo à sustentabilidade sócio-ambiental na
Marambaia. Nele, estão colocadas as necessidades e aspirações da comunidade, que no seu
imaginário popular garantirão a melhoria da qualidade de vida. A comunidade traçou os
caminhos para o seu desenvolvimento. Porém como eles mesmos colocam necessitam de
“informações e de orientações técnicas para este novo desenvolvimento”, precisam de “união e
de parceria”.
Conforme BOFF, 1986:
“O importante é que qualquer ação se mantenha orientada na direção de seu objetivo final. Mas orientada dialeticamente, como um caminho de montanha que, apesar de todas as suas voltas (táticas), vai fundamentalmente (estratégia) para o cume (objetivo). Ou como o rio, que contornando montanhas ou saltando em cachoeira (tática) segue firme (estratégia) na direção do mar (meta final)”.
Desse modo, ainda o autor diz, que o “que interessa não é o passo como tal, mas sua
orientação, isto é, sua articulação com o projeto global da ação. A relação é, pois, entre uma
172
instância real e uma instância de representação (um projeto, um horizonte, etc). Donde a
importância do ideológico (teoria e projeto) para o prático”. (op. cit.)
Consideramos que este novo desenvolvimento pretendido pela comunidade passa pela
articulação e aglutinação de diversos setores e instâncias que podem e devem promover os
interesses da sociedade, ou seja, os governos em todas as suas esferas, as ONG´s, as associações,
sindicatos, federações e confederações dos trabalhadores rurais, os movimentos ecológicos,
universidades, entidades profissionais, etc. Para a comunidade avançar na construção do projeto
de melhoria do seu ambiente de vida deve buscar aliados dentro de si e somar com outros aliados
fora dela.
Como mencionado neste estudo, propostas dos trabalhadores rurais não faltam, o que
falta é a vontade política de concretizá-las.
Neste aspecto, julgamos relevante propor com base no Projeto Alternativo de
Desenvolvimento Rural Sustentável baseado na Agricultura Familiar propugnado pela
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG, e nas iniciativas e
experiências de alternativas sustentáveis existentes na comunidade, a elaboração de um Plano
Integrado de Desenvolvimento Local Sustentável da Marambaia, envolvendo uma equipe
interinstitucional e interdisciplinar. Inicialmente deverão ser articulados os órgãos
governamentais que atuam na área (INCRA, Prefeitura Municipal de Itacaré, CRA, CONDER,
CAR, EBDA, CEPLAC, EMBRAPA, BAHIAPESCA), as ONG´s (IESB), a universidade
(UESC), SEBRAE, etc, pois como afirma LEROY, 1997, “essas complexas dinâmicas na busca
de um desenvolvimento sustentável exigem parcerias entre vários setores. A qualificação das
organizações sociais pode ser facilitada pelo suporte de aparelhos técnicos governamentais e
pela participação ativa da academia cumprindo a sua função social”.
Nesta linha de pensamento, podemos destacar que a partir dos resultados preliminares
desta pesquisa apresentados durante o Seminário de socialização dos resultados da investigação e
Lançamento do vídeo “Revelando a Marambaia”, a Pró Reitoria de Extensão da UESC definiu a
comunidade rural da Marambaia como um dos projetos de extensão universitária a ser elaborado
173
para o Programa de Apoio e Desenvolvimento de Comunidades – Programa Universidade
Solidária, Módulo Regional 2001, Edital nº 3 – SESU/MEC – UNISOL, que tem como objetivo
o financiamento de projetos de formação e capacitação de recursos humanos, cooperativismo e
associativismo, buscando a geração de emprego e renda. Para tanto, em reunião realizada com a
comunidade e esta pesquisadora, a Pró Reitoria de Extensão e o Núcleo de Turismo da UESC, a
partir do diagnóstico do ambiente de vida realizado por esta pesquisa-ação, definiram pela
elaboração de um projeto de desenvolvimento pautado no turismo rural-ecológico tendo como
vertente o reforço às atividades de artesanato e de trilha ecológica já em curso na comunidade.
Este projeto irá concorrer com outros em nível nacional, que sendo aprovado, irá fortalecer as
ações comunitárias através da capacitação de membros da comunidade, cumprindo a UESC o
seu papel social de pesquisa e extensão universitária.
