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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA INSTITUTO DE GEOGRAFIA
CURSO DE GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA – BACHARELADO
EXPANSÃO CANAVIEIRA E IMPACTOS SÓCIO-ESPACIAIS DA PRODUÇÃO DE
AGROCOMBUSTÍVEL NO TRIÂNGULO MINEIRO (1980-2011)
NATÁLIA LORENA CAMPOS
UBERLÂNDIA-MG 2011
NATÁLIA LORENA CAMPOS
EXPANSÃO CANAVIEIRA E IMPACTOS SÓCIO-ESPACIAIS DA PRODUÇÃO DE
AGROCOMBUSTÍVEL NO TRIÂNGULO MINEIRO (1980-2011)
Monografia apresentada ao Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia como requisito a obtenção do título de Bacharel em Geografia. Orientador: João Cleps Junior
UBERLÂNDIA-MG
2011
NATÁLIA LORENA CAMPOS
EXPANSÃO CANAVIEIRA E IMPACTOS SÓCIO-ESPACIAIS DA PRODUÇÃO DE
AGROCOMBUSTÍVEL NO TRIÂNGULO MINEIRO (1980-2011)
Uberlândia, 16 de dezembro de 2011
Banca Examinadora
______________________________________________________________
Prof. Dr. João Cleps Junior (Orientador) – UFU
______________________________________________________________
Prof. Dr. Marcelo Cervo Chelotti – UFU
______________________________________________________________
Prof. Me. Eduardo Rozetti de Carvalho - FINOM
"Agradeço todas as dificuldades que enfrentei; não fosse por elas, eu não teria
saído do lugar. As facilidades nos impedem de caminhar. Mesmo as críticas
nos auxiliam muito".
Chico Xavier
AGRADECIMENTOS
Agradecer: mostrar, demonstrar gratidão segundo o Aurélio. Gratidão tenho muita, a muitas
pessoas, em muitos momentos de minha vida. Ao deixar essas linhas de agradecimentos as
“minhas pessoas” me deparo com certo medo... Medo de esquecer alguém importante, em
algum momento da vida...
Agradeço a minha família, especialmente aos meus pais Maria e Paulo, que estiveram sempre
comigo, apoiando todas as minhas decisões e souberam conviver com a distância e as visitas
corridas durante minha fase de formação acadêmica. Vocês são os responsáveis por moldarem
o meu caráter. Juntos ou separados, a vocês meus mais sinceros obrigada!
A Lívia, irmã querida, amiga, companheira em todos os momentos da minha vida. Nossos
encontros e desencontros só reforçaram nossos laços familiares. Também as minhas meninas,
anjinhos da minha vida Babi, Julie, Nina... Meus meninos, Léo, Juninho e Chiquinho... Amo
vocês, saudades sempre. Cada um com seu jeitinho especial que me enche de carinho.
Ao João Cleps, meu orientador e amigo, por confiar no meu trabalho, me mostrar os
caminhos da pesquisa e despertar o desejo de continuar trilhando esse caminho. Muito
obrigada pela oportunidade de trabalhar com você.
As minhas amigas queridas, Bruna, Kárita, Lais e Thainá. Obrigada por existirem na minha
vida e tornar meu mundo mais alegre, e é claro, mais rosa. Vocês fazem parte da minha vida
pra sempre. Amo vocês!
Ao Geraldo, um anjo que surgiu na minha vida e conquistou um lugar especial no meu
coração. Por você tenho profunda admiração, carinho e respeito. Muito obrigada por sempre
me ajudar quando precisei e também poder te ajudar no que pude. Você é o meu maior
orgulho. Amo você! Terá pra sempre minha eterna gratidão.
Aos meus amigos do curso de Geografia, Henrique (Gigante), Mariana, Marcelo (Tio Uepa),
Ana Flávia, Vinícius, Éder, Sávio... Obrigada pelos momentos especiais!
Meus amigos da juventude, Giovanna, Marisa, Gabi, Vanessa, Mariana, Dani, Virgínia,
Thiago, Serginho, Grazi, Léo, Luciano... Saudades e lembranças inesquecíveis.
Ao Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA, minha segunda casa, muitas vezes a
primeira, lugar onde eu me territorializei e me reterritorializei em vários momentos da vida.
Ao meu “amigo irmão” Ricardo (Freitas), obrigada pela amizade e carinho de todos os dias e
trocas de experiências e ideias. Com ele e a Andrêza muito aprendi.
Não posso deixar de mencionar meus outros dois queridos “amigos irmãos” Fabiana e
Ricardo (Leite). Vocês são especiais pra mim. Obrigada pela amizade, companhia, além das
conversas e brincadeiras.
Aos meus amigos do LAGEA, Geraldo, Lucimeire, Andrêza, Luciana, Ricardo Freitas,
Ricardo Leite, Fabiana, Airton, Danielle, Virna, Taiana, Felipe, Jéssica, Wesley, Thiago,
Francisco, Renata, Humberto, Eduardo... Obrigada pela amizade, conversas e trocas de
experiências. Aprendi muito com vocês.
Aos professores do LAGEA, João, Marcelo, Vera e Geisa. Obrigada pelos ensinamentos e
amizade.
Aos professores do Instituto de Geografia, Vânia(s), Nishyama, Sylvio Andreozzi, Gláucia,
Willian, Douglas, Julio e todos os outros. Obrigada pela contribuição na minha formação
como professora e geógrafa.
Ao Marcelo Chelotti e Eduardo por aceitar o convite em participar da minha banca de defesa.
As contribuições serão sempre bem vindas.
A Mizmar pelo carinho e atenção, sempre me socorrendo nos momentos de desespero.
Ao CNPq e Fapemig pelas bolsas de iniciação científica.
Por fim a Deus, por proporcionar essas pessoas singulares na minha vida. Sem Ele nada disso
seria possível. Obrigada!
RESUMO
O tema da monografia envolve a produção de agrocombustíveis e a expansão da produção canavieira na região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, que é uma das principais discussões da questão agrária atual, a partir do agravamento de problemas no campo, como a incorporação de terras para a monocultura canavieira. Como principais objetivos do trabalho, buscamos compreender as dimensões socioterritoriais da expansão da produção canavieira recente para a produção de agrocombustíveis no espaço agrário de Minas Gerais e suas relações com as estruturas sociais rurais (principalmente a produção camponesa/familiar); analisar o desenvolvimento da agroindústria canavieira frente as demais produções agrícolas e pecuária da região e verificar os principais impactos da expansão dessa monocultura. Para alcançar os objetivos foi realizado uma ampla revisão bibliográfica da temática afim e levantamento de dados e informações em fontes secundárias. Nesse sentido, temos a apropriação dos territórios para a produção canavieira como a principal causa dos conflitos e disputas territoriais no campo brasileiro, onde a industrialização da agricultura subordina a natureza ao capital. Preocupações a respeito dos impactos, problemas ambientais e a forma insustentável da produção de agrocombustíveis refletem os problemas do desenvolvimento econômico gerado pelo setor, que não leva em consideração o desenvolvimento social. Não podemos deixar de questionar até que ponto esse desenvolvimento econômico é positivo tendo que esse lucro obtido venha a ser utilizado na exportação de alimentos, em um país com grande vocação agrícola como o Brasil.
Palavras-chave: Agrocombustíveis. Agroindústria canavieira. Cana-de-açúcar. Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.
LISTAS DE ILUSTRAÇÕES
LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Movimento espacial do capital agroindustrial canavieiro do Nordeste para outras regiões do Brasil (2007)
71
Figura 2 – Fluxo da mão-de-obra para a agroindústria canavieira no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2009)
LISTA DE FLUXOGRAMA
88
Fluxograma 1 – Processo produtivo a partir da cana-de-açúcar
LISTA DE GRÁFICOS
31
Gráfico 1 – Minas Gerais – Unidades Sucroenergéticas por Mesorregião (2011) 67
Gráfico 2 – Evolução da área plantada de cana-de-açúcar e número de usinas instaladas na Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1990 a 2009)
LISTA DE MAPAS
82
Mapa 1 – Localização da Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba 15
Mapa 2 – Minas Gerais – Zoneamento da cultura da cana-de-açúcar (2008) 59
Mapa 3 – Minas Gerais – Unidades Sucroenergéticas instaladas e projetadas (2011) 60
Mapa 4 – Minas Gerais – Zoneamento Ecológico Econômico (2008) 62
Mapa 5 – Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba – Unidades Sucroenergéticas (1980 -1989)
68
Mapa 6 – Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba – Unidades Sucroenergéticas (1980 -1999)
69
Mapa 7 – Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba – Unidades Sucroenergéticas (1980 -2009)
69
Mapa 8 – Brasil – Produção de cereais, leguminosas e oleaginosas e empresas mundiais (2007)
76
Mapa 9 – Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1990)
78
Mapa 10 – Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1995)
79
Mapa 11 – Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2000)
79
Mapa 12 – Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2005)
80
Mapa 13 – Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2009)
81
Mapa 14 – Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1990)
83
Mapa 15 – Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1995)
83
Mapa 16 – Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2000)
84
Mapa 17 – Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2005)
85
Mapa 18 – Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2009)
LISTA DE ORGANOGRAMAS
85
Organograma 1 – Principais etapas do planejamento agroindustrial canavieiro no Brasil (1930-1975)
26
Organograma 2 – Etapas do processo produtivo dos subprodutos da cana-de-açúcar
LISTA DE QUADROS
32
Quadro 1 – O conceito de agribusiness e a abordagem sistêmica 24
Quadro 2 – Principais fases da produção de biocombustíveis no Brasil (1973-2011) 46
Quadro 3 – Principais fases do desenvolvimento da agroindústria canavieira do Brasil (Séculos XIX e XX)
53
Quadro 4 – Principais agentes atuantes e desafios da agroindústria canavieira no Brasil
56
Quadro 5 – Minas Gerais – Relação das Unidades Sucroenergéticas Instaladas e Projetadas (2011)
64
Quadro 6 – Inserção do capital estrangeiro e aquisição de unidades em Minas Gerais (2001-2011)
73
Quadro 7 – Caracterização das agroindústrias canavieiras implantadas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2011)
108
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Comparação das fontes alternativas na produção do etanol 28
Tabela 2 – Brasil – Quantidade produzida de cana-de-açúcar (1990 a 1999) 51
Tabela 3 – Produção canavieira nos principais estados do Brasil (2011) 57
Tabela 4 – Variação da área planatada (%) de cultivos selecionados na Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2007-2009)
77
Tabela 5 – Área de agricultura, pecuária e florestas substituídas pela cana-de-açúcar (ha.) (2007-2008)
86
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AIAA – Associação das Indústrias de Açúcar e Álcool
AFES – Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade
ANP – Agência Nacional do Petróleo
CAI – Complexo Agroindustrial
CENAL – Comissão Executiva Nacional do Álcool
CNAA – Companhia Nacional de Açúcar e Álcool
CNAL – Conselho Nacional do Álcool
CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
CEAM – Comissão de Estudos sobre o Álcool Motor
