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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
INSTITUTO DE LETRAS E LINGUÍSTICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM ESTUDOS LINGUÍSTICOS
LUDMILA NOGUEIRA DE ALMEIDA
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE LÍNGUAS PARA A AVALIAÇÃO DA
APRENDIZAGEM À LUZ DA COMPLEXIDADE E DA
TRANSDISCIPLINARIDADE
UBERLÂNDIA
2015
15
LUDMILA NOGUEIRA DE ALMEIDA
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE LÍNGUAS PARA A AVALIAÇÃO DA
APRENDIZAGEM À LUZ DA COMPLEXIDADE E DA
TRANSDISCIPLINARIDADE
Trabalho apresentado à Comissão Examinadora para
Defesa de Dissertação de Mestrado no Programa de Pós-
Graduação em Estudos Linguísticos da Universidade
Federal de Uberlândia, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Estudos Linguísticos.
Linha de pesquisa: Ensino e aprendizagem de línguas.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Inês Vasconcelos Felice.
UBERLÂNDIA
2015
16
17
LUDMILA NOGUEIRA DE ALMEIDA
A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE LÍNGUAS PARA A AVALIAÇÃO DA
APRENDIZAGEM À LUZ DA COMPLEXIDADE E DA TRANSDISCIPLINARIDADE
Trabalho apresentado à Comissão Examinadora para
Defesa de Dissertação de Mestrado no Programa de Pós-
Graduação em Estudos Linguísticos da Universidade
Federal de Uberlândia, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Estudos Linguísticos.
Linha de pesquisa: Ensino e aprendizagem de línguas.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Inês Vasconcelos Felice.
18
Dedico este trabalho a todos os
educadores que escolheram a
missão de trabalhar em ambientes
educacionais e que lutam com
ardor por uma educação
transformadora.
19
AGRADECIMENTOS
Expresso minha gratidão a muitos seres que contribuíram para o desenrolar deste
trabalho:
À minha orientadora, professora Dra. Maria Inês Vasconcelos Felice, que depositou
em mim toda a confiança, me apoiando para prosseguir pesquisando o que mais me motivava.
Aos meus amigos do Grupo de Estudos em Educação e Psicologia Espírita Joanna de
Ângelis (GEEPEJA) que me permitiram apresentar-lhes a teoria da complexidade e a
transdisciplinaridade em nossos encontros de estudo, contribuindo para o desenvolvimento de
minhas reflexões.
Aos professores e colegas do Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos,
que enriqueceram minhas reflexões durante o percurso de pesquisa.
À professora Dra. Valeska Virgínia Soares Souza, por me receber com muito carinho
em seu gabinete de atendimento, me dando os direcionamentos necessários para embasar
minha pesquisa na teoria da complexidade.
Às professoras Ma. Cláudia Almeida Rodrigues Murta, Dra. Maximina Maria Freire e
Dra. ValeskaVirgíniaSoares Souza, por trazerem contribuições preciosas durante o exame de
qualificação.
Aos meus alunos da Central de Línguas e do Centro Educacional Eurípedes
Barsanulfo que indiretamente permitiram que eu colocasse em prática o que paulatinamente ia
aprendendo sobre ensino e avaliação da aprendizagem à luz da complexidade, da
transdisciplinaridade e da avaliação formativa.
Aos meus queridos familiares, em especial minha mãe, Maria Aparecida Nogueira e
minha irmã, Fabiana Nogueira de Almeida, que me apoiaram constantemente, me sustentando
nos momentos de cansaço, de angústia, compreendendo também as minhas muitas ausências
no meio familiar.
Ao meu pai de alma, Franklin José Heilbuth, professor que me é exemplo e inspiração
e que sempre me incentivou a prosseguir em meus estudos.
À minha querida amiga, Natália Luíza Silva, que esteve sempre presente a me apoiar
seja nas discussões sobre avaliação, sobre educação, sobre a vida. Além disso, agradeço-a
também pela leitura e revisão desta dissertação.
A Deus e aos amigos espirituais.
20
Quero ensiná-lo a viver!
Emílio de Rousseau
É preciso ensinar a compreensão humana.
Edgar Morin
21
RESUMO
A presente pesquisa tem como macro objetivo descrever e problematizar, à luz da
complexidade, como se processa a formação de professores de línguas do curso de Letras de
uma universidade do interior do Brasil, no que concerne à avaliação da aprendizagem. Assim
sendo, os questionamentos que guiam esta pesquisa são: 1. O que propõe o Projeto Político-
Pedagógico (PPP) do curso de Letras da instituição escolhida para este estudo de caso, no que
tange à avaliação da aprendizagem? 2. Como os professores formadores veem a avaliação da
aprendizagem na formação de professores de línguas? 3. As propostas e práticas avaliativas
analisadas correspondem ao que a complexidade,atransdisciplinaridade e os estudos em
avaliação sugerem para as práticas educacionais da contemporaneidade?Trata-se de um
estudo de caso inserido no paradigma metodológico da pesquisa qualitativa, com base em
Stake (1995) e André (2008), que buscou, como fonte de dados, entrevistas semiestruturadas
realizadas com professores formadores e documentos da instituição, como o PPP e os Planos
de Ensino. Para discutir a Avaliação da Aprendizagem, este estudo se embasou, sobretudo, em
Álvarez Méndez (2002), Fernandes (2009), Hadji (2008), Luckesi (2010); e para discutir
Avaliação e Linguística Aplicada, foram buscadas as contribuições de Neves (2004), Cunha
(2006), Menezes e Sade (2006), e Felice (2011). Tais autores defendem a prática de uma
avaliação formativa, pois é o tipo de avaliação que se mostra como o mais adequado para a
regulação da aprendizagem. Para o item Formação de Professores, foram empregadas as
lentes do paradigma da complexidade e seus desdobramentos educacionais, com base,
principalmente, nas elucubrações teóricas de Freire (2009), Leffa (2006), Moraes (2007a),
Morin (2003; 2005; 2013; 2014) e Nicolescu (2011). Por meio de suas pesquisas, esses
autores evidenciam o surgimento de um novo paradigma educacional advindo do paradigma
da complexidade que, de acordo com Moraes (2007b), emergiu, mas ainda não foi encarado e
assumido pelo sistema educacional. Esse paradigma, de fato, enxerga a necessidade de uma
educação que transcenda a fronteira das disciplinas e que encare o ser humano em seu aspecto
multidimensional, isto é, integral – social, biológico, cultural, mental, físico e espiritual. A
análise dos dados, a partir do percurso teórico-metodológico escolhido, aponta para a
necessidade de uma auto-heteroecoformação (FREIRE, 2009; FREIRE; LEFFA, 2013;
MORAES, 2007a; 2010a; 2010b) de professores,voltada à avaliação da aprendizagem de
línguas, de maneira que a avaliação formativa deixe de ser apenas mais uma utopia
educacional nas práticas avaliativas de docentes dos diferentes níveis de ensino (HADJI,
2008), concretizando-se nas práticas dos professores formadores para retroagirem nas práticas
dos professores em formação.
Palavras chaves: Formação de professores. Avaliação.Complexidade.Transdisciplinaridade.
22
ABSTRACT
This research has as a macro objective to describe and question, in the light of complexity,
how the language teacher training of a Language and Literature course from a Brazilian
university is processed, regarding the learning assessment. Therefore, the questions that
guide this research are: 1. What does the Political-Pedagogical Project (PPP) of the
Language and Literature course from the selected institution for this case study propose,
regarding the assessment? 2. How do the teachers/trainers see the learning assessment in the
training of language teachers? 3. Do the analyzed proposals and assessment practices
correspond to what complexity, transdisciplinarity and studies on assessment suggest to the
contemporary educational practices? It is a case study inserted in the methodological
paradigm of qualitative research, based on Stake (1995) and André (2008), which sought as a
source of data semi-structured interviews with teachers/trainers and documents from the
institution, such as PPP and Course Plans. To discuss assessment, this study was supported
especially in Álvarez Méndez (2002), Fernandes (2009), Hadji (2008), Luckesi (2010); and to
discuss evaluation and Applied Linguistics, contributions from Neves (2004), Cunha (2006),
Menezes and Sade (2006) and Felice (2011) were sought. These authors defend the practice
of a formative assessment because it is the kind of evaluation that seems the most appropriate
for the regulation of learning. For the item Teacher Training, the lenses of the complexity
paradigm and their educational outcomes were utilized, supported mainly in theoretical
lucubration of Freire (2009), Leffa (2006), Moraes (2007a), Morin (2003; 2005; 2013; 2014)
and Nicolescu (2011). Through their research, these authors show the appearance of a new
educational paradigm arising from the complexity paradigm that, according to Moraes
(2007b), emerged, but it has not been faced and assumed by the educational system yet. This
paradigm, in fact, sees the necessity for an education that transcends the discipline edges and
which faces the human being in his/her multidimensional aspect, that is, integral – social,
biological, cultural, mental, physical and spiritual. Data analysis from the theoretical and
methodological approach chosen points to the necessity of a self-heteroecoformation
(FREIRE, 2009; FREIRE; LEFFA, 2013; MORAES, 2007a; 2010a; 2010b) of teachers,
focused on language learning evaluation, so that formative assessment is no longer just an
educational utopia in assessment practices of teachers from different educational levels
(HADJI, 2008), concretizing on the practice of teachers/trainers to retroact in the practices of
teachers in training.
Keywords: Teacher training. Assessment.Complexity.Transdisciplinarity.
23
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Histórico da Avaliação Educacional...................................................................... 66
Quadro 2: Pistas para avaliar formativamente de acordo com Hadji (2008).......................... 74
Quadro 3: Resumo das perguntas, fontes de dados e métodos, justificativa e base teórica da
pesquisa.................................................................................................................................... 95
Quadro 4: Como a formadora Rosa realiza a formação para a avaliação da
aprendizagem......................................................................................................................... 111
Quadro5:Como a formadora Luana realiza a formação para a avaliação da
aprendizagem......................................................................................................................... 115
Quadro 6:Como a formadora Nair realiza a formação para a avaliação da
aprendizagem......................................................................................................................... 117
Quadro 7: Como a formadora Rosa avalia - disciplina: Estágio Supervisionado de Língua
Portuguesa.............................................................................................................................. 121
Quadro 8: Como a formadora Rosa avalia – disciplina: Estágio Supervisionado de Português
em diferentes contextos.......................................................................................................... 122
Quadro 9: Como a formadora Luana avalia – disciplina: Metodologia de Ensino de Inglês
para Fins Específicos............................................................................................................. 124
Quadro 10: Como a formadora Luana avalia – disciplina: Estágio supervisionado de Língua
Inglesa2................................................................................................................................. 126
Quadro 11: Como a formadora Nair avalia – disciplina: Estágio supervisionado de Português
como língua estrangeira......................................................................................................... 129
Quadro 12: Como a formadora Nair avalia – disciplina: Metodologia de ensino do Português
como língua estrangeira......................................................................................................... 130
24
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: O objeto transdisciplinar : o Sujeito transdisciplinar e o termo de interação.......... 41
Figura 2: Representação simbólica da ação da lógica do 3º incluído.................................... 42
Figura 3: Comparação entre o conhecimento disciplinar CD e o conhecimento
transdisciplinar CT................................................................................................................... 43
Figura 4: Visão transdisciplinar de uma situação de pesquisa............................................... 47
Figura 5: Processo tripolar de formação................................................................................. 54
Figura 6: Limites da avaliação polilógica............................................................................... 79
25
LISTA DE SIGLAS
AFA – Avaliação Formativa Alternativa
AILA – Associação Internacional de Linguística Aplicada
ASL – Aquisição de Segunda Língua
CD – Conhecimento Disciplinar
CT – Conhecimento Transdisciplinar
EFL – Entrevista com a formadora Luana
EFN – Entrevista com a formadora Nair
EFR – Entrevista com a formadora Rosa
LA – Linguística Aplicada
LDBN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LE – Língua Estrangeira
NSF – Nation Science Foundation
PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais
PPP – Projeto Político-Pedagógico
SCA – Sistema Adaptativo Complexo
TCI – Tecnologias de Comunicação e Informação
UIP – Universidade Interdisciplinar de Paris
UNESCO –Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
26
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO – FAZENDO QUESTIONAMENTOS PARA ENCONTRAR
POSSIBILIDADES................................................................................................................ 15
Macro objetivo............................................................................................................. 18
Objetivos Específicos................................................................................................... 19
CAPÍTULO 1 – Oparadigma da complexidade e seus desdobramentos na educação e na
Linguística Aplicada..............................................................................................................21
1.1 Paradigma da complexidade e seus desdobramentos educacionais................................ 21
1.2 Teoria da complexidade e seus desdobramentos educacionais........................................ 25
1.2.1 A Reforma do conhecimento................................................................................... 26
1.2.2 A Reforma do pensamento...................................................................................... 31
1.2.3 A Reforma do ensino............................................................................................... 37
1.3 A transdisciplinaridade e a complexidade........................................................................ 40
1.4 Transdisciplinaridade, Linguística Aplicada e complexidade.........................................44
1.4.1 LA e transdisciplinaridade..................................................................................... 45
1.4.2 LA e complexidade................................................................................................. 49
1.5 A proposta da auto-heteroecoformação de professores ..................................................53
CAPÍTULO 2 – Avaliação da aprendizagem, Linguística Aplicada e
transdisciplinaridade.............................................................................................................60
2.1 Breve histórico da avaliação educacional.......................................................................... 62
2.2 Da avaliação formativa à avaliação polilógica transdisciplinar.........................................69
2.3 Avaliação e Linguística Aplicada...................................................................................... 81
CAPÍTULO 3 –METODOLOGIA......................................................................................88
3.1 O estudo de caso............................................................................................................... 88
3.2 Contexto de pesquisa ....................................................................................................... 89
3.3 Participantes da pesquisa.................................................................................................. 91
3.4 Instrumentos e procedimentos de geração de dados ........................................................ 93
3.5 Procedimentos de análise de dados .................................................................................. 94
CAPÍTULO 4 – RELIGANDO TEORIAS, METODOLOGIA E DADOS...................... 98
27
4.1 O que prescreve o Projeto Político-Pedagógico do curso de Letras da instituição escolhida
para este estudo de caso, no que tange à avaliação da aprendizagem?........................ 98
4.1.1 Concepções de avaliação da aprendizagem........................................................... 102
4.1.2 Direcionamentos para a formação do professor para a avaliação da
aprendizagem............................................................................................................. 104
4.2 Como os professores formadores veem a avaliação da aprendizagem na formação de
professores de línguas? .............................................................................................. 109
4.2.1 Como o professor formador realiza a formação para a avaliação da
aprendizagem.............................................................................................................110
4.2.2 Como o professor formador avalia........................................................................ 120
4.3 As propostas e práticas avaliativas analisadas correspondem ao que a complexidade e os
estudos em avaliação sugerem para as práticas educacionais da
contemporaneidade?...................................................................................................132
FINALIZANDO E DESCOBRINDO POSSIBILIDADES: A favor de umaauto-
heteroecoformaçãodocente para a avaliação da aprendizagem....................................... 138
REFERÊNCIAS................................................................................................................... 143
APÊNDICES......................................................................................................................... 149
Apêndice A– Roteiro da entrevista........................................................................... 149
Apêndice B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido................................... 150
INTRODUÇÃO – FAZENDO QUESTIONAMENTOS PARA ENCONTRAR
POSSIBILIDADES
Nos cursos de formação de professores existe toda uma organização curricular que é
previamente debatida de maneira a organizar aparatos teóricos, filosóficos, políticos e
metodológicos para que o futuro professor saia do curso capaz de exercer suas atividades de
ensino com competência. Além da formação inicial, muitas universidades juntamente com as
superintendências de ensino oferecem variadas iniciativas de formação continuada que
buscam complementar a formação inicial e também a atualização.
Aproximando-me do meu contexto de formação em Letras, lembro-me que terminei a
licenciatura com dupla habilitação em Línguas e Literaturas Francesa e Portuguesa no
28
segundo semestre de 2010. No entanto, desde o segundo período do curso já exercia a
docência. A possibilidade de estudar e poder imediatamente colocar em prática o que era
aprendido foi muito profícua. No início do curso, não pude fazer uma ligação direta entre o
que estudava na graduação e o que a lide em sala de aula me pedia, pois as disciplinas que
cursava não eram em sua maioria voltadas para as práticas pedagógicas de ensino de línguas.
A partir do sexto período, as disciplinas de Linguística Aplicada (LA) ao Ensino de
Línguas e Metodologia de Ensino de Língua Portuguesa e Língua Estrangeira permitiram uma
maior aproximação do ambiente escolar. Isso aconteceu porque foi necessária a visita a
escolas, observação de aulas e também, na disciplina de Metodologia de Língua Estrangeira,
ministramos em duplas um minicurso de língua estrangeira para a comunidade.
No último período do curso, reservado para os estágios supervisionados, fiz as três
práticas de ensino: Prática de Língua Portuguesa, de Língua Francesa e de Literatura. Antes
de ministrar as aulas, tivemos alguns encontros nos quais foram discutidas questões
pedagógicas e metodológicas que concernem ao ensino e aprendizagem da disciplina na qual
fazíamos estágio, a disciplina de Língua Portuguesa como língua materna, a de Língua
Francesa como língua estrangeira e a de Literatura. Foram momentos muito ricos, pois
pudemos compartilhar boas experiências, dificuldades, e dúvidas, porque a maioria já estava
exercendo a docência. Para essas discussões, os professores nos forneceram textos, com os
quais cada grupo elaborou um seminário.
Finda essa etapa inicial, nos organizamos e, em cada estágio, oferecemos um
minicurso para a comunidade. No estágio de Língua Francesa, oferecemos, em duplas, um
curso de francês de nível básico em uma escola estadual da cidade. O público eram alunos do
Ensino Médio, de 15 a 17 anos. Com a colaboração do professor orientador do estágio, eu e a
outra professora em formação elaboramos o Plano de Curso. Os Planos de Ensino foram
organizados apenas por mim e minha colega. Num período de dois meses e meio, ministramos
o minicurso. Não tive muitas dificuldades nesse estágio, pois já era professora em formação
em um projeto do curso de Letras, e ministrava aulas de francês no centro de línguas da
universidade. A avaliação da aprendizagem foi feita nos moldes que eu já fazia na escola de
línguas, apenas com provas que eram corrigidas e depois devolvidas para os alunos para que
eles tomassem conhecimento de suas notas.
No estágio da Prática de Língua Portuguesa, oferecemos uma oficina de leitura e
produção de textos para alunos do Ensino Fundamental da escola de Educação Básica da
universidade. Dividimo-nos em duplas e cada dupla, com a orientação do professor, elaborou
uma aula sobre um gênero textual. Nessa oficina, não elaboramos instrumentos de avaliação
29
da aprendizagem, visto que era uma oficina de reforço escolar e também porque cada
professor ministrou apenas uma aula.
Para a Prática de Literatura, montamos dois minicursos. Um deles foi sobre as obras
literárias cobradas no processo seletivo de entrada nos cursos de graduação da universidade.
Dividimo-nos também em duplas e cada dupla ficou responsável em dar uma aula sobre uma
obra literária que foi ministrada para alunos do Ensino Médio da comunidade. Para o segundo
minicurso, realizamos oficinas de Literatura Infanto-Juvenil. As mesmas duplas do primeiro
minicurso escolheram uma obra literária infanto-juvenil que foi trabalhada em forma de
contação de histórias para crianças convidadas pelos professores em formação e pelo
professor orientador do estágio. Não foi feito nenhum tipo de avaliação, as aulas foram
expositivas e não tivemos momentos em que avaliamos os alunos, como também não fomos
avaliados por eles.
Em cada estágio supervisionado, após a realização das oficinas e minicursos, tivemos
um período para a elaboração do relatório final de prática de ensino. Cada professor
especificou o que queria nos respectivos relatórios e se disponibilizou para orientações.
Na data marcada, entregamos os relatórios. Os professores orientadores marcaram
então uma data e, após a avaliação do relatório, que tinha maior valor comparado com as
outras atividades que foram realizadas, nos mostraram as notas. Pelo fato de o relatório ter
que ficar na instituição durante determinado período por motivos administrativos, não
pudemos pegá-los de volta.
Finalizar o curso e colar grau me possibilitou assumir cargos em instituições que
exigem diploma. Continuei com as aulas de Língua Francesa e Portuguesa que já ministrava
durante a graduação. Durante o exercício da docência, depois de formada, foi despertada em
mim uma inquietação, a da avaliação da aprendizagem. Durante a reflexão sobre a minha
prática, fazia a mim mesma perguntas como: “Posso adotar outras formas de avaliar além da
prova?,” “As provas que aplico são justas?,” “Devo realmente aplicar as provas prontas que a
escola de idiomas ordena serem aplicadas?,” “Por que é tão difícil elaborar uma prova de
línguas?”.
Interessante foi que, quando exercia a docência durante a graduação, tais
questionamentos não me incomodaram. Acredito que pelo fato de ainda estar muito imatura
na profissão e por achar conveniente repetir as práticas avaliativas que conhecia ou que me
eram oferecidas, como no caso da escola de idiomas que já disponibilizava as provas prontas
que deviam ser obrigatoriamente aplicadas.
30
É importante ressaltar que os meus questionamentos, em sua maioria, giravam em
torno da prova, o que demonstra que não queria estar presa apenas a ela para avaliar a
aprendizagem de meus alunos, mas também não conhecia outras maneiras de avaliar. No
entanto, ao relembrar o período de formação no curso de Letras, constatei que não tive
nenhum momento no qual foi me foi ensinado a elaborar provas, como também se havia ou
não outras maneiras eficientes de avaliar a aprendizagem dos alunos.
O que era de se esperar é que nas disciplinas do núcleo de formação pedagógica
(Linguística Aplicada ao Ensino de Línguas, Metodologia de Ensino de Línguas, Estágio
Supervisionado, dentre outras) fossem reservados momentos nos quais a avaliação da
aprendizagem fosse discutida, mesmo que em apenas uma aula, mas isso não aconteceu. Nos
três estágios supervisionados que fiz, a avaliação foi apenas exercida pelo professor formador,
seja nos seminários apresentados, na observação das aulas dadas e no relatório.
O que se pode depreender desse meu percurso formativo é que não é preciso se
preocupar com a avaliação, pois trata-se quase de um instinto, prática inata que se desenvolve
sem a necessidade de se refletir sobre tal ação e que as provas serão o valioso e único recurso
para saciar essa necessidade instintiva, o alimento que suprirá as necessidades de notação. Na
maioria das disciplinas que cursei no curso de Letras, a prova era o instrumento majoritário
para a avaliação; alguns outros professores utilizaram de outros recursos como seminários,
artigos, etc., contudo, poucos professores possibilitavam feedbacks formativos.
Acho que foi dessas inquietações sobre a avaliação da aprendizagem que nasceram as
motivações para desenvolver esse trabalho de pesquisa, visto que sentia que algo a mais
poderia ser feito para melhorar as minhas práticas avaliativas. Porque as que eu adotava, às
vezes, me davam a impressão de que não respondiam aos objetivos de aprendizagem e eram
um pouco injustas. Essas motivações também justificam a escolha em investigar a formação
inicial de professores de línguas para a avaliação da aprendizagem, visto ser no ensino
superior o lugar onde se deve possibilitar aprendizagens, reflexões e práticas, não apenas de
metodologias e didáticas de ensino, mas também de formas de avaliação.
Mas por que investigar a formação de professores de línguas à luz do paradigma da
complexidade? Percebi que estou em busca de um novo paradigma para minhas práticas
educacionais enquanto professora e aluna há muito tempo. Considero-me um passarinho que
não gosta de estar preso em sua gaiola disciplinar, sempre me interessaram as diversas áreas
do conhecimento.
A transdisciplinaridade da Linguística Aplicada veio ao encontro de meus interesses,
haja vista que o fato de poder buscar em outras ciências os aparatos necessários para as
31
investigações me fez sentir um passarinho livre, sem gaiola disciplinar para ficar presa e
limitada.
Além disso, em duas disciplinas que fiz no mestrado com a professora Valeska
Virgínia Soares Souza, tomei conhecimento da teoria da complexidade. Na disciplina de
Bases Teóricas em Linguística Aplicada, ela nos apresentou a subárea de pesquisa, LA e
complexidade. E na disciplina Tecnologias, Ensino e Aprendizagem de Línguas, ela nos
apresentou, de forma apaixonante e cativante, uma nova maneira de conceber o ensino e
aprendizagem de línguas e sua relação com as tecnologias, a maneira que se ampara à luz da
complexidade.
Dessa gama de novas informações com as quais fui tendo contato durante as aulas e
por meio das leituras que fazia, fui tomada por uma efervescência de questionamentos e
problematizações. Foi nas reflexões feitas nos diários reflexivos da disciplina Tópicos em
Linguística Aplicada 1: Avaliação e Linguística Aplicada, ministrada pela professora Dra.
Maria Inês Vasconcelos Felice, que surgiram outros questionamentos como: “Como seria
então avaliar transdisciplinarmente?” e “As práticas avaliativas mais recentes, propostas na
atualidade, estão fundamentadas no paradigma da complexidade?”.
Assim sendo, após ter exposto os questionamentos que motivaram a escolha do objeto
de pesquisa, como também as razões que justificam a necessidade de estudos que visem à
formação de professores para o objeto de estudo escolhido, passo, então, a explicitar os
objetivos desta pesquisa. Em sequência, detalho como a dissertação está organizada,
descrevendo, resumidamente cada capítulo.
Macro objetivo:
Tendo como contexto de pesquisa o curso de Letras de uma universidade do interior
do Brasil, estabeleci como macro objetivo para esta pesquisa:
- descrever e problematizar como se processa a formação de professores de línguas do curso
de Letras de uma universidade do interior do Brasil, no que concerne à avaliação da
aprendizagem.
Objetivos específicos
Com este trabalho pretendi ainda:
- investigar o que propõe Projeto Político-Pedagógico (PPP) do curso de Letras da instituição
escolhida para este estudo de caso para a as práticas de avaliação da aprendizagem;
32
- investigar como os professores formadores veem a avaliação da aprendizagem na formação
de professores de línguas;
- refletir sobre o que sugerem os estudos mais atuais em avaliação da aprendizagem para as
práticas educacionais;
- refletir sobre o que sugere o paradigma da complexidade para as práticas educacionais e
formativas.
Assim sendo, as perguntas de pesquisa que nortearam as minhas discussões serão as
seguintes:
- O que propõe o PPP do curso de Letras da instituição escolhida para este estudo de
caso, no que tange à avaliação da aprendizagem?
- Como os professores formadores veem a avaliação da aprendizagem na formação de
professores de línguas?
- As propostas e práticas avaliativas analisadas correspondem ao que a complexidade,
a transdisciplinaridade e os estudos em avaliação sugerem para as práticas educacionais da
contemporaneidade?
Esta dissertação está organizada da seguinte maneira: no capítulo um, apresento a
teoria da complexidade que, estabelecida enquanto paradigma, traz contribuições no campo
educacional. Para este tópico destaco, dentre outros autores, as contribuições de Morin(2005a,
2005b), Morin, Ciurana e Motta (2003), Morin e Le Moigne (2000), que definem o vocábulo
complexo, as características do paradigma da complexidade, bem como listam as reformas
necessárias para que este paradigma emirja no campo educacional.
Na seção que segue nesse mesmo capítulo, reservo para discutir e exemplificar a
transdisciplinaridade e a complexidade na LA, apresentando, por fim, a proposta da auto-
heteroecoformação de professores (FREIRE, 2007; FREIRE E LEFFA, 2013; MORAES,
2007a; 2010a; 2010b).
No capítulo dois, apresento os aparatos teóricos que embasam a formação de
professores para a avaliação. Para isso, faço, primeiramente, um breve histórico da avaliação
educacional que culmina nos estudos contemporâneos que defendem práticas formativas de
avaliação, me respaldando, principalmente, em Fernandes (2009), dentre outros autores.
Discorro, igualmente, sobre as contribuições da LA para a avaliação da aprendizagem e
finalizo expondo alguns aspectos da avalição pautada na transdisciplinaridade e
complexidade.
No capítulo três, exponho a metodologia escolhida para a interpretação dos dados
coletados, retomo objetivos, questões, caracterização da pesquisa, contexto, participantes,
33
instrumento e procedimentos de geração de dados. Escolhi como contexto de pesquisa, o
curso de Letras de uma Universidade do interior do Brasil, do qual tenho como fonte de dados
o PPP, Planos de Ensino, como também, três entrevistas realizadas com professoras
formadoras. Na seção que finaliza esse capítulo, discorro sobre os procedimentos de
interpretação de dados.
Trata-se, pois, de um estudo de caso com base em André (2005) e Stake (1995), que
buscou responder às perguntas de pesquisa propostas, interpretando os dados com base no que
atualmente se defende para as práticas educacionais em geral, à luz do paradigma da
complexidade (MORIN, 2002b; 2005a, 2005b; 2005c; MORIN, CIURANA E MOTTA,
2003; MORAES, 2007b); o que se defende para as práticas avaliativas (FERNANDES, 2009;
LUCKESI, 2010; 2011); como também para as práticas de formação de professores
(FREIRE, 2009; FREIRE; LEFFA, 2013; MORAES, 2007a; 2010a; 2010b).
No capítulo quatro, analiso os dados respondendo, em cada seção, cada uma das três
perguntas de pesquisa anteriormente apresentadas, tendo também como aparato metodológico,
quadros e categorias temáticas, com base em Bardin (1977).
Por fim, apresento as conclusões advindas das reflexões feitas durante o percurso de
pesquisa, reflexões que evidenciaram a necessidade de uma auto-heteroecoformação de
professores para a avaliação da aprendizagem.
CAPÍTULO 1 – O paradigma da complexidade e seus desdobramentos na educação e na
Linguística Aplicada
Neste capítulo, faço a resenha da teoria da complexidade. Optei por, primeiramente,
apresentar as bases teóricas da teoria da complexidade já aplicados em pesquisas no campo da
educação, o que não significa que não busquei detalhar seus aspectos teóricos, o que já é feito
com exemplificações dentro dos desdobramentos educacionais.
Assim sendo, inicio discorrendo sobre o surgimento da teoria da complexidade; em
seguida, parto para a resenha de textos que discutiram a teoria no campo educacional.
Posteriormente, discuto as reformas necessárias para a emergência do paradigma da
complexidade na educação, direcionando, a seguir, para a apresentação de pesquisas em LA
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que se embasaram na complexidade. Faço, portanto, uma tessitura transdisciplinar entre as
teorias que sedimentam minhas reflexões a fim de mobilizar embasamentos que respondam às
perguntas de pesquisa aqui propostas.
1.1 O Paradigma da complexidade e seus desdobramentos educacionais
Antes de começar a sondar no campo da LA as pesquisas que buscaram o paradigma
da complexidade para embasar suas problematizações, assumi ser necessária uma sondagem
de trabalhos que catalogaram a emergência de um novo paradigma para a educação.
Recorro então a Kuhn para entender o que vem a ser paradigma. Segundo o filósofo e
historiador da ciência (KUHN,1994, p. 225), paradigma é, em linhas gerais: “a constelação de
crenças, valores e técnicas partilhada pelos membros de uma comunidade científica.”. Moraes
(2007b), ao analisar o que Kuhn entende por paradigma, apresenta a definição de Morin,
argumentando que ela é mais abrangente, pois segundo Morin, paradigma é “um conjunto das
relações fundamentais de associação e/ou de oposição entre um número restrito de noções-
chave, relações essas que vão comandar-controlar todos os pensamentos, todos os discursos,
todas as teorias” (MORIN, 2005b, p.258).
A definição de Morin é, para Moraes (2007b), mais abrangente porque, segundo ela, o
enfoque relacional faz com que conceitos e teorias soberanas convivam com teorias rivais, ao
contrário da definição de Kuhn, que defende a prevalência apenas do consenso entre os
membros de uma comunidade científica que faz desaparecer teorias rivais.
Adotando a definição de paradigma de Morin, parto para a discussão do surgimento e
desenvolvimento do paradigma complexo. A teoria da complexidade surge pela compilação
de trabalhos de diversas áreas do conhecimento e tem como um dos seus principais
representantes o filósofo e sociólogo francês Edgar Morin. De amplos alcances disciplinares,
suas elucubrações teórico-filosóficas trouxeram desdobramentos importantes para o
desenvolvimento de diversas áreas do conhecimento. Essa teoria se embasa em um novo
paradigma, o da complexidade.
A relevância de seus vários trabalhos no âmbito da complexidade despertou a atenção
de pesquisadores e instituições que trabalham pelo desenvolvimento da educação. Dentre eles,
a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) que, em
1999, o convidou para elaborar Os sete saberes necessários para a educação do futuro, com o
objetivo de ampliar e aprofundar o espectro transdisciplinar dos pilares da educação
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estabelecidos por Jacques Delors no Relatório da Comissão Internacional sobre a Educação
para o Século XXI (DELORS, 1998).
Mediante as repercussões da obra Os sete saberes necessários para a educação do
futuro, Morin, com a colaboração de Emilio Roger Ciurana e Raúl Domingo Motta, dá
continuidade ao trabalho, clareando as ideias do pensamento complexo e suas implicações
educacionais em Educar na Era Planetária (MORIN, CIURANA E MOTTA, 2003). É a partir
da resenha dessas obras e outras, sobretudo as de Morin e as de Moraes - que vêm tratar do
paradigma educacional emergente - que teço um percurso tentando abordar os aspectos
teóricos relevantes para a caracterização da teoria da complexidade e seus desdobramentos
educacionais.
É preciso, inicialmente, entender que complexo não é sinônimo de complicado. Do
latin complectere- traçar, tecer, enlaçar; é complexo aquilo que é tecido junto. Por isso, há de
se compreender que:
À primeira vista, complexidade é um tecido de elementos heterogêneos
inseparavelmente associados, que apresentam a relação paradoxal entre o uno
e o múltiplo. A complexidade é efetivamente a rede de eventos, ações,
interações, retroações, determinações, acasos que constituem nosso mundo
fenomênico. A complexidade apresenta-se, assim, sob o aspecto perturbador
da perplexidade, da desordem, da ambiguidade, da incerteza, ou seja, de tudo
aquilo que é se encontra do emaranhado, inextricável (MORIN, CIURANA E
MOTTA, 2003, p.44).
A partir dessa visão de complexidade, pressupõe-se que qualquer objeto de estudo que
se olhe com uma lente complexa, será enxergado a partir de uma visão holográfica,
multidimensional, pois não se deve separar os objetos uns dos outros, muito menos suas
partes e do seu contexto. A complicação, não sendo sinônimo de complexo, o seria apenas um
de seus atributos.
Em oposição à lente complexa está a lente simples, lentes que refletem o que os
paradigmas da complexidade e da simplicidade, respectivamente, ditam para as ciências.
Dentre as influências presentes na formulação das bases do paradigma da simplicidade estão
os procedimentos de análise científica elaborados por Descartes em seu Discurso sobre o
Método:
- o primeiro era o de nunca aceitar algo como verdadeiro que eu não conhecesse
claramente como tal, ou seja, de evitar cuidadosamente a precipitação e a
prevenção, e de nada fazer constar de meus juízos que não se apresentasse tão
clara e distintamente a meu espírito que eu não tivesse motivo algum de
duvidar dele;
- o segundo, o de repartir cada uma das dificuldades que eu analisasse em tantas
parcelas quantas fossem possíveis e necessárias a fim de melhor solucioná-las;
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- o terceiro, o de conduzir por ordem meus pensamentos, iniciando pelos objetos
mais simples e mais fáceis de conhecer, para elevar-me, pouco a pouco, como
galgando degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e presumindo até
mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros;
- e o último, o de efetuar em toda parte relações metódicas tão completas e
revisões tão gerais nas quais eu tivesse a certeza de nada omitir”
(DESCARTES, S/D, não paginado).
Para compreender a realidade de um objeto dado, segundo o método cartesiano, era
preciso, pois, isolar o objeto investigado de outros, decompô-lo em suas partes, para não
influenciar nos resultados, tendo a técnica e objetividade garantidas. Esse paradigma ficou
também conhecido como tradicional ou newtoniano-cartesiano, pois recebeu igualmente
influências dos estudos de Isaac Newton.
Os postulados do paradigma tradicional deram ao homem a visão de um mundo como
um sistema mecânico, sendo possível descrevê-lo objetivamente com raciocínios indutivos e
dedutivos para criação de leis universais de acordo com hipóteses. Dotado desse poder
descritivo, o homem, para compreender o real, precisa, segundo esse paradigma, dominar e
transformar o mundo através da técnica, já que é visto como o dono dos recursos naturais e
aquele que adquiriu a técnica para manipulá-los de acordo com suas necessidades (MORAES,
2007b).
Além disso, tentou-se separar o conhecimento científico do conhecimento advindo do
senso comum, e diferenciar a natureza, os recursos naturais da pessoa humana. Como se o ser
humano também não fosse natureza e não fizesse parte dela, sendo apenas aquele que pode
manipulá-la. Assim sendo, segundo esse paradigma, era necessário ter uma visão filosófica do
mundo que fosse fragmentada e dualística, pois a matéria estaria em oposição a espírito,
corpo/mente, objetivo/subjetivo, ciência/fé, natureza/ser humano.
Ao discorrer sobre os pressupostos do paradigma da simplicidade, Morin (2005a)
considera que há uma cegueira que impede de ver a complementariedade, a desordem e
incerteza inerentes aos fenômenos. Essas características já foram endossadas por estudos da
física quântica, visto que as descobertas dessa área acabaram pondo por terra as certezas da
física clássica, substituindo-as pela noção de probabilidade. Por isso, propõe um paradigma
que, ao invés da disjunção/ redução/ unidimensionalização, olhe para seu objeto de estudo
com uma lente de distinção/ conjunção/ multidimensionalização que permita “distinguir sem
separar, associar sem identificar ou reduzir” (MORIN, 2005a, p.22).
Esses pressupostos do paradigma complexo não vêm abandonar e desvalorizar o que
as pesquisas embasadas no paradigma tradicional ou simplificador fizeram. Pelo contrário, o
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paradigma complexo reconhece os avanços perpetrados pela lente cartesiana, visto que o
desenvolvimento científico-tecnológico do mundo atual
[...] possibilitou grandes saltos evolutivos na história das civilizações,
traduzidos, entre outros aspectos, pela democratização do conhecimento, pelo
surgimento de técnicas extremamente eficazes para a construção de novos
conhecimentos e pela presença de um espírito científico de investigação aberta
e validação pública do conhecimento (MORAES, 2007b, p. 42).
Apesar das conquistas advindas dos avanços científicos-tecnológicos, muitos dos
problemas econômicos, civilizatórios e climáticos presentes na sociedade contemporânea são,
no entanto, consequências da visão fragmentadora, reducionista e simplificadora do mundo. A
educação vem refletindo há tempos as determinações desse paradigma, pois além de outras
coisas, vemos, por exemplo, a cada dia, o crescimento do número de disciplinas, que cada vez
mais se superespecializam, impedindo assim a visão totalizadora da realidade. Aspecto esse
que não mais dá conta da complexidade de uma era planetária que demanda uma educação
para o futuro promotora de um:
[...] grande remembramento dos conhecimentos oriundos das ciências naturais,
a fim de situar a condição humana no mundo, dos conhecimentos derivados
das ciências humanas para colocar em evidência a multidimensionalidade e a
complexidade humanas, bem como integrar (na educação do futuro) a
contribuição inestimável das humanidades, não somente a filosofia e a
história, mas também a literatura, a poesia, as artes [...] (MORIN, 2002b,
p.48).
Para a concretização de uma educação para o futuro que leve em consideração as
contribuições do paradigma da complexidade, Morin (MORIN, CIURANA E MOTTA 2003;
MORIN, 2005a) pondera que há uma urgência de educar para uma nova era, que ele nomeia
de planetária. Para que essa educação se efetive, fazem-se imprescindíveis reformas que são
inteiramente interdependentes:
- Reforma do modo de conhecimento
- Reforma do pensamento
- Reforma do ensino
- Reformas na sociedade
- Reformas de vida1
1 As três primeiras Reformas, Reforma do modo de conhecimento, Reforma do pensamento e Reforma do
ensino, foram explicitadas principalmente em Morin (2002b), Morin (2005a), Morin, Ciurana e Motta (2003). Já
as Reformas da sociedade e as Reformas da vida são detalhadas, sobretudo, em Morin (2013). A Reforma do
ensino aparece como Reforma da educação em Morin (2013; 2014).
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Essas reformas são necessárias para que o paradigma da complexidade se estabeleça,
mudando a maneira de ver, viver e conviver com o mundo e no mundo. Para tanto, Morin
sempre relembra seus leitores que não se tratam de reformas programáticas, contudo
paradigmáticas, tendo em vista a necessidade de um novo paradigma para as práticas
educacionais, o da complexidade.
Apresentei, nesse item, as bases que fizeram surgir esse novo paradigma complexo.
No item que segue, discuto as três primeiras reformas: a Reforma do modo de conhecimento,
a Reforma do pensamento e a Reforma do ensino. Optei em focalizar apenas as três, pois suas
características serão reivindicadas na interpretação dos dados, como também para poder
aprofundar e detalhar suas particularidades.
1.2 Teoria da complexidade e seus desdobramentos educacionais
Ao detalhar os pressupostos de cada reforma, Morin (MORIN, CIURANA E MOTTA
2003; MORIN, 2005a; 2013) repete com frequência que essas reformas estão conectadas e,
por isso, dependem umas das outras para a efetivação de uma educação que queira se pautar
no paradigma da complexidade. É apenas em Morin (2013) que o autor vem separar capítulos
específicos para discutir cada reforma, contudo, optei em detalhar separadamente as
características de cada reforma, mas é imperioso deixar claro que a concretização de cada uma
das Reformas está na dependência da efetivação das outras.