Ainda com base nesta pesquisa-ação recomendamos que o Centro de Recursos
Ambientais – CRA, como órgão gestor da APA Costa de Itacaré-Serra Grande, deverá; a)
promover a articulação interinstitucional, envolvendo organizações governamentais e não
governamentais, visando ao desenvolvimento de ações conjuntas que permitam acompanhar e
fortalecer a educação ambiental no âmbito das comunidades inseridas na APA e, no caso
específico da Marambaia, b) fomentar e estimular a efetivação de projetos sócio-ambientais,
buscando alternativas de emprego e renda na comunidade, c) fomentar o fortalecimento das
ações comunitárias a partir de trabalhos educativos voltados para a realidade concreta que
respondam as questões enfrentadas pela comunidade.
Por último, consideramos que esta investigação a partir da prática participativa de
Educação Ambiental com os pequenos produtores rurais da APA Itacaré – Serra Grande pode
dar contribuições à tão almejada gestão ambiental, constituindo-se, então, em um ponto de
partida para a continuidade do trabalho que teve conquistas parciais, mas fundamentais para a
conscientização da comunidade e construção da cidadania. É um ponto de partida também para a
elaboração e execução do Plano Integrado acima mencionado.
174
Aprendemos a enfrentar as dificuldades com a “Pedagogia dos Desafios” defendida pela
minha orientadora Profª Denise Homem d´El-Rey e com esta pesquisa vivenciada com a
comunidade da Marambaia, estamos tentando esboçar a “Pedagogia do Cuidado”.
Esta pedagogia tem como princípio uma nova ética do humano e compaixão pela terra,
propugnado por Leonardo Boff, 2000, que enfatiza:
“Quando falamos de ethos queremos expressar o conjunto de valores, princípios e inspirações que dão origem a atos e atitudes (as várias morais) que conformarão o habitat comum e a nova sociedade nascente. É urgente um novo ethos de cuidado, de sinergia, de re-ligação, de benevolência, de paz perene para com a Terra, para com a vida, para com a sociedade e para com o destino das pessoas, especialmente das grandes maiorias empobrecidas e condenadas da Terra”.
A “Pedagogia do Cuidado”, enquanto práxis social e educativa, portanto, deve resgatar a
natureza do cuidado essencial nos seres humanos, que com certeza não é a razão “analítica e
objetivista”, mas sim, o sentimento, o envolvimento, o afeto e a capacidade de expressar as
emoções. Ou seja, construir um novo mundo pautado nos laços afetivos, valorizando as pessoas,
preocupando-nos com elas, ou seja, colocar o cuidado como uma atitude de vida, de desvelo e de
preocupação com os seres humanos e com os outros seres vivos e com o planeta Terra. Assim,
nos revelamos, nos damos a conhecer e mostramos a nossa capacidade de amar. Como diz,
Humberto Maturana, citado por BOFF, 2000, “o que é especialmente humano no amor não é o
amor, mas o que fazemos no amor enquanto humanos...; é a nossa maneira particular de
vivermos juntos como seres sociais na linguagem...; sem amor nós não somos seres sociais”.
A vida, portanto, “é a essência do ser vivo, uma unidade auto-poiética, que significa ser
capaz de auto-produção, auto-manutenção, auto-organização e auto-transformação em um
sistema dinâmico e interdependente com todo seu ecossistema. (HOMEM D´EL-REY, 2000).
O surgimento dessa nova pedagogia do cuidado deve está alicerçada em pressupostos
teóricos que foram resumidos por HOMEM D´EL-REY, 2000, e que, consideramos relevantes
destacar: “subjetividade no processo de conhecimento da realidade; conceito de totalidade
reforçando a interdependência entre o indivíduo e o coletivo; existência de uma área interface
entre todas as áreas de conhecimento; a participação é uma necessidade biológica; reforço do
175
caráter político da educação para autonomia do sujeito; reconhecimento da dimensão afetiva no
processo de transformação; reconhecimento da emoção no processo de tomar decisões; uso do
saber para fomentar alianças e parcerias e relações entre sujeitos baseadas na ética e
solidariedade”.
Finalmente, consideramos que alçando vôos, retomando o sentido da transcendência,
ousando reconquistar o prazer e a emoção que se tem através da harmonia obtida pelo amor,
reencontrando a essência da natureza humana através do cuidado, daremos um grande passo para
a construção de uma vida digna e solidária na Terra.
176
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134-160.
