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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA MIRELLA PATRICIA CHAVES LIMA GRAMÁTICA EM SALA DE AULA: COMO FICA O ENSINO DE LÍNGUA INGLESA? Salvador 2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE LETRAS … · a ser alvo de inúmeras críticas ao longo dos anos sessenta. Cestaro (2007, p. 7) aponta a incapacidade de conduzir o aluno

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE LETRAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA E CULTURA

MIRELLA PATRICIA CHAVES LIMA

GRAMÁTICA EM SALA DE AULA:

COMO FICA O ENSINO DE LÍNGUA INGLESA?

Salvador

2015

MIRELLA PATRICIA CHAVES LIMA

GRAMÁTICA EM SALA DE AULA:

COMO FICA O ENSINO DE LÍNGUA INGLESA?

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do

Programa de Pós-Graduação em Língua e Cultura, do

Instituto de Letras, da Universidade Federal da Bahia,

como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre

em Letras.

Orientadora: Profa. Dra. Denise Chaves de Menezes

Scheyerl.

Salvador

2015

Lima, Mirella Patrícia Chaves. Gramática em sala de aula: como fica o ensino de língua inglesa / Mirella Patrícia Chaves Lima. – Salvador, 2015.

vii, 135 f.

Inclui anexos e apêndices. Orientadora: Profª. Drª. Denise Chaves de Menezes Scheyerl. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal da Bahia (UFBA),

Programa de Pós-Graduação em Língua e Cultura, 2015.

1. Linguística Aplicada. 2. Ensino – Aprendizagem de Língua Estrangeira. 3. Instrução Gramatical. 4. Brasil. I. Título.

CDD – 420.07

MIRELLA PATRICIA CHAVES LIMA

GRAMÁTICA EM SALA DE AULA:

COMO FICA O ENSINO DE LÍNGUA INGLESA?

Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Letras,

Instituto de Letras, da Universidade Federal da Bahia.

Aprovada em 25 de setembro de 2015.

________________________________

Profª Drª Denise Chaves de Menezes Scheyerl

Universidade Federal da Bahia - UFBA

Orientadora

________________________________

Profª Drª. Jael Glauce da Fonseca

Universidade Federal da Bahia

Membro Interno

________________________________

Prof. Drª. Fernanda Mota Pereira

Universidade Federal da Bahia – UFBA

Membro Externo

Dedico este trabalho ao meu amado e saudoso

pai, por ter sido sempre um incentivador de

meus estudos e por ter me ensinado as mais

nobres lições da vida.

AGRADECIMENTOS

A Deus, por todas as bênçãos concedidas;

A minha querida orientadora, Denise Scheyerl, por ter sido tão paciente, compreensiva,

sensível e incentivadora da presente pesquisa;

A minha amada mãe, pelo apoio, pelo constante incentivo e pelas orações;

Ao meu companheiro, Edson Lima, pela paciência, pelo incentivo e por nunca me deixar

desistir;

A minha querida irmã, pelas palavras de ânimo e encorajamento nos momentos difíceis;

Ao meu bem mais precioso, meu amado filho Guilherme, por ser minha fonte de inspiração,

de coragem e força.

LIMA, Mirella Patrícia Chaves. Gramática em sala de aula: como fica o ensino de língua

inglesa? NÚMERO DE f. 135, 2015. Dissertação (Mestrado). Instituto de Letras,

Universidade Federal da Bahia, UFBA, 2015.

RESUMO

Como introduzir a gramática em sala de aula tem sido um ponto crucial nas discussões sobre

ensino de línguas estrangeiras. Tradicionalmente, a instrução gramatical limitava-se às longas

explicações sobre as estruturas linguísticas e à aplicação de exaustivos exercícios de fixação.

Com o advento das pesquisas no campo da Linguística Aplicada, novas orientações foram

surgindo a respeito do ensino de gramática. Nessa perspectiva, o estudo da gramática não

mais se restringe a conhecer a estrutura da língua e a organizar frases desprovidas de sentido.

Faz-se necessário que as formas linguísticas estejam atreladas ao sentido que expressam, bem

como às funções comunicativas. Em observância a essa mudança de paradigma, este estudo

tem o objetivo de investigar a abordagem de duas professoras de língua inglesa em relação ao

ensino de gramática, bem como verificar se o seu contexto de atuação influencia na maneira

como o professor aborda a gramática em suas aulas. Para este estudo, realizamos uma

pesquisa qualitativa de cunho etnográfico, tendo como instrumentos de coleta de dados: a) um

questionário, com o objetivo de coletar informações sobre o contexto de atuação das

professoras; b) uma entrevista com roteiro estruturado, a fim de investigar como as

professoras compreendem o ensino de gramática e conhecer a proposta metodológica por elas

adotada e c) a observação presencial de aulas, com o intuito de verificar como as professoras

lidam, na prática, com a instrução gramatical. As participantes do estudo são duas professoras

atuantes em diferentes contextos de sala de aula, a saber, uma escola pública e um curso de

idiomas. Os resultados obtidos apontaram que determinadas premissas concernentes ao

discurso das professoras divergem significativamente de sua prática de ensino, como também

indicaram a necessidade de se explorar mais consistentemente o significado e as funções

comunicativas nas aulas de língua inglesa. Os dados revelaram também que determinados

fatores, tais como número de aprendizes na turma, infraestrutura, tempo disponível para aulas

e autonomia das professoras, interferem nos procedimentos adotados pelas professoras para

conduzir o ensino da gramática nestes contextos específicos.

Palavras-chave: Linguística Aplicada, Ensino - Aprendizagem de Língua Estrangeira,

Instrução gramatical.

LIMA, Mirella Patrícia Chaves. Gramática em sala de aula: como fica o ensino de língua

inglesa? NÚMERO DE f. 135, 2015. Dissertação (Mestrado). Instituto de Letras,

Universidade Federal da Bahia, UFBA, 2015.

ABSTRACT

How to introduce grammar in the classroom has been crucial in discussions about foreign

language teaching. Traditionally, grammar instruction was limited to long explanations about

linguistic structures and application of exercises. With the advance of research in the field of

applied linguistics, new orientations have emerged about the teaching of grammar. From this

perspective, the study of grammar is no longer restricted to know the structure of the language

and organize meaningless sentences. It is necessary that linguistic forms are linked to the

meaning they express and their communicative functions. Observing this change of paradigm,

this study aims to investigate the perspective of two English language teachers in relation to

grammar teaching, and verify if the action context influences the way the teachers deal with

grammar in their classes. For this study, we conducted a qualitative ethnographic research,

using the following data collection instruments: a) a questionnaire, in order to gather

information about the teachers’ context of performance; b) an interview with a structured

script, in order to investigate how informants understand the teaching of grammar and know

the methodological approach adopted by them and c) Classroom observation, in order to

verify how the teachers deal in practice with grammatical instruction. The study’s participants

are two teachers acting in different classroom contexts, namely, a public school and a

language institute. The results showed that certain assumptions concerning the discourse of

the teachers diverge significantly from their teaching practice. They indicated the need to

explore more consistently the meaning and communicative functions in English classes. The

data also revealed that certain factors such as number of learners in the classroom,

infrastructure, available time for classes and teachers’ autonomy, interfere in the procedures

adopted by the teachers to conduct the teaching of grammar in these specific contexts.

Key-words: Applied Linguistics, Teaching and learning of foreign languages, Grammar

instruction.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 09

2. O PERCURSO DA PESQUISA 14

2.1 A etnografia em sala de aula 14

2.2 Cenário da pesquisa e perfil dos participantes 15

2.3 Instrumentos de coleta 17

3. REFLETINDO SOBRE A TEORIA 20

3.1 Concepções de língua e suas implicações 20

3.2 Um passeio pelas teorias de aquisição 25

3.3 Para que gramática, afinal? 28

3.4 Com licença, sou a gramática, posso entrar? 34

4. O QUE NOS DIZ A PESQUISA? 54

4.1 Análise dos questionários 54

4.2 Análise das entrevistas 59

4.3 Análise das aulas 86

CONSIDERAÇÕES FINAIS 111

REFERÊNCIAS 125

APÊNDICES 130

ANEXOS 134

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1. INTRODUÇÃO

Aprender uma língua estrangeira pressupõe desenvolver habilidades que nos

permitem comunicar na língua-alvo. Dentre tais habilidades, “a habilidade de

reconhecer e produzir sentenças bem formadas é parte essencial no aprendizado de uma

segunda língua1” (THORNBURY, 1999, p. 3). Nesse sentido, aprender a língua

envolve, entre outras coisas, aprender as regras que determinam a estrutura da língua.

No entanto, quando se pensa em uma língua não se pode descartar o seu caráter

dinâmico e interativo e sua primordial finalidade: a comunicação. A gramática, sendo

elemento crucial no aprendizado de uma língua estrangeira, não deve ser entendida de

maneira diferente, ou seja, não deve estar dissociada de um contexto que favoreça o

desenvolvimento da capacidade de comunicação. Porém, durante um longo período, a

instrução gramatical esteve, de fato, vinculada tão somente ao estudo das estruturas que

regem o funcionamento da língua, sem qualquer associação com contextos de uso

efetivo da língua.

Segundo Sheen (2002), a instrução gramatical pode ocorrer de duas maneiras,

com o “foco na forma” ou “foco nas formas”. O foco na forma pressupõe direcionar a

atenção dos alunos para os elementos linguísticos conforme eles surgem casualmente

nas aulas, sendo que o foco das aulas está no significado e na comunicação. O foco nas

formas, por sua vez, se refere ao ensino tradicional de itens gramaticais. Doughty e

Williams (1998) ressaltam que a principal premissa da instrução com foco na forma é a

de que o significado e o uso da língua já devem estar evidentes para o aprendiz quando

sua atenção for direcionada para o aspecto linguístico.

Com o advento das pesquisas no campo da Linguística Aplicada, novas

orientações foram surgindo a respeito do ensino de Língua Estrangeira (doravante LE)

e, consequentemente, de gramática. A própria concepção de gramática adquiriu sentido

mais abrangente, conforme a seguinte definição:

Os aprendizes precisam aprender não apenas que formas são possíveis, mas

que formas irão expressar sentidos específicos. Visto por essa perspectiva, a

gramática é uma ferramenta para a formação de sentido. A implicação disso

para os professores de língua é que a atenção dos alunos precisa estar

centralizada não apenas nas formas da língua, mas nos sentidos que essas

formas concentram2 (THORNBURY,1999, p. 4).

1 Todas as traduções ao longo do trabalho são de responsabilidade da autora. O trecho traduzido se refere

à: The ability both to recognize and to produce well-formed sentences is an essential part of learning a

second language. 2 Learners need to learn not only what forms are possible, but what particular forms will express their

particular meanings. Seen from this perspective, grammar is a tool for making meaning. The implication

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Compreendida dessa maneira, o ensino de gramática não se restringe mais em

conhecer a estrutura da língua e organizar frases isoladas desprovidas de sentido. É

necessário que as formas linguísticas estejam atreladas aos sentidos que expressam.

Almeida Filho (2003, p. 4) aponta a passagem do audiolinguismo para o

comunicativismo como fator determinante para mudanças na concepção de gramática e

de ensino de LE. O método audiolingual fundamentava-se nos princípios do

behaviorismo, o que implica em uma visão restrita de língua. “A língua era vista como

um conjunto de hábitos condicionados que se adquiria através de um processo mecânico

de estímulo e resposta” (CESTARO, 2007, p. 6). Nessa perspectiva, as aulas de inglês

priorizavam o ensino dos padrões estruturais da gramática. Por ser um método de ensino

que desconsiderava o contexto real e efetivo de uso da língua, o audiolinguismo passou

a ser alvo de inúmeras críticas ao longo dos anos sessenta. Cestaro (2007, p. 7) aponta a

incapacidade de conduzir o aluno a estágios mais avançados, devido à dificuldade de

avançar do automatismo à expressão espontânea, como a maior ressalva ao método

audiolingual. Harmer (2007, p. 80), por sua vez, ressalta que ao tentar banir os erros das

aulas de línguas, o audiolinguismo contradiz a opinião de vários teóricos que acreditam

que os erros são elementos essenciais no processo de aquisição.

O comunicativismo, portanto, surgiu como uma proposta de ensino interativo

capaz de preencher algumas lacunas deixadas pelo audiolinguismo. A prioridade do

ensino passou a ser a de capacitar os aprendizes para a comunicação efetiva na língua

alvo e a atenção passou a ser direcionada prioritariamente para as funções

comunicativas. Nesse sentido, Widdowson (1978, p. 2) afirma que “[...] nós não

aprendemos somente como compor e compreender sentenças como unidades

linguísticas isoladas de incidência aleatória, mas também como usar tais sentenças

apropriadamente para alcançar objetivos comunicativos3”. De fato, aprender uma língua

não significa exclusivamente entender, falar, ler e escrever frases precisas, uma vez que

o sucesso na comunicação nem sempre depende da precisão linguística.

Apesar de o comunicativismo ser uma proposta de ensino aceita por diversos

linguistas e professores de línguas, Thompson (1996, p.9) ressalta que ainda existem

diversas interpretações errôneas sobre o que a abordagem comunicativa preconiza.

Dentre as quais, destacarei uma: comunicativismo significa não ensinar gramática.

for language teachers is that the learner’s attention needs to be focused not only on the forms of the

language, but on the meanings these forms convey. 3 [...] we do not only learn how to compose and comprehend correct sentences as isolated linguistic units

of random occurance, we also learn how to use sentences appropriately to achieve a communicative

purpose.

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Segundo Thompson (1996, p.11), é consensual a necessidade de que um determinado

tempo das aulas seja dedicado à gramática, o que não significa, porém, simplesmente

retornar ao tratamento tradicional das regras gramaticais. Sendo assim, uma proposta de

ensino nos moldes do comunicativismo não banirá o estudo da gramática, mas o

proporcionará sob uma nova perspectiva, conforme descrito por Thompson (1996,

p.11):

[...] os aprendizes são, a princípio, expostos ao novo elemento linguístico em

um contexto compreensível, para que eles possam entender sua função e

significado. Somente depois a atenção deles é direcionada para examinar as

formas gramaticais usadas para transmitir aquele significado4.

Nos moldes do comunicativismo, as atividades propostas devem estar

vinculadas a contextos reais do cotidiano para que sejam de fato significativas e

relevantes. Acredita-se que o uso de atividades comunicativas em sala de aula não só

motiva os aprendizes como também favorece um ambiente de aprendizado mais natural

e cria mais oportunidades de assimilação subconsciente.

Almeida Filho e Barbirato (2000) discutem a noção equivocada que, às vezes, é

vigente entre professores de LE sobre as atividades comunicativas:

Muitos professores já estavam familiarizados com atividades comunicativas,

mas a ideia de fazer uso delas sistematicamente e de desenvolver um

planejamento e materiais distintos com tais atividades não estava e nem está

amplamente estabelecida como prática profissional em nosso meio. O uso de

atividades comunicativas ainda é visto como a introdução de exercícios

extras nas aulas de LE, geralmente com o propósito de oferecer uma prática a

mais de algum ponto gramatical ou para servir como variedade motivadora.

Esta é uma visão equivocada e que nem de longe exaure o grande potencial

das atividades comunicativas como deflagradoras de aquisição de uma nova

língua (ALMEIDA FILHO, BARBIRATO, 2000, p. 4).

Em virtude dessa visão equivocada do comunicativismo e do uso de atividades

comunicativas nas aulas de LE, é comum que professores continuem fundamentando

suas práticas em modelos tradicionais de ensino que pouco favorecem a interação entre

os alunos e pouco oportunizam momentos efetivos de comunicação e atribuam a

qualquer atividade lúdica ou inovadora o título de atividade comunicativa.

Sendo professora de língua inglesa há treze anos, atuando na rede pública e,

acreditando na possibilidade de um ensino de línguas de qualidade nas escolas

brasileiras, sinto-me motivada a encarar o desafio da pesquisa e a contribuir, de alguma

maneira, para uma mudança no cenário do ensino de línguas da atualidade. Embora

4 [...] learners are first exposed to new language in a comprehensible context, so that they are able to

understand its function and meaning. Only then is their attention turned to examining the grammatical

forms that have been used to convey that meaning.

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discorde de propostas de ensino que enfoquem exclusivamente nos padrões estruturais

da língua, considero a instrução gramatical crucial para o aprendizado de uma língua.

Acredito que a questão a ser discutida não é mais ensinar ou não ensinar gramática, mas

de que maneira a gramática deve ser ensinada para que contribua efetivamente para o

desenvolvimento da competência comunicativa do aprendiz.

Para tanto, é importante discutir a concepção de gramática que subjaz a prática

dos professores de línguas e as implicações disso para a rotina das aulas de língua

inglesa. Faz-se necessário conhecer a maneira como os professores lidam com o ensino

da gramática nas aulas de língua estrangeira, bem como questionar se a prática docente

contribui para o aprendizado reflexivo, participativo e interativo. Sendo assim,

proponho para este estudo a investigação do seguinte problema:

Qual é a concepção de duas professoras de língua inglesa atuantes em diferentes

contextos, a saber, escola pública e curso de idiomas, frente ao ensino de gramática?

Considerando a necessidade de se repensar o papel da gramática no aprendizado

de LE e tendo em mente a função do professor como promotor de um ensino

significativo e relevante para os aprendizes, os objetivos desse trabalho de pesquisa são:

Objetivo geral:

Discutir e repensar o ensino da gramática na contemporaneidade em contextos

formais de aprendizagem.

Objetivos específicos:

1. Mapear as estratégias utilizadas pelas professoras que as auxiliam no ensino da

gramática;

2. Confrontar o discurso e as ações pedagógicas dos sujeitos investigados;

3. Investigar se as aulas de língua inglesa propiciam o estudo da gramática em

consonância com as noções de significado e comunicação;

4. Confrontar o contexto de ação dos sujeitos investigados com a sua abordagem

de ensinar gramática.

Para a viabilização deste estudo foram delineadas as seguintes perguntas de

pesquisa:

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1. Como as professoras abordam o ensino de gramática nos contextos investigados

e que aspectos desses contextos interferem nas suas práticas?

2. Que estratégias são utilizadas pelas professoras, a fim de conduzirem o ensino

da gramática?

3. Que premissas concernentes ao ensino de gramática presentes no discurso das

professoras convergem e/ou divergem com suas ações pedagógicas?

4. Como as professoras direcionam a atenção dos alunos para o sentido e para as

funções comunicativas da língua quando lidam com aspectos gramaticais?

5. Como o contexto de atuação (escola pública ou curso de idiomas) interfere na

maneira como as professoras abordam o ensino da gramática em suas aulas?

Para desenvolver este estudo, a presente dissertação está organizada da seguinte

maneira: a) Introdução, contendo a delimitação do tema e a justificativa, o problema, os

objetivos e as perguntas de pesquisa; b) Capítulo I, no qual é apresentado o arcabouço

metodológico da pesquisa; c) Capítulo II, que apresentará os subsídios teóricos que

fundamentam o estudo; d) Capítulo III, que consiste da análise e discussão dos dados e,

por fim, seguem-se as Considerações Finais, as Referências Bibliográficas, os

Apêndices e os Anexos.

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2. O PERCURSO DA PESQUISA

Neste capítulo apresento os procedimentos metodológicos adotados para a

realização da pesquisa, detalhando os instrumentos utilizados para a geração de dados, o

cenário da pesquisa e o perfil dos participantes.

2.1 A etnografia em sala de aula

Uma vez que pretendo identificar a perspectiva de duas professoras de língua

inglesa frente ao ensino de gramática, observando que estratégias elas utilizam a fim de

conduzir o seu ensino e que aspectos do seu contexto de atuação interferem nas

estratégias utilizadas, opto por uma abordagem qualitativa de base etnográfica.

Conforme Cançado (1994), um dos campos em que a aplicação da etnografia

vem crescendo é a educação, devido à insatisfação com os resultados obtidos por meio

de estudos experimentais que “simulam” situações de sala de aula, deixando de lado a

verdadeira interação de sala de aula. Desse modo, tendo em vista a complexidade, o

dinamismo, as ações e as interações que compõem o universo da sala de aula, considero

que a pesquisa etnográfica fornece os subsídios adequados para que possamos observar,

apreender e interpretar fenômenos educacionais.

André (1995) aponta cinco aspectos que caracterizam a etnografia em educação:

a) O uso de técnicas que são tradicionalmente associadas à etnografia, tais como a

observação participante, a entrevista e a análise de documentos;

b) O foco no pesquisador como instrumento principal na coleta e análise de dados;

c) A ênfase no processo, naquilo que está ocorrendo e não no produto ou resultados

finais;

d) O trabalho de campo, em que o pesquisador aproxima-se das pessoas e das

situações mantendo com elas contato direto por período que pode variar muito,

indo desde algumas semanas até vários meses ou anos;

e) A descrição e a indução. O pesquisador faz uso de uma grande quantidade de

dados descritivos: situações, pessoas, ambientes depoimentos e diálogos. Por

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fim, a pesquisa etnográfica busca a formulação de conceitos, abstrações teorias e

não sua testagem.

A metodologia adotada nesta pesquisa possui as características acima

apresentadas de maneira que é possível situá-la no âmbito da abordagem etnográfica.

Cançado (1994, p. 57) ressalta que “este tipo de pesquisa depende crucialmente

de um relacionamento de confiança entre o pesquisador, o professor e os alunos”. Desse

modo, a imagem do pesquisador/observador como um espião é incompatível com o

pesquisador etnográfico. Sendo assim, preocupei-me, primordialmente, em estabelecer

essa relação de confiança com os participantes para que a realização do estudo não

gerasse constrangimentos ou causasse incômodos à rotina da sala de aula.

Telles (2002) ressalta que a pesquisa educacional deve ser emancipatória e, sob

esse paradigma emancipador, o pesquisador e o professor estabelecem uma relação de

parceria em que o professor é também agente da investigação, conhecedor dos objetivos

e métodos da pesquisa, um ser sabente de sua prática pedagógica com potencial para

refletir suas ações. Desse modo, opõe-se à visão tão comumente proliferada do

professor como sujeito investigado, cujo papel é unicamente o de fornecer os dados e

informações necessárias para a pesquisa. Partindo desse pressuposto, tentei manter um

constante diálogo com os professores participantes sobre os objetivos da pesquisa, sobre

os procedimentos adotados bem como ouvir suas opiniões, questionamentos e

contribuições. Afinal, considero que o desenrolar da pesquisa constitui-se em um

oportuno momento de aproximação e intercâmbio de conhecimento. Ainda de acordo

com Telles (2002, p.98) “o tempo de contato entre pesquisador e professor é

determinante na qualidade dos resultados da investigação e frequentemente a relação

criada entre ambos transcende os limites da escola e o período da pesquisa realizada”.

Neste estudo, as contribuições mútuas e os benefícios advindos da interação entre a

pesquisadora e os professores participantes construíram relações que tendem a

permanecer após a conclusão da pesquisa.

2.2 Cenário da pesquisa e perfil dos participantes

A fim de verificar de que maneira a gramática é abordada em contextos formais

de aprendizagem, optei por dois cenários com características bem diversas, a saber, uma

escola pública e um curso de idiomas.

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A escola pública em questão é uma instituição estadual que oferece o Ensino

Médio e funciona em três turnos na cidade de Porto Seguro. A escolha por essa unidade

de ensino justifica-se pela familiaridade da pesquisadora com a instituição, uma vez que

já havia visitado a escola anteriormente em outras ocasiões para divulgação de eventos

promovidos pela instituição na qual a pesquisadora atua. A professora participante da

pesquisa (denominada de P1) era a única professora de língua inglesa do quadro efetivo

de professores dessa unidade escolar quando a pesquisa foi realizada, fator determinante

para que fosse a colaboradora do estudo. Ademais, a receptividade e a sensibilidade

para com o pesquisador foram fundamentais para a seleção.

O segundo cenário de investigação, o curso de idiomas, é uma instituição que

oferece cursos de inglês e espanhol na cidade de Porto Seguro. A escolha por esse

curso, em especial, foi decorrente de dois fatores preponderantes: a disponibilidade e

demonstração de interesse da professora (denominada de P2) em colaborar com o

estudo e o fato de se tratar de uma instituição tradicional e bem conceituada na cidade

de Porto Seguro atendendo a um vasto público. A professora em questão, ao ser

consultada sobre a possibilidade de participar da pesquisa mostrou-se bastante

entusiasmada e aceitou de imediato. Além disso, foi relevante o fato de que se trata de

uma professora com formação acadêmica na área, haja vista que em cursos de idioma é

comum que os professores sejam falantes do idioma, porém não tenham formação

docente.

Considero, inclusive, que um estudo que contemple essa distinção entre o ensino

promovido pelo professor com formação docente e o professor sem a formação docente

pode trazer contribuições significativas para refletirmos sobre o ensino de línguas. No

entanto, o enfoque da pesquisa direcionou para um perfil de profissional que aliasse o

conhecimento prático ao conhecimento teórico, uma vez que acredito que o professor

com formação específica na área tem mais subsídios e melhores condições para

explicitar suas concepções, descrever suas ações pedagógicas, a fim de se observar de

que maneira tais concepções se evidenciam na prática.

Além da formação acadêmica e a predisposição demonstrada pelas professoras,

outro fator determinante para a escolha das participantes foi a vasta experiência de

ensino que ambas possuem. A seguir, apresento um breve perfil de cada professora

participante:

P1 é licenciada em Letras com habilitação em Inglês e Português pela

Universidade de Salvador. P1 residiu nos Estados Unidos durante dez anos, onde

aprendeu a língua inglesa. Atualmente, P1 leciona inglês em uma escola pública da rede

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estadual, instituição participante desta pesquisa, e em um curso de idiomas também

situado na cidade de Porto seguro.

P2 é licenciada em Letras com habilitação em Inglês e Português pela

Universidade Federal de Goiás, tendo estudado língua inglesa desde os quatorze anos de

idade em um curso privado de idiomas. P2 residiu na Inglaterra durante quatro anos.

Atualmente, P2 atua como professora de língua inglesa em uma escola pública federal

como professora substituta e no curso de idiomas cenário desta pesquisa. Ademais, ela

ministra aulas particulares.

A seguir, descreverei os instrumentos de coleta utilizados para realização da

pesquisa.

2.3 Instrumentos de coleta

Considerando a natureza da pesquisa e a necessidade de adentrar a sala de aula, a

fim de perceber como o ensino da gramática se concretiza na prática pedagógica, parti

de algumas pressuposições e orientações metodológicas:

a) Apesar de inicialmente o comportamento dos professores e alunos ser alterado

com a entrada do pesquisador no cenário da pesquisa, os participantes voltarão a

agir como de costume quando for estabelecido um clima de confiança entre o

pesquisador e participantes (NUNAN, 1995).

b) Os professores colaboradores serão honestos quando requisitadas informações

por meio de entrevistas, questionários ou outros instrumentos (RICHARDS;

LOCKART apud RODRIGUES, 2005).

c) Embora não se possa assegurar a completa neutralidade do pesquisador, pode-se

garantir certa isenção. O pesquisador etnográfico, portanto, deve ter uma postura

de não julgamento em relação ao seu foco de pesquisa (CANÇADO, 1994).

d) É importante delimitar o período em que o pesquisador estará presente na escola,

o que interfere diretamente na qualidade da aprendizagem e do contato entre o

pesquisador e a escola (TELLES, 2002).

e) O pesquisador deve estar familiarizado com o contexto em que realizará a

pesquisa bem como deve negociar com os participantes o tempo que lhes será

requisitado e o grau de envolvimento que terá com eles (TELLES, 2002).

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f) Cada instrumento de coleta adotado pretende documentar informações

específicas sobre a prática pedagógica cotidiana (TELLES, 2002).

Os dados obtidos por meio de uma etnografia em sala de aula podem ser obtidos

de um número pequeno de informantes. Ainda assim, no final da coleta pode-se obter

uma extensa quantidade de registros, o que gera a necessidade de cortes e vieses

direcionados pelo foco da pesquisa (ANDRÉ, 1995).

Observando os aspectos acima mencionados foram utilizados os seguintes

instrumentos de coleta:

1) Questionário: O questionário teve a finalidade de coletar informações acerca da

formação acadêmica dos professores, de suas experiências profissionais, de suas

rotinas de trabalho, bem como a respeito dos recursos físicos e humanos

disponíveis na instituição de ensino. O questionário continha questões objetivas

e abertas perfazendo um total de vinte e sete questões (vide apêndice).

2) Entrevista semiestruturada: A entrevista teve a finalidade de levantar dados a

respeito da perspectiva dos professores em relação ao ensino de gramática. Por

meio da entrevista, objetivei também que as professoras explicitassem que

estratégias e procedimentos elas adotam na prática a fim de conduzir o ensino da

gramática. A entrevista, inicialmente, consistiu de nove questões que foram

complementadas com outras perguntas surgidas no decorrer da entrevista. As

entrevistas foram gravadas em áudio e transcritas para análise posterior.

3) Anotações de observação: A observação das aulas teve o objetivo de verificar de

que maneira a gramática é tratada nas aulas e que tipos de procedimentos,

estratégias e exercícios são utilizados a fim de propiciar o aprendizado das

estruturas gramaticais, verificando ainda se há uma preocupação com o

significado e a função comunicativa aliados à forma. Através das observações,

busquei também identificar as convergências e divergências entre o discurso das

professoras e suas práticas pedagógicas.

Ao todo, foram observadas seis aulas de cada professora. Durante as

observações foram produzidas notas de campo nas quais a pesquisadora registrava todos

os aspectos relevantes para a pesquisa. As aulas foram também gravadas em áudio.

Dentre as aulas observadas, foi selecionada uma aula da professora do curso de idiomas

e duas aulas da professora da escola pública para análise. Foram selecionadas as aulas

com maior saliência de aspectos gramaticais. É válido ressaltar a diferença existente na

19

duração da aula em cada contexto. No curso de idiomas, cada aula tem duração de uma

hora e quinze minutos. Na escola pública, cada aula tem duração de cinquenta minutos.

Desse modo, para fins de análise, foi considerado o período de uma hora e quinze

minutos no curso de idiomas e de uma hora e quarenta minutos na escola pública. Optei

por analisar os dados coletados nesta carga horária por termos verificado, em ambos os

contextos, certa regularidade na condução das aulas, ou seja, durante o período integral

de observação não verifiquei diversificação relevante nos procedimentos adotados.

Durante as observações, a pesquisadora manteve-se posicionado discretamente

na sala de aula e, em nenhum momento, interferiu nas interações ocorrentes entre os

professores e seus alunos. No primeiro dia de observação, ambas as professoras

preocuparam-se em explicar brevemente aos alunos a presença da pesquisadora. Os

alunos não fizeram questionamentos a esse respeito e comportaram-se naturalmente não

se importando com a presença da pesquisadora.

No capítulo a seguir, apresentarei e discutirei o arcabouço teórico que

fundamentou o desenvolvimento da pesquisa.

20

3 REFLETINDO SOBRE A TEORIA

3.1 Concepções de língua e suas implicações

O aprendizado de uma língua estrangeira pode e deve ser uma experiência rica e

prazerosa. Aprender uma segunda língua significa embarcar em uma grande aventura

em que descobrimos, a cada dia, novos elementos e novas formas de nos expressarmos

e interagirmos com o mundo. Quando pensamos na língua inglesa, mais

especificamente, pode-se dizer que somos constantemente convidados a viver essa

aventura. Diante de um mundo globalizado, somos expostos diariamente a inúmeras

situações em que a língua inglesa se faz presente. O inglês tornou-se a língua dos

negócios, da diplomacia, da internet etc. Atualmente, dificilmente ficamos alheios à

influência desse idioma em nossas vidas. Ventura (apud PAIVA, 1996, p.36) define

bem as dimensões que o uso da língua inglesa já alcançou em todo o mundo:

É uma epidemia que contamina 750 milhões de pessoas no planeta. Essa

língua sem fronteiras está na metade dos 10.000 jornais do mundo, em mais

de 80% dos trabalhos científicos e no jargão de inúmeras profissões, como a

informática, a economia e a publicidade.

Desse modo, o aprendizado da língua inglesa não só proporciona o contato com

novos povos e culturas, como também possibilita o engajamento com o mundo

acadêmico, científico e tecnológico, assumindo o papel de língua global, como destaca

Schutz (2006, p. 3):

Ao assumir o papel de língua global, o inglês torna-se uma das mais

importantes ferramentas, tanto acadêmicas quanto profissionais. É hoje

inquestionavelmente reconhecida como a língua mais importante a ser

adquirida na atual comunidade internacional. Esse fato parece incontestável e

parece ser irreversível. O inglês acabou tornando-se o meio de comunicação

por excelência tanto do mundo científico como do mundo de negócios.

Nessa perspectiva, ressalto aqui o quanto é valioso e gratificante o aprendizado

dessa língua que insiste em fazer parte de nossas vidas. Porém, ao se pensar no ensino

de línguas estrangeiras, não raro, nos deparamos com um cenário desanimador. Há uma

tendência em conceber a língua como mero sistema de formas dissociadas de sentido e

21

sem qualquer vínculo com contextos de uso efetivo. Os PCN para o Ensino Médio

afirmam que as Línguas Estrangeiras na escola “passaram a pautar-se, quase sempre,

apenas no estudo de formas gramaticais, na memorização de regras e na prioridade da

língua escrita”. Essa visão estruturalista confere sérias implicações para os processos e

resultados de aprendizagem de uma língua estrangeira. A concepção de língua como

estrutura nos remete aos postulados de Saussure que, em seu célebre Curso de

Linguística Geral, dedica um capítulo à delimitação do objeto da linguística. Entre todas

as formas de manifestações da linguagem, Saussure (1996, p. 17) elege a língua como o

objeto integral e concreto da linguística e a define da seguinte maneira:

Mas o que é língua para nós, ela não se confunde com a linguagem; é

somente uma parte determinada, essencial dela indubitavelmente. É, ao

mesmo tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto

de convenções necessárias pelo corpo social para o exercício dessa faculdade

nos indivíduos.

Saussure (1996) delimita, portanto, o conceito de língua dentro da própria

linguagem e atribui à língua o primeiro lugar no estudo da linguagem, fazendo dela o

objeto da linguística. Saussure (1996) ainda estabelece a dicotomia langue (língua)

versus parole (fala). De acordo com essa dicotomia, pode-se compreender a língua

como sistema linguístico que constitui o lado social da linguagem ao passo que a fala se

refere ao ato individual, caracterizada como elemento acessório da linguagem.

Em suma, o autor caracteriza a língua como a “parte social da linguagem,

exterior ao indivíduo, que, por si só, não pode nem criá-la, nem modificá-la; ela não

existe senão em virtude duma espécie de contrato estabelecido entre os membros da

comunidade” (Saussure, 1996, p.22). Tendo em vista essa concepção, o caráter

interacional da língua é excluído. Sob sua perspectiva, a língua é um sistema abstrato e

fechado que conhece somente sua própria ordem, sendo impossível para os seus

usuários modificá-la. Sendo assim, a língua é uma convenção de normas e regras bem

estabelecidas e fatores linguísticos externos não devem, portanto, ser preocupação da

linguística. Desse modo, Saussure não estabelece relações entre a língua e seus usuários.

Essa concepção de língua postulada por Saussure é criticada por diversos

teóricos. Dentre as contraposições feitas às proposições saussurianas, é indispensável

mencionar as contribuições do pensador Mikhail Bakhtin. A crítica de Bakhtin (2006, p.

108) à noção de língua como sistema estável, imutável fica explícita a seguir:

A língua, como sistema de formas que remetem a uma norma, não passa de

uma abstração, que só pode ser demonstrada no plano teórico e prático do

ponto de vista do deciframento de uma língua morta e do seu ensino. Esse

22

sistema não pode servir de base para a compreensão e explicação dos fatos

linguísticos enquanto fatos vivos e em evolução. Ao contrário, ele nos

distancia da realidade evolutiva e viva da língua e de suas funções sociais.

Para Bakthin (2006), é somente quando a criatividade se encerra, quando a

língua deixa de evoluir que é possível pensar em sistematizações. Essa noção de língua,

portanto, só se admite quando lidamos com línguas mortas. Línguas vivas estão em

constante processo evolutivo e se transformam conforme seu uso. Em oposição a essa

noção de sistema, Bakhtin concebe a língua como uma atividade social de natureza

essencialmente dialógica. A língua é determinada por uma ideologia, assim como todo

signo linguístico é ideológico:

A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido

ideológico ou vivencial. É assim que compreendemos as palavras e somente

reagimos àquelas que despertam em nós ressonâncias ideológicas ou

concernentes à vida (BAKHTIN, 2006, p.95).

Segundo Bakhtin, “a língua, no seu uso prático, é inseparável de seu conteúdo

ideológico e relativo à vida” (BAKHTIN, 2006, p.96). Diante do exposto, considero

relevantes e pertinentes as críticas de Bakhtin em relação ao conceito estruturalista de

língua. Afinal, como se pode pensar a língua desconsiderando o seu valor ideológico?

Dissociar a língua de seu aspecto interacional é, de fato, ignorar sua dinamicidade,

historicidade e caráter evolutivo. A língua perpetua todas as relações sociais e não deve,

portanto, ser compreendida como um objeto abstraído de realidade histórica e social.