Assim sendo, nos itens subsequentes desse capítulo, faço uma tessitura teórica das
particularidades das três primeiras Reformas, relacionando-as com as contribuições de Moraes
(2007b), dentre outros autores, que igualmente visualizaram a emergência de um novo
paradigma educacional.
1.2.1 A Reforma do conhecimento
A Reforma do conhecimento está diretamente relacionada ao modo que o
conhecimento está organizado. Esse modo de organização é o reflexo do paradigma científico
que rege as diversas áreas do conhecimento, o paradigma newtoniano-cartesiano.
As várias disciplinas, que a cada dia surgem e pedem estatuto científico, buscam um
lugar só seu, um espaço delimitado onde possam reinar separadas, fragmentadas, tornando-se
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cada vez mais superespecializadas, apresentando-se, desta forma, como fruto do paradigma
tradicional. É uma forma de tratar o conhecimento que não se adequa às realidades ou
problemas que surgem pedindo uma visão que abranja o todo, o multidimensional, o
transdisciplinar, o global, o planetário.
Segundo Morin (2005a, p.13), a hiperespecialização “impede de ver o global (que ela
fragmenta em parcelas), bem como o essencial (que ela dilui)”, visto que os problemas que se
apresentam como globais são cada vez mais essenciais, e os que se apresentam como
essenciais podem ter reflexos globais. É uma teia que está interligada, conectada em suas
ínfimas particularidades, pois “todos os problemas particulares só podem ser posicionados e
pensados corretamente em seus contextos; e o próprio contexto desses problemas deve ser
posicionado, cada vez mais, no contexto planetário” (2005a, p.14).
A fragmentação e unidimensionalização do saber geram a incapacidade de pensar
contextualmente, levando em consideração as partes do objeto e a integração dessas partes no
todo. Uma educação que se pauta nessa disciplinarização do saber gera inteligências que não
têm habilidades para compreender a gravidade dos problemas que se apresentam cada vez
mais complexos, isto porque não conseguem enxergar a relação indissolúvel entre o todo e
suas partes, de forma a integrar e contextualizar os saberes que foram apenas memorizados
em caixinhas habilmente separadas e fechadas.
O bombardeamento descontrolado de informações também contribui para essa
alienação simplificadora, pois sabe-se muito sobre várias coisas, tem-se uma gama de
informações esparsas, mas não se consegue contextualizar e englobar essas informações.
Morin (2002b) considera que há duas cegueiras do conhecimento que impedem de ver
a realidade complexa: as cegueiras advindas do erro e da ilusão. De acordo com ele, todo
conhecimento comporta o risco do erro e da ilusão. A educação, por sua vez, deve levar em
conta essa premissa, visto que a teoria da informação2, por exemplo, nos demonstra que em
qualquer evento onde há transmissão de informação, onde há comunicação de alguma
mensagem, existe o risco do erro.
Com essa premissa, cai por terra a tentativa de buscar da verdade pela objetividade e
racionalização do paradigma da simplicidade, que tenta excluir toda afetividade e
subjetividade de qualquer processo submetido ao método cartesiano. De acordo com Morin
(2002b, p.21) “nenhum dispositivo cerebral permite distinguir a alucinação da percepção, o
2A Teoria da Informação ou Teoria Matemática da Comunicação se iniciou com Claude E. Shannon (1961-
2001) e foi a primeira a considerar a comunicação como um problema matemático rigorosamente embasado na
estatística, oferecendo aos engenheiros da comunicação um modo de determinar a capacidade de um canal de
comunicação em termos de ocorrência de bits (WADT, 2009, p. 51).
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sonho da vigília, o imaginário do real, o subjetivo do objetivo”. Disto, a conclusão da
impossibilidade de se fragmentar o real, quem assim o faz, utiliza lentes que cegam, causando
a cegueira que Morin classifica de falsa racionalidade que não admite o erro.
A inadmissibilidade do erro é uma ilusão, já que a verdadeira racionalidade reconhece
a parte da totalidade que se caracteriza pelo afeto, pelo amor e pelo arrependimento, sendo
capaz de criticar e se autocriticar reconhecendo suas insuficiências.
Daí decorre a necessidade de reconhecer na educação do futuro um princípio
de incerteza racional: a racionalidade corre risco constante, caso não
mantenha vigilante autocrítica quanto a cair na ilusão racionalizadora. Isso
significa que a verdadeira racionalidade não é apenas teórica, apenas crítica,
mas também autocrítica (MORIN, 2002b, p.24).
Para solidificar a autocrítica é necessário que a educação possibilite o conhecimento
do conhecimento, visto que “[a] educação atual fornece conhecimentos sem ensinar o que é o
conhecimento. Ela não se preocupa em conhecer o que é conhecer, ou seja, os dispositivos
cognitivos, suas dificuldades, suas instabilidades, suas propensões ao erro, à ilusão” (MORIN,
2013, p. 195).
O conhecimento do conhecimento não solicita que as barreiras disciplinares sejam
derrubadas. Além dos avanços científico-tecnológicos, a complexidade também reconhece a
necessidade de manutenção da individualidade de cada disciplina, mas isso não significa que
as disciplinas devam se fechar em si mesmas, pois se preza pela interação que transgrida as
barreiras disciplinares em busca de uma visão multidimensional do objeto. Tal maneira de
tratar o conhecimento é possível quando se concebe uma disciplina como um sistema, ao
mesmo tempo fechado em seus suas milésimas partes, mas aberto para novas conexões,
readaptações.
É nesse viés que encontramos, além dos trabalhos de Morin, os de Bassarab Nicolescu
(2001) em defesa da transdisciplinaridade do conhecimento. Acredito ser relevante mencionar
que ambos os autores redigiram e assinaram, no Primeiro Congresso Mundial de
Transdisciplinaridade, realizado em 1994, em Portugal, a Carta da Transdisciplinaridade.
De acordo com Nicolescu (2001), a transdisciplinaridade vem suplantar as visões que
a precedem: disciplinaridade, multidisciplinaridade e interdisciplinaridade. A explicação que
mais me esclareceu sobre esses termos, foi a que assisti em uma conferência3 por ele realizada
na Universidade Interdisciplinar de Paris (UIP), em 12 de abril de 2014. Na conferência, ele
traz inicialmente dados sobre o aumento do número de disciplinas através dos anos. Segundo
3A conferência pode ser assistida acessando o link https://www.youtube.com/watch?v=8HA8_Im4KhI.
41
ele, a Nation Science Foundantion (NSF - uma agência norte americana responsável por
promover a ciência e engenharia através de programas de pesquisas e projetos educacionais),
catalogou que, no ano de 1300, havia apenas 7 disciplinas; em 1950, 54 disciplinas; em 1975,
1845 disciplinas; em 2000, 8000 disciplinas, e que, em 2014, havia 8200 disciplinas.
Trata-se de um crescimento vertiginoso e para que um diálogo entre essas disciplinas
aconteça, há a necessidade de uma metodologia, visto que a noção de realidade, por exemplo,
é apresentada diferentemente para cada disciplina. Todas as noções de realidade receberam e
recebem grande influência dos estudos físicos, podendo ser feita uma categorização em dois
polos: de um lado o realismo clássico e do outro, o realismo quântico. O primeiro, sob a
influência da física clássica newtoniana e o segundo, sob a influência da mecânica quântica e
física quântica.
O realismo clássico é baseado em princípios básicos: continuidade, causalidade local,
determinismo e objetividade. Já o realismo quântico, que aparece no início do século XX, é
baseado na descontinuidade, não-superatividade, indeterminismo, e sob a lógica quântica do
terceiro incluso (baseada na descoberta, dentre outros estudos, do quantum que é, ao mesmo
tempo, onda e partícula). O que sai deste século dos avanços físicos quânticos é a noção de
níveis de materialidade, que mostra que não há apenas uma matéria, há níveis de
materialidade. O que desdobra, igualmente, em níveis de Realidade. Para dar conta desses
diversos níveis de Realidade, Nicolescu recorre ao conceito de transdisciplinaridade e a uma
metodologia transdisciplinar.
Segundo Nicolescu (2014), transdisciplinaridade é a evolução dos estágios que o
precederam, a saber, a disciplinaridade, que foi seguida pela multidisciplinaridade, que, por
sua vez, foi seguida da interdisciplinaridade e que deságua, finalmente, na
transdisciplinaridade. Para explicar esses quatro termos, Nicolescu (2014) recorre a metáforas.
As disciplinas seriam gaiolas de pássaros, cada uma diferente da outra, e os pássaros, os
sujeitos pesquisadores.
Na disciplinaridade, cada pássaro deverá ficar preso em suas gaiolas, não tendo a
possibilidade de sair, sendo a sua realidade medida pelo que é possível ver daí. Na
multidisciplinaridade, os pássaros saem de suas gaiolas, discutem entre si, mas depois cada
um volta para sua gaiola. Na interdisciplinaridade, os pássaros saem de suas gaiolas, discutem
entre si, visitam as gaiolas dos outros e voltam para suas gaiolas para se abrigarem. Na
transdisciplinaridade, os pássaros estão totalmente livres, saem de suas gaiolas, discutem entre
si e visitam as outras gaiolas. Ao voarem pelo céu, possuem uma visão multidimensional das
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gaiolas, mas não são obrigados a voltar para uma, podem optar em qual gaiola ficar segundo
suas necessidades, e muito menos precisam se abrigar dentro de uma, pois estão libertos.
Assim sendo, o conhecimento disciplinar é fruto do estudo de um problema dentro
apenas de uma disciplina; já o conhecimento multidisciplinar se caracteriza pelo estudo de um
problema, tendo o aparato de diversas disciplinas ao mesmo tempo. O conhecimento
interdisciplinar, por sua vez, advém da transferência de métodos de estudo de uma disciplina
para outra, e finalmente, o conhecimento transdisciplinar. Para esclarecer o significado do
vocábulo, Nicolescu relata que o termo transdisciplinaridade foi utilizado pela primeira vez
por Piaget, em uma conferência de um congresso sobre interdisciplinaridade, em 1970, na
Universidade de Nice, França. Piaget, ao defini-lo, afirma:
[...] à etapa das relações interdisciplinares, podemos esperar ver sucedê-la
uma etapa superior que seria „transdisciplinar‟, que não se contentaria em
encontrar interações ou reciprocidades entre pesquisas especializadas, mas situaria essas
ligações no interior de um sistema total, sem fronteira estável entre essas disciplinas
(PIAGET, 1970, apud SOMMERMAN, 2012, p.397).
Transdisciplinaridade é, pois, nas palavras de Nicolescu (2014), o que está ao mesmo
tempo entre as disciplinas, através das disciplinas e além de toda disciplina. Seu objetivo
primordial é compreender o mundo presente, e sua finalidade é alcançar a unidade do
conhecimento. Objetivo e finalidade que podem ser transferidos para uma educação do
futuro, pois a dignidade do ser humano aí se fundamenta, porquanto é preciso compreender o
mundo para poder viver no mundo.
Morin (2005) defende que é importante saber distinguir a disciplinaridade, da multi, da
inter e da transdiciplinaridade, como também é preciso igualmente saber “ecologizar” as
disciplinas, “isto é, levar em conta tudo que lhes é contextual, inclusive as condições culturais
e sociais, ou seja, ver em que meio elas nascem, levantam problemas, ficam esclerosadas e
transformam-se”(MORIN, 2005b, p.115).
Essa ecologização disciplinar está muito relacionada às aprendizagens propostas por
Delors (1998) no Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para
o século XXI. No relatório, são sugeridos quatro pilares para o desenvolvimento da educação
do futuro: - aprender a conhecer, - aprender a fazer, - aprender a viver juntos e – aprender a
ser. Esses pilares veem as disciplinas priorizando a contextualização dos conhecimentos para
uma melhor compreensão do mundo e suas complexidades. Para Mello, Barros e Sommerman
(p.11, 2002), os pilares para educação do século XXI estabelecidos por Delors “também se
constituem em elementos norteadores para o exercício efetivo da transdisciplinaridade”.
43
O aprender a conhecer está diretamente relacionado ao que Morin (2002b; 2005a;
2005b) defende para o conhecimento do conhecimento. É uma aprendizagem que prioriza o
domínio dos instrumentos do conhecimento, as ferramentas necessárias para aprender a
aprender, exercitando a atenção, a memória e o pensamento, para depreender, analisar,
escolher os diversos saberes desenvolvidos pelas disciplinas, tendo em vista que elas estão
sempre evoluindo, modificando, e até mesmo se extinguindo.
Conectado ao aprender a conhecer está o aprender a fazer, pilar que busca responder à
pergunta: como ensinar o aluno a pôr em prática os conhecimentos construídos, adaptando-os
às necessidades profissionais? De acordo com Delors (1998), com o desenvolvimento técnico-
científico, os conhecimentos precisam – além de abranger práticas rotineiras, tarefas materiais
e intelectuais bem determinadas – de abarcar competências mais subjetivas ligadas à
capacidade de iniciativa, de trabalho em equipe, do comportamento social, de se comunicar e
de gerir e resolver conflitos. Com isso, percebe-se que deve haver a construção de
conhecimentos que potencializem a qualificação profissional e a qualificação social
solicitadas nas práticas vivenciais.
Igualmente conectado com os outros pilares, aparece o pilar que defende uma
educação para aprender a viver juntos. Para que essa aprendizagem se concretize, o aprendiz
necessita conhecer o outro, descobrir a diversidade da espécie humana que nos rodeia, a
multiplicidade de cultura e costumes e ter consciência que essa diversidade é parte
contribuinte da riqueza interdependente do planeta. Passando pela descoberta do outro, o
conhecimento de si mesmo, de suas raízes sociais e culturais, de suas diferenças e
semelhanças em relação ao outro. Portanto, fazem-se necessários projetos desenvolvidos em
conjunto com o objetivo de desenvolver, na convivência, a compreensão mútua e as
estratégias de resolução de conflitos para manutenção da paz.
Por último, e não menos importante, já que esses pilares se fazem interdependentes, o
aprender a ser. Essa aprendizagem está na possibilidade do desenvolvimento integral do ser:
espírito e corpo, inteligências variadas, sensibilidade, espiritualidade, etc. Aprendizagens que
coadunem com a liberdade de pensamento, de discernimento, de sentimentos para o
desenvolvimento de suas potencialidades, segundo suas necessidades e escolhas. Assim
sendo, é imperioso dar especial importância à autonomia, à criatividade e à imaginação.
Segundo Delors (1998 p.100), o século XXI necessita “de uma diversidade de talentos e
personalidades, mais ainda de pessoas excepcionais, igualmente essenciais em qualquer
civilização”. Para tanto, poesia e arte, conhecimentos retirados de experiências pessoais,
devem ser igualmente priorizados em meio aos outros conhecimentos.
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Esses quatro pilares se apresentam como facetas diferentes do conhecimento, que deve
ser elaborado e pensado de forma a mais integral possível, pois de acordo com Delors (1998,
p.99) : “À educação cabe fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo complexo e
constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que permita navegar através dele”.
Atinei ser importante, ao discutir a Reforma do conhecimento, discorrer igualmente
sobre os termos disciplinaridade, multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e
transdisciplinaridade; os quatro pilares para a educação do futuro; bem como as justificativas
apresentadas pelo próprio Morin, porque todos esses itens se mostram relacionados com o
problema do conhecimento, e mais diretamente o do conhecimento do conhecimento, que
precisa ser pensado e repensado para a emergência do paradigma complexo. Passo, então, a
discutir a segunda Reforma, a do pensamento.
1.2.2 A Reforma do pensamento
De acordo com Morin (2005a), não se tratam de Reformas de natureza programática,
mas paradigmática, porque se deseja reformar a aptidão humana para organizar o
conhecimento. Conhecimento que, com base no paradigma da simplicidade, é pensado de
maneira reducionista, fragmentada, determinista, empirista, e que, com a ótica complexa, é
pensado com princípios que religam, auto-eco-organizam, integram, contextualizam e
dialogam.
Apesar de ter como objetivo primordial o de oferecer uma visão integral do mundo, do
outro e de si mesmo em suas inter-relações, o pensamento complexo reconhece, não obstante,
a impossibilidade de uma onisciência, visto que assume a ideia de que o caminho da
construção do conhecimento é um processo que nunca termina.
Para explicitar em que consiste a Reforma do pensamento, Morin caracteriza o
pensamento complexo em relação ao pensamento simplificador, e esclarece que um não é o
oposto do outro, mas que o primeiro engloba o segundo.
O pensamento simplificador, produto dos avanços técnico-científicos, desenvolve
apenas um tipo de inteligência, aquela
[...] que só sabe separar, fragmenta o complexo do mundo em pedaços
separados, fraciona os problemas, unidimensionaliza o multidimensional[...]
quanto mais planetários tornam-se os problemas, mais impensáveis eles se
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tornam. Uma inteligência incapaz de perceber o contexto e o complexo
planetário, fica cega, inconsciente e irresponsável (MORIN, 2005a, p.14-15).
O pensamento complexo é aquele que incentiva o desenvolvimento da inteligência
geral. Uma inteligência que, de acordo com Morin (2005a), é aquela que, pelo
desenvolvimento de aptidões cognitivas gerais, permite um melhor desenvolvimento de
competências especializadas, de maneira a incentivar o livre exercício da curiosidade para a
construção do conhecimento.
O pensamento complexo é uma necessidade, pois, para que o ser humano consiga dar
conta dos problemas planetários, é preciso aprender a pensar o complexo, desenvolvendo esta
inteligência geral. Substituindo o pensamento que isola e separa, por um pensamento que
distingue e une, isto é, um pensamento que saiba com lucidez compreender o complexo, o que
é tecido junto, o que é global, contextual e multidimensional.
Como é bem enfatizado por Morin (2005a), não se trata de uma reforma programática
porque um programa de ações é predeterminado e fechado em si. O pensamento complexo se
desdobra em atitudes educacionais que não exigem um programa, uma metodologia única e
fixa a ser seguida. Para que ele se manifeste em práticas complexas, há a necessidade de um
método (um caminho) que viabiliza propor e por em prática estratégias que serão frutíferas ou
não. Nesse sentido, é um pensamento que, ao tentar se aproximar da realidade, gera suas
próprias estratégias que são inseparáveis dos sujeitos que as desenvolvem e que as porão à
prova durante o caminho.
Esse caminho é percorrido com a interação de sujeitos, objetos e contextos que são
indissociáveis e em processo contínuo de influência mútua. Assim sendo, “diferentemente dos
pensamentos simplificadores, que partem de um ponto inicial (elemento) e conduzem a um
ponto terminal (princípio); o pensamento daquilo que é complexo é um pensamento rotativo,
espiral” (MORIN, CIURANA E MOTTA, 2003, p.56).
Morin, Ciurana e Motta (2003, 52-57) listam vários pontos com vistas a elucidar as
características do pensamento complexo. Vejamos alguns:
- O pensamento complexo se cria e se recria no próprio caminhar;
- O pensamento complexo sabe que a certeza generalizada é um mito;
- Um pensamento complexo nunca é um pensamento completo;
- O pensamento complexo se pauta na tese de que todo conhecimento traz em si mesmo e de
forma não eliminável a marca da incerteza;
- O pensamento complexo não despreza o simples, mas critica a simplificação;
46
- O imperativo do pensamento complexo é, portanto, “Ciência com consciência”.
Com o objetivo de facilitar a pensar a complexidade, Morin (MORIN, 2005a;
MORIN, CIURANA E MOTTA, 2003) propõe um conjunto de princípios. São eles:
- Princípio dialógico;
- Princípio da recursividade;
- Princípio hologramático;
- Princípio sistêmico ou organizacional;
- Princípio de retroatividade;
- Princípio da autonomia/dependência;
- Princípio da reintrodução do sujeito cognoscente em todo conhecimento.
São esses sete princípios interdependentes e complementares que dão ao sujeito lentes
que possibilitam visualizar e trabalhar com as complexidades que emergem durante o
percurso escolhido. Podem também ser utilizados como instrumentos teóricos de investigação
e como categorias de análise de dados.
O princípio dialógico defende o diálogo entre duas lógicas contrárias. É o operador
que permite pensar a união de noções que deveriam se recusar reciprocamente como, por
exemplo, a racionalidade e a subjetividade, espírito e matéria, ordem e desordem, já que,
segundo o pensamento simplificador, é impossível pensá-las numa mesma realidade. Esse
operador pode ser definido como “a associação complexa (complementar/ concorrente/
antagônica) de instâncias necessárias, conjuntamente necessárias à existência, ao
funcionamento e ao desenvolvimento de um fenômeno organizado” (MORIN, CIURANA E
MOTTA, 2003, p.36).
Segundo esses mesmos autores, esse operador pode ser percebido, por exemplo, na
própria origem do Universo, que foi concebido na dialógica ordem/desordem/organização,
como também percebido nas evidências trazidas pela Física, introduzidas pelos estudos de
Niels Bohr, que percebeu a necessidade de conceber as partículas como ondas e corpúsculos,
ao mesmo tempo.
Outro exemplo interessante é o dado por Mariotti, o da concorrência entre empresas.
Segundo ele,
[...] os concorrentes que mais se antagonizam, que mais nos incomodam, são
aqueles que não devem ser eliminados, pois sua existência é uma fonte
constante de estímulo e ensinamentos. Afastá-los, produziria um desequilíbrio
que, mais cedo ou mais tarde, diminuiria nossa criatividade e, portanto, nossa
competência (MARIOTTI, 2007, não paginado).
47
O princípio da recursividade é o que demonstra que a relação linear causa e efeito não
existe para o pensamento complexo, pois em todo processo, sob a lente complexa, é um
círculo recursivo no qual os produtos são necessários para a produção do processo. Isso quer
dizer que se trata de uma dinâmica autoprodutiva e auto-organizacional, na qual os efeitos ou
produtos são, ao mesmo tempo, causadores e produtores do próprio processo. Assim sendo, os
resultados finais são imprescindíveis para a geração dos estados iniciais.
Portanto, é um processo autoprodutor e autoreprodutor, tendo a condição de ser gerido
por uma fonte, fluxo, ou reserva exterior. Para exemplificar, Morin (2005b, p. 183) faz alusão
ao ciclo da reprodução sexual, pois o ciclo produz indivíduos e esses são essenciais para a
continuação do ciclo de reprodução. Dessa forma, tem-se o processo (de reprodução) que
produz indivíduos (produtos) que alimentam o círculo reprodutivo (processo).
O princípio hologramático tem como inspiração o holograma, um tipo de fotografia
feita pelo processo holográfico, o qual se caracteriza pelo fato de cada parte da imagem conter
a totalidade do objeto que está sendo representado. Assim sendo, em qualquer arranjo
complexo, o todo está nas partes, e as partes contêm o todo. Morin (2005b) apresenta como
exemplo a célula humana que, possuidora de material genético, contém todas as informações
genéticas de um organismo humano. Outro exemplo, apresentado pelo autor, é o da sociedade
como um todo, pois há de se notar que ela está presente em cada indivíduo (parte) por meio da
linguagem, da cultura e de suas normas.
O princípio sistêmico ou organizacional é o que permite a religação do conhecimento
das partes com o conhecimento que se tem do todo. A organização de um todo produz o que
Morin (2005b, p.261) nomeia de emergências, isto é, as propriedades ou qualidades novas
que não surgem nas partes isoladas, mas apenas nas interações delas, em seu todo organizado.
Tem-se, portanto, a premissa de que o todo é maior do que a soma das partes, o que pode ser
evidenciado, por exemplo, na comunhão de ideias sábias de um grupo, já que se pode
observar que a sabedoria advinda da discussão em grupo é maior do que a dos seus membros
que, isolados, não acrescentariam outras ideias às suas.
O princípio sistêmico demonstra, igualmente, que o todo é menor do que a soma de
suas partes constituintes. Isso acontece porque os predicativos ou propriedades de suas partes
acabam por se diluir no sistema. Um bom exemplo é um time de futebol: por mais que ele
tenha um excelente atacante, ele precisa da participação do seu conjunto para jogar e fazer
gols. Assim sendo, a complexidade do todo é maior e menor do que a soma das partes,
princípios em si antagônicos, mas que caracterizam todo sistema complexo em sua
circularidade.
48
Baseado no conceito de circuito retroativo, introduzido por Norbert Wiener (sem data
apud MORIN, 2005a), está o princípio de retroatividade. Esse princípio permite o
conhecimento dos processos auto-reguladores, de tal sorte que rompe com a causalidade
linear causa-efeito, haja vista que não só a causa age sobre o efeito, mas o efeito retroage
sobre a causa, isto é, os efeitos se voltam para as condições que os produziram, o que permite
a autonomia organizacional do sistema. De acordo com Morin (2005a), as retroações ou
feedbacks podem ser negativas ou positivas:
Em sua forma negativa, o círculo de retroação (ou feedback) permite reduzir o
desvio e, assim, estabilizar um sistema. Em sua forma positiva, o feedback é
um mecanismo amplificador; por exemplo: a violência de um protagonista
provoca uma reação violenta que, por sua vez, provoca uma reação mais
violenta ainda (MORIN, 2005a, p. 93-94).
O princípio da autonomia e dependência traz à tona a ideia da auto-eco-organização.
Ele esclarece que qualquer organização viva é auto-eco-organizadora, pois não cessam de se
autoproduzirem, e que, por isso, sempre estão a despender energia para conservar sua
autonomia. Daí a constatação de que todo sistema deve ser, ao mesmo tempo, aberto e
fechado em si mesmo, pois, para manter sua organização, está na dependência de seu
ecossistema, do qual retira energia e informação. Para ilustrar, Morin (2005a, p.95) atesta que
é fácil visualizar esse princípio nos humanos que desenvolvem sua autonomia na dependência
da energia que absorvem do ecossistema, como também da informação cultural. Portanto, a
autonomia se constrói a partir de múltiplas dependências. Outro bom exemplo dado pelo autor
é o processo de homeostase4, termo criado por Walter B. Cannon (1929) para descrever
processos reguladores de sistemas abertos, notadamente seres vivos. Esses seres realizam
processos de troca homeostática para manter a sua estabilidade energética e química, e se
adaptarem ao ambiente externo.
O Princípio da reintrodução do sujeito cognoscente em todo conhecimento se funda
na premissa de que a objetividade e a verdade absolutas constituem enganos, por isso é
imprescindível fazer com que o sujeito, seja ele observador/computador/conceituador/
estrategista, tenha seu papel restaurado e ativo na construção da realidade. Nesse sentido, este
princípio acarreta a ideia de que “todo conhecimento é uma reconstrução/tradução feita por
uma mente/cérebro, em uma cultura e época determinadas” (MORIN, 2005a, p.96).
Assim sendo, o conhecimento é sempre aberto e inacabado, pois está sempre presente
a crítica da teoria e a teoria da crítica. Sabe-se que a incerteza e o erro são características
4 Capacidade do corpo para manter um equilíbrio estável a despeito das alterações exteriores; estabilidade
fisiológica.
49
constituintes de todo processo de busca de conhecimento porquanto o sujeito se localiza na
realidade que intende conhecer.
É importante ressaltar que, de acordo com Morin (1987, p.25), “não se trata de
resvalar para o subjetivismo: trata-se, muito pelo contrário, de enfrentar esse problema
complexo em que o sujeito cognoscente se torna objeto do seu conhecimento ao mesmo
tempo em que permanece sujeito”. Nessa mesma perspectiva, Morin, Ciurana e Mota (2003,
p.59) defendem que:
O pensamento complexo e a prática da macroconceitualização só pretendem
ganhar em compreensão, reconhecendo criticamente aquilo que se perde na
cosmovisão unidimensional de um pensamento simplificador e reducionista.
Uma educação que tem por objetivo uma concepção complexa da realidade e
que efetivamente conduzisse a ela, estaria colaborando com os esforços que
visam atenuar a crueldade do mundo”.
Os mesmos autores (MORIN, CIURANA E MOTTA, 2003, p.37) elucidam que esses
princípios metodológicos propostos fazem parte de um método (caminho) que é indissociável
de um paradigma, o da complexidade. São princípios que se constituem inseparáveis e
interdependentes, todavia, acontece de um ou mais se evidenciarem na análise do sistema em
foco, haja vista que são ferramentas que serão solicitadas quando o ser humano se defronta, o
que acontece frequentemente, com a necessidade de articular, contextualizar e relacionar para
dar conta de pensar realidade complexa que o cerca.
1.2.3 A Reforma do ensino
Apresento, nesta seção, alguns dos pontos essenciais assinalados por Morin para que
aconteça uma Reforma no ensino, reforma esta que se fará pelo reflexo das outras nos três
níveis de ensino, o primário, o secundário e o universitário. Uma reforma educacional que
também retroagirá no conhecimento do conhecimento e na maneira de pensar a realidade,
simultaneamente, visto que “mais vale uma cabeça bem-feita do que uma cabeça bem cheia”
(MORIN, 2005a, p.21).
Para fundamentar essa reforma, Morin(2013) considera que ela deve se pautar na frase
de Emílio de Jean-Jacques Rousseau, quando o professor diz ao aluno: “Quero ensiná-lo a
50
viver”. É em torno dessa frase que Morin lança em 2014 o livro Enseigner à vivre –
Manifeste pour changer l’éducation (Ensinar a viver – manifesto para mudar a educação).
Essa obra recapitula suas ideias desenvolvidas em outros livros sobre a Reforma do ensino,
mas direcionando para o que significa ensinar a viver na nossa atualidade, pois segundo ele:
A escola atualmente, principalmente para a adolescência, [...] não fornece as
defesas para enfrentar as incertezas da existência, ela não fornece as defesas
contra o erro, a ilusão, a cegueira. Ela não fornece [...] os meios que permitam
se conhecer e compreender o outro. Ela não traz para o aluno, a preocupação,
a interrogação, a reflexão sobre a boa vida ou de como bem viver. Ela apenas
ensina, com muitas lacunas, a viver, ficando em falta no que deveria ser sua
missão essencial 5 (MORIN, 2014, p.41).
Dentro do conjunto de mudanças que devem ser feitas para que a escola, em seus
diferentes níveis, ensine, sobretudo, a viver, Morin (2005a, p.21) defende que, para a reforma
acontecer no ensino primário, deve ser priorizada a formação do que ele chama de “cabeça
bem-feita”, por meio de um programa interrogativo que fosse gerado incentivando as
curiosidades naturais de toda criança. Indagações que vão desde a condição humana às
indagações sobre o mundo. Estarão, portanto, mantidos o ensino das ciências biológicas,
físicas, sociais, psicológicas e culturais, contanto que:
[D]esde o princípio, ciências e disciplinas estariam reunidas, ramificadas umas
às outras, e o ensino poderia ser o veículo entre os conhecimentos parciais e
um conhecimento global. De tal sorte que a Física, a Química e a Biologia
possam ser diferenciadas, ser matérias distintas, mas não isoladas, porquanto
sempre inscritas em seu contexto (MORIN, 2005a, p.75).
Com efeito, sabendo distinguir as matérias, relacioná-las, uni-las, garantindo suas
autonomias, é necessário que os educandos aprendam a conhecer (um dos pilares de Delors,
para a educação do futuro), aprendizagem que se relaciona ao aprender a sintetizar, separar,
unir, analisar, ao mesmo tempo. A aprendizagem, por esse viés, acontecerá, segundo Morin
(2005a), por duas vias: uma que incentive a autocrítica e a autoanálise, através do exame de
si, a chamada via interna; a outra, a via externa, se centraria na introdução ao conhecimento
das mídias, de maneira a mostrar aos educandos como a montagem, tratamento das imagens e
dados acaba por passar uma impressão arbitrária da realidade, pois que direcionada pelas
escolhas de outros.
5 Tradução da autora para: “L‟école, actuellement surtout pour l‟adolescence [...] n‟apporte pas les défenses pour
affronter les incertitudes de l‟existence, elle n‟apporte pas les défenses contre l‟erreur, l‟illusion, l‟aveuglement.
Elle n‟apporte pas[...] les moyens qui permettent de se connaître et de comprendre autrui. Elle n‟apporte pas la
préoccupation, l‟interrogation, la réflexion sur la bonne vie ou le bien vivre. Elle n‟enseigne que très
lacunairement à vivre, défaillante en cela à ce qui devrait être sa mission essentielle” (MORIN, 2014, p.75).
51
O ensino secundário, por sua vez, de acordo com Morin (2005a), seria pautado no
diálogo entre cultura das humanidades e cultura científica, o que ele nomeia de verdadeira
cultura. Para isso, os programas precisariam ser substituídos por guias de orientação que
contextualizassem as disciplinas nos espaços do Universo, da Terra, da vida e do humano.
Disto, a importância de uma atualização constante de professores de maneira a permitir
momentos reflexivos e uma visão complexa de mundo para que, ao ensinar a cultura das
humanidades e a cultura científica, ensinassem ao mesmo tempo a condição humana no meio
físico e biológico. Assim sendo, “[...] o ensino das humanidades não deve ser sacrificado,
mas otimizado. (Uma das principais missões do professor secundário é salvaguardar a cultura
das humanidades.) [...] as humanidades introduzem, ao mesmo tempo, à condição humana e
ao aprender a viver.” (MORIN, 2005a, p.79).
Além disso, caberá também ao professor do secundário se informar sobre a cultura e
mundo dos adolescentes, suas rivalidades históricas e as consequências dessas rivalidades
para as sociedades. Será preciso, igualmente, estar a par da cultura midiática da qual se
alimentam os adolescentes, de maneira a mostrar aos seus alunos que, por meio de
convenções e estereótipos, as séries televisivas, por exemplo, dizem muito sobre a condição
humana.
Cabe à Universidade duas funções: integrar e adaptar-se à modernidade científica,
assim como dar conta das necessidades de formação. Além de continuar realizando o que
Morin chama de sua missão transecular (2005a, p.81): “conservar, transmitir e enriquecer o
patrimônio cultural”.
É imprescindível que essa reforma possibilite a democratização do conhecimento,
contudo, não apenas isso, pois será preciso uma reforma que leve em conta a aptidão de
organização do conhecimento, isto é, a de pensar, visto que a Reforma do pensamento exige
uma reforma da Universidade. Para tanto, com o objetivo de possibilitar pensar o complexo,
Morin (2005a, p.84) visualiza a necessidade das universidades e faculdades oferecerem em
suas grades curriculares “um dízimo epistemológico ou transdisciplinar”, o que
corresponderia a dez por cento do curso para momentos de ensino comum, no qual diferentes
saberes se tornariam comunicantes. Seria igualmente apropriado, de acordo com o autor
(MORIN, 2005a), que cada universidade tivesse um centro de pesquisas para problemas
complexos e transdisciplinares, com momentos de oferta de oficinas destinadas a essas
problemáticas.
Analisados alguns pormenores da Reforma em cada um dos três graus, Morin (2002b;
2005a; 2014) também sinaliza em suas obras a importância da difusão de saberes que visem:
52
- Ensinar a condição humana;
- Ensinar a identidade terrena;
- Enfrentar as incertezas;
-Ensinar a compreensão;
-Ensinar a complexidade para viver – complexidade que existe desde que existe uma
humanidade;
- Ensinar a ética do gênero humano.
A respeito da necessidade de se ensinar a compreensão, Morin (2014) assinala a
importância de se aprender dois tipos de compreensão: a intelectual e a humana. A
compreensão intelectual se estabelece no sentido que se dá ao que o outro fala, à sua visão de
mundo, às suas ideias, que podem ser sempre ameaçadas pelos mal entendidos, pela
polissemia, pelas diferentes contextualizações, pelas variadas interferências existentes nas
trocas comunicativas.
A compreensão humana seria ensinada e exemplificada nas práticas dos professores,
incentivada entre os alunos pelo exercício da benevolência que evitaria qualquer tipo de
humilhação dentro do ambiente escolar. Humilhação que é resultado, dentro de outros fatores,
dos critérios de eficacidade, rentabilidade e competividade advindos das influências politicas,
financeiras e técnico-científicas que se insurgem também na educação. Segundo o autor
(MORIN, 2014), essas influências são visíveis nas avaliações, por exemplo, que são,
predominantemente, quantitativas e escondem o qualitativo do processo de aprendizagem.
Nesse sentido, faz-se mister entender que
A compreensão intelectual necessita de apreender juntos o texto e o contexto,
o ser e seu ambiente, o local e o global. A compreensão humana necessita
dessa compreensão, mas também e, sobretudo, de compreender o que vive o
outro.[...] a compreensão nos solicita, antes de tudo, compreender a
incompreensão6 (MORIN, 2014, p.59).
Todos esses ensinamentos proporcionarão uma transformação dos conhecimentos em
sapiência (palavra que engloba “sabedoria” e “ciência”), uma vez que para Morin (2005a,
p.47), de acordo com Durkheim, “o objetivo da educação não é o de transmitir conhecimentos
sempre mais numerosos aos alunos, mas o de criar nele um estado interior e profundo, uma
espécie de polaridade de espírito que o oriente em um sentido definido, não apenas durante a
infância, mas por toda a vida”.
6 Tradução da autora para « La compréhension intellectuelle necessite d‟appréhender ensemble le texte et le
contexte, l‟être et son environnement, le local et le global. La compréhension humaine nécessite cette
compréhension mais aussi et surtout de comprendre ce que vit autrui.[...] La compréhension nous demande
d‟abord de comprendre l‟incompréhension. » (MORIN, 2014, p.59)
53
Quem educará os educadores? Pergunta que se repete nas obras de Morin (MORIN,
CIURANA E MOTTA, 2003; MORIN, 2005a) e que eu faço igualmente ressoar. Caberá a
quem ser protagonista dessas Reformas que se mostram necessárias na atualidade? Reformas
que se conectam e que precisam umas das outras para se concretizar. É tendo em vista
responder a essas perguntas que discutirei, na seção seguinte, o que as investigações em LA,
embasadas no paradigma da complexidade, têm engendrado para contribuir com a educação
de educadores, isto é, a formação de professores. Contudo, antes de passar para a LA, discorro
sobre a relação entre transdisciplinaridade e complexidade.
1.3 A transdisciplinaridade e a complexidade
Atinei ser relevante reservar uma seção para detalhar mais a respeito da
transdisciplinaridade e sua relação com o paradigma da complexidade, pois como demonstrei,
é necessário uma metodologia (caminho) transdisciplinar para alavancar todas as Reformas,
assim como para promover uma auto-heteroecoformação7 de professores. De acordo com
Nicolescu (2002), a transdisciplinaridade apresenta três eixos ou pilares: os níveis de
Realidade, a complexidade e o terceiro incluído. O autor, ao discorrer sobre esses três eixos,
considera que:
1. Há, na Natureza e no nosso conhecimento da Natureza, diferentes níveis de
Realidade e, correspondentemente, diferentes níveis de percepção.
2. A passagem de um nível de Realidade para outro é assegurada pela lógica
do terceiro incluído.
3. A estrutura da totalidade dos níveis de Realidade ou percepção é uma
estrutura complexa: cada nível é o que é porque todos os níveis existem ao
mesmo tempo (NICOLESCU, 2002, p.45).
Para compreender o que vem a ser os diferentes níveis de Realidade, Nicolescu (2002,
p.48) diferencia Realidade de Real. Segundo ele, “Real designa aquilo que é, enquanto
Realidade diz respeito à resistência na nossa experiência humana. Por definição, o „Real‟ está
velado para sempre; enquanto a „Realidade‟ é acessível ao nosso conhecimento”. A
transdisciplinaridade permite a existência de diversos níveis de Realidade, isto é, uma
realidade multifacetada diferente da proposta pelo paradigma da simplicidade, que sugere a
unidimensionalidade.
7 Discutirei sobre a auto-heteroecoformação em seção subsequente a esta.
54
Com vistas a explicar a abordagem transdisciplinar da natureza e do conhecimento,
Nicolescu (2002, p. 47) nos traz um diagrama:
Figura 1: O objeto transdisciplinar: o Sujeito transdisciplinar e o termo de interação. Fonte: (NICOLESCU apud GALEFFI, 2009, p.114.)
À esquerda estão representados os níveis de realidade e, à direita, os níveis de percepção,
ambos com seus contrários. É possível observar que o terceiro termo, T, conecta os variados
níveis de Realidade e o ponto X é a fonte de toda percepção e Realidade:
Por „nível de Realidade‟ [...] designo um conjunto de sistemas que são
invariáveis sob certas leis: por exemplo, as entidades quânticas estão
subordinadas às leis quânticas, que são radicalmente diferentes das leis do
mundo físico. Isto é, dois níveis de Realidade são diferentes quando, ao se
passar de um para outro, há uma quebra nas leis e uma quebra nos conceitos
fundamentais [...] (NICOLESCU, 2002, p.48).
O que difere esta abordagem daquela regida pela lógica clássica é que para esta, é
impossível existir um termo que é, ao mesmo tempo, A e não-A, ou seja, o terceiro incluído,
55
pois os axiomas são: o da identidade, segundo o qual A é A; o da não contradição, onde A não
é não-A; e o axioma do terceiro excluído, isto é, não há um termo que é, simultaneamente, A
e não-A. Esse último axioma foi clarificado pela noção de níveis de Realidade.
Na figura, abaixo reproduzida, é possível uma melhor compreensão da lógica do
terceiro incluído, a qual foi ratificada pelas lógicas quânticas:
Figura 2: Representação simbólica da ação da lógica do 3º incluído Fonte: (NICOLESCU, 2002, p.51)
Como se pode observar, há dois níveis de Realidade, em um dos níveis, NR2, há os
dois axiomas antagônicos A e não-A e, em outro nível, o axioma T. O estado T, em sua
projeção em um mesmo nível de Realidade, produzirá o antagonismo dos pares, haja vista que
um mesmo nível de Realidade apenas poderá produzir antagonismos. O estado T será o
responsável pela unificação do par de antagonismos A e não-A.