182
ANEXOS
183
ANEXO I
184
ANEXO II
185
ANEXO III
ZONEMENTO ECONÔMICO E ECOLÓGICO DA APA E A INSERÇÃO DA MARAMBAIA
Zoneamento Econômico e
Ecológico
Proteção Ambiental Uso Indicado
ZAF – Zona Agro-florestal
Preservar remanescentes florestais. Manutenção integral da cobertura florestal remanescente e redução da atividade antrópica, buscando-se o manejo sustentado dos ecossistemas existentes. Apoio técnico para implantação e manutenção dos sistemas agroflorestais, e incremento de alternativas tecnológicas, evitando a substituição por cultivos convencionais ou pastagens. Identificação dos remanescentes florestais pelos proprietários rurais, podendo estas áreas serem transformadas em RPPN – Reserva Particular do patrimônio Natural. Parcelamento do solo só através de lotes rurais conforme módulo rural do INCRA.
Implantação de cultivos econômicos típicos dos sistemas agroflorestais. Implementação de cultivos agrícolas convencionais e formadores de estrato arbustivo e arbóreo, priorizando-se as frutíferas.
ZAG – Zona de Agricultura
Preservar remanescentes florestais. Manutenção e recuperação das áreas protegidas pela legislação, degradas ou em processo de degradação. Revegetação das áreas livres e comuns do lote ou gleba. O parcelamento mínimo do solo só será permitido para finalidade rural, conforme módulo mínimo do INCRA
Silvicultura ou cultivos econômicos típicos dos sistemas agroflorestais, priorizando-se as espécies arbóreas perenes. Cultivos agrícolas de subsistência, através de técnicas alternativas apropriadas aos ambientes tropicais, sem o uso intenso de agrotóxicos e fertilizantes. Beneficiamento agrícola. Apicultura. Piscicultura. Uso pastorial, em regime de semiconfinamento.
186
ZPR - Zona de Proteção Rigorosa
Proibição completa da eliminação das formações florestais remanescentes, preservação desses remanescentes ou recuperação das áreas degradas, buscando-se alternativas viáveis para a exploração econômica da floresta. As áreas íntegras poderão ser transformadas em RPPN. A assistência técnica, por parte dos organismos competentes, para projetos de manejo dos remanescentes florestais também será um mecanismo protetor do ambiente dessa zona.
Exploração econômica da mata, com base no Plano de Manejo Florestal devidamente aprovado pelo órgão competente. Inserção em projetos produtivos dos sistemas agroflorestais. Apicultura. Turismo ecológico, com trilhas e infra estrutura de apoio.
ZUD – Zona de Uso Diversificado
Preservar remanescentes florestais. Manutenção e recuperação das áreas protegidas pela legislação, degradadas ou em processo de degradação. Revegetação das áreas livres e comuns do lote ou gleba.
Agropastoril, priorizando-se os cultivos agrícolas, com utilização de espécies arbóreas perenes e o semiconfinamento, na atividade pastoril. Comércio e serviços diversos. Atividades de infra estrutura e apoio ao desenvolvimento dos projetos turísticos existentes para a APA.
NUA – Núcleo Urbano de Apoio
Preservar remanescentes florestais. Revegetação das áreas livres e comuns do lote ou gleba. Manutenção e recuperação das áreas protegidas pela legislação, degradadas ou em processo de degradação. Cadastramento e regularização dos loteamentos existentes. Lote mínimo de 300,00 m2 Gabarito máximo de 2 pavimentos ou altura de 7,5m a, com telhado com inclinação máxima de 30%.
Conservação da cobertura florestal. Implantação de cultivos econômicos típicos dos sistemas agro-florestais. Uso agropastoril. Priorizando-se cultivos agrícolas com utilização de espécies arbóreas perenes e semiconfinamento na atividade pastoril Uso residencial unifamiliar, plurifamiliar, turismo. Serviço de alimentação, comércio e serviços. Atividades de infra estrutura e apoio ao desenvolvimento dos projetos turísticos Transformação de remanescentes florestais em Reserva Particular do patrimônio natural – RPPN.
187
ZT1 – Zona Turística I
Índice de permeabilidade de 60% e taxa de ocupação de 30%. Taxa de ocupação para comércio, turismo e serviço de alimentação poderá se estender até 70%, com índice de permeabilidade mínima de 30%. Arborização com espécies nativas, na proporção de 01 árvore para cada 50 m2 de área impermeável. Solução para saneamento básico, sistema viário e energia elétrica. Elaboração de estudos prévios na utilização de áreas úmidas. Preservar remanescentes florestais. Unidade territorial mínima de parcelamento, por Resort, de 30 ha. Densidade máxima de 30 leitos/ha de área antropizada. Gabarito máximo de 2 pavimentos ou 7,50m com telhado de inclinação mínima de 30%. Solução para saneamento básico, sistema viário e energia elétrica. Projeto de arborização priorizando as espécies nativas. Manutenção e recuperação das áreas protegidas pela legislação, degradadas ou em processo de degradação. Revegetação das áreas livres e comuns do lote ou gleba.