Imbuída dessas reflexões, reitero a constatação bakhtiniana que descarta qualquer

possibilidade de tratar uma língua viva como um sistema de normas imutáveis. Apenas

línguas mortas podem ser analisadas sob essa perspectiva.

Através do uso, as línguas são recriadas e transformadas na interação entre seus

falantes. As línguas são, em sua essência, interativas. Por conta disso, acredito que o

ensino das línguas não pode seguir por diferente caminho.

Em face dessas discussões, fica claro que a concepção de língua adotada implica

diretamente na maneira como a língua será ensinada. Se acreditamos que a língua é um

sistema de normas, compreendemos que o ensino da língua deve consistir em transmitir

as regras que fundamentam a língua. Se acreditamos que a língua, além de abranger os

aspectos formais e normativos, envolve os aspectos contextuais de uso efetivo, a

cultura, a ideologia, faz-se necessário que o ensino englobe muitos outros elementos

para além da estrutura linguística em si. É válido questionar que caminho tem sido

delineado para o ensino de línguas estrangeiras na atualidade.

23

Almeida Filho (2005) aborda a problemática do ensino de línguas nas escolas

brasileiras que parece preocupar-se quase que exclusivamente com a aprendizagem

consciente das formas da língua combinada com exercícios de automatização de

modelos. Segundo esse autor, “o grande pressuposto é de que o domínio da forma

(gramatical e do léxico) levará por extensão e transferência ao uso normal da língua-

alvo” (ALMEIDA FILHO, 2005, p.22). Partindo dessa perspectiva de ensino de línguas,

têm-se como resultado aprendizes incapazes de produzir e se comunicar efetivamente na

língua-alvo. Contudo, essa não é a única consequência advinda do ensino

descontextualizado e sem propósitos de comunicação e interação. Ao nível ideológico,

os resultados são ainda mais preocupantes:

As implicações de uma abordagem de ensino de LE que priorize as formas ao

nível de sistema de língua-alvo não se exaurem na crítica de pressupostos e

materiais de ensino. Ao nível ideológico, também as experiências de

linguagem que essa prática específica enseja a quem quer aprender uma

língua estrangeira representam um alto custo. Em termos de conteúdos

socialmente relevantes ou mesmo transformadores, ela se caracteriza como

plenamente estéril. O atendimento à forma tem causado uma simplificação da

linguagem que por sua vez reduz a verossimilhança com as negociações,

conflitos e desencontros próprios da vida. Não há nas amostras de linguagem

o que objetar, questionar ou indagar mais a respeito. Embora o propósito não

seja esse, o seu efeito tem sido, na melhor das hipóteses, uma experiência

educacional superficial, e na pior, um processo subliminar de alienação

auxiliado pela língua estrangeira (ALMEIDA FILHO, 2005, p.20).

As palavras de Almeida Filho (2005) suscitam uma série de questões que

merecem destaque e profunda reflexão entre os profissionais atuantes no ensino de

línguas estrangeiras. A princípio, observa-se uma inversão no papel que a língua deve

desempenhar nas salas de aula de línguas. Sendo a língua reflexo de uma ou de

múltiplas culturas, ela deve propiciar a aproximação com o mundo que nos cerca, com

as questões político-sociais presentes em nossas vidas. Conforme os PCN (1998), a

Língua Estrangeira no ensino “envolve um complexo processo de reflexão sobre a

realidade social, política e econômica, com valor intrínseco importante no processo de

capacitação que leva à libertação. Em outras palavras, Língua Estrangeira no ensino

fundamental é parte da construção da cidadania.” No entanto, a língua, ao ser

compreendida como mero sistema linguístico, proporciona distanciamento e alienação.

O ensino, sob essa perspectiva, exclui qualquer possibilidade de formação de cidadãos

críticos e reflexivos, uma vez que privamos nossos aprendizes de discutir temas

relevantes por meio da língua estrangeira.

Outra questão de similar importância diz respeito à formação e à atuação do

professor de línguas estrangeiras. Pressupõe-se que o professor seja um agente

24

transformador, capaz de motivar seus aprendizes a indagar, refletir e se posicionar

criticamente diante do mundo. As práticas pedagógicas fazem sentido quando

favorecem o aprendizado por meio da interação, do intercâmbio de ideias e

experiências. O aprendiz, portanto, não pode ser compreendido como mero reprodutor

de informações e conceitos, mas um indivíduo que constrói o conhecimento e se

constrói a partir do diálogo com o que há de convergente e/ou divergente com os demais

com os quais dialoga. No entanto, nos deparamos cotidianamente com propostas

educacionais que não ultrapassam os limites do ensino promotor do domínio cognitivo.

Diante desse cenário, a função do professor fica extremamente restrita à transmissão de

conteúdos que pouco ou nada contribuem para a formação crítica de seus aprendizes.

Nesse sentido, Almeida Filho (2005) utiliza o termo “sonâmbulos políticos” para

descrever a massa de professores que continuam adotando práticas de ensino

desprendidas de consciência política e social.

Em face do exposto, observa-se um cenário de ensino de línguas com as

seguintes características: a língua compreendida como sistema de regras, professores

com formação precária, práticas pedagógicas desprovidas de senso crítico e consciência

política, aulas fundamentadas no gramaticalismo e aprendizes incapazes de usar a língua

efetivamente e por meio da língua refletir sobre a realidade que os cerca. Diante dessa

realidade, SIQUEIRA e ANJOS (2012, p. 137) ressaltam que:

Nesse cenário carente de práticas significativas, inevitavelmente, o atraso e a

frustração se sobrepõem à criatividade e à vontade de fazer diferente. Para

que isso aconteça, o ensino e a aprendizagem de LE precisam ter sentido para

os alunos e, com certeza, o professor tem papel crucial na consolidação desse

processo. Com pequenas mudanças de postura, por exemplo, os resultados já

serão outros na sala de aula.

De fato, tornar o ensino significativo para os aprendizes parece ser a chave para

que encontremos um novo rumo para o ensino de línguas estrangeiras. É preciso que os

aprendizes saibam com que finalidade aprendem a língua e percebam que, como afirma

RAJAGOPALAN (2003, p.70), “o verdadeiro propósito do ensino de línguas

estrangeiras é formar indivíduos capazes de interagir com pessoas de outras culturas e

modos de pensar e agir”. A língua oportuniza o contato, o intercâmbio, a aproximação

com o outro. Desse modo, me parece imprescindível que as propostas de ensino de LE

ultrapassem os limites do domínio cognitivo e favoreçam o reconhecimento, a

compreensão e o respeito às diferenças étnicas e culturais. Isso só é possível quando se

adota uma visão abrangente de língua e de ensino de línguas, para além de um

arcabouço estrutural e gramaticalizante.

25

Identificar os problemas, entretanto, não é suficiente para que mudanças

significativas aconteçam. As pesquisas em Linguística Aplicada sugerem novas

orientações de ensino, no entanto, ainda existe uma considerável lacuna entre a pesquisa

e o ensino. É questionável, inclusive, de que maneira essas pesquisas alcançam, e se

alcançam, a massa dos professores de línguas. A Linguística Aplicada vem sendo

campo promissor de estudos, mas ainda tem desafios que precisam ser enfrentados.

Almeida Filho (2005) ressalta a necessidade de pesquisas capazes de trazer indicações

seguras de como verificar ou fortalecer hipóteses no sentido de que se constituam

princípios mais estáveis da aprendizagem de línguas. É preciso investigar em que

medida as práticas de ensino utilizadas nas escolas divergem dos pressupostos de

aquisição. Compreender como a língua é adquirida pode auxiliar no processo de ensino

e evitar que tempo seja despendido em técnicas que não promovem seu uso efetivo em

contextos reais. No entanto, as teorias de aquisição, as quais discutirei a seguir, parecem

não explicar o fenômeno da aquisição satisfatoriamente, haja vista a dificuldade de se

obter conclusões definitivas quando tratamos de um processo tão dinâmico e complexo.

3.2 Um passeio pelas diferentes teorias de aquisição

As discussões em torno do ensino de línguas se fundamentam, de certo modo,

nos pressupostos de aquisição. No entanto, apesar das diversas teorias existentes, me

parece que nenhuma delas explica o fenômeno da aquisição em sua completude. De

qualquer maneira, é imprescindível revisitar as teorias mais difundidas e discutir as

implicações desses fundamentos para o ensino de línguas e para a maneira como a

gramática é abordada nas aulas de Língua Estrangeira. Desse modo, destacarei o

behaviorismo, a teoria da gramática universal, a hipótese do input, bem como a teoria

sociocultural.

A teoria behaviorista parte da premissa de que o conhecimento linguístico

provém do ambiente e das experiências vivenciadas em um processo contínuo de

estímulos e respostas. A aprendizagem da língua se restringe à formação de hábitos

automáticos, o que induz o ensino às práticas de repetição mecânica e memorização.

Através da repetição, o aprendiz é estimulado a reproduzir a mesma resposta inúmeras

vezes a fim de que se constitua o hábito. O behaviorismo foi a teoria que fundamentou

o método audiolingual, que se caracteriza pelo ensino indutivo da gramática por meio de

exaustivos exercícios de repetição. Segundo Franco (2013, p. 216):

26

A aprendizagem de língua materna (L1) era vista como um processo

relativamente simples, em que o falante aprendia um conjunto de hábitos

novos em resposta ao estímulo do ambiente. Ao aprender uma L2, por já se

ter um conjunto de hábitos definidos na L1, o processo de aprendizagem

implica a substituição de hábitos antigos por novos.

Esse modelo exclui a criatividade do processo de aprendizado e reduz tal

processo ao automatismo e à formação de hábitos condicionados.

A teoria da gramática universal de Chomsky, por outro lado, enfatiza a

capacidade inata dos humanos para a aquisição da linguagem, considerando que o

ambiente e os insumos por ele fornecidos são insuficientes para o desenvolvimento da

linguagem. Para Chomsky (1959) a competência linguística de um falante não deve ser

limitada a um modelo baseado em imitação e formação de hábitos. Chomsky ressalta a

capacidade humana de utilizar um número finito de elementos para elaborar um número

infinito de enunciados, ou seja, a capacidade humana de entender e produzir uma

variedade infinita de sentenças mesmo que nunca tenham sido expostos a tais sentenças

anteriormente. Nesse sentido, Chomsky aponta para a criatividade como elemento

inerente ao desenvolvimento da linguagem humana. A gramática universal, por sua vez,

funcionaria como um guia na aprendizagem de línguas. Tendo como foco o

processamento mental e a asserção de que a linguagem é uma faculdade inata, esta

teoria é um contraponto a qualquer perspectiva ambientalista ou sócio interacionista

para o aprendizado de línguas.

Já a hipótese do input formulada por Krashen5 (1985) e mais tarde denominada

hipótese da compreensão preconiza que o elemento chave para a aquisição é a

exposição ao insumo natural, por meio do qual o aprendiz assimila de maneira

subconsciente a linguagem. Desse modo, o autor considera necessária interação

significativa na língua alvo para que a aquisição seja possível. Os falantes devem estar

preocupados, a princípio, com as mensagens que transmitem e com seu entendimento e

não com a forma de seus enunciados. Para Krashen, a preocupação com a forma faz-se

desnecessária. Nesse sentido, apenas o insumo positivo, ou seja, a exposição a

produções autênticas da língua seria o fundamento para a aquisição de uma língua. Os

pressupostos dessa teoria, de certa maneira, provocaram a exclusão do estudo da forma

conforme ressalta Marchetti (2009, p. 41):

5 Tal hipótese afirma que os humanos adquirem a linguagem através da exposição e compreensão do

insumo. Sob essa perspectiva, se o insumo é compreensível e o sujeito é exposto a um volume suficiente

de insumo, a gramática necessária é automaticamente fornecida e o professor não precisa deliberadamente

tentar ensinar a gramática.

27

Esse modelo que só reconhece a exposição natural levou, mais tarde, a

interpretações equivocadas da abordagem comunicativa, o que resultou em

uma fuga completa da forma e em um grande volume de materiais de

“conversação”, jogos, dramatizações, etc.

De fato, por certo período, o abandono ao estudo da forma parece ter sido

tendência àqueles que buscavam adotar uma abordagem comunicativa para o ensino de

línguas estrangeiras. No entanto, uma visão mais ampla do comunicativismo abre

espaço para o estudo da forma, embora esta não seja o foco e esteja sempre atrelada à

veiculação de sentido em situações reais de uso da língua. As implicações da exclusão

ou inclusão do estudo da forma e da instrução gramatical nas aulas de Língua

Estrangeira serão mais profundamente discutidas posteriormente.

A teoria sociocultural, por sua vez, está alicerçada no pressuposto de que a

aquisição emerge da interação. Segundo Paiva (2009, p. 4):

A teoria sociocultural (TSC), baseada no pensamento de Vigostsky,

reivindica que a aprendizagem de uma língua é um processo socialmente

mediado. A mediação é um princípio fundamental, e a língua é um artefato

cultural que media as atividades psicológicas e culturais.

Ainda segundo a autora:

É no mundo social que os aprendizes de língua observam os outros usando a

língua e os imitam. É também com a colaboração de atores sociais que o

aprendiz de língua passa de um estágio a outro (p.5).

Sob a ótica da teoria sociocultural, é na interação que o processo de

aprendizagem acontece. Para o ensino, portanto, é preciso que se instaure um ambiente

de trocas de experiências, informações e vivências a fim de que ocorra a negociação de

sentidos e a possibilidade de uso efetivo da língua. De maneira prática, observa-se um

cenário em que o professor é um mediador e que tem a função de proporcionar

atividades em pares e pequenos grupos nas quais a colaboração mútua seja o elemento

propulsor da aprendizagem.

Tendo em vista as diferentes e divergentes acepções das teorias de aquisição, Paiva

(2009, p. 6) sugere que a aquisição de uma segunda língua seja compreendida como um

conjunto de conexões em um sistema dinâmico e complexo que une tais teorias. De

acordo com a autora:

Um modelo complexo, [...], pode acomodar elementos incompatíveis; pois,

ao mesmo tempo em que admite, por exemplo, a existência de uma

capacidade inata que faz com que o aprendiz de uma língua aprenda mais do

que ele encontra no input que recebe, o modelo admite também a importância

da repetição e da criação de hábitos automáticos.

28

Desse modo, Paiva propõe um modelo de aquisição nos quais estão envolvidos

elementos que embora, a princípio, pareçam controversos, na verdade se complementam

quando analisados mais cuidadosamente. Nessa perspectiva, são considerados

componentes desse sistema complexo: os automatismos, a interação, a afiliação; que

corresponderia ao grau de relacionamento com a cultura da segunda língua, as

mediações sociais, o input, a capacidade inata, as conexões e o output. Para Paiva

(2009, p. 7):

[...], a ASL deve ser entendida como um sistema não linear e dinâmico,

composto de inter-relações entre elementos biológicos, psicológicos, sociais e

tudo o que o social implica, tais como aspectos históricos, econômicos,

culturais e políticos. São essas interconexões que nos fazem pensar e agir

através da linguagem, linguagem essa também entendida como um sistema

em constante movimento de auto-organização, com seus elementos

interagindo entre si e se auto influenciando.

Como se pode perceber com as considerações de Paiva, os aspectos biológicos,

psicológicos e sociais não são antagônicos e sim complementares. O processo de

aquisição envolve uma rede de conexões neurais, psicológicas e de mediações sociais

constantes e intermináveis. Daí a complexidade de entendimento do processo de

aquisição. Proposições que tendem a admitir a coexistência desses fatores parecem mais

proveitosas do que posturas que consideram apenas um dos aspectos e excluem os

demais. Sob essa ótica, propõe-se um ensino de línguas em que sejam oferecidas

oportunidades de aprendizagem “por meio de atividades que exponham os aprendizes a

input autêntico, às repetições, à interação, à negociação de sentido e às diversas práticas

sociais da linguagem onde as identidades possam ser exercidas” (PAIVA, 2009, p.12).

Com essa postura, adota-se uma prática que não exclui elementos essenciais, mas que os

agrega de forma colaborativa. É nesse sentido que defendo a relevância da instrução

gramatical nas aulas de língua estrangeira. Para tanto, precisa-se pensar a gramática em

uma dimensão ampla e dinâmica, dimensão esta que discutirei a seguir.

3.3 Para que gramática, afinal?

Embora em determinados momentos da história do ensino de línguas

estrangeiras o papel da gramática tenha sido excluído e tenha havido um esforço no

sentido de manter o foco exclusivamente na comunicação, é inegável a contribuição da

29

gramática para o aprendizado de uma língua, até mesmo porque, quando nos

comunicamos, a gramática, inevitavelmente, se manifesta.

Entretanto, é preciso pensar a gramática em uma dimensão que ultrapasse a mera

sistematização de regras por meio das quais sentenças são organizadas. Nesse sentido,

Thornbury (2001) preconiza que a gramática deve ser compreendida mais como um

processo do que como um produto, ou seja, a gramática não é algo pronto e sim algo

que acontece. Para o autor, uma premissa comum e equivocada subjacente a práticas de

ensino de línguas estrangeiras é a de que se o produto é ensinado, o processo será uma

consequência natural, ou seja, o professor fragmenta a língua em pequenas partes e o

aprendiz será capaz de reorganizá-las em comunicação real. Thornbury (2001, p.2)

ressalta que:

Ignora-se o fato de que produto e processo são coisas bem diferentes – existe

gramar (produto) e existe grammaring (processo), sendo que a última não

pode ser tão facilmente inferida a partir da primeira. Em resumo, a descrição

da língua em uso não é o mesmo que a língua sendo usada6.

Desse modo, o ensino de gramática que pretende ser efetivo não pode se

restringir à análise da língua. Faz-se necessário que os aspectos estruturais sejam

trabalhados em consonância com o significado e a função comunicativa, uma vez que a

combinação de palavras para a formação de sentenças é apenas parte do que a

gramática, de fato, representa.

Essas considerações reforçam nosso pensamento de que não é preciso abolir o

estudo da forma nas aulas de língua e sim atrelá-lo às noções de significado e função em

uma dinâmica que atente para os diversos aspectos que constituem a língua. Não se

pode pensar em gramática, portanto, sem pensar nos sentidos que podem ser veiculados

e nos propósitos comunicativos vigentes. Afinal, a comunicação é o objetivo primordial

de um aprendiz de língua estrangeira.

Nesse sentido, Winddowson (1978) sugere a distinção entre usage e use, sendo

que o primeiro se refere “às palavras e sentenças como manifestações do sistema

linguístico e o segundo se refere à maneira como esse sistema é utilizado para

propósitos comunicativos”. Em outras palavras, diria que usage engloba o

conhecimento dos padrões de organização do sistema linguístico ao passo que use se

refere ao emprego desses padrões em situações reais de comunicação. Desse modo, o

primeiro corrobora o desenvolvimento da competência meramente linguística enquanto

6 It ignores the fact that the product and the process are two quite different things – that there is

grammar and there is grammaring, and the latter is not easily inferable from the former. In short, a

description of used language is not the same as language being used.

30

o segundo corrobora o desenvolvimento da competência comunicativa. Winddowson

(1978) ressalta que o mero conhecimento linguístico é de pouca utilidade quando não é

complementado pelo conhecimento de uso apropriado. É comum, por exemplo, que um

aprendiz domine certas regras e padrões linguísticos, porém não consiga empregá-los na

comunicação. Este cenário, inclusive, é frequente entre professores de língua inglesa,

principalmente de escolas públicas. Com formação precária, tais professores

desenvolveram apenas a competência linguística e são capazes de explicar,

exemplificar, formular atividades de fixação e também avaliar o desenvolvimento da

competência linguística de seus aprendizes. Por outro lado, são incapazes de usar a

língua efetivamente e, consequentemente, são incapazes de proporcionar aos seus

alunos um contexto de aprendizagem que favoreça o desenvolvimento da competência

comunicativa. Estamos, portanto, diante de uma das maiores contradições do ensino de

línguas estrangeiras. Afinal, um professor que não possui habilidades comunicativas, de

modo algum, irá dispor de ferramentas e procedimentos que possam conduzir seus

aprendizes para o desenvolvimento de tais habilidades. Obviamente, não se descarta a

relevância da competência linguística ou das atividades utilizadas para desenvolvê-la.

Porém, ressalta-se que, isoladamente, ela não contempla os propósitos de aprendizagem

de uma língua. Conforme Widdowson (1978, p. 67):

[...] tradicionalmente o foco da atenção tem recaído sobre as habilidades

linguísticas e comumente presume-se que uma vez que essas habilidades são

adquiridas em uma medida razoável, as habilidades comunicativas surgirão

como uma consequência mais ou menos automática. As evidências que

temos, entretanto, sugerem que este não é o caso: a aquisição de habilidades

linguísticas não parece garantir a consequente aquisição de habilidades

comunicativas. Ao contrário, nos parece que o excesso de ênfase em drills e

exercícios para a produção e recepção de sentenças tende a inibir o

desenvolvimento das habilidades comunicativas. Isso não significa que tais

drills e exercícios não são necessários. Afinal, como dito previamente, as

habilidades comunicativas incluem as habilidades linguísticas: não se pode

adquirir habilidades comunicativas sem ter adquirido habilidades

linguísticas7.

De fato, os moldes tradicionais de ensino enfatizam o desenvolvimento de

habilidades estritamente linguísticas. Porém, converter esse conhecimento de usage em

use não é tarefa tão simples. Conhecer os mecanismos de funcionamento da língua não

7 [...] traditionally the focus of attention has been on the linguistic skills and that it has commonly been

supposed that once these are acquired in reasonable measure the communicative abilities will follow as a

more or less automatic consequence. What evidence we have, however, suggests that this is not the case:

the acquisition of linguistic skills does not seem to guarantee the consequent acquisition of

communicative abilities in a language. On the contrary, it would seem to be the case that an over-

emphasis on drills and exercises for the production and reception of sentences tends to inhibit the

development of communicative abilities. This is not meant to imply that such drills and exercises are not

necessary. As was pointed out earlier, the abilities include the skills: one cannot acquire the former

without acquiring the latter.

31

é suficiente para que o aprendiz seja capaz de utilizar a língua em contextos reais de

comunicação. O aprendiz pode ser capaz de formular sentenças adequadamente, porém

ser incapaz de empregá-las com uma finalidade comunicativa atentando, inclusive, para

as convenções de uso da língua.

Os moldes de ensino que prezam exclusivamente o ensino de gramática

descontextualizada e de maneira explícita seguem uma concepção de ensino com foco

nas formas (LONG, 1991). Em contrapartida, o foco na forma sugere atentar para a

forma através de atividades cujo foco primordial é o sentido (LÍVIA apud

MARCHETTI, 2009). O foco nas formas, portanto, é uma perspectiva excludente de

ensino. Os propósitos comunicativos e as noções de função e sentido são omitidos. O

foco na forma, por outro lado, admite o estudo do sistema, mas não o enfatiza. A

atenção deve estar, sobremaneira, voltada para o sentido que a forma em si carrega.

Entretanto, alguns estudiosos, tais como Long e Robinson (apud DUTRA;

MELLO, 2004) classificam programas nocionais- funcionais (base dos cursos que

seguem a abordagem comunicativa) como sintéticos ou com o foco nas formas. Os

autores enfatizam que, na verdade, os materiais utilizados e os procedimentos adotados

são preparados com a finalidade de apresentar e praticar itens ou formas linguísticas, ou

seja, o foco primordial não é o sentido em si, mas a própria estrutura linguística. Dutra e

Mello (2004), por sua vez, concordam em parte com tal posicionamento. Eles admitem

que quando pensamos somente nos itens ou formas linguísticas escolhidas para o

ensino, de fato, parece que o foco recai novamente nas formas. Porém, quando

somamos a essa perspectiva a noção de língua como comunicação e a ideia de gramática

como regras de uso da língua alinhadas com a veiculação de sentidos, distanciamo-nos

de uma proposta de ensino alicerçada no foco nas formas.

A partir do exposto, considero que embora alguns programas nocionais-

funcionais utilizados na abordagem comunicativa delineiem itens gramaticais para

estudo, não necessariamente o objetivo seja meramente a apresentação e prática das

estruturas em si. Parece-me mais coerente considerar que tais estruturas funcionam

como ferramenta, como meio para se chegar a um propósito maior: a veiculação de

sentidos e de funções comunicativas. Pensar nesses programas como simplesmente foco

nas formas significa reduzi-los significativamente.

Quando falamos sobre abordagem comunicativa, é válido ressaltarmos a

existência de duas versões distintas. A versão forte prevê que a aprendizagem ocorra

incidental e implicitamente por meio do input que o aprendiz recebe (DUTRA;

MELLO, 2004). Esse pressuposto advém primordialmente da teoria do input

32

compreensível de Krashen (1985) que preconiza que a aquisição acontece por meio da

exposição natural ao insumo positivo e não através da instrução formal. Obviamente,

concordo com os benefícios de expor o aprendiz a um insumo positivo e possibilitar que

um processo intuitivo e subconsciente de construção do sistema linguístico se

desencadeie. No entanto, conforme Marcheti (2009):

No contexto brasileiro, o contato com a língua-alvo no aprendizado de uma

LE restringe-se, quase sempre, a algumas horas semanais e à sala de aula.

Fica inviável aguardar que o conhecimento da forma se dê de modo natural,

já que a quantidade de insumo a que o aluno é exposto é restrita (p.59).

Mediante a escassez de tempo e de oportunidades de exposição natural à língua-

alvo, é desejável que, em certa medida, os aprendizes sejam conduzidos através de

procedimentos e atividades que enfatizem tanto a forma quanto sua função

comunicativa. Nesse sentido, a versão fraca da abordagem comunicativa admite que a

forma seja estudada por meio de estruturas contextualizadas, sendo que tais estruturas

são direcionadas a um determinado propósito comunicativo.

Diante do exposto, faz-se necessário o entendimento de que práticas de ensino

orientadas exclusivamente pelo foco nas formas são, certamente, ineficazes e

improdutivas. Por outro lado, diversos argumentos me fazem crer que propostas de

ensino orientadas pelo foco na forma tem grande potencial de eficácia e produtividade,

uma vez que o foco na forma, de acordo com Mello (2004, p.58):

[...] não elimina o foco no significado da sala de aula. Ao contrário, o foco na

forma adiciona a esse o componente gramatical dentro de contextos

específicos, o que, no meu entender, é uma vantagem sobre abordagens

exclusivistas e polarizadoras. Isso emana de uma visão mais ampla do que

seja a linguagem, isto é, a sintaxe, a semântica, a pragmática e a fonologia de

dada língua acontecem simultaneamente no processo interacional-

comunicativo. Não há módulos isolados a serem ensinados na sala de L2; o

que naturalmente leva à conclusão de que forma e significado são faces de

um caleidoscópio linguístico e não podem ser ensinados isoladamente.

Nassaji e Fotos (2004) também corroboram a visão de que o foco na forma seja

potencialmente vantajoso, apontando quatro razões pelas quais devemos pressupor a

necessidade e relevância da instrução gramatical nas aulas de línguas. Inicialmente, os

autores questionam a viabilidade de se aprender uma língua sem certo grau de

consciência e atenção à forma presumindo que os mecanismos de noticing são

essenciais para o aprendizado de L2. Em seguida, ressaltam a “hipótese da

ensinabilidade” proposta por Pienemamn (1988), que sugere que algumas estruturas

podem ser adquiridas sem a necessidade de instrução gramatical ao passo que outras

33

podem ser favorecidas pelo ensino da forma. A terceira razão apontada pelos autores diz

respeito ao nível de acuidade linguística de aprendizes que foram submetidos a

programas cujo foco recaía exclusivamente na comunicação. Estudos apontam que

mesmo sendo expostos a um insumo significativo por longos períodos, os aprendizes

não alcançam um nível de acuidade desejável quando nenhuma atenção é direcionada à

forma. Por fim, Nassaji e Fotos (2004) enfatizam as evidências dos efeitos positivos da

instrução gramatical nas aulas de línguas estrangeiras através de estudos realizados em

laboratórios e em salas de aulas ao longo dos últimos vinte anos.

Em resumo, os argumentos apresentados por Nassaji e Fotos mais uma vez me

fazem pensar em uma perspectiva de ensino que alia a forma ao significado e à

comunicação. Sob essa ótica, Gil (2004) sugere que o foco na forma e o foco na

comunicação, na verdade, devem funcionar como dois focos complementares e não

antagônicos. Essa perspectiva “parece ser mais adequada para criar uma ponte entre a

teoria e prática pedagógica real, do que a oposição entre os dois focos, comum em

muitos estudos sobre a interação na sala de aula de língua estrangeira” (GIL, 2004,

p.41).

Thornbury (1999) esclarece de que maneira se constroem as relações “gramática

versus significado” e “gramática versus função”. Segundo o autor, pode-se dizer que a

“gramática é parcialmente o estudo de que formas são possíveis”, ou seja, o estudo da

gramática consiste, parcialmente, em observar de que maneira as formas linguísticas são

organizadas e padronizadas para que se construam sentenças possíveis. Mas por que se

diz que esta concepção expressa apenas parcialmente o que a gramática representa? Por

que algumas sentenças, ainda que possíveis e estruturalmente bem formadas não fazem

sentido e não veiculam mensagens coerentes com a intenção do falante, como exemplo

“This is 2680239. We are at home right now. Please leave a message after the beep”8.

Segundo Thornbury (1999, p. 3):

A sentença We are at home right now é possível. Isto é, é gramaticalmente

bem formada. Porém, ela não faz sentido neste contexto. A forma empregada

não transmite o exato significado que o falante necessita externar. Desse

modo, precisamos considerar outra característica da gramática, que é o seu

potencial de construção de significados9.

8 Este é o 2680239. Nós estamos em casa agora. Por favor, deixe uma mensagem depois do sinal.

9 The sentence we are at home right now is possible. That is, it is grammatically well-formed. But it

doesn’t make sense in this context. The former the speaker has chosen doesn’t convey the exact meaning

the speaker requires. We now need to consider another feature of Grammar, and that is, its meaning-

making potential.

34

Diante do exposto, percebe-se que forma e sentido são elementos indissociáveis.

De nada adianta formularem-se sentenças de acordo com as regras e padrões

estabelecidos se não formos capazes de vincular significados a tais estruturas e usá-las

apropriadamente de acordo com o contexto em que se inserem. Além do contexto, faz-

se necessário ainda atentar para a intenção do falante, ou seja, para a função da língua.

Segundo Thornbury (1999) quando processamos a linguagem não estamos apenas

tentando dar sentido às palavras e à gramática, nós também estamos tentando inferir a

intenção do falante, isto é, estamos tentando inferir a função do que fora dito ou escrito.

De fato, utilizamos a língua com uma finalidade em mente, com uma intencionalidade e

propósitos definidos. Uma determinada forma, por sua vez, pode adquirir diferentes

significados e servir para diferentes propósitos comunicativos ou funções. Portanto, é

preciso observar o contexto para que possamos identificar adequadamente o sentido

expresso e a função almejada pelo falante.

Em face dessa perspectiva tridimensional de gramática que engloba forma,

significado e função comunicativa, presumo sua amplitude e ressalto a necessidade de

que o ensino de línguas estrangeiras propicie o estudo da gramática considerando,

obviamente, tanto os níveis fonológico, sintático e morfológico quanto os níveis

semântico, pragmático e discursivo. Desta forma, visamos a um ensino contextualizado

e promissor. A seguir, discutirei alternativas para o ensino de gramática nas aulas de

língua inglesa levando em consideração sua amplitude e relevância.

3.4 Com licença, eu sou a gramática, posso entrar?

Para pensarmos na maneira como a gramática pode ser trabalhada nas aulas de

línguas estrangeiras é válido compreender a maneira como o uso da gramática progride

durante o processo de aquisição da língua materna. Quando pensamos na comunicação

de crianças nos estágios iniciais do desenvolvimento da fala, observamos a seguinte

progressão:

A linguagem inicial de crianças apresenta pouca gramática. Inicialmente, elas

se comunicam exclusivamente através dos gestos e do tom de voz, em

seguida começam a produzir suas primeiras palavras por volta dos doze

meses. Essas são palavras individuais que servem para se referir ou descrever

aspectos do seu cotidiano: bola, gato, sujo, papai, sapato. Eles também usam

a língua para dar comandos– Dá! Coloca! Sobe! Pare! – e para comunicar

significados sociais: Oi, Tchau. Essas duas principais funções da linguagem –

às vezes chamadas, respectivamente, de referencial e a interpessoal – formam

35

um tipo de modelo para o uso subsequente da linguagem10

(THORNBURY,

2001, p.15).

Desse modo, observamos que quando as crianças começam a utilizar as palavras

na comunicação, estas são usadas isoladamente e, normalmente, expressam significados

que se referem ao contexto imediato. Isto é, usam vocabulário específico para se referir

a objetos ao seu redor ou para que suas necessidades momentâneas, tais como

alimentação, entretenimento ou descanso, sejam atendidas. Na medida em que a criança

necessita expressar mensagens mais complexas, o uso de palavras isoladas parece não

ser mais eficiente. Desse modo, elas passam a usar duas ou mais palavras a fim de

alcançar seus propósitos comunicativos. Thornbury (2001) ressalta que, nesta fase, as

crianças já são capazes de formar mini sentenças, uma vez que, normalmente, a junção

das palavras não é arbitrária. Quando a criança diz, por exemplo, “Eu quer”, não se

pode afirmar que esta construção seja totalmente agramatical, tendo em vista que a

maneira como as palavras estão dispostas condiz com um padrão linguístico “Sujeito +

Verbo”, ou seja, existe uma regra que fundamenta a formação da sentença, embora a

criança não tenha consciência dela. Conforme os pensamentos a serem expressos

passam a ser mais complexos e as sentenças mais elaboradas, observamos que o grau de

complexidade gramatical dessas sentenças também evolui. Nesse sentido, Thornbury

(2001) afirma que a aquisição da língua materna segue uma progressão do lexical para o

gramatical e que adquirir a primeira língua significa, em grande medida, aprender a usar

sua gramática.

De fato, o que observamos no processo de aquisição da língua materna é uma

evolução da palavra para a sentença. À medida que as crianças começam a formular

sentenças, há também uma evolução gradativa que vai do uso de estruturas gramaticais

simples, como a mera disposição “Sujeito + Verbo”, até o uso de estruturas mais

complexas, tais como o emprego da concordância verbal. De modo semelhante, ocorre o

aprendizado de uma língua estrangeira. É comum que nos estágios iniciais de

aprendizado, a comunicação, de certa maneira, se fundamente meramente no léxico ou

em estruturas gramaticais simples até que o aprendiz adquira competência linguística

necessária para formular sentenças com maior grau de complexidade gramatical. Existe,

10 Early child language is low on grammar. Initially communicating solely through gesture and tone of

voice, children start to produce their first words at around twelve months. These are individual words

that serve to refer to, or describe, features of their everyday world: ball, cat, dirty, Daddy, shoe. They

also use language to get things done – Give!, Put!, Up, Stop! – and to communicate social meanings: Hi,

Bye-bye. These two major language functions – sometimes called, respectively, the referential and the

interpersonal – form a kind of template for all subsequent language use.

36

porém, uma diferença importante entre o processo de aquisição da língua materna e o

aprendizado de uma língua estrangeira: o contexto em que tais processos ocorrem.

Tendo em vista que adquirimos a língua materna em contato constante e somos

expostos diariamente a insumos autênticos de uso da língua, aprendemos a estruturar

nossas construções de acordo com determinados padrões sem termos consciência de tais

padrões. Quando aprendemos uma língua estrangeira, por outro lado, o contato com a

língua alvo é muito mais restrito e, muitas vezes, a exposição ao insumo se limita a

algumas horas semanais em sala de aula, razão pela qual ter consciência de certos

aspectos estruturais pode facilitar o processo de aprendizagem. Desse modo, podemos

inferir que parte do processo de ensino de uma língua estrangeira consiste em prover as

ferramentas para que o aprendiz obtenha consciência de certos padrões linguísticos.

Evidentemente, este não é um posicionamento consensual. Existem diversos

questionamentos acerca da real necessidade de conhecer conscientemente as regras da

língua para que sejamos aptos a usá-la apropriadamente.

Para melhor assimilarmos essa problemática, é imprescindível discutir as noções

de conhecimento implícito e conhecimento explícito. Segundo Ellis (2006, p.95), o

conhecimento explícito é constituído pelos aspectos que os falantes aprenderam sobre a

língua. Esse conhecimento é consciente e, normalmente, é acessado através de um

processo controlado. O conhecimento implícito, por sua vez, é inconsciente, pode ser

acessado facilmente e está disponível para uso na comunicação rápida e fluente. Este

conhecimento é o que permite que o falante utilize determinadas estruturas sem saber

que regras as fundamentam.