De acordo com Nicolescu (2002), essa nova lógica, a do terceiro incluído, demonstra
que a estrutura dos níveis de Realidade não é fechada, apesar de ser única. Tal estrutura tem
desdobramentos na teoria do conhecimento de tal forma que
[...] implica na impossibilidade de uma teoria completa e auto-referente. [...]
Isto significa que, se começarmos com um certo número de pares mutuamente
exclusivos, podemos construir uma teoria nova que elimina as contradições
num certo nível de Realidade, mas essa teoria sem contradições é temporária,
pois conduz inevitavelmente, sob a pressão conjunta da teoria e da
experiência, à descoberta de novos pares de contraditórios, situados em novos
níveis de Realidade (NICOLESCU, 2002, p.52-53).
Tal processo demonstra que a evolução do conhecimento será sempre um processo
aberto e inclusivo e, para isso, o ser humano deve estar também aberto para aprender a
transitar nos diferentes níveis de Realidade que existem e que são descobertos e ou
concebidos.
56
As variadas disciplinas acadêmicas, de acordo com o mesmo autor, giram em torno do
estudo de partes de níveis de Realidade, podendo acontecer também de muitas disciplinas se
enquadrarem apenas em um nível de Realidade. O conhecimento disciplinar (CD), em
oposição ao conhecimento transdisciplinar (CT), é apresentado como aquele conectado apenas
ao Objeto, excluindo o Sujeito e o terceiro incluído e por isso, é neutro, pois estudado sem a
influência de nenhum sistema de valores. O que, conforme Nicolescu, é uma maneira artificial
e ilusória de tratar o conhecimento, pois sempre há a interação entre Sujeito e Objeto por meio
do terceiro termo.
Ao diferenciar o conhecimento disciplinar (CD) do conhecimento transdisciplinar
(CT), Nicolescu nos apresenta a seguinte tabela:
Figura 3: Comparação entre o conhecimento disciplinar CD e o conhecimento
transdisciplinar CT
Fonte : (NICOLESCU, 2002, p.58)
A complexidade, um dos três postulados da transdisciplinaridade, não foi, segundo
Galleffi (2009), alvo de Nicolescu, haja vista que a maior contribuição existente à teoria da
complexidade está nas obras de Edgar Morin. Teoria sobre a qual já teci, anteriormente,
considerações relevantes, cabendo ressaltar aqui a necessidade das Reformas sugeridas por
ele, a do pensamento, a do conhecimento e a do ensino. Será o pensamento complexo o
possibilitador da articulação estrutural dos níveis de Realidade e ele
[...] tem pela frente a construção de uma ciência que dê conta dos diversos
níveis de realidade e que coordene a dispersão da complexificação da vida
planetária, pelo encontro inteligente e amoroso com o que constitui a grandeza
de existir em um universo misterioso para quem não se abre em seu florescer e
fenecer criador (GALEFFI, 2009, p.125).
57
Ainda recorro a Galeffi (2009), pois o autor transpôs esses três postulados da
transdisciplinaridade para formular os princípios metodológicos do que ele chama educar
transdisciplinar. Além disso, ele discorre, com bastante profundidade, sobre a avaliação por
ele nomeada de avaliação polilógica transdisciplinar. Trata-se de um tipo de avaliação que
tem como fundamentação a transdisciplinaridade e seu tripé, além dos pilares da educação
para século XXI propostos por Delors (1998), - aprender a conhecer, - aprender a fazer, -
aprender a viver juntos e - aprender a ser. Irei discorrer com mais detalhes sobre esse tipo de
avaliação no capítulo reservado à discussão sobre avaliação.
1.4 Transdisciplinaridade, Linguística Aplicada e complexidade
Na seção anterior, discorri sobre a complexidade e a transdiciplinaridade, ambas se
relacionam porque a complexidade é um dos pilares da transdisciplinaridade. A primeira tem
como principal representante e desenvolvedor o filósofo e sociólogo francês Edgar Morin. A
transdisciplinaridade, por sua vez, se descortina, principalmente, nos estudos do físico e
pesquisador romeno Bassarab Nicolescu, também presidente-fundador do Centro
Internacional de pesquisas e estudos transdisciplinares.
Cabe, portanto, discorrer sobre a relação da Linguística Aplicada e a
transdisciplinaridade, assim como da Linguística Aplicada e a complexidade.
1.4.1 LA e Transdisciplinaridade
A Linguística Aplicada se estabeleceu enquanto ciência transdisciplinar, o que
segundo Moita Lopes (2007, p.113) “é devido ao fato de a LA ser uma área de investigação
relativamente nova, o que permitiu a captação de ideias emergentes sobre procedimentos
espistemológicos de natureza transdisciplinar na formulação de seus percursos de
investigação”.
O conhecimento produzido através de pesquisas em LA leva, desta forma, o rótulo da
transdisciplinaridade como postura científica. Contudo, ao aprofundar meus estudos em
transdisciplinaridade, é possível questionar se a forma como se produz esse conhecimento se
pauta realmente na transdisciplinaridade, haja vista que, mesmo dentro da universidade, é
fácil encontrarmos professores, pesquisadores em LA, que não sabem distinguir o que vem a
ser disciplinaridade, interdisciplinaridade, multidisciplinaridade e transdisciplinaridade.
58
Além disso, a própria organização curricular dos cursos superiores, por exemplo, não
permite uma prática transdisciplinar, pois o que ainda predomina é o trabalho estritamente
disciplinar. Sobre isso, não é raro ouvir nos corredores dos cursos de Letras, rumores de
discussões e rixas que acontecem entre professores por serem de áreas diferentes, Linguística
hard e Linguística Aplicada.
Por outro lado, não posso afirmar que, pelo fato dos professores não saberem fazer tal
distinção dos diferentes modos de produção de conhecimento, e por ainda predominar o
ensino disciplinar na academia, não possa haver, em alguma instância, algum tipo de trabalho
transdisciplinar, podendo ele acontecer apenas na pesquisa, por exemplo.
No entanto, acredito que o fato de se ignorar tal distinção leva o pesquisador a se
limitar cientificamente de maneira a não ter a consciência de que estamos em uma fase de
transição de paradigmas que solicita reformar o pensamento, o conhecimento e o ensino e que
o conhecimento disciplinar necessita ser encarado de outra maneira, aquela que permite a
religação dos saberes para o trabalho com a complexidade da realidade, que abraça os
diferentes níveis de Realidade com o respaldo de uma lógica ternária.
Como já discuti anteriormente, Morin sugere que, para a Reforma do ensino, seria
necessário que cada universidade possuísse um dízimo transdisciplinar, que se caracterizaria
por lugares onde pesquisadores de diversas áreas do conhecimento se comunicassem,
reunidos em torno de problemáticas complexas. Na universidade a qual estou vinculada e faço
pesquisa em LA, por exemplo, não tenho conhecimento da existência um núcleo dentro do
programa de pós-graduação em estudos linguísticos que realize tal prática, como também
desconheço a existência de algum grupo de pesquisas da universidade que adote a
epistemologia transdisciplinar.
Apesar dessas constatações, o desejo de por em prática a transdisciplinaridade pode
ser evidenciado nas pesquisas em LA. Os guias de LA publicados em língua inglesa, como o
The handbook of Applied Lingusitics (DAVIES; ELDER, 2004) e o guia Mapping Applied
Linguistics (HALL; SMITH; WICAKSONO, 2011). Em seus índices, encontramos a
pluralidade de áreas do conhecimento sobre as quais a LA se debruça para poder resolver os
problemas do mundo real em que a linguagem é uma questão central, tais como: Aquisição de
segunda língua; Análise do discurso; Análise da conversação; Linguagem e política; Ensino e
aprendizagem de segunda língua; Letramento; Testes de línguas; Tradução; Variação
Linguística; dentre outros.
O conceito de transdisciplinaridade na pesquisa em LA foi muito bem ilustrado por
Celani (2007, p.119) na representação de uma pesquisa, no gráfico abaixo reproduzido. Ao
59
explicar a situação de pesquisa - Relações sociais entre interlocutores em sala de aula -,
Celani afirma que ela pode ser interpretada como tendo duas fontes. Uma delas estaria
refletida no produto do diálogo, pois faz referência às relações sociais entre interlocutores em
um ambiente de sala de aula. A outra fonte se ocuparia do processo comunicativo presente em
contextos de aprendizagem, tendo um compromisso teórico com o sociointeracionismo.
Figura 4: Visão transdisciplinar de uma situação de pesquisa. Fonte: (CELANI, 2007, p.119).
Interessante observar também que, ligadas e em interação, várias áreas do
conhecimento dialogam, todas dentro de um conjunto uno. Unidas em sua diversidade e
mantidas suas identidades, elas coexistem em um estado de interação dinâmica em função da
Linguagem. E a Linguística Aplicada ocupa aí seu posto de trans, pois transcende cada
disciplina se dissolvendo em seu objeto de investigação, representado neste gráfico pelo
processo de aprendizagem na interação em sala de aula.
Podemos também ver no gráfico, a coexistência de diferentes níveis de Realidade
(NICOLESCU, 2002), representados pelas várias disciplinas que buscam visualizar com
diferentes lentes o objeto do estudo: as relações sociais entre interlocutores em sala de aula. O
objeto de pesquisa é vislumbrado por diversas perspectivas, de maneira a possibilitar o
60
surgimento de soluções plausíveis e cabíveis para suas problemáticas, dando conta, dessa
forma, da complexidade inerente às relações sociais produzidas e processadas em sala de aula.
Pennycook (2013), talvez com uma postura mais agressiva, defende que, além de
transdisciplinar, a LA deve ser também transgressiva. Uma ciência que ao invés de transpor
fronteiras, as transgrida, pois segundo ele, esse campo de investigação deve ter como base
uma abordagem transgressiva da teoria e da disciplinaridade, visto que:
[...] assinala a intenção de transgredir, política e teoricamente, os limites do
pensamento e ação tradicionais, não somente entrando em território proibido,
mas tentando pensar o que não deveria ser pensado, fazer o que não deveria
ser feito. Almeja atravessar fronteiras e quebrar regras; tem como meta um
posicionamento reflexivo sobre o que e por que atravessa; é entendida como
em movimento em vez de considerar aquilo em relação ao que é „pós‟; é
pensada para a ação e a mudança (PENNYCOOK, 2013, p.82).
Essa visão transgressora da LA apresentada por Pennycook vem complementar os
aparatos teóricos para fortalecer o campo e suprir as necessidades das pesquisas linguísticas,
contribuindo para o desenvolvimento da LA, que se coloca como uma ciência que está em
contínuo movimento, pois é reflexiva e se repensa constantemente. Tais características da LA
a diferencia fortemente do campo dos estudos linguísticos, que pode ser considerado, à luz da
complexidade, um campo ainda onde predominam epistemes cartesianas porque busca
verdades científicas absolutas e imutáveis.
Tendo um histórico conflituoso com os representantes dos estudos linguísticos, o que
resultou na necessidade de um grande número de pesquisas reafirmadoras da LA como
disciplina científica, essa área do conhecimento, como aponta Cavalcanti (2007, p.182), já
tem um teto todo seu. É bem representada no Brasil e no mundo por associações como a
Associação Internacional de Linguística Aplicada (AILA) e a Associação Brasileira de
Linguística Aplicada (ALAB). E, como catalogou Almeida Filho (2013), no Brasil, temos um
número considerável de programas de pós-graduação que trazem a LA como denominação,
linha de pesquisa ou área de concentração.
Dentre as pesquisas realizadas nas pós-graduações brasileiras, de acordo com Almeida
Filho (2013), se destacam as que investigam o ensino-aprendizagem de línguas (materna,
estrangeira e segunda). Tendo em vista esse dado, considero que o professor de línguas tem
uma numerosa bibliografia para embasar suas práticas de ensino. Isso porque a LA
proporciona ferramentas para que, durante sua formação, o professor desenvolva ações
reflexivas orientadas para suas práticas.
61
Deseja-se que, enquanto professores, esses sejam também pesquisadores, estando
sempre, como sugere a LA, em um processo de autoavaliação e reflexão contínuas, pois como
assevera Cavalcanti (1999, p.181), essa postura de professor-pesquisador permite “que o
professor olhe para si mesmo, se questione, se explique e, eventualmente, se reveja”. Com
uma preocupação voltada para o desenvolvimento social e humano, pois é ao mesmo tempo
teórica e prática, a LA, pela quantidade de pesquisas voltadas para o ensino-aprendizagem de
línguas, demonstra grande preocupação para com a formação do professor de línguas.
São inúmeros os recursos ofertados pelas pesquisas transdisciplinares da LA para o
professor que deseja exercer práticas críticas e reflexivas, no entanto, é muito importante
advertir que não se prescreve receitas prontas que devem ser obrigatoriamente seguidas. Por
isso, se prioriza a reflexão constante sobre as práticas de ensino, a observação de si mesmo,
observação dos seus alunos e do contexto de aprendizagem. Considerada como uma ciência
transdisciplinar que se repensa constantemente, o bom professor é aquele que também se
analisa com frequência para poder proporcionar oportunidades de aprendizagem
significativas, integrais e prazerosas.
Ao tomar conhecimento da transdisciplinaridade que acontece nas pesquisas em LA,
fiquei muito surpresa pelo fato de uma ciência relativamente recente ter representantes que
buscam constantemente responder às necessidades da sociedade perante a linguagem,
acompanhando, assim, a evolução dos paradigmas. Apesar disso, questionamentos foram
surgindo e insistiram em permanecer em minhas reflexões, tais como: Se a LA é
transdisciplinar em suas investigações, o ensino de línguas o é igualmente? Como pautar o
ensino e aprendizagem de línguas a partir da transdisciplinaridade? E a avaliação da
aprendizagem, como fica dentro da transdisciplinaridade? E a formação de professores de
línguas no viés transdisciplinar, como se pautaria?
Como discuti anteriormente, acredito que o fato de a LA aderir à transdisciplinaridade
nas pesquisas não significa que a prática de ensino de seus pesquisadores será igualmente
transdisciplinar, muito menos o avaliar. O pesquisar, ensinar e avaliar são instâncias
atitudinais diferentes que, apesar de se relacionarem, necessitam de reflexões e estudos
específicos, abordando cada instância e suas propriedades contextuais, subjetivas e
processuais.
Incentiva-se que o professor de línguas seja um professor-pesquisador, como
asseverou Cavalcanti (1999), na assertiva anteriormente citada, o que significa que, ao
pesquisar e refletir sobre suas práticas de ensino a partir da Linguística Aplicada, o professor
será incentivado a buscar transcender barreiras disciplinares em suas pesquisas. É um passo
62
que pode ser dado com repercussões nas práticas de ensino mais transdisciplinares, mas que
não são garantidas em espaços nos quais ainda não se sabe como ensinar, e
consequentemente, pensar na complexidade e transdisciplinaridade inerentes a todo e
qualquer sistema de interações complexas.
As pesquisas transdisciplinares em LA demonstram que essa ciência já trabalha para o
que Morin (2005a) defende para as Reformas do conhecimento e do pensamento, o que foi
muito bem demonstrado no exemplo de pesquisa posto em gráfico por Celani. Mas a
constatação de que, de acordo com Morin, as Reformas do conhecimento, do pensamento e do
ensino são interdependentes, isto é, estão na dependência umas das outras para se efetivarem,
incitam igualmente a necessidade de atitudes para uma reforma do ensino.
Na busca de respostas a esses questionamentos, encontrei os trabalhos pautados na
complexidade e na transdisciplinaridade que puderam me dar alguns direcionamentos, pois
nesse viés transdisciplinar, existem pesquisas que buscaram os aparatos da teoria da
complexidade para suas problemáticas e problematizações. Diante dessa constatação, passo a
apresentar o que essas investigações têm buscado analisar, mais especificamente, ao que tange
o ensino e aprendizagem de línguas e a formação de professores.
1.4.2 LA e Complexidade
Os primeiros estudos em LA feitos à luz da teoria da complexidade foram os da
pesquisadora norte americana Larsen-Freeman. Com seu artigo (1997) publicado na Applied
Linguistics, a autora relaciona os processos de Aquisição de Segunda Língua (ASL) com as
características dos sistemas complexos, inaugurando, portanto, uma nova linha de
investigação para a LA. Além do artigo seminal de 1997, na continuidade de seus trabalhos,
há várias publicações importantes, como o livro Complex systems and Applied Linguistics
(2008) escrito com Cameron.
A nova linha teve notáveis repercussões para a área, o que foi evidenciado pela revista
Applied Linguistics que dedicou, em 2006, uma edição especial com trabalhos que visavam
investigações que entediam a linguagem enquanto um sistema complexo.
No Brasil, também há uma produção considerável em LA e complexidade. Franco
(2013) fez um apanhado muito rico de pesquisas fundamentadas na teoria da complexidade
realizadas em pós-graduações brasileiras em LA. Ao verificar o número de orientações
finalizadas na última década (2005-2014), Franco destaca os pesquisadores: Paiva da
63
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com dez teses orientadas; Freire da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC – SP), com cinco teses e seis
dissertações; e Vetromille-Castro da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), com quatro
dissertações. Segundo esse autor, por se tratar de um paradigma emergente, ainda são poucos
os trabalhos de pós-graduação em LA realizados à luz da complexidade. Também encontrei
no programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos da Universidade Federal de
Uberlândia, o registro de uma tese de doutorado, defendida em 2013, sob a orientação do
professor Waldernor Barros Moraes Filho.
É importante mencionar ainda, o livro organizado por Paiva e Nascimento (2009),
Sistemas adaptativos complexos: língua(gem) e aprendizagem, que consiste em uma
coletânea de artigos que relacionam teoria da Complexidade, Linguística e Linguística
Aplicada. Dentre as temáticas dos artigos, estão discussões sobre ambientes virtuais de
aprendizagem de língua, sobre a formação de professores de língua estrangeira, aquisição de
segunda língua, comunidades de aprendizagem online, entre outras.
Grande parte desses trabalhos em LA, que estão sob as lentes da complexidade, pauta-
se na concepção de linguagem como um sistema complexo. Por se tratar de um conceito do
qual igualmente parto para as minhas discussões, listarei algumas definições, de maneira a
poder retomá-las sempre que necessário.
Castilho (2009, p.38-39), com a proposta de revisitar as teorias linguísticas com um
novo paradigma, o dos domínios complexos, trabalha com uma abordagem de língua como
um sistema dinâmico e complexo. Essa postulação se fundamenta nas seguintes premissas:
(1) Do ângulo de sua produção, as línguas serão definíveis como um conjunto de
processos mentais, pré-verbais, organizáveis num multissema operacional. [...]
(2) Do ângulo de seus produtos, as línguas serão apresentadas como um conjunto
de categorias igualmente organizadas num multissema (CASTILHO, 2009,
p.38-39).
A premissa número um estaria encarregada da descrição dos processos de criação
linguística. Já a premissa número dois leva em consideração as contribuições da ciência
clássica que, segundo Castilho, é adequada para a descrição dos produtos. Por isso, Castilho
defende a tese de que a complexidade está no fato de que como produto, a língua seja (2009,
p.39) “um conjunto de quatro categorias agrupadas ao mesmo tempo em quatro sistemas:
1)Léxico, 2)Discurso, 3) Semântica e 4)Gramática”. Sistemas que são autônomos, não
hierarquizados, de maneira que as expressões linguísticas manifestam simultaneamente
características gramaticais, semânticas, discursivas e lexicais. O que contradiz os estudos
64
neogramáticos, estruturalistas, gerativistas e funcionalistas que apostavam, cada um a seu
turno, na existência de sistemas centrais e periféricos.
Nascimento (2009), por sua vez, propõe que
[...] entender a linguagem como um sistema complexo é, essencialmente,
entender a linguagem como um sistema aberto, não linear, auto-organizante,
em constante troca de energia com seu exterior, exibindo espaços de fase,
entendidos como graus de estabilidade e variabilidade. É, essencialmente,
entender a linguagem, o processo de auto-eco-organização do animal humano,
como um processo essencialmente criativo [...] (NASCIMENTO, 2009, p.72).
Nesse viés de língua como sistema aberto (característica evidenciada pelo operador do
Círculo de recursividade), Nascimento pretende, a partir de Morin (2002a), Capra (2007),
Larsen-Freeman e Cameron(2008), entre outros autores, demonstrar que, apesar do fluxo
contínuo de troca como o meio externo, a língua, como qualquer sistema aberto, se distancia
do estado de equilíbrio , mas permanece sempre estável, mantendo sua estrutura e organização
global, pois está sempre em adaptação.
Borges e Paiva (2011), por seu turno, apresentam a linguagem na perspectiva dos
sistemas adaptativos complexos (SACs), haja vista que a consideram um sistema semiótico
complexo que engloba processos políticos-culturais, sócio-históricos e bio-cognitivos. Para
tanto, assinalam que Saussure, “de certa forma, já preconizava a complexidade do fenômeno
quando dizia que a língua(gem) é multiforme e que pertence a diferentes domínios”
(BORGES; PAIVA, 2011, p.342). Argumentam que optaram pelo uso do termo sistema
adaptativo complexo (SAC) em vez do vocábulo sistema complexo, já bastante utilizado na
LA, por causa da ênfase que dão em suas produções no campo dos estudos em linguística
aplicada para os processos de adaptação e aprendizagem.
Segundo as autoras,
Apesar de a noção de sistema não ser nova nos estudos da língua(gem), a
partir da perspectiva dos SACs, passamos a perceber esse sistema como algo
aberto e em funcionamento, gerando emergências e auto-
organização.[...]Nesse processo dinâmico e auto-organizativo, a língua(gem)
nos constitui como sujeitos sociais, revela nossas identidades e nos permite
refletir e agir na sociedade (BORGES; PAIVA, 2011, p.343).
Essas definições de língua evidenciam a necessidade de tratar igualmente o ensino e
aprendizagem de língua com uma abordagem também complexa. Entendendo que o ensino e
aprendizagem são processos não lineares, Borges e Paiva (2011) engendram na tentativa de
elaborarem uma abordagem complexa de ensino de línguas, dando continuidade ao que foi
iniciado por Larsen-Freeman e Cameron (2008) ao sugerirem alguns componentes
65
constitutivos de uma abordagem complexa de ensino de línguas. Estes, em linhas gerais,
visam mostrar que uma abordagem específica (comunicativa, por exemplo) pode trazer
limitações para o ensino de línguas quando se utilizam determinadas técnicas ou atividades,
visto que a linguagem e métodos, à luz da teoria da complexidade, são dinâmicos e adaptáveis
quando em uso, não podendo ser rigidamente predeterminados apenas por uma abordagem.
Para Borges e Paiva (2011), uma abordagem complexa de ensino de línguas se
justifica no fato de que as abordagens disponíveis não abarcaram ainda as mudanças
paradigmáticas que acontecem em todas as ciências e que se estendem igualmente à LA. As
contribuições desse novo paradigma, o da complexidade, fazem-se em uma nova abordagem,
na qual:
[...] o professor não pode ser visto como mero repetidor de procedimentos pré-
estabelecidos, mas como construtor consciente de sua metodologia. Para tanto,
o professor deve basear-se em seu contexto imediato de atuação, sua intuição
pedagógica e em seu conhecimento – em constante transformação e
atualização – das diferentes concepções sobre os processos e fenômenos que
envolvem o seu fazer docente. Da mesma forma, o aluno não deve ser tomado
como simples seguidor de instruções, mas como um ser atuante e mediador de
sua própria aprendizagem. [...] A aquisição, nessa perspectiva, deixa de ser
vista como processo linear, como algo que “se toma” para si depois de um
determinado período de exposição à língua, passando a ser compreendida
como algo em constante desenvolvimento [...] (BORGES; PAIVA, 2011,
p.352).
Essa proposição, a da abordagem complexa para o ensino de línguas, demonstra que as
investigações em LA, além de buscarem uma reforma do conhecimento e do pensamento
através de suas pesquisas, também trabalham para uma Reforma do ensino, indo em direção
ao que Morin (2005a, p.20) preconiza, porquanto a “[...]Reforma do ensino deve levar à
Reforma do pensamento, e a Reforma do pensamento deve levar à Reforma do ensino”.
Para a concretização dessa Reforma no ensino, faz-se imprescindível trabalhar para
que a formação de professores de línguas esteja engajada e inserida nessas três Reformas (a
do conhecimento, do pensamento e do ensino), haja vista que a Reforma do ensino deve
abranger os três graus, o primário, o secundário e a Universidade.
Partindo do viés da complexidade e da transdisciplinaridade, as pesquisas em LA de
Freire (2009) e Freire e Leffa (2013) argumentam que a formação tecnológica de professores
de línguas deve ser ao mesmo tempo auto, hetero e eco formadora. Por se tratar da única
proposta com base na complexidade e transdisciplinaridade para a formação de professores
em LA que se relaciona com o macro objetivo dessa pesquisa, a formação de professores para
66
o avaliar, dedicarei a seção que segue para discutir o que vem a ser essa proposta da auto-
heteroecoformação de professores.
1.5 A proposta da auto-heteroecoformação de professores
Reconhecendo a emergência de paradigmas educacionais (MORAES, 2007b), Freire
(2009) sinaliza que, nas últimas décadas, as pesquisas em LA e Educação têm procurado se
inserir nessa fase de transição de paradigmas. Reconheceram que as práticas de ensino e
aprendizagem adotadas pelos sistemas educacionais, com algumas exceções, não mais se
enquadram ao contexto histórico-social caracterizado por transformações rápidas, evoluções
criativas, criações de ferramentas tecnológicas que solicitam novas concepções, reflexões e
práticas. Freire (2009) assinala que
[...] embora inseridas em um único contexto histórico-cultural, escola e
sociedade parecem não caminhar na mesma direção nem falar a mesma língua:
a escola mostra-se previsível, normativa, priorizando uma linguagem
prescritiva, atuando em via de mão única, perpetuando a transmissão de
conhecimento disciplinar e fragmentado. A sociedade, ao contrário, é
dinâmica, multimidiática e imprevisível, priorizando a multiplicidade e
simultaneidade de linguagens, valorizando o conhecimento em rede,
transdisciplinar, construído, coconstruído, desconstruído e dinamicamente
reconstruído a todo momento e ao longo da vida (FREIRE, 2009, p.16).
Além disso, a autora argumenta que quando escolas tentam modificar suas práticas
direcionando-as para atitudes embasadas nas demandas complexas do contexto social, se
deparam com certo estranhamento da sociedade que culminam em queixas de pais e alunos a
exigirem o retorno de práticas tradicionais.
Nesse cenário complexo, ambíguo, contraditório e dinâmico, Freire alega que deve ser
problematizada a formação de professores. Haja vista que, muitas vezes, apesar dos
professores terem contato durante a formação inicial com discussões que abarcam essas
incoerências teórico-metodológicas, enquanto professores atuantes apresentam atitudes
conformistas, pois continuam a reproduzir as velhas práticas tradicionais, mesmo tendo à sua
disposição instrumentos tecnológicos que possibilitariam a mudança, como a internet e o
computador.
É dessa perspectiva que Freire busca problematizar e refletir sobre a formação
tecnológica de professores, defendendo a necessidade de uma formação que seja ao mesmo
tempo auto, hetero e eco formação. Essa proposta foi primeiramente feita por Moraes (2007a;
67
2010a; 2010b) ao estabelecer que a formação que se quer complexa e transdisciplinar deve se
amparar nesse tripé formativo.
Ambas as autoras, todavia, buscaram em Pineau (2005) e Galvani (2002) os aparatos
teóricos para sustentar suas propostas. Pineau (2005), em face ao paradoxo unidade
/diversidade explicitado por Morin, e adotando a concepção de que o humano não se reduz ao
indivíduo isolado, mas que, outrossim, faz-se indivíduo nas relações com o social e o físico,
considera que o indivíduo (auto) se forma com o não-auto, “do outro,” no meio físico e social.
A partir dessa premissa, qualquer processo pedagógico de formação precisa, portanto,
abranger três polos de relações e interações:
Figura 5: Processo tripolar de formação
Fonte: (GALVANI, 2002, p.96)
Como demonstra o esquema acima apresentado:
O processo S1. e S.2 simbolizam as tomadas de consciência e as retroações da
pessoa sobre as influências físicas e sociais recebidas.[...] O processo S.3
simboliza a tomada de consciência do sujeito sobre seu próprio
funcionamento. [...] Essas três dinâmicas de autoformação são processos de
tomada de consciência e de retroação da autos sobre si mesma e sobre suas
interações com o meio ambiente físico e social. Assim, autoformação
ultrapassa, integrando-os, os limites da educação entendida como transmissão-
aquisição de saberes e de comportamentos (GALVANI, 2002, p.97).
Isso porque, para Pineau (2005), concordando com Fabre (1994 apud PINEAU, 2005),
formar é visto como um processo, cujo objetivo é formar alguém por meio de algo, em algum
lugar, para fazer alguma coisa. Trata-se de três níveis complementares de análise e de ação
que influenciam na formação dos sujeitos sociais. Reconhece-se, por sua vez, a singularidade
de cada nível de análise, de maneira que se complementam e são solidários uns aos outros.
68
Essa abordagem ternária do processo de formação, de acordo com Pineau (2005),
fornece uma visão que rechaça polarizações durante o processo formador, pois reconhece a
interdependência desses aspectos para a formação integral do indivíduo.
Moraes (2007b) considera que a complexidade e seus desdobramentos de pensamento
e ação demandam que a formação docente seja repensada com base em um processo de
formação integral. Para tanto, necessita se amparar na transdisciplinaridade e nos três polos de
formação. Esses desdobramentos transdisciplinares na educação estão, de acordo com
Moraes, sendo evocados pelos profissionais em formação, visto que o tratamento homogêneo
dado durante a formação, não considera particularidades relacionadas à motivação,
inquietude, tempo e recursos disponíveis de cada professor em formação.
Segundo essa mesmo autora, os problemas educacionais têm sido tratados de modo
fragmentado, tendo em conta que não se consegue visualizar a problemática da educação no
seu todo, pois o que se vê são medidas paliativas apresentadas por discursos atualizados e
fundamentados, mas que não conseguem cortar o mal pela raiz. São políticas e estratégicas de
formação que não conseguem abarcar as peculiaridades dos diferentes tipos de professores em
formação que carregam, cada um, suas histórias e vivências, assim como suas maneiras
particulares de enxergar o processo formativo. Busca-se uma homogeneização de conteúdos e
formas de aprendizagem que não facilitam a construção de uma autonomia profissional, assim
como não se incentiva que os sujeitos sejam protagonistas mais críticos e reflexivos onde
forem exercer sua docência.
A situação implica um repensar global dos programas, projeto e estratégias de
formação, pois uma melhor qualidade na formação docente não acontece
modernizando-se as instalações com novos equipamentos ou priorizando esta
ou aquela solução tecnológica. Nem se retocando o velho currículo com um
leve „botox‟, melhorando discursos, aumentando os anos de estudo ou
adicionando esta ou aquela nova disciplina curricular (MORAES, 2007a,
p.17).
Ao invés de um professor idealizado, com um perfil muito bem traçado, que saiba de
tudo e que cobre rigidamente tudo de seu aluno, Moraes (2007a) defende que as escolas
necessitam de docentes que sejam capazes de criar ambientes prazerosos de aprendizagem,
nos quais haja acolhimento, compreensão e afeto, sendo, pois criativos, questionadores e
colaboradores, capazes de enfrentar incertezas e desafios, construir, descontruir e reconstruir
conhecimentos com ética e respeito ao outro, a si mesmo e ao meio ambiente.
Para tanto, Moraes concorda com Torre e Barrios (2002) ao apresentarem uma
proposta de formação integral que dê conta da complexidade intrínseca à ação, ao sentimento
e pensamento humanos. Basta ver que é ela, a complexidade, que nos comunica que a
69
realidade não é previsível, determinista e ordenada, da mesma maneira que os processos
educacionais. O que demonstra que há de se aceitar as situações imprevisíveis e incertas que
surgem como características próprias da vida, e consequentemente, dos processos formativos
que precisam ensinar a trabalhar com tais situações inesperadas.
É nesse ponto que Moraes (2007a) relaciona a complexidade e transdisciplinaridade. A
complexidade constitui um dos três eixos da transdisciplinaridade estabelecidos por
Nicolescu, que são, como anteriormente explicitados: os níveis de Realidade, o terceiro
incluído e a complexidade.
Isto posto, uma formação docente transdisciplinar é aquela que abarca a complexidade
inerente às relações, considera os diferentes níveis de Realidade e a lógica do terceiro
incluído. Esse tipo de formação será possível com a adoção de uma teoria tripolar de
formação, como a proposta por Pineau (2005)– autoformação, heteroformação e ecoformação
– porque é no imbricamento desses polos formativos que emerge a complexidade
característica de uma formação que se quer integral, visto que é ela que liga os diferentes
níveis de Realidade, rompe com a disciplinaridade, com a dualidade clássica, fazendo nascer,
sob a lógica do terceiro incluído, uma terceira possibilidade de se enxergar a(s) Realidade(s)
pela ampliação do nível de consciência.
Nessas vivências relacionais consigo mesmo (auto), com os outros (hetero) e com as
circunstâncias ambientais (eco) que o professor em formação constrói e aprimora sua
identidade enquanto profissional. É na prática relacional que a identidade profissional se
constrói e igualmente se transforma:
Uma prática grávida de teoria e uma teoria nutrida por um conhecimento
prático, pois a circularidade existente faz com que a ação de uma retroaja
sobre a outra, realimentando-a ou modificando-a[...]lembrando que nenhuma
abordagem teórica ou metodológica concebida de maneira isolada, dará conta
de tudo aquilo que se necessita e se espera alcançar em um processo de
formação profissional competente e necessário (MORAES, 2010b, não
paginado).
Freire (2009; 2013), por seu turno, partindo do que demanda o paradigma complexo
para os processos educacionais da contemporaneidade, é a favor de uma auto-
heteroecoformação tecnológica de professores. Nomeação hifenizada proposta por Freire
(2009, p.20, por ela interpretada tendo como foco quatro dimensões, a da ação, a do sujeito, a
do objeto e a das relações.
A dimensão da ação se caracteriza pela recursividade e circularidade (operadores do
pensamento complexo), pois cada ação formadora proporcionará movimentos sobre o próprio
70
sujeito, que influenciarão os outros sujeitos envolvidos no processo formador, como também
modificarão o ambiente onde agem. Cada dimensão poderá ter, por sua vez, movimentos
formadores que as evidenciem em determinados momentos, contudo Freire aponta que estas
dimensões, bem como os polos formativos, não podem ser tratados isoladamente, por fazerem
parte de um todo que não é dissolúvel e concluso.
Nesse viés, a auto-heteroecoformação tecnológica é concebida como:
Ação do meio ambiente – presencial e/ou digital - sobre os indivíduos,
mediada por ferramentas, práticas singulares, aliada a uma ação crítico-
reflexiva desses indivíduos sobre o meio, sobre os outros e sobre si mesmo,
apropriando-se dessas ferramentas, práticas e linguagens, para usá-las de
maneira pertinente e adequada, na construção/desconstrução/reconstrução do
conhecimento e na sua inserção crítica nos mundos presencial e digital, como
cidadãos geradores, guardiães e intérpretes de informações que conduz à
formação plena do eu como sujeito individual, social, tecnológico e planetário
(FREIRE; LEFFA, 2013, p.75).
A auto-heteroecoformação é um processo sem fronteiras determinadas, que se estende
num contínuo de interações e transformações ao longo da vida. Portanto, para um curso de
Letras que tenha o objetivo de praticar esse tipo de formação, Freire e Leffa (2013) apontam
que o conhecimento relativo à utilização das Tecnologias de Comunicação e Informação
(TCI) em ambientes de ensino e aprendizagem não deve ser foco apenas de uma ou duas
disciplinas específicas para a formação tecnológica, isto é, de forma fragmentada. A auto-
heteroecoformação acontece quando esse tipo de conhecimento é construído em todos os
conteúdos,
[...] o curso como um todo, e cada uma das disciplinas, como partes dele, será
lócus potencial para a formação tecnológica no enfoque sistêmico-complexo,
permitindo que o futuro professor ligue/religue saberes e vivências para
compor seu repertório de conhecimentos, desenvolvendo uma atitude
consciente, responsável e criteriosa frente às tecnologias, sua utilização,
vantagens e desvantagens (FREIRE; LEFFA, 2013, p.75).
Nessa perspectiva, ainda de acordo com Freire e Leffa (2013), deve se questionar os
conceitos de formação inicial ou pré-serviço e formação continuada ou contínua, pois acabam
por resultar como procedimentos lineares de construção do conhecimento, característicos dos
preceitos do paradigma newtoniano-cartesiano. O que acontece nos cursos de Letras, por
exemplo, e nas licenciaturas em geral, é o fato de estudantes que, apesar de ainda estarem na
formação inicial, já são professores em escolas de línguas ou escolas regulares. Daí a
necessidade de elaborar construtos teóricos que enxerguem a formação de maneira complexa,
multidimensional e não linear, com diversos eixos que permitam a formação dos sujeitos.
71
O conceito de auto-heteroecoformação tem sido aplicado como construto teórico para
investigações. Alvareli (2012), Brauer (em andamento) e Portela (em andamento) fazem uso,
em suas pesquisas, do conceito de auto-heteroecoformação em contextos aplicados. Alvareli
(2012), ao investigar o fenômeno auto-heteroecoformação tecnológica, experienciado por um
professor atuante na plataforma Moodle, apresenta como uma de suas contribuições, a
percepção de que “ao formar-se(auto), o professor contribuiu para a formação dos outros
sujeitos, que compartilharam o espaço social com ele (hetero), além de contribuir para que o
ambiente Moodle (eco) como espaço ecologizado se formasse, se estabelecesse e se
organizasse.” (ALVARELI, 2012, p.213). Além disso, ela conclui que um educador
tecnológico amparado pela complexidade deve ser aquele que cuida dos alunos e os vê como
um grupo, percebendo igualmente suas individualidades, para assim poder auxiliar e orientar
tendo em vista a formação de sujeitos conectados com as TCI.
Visto que as pesquisas em LA à luz da complexidade vêm buscando contribuir para
avanços nos processos de ensino e aprendizagem, - concebendo uma abordagem complexa de
ensino de línguas - como também as contribuições para a formação de professores,
evidenciadas pelo que pretende uma formação tripolar, depreendo que essas elucubrações
buscam se enquadrar naquilo que a Reforma do ensino preconizada por Morin solicita.
Contudo, o ensino ainda carece de reformas que abranjam o pensamento e o conhecimento
que, interligadas e interdependentes, precisam criar teias mais fortes para dar conta do que a
era planetária demanda aos indivíduos, considerando-se que existem vários aspectos do
ensino nos quais a complexidade ainda não foi visualizada.
Com o objetivo de poder investigar e problematizar outras áreas que não foram
abordadas pelas lentes da complexidade e seus desdobramentos educacionais que demonstram
a necessidade de Reformas do pensamento, do conhecimento e do ensino (que, como apontei,
já estão acontecendo dentro do escopo transdisciplinar da LA), problematizo, à luz da
complexidade, tendo os aparatos metodológicos de um estudo de caso, a formação de
professores (de um curso de Letras de uma universidade federal do interior do Brasil) para o
avaliar.
No capítulo que segue, discorro sobre a avaliação da aprendizagem. Primeiramente,
faço um pequeno histórico da avaliação educacional, apresento estudos atuais sobre avaliação
educacional e, por fim, apresento contribuições da LA para a avaliação da aprendizagem.
72
CAPÍTULO 2 – TECENDO TEORIAS: avaliação da aprendizagem, Linguística
Aplicada e transdisciplinaridade
O ser humano, já na sua tenra idade, é direcionado por escolhas, desde aquelas
provenientes de seus instintos básicos de sobrevivência às que correspondem a julgamentos
mais elaborados. Todas essas escolhas são perpassadas pelo crivo avaliativo do conhecimento
intelectual e moral já adquiridos. E, para determinar os critérios avaliativos, selecionam-se as
variáveis que direcionarão a escolha. Desta forma, observa-se que o ato de avaliar é parte
intrínseca de nossas vidas, necessidade elementar para escolher o que nos convém ou não,
para em seguida direcionarmos os nossos esforços para o próximo passo.
Dentro do universo escola, como instituição, o indivíduo está em um ambiente oficial
de trocas educacionais. Professores e alunos estão regidos por documentos e leis que
garantem que, nessa instituição, como traz o artigo 1º da Lei de Diretrizes e Bases da
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educação (LDBN/1996): “a educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à
prática social.”. Enxergo nesse trecho da LDBN/1996, já com a lente da complexidade, uma
tradução do que o Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre educação para
o século XXI elaborado por Delors (1998) estabeleceu como pilares: - aprender a conhecer, -
aprender a fazer, - aprender a viver juntos e – aprender a ser.
A LDBN/1996, portanto, preocupa-se em fornecer uma educação integral,
significativa e contextualizada que permita ao aluno aprendizagens que o insiram no mundo
do trabalho e na prática social. Sobre esse ponto, o relatório da Comissão apresentado para a
UNESCO aponta que, “À educação cabe fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo
complexo e constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que permita navegar
através dele” (DELORS,1998, p.89). Essa proposta está em oposição a uma educação que vise
aspectos quantitativos, em que grande quantidade de informações, muitas vezes
descontextualizadas, devem ser acumulada pelos aprendizes. A acumulação de conhecimentos
não responde mais aos imperativos do mundo contemporâneo, caracterizado por constantes
evoluções e mudanças. As problemáticas que surgem na contemporaneidade pedem um olhar
que saiba contextualizar conhecimentos, unindo-os de forma a encontrar soluções adequadas a
cada especificidade.
Como a escola é um ambiente oficial de aprendizagens, vinculado a órgãos
governamentais, há uma necessidade de quantificar em números o que foi aprendido ou não
pelos alunos, pois esses números prestarão contas dos investimentos públicos em educação.