Empreendimentos turísticos de baixa densidade e infra-estrutura de apoio para empreendimentos hoteleiros localizados na ZT II; Estruturas de apoio a atividades esportivas, educativas e culturais; Trilhas ecológicas; Camping; Uso agropastoril, priorizando-se, no cultivo, as espécies perenes e no pastorial o semiconfinamento; Campo de pouso, subordinado à realização de estudo prévio específico; Projetos de manejo produtivo assistidos tecnicamente por organismos competentes; e Atividades educativas e culturais.
FONTE: BAHIATURSA, 1998
188
ANEXO IV
CAPA DO VÍDEO "REVELANDO A MARAMBAIA"
189
FICHA TÉCNICA DO VÍDEO “REVELANDO A MARAMBAIA"
FICHA TÉCNICA
Promoção: UESC/Mestrado de Desenv. Regional e Meio ambiente
Associação dos Parceleiros da Marambaia
Coordenação: Júlia Salomão – Pesquisadora
Denise Cesar Homem d´El-Rey – Profª Orientadora
Roteiro: Julia Salomão, Paulo Paiva e parceleiros da Marambaia
Direção: Paulo Paiva
Cinegrafia: Paulo Paiva e Paulo Celso de Souza Brito(UESC)
Edição: Paulo Roberto Santos - Vídeo Life Produções Ltda
Músicas: Marcus Viana (Jardins de Shiva) e Vangelis (Conquista do Paraíso)
AGRADECIMENTOS
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ – UESC
Magª Reitora Prof.ª Renée Albagli Nogueira
Profº Max de Menezes - Coordenador do Mestrado
CENTRO DE RECURSOS AMBIENTAIS – CRA
Dr. Fausto Antônio Azevedo - Diretor Geral
Eng. Leíla Muricy Torres - Administradora da APA Costa de Itacaré-Serra Grande
Dedico este estudo:
A Carlos Gregório e Larissa, meus filhos, pelo
amor, pela força e alegria de viver. Com eles
aprendo a ter cuidado e carinho com todos as
pessoas, aprendo a alimentar o sonho de um planeta
saudável e de uma sociedade digna, fraterna e
solidária – uma sociedade sustentável.
Ao meu pai, Antônio Salomão (in memoriam) pela
bondade e ternura. Ao meu irmão Cláudio (in
memoriam) pela coragem. A minha mãe Celina,
pelo espírito guerreiro e forte. Aos meus irmãos
Antoninho, Dudu, Irany e famílias pelo incentivo e
solidariedade em todos os momentos de minha
existência.
Aos meus antepassados, rogando a Deus que
alcancem a salvação no Mundo Espiritual.
A todas as famílias da Marambaia pela resistência e
pelo espírito de luta que os tornam vitoriosos na
terra que escolheram para trabalhar e viver
I
GRATIDÃO
A DEUS pela existência de toda vida. Ao mestre, Meishu Sama, que baseado na trilogia
Verdade, Bem e Belo, criou uma filosofia própria de reencontro dos homens com as leis da
natureza, visando uma melhoria geral na qualidade de vida da humanidade. A luz divina
canalizada pelo JOHREI iluminou todos os passos deste estudo.
A minha orientadora, Profª Denise C. H. d´El Rey, a minha especial gratidão, pois com
sua confiança, presteza, força, determinação e inspiração poética elevou o meu espírito e deu-
me coragem para enfrentar todos os desafios da pesquisa, ao dizer: “... Você que
corre...sofre...sonha... levante os olhos, alce vôos além da esperança e aprenda a conhecer a
emoção de ouvir o seu coração”.
Ao Prof. Max de Menezes, coordenador do Mestrado, que com sua dedicação e confiança
oportunizou o desenvolvimento das ações de pesquisa.
A todos os professores que ao repassarem os seus conhecimentos proporcionaram o meu
aperfeiçoamento profissional, científico e pessoal.
A todos os meus colegas do mestrado que ajudaram com suas observações no meu
crescimento relacional.