CEMIG – Companhia Energética de Minas Gerais
CIMA – Conselho Nacional do Açúcar e do Álcool
CO2 – Dióxido de Carbono
COPAM – Conselho de Política Ambiental
COPERSUCAR – Cooperativa Central dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São
Paulo
CPDA - Comissão de Defesa da Produção do Açúcar
DATALUTA – Banco de Dados da Luta pela Terra
EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
FAPEMIG – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais
FETAEMG – Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado de Minas Gerais
GEE – Gases do Efeito Estufa
IAA – Instituto do Açúcar e do Álcool
IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
LAGEA – Laboratório de Geografia Agrária
MG – Minas Gerais
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
PA – Projeto de Assentamento
PAM – Produção Agrícola Municipal
PLANALSUCAR – Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar
PROÁLCOOL – Programa Nacional do Álcool
PT – Partido dos Trabalhadores
SAA – Sistema Agroalimentar
SIDRA – Sistema IBGE de Recuperação Automática
SIAMIG – Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool no Estado de Minas Gerais
SINDAÇÚCAR – Sindicato da Indústria do Açúcar no Estado de Minas Gerais
SOPRAL – Sociedade Produto, Açúcar e Álcool
SUCRAL – Soluções em Açúcar, Etanol e Co-geração
UDOP – União dos Produtores de Bioenergia
UNICA – União da Indústria de Cana-de-açúcar
ZEE – Zoneamento Ecológico-Econômico
SUMÁRIO INTRODUÇÃO 14
1. O AGRONEGÓCIO CANAVIEIRO E A PRODUÇÃO DE AGROCOMBUSTÍVEIS: conceituações e caracterização
21
1.1. O Complexo agroindustrial e o agronegócio (agribusiness) 21 1.2. A agroindústria canavieira e o planejamento estatal 25 1.3. De setor sucroalcooleiro ao setor sucroenergético 29 1.4. Os Territórios e a produção de agrocombustíveis 32 1.4.1. Conflitos e disputas territoriais 36
2. HISTÓRICO DA PRODUÇÃO CANAVIEIRA NO BRASIL E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCENTIVO A PRODUÇÃO DO ETANOL
39
2.1. Breves considerações sobre a produção canavieira no Brasil 39 2.2. As crises do petróleo e a dinâmica agroindustrial a partir da década de 1970 43 2.3. Principais fases do Programa Nacional do Álcool - PROÁLCOOL 46 2.3.1. Primeira fase (1975-1979) 47 2.3.2. Segunda fase (1980-1985) 48 2.3.3. A fase da desregulamentação e reestruturação do setor alcooleiro (1985-1995)
49
2.4. A expansão da agroindústria canavieira em Minas Gerais 58 2.5. O Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) e a expansão da monocultura canavieira
60
3. A CONFIGURAÇÃO DA AGROINDÚSTRIA CANAVIEIRA EM MINAS GERAIS E AS CONSEQUÊNCIAS DA PRODUÇÃO DE AGROCOMBUSTÍVEIS NO TRIÂNGULO MINEIRO/ALTO PARANAÍBA
64
3.1. A expansão da agroindústria canavieira na Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1980-2009)
64
3.2. Os principais grupos econômicos atuantes e a presença do capital estrangeiro no setor canavieiro
70
3.3. Impactos da expansão da monocultura canavieira na agricultura e pecuária de Minas Gerais
74
3.3.1. Impactos da monocultura canavieira sobre o trabalho 87 3.3.2. Impactos da produção canavieira sobre a produção rural familiar e camponesa e nos assentamentos rurais do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
91
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS 95
5. REFERÊNCIAS 99
14
INTRODUÇÃO
O tema principal deste trabalho envolve a produção de agrocombustíveis1, mais
precisamente a expansão da produção canavieira na região do Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba, que é uma das principais discussões da questão agrária atual, a partir do
agravamento de problemas como a escassez dos combustíveis fósseis, em particular do
petróleo. Devido às crises ocorridas no setor sucroenergético, o Estado passou a
incentivar a produção do etanol como combustível alternativo em substituição ao
petróleo, que se tornara uma opção cara no cenário mundial. Foi a partir da década de
1970 e com o Primeiro choque do petróleo, em 1973, que o governo brasileiro passou a
incentivar essa produção, com a criação do Programa Nacional do Álcool – Proálcool,
em 1974. O Proálcool tinha como objetivo estimular a produção do álcool com a
finalidade de atender as necessidades do mercado interno e externo e a política de
combustíveis automotivos.
Frente às crises do petróleo houve um incentivo à instalação e manutenção de
destilarias e novas usinas de cana-de-açúcar em todo país, principalmente no estado de
São Paulo, onde o município de Ribeirão Preto e seu entorno se destaca na produção do
álcool combustível. Recentemente, nesse processo, Minas Gerais registra um aumento
significativo na implantação de usinas, que teve início a partir da década de 1980 em
diversas regiões do estado. Foi a partir da década de 1990 e, principalmente, durante a
década de 2000 que o número de usinas aumentou vertiginosamente, passando de 7 para
59 unidades, sendo destas 47 já instaladas e 12 projetadas. A mesorregião do Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba concentra 35 das unidades instaladas e projetadas em Minas
Gerais.
1 Os agrocombustíveis são combustíveis produzidos na agricultura. Os agrocombustíveis se dividem em três grupos fundamentais: Os combustíveis originários da sacarose/açucares vegetais, do qual resultam diversos tipos de álcool, e em especial o etanol que é o tipo específico para gerar combustão num motor. Pode-se produzir etanol da cana de açúcar, mandioca, milho, batata doce, etc. O grau de conversão desse tipo de agrocombustível é de 30/100. Ou seja, para produzir 100 litros de etanol, vamos gastar 30 litros de alguma outra energia, seja de petróleo, ou do próprio etanol; o segundo grupo são os combustíveis originários dos óleos vegetais, que podem mover motores. É o caso dos óleos vegetais originários dos grãos da soja, amendoim, girassol, ou de das sementes de plantas como a mamona, tungue, pinhão-manso e a palma africana. O grau de conversão desse tipo de combustível é de 3 a 15 por 100 litros; e há um terceiro grupo, que seria o metanol, uma espécie de álcool combustível que pode ser retirado da madeira, de resíduos de lenha e dos resíduos da celulose. O grau de conversão desse tipo de combustível é de apenas 50 por 100 (STÉDILE, s/d).
15
Mapa 1: Localização da Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
Fonte: Geominas, 2011; Base cartográfica: Eduardo Paulon Girardi Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
A partir dessas questões, o objetivo central da pesquisa é compreender as
dimensões socioterritoriais da expansão da produção canavieira recente para a produção
de agrocombustíveis no espaço agrário de Minas Gerais e suas relações com as
estruturas sociais rurais (principalmente a produção camponesa/familiar), analisar o
desenvolvimento da agroindústria canavieira em Minas Gerais, na mesorregião do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba assim como seus aspectos frente as demais produções
agrícolas e pecuária da região, a fim de verificar os principais impactos da expansão
dessa monocultura ao pequeno produtor rural, aos assentados da reforma agrária e as
discussões levantadas a respeito do crescimento da monocultura canavieira, que ocupam
extensas áreas que poderiam ser utilizadas para a produção de alimentos básicos para a
população.
No intuito da realização desse estudo e para a obtenção dos objetivos
pretendidos, foi realizada num primeiro momento uma revisão bibliográfica acerca de
alguns teóricos estudiosos da temática e consulta em fontes qualitativas como relatórios
e jornais, para melhor compreensão das temáticas do agronegócio, do território
(disputas territoriais e conflitos), do setor sucroenergético, a fim de compreender sua
16
expansão em áreas de cerrado (o caso da mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba – área de estudo da pesquisa), a questão agrária existente – o agronegócio
versus agricultura camponesa/familiar – nesse ponto destacamos os embates entre essas
duas frentes de produção assim como as disputas territoriais que marcam o processo de
produção agrícola atual.
São importantes também os estudos acerca da territorialização do capital
produtivo, a inserção de grupos econômicos estrangeiros a frente das unidades
sucroalcooleiras da mesorregião. Essas temáticas deram suporte especial para a pesquisa
no que diz respeito às mudanças do espaço agrário brasileiro, sobretudo do estado de
Minas Gerais.
As reportagens veiculadas pela mídia permitiram a compreensão do
desenvolvimento do setor sucroenergético, os investimentos, além de abordar os
problemas da produção canavieira e sua expansão. Durante a elaboração desse trabalho
foi criado um acervo de reportagens pertinentes a temática que ajudaram a compreensão
da dinâmica do setor.
Num segundo momento foi feito um levantamento de dados em fontes
secundárias a fim de coletar as informações necessárias a respeito da dinâmica do setor
sucroalcooleiro que sofre constantes mudanças de acordo com as necessidades
econômicas do país. Para isso consultamos fontes importantes como o IBGE na coleta
dos dados da Produção Agrícola Municipal – PAM no Sistema IBGE de Recuperação
Automática – SIDRA. Foram coletados dados da produção canavieira e da área plantada
de cana-de-açúcar em todos os municípios do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba a fim
de mapeá-las trazendo sua evolução. Os dados da PAM vão de 1990 a 2009.
Outra fonte consultada foi a União dos Produtores de Bioenergia – UDOP onde
foram contabilizadas as usinas projetadas e instaladas em Minas Gerais. A UDOP e a
União da Indústria de Cana-de-açúcar – UNICA foram as responsáveis pelas coletas de
informações do setor, além de permitir o mapeamento dessas unidades.
O Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool no Estado de Minas Gerais –
SIAMIG teve grande contribuição em diversos dados utilizados na pesquisa como de
produção, desenvolvimento do setor, dados atuais sobre os desafios e perspectivas dos
empreendimentos canavieiros de Minas Gerais.
17
Em relação às unidades alcooleiras do estado de Minas Gerais, foi feito um
levantamento minucioso de todas as unidades (instaladas e em projeto de instalação),
assim como o ano de instalação e/ou previsão da instalação a fim de mapear essas
unidades por períodos de implantação, o que propiciou a compreensão da finalidade
dessa crescente instalação de usinas no estado e na mesorregião do Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba. Para o mapeamento foi utilizado softwares como o Arcgis 3.2,
bases cartográficas do GeoMinas para os mapas da produção e área plantada e base
fornecida pelo Prof. Eduardo Girardi na confecção dos mapas de localização das usinas.
Para finalização dos mapas foi utilizado o Corel Draw 5.0.