Para essa função quantificadora, os instrumentos de avaliação em larga escala oferecem os
números necessários para sondar os resultados do que está sendo investido, como por
exemplo, a prova Brasil, o Enade, dentre outros testes.
O artigo 9, inciso VI da LDBN/1996 determina que a União deve “[...]assegurar
processo nacional de avaliação do rendimento escolar no Ensino Fundamental, Médio e
Superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e
melhoria da qualidade do ensino”. Ao docente, além de outras obrigações, a LDBN/1996 em
seu artigo13, inciso V, estabelece que cabe a ele “participar integralmente dos períodos
dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional”.
Assim sendo, o ato avaliativo das atividades educacionais, dentro do universo escola, é
uma prática prevista pela legislação que rege o nosso Estado. Além disso, a LDBN/1996
prevê alguns critérios para a verificação do rendimento escolar. Dentre esses critérios, destaco
o artigo 24, inciso V, que versa sobre os aspectos qualitativos e quantitativos: “avaliação
contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos
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sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas
finais”.
Ao interpretar esse parágrafo da lei, acredito que o legislador deseja evidenciar a
prevalência de uma avaliação progressiva, que acompanhe passo a passo o desenvolvimento
do aluno, e que privilegie a qualidade do conhecimento adquirido, ao invés da quantidade.
Isto é, será mais importante o uso crítico que o aluno saiba fazer de determinado
conhecimento, do que a simples repetição de fatos e dados em grande quantidade e
descontextualizados.
Não só a LDBN/1996, mas igualmente outros documentos oficiais, trazem orientações
para as práticas avaliativas dos professores, todas elas embasadas em estudos atualizados
como, por exemplo, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), cujas assertivas serão
analisadas no item seguinte. Todavia, apenas documentos não garantem que essas orientações
serão plenamente executadas em sala de aula. Creio ser primeiramente necessário garantir que
os professores em processos de formação, tenham acesso a esses documentos de forma a
refletir sobre o que está sendo proposto para utilizá-los de maneira crítica em sua prática
pedagógica.
O contexto de formação nos cursos de licenciatura é o ambiente no qual reflexões
sobre as práticas pedagógicas devem ser feitas visando ao desenvolvimento dessas habilidades
para o professor que está em formação. Acredito que reflexões sobre a avaliação da
aprendizagem também devem estar inseridas neste contexto, haja vista que fazem parte das
práticas pedagógicas. É neste ponto, como já foi explicitado anteriormente, que está minha
maior motivação para a realização desta pesquisa, visto que durante minha formação no curso
de licenciatura em Letras, foram pouquíssimos os momentos em que me foi ensinado a
avaliar, quais recursos utilizar, como elaborá-los, que aspectos devem ser avaliados, bem
como quais critérios podem ser aplicados na avaliação.
Além dessa motivação primeira, a prática em sala de aula, os estudos feitos no Grupo
de Estudos e Pesquisas em Avaliação (GEPAV)8 e as disciplinas cursadas durante o mestrado,
me incutiram mais questionamentos, os quais foram apresentados como perguntas de pesquisa
no capítulo introdutório. É motivada por esses questionamentos e tendo apresentado alguns
aspectos legais da avaliação educacional no território brasileiro, que teço, em sequência: um
breve histórico da avaliação educacional; em seguida, descrevo quais práticas avaliativas são
8GEPAV (Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliação) – Grupo vinculado ao Instituto de Letras e Linguística da
Universidade Federal de Uberlândia, composto por pesquisadores doutores e alunos de graduação e pós-graduação.
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defendidas pelos estudos contemporâneos em avaliação educacional e, para finalizar este
item, apresento algumas considerações teóricas em Linguística Aplicada sobre a avaliação da
aprendizagem no ensino de línguas.
2.1. Breve histórico da avaliação educacional e razões para mudar a avaliação
Para elaboração dessa seção, escolhi, sobretudo, os estudos de Fernandes (2009), autor
português que fez uma pesquisa aprofundada sobre as gerações da avaliação educacional,
caracterizando cada fase e ressaltando o que é preciso ser feito para direcionar aprendizagens
que acompanhem as pesquisas educacionais, os progressos nas ciências, e as incertezas
advindas das constantes mudanças caraterísticas desse mundo complexo e dinâmico.
Fernandes (2009), já no início de sua obra, reconhece a necessidade de mudanças a
serem feitas nas práticas de avaliação educacional, mudanças que foram evidenciadas por
diversos estudos sobre a temática. Levando em conta esses estudos, Fernandes enumera três
razões que são suficientes para mudar a avaliação das aprendizagens, a saber:
desenvolvimento das teorias da aprendizagem, desenvolvimento das teorias do currículo e
democratização dos sistemas educativos (FERNANDES, 2009, p.30). Ao argumentar em
favor da primeira razão, ele afirma que a forma com que o professor avalia está diretamente
relacionada à maneira como o professor acredita que seu aluno aprende. Essas crenças sobre a
aprendizagem de seus alunos estão também diretamente relacionadas às crenças que embasam
suas práticas de ensino.
Dessa forma, as práticas pedagógicas de ensino, as concepções sobre a aprendizagem
do aluno e os instrumentos de avaliação da aprendizagem utilizados pelo professor tendem a
refletir a teoria de aprendizagem que o professor escolheu para sua docência. Muitas vezes,
essa escolha é inconsciente, fruto de mera repetição de práticas com as quais teve contato em
sua vida escolar, pois durante seu percurso de formação acontece de não ser submetido ou se
submeter a experiências teórico-práticas que direcionem reflexões sobre qual a teoria de
ensino e aprendizagem escolher para ensinar e avaliar.
Essas práticas repetitivas de ensino e avaliação que não passam por reflexões críticas
voltadas para as diversas situações de ensino e aprendizagem têm como embasamento,
comumente, a concepção behaviorista de aprendizagem:
[...] uma concepção da aprendizagem como acumulação de associações
estímulo-resposta, que sustentou o pensamento e a ação dos psicólogos
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behavioristas, e, em boa medida, que ainda hoje influencia de modo
significativo o currículo e as práticas de ensino e de avaliação nos sistemas
educacionais (FERNANDES, 2009, p.31).
Apesar de as práticas behavioristas ainda predominarem, Fernandes (2009) pontua
que, desde os anos 80 do século XX, concepções novas inspiradas no cognitivismo,
construtivismo e no socioconstrutivismo estão sendo adotadas.
No ensino de línguas, as práticas de ensino e avaliação dos professores, além da
concepção de ensino e aprendizagem, também refletem a concepção de língua que o professor
defende, consciente ou inconscientemente. Isso porque que a maneira que o docente entende a
língua pode influenciar a escolha de suas estratégias de ensino e avaliação. Paniago (2006),
com base em Geraldi (1984) e Travaglia (1996), realizou um estudo que indicou as
concepções de língua mais frequentes na prática de professores de língua materna, são elas:
- A linguagem como espelho do pensamento
- A linguagem como instrumento de comunicação
- A linguagem como forma ou processo de interação
Os estudos feitos por Paniago demonstraram que é a segunda concepção – linguagem
como instrumento de comunicação – a mais predominante, pois nesta, a linguagem é vista
como um fato objetivo e externo ao sujeito, opondo-se ao falante enquanto norma
indestrutível, característica que o indivíduo só pode aceitar como tal. Paniago (2006)
acrescenta que essa concepção faz o trabalho com a língua ser artificial e o aluno apenas mero
repetidor de termos e conceitos. São práticas que podem ser classificadas como behavioristas,
pois se limitam aos estímulos e respostas comportamentais.
Ainda sobre as concepções de ensino e aprendizagem, Fernandes (2009) afirma que
estamos diante de um paradigma que está emergindo e que reúne aparatos cognitivistas,
construtivistas e socioconstrutivistas Apesar de não fazer referência à teoria da complexidade,
acredito na possibilidade de poder associar essa afirmativa com os direcionamentos que a
teoria nos traz sobre o surgimento do novo paradigma, o da complexidade. Além de concordar
com o autor, creio que esses aparatos estão sendo solicitados pela nossa sociedade moderna
complexa, na qual os professores são coagidos a modificar suas práticas, e desta forma:
A avaliação tem de abranger processos complexos9 de pensamento, tem de
contribuir para motivar os alunos na resolução de problemas e para a
valorização dos aspectos de natureza socioafetiva, e tem também de se centrar
9 O adjetivo complexo utilizado por Fernandes (2009) não traz o mesmo significado daquele apresentado pela
teoria da complexidade, pois o autor não faz, em nenhum momento, referência à teoria da complexidade.
Contudo, podemos notar certa aproximação ao que sugere a teoria da complexidade quando o autor traz a
avaliação como motivadora de resolução de problemas e valorizadora dos aspectos socioafetivos.
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mais nas estratégias metacognitivas utilizadas e serem usadas pelos alunos
(FERNANDES, 2009, p.35).
Dentre as razões para mudar a avaliação que envolvem o desenvolvimento das teorias
do currículo, Fernandes assinala as mudanças significativas que aconteceram nos âmbitos
econômicos, sociais, políticos e culturais. A grande facilidade de trocas de movimentação
econômica, de pessoas e informações, transforma sobremaneira a forma de viver do homem
moderno, que se comunica e se movimenta como nunca antes pudera, originando uma
integração multicultural jamais vista. Da mesma maneira que facilidades para viver foram
conquistadas pelo avanço das tecnologias, as sociedades estão muito mais instáveis, inseguras
e imprevisíveis. Um bom exemplo são as decisões econômicas que tomadas em um continente
podem ter reflexos inesperados em outro.
É nesse contexto de mudanças constantes que emergem novas teorias de currículo,
buscando padrões de ensino e aprendizagem que suplantem a simples memorização de
conhecimentos e que abranjam aprendizagens contextualizadas e mais significativas. Essas
novas teorias de currículo são embasadas em princípios que buscam a igualdade de
oportunidades, a resolução de problemas, práticas democráticas e reflexivas, e a premissa de
que todos os alunos podem aprender (SHEPARD, 2001, p.1074).
O interessante, ou chocante, é que Fernandes ressalta que foi apenas nos fins da
década de 1980 e em poucos países, que se iniciou uma reforma para alinhar a avaliação ao
que demandavam as novas exigências curriculares de ensino e aprendizagem. Há, apesar
disso, quem afirme que “as sucessivas reformas têm falhado, porque a avaliação permanece
praticamente imutável” (2009, p.37).
Fernandes (2009) recorre a Shepard (2000; 2001) para reforçar o seu argumento de
que o desenvolvimento das teorias de currículo dos últimos vinte anos
[está] dando origem à substituição do Currículo da Eficiência Social, que fez
uso dos princípios da gestão científica aplicando-os às escolas, por uma Visão
Reformada do Currículo inspirada em teorias construtivistas, socioculturais e
cognitivistas das aprendizagens (FERNANDES, 2009, p.37).
Finalmente, o autor defende a necessidade de modificar a avaliação para uma
consequente democratização dos sistemas educativos, visto que ela é frequentemente
responsável pela evasão escolar, pois ainda predomina nos sistemas educativos em geral uma
avaliação classificatória e excludente. Avaliação que acaba por desmotivar os estudantes no
prosseguimento de seus estudos. Por isso, modificações devem ser feitas visando uma
avaliação que busque motivar, desenvolver competências intelectual, moral e socioafetivas,
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integrar, respondendo assim, aos direitos, interesses e motivações de crianças e suas
comunidades.
Buscando nos estudos de Guba e Lincoln (1989), Fernandes (2009, p.44) faz um
interessante histórico da avaliação, um percurso de quatro gerações que ele nomeia de “Da
avaliação como medida à avaliação formativo-alternativa (AFA)”. Com base nas informações
fornecidas por Fernandes para cada geração, elaborei um quadro com intuito de facilitar a
visualização dos progressos realizados nessas quatro gerações avaliativas, que apresento a
seguir:
79
Quadro 1 – Histórico da Avaliação Educacional
Geração de
Avaliação
1ª Geração - Avaliação
como medida
2ª Geração - Avaliação
como descrição
3ª Geração - Avaliação como
juízo de valor
4ª Geração - Avaliação como
negociação e construção
Época de
surgimento e
difusão
1900 a 1930 1930 a 1945 1958 a 1972
(Conhecida como Idade do
Desenvolvimento da Avaliação)
1986 a 2004
(Geração de ruptura –
Elaboração dos referenciais da
Avaliação Formativa)
Professor
Avaliador
Neutro – não influencia nos
resultados
Neutro – não influencia
nos resultados
Juízes neutros – cuja função é a
de aplicar juízos de valor
Partilha o poder de avaliar com
os alunos e outros atores.
Objeto a ser
Avaliado
Avaliação técnica, objetiva
e classificatória dos
conhecimentos.
Avaliação descritiva dos
conhecimentos dos alunos
como base em objetivos.
Avaliação dos conhecimentos
para a apreciação do mérito e
consequentes decisões.
Avaliação formativa dos
conhecimentos para a melhoria
e regulação das aprendizagens.
Alunos Não participam do processo
de elaboração da avaliação.
Não participam do
processo de elaboração da
avaliação.
Participam parcialmente do
processo de elaboração da
avaliação.
Participam integralmente do
processo de elaboração da
avaliação.
Instrumentos
avaliativos
Testes técnicos e objetivos
e, na maioria das vezes,
descontextualizados.
Prevalência de testes que
agora, além de medir,
descrevem até ponto os
alunos atingem os
objetivos.
Testes que devem levar em
consideração critérios
previamente estabelecidos e
também o contexto.
Um variedade de estratégias,
técnicas e instrumentos
predominantemente
qualitativos que proporcionem
o feedback.
Objetivo da
Avaliação
(com base na
ação do
professor)
Medir, classificar,
selecionar e certificar.
Descrever padrões de
pontos fortes e de pontos
fracos com base em
objetivos educacionais
previamente definidos.
Medir, descrever para em
sequência emitir juízos de valor.
Ajudar o aprendiz a
desenvolver suas
aprendizagens.
Pensadores
Influentes
Alfred Binet e Théodore
Simon (coeficiente de
inteligência); Stuart Mill;
Fredrick Taylor
(taylorismo)
Ralph Tyler (pai da
avaliação educacional)
Michael Scriven (1967)
(distingue avaliação a somativa
da formativa); Bloom; Hastings;
Madaus
Guba e Lincoln(1989), Allal
(1986); Cardinet (1986); Hadji
(1992); Gipps(1994);
Perrenoud (1998; 2001; 2004)
Fonte: elaboração da autora com base em Fernandes (2009).
80
Cada geração, segundo Guba e Lincoln (1989 apud FERNANDES, 2009), apresenta
uma evolução dos significados dados à avaliação, os quais refletem os contextos históricos,
políticos, sociais e filosóficos de cada época. É um percurso evolucionista que vai desde a
concepção de avaliação como medida, culminando em estudos mais recentes que concebem a
avaliação como negociação e construção.
A primeira geração descrita no quadro, a da Avaliação como medida, sofreu grande
influência das ideias sobre gestão científica (no mundo da Economia) de Frederick Taylor. A
sistematização, a padronização e eficiência que dominaram a gestão econômica foram
transferidas para a produção em massa de testes: “os testes acabaram por ter um papel
determinante para verificar, para medir, se os sistemas educacionais produziram bons
produtos a partir da matéria prima disponível – os alunos” (FERNANDES, 2009, p. 46).
Os professores, nesta geração, são os avaliadores, os que, ao aplicar o teste, não
poderão influenciar no resultado porque é privilegiada a quantificação dos resultados, o que
trará a garantia da neutralidade do professor. Já o aluno não intervém, em nenhum momento,
no processo de elaboração da avaliação que é, nessa geração, representada apenas por testes.
Seu papel é o de fazer o teste e receber o resultado da nota e sua classificação.
Na geração da Avaliação como descrição, predominam as influências dos estudos de
Ralph Tyler, conhecido como pai da avaliação educacional. O que diferencia esta geração da
precedente é a proposição de Tyler que estabelece a necessidade de se determinar objetivos
para a definição concreta do que se deseja avaliar podendo, desta forma, descrever até que
ponto os alunos atingem os objetivos estabelecidos previamente. De acordo com Fernandes
(2009, p.48), essa é a única característica que diferencia esta geração de avaliação da anterior,
as outras características persistem.
A terceira geração, Avaliação como juízo de valor, surge, como a segunda, da
necessidade em aprimorar as carências da avaliação. Percebendo que o avaliador não poderia
continuar com o seu papel de neutralidade em face dos objetos de avaliação, foi estabelecido
que “os avaliadores, mantendo as funções técnicas e descritivas das gerações anteriores,
passariam também a desempenhar o papel de juízes” (FERNANDES, 2009, p.48).
Essa geração foi marcada por um grande desenvolvimento da teoria da avaliação,
concomitantemente ao alto desenvolvimento científico e tecnológico. Nesse ínterim, os
Estados Unidos e os países da Europa investiram fortemente na avaliação dos currículos
educacionais objetivando alcançar altos padrões de ensino e aprendizagem. É nesse período
que são elaborados por Michael Scriven, em 1967, os conceitos de avaliação somativa e
avaliação formativa. Ambos os conceitos se distinguem: o de a avaliação somativa, mais
81
associado à prestação de contas, à certificação e à seleção, e o conceito de avaliação
formativa mais associado ao desenvolvimento, à melhoria das aprendizagens e à regulação
dos processos de ensino e aprendizagem” (FERNANDES, 2009, p.49).
Fernandes também enfatiza que, de acordo com Guba e Lincoln (2000 apud
FERNANDES, 2009), as três primeiras gerações trazem limitações. A primeira limitação se
relaciona ao fato de atribuírem apenas aos alunos a responsabilidade pelas falhas nas
aprendizagens. A segunda limitação se relaciona ao fato de as avaliações não considerarem a
diversidade cultural dos aprendizes de uma mesma instituição educacional, por exemplo. A
última limitação das três gerações de avaliação se dá pela grande influência do método
científico nas avaliações, como garantia de objetividade e neutralidade para que não houvesse
nenhuma influência nos resultados por parte dos avaliadores.
Em resposta às limitações das gerações anteriores, Guba e Lincoln (1989 apud
FERNANDES, 2009) propuseram uma ruptura com parâmetros e enquadramento, pois as
avaliações da nova geração deveriam ser elaboradas em um processo onde o poder de avaliar
fosse partilhado com os alunos e outros atores do processo. A avaliação é então construída na
interação desses atores, sendo, pois, responsiva às suas necessidades. Por outro lado, é
também construtivista “[...] expressão que designa não só a metodologia que é efetivamente
posta em prática na avaliação, mas também a epistemologia que lhe está subjacente”
(FERNANDES, 2009, p.55).
Dentre outras características, a quarta geração, a da Avaliação como negociação e
construção, ao elaborar os referenciais para a avaliação formativa, como explicitado no
quadro, traz o professor como partilhador do poder de avaliar com os alunos e outros atores
do processo de ensino e aprendizagem, e os conhecimentos são avaliados com o objetivo de
regular as aprendizagens, visando sua melhoria. Já os métodos10
de coleta de informação, isto
é, os instrumentos, técnicas e estratégias de avaliação, são predominantemente qualitativos. É
importante ressaltar também o valor que é dado ao feedback nessa geração, pois é em suas
diversas formas que a avaliação se integrará no processo de ensino e aprendizagem.
Apresentei, nesta seção, um pequeno histórico da Avaliação Educacional, desde seus
questionamentos primordiais feitos no início do século XX até seus desdobramentos atuais.
Na próxima seção, passo a caracterizar a avaliação apresentada na quarta geração, assim
sendo, exponho algumas das características da avaliação de cunho formativo defendida por
Álvarez Méndez (2002), Fernandes (2009), Hadji (2008) e Luckesi (2010; 2011), bem como o
10
Como Fernandes (2009), neste trecho e em todo o texto, utilizo a palavra método, em itálico, no contexto de
avaliação, para me referir a estratégias, técnicas e instrumentos de coleta de informações.
82
que é sugerido pelos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira e Portuguesa
(1998). Finalizo a seção discorrendo sobre estudos que buscaram elaborar preceitos de uma
avaliação fundamentada na transdisciplinaridade e complexidade.
2.2 Da avaliação formativa à avaliação polilógica transdisciplinar
Para Álvarez Méndez (2001), avaliar com intenção formativa não é sinônimo de
examinar, aplicar testes, qualificar, medir e classificar. Essas palavras estão no campo
semântico da avaliação, mas se diferenciam com relação à finalidade e instrumentos que
utilizam, já que a avaliação que pretende ser formativa tem o objetivo de conhecer para
aprender visto que se deseja:
[...] conhecer a qualidade dos processos e dos resultados [...] para valorizar os
processos que produzem certos resultados e intervir a tempo, se necessário,
com a sincera intenção de assegurar o êxito dos que participam do mesmo
processo educativo (ÁLVAREZ MÉNDES, 2001, p.64).
O autor também deixa claro que a avaliação deve estar a serviço de quem aprende;
para isso, o professor deve ter a seu dispor uma variedade de instrumentos que visem a
conhecer como seu aluno aprende, o que ele já aprendeu, quais estratégias ele privilegia:
“uma avaliação que vise mais os aspectos em que o aluno vai obtendo êxito do que o que vai
deixando de lado, mais o que aprende do que o que não sabe, ou ignora, ou esquece”
(ÁLVAREZ MÉNDEZ, 2001, p.84).
Assim, considero que o professor deve estar sempre num caminho de observações,
aprendizagens e descobertas sobre seus alunos e sobre suas próprias práticas, por isso acredito
que instrumentos, estratégias e técnicas de avaliação utilizados com o objetivo de medir,
classificar e examinar, não atendem às demandas do caminho contínuo, processual,
participativo, compartilhado de um professor que busca avaliar formativamente.
Como sugestão de métodos de avaliação, Álvarez Méndez (2001) destaca a
observação, a entrevista, as anotações, os diários e o diálogo entre alunos e aluno-professor.
Todos esses instrumentos devem, contudo, ser escolhidos tendo por base critérios que devem
ser explicitados com antecedência para os alunos e também adaptados segundo as
necessidades subjetivas e contextuais dos aprendizes envolvidos no processo.
Fernandes (2009), por sua vez, distingue a avaliação formativa, que apenas pretende
ser “formativa”, mas é de cunho behaviorista e neobehaviorista, da avaliação formativa
83
alternativa (AFA), que se embasa em estudos cognitivistas, construtivistas, da Psicologia
Social e das teorias socioculturais e sociocognitivistas. A avaliação de cunho behaviorista
ainda atende aos objetivos psicométricos, é predominantemente somativa e traz a avaliação
como sinônimo de medida. O autor é, portanto, a favor de uma avaliação formativa
alternativa (AFA), pois o professor que a adote, deve trabalhar em favor do desenvolvimento
das aprendizagens, ao invés da mera classificação e qualificação de objetivos
comportamentais e memorização de conhecimentos, associando suas práticas avaliativas ao
ensino, à aprendizagem e às condições individuais e contextuais.
É possível enxergar pontos em comum entre o que defendem Álvarez Méndez (2001)
e Fernandes (2009), pois ambos reforçam a necessidade da contextualização e
individualização das práticas avaliativas, que vão contra práticas behavioristas.
Outro fator importante a ressaltar é a presença de contribuições teóricas de várias áreas
do conhecimento para a formulação das diretrizes de uma avaliação que se quer
verdadeiramente formativa. É observando essa característica que Fernandes (2009, p.63)
recorre a Perrenoud (2001) para ressaltar a necessidade de “um quadro conceitual de natureza
transdisciplinar em que uma teoria da avaliação formativa pudesse ancorar-se e apoiar-se com
segurança”, pois ambos veem a necessidade de um quadro conceitual sólido para desfossilizar
práticas tradicionais de avaliação e favorecer o desenvolvimento de uma AFA.
Apesar de buscar transdisciplinarmente em várias disciplinas, Fernandes (2009) afirma
que ainda não há uma teoria solidamente alicerçada para a AFA, todavia, já existe um corpo
teórico relevante que pode direcionar práticas que favoreçam a melhoria das aprendizagens.
Ele acredita que não se pode esperar por uma teoria triunfal, pois:
A teoria constrói-se através da nossa interação com as realidades educacionais,
da construção e reconstrução de pesquisas empíricas que vamos
empreendendo, das análises que formos sendo capazes de realizar e das
integrações e relações conceituais que descobrirmos e interpretarmos
(FERNANDES, 2009, p.65).
Abro aqui um parêntese para ressaltar que o fato de buscar a transdisciplinaridade para
a construção de uma teoria para a avaliação pode ser uma evidência da influência do
paradigma da complexidade nos estudos avaliativos. Igualmente percebo o princípio da
autonomia e dependência regendo as pesquisas avaliativas, quando Fernandes reconhece a
necessidade de construção e reconstrução das pesquisas, pela necessidade de uma auto-eco-
organização, pois as pesquisas caminham na dependência das necessidades avaliativas que
surgem. Dessa maneira, não há a possibilidade de uma teoria avaliativa fechada e acabada em
si mesma.
84
Para a escolha de estratégias, técnicas e instrumentos que proporcionem a AFA,
Fernandes (2009) considera que eles devem estar sempre como parte integrante do processo
de ensino e aprendizagem, devendo também haver uma integração com as propostas político-
pedagógicas do currículo da instituição. Dentre as sugestões feitas, destaco o feedback, a
triangulação e o portfólio.
Fruto da interação e comunicação no processo de ensino e aprendizagem, o feedback
se faz indispensável para a AFA, visto que o desenvolvimento das aprendizagens necessita de
orientações e avaliações sistemáticas para direcionar esforços, estimular e motivar os alunos.
De acordo com Fernandes (2009), os autores Tunstal e Gipps (1996 apud FERNANDES,
2009) distinguem dois tipos de feedback, o feedback avaliativo e o feedback descritivo. O
primeiro é, sobretudo, aquele no qual serão expressos juízos de valor ou mérito de trabalhos
realizados; já o segundo é aquele no qual o professor irá descrever o que foi feito pelo aluno,
tomando como referência os objetivos estabelecidos para a realização de determinada
atividade.
Fernandes (2009, p.101) ainda esclarece que a utilização de um sistema de feedback,
contribuirá “para que os alunos se tornem mais autônomos, mais responsáveis pelas suas
aprendizagens, mais capazes de avaliar e regular seu trabalho, seu desempenho e suas
aprendizagens e mais ágeis na utilização das suas competências metacognitivas”.
Ao fazer uso de feedbacks em sua prática avaliativa, o professor facilita o trabalho
com a complexidade inerente ao processo de ensino e aprendizagem, isso porque é possível
visualizar nessa prática o que diz o princípio da retroatividade: a causa age sobre o efeito e o
efeito age sobre a causa, isto é, os efeitos advindos dos esforços de ensino e aprendizagem
serão explicitados para reorganizar as condições que os produziram, redirecionando o
processo para novas possibilidades de aprendizagem. Esse processo, que também é nomeado
dentro da teoria da complexidade como feedback, possibilitará atitudes mais autônomas e
autorreguladoras por parte dos aprendizes, fazendo cair por terra a premissa da avaliação
tradicional que preconiza que nem todos podem aprender, uma vez que as avaliações têm a
função de selecionar e classificar; e a premissa do ensino tradicional que não permite uma
avaliação reguladora, apenas quantitativa e somativa.
No feedback é possível também visualizar o princípio de introdução do sujeito
cognoscente. O professor aparece como sujeito que interfere no processo de aprendizagem
como suas informações e juízos de valor, participando da construção e reconstrução do
conhecimento.
85
A triangulação é outro recurso imprescindível da AFA, pois considera-se impossível
avaliar todas as competências desenvolvidas e em desenvolvimento dos aprendizes. Toda
avaliação comporta em si um erro, daí não existe estratégia, instrumento ou técnica que
contemple exatamente e globalmente aprendizagens específicas. Para minimizar esse erro a
triangulação precisa ser feita, considerando três aspectos: - triangulação de estratégias,
técnicas e instrumento; - triangulação de atores e; - triangulação de espaços e de tempos
(FERNANDES, 2009, p.95-96).
Enxergo aqui mais uma possível influência do paradigma da complexidade quando
Morin (2002b) afirma que todo conhecimento comporta o risco do erro e da ilusão de maneira
que, onde há transmissão de informação, onde há comunicação de alguma mensagem, existe o
risco do erro.
Para a triangulação de estratégias, técnicas e instrumentos, Fernandes (2009) sugere a
variabilidade destes métodos para que não se restrinja aos testes e provas. Para a triangulação
de atores, aponta-se para a necessidade da participação de atores, além dos alunos, no
processo de avaliação, como pais, outros professores, técnicos, assistentes sociais e
psicólogos escolares. E, para a triangulação de espaços e tempos, o autor recomenda que a
avaliação aconteça em diferentes contextos e em diferentes períodos de tempo, isso significa
que:
Pode ser importante recolher informação dentro da sala de aula, onde se
podem criar situações diversificadas [...], mas também fora dela como é, por
exemplo, o caso de visitas a museus, a unidades empresariais, a mercados, a
associações culturais e recreativas, a instituições científicas ou a instituições
culturais de outra natureza [...]. Outra é a de que a informação,
desejavelmente, deve ser recolhida em tempos diversificados; sempre que
possível ao longo dos períodos escolares e não em dois ou três momentos
previamente anunciados (FERNANDES, 2009, p.95-96).
Para o autor, com esses três modos de triangular, os aprendizes acabam por perceber
que não basta apenas estudar para a prova; há uma contemplação maior da diversidade de
tipos de aprendizagem; ocorre a diminuição dos erros inerentes à avaliação e,
consequentemente, acontece o compartilhamento do poder de avaliar, que quase sempre é
conferido apenas ao professor.
O portfólio é outro recurso do qual o professor pode se utilizar para propiciar uma
AFA. Trata-se de organizar os trabalhos realizados pelos alunos de maneira a permitir a
visualização de seus progressos e necessidades de aperfeiçoamento: trabalhos como
produções de texto, diários reflexivos, relatos de viagens de estudo, trabalhos individuais e em
grupo, entre outros. Para evitar que o portfólio seja apenas uma pasta onde os alunos irão
86
guardar seus trabalhos, é preciso que o professor estabeleça objetivos a alcançar, segundo as
diretrizes avaliativas, pedagógicas e curriculares, de maneira a envolver os alunos em um
processo avaliativo formativo, mais contextualizado, mais participativo e reflexivo
(FERNANDES, 2009).
A utilização do portfólio me faz recordar o que diz o princípio hologramático do
pensamento complexo: o todo está nas partes, assim como as partes estão no todo. Ao refletir
sobre uma determinada atividade que está sendo desenvolvida (parte), o aprendiz, de posse de
seu portfólio (todo), reconhece e classifica essa atividade como parte de um todo que já foi
desenvolvido e que está em processo. Visualiza as aprendizagens desenvolvidas no conjunto
do conhecimento construído, podendo ver a nova atividade como a parte na qual poderá
investir o todo da aprendizagem que já construiu, fazendo dela, por conseguinte, mais um
reflexo do conjunto.
Dessa maneira, além de possibilitar uma visão integral das habilidades desenvolvidas e
a desenvolver, pois no portfólio terá acesso a cada atividade feita e a fazer, poderá,
igualmente, compreender que o todo é, ao mesmo tempo, maior e menor do que a soma de
cada atividade. Menor porque as particularidades (facilidade, esforços, tempo gasto,
dificuldades) de cada atividade acabam, de alguma forma, sendo inibidas pela organização do
portfólio. Maior porque ao ter uma visão mais abrangente do todo organizado do
conhecimento construído, poderão emergir qualidades novas, (facilidades, capacidades,
contribuições para outros saberes). Assim sendo, o aprendiz pode descobrir habilidades dantes
desconhecidas, ter insights criativos, por exemplo.
É importante deixar claro que, de acordo com Fernandes (2009), a utilização desses
métodos não proíbe a utilização daqueles utilizados por uma avaliação somativa, como testes
em períodos determinados, por exemplo. As instituições políticas organizacionais ainda fazem
uso desses recursos para poder calcular investimentos feitos e a fazer, estabelecer objetivos e
classificações. Por outro lado, o que deve prevalecer são as estratégias, técnicas e
instrumentos da AFA, o que facilitará a utilização dos resultados de eventuais avaliações
somativas com objetivos que favoreçam a regulação das aprendizagens.
Hadji (2008), por seu turno, assevera que, para a avaliação formativa deixar de ser
uma utopia e passar a fazer parte das práticas avaliativas educacionais, a escola deverá pôr a
avaliação a serviço das aprendizagens o máximo possível. A avaliação será, nesse sentido,
formativa, quando é informativa, oferecendo as informações para os dois principais atores do
processo, o professor e o aluno. De posse das informações, esses atores poderão modificar sua
87
ação com o objetivo de obter melhores efeitos por meio de uma mudança nos dispositivos
pedagógicos de ensino e aprendizagem.
O autor apresenta três obstáculos à emergência de uma avaliação com intenção
formativa, quais sejam: 1-as forças das representações inibidoras; 2- a pobreza de
conhecimento teórico que podem, consequentemente, 3- fundamentar a interpretação e a
preguiça, ou medo dos professores que não ousam imaginar remediações.
Hadji (2008) esclarece ainda que, graças às investigações, já há certo número de pistas
para avaliar formativamente. Essas pistas são por ele classificadas em quatro grandes
categorias: “Objetivos da prática avaliativa; - Modalidades dessa prática; - Condições e
técnicas e; - Deontologia do trabalho avaliador.” (HADJI, 2008, p.74-75). Dentre as pistas
apresentadas, destaco, no quadro a seguir, algumas:
Quadro 2: Pistas para avaliar formativamente de acordo com Hadji (2008).
Objetivos da
prática avaliativa
Modalidades dessa
prática
Condições e
técnicas
Deontologia do
trabalho avaliador
- designar e explicitar
o que se espera
construir e
desenvolver através
do ensino;
- apropriar dos
critérios de
realização quanto dos
critérios de êxito para
julgar as situações
com conhecimento
de causa;
-diversificar sua
prática pedagógica,
por meio de um
aumento de sua
“variabilidade
didática”.
- o professor não
deve autolimitar sua
criatividade e sua
imaginação;
- o professor não
deve ter a
preocupação de falar
“correta” e
pertinentemente.
- relacionar de
maneira coerente o
exercício de
avaliação ao objeto
avaliado;
- explicitar os
exercícios;
- ampliar o campo
das observações a
fim de tornar a
avaliação mais
informativa.
- o avaliar não deve
jamais pronunciar
levianamente;
- o avaliador deve
construir um contrato
social, fixando as
regras do jogo (dever
de clareza);
- o avaliador deve
despender tempo
para refletir e
identificar o que
julgava poder esperar
dos alunos.
Fonte: elaboração da autora com base em Hadji (2008, p.74-75).
88
Após especificar cada uma dessas pistas, ele considera que elas representam realmente um
nível de exigências ainda relativamente alto, difícil, mas não complicado, o que, segundo o
autor, exigirá por parte do professor muita lucidez, inventividade e tenacidade.
Apesar do nível de alto de dificuldades para colocá-las em prática, para tornar essas
pistas concretas para a efetivação de uma avaliação mais formativa, Hadji (2008, p.75) propõe
um fio condutor. Desse modo, descreve as tarefas que o avaliador é obrigado a executar: -
Agir desencadeando de maneira adequada; - Agir observando/ interpretando de maneira
pertinente; - Agir, comunicando de modo útil, e; Agir remediando de modo eficaz.
Ao concluir “provisoriamente” sua argumentação a favor de uma avaliação formativa,
responde à questão por ele posta: “A avaliação poderá (enfim) tornar-se formativa?” (HADJI,
2008, p.131) Responde, alegando categoricamente que
[Para] que a avaliação se torne formativa, será necessário que os professores
deem provas, antes de tudo, de coragem. A coragem necessária para ousar
falar, e julgar; [...] Colocar o julgamento de avaliação, que o aluno começa por
sofrer, a serviço de uma dinâmica que lhe permitirá tornar-se ele próprio
soberano, e não mais se submeter, este é o desafio àqueles que desejam tornar
a avaliação formativa (HADJI, 2008, p.132).
Luckesi (2010; 2011) é um dos pesquisadores brasileiros que dedicou vários de seus
trabalhos para discutir a avaliação educacional. Apesar de não nomear como formativo o
conjunto de práticas avaliativas que defende, nota-se que os aparatos para a avaliação da
aprendizagem, por ele defendida, apresentam amplas características de um sistema de
avaliação que se quer formativo. Para ele, a avaliação da aprendizagem é, portanto, uma
avaliação de acompanhamento, pois é dinâmica da mesma forma que o processo de
aprendizagem. Para que essa avaliação de acompanhamento aconteça, há a necessidade de um
projeto de ações que definam o ponto de partida e chegada, bem como os meios a serem
utilizados.
De acordo com o autor, essa planificação de ações necessita de um Projeto Político-
Pedagógico que encare o processo de ensino e aprendizagem como construtivo, que não veja
o aprendiz como um ser pronto, mas em autoconstrução. O Projeto Político-Pedagógico
definirá, desta forma, as finalidades político-filosóficas das ações e também os meios para
colocar em prática essas finalidades (LUCKESI,2011).
A avaliação da aprendizagem será, segundo o autor, um dos meios para alcançar os
objetivos estabelecidos pelo projeto da instituição escolar, não sendo, contudo, um ato
isolado, separado das práticas de ensino, visto que:
89
A avaliação da aprendizagem, por sua vez, não pode ser praticada
isoladamente, sob o risco de perder sua dimensão pedagógica e passar a ser
seletiva, à semelhança dos exames. Estes têm como objetivo classificar e
selecionar candidatos, ao passo que o objetivo da avaliação da aprendizagem é
subsidiar o ensino e a aprendizagem bem-sucedidos no interior de um projeto
pedagógico (LUCKESI, 2011, p.148).
Nesse sentido, Luckesi (2011) considera que a avaliação deve ser uma prática de
investigação e intervenção. Por isso, distingue duas modalidades de avaliação: - a avaliação
de certificação e – a avaliação de acompanhamento de uma ação. A primeira é utilizada para
avaliar um objeto já concluído e configurado, a segunda, para avaliar um objeto que está em
construção. A avaliação de certificação preocupa-se em investigar a qualidade do produto já
pronto, e a avaliação de acompanhamento centra-se na investigação da qualidade dos
resultados das ações em andamento.
Destarte, Luckesi (2011) é a favor da avaliação de acompanhamento de uma ação. A
justificativa que o autor apresenta é a de que esse tipo de avaliação tem um foco formativo no
processo, o que permite intervenções, pois “no caso de uma qualificação negativa, após a
investigação da qualidade dos resultados em andamento, subsidiará a intervenção para a
correção ou reorientação da ação com a finalidade de chegar ao resultado desejado”
(LUCKESI, 2011, p.174).
O que diferencia, desta maneira, as duas avaliações é que a avaliação com foco no
produto descreve e qualifica a realidade; por outro lado, a avaliação com foco no processo
descreve, qualifica e intervém na realidade quando necessário. Não obstante, o que prevalece,
segundo o autor, nas escolas brasileiras e fora do Brasil, é aquela que apenas descreve e
qualifica a realidade por meio de exames. Apesar de ser anunciada nos documentos oficiais
das escolas e sistemas mantenedores da educação a prática da avaliação da aprendizagem, o
que na verdade acontece, é o exame. Isso demonstra, portanto, equívocos na compreensão do
que venha ser a avaliação da aprendizagem e como ela deve ser praticada.
Luckesi (2010), ao se referir aos equívocos da avaliação da aprendizagem na escola
brasileira, afirma que o que predomina é uma “pedagogia do exame” (LUCKESI, 2010, p.17),
porque nossa prática de ensino passou a ser direcionada por testes, visto que pais, sistema de
ensino, profissionais da educação, professores e alunos trabalham em torno das provas e de
seus resultados. É dessa “pedagogia do exame” que nasce o viés avaliativo como instrumento
de poder. O professor, por exemplo, ao se deparar com situações nas quais perde o controle da
disciplina de seus alunos, faz uso dos exames e notas para reaver sua autoridade na sala de
aula, dizendo que aumentará o nível de dificuldade de um exame, por exemplo.
90
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira (BRASIL, 1998),
documento oficial que visa orientar e apoiar na elaboração do projeto educativo da escola,
leva em conta os resultados dos estudos sobre avaliação educacional porque, ao defender a
prática de uma avaliação formativa no ensino de Línguas Estrangeiras, o documento a
considera como parte integrante do ensino-aprendizagem, tendo a função de alimentar,
sustentar e orientar a ação pedagógica. Desta maneira, entende-se aí a avaliação de cunho
formativo e processual, visto que: é um “processo contínuo de acompanhamento da
aprendizagem como bússola diretiva que determina os ajustes necessários a serem feitos no
ensino” (BRASIL, 1998, p.79).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (BRASIL, 1998), apesar
de não caracterizar a avaliação com o adjetivo formativo, sugerem ações que se enquadram
nesse tipo de avaliação. O documento indica que a avaliação deva ter cunho informativo tanto
para o aluno quanto para o professor e que, para isso, o professor pode fazer uso de variados
procedimentos investigativos de avaliação. Deverá acontecer durante todo o processo de
ensino e aprendizagem, fazendo parte da prática educativa, favorecendo, igualmente, a
autonomia do aluno. A avaliação será, nesse sentido, uma avaliação dialógica, haja vista que:
Deve realizar-se num espaço em que sejam considerados aquele que ensina,
aquele que aprende e a relação intrínseca que se estabelece entre todos os
participantes do processo de aprendizado. Portanto, não se aplica apenas ao
aluno, considerando unicamente as expectativas de aprendizagem, mas aplica-
se às condições oferecidas para que isso ocorra: avaliar a aprendizagem
implica avaliar também o ensino oferecido (BRASIL, 1998, p.94).