A Mônica Maia, secretária do Curso de Mestrado pelo empenho e cuidado com todos.
A Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC por ter-me propiciado a oportunidade de
realizar o Mestrado e pelo apoio na promoção do vídeo “Revelando a Marambaia”.
A EDITUS/UESC, pela edição da Literatura de Cordel elaborada por D. Otília Nogueira -
líder comunitária da Marambaia.
II
Aos meus colegas do CRA, em especial:
- Dr. Fausto Azevedo – Diretor Geral, pelo incentivo e determinação em formar um
quadro de pessoal especializado e competente para o enfrentamento da problemática
ambiental no Estado da Bahia.
- Leíla Muricy Torres – Adm. da APA Costa de Itacaré – Serra Grande, colega e amiga,
que não mediu esforços em apoiar todas as etapas da pesquisa e incentivar o estudo.
- Lúcia Cardoso, colega e grande amiga que sempre confiou na minha capacidade
profissional e que em momentos difíceis de minha vida esteve sempre pronta para
ajudar.
- Teresa Muricy, a quem reconheço o espírito de liderança e que deposita em mim a
confiança para a concretização dos trabalhos sócio-ambientais.
Ao IESB, Rui Rocha, Salvador Ribeiro, Oscar Artaza, Ana Paranhos pelo apoio e
colaboração ao estudo. A Marcelo Araújo, especial gratidão, pela dedicação na elaboração
dos Mapas e na preocupação em me fornecer bibliografia para o enriquecimento teórico da
pesquisa.
A Paulo Paiva, colega de Mestrado, pela dedicação nas filmagens e direção do vídeo
“Revelando a Marambaia”, meus sinceros agradecimentos, que com carinho estendo,
também, para Paulo Celso Brito, técnico da ASCOM/UESC.
A Emiliano, pelo estímulo e pela amizade, transmitindo-me sempre energias positivas.
A todos os meus amigos e amigas, a minha gratidão fraterna.
III
“A gente quer do bom e do melhor...
A gente quer carinho e atenção...
A gente quer é ter muita saúde...
A gente quer viver a liberdade...
A gente quer é ser cidadão
E a cada momento de felicidade,
Dizer declarações de amor à vida...”
(Gonzaguinha)
IV
SUMÁRIO Página
LISTA DE SIGLAS ........................................................................................... VII
LISTA DE FIGURAS ........................................................................................ VIII
LISTA DE QUADROS ...................................................................................... X
LISTA DE MAPAS ............................................................................................ XI
LISTA DE ANEXOS .......................................................................................... XII
RESUMO ............................................................................................................ XIII
ABSTRACT ....................................................................................................... XV
INTRODUÇÃO ................................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 – Desafios para o desenvolvimento sustentável na
agricultura de pequenos produtores rurais....................................................... 7
1.1 – Ecodesenvolvimento e Desenvolvimento Sustentável .. 8
1.2 – Meio ambiente e Reforma Agrária ................................. 21
CAPÍTULO 2 – Educação ambiental como estratégia para viabilizar o
desenvolvimento sustentável nos assentamentos de reforma agrária............. 29
2.1 – Caminhos da Educação Ambiental no mundo e seus
reflexos no Brasil .................................................................. 30
2.2 – Papel dos movimentos sociais e dos movimentos ecológicos
na busca pela cidadania e pelo direito à vida ........................ 44
2.3 – Os pressupostos da educação ambiental e sua importância
como instrumento de cidadania ............................................. 52
2.4 – A pesquisa-ação como estratégia de educação ambiental
nos assentamentos de reforma agrária ................................... 58
CAPÍTULO 3 – Conhecendo a Marambaia ...................................................... 62
3.1 – Caracterizando o ambiente natural e ambiente construído ... 64
3.1.1 – O ambiente natural ................................................... 64
3.1.2 – O ambiente construído.............................................. 69
3.2 – Inserindo a Marambaia na APA Costa de
Itacaré – Serra Grande .......................................................... 78
V