Para a caracterização das agroindústrias no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
realizou-se um levantamento da produção (em toneladas), da área produzida (em
hectares), da capacidade da usina, grupo econômico e origem do capital que estão
presentes no estudo. A obtenção desses dados foi possível através de sites das próprias
usinas, contato por e-mail e coleta de dados da SUCRAL, principalmente em relação à
capacidade das usinas.
Antes da justificativa do trabalho, é importante trilhar a trajetória como
pesquisadora até o desenvolvimento da pesquisa, que resultou na monografia. Tudo
começou em 2008, ano que entrei no Laboratório de Geografia Agrária atuando como
estagiária voluntária no projeto Banco de Dados da Luta pela Terra – DATALUTA.
Logo veio a oportunidade de atuar como bolsista de extensão no projeto, onde a
participação de reuniões e encontros trouxe um amadurecimento e melhor compreensão
da questão agrária e da importância do projeto, além da experiência de conhecer pessoas
e professores envolvidos no projeto e o desenvolvimento das primeiras produções.
Em 2010 foi quando comecei a trilhar na temática do agronegócio e da produção
de agrocombustíveis na iniciação científica financiada pelo CNPq, não deixando de lado
as atribuições do DATALUTA. Nessa trajetória, agora no ano de 2011, tive a
oportunidade de participar do projeto “Agrocombustível e Soberania Alimentar:
desenvolvimento territorial e as novas fronteiras da reprodução do capital
sucroalcooleiro nos cerrados de Minas Gerais” como bolsista de apoio técnico pela
FAPEMIG. Esse projeto tem por objetivo compreender as dimensões socioterritoriais da
expansão da produção recente de agrocombustível no espaço agrário de Minas Gerais e
suas relações com as estruturas sociais rurais (principalmente da produção
18
familiar/camponês) e a reprodução dos capitais e seu papel no modelo de
desenvolvimento e debate sobre a crise alimentar, e conta com uma equipe de
pesquisadores do LAGEA e da Rede DATALUTA.
A monografia apresentada é fruto do desenvolvimento dessa pesquisa, ainda em
andamento e com pesquisas de campo previstas. Nessa fase, buscamos uma
caracterização do setor canavieiro em Minas Gerais a partir da coleta de dados e
informações a respeito do desenvolvimento da produção sucroenergética e as
implicações nos embates da questão agrária atual.
Como justificativa da pesquisa, temos a importância da análise dos impactos que
a monocultura canavieira tem gerado no território mineiro, na produção
camponesa/familiar (território campesino), que enfrenta constantes disputas e embates
contra o agronegócio. Os impactos discutidos nesse trabalho vão além da preocupação
da ameaça à agricultura. A questão do trabalho e do trabalhador também faz parte da
problemática da produção de agrocombustíveis, por ser um trabalho degradante e
precarizado. A sujeição dos trabalhadores nas lavouras canavieiras acarreta o processo
migratório que muitas vezes alteram a dinâmica local, onde alguns municípios não estão
preparados infraestruturalmente para alojarem essa mão-de-obra temporária, além de
dificilmente oferecer condições de saúde, alimentação, higiene, que são necessidades
básicas da população. Esse fator só é vantajoso para os empresários do setor e para a
acumulação capitalista.
São problemas como esses, principalmente de ordem social que preocupam e
desperta a necessidade de compreensão da expansão canavieira desenfreada em Minas
Gerais, sobretudo no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. O embate entre a agricultura
camponesa e o agronegócio é um dos principais problemas estruturais do modelo
capitalista em relação ao campo.
Nesse sentido, no primeiro capítulo conceituamos e caracterizamos o
agronegócio, as agroindústrias, a partir do conceito de complexo agroindustrial. Para
isso, utilizamos autores como Geraldo Muller (1989), José Graziano da Silva (1996) e
Alberto Passo Guimarães (1976). Em relação às agroindústrias canavieiras e o
planejamento agroindustrial, Tamás Szmerecsániy (1979) contribuiu no entendimento
desse processo. Vian (2003) e Belik (2007) também tiveram contribuições significativas
referentes à agroindústria canavieira. Nossa discussão teve como finalidade atingir até o
19
período recente (década de 2000), no que diz respeito à evolução do setor e as
perspectivas de produção que vão além da produção de açúcar e álcool.
A discussão territorial e a abordagem do território dos agrocombustíveis foram
de extrema importância para a compreensão dessa categoria, como expressão de análise
à constituição das tramas do agronegócio e a apropriação do espaço geográfico tendo o
território como lugar do desenvolvimento das agroindústrias. Os conflitos e as disputas
territoriais entre agronegócio e campesinato também estão caracterizadas nesse trabalho.
Raffestin (1993), Santos (1996), Haesbaert (2004), Saquet (2007), Oliveira (2004),
Thomaz Júnior (2002) auxiliaram essa discussão. Os territórios selecionados para a
pesquisa compreendem as principais localidades na qual vem sendo instaladas as
unidades produtoras e em termos gerais o contexto dos cerrados de Minas Gerais, que é
um dos espaços mais propício ao avanço da monocultura da cana e instalação de
empreendimentos pelos grandes capitais.
No segundo capítulo partimos do histórico da produção canavieira no Brasil e a
criação de políticas públicas para o setor. Iniciamos com uma breve discussão a partir
colonização do Brasil, dando mais destaque para a década de 1970 e a implantação do
Programa Nacional do Álcool – Proálcool (1975 – 1985), em suas diferentes fases e os
desdobramentos ao setor canavieiro até sua expansão em Minas Gerais a partir da
década de 1980. Autores como Bray; Ferreira; Ruas (2000), Vian (2003), Veiga Filho;
Ramos (2006) e Pereira (2007) auxiliaram nessa compreensão. Instituições como a
União da Indústria de Cana-de-açúcar – UNICA, União dos Produtores de Bioenergia –
UDOP e Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool no Estado de Minas Gerais –
SIAMIG, forma fundamentais na coleta de dados e informações atuais.
Nesse capítulo também é discutido o papel do Zoneamento Ecológico
Econômico de Minas Gerais como uma ferramenta importante para a expansão da
monocultura canavieira no estado, principalmente para a mesorregião do Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba. As contribuições de Sepúlveda (2008), pesquisador da
Fundação Estadual do Meio Ambiente do Estado de Minas Gerais – FEAM auxiliaram
na compreensão dessa importante ferramenta, pouco utilizada nas discussões da
Geografia Agrária.
No capítulo final (terceiro capítulo) focamos a expansão canavieira em Minas
Gerais e na mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. Trazemos a
20
configuração das agroindústrias na mesorregião, os grupos econômicos e o capital
estrangeiro envolvido. Essa caracterização é importante na compreensão do setor e o
seu desenvolvimento no estado a partir da sua forma de atuação.
O objetivo principal do capítulo é trazer a discussão sobre os impactos e os
problemas da produção de agrocombustíveis na sociedade e no trabalho. No caso dos
impactos da monocultura sobre a produção camponesa/familiar, temos estudos na região
que mostra a expansão canavieira em áreas próximas aos assentamentos, o que faz com
que o assentado sinta-se pressionado a arrendar sua terra ou manter sua produção
sofrendo efeitos negativos gerados pela sua expansão.
Nesse sentido, a importância da pesquisa refere-se na compreensão do setor
sucroenergético, a partir das políticas públicas voltadas ao setor, e o seu
desenvolvimento, criando uma gama de problemas referentes ao modelo de produção –
monocultura, voltado ao desenvolvimento do capital e geração de lucro aos empresários
do agronegócio e emblemático e prejudicial aos trabalhadores do campo, gerando a
crítica em relação ao capital investido no modelo do agronegócio e os baixos índices de
produção, superados pela agricultura camponesa e a pequena produção, responsável
pela alimentação dos brasileiros.
21
1. O AGRONEGÓCIO CANAVIEIRO E A PRODUÇÃO DE
AGROCOMBUSTÍVEIS: conceituações e caracterização
[...] o latifúndio efetua a exclusão pela improdutividade, o agronegócio promove a exclusão pela intensa produtividade2.
Bernardo Mançano Fernandes.
1.1. O Complexo agroindustrial e o agronegócio (agribusiness)
A agricultura brasileira passou por inúmeros processos de transformação ao
longo do tempo. Essas transformações foram responsáveis pelo desenvolvimento do
agronegócio. Antes da definição do conceito de agronegócio temos que passar por
elementos que desencadearam sua formação e desenvolvimento como modelo agrícola
voltado principalmente a exportação. A industrialização da agricultura pode ser
considerada como precursora do agronegócio.
O processo de industrialização da agricultura está diretamente ligado com a
modernização da agricultura, o que permitiu a utilização de novas tecnologias no
campo, como o uso de insumos agrícolas, fertilizantes, técnicas de adubação, entre
outros. “A modernização da agricultura atingiu de forma profundamente diferenciada
nas regiões do Brasil, modernizando-as, mas reforçando suas desigualdades
historicamente estabelecidas” (KAGEYAMA, 1986, p. 304), caracterizado pelos
latifúndios. Segundo Graziano da Silva (1982), esse processo de modernização se fez
acompanhar de unidades de produção cada vez maiores, com uma conseqüente
deteriorização da distribuição da renda no setor agrícola.
O longo processo de transformação da base técnica – chamado de modernização – culmina, pois, na própria industrialização da agricultura. Este processo representa na verdade a subordinação da Natureza ao capital que, gradativamente, liberta o processo de produção agropecuária das condições naturais dadas, passando a fabricá-las sempre que se fizerem necessárias. Assim, se faltar chuva, irriga-se; se não houver solos suficientemente férteis, aduba-se; se ocorrerem pragas
2 Extraído do texto Questão Agrária: conflitualidade e desenvolvimento territorial, Bernardo Mançano Fernandes (2004).
22
e doenças, responde-se com defensivos químicos ou biológicos; e se houver ameaças de inundações, estarão previstas formas de drenagem (GRAZIANO DA SILVA, 1996, p. 3).
O autor denomina como industrialização da agricultura o controle cada vez
maior da Natureza e a possibilidade de reprodução artificial das condições naturais da
produção agrícola. É a partir das transformações dos elementos naturais (meio rural)
através do processo industrial (meio urbano) que temos a industrialização da agricultura.
A industrialização da agricultura implica a passagem de um sistema de produção
artesanal a um sistema de base manufatureira (GRAZIANO DA SILVA, 1996). Em
relação a produção de alimentos, houve um declínio explicado pela modernização e
mercantilização das atividades agrárias. “Ao mesmo tempo em que se industrializa, a
agricultura se concentra e se internacionaliza” (MALASSIS, 1973).