Muitos questionam se o conhecimento explícito tem algum valor e se funciona

como facilitador do desenvolvimento de conhecimento implícito, ou seja, se os

aprendizes são capazes de utilizar o conhecimento explícito em situações de

comunicação. Para Krashen (1985), o conhecimento explícito e o conhecimento

implícito são independentes. Desse modo, o conhecimento explícito não se converte em

conhecimento implícito, ou seja, o conhecimento consciente das regras de uso da língua

não é acionado no momento em que o falante produz enunciados em situações

espontâneas de comunicação. Segundo a hipótese do monitor (KRASHEN, 1985), o

conhecimento explícito é acionado somente com o propósito de monitorar a produção

do falante, isto é, fiscalizar e corrigir possíveis erros, o que só acontece quando o

aprendiz está atento à forma e não ao significado. Quando estamos envolvidos em uma

conversação, por exemplo, não estamos conscientes da maneira como as sentenças

devem ser estruturadas e não atentamos para a forma. É o nosso conhecimento implícito

37

que se manifesta em situações de comunicação que exigem fluidez e celeridade. O

conhecimento explícito, por sua vez, só se manifesta quando o aprendiz dispõe de

tempo para pensar na forma e, se necessário, corrigir seu enunciado por meio de um

processo consciente e controlado. Sob essa perspectiva, o conhecimento explícito não

pode ser internalizado e se tornar automático, o que o torna limitado e pouco útil.

Em contrapartida, Ellis (2006, p.86) argumenta que o conhecimento explícito é

usado tanto no processo de formulação da mensagem quanto em seu monitoramento e

que muitos aprendizes são hábeis em acionar seu conhecimento explícito para ambas as

finalidades sem necessitar de tempo para isso, especialmente, se as regras foram

automatizadas. Nesse sentido, o autor afirma que o conhecimento explícito pode ser

convertido em conhecimento implícito, uma vez que o aprendiz esteja pronto para

adquirir a estrutura linguística alvo e que essa conversão ocorra através de determinados

processos, tais como o noticing e o noticing the gap. Segundo o autor:

O conhecimento explícito de uma estrutura gramatical torna mais provável

que os aprendizes atentem para a estrutura do input e realizem a comparação

cognitiva entre o que eles observam no input e o que produzem como output

(ELLIS, 2006, p.97).11

Sob essa perspectiva, o conhecimento explícito assume um papel muito mais

relevante, uma vez que o conhecimento explícito permite que o aprendiz atente para

determinados aspectos linguísticos e tenha a percepção (noticing) da maneira como

estes são empregados, bem como permite que o aprendiz perceba a lacuna existente

entre o que ele produz e o insumo positivo a que está sendo exposto (noticing the gap).

A noção de noticing no aprendizado de línguas foi introduzida pelo pesquisador

Richard Schmidt que veio ao Brasil com a intenção de aprender português. O

pesquisador manteve um diário com anotações sobre sua própria experiência de

aprendizado, que consistia em aulas formais associadas ao seu contato constante com a

língua-alvo em situações reais de uso. De acordo com Thronbury (2001, p.36):

Schmidt concluiu que a instrução em sala de aula foi útil porque auxiliou na

percepção de determinados aspectos da língua presentes no insumo natural a

que estava sendo exposto. Ele também presumiu que não era suficiente ser

apresentado à forma e tê-la treinado através de drills: ele precisava perceber

como a forma era usada naturalmente. Em outras palavras, os dois tipos de

experiência pareciam se complementar. Sem a instrução formal, aspectos

específicos da língua em uso natural teriam passado despercebidos. Mas sem

a interação em situações reais, os resultados da instrução formal poderiam

simplesmente ter ficado armazenados no cérebro sem utilidade. Além disso,

11

Explicit knowledge of a gramatical structure makes it more likely that learners will attend to the

structure in the input and carry out the cognitive comparison between what they observe in the input and

their own output.

38

Schmidt insistiu que ambos os tipos de aprendizado exigiu um grau de

atenção. Em outras palavras, o processo de aprendizado envolve processos de

consciência12

.

Meu posicionamento neste estudo condiz com esta perspectiva abrangente que

presume a relevância do conhecimento explícito e da consciência no processo de

aprendizagem. Evidentemente, como as observações de Schmidt sugerem, faz-se

necessário que a instrução formal esteja aliada ao uso da língua em contextos reais de

comunicação. Nesse sentido, é essencial discutir a importância do uso de procedimentos

de consciousness-raising, ou seja, de procedimentos que tornem os aprendizes

conscientes dos aspectos linguísticos durante o processo de ensino-aprendizagem.

Segundo Thornbury (2001, p.36), tradicionalmente, os aprendizes obtinham essa

consciência mediante a apresentação (presentation) da forma pelo professor. A

apresentação comumente precede as atividades de prática e produção, em um modelo de

ensino denominado PPP (Presentation + Practice + Production). Para o autor, a

fragilidade dessa estratégia consiste exatamente na noção de presentation, uma vez que

não há garantia que o aprendiz será capaz de transferir a estrutura apresentada em sala

de aula para contextos reais de comunicação, mesmo que a prática e a produção também

tenham sido contempladas. Esse modelo de ensino pressupõe uma linearidade no

processo que evolui diretamente do input para o output. Thornbury (2001, p.38) aponta

uma diferenciação entre esse modelo (Presentation + Practice) e uma perspectiva

orientada pela noção de consciousness-raising:

A diferença incide basicamente na redução de expectativas. Numa proposta

de consciousness-raising não há expectativa de produção precisa e imediata –

premissa que subjaz uma metodologia do tipo presentation. O objetivo de

uma proposta de consciousness-raising é fornecer dados que provavelmente

se tornarão intake, e que, quando chegado o momento oportuno, terá o efeito

de dar início à reestruturação da gramática mental do aprendiz. (...) Esta é

uma visão bem diferente da concebida no modelo presentation-practice, que

assume uma ligação direta entre input e output, entre ensino e aprendizado.

As duas concepções podem ser representadas da seguinte forma:

1) PP (Presentation + Practice) = input – output

2) C-R (Consciousness-raising) = input – noticing -intake – output13

(THORNBURY, 2001, p.38).

12

Schmidt concluded that classroom instruction was useful because it helped him notice things in the

natural input he was exposed to. He also suspected that simply being taught and drilled a form was not

enough: he needed to notice it being used naturally. In other words, the two types of experience

(instruction plus and instruction minus) seemed to complement each other quite neatly. Without the

formal instruction, specific features of naturally-occurring language use might have washed right over

him. But without the real-life interaction, the outcomes of formal instruction may have simply sat on a

shelf in the brain and gathered dust. What’s more, Schmidt insisted that both kinds of learning required a

degree of attention. In other words, language involves conscious processes.

13

The difference is basically one of reduced expectations. With consciousness-raising there is not the

expectation of immediate and consistently accurate production – the assumption underlying a

presentation-type methodology. The aim of consciousness-raising is to provide the kind of data that is

39

Em outras palavras, o modelo de ensino PPP parte do pressuposto de que o

aprendiz desconhece a forma e que o professor tem a função de apresentá-la. A

apresentação, portanto, é a primeira etapa do ciclo, é o contato inicial do aprendiz com a

forma que se pretende fixar. Em um segundo momento, os aprendizes são orientados a

praticar a estrutura linguística previamente apresentada, a fim de que, com a prática

controlada, alcancem a precisão linguística desejada. Desse modo, evita-se que o

aprendiz cometa erros durante a produção. A última etapa do ciclo, por sua vez, almeja

a fluência. Uma vez que o aprendiz já foi apresentado à forma, teve a oportunidade de

praticá-la sob a orientação do professor, espera-se que ele esteja apto à produção

utilizando a estrutura estudada sem que os erros persistam. Como se percebe a relação

input – output é quase imediata. O aprendiz é levado a produzir pouco tempo depois de

ter sido exposto à estrutura em estudo. Desse modo, há uma elevada expectativa para

que a produção aconteça apropriadamente no final do ciclo.

Em contrapartida, uma proposta de consciousness-raising não exige que o

aprendiz seja capaz de produzir tão precisamente e imediatamente após ter sido exposto

a determinado insumo. O percurso é mais longo e não estabelece uma relação direta

entre input e output. Presume-se que o ciclo inicia-se com a exposição ao insumo e que

a partir do insumo ele perceba (notice) o uso de determinadas estruturas linguísticas.

Obviamente, são utilizadas estratégias e atividades específicas, a fim de que o aprendiz

atente para a forma em si, embora também seja imprescindível que o foco da atenção

seja o sentido. O intake, por sua vez, consiste na internalização dessa estrutura, o que

não implica, entretanto, em seu uso imediato. O intake permite que o aprendiz

reestruture mentalmente sua gramática e que seja capaz de utilizá-la em momento

oportuno. Nesse sentido, não existe uma expectativa de output logo após o input.

Ellis (1995) propõe uma abordagem de ensino de gramática que consiste em

atividades que direcionam a atenção dos aprendizes para a estrutura alvo no input, bem

como permite a identificação e compreensão de seu significado. Essa abordagem,

portanto, enfatiza o processo de compreensão do input em vez de enfatizar o processo

de produção de output. As atividades delineadas com esse propósito são denominadas

interpretation tasks. Segundo Ellis (1995), esse modelo de ensino de gramática envolve

os seguintes processos: a) Interpretação, processo por meio do qual os aprendizes se

likely to become intake, which, when the time is right, will have the effect of triggering the restructuring

of the learner’s mental grammar. (...) This is a different view of learning than implied by presentation-

practice, which assumes a direct link between input and output, between teaching and learning. The two

views can be represented like this:

1 PP (Presentation + Practice) = input – output

2) C-R (Consciousness-raising) = input – noticing -intake – output (THORNBURY, 2001, p.38).

40

esforçam para compreender o input e, para tanto, prestam atenção a aspectos

linguísticos específicos e seus significados; b) Integração, que ocorre quando os

aprendizes são capazes de internalizar determinadas estruturas e incorporá-las à sua

interlíngua; c) Produção, que pode auxiliar os aprendizes a dominar estruturas

linguísticas que já estão inseridas em sua interlíngua.

Sob essa ótica, a produção assume um papel diferenciado na aquisição de

estruturas linguísticas. A princípio, faz-se necessário que o aprendiz compreenda o uso

de tais estruturas, as internalize para que, então, seja capaz de produzir enunciados

utilizando-as. Assim, a compreensão é o elemento chave para a aquisição, o foco do

ensino recai na interpretação e não existe uma necessidade imediata de produção.

Sugere-se que “os professores possam proveitosamente tentar concentrar a atenção dos

aprendizes na percepção e compreensão de características gramaticais específicas do

input, uma vez que é desta maneira que a aquisição de novos itens é iniciada14

” (ELLIS,

1995, p.91).

Thornbury (2001) ressalta que forçar o aprendiz a produzir uma estrutura

recentemente aprendida pode ser improdutivo, visto que o esforço despendido na

articulação desvia a atenção do aprendiz do simples entendimento de como determinada

estrutura funciona. Para o autor, o processo de reestruturação, ou seja, o processo por

meio do qual o aprendiz reorganiza sua gramática mental a fim de acomodar novas

informações, é um processo complexo e não necessariamente ocorre instantaneamente.

De fato, quando penso em experiências pessoais de aprendizado de línguas,

pressuponho o benefício advindo de atividades que nos direcionem para a compreensão

da forma, sem que sejamos imediatamente submetidos a atividades de produção. A

exigência imediata de produção, inclusive, pode aumentar o nível de ansiedade do

aprendiz, já que há uma expectativa pela verificação de sua capacidade de produção da

estrutura linguística em estudo. Nada garante que o aprendiz será capaz de internalizar a

estrutura e acomodá-la em sua gramática mental instantaneamente. Parece-me que esse

processo de reorganização acontece mais gradativamente e, às vezes, requer mais

tempo. É válido ressaltar que não estou assumindo um posicionamento que visa a banir

atividades de produção. Afinal, a produção é a finalidade do aprendizado e discordo

sumariamente de qualquer perspectiva de ensino alicerçada na passividade e mera

receptividade. Apenas defendo a premissa de que para sermos capazes de produzir

eficazmente determinadas estruturas é válido sabermos de que maneira elas funcionam e

os significados que expressam. Nesse sentido, acredito que o uso de Grammar

14

[...] teachers might profitably try to focus learner’s attention on noticing and understanding specific

grammatical features of input, as it is by this means that the acquisition of new features gets started.

41

Interpretation Tasks pode desempenhar um papel fundamental no ensino de gramática.

Segundo Ellis (1995) as interpretation tasks têm as funções de habilitar os aprendizes, a

fim de que identifiquem os significados transmitidos por determinadas estruturas

gramaticais, promover o input de maneira que o aprendiz seja induzido a observar

aspectos gramaticais que provavelmente seriam ignorados, bem como capacitar os

aprendizes para a comparação entre a lacuna existente entre a maneira como

determinada forma funciona e a maneira como os aprendizes a utilizam quando se

comunicam, o que é possível quando a atenção dos aprendizes é direcionada para os

erros que tipicamente cometem. Os erros, dessa maneira, são importantes elementos

para a construção da consciência linguística do aprendiz.

Observemos um exemplo de Grammar Interpretation task que pretende elucidar

a diferença entre o uso do Simple Past e o Present Perfect proposto por Thornbury

(2001):

O professor fala para a turma que eles vão escutar algumas mensagens de voz

que o professor acabou de receber. Todas as mensagens são de amigos que estão

viajando ou que acabaram de retornar de viagem. A primeira tarefa consiste em

adivinhar a que cidade ou país a mensagem se refere. Disponibilizo-as em inglês, com

sua tradução em nota:

Hi, Joe. How are you? Great holiday! We’ve been to the Louvre and the Eiffel

Tower, but we haven’t been to Versailles yet. We’ll phone you back. Bye.

Joe, it’s Barry. Fantastic holiday! We went everywhere – the Colisseum, St

Peters, Hadrian’s Villa – and we had great Italian food. Speak to you soon. Bye.

Hi, Joe, Cathy here. How was your holiday? I went sightseeing and shopping

and spent a fortune. Didn’t have time to see Big Ben! But I bought you a fab T-

shirt. Bye.

Joe, baby! Donald speaking. Amazing holiday. Taj Mahal, Rajahstan. I’ve

travelled thousands of miles, all by train. Third class. And I’ve met some really

interesting people. I’ve seen a tiger! Money running out, have to go…

Hello, Joe. It’s six o´clock Tuesday evening. Just phoning to tell you about my

trip. I had a great time. I climbed to the top of Ayers’ Rock, can you believe it!

And I went surfing at Bondi Beach. But I never made it to Cairns. I have some

great photos to show you. Well, speak to you soon. Bye.15

15 Oi, Joe. Como você está? Ótimo feriado! Nós estivemos no Louvre e na torre Eiffel, mas ainda

não estivemos em Versailles. Nós te ligaremos de volta. Tchau.

42

Após verificar a primeira tarefa, o professor solicita que os alunos escutem as

mensagens novamente e indiquem que amigos ainda estão viajando e que amigos já

retornaram de suas viagens.

Vamos refletir um pouco sobre os benefícios em utilizar tarefas dessa natureza, a

fim de facilitar a percepção e compreensão da forma em uso. A princípio, observo que a

primeira tarefa tem o foco exclusivamente no significado. Os aprendizes não necessitam

atentar para a forma a fim de reconhecer as cidades ou países a que as mensagens se

referem. Muito mais relevante para a realização dessa tarefa é o conhecimento de

mundo do aprendiz. O reconhecimento de algumas palavras- chave, tais como Louvre,

Big Ben, Colisseum e Taj Mahal associados a uma provável familiaridade do aprendiz

com esses lugares serão suficientes para que o aprendiz complete a tarefa. Vale ressaltar

que o desafio proposto na tarefa também é ponto positivo. Além disso, a tarefa promove

o contato do aprendiz com um gênero textual habitual: as mensagens de voz. Diante da

informalidade do discurso, é possível que os aprendizes verifiquem, inclusive, a

possibilidade e legitimidade de construções que não seguem um rigor gramatical, tais

como Didn’t have time to see Big Ben! e have to go. Desse modo, nos afastamos de uma

concepção de gramática estritamente padronizada que não reconhece a viabilidade de

variações linguísticas.

A segunda tarefa, por sua vez, direciona a atenção dos aprendizes para a forma.

Eles não serão capazes de identificar se os locutores ainda estão viajando ou se

retornarem de viagem sem observar a maneira como os verbos são empregados. O

propósito, portanto, é fazer com que eles percebam que o uso do present perfect implica

em uma relação com o presente ao passo que o uso do simple past não estabelece essa

relação. É imprescindível ressaltar que apesar de direcionar a atenção para a forma, o

foco continua sendo o significado. Segundo Thornbury (2001), “os aprendizes precisam

perceber de que maneira a escolha da forma impacta no significado”. A escolha

Joe, é o Barry. Feriado fantástico! Nós fomos a todos os lugares – o Coliseu, a São Pedro, a vila

Hadrian – e nós comemos uma ótima comida italiana. Falo com você em breve. Tchau.

Oi, Joe, É a Cathy. Como foi o feriado? Eu fui visitar os pontos turísticos e fazer compras e

gastei uma fortuna. Não tive tempo de ver o Big Ben! Mas eu comprei uma camisa fabulosa para

você. Tchau.

Joe, querida! É o Donald. Feriado incrível. Taj Mahal, Rajahstan. Eu viajei milhares de

quilômetros, tudo de trem. Terceira classe. E nós conhecemos algumas pessoas muito

interessantes. Eu vi um tigre. O dinheiro já está acabando, tenho que ir…

Oi, Joe. São seis horas da tarde de terça. Só estou ligando para te contar sobre minha viagem. Eu

tive ótimos momentos. Eu subi ao topo da Ayers’ Rock, você acredita! Eu fui surfar na praia

Bondi. Mas não fiz isso na Cairns. Tenho fotos ótimas para te mostrar. Bem, falo com você em

breve. Tchau.

43

inapropriada do simple past ou do present perfect, por exemplo, pode transmitir uma

mensagem diferente da pretendida pelo falante. É essa relação forma-sentido que

precisa ser enfatizada. Ensinar a forma sem estabelecer essa relação com o sentido me

parece pouco produtivo.

Evidentemente, em algumas situações, o falante é compreendido ainda que

utilize estruturas inapropriadas, como em He don’t live here. Apesar do uso inadequado

do auxiliar don’t é muito provável que o ouvinte capte a mensagem. No entanto, é

essencial que o aprendiz seja exposto a input e a atividades que favoreçam a percepção

de que a maneira como ele usa essa estrutura difere da maneira como ela é comumente

utilizada.

Em suma, posso enumerar as seguintes vantagens nas tarefas acima

exemplificadas:

Retomada do conhecimento de mundo do aprendiz;

Desafio na execução da tarefa;

Familiaridade do aprendiz com gênero textual utilizado;

Reconhecimento de variações linguísticas;

Percepção do impacto da forma no sentido;

Ausência de expectativa de produção imediata.

Sobre o último ponto, gostaria de ponderar que não excluo a possibilidade de

produção após a utilização de uma tarefa de interpretação gramatical. Considerado o

contexto, o desempenho dos aprendizes e principalmente a percepção do professor,

acredito que seja válido inserir, por exemplo, uma terceira tarefa em que o aprendiz teria

que escrever uma mensagem para um amigo tendo em mente sua última viagem. Outra

alternativa seria solicitar que cada aprendiz escrevesse sua própria mensagem, lessem

em voz alta para que os colegas tentassem mais uma vez identificar o local a que se

referem e se a viagem estava em progresso ou se já havia sido finalizada. Cabe ao

professor decidir se é oportuno ou não propor uma atividade de produção imediata. Meu

posicionamento neste estudo condiz muito mais com propostas de flexibilidade e

versatilidade para o ensino da gramática do que com fórmulas estanques e dogmáticas.

A seguir, demonstrarei uma atividade por mim elaborada e aplicada a uma turma

de 1º ano de ensino Médio, a fim de direcionar a atenção dos aprendizes para a

diferença entre o Simple Past e o Present Perfect:

O professor divide a turma em dois grupos e propõe um quiz com questões sobre

conhecimentos gerais, tais como:

44

How long did the dinosaurs live?

How long did Steve Jobs work for Apple?

How long has “real” been the official currency in Brazil?

How has Brasília been the capital city in Brazil?

How long was Rio de Janeiro the capital city in Brazil?

How long did Paul McCartney play with the Beatles?16

Para cada questão, o professor apresenta três alternativas. Os grupos devem,

portanto, escolher dentre as alternativas a que considera correta. Quando os grupos

finalizam a tarefa o professor faz a correção e verifica qual grupo obteve mais acertos.

Com essa primeira tarefa, os aprendizes são expostos a um insumo no qual o

present perfect e o simple past são utilizados para indicar duração do tempo. No

entanto, é possível que nesse primeiro momento os aprendizes ainda não tenham

atentado para a diferença entre as estruturas em uso, já que o foco da primeira tarefa

esteve primordialmente no sentido.

Na tarefa seguinte, os aprendizes recebem duas alternativas de resposta para

cada questão:

Exemplo:

a) Brasília has been the capital city of Brazil for 55 years. ( )

b) Brasília was the capital of Brazil for 55 years. ( )17

Nesta tarefa, os alunos precisam atentar para a forma a fim de verificar a

alternativa adequada. Possivelmente, observarão que a escolha da forma impactará no

sentido.

Em seguida o professor orienta os aprendizes a agruparem as respostas do

exercício anterior no quadro abaixo:

It’s still happening. It doesn’t happen anymore.

16

Por quanto tempo os dinossauros viveram?

Por quanto tempo Steve Jobs trabalhou para a Apple?

Há quanto tempo o real tem sido a moeda oficial do Brasil?

Há quanto tempo Brasília tem sido a capital do Brasil?

Por quanto tempo o Rio de Janeiro foi a capital do Brasil?

Por quanto tempo Paul McCartney tocou com os Beatles? 17

A) Brasília tem sido a capital do Brasil há 55 anos;

B) Brasília foi a capital do Brasil por 55 anos.

45

Brasília has been the capital city in Brazil for… Paul McCartney played with the Beatles for…18

No final da atividade, caso o professor considere relevante e oportuno, é possível

solicitar que os aprendizes elaborem em grupo um quiz da mesma natureza a fim de

desafiar o grupo adversário.

Tendo em vista que o emprego inadequado do tempo verbal implicará em uma

alteração no sentido expresso, é provável que os aprendizes sejam cautelosos na escolha

da forma a ser utilizada. Por ser uma atividade de produção escrita os aprendizes

dispõem, inclusive, de mais tempo para refletir sobre o uso apropriado das estruturas.

Outra vantagem da atividade é a interação entre os aprendizes. No momento em que

elaboram o quiz, eles provavelmente compartilharão conhecimento de mundo,

informações de interesse coletivo, curiosidades etc. Vale lembrar ainda a autenticidade e

a originalidade da produção dos aprendizes, bem como a oportunidade de comunicação

efetiva na língua-alvo. Considero ainda a pertinência do desdobramento dessas

atividades escritas em uma atividade de prática oral. Nada impede que o professor, por

exemplo, solicite que os alunos preencham o quadro abaixo com informações pessoais

sem se identificarem:

It’s still happening It doesn’t happen anymore

I have worn glasses for five years. I lived in Rio de Janeiro for seven years.19

Em seguida, os quadros preenchidos poderiam ser redistribuídos aleatoriamente

entre os alunos. Os aprendizes teriam que formular perguntas e direcioná-las aos

colegas que eles pressupõem ter preenchido o quadro.

Exemplo:

Juliana, did you live in Rio de Janeiro for seven years20

?

Com essa atividade, os alunos estariam engajados em um procedimento que

apesar de exigir atenção à forma, também oferece a oportunidade de conhecer um pouco

18

Ainda está acontecendo. Não acontece mais.

Brasília tem sido a capital do Brasil há… Paul McCartney tocou com os Beatles por…

19

Ainda está acontecendo. Não acontece mais.

Eu tenho usado óculos há cinco anos. Eu morei no Rio de Janeiro por sete anos.

20

Juliana, você morou no Rio de Janeiro por sete anos?

46

mais sobre os colegas. As experiências vivenciadas e compartilhadas por cada um

constituiriam o sentido a ser resgatado.

É importante ressaltar que propor atividades de interpretação gramatical talvez

exija muito mais do professor, uma vez que os materiais didáticos disponíveis quase

sempre apresentam atividades tradicionais de fixação das estruturas linguísticas. É

provável, portanto, que o professor necessite elaborar tais atividades, a fim de garantir

que o foco na forma e foco no significado, de fato, estejam atrelados e se

complementem.

Poderíamos argumentar que a explicitação da regra, seguida de exemplos bem

contextualizados, seria uma alternativa mais simples, que exige menos tempo e que

também viabiliza a compreensão. De fato, é irrefutável que este caminho é mais curto,

menos sinuoso e proporciona mais segurança ao professor, haja vista a previsibilidade

das aulas planejadas nesses moldes. Contudo, também é irrefutável que facilitar os

procedimentos de noticing e noticing the gap através de atividades que consigam aliar

forma e sentido e, mais do que isso, enfatizar as implicações da forma no sentido e na

comunicação traz resultados mais positivos para a aprendizagem.

Entretanto, não descarto completamente a validade e funcionalidade de

procedimentos tradicionais do ensino de gramática. Afinal, devido à complexidade e

todas as nuances que envolvem o ensino e a aprendizagem de línguas estrangeiras,

considero que defender categoricamente um modelo de ensino em detrimento dos

demais não condiz com uma proposta de trabalho crítica e reflexiva. Inúmeros aspectos

podem corroborar a escolha do procedimento adotado pelo professor, tendo em vista

que ele não precisa e nem mesmo deve ser orientado por concepções estanques,

dogmáticas e prescritivas sobre ensino. A sala de aula é também um ambiente de

experimentação, de tentativas tanto frustradas como bem sucedidas. Conforme salienta

Rodrigues (2005, p.16):

O ensino dificilmente poderia ser encapsulado em uma teoria única e

onipresente que traria nortes seguros e definitivos para a ação pedagógica.

Neste cenário complexo, a relação entre a teoria, as nossas concepções e a

nossa prática estará em constante diálogo, pacífico ou não.

O diálogo entre a teoria e a prática, a reflexão sobre a ação pedagógica em si e

sobre as próprias experiências de aprendizagem permitem que o professor desenvolva

um senso de plausibilidade, ou seja, a compreensão subjetiva do professor acerca do

ensino que ele proporciona (PRABHU, 1990). É o senso de plausibilidade que nos

47

permite dizer por que ensinamos da maneira como ensinamos. De acordo com Prabhu

(1990, p. 172):

Professores precisam atuar por meio de uma concepção pessoal de como o

ensino os conduz ao aprendizado desejado – uma noção de causa que tenha

alguma credibilidade para eles. Essa concepção pode emergir de diversas

origens, incluindo a experiência passada como aprendiz (com as

interpretações de como o ensino que lhe fora proporcionado auxiliou ou não

auxiliou no aprendizado), experiências prévias como professor (com

interpretações semelhantes sobre o ensino), exposição a um ou mais métodos

durante o período de formação (com uma avaliação subjetiva dos métodos e

talvez um grau de identificação com um ou outro), o que o professor sabe ou

pensa sobre as ações e opiniões de outros professores, e até mesmo a

experiência do professor como pai ou mãe21

.

Diante de todos os aspectos que constituem o senso de plausibilidade do

professor, e do caráter multifacetário de cada ambiente de aprendizagem e de cada sala

de aula em particular, pode-se afirmar que, mesmo que o professor adote um método

específico para conduzir suas aulas, deve haver sempre espaço para o ecletismo. Sendo

capaz de refletir sua prática, o professor é também capaz de avaliar em que medida

procedimentos advindos de diferentes abordagens podem colaborar para sua ação

pedagógica. Essa possibilidade de flexibilidade metodológica rompe os limites por

vezes tão firmemente estabelecidos por métodos de ensino positivistas. Segundo Leffa

(1988, p. 235):

As abordagens que dão origem aos métodos são geralmente monolíticas e

dogmáticas. Por serem uma reação ao que existia antes, tendem a um

maniqueísmo pedagógico sem meio-termo: tudo estava errado e agora tudo

está certo. Abordagens pedagógicas, que pela experiência do professor

deveriam conviver na prática, tornam-se preceitos antagônicos e irredutíveis:

indução versus dedução, escrita versus fala, significado versus forma,

aprendizagem versus aquisição, material autêntico versus material adaptado –

são apenas alguns exemplos. Daí que a história do ensino de línguas tem sido

comparada por alguns metodólogos aos movimentos de um pêndulo,

balanceando sempre de um lado a outro; uma constante sucessão de tese e

antítese sem jamais chegar à síntese.

De fato, professores de línguas estão constantemente diante de dicotomias e de

conceitos nem sempre antagônicos, mas por vezes antagonizados, que normalmente os

fazem questionar que postura adotar: ensinar ou não ensinar gramática? Foco na forma

21

Teachers need to operate with some personal conceptualisation of how their teaching leads to desired

learning – with a notion of causation that has a measure of credibility for them. The conceptualisation

may arise from a number of different sources, including a teacher’s experience in the past as a learner

(with interpretations of how the teaching received at that time did or did not support one’s learning), a

teacher’s earlier experience of teaching (with similar interpretations from the teaching end), exposure to

one or more methods while training as a teacher (with subjective evaluation of the methods concerned

and perhaps a degree of identification with one or another of them), what a teacher knows or thinks of the

other teacher’s actions or opinions, and perhaps a teacher’s experience as a parent or caretaker.

48

ou foco na comunicação? Ensino dedutivo ou indutivo? Corrigir os erros ou não corrigir

os erros? Exercícios de repetição ou atividades com foco na comunicação? O

entendimento de que precisamos escolher entre uma coisa ou outra é extremista e

excludente, haja vista que concepções aparentemente opostas podem, na verdade, ser

complementares.

Quando nos referimos mais especificamente à instrução gramatical explícita, por

exemplo, consideramos duas abordagens distintas: a abordagem dedutiva e abordagem

indutiva. Na abordagem dedutiva, as regras, princípios, conceitos ou teorias são

apresentados primeiramente, e depois são tratadas suas aplicações. Na abordagem

indutiva observo alguns exemplos e a partir deles inferimos um princípio ou conceito

geral (WIDODO, 2006).

A princípio, pode-se pensar que tais abordagens são completamente antagônicas

e que o professor deve escolher uma delas para orientar sua prática pedagógica. Porém,

muito mais produtivo do que escolher entre dedução ou indução seria pensar em

dedução e indução, uma vez que os aprendizes podem se beneficiar mais de uma ou de

outra a depender, inclusive, da estrutura gramatical em estudo. Ellis (2006), por

exemplo, sugere que estruturas simples podem ser melhor ensinadas dedutivamente ao

passo que regras mais complexas podem ser melhor ensinadas indutivamente.

Evidentemente, ambas as abordagens apresentam vantagens e desvantagens e uma pode

se sobrepor à outra em determinados momentos tendo em vista o perfil dos aprendizes,

o propósito da aula, o tempo e material disponíveis, o item gramatical em estudo, dentre

outras variáveis. Widido (2006) elenca as principais vantagens e desvantagens das

referidas abordagens através dos quadros a seguir:

Quadro 1. Vantagens e desvantagens da abordagem dedutiva para o ensino de

gramática:

Vantagens

1. A abordagem dedutiva vai diretamente ao ponto e pode,

portanto, poupar tempo.

2. Alguns aspectos da regra (por exemplo, a forma) podem ser

mais simplesmente e claramente explicados.

3. Vários exemplos diretos de prática/aplicação são

imediatamente fornecidos.

49

4. A abordagem dedutiva respeita a inteligência e maturidade de

muitos aprendizes adultos em particular e reconhece o papel

dos processos cognitivos na aquisição da língua.

5. Atende às expectativas de muitos aprendizes sobre ensino em

salas de aula particularmente aqueles que têm um estilo

analítico.

Desvantagens

1. Começar a aula com uma apresentação pode não ser atrativo

para alguns aprendizes, especialmente para os mais jovens.

2. Aprendizes mais jovens podem não entender os conceitos ou

a terminologia gramatical apresentada.

3. Explicação gramatical estimula um modelo de aula centrado

no professor e na transmissão de conteúdo, o que entrava o

envolvimento e a interação do aprendiz imediatamente.

4. A explicação gramatical é raramente lembrada como outras

formas de apresentação (por exemplo, demonstração).

5. A abordagem dedutiva estimula a crença de que aprender uma

língua é simplesmente conhecer suas regras.

Fonte: Widodo (2006)

Diante do exposto, verifica-se que uma abordagem dedutiva de ensino de

gramática demanda menos tempo e planejamento do professor. É possível, inclusive,

que professores optem por esta abordagem devido ao pouco tempo disponível para

planejamento. Infelizmente, as condições de trabalho dos professores no Brasil são

precárias. A carência de espaço físico adequado, recursos tecnológicos, materiais

didáticos, bem como carga horária elevada e poucas oportunidades de formação

continuada constituem um cenário desanimador. Desse modo, optar por um modelo de

ensino já conhecido, em que já existe uma vasta gama de materiais disponíveis parece

ser a alternativa mais comum entre os profissionais de ensino de línguas. Por outro lado,

como mencionado por Widodo (2006), o modelo dedutivo também atrai a atenção de

50

muitos aprendizes cujo estilo de aprendizagem é analítico e que preferem que o

professor assuma o papel central nas aulas.

Quanto à abordagem indutiva, observemos as vantagens e desvantagens

elencadas por Widodo (2006) através do quadro seguinte:

Quadro 2. Vantagens e desvantagens da abordagem indutiva para o ensino de

gramática:

Vantagens

1. Os aprendizes são treinados para descobrir a regra, o que

poderia aumentar a autonomia e autoconfiança do

aprendiz.

2. Maior grau de capacidade cognitiva dos aprendizes é

explorada.

3. Os aprendizes são mais ativos no processo de

aprendizado, ao invés de serem simplesmente sujeitos

passivos. Deste modo, eles ficam mais motivados.

4. A abordagem envolve habilidades de reconhecimento de

padrões e de resoluções de problemas e determinados

aprendizes se interessam por estes desafios.

5. Se as atividades de resoluções de problemas forem feitas

colaborativamente, os aprendizes têm a oportunidade de

praticar a língua.

Desvantagens

1. A abordagem demanda tempo e energia, uma vez que

conduz o aprendiz a obter um conceito apropriado da

regra.

2. Os conceitos transmitidos implicitamente podem conduzir

o aprendiz a obter um conceito errado sobre a regra.

3. A abordagem enfatiza os professores planejando as aulas.

4. Estimula o professor a elaborar o material de ensino

cuidadosamente e sistematicamente

5. A abordagem pode contrastar com o estilo de

51

aprendizagem de alguns aprendizes, bem como suas

experiências passadas de aprendizado. Alguns simplesmente

preferem que as regras sejam explicitadas.

Fonte: Widodo (2006)

De acordo com o explicitado no quadro anterior, a abordagem indutiva requer

mais participação ativa do aprendiz, uma vez que ele tem o papel de inferir as regras

subtendidas nos exemplos fornecidos pelo professor. Esse modelo, portanto, estimula a

autonomia do aprendiz bem como o desafia a reconhecer padrões linguísticos e a

solucionar problemas. Parece-me que essa abordagem atende mais apropriadamente a

um público que aprecia desafios e que se sente motivado com a perspectiva de conduzir

mais ativamente o aprendizado.

Mais uma vez ressalto que não pretendo sobrepujar um modelo em detrimento

do outro. É provável que um seja mais eficaz e viável em determinado contexto e em

outro não. Saliento também que alternar entre um modelo e outro a depender do

propósito, da estrutura linguística trabalhada bem como do tempo disponível pode ser

uma opção válida para o professor. O que não se pode perder de vista é a importância de

vincular o estudo da forma com o sentido e seu uso. O professor precisa estar atento

para que sua prática não se encerre na simples transmissão de regras e a exaustiva

reprodução de padrões linguísticos desvinculados de significado e de propósitos

comunicativos.

Faz-se necessário, também, que o professor tenha consciência das razões pela

quais suas escolhas são realizadas. Precisamos pensar que cada escolha, cada iniciativa

e cada procedimento adotado nas aulas refletem diretamente no aprendizado do aluno.

Desse modo, as ações precisam ser pensadas e refletidas, a fim de que os resultados

obtidos sejam os mais positivos possíveis. Compreendo que o ecletismo metodológico

no ensino não significa que qualquer coisa serve e que qualquer resultado já é um

resultado, muito menos que uma combinação aleatória de procedimentos advindos de

diversos métodos seja uma fórmula para o ensino de línguas estrangeiras.

Tendo em vista o senso de plausibilidade do professor, espera-se que ele seja

capaz de justificar suas escolhas e que sua prática não seja meramente intuitiva. É

imprescindível que o professor tenha consciência do por que age da maneira como age,

ou seja, suas ações precisam ser previstas e planejadas conscientemente, a fim que

sejam alcançados objetivos também pré-definidos. Nesse sentido, Prabhu (1990) afirma

que quando o senso de plausibilidade está envolvido no processo de ensino, o professor

52

também está efetivamente envolvido e o ensino não é mecânico. Desse modo, a

atividade de ensino é mais produtiva e o professor tem condições de avaliar o seu grau

de satisfação com determinada atividade ou técnica, por exemplo. Prabhu (1990)

também associa o fracasso na implementação de métodos de ensino ao fato de que, não

raro, os professores seguem o método mecanicamente sem um senso de compreensão e

identificação. Consequentemente, a prática se molda em rotinas firmemente

estabelecidas e automáticas.