3.2.1 – Zoneamento Econômico e Ecológico da
APA Costa de Itacaré – Serra Grande e a
inserção da Marambaia ........................... 81
3.3. Experiências de integração ao Plano de Manejo da APA:
Projetos desenvolvidos pelo poder público e ONG´s........... 88
3.3.1 – Experiências do poder público.......................... 88
3.3.2 – Experiências de ONG´s .................................... 91
CAPÍTULO 4 – Enfrentando dificuldades e conquistando sonhos:
uma prática participativa com a comunidade
da Marambaia ......................................................................... 94
4.1 – Pesquisando e agindo ........................................................ 96
4.1.1 – Conhecendo a realidade da comunidade envolvida 97
4.1.2 – Rearticulando a prática de pesquisa à teoria
de Educação Ambiental .......................................... 114
4.1.3 – Diagnosticando o ambiente de vida ........................ 116
4.1.4 – Planejando e implementando as ações .................... 124
4.1.5 – Avaliando as práticas educativas vivenciadas ......... 148
4.1.6 – Socializando os resultados da investigação ............. 163
CAPÍTULO 5 – Considerações Finais ou um Ponto de Partida? .................... 168
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 176
ANEXOS ............................................................................................................... 182
VI
LISTA DE SIGLAS
APA – Área de Proteção Ambiental
BNB – Banco do Nordeste
CRA – Centro de Recursos Ambientais
CAR – Companhia de Desenvolvimento Rural
CEPRAM – Conselho Estadual de Meio Ambiente
CEPLAC – Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira
CODETUR – Coordenação de Desenvolvimento do Turismo
COOTEBA/LUMIAR – Cooperativa de Trabalho do Estado da Bahia
CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
DRP – Diagnóstico Rural Participativo
EA – Educação Ambiental
EBDA – Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola
EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agrícola
FETAG-Ba – Federação dos Trabalhadores na Agricultura da Bahia
FUNBIO – Fundação para a Biodiversidade
GEA – Grupo de Estudos de Educação Ambiental da UFRJ
IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IESB – Instituto de Estudos Sócio-Ambientais do Sul da Bahia
INCRA – Instituto de Colonização e Reforma Agrária
MMA – Ministério do Meio Ambiente
MIRAD – Ministério de Reforma Agrária
ONG´s – Organizações Não Governamentais
PRONEA – Programa Nacional de Educação Ambiental
PCN´s – Parâmetros Curriculares Nacionais
PEAE – Programa de Educação Ambiental e Ecoturismo da APA Itacaré-Serra Grande
PROCERA – Programa de Custeio para a Reforma Agrária
SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação
UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
ZEE – Zoneamento Econômico e Ecológico
VII
LISTA DE FIGURAS
FIGURAS Página
1 e 2. Árvores e cipós da Marambaia no lote do parceleiro Beca ............................ 65
3. Rio Jeribucaçu ...................................................................................................... 68
4, 5 e 6. Reunião da Associação dos Parceleiros da Marambaia ............................. 69
7 e 8. Sede do Centro Comunitário e Jovens da Marambaia .................................. 71
9 e 10. Moradias dos Parceleiros da Marambaia ..................................................... 72
11. Rio Jeribucaçu e seus usos pela comunidade ................................................... 72
12. Destinação Final do lixo da cidade de Itacaré em áreas da Marambaia ............ 73
13. Roça de mandioca em lote de parceleiro da Marambaia ................................... 75
14, 15 e 16. Casa de Farinha Comunitária ............................................................... 76
17 e 18. Peça musical “O bicho da Mata Atlântica” ................................................ 77
19, 20 e 21. Grupo Alegria – Artesanato da Terra ................................................... 77
22 e 23. I Seminário da Marambaia – Reforma Agrária, Turismo e Meio Ambiente 102
24 e 25. Mutirão de Limpeza dos coqueiros ............................................................. 130
26 e 27. Capacitação em Ecoturismo ........................................................................ 133
28 e 29. Trilha Ecológica “Janela da Gindiba” (lote do parceleiro Beca)................. 136