No complexo rural, o que o determinava era a divisão do trabalho e a detenção
de todos os bens (insumos, máquinas e equipamentos) concentrados em um único lugar,
no caso uma fazenda, para a produção de determinado produto. O trabalho livre pode
ser considerado como desencadeante da crise do complexo rural e a mudança para o
complexo agroindustrial. Nesse sentido, temos o início da passagem do “complexo
rural” para os “complexos agroindustriais” que segundo José Graziano da Silva é:
CAIs: a substituição da economia natural por atividades agrícolas integradas à indústria, a intensificação da divisão do trabalho e das trocas intersetoriais, a especialização da produção agrícola e a substituição das exportações pelo consumo produtivo interno como elemento central da alocação dos recursos produtivos no setor agropecuário (GRAZIANO DA SILVA, 1996, p. 1).
Muller (1989) define como complexo agroindustrial a “integração entre
indústria-agricultura, na qual a produção agrária não se acha apenas na dependência das
solicitações do comércio, mas também de um conjunto de indústrias que tem nas
atividades agrárias seus mercados” (MULLER, 1989, p. 18). Ainda afirma que as
relações indústria e agricultura apresentavam um elevadíssimo grau de integração
intersetorial e, aspecto relevante, com praticamente todos os ramos localizados no país.
Assim, as empresas e grupos econômicos industriais, cresceram, expandiram, quando
não surgiram novas plantas, de capital nacional e estrangeiro. O mesmo ocorreu com as
agroindústrias (MULLER, 1989, p. 17).
23
Guimarães (1976) aponta o complexo agroindustrial como sendo uma
particularidade que distingue a agricultura atual da agricultura do passado. Diante da
crise, a agricultura mundial foi forçada a receber subsídios do Estado, integrar-se num
processo de concentração e de centralização de capitais, que contribuíram para a
formação do complexo agroindustrial. Para o autor, não apenas a agricultura se
industrializa como a indústria industrializa a agricultura (GUIMARÃES, 1982). Aponta
também que opção do Brasil pela modernização conservadora foi um lamentável
equívoco, pois resultou no fortalecimento do sistema latifundiário, elevando a
concentração da propriedade agrária (GUIMARÃES, 1976, p. 6), o que se ajustou a
estratégia agrícola mundial liderada pelo agribusiness.
Ramos (2007) analisa o conceito de complexo agroindustrial apontando o ponto
de vista de Alberto Passos Guimarães, Geraldo Muller e Tamás Szmerecsányi. O termo
de complexo agroindustrial passou a ser objeto de controvérsia na medida em que ele
passou a ser mais utilizado. A ideia do conceito foi criticada por ser um fato recente no
Brasil, assim como sua contribuição teórica/ metodológica do emprego do conceito. A
segunda crítica chamou a atenção para o fato de que a agregação que o conceito
pressupõe pode impedir que importantes particularidades da dinâmica econômica das
diferentes atividades envolvidas sejam devidamente captadas (RAMOS, 2007, p. 39-
40).
O autor mostra que devido a forma de separação das atividades entre produção
agrícola, transformação e distribuição constituiu diversas unidades de análise, sendo as
mais importantes o Complexo Agroindustrial (CAI), o Sistema Agroalimentar (SAA) e
o Agribusiness.
O agribusiness corresponde à organização das atividades agrícolas a partir das
relações com a indústria, conforme aponta Cleps Junior (1998) em sua tese de
doutorado. O termo foi proposto pela primeira vez nos anos 1950 pelos professores Ray
Goldberg e John Davis, da Universidade de Harvard. O conceito de agribusiness
(agronegócio em português) foi construído a partir de uma metodologia para estudo da
cadeia agro - alimentar, que sintetizava sua nova visão. O agribusiness envolve a soma
das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas, processamentos e
distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos a partir deles.
24
De acordo com esse conceito, a agricultura passa a ser abordada de maneira
associada aos outros agentes responsáveis por todas as atividades, que garantem a
produção, transformação, distribuição e consumo de alimentos, considerando assim,
como parte de uma extensa rede de agentes econômicos. Os investimentos no
agronegócio são essencialmente de capital estrangeiro, isso não anula a participação do
capital nacional, embora atualmente seja uma parcela pouco significativa.
Davis e Golberg identificaram dois níveis de agregados para explicar o conceito
de agribusiness.
No primeiro triagregado temos a indústria de insumos para a agricultura, a agricultura em si e o processamento e distribuição. O segundo triagregado, mais amplo, representa um outro corte mais largo que inclui serviços para a agropecuária, gastos do governo e o processamento de fibras e de alimentos em separado (BELIK, 2007, p. 144).
O quadro 1 sistematiza o conceito de agribusiness e suas abordagens sistêmicas.
Quadro 1: O conceito de agribusiness e a abordagem sistêmica
CONCEITO DE AGRIBUSINESS: “soma total das operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas; as operações de produção nas unidades agrícolas; e o armazenamento, processamento e distribuição dos produtos agrícolas e itens produzidos com eles”. Essas operações podem ser assim consideradas:
A ABORDAGEM SISTÊMICA – Os subsistemas componentes. 1. Produção agropecuária propriamente dita: gêneros de cultivo e criação. 2. Atividades de suporte ou de infraestrutura institucional: pesquisa, crédito, assistência técnica, treinamento de mão-de-obra, etc.
1. “Antes da porteira” (suprimentos à produção): indústrias fornecedoras de insumos e máquinas/equipamentos, pesquisa, assistência técnica, etc.
3. Insumos extra-setoriais: fertilizantes, máquinas e implementos, sementes, defensivos, corretivos, etc.
2. “Dentro da porteira” (produção agropecuária): produção dos bens vegetais e animais.
4. Canais de comercialização: estocagem, comércio atacadista e varejista, interno ou externo.
3. “Depois da porteira” (processamento, armazena-mento, distribuição): operações de estocagem, comercialização e, enfim, de atendimento ao consumidor final.
5. Processamento dos produtos agropecuários: ramos industriais que utilizam matérias-primas agropecuárias.
Fonte: Referencial teórico e analítico sobre a agropecuária brasileira. In: Dimensões do agronegócio brasileiro: políticas, instituições e perspectivas/ Pedro Ramos... [et al.], 2007. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
O agronegócio brasileiro é caracterizado pelas fases “Antes da porteira”,
caracterizada pelas indústrias fornecedoras de matérias-primas para a produção no
25
campo; “Dentro da porteira”, caracterizada pela produção propriamente dita (agrícola e
agropecuária); e “Depois da porteira”, momento da comercialização da produção.
O conceito de Sistema Agroalimentar foi criado na década de 1950 por Perroux.
Esse conceito é dividido em três subsistemas: Agroindustrial (agricultura + indústria),
Distribuição (comércio + restauração) e Transformação-Distribuição (indústria +
comércio + restauração). Os produtos agroalimentares compõem um subsistema de
produção-transformação-distribuição.
1.2. A agroindústria canavieira e o planejamento estatal
O conceito de agroindústria vai além do que a nomenclatura apresenta como
sendo a união entre agricultura e indústria. Essa união é a principal formadora do
conceito, mas, de acordo com Belik (2007) como única interpretação, implica em
comparações indevidas criando muitos problemas quando tratamos das comparações
setoriais. Não podemos generalizar a atuação das agroindústrias exclusivamente em
forma de setor, cada qual responsável por determinada atividade econômica, embora
com essa divisão torna-se possível verificar a estrutura e determinadas relações que
teriam desaparecido em uma análise dos grandes agregados.
A cerca desse fator o autor relata:
Historicamente a agroindústria nasceu a partir das atividades agrícolas. Já nos antigos complexos rurais, a agroindústria estava presente com o beneficiamento de matérias-primas e a sua conservação. Mais modernamente, as atividades industriais realizadas no interior das fazendas passaram a ser denominadas como indústria rural, um complemento das atividades agrárias. Mas, no passado, era muito difícil separar as chamadas indústrias rurais da indústria propriamente dita. As atividades industriais complementares à agricultura confundiam com a própria agricultura (BELIK, 2007, p. 143).
O crescimento da demanda por produtos beneficiados tornou a atividade da
indústria rural independente do meio agrário, deslocando-se para áreas urbanas. A
agroindústria moderna não é fruto da integração para frente dos capitais agrários, mas
sim através da integração para trás principalmente do capital financeiro, comercial e
industrial (BELIK, 2007).
26
O processo de formação agroindustrial dá-se a partir de um planejamento no
qual todas as etapas devem apresentar um retorno (feedback) e constituir um processo
interativo. Segundo Szmerecsányi (1979) o planejamento “é um processo de
intervenção racional na realidade sócio-econômica que não se limita apenas à
formulação de planos e programas de desenvolvimento”. De acordo com o autor, os
estágios do planejamento (no caso o planejamento agroindustrial) se dão da seguinte
forma:
Organograma 1: Principais etapas do planejamento agroindustrial canavieiro no Brasil (1930-1975)
Fonte: O planejamento da agroindústria canavieira do Brasil (1930-1975)/ Tamás Szmerecsányi, 1972. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Como em todo processo de planejamento, a primeira etapa a ser realizada é a do
diagnóstico (área foco do planejamento). Nela são definidos os objetivos da área a ser
planejada e a sua viabilidade. Após essa etapa, deve ser criadas políticas para o
desenvolvimento agroindustrial criando diretrizes gerais e específicas para o plano.
Após a execução do plano devem-se avaliar os resultados obtidos e com isso fazer as
reformulações necessárias ao planejamento. O planejamento agroindustrial é semelhante
27
ao planejamento do Zoneamento Ecológico Econômico que procura harmonizar as
relações econômicas, sociais e ambientais no ordenamento territorial brasileiro.
Os vários subprodutos da cana-de-açúcar, todos de grande utilidade, fez com que
a cultura canavieira tornasse uma importante atividade agrícola no país.
Devido ao seu valor de mercado, a cultura da cana-de-açúcar representa uma importante fonte de renda e de emprego para ponderáveis parcelas da população rural. Por outro lado, a ela se vincula diretamente um grande parque fabril – as usinas de açúcar, destilarias de álcool etc. – o qual também gera renda de empregos, e cuja produção tem amplo consumo doméstico e industrial, tanto dentro como fora do País (SZMERECSÁNYI, 1979, p. 41).
O desenvolvimento da agricultura canavieira deu-se em princípio para a
produção de açúcar que tinha uma crescente procura a partir do século XV, e foi um
fator determinante do surto da cultura canavieira em vários países, com destaque para o
Brasil.