Considerando a importância da competência do professor no sentido de

implementar uma prática de ensino particular alicerçada tanto em seu conhecimento

teórico quanto em suas experiências de ensino, bem como a insatisfação com o conceito

de método como o princípio organizacional que rege o ensino das línguas,

Kumaravadivelu (2001, p.544-545), define a noção de pedagogia pós-método

caracterizando-a como um sistema tridimensional:

[...] uma maneira de conceituar a pedagogia pós-método é visualizá-la

tridimensionalmente como uma pedagogia da particularidade, da

praticabilidade e da possibilidade. Como pedagogia da particularidade, o pós-

método rejeita a defesa de um conjunto de princípios e procedimentos

genéricos e predeterminados destinados a alcançar objetivos também

genéricos e predeterminados. Ao invés disso, pretende-se facilitar o

progresso de uma pedagogia sensível ao contexto, alicerçada na real

compreensão das particularidades linguísticas, socioculturais e políticas

locais. Como pedagogia da praticabilidade, o pós-método rejeita a dicotomia

entre teóricos como produtores do conhecimento e professores como

consumidores do conhecimento. Ao contrário, pretende-se romper com essa

dicotomia permitindo e estimulando os professores a teorizar sobre suas

práticas como também a por em prática suas próprias teorias. Como

pedagogia da possibilidade, a pedagogia pós- método rejeita a noção restrita

de ensino de línguas que se limita ao tratamento de elementos funcionais e

linguísticos obtidos dentro da sala de aula. Ao contrário, pretende-se explorar

a consciência sociopolítica que os aprendizes trazem consigo para a sala de

aula a fim de que possa também funcionar como um catalisador em uma

busca contínua por formação de identidade e transformação social22

.

Dentre os parâmetros delineados pelo autor, gostaria de ressaltar a

praticabilidade, uma vez que considero de relevância o papel do professor autônomo 22

[...] one way of conceptualizing a postmethod pedagogy is to look at it three-dimensionally as a

pedagogy of particularity, practicality, and possibility. As a pedagogy of particularity, postmethod

pedagogy rejects the advocacy of a predetermined set of generic principles and procedures aimed at

realizing a predetermined set of generic aims and objectives. Instead, it seeks to facilitate the

advancement of a context-sensitive, location-specific pedagogy that is based on a true understanding of

local linguistic, sociocultural, and political particularities. As a pedagogy of practicality, postmethod

pedagogy rejects the artificial dichotomy between theorists who have been assigned the role of producers

of knowledge and teachers who have been assigned the role of consumers of knowledge. Instead, it seeks

to rupture such a reified role relationship by enabling and encouraging teachers to theorize from their

practice and practice what they theorize. As a pedagogy of possibility, postmethod pedagogy rejects the

narrow view of language education that confines itself to the linguistic functional elements that obtain

inside the classroom. Instead, it seeks to branch out to tap the sociopolitical consciousness that

participants bring with them to the classroom so that it can also function as a catalyst for a continual

quest for identity formation and social transformation.

53

capaz de assumir a direção e a responsabilidade de sua prática pedagógica. Este

professor é capaz de utilizar a sala de aula como um espaço de experimentação, capaz

de avaliar o que funciona e o que não funciona com seus aprendizes, capaz de

reconhecer convergências e divergências entre as premissas metodológicas e o contexto

em que está inserido. É também capaz de observar cuidadosamente os resultados

obtidos com sua prática e operar mudanças quando necessárias, capaz de reconhecer as

concepções de ensino, de aprendizagem e de língua que fundamentam sua prática, capaz

de fazer escolhas coerentes e criteriosas alicerçadas em um construto teórico do qual ele

efetivamente faz parte.

No que tange ao ensino de gramática, cerne desta pesquisa, mais uma vez

observo a necessidade desse professor crítico e atuante que reconhece a gramática em

uma perspectiva holística, considerando tanto os níveis fonológico, sintático,

morfológico, bem como os níveis semântico, pragmático e discursivo. O professor

autônomo e crítico consegue vislumbrar, dentre tantos posicionamentos teóricos e

ideológicos divergentes, aquele que mais se adéqua a sua realidade e traz resultados

mais efetivos. Considero que esse professor tem condições de proporcionar um ensino

de gramática eficaz e consonante com propósitos de comunicação e com a veiculação de

sentidos, em uma tríade na qual a forma, o sentido e o uso coexistem e cooperam no

processo de aprendizado da língua.

A seguir, apresentarei a análise dos dados, por meio da qual verificarei que

perspectiva de gramática tem sido adotada nas aulas das professoras participantes deste

estudo.

54

4 O QUE NOS DIZ A PESQUISA?

4.1 Análise dos questionários

Os dados coletados através dos questionários me ajudam a perceber as

diferenças inerentes ao contexto de atuação de cada professora participante deste estudo.

O quadro abaixo sintetiza as respostas fornecidas pelas professoras. Em seguida, farei

algumas considerações sobre as principais convergências e divergências encontradas

nos diferentes contextos:

Questões Dados de P1 (Professora da

escola pública)

Dados de P2 (Professora

do curso de idiomas)

Curso de graduação e ano

de conclusão:

Licenciatura em Letras

com habilitação em

Inglês/Português

Ano de Conclusão: 2010

Licenciatura em Letras

com habilitação em

Inglês/Português

Ano de Conclusão: 2004

Tipo de instituição em que

cursou a graduação:

Instituição Privada Instituição Pública Federal

Curso de Pós-graduação: Não completou o curso de

pós-graduação

(especialização)

Não completou o curso de

pós-graduação

(especialização)

Frequência na participação

de atividades de formação

continuada:

Uma vez por ano Uma vez por ano

Participação em atividades

de formação continuada

nos últimos seis meses:

Não participou de nenhuma

atividade de formação

continuada nos últimos seis

meses

Não participou de nenhuma

atividade de formação

continuada nos últimos seis

meses

Tempo de atuação como

professora:

10 anos 17 anos

Número de instituições em

que atua como professora e

a sua natureza:

2 instituições: escola

pública estadual e curso de

idiomas

2 instituições: curso de

idiomas e escola pública

federal (professora

temporária)

Aulas particulares

Quantidade de aulas

ministradas por semana

(considerando todas as

instituições em que

trabalha):

42 horas 23 horas

Tempo de atuação na

instituição participante da

pesquisa:

6 anos 3 anos

Carga horária semanal total

na instituição participante

40 horas 6 horas

55

da pesquisa:

Quantidade de horas-aula

ministradas na instituição

participante da pesquisa:

32 horas 6 horas

Horas semanais

disponíveis para

planejamento na instituição

participante da pesquisa:

8 horas Não há tempo disponível

para planejamento.

Considera o tempo

disponível para

planejamento satisfatório?

Sim O planejamento já vem

pronto no manual. Não há

necessidade de

planejamento por parte do

professor.

Costuma fazer o

planejamento sozinho ou

em parceria com colegas

de área?

Sozinha, uma vez que é a

única professora de Inglês

do quadro efetivo da escola

e todas as turmas dos

turnos matutino e noturno

lhe pertencem.

Não planeja as aulas. O

manual já traz a aula

planejada.

Conta com apoio

pedagógico no

planejamento das

atividades de ensino? Caso

positivo, em que consiste

esse apoio?

Não Não

Número de turmas em que

ministra aulas na

instituição participante da

pesquisa:

16 turmas 2 turmas

Média de alunos por turma: 45 alunos 15 alunos

Vínculo trabalhista com a

instituição participante da

pesquisa:

Estatutário Celetista

Recursos disponíveis para

uso em sala de aula:

Quadro branco, marcadores

para quadro branco,

projetor de slides e livro

didático.

Quadro branco, marcadores

para quadro branco,

televisão, aparelho de som,

acesso a internet, livro

didático, fotocópias, CD e

DVD.

Recursos que costuma

utilizar nas aulas:

Quadro branco, marcadores

para quadro branco,

projetor de slides e livro

didático.

Televisão, DVD, quadro e

livro didático.

Quantidade de alunos na

turma participante da

pesquisa:

45 alunos 9

Faixa etária da turma

participante da pesquisa:

16 anos 13 a 19 anos

Alunos possuem livros

didáticos?

Sim Sim

Frequência em que o livro

didático é utilizado:

Algumas vezes por mês Semanalmente

56

Participou na escolha do

livro didático?

Sim Não

O livro escolhido foi o

adotado?

Sim _______

Avaliação do livro didático

adotado pela instituição:

Bom Bom

Comparando os dados fornecidos por P1 e P2, pode-se destacar algumas

semelhanças e algumas significativas divergências quanto ao contexto de atuação das

professoras-colaboradoras.

Intencionalmente, a nossa seleção de professoras colaboradoras contemplou

profissionais com formação específica na área. Sendo assim, ambas são licenciadas em

Letras com habilitação em Língua inglesa. Coincidentemente, ambas têm vasta

experiência de ensino e já atuam como professoras há bastante tempo.

Quanto à formação continuada, ambas afirmam participar de atividades dessa

natureza apenas uma vez por ano, sendo que nenhuma delas esteve envolvida em

atividades de formação continuada nos últimos seis meses. Nesse ponto, observo que a

conjuntura dos diferentes contextos não se distancia. Ao contrário do que se poderia

imaginar, a professora atuante no curso de idiomas parece não ter oportunidades

constantes de formação continuada e de treinamento contínuo propiciados pela

instituição, evidenciando uma surpreendente similaridade com a escola pública.

No tocante à atuação enquanto professoras, verifico que ambas trabalham em

mais de uma instituição, realidade bastante comum entre os professores no Brasil. Esse

aspecto certamente implica em uma elevada carga horária e em uma rotina de trabalho

estafante.

Outro aspecto que também surpreendente se refere ao tempo disponível para o

planejamento subsidiado pela instituição de ensino. A professora da escola pública

dispõe de um tempo denominado “Atividade Complementar” (AC) para que planeje e

organize suas atividades de ensino. Desse modo, P1 dispõe de 8 horas semanais para o

planejamento de suas aulas e demais atividades pedagógicas. P2, por outro lado, não

dispõe de tempo subsidiado pela instituição para o planejamento. Nesse aspecto, pode-

se perceber um privilégio da escola pública em relação ao curso de idiomas.

A questão do planejamento remete ainda à questão da autonomia do professor.

Enquanto P1 tem autonomia para planejar suas atividades de ensino, P2 precisa seguir

um planejamento pré-determinado pela instituição através de um manual. A professora,

portanto, limita-se a seguir as orientações descritas no manual, o que, segundo P2,

dispensaria o professor das atividades de planejamento. A autonomia de P2 também é

inibida no que tange à escolha do material didático. O livro utilizado por P2 é

57

determinado pela instituição sem que os professores participem ou discutam a

elaboração desse material. Essa prática, de fato, é comum nos cursos de idiomas.

Hierarquicamente, parece-me que o professor é submetido ao material de ensino. P1,

por outro lado, tem autonomia para escolher o livro a ser utilizado.

Os dados obtidos através dos questionários apontam ainda para o fato de que o

trabalho desenvolvido pelo professor de língua inglesa é, na maioria das vezes, um

trabalho solitário. Ambas as professoras, além de não contar com apoio pedagógico da

instituição, não costumam realizar o planejamento de suas ações pedagógicas em

parceria com seus colegas. P1, simplesmente porque não dispõe de tempo subsidiado

pela instituição para que esses momentos de intercâmbio de conhecimento se

concretizem e P2, porque é a única professora de Língua inglesa da instituição nos

turnos em que trabalha.

Outro ponto de divergência relevante entre os diferentes contextos se refere à

quantidade de alunos por turma. As turmas de P1 possuem aproximadamente 45 alunos,

ao passo que no curso de idiomas onde P1 atua são admitidos, no máximo, 15 alunos.

Com certeza, esse fator numérico interfere significativamente na dinâmica das aulas e

nos procedimentos adotados na condução do ensino, o que consegui comprovar

mediante os dados obtidos na entrevista e na observação das aulas.

Quanto aos recursos disponíveis para uso em sala de aula, verifico também

algumas discrepâncias. Na escola pública, a professora dispõe basicamente do livro, do

quadro, dos marcadores para quadro e do projetor de slides. Durante o período de

observação, contudo, o projetor de slides não ficou à disposição na sala, o que me faz

supor que esse recurso seja compartilhado entre todos os professores e que precisa ser

previamente reservado para uso. Por outro lado, P2 dispõe de quadro branco,

marcadores para quadro branco, televisão, aparelho de som, acesso a internet, livro

didático, fotocópias, CD e DVD. Conforme respostas do questionário, entretanto, P1

limita-se em usar a televisão, DVD, quadro e livro didático, o que se justifica devido à

metodologia utilizada e ao pouco tempo disponível para atividades extras, conforme

relato de P1 durante a entrevista.

No mais, verifico que a adoção do livro didático é comum em ambos os

contextos, ressaltando que P2 utiliza o material com mais regularidade (semanalmente),

uma vez que essa é uma exigência da instituição. P1, por sua vez, tem autonomia para

definir quando usar o livro e, dessa maneira, opta por utilizá-lo apenas algumas vezes

por mês.

58

Diante do exposto, faz-se necessário enfatizar alguns pontos positivos e negativos dos

dois cenários a fim de levantarmos possíveis fatores que interfiram na condução das

aulas e, consequentemente, no ensino da gramática.

Cenário I: A escola pública

Pontos positivos: a) Autonomia da professora na escolha do livro didático, o que

estimula a reflexão e a análise criteriosa do material de ensino; b) Autonomia no

planejamento das aulas, o que permite que a professora avalie que propostas melhor se

enquadram à realidade de sua sala de aula; c) Autonomia quanto ao uso do livro

didático, uma vez que não há uma exigência institucional, para que o livro seja

integralmente utilizado; d) Possibilidade de inserção de atividades variadas, além

daquelas previstas no livro didático e e) Tempo disponível para o planejamento.

Pontos negativos: a) Infraestrutura inadequada para o ensino de uma língua

estrangeira; b) Escassez de recursos e materiais importantes para a condução das aulas;

c) Raras oportunidades de formação continuada para a professora; d) Ausência de apoio

pedagógico para o planejamento das atividades de ensino; e) Ausência de intercâmbio

de conhecimento com outros profissionais atuantes na mesma área; f) Carga horária

elevada, uma vez que o professor em regime de 20 horas semanais precisa ministrar 16

aulas a cada semana; g) Salas superlotadas, visto que é uma tarefa realmente desafiadora

ensinar eficientemente uma língua estrangeira para turmas compostas por cerca de 45

alunos e h) Carga horária da disciplina, haja vista que a professora tem apenas um

encontro semanal com a turma com duração de uma hora e quarenta minutos.

Cenário II: O curso de idiomas

Pontos positivos: a) Infraestrutura adequada para o ensino de língua estrangeira;

b) Disponibilidade de recursos e materiais; c) Número apropriado de alunos por turma e

d) Carga horária adequada do curso, uma vez que a professora tem dois encontros

semanais com a turma com duração de uma hora e quinze minutos, totalizando duas

horas e trinta minutos por semana.

Pontos negativos: a) Raras oportunidades de formação continuada; b) Ausência

de apoio pedagógico para o planejamento das atividades de ensino; c) Ausência de

59

intercâmbio de conhecimento com outros profissionais atuantes na mesma área; d)

Ausência de autonomia por parte da professora na escolha dos materiais de ensino; e)

Ausência de autonomia por parte da professora na condução das aulas; f) Exigência

institucional para que o livro seja integralmente utilizado e que a professora siga o

manual do professor rigorosamente e d) Ausência de tempo subsidiado pela instituição

para o planejamento.

Curiosamente, ao contrário do que costumamos imaginar, em alguns aspectos a

professora da escola pública parece estar numa situação um pouco mais confortável do

que a professora do curso de idiomas. Embora no curso de idiomas a estrutura física e

os recursos disponíveis sejam mais atrativos, percebo que a professora carece de um

elemento fundamental para a função exercida pelo professor de língua estrangeira:

autonomia. Desse modo, ficamos diante de um cenário em que o professor está

encapsulado em uma metodologia onipresente que tende a silenciar e coibir qualquer

iniciativa advinda do professor, desconsiderando que apenas o professor é capaz de

avaliar consistentemente que estratégias melhor se adequam à sua sala de aula.

Diante dos pontos positivos e negativos listados, verifico também que, nos dois

cenários, pouca importância tem sido atribuída à necessidade de formação continuada

dos professores de língua estrangeira. As professoras participantes desta pesquisa são

apenas um exemplo representativo de tantos outros profissionais que carecem de

oportunidades de refletir coletivamente e discutir suas ações pedagógicas, beneficiando-

se do diálogo com outros professores que encaram diariamente similares desafios e

conflitos.

Em suma, me parece que os pontos positivos da escola pública somados aos

pontos positivos dos cursos de idiomas, acrescidos da preocupação com o

desenvolvimento e aprimoramento dos professores por parte das instituições,

constituiriam um cenário animador para a promoção do ensino de língua estrangeira.

4.2 Análise das entrevistas

A entrevista semiestruturada teve como objetivos principais identificar as

concepções das professoras colaboradoras em relação à gramática e ao ensino de

gramática bem como sua avaliação em relação ao material didático adotado na

instituição em que trabalham. Busquei também uma explicitação por parte das

professoras sobre os procedimentos adotados em suas aulas quando elas lidam com o

60

ensino de estruturas gramaticais. A princípio, o roteiro da entrevista constava de nove

perguntas principais (vide apêndice), que foram complementadas com perguntas

surgidas no decorrer da entrevista, a fim de que alguns pontos fossem esclarecidos.

Metodologicamente, decidi analisar as respostas de cada professora

individualmente. As perguntas complementares serão destacadas com a sigla PC, ao que

se segue:

Pergunta 1: Qual é a sua formação acadêmica e quais são as principais

contribuições dessa formação para a sua atuação em sala de aula?

P1: Então, a minha formação é Licenciatura em Letras com ênfase em Língua

inglesa. Bom, o meu caso é um pouquinho diferente. Eu já sabia inglês. Eu

morei nos Estados Unidos durante dez anos. O conhecimento da língua

inglesa eu já tinha. Gramaticalmente falando e tudo mais eu já sabia tudo, né?

Como quando eu vim para Porto Seguro comecei a trabalhar com educação,

justamente por isso, você sabe inglês, você acaba sendo professora de inglês.

Então, eu fui pra a faculdade. Então, ela só me passou a questão da didática e

tudo mais, entendeu? Mas com relação à língua inglesa mesmo eu já sabia

tudo. Então, ela só veio confirmar tudo que eu já sabia.

Pergunta 2: Há quanto tempo você atua como professora de língua

inglesa?

P1:Há uns dez anos mais ou menos. Porque eu comecei logo que eu vim

embora para o Brasil. Eu trabalhava com educação infantil, com o

Fundamental I, segmentos que não precisavam tanto, na época, do ensino

superior, aquela história toda. Quando me foram aparecendo novas

oportunidades, especialmente para concurso e tudo mais, então eu precisei da

graduação. Eu fui pra colégios grandes da cidade e aí precisava da formação

superior. Por isso que eu decidi, “então tá bom”, “vou dar aula de inglês,

então vamos pra faculdade e fazer tudo como deve ser feito”.

A partir das respostas de P1 às questões 1 e 2, vê-se que a motivação para P1

tornar-se professora de língua inglesa surgiu devido ao conhecimento adquirido durante

os anos em que residiu nos Estados Unidos. Ao falar sobre o conhecimento da língua,

P1 nos remete à dicotomia existente entre saber a língua e saber sobre a língua, ou seja,

entre o conhecimento implícito que nos permite utilizar determinadas estruturas

linguísticas sem necessariamente sabermos as regras que as fundamentam e o

conhecimento explícito, constituído pelos aspectos linguísticos que o falante

conscientemente aprende sobre a língua (ELLIS, 2006).

As afirmações de P1 fazem-me supor que ao iniciar sua carreira como professora

de língua inglesa, ela era detentora tanto do conhecimento implícito quanto do

conhecimento gramatical explícito, uma vez que afirma que “O conhecimento da língua

inglesa eu já tinha. Gramaticalmente falando e tudo mais eu já sabia tudo, né?”. No

entanto, P1 reconhecia a necessidade de complementar esse conhecimento com

fundamentos didático-metodológicos que o curso de graduação poderia lhe oferecer.

61

Desse modo, o interesse em ingressar na Licenciatura em letras partiu essencialmente

dessa lacuna e das oportunidades que lhe foram surgindo em que a formação acadêmica

era um pré-requisito básico.

Pergunta 3: Como você define o termo “gramática”?

P1: Gramática? Difícil dizer assim, transformar em palavras. Eu creio assim

que gramática, pelo que eu entendo, é o que nos direciona, é o que nos

norteia para estabelecer uma comunicação da forma correta, né? Então, a

minha visão de gramática é essa. Ela nos direciona. Ela é o norte que nós

temos para nos comunicarmos corretamente, entendeu? É lógico que tem

muitas coisas de gramática, especialmente da língua portuguesa, que os

alunos, os leigos ficam pensando pra que precisam daquilo. Então, algumas

coisas eu confesso que eu não consigo entender muito bem pra que é

necessário. Mas se existe, com certeza, é necessário. Essa coisa de oração

coordenada, oração subordinada, essas nomenclaturas, né? A gramática como

forma de nos nortear a falar corretamente, eu acho perfeito. Mas essa coisa

das nomenclaturas é que a gente fica sem entender a necessidade.

O posicionamento de P1 sugere que a gramática é um recurso do qual lançamos

mão para nos comunicarmos. No entanto, observo que P1 associa a gramática

diretamente com as regras do “bem falar”, ou seja, com os padrões da norma culta, o

que lhe dá um caráter eminentemente normativo. Thornbury (2001) ressalta que embora

produzir sentenças bem formadas seja parte essencial do aprendizado da língua, essa

concepção suscita algumas questões problemáticas, tendo em vista a dificuldade de

definir o que são sentenças bem formadas, bem como o fato de que o discurso natural e

espontâneo costuma violar as regras gramaticais. Desse modo, direcionar a atenção dos

aprendizes unicamente para o padrão da língua pode gerar um distanciamento entre a

sala de aula e o contexto real de uso da língua, onde a norma culta costuma ser

negligenciada, bem como pode legitimar um discurso de preconceito linguístico. Sendo

assim, faz-se necessário que os aprendizes tenham a oportunidade de apreciar as

variações linguísticas existentes e que a gramática não seja compreendida meramente

como a imposição de normas prescritivas de correção.

Além disso, observo que P1 questiona a necessidade de utilizar a

metalinguagem, ou seja, o uso da língua para descrever ou analisar um fenômeno

linguístico (CICUREL apud DUTRA 2004) para o ensino da língua. Desse modo,

percebo que P1 considera que a análise consciente da língua e o conhecimento das

nomenclaturas não tem papel relevante para o aprendizado da língua.

Pergunta 4: Que concepção de gramática você utiliza para conduzir a

sua prática de ensino?

P1: Olha, muitas vezes não tem como você explicar alguma coisa, abrir a

visão do seu aluno com relação a certas coisas sem que você utilize

62

nomenclatura gramatical. Então, muitas vezes eu tenho que falar “aqui você

precisar usar um advérbio, aqui você precisa procurar o verbo”. Então, o uso

da nomenclatura gramatical é necessário para que eu possa mostrar para o

meu aluno para onde que vai. Basicamente isso. Como o meu objetivo com a

língua inglesa é ensinar ao meu aluno como estruturar a fala, então, eu

procuro utilizar o menos possível a nomenclatura gramatical pra não

confundir meu aluno. Porque a minha intenção não é fazer ele fazer uma

análise sintática. É fazer ele estruturar a fala. A minha gramática é voltada

para a estrutura da oralidade, da fala mesmo, da comunicação falada.

Embora P1 tenha afirmado previamente não compreender a necessidade das

nomenclaturas para o ensino da língua, ela afirma utilizar esse recurso em determinados

momentos. No entanto, P1 ressalva que utilizar as nomenclaturas pode confundir seus

alunos e por essa razão evita fazê-lo.

Fica claro que P1 concebe a gramática como meio de viabilizar o

desenvolvimento da oralidade. P1 parece eleger a habilidade oral como prioridade do

ensino de línguas e, para tanto, considera que a análise linguística tem um papel

secundário e só faz sentido quando coopera para que o objetivo maior, a comunicação,

seja alcançado. Nesse sentido, P1 afirma que “A minha gramática é voltada para a

estrutura da oralidade, da fala mesmo, da comunicação falada”.

O trecho acima evidencia também uma preocupação, talvez remanescente das

teorias naturalistas que preconizam a ausência da instrução gramatical nas aulas de LE,

com a necessidade de explicitação das regras gramaticais. O discurso de P1 faz parecer

que, dizer ao aluno quando ele precisa usar um verbo ou advérbio seja algo

problemático e que ela só o faz por falta de opção. Daí P1 afirmar “às vezes eu tenho

que falar”, ou seja, não lhe resta alternativa. E por mais que P1 evite adentrar nesse

universo aparentemente proibido, o do conhecimento explícito da gramática, às vezes

faz-se necessário. Imbuídos de premissas metodológicas que questionam a finalidade e a

utilidade da instrução gramatical no ensino de Línguas estrangeiras, é comum que

professores alimentem um sentimento de transgressão quando promovem o ensino

explícito da gramática. Nesse sentido, (RODRIGUES, 2005, p.75) salienta que:

Por vezes, para cumprir o ideal de uma determinada metodologia, o professor

de línguas precisa empreender o esforço, a nosso ver não justificado, de

evitar que o aluno estude gramática porque seu objetivo é conversação, ou

apenas leitura, assim eliminando a priori qualquer relação que porventura

exista entre o ensino da gramática e o desenvolvimento das competências

linguística e comunicativa.

Rodrigues (2005, p. 90) atenta ainda para o fato de que:

As abordagens que tendem a equacionar a aquisição da língua materna à

aprendizagem de língua estrangeira, dessa forma reduzindo o enfoque na

instrução gramatical, ou mesmo eliminando-o, foram fundamentadas em

63

experiências de aprendizagem com alunos de inglês, na verdade, como

segunda língua, isto é aqueles que imigraram a um país onde a língua-alvo é

usada efetivamente no convívio do usuário com falantes dessa língua e, por

isso, possuem algumas condições privilegiadas para o desenvolvimento de

sua proficiência.

Desse modo, considerando a eminente relação entre a gramática e o

desenvolvimento das competências linguística e comunicativa, bem como o fato de que

aprendizes de inglês como língua estrangeira não dispõem das mesmas condições dos

aprendizes de inglês como segunda língua, acredito que os professores precisam se

eximir de qualquer sentimento de transgressão ou culpa ao lidar com a gramática

explicitamente em suas aulas. Evidentemente, não estou defendendo uma proposta de

ensino que se limite à explicitação gramatical, porém não excluo essa possibilidade

quando o professor julgar necessário.

Pergunta 5: Em sua prática pedagógica, você adota alguma orientação

teórica específica que fundamente os procedimentos utilizados para o

ensino de gramática?

P1: É como eu te falei. O meu objetivo é fazer com que o meu aluno domine

a habilidade da oralidade, da fala. Infelizmente, eu não posso praticar a

oralidade com eles por causa da quantidade de alunos, infelizmente. Mas eu

direciono eles, eu coloco eles no caminho que eles precisam. Eu passo pra

eles o mínimo necessário que eles precisam pra se comunicar, pra estruturar a

fala deles corretamente, entendeu? Então, o meu foco é esse. Como o meu

foco é a fala, tudo que eu faço gira em torno de como você precisa fazer para

estruturar corretamente pra você falar. E aí entram algumas regras da

gramática da língua inglesa, essas peculiaridades da língua, entendeu? Então,

é basicamente nisso que eu me fundamento. E quando ele consegue fazer

isso, se ele quiser aprimorar os conhecimentos dele lá pra frente ele vai ter

condições porque o básico ele já recebeu de mim.

PC: Mas há uma metodologia específica que fundamente o ensino?

P1: Eu utilizo muito da minha própria experiência. Você entender o contexto,

você procurar não traduzir as palavras, simplesmente entender o que elas

significam sem buscar um referencial em português necessariamente, porque

é assim que você internaliza a língua. Eu sei por conta da vivência que eu

tive. Eu não tive professor pra me ensinar, eu não tive dicionário, eu não tive

google tradutor. Então é baseado na minha vivência e na minha experiência

também. Eu não sou professora só aqui. Eu sou professora num curso de

idiomas. E lá tem a metodologia dele de fazer com que o aluno aprenda

através da estrutura pronta. E ele descobre o significado daquilo e ele passa a

utilizar aquilo, entendeu? E a metodologia que eles usam é exatamente a

metodologia, entre aspas, que acontece quando você tá lá fora vivenciando

isso. Você tem que decifrar o significado daquilo que você tá ouvindo ali. E a

partir dali você imitar aquilo e falar igual. Eu sempre falo para os meninos.

Eu acabei de falar pra eles ali agora. Vocês me viram colocando aqui What’s

your favorite color? Então, na hora de responder você não diz my color

favorite. Você vai seguir exatamente o que eu falei. O Inglês você ouviu

daquele jeito, você repete daquele jeito. Você não tenta mudar a língua.

Porque quem tá falando com você é o dono da língua. É o nativo da língua.

Então, você vai aprender a partir do momento em que você copia exatamente

do jeito que ele está falando. É assim que você aprende, entendeu?

64

As respostas fornecidas por P1 acerca de sua metodologia e procedimentos para

o ensino de gramática suscitam uma série de questões importantes para discussão.

Primeiramente, percebo uma contradição em relação aos objetivos de ensino externados

pela professora e as possibilidades reais de aprendizagem. P1 reafirma seu interesse em

direcionar seus aprendizes para o desenvolvimento de habilidades orais, ao mesmo

tempo em que manifesta a sua frustração em não poder praticar a oralidade com seus

alunos, tendo em vista seu número elevado na turma. Dessa maneira, o objetivo

almejado não encontra os procedimentos adequados para que se concretize.

Segundo, mais uma vez percebo a concepção de gramática como um

instrumento que direciona, orienta os aprendizes a falar de acordo com a norma culta.

Além disso, quando P1 afirma “Eu direciono eles, eu coloco eles no caminho

que eles precisam. Eu passo pra eles o mínimo necessário que eles precisam pra se

comunicar e aí entram algumas regras da gramática da língua inglesa”, parece que P1

presume que seus aprendizes estarão aptos a converter o conhecimento explícito da

gramática em habilidade de comunicação, ainda que não sejam criadas oportunidades de

prática e produção.

Terceiro, verifico que P1 considera que o aprendizado da língua acontece

essencialmente através de um processo de imitação de estruturas prontas, tendo como

espelho o falante nativo. Para P1, o uso da língua materna com fins de tradução deve ser

evitado e o aprendiz precisa decifrar os significados com base no contexto. Observo

que, de certa maneira, P1 tende a equacionar o ensino promovido em sala de aula com o

processo de aprendizagem que ocorre em contextos de imersão. Aqui, portanto, faz-se

necessário estabelecermos uma distinção entre o ensino de inglês como língua

estrangeira e o ensino de inglês como segunda língua. Como mencionado previamente,

P1 residiu nos Estados Unidos durante 10 anos e aprendeu a língua inglesa em um

contexto onde a língua-alvo é efetivamente usada por falantes nativos. Desse modo, em

sua experiência de aprendizagem a língua inglesa se configura em uma segunda língua.

No entanto, seus aprendizes vivenciam uma situação diferenciada, em que a sala de aula

é provavelmente um dos poucos espaços em que eles têm contato efetivo com a língua.

Sendo assim, é válido questionar se os mesmos princípios são válidos em ambas as

situações, já que o nível de exposição ao insumo linguístico ocorre de maneira bem

diferenciada nos referidos contextos. Obviamente, existem teorias que coadunam com o

posicionamento de P1, como a hipótese do input de Krashen (1985) para quem a

exposição ao insumo natural é a chave para que o aprendiz assimile de maneira

subconsciente a linguagem. Essa teoria, entretanto, parece desconsiderar que as

65

condições privilegiadas de um cenário onde a língua alvo é usada efetivamente a todo o

momento, não são contempladas no contexto onde a sala de aula é o espaço prioritário

de aprendizagem, onde por vezes os anseios, objetivos e expectativas de mais quarenta

aprendizes coexistem.

Por outro lado, observo que apesar de P1 tentar equacionar a aquisição natural

da língua com o aprendizado da língua estrangeira em contextos escolares, P1 não

descarta a importância da instrução gramatical, conforme sugere Krashen (1985) para

quem a preocupação com a forma faz-se desnecessária. P1, portanto, parece considerar

relevante que aspectos estruturais sejam observados, a fim de que os aprendizes

consigam alcançar o nível desejado de acurácia linguística, elemento que P1 parece

considerar preponderante na aprendizagem da língua.

O quarto aspecto observado no posicionamento de P1 se refere a um discurso de

propriedade da língua inglesa tão comumente e equivocadamente difundido. Sarmento

(2003, p. 162) atenta para o fato de que:

Cada vez mais, nossos alunos usarão o inglês para se comunicar com pessoas

que não são falantes nativos dessa língua. Mesmo se tivermos em mente

apenas os falantes nativos, a falantes nativos de qual país estamos nos

referindo? Inglaterra? Estados Unidos? Austrália? De que comunidade de

fala dentro de cada país? Falantes nativos de inglês são a minoria entre a

comunidade de falantes dessa língua..

Desse modo, espelhar-se em um falante nativo ideal parece não ter sentido,

tendo em vista o status de língua franca e mundial do inglês na atualidade. O próprio

conceito de natividade é questionável, já que, conforme Rajagopalan (apud

SARMENTO, 2003, p. 163), “está relacionado à crença da existência de um ser que tem

um domínio tão perfeito de sua língua materna que pode, dessa forma, ser considerado a

autoridade máxima em assuntos relacionados à sua língua”.

Nesse sentido, reproduzir um discurso de imitação do falante nativo,

argumentando ser ele o proprietário da língua, além de desconsiderar o status de inglês

como língua franca, pode colocar os aprendizes em uma posição de submissão em face

à imposição de um padrão linguístico considerado superior.

Por fim, observo que, aparentemente, não há uma metodologia específica que

fundamente a prática pedagógica de P1. Embora P1 considere coerente a metodologia

utilizada no curso de idiomas onde também atua, provavelmente, a escola pública não

lhe fornece os subsídios necessários para que as aulas sejam conduzidas da mesma

maneira, suposição confirmada com as observações das aulas. No entanto, P1 traz para

o contexto da escola pública alguns pressupostos adquiridos tanto da sua experiência de

66

aprendizagem como da sua experiência de ensino no curso de idiomas, o que parece

constituir a sua abordagem de ensinar. Almeida Filho (1993) define a abordagem de

ensinar do professor como uma filosofia de trabalho, um conjunto de pressupostos,

princípios e até mesmo crenças intuitivas quanto à natureza da linguagem humana, de

uma língua estrangeira em particular, do ensino e do aprendizado de línguas bem como

do papel do professor e dos alunos nesse processo.

Resumidamente, posso dizer que alguns dos pressupostos da abordagem de

ensinar de P1 que são identificáveis por meio de seu discurso são: a) A habilidade oral

deve ser enfatizada no ensino da língua, mesmo em contextos desfavoráveis à prática e

à produção; b) A instrução gramatical contribui para que o aluno adquira acurácia na

língua; c) A norma culta deve ser enfatizada para que os aprendizes aprendam a falar

“corretamente”; d) O aprendizado da língua ocorre essencialmente através da

reprodução de enunciados emitidos por falantes nativos; e) O uso da língua materna

para fins de tradução deve ser evitado; f) Os significados devem ser inferidos por meio

do contexto em que estão inseridos ; g) A repetição de estruturas prontas é essencial

para que o aprendiz assimile e internalize a língua e h) Os erros são considerados

desvios que precisam ser evitados.

Desse modo, observo que P1 parece ser fortemente influenciada pelos

pressupostos do audiolinguismo, embora em momento algum ela tenha feito referência

explícita a essa metodologia.

Pergunta 6: O material didático utilizado é predeterminado pela

instituição de ensino ou você possui autonomia para escolhê-lo?

P1: Bom, o livro didático que a escola adquiriu eu tive autonomia de

escolher. Eu recebi várias coleções, analisei todas elas e cheguei à conclusão

de que essa coleção aqui é a melhor coleção. Eu gostei da linguagem dele, eu

gostei do conteúdo dos textos, do formato dos exercícios. Confesso a você

que não vou usar todos os exercícios. Mas os que eu vou usar são coisas que

eu tenho certeza que são coisas que eles conseguem alcançar, entendeu? Me

permite trabalhar o skimming, o scanning, identificação de informações no

texto. Então, eu gostei muito dele. Mas eu não preciso ficar utilizando só ele

para montar as minhas aulas, pra planejar as minhas aulas. É lógico que eu

posso utilizar outros livros. Só que eles não terão acesso a esses livros. Só

quem terá sou eu.

O livro é uma novidade. Antes eles não tinham. Então, eu me acostumei

muito a passar as coisas no quadro, a explicar e já elaborar o exercício, já ter

o exercício na minha cabeça que eu vou colocar ali. Eu sempre digo pra eles

“Olha gente, vocês conseguindo resolver isso aqui, vocês alcançarão o

mínimo necessário pra vocês trabalharem esse conteúdo”. Aí depois eu junto

isso tudo dentro de um texto que o livro traz pra fazer com que eles

visualizem, então, na parte textual, na parte de interpretação tudo aquilo que

eles aprenderam de gramática nas aulas anteriores. Quando aparece alguma

coisa eu digo a eles “Aí o advérbio de frequência, olha um auxiliar aqui, tá

vendo?” Eu faço questão de mostrar pra eles. “Olha aí, tá vendo a quantidade

de coisa que você não sabia e agora você não sabe por conta daquilo que

você aprendeu nas aulas anteriores? Quantas coisas você consegue identificar

67

agora”. É legal quando eles veem que eles estão saindo melhores do que

quando eles entraram. Isso dá uma motivação pra eles, entendeu?