O percurso histórico de construção teórico-metodológica da avaliação formativa até
agora apresentado, nos mostra que o ensino a ser avaliado é o que se enquadra na
disciplinaridade do conhecimento. O que nos leva concluir que as aprendizagens avaliadas
formativamente são aquelas fruto de um ensino tradicional, que não busca a
multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade. Haja vista que não
encontrei nenhum autor que ao discorrer sobre avaliação formativa, faça referência a
modalidades de ensino que diferem da disciplinaridade.
A construção da teoria para a avaliação formativa foi, como afirma Perrenoud (2001) e
Fernandes (2009), construída com um sólido amparo transdisciplinar em variadas áreas do
conhecimento, contudo esta característica não garante que o ensino se ampare igualmente
numa postura que abranja os diferentes níveis de Realidade, a complexidade e o terceiro
incluído. Tal postura metodológica de ensino leva à reprodução de padrões de pensamento
simplificador que não conseguem dar conta da complexidade da contemporaneidade. Talvez
91
seja isso que motivou Borges e Paiva (2011) a proporem uma abordagem complexa de ensino
de línguas.
Mesmo que o professor exerça uma avaliação formativa, ela tenderá a reforçar as
práticas tradicionais de ensino e pensamento, pois o conhecimento disciplinar é forçosamente
unidimensional e analítico, desprovido de valores, e, como aponta Nicolescu (2002), prioriza
o valor e o poder, além de ser regido pela lógica binária que diz que A não é não-A. Em
outras palavras, um tipo de ensino que não aceita as oposições, o risco do erro, como também
não aceita a tese de que todo conhecimento traz em si a marca da incerteza. (MORIN;
CIURANA; MOTTA, 2003). Apesar disso, os instrumentos, estratégias e técnicas da
avaliação formativa anteriormente descritos, quando analisados à luz dos princípios da
complexidade, permitem o trabalho com a complexidade.
Bem na reta final da escrita do texto desta dissertação, tomei contato com os estudos
de Galeffi (2009) e Strieder, Benvenutti e Bavaresco (2014), que buscaram a complexidade e
transdisciplinaridade para discutir a avaliação da aprendizagem. Assim sendo, como um dos
questionamentos que me levaram a escolher a complexidade como aparato teórico, foi
justamente “Como avaliar transdisciplinarmente?”, acredito ser necessário tecer algumas
considerações a cerca das contribuições trazidas por esses autores.
Seria a avaliação polilógica transdisciplinar aquela que permitiria a aplicação de uma
abordagem complexa de ensino de línguas (BORGES; PAIVA, 2011) e que traria os
direcionamentos da concepção de língua enquanto um sistema complexo (NASCIMENTO,
2009) para as práticas avaliativas?
Como o escopo do trabalho não visa responder a essa pergunta, estando ele mais
relacionado com a formação de professores, não discuto com detalhes esse tipo de avaliação.
Contudo, respondo afirmativamente à pergunta que fiz, porquanto Galeffi (2009), ao
desenvolver uma epistemologia para o educar transdisciplinar, atinou também ser necessário
uma avaliação que correspondesse aos objetivos complexos e transdisciplinares para a
educação. Assim sendo, o autor busca na complexidade e nos outros pilares da
transdisciplinaridade, bem como nos pilares para educação do futuro, os aparatos para
sustentar sua proposta de avaliação. De acordo com o autor:
Nessa perspectiva de avaliação ninguém é excluído do processo. O que se
avalia não é a adequação a um modelo predefinido e formalizado, mas a
efetividade do florescimento singular. De maneira ampla, cada um aprende na
medida de sua expansão e de sua conexão com suas circunstâncias
existenciais. Cada um é holograma da totalidade vivente em seu próprio e
único lugar (GALEFFI, 2009, p.234).
92
A avaliação polilógica transdisciplinar é orientada para o despertar das potencialidades
humanas, incentiva a autonomia, a criatividade, a responsabilidade e a crítica. Tem como
ponto de partida a constatação da existência de uma enorme gama de conhecimento e
informação na contemporaneidade, assim como as inúmeras possibilidades para o
desenvolvimento humano. Além disso, reconhece a existência de variados contextos,
caracteres e personalidades, realidades que não são reconhecidas pelo sistema educacional em
geral, por predominar ainda um tipo de avaliação monológica que não abarca a pluralidade e
que conduz à exclusão dos que não tem êxito nos exames.
Daí a necessidade de uma avaliação que seja “também um convite à instauração do
exercício de reconhecimento e identificação das dimensões aprendentes do ser humano que
requisitam avaliações diferenciadas” (GALEFFI,2009, p.225). Dessa maneira, a avaliação
polilógica transdisciplinar reconhece a diferença de cada um, rechaçando a comparação,
valoriza as potencialidades dos aprendentes e não os obrigam a ser o que não desejam.
Há de se reconhecer que, como é ratificado pela teoria da complexidade, é impossível
abarcar a totalidade de um sistema, da mesma maneira que é impossível abarcar a condição
humana em toda sua complexidade tendo como aparato uma teoria. Por isso, Galeffi nos traz
o diagrama abaixo, na tentativa de mostrar que não se busca reduzir a totalidade a esquemas
conceituais e abstrações mortas:
93
Figura 6: Limites da avaliação polilógica. Fonte: (GALEFFI, 2009, p.246)
Trazendo também como fundamentos a teoria da complexidade e a
transdisciplinaridade, Strieder, Benvenutti e Bavaresco (2014) engendram na busca de
investigar a avaliação com um olhar transdisciplinar. Elaboram, como base nisso, construtos a
fim de apresentar a avaliação como oportunidade de aprendizagem. Segundo esses autores,
para que a avaliação como oportunidade de aprendizagem se concretize, há a necessidade de
desobediência à lógica classificatória e excludente que predomina:
Avaliação como oportunidade de aprendizagem é assumir, como atitude
irreversível a intolerância diante da injustiça examinadora, sustento da
desigualdade, da dor e do sofrimento que atinge, prioritariamente os
considerados menos capazes e também os mais desprotegidos no contexto
social, intelectual, legal e econômico (STRIEDER; BENVENUTTI;
BAVARESCO, 2014, p.185).
Ao comparar as características da avaliação formativa com as da avaliação nascida da
trasdisciplinaridade e complexidade, é possível constatar que ambas têm um cunho formativo
que visa desenvolver a autonomia, a criatividade, a regulação das aprendizagens, combatendo
a exclusão e a seletividade. Não discorri com profundidade sobre a segunda, todavia, percebe-
se, como já foi discutido nessa seção, que a avaliação formativa é construída nos moldes de
um ensino disciplinar, pretende-se regular as aprendizagens dentro de um nível disciplinar,
isto é, dentro de uma área do conhecimento. Já a avaliação transdisciplinar pressupõe um
ensino, um educar que seja igualmente transdisciplinar, sem o qual não poderia se concretizar:
A proposta de uma Avaliação Polilógica Transdisciplinar atende ao chamado
de uma educação que dê conta do desenvolvimento humano pleno, o que
contraria o modo dominante de produção e consumo do mundo globalizado.
[...] Isto implica em uma problematização da educação instituída e seus
métodos avaliativos, tendo em vista o alcance de uma atitude avaliativa
indissociável do ato de aprender e de ensinar, com foco no concreto
movimento polilógico do aprender: aprender a ser, a conhecer, a pensar, a
perceber, a viver junto, a fazer, pela concepção, elaboração e resolução de
problemas emergentes (GALEFFI, 2009, p.220).
Nesta seção, apresentei e discuti as características de uma avaliação que se quer
formativa. Discorri resumidamente sobre a avaliação à luz da transdisciplinaridade e
complexidade. Na seção seguinte, passo a expor algumas das contribuições da Linguística
Aplicada para avaliação da aprendizagem.
94
2.3 Avaliação e Linguística Aplicada
Linguistas Aplicados do Brasil e do mundo dedicaram e dedicam suas pesquisas para
investigar a avaliação relacionando-a ao ensino e aprendizagem de línguas. Guias de LA
publicados em língua inglesa como The Oxford Handbook of Applied Linguistics (KAPAN,
2002), The handbook of applied lingusitics (DAVIES; ELDER, 2004) e o guia The Routledge
handbook of applied linguistics (SIMPSON, 2011), trazem trabalhos que abordam a avaliação
no ensino e aprendizagem de línguas. Assim sendo, levando em conta as contribuições desses
e outros estudos, a avaliação pode, segundo Mcnamara (2004), ser considerada uma das
principais áreas da LA.
Ao analisar esses guias de LA, pude notar uma diferenciação entre testing e
assessment. O primeiro termo, quando traduzido para o português tem o sentido de prova e
teste; já o segundo é traduzido como avaliação. Desta forma, considera-se que a aplicação de
provas (testing) é apenas um dos modos de avaliação (assessment). Percebo aí que essa
distinção recebe influências dos estudos em avaliação educacional, que possibilitaram a
distinção entre avaliação somativa e avaliação formativa (FERNANDES, 2009), visto que os
testes e provas servem aos objetivos somativos de avaliação e o termo avaliação (assessment)
vem abarcar todos os recursos alternativos de avaliação formativa, incluindo também os
testes.
Outro aspecto que pude notar ao analisar os guias em língua inglesa é a predominância
de estudos que investigam o que se relaciona aos testes de línguas. Acredito que isso se deve à
influência da grande indústria de produção de testes e preparação de aplicadores que busca
constantemente desenvolver técnicas mais eficazes de avaliar a aprendizagem e a competência
linguística, como discutirei posteriormente. Em contrapartida, a avaliação que é mais ampla,
pois abarca aspectos do ensino e aprendizagem de línguas, bem como as relações entre os
atores da sala de aula, é menos priorizada nesses guias.
No Brasil, integrando contributos dos estudos linguísticos, da psicologia, da
pedagogia, dos estudos socioculturais, destaco os trabalhos de Neves (2004), Menezes e Sade
(2006), Cunha (2006) e Felice (2011). Ao analisar essas contribuições brasileiras no campo da
avaliação, noto que seus autores, ao discorrer sobre avaliação em geral, defendem que ela
deve estar ligada a uma abordagem de ensino e aprendizagem caracterizada como processo.
Diferentemente da concepção tradicional de ensino que, ao invés de processo, considera a
aprendizagem como um produto, e o aluno, que tradicionalmente era visto como receptor, é
encarado como agente ativo e participativo de sua aprendizagem.
95
Deste modo, há uma forte argumentação em defesa da prática de uma avaliação
formativa, pois é ela que fornecerá os instrumentos necessários para a regulação da
aprendizagem. Por ser processual, defende-se que esse tipo de avaliação está estritamente
ligado ao planejamento, visto que, ao diagnosticar o que foi aprendido ou não, o professor
utiliza-se desses resultados para redirecionar suas aulas, focando nas dificuldades,
necessidades e motivações de seus aprendizes.
Com isso, nota-se que a LA acompanha o desenvolvimento pedagógico dos métodos
avaliativos já que adota um tipo avaliação que vai ao encontro das regulações que favorecem
a aprendizagem, isto é, práticas que se adequam à chamada avaliação formativa, localizada
seminalmente na quarta geração, conforme Fernandes (2009). Essa avaliação, que nomeio de
emergente, haja vista que ainda não se concretizou efetivamente nas práticas avaliativas
contemporâneas, de acordo com Felice (2011, p.06), “pode ser definida pelas avaliações
interativas frequentes dos progressos e das construções de conhecimento dos estudantes a fim
de identificar suas necessidades e, consequentemente, ajustar o ensino”.
Ao adotar essa concepção de ensino e avaliação, que devem estar necessariamente
entrelaçadas, Felice (2011) recorre a Chammings, et alii (2010) quando apontam que o
professor deixa de ser o professor-avaliador e passa a ser o professor-guia. Nessa perspectiva,
avaliação deixa de ser, como assinalam Menezes e Sade (2006, p.38),“um mero instrumento
disciplinador e controlador, um pretexto para mostrar aos alunos quem tem poder”.
Os métodos de coleta de informação que o professor de línguas que adota essa
perspectiva formativa tem para avaliar são variados, como foi apresentado no item referente à
avaliação formativa. Aliados a eles, Felice (2011) defende também o uso da autoavaliação e
da avaliação dos pares. Para enfatizar os benefícios da utilização dessas duas práticas
avaliativas, Felice nos traz exemplos de atividades realizadas por ela com seus alunos em uma
disciplina de língua estrangeira nomeada Aprendizagem crítico-reflexiva. Disciplina que
integra o quadro do primeiro período de um curso de licenciatura em Letras.
Segundo Felice, todos esses recursos permitiram mostrar aos alunos, professores de
línguas em formação que, o poder de avaliar, pode ser compartilhado pelo grupo. Convidado a
se autoavaliar, por exemplo, o aprendiz, ao refletir sobre suas aprendizagens, pode ser guiado
pelo professor a conhecer como ele aprende ou não aprende. O aluno então vai aprendendo a
aprender, conseguindo, de tal modo, a autonomia para buscar o que ele necessita em seu
percurso de construção do conhecimento linguístico.
A avaliação dos pares ou coavaliação é também um recurso fundamental. Avaliando
um aprendiz que se encontra numa mesma situação de aprendizagem que a sua, por exemplo,
96
reconhece-se semelhança de dificuldades e facilidades. Inseridos em uma interação
coavaliativa que permite feedbacks variados, os aprendizes podem encontrar caminhos
diferentes que possam facilitar o percurso de suas construções linguísticas.
Sobre essa variedade de recursos avaliativos que o professor de línguas que adota
práticas formativas alternativas tem a sua disposição, Neves (2004, p.5) considera que eles:
[...] funcionam como representação de instrumentos de avaliação contínua do
progresso do aluno, e por se diferenciarem dos testes tradicionais, são
conhecidos como métodos alternativos. São também aclamados como métodos
de promover a autonomia de aprendizagem, valor máximo do indivíduo
moderno.
Voltando a Felice (2011), ela afirma que o trabalho realizado com seus alunos de
primeiro período na disciplina Aprendizagem crítico-reflexiva visou à tentativa de adotar
práticas formativas de avaliação, de maneira a mostrar aos professores em formação que a
avaliação faz parte da carreira docente. Assim sendo, a pesquisadora reforça que:
Deve-se fazê-los perceber que avaliar tem relação com o desenvolvimento da
crítica construtiva, visando à percepção do progresso feito por ele e por seus
colegas durante a aquisição dos conhecimentos e que faz parte da formação do
professor aprender a avaliar (FELICE, 2011, p.590).
Por favorecer a autonomia, a avaliação formativa defendida pela LA pretende fazer do
aluno o ator de suas aprendizagens, visto que ele passa a ter consciência das razões dos seus
fracassos ou sucessos. O conhecimento adquirido será, desta forma, reflexivo e significativo,
pois o aprendiz sente-se motivado e empoderado para buscar seu desenvolvimento.
Também é importante ressaltar o argumento de que o erro dos aprendizes não poderá
ser estigmatizado pelo professor. Poderá ser visto, contudo, como um dos instrumentos de
ensino porquanto demonstra o que está sendo feito pelos aprendizes, como também evidencia
o que é necessário ser ensinado novamente, ou de outra maneira.
Dentre as pesquisas que envolvem o ensino de línguas estrangeiras e o tratamento dos
erros, as que envolvem a interlíngua, vêm contribuindo bastante para o desenvolvimento dos
estudos que visam a uma prática avaliativa formativa no ensino-aprendizagem de LEs.
Segundo Selinker (1974), a interlíngua se constitui durante a aprendizagem de uma língua
estrangeira ou segunda língua, e pode ser caracterizada com um sistema linguístico que possui
características da língua materna e da língua-alvo. É nela que surgem os erros, os quais
tendem a se fossilizar, construções linguísticas que persistem nas produções do aprendiz, fruto
das tentativas de acerto, mas que não correspondem nem à língua materna, nem à língua
estudada.
97
De acordo com esta perspectiva, os erros são vistos de uma maneira positiva, isto é,
como parte constitutiva do processo de aprendizagem. Eles podem, por exemplo, informar ao
docente qual o percurso de aprendizagem utilizado pelo aluno, quais as técnicas cognitivas
adotadas e hipóteses feitas. Analisando estas informações advindas dos erros da interlíngua, o
professor terá mais ferramentas para redirecionar seu ensino, pois poderá fazer uso de
estratégias que evitem a ocorrência da fossilização de erros. Segundo Paiva (2014, p.161), o
que a teoria de Selinker trouxe de inovador foi o fato de teorizar a ideia de que os avanços na
Aquisição de Segunda Língua (ASL) podem ser evidenciados também pelos erros.
Quando o assunto é avaliação da proficiência linguística, os parâmetros da sociedade
contemporânea exigem que o falante de uma língua estrangeira tenha uma proficiência que
demonstre sua competência ao lidar com diferentes situações de uso da língua. Para
Scaramucci (2000), a proficiência é a capacidade linguística e comunicativa em cada uma das
situações reais de uso da língua que exige uma habilidade de lidar com discurso, contexto,
interpretação, expressão, construção e negociação de sentidos. Já Canagarajah (2006)
considera que, num mundo pós-moderno e globalizado, é linguisticamente proficiente aquele
que tem a habilidade de se engajar em funções sociais e institucionais significativas em
comunidades multilíngues, de acordo com convenções locais.
Levando em consideração o que a sociedade demanda para um falante de língua
estrangeira proficiente, Neves (2006), através de suas investigações, constatou que nós,
professores, somos levados a tentar produzir testes nos quais questões gramaticais, por
exemplo, sejam contextualizadas de modo a fazer sentido para o uso. Precisamos igualmente
nos preocupar em elaborar testes com questões que abranjam as quatro habilidades de ler,
escrever, ouvir e falar e, além disso, como destaca Neves (2006):
[...] temos que considerar que tais questões têm que ter validade (porque
aquele conteúdo foi praticado em sala de aula), confiabilidade(porque pode ser
aplicado e corrigido por outros professores e em outras ocasiões e não trazer
resultados discrepantes), objetividade (as questões não vão ser corrigidas de
acordo com a simpatia que temos pelos alunos) e praticidade (não vão dar
trabalho em excesso para nós, ao corrigir, ou para o aluno, ao fazer a prova)
(NEVES, 2006, p.4).
Ao tentar seguir essa lista de requisitos para a elaboração de provas, Neves (2006)
ressalta que o professor acaba por direcionar a maioria de seus esforços criativos na
preparação de testes, com o objetivo de acompanhar os avanços técnicos nos estudos de
aquisição de línguas, deixando de fazer o mesmo nas práticas em sala de aula. O professor
esquece, por sua vez, de utilizar outros recursos alternativos aos testes que são igualmente
98
validáveis, confiáveis e práticos. Tais recursos, se integrados às práticas de ensino, favorecem
o acompanhamento do desenvolvimento das aprendizagens de seus alunos.
Além do poder disciplinador dos testes em sala de aula e, muita vezes, segregador e
excludente, há também o grande poder econômico deste sistema avaliativo classificatório-
quantitativo. Existe um grande mercado que trabalha para produzir testes, preparar alunos
para fazê-los e para formar aplicadores. No que concerne o mercado dos testes de línguas
estrangeiras, temos os exames de proficiência. Estes sempre refletem os avanços advindos da
evolução nos estudos avaliativos, pois percebemos que seu foco não está sendo apenas em
estruturas gramaticais isoladas, como nos testes tradicionais, mas nestas estruturas aplicadas
em situações de comunicação.
Para que seus aprendizes adquiram a proficiência linguística, o professor deve orientar
seu ensino de maneira a desenvolver a competência comunicativa que, segundo Hymes
(1972), está diretamente relacionada à integração da competência linguística com o
conhecimento de mundo do falante. Na contemporaneidade, a abordagem mais utilizada nos
materiais didáticos e escolas de línguas, a qual busca o desenvolvimento dessa competência, é
a chamada abordagem comunicativa. Este percurso didático-metodológico de ensino e
aprendizagem traz como foco o aluno e a interação entre ele e o professor, com os outros
alunos e com o texto.
Almeida Filho (2013) considera que esta abordagem de ensino concebe a linguagem
como processo de interação, portanto o professor deve ser aquele que organiza as experiências
de aprender em termos de atividades/tarefas de real interesse e/ou necessidade do aluno, para
que este se capacite a utilizar a língua-alvo para realizar ações de verdade na interação com
outros usuários da língua.
Ao adotar uma abordagem comunicativa de ensino, considero que o professor deve,
portanto, assumir uma postura didática que reflita os pressupostos comunicativos. Assim, suas
concepções do que é língua, o que é aprender e o que é ensinar uma LE devem estar de acordo
com a abordagem adotada. O mesmo princípio deve necessariamente nortear suas práticas
avaliativas visto que não há coerência, por exemplo, em trabalhar o desenvolvimento
formativo e processual de habilidades comunicativas durante as aulas e avaliar apenas
estruturas da língua descontextualizadas por meio de testes tradicionais e behavioristas, que
priorizam memorização quantitativa de conhecimento e classificação excludente de alunos, de
acordo com a quantificação dos erros e acertos obtidos.
A esse respeito, Cunha (2006) realizou um estudo em que pôde demonstrar algumas
das causas da incoerência entre práticas de ensino e avaliação que não se pautam nos mesmos
99
princípios didático-metodológicos. Os equívocos constatados pela pesquisadora giram em
torno da avaliação formativa no ensino e aprendizagem de língua materna.
Segundo Cunha (2006), o conceito de avaliação formativa não é entendido em sua
integralidade. Características atribuídas a esse tipo de avaliação, como processual, dialógica,
qualitativa e reguladora, mesmo que amplamente definidas por ocupantes de cadeiras
acadêmicas e divulgadas em documentos que oferecem diretrizes para professores, não
possibilitam a correta utilização de procedimentos e a renovação de práticas avaliativas de
professores.
Para exemplificar esses equívocos, a autora dá o exemplo da preocupação que se deve
ter com o desenvolvimento das competências linguísticas, por se tratar de um processo
demorado. Levando em conta esse processo paulatino e contínuo de construções linguísticas,
o professor acaba por confundir o que é avaliar, pois faz uso “[...] nada menos do que a velha
avaliação somativa fragmentada em uma multiplicidade de momentos, uma avaliação
somativa constante, mascarada pelo uso do qualificativo „contínua‟” (CUNHA, 2006, p.72),
avaliação que é feita, nas aulas de línguas, dando várias produções escritas e orais, trabalhos,
etc. Dessa forma, valoriza-se apenas o processo contínuo e se esquece de avaliar
dialogicamente o produto de cada trabalho, de maneira a possibilitar a regulação de cada
passo da construção das competências linguísticas.
Essa reflexão de Cunha (2006) se assemelha à que Fernandes (2009) faz quando
compara avaliação formativa, que apenas pretende ser “formativa”, mas é de cunho
behaviorista e neobehaviorista, pois predominantemente somativa, com a avaliação formativa
alternativa (AFA) que direciona para o desenvolvimento dialógico das aprendizagens e
associa as práticas avaliativas ao ensino, à aprendizagem e às condições individuais e
contextuais dos aprendizes.
Cunha (2006), na conclusão de seus estudos, considera que
O problema, portanto, não se encontra na qualidade ou natureza dos conceitos,
e sim na „fetichização‟ que estes sofrem quando manipulados sem o
investimento didático-metodológico correspondente. O problema reside
essencialmente em agir como se a sofrida escola brasileira pudesse viver só de
conceitos” (2006, p.74).
Todos esses trabalhos em LA nessa seção apresentados vêm demonstrar a necessidade
de uma formação mais criteriosa de professores de línguas no quesito avaliação. A formação
se faz necessária para empoderá-los, de tal forma que, sabendo regular as aprendizagens
100
linguísticas de seus alunos, o professor possa adequar as práticas de ensino às necessidades de
aprendizagem.
Critica-se a repetição de práticas tradicionais de avaliação porque, em sua maioria,
elas se preocupam apenas em medir o aprendido, acentuando os erros e por fim,
hierarquizando os alunos em níveis de notas e ou fazendo terror com os resultados para ter o
domínio disciplinar do comportamento dos alunos.
Além disso, com a exposição dos trabalhos neste item apresentados, é possível notar
que as pesquisas em LA problematizam fortemente a avaliação no ensino e aprendizagem de
línguas, igualmente a avaliação da competência linguística através de testes, contudo,
encontrei apenas a pesquisa de Felice (2011) que problematizasse as práticas avaliativas de
formadores de professores, pois como citado acima, durante seu trabalho com professores em
formação, se preocupou com o ensinar a avaliar. Deste modo, pode-se notar a relevância deste
trabalho, porquanto acredito que se faz necessário também investigar e problematizar em que
se pautam as práticas avaliativas dos professores formadores e quais direcionamentos são
dados para os professores alvo da formação.
Como já foi discutido, a adoção de práticas formativas de avaliação exige um trabalho
teórico-crítico-reflexivo que pode e deve ter lugar na formação de professores, ambiente no
qual poderá ter início a desfossilização de práticas avaliativas classificatórias, excludentes,
desmotivadoras, acumuladas pelos professores em formação durante seus percursos escolares.
Portanto, almejamos, além de fazer emergir problematizações, encontrar sugestões que
facilitem o trabalho dos professores formadores e propiciem a reflexão crítica sobre o ato de
avaliar, que deverá levar em conta os variados avanços perpetrados nos aspectos teóricos,
epistemológicos e didático-metodológicos na área da avaliação e sua relação com ensino e
aprendizagem de línguas, seja em LA, educação ou outras áreas às quais a LA permite
transgredir (PENNYCOK, 2013) as barreiras disciplinares para solucionar suas questões.
Áreas como a teoria da complexidade, por exemplo, campo de estudos o qual me permiti
transgredir fronteiras para embasar as minhas reflexões a respeito da formação de professores.
Após ter apresentado, neste capítulo, um histórico da avaliação educacional, os
estudos contemporâneos em avaliação educacional e algumas contribuições da LA para a
área, na seção que segue, apresento a metodologia utilizada para a análise dos dados
coletados. Trata-se, pois, de um estudo de caso com base em André (2005) e Stake (1995),
organizado com o objetivo de responder às perguntas de pesquisa propostas, cujo aparato
teórico já foi discutido, problematizado e exposto, neste e no capítulo precedente.
101
CAPÍTULO 3 – TECENDO UMA METODOLOGIA
No presente capítulo, apresento a metodologia mobilizada para a coleta e análise dos
dados. Primeiramente, discorro sobre o que vem a ser o procedimento metodológico
escolhido, o estudo de caso. Por conseguinte, apresento o contexto de coleta de dados, como
também os participantes escolhidos. Em sequência, apresento as ferramentas escolhidas para a
coleta dos dados. Finalizo este capítulo discorrendo sobre os procedimentos eleitos para a
análise.
3.1 O estudo de caso
Para alcançar os objetivos de pesquisa aqui propostos, adotei as técnicas e métodos do
estudo de caso do tipo etnográfico. Este enfoque de pesquisa de cunho interpretativista foi
escolhido porque, de acordo com André (2008), se insere na abordagem qualitativa de
pesquisa que concebe o fenômeno social, suas raízes históricas e culturais, e as relações deste
com a macrorrealidade que o circunda.
Além disso, segundo Triviños (1987), pela coleta de dados pautados em um
embasamento teórico, a pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como fonte direta destes
dados e o pesquisador como instrumento-chave, é descritiva e preocupa-se com o processo e
não simplesmente com os resultados e o produto.
Assim sendo, acredito que essas características da pesquisa qualitativa permitem
vislumbrar a complexidade que emerge no processo de formação de professores, fenômeno a
ser analisado nesta pesquisa. Trata-se de uma metodologia de investigação que, segundo
Bortoni-Ricardo(2008), se insere no paradigma interpretativista tendo em conta que não
privilegia explicações causais por meio de relações lineares, o que é previsto no paradigma
positivista, mas que, por outro lado, visa a interpretar e compreender acontecimentos sociais
inseridos em seus ambientes contextuais.
A escolha do estudo de caso como abordagem metodológica desta pesquisa se justifica
também porque apresento, como macro objetivo, descrever e problematizar como se processa
a formação de professores de línguas do curso de Letras de uma universidade do interior do
Brasil. Considerando que, de acordo com André (2005), no estudo de caso investiga-se com
“profundidade um fenômeno educacional, com ênfase na sua singularidade e levando em
102
conta os princípios e métodos da etnografia” (ANDRÉ, 2005, p.19), me detenho
especificamente no fenômeno educacional da avaliação da aprendizagem.
Esta maneira de pesquisar, apesar de se originar de um paradigma de pesquisa
interpretativista, é caracterizada de maneiras diversas. Para esta pesquisa, me pautei nos
estudos de Stake (1995) que, ao caracterizar o estudo de caso, o distingue em três tipos: o
estudo de caso intrínseco, o estudo de caso instrumental e o estudo de caso coletivo.
Cada tipo atende a interesses particulares da mesma maneira que mobiliza orientações
metodológicas diferenciadas. O estudo de caso intrínseco se dá quando o pesquisador foca
seu interesse em um determinado caso. Pode chamar a atenção para investigação, por
exemplo, um aspecto da sala de aula, uma prática pedagógica, como também um
comportamento de seus alunos. Para isso, faz uso de documentos, como planos de aula,
produções de alunos, entrevistas, narrativas do professor, observação participante, dentre
outros documentos.
O segundo tipo, o estudo de caso instrumental, se dá quando o pesquisador tem o
objetivo de elucidar algum aspecto de casos particulares. Por exemplo, quando há o interesse
de averiguar a aplicação e apropriação de determinada teoria em uma escola. Nesse enfoque,
poderão ser mobilizadas entrevistas com professores, observações do ambiente escolar,
observação de aulas, análise de documentos escolares e oficiais.
O estudo de caso coletivo é o que demanda mais tempo para ser efetivado, pois
abrange vários casos que podem ser instrumentais ou intrínsecos. Visa, sobretudo,
compreender como determinado aspecto é aplicado, abordado em contextos particulares, para
poder tirar conclusões, vislumbrando posteriormente os fenômenos em escala mais ampliada.
As escolhas metodológicas feitas para a presente pesquisa se adequam ao segundo tipo
proposto por Stake (1995), o estudo de caso instrumental, pois tenho como enfoque analisar a
formação de professor para as práticas avaliativas, em um curso de licenciatura em Letras.
Com esse intuito, utilizo as ferramentas metodológicas que esse tipo de pesquisa solicita para
suas investigações, as quais que passo a descrever nos itens que seguem.
3.2 Contexto de pesquisa
As minhas interferências durante o processo de pesquisa foram realizadas nas
dependências do curso de Letras de uma universidade do interior do Brasil. O curso possui
cinco licenciaturas: licenciatura plena em língua francesa, licenciatura plena em língua
103
espanhola, licenciatura plena em língua inglesa, licenciatura plena em língua portuguesa e
licenciatura plena em língua portuguesa com domínio em libras. Tem uma história vasta de
mudanças, tendo em conta que funciona desde 1960, quando iniciou o curso de Neolatinas e
Anglo-Germânicas. Nessa longa trajetória, várias modificações e adequações foram feitas em
seu Projeto Político-Pedagógico, como a transformação de licenciaturas que antes eram
duplas e passaram a funcionar em regime único de formação.
No instituto onde funcionam os cursos de licenciatura, foi criado, em 2010, o curso de
bacharelado em Tradução, igualmente em suas dependências, funcionam três cursos de pós-
graduação – a Pós-graduação em Estudos Linguísticos (criada em 1994), a Pós-graduação em
Letras, ênfase em estudos literários (criada em 2005) e o Mestrado Profissional em Letras
(criado em 2013). O corpo docente do instituto é constituído de 81 docentes efetivos e
substitutos (doutores, mestres e especialistas).
A estrutura física do instituto oferece amplas ferramentas para o desenvolvimento das
atividades docentes e discentes, dentre as quais, apresento algumas:
- nove Laboratórios Pedagógicos de Línguas ambientados com computadores com acesso à
internet, tvs, dvds, amplificadores de som e projetor de imagens.
- um Laboratório Pedagógico de Prática de Ensino, sala destinada às atividades de Prática de
Ensino que possui computadores, impressora, acesso à internet, TV, DVD, gravador de som e
um pequeno acervo bibliográfico para subsidiar as práticas pedagógicas dos professores em
processo de formação.
- um Laboratório de Línguas, ambiente no qual os alunos tem à disposição 36 cabines de
estudo individual e coletivo, com acesso a um acervo de filmes e documentários, músicas e
exercícios de fonética.
- um Laboratório de Multimídia de Projetos – destinado a alunos da graduação e da Pós-
graduação envolvidos em projetos de ensino, pesquisa e extensão, no qual tem acesso a
computadores, Internet, câmeras fotográficas, filmadoras digitais, scanners, impressora, além
de poderem fazer um usuário na rede para gravar seus arquivos e documentos.
- Coordenação de Extensão e Educação Continuada em Letras, um centro de estudo de apoio
a projetos de extensão que possui amplo acervo bibliográfico, equipamento de som, vídeo e
áudio, e computadores para pesquisa acadêmica.
- um Laboratório de informática – destinado aos alunos, dos cursos do instituto, que fazem
pesquisas e trabalhos que necessitam de softwares específicos.
104
- Laboratórios de Informática – ambientes da universidade que podem também ser utilizados
pelos professores em formação das licenciaturas em Letras que são compartilhados com
alunos de outros cursos.
- Um polo do Idiomas sem fronteiras11
que oferece cursos de inglês a todos estudantes,
professores e técnicos da universidade.
Vinculado ao instituto, há uma escola de línguas que oferece cursos de alemão,
espanhol, francês e inglês, e que é ambiente para ensino, pesquisa e extensão, como também
lugar onde acontecem os estágios de observação e prática de ensino. Além disso, desde 1994
há oferta de vagas para a participação no PET (Programa de Ensino Tutorial) que seleciona
alunos para, desde os primeiros períodos da Licenciatura, se engajarem em projetos de
pesquisa, ensino e extensão, promovendo mini-cursos, palestras e eventos, como a semana de
Letras.
3.3 Participantes da pesquisa
Os membros da comunidade escolhida como contexto de pesquisa foram três
professores do curso de Letras. No período da coleta dos dados, estes professores estavam
responsáveis pela oferta das disciplinas da área de formação pedagógica do curso, cujo
currículo está organizado em núcleos:
I. Núcleo de Formação Específica (Disciplinas obrigatórias e optativas),
II. Núcleo de Formação Pedagógica (Disciplinas Pedagógicas obrigatórias,
Práticas Específicas e Estágio Supervisionado),
III. Núcleo de Formação Acadêmico-Científico-Cultural(Atividades
Acadêmicas Complementares) (PPP, 2007, p.69).12
Um dos docentes formadores, a qual nomearei Rosa, é professora substituta da
universidade, exerce suas funções ministrando as disciplinas do Núcleo de Formação
Pedagógica para a Licenciatura em Língua Portuguesa, que são as metodologias de ensino de
português língua materna e português em diferentes contextos, como também os estágios
supervisionados de português língua materna e português em diferentes contextos.
Rosa possui especialização em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, e mestrado
em linguística, além de já estar trabalhando na área de Língua Portuguesa no Ensino Superior
há dez anos. Na época em que colhi os dados, ela estava em seu primeiro ano de doutorado.
11
Idiomas sem fronteiras - programa criado pelo MEC, em 2014, para o ensino de línguas estrangeiras nas universidades públicas. 12
Aa referências ao documento foram omitidas para a não identificação da instituição.
105
O outro docente, cujo nome fictício escolhido é Luana, é professora do quadro efetivo
do instituto. Exerce sua função como professor adjunto, ministra principalmente as disciplinas
do Núcleo de Formação Pedagógica do curso de Letras, licenciatura em Língua Inglesa, a
saber, metodologia de língua estrangeira, metodologia de inglês para objetivos específicos,
estágio supervisionado de inglês língua estrangeira e estágio supervisionado de inglês para
objetivos específicos.
Luana possui licenciatura em Letras, mestrado e doutorado em Linguística Aplicada e
está vinculada ao instituto enquanto professora efetiva há vários anos. Lecionou também
língua inglesa, antes de ocupar o cargo no ensino superior, em escolas regulares e em curso de
línguas durante, aproximadamente, cinco anos.
O terceiro docente que foi entrevistado, cujo nome fictício escolhido é Nair, é
professor do quadro efetivo da instituição. Está a cargo, principalmente, das disciplinas do
Núcleo de Formação Pedagógica da Licenciatura em Língua Francesa, tendo segundo ela,
trabalhado com as disciplinas metodologia de língua estrangeira, metodologia de francês para
objetivos específicos, estágio supervisionado de francês, língua estrangeira, e estágio
supervisionado de francês para objetivos específicos, além de ministrar também as disciplinas
de metodologia e estágio supervisionado de português língua estrangeira (PLE).
Nair possui licenciatura em Letras e mestrado em Letras, é professora formadora do
curso há mais de quatro anos e tem uma vasta experiência enquanto professora de língua
francesa.
A escolha dessas professoras para a coleta de dados, que foi feita por meio de
entrevista-semiestruturada, se justifica pelo fato de elas serem responsáveis em ministrar as
disciplinas do Núcleo de Formação Pedagógica. Levei em conta, igualmente, o fato de ser
nessas disciplinas o momento em que o professor formador tem mais abertura para trabalhar o
ensinar a avaliar, como demonstram alguns dos objetivos estabelecidos nos Planos de Ensino
das disciplinas abaixo transcritos:
-Metodologia de Ensino de Línguas Estrangeiras:
-Capacitar o aluno para fazer uso de várias metodologias e abordagens de
ensino de língua nos diversos contextos educacionais, tanto no que concerne
ao ensino das quatro habilidades quanto para fins específicos.
- Instrumentalizar o aluno para a elaboração de planos de aula, confecção de
materiais didáticos e uso de recursos de ensino de língua.
- Desenvolver / elaborar atividades de ensino, considerando sua adequação a
diversas variáveis da situação de ensino (metas e objetivos, nível, conteúdo,
concepções sobre língua, gramática, tipo de ensino, etc.) (PPP, 2007, p.87).
106
- Metodologia de Ensino de Língua Portuguesa:
- Promover uma avaliação, através de reflexões teóricas, sobre a educação, o
educando e os educadores no contexto metodológico institucional.
- Perceber como se constroem os métodos e técnicas de ensino através de
opções em diferentes campos.
- Desenvolver / elaborar atividades de ensino, considerando sua adequação a
diversas variáveis da situação de ensino (metas e objetivos, nível, conteúdo,
concepções sobre língua, gramática, tipo de ensino, etc.).
- Analisar e criticar atividades propostas por livros didáticos e outras fontes
(PPP, 2007, p.81)
3.4 Instrumentos e procedimentos de geração de dados
Para a coleta de dados, mobilizei os seguintes instrumentos: - três entrevistas
semiestruturadas, o Projeto Político-Pedagógico do curso de Letras alvo deste estudo de caso
e Planos de Ensino dos professores entrevistados. A escolha desses instrumentos se justifica
porque como aponta André (2008, p.28):
As entrevistas têm a finalidade de aprofundar as questões e esclarecer os
problemas observados. Os documentos são usados no sentido de
contextualizar o fenômeno, explicar suas vinculações mais profundas e
completar as informações coletadas através de outras fontes.
Para responder à primeira pergunta que guia esta pesquisa, a saber:
- O que prescreve o Projeto Político-Pedagógico do curso de Letras da instituição escolhida
para este estudo de caso, no que tange à Avaliação da Aprendizagem?; analiso o PPP da
instituição.
O PPP é um documento que se caracteriza por ser um registro oficial que deve guiar as
escolhas pedagógicas, políticas e metodológicas, de forma a acompanhar os avanços
perpetrados nas investigações educacionais, seguir as orientações legais, bem como guiar
práticas que se adaptem às necessidades subjetivas e contextuais de cada instituição. De
acordo com VEIGA (2010):
[O] Projeto Político-Pedagógico vai além do simples agrupamento de planos
de ensino e de atividades diversas. O projeto não é algo que é construído e em
seguida arquivado ou encaminhado às autoridades educacionais como prova
do cumprimento das tarefas. Ele é construído e vivenciado em todos os
momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo da escola
(VEIGA, 2010, p.12-13).
Assim sendo, o referido documento é campo rico de informações no qual busco identificar as
concepções de avaliação que permeiam as escolhas político-pedagógicas feitas pelo o corpo
107
docente da instituição. O acesso a este documento da instituição foi tido sem dificuldades,
pois ele se encontra no site do curso, sítio que é atualizado periodicamente.
A entrevista semiestruturada (anexo 1) foi elaborada com o objetivo responder à
segunda pergunta proposta por essa pesquisa:
- Como os professores formadores veem a avaliação da aprendizagem na formação de
professores de línguas?
Para isso, propus questionamentos básicos, que permitiram a abertura para outras
interrogativas, fruto de novas reflexões surgidas no percurso das perguntas-respostas. Dessa
maneira, as entrevistadas puderam se sentir mais livres em suas respostas, tendo elas
colaborado espontaneamente nas respostas aos questionamentos. Além disso, é importante
mencionar que depois de analisadas, as gravações foram descartadas.
Além das respostas às entrevistas, tenho também como fonte de dados para responder
á essa pergunta, os Planos de Ensino elaborados pelos professores entrevistados que me foram
disponibilizado pela coordenação do curso de Letras. A escolha desta fonte de dados se
justifica, pois neste documento, os professores formadores estabelecem quais direcionamentos
avaliativos irão adotar para a disciplina ministrada.
Este percurso de coleta de dados foi assim delimitado porque possibilitará a
triangulação dos dados obtidos. Segundo Bortoni-Ricardo (2008), a triangulação acontece
apenas quando as informações coletadas foram originadas de diferentes tipos de instrumentos,
tendo o objetivo de comparar os dados obtidos para identificar as concordâncias e
discrepâncias oriundas do cruzamento dos mesmos, dando, desta maneira, mais recursos para
a validação da pesquisa.