O desenvolvimento da agroindústria canavieira teve um papel de grande relevo na história econômica do Brasil. Durante quase dois séculos após o descobrimento, ela constituiu praticamente o único pilar em que se assentava a economia colonial. Até a época, o Brasil era o maior produtor e exportador de açúcar do mundo. Daí em diante, apesar das numerosas crises havidas no subsetor, em consequência da perda da posição hegemônica do Brasil no mercado açucareiro mundial, a cana continuou sendo o principal produto comercial de sua agricultura, condição que só veio perder em fins do século passado, quando definitivamente se firmou o ciclo do café (SZMERECSÁNYI, 1979, p. 43).
Embora houvesse o surgimento de novos períodos econômicos, a cana-de-açúcar
ainda era considerada uma atividade econômica importante no setor agroindustrial e
ainda mantinha grande produção no Nordeste do país. O autor já destaca a crescente
produção de álcool de cana, destinadas a fins carburantes e industriais, como uma
importante fonte de redução e de substituição das importações de derivados do petróleo.
A produção de álcool combustível foi impulsionada pelo Estado, expandindo-se
para outras regiões do país. No final do século XIX houve uma necessidade de
modernização da produção para enfrentar a competição de outros países produtores,
tendo o açúcar ainda como principal produto da agroindústria canavieira. A produção de
álcool combustível foi incentivada a partir da década de 1970, onde o Estado criou
28
políticas de incentivo a essa produção. Foi nesse contexto de modernização que a região
Centro-Sul vivenciou esse momento de expansão, no qual a cultura canavieira obteve
sucesso nessa região.
A intervenção estatal a fim de modernizar os canaviais nordestinos não teve
êxito, pois a inserção de maquinário no processo produtivo impediu que a produtividade
do setor aumentasse, além do descrédito dos senhores-de-engenho que perderam o
controle sobre a totalidade do complexo produtivo do açúcar, base do poder político e
econômico desses agentes (VIAN, 2003). Nesse contexto, a região Centro-Sul começou
a receber suas primeiras unidades de produção e áreas de cultura da cana-de-açúcar.
Dentre elas, estavam unidades de origem nordestina – algumas filiais de
empreendimentos tradicionais do Nordeste que viu um potencial de desenvolvimento na
região, expandindo seu capital. Essa expansão deu-se não apenas devido ao descrédito
dos produtores nordestinos, mas também devido às constantes secas que motivaram o
envolvimento de novas áreas, e até mesmo a transferência de algumas unidades para o
Centro-Sul.
O estado de São Paulo e algumas regiões do Paraná foram o primeiro cenário da
produção canavieira no Centro-Sul. Essa produção obteve grande desenvolvimento
fazendo com que elas tornassem as maiores produtoras de açúcar e álcool do país. Tem-
se ai o desenvolvimento do setor sucroalcooleiro, voltado à produção de açúcar (prefixo
sucro) e/ou álcool (sufixo alcooleiro), diretamente relacionado às culturas de cana-de-
açúcar, principal insumo para o processo produtivo do açúcar e do álcool, além de mais
vantajoso em relação aos outros insumos utilizados para a produção em outros países,
como o milho e a beterraba. A tabela 1 apresenta a comparação dessas outras fontes em
relação à cana-de-açúcar.
Tabela 1: Comparação das fontes alternativas na produção do etanol
Matéria-prima Cana-de-açúcar Milho Beterraba
Região Brasil Estados Unidos União Européia
Custo de Produção (USD/litros)³
0,21 0,27 0,76
Balanço Energético 9,3 1,4 2,0
Redução das emissões de GEE (em %)
90 35 34
Fonte: UNICA, 2011/ SIAMIG, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
29
Temos que a produção de etanol através da cana-de-açúcar como matéria prima
se mostra mais vantajosa economicamente em relação ao seu custo de produção,
redução das emissões de GEE (Gases do Efeito Estufa), eficiência energética e
produtividade.
1.3. De setor sucroalcooleiro ao setor sucroenergético
O conceito de setor sucroalcooleiro vem perdendo sentido a partir do momento
em que a produção de derivados da cana vai além do açúcar e do álcool. Com o
desenvolvimento tecnológico é possível produzir energia elétrica (bioenergia), plástico e
o bio-hidrocarboneto que está sendo desenvolvido como um combustível de aviação, o
que seria uma espécie de diesel da cana. Sendo assim, o conceito passa por inúmeras
mudanças ao longo do tempo devido às inúmeras possibilidades de produção a partir da
cana-de-açúcar. Com ela, além da produção de agrocombustíveis como o etanol e a
produção de açúcar, novas tecnologias estão sendo desenvolvidas. Com isso, o sentido
de setor sucroalcooleiro não cabe haja vista que o número de produto final vai além do
que esse setor produz e o termo sucroalcooleiro deve ser substituído pelo termo
sucroenergético, o qual engloba tanto a produção de álcool e açúcar como a produção de
eletricidade.
As projeções indicam um aumento da participação relativa da venda de energia na receita das usinas em detrimento da receita oriunda da comercialização de açúcar. A comercialização de energia corresponderá a 2/3 da receita das usinas já na safra 2015/16. Desta forma, torna-se adequada à utilização do termo cana energética em substituição ao termo cana de açúcar. Por fim, é necessário se ressaltar a necessidade de se adotar a expressão sucroenergético em detrimento ao termo sucroalcooleiro porque já é passado o tempo em que o etanol era o único bem energético produzido nas usinas canavieiras brasileiras (DANTAS, 2008, s/p).
Muitas usinas já produzem energia capaz de sustentar todo seu processo
produtivo e ainda vender o que extrapola para as companhias energéticas. Essa
produção de energia deu-se em meados dos anos 1990 onde muitas usinas estão
investindo em novas caldeiras capazes de um melhor rendimento a partir do bagaço e da
30
palha da cana. A expectativa é que a produção de energia tende a superar a de açúcar
nas usinas.
Segundo especialistas, a cana-de-açúcar gera 1/3 de vinhaça, 1/3 de palha e 1/3 de bagaço. Ou seja, pode-se usar 2/3 para a produção de energia elétrica. A estimativa é que em 2020 a produção nacional de cana-de-açúcar atinja um bilhão de toneladas - hoje são 496 milhões de toneladas. Com esta projeção a produção de energia elétrica através das usinas deverá igualar a produção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, que tem capacidade instalada de produção de 14 mil megawatts (MW) (REVISTA RURAL, 2008, s/p).
Com o avanço tecnológico, foi possível a produção de energia elétrica a partir do
bagaço e da palha da cana, que antes eram considerados resíduos sem finalidade e ainda
evita a queima que já está praticamente eliminada nos canaviais. Além da produção de
energia, uma nova matéria já vem sendo produzida a partir da cana-de-açúcar. Trata-se
do bioplástico, feito a partir da moagem da cana que produz o suco, fermentado e
destilado em etanol, que é convertido por uma série de processos químicos, para se
tornar um monoetilenoglicol, um derivado de petróleo que é misturado em um ácido
(tereftálico) para criar o plástico pet. Esse pet é utilizado nas garrafas de 600 ml da
Coca-cola. Uma tecnologia que ainda está em desenvolvimento é a do bio-
hidrocarboneto3, que será um novo combustível voltado à aviação. É devido a essa
gama de possibilidades de produção a partir da cana que Dantas (2008) que se deve
adotar o termo cana energética em substituição ao termo cana-de-açúcar.
No fluxograma 1 temos um esboço do que é produzido a partir da cana-de-
açúcar e o que ainda está em desenvolvimento.
3 Diesel da cana-de-açúcar. Combustível de aviação (SIAMIG, 2011).
31
Fluxograma 1: Processo produtivo a partir da cana-de-açúcar
Fonte: SIAMIG, 2011. Adaptado: CAMPOS, N. L., 2011.
Através da cana-de-açúcar é extraído o caldo o bagaço e a palha. Deles é
possível a produção do açúcar, do melaço, do etanol, da bioeletricidade, do bioplástico e
futuramente o bio-hidrocarboneto (subprodutos da cana).
A produção está dividida em três etapas básicas: plantação e cultivo da cana-de-
açúcar, produção do açúcar ou álcool e a comercialização do produto final. Tem seu
início no campo (cana-de-açúcar) até chegar ao mercado (produto final). A seguir,
temos descritas as etapas do processo produtivo dos subprodutos da cana (Organograma
2).
32
Organograma 2: Etapas do processo produtivo dos subprodutos da cana-de-açúcar
Fonte: SIAMIG, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Essas etapas são importantes para o desenvolvimento e funcionamento do setor,
pois são condicionantes à produção dos derivados da cana. Campo, logística
agroindustrial, indústria-produção, estoque, transporte-produto final e mercado são os
principais processos produtivos que fazem parte das etapas do planejamento da
produção agroindustrial.
1.4. Os Territórios e a produção de agrocombustíveis
Antes de compreendermos a expansão da monocultura canavieira Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba, abordamos o território como o lugar do desenvolvimento das
agroindústrias. Essa abordagem vai além do processo produtivo de agrocombustíveis.
Nossa análise também está pautada nos conflitos e disputas territoriais entre o
agronegócio e o campesinato, que se desterritorializa na medida em que é ameaçado por
essa nova configuração territorial, o agronegócio voltado para a produção de
agrocombustível pelas agroindústrias.
33
O território, categoria de análise da geografia, tem ganhado destaque nos
enfoques teóricos, sobretudo, aqueles que destacam a ação do Estado e os interesses dos
grupos hegemônicos. Com referência à expansão sucroenergética, devemos discutir este
conceito, tendo como expressão de análise à constituição das tramas do agronegócio e a
apropriação do espaço geográfico. Devemos ressaltar que o território analisado nesse
processo de expansão das lavouras canavieiras não é um espaço fixo, imóvel. Ele vai
além dos limites municipais e/ou estaduais dependendo das relações de poder que uma
unidade produtiva venha a exercer nos seus atores sociais. Temos que sua área de
produção muitas vezes não corresponde apenas os limites políticos, extrapolando para
outros territórios e assim exercendo uma relação de poder.
Ao analisar essa categoria, utilizamos diversos autores como Raffestin (1993),
Santos (1996), Haesbaert (2004), Saquet (2007), Oliveira (2004), pois a abordagem
territorial oferece possibilidades para entender os conflitos de interesses surgidos nas
relações sociais envolvidas neste processo de reprodução do capital sucroenergético.
Thomaz Júnior (2002) sugere a possibilidade de compreender o território dos
agrocombustíveis em específico no Brasil, por meio de suas análises a respeito do setor
sucroenergético e da relação capital x trabalho do setor, além do próprio papel do
Estado. Para o autor:
[...] a participação do Estado, especificamente nesse setor da economia, não se restringe apenas às instâncias de planejamento e controle, bem como da fiscalização da produção, distribuição e comercialização dos produtos. Está presente também, assim como para as demais esferas da atividade econômica, na normatização e regramento jurídico-institucional das relações sociais de trabalho, com o atributo de realizar a mediação entre capital e trabalho. (THOMAZ JUNIOR, 2002, p. 55-56).