Nesse excerto, verifico que P1 teve autonomia para escolher o livro didático

utilizado, fator bastante positivo, uma vez que implica em um trabalho de observação,

análise e reflexão por parte da professora no sentido de adotar um material que melhor

contemple a realidade dos seus aprendizes. Como P1 menciona, a adoção de livros de

língua inglesa na escola pública é algo relativamente novo. Certamente, o uso do livro

aumenta a motivação dos aprendizes que, outrora, tinham como único recurso o quadro

branco.

P1 afirma ter escolhido o livro tendo em mente os seguintes critérios: linguagem,

conteúdo dos textos e os tipos de exercícios propostos. P1 não faz referência à maneira

como a gramática é abordada pelo livro, o que me leva a crer que esse critério não foi

relevante para a escolha.

Por outro lado, P1 ressalta a utilidade dos textos apresentados no livro no sentido

de direcionar a atenção dos aprendizes para estruturas gramaticais previamente

estudadas. Observo, portanto, que P1 opta, na prática, pelo percurso “da gramática para

o texto”. Os alunos, a princípio, são expostos às estruturas gramaticais para que,

posteriormente, observem o emprego dessas estruturas no texto. Desse modo, P1 parece

considerar relevante que os alunos tenham a oportunidade de atentar para o uso da

gramática nos textos escritos. Porém, uma vez que os aprendizes apenas trabalham com

os textos após a exposição da gramática, me parece que a instrução gramatical, a priori,

ocorre de maneira descontextualizada e o foco recai exclusivamente na forma,

excluindo os significados e as funções comunicativas desse processo.

Pergunta 7: Como você avalia a concepção de gramática no material

didático adotado? A perspectiva de ensino de gramática presente nesse

material condiz com a sua?

P1: A gramática é trabalhada de forma bem simples no livro. Bem simples. A

única questão que interfere um pouquinho é porque ele tem muito

vocabulário. O livro utiliza de muito vocabulário. Então, como a gente tem

dificuldade na tradução porque o acesso à tradução é complicado por conta

da falta de dicionários, aquela história toda. Então, muitos dos exercícios de

gramática que ele utiliza eu decido não utilizar e muitos conteúdos e

peculiaridades da gramática que ele traz, eu decido não usar porque eu sei

que vai ser complexo e que vai ser trabalhoso para trabalhar na sala de aula

por conta da falta de conhecimento de vocabulário. Mas existem vários

exercícios de gramática aqui que são possíveis de ser trabalhados sim.

Então, eu prefiro passar a gramática antes e depois eu vou para o livro pra

complementar e pra trabalhar os textos. Dentro dos textos, as perguntas de

interpretação que seguem, todas eles contem questões ou aspectos

gramaticais daquilo que eu expliquei nas aulas passadas, que eles já

internalizaram da forma mais simplificada possível. Eu sempre trago bem

mastigado pra eles, entendeu? Pra que eles possam compreender. Porque

68

todos esses livros são pra pessoas que vêm tendo inglês desde a primeira

série, entendeu? Pra quem já tem um certo domínio da língua. Que fazem

inglês fora, que gostam, que têm interesse. A gente que numa classe de 45

alunos de ensino médio de escola pública, a realidade é diferente. Eles não

têm o preparo necessário pra poder encarar isso daqui independentes. Eles

não têm essa autonomia. Eu tenho que ficar junto com eles, ajudando eles a

traduzir. Por isso eu escolho atividades mais simples que eles conseguem

dominar sem muito da minha interferência. Tem exercícios maravilhosos

aqui, tem conteúdos maravilhosos aqui, se eles dominassem a questão do

vocabulário pra que eles consigam chegar à resposta correta... Se eles não

dominarem o vocabulário, eles não vão conseguir chegar à resposta correta.

Por mais que eles conheçam a gramática. Eles não vão conseguir porque tem

palavras demais.

P1 não deixa claro de que maneira a gramática é trabalhada no livro didático

adotado, declarando apenas que o enfoque dado à gramática é “bem simples”. Para fins

de esclarecimento, faz-se necessário pontuar que o livro adotado é o High up da editora

Macmillan. Consultando o guia didático do referido livro, verifico que a coleção, no que

tange à gramática, “dedica-se ao desenvolvimento do conhecimento gramatical do aluno

por meio de atividades contextualizadas pelo gênero e assunto do texto de leitura”

(DIAS et all, 2013).

Ademais, os autores do material ressaltam que se pautaram “por fornecer

análises dedutivas e indutivas dos aspectos gramaticais da língua inglesa”.

Analisando o material, observo que, de fato, há uma estreita relação entre as

estruturas gramaticais em estudo e os textos e atividades propostas previamente. As

seções Grammar, In other words e Practice makes perfect lidam mais explicitamente

com a gramática. Na seção Grammar, observo que a gramática é explorada por meio de

exercícios em que os alunos são conduzidos a detectar determinados aspectos da

estrutura linguística em estudo, normalmente associando a estrutura à sua função

comunicativa. A seção seguinte, In other words fornece uma explicação em língua

portuguesa dos aspectos gramaticais. A seção Practice makes perfect, por sua vez,

fornece oportunidades adicionais de prática por meio de exercícios com enfoque

gramatical. É válido ressaltar que as mencionadas seções são antecedidas por outras

quatro outras seções que lidam com aspectos socioculturais, leitura, análise dos gêneros

textuais e vocabulário. Tais seções também trazem uma vasta gama de exemplos da

estrutura linguística a ser estudada. Em suma, percebo que o material contextualiza a

gramática e direciona a atenção dos aprendizes para as funções e o sentido das

estruturas linguísticas apresentadas.

Desse modo, percebo que a principal divergência entre o enfoque dado à

gramática pelo material adotado e a prática pedagógica de P1 se refere à opção pelas

abordagens dedutiva ou indutiva. Como o guia da coleção descreve, o livro fornece

análises dedutivas e indutivas dos aspectos gramaticais ao passo que P1 parece optar

69

exclusivamente por uma análise dedutiva, como se pode perceber nas seguintes

afirmações: “eu prefiro passar a gramática antes e depois eu vou para o livro pra

complementar e pra trabalhar os textos” e “eu sempre trago bem mastigado pra eles,

entendeu? Pra que eles possam compreender”. P1, dessa maneira, percorre o caminho

inverso daquele proposto pelo material em uso. Os textos e exercícios propostos

previamente pelo livro funcionariam como elementos para a contextualização da

gramática e forneceriam subsídios para que os alunos pudessem inferir os aspectos

gramaticais a partir dos exemplos fornecidos. No entanto, P1 considera que a gramática

precisa ser apresentada explicitamente antes do trabalho com a leitura, tendo em vista a

deficiência de seus alunos em relação ao vocabulário. Sendo assim, o modelo dedutivo

prevalece em sua prática pedagógica.

Pergunta 8: De que maneira novos itens gramaticais são introduzidos em

suas aulas?

P1: Normalmente eu passo pra eles um referencial da língua portuguesa. Pra

mostrar pra eles que o inglês não é inventation, não é imagination, não é nada

disso. Existe uma lógica. Então, existem certos recursos pra nos comunicar

em português que em inglês não é diferente. Então, esses recursos também

existem em inglês: pronomes interrogativos, pronomes possessivos,

advérbios de frequência e uma série de coisas. Então, eu procuro sempre

traçar um paralelo pra mostrar pra eles o quão simples e semelhante ao

português a língua inglesa é, entendeu? Então, eu sempre procuro trazer esse

paralelo pra eles primeiro e aí depois eu entro com as particularidades da

língua inglesa. Então, eu vou passo a passo. Então, eu vou conceituando e

explicando as regras pra depois eu entrar na parte procedimental, que é a

parte de fazer, realizar os exercícios. Então, esses três passos eu procuro

seguir sempre.

Sucintamente, diria que a maneira como P1 insere estruturas gramaticais em

suas aulas percorre as três etapas seguintes: 1) Estabelece-se um paralelo entre a língua

inglesa e a língua portuguesa, ressaltando as semelhanças existentes entre a gramática

das duas línguas; 2) explicitam-se os conceitos e regras da estrutura gramatical em

estudo; 3) Propõem-se exercícios de fixação do conteúdo. Conforme P1, essas etapas

constituem uma rotina bem estabelecida, de acordo com um modelo de ensino

essencialmente dedutivo, no qual o professor transmite o conteúdo sem que o aprendiz

participe ativamente do processo. Conforme discutido no capítulo teórico, existem

alguns aspectos negativos em relação à abordagem dedutiva para o ensino da gramática.

Dentre elas destaco que uma abordagem dedutiva estimula a crença de que aprender

uma língua é simplesmente conhecer suas regras. A explicitação gramatical estimula um

modelo de aula centrado no professor e que bloqueia o envolvimento dos aprendizes.

Além disso, começar a aula com apresentação da gramática pode não ser motivador,

especialmente para os aprendizes mais jovens (WIDODO, 2006). Tendo em vista a

70

faixa etária dos aprendizes de P1, é possível afirmar que os mesmos se beneficiariam de

oportunidades de engajamento e participação efetiva na construção do conhecimento, de

momentos em que fossem desafiados a solucionar problemas e reconhecer as regras a

partir de um modelo indutivo. Afinal, o modelo indutivo envolve o aprendiz no

processo e corrobora o desenvolvimento de sua autonomia e autoconfiança (WIDODO,

2006). Obviamente, não pretendo ser taxativa e excluir a dedução da sala de aula.

Apenas considero que a previsibilidade das aulas norteadas por um modelo único e fixo

de dedução, através do qual os alunos passivamente “assimilam” o conhecimento

apresentado pelo professor e o reproduz com o auxílio de exercícios de prática escrita

pouco contribui para que o aprendiz, de fato, desenvolva sua competência comunicativa.

Segundo Thornbury (2001), a prática de ensino de línguas estrangeiras parece se

fundamentar na equivocada premissa de que se a estrutura é ensinada de maneira

fragmentada, o aprendiz será capaz de reorganizá-la para fins de comunicação efetiva.

Sendo assim, parece suficiente apresentar a forma e promover oportunidades de fixação,

como se as habilidades comunicativas surgissem como uma consequência natural. No

entanto, conforme a experiência de Schmidt relatada por Thornbury (2001) sugere, a

instrução formal precisa ser complementada pela interação na língua alvo em situações

reais de uso. De certa maneira, o posicionamento de P1 parece partir da premissa

mencionada e problematizada por Thornbury, uma vez que P1 afirma ser a comunicação

o seu objetivo primordial de ensino, embora relate a impossibilidade da prática oral e

muito menos da produção, haja vista a quantidade de alunos em sala. Desse modo, P1

parece supor que seus aprendizes estarão aptos, de certo modo, em converter o

conhecimento sistêmico em competência comunicativa, ainda que não tenham tido

oportunidades para prática e produção.

Outra premissa que parece fundamentar as ações de P1 se refere ao papel da

língua materna para o aprendizado de línguas estrangeiras. Para P1, a língua materna

funciona como um elemento facilitador quando o aprendiz é levado a comparar sua

língua materna com a língua estrangeira. Seu posicionamento converge com a

perspectiva de Moraes (apud PEREIRA, 2001) para quem a língua estrangeira

configura-se em uma leitura que o sujeito faz a partir da língua materna. Nesse sentido,

Pereira (2001, p. 60) acrescenta o pensamento de que essa leitura é uma tentativa de

“entender a língua estrangeira comparando-a com algo similar ao que nos é familiar,

associando a nossa estruturação subjetiva, a nossa língua materna”.

71

Pergunta 9: Alguns teóricos defendem que o ensino da gramática deve

ser evitado ou, até mesmo, banido da sala de aula. Qual é o seu

posicionamento em relação a isso?

P1: Então, é o que eu te falei aquela hora. O meu foco é fazer com que ele

consiga se estruturar para adquirir autonomia pra falar. É como eu te falei,

não tem como você alcançar isso sem utilizar certas nomenclaturas

gramaticais, né? Eu sempre falo pra eles “Se você falar dessa maneira, por

exemplo, se você falar you is, você vai ser entendido. Mas é a mesma coisa

de você falar nós é. Quando você fala nós é, as pessoas te entendem, mas

sabem que você tá falando errado. Quando você vai me responder, você pode

responder somente sim ou não. Mas quando você me dá a resposta completa,

você monta a frase completa, você está trabalhando seu cérebro pra que ele se

comunique me contando isso. Então, é pra isso que eu peço respostas

completas. Eu não posso deixar você passar o resto da vida falando Yes e No.

Então, eu peço pra você me dar a resposta completa e dentro dessa resposta

completa você vai estar aplicando as regras de como se comunicar

corretamente”. Então, eu deixo sempre bem claro pra eles, “Quando vocês

tiverem ouvindo as pessoas falando lá fora, vocês vão ouvir as pessoas que

não estão respeitando a gramática, mas é da mesma forma da língua

portuguesa. A gramática precisa ser ensinada? Precisa. Você precisa aprender

a falar corretamente? Precisa. Mas você não vai deixar de estabelecer

comunicação se, porventura, você não se colocar dessa maneira”. Pra que

isso não gere uma insegurança na hora dele falar. Mas dentro da escola,

infelizmente, felizmente ou infelizmente, eu não sei, eu preciso cobrar a

gramática normativa. Pra isso que eu estou ensinando. Porque nós somos

uma escola.

Mais uma vez percebo a preocupação de P1 com a gramática normativa. Para

P1, a escola é o espaço onde os aprendizes precisam aprender a falar de acordo com as

regras gramaticais. Embora reconheça que os falantes, em situações espontâneas de

comunicação, negligenciem tais regras e que nem sempre isso implica em um

empecilho para que a comunicação se estabeleça; P1 parece considerar preponderante

que os “erros” sejam evitados e que os aprendizes aprendam e utilizem a norma culta da

língua. O posicionamento de P1, de certa maneira, converge com as asserções de Neves

(2000, p. 52) que, ao discutir o ensino de gramática de língua portuguesa, afirma que “a

escola tem a obrigação, sim, de manter o cuidado com a adequação social do produto

linguístico de seus alunos, isto é, ela tem que garantir que seus alunos entendam que

têm que adequar registros”. Embora Neves discuta o ensino da gramática da língua

materna, pode-se estabelecer um paralelo com a língua estrangeira, uma vez que a

variação linguística é característica de toda e qualquer língua. Para Neves (2000, p. 52),

a escola precisa garantir aos aprendizes “que eles tenham condições de mover-se nos

diferentes padrões de tensão ou frouxidão, em conformidade com as situações de

produção”. No que tange ao ensino de língua estrangeira, a evolução das estruturas

“frouxas” para as estruturas mais coesas é descrita por Givon (apud RODRIGUES,

2005) como a transição de um pragmatic mode a um syntatic mode. Noutras palavras,

os aprendizes, a princípio, utilizam estruturas pouco elaboradas que normalmente

72

infligem as regras gramaticais e, desse modo, a comunicação se estabelece

precariamente (pragmatic mode). Com o progresso na aprendizagem, no entanto, é

desejável que o aprendiz seja capaz de construir estruturas mais coesas visando à

adequação do código linguístico (syntatic mode). Obviamente, concordo que a escola

precisa preocupar-se com o ensino da norma culta. Contudo, faz-se necessário que as

variações linguísticas não sejam ignoradas e muito menos discriminadas, para que

atitudes de intolerância e preconceito linguístico não sejam estimuladas. Nesse sentido,

Rodrigues (2005, p. 41) salienta que:

O que precisa ser desencorajado, por certo, é a atitude preconceituosa para

com os falantes de outras variedades linguísticas que não a norma culta (até

porque não usamos apenas uma variedade linguística), pois tal preconceito se

assenta na ideia errônea de que as línguas são homogêneas, e o que escapa a

essa homogeneidade é considerado “defeito” de raciocínio ou incapacidade

intelectual.

Diante do exposto, considero que a maneira como o professor lida com as

variações linguísticas e o feedback fornecido nas situações em que aprendizes cometem

erros na sala de aula terão um importante impacto no processo de ensino-aprendizagem.

A meu ver, o erro deve ser considerado como um elemento inerente ao processo de

aprendizagem, o que não significa ignorá-lo. Por outro lado, também não significa

transformar a aula de língua estrangeira em um cenário de tensão, no qual a correção se

faz presente a cada cinco minutos, inibindo a produção do aprendiz. Desse modo, faz-se

necessário que a correção não interrompa o processo de comunicação. E como isso seria

possível?

Thornbury (2001) ressalta que é preciso fazer com que o aprendiz perceba o

impacto que a forma tem sobre o sentido. Embora, muitas vezes, mesmo com o

emprego da forma inadequada sejamos capazes de identificar a mensagem veiculada, é

importante negociar o sentido da mensagem com o aprendiz, demonstrando que a forma

inadequada pode causar um mal entendido ou ambiguidade. Para isso, o professor pode

até mesmo fingir não ter entendido a mensagem que o aprendiz pretendia transmitir. Em

termos práticos, observemos os exemplos de correção fornecidos por Thornbury (2001)

em duas diferentes situações:

Situação 1:

T What did you do at the weekend, Ana?

S I go to the mountains.

73

T Not go. What’s the past of go?

S goed?

T No, it’s irregular. Look (writes on board): go – went

S I went to the mountains.

T Good. Juan, what did you do at the weekend?23

Situação 2:

T What did you do at the weekend, Ana?

S I go to the mountains.

T Last weekend, I mean.

S Last weekend, I…erm…went to the mountains.

T Did you go alone?

S No, I go with my friend.

T You went with your friend?

S Yes, I went with my friend.24

Thornbury (2001) destaca as diferenças entre os dois tipos de abordagens. Na

primeira situação, visualizamos um exemplo de feedback negativo, em que o professor

direciona a atenção do aprendiz diretamente para a inadequação da forma empregada. O

aprendiz, por sua vez, reestrutura sua fala na tentativa de corrigir o erro explicitamente

apontado. Para o autor, esse tipo de abordagem que foca exclusivamente na forma não é

a ideal quando se pretende explorar as possibilidades de comunicação. Como pudemos

observar, nessa situação, o processo de comunicação foi bruscamente interrompido. Na

segunda situação, a intenção do professor é chamar a atenção do aprendiz para a

23

P O que você fez no fim de semana, Ana?

A Eu vou para as montanhas.

P Não “go”. Qual é o passado de “go”?

A “goed”?

P Não, é irregular. Observe (a professora escreve no quadro): go – went

A Eu fui para as montanhas.

P Bom. Juan, o que você fez no fim de semana? 24

P O que você fez semana passada, Ana?

A Eu vou para as montanhas.

P Eu me referi à semana passada.

A Semana passada, eu... hum... fui para as montanhas.

P Você foi sozinha?

A Não, eu vou com uma amiga.

P Você foi com uma amiga?

A Sim, eu fui com uma amiga.

74

autocorreção sem interromper a fluência da conversa. A princípio, a professora

demonstra que o enunciado do aprendiz não está claro ou que está ambíguo, ao dirigir-

se ao aprendiz dizendo Last weekend, I mean. Em seguida, o professor apenas repete o

enunciado do aprendiz You went with your friend?, como se estivesse apenas

verificando a informação. No entanto, ele enfatiza o enunciado a fim de que o aprendiz

perceba o erro cometido e corrija a si mesmo. Para Thornbury (2001), dessa maneira, o

foco na forma é contemplado sem que a fluência do diálogo seja prejudicada. A

preocupação com o sentido é mantida, embora o sentido tenha que ser negociado, o que

para o autor é algo natural. Afinal, a negociação de sentidos é o que acontece em

situações de comunicação genuína.

Com base nas considerações acima, reafirmo que a escola, certamente, precisa

preocupar-se com a adequação linguística para que os aprendizes, inclusive, consigam

evoluir para estágios mais avançados de uso da língua estrangeira. No entanto, não se

pode ignorar a existência e a legitimidade das variações linguísticas. Afinal, não raro, os

próprios aprendizes trazem típicos exemplos de “erros” gramaticais percebidos em

filmes, músicas, textos etc. Se postulamos que o falante nativo é o falante ideal digno de

fiel imitação e que a norma culta é a única válida, esses postulados caem por terra

quando nos deparamos com exemplos que os aprendizes trazem para a aula em que o

falante nativo utiliza um padrão diferente daquele que a escola afirma ser o único

legítimo.

A seguir, analisarei os dados fornecidos por P2 durante a entrevista.

Pergunta 1: Qual a sua formação acadêmica e quais são as principais

contribuições dessa formação para a sua atuação na sua prática diária?

P2: A minha licenciatura era chamada de Licenciatura dupla. Na época, era

português e uma língua estrangeira, no caso, inglês. Tinha a licenciatura

simples que era só português com as literaturas ou dupla que era português,

literatura e uma língua estrangeira.

PC: Quando você iniciou o curso?

P2: Eu iniciei em 98, mas eu entrei muito nova. Então, eu fiz um ano, aí

tranquei dois anos pra viajar pelo mundo. Aí depois eu retornei e terminei.

PC: Quando você concluiu?

P2: Em 2004.

PC: Quais são as principais contribuições dessa formação para a sua

atuação em sala de aula?

P2: Inclusive, isso foi até um ponto da minha monografia. Foi realmente...

era mais quantitativo: quantas pessoas... Eu fui analisar, na verdade, quantas

75

pessoas se arriscavam a começar na profissão antes de formar. Foi até tema

meu.

No meu caso, eu só comecei a dar aula quando eu entrei na

faculdade, porém eu não esperei as matérias específicas não. Já desde o

primeiro dia de aula, eu com 17 anos, já comecei a dar aula num cursinho

pré-vestibular. No começo, como o cursinho pré-vestibular, ele não é

fiscalizado pelo MEC, eu me senti mais à vontade pra dar aula, né? . Então,

simplesmente eu copiei um modelo, né? Tinha uma apostila que um dia o

professor trabalhou comigo e eu copiei o que o professor fazia trabalhando.

Então, eu me arrisquei. Claro que com muito erro e muito acerto também.

Mas assim, o curso foi imprescindível pra... desde o estágio, né? De

te dar segurança em sala de aula, te dar algumas técnicas. Agora, não existe

uma receita certa, né? Então, é realmente uma mescla de experiências com o

curso. Mas o curso dá o pontapé inicial de você ter um apoio pedagógico,

apoio dos seus colegas. Eu fiz estágio no colégio de aplicação da própria

universidade. Então, fui muito bem acolhida. Eu fiz estágio tanto de literatura

quanto de português quanto de inglês. Então, o curso me ajudou muito, mas

assim, desde caloura eu já dou aula. E era imitando os professores. É tipo

assim, é uma peneira. Você vai peneirando o que seus professores fizeram

com você. Você gostou e você tenta aplicar.

A partir das respostas da informante, observo que ela iniciou a graduação ainda

muito nova. Decidiu, portanto, trancar o curso por dois anos e viajar por alguns países.

P2 morou durante dois anos na Inglaterra, o que, obviamente, foi uma experiência

enriquecedora em relação ao aprendizado do idioma. Pode-se perceber, também, que

apesar de ter interrompido o curso, P2 retoma os estudos no curso de Letras quando

retorna ao Brasil, o que demonstra sua identificação e afinidade com a área. Parece-me

que a experiência de ter vivido em um país falante de língua inglesa, reforçou o seu

desejo de atuar como professora dessa língua. Desse modo, estamos diante de uma

profissional que escolheu ser professora de língua inglesa.

Observo também que P2 considera imprescindível a formação para a atuação dos

professores de língua inglesa e caracteriza como “risco” a iniciativa de ministrar aulas

antes de ter a formação adequada. O tema, inclusive, despertou seu interesse para a

pesquisa. Portanto, fica claro que P2, apesar de também ter se arriscado na profissão

antes de concluir o curso, ou pelo menos ter cursado algumas disciplinas específicas de

cunho didático e metodológico, considera que nessa condição o profissional não tem

segurança suficiente para delinear sua prática pedagógica e, consequentemente, acaba

por imitar a prática de outros profissionais. Nesse sentido, é comum que o novo

profissional seja fortemente influenciado pela prática dos professores com os quais

aprendeu a língua. Quando ela afirma que “simplesmente copiou um modelo”, torna-se

nítido que há pouca ou quase nenhuma reflexão por parte do professor sobre como

conduzir suas aulas. No entanto, quando afirma que houve “muito erro e acerto”

demonstra que, àquela altura, já era capaz de avaliar os resultados de sua prática a ponto

de perceber que alguns procedimentos não geravam os resultados esperados.

76

P2 enfatiza os estágios como importante etapa na construção do profissional e

ressalta a não existência de um modelo de ensino predeterminado que possa ser aplicado

e que garanta o sucesso da aprendizagem. A participante fala sobre “uma mescla de

experiências com o curso”, o que aponta para a importância de considerar tanto o

conhecimento teórico adquirido nas aulas da licenciatura quanto o conhecimento

construído com as experiências em sala de aula, seja nos estágios ou em seus reais

ambientes de trabalho. Observemos que P2 descreve a graduação como o “pontapé

inicial”. Nesse sentido, a graduação é apenas o início da formação do docente a ser

complementada durante toda sua vida profissional. P2 enfatiza também que “o curso me

ajudou muito, mas desde caloura eu já dou aula. E era imitando os professores. É tipo

assim, é uma peneira. Você vai peneirando o que seus professores fizeram com você.

Você gostou e você tenta aplicar”. Mais uma vez percebo que P2 considera a

experiência obtida na prática como fundamental para a formação, o que me leva a

considerar, inclusive, a necessidade de inserir mais amplamente os estudantes da

graduação nos contextos de sala de aula. Os estágios, muitas vezes, são oferecidos

somente nos últimos semestres dos cursos e os alunos entram em contato com a escola

um pouco tardiamente e, até então, a única referência de prática pedagógica é aquela

obtida nas suas próprias experiências de aprendizagem com os professores com os quais

tiveram a oportunidade de estudar.

Como ressalta P2, no início de sua atuação profissional, ela copiava o modelo ao

qual foi submetida, selecionando os procedimentos que ela aprovava. Não havia,

portanto, nenhum fundamento teórico ou crítico-reflexivo em suas escolhas. O curso,

em si, portanto, fornece as ferramentas para que o profissional deixe de reproduzir a

prática de outros profissionais aleatoriamente e tenha sua própria concepção do ensino.

Porém, sem o contato amplo com a sala de aula, espaço de experimentação e apreciação

de resultados, acredito que a formação não contempla o cunho prático da profissão.

Desse modo, considero importante a existência de programas como o Programa

Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID –, que visam à inserção de

estudantes de licenciaturas nos contextos das escolas públicas desde o início da sua

formação acadêmica.

Pergunta 2: Há quanto tempo você atua como professora de língua

inglesa?

77

P2: Então, há mais de dez anos. Assim que eu me formei, já faz mais de dez

anos. Então, deixa eu ver... há quinze anos eu dou aula. Assim, tive algumas

pausas, né? Inclusive, quando eu morei fora eu trabalhei no meio pedagógico,

mas com pessoas especiais. Não focada na língua inglesa, focada mais no

lado terapêutico.

Pergunta 3: Como você define o termo “gramática”?

P2: Gramática é o conjunto de regras que regem a língua, né? Que padroniza

o sistema de comunicação pra que mesmo com a influência de regionalismos,

influência de estrangeirismos, pra que haja comunicação de maneira

padronizada. Então, digamos assim que gramática é o conjunto de regras que

regem a língua.

Observo que P2 define o termo “gramática” considerando as concepções

subjacentes à gramática normativa. Nesse sentido, a gramática se restringe à prescrição

de regras, à padronização e ao estabelecimento de regularidades da língua. Larsen-

Freeman (2001) ressalta que não é produtivo pensar em gramática como um conjunto de

estruturas descontextualizadas, estáticas e desprovidas de sentido, bem como não é útil

pensar em gramática unicamente como um conjunto de regras prescritivas sobre a forma

linguística. A autora destaca que as estruturas gramaticais não possuem apenas forma

(morfossintaxe). Elas também expressam sentidos (semântica) em contextos de uso

apropriado (pragmática). A definição fornecida por P2, no entanto, contempla

exclusivamente a forma em si e desconsidera as dimensões do sentido e do uso da

gramática.

Pergunta 4: Que concepção de gramática você utiliza para conduzir a

sua prática de ensino?

P2: Olha, isso depende do foco. Depende da necessidade do aluno. Depende

do foco do aprendizado do aluno. Por exemplo, quando você dá aula pro

ensino médio é um foco. É mais interpretação de texto, então, a gramática é

mais voltada pro Enem e pro vestibular. Tanto quanto pra interpretação de

texto, quanto perguntas. No próprio Enem tem perguntas específicas da

gramática. Agora quando é num curso que é um curso livre, a gramática é só

um apoio pra o aprendizado da língua no geral. Porque aí você trabalha as

quatro habilidades, né? Você trabalha, então, a interpretação de texto, né? A

oralidade, a audição, a escrita. Então, a gramática é só mais um instrumento.

Agora eu acho que quando é o inglês voltado para o cursinho pré-vestibular

ou segundo grau, ela é... digamos que é um foco maior na gramática.

Nesse trecho da entrevista, fica evidente a sensibilidade de P2 ao contexto de

atuação, atendendo ao parâmetro da particularidade proposto por Kumaravadivelu

(2001) em face de uma pedagogia pós-método. P2 deixa claro que os interesses e

objetivos do grupo de aprendizes precisam ser levados em consideração ao decidirmos

que perspectiva de ensino adotar. No entanto, me parece reducionista a visão de P2 em

relação ao papel que a gramática assume nas aulas de Ensino Médio e até mesmo em

78

cursos de pré-vestibular. Obviamente, este público almeja preparar-se para os exames

de Enem e vestibulares, porém pensar o ensino da língua, seja lá em que contexto for,

como mera instrumentalização para leitura e para aptidão em responder questões

essencialmente estruturais restringe consideravelmente a potencialidade da língua e de

sua gramática. De certa maneira, o posicionamento de P2 condiz com as orientações dos

PCN para o Ensino Fundamental (1998) que recomendam que a leitura seja o foco do

ensino das línguas estrangeiras modernas, haja vista as dificuldades de

operacionalização do ensino das demais habilidades. Só para ilustrar, os PCN apontam

os seguintes aspectos como desfavoráveis ao trabalho com as quatro habilidades: classes

superlotadas, carência de recursos didáticos, carga horária reduzida, pouco domínio da

oralidade por parte da maioria dos professores.

No entanto, alguns outros aspectos precisam ser também considerados e

refletidos: a) Embora considere a função primordial da leitura no ensino de línguas

estrangeiras, me parece que não pleitear o trabalho com as habilidades de produção (fala

e escrita) coloca o aluno em uma permanente condição de relativa passividade. Por que

relativa? Obviamente, não considero que a leitura seja uma atividade passiva, porém

faz-se necessário dar voz ao aprendiz através do desenvolvimento de habilidades de

produção; b) Considerando a cidade onde P2 atua, em que o turismo é a fonte principal

de renda de maior parte da população e onde centenas de turistas falantes de língua

inglesa circulam diariamente, é provável que os aprendizes tenham real interesse na

comunicação falada e seus objetivos de aprendizagem não se reduzam à aprovação em

exames escritos. Oportunidades de emprego, inclusive, muitas vezes dependem de uma

mínima habilidade com a oralidade; c) Mesmo que o professor não tenha condições de

trabalhar sistematicamente as quatro habilidades durante suas aulas, acredito que seja

possível, ainda que timidamente, garantir que alguma atenção seja dispensada às quatro

habilidades e d) O trabalho com as quatro habilidades dinamiza as aulas e motiva os

alunos.

Ainda nesse trecho da entrevista, quando P2 afirma “quando é num curso que é

um curso livre, a gramática é só um apoio pra o aprendizado da língua no geral e

quando é o inglês voltado para o cursinho pré-vestibular ou segundo grau, ela é...

digamos que é um foco maior na gramática”, percebo duas concepções bem antagônicas.

Na primeira perspectiva, em que se encaixam os cursos livres, a gramática funciona

como ferramenta para o aprendizado da língua como um todo. Parece-me que, nesse

contexto, ela aparece de maneira mais implícita. Na segunda perspectiva, em que se

enquadram as escolas de Ensino Médio e os cursos de pré-vestibular, considero que a

79

perspectiva é mais gramaticalizante, ou seja, com um fim em si mesmo, e se apresenta

mais explicitamente.

Pergunta 5: Em sua prática pedagógica você adota alguma orientação

teórica específica que fundamente os procedimentos utilizados para o

ensino de gramática?

P2: Olha, não claramente. Mas, a franquia ela te dá... bom, ela é baseada no

sistema áudio visual. Então, isso já te direciona. É uma franquia. Você

precisa seguir o que ela pede para ser seguido. E na faculdade a gente

aprendeu o que vem a ser áudio visual, tal. Mas a franquia não dá tratamento

específico explicando porque daquilo tudo e como funciona. Ela joga ali e

fala o jeito que eu tenho que trabalhar. Mas ela não dá nome aos bois, mas é

direcionado do jeito que a franquia pede.

PC: Vocês têm algum tipo de treinamento para utilizar a metodologia

recomendada pela franquia?

P2: Sim. Eu tenho um DVD, onde a gente passa o DVD baseado em

pequenas situações do cotidiano imitando o nativo em situação real e a partir

dali primeiro é trabalhado, como a ordem natural da língua, primeiro o aluno

escuta aquele diálogo, eu explico o que tá sendo falado ali, em inglês. A

explicação toda é vocabulário em inglês. Aí o aluno repete, meio que decora

aquela frase e só no final da aula que ele abre o livro, que ele vê aquilo

escrito e ao ver aquilo escrito, instiga a curiosidade de saber o porquê da

sistematização da frase daquele jeito. Então, parte-se da fala, repetição, da

internalização, depois a escrita e por último a gramática. A gramática é o

menos principal, é o foco menor. Mas a franquia, ela dá a metodologia, mas

ela não dá nome aos bois.

Nesse trecho, pode-se perceber que no contexto de atuação de P2, a metodologia

é estabelecida pela própria instituição. O professor limita-se a seguir as orientações

metodológicas da franquia. Os professores são treinados para seguir os procedimentos

do método utilizado, porém não existe uma discussão acerca dos pressupostos que

fundamentam a metodologia adotada. P2 deixa claro que a franquia fornece os subsídios

para que o professor saiba como proceder, no entanto, não existe uma preocupação em

discutir com seus profissionais as razões pelas quais tais procedimentos são adotados.

Desse modo, o professor segue a metodologia mecanicamente sem um senso de

compreensão e identificação por meio de uma rotina firmemente estabelecida, o que

Prabhu (1990) considera ser uma das causas do fracasso na implementação de métodos

de ensino.

O método em questão, que a professora identifica como o método audiovisual,

pode ser entendido como uma variação do método audiolingual, dadas as semelhanças

de procedimentos e as teorias de ensino em que ambos se apoiam. (FERNANDES,

2004, p. 11). Como P2 ilustra, o método fundamenta-se no princípio da reprodução de

enunciados que, no contexto de atuação de P2, são fornecidos através de material

gravado em DVD. Conforme Fernandes (2004, p.12), para esses atos de repetição

80

(respostas), diante do modelo fornecido (estímulo), seria emitido um reforço-positivo ou

negativo- pelo instrutor. Outra premissa do método suscitada pela professora é a ordem

em que as habilidades são trabalhadas nas aulas. A princípio os alunos ouvem, depois

falam (repetindo o modelo) para posteriormente, serem expostos à leitura e escrita. É

importante observar que P2 associa o modelo procedimental do método à “ordem

natural da língua”, ou seja, à maneira como adquirimos a língua materna. No entanto,

as atividades de repetição mecânica de estruturas concebem a aprendizagem da língua

como um processo mecânico, desvinculado das funções comunicativas e dos contextos

de uso da língua. Além disso, tais atividades são monótonas e desmotivadoras,

característica que não relembra com precisão a experiência prévia de aquisição da

língua materna. (RODRIGUES, 2005, p.47).

Quanto ao tratamento gramatical, em específico, P2 esclarece que o ensino

ocorre indutivamente. Os aprendizes são expostos a exemplos, os quais devem ser

repetidos e memorizados. Os enunciados de P2 parecem referendar a ideia de que a

incansável repetição de sentenças conduzirá à internalizarão e, consequentemente, ao

aprendizado da língua. Gramática, segundo P2, é o foco menor na aprendizagem e,

portanto, só lhe é dada alguma atenção no final do processo, quando as etapas de

escutar, falar, ler e escrever já tenham sido contempladas.

Pergunta 6: O material didático utilizado em suas aulas é

predeterminado pela instituição de ensino ou você tem autonomia para

escolhê-lo?