3.5 Procedimentos de interpretação de dados
Ao seguir este percurso metodológico de pesquisa pretendo, sobretudo, descrever e
problematizar como se processa a formação de professores de línguas. Por isso, ao analisar os
dados coletados, procuro perquirir quais concepções de avaliação os professores formadores
adotam como avaliadores da aprendizagem e como formadores de futuros avaliadores. Assim
sendo, considero que mesmo não abordando o tópico avaliação em suas aulas, a maneira
como o professor formador avalia, influenciará nas escolhas avaliativas dos futuros
professores.
108
Objetivando uma melhor visualização dos procedimentos de análise de dados,
apresento o quadro abaixo, no qual esquematizo as perguntas de pesquisa, os dados
mobilizados para respondê-las, e a base teórica de onde parto para a discussão e
problematização.
Quadro 3: Resumo das perguntas, fontes de dados e métodos, justificativa e base teórica da
pesquisa.
Perguntas de
Pesquisa
Fonte de Dados Justificativa Base teórica
1- O que prescreve o
Projeto Político-
Pedagógico do curso de
Letras da instituição
escolhida para este
estudo de caso, no que
tange à avaliação da
aprendizagem?
-Projeto Político-
Pedagógico do curso de
Letras da instituição
escolhida.
- Categorias
(BARDIN,1977):
- Concepções de
avaliação da aprendizagem;
- Direcionamentos para a formação do professor
para a avaliação da
aprendizagem.
-Os excertos do Projeto
Político-Pedagógico do
curso poderão
demonstrar a concepção
de avaliação que orienta
as práticas avaliativas da
instituição escolhida
como contexto de
pesquisa.
- Os excertos
possibilitarão visualizar
se o PPP preconiza a
formação de professores
para a avaliação da
aprendizagem.
-Avaliação:
Cunha(2006),
Fernandes(2009),
Felice(2011), Galeffi
(2009) , Hadji (2008),
Luckesi(2010; 2011),
Nunes (2004), dentre
outros.
2- Como os professores
formadores veem a
avaliação da
aprendizagem na
formação de professores
de línguas?
-Entrevistas
semiestruturadas
realizadas com
professores do Núcleo
de Formação
Pedagógica.
- Planos de Ensino dos
professores
entrevistados.
- Categorias
(BARDIN,1977):
- Como o professor
formador realiza a formação para a
avaliação da aprendizagem;
- Como o professor
formador avalia.
- As respostas
fornecidas pelos
professores na entrevista
semiestruturada poderão
mostrar as concepções
de avaliação dos
professores formadores
e como os percebem
e/ou trabalham a
formação de professores
para a avaliação da
aprendizagem
- Os Planos de Ensino
poderão demonstrar
como os professores
formadores avaliam
e/ou concebem a
avalição da
aprendizagem.
-Avaliação:
Cunha(2006),
Fernandes(2009),
Felice(2011), Galeffi
(2009), Hadji (2008),
Luckesi(2010; 2011),
Nunes (2004), dentre
outros.
109
3- As propostas e
práticas avaliativas
analisadas
correspondem ao que a
complexidade, a
transdisciplinaridade e
os estudos em
avaliação sugerem para
as práticas
educacionais da
contemporaneidade?
- Análise das respostas
às duas primeiras
perguntas.
- As respostas às duas
perguntas, analisadas à
luz da complexidade,
poderão demonstrar se
as práticas e propostas
analisadas se enquadram
à complexidade inerente
aos processos de ensino
e aprendizagem de
línguas, bem como aos
processos de auto-
hetereecoformação.
- Operadores da
Complexidade:
(MORIN, 2002b,
2005a, 2005b, 2005c;
MORIN, CIURANA E
MOTTA, 2003);
MORAES, 2007b),
dentre outros.
- Transdisciplinaridade
(NICOLESCU, 2002),
dentre outros.
- Auto-heteroecoformação:
Freire(2009); Freire e
Leffa(2013) e
Moraes(2007a; 2010a;
2010b)
Fonte: elaboração da autora.
Para responder à primeira pergunta: O que prescreve o Projeto Político-Pedagógico do
curso de Letras da instituição escolhida para este estudo de caso, no que tange à Avaliação da
Aprendizagem?; disponho de excertos contidos no Projeto Político-Pedagógico do curso de
Letras escolhido como contexto para o estudo de caso.
Com o objetivo de organizar as análises e responder à primeira pergunta, fiz a divisão
dos excertos em duas categorias temáticas, tendo como amparo a Análise de Conteúdo de
Bardin (1977) que, ao discorrer sobre o assunto, argumenta que a “categorização é uma
operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por diferenciação e,
seguidamente, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com os critérios previamente
definidos” (BARDIN, 1977, p. 117).
Desta maneira, na primeira categoria, concepções de avaliação da aprendizagem,
analiso as concepções de avaliação da aprendizagem apresentadas no Projeto Político-
pedagógico. Na segunda categoria, direcionamentos para a formação do professor para a
avaliação da aprendizagem, analiso excertos do PPP que discorrem sobre formação do
professor para a avaliação da aprendizagem.
Para responder à segunda pergunta: Como os professores formadores veem a avaliação
da aprendizagem na formação de professores de línguas?; tenho, como fonte de dados,
excertos das entrevistas realizadas com os três professores formadores e seus Planos de
Ensino. Fiz também a divisão de categorias para a análise dos dados pois, como defende
Bardin (1977), esta maneira de trabalhar com os dados é um facilitador para a análise pois
“consiste em classificar os diferentes elementos nas diversas gavetas segundo critérios
110
susceptíveis de fazer surgir um sentido capaz de introduzir uma certa ordem na confusão
inicial” (BARDIN, 1977, p. 37).
Assim sendo, as categorias foram divididas nos seguintes temas: como o professor
formador realiza a formação para a avaliação da aprendizagem e como o professor
formador avalia.
O aparato teórico mobilizado para analisar os dados referentes às duas primeiras
perguntas são, principalmente, o que discorre sobre avaliação, Cunha (2006), Fernandes
(2009), Felice (2011), Galeffi (2009), Hadji (2008), Luckesi (2010), Nunes (2004), dentre
outros.
Para responder à terceira pergunta, a saber: As propostas e práticas avaliativas
analisadas correspondem ao que a complexidade, a transdisciplinaridade e os estudos em
avaliação sugerem para as práticas educacionais da contemporaneidade?; retomo as respostas
dadas às duas primeiras perguntas, e as analiso à luz dos aparatos teórico-metodológicos do
pensamento complexo, que demandam Reformas no conhecimento e no ensino, com o intuito
de possibilitar a emergência e a visualização da complexidade inerente às interações entre
sujeitos, objetos e contextos. Além disso, trago também as contribuições da
transdisciplinaridade e dos estudos em educação e LA à luz da complexidade que defendem a
necessidade de uma auto-heteroecoformação de professores, Freire (2009); Freire e Leffa
(2013) e Moraes (2007a; 2010a; 2010b).
Portanto, pela identificação de concepções e representações encontradas referentes ao
objeto de pesquisa, qual seja, a formação de professores para a avaliação da aprendizagem,
almejo, à luz da complexidade e da transdisciplinaridade (MORIN, 2002b; 2005a, 2005b;
2005c; MORIN, CIURANA E MOTTA, 2003; MORAES, 2007b; NICOLESCU, 2001;
dentre outros), compreender os porquês de suas escolhas pedagógicas, teóricas e práticas,
relacionando-as com os estudos e teorias avaliativas já concebidas e também com o que o
paradigma da complexidade sugere para as práticas educacionais que necessitam ser pensadas
de maneira complexa.
Por fim, teço considerações com o intuito de contribuir para a prática social e
profissional destes participantes, como também para a formação de professores em geral, de
maneira a incentivar problematizações e reflexões que possibilitem meios de enxergar e lidar
com a complexidade que emerge nessa era que se caracteriza por conexões complexas e
planetárias.
111
CAPÍTULO 4 – RELIGANDO TEORIAS, METODOLOGIA E DADOS
Neste capítulo, analiso os dados de forma a responder às perguntas que norteiam esta
pesquisa. Faz-se necessário deixar claro que apesar de ter três instrumentos para a análise de
dados de forma a permitir a triangulação e a consequente validação (BORTONI-RICARDO,
2008), não pretendo estabelecer verdades sobre os sujeitos analisados, bem como suas
práticas, pois como nos revela Morin (2002b), em qualquer contexto de produção de
conhecimento há sempre o risco do erro e da ilusão. O meu objetivo foi o de fazer
interpretações e problematizações que incitem mais reflexões para o desenvolvimento do
campo da formação para a avaliação da aprendizagem no ensino de línguas, como também
contribuir para a efetivação da Reforma do ensino (MORIN, 2002b; 2005a; 2014).
4.1 O que prescreve o Projeto Político-Pedagógico do curso de Letras da instituição
escolhida para este estudo de caso, no que tange à avaliação da aprendizagem?
A escolha do Projeto Político-Pedagógico como fonte de dados foi necessária, pois se
trata de um documento que visa orientar as decisões político-pedagógicas de uma instituição
escolar. Assim sendo, pressupõe-se que nele também devam estar explícitos direcionamentos
para as práticas avaliativas dos docentes.
De acordo com Veiga (2010):
O projeto busca um rumo, uma direção. É uma ação intencional, com um
sentido explícito, com um compromisso definido coletivamente. Por isso, todo
projeto pedagógico da escola é, também, um projeto político por estar
intimamente articulado ao compromisso sociopolítico com os interesses reais e
coletivos da população majoritária. É político no sentido de compromisso com
a formação do cidadão para um tipo de sociedade (VEIGA, 2010, p.13).
Dentro do escopo da complexidade há uma demanda por um método, um caminho que
seja “[...] simultaneamente programa e estratégia e, por retroação de seus resultados, pode
modificar o programa;” (MORIN, CIURANA E MOTTA, 2003, p.28). Isto posto, enxergo
essa premissa na proposta do PPP, enquanto documento que elabora estratégias, estando
sempre aberto à modificações de acordo com as necessidades e propósitos da comunidade
escolar.
112
Ainda segundo Veiga (2010), as intenções dos membros da comunidade escolar irão
direcionar a definição e planificação de ações a serem sugeridas no PPP:
Na dimensão pedagógica reside a possibilidade da efetivação da
intencionalidade da escola, que é a formação do cidadão participativo,
responsável, compromissado, crítico e criativo. Pedagógico, no sentido de
definir as ações educativas e as características necessárias às escolas de
cumprirem seus propósitos e sua intencionalidade. (VEIGA, 2010, p.13)
O Projeto-Político-Pedagógico do curso de Letras da instituição escolhida data de
2007, contudo, consta no texto do referido documento que as reflexões e os estudos para sua
elaboração foram iniciados no ano de 2002 para atender às exigência do Conselho Nacional
de Educação. Professores, técnicos e estudantes do curso de Letras, além de professores de
outros cursos da instituição, foram nomeados para compor a comissão responsável pela
elaboração do projeto. Também foram convidados coordenadores de cursos de Letras de
outras instituições que participaram de reuniões a fim de contribuírem para com a tessitura do
projeto.
O documento assegura que sua elaboração foi regida pela legislação específica,
preservando, contudo, a história e particularidades que caracterizam o percurso da
consolidação do curso. Assim sendo, a proposta tem como objetivo principal:
[...] traçar os parâmetros que nortearão a elaboração de projetos
específicos para o Curso de Licenciatura em Letras, de maneira a
que este possa oferecer uma formação que desenvolva em todo
professor egresso desta universidade, características de sujeito
reflexivo, questionador e aberto às inovações, bem como uma sólida
formação científicopedagógica nesta área específica, aliada a uma
consistente formação humana e cultural (PPP, 2007, p.8).13
Dentre outras informações, o PPP apresenta dados de identificação da instituição,
trajetória do curso, infra-estrutura histórica do curso (exponho essas informações atualizadas
quando apresento o contexto de pesquisa), princípios e fundamentos da concepção teórico-
metodológica, perfil do egresso, objetivos, proposta pedagógica, atividades complementares,
concepção da estrutura curricular, fichas de disciplina, além de um capítulo intitulado
“Diretrizes Gerais para os Processos de Avaliação”.
Como foi mencionado anteriormente, a concepção que se tem de ensino e de língua
(PANIAGO, 2006; GERALDI, 1984; TRAVAGLIA, 1996), é um dos direcionadores das
escolhas avaliativas. Nesse sentido, acredito ser importante apresentar a que tipo de ensino o
13
Por motivos de identificação, não foi colocado nas referências, a referência do Projeto Político Pedagógico analisado.
113
projeto propõe. Partindo duma visão heurística do tratamento formativo do conhecimento, o
documento traz a compreensão de que:
[...] o desenvolvimento metodológico do ensino precisa ser fundado em um
caráter dialógico no qual as inter-relações linguagem/mundo,
linguagem/conhecimento e linguagem/sociedade traduzam conflitos de
ordem diversos, considerando a possibilidade de exposição a diferentes
enfoques teóricos, no que tange à pluralidade epistemológica em torno dos
conhecimentos subjacentes às áreas de formação universitária (PPP, 2007,
p.31).
Ainda sobre o ensino, achei relevante fazer uma busca no documento pelos termos
multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, com o objetivo de
averiguar a recorrência na utilização dos termos, bem como a compreensão que se tem deles e
a consequente concepção de conhecimento adotada.
O termo multidisciplinaridade aparece apenas uma vez na expressão Colóquios
Multidisciplinares (2007, p.22). São eventos realizados pelos discentes integrantes do
Programa de Ensino Tutorial (PET). Não há, contudo, nenhuma outra especificação sobre
como são realizados os colóquios e com qual objetivo.
O termo interdisciplinaridade aparece em seis ocorrências. A primeira, no capítulo dos
princípios que regem o curso de Letras, em uma referência aos temas de pesquisa da LA
(PPP, 2007, p.28). A segunda, em uma citação das Diretrizes Curriculares Nacionais, em seu
artigo 14, parágrafo primeiro, que versa sobre a necessidade de flexibilidade dos cursos de
Letras, flexibilidade essa que deve se amparar na interdisciplinaridade (PPP, 2007, p.33). A
terceira recorrência do termo está em uma das competências e habilidades do graduado em
Letras: “domínio dos conteúdos a serem socializados, aos seus significados em diferentes
contextos e sua articulação interdisciplinar; (PPP, 2007, p.35). A quarta recorrência é
empregada para explicitar uma das características de como se entende a aula presencial, que,
de acordo com o documento, deve proporcionar a contextualização de conteúdos também em
uma dimensão interdisciplinar (PPP, 2007, p.63). A quinta recorrência explicita um dos
objetivos de um programa de pesquisa que oferece bolsas aos graduandos, o Programa
Institucional de Bolsas de Ensino de Graduação (PIBEG): “estimular a interdisciplinaridade”
(PPP, 2007, p.66). A última e sexta recorrência é utilizada para caracterizar o Projeto
Integrado de Práticas Educativas (PIPE), práticas estas que acontecem do primeiro ao sexto
semestre do curso, cujo objetivo é o de reunir atividades práticas relacionadas à formação do
profissional da educação de maneira a prepará-lo para os estágios supervisionados que se
iniciam no sexto semestre (PPP, 2007, p.76).
114
O termo transdisciplinaridade aparece apenas em uma ocorrência, quando se discute as
contribuições da LA para o ensino de línguas e formação de professores, pois há um grande
número de pesquisas que demonstram ser a LA “[...] área com potencial para percursos
transdisciplinares em pesquisa” (PPP, 2007, p.27).
Tal análise de recorrências dos termos multidisciplinaridade, interdisciplinaridade e
transdisciplinaridade no PPP, pode indicar que há esforços para a desvinculação de um ensino
que se paute apenas na disciplinarização do conhecimento. O desenvolvimento da
interdisciplinaridade retratada nas seis aparições se mostrou como um dos objetivos de ensino
do PPP.
Apesar disso, ainda a transdisciplinaridade está distante da proposta do PPP, na sua
única referência, é citada em relação à LA que se estabeleceu enquanto uma área de pesquisa
transdisciplinar. Entendo, desta forma, que a transdisciplinaridade ainda não é, neste PPP,
objeto de prática e ensino, apenas uma característica de uma ciência que é estudada na
instituição. Contudo, um graduando, ao fazer uma pesquisa em Linguística Aplicada, terá
ciência dessa maneira de tratar o conhecimento, poderá fazer pesquisas transdisciplinares, mas
não encontrará no curso o dízimo epistemológico transdisciplinar recomendado por Morin
(2005) para o desenvolvimento do pensamento complexo.
Por estar focando igualmente em reflexões em torno da formação de professores, qual
seja a auto-heteroecoformação, atinei ser necessário destacar também o que a instituição
compreende por formação. Há uma preocupação de formar e não apenas informar. Formar
professores críticos e reflexivos, agentes de cidadania, “professores de línguas e literaturas
que se constituam, em primeira instância, como leitores constituídos da sociedade em que
atuam, compreendendo a leitura como a constituição do indivíduo em seu universo cultural,
político, histórico e linguístico” (2007, p.30).
A base da proposta pedagógica do curso de Letras da instituição é a formação de
professores da Educação Básica em consonância com as necessidades educacionais do país. É
priorizado, em vários excertos, o desenvolvimento da autonomia do graduando em seu
percurso de formação, por isso aponta “A pesquisa como fundamento da reflexão-ação e da
construção da autonomia intelectual” (PPP, 2007, p.42) e “A extensão como espaço
articulador das práticas e do profissional reflexivo” (PPP, 2007, p.43).
Guiado por essa perspectiva de formação, o projeto apresenta também como está
organizado o currículo. Há três núcleos de formação, um núcleo de formação específica com
disciplinas obrigatórias e optativas, um núcleo de formação pedagógica com disciplinas
pedagógicas obrigatórias, práticas específicas e estágio supervisionado, e um núcleo de
115
formação acadêmico-cultural para o desenvolvimento de atividades acadêmicas
complementares.
Tendo discutido sobre a função do PPP, contextualizado o Projeto a ser analisado, bem
como apresentado o que nele se entende por ensino e formação, passo, na seção que segue, a
responder à pergunta de pesquisa O que prescreve o PPP do curso de Letras da instituição
escolhida para este estudo de caso, no que tange à avaliação da aprendizagem?, nas
categorias já especificadas: concepções de avaliação da aprendizagem; e direcionamentos
para a formação do professor para a avaliação da aprendizagem.
4.1.1 Concepções de avaliação da aprendizagem:
Para apresentar e discutir as concepções de avaliação de aprendizagem presentes no
PPP, recorro a excertos contidos no capítulo de 15 páginas nomeado Diretrizes Gerais para
os Processos de Avaliação. A concepção de avaliação defendida é a avaliação formativa, que
é apresentada com o respaldo de autores como Masetto(2003), Álvarez Méndez (2002),
Medeiros(1977), Vianna (1978), Romero (2000), Liberali e Zingier (2000), Hadji (2002),
Perrenoud (1999), dentre outros. Já no início do referido capítulo, identifiquei o seguinte
excerto que pode demonstrar a concepção de avaliação adotada pelo PPP: “o ato de avaliar
será um processo contínuo e permanente com função diagnóstica, processual e classificatória
e será feita de maneira a possibilitar a constante reflexão sobre o processo formativo do
aluno” (PPP, 2007, p.45).
Em um PPP com 92 páginas ao todo, reservar um capítulo de 15 páginas para discutir
e sugerir práticas avaliativas para o curso de Letras demonstra a preocupação que se tem para
atualizar e refletir sobre as práticas avaliativas. Práticas essas que, em sua maioria,
confirmaram estar em consonância com os estudos da quarta geração, a que concebe a
avaliação como negociação e construção (FERNANDES, 2009). Assim sendo, em sequência,
passo a analisar os excertos que indicam estar o documento a favor da avaliação de cunho
formativo.
Neste excerto, abaixo citado, vai-se contra a avaliação somativa cujos fins são apenas
classificatórios:
A construção de conhecimentos não é possível de ser verificada a partir de
instrumentos de medida, mas apreciados a partir de construções textuais
respaldadas teoricamente, bem argumentadas, analisadas e pontuadas. Desta
forma, a prova deixa de ser entendida como principal instrumento avaliativo,
116
devendo os planos de avaliação contemplar diferentes instrumentos que
possibilitem um processo avaliativo mais completo (PPP, 2007, p.46).
Entende-se aí que a prova não pode ser o principal instrumento avaliativo, e que, por
isso, o professor deve fazer uso de outros instrumentos que façam o processo de avaliação ser
mais completo. Assim sendo, para a avaliação do discente, há sugestões de algumas práticas
avaliativas que se somam à prova, sendo estes: “prova discursiva, dissertação ou ensaio, prova
oral, entrevista, prova objetiva, registro de incidentes críticos, lista de verificação, prova
prática, diário de curso, projetos, debates, pesquisas, portfólio” (PPP, 2007, p.48).
Sobre o processo de quantificação em notas, o projeto traz que “a nota não pode ser
encarada como um fim, cujo alcance justifica todos os meios. O fim é a aprendizagem, a nota
é apenas um indicativo desta” (PPP, 2007, p.47). Esta última afirmação evidencia de forma
clara a proposta formativa que existe em ver a nota apenas como um indicativo de
aprendizagem que pode se somar a outros. No entanto, pondero que há de se considerar
também qual tipo de aprendizagem está sendo avaliada, a quais objetivos de ensino o docente
se subordina, podendo estes objetivos ser guiados por concepções de ensino, de língua e
aprendizagem disciplinares que ainda respondem ao paradigma da simplicidade, mas que são
avaliados formativamente e que, consequentemente, não corroboram para o desenvolvimento
de um pensamento complexo.
Prioriza-se também, no projeto, o envolvimento do estudante no processo de
avaliação, e, para isso, destaca-se a autoavaliação como parte essencial da avaliação
formativa. Há o entendimento de que autoavaliação, juntamente com a reflexão, direcionarão
o estudante para a autonomia na aprendizagem, se transformando, dessa forma, em sujeito de
seu processo. Pretende-se realizar a formação de profissionais que sejam críticos, reflexivos,
mas também detentores de autonomia para direcionar seu percurso de formação:
O Curso de Letras [...] pretende que essa autonomia, o aluno a desenvolva ao
longo do curso de graduação. Um curso é um percurso, portanto, acreditamos
que poderá haver alternativas de trajetórias; essas alternativas são feitas no
interior de campos específicos de saber que visam ao desenvolvimento de
habilidades e competências específicas (PPP, 2007, p.41).
Tendo o amparo de diversos autores, o PPP sugere alguns tipos de atividades para
autoavaliação e reflexão. São eles: “observação dos alunos, as entrevistas, a avaliação
contínua, portfólios, relatórios e inventários, diários e vários tipos de reuniões ou encontros”
(PPP, 2007, p.55).
117
Apesar de reconhecer a importância da autoavaliação para a avaliação formativa da
aprendizagem, não encontrei no texto do projeto nenhum excerto que discorresse sobre a
coavaliação ou avaliação dos pares, recurso avaliativo que, de acordo com Felice (2011), é
fundamental para a regulação das aprendizagens dentro da perspectiva formativa.
Há a compreensão de que o discente não é o único responsável quando acontece
fracasso na aprendizagem. Considera-se necessário avaliar, igualmente, a ação do professor, a
adequação de seu planejamento, as práticas pedagógicas realizadas, todo o processo de ensino
e aprendizagem. Nesse sentido, de acordo com o documento, a avaliação deve ser realizada
em diversas dimensões:
a) avaliações feitas pelo corpo docente: avaliações dos alunos; avaliação da
disciplina; b) avaliações feitas pelo corpo discente: avaliação dos professores e
da disciplina; c) avaliação institucional interna; d) avaliação externa. e)
avaliação feita pelo corpo técnico-administrativo sobre as condições de
funcionamento dos diversos setores essenciais da instituição de ensino (PPP,
2007, p.58).
Apenas as duas primeiras dimensões são especificadas no projeto: as avaliações feitas
pelo corpo docente e as avaliações feitas pelo corpo discente. Sobre as avaliações feitas pelo
corpo docente, indica-se que as avaliações dos alunos devam ser realizadas de maneira
processual, não se limitando às provas. Desta forma, devem abranger avaliações diagnósticas,
formativas e somativas. Além disso, é proposta a realização da avaliação docente da
disciplina, feita por meio de formulário eletrônico específico composto por itens para avaliar
os objetivos alcançados, as condições estruturais e humanas de realização da disciplina, bem
como necessidades de melhoria.
A segunda dimensão especificada, as avaliações feitas pelo corpo discente,
direcionam para a avaliação discente da disciplina e do professor. Recomenda-se que ambas
avaliações sejam feitas em formulário eletrônico específico. A primeira tem como objetivo
recolher apontamentos dos alunos para a reformulação das disciplinas, quando necessário. E a
segunda, visa avaliar a metodologia e as atividades avaliativas adotadas pelo docente.
Além da avaliação discente e docente, propõe-se que a avaliação perpasse toda a
estrutura escolar de maneira a produzir informações que nutram os processos administrativos
e pedagógicos com o objetivo de melhoria do ensino, apesar de o projeto não possuir
detalhamentos de como essas outras dimensões serão avaliadas.
4.1.2 Direcionamentos para a formação do professor para a avaliação da aprendizagem
118
A avaliação formativa enfrenta um alto grau de dificuldade, como aponta Hadji
(2008), para se efetivar nos diferentes graus de ensino, e, no ensino superior, considero que
não seja diferente. Considerando este nível de dificuldade para a efetivação de uma avaliação
que se quer formativa, o PPP analisado se mostra pioneiro, pois além de sugerir práticas
formativas de avaliação para os docentes do curso de Letras, também sugere que os discentes
sejam formados de maneira a refletirem sobre o papel e importância da avaliação formativa,
podendo, desta maneira, utilizá-la em suas práticas enquanto professores.
No capítulo Diretrizes Gerais para os Processos de Avaliação é bem enfática a
relevância que se dá para a formação do professor no aspecto avaliação da aprendizagem.
Destaco alguns trechos nos quais tal relevância é evidente.
No excerto que segue, demonstra-se a necessidade do trabalho com novas práticas de
avaliação. Acredito que essas novas práticas fazem referência às formativas, que estão em
oposição às que têm única e exclusivamente a intenção somativa e classificatória: “[...] faz-se
necessário discutir a avaliação a fim de estimular novas atividades avaliativas e preparar os
futuros professores para que eles possam atualizar as novas práticas de avaliação, com o
intuito de renovar o processo na Educação Básica” (PPP, 2007, p.46).
É possível notar que esta necessidade de estímulo a novas atividades avaliativas é
relacionada à renovação do “processo na Educação Básica”. O processo ao qual o documento
faz referência é justamente o de avaliação, que segundo a LDBN/1996, como já foi
apresentado anteriormente, deve se pautar em uma “avaliação contínua e cumulativa do
desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos
resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais” (BRASIL, 1996).
Parte-se do pressuposto de que na Educação Básica pratica-se uma avaliação que não
seja formativa e que, por isso, numa perspectiva linear simplificadora de causa e efeito,
consequência de sua formação no curso de Letras em questão, os professores poderão avaliar
formativamente sem nenhum empecilho. Contudo, o que acontece na Educação Básica é
igualmente um enorme grau de dificuldade para se avaliar formativamente (HADJI, 2008),
quando se considera o número de alunos por sala, a visão tradicional de avaliação da equipe
com que se trabalha, dentre outras dificuldades.
Ao invés da linearidade causa e efeito, poder-se-ia pensar de maneira retroativa e
circular, como dita o princípio do círculo retroativo (MORIN, 2003), que possibilitaria, por
exemplo, partir de vivências de professores da Educação Básica para pensar em maneiras
mais adequadas de se avaliar formativamente, direcionadas para as dificuldades de cada
contexto, bem como trazer as experiências particulares de cada professor. Vivências que
119
podem partir dos próprios alunos, haja vista que é comum muitos discentes de cursos de
Letras já exercerem a docência durante o período de formação.
Em outro trecho, ressalta-se a importância de se pensar a avaliação dentro do contexto
de formação:
A avaliação precisa ser pensada dentro do contexto de formação que a
pretende estabelecer; neste sentido, torna-se necessário dimensionar não
apenas a avaliação da aprendizagem, mas também do curso como um todo,
buscando, em um movimento coletivo avaliar e replanejar as ações
desenvolvidas, aproximando-as dos objetivos propostos pelo curso (PPP,
2007, p.46).
No próximo excerto, a ação de pensar a avaliação na formação docente é vista como
chave para direcionamentos de aprendizagem, como também para poder ser fonte de
informações que possam direcionar ações de replanejamento do curso de Letras: “A avaliação
é uma parte integrante do processo de formação e possibilita o diagnóstico de lacunas e a
aferição dos resultados alcançados, consideradas as competências a serem constituídas e a
identificação das mudanças de percurso eventualmente necessárias” (PPP, 2007, p.56).
No trecho em sequência, a formação para a avaliação da aprendizagem é relacionada
com a proposta do currículo, do curso e do PPP que visam, sobretudo, a formação de cidadãos
que saibam ser autônomos em seus percursos formativos e profissionais:
Em um currículo em que se pretende que o professor em formação tenha
autonomia em seu percurso, escolhendo as disciplinas nas quais buscará se
aprofundar e com as quais pretende compor seu curso, em um curso que tem
como maior objetivo a formação do professor pesquisador, em um Projeto
Pedagógico que destaca como prioridade formar profissionais e cidadãos, faz
toda a diferença a forma como será encarada e aplicada a avaliação da
aprendizagem. Preparar o futuro profissional para o mercado de trabalho
requer que este esteja apto a avaliar os outros, mas também avaliar a si próprio
(PPP, 2007, p.55).
Observa-se que há uma ênfase para o aprender a se autoavaliar e não apenas avaliar os
outros, uma valorização do papel do sujeito aprendente no desenvolvimento de suas
aprendizagens, papel esse que é retomado pelo princípio da reintrodução do sujeito
cognoscente, que diz que a objetividade e a verdade absolutas constituem enganos, por isso é
imprescindível fazer com que o sujeito, seja ele observador/ computador/ conceituador/
estrategista, tenha seu papel restaurado e ativo na construção da realidade (MORIN, 2005a).
Realidade(s) que, segundo a transdisciplinaridade, varia(m) para cada sujeito aprendente, bem
como para cada disciplina estudada.
120
Ao analisar o quadro de disciplinas dos cursos de Letras Licenciatura em Línguas
Espanhola, Francesa e Inglesa, encontrei um componente curricular optativo cujo nome é
Língua (Espanhola, Francesa ou Inglesa): Avaliação da aprendizagem. Tal disciplina
apresenta como objetivo geral “Conhecer e analisar criticamente os aspectos teóricos da
avaliação e saber aplicá-los em situações de ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras”
(PPP, 2007, não paginado). Em sua ementa propõe-se, dentre outros aspectos: “abordar
diferentes concepções do processo de avaliação e sua função, elaborar planos e instrumentos
de avaliação, relacionar instrumentos de avaliação com abordagens para o ensino de língua
estrangeira” (PPP, 2007, não paginado).
A existência de uma disciplina específica para determinada necessidade de formação é
uma das críticas de Freire (2013), quando afirma que uma melhor formação docente para a
utilização das TCI não acontecerá com o acréscimo de uma ou duas disciplinas específicas
para a formação tecnológica. De acordo com a autora, essa postura retrata a maneira
fragmentada de tratar o conhecimento bem como a formação de professores. Para ela, uma
auto-heteroecoformação acontece quando esse tipo de conhecimento, na presente análise, os
conhecimentos relativos à avaliação da aprendizagem, é construído em todos os conteúdos,
permitindo desta maneira, que “o futuro professor ligue/religue saberes e vivências para
compor seu repertório de conhecimentos” (FREIRE, 2013, p.75).
Concordo com a argumentação de Freire, todavia, ao refletir sobre o contexto de
formação dos cursos de Letras, tem-se um ambiente no qual, em geral, professores
formadores, após aprovação em concurso para disciplinas específicas, são lançados para a sala
de aula, não sendo incomum encontrar os que nunca exerceram a docência e repetem as
práticas avaliativas a que foram sujeitos durante seus percursos escolares. Diante do exposto,
questiono se a presença de uma disciplina optativa não poderia ser uma medida temporária e
paliativa para um contexto em que não se pode garantir uma formação que abranja também
aspectos da avaliação da aprendizagem.
Mesmo que a instituição tenha um PPP que proponha também uma formação para este
aspecto, pressuponho que a implementação de novas propostas sempre terão à frente algumas
barreiras dificultadoras. Barreiras que, segundo Santos Felício (2010), exigirão quatro
posicionamentos distintos dos docentes, a saber:
O primeiro posicionamento diz respeito ao desenvolvimento de uma
consciência de pertença à Instituição de Ensino Superior. Como
professor/pesquisador, não se pode entender a Instituição do Ensino Superior
só como um local de referência para o trabalho. [...] O segundo
posicionamento relaciona-se com a necessidade do conhecimento pedagógico
que os professores/pesquisadores devem, também, construir: assumir o “ser
121
professor” como uma profissão e, como tal, imbuir-se dos conhecimentos
pedagógicos que fundamentam tal profissão. [...] O terceiro posicionamento
aqui considerado refere-se à participação efetiva dos
professores/pesquisadores na construção do Projeto Político-Pedagógico. Tal
participação indica a possibilidade de negar toda a tendência de
individualização que o trabalho docente, sobretudo no Ensino Superior, tende
a expressar. [...] O quarto posicionamento diz respeito à ação de assumir o
Projeto Político-Pedagógico no cotidiano institucional e, consequentemente,
comprometer-se com o processo de avaliação constante do mesmo, em função
da qualidade dos serviços prestados pela Instituição do Ensino Superior
(SANTOS FELÍCIO, 2010, p.151-152).
Acredito que esses posicionamentos sugeridos por Santos Felício tragam barreiras
mais difíceis ainda de serem superadas quando se trata da avaliação da aprendizagem, pois a
avaliação formativa é uma proposta muito recente, suas bases foram construídas entre as
décadas de 1980 e 2004 (FERNANDES, 2009). 14
Assim sendo, professores formadores da
contemporaneidade ainda trazem enraizada, em suas práticas avaliativas, a ideia de avaliação
como medida, descrição e juízo de valor, principalmente quando se considera, no caso do
curso de Letras em análise, aqueles docentes que não compõem o núcleo de disciplinas
pedagógicas. Problemática essa que é ratificada no seguinte excerto do PPP que segue:
“Ressalta-se que a mudança de postura quanto à avaliação da aprendizagem e do curso é
processual e precisa ser levada a sério para que a mesma possa contribuir com a formação do
profissional que o curso se propõe a realizar” (PPP, 2007, p.56).
Portanto, considero que a existência de uma disciplina optativa que tenha como
objetivo conhecer e analisar criticamente os aspectos teóricos da avaliação e saber aplicá-los
em situações de ensino e aprendizagem de línguas seria talvez um paliativo que pudesse de
alguma forma tornar visível (SOUZA; MORAES FILHO, 2012)15
a importância de se refletir,
discutir e formar para a avaliação da aprendizagem, enquanto as barreiras de implementação
das propostas do PPP ainda se fizerem intransponíveis para uma formação avaliativa em um
enfoque sistêmico-complexo (FREIRE, 2013).
14
Este aspecto, o da idade da avaliação formativa, me foi exposto pelo próprio professor Fernandes em uma
conferência proferida por ele no II Seminário Internacional de Avaliação (SIAVA) realizado na Universidade
Federal de Uberlândia, em abril de 2015, quando o questionei sobre as dificuldades da avaliação formativa se
estabelecer no sistema educacional. 15
Souza e Moraes Filho (2012) realizaram um estudo sobre o letramento digital na Educação a Distância
questionando se os letramentos digitais terão impactos efetivos nas comunidades de aprendizagem no momento
em que as tecnologias digitais de informação e comunicação forem naturalizadas nas práticas sociais e
educativas. Os autores trazem, como conclusão do estudo, o fato de que: “Em disciplinas na modalidade a
distância que tenham como um de seus objetivos contribuir para os letramentos digitais dos aprendizes, parece-
nos necessário encontrar um meio termo, algo no continuum, „meio visível‟ e „meio invisível‟. Isso quer dizer
que o processo de letramento digital não deveria ser o único foco em um curso de Educação a Distância, mas que
os professores devem prover os aprendizes com tarefas que possam também retratar o contexto acadêmico e
profissional que eles estejam vivendo ou por viver” (SOUZA; MORAES FILHO, 2012).
122
Deste modo, após ter analisado as concepções de avaliação da aprendizagem, bem
como os direcionamentos para a formação do professor para a avaliação da aprendizagem,
presentes no PPP do curso de Letras em questão, na próxima seção, passo a analisar como três
professores do Núcleo de Formação Pedagógica do curso de Letras alvo deste estudo de caso,
veem a avaliação na formação de professores.
4.2 Como os professores formadores veem a avaliação da aprendizagem na formação de
professores de línguas?
As orientações expressas no PPP do curso de Letras demonstraram estar de acordo
com o que norteia a quarta e última geração de estudos sobre avaliação educacional
(FERNANDES, 2009). Seria interessante se eu tivesse acesso às avaliações do PPP que foram
feitas, mas as limitações de tempo para a pesquisa não me permitiram abranger outros
documentos. Tive acesso, contudo, por meio do site da instituição, à informação de que todos
os cursos de Letras regidos por este PPP, foram avaliados com a nota 4 pelo Ministério da
Educação (MEC). Assim sendo, recorri à entrevista semiestruturada e aos Planos de Ensino de
três professores do núcleo pedagógico do curso como fonte outra de dados, a fim de poder
relacionar os dados obtidos destas fontes com as análises dos trechos do PPP e formular
possíveis respostas aos questionamentos feitos nesta pesquisa.
Na entrevista semiestruturada (anexo 1), busquei fazer questionamentos básicos que
trouxessem respostas que evidenciassem como as professoras formadoras realizam a
avaliação nas disciplinas que ministram, quais práticas utilizam, em que momentos avaliam e
em qual concepção teórica se pautam. Tentei também fazer perguntas por meio das quais elas
pudessem exprimir se em algum momento da disciplina, trabalham a avaliação, no sentido de
formar os alunos para avaliar com base nos estudos contemporâneos sobre avaliação
educacional.
Ter os Planos de Ensino como outra fonte de dados também foi importante para o
desenvolvimento das interpretações. Os Planos de Ensino são documentos obrigatórios
solicitados aos professores no início do semestre letivo, entregue à secretaria da coordenação
de curso e igualmente disponibilizados aos alunos. Neles, segundo Libâneo (2004), deve
constar o conteúdo a ser ministrado, os objetivos da disciplina, o programa de ensino, o
desenvolvimento metodológico, as referências bibliográficas e como será realizada a
avaliação.
123
Pelas lentes da complexidade, enfatizo que, da mesma forma que o PPP deve estar
aberto para modificações segundo as necessidades e propósitos da comunidade educacional, o
Plano de Ensino enquanto documento que expressa as diretrizes pedagógicas e avaliativas a
serem tratadas em uma disciplina, também necessita de uma abertura para as características
contextuais que irão emergir durante o percurso que podem demandar modificações
estratégicas no planejamento para o ajuste do ensino.
Ademais, ao explorar estas duas fontes de informações, quais sejam, os Planos de
Ensino e as entrevistas, pude me aproximar da prática realizada no curso e depreender com
mais transparência a maneira tal como os formadores veem a avaliação na formação de
professores de línguas. Deste modo, separei os dados que sinalizam respostas a este
questionamento em duas categorias (BARDIN, 1977). Na primeira categoria, como o
professor formador realiza a formação para a avaliação da aprendizagem, seleciono dados
que refletem explicitamente o modo com que o professor formador licencia seus alunos para a
avaliação da aprendizagem. Busquei, igualmente, excertos que demonstrassem qual
concepção de avaliação o professor trazia em suas falas, isto porque as concepções que
portam, isto é, o modo como se entende a avaliação, poderá direcionar também suas práticas
formativas para o avaliar.
A segunda categoria visou sondar como o professor formador avalia. Mas por que
analisar como o professor avalia, se a pergunta pretende averiguar como eles veem a
avaliação na formação de professores? Essa categoria se justifica porque creio que o modo
que o professor avalia pode refletir a concepção de avaliação em que ele se pauta, além de
oferecer aos seus alunos vivências avaliativas que poderão ser utilizadas em suas futuras
práticas. Ao mesmo tempo, considerei a possibilidade de algum professor não abordar, nas
disciplinas pedagógicas que ministram, nenhum tópico sobre a avaliação da aprendizagem (o
que aconteceu em minha formação, como foi relatado na introdução desta dissertação), logo,
parto da premissa de que a forma com que os discentes são avaliados seria, de alguma
maneira, uma formação para o avaliar.
4.2.1 Como o professor formador realiza a formação para a avaliação da
aprendizagem.
Nesta categoria, tenho como fonte de dados excertos das entrevistas semiestruturadas
realizadas com as professoras formadoras, cujos nomes fictícios são Rosa, Luana e Nair.
124
Acredito ser relevante mencionar que as três professoras se mostraram muito solícitas ao
responderem a entrevista. Desde a marcação do encontro até o momento dos
questionamentos, responderam de boa vontade se colocando à disposição caso eu precisasse
de outras informações. Contudo, também acho relevante trazer à baila o fato de que durante o
percurso de busca de professores, entrei em contato com uma quarta professora do núcleo
pedagógico que se recusou participar, alegando não pesquisar sobre o tema de minha
pesquisa. Fato este que me surpreendeu, pois ela ministrava disciplinas do núcleo pedagógico.
O que ficou evidente, é que a professora provavelmente se sentiu ameaçada, pois ao ler o
termo de consentimento livre esclarecido que lhe foi entregue, nele informo aos entrevistados
qual o objetivo da pesquisa.