Segundo o autor, este território, porém, é um território outro, mais funcional e
ligado à reprodução dos interesses do capital. E faz, na maioria das vezes, pela
expropriação de outras formas de território, sobretudo o do camponês. Por sua vez, o
Estado deve assegurar garantias a todos os atores envolvidos nesse setor econômico,
envolvendo o grande e o pequeno produtor, sendo o último o mais afetado pelo setor.
Oliveira (2004) aborda a territorialização do capital e a monopolização do
território a partir do desenvolvimento da indústria e agricultura. Para ele, isso é possível
34
porque o capitalista se tornou também proprietário das terras, latifundiários, portanto
(OLIVEIRA, 2004, p. 41). O campesinato está subordinado à territorialização do
capital, uma vez que ele produza exclusivamente para a indústria.
Um exemplo desse contraditório desenvolvimento ocorre com as usinas ou destilarias de açúcar e álcool, onde atualmente indústria e agricultura são partes ou etapas de um mesmo processo. Capitalista da indústria, proprietário de terra e capitalista da agricultura têm um só nome, são uma só pessoa ou uma só empresa, para produzir, utilizam o trabalho assalariado dos bóias-frias que moram/vivem nas cidades (OLIVEIRA, 2004, p. 42).
Em situação em que o capitalista industrial é uma empresa industrial, o
proprietário da terra e o trabalhador são uma única pessoa, o camponês. Para Oliveira
(2004), esse contraditório desenvolvimento capitalista no campo revela que no caso das
agroindústrias, o capital se territorializa (territorialização do capital monopolista na
agricultura) e quando o camponês é o proprietário da terra, o capital monopoliza o
território sem, entretanto, se territorializar (monopolização do território pelo capital
monopolista).
Para Raffestin (1993), o conceito de território envolve as relações de poder. O
autor discute o território a partir de uma perspectiva política. Ainda interpreta o
território como produto dos atores sociais, ou seja, do Estado ao indivíduo, sendo esses
atores os produtores do território. Esse caráter político do território está definido no
trabalho, pois é no trabalho que ocorre às relações de poder. Segundo Raffestin, “[...] o
território se apóia no espaço, mas não é o espaço, é uma produção a partir do espaço.
Ora, a produção, por causa de todas as relações que envolvem, se inscreve num campo
de poder” (RAFFESTIN, 1993, p.144). Assim, poder e território estão intrínsecos em
todas as relações sociais.
Milton Santos analisa em sua obra “O retorno do território” o conceito de
território e o conceito de lugar, tendo o espaço geográfico como sinônimo de território
usado chamando a atenção para distinguir o território de todos (território como abrigo)
do território de interesse das empresas. Para Santos (1996), lugar é o palpável,
controlado remotamente pelo mundo. Por conseguinte, no caso do território dos
agrocombustíveis, seria o que Santos (1996) chama de território usado, respondendo
interesses de empresas e grupos econômicos. No território dos agrocombustíveis
35
observamos essa relação entre os grupos econômicos que detém o capital e as empresas
que são as usinas, os usineiros e os trabalhadores.
O acontecer homólogo é aquele das áreas de produção agrícola ou urbana, que se modernizam mediante uma informação especializada e levam os comportamentos a uma racionalidade presidida por essa mesma informação que cria uma similitude de atividades, gerando contigüidades funcionais que dão os contornos da área assim definido. O acontecer complementar é aquele das relações entre cidade e campo e das relações entre cidades, conseqüência igualmente de necessidades modernas da produção e do intercâmbio geograficamente próximo. Finalmente, o acontecer hierárquico é um dos resultados da tendência à racionalização das atividades e se faz sob um comando, uma organização, que tendem a ser concentrados e nos obrigam a pensar na produção desse comando, dessa direção, que também contribuem à produção de um sentido, impresso na vida dos homens e na vida do espaço (SANTOS, 1996, p. 9).
Ainda de acordo com as ideias de Milton Santos, o acontecer simultâneo
(lugares contíguos e lugares em rede) cria novas solidariedades apresentando-se como
três formas no território atual: um acontecer homólogo, um acontecer complementar e
um acontecer hierárquico. Podemos compreender o território dos agrocombustíveis a
partir do acontecer homólogo, que cria uma nova função ao campo, função essa
relacionada a alta produtividade voltada à economia do país.
Haesbaert (2004) identifica o território como fruto das relações sociais e das
relações de poder. Nesse sentido, como forma de integrar as perspectivas materialistas e
idealistas, considera que o território envolve ao mesmo tempo a dimensão espacial
material das relações sociais e o conjunto das representações sobre o espaço. O autor,
em outra discussão, ainda traz uma definição do conceito de território partindo da
multiterritorialidade a partir de três aspectos – “político”, onde o território é visto como
um espaço delimitado e controlado sobre o qual se exerce determinado poder, o
território demarcado pelo Estado-nação; “simbólico”, onde o espaço passa a ser
concebido pelos aspectos culturais, o território é produto da apropriação subjetiva do
imaginário; e “econômico”, onde o território é visto através das relações econômicas
como fonte de recursos no embate entre classes sociais e na relação capital-trabalho
como produto da divisão territorial do trabalho. Segundo Haesbaert,
36
[...] todo território é, ao mesmo tempo e obrigatoriamente, em diferentes combinações, funcional e simbólico, pois exercemos domínio sobre o espaço tanto para realizar “funções” quanto para produzir “significados”. O território é funcional a começar pelo território como recurso, seja como proteção ou abrigo (“lar” para o nosso repouso), seja como fonte de “recursos naturais” – “matérias-primas” que variam em importância de acordo com o(s) modelo(s) de sociedade(s) vigente(s) (como é o caso do petróleo no atual modelo energético capitalista). (HAESBAERT, 2004, p. 3).
Saquet (2007) faz uma interessante reflexão de diferentes abordagens do
território apresentando uma síntese desse conceito a partir de diversos autores que
discutem a categoria. Apresenta as ideias de Maquiavel que foi o primeiro a refletir
sobre o Estado a partir das relações de dominação do homem por outros homens, no
processo de conquista de uma área, que é o território. Discute o território a partir das
idéias de Gottmann (1973/2005), como função de abrigo e segurança, e o território
como função de oportunidades. Essa função de abrigo perde valor quando tratamos do
território do agronegócio que visa à produção e a intensa acumulação de capital.
É o que Cleps Junior (2010) chama o território em disputa, disputa essa marcada
pelo agronegócio e o campesinato, gerando os conflitos sociais como ocupação,
reintegração de posse, regularização fundiária entre outros. De acordo com o autor,
Os interesses conflitantes sobre o uso e a ocupação de um mesmo território geram as disputas territoriais. Compreender as transformações territoriais no processo de desenvolvimento da agricultura contemporânea é questão central das pesquisas. Porque o território é objeto de disputa? Quais os efeitos das transformações capitalistas sobre o campesinato? (CLEPS JUNIOR, 2010, p. 37).
O que queremos com a construção desse trabalho é justamente entender essas
disputas territoriais entre agronegócio e campesinato. No decorrer do trabalho, veremos
alguns efeitos socioeconômicos que essas transformações capitalistas causam ao
campesinato.
1.4.1. Conflitos e disputas territoriais
Quando tratamos do agronegócio, verificamos um novo ciclo de conflituosidade
no campo, “que agrega de um lado, grandes proprietários de terras, empresários do
37
agronegócio e seus porta-vozes e, de outro, trabalhadores rurais sem terra, agricultores
familiares e seus mediadores” (BRUNO, 2008, p. 83). Para alguns, o agronegócio é
visto como símbolo da modernidade e a agricultura familiar considerada incapaz e
atrasada, embora extremamente competente no plano social. Ainda no ciclo da
conflitividade, as ocupações de terras, os assentamentos rurais e a luta pela terra geram
inúmeras críticas por serem consideradas ameaça ao modelo agrícola exportador
vigente.
Segundo Fernandes (2004) a conflitualidade é um processo constante alimentado
pelas contradições e desigualdades do capitalismo.
O movimento da conflitualidade é paradoxal ao promover, concomitantemente, a territorialização – desterritorialização – reterritorialização de diferentes relações sociais. A realização desses processos geográficos gerados pelo conflito é mais bem compreendida quando analisada nas suas temporalidades e espacialidades. São processos de desenvolvimento territorial rural formadores de diferentes organizações sociais (FERNANDES, 2004, p. 2).
Conflito e desenvolvimento estão interligados, possuem uma relação que nos faz
compreender que um não existe sem o outro, sendo dependentes e é através deles que
ocorrem as transformações territoriais. Ainda segundo Fernandes (2004) “a
conflitualidade gerada pelo campesinato em seu processo de territorialização destrói e
recria o capital”. Nesse sentido, essa conflitualidade promove modelos distintos de
desenvolvimento.
Em vista desses fatores, temos as disputas territoriais. Território este do
agronegócio, em disputa marcada com o território do campesinato. Assim,
Disputas por território podem ser exemplificadas ao mesmo tempo por diversas ações e situações que são conflituosas: ocupação, reintegração de posse, usucapião, regularização fundiária entre outras. Ações judiciais, envolvendo disputa de terras e demarcação de áreas de populações tradicionais, são exemplos em todo o país e marcadamente na região norte (madeireiras, mineradoras, grileiros posseiros, índios e ribeirinhos etc) (CLEPS JUNIOR, 2010, p. 37).
Neste processo, o MST tem sido considerado uma ameaça aos grandes
proprietários de terra e lideranças do agronegócio, pois possui grande capacidade de
38
mobilização social frente à questão agrária brasileira. Além disso, é o movimento social
de maior expressão no Brasil e na América Latina. Segundo Bruno (2008),
Para alguns representantes do agronegócio, a ausência de políticas públicas “preventivas” teria gerado um grave problema de distribuição de renda que, gradativamente, foi se transformando em questão política. E o MST seria a expressão mais acabada dessa situação. Para outros, o Estado – “mediador de interesses sociais conflitantes” – tem se mostrado historicamente incapaz de neutralizar os conflitos fundiários e acabar com a violência (BRUNO, 2008. p. 98).
Esta visão é comum dentre os representantes do agronegócio por se sentirem
ameaçados pela ação dos movimentos sociais, ações estas já conhecidas como o caso da
Cutrale que teve sua fazenda ocupada por integrantes do MST no interior de São Paulo,
em 2009. Ainda de acordo com Bruno (2008) os empresários do agronegócio fazem
inúmeras críticas ao MST e defendem a visão da propriedade como direito absoluto,
assim como defendem a concentração fundiária e negam a reforma agrária como
expressão da democratização da propriedade. Para os “porta vozes do agronegócio” não
há como falar em terras improdutivas uma vez que a produtividade e a rentabilidade são
uma realidade. Os impactos gerados pela agroindústria canavieira cria uma situação
conflitante entre o pequeno produtor que necessita se manter no campo e manter sua
produção, com os representantes do agronegócio que é defendido no país por
desenvolver a econômia. Assim, os representantes do agronegócio defendem a estrutura
de propriedade vigente no país e tratam a reforma agrária como uma questão menor e
não viável a eliminação da concentração fundiária.