P2: Totalmente predeterminado. Os livros são feitos com uma gráfica própria

da franquia, que, aqui no Brasil, se encontra no Rio de Janeiro. Por exemplo,

quando o aluno faz a matrícula aqui, ele é obrigado a comprar o livro. A

franquia já fornece todo o material pronto. Desde o CD, o livro, a gente tem o

livro de texto, que é onde têm essas situações, esses dialogozinhos e a

gramática e o vocabulário. A gente tem o livro de compreensão auditiva, que

vem o cdzinho também que o aluno pode fazer em casa e marcar as respostas

e tem o livro de exercícios, o workbook, que é uma mistura de gramática, de

vocabulário, de tudo que é feito, que ele preenche ali lacunas ou marca x ou

etc. então, esse material já vem pronto do Rio de Janeiro e é obrigatório o uso

dele. Às vezes quando eu tenho a liberdade de fazer um warm up, quando eu

tenho uma aula extra na sexta feira eu posso fazer uma música... mas é bem

enfaixado, bem engessado.

PC: Mesmo que você queira somente inserir ou acrescentar algo, você

tem dificuldade em fazê-lo?

P2: Se a turma é muito boa, dá tempo de trazer bastante coisa. Eu trago o

máximo que posso.

PC: Esse material complementar é escolhido por você ou pela

instituição?

P2: Sim. A escolha é minha. E a maioria que eu trago é baseado em

exercícios gramaticais. A fala em sala de aula já é muito grande e os alunos

81

têm um pouco de dificuldade se eu trago exercícios baseados em fala porque

o método é tão encaixadinho que poucas vezes que eu trouxe exercícios de

trabalhar em pares, um conversando com o outro, eles ficaram um pouco

perdidos assim. Porque sai daquela coisa de professor pergunta aluno

responde, professor pergunta aluno responde, ou aluno pergunta a aluno, mas

todo mundo escutando, eu ajudando e tal. Trabalhar em pares, por exemplo,

só os dois ali, eles ficam perdidos achando que tão fazendo alguma coisa

errada. Então, sai um pouco, é raro, mas dá pra fazer.

Os trechos acima suscitam importantes questões a serem pensadas sobre o

contexto de atuação de P2. A princípio, percebo que a autonomia de P2 é bem restrita

em relação ao material didático. Por se tratar de uma franquia, como de costume, o

material é predeterminado e usado nas diferentes regiões do país, independente das

particularidades de cada região. P2 tem autonomia apenas para utilizar algum material

extra quando há também algum tempo extra, uma vez que o material didático deve ser

explorado completamente e o tempo disponível deve dar conta, prioritariamente, das

atividades propostas pelo material didático oficial. P2, entretanto, afirma que tenta

inserir atividades complementares sempre que possível, o que, às vezes, só é viável com

turmas que mantenham um bom ritmo no aprendizado e consigam cumprir as atividades

do livro um pouco antes do previsto. Percebo que P2, portanto, considera relevante a

inserção de material diversificado nas aulas. É válido ressaltar que somente nesses raros

momentos P2 parece ter real autonomia na condução de suas aulas.

Verifico também que P2 normalmente opta por exercícios gramaticais quando

tem a oportunidade de fornecer atividades extras para seus aprendizes, o que demonstra

que P2 não ignora as oportunidades de explorar a gramática da língua. Segundo ela, “A

fala em sala de aula já é muito grande e os alunos têm um pouco de dificuldade se eu

trago exercícios baseados em fala porque o método é tão encaixadinho que poucas vezes

que eu trouxe exercícios de trabalhar em pares, um conversando com o outro, eles

ficaram um pouco perdidos assim”. Merece atenção a diferença de sentido no emprego

da palavra “fala” mencionada por P2 nesse trecho. No primeiro momento, quando P2

afirma que a “fala” em sala de aula é muito grande, P2 se refere às atividades de

repetição e de prática controlada em que o professor media as perguntas e as respostas.

Em seguida, quando P2 menciona que “se eu trago exercícios baseados em fala”,

verifico que fala, nesse contexto, se refere à comunicação efetiva entre os estudantes.

Conforme P2, os alunos estão tão habituados à prática controlada que não sabem como

lidar com situações espontâneas de comunicação. A fala de P2 sugere que a interação

em sala de aula é muito limitada e os aprendizes não estão aptos a estabelecer

comunicação em pares ou pequenos grupos, uma vez que, via de regra, a ênfase na

língua oral acontece por meio de um processo mecânico e automatizado.

82

Considerando as premissas que subjazem o método em questão, em que a língua

é vista meramente como um conjunto de hábitos condicionados, P2 ao descrever o que

ocorre em sua sala de aula quando tenta promover a interação e a comunicação entre os

aprendizes, suscita uma das maiores críticas ao método audiolingual/audiovisual: a

dificuldade dos aprendizes em lidar com situações reais de comunicação no momento

em que se defrontavam com falantes nativos. O referido método ignora a capacidade

humana de gerar frases novas, ou seja, sua capacidade de se comunicar

espontaneamente (LEFFA, 1998).

Pergunta 7: Como você avalia a concepção de gramática presente no

material didático adotado? A perspectiva de ensino de gramática nesse

material condiz com a sua?

P2: Parcialmente sim. Bom, eu dou aula particular também. Na minha aula

particular eu uso comunicative aprroach, que é um material também em que

as aulas são todas dadas em inglês. Parcialmente também porque aqui se

segue a ordem natural da língua. Por exemplo, a gente quando criança, a

gente escuta os pais, ou vizinho ou irmão falando. A gente escuta, repete

aquilo no contexto, vai repetindo, e vai usando aquilo ali e vai aprendendo

como é que aquilo ali é feito, né? Então, meio que tenta forjar o ensino

natural da língua. Primeiro eles escutam, aí tem o visual pra ajudar a

entender, como a criança tem ali o visual no contexto do pai e da mãe

falando. Aqui a gente tem o visual imitando a vida real. Mas ele meio que

repete ali sem saber o porquê. Então ele repete bem focado na oralidade pra

depois dá a sistematização. Então, tenta-se imitar o aprendizado natural de

uma língua, né? Então, a gente tenta fazer isso aqui. Nesse sentido, condiz

um pouco com o que eu acredito que funcione. Mas a minha metodologia é

um pouco mais instigante. No meu material particular, eu dou mais materiais

autênticos, assim, revistas, depoimentos de pessoas, jornal, e aí eu coloco o

aluno pra pensar. Eu faço várias indagações sobre aquilo até ele..., eu puxo

dele, digamos assim, a gramática. Aqui não é muito assim. Então, aqui é um

pouco com o que eu acredito, mas parcialmente eu acredito mais nessa coisa

de tirar do aluno, ir fazendo perguntas até ele vê que a gramática é daquele

jeito. Então, eu tento fazer isso na minha aula particular, puxar dele. Às vezes

eles acertam, às vezes eles erram, às vezes eles ficam felizes em acertar e eu

vou fazendo de um jeito em que eu induzo ele a acertar. Então, parcialmente.

Aqui não é totalmente o que eu penso. Mas um pouco dessa coisa de tentar

imitar o processo natural da língua, sim.

Mais uma vez percebo que P2 recorre ao argumento da naturalidade,

considerando que o método adotado pelo material e pelo curso apresenta marcantes

semelhanças com a aquisição natural da língua materna. Entretanto, apesar de concordar

parcialmente com os procedimentos metodológicos em questão, P2 opta por uma

metodologia diferente quando tem autonomia para fazê-lo. Desse modo, P2 prefere

utilizar a abordagem comunicativa em suas aulas particulares. Observo que P2 não

apresenta uma posição de resistência ao método audiovisual, no entanto, destaca a sua

incompletude em alguns aspectos. Como exemplo, posso citar a ausência de materiais

autênticos e a possibilidade de reflexão gramatical por parte dos alunos. P2 caracteriza

83

como “mais instigante” uma proposta de ensino que vislumbre a participação efetiva

dos aprendizes na construção do conhecimento. O posicionamento de P2 sugere que

uma abordagem de ensino baseado na transmissão/ apresentação de gramática é menos

eficaz do que uma abordagem por meio da qual o aluno é desafiado, e ao mesmo tempo,

conduzido a trazer à tona o conhecimento. Segundo Thornbury (2001) uma abordagem

que se fundamenta na mera transmissão e apresentação de conteúdos assume que há

algo que os alunos desconhecem e que o papel do professor é prover este conhecimento.

Desse modo, partimos de um modelo de aprendizagem deficitário, como se os

aprendizes nada tivessem a oferecer. Os enunciados de P2 sugerem a sua discordância

em ignorar o conhecimento que o aprendiz traz consigo e o seu potencial para refletir

sobre a língua e tirar suas próprias conclusões sobre o seu funcionamento.

É importante ressaltar também o caráter pessoal conferido à metodologia usada em suas

aulas particulares quando a professora afirma que “a minha metodologia é mais

instigante”. Apesar de, a princípio, afirmar utilizar a abordagem comunicativa em suas

aulas particulares, P2 personaliza sua metodologia de ensino no trecho em destaque, o

que aponta para uma tendência no ensino de línguas de modo geral. Apesar de optar por

uma abordagem em específico, o professor crítico e reflexivo não mais adere

irrestritamente a uma determinada metodologia sem questionar os seus pressupostos e

suas reais contribuições para o aprendizado.

Pergunta 8: De que maneira os itens gramaticais são introduzidos em

suas aulas?

P2: Então, eles são introduzidos através de diálogos. São situações, né? Cada

unidade apresenta duas ou três situações, que podem ser independentes ou

pode ser uma história longa dividida em três pedaços. Então, cada situação,

primeiro eu apresento duas vezes sem falar nada. A primeira vez com pouca

figura. E a segunda vez o mesmo diálogo com mais figurinhas tentando

representar o que a pessoa tá falando. Depois eu parto para o explanation que

é mais focado no significado das palavras. Exemplo, tem o desenhinho do sol

e alguém falando Good morning. Então, ele já pensa que deve ser alguma

coisa a ver com o dia. Então, ele aprende mais instintivamente o vocabulário,

a pronúncia em si do que gramática. Então, ela é totalmente contextualizada

na fala. Aí, às vezes, assim, o material como é mais juvenil, voltado mais

para o público juvenil, tem algumas gírias. Por isso que eu digo que é mais

voltado para o vocabulário em si do que gramática. Então, ela é feita de

maneira não muito reflexiva. Ela é jogada para o aluno. Aí dependendo da

turma quando eu vejo que eles não estão conseguindo repetir, eu jogo uma

explicação gramatical ali na hora mesmo, mas bem pouca. Por exemplo,

quando eu dei comparativos de adjetivos. Começa com os curtos, né? Taller e

smaller, eles entenderam. Aí quando eu passei para o segundo diálogo e falou

more beautiful. Então, perguntaram por que não era beautifuller? Aí na hora

de repetir já. Então, não é beautifuller porque beautiful é longo. Então é more

beautiful. E já sigo a aula. E só no final vejo isso de novo. Eu acho ruim de

falar “Espera aí, depois eu te falo”. Ali, com o tempo o aluno pode desistir de

fazer essas perguntas. Aí eu jogo um pouquinho até onde eu posso, até onde

não atrapalhe a aula e aí continuo. Deixo para o final, quando nós abrimos o

livro, observamos as regras e os exemplos.

84

Diante do exposto por P2, pode-se observar que a aula segue uma ordem bem

estabelecida e os procedimentos são seguidos precisamente, o que pôde ser constatado

com as observações das aulas. O professor possui um manual que se configura em uma

espécie de roteiro de aula. Cabe ao professor, portanto, seguir todas as orientações e

procedimentos ali descritos. Observemos que P2 descreve cuidadosamente as etapas da

aula atentando, inclusive, para detalhes como “cada situação, primeiro eu apresento

duas vezes sem falar nada”. Parece configurar-se aqui um processo mecânico de

condução das aulas, no qual o professor tem quase nenhuma autonomia e cujo papel é

unicamente reproduzir as orientações do manual.

Como já enfatizado por P2 previamente, a fala constitui a base para o ensino

tanto do vocabulário quanto da própria gramática. As palavras e a estrutura gramatical a

serem trabalhadas na aula estão presentes nos diálogos. Os aprendizes repetem as

estruturas associando-as às imagens disponíveis. Conforme P2, caso os alunos não

questionem a respeito da gramática, a aula prossegue sem qualquer intervenção nesse

sentido, visto que a sistematização acontece apenas no fim da aula, quando os alunos

provavelmente já memorizaram as sentenças contendo a estrutura gramatical em estudo.

Observo, entretanto, que P2 não corrobora a perspectiva de ter o aluno apenas

reproduzindo frases sem o entendimento do seu funcionamento. Desse modo, ela

interfere e explicita a regra quando julga necessário, como descrito no trecho “Por

exemplo, quando eu dei comparativos de adjetivos. Começa com os curtos, né? Taller e

smaller, eles entenderam. Aí quando eu passei para o segundo diálogo e falou more

beautiful. Então, perguntaram por que não era beautifuller? Aí na hora de repetir já.

Então, não é beautifuller porque beautiful é longo. Então é more beautiful. E já sigo a

aula. E só no final vejo isso de novo”. Ainda assim, percebo que a instrução gramatical

nessa etapa da aula se configura quase como um tópico proibido. P2 se limita a uma

explicação o mais breve o possível “até onde não atrapalhe a aula”. Afinal, a aula

precisa seguir a sequência prescrita no manual, segundo o qual a regra é explicitada no

final da aula. P2, entretanto, se desprende da prescrição metodológica quando precisa

atender a uma solicitação do aprendiz, considerando a importância de elucidar as

dúvidas e de estimulá-lo a questionar quando houver a necessidade.

Então, resumidamente, diria que a instrução gramatical ocorre, a princípio,

através da exposição ao insumo. O aprendiz supostamente internaliza as estruturas

linguísticas através da imitação. Nesses moldes de ensino, a gramática ensinada é a

normativa. “Os alunos, portanto, devem praticar a língua, ou seja, repeti-la. Os erros são

85

vistos como desvios a serem evitados a fim de não serem internalizados pelo aluno. Por

isso, o aprendiz não é encorajado a experimentar ou usar a língua de forma espontânea,

autônoma e criativa” (SCHULZ; VIAPIANA, 2012, p. 6).

Como se pode verificar tanto na descrição de P2 quanto nas aulas observadas, de

fato, não existem oportunidades de uso efetivo da língua e de produção utilizando as

estruturas gramaticais em estudo. O desenvolvimento da habilidade oral restringe-se à

reprodução dos padrões linguísticos e à prática controlada através de drills. Mais uma

vez pondero que não descarto a validade desses tipos de procedimentos, mas questiono

se o seu uso exclusivo poderá contribuir para o desenvolvimento da competência

comunicativa do aprendiz.

Pergunta 9: Alguns teóricos defendem que o ensino da gramática deve

ser evitado ou, até mesmo, banido da sala de aula. Qual é o seu

posicionamento em relação a isso?

P2: Olha, isso aí eu acho muito enfaixado. Eu acho que depende muito do

contexto da sala de aula, da faixa etária, do objetivo do aluno em aprender a

língua. Eu já dei aula em franquias onde a gramática era quase que ignorada.

Os alunos aprendiam por repetição, simplesmente por repetição e

substituição. Por exemplo, This chair is blue. This chair is yellow. This chair

is white. Aí eles pensavam “então deve ser as cores”. Então, eles iam por

instinto aí. Só que quando ia pra Those chairs are white. Eles não sabiam por

que não bota s em white, por exemplo. Então, demorava um pouco mais para

eles entenderem a sistematização, mas eles decoravam. Se eles chegavam

num restaurante e pediam I wanna a steak, please? Aí se a pessoa falava

rare, médium aí eles já travavam. Eles só sabiam falar I wanna a steak with

french fries e pronto. Porque decorou. Agora se o garçom sai daquele

contexto e pergunta rare or medium a pessoa já travava. Eu acho que quando

você dá um pouco de gramática, ela dá um pouco mais de flexibilidade de

expressar o que se quer naquele contexto. Agora se você dá a comunicação

por si só, ela pode ficar enfaixada, ele pode ficar com aquela decoreba e com

aquilo a pessoa pode sentir insegurança e não conseguir comunicar. Então,

não pode ser nada radical. Então, eu acho um muito radical achar que a

gramática tem que ser banida. Mas também acho absurdo também no

vestibular colocar regrinhas que não vão atrapalhar a comunicação. Então,

como a língua é um processo que tá sempre em andamento, tá sempre em

evolução, assim também tem que ser a metodologia de ensino da gramática e

da língua em si. Não deve ser radical.

Nesse trecho, o posicionamento de P2 demonstra sua oposição à exclusão da

instrução gramatical das aulas de LE, tendo em vista a flexibilidade que a gramática

proporciona. A professora revela certo ceticismo em relação a propostas de ensino cujo

foco seja exclusivamente a comunicação. No entanto, parece-me que P2 tem uma visão

um tanto equivocada em relação ao ensino com foco na comunicação, associando este

tipo de ensino às práticas automatizadas de repetição e substituição e,

consequentemente, memorização. Na verdade, quando P2 afirma que “Eu já dei aula em

franquias onde a gramática era quase que ignorada. Os alunos aprendiam por repetição,

86

simplesmente por repetição e substituição. Por exemplo, This chair is blue. Yellow. This

chair is yellow. White. This chair is white. Aí eles pensavam então deve ser as cores.

Então, eles iam por instinto aí. Só que quando ia pra Those chairs are white. Eles não

sabiam por que não bota s em White, por exemplo”, verifico diversas semelhanças entre

os procedimentos aqui descritos com aqueles adotados em seu atual contexto de

atuação. O único aspecto que parece distinguir o cenário descrito e o seu cenário de

atuação é que um ignora a instrução gramatical ao passo que o outro reserva um tempo

no final das lições para que as regras gramaticais sejam explicitadas.

Por outro lado, P2 também parece rejeitar uma proposta gramaticalizante que

enfatize “regrinhas que não vão atrapalhar a comunicação”, afirmando que no que tange

ao ensino de uma língua, de natureza dinâmica e evolutiva, não podemos ser radicais.

Desse modo, percebo que P2 não corrobora a exclusão da gramática da sala de aula bem

como não coaduna com uma proposta que priorize o conhecimento sobre a língua em

detrimento do conhecimento da língua. Para P2, o conhecimento sobre a língua

funciona como um facilitador para a comunicação, já que “... quando você dá um pouco

de gramática, ela dá um pouco mais de flexibilidade de expressar o que se quer naquele

contexto”. Nesse sentido, observo que P2 vislumbra a gramática como ferramenta de

veiculação de sentidos em diferentes contextos de uso, embora sua prévia definição do

termo gramática (resposta à pergunta 2) tenha se aproximado mais da noção de

gramática como recurso de padronização do que como recurso de flexibilização.

4.3 Análise das aulas

Esta seção, dedicada à análise das aulas observadas, pretende elucidar que

estratégias são utilizadas pelas professoras participantes desta pesquisa para conduzir o

ensino da gramática. Além disso, objetivo verificar se a maneira como a gramática é

abordada nas aulas direciona a atenção dos aprendizes tanto para a forma quanto para o

significado e uso da língua. Através dessas análises, poderei verificar que aspectos

contextuais, ou seja, fatores relacionados ao contexto de atuação destas profissionais,

interferem no trabalho com a gramática em sala de aula.

Conforme mencionado no capítulo sobre os pressupostos metodológicos, optei

por analisar duas aulas geminadas de P1 e uma aula de P2, considerando as aulas com

maior índice de saliência de aspectos gramaticais e também por termos verificado certa

87

regularidade na condução das aulas, sendo que durante o período total de observação

não verifiquei diversificação dos procedimentos e estratégias utilizadas.

Metodologicamente, optei por fazer uma descrição detalhada das aulas incluindo

excertos com a transcrição dos enunciados de P1 e P2, bem como das interações com os

aprendizes. Dividi essa descrição em etapas para que pudéssemos destacar os aspectos

relevantes de diferentes momentos da aula. As aulas de P1 foram descritas em quatro

etapas e a aula de P2 foi descrita em sete etapas.

Observe-se que, para fins de transcrição, utilizo as siglas P1 e P2 para me referir

às professoras, AA para me referir aos alunos coletivamente e uso nomes fictícios para

me referir a algum aluno individualmente.

Aulas de P1

Etapa 1

P1 inicia a aula cumprimentando os alunos e esclarecendo que irá apresentar

conteúdo novo da unidade e aconselha os estudantes a registrarem anotações para fins

de consulta posterior. Em seguida, P1 inicia a explicação sobre o conteúdo da aula, que

se refere aos advérbios de frequência. Observemos o excerto abaixo com as explicações

fornecidas por P1:

Excerto 1:

P1: Então tá, olha só. Quando nós falamos a respeito de frequência, quais as palavras

que vêm a sua mente? Quando eu quero representar a frequência em que eu faço alguma coisa,

quais são as palavras que a gente usa? Advérbios de frequência, né? Advérbios de frequência

em língua portuguesa, vocês sabem do que se trata, né? Quando você quer dizer, por exemplo,

que você vem de ônibus pra escola. O que você diz?

Joana: Eu sempre venho de ônibus pra escola.

P1: Isso. Você usa “sempre”. Quando você quer dizer que você só vem a pé pra escola.

O que você usaria pra dizer a frequência em que você vem de ônibus?

Gabriel: De vez em quando.

P1: Quando você só vem a pé, como você diria a frequência em que você vem de

ônibus?

Ana: Nunca.

P1. Isso. Eu só venho a pé. Então, eu nunca venho de ônibus para a escola. Agora, e se

você vem para a escola de ônibus uma vez ou outra, a cada quatro ou cinco dias?

Rafael: Às vezes.

P1: Então, essas palavras são chamadas de advérbios de frequência, tá? É quando você

diz “sempre”, “às vezes”, “nunca”, “frequentemente”, “geralmente”. Então, são palavras que

você usa para expressar a frequência. Em inglês, não é diferente, mas existem algumas regrinhas

88

que nós precisamos conhecer pra podermos estruturar a nossa fala corretamente. Em português,

não é dada muita atenção a isso. Eu não sei se é da língua portuguesa mesmo não se preocupar

com isso. Mas o fato é que em inglês é diferente. Existe uma regra pra você se expressar

corretamente e essa regra precisa ser respeitada, pelo menos enquanto nós estivermos falando

em gramática normativa. Depois, se você quiser falar tudo embolado pra lá, isso é um problema

seu, entendeu? Mas gramaticalmente falando, existem regras e essas regras precisam ser

conhecidas pela pessoa desejosa a aprender a falar corretamente, Então tá, vamos fazer aqui o

gráfico, o esboço da frequência.

Através do excerto 1 verifico que a prática de P1 possui convergência com uma

abordagem de ensino tradicional de línguas, uma vez que preserva algumas

características do método gramática-tradução, dentre as quais posso destacar o ensino da

língua por meio da língua materna e o conhecimento explícito das regras gramaticais

para formação de frases (LEFFA,1988). Como mencionado previamente durante a

entrevista, P1 considera necessária a construção de um paralelo com a língua materna.

P1 inicia a apresentação do conteúdo gramatical trazendo à tona o conhecimento dos

aprendizes em relação aos advérbios de frequência da língua portuguesa. Para P1, esse

procedimento facilita o entendimento, uma vez que faz com que os aprendizes

percebam as semelhanças existentes entre as duas línguas.

O excerto acima nos permite verificar ainda a preocupação de P1 com a

gramática normativa. P1 reforça o pensamento de que os aprendizes precisam aprender

a falar “corretamente”. E falar “corretamente”, a seu ver, significa obedecer

categoricamente às regras gramaticais, desconsiderando, inclusive, que em situações de

uso autêntico da língua, algumas dessas regras são comumente infligidas sem prejuízo

para o sentido. Além disso, depreende-se do excerto acima a noção de que apenas a

norma culta é admitida e o usuário que negligencia esse padrão socialmente

estabelecido terá um problema de comunicação, como fica nítido no trecho “Depois, se

você quiser falar tudo embolado pra lá, isso é um problema seu, entendeu? Mas

gramaticalmente falando, existem regras e essas regras precisam ser conhecidas pela

pessoa desejosa a aprender a falar corretamente”.

Etapa 2

P1 faz a as seguintes anotações no quadro e pede que os alunos as registrem no caderno:

89

100% _____________ 75% ____________50% _________ 25%____________0%

(always) (frequently) (sometimes) (rarely) (never)

(generally) (seldom)

(normally)

(often)

P1 prossegue com as explicações a respeito do esboço acima:

Excerto 2

P1: Eu costumo fazer essa linha de frequência. Por exemplo, quando você fala em 100%

do tempo? Como você chamaria em português? Sempre, né? Em inglês, eu vou chamar de

always. Então, always é 100% do tempo. Depois a gente cai um pouquinho. Essa frequência cai

para, digamos assim, 75% do tempo. Sabe aquela coisa que é, tipo assim, cinco vezes por

semana. Já não é sempre mais. Esse aqui eu vou chamar de frequently. Quando você fala

frequentemente é um pouco menos que sempre. Então, em inglês, tem várias palavras que nós

podemos considerar sinônimas de frequently. Eu posso chamar também de generally, normally

ou often. Generally eu posso chamar de geralmente, normally de normalmente e often é

frequentemente também. Caindo mais um pouquinho a frequência, pra 50%, nós temos o “às

vezes”. Às vezes eu vou, às vezes eu não vou. Eu vou chamar isso aqui de sometimes.

Sometimes é o famoso “às vezes”, o famoso “de vez em quando”, tá? Caindo mais um

pouquinho minha frequência, eu venho pra 25% do tempo. Sabe aquela coisa mais esporádica?

Quando é mais esporádico a gente chama de “raramente”, não é? Eu vou chamar isso de rarely.

Alguns livros trazem também uma palavra um pouquinho mais eloquente, que é a palavra

seldom. O seldom é uma palavra mais bem elaborada, digamos assim. Então, dificilmente, você

ouve uma pessoa com um linguajar mais popular usando a palavra seldom, tá? Usa-se mais

rarely.

Então, se vocês precisarem colocar a tradução, fiquem à vontade. Na verdade, o meu

objetivo com vocês vai ser que vocês memorizem os advérbios de frequência porque vocês

precisam saber que frequência vocês vão querer expressar quando vocês estiverem falando. Mas

assim, isso vai ser secundário. Primeiramente, vai entrar a parte da gramática, a parte da forma

correta de vocês estruturarem a frase. Vocês já conheciam todas essas palavras?

AA: Não.

P1: Então, voltando aqui em português claro. O que significa always?

AA: Sempre.

P1: Frequently?

AA: Frequentemente.

P1: Generally?

AA: Geralmente.

P1: Normally?

AA: Normalmente.

P1: Often?

AA: Frequentemente.

P1: Sometimes?

AA: Às vezes.

P1: Rarely?

AA: Raramente.

P1: Seldom?

AA: Raramente.

P1: Never?

90

AA: Nunca.

Os procedimentos adotados na etapa 2 evidenciam que o modelo de ensino

proposto por P1 organiza hierarquicamente as dimensões da forma e do sentido. P1

deixa nítido que a preocupação prioritária dos aprendizes deve residir na estruturação da

frase, ou seja, o essencial é que os aprendizes consigam posicionar os advérbios

adequadamente na sentença. Por outro lado, o sentido expresso pelas formas em uso é

caracterizado como secundário por P1.Vale ressaltar ainda que o discurso de P1 sugere

que a dimensão do sentido se esgota em um mero processo de memorização. Tais

considerações ficam evidenciadas no trecho “o meu objetivo com vocês vai ser que

vocês memorizem os advérbios de frequência porque vocês precisam saber que

frequência vocês vão querer expressar quando vocês estiverem falando. Mas assim, isso

vai ser secundário. Primeiramente, vai entrar a parte da gramática, a parte da forma

correta de vocês estruturarem a frase”.

Ainda na etapa 2, pode-se verificar uma relevante divergência entre o discurso e

a prática de P1. Durante a entrevista, P1 menciona que, com base na sua experiência de

aprendizagem, considera importante que o aprendiz compreenda o contexto, que a

tradução das palavras seja evitada e que os aprendizes possam compreender seus

significados sem buscar um referencial na língua portuguesa. No entanto, os

procedimentos adotados a fim de introduzir os advérbios de frequência são

notoriamente um contraponto às referidas proposições de P1 durante a entrevista. Na

prática, P1 optou por utilizar a tradução como recurso exclusivo na condução do ensino.

E embora tenha mencionado a importância da compreensão do contexto, não houve

contextualização efetiva que possibilitasse que os aprendizes inferissem os significados

sem necessidade do referencial da língua portuguesa. Desse modo, houve pouca ou

nenhuma participação dos aprendizes na construção dos sentidos, caracterizando um

modelo centralizador de ensino em que o professor é o detentor do conhecimento a ser

transmitido aos aprendizes.

Acredito que o conteúdo trabalhado, inclusive, proporciona vastas possibilidades de

contextualização. Para fins de ilustração, esboço uma atividade que poderia contribuir

para o processo de inferência dos sentidos dos advérbios de frequência:

1. Os aprendizes seriam expostos a uma sequência de sentenças descrevendo

aspectos da rotina da escola.

Exemplos:

91

The classes always start at 7:30.

The students sometimes have classes on Saturdays.

The students never have Italian classes.

Students usually walk around the halls during the break.25

2. Após a leitura das sentenças acima e a observação do uso dos advérbios de

frequência, os aprendizes responderiam a uma atividade de Verdadeiro ou Falso

sobre aspectos restritos à sua sala de aula.

Exemplos:

Ana always comes to school by bus. ( )

João never uses the cell phone in class. ( )

The teacher often asks the students to make silence. ( ) 26

Em seguida, os aprendizes poderiam ser questionados sobre a posição do

advérbio na frase e deduzirem a regra subtendida nos exemplos.

Através de atividades dessa natureza, os aprendizes teriam o primeiro contato

com o item em estudo de maneira mais contextualizada e sem a necessidade da

explicação gramatical, a priori.

Afinal, como ressalta Widodo (2006), a explicação gramatical é dificilmente

lembrada como outras formas de apresentação, tais como a demonstração.

Obviamente, destaco que o exemplo fornecido é apenas uma entre tantas outras

possibilidades de contextualizar e explorar o conteúdo. O próprio livro didático adotado

na escola traz uma proposta bastante interessante. A unidade 2 do livro, que apresenta

como um dos objetivos a identificação e utilização dos advérbios de frequência, propõe

uma reflexão sobre estereótipos e fornece exemplos em que os advérbios de frequência

são utilizados, tais como They always carry an umbrella27

e They are always punctual28

ao se referir aos estereótipos britânicos. Uma das atividades propostas no livro ainda

sugere que os alunos discutam em classe e façam uma lista de outros estereótipos

25

As aulas sempre começam às 07:30.

Os estudantes, às vezes, têm aulas aos sábados.

Os estudantes nunca têm aulas de italiano.

Os estudantes normalmente caminham pelos corredores durante o intervalo. 26

Ana sempre vem para a escola de ônibus.

João nunca usa o celular na sala.

A professora frequentemente pede aos estudantes que façam silêncio. 27

Eles sempre carregam um guarda-chuva. 28

Eles são sempre pontuais

92

conhecidos pelos estudantes. O material orienta que os professores peçam exemplos de

estereótipos de mineiros, gaúchos, baianos etc. Portanto, o professor poderia construir

essa lista juntamente com os alunos e escrever no quadro os exemplos. Em muitos

desses exemplos, o uso dos advérbios de frequência seria possível, como em Gaúchos

usually eat barbecue29

ou Baianos are always late30

. Além de direcionar a atenção dos

aprendizes para a forma em uso, os exemplos fornecidos poderiam provocar uma

proveitosa discussão em torno do tema. Essa seria uma oportunidade de demonstrar aos

aprendizes que estereótipos não traduzem uma verdade irrefutável, uma vez que

consistem em generalizações simplistas que podem, inclusive, originar discursos

preconceituosos. Considerando que a sala de aula é um espaço onde devemos

ultrapassar os limites do ensino promotor do domínio cognitivo e favorecer o

reconhecimento, compreensão e respeito às diferenças étnicas e culturais, a discussão

acerca dos estereótipos seria uma importante ocasião para refletir tais diferenças.

Embora o livro possua essa interessante proposta, P1 optou por não utilizar as

atividades fornecidas no material e preferiu partir para a explicitação do tópico

gramatical. Nesse sentido, a prática de P1 condiz com seu discurso, uma vez que P1

afirmou durante a entrevista que o livro é utilizado apenas depois que o conteúdo

gramatical é previamente exposto.

Etapa 3

Excerto 3

P1: Muito bem. Então, qual é a jogada aqui? A jogada aqui está na forma correta de

você colocar esse advérbio na frase. Em português, você fala assim “Eu vou para a escola de

vez em quando de ônibus” ou “Eu vou para a praia sempre”, não é assim? Em Inglês, não pode

acontecer dessa maneira. Em inglês, existe a ordem correta para você colocar. E a ordem correta

é...

P1, então, anota no quadro: Sujeito + advérbio + verbo + complemento.

Excerto 4

P1: É como se fosse uma fórmula matemática. Não é uma fórmula matemática, mas é

uma fórmula gramatical. Essa é a ordem que você deve usar ao estar se expressando ao utilizar

um advérbio de frequência. Eu digo, por exemplo, “Eu sempre peço aos meus alunos que façam

silêncio, mas eles nunca fazem”. Então, em português, pelo menos no meu caso, a partir do

momento que eu conheci isso daqui, há muito tempo atrás, eu me acostumei com essa forma de

me colocar. Então, até quando eu falo português, eu sempre coloco o advérbio na posição certa

29

Gaúchos geralmente comem churrasco. 30

Baianos estão sempre atrasados.

93

na frase. Eu não sei se isso é também uma exigência da língua portuguesa. Vou até perguntar

pra uma professora de língua portuguesa. Mas, em inglês, isso é importante. E é exatamente isso

que vai ser cobrado na prova. Então, é bem simples. Não é um assunto que nós vamos ficar

quatro ou cinco aulas falando disso. Pra mim, basta que vocês memorizem essa fórmula aqui e o

assunto já está encerrado. Então, só tem uma coisa importante sobre o advérbio de frequência

que vocês precisam lembrar. Porque é isso que eu vou cobrar de vocês. E o que é isso que eu

vou cobrar? É justamente a ordem em que eu estruturo o que eu quero falar. Então, primeiro

vem o sujeito, depois vem o advérbio, depois vem o verbo e depois vem o complemento.

Porém, tem uma exceção. A exceção vai ocorrer quando estivermos falando do verbo to be. Isso

eu vou precisar que vocês lembrem. Olha aí o verbo to be de novo batendo a nossa porta. O

verbo to be, ele virá antes do advérbio de frequência. Então, quando for o verbo to be, teremos

primeiro o sujeito, depois o verbo to be, depois o advérbio de frequência e por fim, o

complemento. Essa regrazinha eu preciso que vocês coloquem aí como um caso especial. Então,

com o verbo to be é diferente. É um caso especial. Anotem aí. A ordem dele é diferente. É

sujeito, verbo to be, advérbio e depois complemento. Então, eu não vou dizer “Eu sempre estou

em casa aos domingos”. Eu preciso dizer “Eu estou sempre em casa aos domingos”.

Entenderam? Não posso dizer “Ela sempre cansada depois do trabalho”. O correto é “Ela está

sempre cansada depois do trabalho”. Então, quando for verbo To be, a ordem vai ser diferente.

Eu preciso que vocês memorizem porque essa é uma regra. É mais uma regra que vocês vão

memorizar para que vocês possam falar corretamente, tá bom?

Nessa etapa da aula, percebo nitidamente que P1 direciona a atenção dos

aprendizes unicamente para a forma e os procedimentos adotados não contemplam as

dimensões do significado e do uso.

Larsen-Freeman (2001) ressalta que equacionar a gramática com a forma e o

ensino de gramática com o ensino das regras linguísticas explícitas concernentes à

forma é excessivamente limitador. A autora salienta ainda que gramática tem a ver com

forma e uma maneira de ensinar a forma é mostrar as regras, entretanto, ressalva que

gramática é muito mais do que forma e que o ensino que se restringe ao ensino das

regras é pouco proveitoso. Nesse sentido, Larsen-Freeman (2001) propõe um modelo

tridimensional de gramática que contempla a forma (padrões morfossintáticos, lexicais e

fonéticos), o significado (significados gramaticais e lexicais) e o uso (contexto social,

contexto linguístico discursivo e pressuposições sobre o contexto). Essas dimensões

estão interconectadas, porém não devem ser concebidas hierarquicamente. Desse modo,

presumo que no ensino da gramática, a forma não deve ser priorizada em detrimento das

dimensões do uso e do sentido. A atenção dos aprendizes deve ser direcionada às três

dimensões para que tanto a forma, quanto o uso e o significado sejam contemplados.

Afinal, saber estruturar uma sentença sem saber quando, porque e que sentido essa

estrutura veicula não teria uma finalidade prática.

Os procedimentos adotados por P1, no entanto, priorizam a organização da

sentença e evidenciam que sua concepção de gramática converge com uma perspectiva

meramente estruturalista, o que também poderá ser verificado através dos exercícios

propostos na etapa seguinte da aula.