30. Recursos Naturais das roças utilizados para a confecção dos artesanatos .......... 137
31. Peças artesanais fabricadas pelo Grupo Alegria ................................................. 137
32 e 33. Viveiro de Mudas Comunitário.................................................................... 139
34 e 35. Capacitação em Produção de Mudas Florestais (Projeto IESB/FUNBIO)... 140
36 e 37. Filmagem do Vídeo “Revelando a Marambaia” ......................................... 142
38 e 39. Reunião para discussão das imagens para a edição do Vídeo ..................... 143
40. Produção de Mudas (florestais, ornamentais e medicinais) ................................ 144
41 e 42. Extração de Piaçava e fabricação de vassouras ........................................... 144
43. Adubo Orgânico .................................................................................................. 145
44. Artesanato ............................................................................................................ 145
45. Trilhas Ecológicas (cipós e árvores da Trilha Janela da Gindiba) ...................... 146
46. Lançamento do Vídeo "Revelando a Marambaia" .............................................. 147
VIII
47. Apresentação do Vídeo pela pesquisadora ......................................................... 147
48. Participação da comunidade no lançamento do vídeo ........................................ 148
49. Avaliação com máscaras (antes dos trabalhos educativos) ................................ 150
50 e 51. Avaliação com máscaras (painéis com desenhos) ..................................... 151
52 e 53. Painéis de desenhos antes e depois dos trabalhos educativos ................... 151
54, 55 e 56. Seminário de Socialização dos resultados da investigação ................. 165
57, 58 e 59. Inauguração da Barraca do Grupo Alegria – Artesanato da Terra ...... 166
60 e 61. Filmagem da TV Santa Cruz (Rede Globo) na Marambaia (18.02.2001) 167
IX
LISTA DE QUADROS
QUADROS Página
1. Tipos de cultivos agrícolas da Marambaia .................................................... 66
2. Ocupação do solo .......................................................................................... 66
3. Escolaridade .................................................................................................. 71
4. Marambaia nas categorias do Zoneamento da APA ..................................... 83
5. Identificação dos Problemas ......................................................................... 121
6. Plano de Ação da Marambaia ....................................................................... 126
7. Plano de Execução para o Ecoturismo ......................................................... 134
8. O que achamos mais importante nos trabalhos ............................................ 160
9. O que esperamos .......................................................................................... 161
10. O que pretendemos fazer ........................................................................... 161
X
LISTA DE MAPAS
MAPAS Página
1. MAPA DE LOCALIZAÇÃO DA APA NO ESTADO DA BAHIA .................... 84
2. MAPA DE LOCALIZAÇÃO DO ASSENTAMENTO MARAMBAIA
NO ZONEAMENTO DA APA ........................................................................... 85
3. ASSENTAMENTO MARAMBAIA: ZONEAMENTO CONFORME O PLANO
DE MANEJO DA APA ......................................................................................... 87
XI
LISTA DE ANEXOS
ANEXOS Página
ANEXO I – ROTEIRO DE ENTREVISTA ............................................................ 183
ANEXO II– RECORTES DO JORNAL DA APA - Vol. I, Ano II - nº 15, set. 2000 184
1. GENTE DA APA – ENTREVISTA D. OTÍLIA NOGUEIRA
2. INFORMES – SEMINÁRIO DA MARAMABAIA
RECORTES DO JORNAL DA APA - Vol. I, Ano II - nº 19, fev. 2001
3. VÍDEO "REVELANDO A MARAMBAIA"-Artigo de Julia Salomão
ANEXO III – ZONEAMENTO ECONÔMICO E ECOLÓGICO DA APA E A
INSERÇÃO DA MARAMBAIA........................................................ 185
ANEXO IV - CAPA DO VÍDEO "REVELANDO A MARAMBAIA" ................. 188
- FICHA TÉCNICA DO VÍDEO ........................................................ 189
XII
RESUMO
SALOMÃO, Júlia Maria Santana, Universidade Estadual de Santa Cruz, maio de 2001.