Em vista a essas questões, temos a configuração da mesorregião do Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba destacada como um novo território do desenvolvimento do
agronegócio, a partir da expansão da monocultura canavieira que se intensificou
principalmente após os anos de 1990 com a crescente instalação de agroindústrias
canavieiras, transformando o cenário local e os modos de vida.
39
2. HISTÓRICO DA PRODUÇÃO CANAVIEIRA NO BRASIL E AS
POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCENTIVO À PRODUÇÃO DO ETANOL
“Vira usinas comer as terras que iam encontrando; com grandes canaviais todas as várzeas ocupando.
O canavial é a boca com que primeiro vão devorando matas e capoeiras, pastos e cercados;
com que devoram a terra onde um homem plantou seu roçado; depois os poucos metros onde ele plantou sua casa;
depois o pouco espaço de que precisa um homem sentado; depois os sete palmos onde ele vai ser enterrado”.4
João Cabral de Melo Neto
2.1. Breves considerações sobre a produção canavieira no Brasil
A produção canavieira foi uma das primeiras atividades produtivas e econômicas
no Brasil desde o início da colonização que se deu no século XVI e ainda hoje se
configura como uma atividade de grande importância no cenário econômico nacional,
tanto na produção de açúcar, etanol e energia. O Brasil é o país que possui a maior
produção de cana-de-açúcar no mundo. Seu início ocorreu na Zona da Mata Nordestina
voltada à produção de açúcar que era o principal produto de exportação nos séculos XVI
e XVII (período colonial e primeiras décadas da fase republicana) durante o período
“ciclo” açúcar. Além do ciclo do açúcar, o Brasil passou por outros períodos
econômicos como o do ouro (final do século XVII), do café (1830 a 1930) e da borracha
(primeira fase: 1979 - segunda fase: 1942), que movimentaram a economia do país
durante seus auges. No início da economia do açúcar a força de trabalho era
primeiramente escrava passando a assalariada somente próximo ao fim da escravatura
no Brasil.
Com isso, o país passou a receber mão de obra principalmente da Europa em sua
ocupação humana e econômica, a fim de abastecer o mercado europeu. Segundo
Furtado (1963), a ocupação econômica das terras americanas constitui um episódio da
expansão comercial da Europa, onde a busca por matérias primas de exportação garantia
a soberania econômica dos países europeus. O açúcar era o produto econômico mais
cobiçado da época. É o que Furtado (1963) classificou como “empresa colonial agrícola 4 Trecho do poema: O Rio, de João Cabral de Melo Neto (1953).
40
européia”. “A experiência na produção açucareira e solução dos problemas técnicos
relacionados a produção fez com que a indústria portuguesa se desenvolvesse para os
engenhos açucareiros” (FURTADO, 1963, p. 10).
Com o processo de produção de açúcar, o país obteve um desenvolvimento
técnico da produção, que fez com que outros ramos industriais se desenvolvessem. A
produção de açúcar no Brasil, assim como posteriormente a de etanol passou por
momentos de altos e baixos ao longo dos anos. Em 1875 a produção açucareira entra em
declínio, uma vez que a Europa passou a produzir açúcar a partir da beterraba, tornando-
se independente da importação do açúcar. O desenvolvimento da cafeicultura também
foi responsável pelo declínio da cultura canavieira. O cultivo da cana-de-açúcar retomou
com a crise da cafeicultura, onde houve o incentivo para a produção de cachaça e uso da
cultura para alimentação animal (gado leiteiro).
Como forma de solucionar o declínio da produção e a má qualidade do açúcar, o
Estado passou a incentivar a criação dos engenhos centrais a partir do processo de
modernização das lavouras que se estendeu de 1870 a 1930, conforme aponta Ramos
(1991). A formação dos engenhos centrais não obteve o êxito esperado. Os senhores-de-
engenho deveriam investir em melhorias das condições dos canaviais com o apoio do
Estado, o que melhoraria a produtividade. Houve investimentos para a instalação de
novas unidades. Essas unidades foram criadas a partir da abertura ao capital estrangeiro
na implantação de unidades centrais no país. O fracasso deu-se a partir de um conflito
entre agricultores (senhores-de-engenho) e capital industrial (usineiros). Os senhores de
engenho não aceitaram a perda de controle sobre a totalidade do processo produtivo do
açúcar, que era a base do poder político e econômico.
A nova forma de organização da produção impunha aos senhores-de-engenho uma perda de poder: eles deveriam ficar subordinados ao capital industrial estrangeiro e passariam a receber apenas a parcela relativa à matéria-prima, e esta poderia ser rebaixada pelos donos dos Engenhos Centrais (VIAN, 2003, p. 66).
Foi no final da década de 1920 e início da década de 1930 que a produção
açucareira migrou do Nordeste do país para o Centro-Sul, mais precisamente São Paulo
e Rio de Janeiro. Segundo Bray, Ferreira e Ruas (2000) como forma de retomar a
primazia da produção canavieira, o Nordeste intensificou o cultivo da cana e os
41
usineiros passaram a investir melhorando as fábricas e construindo novas usinas,
enquanto o governo paulista se empenhava no combate às moléstias da cana,
classificada pelos autores como mosaico, uma doença que atingiu e devastou os
canaviais paulistas, fazendo com que importassem novas variedades de cana japonesas.
[...] os proprietários de engenhos aceitaram a modernização, desde que eles fossem os donos dos engenhos centrais e que recebessem os mesmos incentivos que eram dados ao capital estrangeiro na fracassada primeira fase do processo. Assim, a manutenção da integração vertical para trás, que caracteriza o setor até os dias de hoje, e pelo acesso a créditos subsidiados pelo Estado (VIAN, 2003, p. 67).
Durante os anos 1930 houve uma preocupação pelo governo em criar políticas
públicas como forma de “proteção” ao setor, tais como implantação de fábricas,
aquisição de terras, plantio das lavouras e obras de infraestrutura necessárias. Em agosto
de 1931 o Ministério da Agricultura criou a Comissão de Estudos sobre o Álcool Motor
- CEAM já pensando na possibilidade de sua utilização como combustível. No mesmo
ano o governo federal criou a Comissão de Defesa da Produção do Açúcar, com o
objetivo de estudar e incentivar a produção de álcool anidro para misturar à gasolina
com vistas à diminuição do excedente de açúcar e para diminuir a importação de
derivados de petróleo.
O CEAM foi a primeira intervenção estatal para o setor canavieiro. Como
desdobramento da Comissão de Defesa da Produção do Açúcar – CPDA e da CEAM, o
governo federal criou em 1933 o Instituto do Açúcar e do Álcool – IAA, com o objetivo
de dirigir, intervir, fomentar e controlar a produção de açúcar e álcool do país (BRAY;
FERREIRA; RUAS, 2000, p. 14), que se estendeu até a década de 1970. O objetivo
principal do IAA era “regular o mercado de açúcar via usos alternativos para a cana e
para os subprodutos de seu processamento industrial, incorporando funções de fomento
à diversificação das usinas, obrigando-as a destinar parte da matéria-prima à produção
de anidro” (VIAN, 2003, p. 74).
O IAA controlava a produção de açúcar através das cotas. Inicialmente eram baseadas na capacidade instalada de cada unidade produtiva e nas previsões de crescimento do mercado. A instalação de novas unidades e a expansão das já existentes devia ser previamente autorizada pelo IAA. Mas essa obrigatoriedade não era respeitada não era respeitada pelos
42
grandes grupos do setor, principalmente os paulistas (VIAN, 2003, p. 76).
No contexto da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), houve incentivos à
produção de álcool combustível devido à dificuldade de exportação do açúcar e
racionamento da gasolina. O incentivo à produção de álcool pelas destilarias fez com
que o governo federal criasse mais uma política pública, o Plano de Desenvolvimento
do Álcool:
No ano de 1942, o IAA passou a adotar várias medidas que resultaram num verdadeiro “plano de economia de guerra”. A produção de açúcar de usina que ultrapasse o limite de 15.200.000 sacos de 60 kg deveria ser entregue ao IAA para ser transformada em álcool. Neste contexto, o IAA passou a comercializar todo o tipo de álcool fabricado no país e criou o Plano de Desenvolvimento do Álcool. Esse Plano garantia o crescimento da produção do álcool anidro e o abastecimento do álcool hidratado no país (BRAY; FERREIRA; RUAS, 2000, p. 20).
Durante a Segunda Guerra Mundial, houve uma escassez dos derivados de
petróleo e uma valorização da produção do álcool. Nesse período, destacou-se a
expansão da agroindústria canavieira em Piracicaba, interior de São Paulo, com a
criação da primeira fábrica brasileira de equipamentos para atender a produção de
açúcar.
A década de 1950 foi marcada pela expansão da agroindústria canavieira, sobretudo em São Paulo, ocupando terras anteriormente destinadas ao cultivo do café, mantendo a estrutura fundiária vigente e, aos poucos, reforçando sua concentração. A partir desta década, o estado de São Paulo tornou-se o maior produtor de açúcar do país e, pela primeira vez desde o período colonial, Pernambuco perdeu a sua primazia. (SANTOS, 2009, p. 110).
Ainda nesse contexto, as usinas paulistas foram incentivadas a ampliar sua
produção de açúcar e álcool para abastecer o mercado interno e possuíam melhores
condições que as usinas nordestinas para atender a demanda de açúcar, principalmente
no Centro-Sul.
Com a modernização da agricultura após a década de 1960, houve um
movimento expansionista caracterizado pelo expressivo crescimento econômico e pelo
grande avanço tecnológico. Como aponta Hespanhol (2008), a partir da década de 1950,
43
a Revolução Verde derivou diretamente do modelo de desenvolvimento produtivista
predominante até o final dos anos 1970 o que fez com que a produção e produtividade
agrícola se expandissem significativamente.
Apesar do aparente sucesso da modernização da agricultura, o passivo ambiental dela decorrente é muito grande. A expansão de monoculturas e o uso indiscriminado de máquinas, implementos, fertilizantes químicos e de biocidas comprometeram a qualidade ambiental de vastas áreas dos países desenvolvidos e subdesenvolvidos (HESPANHOL, 2008, p. 372).