As professoras já foram caracterizadas no capítulo referente à metodologia, contudo,
retomo algumas informações que serão importantes para a interpretação dos dados. Para cada
professora, elaborei um quadro que agrega os dados fornecidos nas entrevistas, nele agrupei
excertos que demonstram a concepção de avaliação adotada e excertos que demonstram se a
formadora aborda, no decorrer das disciplinas, tópicos específicos que discutem os
procedimentos de avaliação da aprendizagem para a formação do professor.
Quadro 4:16
Como a formadora Rosa realiza a formação para a avaliação da aprendizagem.
16
Todos as respostas às entrevistas realizadas com as formadoras foram transcritos na íntegra, sem haver
correção ortográfica. 17
A letra E., se refere à palavra entrevista, a letra F, à palavra formadora, e a letra R, ao nome da formadora. Por
exemplo: E.F.R. – Entrevista Formadora Rosa. 18
Todos os negritos que aparecem nos dados selecionados para análise foram colocados pela autora para
enfatizar determinados aspectos.
Excertos da entrevista que
demonstram a concepção de avaliação
adotada.
Excertos da entrevista que demonstram se a
formadora aborda no decorrer das disciplinas,
tópicos específicos que discutem os
procedimentos de avaliação da aprendizagem
para a formação do professor.
E.F.R.17
- Então, eu já fazia muita coisa
intuitivamente. Porque eu sempre me
preocupei muito com essa questão da
avaliação porque eu percebia que muitas
vezes as avaliações eram injustas, então
eu sempre procurei tentar ser um pouco
mais coerente, um pouco mais
compreensiva, não sei se é essa palavra
que eu poderia usar na avaliação.
Mas depois de estudar na disciplina de
avaliação18
, estudar os eixos teóricos de
avaliação, eu acredito sim nessa
avaliação formativa, na qual o aluno, a
E.F.R. Sim, nas disciplinas de estágio, nas
disciplinas especialmente pedagógicas do curso
de Letras, no caso das disciplinas de outros cursos
eu não tenho essa preocupação imediata não, porque
não vão ser professores. Mas nas disciplinas
pedagógicas, eu sempre dou um tópico para isso. E
no início do curso né, da disciplina, na apresentação
do meu Plano de Ensino eu já faço a apresentação
do meu plano de avaliação e nas disciplinas de
estágio, especialmente estágio que é mais uma
disciplina de formação pedagógica, aí eu tenho um
tópico no Plano de Ensino para tratar do tema
avaliação.
125
Fonte: elaboração da autora com base na entrevista semiestruturada realizada com a professora Rosa.
Como já foi mencionado, a professora Rosa faz parte do Núcleo de Formação
Pedagógica da Licenciatura em Língua Portuguesa. Possui especialização em Língua
Portuguesa e Literatura Brasileira, e mestrado em linguística, além de já estar trabalhando na
área de Língua Portuguesa no Ensino Superior há vários anos. Na época em que colhi os
dados, ela estava em seu primeiro ano de doutorado. Ao ser questionada sobre quais as
concepções teóricas em que ela trabalhava a avaliação, aponta que acredita sim nessa
avaliação formativa, na qual o aluno, a avaliação não é um objeto em si. Considera
igualmente que a avaliação é um processo que é construído ali na mediação de sala de aula.
Este trecho que retomo demonstra claramente que a professora tem conhecimento a
respeito dos estudos mais atuais em avaliação da aprendizagem, haja vista que afirma
acreditar na avaliação formativa e vê a avaliação enquanto um processo que é construído na
mediação de sala de aula, não sendo um objeto em si. O fato de considerar que a avaliação é
um processo que é construído, implica que a professora pode ter também o conhecimento de
que o avaliar não é exterior ao ensino e aprendizagem, sendo construído enquanto processo
de interações em sala que permitam regulações (FERNANDES, 2009). Essa postura, segundo
a formadora, foi estabelecida depois de estudar na disciplina de avaliação, disciplina que
cursou no doutorado. Contudo, em outro excerto, relata que já avaliava formativamente, mas
trazia essa concepção intuitivamente:
avaliação não é um objeto em si, a
avaliação é um processo que é
construído ali na mediação de sala de
aula, então nessa concepção interativa
ou sóciointeracionista visando essa
formação contínua do aluno.
E.F.R. Então, eu acho que uma boa
avaliação é aquela na qual o aluno, ele vai
mobilizar grande parte do conhecimento
que ele tem né, não só o conhecimento
que foi adquirido no decorrer da
disciplina, mas conhecimento de mundo
né, conhecimento de outros componentes
curriculares, então a boa avaliação para
mim é essa avaliação que mobiliza essa
reflexão do aluno, né. Então aquela
avaliação que realmente o aluno tem que
pensar, tem que refletir sobre um
contexto maior de mundo, não aquela
coisa, certo, errado, nesse sentido.
E.F.R. Na primeira turma que eu trabalhei aqui
estágio, esse tópico(o tópico avaliação) já constava
de planos anteriores como sendo o último tópico,
mas depois que eu fiz a disciplina de avaliação
[...], eu percebi a necessidade de trabalhar esse
tópico no primeiro momento. Então, nessa
disciplina, nesses dois estágios que estou
trabalhando, eu trabalhei no primeiro momento,
então iniciei a disciplina, comecei a falar de
planejamento, depois que eu falei de planejamento,
no segundo tópico, eu trabalhei com avaliação.
126
Então, eu já fazia muita coisa intuitivamente. Porque eu sempre me
preocupei muito com essa questão da avaliação porque eu percebia que muitas
vezes as avaliações eram injustas, então eu sempre procurei tentar ser um
pouco mais coerente, um pouco mais compreensiva não sei se é essa palavra
que eu poderia usar na avaliação. E.F. R.
Este excerto demonstra uma preocupação da professora com o avaliar, pois não deseja
ser injusta em suas práticas. Ao afirmar que fazia muita coisa intuitivamente, deixa claro que
não teve uma capacitação para refletir e conhecer as teorias da avaliação da aprendizagem, o
que veio acontecer apenas no doutorado, ao cursar uma disciplina que abordava os eixos
teóricos da avaliação.
Ao ser questionada se trabalhava, no decorrer das disciplinas, tópicos específicos que
discutam os procedimentos de avaliação da aprendizagem para a formação do professor,
responde afirmativamente. O que acontece, conforme ela, nas disciplinas pedagógicas, pois
reserva um tópico no Plano de Ensino para tratar do tema avaliação. Relata também uma
inversão da ordem de apresentação dos tópicos da disciplina de estágio supervisionado, a
avaliação que era trabalhada no fim da disciplina, foi colocada no início da disciplina: [...] eu
percebi a necessidade de trabalhar esse tópico no primeiro momento. Esta inversão na
ordem de apresentação dos tópicos, colocando a avaliação em primeiro momento, pode
demonstrar uma priorização dada pela formadora ao assunto, de maneira a possibilitar um
maior tempo para se estudar e refletir sobre os aparatos teóricos e práticos da avaliação.
Por se tratar de uma entrevista semiestruturada, há a possibilidade de se abrir em
novos questionamentos; assim sendo, achei relevante interrogá-la sobre a reação dos discentes
quando ela trabalhou com o tópico avaliação em um primeiro momento. Sua resposta foi a
seguinte: Então, eles ficaram assim surpresos, na verdade, eles me relataram que poucas
disciplinas, para não dizer nenhuma, tratava especificamente do tema avaliação. Esta
resposta pode retratar a problemática que vivenciei em minha formação, contudo, os discentes
tiveram a oportunidade de, pelo menos, nos últimos períodos do curso, ter contato com teorias
de avaliação, o que não foi o meu caso. Este excerto demonstra ainda que a proposta do
Projeto Político-Pedagógico da instituição de se estabelecer, durante todo o curso, práticas de
formação para a avaliação da aprendizagem, está tendo certa dificuldade para ser implantada,
pois os alunos relataram não ter tido quase nenhuma disciplina que tratava especificamente do
tema avaliação.
127
Perguntei à formadora de qual período eram estes alunos que relataram não ter tido
nenhuma disciplina que tratava especificamente do tema avaliação, ela alega que São alunos
do oitavo período. Na continuidade de sua resposta, traz o seguinte:
O que eles me disseram foi que não existia no componente curricular, uma
disciplina específica, mas agora, me falaram que, tem uma disciplina optativa
em avaliação. Mas nas demais disciplinas, ninguém dava ênfase nesse tema,
que todo mundo fala, mas fala assim de forma informal, sem se
preocupar, sem dar uma orientação teórica. Sem se preocupar realmente
com os fundamentos da avaliação e de instrumentos, de mostrar
instrumentos diferenciados de avaliação. Então eles ficaram surpresos,
gostaram muito, acharam importante e perceberam que podem fazer outras
práticas que não sejam essas tradicionais que eles estão acostumados. E.F. R.
Este excerto pode refletir o que acontece no curso de Letras deste estudo de caso: não
há, durante o curso, uma preocupação da maioria dos formadores com a avaliação da
aprendizagem, pois a professora relata que seus alunos ficaram surpresos por ela trazer
direcionamentos teóricos e práticos de avaliação, além disso, afirmam que ninguém dava
ênfase nesse tema, que todo mundo fala, mas [...] sem dar uma orientação teórica, a não ser
na disciplina optativa em avaliação.
Outra afirmação que deve ser destacada é a frase na qual os alunos da professora Rosa,
segundo ela, acharam importante e perceberam que podem fazer outras práticas que não
sejam essas tradicionais que eles estão acostumados. Este trecho demonstra a precariedade na
formação de professores para o avaliar: discentes do último período de um curso de Letras
que se surpreendem ao conhecerem métodos alternativos de avaliação, diferentes dos
tradicionais que conhecem. Situação esta que, mais uma vez, retrata as barreiras para
implementação de novas propostas expressas no Projeto Político Pedagógico, como foi
exposto por Santos Felício (2010), no texto anteriormente citado.
Há de se afirmar, porém, que o trabalho da formadora Rosa pode se caracterizar
enquanto uma proposta auto-heteroecoformadora, haja vista que a professora foi uma das
poucas que trouxe para os alunos aspectos da avaliação na formação do professor, fazendo
com que a formação para o avaliar não se limitasse apenas à disciplina optativa em avaliação
oferecida pelo curso.
A segunda professora entrevistada, Luana, integra o Núcleo de Formação Pedagógica
da Licenciatura em Língua Inglesa. Possui licenciatura em Letras, mestrado e doutorado em
Linguística Aplicada e está vinculada ao instituto enquanto professora efetiva há vários anos,
além de ter experiência como professora de língua inglesa em escolas de idiomas.
128
Quadro 5: Como a formadora Luana realiza a formação para a avaliação da aprendizagem.
Fonte: elaboração da autora com base na entrevista semiestruturada realizada com a professora Luana.
Nos excertos em que a professora aponta as características de uma boa avaliação,
destaco os adjetivos coerente e processual. Para a formadora, uma boa avaliação tem que ser
coerente com todo o processo de aprendizagem. O que se pode depreender é que ela acredita
que deve ser avaliado o que foi ensinado, o professor não pode cobrar nas avaliações algo que
não foi trabalhado em sala. Conforme relata a professora, a avaliação não pode acontecer
apenas ao final, destaca a necessidade de investigar todo o processo de aprendizagem.
Este último excerto me faz questionar como a formadora realiza as avaliações durante
o processo de aprendizagem, informação esta que não pude ter na entrevista, mas que os
Planos de Ensino, analisados na próxima seção, deram mais detalhamentos. Há de se
considerar que, se as avaliações não acontecem dialogicamente, onde o professor, por meio de
vários métodos, consegue se informar sobre o percurso de aprendizagem de seus alunos, não
haverá regulação da aprendizagem. O que poderá acontecer é o que ressalta Cunha (2006,
p.72), anteriormente citado, “a velha avaliação somativa fragmentada em uma multiplicidade
de momentos”, não acontecendo a avaliação formativa, que visa o diálogo entre professor e
aluno, de modo a informá-los para que aconteçam redirecionamentos que melhorem as
aprendizagens.
Além disso, em outro excerto, a formadora considera que a avaliação precisa fazer
parte do processo, porque se ela for apenas um produto, ela vira só uma questão de atribuir
Excertos da entrevista que demonstram a
concepção de avaliação adotada.
Excertos da entrevista que demonstram se
a formadora aborda no decorrer das
disciplinas, tópicos específicos que
discutem os procedimentos de avaliação da
aprendizagem para a formação do
professor.
E.F.L. Acho que primeiro ela tem que ser
coerente com todo o processo de
aprendizagem. Você não vai fazer algo fora do
processo do que você já está trabalhando. Acho
que é interessante que ela seja processual, né?
Não apenas ao final. Então, você deve
investigar todo o processo de aprendizagem.
Tem que fazer parte do processo, porque se ela
for apenas um produto, ela vira só uma
questão de atribuir e ganhar nota.
E.F.L. Também outro aspecto que acho
fundamental é o estabelecimento de critérios,
tem que ser bem claro, para você e o aluno, o
que é que está sendo avaliado.
E.F.L. A avaliação em si, eu não tenho
discutido muito, o que eu tenho discutido são
as noções de erro que acabam tocando em
aspectos de avaliação. Porque, às vezes, eles
veem essa coisa de avaliação na metodologia.
O que eu tenho discutido muito, é essa noção
de erro porque passa pelas concepções de
linguagem, e estão implicadas em avaliação.
Discutimos também a de feedback, como que
você corrige, por exemplo, o aluno dentro da
sala. Agora, não há um tópico especifico de
avaliação.
129
e ganhar nota. Neste fragmento, há o entendimento de que a atribuição de notas em si não há
um cunho processual, contudo a formadora não especifica como deve ser feita esta avaliação
processual. O que se pode inferir é o entendimento anterior de que a avaliação não pode
acontecer apenas no final de uma disciplina, pois terá um aspecto quantitativo de produto,
devendo ocorrer durante todo o percurso de ensino, em diversos momentos.
Na visão da professora, uma boa avaliação está relacionada também com o
estabelecimento de critérios que devem estar claros para ambos participantes da avaliação,
professor e aluno: tem que ser bem claro, para você e o aluno, o que é que está sendo
avaliado. Creio que este aspecto esteja relacionado com o caráter de coerência invocado pela
formadora como característica de uma boa avaliação, o que também caracteriza uma avaliação
formativa, haja vista que, para Hadji (2008), a definição de critérios de realização e de êxito é
essencial para se julgar as situações com conhecimento de causa. E para Álvarez Méndez
(2001), os critérios necessitam ser explicitados para os alunos com antecedência estando de
acordo com as necessidades contextuais e subjetivas dos alunos envolvidos no processo.
Ao ser interrogada se abordava, no decorrer das disciplinas, tópicos específicos de
avaliação da aprendizagem enquanto requisito de formação de professor, a formadora
responde dizendo que não, pois o que tem discutido muito é essa noção de erro porque passa
pelas concepções de linguagem, e estão implicadas em avaliação. Além disso, a formadora
afirma discutir com os professores em formação, o feedback, que é relacionado a como que
você corrige, por exemplo, o aluno dentro da sala. Ao questioná-la como passa o resultado
das avaliações a seus alunos, pude ter um detalhamento maior de como a formadora realiza o
feedback. Então ela explicita como utiliza deste método com seus alunos do estágio
supervisionado:
Então, logo em seguida à aula, eu sento com ele e dou um feedback. Então eu
vou explicar a minha, na verdade, é uma interlocução, em relação à aula dele,
o que eu acho que poderia melhorar. O que foi bom ou não foi bom a meu
ver. E tento deixar claro que é a avaliação de uma aula, não é uma avaliação
da vida dele, às vezes dá essa impressão. As demais avaliações, o seminário
também pode ser imediato. Agora, o relatório final, essa avaliação, se ele
conseguir me entregar o relatório antes, eu consigo dar um parecer antes da
entrega final, caso contrário, realmente é só no final da disciplina. E aí eu
mando como se fosse um relatório do relatório dele. E.F.L
Não foi possível fazer mais questionamentos sobre quais noções de erro e feedback
com as quais a formadora Luana trabalha, todavia, abordar o erro na aprendizagem de línguas
com outras perspectivas além do simples julgamento certo X errado, já demonstra uma
preocupação da formadora em licenciar os futuros professores para avaliar de maneira
130
diferente à tradicional. A preocupação da formadora em dar o feedback das suas avaliações,
como também mostrar para seus alunos noções de feedback, são contribuições para capacitar
o professor em formação para entender e vir a praticar uma avaliação de cunho formativo. De
acordo com Fernandes (2009, p.101), a utilização de um sistema de feedback, cooperará “para
que os alunos se tornem mais autônomos, mais responsáveis pelas suas aprendizagens, mais
capazes de avaliar e regular seu trabalho, seu desempenho e suas aprendizagens e mais ágeis
na utilização das suas competências metacognitivas”.
É importante ressaltar que, apesar de fazer uso de métodos que contribuem para uma
avaliação de cunho formativo, o adjetivo formativo não foi utilizado em nenhuma recorrência
na entrevista, o que me faz inferir que a professora talvez não tenha tido oportunidades de se
aprofundar nos estudos contemporâneos de avaliação da aprendizagem, trazendo, contudo, na
definição de uma boa avaliação os adjetivos processual e coerente, que caracterizam a
avaliação formativa.
A terceira e última professora entrevistada, Nair, é professora efetiva, possui
licenciatura em Letras e mestrado em Letras e, na época em que foi entrevistada, estava
cursando o doutorado em Letras. Ela está na instituição como professora formadora há mais
de quatro anos e tem vários anos de experiência como professora de língua francesa. No
curso de Letras, está vinculada ao Núcleo de Formação Pedagógica da Licenciatura em
Língua Francesa, tendo ministrado disciplinas deste núcleo e também disciplinas pedagógicas
para o ensino de Português Língua Estrangeira.
Quadro 6: Como a formadora Nair realiza a formação para a avaliação da aprendizagem.
Excertos da entrevista que demonstram a concepção
de avaliação adotada.
Excertos da entrevista que
demonstram se a formadora
aborda no decorrer das
disciplinas, tópicos específicos
que discutem os procedimentos
de avaliação da aprendizagem
para a formação do professor.
E.F.N. Para mim uma boa avaliação, ela precisa estar
pautada nos objetivos que eu estabeleci através do
planejamento no início do semestre. E essa avaliação
também tem que estar casada com a abordagem de
ensino de línguas que eu adoto e com a metodologia e
os materiais didáticos. Para mim a avaliação é um
conjunto disso tudo, é um reflexo disso tudo, não é
apenas a tradicional baseada em acerto e erros.
Apesar de eu acreditar que é necessário e importante a
gente ter avaliação pontuais de conteúdo né, para
confirmação de conteúdo, mas, sobretudo, aquela que
E.F.N. Sim, normalmente de 3 a
4 aulas a gente trabalha com
avaliação e com planejamento.
E.F.N. Em todo o curso, no meio
para frente. No final eu acho
péssimo, porque aí realmente eles
ficam sem saber direito o que é
isso. O ideal seria desde o início,
mas não tem espaço para isso,
131
Fonte: elaboração da autora com base na entrevista semiestruturada realizada com a professora Nair.
Sobre as concepções de avaliação da aprendizagem que a professora traz, destaco
alguns excertos que demonstram qual ela adota para suas práticas avaliativas. Nair entende
que uma boa avaliação precisa estar pautada nos objetivos que eu estabeleci através do
planejamento no início do semestre. Considerando essa afirmação, subentende-se que a
professora elege critérios de avaliação que dialogam com os objetivos de ensino da disciplina.
A formadora também considera que a avaliação necessita dialogar com a abordagem e
metodologia de ensino adotada: E essa avaliação também tem que estar casada com a
abordagem de ensino de línguas que eu adoto e com a metodologia e os materiais didáticos
Tal necessidade apresentada pela formadora de “casar” abordagem, avaliação e metodologia
demonstra a influência de escolhas lineares para suas práticas pedagógicas, haja vista que,
para a complexidade, a linguagem e os métodos, quando em uso, são adaptáveis e dinâmicos,
e por isso, não podem ser predeterminados de maneira fechada e linear por apenas uma
abordagem ou metodologia.
A abordagem complexa de ensino de línguas (BORGES; PAIVA, 2011) não vê o
professor como “mero repetidor de procedimentos pré-estabelecidos, mas como construtor de
sua metodologia”, e por isso, “baseia-se em seu contexto imediato de atuação, sua intuição
pedagógica e em seu conhecimento - em constante transformação e atualização – das
diferentes concepções sobre os processo e fenômenos que envolvem o fazer docente”
(BORGES; PAIVA, 2011, p.352).
Ao afirmar que, além de avaliações pontuais, realiza também avaliações ao longo do
processo, faz uma confusão entre os termos somativo e formativo: aquela não sei se é
somativa enfim, aquela ao longo do processo do ensino, eu sempre deixo uma nota pra isso,
leva, aquela, não sei se é somativa, enfim, aquela ao
longo do processo do ensino, eu sempre deixo uma
nota pra isso, para a evolução do aluno ao longo do
semestre.
E.F.N. Mas a avaliação também é para mim, como
professor, para eu ter uma noção, o feedback que os
alunos me dão ao longo dessas pequenas variações.
Eu em geral trabalho entre 5 e 6 avaliações, eu tenho 5
e 6 avaliações, divididas, chamadas de avaliações né,
formas de avaliação, e entre elas estão aí essa avaliação
mesmo do aluno e a que eu faço a medida que eles vão
me dando esse feedback, para que eu possa ter uma
negociação até comigo mesmo, se aquilo está dando
certo ou não está dando certo e as vezes eu tenho que
deixar de lado mesmo.
porque tem muita carga teórica
que a gente tem que
instrumentalizar, mas eu acho
que pelo menos do meio para
frente.
132
para a evolução do aluno ao longo do semestre. De acordo com Fernandes (2009, p.49), “a
avaliação somativa, mais associada à prestação de contas, à certificação e a seleção, e o
conceito de avaliação formativa mais associado ao desenvolvimento, à melhoria das
aprendizagens e à regulação dos processos de ensino e aprendizagem”. Nota-se, portanto, que
a formadora pretendia usar o adjetivo formativa, ao invés de somativa.
Ainda que a formadora apresente uma preocupação com a avaliação processual, a
despeito da confusão dos termos, há um segundo mal entendido no excerto que segue: eu
sempre deixo uma nota pra isso, para a evolução do aluno ao longo do semestre. A confusão
está no entendimento de que se precisa reservar uma nota X para a avaliação processual e
formativa. Esta ideia demonstra a possibilidade de as outras avaliações que a formadora faz,
serem quantitativas e somativas, cujos resultados não podem favorecer a regulação das
aprendizagens, pois já existe uma nota reservada para este quesito.
Ambas as confusões vêm reforçar o que foi notado por Cunha (2006) em seu estudo
antes citado. Segundo ela, há uma fetichização dos conceitos relativos à avaliação formativa,
dado que características como qualitativa, reguladora e processual são equivocadamente
interpretadas, apesar de amplamente divulgadas, pois que difundidas em documentos sem o
investimento didático-metodológico necessário, o que não permite a correta aplicação dos
mesmos.
Em outro excerto, a formadora enxerga os resultados de suas avaliações como
feedbacks para sua prática: Mas a avaliação também é para mim, como professor, para eu ter
uma noção, o feedback que os alunos me dão ao longo dessas pequenas variações. Nesse
sentido, na continuidade de sua fala, traz que a medida que eles vão me dando esse feedback,
para que eu possa ter uma negociação até comigo mesmo, se aquilo está dando certo ou não
está dando certo e as vezes eu tenho que deixar de lado mesmo. Neste trecho, é possível
notar que a formadora enxerga os resultados das avaliações que aplica como termômetros que,
caso seja necessário, conduzirão modificações reguladoras em suas escolhas didáticas.
Aspecto este que caracteriza uma avaliação de cunho formativo.
Ao ser questionada se, no decorrer das disciplinas, abordava tópicos específicos que
discutem os procedimentos de avaliação da aprendizagem para a formação do professor,
garante trabalhar o conteúdo em 3 a 4 aulas, não dando mais detalhes sobre como essa
formação é realizada: Sim, normalmente de 3 a 4 aulas a gente trabalha com avaliação e
com planejamento.
Aproveitando da maleabilidade da entrevista semiestruturada, pergunto à formadora
quando ela acredita que, em um curso de Letras, deva ser abordada a avaliação da
133
aprendizagem. Ao responder, pondera que seria inadequado que se trabalhasse apenas no final
do curso, mas que o ideal seria desde o início, mas que isso não é possível devido a
necessidade da carga teórica: porque tem muita carga teórica que a gente tem que
instrumentalizar. Por isso, de acordo com Nair, a formação para o avaliar deveria acontecer,
pelo menos, do meio para frente.
Esta visão vem demonstrar que Nair traz uma concepção linear do conhecimento, pois
separa teoria de prática, talvez por não conseguir perceber que ambas podem caminhar com as
mesmas intenções formativas e que, a avaliação formativa, pode ser ensinada, praticada e
vivenciada de maneira auto-heteroecoformadora, em qualquer disciplina de um curso de
Letras.
4.2.2 Como o professor formador avalia
Analisar como o professor formador avalia, como já foi discutido na introdução desta
seção, justifica-se porquanto as práticas avaliativas vivenciadas pelo professor durante sua
formação podem ser utilizadas e adaptadas em suas futuras experiências profissionais. Além
do mais, achei relevante poder comparar o que as formadoras expõem na entrevista com o que
elas trazem em seus Planos de Ensino. Uma vez que, não é de se estranhar, a existência de
incoerências entre concepções adotadas e práticas concretizadas, como o que foi evidenciado
na categoria anterior ao analisar o excerto da formadora Nair.
Para esta categoria, tenho como fonte de dados os Planos de Ensino das professoras
formadoras, disponibilizados pela coordenação do curso de Letras. Como foi feito para a
categoria anterior, elaborei, para cada formadora, dois quadros que agrupam informações
extraídas dos Planos de Ensino de duas disciplinas distintas. Para tanto, selecionei excertos
que expressam os métodos de avaliação e excertos que expressam os critérios de avaliação a
serem utilizados na disciplina.
No primeiro Plano de Ensino, o da formadora Rosa, destaco os excertos agrupados no
quadro a seguir:
134
Quadro 7: Como a formadora Rosa avalia - disciplina: Estágio Supervisionado de Língua
Portuguesa.
Fonte: elaboração da autora com base no Plano de Ensino da professora Rosa da disciplina: Estágio
Supervisionado de Língua Portuguesa
Trata-se de uma disciplina obrigatória do último período do curso de Letras
Licenciatura em Língua Portuguesa. O Plano de Ensino data do segundo semestre de 2012 e
sua carga horária é de 90 horas, sendo 30 horas teóricas e 60 práticas. O objetivo geral da
disciplina é o de proporcionar ao licenciando o manejo de adequação dos conteúdos
assimilados no curso de Letras à realidade do ensino-aprendizagem da língua materna.
A formadora distribui 100 pontos em variados métodos de avaliação. Para a carga
horária teórica, acredito que ela reserva os seminários, debates e estudos dirigidos,
totalizando 30 pontos. A plataforma moodle também é utilizada como método de avaliação,
sendo talvez lugar de postagem de tarefas, debates e estudos dirigidos. Para a carga horária
prática, a formadora utiliza microensino e regência, reservando para estes, 20 pontos. Ao
relatório final, a formadora reserva metade da nota da disciplina, 50 pontos. Por não haver
informações específicas sobre a elaboração do mesmo, creio ser o relatório final, o documento
onde serão anexados os Planos de Curso e de Ensino da regência, materiais didáticos
utilizados, relatos reflexivos das aulas ministradas, dentre outros elementos.
Não há, no Plano de Ensino, nenhuma especificação ao que concernem os critérios de
avaliação adotados para cada prática avaliativa. Isso não significa, contudo, que a formadora
não estabeleça e apresente critérios aos seus alunos. Também não encontrei informações que
detalhassem como aconteceriam os momentos de avaliação e em que lugares, isto porque o
estágio, em geral, acontece em ambientes diferentes de onde os formadores ministram suas
aulas.
Métodos de avaliação utilizados Critérios de avaliação
utilizados
Seminários, debates, estudos dirigidos, moodle
(30 pontos)
Não especificado
Microensino e regência (20 pontos) Não especificado
Relatório final (50 pontos) Não especificado
135
Como se pode observar, não há referência a nenhum método avaliativo, seja
instrumento, técnica ou estratégia que caracterize a avaliação de cunho formativo. É um Plano
de Ensino com informações bem resumidas, não apenas no item de avaliação, mas também no
de metodologia e programa. É relevante mencionar que o Plano de Ensino contém, em seu
programa, um item relativo à formação do professor para a avaliação da aprendizagem: A
prática de ensino e o processo avaliativo.
Passo, a seguir, à análise do segundo Plano de Ensino da formadora Rosa, a fim de
aprofundar as interpretações e fundamentar possíveis conclusões.
Quadro 8: Como a formadora Rosa avalia – disciplina: Estágio Supervisionado de Português
em diferentes contextos.
Fonte: elaboração da autora com base no Plano de Ensino da professora Rosa da disciplina: Estágio
supervisionado de Português em diferentes contextos
A disciplina é obrigatória e se localiza entre as que integram o oitavo e último período
do curso de Letras Licenciatura em Língua Portuguesa. Possui a carga horária total de 75
horas, das quais 15 horas são teóricas e 60 horas são práticas. O Plano de Ensino corresponde
ao da disciplina ministrada no segundo semestre de 2012. Seu objetivo geral exposto é o de
desenvolver a prática de ensino de Português como Língua Estrangeira (PLE), Português
como Segunda Língua (PSL) e/ou Português com objetivos específicos (Português
Instrumental).
Métodos de avaliação utilizados Critérios de avaliação
utilizados
Resenhas acadêmicas e fóruns de discussão no
valor de 10 pontos (5pontos para resenha e 5
pontos fóruns)
Não especificado
Pesquisa temática: pesquisar, em periódicos
acadêmicos, diferentes experiências em
Português Instrumental, para fins específicos;
em grupo. (10 pontos)
Não especificado
Elaboração e planejamento do plano de ação
do estágio. (30 pontos)
Não especificado
Execução do plano de ação. (25 pontos) Não especificado
Relatório final de estágio. (25 pontos) Não especificado
136
Como se pode observar, os cem pontos foram distribuídos em várias atividades:
pesquisa temática, elaboração e planejamento do plano de ação do estágio, execução do
plano de ação e relatório final do estágio. Para o componente teórico, a formadora reservou
20 pontos e os 80 pontos restantes, foram destinados às atividades práticas. Por ser uma
disciplina de estágio, acredito que a execução do plano de ação corresponda ao microensino e
regência presentes no Plano de Ensino anterior. No entanto, as pontuações dadas a essas
atividades variaram: no Estágio Supervisionado de Língua Portuguesa, a professora reserva
20 pontos, e no Estágio Supervisionado de Português em diferentes contextos, 25 pontos. O
relatório que, no primeiro Plano de Ensino analisado, vale 50 pontos, neste é avaliado em 25
pontos. No entanto, entendo que não há muita diferença na distribuição de pontos para este
item porque o planejamento, que corresponde ao Plano de Ensino e aos planos de aulas, deve
constar no relatório. O que a formadora fez, foi um detalhamento maior, em relação ao outro
Plano de Ensino, do que será avaliado.
Igualmente ao anterior, não foi disponibilizado, pela formadora, informações que
detalhassem os critérios para cada atividade avaliada. Apesar disso, diferentemente do
primeiro, há informações, no item Metodologia, sobre o que deverá ser ensinado nas aulas do
estágio, onde acontecerão e em qual lugar.
A falta dos detalhamentos sobre os critérios de avaliação limitam a análise dos dados
em curso, contudo não indicam necessariamente que não foram explicitados aos alunos
oralmente ou por meio da plataforma virtual utilizada pela formadora. Por outro lado, o Plano
de Ensino é o documento que permite tal detalhamento que, quando feito com antecedência,
fornecerá ao aluno maior clareza do que precisa ser desenvolvido neste percurso formativo.
Também não encontrei referência à utilização de métodos de avaliação de cunho
formativo. O que não significa que a professora, após a realização de cada atividade, não
oferecia feedbacks formativos com o objetivo de regulação do ensino e aprendizagem. Como
no outro Plano de Ensino analisado, há no programa da formadora um item relativo à
formação do professor para a avaliação da aprendizagem: A prática no processo de avaliação.
O que vem a confirmar o que ela alega na entrevista, ao afirmar que sempre reserva um tópico
para a temática nas disciplinas pedagógicas.
Como se pode depreender, os dois Planos de Ensino da professora Rosa se
assemelham bastante no item avaliação, nas atividades escolhidas e na distribuição de pontos.
A forma como a distribuição de atividades e pontos é apresentada, e a falta de métodos
formativos de avalição, bem como a de critérios avaliativos, passa a ideia de que predomina,
137
na prática da professora, uma avaliação concebida como descrição e medida, sem haver
momentos de negociação e construção (FERNANDES, 2009).
Foram duas disciplinas de estágio ministradas no segundo semestre de 2012, e seria
interessante para interpretação dos dados, saber se estes Planos de Ensino foram elaborados
antes ou depois de a formadora fazer a disciplina sobre avaliação no doutorado(como foi
exposto na entrevista), contudo não dispus desta informação. A entrevista com a formadora
Rosa foi feita em dezembro de 2013, e pelo relato dado, parecia bem recente a sua
participação na disciplina sobre bases teóricas em avaliação, no doutorado. Assim sendo,
considero que os Planos de Ensino foram elaborados antes de a formadora se aprofundar nos
estudos em avaliação formativa. Caso contrário, creio que instrumentos, técnicas e estratégias
de cunho formativo seriam mencionados nos Planos de Ensino. Reitero, todavia, que o fato de
não serem mencionados, não significa que a formadora não os utilizava; o que poderia
acontecer era o uso intuitivo de direcionamentos formativos, como ela mesma relata na
entrevista:
Então, eu já fazia muita coisa intuitivamente. Porque eu sempre me preocupei
muito com essa questão da avaliação porque eu percebia que muitas vezes as
avaliações eram injustas, então eu sempre procurei tentar ser um pouco mais
coerente, um pouco mais compreensiva, não sei se é essa palavra que eu
poderia usar na avaliação. E.F.R.
Passo à análise dos excertos dos Planos de Ensino da professora formadora Luana. No
primeiro Plano de Ensino analisado pude selecionar os excertos dispostos no quadro que
segue:
Quadro 9: Como a formadora Luana avalia – disciplina: Metodologia de Ensino de Inglês
para Fins Específicos.
Métodos de avaliação utilizados Critérios de avaliação utilizados
Uma prova escrita individual (40
pontos) – Data especificada
Pertinência dos aspectos abordados
em relação à proposta da prova;
coesão e coerência do texto.
Análise e elaboração de material
didático com base nos textos técnicos
discutidos. (20 pontos) - Ao longo do
curso
Critérios não especificados.
138
Fonte: elaboração da autora com base no Plano de Ensino da professora Luana da disciplina:
Metodologia de Ensino de Inglês para Fins Específicos.
A disciplina compõe o quadro do Núcleo de Formação Pedagógica do curso de Letras
Licenciatura em Língua Inglesa, sendo ministrada no sexto período. Tem a carga horária total
de 60 horas que se dividem em 45 horas teóricas e 15 práticas. O Plano de Ensino
corresponde ao da disciplina ministrada no segundo semestre de 2012. O objetivo geral da
disciplina exposto no documento é o de Integrar e discutir os conhecimentos linguístico,
teórico e prático no contexto de ensino de língua inglesa para fins específicos, considerando
o desenvolvimento das quatro habilidades, de acordo com as necessidades de cada contexto
de ensino particularmente.
A formadora tem como métodos avaliativos uma prova avaliada em 40 pontos, análise
e elaboração de material didático, avaliada em 20 pontos e feita ao longo da disciplina, e três
microensinos, avaliados em 40 pontos. Dos 100 pontos distribuídos, 60 pontos focalizam o
desenvolvimento de atividades práticas que envolvem os microensinos, e 40 pontos para a
prova dissertativa que, a meu ver, avaliará aspectos teóricos ministrados durante a disciplina.
A quantidade de pontos reservada para a prova me faz inferir que ela é um dos principais
instrumentos utilizado pela formadora ao avaliar seus alunos, pois quase cinquenta por cento
da nota é direcionada para este instrumento. O que não aconteceria, se a formadora,
apresentasse um quarto recurso de avaliação, tirando o peso da prova e também dos
microensinos que foram avaliados em 40 pontos cada um. Conforme aponta Fernandes
(2009), três momentos de avaliação não são suficientes para que aconteça a triangulação na
avaliação da aprendizagem:
[...] a informação, desejavelmente, deve ser recolhida em tempos
diversificados; sempre que possível ao longo dos períodos escolares e não em
dois ou três momentos previamente anunciados (FERNANDES, 2009, p.96).
Sobre os critérios de avaliação estabelecidos, como pode ser visto no quadro, para a
Análise e elaboração de material didático com base nos textos técnicos discutidos, não há
nenhum critério. Alguns critérios foram expressos para a avaliação da prova, como também
dos microensinos, podendo ser eles considerados pertinentes para cada instrumento. Por outro
lado, apenas o que foi feito com os resultados de cada avaliação poderá indicar se foi um
processo pautado na negociação e construção do conhecimento, com vistas à regulação do
Três microensinos: dois sobre o ensino
de leitura para fins específicos e um a
ser escolhido pelos alunos. (40 pontos)
– Data especificada
Clareza na exposição; estrutura da
aula; elaboração do plano de aula.
139
ensino e da aprendizagem. Não há, no texto do Plano de Ensino, referência à utilização de
nenhuma técnica, instrumento ou estratégia avaliativa formativa, como diários reflexivos,
observações, portfólio, autoavaliação, coavaliação, dentre outros.
Do segundo Plano de Ensino da professora Luana, foram recolhidos os métodos e
critérios de avaliação incorporados no quadro que segue.
Quadro 10: Como a formadora Luana avalia – disciplina: Estágio supervisionado de Língua
Inglesa 2.
Métodos de avaliação utilizados Critérios de avaliação utilizados
Relatório final: Organização: capa,
introdução, justificativa, objetivos,
fundamentação teórica, planejamento de
curso e planos de aula, considerações
finais, referências e anexo (se necessário).
(15 pontos)
- Apresentar um texto claro, em português ou
em inglês de acordo com os modelos
disponibilizados.
Relatório final: Relato reflexivo da
regência em escola pública, baseado na
observação de 03 aulas de inglês de um
mesmo professor, em uma mesma sala, na
escola regular, no Ensino Fundamental ou
Médio e na regência de 03 aulas
(individual ou em dupla). (20 pontos)
- Legibilidade Textual, coerência e coesão.
- Gênero: texto acadêmico (introdução,
discussão teórica, descrição e análise, das
observações, descrição e análise das aulas
ministradas, considerações finais. bibliografia,
anexos).
Relatório final: Três diários reflexivos
sobre as regências ministradas no curso
oferecido à comunidade. (15 pontos)
- Texto - claro e coeso (página digitada,
espaçamento 1,5, Times New Roman, fonte
12).
- Descrições de aspectos e eventos relevantes.
- Posicionamento sobre os fatos ocorridos na
sala de aula.
- Confronto entre o planejamento e a aula dada.
- Confronto entre a prática e teorias estudadas /
consultadas ao longo do Curso de Letras.
-Reconstrução/Apresentação de sugestões.
Interação na plataforma Moodle :
participação nos Fóruns propostos ao longo
do curso. (15 pontos)
Não especificado.
Regências: Registros de observações da
professora supervisora, considerando o
processo da formação do professor. A
regência será avaliada levando em conta os
planos de aulas apresentados com
antecedência, aspectos apontados numa
primeira observação e revisitados na
segunda e/ou terceira aula observada. (20
pontos)
- Estrutura da aula (abertura, sequenciamento e
fechamento), ritmo e criatividade (10,0
pontos).
- Uso da língua inglesa (5,0 pontos).
- Explicações e instruções (5,0 pontos).
Participação nas aulas e envolvimento - Assiduidade e compromisso com os horários
140
Fonte: elaboração da autora com base no Plano de Ensino da professora Luana da disciplina: Estágio
supervisionado de Língua Inglesa 2.
O Plano de Ensino a ser analisado é o da disciplina Estágio supervisionado de Língua
Inglesa 2, que está no quadro de conteúdos do Núcleo de Formação Pedagógica do curso de
Letras Licenciatura em Língua Inglesa, disciplina obrigatória ministrada no oitavo período. O
Plano de Ensino data do primeiro semestre de 2013, e a carga horária de 90 horas, está
dividida em 30 horas teóricas e 60 horas práticas. É apresentado como objetivo geral:
Desenvolver prática de ensino de língua inglesa, nas redes pública e privada de ensino da
cidade de [...], atrelada a realização de projetos de pesquisa colaborativa a serem realizados
com os professores em serviço. Além disso, atinei ser relevante também citar o que é
apresentado nos objetivos específicos, pois fazem referência aos processos de avaliação:
- Vivenciar, como professor pré-serviço, experiências metodológica e
linguística de ensino de língua inglesa relacionadas com a avaliação nas aulas
de língua inglesa; - Vivenciar prática reflexiva como ponto de partida para
autoavaliação crítica sobre o processo de ensino e aprendizagem
desenvolvido como forma de rever e re-elaborar o fazer de sala de aula.