Revelando a Marambaia: uma prática participativa de Educação Ambiental com
pequenos produtores rurais na APA Costa de Itacaré - Serra Grande. Professora
Orientadora: Denise César Homem d´El-Rey
A intenção do presente estudo foi a de compreender como os pequenos produtores
rurais de um assentamento de reforma agrária, localizado na APA Costa de Itacaré-Serra
Grande, no Estado da Bahia, se relacionam com o meio ambiente e como percebem as
influências de uma Unidade de Conservação em seu ambiente de vida e quais as soluções
encontradas para a melhoria da qualidade de vida, no sentido de compatibilizar a conservação
ambiental e a sobrevivência. Para efeito dos resultados esperados na pesquisa junto ao
assentamento de reforma agrária - Marambaia, optamos por um trabalho pautado na prática
contextualizada de Educação Ambiental participativa, adotando a estratégia metodológica da
pesquisa-ação, pois permite a ação e solução de problemas coletivos e no qual os
pesquisadores e os participantes representativos da situação estão envolvidos de modo
cooperativo e participativo. A análise contextualizada do ambiente natural e do ambiente
construído do assentamento Marambaia, bem como da sua inserção no zoneamento da APA é
de fundamental importância, pois, permite visualizar o contexto da investigação, os possíveis
impactos sobre os modos de vida local e a necessidade de envolvimento e incorporação do
saber popular nos Planos de Manejo como condição essencial para que este tipo de
planejamento transforme-se em um real instrumento de gestão do espaço e dos recursos
naturais. Com esta investigação foi possível articular e elaborar um plano de ação que serviu
de bússola para a concretização de pequenos passos (caminhos) rumo à sustentabilidade da
Marambaia. Como resultado do processo de Educação Ambiental possibilitamos, ainda, a
instrumentalização da comunidade para o enfrentamento das lutas pelas transformações das
atuais condições sociais e econômicas que sabemos, fogem ao controle da comunidade, pois
é papel do Estado ou da sociedade como um todo e que não é cumprido para as camadas
populares. Por último, consideramos que esta pesquisa, a partir da prática de Educação
Ambiental com os pequenos produtores rurais da APA Itacaré – Serra Grande, pode dar
XIII
contribuições significativas à tão almejada gestão ambiental participativa, constituindo-se,
então, em um ponto de partida para a continuidade do trabalho que teve conquistas parciais,
mas, fundamentais para a conscientização da comunidade e para a construção da cidadania. É
um ponto de partida, também, para a elaboração e execução de um possível Plano Integrado
de Desenvolvimento Sustentável da Marambaia, envolvendo a articulação e aglutinação de
diversos setores e instâncias que podem e devem promover os interesses da sociedade, ou
seja, os governos em todas as suas esferas, as ONG´s, as associações, os sindicatos, as
federações e confederações dos trabalhadores rurais, os movimentos ecológicos, as
universidades, as entidades profissionais. Para a comunidade, avançar na construção do
projeto de melhoria do seu ambiente de vida implica unir forças coletivas dentro de si e
somar outras forças fora dela, para que seja garantida a concretização da sustentabilidade
socio ambiental do Assentamento Marambaia.
XIV
ABSTRACT
SALOMÃO, Júlia Maria Santana, Universidade Estadual de Santa Cruz, may of 2001.
Revealing the Marambaia: a participative experience on environmental education with
small rural producers inside the Environmental Protection Area of Itacaré Cost - Serra
Grande. Adviser: Denise César Homem d´El-Rey
The aim of the present study was to understand how small rural producers of a land
reform settlement, located in APA (Environmental Protection Area) Itacaré Cost - Serra
Grande has its relationship with the environment and how they percieve the influences of a
Unit of Conservation in its life environment and which solutions they found to improve the
quality of life, in order to compatibilisize the environmental conservation and their survival.
Waiting for better results in the research in the land reform settlement - Marambaia, we
opted for a work ruled by the practice contextualized of Participating Enviromental
Education, adopting the methodological strategy of the research-action, because it allows the
action and solution of collective problems and in which the researchers and the representative
participants of the situation are involved in a cooperative and participative way. The
contextualized analysis of the natural environment and of the constructed environment of the
Marambaia Settlement, as well as its insertion in the APA zonning is of fundamental
importance, because it allows to visualize the context of the investigation, the possible
impacts on the local life manners and the necessity of involvement and incorporation of the
popular knowledge in the Plans of Handling as essential condition so that this type of
planning becomes a real instrument of administration of the space and the natural resources.
With this investigation it was possible to articulate and to elaborate an action plan that served
as compass for the materialization of small steps heading for the Marambaias’s
sustainability. As a result of the Environmental Education process we facilitated the
community's instrumentalization for the confrontalization of the fights for transformations of
the current socials and economicals conditions, that we know, scape from the community's
control, because it is a state role or society role as a whole and that is not executed for the
popular layers. Last, we consider that this research starting from the Environmental
Education practice with APA Itacaré - Serra Grande with small rural producers can give
significant contributions to the longed Participative Environmental Administration, being
XV
XVI
constituted, then, in a starting point for the continuity of the work that had partial conquests,
but fundamental for the comunity’s consciousness and for the construction of the citizenship.
It is a starting point, also, for the elaboration and execution of a possible Integrated Plan of
Sustainability Development of Marambaia, that goes through the articulation and
agglutination of several sections and instances that can and they should promote the society’s
interests, that is to say, the governments in tis whole spheres, ONG´s, associations, unions,
federations and the rural workers' confederations, the ecological movements, universities,
professional entities. For the community to move forward in construction the project of
improvement of its life environment, it should join collective forces inside of itself and add
out with other forces outside, so it can be guaranteed the materialization of Marambaia's
Settlement.