94

Etapa 4

P1 propõe uma atividade escrita. P1, então, escreve no quadro a seguinte

atividade para que os alunos copiem e respondam:

Exercício 1

Organize as frases abaixo:

a) Julia/by bus/always/to school/goes

b) never/soccer/on weekends/play/you

c) sometimes/explains/the teacher/exercises

d) I/study/frequently/for the tests

e) are/at home/you/always31

P1 ressalta que o exercício servirá para que os estudantes memorizem a estrutura

e os orienta a consultarem as anotações para completarem a atividade. Os estudantes

iniciam a atividade e P1 caminha pela sala auxiliando os alunos com dificuldades na

execução da tarefa. Após o término da atividade, P1 prossegue com a correção. No

excerto abaixo visualizamos de que maneira P1 conduz a correção:

Excerto 5

P1: Olha só, como vocês colocaram isso daqui na ordem certa?

A1: Júlia goes...

P1: Olha só, o que vem depois do sujeito?

AA: O advérbio

AA: O verbo

P1: É o verbo to be que tem nessa frase?

AA: Não

P1: Se não é verbo to be, o que vem depois do sujeito?

AA: O advérbio

P1: Então, quem é o advérbio?

AA: Always

P1: Então, o que vem depois do advérbio?

AA: O verbo

P1: Isso. E quem é o verbo nessa frase?

AA: Goes

31

a) Julia/de ônibus/sempre/para a escola/vai

b) nunca/futebol/ nos fins de semana/ joga/ você

c) às vezes/explica/a professora/exercícios

d) Eu/estudo/frequentemente/para os testes

e) está/em casa/você/sempre

95

P1: Então, vai ficar Julia always goes...”. E quem são os complementos?

AA: To school by bus

P1: Muito bem. Então, temos Julia always goes to school by bus. A ordem corretinha.

As demais sentenças são corrigidas seguindo a mesma dinâmica. Na sentença E,

entretanto, P1 salienta que quando o verbo empregado for o verbo to be, a ordem é

diferenciada, pois se trata de um caso especial.

Em seguida, P1 comunica aos aprendizes que eles farão uma atividade de

produção em que terão que escrever dez frases usando advérbios de frequência, sendo

que em cinco delas o verbo to be deve ser empregado e nas demais devem ser

empregados os verbos sugeridos por P1 e anotados no quadro. P1, então, registra as

seguintes anotações no quadro:

Exercício 2

Produzir dez frases utilizando os advérbios de frequência e os verbos fornecidos:

Verbo To be Verbos Complementos

Am Play At home

Is Study At the park

Are Watch At the beach

Wash On Mondays

Eat On weekends

Work On my birthday

Play

Drink

go

P1 salienta que os alunos podem usar outros complementos e orienta os

aprendizes a realizarem a tarefa em casa e entregarem na aula seguinte. Por fim, P1

despede-se dos aprendizes e finaliza a aula.

O primeiro exercício proposto demonstra notoriamente a preocupação de P1

com a organização das frases. Dessa maneira, o único objetivo perceptível no exercício

concerne à prática da regra de ordenação de estruturas que contenham os advérbios de

frequência. Observo, portanto, que os exemplos fornecidos no exercício são

completamente descontextualizados e que não há nenhuma tentativa de explorar o

96

significado e o uso de tais estruturas. Larsen-Freeman (2001) sugere que para lidar com

qualquer estrutura gramatical, o professor precisa partir de alguns questionamentos

básicos: Como ela é formada? O que ela significa? Quando e por que ela é usada? O

exercício 1 e os procedimentos de correção adotados por P1, no entanto, parecem

contemplar apenas o primeiro questionamento. No final da aula, é provável que os

aprendizes consigam explicitar as regras apresentadas. Porém, é também provável que

esse conhecimento não ultrapasse os limites da sala de aula, uma vez que não foi

estabelecida uma relação entre a forma e seu significado e uso efetivo.

Nesse sentido, Larsen-Freeman (2001) fala sobre a existência de um

conhecimento inerte. Segundo a autora, o conhecimento inerte é o conhecimento que

pode ser recordado pelo aprendiz quando lhe é solicitado, porém não está disponível em

situações de uso espontâneo. Desse modo, o conhecimento permanece inerte quando ele

não está disponível para ser transferido do contexto da sala de aula para o mundo. Para

Larsen-Freeman, quando as condições de aprendizado são associadas à aplicabilidade, é

mais provável que essa transferência aconteça. No entanto, as condições de aprendizado

fornecidas por P1 parecem não favorecer essa importante relação com a aplicação do

conhecimento.

Ainda nessa etapa da aula, através do segundo exercício proposto, percebo a

intenção de P1 em promover uma oportunidade de produção. No entanto, é válido

questionar se a proposta de P1, de fato, se caracteriza como uma atividade de produção.

Afinal, P1 predetermina os verbos a serem utilizados e, de certa maneira, limita as

possibilidades de produção do aprendiz. Quando pensamos em produção, na verdade,

pensamos em oportunidades de interagir por meio da língua veiculando sentidos e tendo

um propósito comunicativo em mente. No exercício proposto, entretanto, não vislumbro

um propósito comunicativo e muito menos uma preocupação com o sentido veiculado

pelas sentenças. Diante da proposta de P1, é provável que os aprendizes elaborem frases

descontextualizadas e sem significado. Desse modo, mais uma vez percebo uma

necessidade de interação do ensino proposto com o uso efetivo da língua.

Aula de P2

Etapa 1

97

P2 inicia a aula cumprimentando os alunos. Em seguida, P2 apresenta um vídeo

no qual o vocabulário da unidade é apresentado. Esta seção é intitulada words in action.

Os alunos visualizam imagens acompanhadas do áudio que as descrevem. P2 orienta os

aprendizes a ouvirem e repetirem as seguintes palavras e frases transmitidas no vídeo:

forehead, the woman is kissing the baby forehead, tooth, this baby has only one tooth,

teeth, this woman has beautiful teeth, toothbrush, toothpaste, lights, the lights are on,

fair, some different kinds of fairs, she’s a brunette, mobile phone, cell phone, he’s

holding a mobile phone, brownies, this brownie looks delicious.

Ao finalizarem essa atividade, P2 exibe a próxima seção do vídeo intitulada

What’s going on?. Nessa seção, mais uma vez são exibidas imagens acompanhadas de

áudio e os estudantes são orientados a repetirem os enunciados: He’s brushing his teeth,

she’s brushing her hair.

Em seguida, P2 exibe uma imagem na qual um garoto com um ferimento na

testa conversa com uma garota. P2, então esclarece:

Excerto 1

P2: Look at this picture. This girl is this boy’s friend, ok? She is his friend. What do you think

they are talking about?

João: His accident.

Maria: His forehead.32

Como se percebe, esta primeira etapa da aula introduz novo vocabulário através

da associação de palavras e frases a imagens. Os aprendizes precisam repetir a fim de

que memorizem os itens lexicais que brevemente serão retomados durante as próximas

etapas da aula. Desde o início da aula, portanto, percebo que a repetição é um elemento

chave na condução do ensino.

Outro aspecto evidente nessa primeira etapa se refere à descontextualização do

vocabulário durante a apresentação. As palavras são apresentadas isoladamente ou em

sentenças também descontextualizas, uma vez que não há nenhum tipo de relação direta

entre as sentenças utilizadas.

Etapa 2

32

P2: Olhe a ilustração. Esta garota é amiga deste garoto, ok? Ela é amiga dele. Sobre o que vocês acham

que eles estão conversando?

A1: O acidente dele.

A2: A testa dele.

98

P2 exibe a Situação 1. Conforme P2 mencionou na entrevista, cada unidade de

ensino do livro contem três situações que simulam situações do cotidiano. Na Situação

1, um garoto narra à amiga um pequeno acidente ocorrido na noite anterior, o que

provocou um ferimento em sua testa, através do seguinte diálogo:

Girl: What happened to your forehead?

Boy: The power went out last night while I was brushing my teeth.

Girl: So?

Boy: When I bent down to rinse the toothpaste out of my mouth I hit my head on the

faucet.33

P2 exibe a situação duas vezes. Em seguida, P2 segue para a etapa denominada

de “explicação” (Explanation), em que ela explora cada enunciado do diálogo através

de perguntas. Antes de fazer perguntas sobre cada enunciado, P2 repete o áudio por três

vezes. Sobre o primeiro enunciado What happened to your forehead?, P2 questiona:

Excerto 2

P2: What do we call this part of our body? (apontando para a testa do garoto)

AA: Forehead.

P2: Very good! Look at this boy’s forehead. Did something happen to his forehead?

AA: Yes.

P2: Does the girl know what happened to his forehead?

AA: No.

P2: What is she asking the boy?

Carlos: What happened with your forehead?

P2: No, no, no. What happened to your forehead? Repeat!

Carlos: What happened to your forehead?34

P2, então, exibe a passagem várias vezes até que cada aluno tenha repetido o

enunciado individualmente.

33

Garota: O que aconteceu com sua testa?

Garoto: A energia foi embora ontem à noite enquanto eu estava escovando meus dentes.

Garota: E daí?

Garoto: Quando eu abaixei para cuspir a pasta de dente da boca, eu bati minha cabeça torneira. 34

P2: Como nós chamamos essa parte de nosso corpo? (apontando para a testa do garoto)

AA: Testa.

P2: Muito bem! Olhem para a testa do garoto. Alguma coisa aconteceu com a testa dele?

AA: Sim.

P2: A garota sabe o que aconteceu com a testa dele?

AA: Não.

P2: O que ela está perguntando ao garoto?

Carlos: O que aconteceu com (with) sua testa?

P2: Não, não, não. O que aconteceu com (to) sua testa? Repita!

Carlos: O que aconteceu com (to) sua testa?

99

Nessa etapa da aula já é possível detectar quais estruturas gramaticais estarão em

foco. O diálogo é construído predominantemente por meio de enunciados em que o

passado simples e o passado contínuo estão em uso. Existe, de fato, uma grande

preocupação com a memorização. Desse modo, além de repetir o diálogo na íntegra por

duas vezes, cada enunciado é também explorado isoladamente através da repetição e de

perguntas de verificação. Como se pode perceber, as perguntas de verificação conduzem

novamente os aprendizes à reprodução do enunciado. Aliás, o objetivo desta etapa

parece residir na reprodução fiel do enunciado explorado. Assim, conforme evidenciado

no excerto acima, quando um dos aprendizes emprega a preposição with indevidamente,

ele é corrigido de imediato pela professora. Afinal, evitar o erro é essencial em uma

proposta de ensino fundamentada no behaviorismo. Richter (2002, p. 74), no entanto,

ressalva que “a insistência na correção a qualquer custo diminui a motivação”. Segundo

o autor:

É enervante para o aluno querer comunicar-se, expressar-se, sabendo que do

outro lado da mensagem está alguém que não se interessa pelo que lhe vai no

subjetivo, estando, isto sim, à espreita policialesca de qualquer “crime”

contra o idioma! Pilhas e pilhas de pesquisa já mostraram que a mera

repetição exaustiva de formas não leva a utilizar bem essas formas.

Até essa etapa da aula, de fato, ainda não vislumbrei nenhuma iniciativa de

comunicação efetiva. Até então, o que temos visto limita-se à repetição das formas e um

zelo à correção linguística. Depreende-se, do que pode ser observado por meio dos

procedimentos adotados, a premissa de que a prática leva à perfeição.

Etapa 3

P1 exibe o próximo segmento The power went out last night while I was brushing my

teeth por três vezes. E para fins de explicação, P2 faz questionamentos e os alunos

respondem:

Excerto 3

P2: How do you say these in English? (apontando para a imagem no televisor)

AA: Teeth.

P2: Is it plural or singular?

AA: Plural

P2: Very good! What’s the singular?

AA: Tooth

P2: Perfect! In your opinion, is candy good or bad for your teeth?

100

AA: Bad.

P2: In this balloon (apontando para aimagem no televisor), is this boy brushing his teeth?

AA: Yes.

P2: What’s the boy doing?

AA: Brushing his teeth.

P2: In this balloon, is this boy using a toothbrush?

AA: Yes.

P2: What’s the boy using to brush his teeth?

AA: a toothbrush.

P2: In this balloon, are the lights in or off?

AA: On

P2: Ok, do we need electricity to turn the lights on?

AA: Yes.

P2: Do we need power to turn the lights on?

AA: Yes.

P2: Do we refer to the electricity supply to our home and community as power?

AA: Yes.

P2: Synonym for electricity…?

AA: Power.

P2: Excellent! What do we need to operate the TV, the DVD and lights?

AA: Power.

P2: In this balloon, are the lights on or off?

AA: Off.

P2: Do lights operate when power goes out?

AA: No.

P2: When the power goes out, does everything that needs power turn off?

AA: Yes.

P2: According to this boy, did the power go out at his house last night?

AA: Yes.

P2: According to this boy, did the power go out at his house an hour ago?

AA: No.

P2: Did the power go out last night?

AA: Yes.

P2: What happened to the power at this boy’s house last night, Ana?

Ana: The power went out.

P2: What happened to the power at this boy’s house last night, everybody?

AA: The power went out.

P2: What’s the past of go out?

AA: Went out.

P2: According to this boy, the power went out last night while he was brushing his teeth?

AA: Yes.

P2: Did the power go out last night while he was watching TV or while he was brushing his

teeth?

AA: While he was brushing his teeth.

P2: Lucas, imagine you are this boy and I’m your friend. Tell me if you were watching TV or if

you were brushing your teeth when the power went out last night.

Lucas: I was brushing my teeth.

P2: What happened last night while the boy was brushing his teeth?

AA: The power went out.35

35

P2: Como você diz isso em Inglês? (apontando para a imagem no televisor)

AA: Dentes.

P2: É plural ou singular?

AA: Plural.

P2: Muito bem! Qual é o singular?

AA: Dente.

P2: Perfeito! Em sua opinião, doce é bom ou ruim para seus dentes?

AA: Ruim

P2: Neste balão (apontando para a imagem no televisor), o garoto está escovando os dentes?

101

P2, então, repete o áudio do segmento The power went out last night while I was

brushing my teeth até que cada aluno repita individualmente.

Nessa etapa da aula, percebo que o professor continua conduzindo as interações.

Até então, não há nenhum tipo de interação entre os alunos. Os alunos se limitam a

responder em coro ou individualmente, quando solicitados, aos questionamentos do

professor. É válido ressaltar que todas as perguntas feitas pelo professor estão descritas

AA: Sim.

P2: O que o garoto está fazendo?

AA: Escovando os dentes.

P2: Neste balão, o garoto está usando uma escova de dentes?

AA: Sim.

P2: O que o garoto está usando para escovar os dentes?

AA: Uma escova de dentes.

P2: Neste balão, as luzes estão apagadas ou acesas?

AA: Acesas.

P2: Ok, nós precisamos de energia para ligar as luzes?

AA: Sim.

P2: Nós nos referimos ao fornecimento de energia em nossa casa e comunidade com o termo “energia”?

AA: Sim.

P2: Sinônimo para eletricidade?

AA: Energia.

P2: Excelente! O que nós precisamos para operar a TV, o DVD e as luzes?

AA: Energia.

P2: Neste balão, as luzes estão acesas ou apagadas?

AA: Apagadas.

P2: As luzes funcionam quando a energia acaba?

AA: Não.

P2: Quando a energia acaba, tudo que precisa de energia se desliga?

AA: Sim.

P2: De acordo com este garoto, a energia acabou em sua casa ontem à noite?

AA: Sim.

P2: De acordo com este garoto, a energia acabou em sua casa há uma hora?

AA: Não.

P2: A energia acabou ontem à noite?

AA: Não.

P2: A energia acabou noite passada?

AA: Sim.

P2: O que aconteceu com a energia na casa deste garoto na noite passada, Ana?

Ana: A energia acabou.

P2: O que aconteceu com a energia na casa deste garoto na noite passada, pessoal?

AA: A energia acabou.

P2: Qual é o passado de go out?

AA: Went out.

P2: De acordo com este garoto, a energia acabou na noite passada enquanto ele estava escovando os

dentes?

AA: Sim.

P2: A energia acabou noite passada enquanto ele estava assistindo TV ou enquanto ele estava escovando

os dentes?

AA: Enquanto ele estava escovando os dentes.

P2: Lucas, imagine que você é este garoto e eu sou sua amiga. Fale-me se você estava assistindo TV ou

escovando os dentes quando a energia acabou noite passada.

Lucas: Eu estava escovando os dentes.

P2: O que aconteceu noite passada enquanto o garoto estava escovando os dentes?

AA: A energia acabou.

102

em seu manual. Desse modo, o professor também tem papel limitado, uma vez que ele

apenas reproduz o roteiro disponível em seu manual e verifica a adequação das

respostas.

Outros aspectos relevantes podem ser depreendidos nessa etapa da aula. A

princípio, verifico uma preocupação em explorar o sentido do vocabulário e das

sentenças, seja por meio da associação com as imagens ou por meio das perguntas que

visam a esclarecer e também verificar o entendimento, por exemplo, do termo power e

da estrutura the power went out. Em seguida, constatamos outros princípios orientadores

característicos da metodologia audiovisual, tais como os descritos por Paiva (2005):

deve-se aprender a língua e não sobre a língua, as estruturas devem ser praticadas até

serem automatizadas, as regras gramaticais devem ser aprendidas intuitivamente e os

hábitos linguísticos são formados pela saturação da prática. Tendo em mente esses

princípios, percebo que existe uma constante preocupação da professora em reforçar

através da repetição a estrutura gramatical a fim de que o aprendiz identifique o padrão

e seja capaz de reproduzi-lo. Ainda no que tange ao ensino da gramática, verifico que

nessa etapa há dois momentos em que o professor faz menção mais explícita à

gramática a fim de conferir a compreensão dos aprendizes. A princípio, a professora

ressalta a distinção entre o singular e o plural das formas tooth e teeth. Posteriormente,

ela questiona sobre o passado do verbo go out. Considerando que, diante do método em

questão, as situações de aprendizagem devem ser bem controladas de forma a prevenir

os erros e, casos eles ocorram, devem ser sempre corrigidos para evitar a fossilização

(PAIVA, 2005), parece-me que a breve menção a esses aspectos estruturais funcionou

como um recurso para que o erro seja evitado. Afinal, as formas irregulares tanto do

plural quanto dos verbos causam recorrentes dúvidas entre os aprendizes de língua

inglesa devido ao contraste com a língua portuguesa. Desse modo, parece-me que

alertar previamente para o uso apropriado da forma pretende inibir o erro na fase de

reprodução da estrutura.

Etapa 4

P2 exibe o segmento So por três vezes e inicia o procedimento de perguntas e

respostas:

Excerto 4

103

P2: When the boy says to the girl that the power went out last night while he was brushing his

teeth, does the girl need more information to understand what happened to the boy’s forehead?

AA: Yes.

P2: What does the girl say to ask the boy to give her more information?

AA: So?

P2: In this situation, does the girl want to understand what happened to the boy’s forehead?

AA: Yes.

P2: Is she saying “so” to ask the boy to explain what happened to his forehead after the power

went out last night at his house?

AA: Yes.

P2: When someone says something and you need more information in order to understand, can

you say “so” to ask the person to explain it better and to give you more information?

AA: Yes.

P2: What does the girl say to ask the boy to give her more information about what happened to

his forehead?

AA: So.36

P2 exibe o segmento com o enunciado So e cada aluno repete individualmente.

Nessa etapa, novamente percebo que a atenção dos aprendizes é direcionada

para o sentido que a expressão so veicula e para a função comunicativa que o termo

desempenha, uma vez que a professora insistentemente especifica que so pode ser usado

quando se pretende pedir explicações adicionais ou esclarecimentos acerca de um

acontecimento.

Etapa 5

O próximo segmento contendo o enunciado When I bent down to rinse the

toothpaste out of my mouth é exibido três vezes. E em seguida, na fase de explicação

ocorrem as seguintes interações:

Excerto 5

P2: Is the boy now giving more information about what happened to his forehead?

36

P2: Quando o garoto diz à garota que a energia acabou noite passada enquanto ele estava escovando os

dentes, a garota precisa de mais informações para entender o que aconteceu com a testa do garoto?

AA: Sim.

P2: O que a garota diz ao garoto para pedir mais informações?

AA: “So”?

P2: Nesta situação, a garota quer entender o que aconteceu com a testa do garoto?

AA: Sim.

P2: Ela está usando “so” para pedir ao garoto que explique o que aconteceu com a testa dele depois que a

energia acabou noite passada, em sua casa?

AA: Sim.

P2: Quando alguém diz algo e você precisa mais informações para entender, você pode dizer “so” para

pedir a pessoa que explique melhor e forneça mais informações?

AA: Sim.

P2: O que a garota diz para pedir ao garoto mais informações sobre o que aconteceu com a testa dele?

AA: “So”.

104

AA: Yes.

P2: What’s this called in English? (apontando para a imagem do creme dental)

AA: Toothpaste.

P2: Very good! In your opinion, did the boy put the toothpaste on the toothbrush to clean his

teeth?

AA: Yes.

P2: What’s is this called in English? (apontando para a imagem da boca)

AA: Mouth

P2: In your opinion, is there water in the boy’s mouth?

AA: Yes.

P2: yes, There is water inside his mouth. Did he fill his mouth with water and now he is filling

out?

AA: Yes.

P2: Is he rinsing his mouth?

AA: Yes.

P2: Ok, do I need water to rinse my mouth when I brush my teeth?

AA: Yes.

P2: So, what’s the boy doing here?

AA: Rinsing his mouth.

P2: If you rinse your mouth do you wash it by filling your mouth with water and then spilling

the water out?

AA: Yes.

P2: Do you generally rinse your mouth before brushing your teeth or after brushing your teeth?

AA: After brushing my teeth.

P2: In this balloon, is the boy brushing his teeth or rinsing his mouth?

AA: Rinsing his mouth.

P2: In this balloon, is there toothpaste in the boy’s mouth?

AA: Yes.

P2: Is he rinsing his mouth to take the toothpaste out of his mouth?

AA: yes.

P2: Do we use “out of” to indicate the movement from the inside of something to the outside?

AA: Yes.

P2: In this balloon, is the boy rinsing the toothpaste out of his mouth?

AA: Yes.

P2: What is the boy rinsing out of his mouth?

AA: The toothpaste.

P2: What is the boy doing?

AA: He is rinsing the toothpaste out of his mouth.

P2: In this balloon here, is he lining his body forward and down (a professora curva-se para

demonstrar)?

AA: Yes.

P2: So, in this balloon, is the boy bending down?

AA: Yes.

P2: When you bend down, do you line your body forward and down?

AA: Yes.

P2: In this balloon, is the boy bending down to rinse the toothpaste out of his mouth?

AA: Yes.

P2: Why is the boy bending down?

AA: To rinse the toothpaste out of his mouth.

P2: After he brushes his teeth, did he bend down to wash his face?

AA: No.

P2: Right. He bent down to rinse the toothpaste out of his mouth. So, did he bend down to wash

his face or did he bend down to rinse the toothpaste out of his mouth?

AA: He bent down to rinse the toothpaste out of his mouth.

P2: Perfect! What did the boy do after he brushes his teeth with the toothpaste?

AA: He bent down…

P2: To?

105

AA: Rinse the toothpaste out of his mouth.37

37

P2: O garoto está dando mais informações sobre o que aconteceu com sua testa?

AA: Sim.

P2: Como isso é chamado em inglês?

AA: Creme dental.

P2: Muito bem. Em sua opinião, o garoto colocou creme dental na escova de dente para limpar seus

dentes?

AA: Sim.

P2: Como isso é chamado em inglês?

AA: Boca.

P2: Em sua opinião, há água na boca do garoto?

AA: Sim.

P2: Sim, há água na boca dele. Ele encheu a boca com água e agora está esvaziando?

AA: Sim.

P2: Ele está enxaguando a boca dele?

AA: Sim.

P2: Certo, eu preciso de água para enxaguar minha boca quando escovo meus dentes?

AA: Sim.

P2: Então, o que o garoto está fazendo aqui?

AA: Enxaguando a boca dele.

P2: Se você enxaguar sua boca, você lava a boca enchendo com água e depois a esvazia?

AA: Sim.

P2: Você geralmente enxágua sua boca antes de escovar os dentes ou depois de escovar os dentes.

AA: Depois de escovar os dentes.

P2: Neste balão, o garoto está escovando os dentes dele ou enxaguando sua boca?

AA: Enxaguando sua boca.

P2: Neste balão, há creme dental na boca do garoto?

AA: Sim.

P2: Ele está enxaguando a boca para tirar o creme dental da boca?

AA: Sim.

P2: Nós usamos “out of” para indicar o movimento de dentro de algo para fora?

AA: Sim.

P2: Neste balão, o garoto está enxaguando o creme dental da boca?

AA: Sim.

P2: O que o garoto está enxaguando da boca?

AA: O creme dental.

P2: O que o garoto está fazendo?

AA: Ele está enxaguando o creme dental da boca.

P2: Neste balão aqui, ele está se curvando para frente?

AA: Sim.

P2: Então, neste balão, o garoto está curvando-se?

AA: Sim.

P2: Quando você curva-se, você alinha seu corpo para frente e para baixo?

AA: Sim.

P2: Neste balão, o garoto está curvando-se para enxaguar o creme dental da boca?

AA: Sim.

P2: Por que o garoto está curvando-se?

AA: Para enxaguar o creme dental da boca.

P2: Depois de escovar os dentes, ele curvou-se para lavar o rosto?

AA: Não.

P2: Certo. Ele curvou-se para enxaguar o creme dental da boca. Então, ele curvou-se para lavar o rosto ou

para enxaguar o creme dental da boca?

AA: Ele curvou-se para enxaguar o creme dental da boca.

P2: Perfeito! O que o garoto fez depois de escovar os dentes com o creme dental?

AA: Ele curvou-se...

P2: Para?

AA: Enxaguar a boca.

106

Cada aluno repete o enunciado When I bent down to rinse the toothpaste out of my

mouth individualmente. Por fim, P2 exibe o último enunciado I hit my head on the

faucet por três vezes e segue com a etapa da explicação:

Excerto 6

P2: What’s this called in English? (apontando para a imagem no televisor)

AA: Faucet

P2: Very good! When you hit something, do you touch it with a lot of force?

AA: Yes.

P2: What’s the boy hitting his head on?

AA: On the faucet.

P2: Ok. According to the boy, when he bent down to rinse the toothpaste out of his mouth, did

he hit his hand on the faucet?

AA: No.

P2: Did he hit his head on the faucet when he bent down to rinse the toothpaste out of his

mouth?

AA: Yes.

P2: When he bent down to rinse the toothpaste out of his mouth, did he hit his hand or did he hit

his head on the faucet?

AA: His head.

P2: Which part of the head did he hit on the faucet?

AA: The forehead.

P2: Maria, imagine you are the boy. Tell us what you were doing when the power went out last

night.

Maria: I was brushing my teeth.

P2: And did you see the faucet when you bent down to rinse the toothpaste out of your mouth?

Maria: No.

P2: And what happened when you bent down to rinse the toothpaste out of your mouth?

Maria: I hit my head on the faucet.

P2: Very good! Joana, what happened to the boy when the power went out last night?

Joana: He hit his head on the faucet.

P2: Perfect!38

38

P2: Como isso é chamado em inglês?

AA: Torneira.

P2: Muito bem! Quando você bate em alguma coisa, você a toca com muita força?

AA: Sim.

P2: Em que o garoto está batendo a cabeça?

AA: Na torneira.

P2: Certo. De acordo com o garoto, quando ele curvou-se para enxaguar o creme dental da boca, ele bateu

a mão na torneira?

AA: Não.

P2: Ele bateu a cabeça na torneira quando ele curvou-se para enxaguar o creme dental da boca?

AA: Sim.

P2: Quando ele curvou-se para enxaguar o creme dental da boca, ele bateu a mão ou ele bateu a cabeça na

torneira?

AA: A cabeça.

P2: Que parte da cabeça ele bateu na torneira?

AA: A testa.

P2: Maria, imagine que você é o garoto. Diga-nos o que você estava fazendo quando a energia acabou

noite passada.

Maria: Eu estava escovando meus dentes.

P2: Você viu a torneira quando você curvou-se para enxaguar o creme dental da boca?

Maria: Não.

P2: E o que aconteceu quando você curvou-se para enxaguar o creme dental da boca?

107

P2, então, repete o segmento com o enunciado I hit my head on the faucet para

que cada aluno repita individualmente.

A etapa 5 preserva as mesmas características das etapas anteriores, o que

alicerça o nosso posicionamento acerca da previsibilidade das ações em sala de aula.

Assim como P1 é capaz de descrever cuidadosamente os procedimentos da aula, é

possível que os alunos também sejam capazes de fazê-lo, uma vez que as aulas

decorrem basicamente por meio dos mesmos mecanismos. Durante o período integral

de observação, poucas variações foram verificadas, tais como o acréscimo de algumas

atividades com drills ou algumas oportunidades de interação entre os estudantes

mediada pelo professor. Nesse ponto, faz-se necessário ressaltar que em nenhum

momento durante o período de observação nos defrontamos com situações de

comunicação genuína entre os aprendizes. Os raros momentos em que os aprendizes

interagem acontecem por meio de um processo mediado e controlado pela professora,

cujo papel é dirigir comandos do tipo João ask Maria if the power went out last night.

Desse modo, verifico que apesar da intenção de demonstrar através dos exemplos e do

insumo fornecido a função comunicativa das estruturas linguísticas, não há

oportunidades para que tais estruturas sejam efetivamente utilizadas. Não são propostas

atividades que propiciem a interação com propósitos comunicativos, o que tanto ignora

quando restringe a capacidade criativa dos aprendizes. De fato, parece-me que a palavra

“controle” parece ser o cerne que fundamenta as ações recorrentes na sala de aula de P2.

P2 é controlada pelo manual do professor que direciona todas as suas ações. Os

aprendizes, por sua vez, são também controlados pelo roteiro estabelecido no manual e

pelos procedimentos adotados por P2. Todas as ações parecem ser previstas para que

nada escape à previsibilidade e à segurança promovida por um modelo de ensino que se

alicerça na repetição, imitação e reprodução, mas que não consegue avançar para a

etapa da produção.

Etapa 6

P2 exibe um vídeo ilustrando o acidente do garoto. O vídeo consiste em apenas

imagens sem áudio. P2, então, questiona e os alunos respondem:

Maria: Eu bati minha cabeça na torneira.

P2: Muito bem! Joana, o que aconteceu com o garoto quando a energia acabou noite passada?

Joana: Ele bateu a cabeça na torneira.

P2: Perfeito!

108

Excerto 7

P2: In this situation, did the boy hit his head on the faucet?

AA: Yes.

P2: Did he hit his forehead when he bent down to rinse the toothpaste out of his mouth?

AA: Yes.

P2: In your opinion, was it the boy’s intention to hit his forehead?

AA: No.

P2: Was it an accident?

AA: Yes.

P2: Suggest a title to the situation.

Mário: An accident.

P2: Any more suggestions?

AA: No.

P2: Ok, Let’s check.39

P2 exibe o vídeo novamente e no final o título da situação é revelado. P2

congratula Mário por ter acertado o título da situação. Então, P2 prossegue a aula com o

intuito de verificar a pronúncia dos alunos. Para tanto, ela exibe cada enunciado e cada

aluno individualmente é orientado a repetir o enunciado.

Nessa etapa, observo que um dos objetivos é que os alunos “deduzam” o título

da situação a partir da exibição do vídeo. Desse modo, P2 retoma algumas questões

acerca do incidente ocorrido com o personagem. No entanto, a seguinte pergunta

realizada por P2 “Was it an accident?” praticamente revela o título que deveria ser

sugerido pelo aluno. Assim sendo, um dos aprendizes rapidamente sugere o título an

accident. Diante desse tipo de prática, percebo o quão pouco os aprendizes contribuem

na construção do processo de ensino-aprendizagem. Mesmo em situações em que o

aprendiz deveria usar sua capacidade de inferência, o professor revela a informação de

antemão para que o aprendiz apenas a reproduza. Dessa maneira, o professor continua

se configurando como detentor do conhecimento que deve ser transmitido ao aluno,

cujo papel parece ser o de passivamente receptar e apreender o que lhe é fornecido.

39

P2: Nesta situação, o garoto bateu a cabeça na torneira?

AA: Sim.

P2: Ele bateu a testa quando ele curvou-se para enxaguar o creme dental da boca?

AA: Sim.

P2: Em sua opinião, foi intenção do garoto bater a testa ?

AA: Não.

P2: Foi um acidente?

AA: Sim.

P2: Sugiram um título para a situação.

Mário: Um acidente.

P2: Alguma outra sugestão?

Mário: Não.

P2: Certo, vamos verificar.

109

Essa fase da aula também tem a finalidade de verificar a pronúncia dos

aprendizes. Sendo assim, cada aluno deve repetir cada enunciado individualmente. O

professor, por sua vez, prossegue com as correções necessárias a fim de reprimir nova

ocorrência do erro. É preciso ressaltar que, até então, os aprendizes não tiveram contato

com nenhum material escrito. Afinal, conforme P2 havia mencionado na entrevista, o

percurso do ensino obedece a uma ordem no que concerne o trabalho com as quatro

habilidades. A princípio, os aprendizes escutam e falam para posteriormente lerem e

escreverem. Segundo Thornbury (2001), se herdou do audiolinguismo a premissa de

que a forma escrita pode interferir negativamente na pronúncia. Entretanto, o autor

destaca que os aprendizes cometerão erros de pronúncia de qualquer maneira e, que

quanto antes lidarmos com isso, melhor. Noutras palavras, poderíamos dizer que talvez

seja melhor que os aprendizes observem e percebam as diferenças entre a fala e a escrita

o mais cedo o possível. É importante que se tenha a percepção de que a fala e a escrita

são dimensões distintas, que preservam características também distintas, e que a

pronúncia é um dos aspectos que merece atenção. O autor considera ainda que é muito

mais fácil observar informações lexicais e gramaticais a partir da forma escrita do que

da falada. Dessa maneira, sugere que talvez não seja proveitoso postergar o contato com

a escrita quando o que se pretende que as regras sejam aprendidas indutivamente.

Etapa 7

P2 toca o DVD novamente e cada aluno repete uma fala. Então, P2 reinicia a interação

com os aprendizes:

Excerto 8

P2: What’s the title of the situation?

AA: An accident.

P2: What’s the first question the girl asks?

AA: What happened to your forehead?

P2: What does the boy answer?

AA: The power went out last night while I was brushing my teeth.40

40

P2: Qual é o título da situação?

AA: Um acidente.

P2: Qual é a primeira pergunta feita pela garota?

AA: O que aconteceu com sua testa?

P2: O que o garoto responde?

AA: A energia acabou noite passada enquanto eu estava escovando meus dentes.

110

P2, então, inicia uma explicação gramatical em língua portuguesa:

Excerto 9

P2: Então, duas coisas aconteceram. Uma estava em progresso quando a outra aconteceu. O que

estava em progresso? I was brushing my teeth, né? Então, não demora um minuto? Nesse

minuto ou dois minutos, algo aconteceu. É o mesmo que falar assim: Eu estava estudando

quando o meu telefone tocou. Eu estava tomando banho quando a minha mãe me chamou.

Então, nesse caso, quando tem alguma coisa acontecendo e outra acontece no meio, a gente usa

while, não é isso? Então, o que aconteceu? The power...?

AA: went out

P2: While...?

AA: I was brushing my teeth.

P2: Very good ! Então, a frase completa é I was brushing my teeth while the power went out.

A última etapa da aula, portanto, consiste em uma explicitação gramatical acerca

do uso do passado contínuo e do passado simples no sentido de esclarecer que uma ação

estava em andamento quando outra ação a interrompe. Para demonstrar essa relação

entre os acontecimentos, P1 fornece exemplos na língua portuguesa e retoma o exemplo

tão exaustivamente repetido ao longo da aula. Porém, nenhum outro exemplo é

fornecido em língua inglesa. A essa altura, presume-se que os alunos já tenham

reconhecido o uso do passado simples e do passado contínuo, portanto, P1 não direciona

atenção às regras de estruturação da sentença como também não utiliza a nomenclatura

para dizer que tempos verbais estão sendo empregados.

111

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nestas considerações finais, refletirei sobre os resultados obtidos com esta

pesquisa que teve como objetivo geral discutir e repensar o ensino de gramática na

contemporaneidade, investigando como as professoras, participantes do estudo,

abordam o ensino de gramática em suas aulas. Para tanto, verifiquei que estratégias elas

utilizam e quais premissas convergem com suas ações pedagógicas, bem como se essas

professoras direcionam a atenção para o sentido e para as funções comunicativas da

língua. Finalmente, quis observar como o contexto de atuação dos sujeitos interfere em

suas práticas. Para cumprir tais objetivos, estabeleci cinco perguntas de pesquisa, que

serão respondidas a seguir à luz dos dados obtidos e analisados.

1. Como as professoras abordam o ensino de gramática nos contextos

investigados e que aspectos desse contexto interferem nas suas práticas?

Diante dos dados obtidos ficou evidente um distanciamento entre os dois

contextos investigados no que concerne o trabalho com a gramática em sala de aula. No

contexto da escola pública, determinados fatores tais como carência de infraestrutura

adequada, escassez de tempo e de materiais e o elevado número de aprendizes por

turma, parecem contribuir para um modelo de ensino tradicional em que a gramática é

sempre apresentada pelo professor e reforçada através de exercícios de fixação.