A formadora apresenta como métodos de avaliação o relatório, a interação na
plataforma Moodle, as regências e a participação nas aulas e envolvimento com o projeto de
curso. A pontuação destinada para o relatório final foi dividida e especificada em três itens:
para organização do relatório, 15 pontos; para o relato reflexivo da regência em escola
pública, baseado na observação de 03 aulas, 20 pontos; para os três diários reflexivos sobre
as regências ministradas, 15 pontos; ao todo, 50 pontos para o relatório. São atividades a
serem realizadas ao longo da disciplina e que de acordo com as instruções, devem constar no
relatório a ser entregue no final do curso.
A utilização do relato reflexivo e do diário reflexivo demonstram o destaque que a
formadora dá para a reflexão durante o estágio, reflexões que foram direcionadas para a
observação de aulas de outros professores e para a própria prática dos professores em
formação, durante a regência. Preocupação essa que é expressa no PPP do curso de Letras,
como foi citado na seção na qual analiso o documento: “o ato de avaliar será um processo
contínuo e permanente com função diagnóstica, processual e classificatória e será feita de
com o projeto de curso. (15 pontos) de orientação pré-estabelecidos (3,0 pontos).
- Pontualidade na entrega dos Planos de Curso
e de aula (4,0 pontos).
- Engajamento nas discussões/atividades
desenvolvidas no curso (5,0 pontos) -
Trabalho/ envolvimento em equipe (3,0
pontos).
141
maneira a possibilitar a constante reflexão sobre o processo formativo do aluno.” (PPP, 2007,
p.45). Além disso, o relato reflexivo e o diário reflexivo são métodos de avaliação de cunho
formativo, porque permitem a autoavaliação e a consequente regulação no percurso das
aprendizagens.
Os procedimentos de orientação para o registro em relatório das regências apontam
para a presença de avaliações frequentes realizadas pela formadora nas várias atividades
propostas na disciplina:
Registros de observações da professora supervisora, considerando o processo
da formação do professor. A regência será avaliada levando em conta os
planos de aulas apresentados com antecedência, aspectos apontados numa
primeira observação e revisitados na segunda e/ou terceira aula observada.
Pode se inferir que, em algum momento, ela apresenta suas observações feitas durante a
regência, e também avalia os planos de aulas apresentados com antecedência. São avaliações
que podem ser consideradas como processuais e qualitativas, pois sugerem redirecionamentos
que devem resultar na reelaboração dos planos de aula. Creio que esses momentos de
avaliação processual realizados pela formadora, são os de feedback que ela relatou na
entrevista, cujo excerto eu retomo:
Então, logo em seguida à aula, eu sento com ele e dou um feedback. Então eu
vou explicar a minha, na verdade, é uma interlocução, em relação à aula dele,
o que eu acho que poderia melhorar. O que foi bom ou não foi bom a meu
ver. E tento deixar claro que é a avaliação de uma aula, não é uma avaliação
da vida dele, às vezes dá essa impressão. E.F.L.
Outro método de avaliação formativa também é utilizado, o da observação
(ÁLVAREZ MÉNDEZ, 2001), presente no item do Plano de Ensino, Participação nas aulas
e envolvimento com o projeto de curso, que pode também estar presente no item Interação
na plataforma Moodle, pela observação da participação nos Fóruns propostos ao longo do
curso.
Para quase todas as atividades avaliadas, a formadora especifica os critérios de
avaliação. Para as regências e participação nas aulas a formadora faz, inclusive, uma
subdivisão de pontos de acordo com os critérios. A interação na plataforma Moodle é a
única atividade que não apresenta critérios de avaliação.
Ao comparar os dois Planos de Ensino da formadora Luana, podemos evidenciar um
maior detalhamento dos métodos e critérios de avaliação no Plano de Ensino da disciplina
Estágio supervisionado de Língua Inglesa 2, o que permitiu mais interpretações e demonstrou
um forte teor formativo nas práticas avaliativas da professora. Há uma preocupação constante
142
em dar feedbacks formativos como foi relatado na entrevista, no entanto, no Plano de Ensino
da disciplina Metodologia de Ensino de Inglês para Fins Específicos ficou evidente o caráter
somativo e descritivo da prova de 40 pontos, principalmente porque não há evidências que
demonstram se a formadora realizou deu algum tipo de feedback para essa avaliação.
São duas disciplinas distintas, a primeira com a carga horária prioritariamente teórica e
a segunda prioritariamente prática. Os métodos de avaliação formativa estiveram mais
presentes na disciplina com maior carga horária prática. O que se pode deduzir é que o fato de
a disciplina Metodologia de Ensino de Inglês para Fins Específicos demandar mais aspectos
teóricos foi talvez um dificultador para a realização formativa da avaliação, o que demonstra
que a professora não vê a possibilidade de outros métodos de avaliação para os aspectos
teóricos de formação, pois se limitou a três, incluindo a tradicional prova. Apesar disso,
afirmações categóricas não podem ser feitas, pois como já foi explicitado, não se sabe como o
resultado das provas é trabalhado, com fins apenas quantitativos e/ou qualitativos.
Tendo analisado os Planos de Ensino das formadoras Rosa e Luana, passo, na
sequência, à análise dos excertos contidos nos Planos de Ensino da formadora Nair.
Quadro 11: Como a formadora Nair avalia – disciplina: Estágio supervisionado de Português
como língua estrangeira.
Fonte: elaboração da autora com base no Plano de Ensino da professora Nair da disciplina: Estágio
supervisionado de Português como língua estrangeira
O primeiro Plano de Ensino da formadora Nair a ser analisado é o da disciplina do
sétimo período, Estágio supervisionado de Português como língua estrangeira que integra o
Métodos de avaliação utilizados Critérios de avaliação utilizados
Seminário de textos teóricos (15
pontos)
Fidelidade ao texto teórico
apresentado com posição crítico-
reflexiva sobre o tema.
Regência – 2 aulas (40 pontos – 20
cada aula)
Adequação entre teoria e prática.
Pasta com planos de curso e
materiais didáticos (30 pontos)
Organização e adequação dos planos
e matérias.
Relatório final (15 pontos) Posicionamento crítico-reflexivo
diante da aprendizagem e da
regência.
143
quadro do Núcleo Pedagógico das licenciaturas em línguas estrangeiras, a saber, Espanhol,
Francês e Inglês. Sua carga horária total é de 75 horas, que estão dividias em 15 horas teóricas
e 60 práticas. O Plano de Ensino data do segundo semestre de 2012 e apresenta como objetivo
geral: Desenvolver prática de ensino de Português como Língua Estrangeira (PLE) e/ou
Segunda Língua (PSL), atrelada à realização de projetos de extensão a serem realizados com
os alunos estrangeiros em Programa de Mobilidade Estudantil na UFU e/ou estrangeiros
recém-chegados a [...].
Os 100 pontos reservados para avaliar os alunos no percurso da disciplina foram
divididos em quatro métodos de avaliação: seminário, regência, pasta com planos de curso e
materiais didáticos e relatório final. A maior pontuação foi reservada para a regência, 40
pontos para duas aulas a serem ministradas, cujo critério de avaliação será a Adequação entre
teoria e prática. O relatório final foi avaliado em 15 pontos, contudo, creio que nele, como
foi expresso nos outros Planos de Ensino analisados, devam constar os Planos de Curso e de
aula da regência, avaliados em 30 pontos. Os critérios estabelecidos para avaliar o relatório
final e os Planos de Curso e de aula, como se pode ver no quadro, não dão muitos detalhes de
como serão avaliados. Da mesma forma que não permitem dizer se a professora faz avaliações
processuais de cada atividade dando feedbacks formativos.
No segundo Plano de Ensino da formadora Nair, pude selecionar os seguintes excertos
que compõem o quadro abaixo:
Quadro 12: Como a formadora Nair avalia – disciplina: Metodologia de ensino do Português
como língua estrangeira.
Métodos de avaliação utilizados Critérios de avaliação utilizados
Uma prova escrita. (35 pontos) Aplicação dos conceitos teóricos
estudados.
Fichamento dos textos teóricos. (20
pontos)
Reprodução dos conceitos teóricos
estudados através dos textos.
Estágio de observação. (10pontos) Não especificado.
Relatório final do estágio de
observação. (15pontos)
Desenvolvimento ao longo do curso,
avaliação continuada.
144
Fonte: elaboração da autora com base no Plano de Ensino da professora Nair da disciplina:
Metodologia de ensino do Português como língua estrangeira.
A disciplina Metodologia de ensino do Português como língua estrangeira está no
quadro de disciplinas do quarto período do Núcleo Pedagógico das licenciaturas em línguas
estrangeiras, quais sejam, Espanhol, Francês e Inglês. Sua carga horária total é de 60 horas,
que estão dividias em 45 horas teóricas e 15 práticas. O Plano de Ensino corresponde à
disciplina que foi ministrada no segundo semestre de 2012, e apresenta como objetivo geral:
Proporcionar formação metodológica que leve o aluno a uma reflexão crítica sobre o
processo de ensino/aprendizagem da língua portuguesa como segunda língua e/ou língua
estrangeira e que o prepare para a prática de ensino da mesma.
Dentre os métodos de avaliação utilizados pela formadora, a prova escrita, o
fichamento e a apresentação do seminário, ao todo 75 pontos, demonstram estar avaliando os
aspectos teóricos da disciplina. Os 25 pontos restantes, correspondem aos aspectos práticos:
estágio de observação e relatório final do estágio de observação.
Os critérios de avaliação da formadora foram expressos em quase todos os métodos
utilizados, com exceção do estágio de observação. Apesar disso, eles não estão claros, e não
permitem deduzir qual é o envolvimento da formadora durante todo o processo de avaliação e
se há ou não a regulação dos resultados de cada atividade com o objetivo formativo. O que se
pode afirmar, ao analisar os critérios estabelecidos, é que os alunos de posse do Plano de
Ensino da professora não terão as informações necessárias para que aconteça o
desenvolvimento das aprendizagens de maneira bem direcionada e reflexiva, palavra essa que
não aparece em nenhum critério.
Faz-se relevante mencionar que em um dos itens relativos aos objetivos específicos do
Plano de Ensino, há um relacionado à avaliação da aprendizagem: - Conhecer instrumentos de
avaliação de rendimento e proficiência em Português Língua Estrangeira. Isso confirma o
que a professora traz na entrevista ao afirmar que reserva de 3 a 4 aulas para trabalhar com
avaliação e planejamento. Apesar disso, os termos rendimento e proficiência carregam um
teor quantitativo de avaliação, relacionado aos testes de proficiência, que tem sua importância
para o ensino e aprendizagem de línguas, mas que não visam o trabalho com os aspectos
formativos da avaliação.
Apresentação de seminário.
(20pontos)
Bom domínio do tema exposto e
capacidade de argumentação.
145
O primeiro Plano de Ensino analisado, se comparado ao segundo, apresenta maior
carga prática, pois trata-se de um estágio. O que chama a atenção é que na disciplina com
maior carga teórica, a formadora utiliza uma prova como método de avaliação, o que não foi
feito na disciplina de estágio. O mesmo aconteceu nos Planos de Ensino da professora Luana.
Tem-se aí a prova ainda como um instrumento quase que indispensável para avaliar aspectos
teóricos do conhecimento.
Foi possível também observar que no texto dos dois Planos de Ensino da formadora
Nair, não há menção a nenhum método de avaliação que tenha o cunho explicitamente
formativo, como diários reflexivos, observações, portfólio, autoavaliação, coavaliação,
observação, dentre outros.
Todas essas análises referentes aos dados extraídos dos Planos de Ensino da formadora
Nair podem demonstrar que suas práticas avaliativas se pautam, predominantemente, em uma
concepção de avaliação como medida, descrição e juízo de valor, uma vez que os dados não
trouxeram evidências de que a professora trabalhe com uma perspectiva de avaliação como
negociação e construção.
4.3 As propostas e práticas avaliativas analisadas correspondem ao que a complexidade,
a transdisciplinaridade, e os estudos em avaliação sugerem para as práticas educacionais
da contemporaneidade?
Como foi demonstrado, o PPP do curso de Letras apresenta uma visão de ensino que
se pauta, sobretudo, na visão disciplinar do conhecimento. Há iniciativas para o
estabelecimento de práticas interdisciplinares, que se caracterizam como passos importantes
para a Reforma do ensino, mas a transdisciplinaridade aparece apenas na Linguística
Aplicada, área do conhecimento estudada principalmente quando se tratam de questões de
ensino e aprendizagem de línguas, dentro de um curso de Letras, mas que não se desdobram
em práticas de ensino e avaliação transdisciplinares. À luz da complexidade, isso indica que a
comunidade responsável pela elaboração das diretrizes políticos-pedagógicas presentes no
PPP necessita buscar contribuições de estudos que, amparados no paradigma da
complexidade, visam a se adequar às necessidades contemporâneas da educação, já com
vistas ao futuro.
Seria interessante, por exemplo, a proposta de um núcleo transdisciplinar que fosse
lugar de estudos, pesquisas e práticas transdisciplinares com a participação de estudantes e
146
profissionais de várias áreas do conhecimento, fazendo com que os estudantes de LA tivessem
o dízimo transdisciplinar dentro da instituição para amparar o desenvolvimento do
pensamento complexo.
No que se refere à concepção de avaliação da aprendizagem, o PPP, por meio das
análises feitas nas categorias concepções de avaliação da aprendizagem; e direcionamentos
para a formação do professor para a avaliação da aprendizagem, se mostrou respaldado
pelos estudos da quarta geração de avaliação, aquela que concebe o processo de avaliação
como negociação e construção, sendo, por isso, formativa. Tendo em conta que, além de
sugerir práticas formativas de avaliação para os formadores do curso de Letras, também há
direcionamentos de formação dos discentes, de modo que sejam incitados a refletir sobre o
papel e importância da avaliação formativa.
Apesar disso, foi possível notar, através das análises das entrevistas e dos Planos de
Ensino das professoras formadoras, que as propostas expressas no PPP do curso de Letras têm
tido dificuldades para serem implementadas no curso. As três professoras entrevistadas
demonstraram utilizar alguns métodos formativos de avaliação, mas Luana e Nair não traziam
concepções claras do que é avaliar formativamente. Apenas Rosa demonstrou ter
conhecimento dos estudos em avaliação educacional, feitos por ocasião da participação em
uma disciplina cursada no doutorado. Em contrapartida, a análise dos Planos de Ensino de
Rosa, tendeu mostrar que é predominante, na prática desta professora, uma avaliação
concebida como descrição e medida, sem haver momentos de negociação e construção
(FERNANDES, 2009). Os aspectos formativos de avaliação que aparecem nas falas e nos
Planos de Ensino das formadoras não apresentam, em sua maioria, correspondências claras e
enfáticas para a negociação e construção de percursos de ensino, aprendizagem e/ou
avaliação.
A fala dos alunos do último período do curso, citada pela professora Rosa, também foi
relevante para esta pesquisa. Segundo ela, os alunos relataram que foi apenas em sua
disciplina que tiveram contato mais aprofundado com os aspectos teóricos da avaliação da
aprendizagem. O fato de um curso de Letras, cujo PPP prioriza ações formativas de avaliação
e formação para a avaliação, mas que não são evidenciadas na prática, confirmou que há
barreiras que impedem essa concretização, barreiras essas que necessitam ser identificadas
para a efetivação da proposta político-pedagógica.
As sugestões de métodos de avaliação, a concepção de avaliação, e os apontamentos
para a formação do professor para o aprender a avaliar, contidos no PPP, pretendem
proporcionar aos professores em formação momentos em que eles possam refletir sobre sua
147
auto formação enquanto avaliadores, vivenciar momentos em que serão avaliados
formativamente em contextos (eco) de trocas e vivências com os outros professores em
formação(hetero). Contudo, a análise dos dados fornecidos pelos formadores constataram que
essa auto-heteroecoformação não é concretizada, tendo em conta que até mesmo os
professores do núcleo pedagógico entrevistados não possuem uma formação que os
possibilitem avaliar formativamente. Acrescenta-se a isso, o fato de a proposta de ensino do
curso se pautar em uma visão disciplinar do conhecimento, o que dificulta a realização efetiva
de uma auto-heteroecoformação.
Nesse sentido, volto a questionar se essas barreiras para o estabelecimento da
avaliação formativa não podem estar relacionadas ao ensino que, sendo disciplinar, não
permite regulações formativas de ensino, de avaliação e/ou de aprendizagem, pois a
linearidade do conhecimento acaba por demandar a linearidade nas práticas avaliativas, que
tenderão a ser tradicionais.
Se o professor acredita que o ensino deve se pautar em transmissão quantitativa de
informações, sua avaliação, por mais que seja formativa, o será no sentido de regular e
verificar com o objetivo de controlar as aprendizagens para o êxito na memorização de
informações. E o que também pode acontecer, é o fato de o professor que, apesar de se
embasar em um paradigma educacional complexo, avalia tradicionalmente por ainda estar
preso às práticas tradicionais de avaliação. Avaliar é complexo, pelo menos o deveria ser
apenas se o adjetivo complexo fosse tomado nas bases do pensamento complexo, isto é, o que
é tecido junto, construído pela relação do sujeito aprendente com o objeto da aprendizagem,
com os pares e com o ambiente onde se está inserido.
Para a concretização das Reformas sugeridas por Morin, eu acrescentaria um item na
Reforma do ensino: a formação para avaliação da aprendizagem. Este item se justifica, pois a
avaliação praticada atualmente vem atacar todo e qualquer tipo de atitude de ensino que se
queira complexa e transdisciplinar, suas características tradicionais ainda demandam a
memorarização, a programação e a falta de reflexão. Como foi apontado anteriormente, a
avaliação formativa, quando praticada, abrange o que os operadores complexos demandam
para o trabalho com os processos complexos emergentes.
Acredito poder caracterizar a avaliação tradicional como um subsistema morto, pois
não permite a autopoiese19
. De acordo com Moraes (2003, p.177), “para que seja um ser
vivente, a condição necessária e suficiente é a existência da autopoiese, ou seja, da força da
19
Conceito desenvolvido, sobretudo, Maturama e Varela (1995).
148
autocriação, da auto-organização que traz consigo a capacidade de autocriar-se, de reproduzir-
se e de transcender”. E esse subsistema morto de avaliação influencia o sistema maior no qual
está incluído, retroagindo na teia de ensino e aprendizagem, influenciando todo o sistema
educacional. Morin protesta que esse tipo avaliação
[...] tende a se inserir em um sistema gigantesco de avaliações quantitativas
que se generalizam em toda a sociedade na qual os avaliadores são eles
mesmos avaliados por super avaliadores que nunca souberam se autoavaliar
nem mesmo questionar suas avaliações (MORIN, 2014, p.71).20
Neste sentido, avaliação tradicional não valoriza o erro como um princípio de
construção da aprendizagem, são necessárias repostas exatas que reflitam a ideia de verdades
fechadas em si mesmas. Sobre isso, retomo Morin, quando ele enfatiza que a ideia de verdade
é uma ilusão:
A ideia de verdade é a maior fonte de erro imaginável; o erro fundamental
reside na apropriação monopolista da verdade.[...] Os caminhos da verdade
passam pelo ensaio e pelo erro; a busca da verdade só pode ser feita através do
vagar e da itinerância; a itinerância implica que é um erro buscar a verdade
sem buscar o erro. (MORIN, CIURANA E MOTTA, 2003, p.27-28)
De acordo com essa visão, o erro na aprendizagem deve ser visto então como
resultado de ações que foram ou não inculcadas, dentro de um programa de atividades
previamente elaboradas visando à efetivação das aprendizagens. Dessa forma, ao tentar
interpretar os erros visando o redirecionamento das práticas de ensino, o docente faz do seu
método de ensino e aprendizagem, ao mesmo tempo, programa e estratégia. Visto que, para a
complexidade, “o método é simultaneamente programa e estratégia e, por retroação de seus
resultados, pode modificar o programa; portanto o método aprende” (MORIN, CIURANA E
MOTTA, 2003, p.28). E da mesma forma que o método aprende, o professor aprende como o
aluno aprende, e o aluno igualmente descobre como direcionar seus esforços para construir
suas aprendizagens. Avaliação tradicional representada pelos testes e provas retalha o todo, o
professor que faz o uso deste tipo de avaliação tem a tendência de avaliar as partes, não
consegue ainda elaborar avaliações que deem conta do todo da disciplina inicialmente, que
venha a dar conta do todo onde essa disciplina pode se encaixar.
A esse respeito, Paiva e Nascimento (2009, p.27), de acordo com os escritos de
Nicolescu (2001), no manifesto da transdisciplinaridade, apontam que a especialização
20
Tradução da autora para : “[...] elle tend à s’insérer dans um gigantesque système d’évaluations quantitatives que se généralise dans toute la société où les évaluateurs sont eux-mêmes évalués par de superévaluateurs qui n’ont jamais su s’autoévaluer ni mettre en doute leurs évaluations.“ (MORIN, 2014, p.71).
149
acelerada dos conhecimentos científicos não é compatível com o rápido agravamento dos
problemas globais, assim sendo, sugerem que “[...] somente um diálogo entre as inúmeras
áreas da ciência permitirá que o conhecimento acumulado pelo homem possa salvar a
civilização do colapso eminente”. Por isso, é imperioso Reformas que abranjam o ensino, o
conhecimento e o pensamento, porque as práticas avaliativas vigentes apenas sabem avaliar
um conhecimento fragmentado, isolado, que não possibilita a integração com o todo
transdisciplinar.
Quando se trata de aprendizagem de línguas, avaliar o aprendido utilizando de
instrumentos que privilegiam a repetição de estruturas, o preenchimento de frases
descontextualizadas, a utilização de formas linguísticas apenas pela forma em si, exclui de
certa forma da aprendizagem o sujeito congnoscente que busca o aprendizado, bloqueando,
dessa maneira, seu viés criativo. Assim procedendo, ele será apenas o repetidor de signos,
poderá de certo modo, desenvolver sua inteligência linguística, mas não potencializará o
desenvolvimento de sua inteligência criativa que o faz indivíduo e sujeito na sociedade-
mundo onde está inserido.
Avaliar tradicionalmente a aprendizagem de uma língua, seja ela materna ou
estrangeira, é concebê-la enquanto apenas um instrumento de comunicação fechado, que pode
ser canalizado, mas que não pode ser reinventado. É ao mesmo tempo desempoderar o
indivíduo de sua inteligência criativa e linguística, pois se não se consegue memorizar
determinado vocabulário ou estrutura gramatical para responder às provas, não poderá
alcançar a pontuação necessária para passar de nível. É limitar a expressão de sua
singularidade que o faz diferente do outro, que o faz indivíduo. É não permitir o seu
movimento de singularidade autopoeitica.
O viés criativo e interrogativo do aluno também é frequentemente anulado quando o
professor avalia apenas as respostas dadas, não se preocupando em avaliar as perguntas feitas.
O questionamento não é incentivado, basta analisar o número de alunos por sala que, no
Ensino Básico de escolas públicas é, geralmente, de 35 alunos por professor, o que impede o
diálogo profícuo entre alunos e aluno e professor. Assim sendo, não há espaço para que as
curiosidades naturais da criança (MORIN, 2005a) sejam incentivadas, pois elas, as
curiosidades, são frequentemente podadas em ambiente no qual deveriam ser estimuladas e
aperfeiçoadas.
Em suma, as análises dos dados feitas em cada categoria possibilitam afirmar que o
curso de Letras, alvo deste estudo de caso, através de seu PPP, busca práticas formativas de
avaliação, contudo se pauta em uma visão de conhecimento que tende para a disciplinaridade.
150
Já as práticas avaliativas das formadoras expressas nos Planos de Ensino, bem como através
das entrevistas, são o espelho da repetição de práticas que vêm se perpetuando há tempos,
haja vista que não se tem acesso a formações que possibilitem reformar o modo de
conhecimento, de pensamento, de ensino e, consequentemente, de avaliação. Contudo, é
evidente o esforço e a vontade de ir em busca de outras possibilidades avaliativas, como o que
foi claramente expresso pela formadora Rosa, ao fazer mudanças em no seu Plano de Ensino
para por em evidência os aspectos formativos de avaliação, como também ao identificar que
suas avaliações eram um pouco injustas.
Assim sendo, o que é preciso ser feito no ambiente de formação de professores para
que o avaliar seja reformado com o amparo dos estudos em avaliação da aprendizagem e
complexidade? O que é preciso ser feito para que as barreiras dificultadoras para o
estabelecimento de avaliações formativas sejam transpostas? Como respostas a esses
questionamentos, apresento no item seguir, minhas considerações finais, nas quais teço as
reflexões advindas dos dados analisados à luz da complexidade, da transdisciplinaridade e da
avaliação formativa.
151
FINALIZANDO E DESCOBRINDO POSSIBILIDADES: A favor de uma auto-
heteroecoformação docente para a avaliação da aprendizagem
Evidenciei nos capítulos de revisão teórica desta pesquisa que a proposta da avaliação
formativa é fruto de avanços nos estudos educacionais, mas que, apesar das variadas
propostas de efetivação deste tipo de avaliação, autores relatam fracassos nas empreitadas de
mudança (HADJI, 2008). Situação esta que foi confirmada na análise dos dados colhidos, haja
vista que os documentos da instituição, como também a fala de alguns professores
demonstraram que, embora tenham conhecimento dos fundamentos desta proposta de
avaliação, é predominante em suas práticas a avaliação entendida como medida, descrição e
juízo de valor.
Isto posto, é possível afirmar que tal fracasso, o que fez Hadji (2008) considerar como
utópica a efetivação dos aparatos formativos na avaliação, pode ser justificado pelos os
seguintes pontos:
- A falta de formação de professores e formadores de professores para refletir sobre a
avaliação educacional, conhecendo, desta maneira, os estudos mais recentes em avaliação.
- O fato de a avaliação de cunho formativo se deparar com um sistema de ensino que é
predominantemente disciplinar.
- O fato de os professores que, apesar de terem aparatos formativos para a avaliação, se
depararem com aprendizes que já chegam com uma formação resultante de um sistema
educacional tradicional, no qual foram, durante toda sua vida escolar, sujeitos a avaliações
tradicionais, classificatórias e excludentes.
- O fato de a avaliação formativa ainda ser relativamente recente para poder se estabelecer nos
sistemas educacionais.
Com base nisso, retomo a pergunta de Marx que se repete nas obras de Morin, “Quem
educará os educadores?”. Quem conduzirá iniciativas para que as Reformas aconteçam? Para
o mesmo autor (MORIN, 2013, p.201), “será por meio de uma multiplicação de experiências-
piloto que poderá nascer a Reforma da educação [...] que conduzirá à criação de um tipo de
mente capaz de enfrentar os problemas fundamentais e globais e de religá-los ao concreto”.
Reformulo, todavia, a pergunta, a fim de questionar quem educará os formadores de
professores? A “educação dos formadores” se mostrou, por meio da análise dos dados,
necessária, levando em conta que dois dos três formadores entrevistados não traziam
concepções claras de avaliação. Além disso, os dados demonstraram que predomina, em suas
152
práticas avaliativas, uma concepção de avaliação enquanto medida e juízo de valor,
concepções essas que refletem os preceitos do paradigma cartesiano-newtoniano.
Com base nisso e respaldada nas evidências desta pesquisa, acredito ser necessário
esforços para a concretização de uma auto-heteroecoformação dos formadores de professores,
primeiramente. Isso porque, como foi demonstrado na análise dos dados desta pesquisa, os
métodos para se avaliar formativamente ainda não estão totalmente assimilados pelos
professores formadores, bem como os aspectos relacionados à complexidade e à
transdisciplinaridade.
Acredito que este tipo de formação poderá diminuir as barreiras de implementação das
propostas do PPP para a avaliação da aprendizagem. Por outro lado, como já discuti em vários
momentos desta dissertação, para que seja uma auto-heteroecoformação, é necessário que a
formação seja guiada pela complexidade e transdisciplinaridade, invocando igualmente as
Reformas propostas por Morin, de tal maneira que o paradigma da complexidade traga suas
contribuições para o ensino e, consequentemente, para os diversos setores da sociedade:
Somente a partir de um novo paradigma educacional que estimule a
inteligência, o desenvolvimento do pensamento, da consciência e do espírito, é
que estaremos colaborando para o desenvolvimento de novas gerações
constituídas de sujeito éticos, criativos, autônomos, cooperativos, solidários e
fraternos, capazes de lidarem com a incerteza, com a complexidade na tomada
de decisão e sejam autônomos, responsáveis, éticos, indivíduos capazes de
afrontarem o seu próprio destino (MORAES, 2003, p.181).
Edgar Morin (2005a, p.10-11) afirma que “[o] termo „formação‟, com suas conotações
de moldagem e conformação, tem o defeito de ignorar que a missão do didatismo é encorajar
o autodidatismo, despertando, provocando, favorecendo a autonomia do espírito”. Assim
sendo, enfatizo a necessidade de uma auto-heteroecoformação que abranja não apenas os
professores em formação, mas também os formadores. Uma auto-heteroecoformação de
professores para a avaliação da aprendizagem resultaria em contribuições para a Reforma da
educação, e consequentemente, uma concretização mais ampla e rápida de todas as outras
Reformas propostas por Morin, haja vista que ela permearia a maneira de tratar o
conhecimento, o pensamento e o ensino.
Uma formação que propiciasse o uso e a reflexão sobre os métodos formativos de
avaliação possibilitaria reconhecer as diferenças peculiares a cada indivíduo com relação aos
processos de aprendizagem, valorizaria os produtos de aprendizagem como individuais,
diferentes, mas não errados, como o quer a avaliação tradicional que exclui os que não se
enquadram às regras de memorização e irreflexão.
153
Há uma preocupação muito presente para a formação de professores do Ensino Básico
em vários aspectos, entretanto, essa pesquisa demonstrou que, no ensino superior, lugar de
formação de professores do Ensino Básico, há lacunas para com a formação de professores,
bem como na formação dos formadores no quesito avaliação da aprendizagem. Esta lacuna
pode estar relacionada com a, ainda predominante, visão cartesiana do pensamento e
conhecimento que demandam a superespecialização e, por conseguinte, a repetição de práticas
tradicionais de ensino e avaliação. Visão originária do paradigma cartesiano que também se
reflete na exigência por pesquisas de docentes universitários que, superespecializados, não
encontram oportunidades e espaços para refletirem e atualizarem suas práticas de ensino e
avaliação.
Daí a relevância desta pesquisa que, à luz da complexidade e transdisciplinaridade,
demonstrou a necessidade de se investir esforços e políticas para a formação de formadores.
Da mesma forma que é necessário criar polos transdisciplinares de estudo e pesquisa, lugares
onde pesquisadores de várias áreas do conhecimento trarão suas contribuições, e terão a
possibilidade de desenvolver um pensamento que, ao invés de separar, reduzir e
unidimensionalizar, possibilite a distinção, mas também a conjunção e
multidimensionalização.
Por ocasião da apresentação de uma comunicação no II Seminário Internacional de
Avaliação (SIAVA), realizado na Universidade Federal de Uberlândia, em abril de 2015, ao
assistir a apresentação de uma das comunicantes no grupo temático, coincidentemente tomei
conhecimento de que na universidade do PPP do curso de Letras analisado, existe na diretoria
de ensino, uma divisão de formação docente. A comunicante, durante a apresentação de sua
pesquisa, afirmou que esta divisão oferece encontros de formação continuada aos docentes da
universidade, nos quais o tópico avaliação formativa sempre é abordado, mas que os docentes
participam de livre vontade, isto é, não são obrigados a participar dos encontros de formação.
Acredito que esta divisão de formação docente da universidade pode se apresentar como um
lugar de experiências-pilotos (MORIN, 2013) que contribuam para as Reformas sugeridas,
além de se apresentar também como um passo importante para se pensar e refletir sobre a
avaliação da aprendizagem, se a formação aí proposta partir de um viés auto-
heteroecoformador.
Proporcionar uma auto-heteroecoformação de professores para a avaliação da
aprendizagem colaborará para a concretização de todas as Reformas para o estabelecimento
do paradigma da complexidade. A avaliação tradicional, em oposição à formativa, corrobora
para a disseminação do pensamento simplificador, bem como para a alienação do pensamento
154
que não saberá ligar as disciplinas, encarar o erro e a incerteza como características inerentes
à vida e às relações. Formar para aprender a avaliar proporcionará também reflexões que
poderão originar em novas formas de avaliar e ecologizar o conhecimento.
O percurso de pesquisa deste trabalho não se deparou com entraves que dificultaram o
desenvolvimento das ideias, tanto no aspecto teórico, como para a coleta e análise de dados.
As obras da complexidade e da transdisciplinaridade foram de fácil acesso, bem como as de
avaliação. Vale ressaltar que no campo da LA, já existem vários pesquisadores que trabalham
para o desenvolvimento do pensamento complexo como foi demonstrado por Franco (2013).
Encontrar duas obras que tratam a avaliação pelo viés da transdisciplinaridade (STRIEDER;
BENVENUTTI; BAVARESCO, 2014) e (GALEFFI, 2009), no fim do percurso de
investigação também foi muito importante para o desenrolar da pesquisa. O que demonstrou
que existem pesquisadores de outras áreas do conhecimento que se já preocupam com a
avaliação da aprendizagem desenvolvida pelo viés da complexidade e transdisciplinaridade.
Creio que este trabalho é inovador quando propõe e enxerga a necessidade de uma
auto-heteroecoformação de professores e formadores para a avaliação da aprendizagem. Com
base nisto, pretendo dar continuidade, em futuras pesquisas, ao desenvolvimento de uma
proposta de auto-heteroecoformação a ser apresentada, por exemplo, à divisão de formação
docente da universidade do curso de Letras, alvo deste estudo de caso. Outra possibilidade de
proposta, que poderá ser desenvolvida enquanto pesquisa-ação, seria a tentativa de por em
prática, em um ambiente de ensino de línguas, por exemplo, uma abordagem complexa
(BORGES; PAIVA, 2011) que fizesse uso de recursos de ensino e avaliação pautados na
complexidade e transdisciplinaridade.
A auto-heteroecoformação enquanto proposta de formação de professores precisa se
concretizar não apenas no ensino básico, mas em todos os níveis de ensino. Do mesmo modo
que ela deve acontecer não apenas no domínio da avaliação, mas em todas as áreas do
conhecimento que trazem contribuições no sentido de reformar o pensamento, o ensino e o
conhecimento para o desenvolvimento de um olhar complexo do mundo, das relações e da
vida.
É em torno da vida que a educação deve se pautar, ensinar a viver é, para Morin
(2005; 2013; 2014), o objetivo primordial do ensino, portanto, acredito que também será o da
avaliação que se quer formativa:
A vida é multidimensional. Nela se articulam em complementação e
antagonismo os diferentes aspectos da condição humana. E para Morin o
objetivo da educação é ensinar a viver, ensinar a realizar a autopoiese de cada
indivíduo em sociedade e com a natureza (auto-eco-organização). Ensinar a
155
viver não seria apenas transmitir conhecimentos, mas permitir, possibilitar, as
transformações interiores no ser, necessárias para a realização de si mesmo
como sujeito (CAMARGO, 2006, p.109).
Nesse sentido,
Ensinar a viver necessita não só dos conhecimentos, mas também da
transformação, em seu próprio ser mental, do conhecimento adquirido em
sapiência, e da incorporação dessa sapiência para toda a vida [...]. Viver exige
de cada um [...] a mobilização de todas as aptidões humanas (MORIN, 2005a,
p.47 e 54).
E para ensinar a viver é indispensável que a vida e o ensino dos docentes sejam
pautados pelo Eros (MORIN, 2013; 2014). Platão, segundo Morin (2014), pondera que para
ensinar é necessário o Eros, isto é, o amor. Neste viés, considero que o educador que
direciona sua prática avaliativa pelo Eros, vê a avaliação como negociação e oportunidade de
aprendizagem ao invés de enxergá-la como instrumento de poder.
O objetivo da Reforma da educação que é finalmente a do „bem viver‟ de cada
um e de todos, notoriamente para os professores e alunos, necessita de uma
regeneração do Eros. [...] Para os que sentem vocação para ensinar, o Eros
está presente no amor pelo saber que eles oferecerão, no amor pela juventude
a ser educada. [...] A regeneração da educação depende da regeneração da
compreensão, que depende da regeneração do Eros, que depende da
regeneração das relações humanas, as quais dependem da reforma da educação
(MORIN, 2014, p.129-131).21
Por fim, destaco a já célebre fala de Carl Gustav Jung, quando ele afirma que “onde há
poder não existe amor; e onde há amor, não existe poder”, assim sendo, avaliar com fins
classificatórios e excludentes é usar do poder da avaliação indo contra o Eros que deve estar
presente em qualquer prática de ensino e/ou avaliação.
21
Tradução da autora para: “Le but de la reforme de l’éducation qui est finalement le ‘bien vivre’ de chacun et de tous, notamment pour les enseignants et pour les enseignés, nécessite de part et d’autre une régénération de l’Éros. [...] Chez ceux qui ont ressenti la vocation d’enseigner, l’Éros était présent, dans l’amour pour le savoir qu’ils dispenseraient, l’amour pour la jeunesseà éduquer. [...] La régénération de l’éducation dépend de la régénération de la compréhension, qui dépende la régénération de l’Éros, qui dépend de la régénération des relations humaines, lesquelles dépendent de la réforme de l’éducation” (MORIN, 2014, p. 129-131).
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162
APÊNDICES
Apêndice A - Roteiro da entrevista
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA
INSTITUTO DE LETRAS E LINGUÍSTICA
PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS LINGUÍSTICOS
Mestranda: Ludmila Nogueira de Almeida
Roteiro da entrevista a ser feita com os professores das disciplinas de Linguística Aplicada ao
Ensino, Metodologia de Ensino e Estágio Supervisionado.
ENTREVISTA ( FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA AVALIAÇÃO)
QUESTÕES ORIENTADORAS
- Para você, quais são as características de uma boa avaliação?
- Em quais momentos você submete os seus alunos a avaliações?
- E depois que são feitas essas avaliações, como você passa para seus alunos os resultados
dessas avaliações?
- Em seu Plano de Ensino, existe uma prática, um instrumento avaliativo que se destaca dos
demais?
-Você aborda no decorrer da disciplina tópicos específicos que discutem os procedimentos
avaliativos? Se sim, quantas aulas? Seguindo quais concepções teóricas?
-Em que momento deve ser trabalhado o tópico Avaliação durante a formação de um
professor de línguas?
-Em sua opinião, o ambiente vivenciado pelo professor em formação no curso de Letras desta
instituição, favorece uma experiência com práticas avaliativas inovadoras?
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Apêndice B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Você está sendo convidado (a) para participar da pesquisa intitulada “A formação de professores de línguas do curso de Letras de uma Universidade do interior do Brasil: A Avaliação em questão”, sob a responsabilidade dos pesquisadores Ludmila Nogueira de Almeida e Maria Inês Vasconcelos Felice. Nesta pesquisa nós estamos buscando entender como se processa a formação de professores de línguas desta instituição, no que concerne a avaliação. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será obtido pelo pesquisador Ludmila Nogueira de Almeida antes de fazer as intervenções com os sujeitos envolvidos. Na sua participação você será convidado(a) a responder uma entrevista que será gravada. O pesquisador também necessitará de um instrumento de avaliação, podendo este ser uma prova. De posse das informações oriundas destes diferentes instrumentos de coleta de dados, poderemos elaborar conclusões consistentes, no que concerne a formação de professores de línguas. Informamos e asseguramos que as entrevistas a serem gravadas serão desgravadas logo após a transcrição. Em nenhum momento você será identificado. Os resultados da pesquisa serão publicados e ainda assim a sua identidade será preservada. Você não terá nenhum gasto e ganho financeiro por participar na pesquisa. O único risco que os participantes poderão correr será o de serem identificados. Para minimizar esse risco iremos tomar os devidos cuidados na descrição dos dados, não colocando nenhum item que aponte alguma forma de identificação. Caso os resultados advindos do trabalho sejam divulgados em eventos científicos, os participantes serão previamente avisados. A pesquisa não apresentará benefícios diretos aos participantes, no entanto, de posse dos seus resultados poderão deles fazer uso, pois aí encontrarão instrumentos e referenciais teóricos para o tópico avaliação no ensino-aprendizagem de línguas. A pesquisa também poderá trazer contribuições importantes para os estudos da Linguística Aplicada ao ensino de línguas, pois faremos uso de seus postulados teóricos, investigando especificamente a avaliação no ensino e aprendizagem. Isso porque tentaremos identificar quais são as necessidades atuais desta área específica, no contexto de pesquisa escolhido, problematizando e propondo, por conseguinte, novas práticas ou destacando práticas que já foram propostas e que podem ser viáveis à comunidade. Você é livre para deixar de participar da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo ou coação. Uma via original deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ficará com você. Qualquer dúvida a respeito da pesquisa, você poderá entrar em contato com:
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Ludmila Nogueira de Almeida Endereço Profissional: Universidade Federal de Uberlândia Central de Línguas - Instituto de Letras e Linguística Av. João Naves de Ávila, 2160 Santa Mônica 38400-902 - Uberlândia, MG - Brasil Telefone: (34) 3239-4007 Maria Inês Vasconcelos Felice Endereço Profissional: Universidade Federal de Uberlândia Instituto de Letras e Linguística Av. João Naves de Ávila, 2160 Santa Mônica 38400-902 - Uberlândia, MG - Brasil Telefone: (34) 3239-4237 . Poderá também entrar em contato com o Comitê de Ética na Pesquisa com Seres-Humanos – Universidade Federal de Uberlândia: Av. João Naves de Ávila, nº 2121, bloco A, sala 224, Campus Santa Mônica – Uberlândia –MG, CEP: 38408-100; fone: (34) 32394131
Uberlândia, 01 de novembro de 2013
_______________________________________________________________ Maria Inês Vasconcelos Felice
_______________________________________________________________ Ludmila Nogueira de Almeida
Eu aceito participar do projeto citado acima, voluntariamente, após ter sido devidamente esclarecido.
________________________________________________________ Participante da pesquisa