Notoriamente, observou-se uma supremacia às regras de estruturação da língua em

detrimento do trabalho com o significado e com as funções comunicativas. Aliado aos

fatores contextuais já mencionados, observou-se que a perspectiva da professora em

relação ao ensino da gramática também contribui para que este modelo de ensino seja

adotado. P1 afirma constantemente a necessidade de que regras sejam memorizadas e

reforça esse discurso diante de seus aprendizes. Os procedimentos adotados em aula,

por sua vez, condizem com uma proposta cujo objetivo final parece recair unicamente

na memorização das regras e na aplicação dessas regras em exercícios de reprodução.

Dessa maneira, a abordagem de gramática no contexto da escola pública preserva

características tradicionalistas que pouco contribuem para o desenvolvimento da

competência comunicativa dos aprendizes.

No cenário do curso de idiomas, verifica-se uma abordagem de ensino de

gramática moldada nos pressupostos do audiolinguismo. Assim sendo, as aulas se

fundamentam em um modelo indutivo e a exposição ao insumo é o ponto de partida

112

para a apresentação às estruturas linguísticas. Procedimentos de repetição são

incansavelmente utilizados. Desse modo, também se observa que a reprodução assume

um papel preponderante no processo de ensino-aprendizagem. No entanto, ao passo que

no contexto da escola pública a reprodução se concretiza por meio de exercícios

escritos, no curso de idiomas, é a repetição falada, seja ela individual ou coletiva, que

conduz o ensino. O pressuposto que parece fundamentar a abordagem de ensino no

curso de idiomas é o de que, a repetição exaustiva das estruturas linguísticas permite

que os aprendizes automatizem as formas e os habilita a transpor esse conhecimento

automatizado para situações reais de comunicação. Contudo, P2 não tem condições de

verificar se os aprendizes são, de fato, capazes de realizar essa transposição, haja vista

que não existem oportunidades de interação efetiva por meio da língua alvo durante as

aulas.

Diante do exposto, verificamos que a principal divergência entre os contextos de

ensino recai na escolha por um modelo dedutivo ou indutivo de ensino. A explicitação

gramatical é o ponto de partida das aulas de P1, ao passo que, nas aulas de P2, a

exposição ao insumo e sua repetição são os primeiros procedimentos adotados a fim de

que a gramática seja contemplada.

2. Que estratégias são utilizadas pelas professoras a fim de conduzir o

ensino da gramática?

Os dados obtidos evidenciaram que as estratégias utilizadas para a condução do

ensino de gramática se diferenciam significativamente entre os dois contextos.

Entretanto, revelaram também que ambas as professoras adotam estratégias bem

rotineiras para o ensino de gramática, ou seja, não foram observadas variações

procedimentais na condução do ensino de estruturas gramaticais. As professoras

mantiveram uma postura uniforme sempre que lidavam com algum aspecto de cunho

gramatical.

As aulas de P1 se fundamentam em uma abordagem tradicional de ensino de LE.

Ressalto que o termo “tradicional” é aqui empregado para se referir às técnicas

características do método gramática e tradução, comumente observadas na prática de

P1. Dessa maneira, em suas aulas, a gramática é apresentada por meio de explicações

em língua portuguesa. P1 costuma estabelecer um paralelo entre as estruturas estudadas

em língua inglesa com as estruturas já conhecidas pelos aprendizes na língua

portuguesa. Desse modo, P1 sempre inicia a apresentação da gramática questionando o

113

funcionamento das mesmas estruturas na nossa língua materna. A participação dos

aprendizes, portanto, restringe-se a essa breve descrição de alguns aspectos linguísticos

da língua portuguesa. Ademais, P1 é a protagonista no processo de ensino-

aprendizagem, cujo papel é explicitar as regras para posteriormente fornecer exemplos.

Curiosamente, muitos desses exemplos são fornecidos ainda em língua portuguesa. Os

exemplos fornecidos em língua inglesa, por sua vez, configuram-se em frases

descontextualizadas das quais o sentido é pouco explorado. Os exercícios propostos são

sempre estruturais e objetivam essencialmente que as regras de organização das frases

sejam memorizadas. Aliás, faz-se necessário ressaltar que P1 endossa constantemente o

discurso de que os aprendizes precisam memorizar as regras, a fim de que consigam se

comunicar corretamente.

A observação das aulas evidenciou ainda que todas as atividades delineadas para

o estudo da gramática são fornecidas na modalidade escrita. Considerando a quantidade

de alunos na turma, não é difícil imaginarmos os obstáculos que P1 enfrentaria ao tentar

propor atividades com a oralidade.

Em suma, posso afirmar que P1 fundamenta-se, essencialmente, em uma

abordagem dedutiva de ensino de gramática, em que a explicitação gramatical é o fio

condutor do ensino. Suas ações pedagógicas, portanto, remetem a um modelo de ensino

centrado no professor e na transmissão de conteúdo. Os aprendizes, por outro lado,

limitam-se a receptar passivamente o conhecimento transmitido e reproduzi-lo mediante

exercícios estruturais escritos.

Quanto a P2, os dados evidenciaram que o caminho percorrido para o ensino da

gramática é o inverso, ou seja, as aulas de P2 são alicerçadas em um modelo indutivo.

Os aprendizes são, a princípio, expostos a exemplos e conduzidos à repetição exaustiva

dos padrões linguísticos para que, posteriormente, sejam explicitadas as regras. No

entanto, observei que a proposição do modelo indutivo parece não cumprir

integralmente sua finalidade, uma vez que apesar dos aprendizes terem tido o contato

prévio e constante com a estrutura alvo, terem repetido inúmeras vezes o padrão

linguístico, terem tido a oportunidade de observar e perceber seu funcionamento, é o

professor quem faz a explicitação sobre a gramática. Os aprendizes, por sua vez,

também têm a limitada função de apreender o que é transmitido pelo professor.

Desse modo, percebo que, mesmo no curso de idiomas, as habilidades de

reconhecimento de padrões e de resolução de tarefas também não são devidamente

reconhecidas e exploradas. Vale ressaltar ainda que, embora a aula seja conduzida em

língua inglesa, a explicitação gramatical é realizada em língua portuguesa.

114

Outro aspecto relevante a ser mencionado se refere ao trabalho com a habilidade

oral. Em contraste ao que ocorre nas aulas de P1, a habilidade oral é priorizada durante

as aulas de P2. Os aprendizes só entram em contato com a escrita quando as etapas de

ouvir e falar são integralmente contempladas. Os aprendizes são expostos a vídeos em

que são exibidas situações que simulam acontecimentos do dia-a-dia. Essas situações

são exploradas através de perguntas e os alunos são conduzidos à reprodução de todos

os enunciados que compõem os diálogos presentes nessas situações. Dessa maneira, fica

evidente que a imitação da pronúncia e a reprodução dos padrões linguísticos

constituem a base do ensino. Surpreende-me, entretanto, que mesmo no curso de

idiomas não sejam propostas atividades de produção. Em momento algum, presenciei

propostas de atividades de produção que vislumbrassem o uso das estruturas linguísticas

estudadas em situações de comunicação genuína entre os aprendizes. Sendo assim,

quando afirmo que há uma priorização do trabalho com a oralidade, entenda-se

oralidade como mera reprodução de enunciados.

Diante do exposto, verifico que as estratégias de ensino de gramática adotadas

por ambas as professoras, apesar das diferenças mencionadas, parecem ainda deixar

uma nítida lacuna quanto ao tratamento gramatical, haja vista a dificuldade de

estabelecer um paralelo entre o conhecimento explorado em sala de aula e as

oportunidades de uso efetivo das estruturas alvo.

3. Que premissas concernentes ao ensino de gramática presentes no

discurso das professoras convergem e/ou divergem com suas ações pedagógicas?

Os dados obtidos revelam que as premissas presentes no discurso das

professoras participantes desta pesquisa, ora convergem, ora divergem de suas ações em

sala de aula. Para fins de organização, apresento uma relação das premissas que

puderam ser apreendidas através do discurso das professoras, destacando os aspectos

convergentes e divergentes.

Através da análise das respostas de P1 à entrevista e da observação das aulas,

identifico que as seguintes premissas convergem com a sua prática pedagógica:

a) A gramática é o elemento que direciona os aprendizes a falar

“corretamente”: As aulas de P1 evidenciam sua preocupação com o cumprimento das

regras estruturais da língua. Dessa maneira, P1, reafirma constantemente, para os

115

aprendizes a necessidade de que eles conheçam as regras e as respeitem. Além disso, os

exercícios propostos também comprovam o quanto P1 direciona a atenção dos

aprendizes aos padrões de organização das sentenças.

b) A escola é o espaço onde o aprendiz precisa aprender a gramática

normativa: a sala de aula de P1 é um recinto onde a norma culta reina plenamente, haja

vista que não observei nenhum momento em que outras variações linguísticas fossem

sequer mencionadas.

c) Os erros são considerados desvios que precisam ser evitados: as

atividades propostas pretendem praticar exaustivamente as estruturas linguísticas, a fim

de que elas sejam memorizadas, reproduzidas e que os erros sejam, consequentemente,

evitados. A ausência de atividades de produção também corrobora para que os erros não

ocorram, uma vez que a imprevisibilidade e os riscos inerentes à produção normalmente

ocasionam erros.

d) É importante traçar um paralelo entre a língua inglesa e a língua

portuguesa para que os aprendizes percebam as semelhanças existentes entre a

gramática das duas línguas e compreendam as estruturas mais facilmente: ao apresentar

novas estruturas linguísticas, P1 preocupa-se em elicitar as contribuições dos

aprendizes, considerando o seu conhecimento sobre a língua materna. A correlação

entre a estrutura alvo na língua inglesa e a estrutura alvo na língua materna é o ponto de

partida de P1 na exposição de um conteúdo de cunho gramatical.

e) As estruturas gramaticais são mais bem assimiladas quando apresentadas

previamente. Desse modo, só depois da exposição ao conteúdo gramatical os aprendizes

devem ter contato com os textos, para que visualizem, na prática, os exemplos da

gramática em uso: os dados demonstraram que a prática pedagógica de P1 alicerça-se

em um modelo dedutivo de ensino e, dessa maneira, as aulas de P1 constituem um ciclo

em que a explicitação da gramática antecede atividades de prática e de leitura.

f) As estruturas gramaticais devem ser trabalhadas da forma mais

simplificada possível para facilitar a compreensão: as aulas observadas evidenciaram

uma tendência em equacionar as regras gramaticais a fórmulas imutáveis que os

aprendizes precisam simplesmente memorizar. Verifiquei também que as frases

utilizadas para fins de exemplificação durante as explicações possuem baixo grau de

complexidade linguística e são constituídas de vocabulário bem elementar. As sentenças

que constituem os exercícios escritos preservam as mesmas características.

116

g) A ausência de domínio de vocabulário, por parte dos aprendizes, impede

que algumas atividades gramaticais presentes no livro sejam utilizadas nas aulas: todas

as atividades gramaticais propostas durante o período de observação foram formuladas

pela própria professora e eram constituídas de vocabulário elementar.

A seguir, enumero as premissas presentes no discurso de P1 que divergem de

sua prática pedagógica:

a) O ensino da gramática deve viabilizar, essencialmente, o

desenvolvimento da oralidade e promover a comunicação falada: os dados obtidos

evidenciam que, discursivamente, em sala de aula, P1 reafirma seu objetivo de

promover o desenvolvimento da habilidade oral. No entanto, as ações em si não

condizem com uma proposta de trabalho com a oralidade, haja vista que todas as

atividades propiciadas fundamentam-se na leitura e escrita. Em nenhum momento, os

aprendizes tiveram oportunidades de vivenciar o uso da língua por meio da fala, seja por

meio da prática controlada ou da produção. O considerável número de aprendizes na

turma, a saber, quarenta e cinco alunos, parece inviabilizar o trabalho com a oralidade e

frustrar as expectativas de P1 em relação aos objetivos que o ensino de LE deve

alcançar.

b) Às vezes, faz-se necessário utilizar as nomenclaturas para fins de

explicação do conteúdo gramatical, porém, elas devem ser evitadas para não confundir

o aluno: durante a observação das aulas não verifiquei nenhuma ressalva ou cautela

quanto ao emprego de nomenclaturas para fins de explicitação de regras estruturais da

língua. P1, habitualmente, faz uso de nomenclaturas para conduzir o ensino da

gramática. Desse modo, considero que essa conduta na prática pedagógica de P1 é

muito mais recorrente do que seu discurso sugere.

c) O aprendiz precisa evitar o uso da língua materna para fins de tradução e

deve inferir os significados das palavras e frases por meio do contexto em que estão

inseridas: considerando que as aulas são ministradas exclusivamente em língua

portuguesa e que as frases utilizadas, tanto nos exemplos quanto nos exercícios, são

descontextualizadas, verifiquei uma nítida divergência entre esta premissa e a prática de

P1.

d) A repetição falada de estruturas prontas é essencial para que o aprendiz

assimile e internalize a língua: a prática de repetição da fala, ainda que em coro, não foi

117

presenciada nas aulas observadas. Desse modo, mesmo considerando a repetição da fala

um elemento primordial para a internalização da língua, P1 não utiliza esse recurso

nesse contexto de atuação.

e) O aprendiz deve imitar o falante nativo e falar como ele: como já

mencionado, as aulas não propiciam o trabalho com a habilidade oral. Além disso,

observei que durante as aulas não houve exposição a insumo autêntico, ou seja, os

aprendizes não tiveram oportunidades de ouvir a insumos provenientes de falantes

nativos e, tão pouco, imitá-los.

Em relação a P2, identifiquei as seguintes premissas presentes em seu discurso

que se concretizam em suas aulas e convergem com suas ações pedagógicas:

a) Em cursos livres, a gramática funciona como ferramenta para o

aprendizado da língua e para o desenvolvimento das quatro habilidades: as aulas, de

fato, contemplam as quatro habilidades linguísticas, obedecendo rigorosamente a ordem

de ouvir, falar, ler e escrever. As estruturas gramaticais em estudo, por sua vez, são

contempladas em todas essas modalidades.

b) O aprendizado da língua e, consequentemente, da gramática, deve seguir

ordenadamente as etapas de ouvir, falar, ler e, por fim, escrever: a ordenação do ensino

nessas etapas é sistematicamente respeitada pela professora na condução de suas aulas.

c) A sistematização do conteúdo gramatical deve ocorrer somente quando

os aprendizes já tiverem tido a oportunidade de ouvir, compreender e repetir as

estruturas em uso: conforme presenciei durante a observação das aulas, P2 apenas

explicita o funcionamento das estruturas gramaticais uma vez que os aprendizes tenham

sido expostos ao insumo auditivo diversas vezes, que a compreensão dos enunciados

tenha sido verificada e que os aprendizes tenham repetido os enunciados por diversas

vezes.

d) Quando surge alguma dúvida em relação aos aspectos gramaticais,

independente da etapa da aula, o professor precisa intervir e esclarecer o funcionamento

das estruturas em estudo, a fim de que o aprendiz não permaneça meramente

reproduzindo as frases sem a devida compreensão de seu funcionamento: presenciei

momentos em que, ainda que brevemente, P2 interrompe os procedimentos da aula para

esclarecer algum aspecto gramatical quando lhe é solicitado.

118

Mediante a observação das aulas e os dados obtidos na entrevista, identifiquei as

seguintes divergências entre o discurso e a prática pedagógica de P2:

a) Uma proposta de ensino em que os aprendizes são conduzidos a inferir

sobre o funcionamento das estruturas gramaticais é mais efetiva do que uma proposta

em que as regras são explicitadas pelo professor: embora os aprendizes sejam expostos

a exemplos de uso das estruturas gramaticais previamente e que o professor levante

alguns questionamentos acerca do sentido veiculado por tais estruturas, é a própria

professora quem explicita e sistematiza o tópico gramatical e não é possível verificar,

portanto, se os aprendizes foram capazes de fazer as devidas inferências e reconhecer os

padrões linguísticos.

b) A gramática funciona como um mecanismo de flexibilização que permite

que o aprendiz consiga produzir enunciados para além daqueles automatizados por meio

de repetições nas aulas de língua inglesa: durante o período de observação não

presenciei atividades de produção. Todas as interações ocorreram por meio da prática

controlada em que professor, de antemão, direcionava que estrutura e que vocabulário

utilizar. Desse modo, não vislumbrei iniciativas de uso criativo da língua e produção de

enunciados realmente diferenciados daqueles tão exaustivamente repetidos durante a

aula. Por essa razão, acredito que a noção de gramática como mecanismo de

flexibilização não foi contemplada nas aulas de P2, uma vez que a capacidade criativa

dos aprendizes é quase que ignorada.

No discurso de P2, ficaram evidentes também duas outras premissas, as quais

não consegui identificar convergência ou divergência com sua prática pedagógica, pelos

motivos que esclareço a seguir:

a) Em cursos pré-vestibulares e no ensino médio, o foco do ensino de língua

estrangeira deve residir na leitura, e a gramática, por sua vez, deve instrumentalizar o

aprendiz para a habilidade leitora: uma vez que não observei a prática de P2 nesses

contextos de atuação, nada posso afirmar em relação à concretização dessa premissa em

suas ações pedagógicas.

b) A maneira como o professor aborda a gramática nas aulas deve se pautar

nos interesses e objetivos do grupo de aprendizes: considerando que os aprendizes não

119

foram envolvidos nesta pesquisa e que, portanto, desconheço seus interesses e objetivos,

não posso verificar se o ensino de gramática adotado dialoga harmoniosamente com os

propósitos dos aprendizes.

4. Como as professoras direcionam a atenção dos alunos para o sentido

e para as funções comunicativas da língua quando lidam com aspectos

gramaticais?

Considerando os procedimentos adotados e as atividades propostas em sala de

aula, verificamos que P1 não direciona efetivamente a atenção de seus aprendizes para o

sentido e para as funções comunicativas ao trabalhar com aspectos gramaticais. A

observação das aulas de P1 evidenciou grande preocupação com a manipulação das

formas em detrimento da produção de significados com propósitos comunicativos. Ao

trabalhar com os advérbios de frequência, por exemplo, P1 enfatizou a regra de

ordenação das sentenças, ressaltando para os aprendizes unicamente a importância de

que a regra fosse memorizada. No entanto, os exemplos fornecidos e os exercícios

propostos são completamente descontextualizados e não veiculam sentidos que, de fato,

dialoguem com a realidade dos aprendizes. Além disso, também não vislumbramos

oportunidades de uso efetivo das formas com propósitos de comunicação.

Notoriamente, P1 apenas menciona o sentido e as funções comunicativas. Isto é, P1

revela o significado das formas e declara em que situações tais formas são empregadas.

Contudo, os aprendizes não são expostos a exemplos significativos como também não

são conduzidos à produção de enunciados que cumpram propósitos de comunicação.

Quanto a P2, verificamos que durante suas aulas o sentido das estruturas é

explorado por meio de perguntas de verificação. P2 questiona insistentemente a respeito

do significado das sentenças que são utilizadas como insumo. A princípio, os aprendizes

são expostos ao insumo. Em seguida, são conduzidos à repetição das estruturas

linguísticas para, finalmente, serem questionados sobre os significados que elas

veiculam. Observa-se, portanto, que há uma preocupação em garantir a compreensão

das mensagens transmitidas pelas estruturas. Em relação às funções comunicativas,

verifica-se que há a intenção de demonstrar através dos exemplos e do insumo fornecido

a função desempenhada pelas formas. As imagens e diálogos demonstrados facilitam a

compreensão das estruturas em uso. No entanto, observa-se também que não há

oportunidades para que tais estruturas sejam efetivamente utilizadas. Desse modo, é

120

provável que os aprendizes sejam capazes de descrever as situações em que as formas

podem ser empregadas, porém não é possível verificar se eles são capazes de usar

efetivamente essas formas nas situações descritas.

5. O contexto de atuação (escola pública ou curso de idiomas) interfere

na maneira como as professoras abordam o ensino da gramática em suas aulas?

Alguns aspectos do contexto de atuação, de certo, influenciam na abordagem

adotada para o ensino da gramática. No entanto, não posso ser taxativa ao elencar que

aspectos, de fato, exercem uma interferência direta na maneira como as professoras

conduzem o ensino de gramática em suas aulas, considerando que não tive como

averiguar qual seria a postura destas profissionais caso o contexto fosse outro. Desse

modo, o que pretendo aqui é descrever que aspectos possivelmente impedem ou

dificultam para que o professor concretize, na prática, algumas das premissas e

concepções identificadas em seu discurso.

Nesta pesquisa, as professoras participantes parecem estar situadas em dois

segmentos extremos: P1, sendo professora de uma escola pública da rede estadual,

carece de uma infraestrutura adequada para o ensino de uma LE, ainda mais quando

consideramos o número excessivo de alunos por turma. Porém, P1 dispõe de ampla

autonomia na condução de suas ações pedagógicas. P2, por outro lado, ao atuar em um

curso de idiomas, conta com uma infraestrutura apropriada e suas turmas são compostas

de, no máximo, quinze alunos. Contudo, P2 dispõe de pouca autonomia para conduzir

suas atividades de ensino. O método imposto e o tempo disponível para que se cumpra

integralmente o material didático, de certa maneira, parecem aprisioná-la em um

arcabouço didático que nem sempre reflete suas expectativas em relação ao ensino de

LE. Partindo dessas considerações, concluo que os aspectos a seguir listados podem

interferir na condução do ensino da gramática:

a) Número de aprendizes nas turmas: Os dados obtidos na entrevista

demonstraram recorrentemente que P1 concebe e anseia que a gramática funcione como

ferramenta para a comunicação falada. É nítido o interesse e expectativa de que seus

aprendizes desenvolvam habilidades orais. No entanto, ao se deparar com uma realidade

de quarenta e cinco alunos na turma, não é difícil imaginar as dificuldades enfrentadas

121

por P1 ao tentar implementar atividades orais. Desse modo, o discurso de P1 também

sugere certa frustração nesse sentido. A professora parece não dispor de alternativas

para que esse propósito do ensino se concretize, em sua prática.

b) Infraestrutura: P1 carece de uma infraestrutura em sala de aula que lhe

permita utilizar habitualmente de recursos audiovisuais. Na sala em que realizei a

observação, não havia televisão, aparelho de som ou projetores. Desse modo, parece-me

inviável que P1 utilize insumo auditivo, por exemplo, para inserir aspectos gramaticais

nas aulas. Na entrevista, P1 deixa claro sua convicção de que os falantes nativos e a

imitação de estruturas por eles produzidas desempenham importante papel no

aprendizado. No entanto, a ausência desses recursos inviabiliza iniciativas que se

pautem em atividades auditivas. Assim sendo, o único insumo em língua inglesa a que

os aprendizes são expostos é aquele proveniente da fala de P1 ao fornecer exemplos e

ler textos. A realidade vivenciada por P1 é representativa de uma gama de profissionais

que esbarram cotidianamente com os mesmos empecilhos e, que, não raro, apesar da

vontade de trabalhar as quatro principais habilidades linguísticas, precisa eleger entre

elas aquela que é exequível em seu contexto de atuação.

c) Tempo: P1 tem um encontro semanal com a turma. São duas aulas

geminadas com duração de cinquenta minutos cada. Desse modo, P1 dispõe de uma

hora e quarenta minutos semanais para contemplar o ensino da língua. P2, por sua vez,

tem dois encontros semanais com a turma, com duração de uma hora e quinze minutos

cada. Assim sendo, ela dispõe de duas horas e trinta minutos semanais para cumprir

com os objetivos do ensino. No curso de idiomas, portanto, contabilizamos cinquenta

minutos adicionais em relação à escola pública. Vale ressaltar ainda que, no curso de

idiomas, são previstos os feriados, datas festivas etc. As aulas não ministradas, por

coincidirem com estas datas, são remanejadas para um dia alternativo. Além disso,

conforme mencionado por P1 previamente durante a entrevista, existe a possibilidade de

agendar aulas extras às sextas feiras, quando a professora julga necessário. Se

adicionarmos ao fator tempo a quantidade de alunos; verifico uma discrepância

considerável entre os dois contextos. Considero que alguns indícios apontam para uma

possível interferência do fator tempo nas ações pedagógicas das professoras. P1, por

exemplo, opta declaradamente por uma abordagem dedutiva de ensino. A abordagem

dedutiva, certamente, poupa tempo, uma vez que o professor vai direto ao ponto e

fornece as regras e os exemplos imediatamente. A opção por uma abordagem indutiva,

122

possivelmente, demandaria mais tempo tanto durante o planejamento das aulas quanto

durante a sua condução. P2, por outro lado, ao dispor de maior carga horária de aulas,

além de ter condições de trabalhar as quatro habilidades, conduz o ensino por meio de

uma abordagem indutiva. Conforme observado nas aulas, há um tempo disponível para

que P2 questione e verifique a compreensão dos aprendizes dos enunciados proferidos

nos diálogos. O aprendiz escuta, repete e, supostamente, compreende o sentido expresso

pelas estruturas utilizadas. Vale ressaltar, entretanto, que a adoção desse modelo de

ensino, no caso de P2, é muito mais uma exigência metodológica da instituição do que

uma escolha pessoal da professora.

d) Autonomia: Os dados demonstraram uma nítida divergência entre os dois

contextos de atuação no que tange ao quesito autonomia. P1 parece ter ilimitada

autonomia na condução de sua prática pedagógica. P2, por outro lado, carece de

autonomia em diversos aspectos. Para fins de exemplificação, posso citar a ausência de

autonomia na escolha dos materiais didáticos e na opção por procedimentos e

estratégias de ensino. Gostaria de pontuar que, durante esta pesquisa, o pesquisador teve

dificuldades interpretativas para identificar se determinadas manifestações em sala de

aula advinham da professora em si ou do método empregado. Essa confusão, entretanto,

não me parece ter sido ocasionada porque P2 está convicta de todas as premissas

inerentes ao método. Parece-me, contudo, que P2 incorpora tais premissas no momento

em que entra em sala de aula. O método, de certo modo, parece cumprir um ideal de

ignorar e silenciar as perspectivas, crenças e expectativas do professor. Desse modo,

percebo que, em relação ao ensino de gramática, P2 afirma em seu discurso que, em

suas aulas particulares, a abordagem é mais desafiadora. Segundo P2, ela conduz os

aprendizes a inferir sobre o funcionamento da língua, propondo questionamentos que

façam com que os aprendizes reconheçam os padrões linguísticos. Para tanto, P2 afirma

utilizar materiais autênticos, tais como revistas, jornais e depoimentos. As afirmações de

P2 sugerem que suas aulas particulares exigem mais participação efetiva do aprendiz na

construção do conhecimento. Diante disso, somos levados a supor que, caso P2 tivesse

autonomia na condução das aulas no curso de idiomas, a sua abordagem de ensino da

gramática, nesse contexto, seria delineada nos mesmos moldes utilizados em suas aulas

particulares, uma vez que P2 acredita que essa perspectiva de ensino é mais eficiente.

Considerando os resultados obtidos com esse trabalho de pesquisa, verifica-se

que o ensino de gramática nas aulas de LE continua sendo um grande desafio para os

123

professores, mesmo em contextos onde, supostamente, são oferecidas as condições

adequadas para sua condução. O desafio recai tanto na escolha de procedimentos que se

adéquem e atendam ao estilo de aprendizagem dos aprendizes, haja vista a

heterogeneidade de estilos dentro de uma classe, quanto na efetiva inserção do

significado e das funções comunicativas nas aulas de gramática. De modo geral,

percebe-se que os professores de língua inglesa não têm dificuldades em lidar com as

estruturas linguísticas e conseguem demonstrar eficientemente aos aprendizes como

essas estruturas se organizam sistematicamente para a formação de sentenças. No

entanto, parece que os professores de línguas não têm sido tão eficientes na tarefa de

atrelar o aspecto sistêmico ao semântico e pragmático. Nesse sentido, faz-se necessário

repensar a eficácia das estratégias de ensino tão comumente utilizadas por professores

de LE em suas práticas pedagógicas. Faz-se necessário ainda refletirmos se os

professores de LE têm sido capazes de, conforme sugere Scheyerl (2009), “construir o

conhecimento em parceria com o aluno, ajudando-o a percorrer reflexivamente todos os

esquemas referenciais que conduzem ao entendimento desse conhecimento.” Afinal, é

um enorme contraponto promover o aprendizado de uma língua sem a efetiva

participação e real envolvimento dos aprendizes.

Esse estudo limitou-se a verificar a perspectiva dos professores e, portanto,

foram averiguados aspectos inerentes ao ensino. Considero que uma pesquisa futura

destinada a verificar a perspectiva do aprendiz, considerando os resultados na

aprendizagem e avaliando o grau de eficiência das abordagens utilizadas em diferentes

contextos de ensino de LE, seria de valorosa contribuição para refletirmos sobre a

condução do ensino da gramática.

De qualquer maneira, mediante a pesquisa por ora realizada, os dados obtidos e

os referenciais teóricos aqui discutidos apontam algumas orientações para o ensino de

gramática que, de certo, precisam ser observadas e conduzidas à prática. Destaco a

seguir as orientações que podem ser inferidas ao longo desse estudo:

a) Apresentar a gramática em contextos significativos para os aprendizes,

atrelando o conhecimento sistêmico ao conhecimento de mundo.

b) Promover a compreensão da organização e do uso das estruturas

linguísticas sem necessariamente exigir do aprendiz a imediata produção.

c) Demonstrar de que maneira a escolha da forma impacta no sentido.

124

d) Conduzir o processo de correção de maneira que o aprendiz perceba as

inadequações em seus enunciados e desenvolva a habilidade de autocorreção.

e) Conduzir o ensino de maneira que habilite o aprendiz a evoluir da

produção de estruturas “frouxas” para a produção de estruturas mais coesas.

f) Promover atividades em que as estruturas linguísticas possam ser

utilizadas na negociação de sentidos e no cumprimento das funções comunicativas da

língua.

g) Envolver o aprendiz efetivamente no processo de ensino-aprendizagem

de modo que ele contribua com a construção do conhecimento, por meio da reflexão das

estruturas em uso, do reconhecimento dos padrões linguísticos e da resolução de

problemas.

h) Alternar entre as abordagens dedutiva e indutiva, a depender dos aspectos

contextuais, tais como o perfil dos aprendizes, o propósito da aula, o tempo e os

materiais disponíveis, a estrutura gramatical em estudo, dentre outros.

No início desse trabalho, quando justifico a realização dessa pesquisa e aponto

os fatores que me motivaram a conduzir esse estudo, afirmo o meu objetivo em

contribuir, de alguma maneira, para uma mudança no cenário do ensino de língua

inglesa na atualidade. Nesse sentido, essa pesquisa originou um projeto de Extensão

com professores da rede pública municipal de Porto seguro, cujo objetivo é criar um

espaço de discussão e planejamento de estratégias que nos permitam por em prática as

orientações acima descritas.

De certo, ao concluir esse estudo, o sentimento é de grande satisfação, haja vista

a convicção de que, ainda que timidamente, a pesquisa pôde colaborar para a reflexão

do ensino de gramática na contemporaneidade bem como para a possível realização de

mudanças.

125

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130

APÊNDICES

APÊNDICE A

Roteiro para a entrevista semiestruturada

1. Qual é a sua formação acadêmica e quais são as principais contribuições dessa

formação para a sua atuação na sua prática diária?

2. Há quanto você tempo atua como professor (a) de língua inglesa?

3. Como você define o termo ‘gramática’?

4. Que concepção de gramática você utiliza para conduzir a sua prática de ensino?

5. Em sua prática pedagógica, você adota alguma orientação teórica específica que

fundamente os procedimentos utilizados para o ensino da gramática?

6. O material didático utilizado em suas aulas é predeterminado pela instituição de

ensino ou você possui autonomia para escolhê-lo?

7. Como você avalia a concepção de gramática no material didático adotado? A

perspectiva de ensino de gramática presente nesse material condiz com a sua?

8. De que maneira novos itens gramaticais são introduzidos em suas aulas?

9. Alguns teóricos defendem que o ensino da gramática deve ser evitado ou, até

mesmo, banido da sala de aula. Qual é o seu posicionamento em relação a isso?

131

APÊNDICE B

Questionário

1. Especifique seu curso de graduação e o ano de conclusão.

2. Em que tipo de instituição você fez o curso superior?

( ) Pública Federal

( ) Pública Estadual

( ) Privada

( ) Outros _____________________________

3. Assinale a(s) modalidade(s) de curso de pós-graduação que você possui:

( ) Aperfeiçoamento

( ) Especialização

( ) Mestrado

( ) Doutorado

( )Não fiz curso de pós graduação

( )Não completei curso de pós-graduação

4. Com que frequência você participa de atividades de formação continuada

(cursos de capacitação, eventos científicos, treinamento etc.)?

5. Você participou de alguma atividade de formação continuada nos últimos seis

meses? Caso positivo, qual a natureza da atividade e que temática foi abordada?

6. Há quanto tempo você atua como professora de língua inglesa?

7. Você atua como professora em alguma outra instituição além da participante

nesta pesquisa? Caso positivo, em quantas outras instituições você atua e qual a

natureza da(s) mesma(s): escola pública, escola privada, curso de idiomas etc.?

8. Ao todo, quantas horas-aula você ministra por semana? (Considere todas as

instituições de ensino em que trabalha)

9. Há quanto tempo você trabalha nesta instituição*?

10. Nesta instituição*, qual é sua carga horária semanal total de trabalho?

132

11. Quantas horas-aula semanais você ministra nesta instituição*?

12. Nesta instituição*, quantas horas semanais você tem disponíveis para

planejamento?

13. Você considera o tempo disponível para planejamento suficiente?

14. Você costuma fazer o planejamento de suas aulas juntamente com os demais

professores de língua inglesa ou sozinha? Por quê?

15. Nesta instituição*, você conta com apoio pedagógico no planejamento de suas

atividades de ensino? Caso positivo, em que consiste esse apoio?

16. Nesta instituição*, você ministra aulas para quantas turmas?

17. Nesta instituição*, qual é a média de alunos por turma?

18. Qual é o seu vínculo trabalhista com esta instituição*?

( ) CLT

( ) Estatutário

( ) Contrato temporário

( ) outros

19. Assinale os recursos que estão disponíveis para uso em suas aulas nesta

instituição*:

( ) Quadro branco

( ) Marcadores para quadro branco

( ) Televisão

( ) Aparelho de som

( ) Computador

( ) Acesso a internet

( ) Projetor de slides

( ) Retroprojetor

( ) Livro didático

( ) Jornais e revistas informativas em língua inglesa

( ) fotocópias

( ) Livros de literatura em língua inglesa

( ) CD

133

20. Dentre os recursos assinalados acima, quais deles você costuma utilizar?

21. A turma participante desta pesquisa é composta por quantos alunos?

22. Qual a faixa etária dos alunos desta turma?

23. Os alunos desta turma possuem livros didáticos?

( ) sim

( ) Não

24. Com que frequência o livro didático é utilizado em suas aulas?

( ) Semanalmente

( ) Algumas vezes por mês

( ) Uma vez por mês

( ) Nunca

25. Você participou na escolha do livro didático adotado?

( ) Sim

( ) Não

26. Caso positivo, o livro escolhido foi o adotado na instituição*?

( ) Sim

( ) Não

27. Como você avalia o livro didático adotado pela instituição*?

( ) Ótimo

( ) Bom

( ) Razoável

( ) Ruim

( ) Péssimo

*Refere-se à instituição participante da pesquisa.

134

ANEXOS

Table 1 – Advantages and disadvantages of the deductive approach to teaching grammar.

Advantages

1. The deductive approach goes

straightforwardly to the point and can,

therefore, be time-saving.

2. A number of rule aspects (for example,

form) can be more simply and clearly

explained than elicited from examples.

3. A number of direct practice/application

examples are immediately given.

4. The deductive approach respects the

intelligence and maturity of many adult

learners in particular and acknowledges the

role of cognitive processes in language

acquisition.

5. It confirms many learners’ expectations

about classroom learning particularly for

those who have an analytical style.

Disadvantages

1. Beginning the lesson with a grammar

presentation may be off-putting for some

learners, especially younger ones.

2. Younger learners may not able to

understand the concepts or encounter

grammar terminology given.

3. Grammar explanation encourages a

teacher-fronted, transmission-style classroom,

so it will hinder learner involvement and the

interaction immediately.

4. The explanation is seldom as memorable as

other forms of presentation (for example,

demonstration).

5. The deductive approach encourages the

belief that learning a language is simply a

case of knowing the rule.

135

Table 2 – Advantages and disadvantages of the inductive approach to teaching grammar.

Advantages

1. Learners are trained to be familiar with the

rule discovery; this could enhance learning

autonomy and self-reliance.

2. Learners’ greater degree of cognitive depth

is “exploited”.

3. The learners are more active in the learning

process, rather than being simply passive

recipients. In this activity, they will be

motivated.

4. The approach involves learners’ pattern-

recognition and problem-solving abilities in

which particular learners are interested in this

challenge.

5. If the problem-solving activity is done

collaboratively, learners get an opportunity

for extra language practice.

Disadvantages

1. The approach is time and energy-

consuming as it leads learners to have the

appropriate concept of the rule.

2. The concepts given implicitly may lead the

learners to have the wrong concepts of the

rule taught.

3. The approach can place emphasis on

teachers in planning a lesson.

4. It encourages the teacher to design data or

materials taught carefully and systematically.

5. The approach may frustrate the learners

with their personal learning style, or their past

learning experience (or both) would prefer

simply to be told the rule.