O processo expansionista da agricultura e as monoculturas fizeram surgir
questões sobre os problemas ambientais e sanitários surgidos, além de que “a
agricultura moderna também não levou a superação do problema da fome no planeta,
apesar de ter havido a ampliação da oferta de alimentos, os problemas relacionados à
sua distribuição perduraram e até se agravaram” (HESPANHOL, 2008). Do ponto de
vista ambiental, o incremento da produção de alimentos, fibras e agrocombustíveis para
fazer frente à demanda internacional está sendo realizado com base neste modelo de
desenvolvimento de forma insustentável, o que abre brecha para críticas de
ambientalistas a esse modo de produção, com alto avanço tecnológico.
Foi nesse contexto de modernização da agricultura, territorialização do capital e ajustes neoliberais, que surgiu o agronegócio. A partir do discurso dos setores dominantes da sociedade, o agronegócio se constitui no mais importante caminho para a agricultura brasileira, tornando-se paradigmático (FABRINI, 2010, p. 60).
Essa modernização da agricultura representa a modernização capitalista no
movimento constante de auto-expansão e reprodução do capital. “Esse processo gerou
fortes impactos ao mundo do trabalho rural como a destruição de formas tradicionais de
produção e desterritorialização do camponês – expropriação de uma parcela da
população rural” (GOMES; CLEPS JUNIOR, 2006, p. 135).
2.2. As crises do Petróleo e a dinâmica agroindustrial a partir da década de 1970
Durante a década de 1970, com a crise no mercado mundial de açúcar e devido à
pressão a respeito da necessidade de preservação dos recursos naturais e a escassez de
44
petróleo (Primeiro choque do petróleo), surgiu à preocupação mundial em relação à
forma de produção e consumo de uma nova fonte de energia. Com isso, tem-se o intento
dos combustíveis alternativos, menos prejudicial ao meio ambiente e que suprisse a
necessidade mundial, podendo ser uma alternativa de substituição da matriz energética
do país.
Embora o etanol como combustível seja considerado uma fonte de energia
limpa, menos prejudicial ao meio ambiente, o seu modo de produção traz inúmeras
implicações em relação às questões ambientais além de expulsar os trabalhadores do
campo e ameaçar a produção de alimentos. Segundo Fabrini (2010), o processo de
modernização da agricultura e a incorporação de novas terras à dinâmica capitalista
provocaram a expulsão de milhares de pequenos proprietários, rendeiros, ribeirinhos,
caiçaras, posseiros, quilombolas, dentre outros camponeses, e indígenas de suas terras.
Mesmo levantando questões que implicam na contestação do modelo
agroindustrial, a demanda por combustíveis cresceu vertiginosamente, sobretudo, os
alternativos devido às crises que ocorreram durante a década de 1970 em relação ao
petróleo. Como forma de incentivar o setor, o IAA junto ao governo federal criou o
Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar – PLANALSUCAR para
renovar as variedades de cana produzidas no país. Nesse sentido, a importância da
relação indústria e agricultura permitiram o sucesso da produção do etanol graças aos
subsídios creditícios e incentivos fiscais.
O processo de integração indústria e agricultura não se deu à margem das relações entre as grandes empresas, os grupos econômicos e o Estado. Este último atuou, sobretudo, através de subsídios creditícios, incentivos fiscais e toda uma bateria de políticas incentivadoras das exportações (MÜLLER, 1989, p. 18).
Essa integração indústria-agricultura foi denominada por Müller (1989) de
complexo agroindustrial, no qual a produção agrária não se dá apenas na dependência
das solicitações do comércio, mas também de um conjunto de indústrias que tem nas
atividades agrárias seus mercados. Para Müller, o complexo agroindustrial
[...] é uma forma de unificação das relações interdepartamentais com os ciclos econômicos e as esferas da produção, distribuição e consumo, relações essas associadas ás atividades agrárias. Vale dizer que o
45
complexo agroindustrial é considerado como uma unidade analítica da acumulação de capital no país (MÜLLER, 1989, p. 23).
Foi nos anos de 1970 e a partir dos desdobramentos economicamente positivos
da união entre indústria e agricultura que o governo brasileiro criou o Programa
Nacional do Álcool – PROÁLCOOL (1975 a 1985) como forma de aumentar a
produção de etanol e incentivar o seu uso. O etanol (ou álcool etílico) é produzido em
usinas a partir de matérias-primas como cana-de-açúcar, milho ou beterraba. No Brasil a
produção se dá pela cana-de-açúcar por ser mais rentável e fácil de produzir, onde é
produzido o álcool anidro e o hidratado. O anidro é utilizado como aditivo em
combustíveis, composto por 99,5% de álcool puro e 0,5% de água. Sua concentração na
gasolina é de 25% de acordo com a EMBRAPA. O hidratado é utilizado como
combustível composto por 96% de álcool puro e 4% de água, utilizado no Brasil desde
1979 (EMBRAPA, 2011).
O etanol é um agrocombustível, ou seja, um combustível renovável, que não
precisa de materiais de origem fóssil, como o petróleo. Seu processo de produção inicia-
se pela moagem da cana, onde se obtém o caldo que contém alto teor de sacarose. O
próximo passo (segunda etapa) é a produção do melaço a partir do aquecimento do
caldo da cana. É nesta etapa que o açúcar é produzido. A terceira etapa é de fermentação
do melaço. Nela fermentos biológicos são acrescidos ao melaço fazendo com que a
sacarose se transforme em etanol. A última etapa é a destilação do mosto fermentado
onde se obtém 96% de etanol e 4% de água.
O etanol produzido pode ser usado na fabricação de bebidas como para
combustível, o que é feito no Brasil. Essa preferência é pelo fato de o etanol produzir
89% menos de CO2 que a gasolina. Além disso, o etanol brasileiro é considerado um
etanol avançado por alcançar as normas de emissão de CO2 definidas pelo Protocolo de
Kyoto. No quadro 2 temos um breve resumo da evolução dos biocombustíveis no
Brasil.
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Quadro 2: Principais fases da produção de biocombustíveis no Brasil (1973-2011)
Momento Característica 1973 Primeiro choque do petróleo
1974 Brasil cria o Proálcool
1977 Adição de 4,5% de etanol à gasolina
1979 Adição de 15% de etanol à gasolina
1980 Segundo choque do petróleo
1983 Carros a etanol representam 90% do total de vendas
1985 Percentual de etanol adicionado à gasolina chega a 22%
1989 Preços do petróleo caem e gasolina se equipara ao etanol
1990’s Etanol passa a representar de 20% a 25% da gasolina
2003 Lançamento dos carros bicombustíveis
2005 É lançado o programa nacional de Biodiesel
2007 Terceiro choque do petróleo
2008 Início da obrigatoriedade do B2
Abril de 2008 Consumo do etanol se equipara ao da gasolina
Julho de 2009 Vigência do B4
Abril de 2011
ANP passa a regular e fiscalizar a produção de etanol, agora considerado um combustível. Percentual na gasolina pode ir de 18 a 25% e é determinado pelo governo
Fonte: Adaptado da ANP, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011. A partir dessa evolução, percebemos os interesses dos representantes
agroindustriais canavieiros em tornar o etanol um combustível competitivo na matriz
energética brasileira. Nesse sentido, os investimentos em políticas públicas para o setor
teve significativo aumento e importância a partir da década de 1970.
2.3. Principais fases do Programa Nacional do Álcool - PROÁLCOOL
O Proálcool foi um programa classificado como bem-sucedido oficialmente
implantado no governo Geisel, em 1975, sob período da ditadura militar, com o objetivo
de estimular a produção de álcool em substituição a gasolina, derivada do petróleo e que
estava passando por grave crise econômica, por ser um combustível não-renovável,
podendo esgotar-se. A intenção do programa era reduzir as importações de petróleo. A
produção de álcool a partir da cana-de-açúcar tem maior retorno econômico para os
agricultores por hectares plantados do que pela mandioca, beterraba ou qualquer outro
insumo, e com a baixa do preço do açúcar no mercado internacional, a mudança de
produção, do açúcar para o álcool, tornou-se mais atrativa à economia.
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A implantação do Proálcool foi precedida de um forte debate entre os atores envolvidos, a saber, Cooperativa Central dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Copersucar), Sindicato dos Produtores de Álcool de São Paulo, Cooperativa Fluminense de Produtores de Açúcar e Álcool (Coperflu), Associação Brasileira das Indústrias Químicas, associações de produtores de cana de vários estados e o IAA, além de técnicos da Petrobrás (VIAN, 2003, p. 85).
Houve embates em relação a implantação de destilarias anexas ou autônomas5.
O IAA defendia a expansão canavieira através das destilarias autônomas, incentivando
sua implantação em regiões de fronteira, a fim de trabalhar com a capacidade ociosa nas
usinas. Já a Copersucar era a favor da produção de anidro através das destilarias anexas,
pois as destilarias paulistas trabalhavam com capacidade ociosa e havia excesso de cana
para ser esmagada. Para solucionar esse embate, o documento “Fotossíntese como Fonte
Energética6” sugeriu a implantação do Proálcool utilizando a capacidade ociosa das
usinas paulistas e sua expansão futura via destilarias autônomas, conjugando os
interesses dos defensores do anidro e do hidratado. Assim, permitia-se a ocupação da
capacidade ociosa das usinas paulistas e a expansão de álcool em destilarias autônomas.
O Proálcool é classificado por diferentes fases e períodos econômico no Brasil.
2.3.1. Primeira fase (1975 a 1979)
Sua primeira fase corresponde de 1975 a 1979 onde surgiram os primeiros
automóveis movidos exclusivamente a álcool. Nessa fase o governo brasileiro investiu
fortemente nas destilarias anexas, havendo um crescimento na produção de álcool
anidro para ser misturado à gasolina. Os estados tradicionais na produção açucareira –
São Paulo e Alagoas foram os mais beneficiados e Pernambuco, Rio de Janeiro e Minas
Gerais se destacaram no número de projetos de destilarias anexas segundo Bray,
Ferreira e Ruas (2000). Nessa fase do Proálcool o número de destilarias autônomas e
anexas aumentou juntamente com a produção de álcool, o que objetivou dinamizar o
Proálcool. O IAA incentivou a produção de álcool anidro “estipulando o preço de
5 Destilarias anexas: ou vinculadas às usinas e geralmente localizadas junto a estas; autônomas: ou não-vinculadas a usinas e localizadas nos, ou junto aos grandes centros de consumo (Ver SZMERECSÁNYI, 1979, p. 82). 6 Trabalho publicado por grupos paulistas e alguns representantes da Associação dos Produtores e distribuidores de Gás (ASSOCIGÁS) apregoando as vantagens do álcool como combustível e da cana como sua matéria-prima.
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paridade em 44 litros de álcool por saca de 60 quilos de açúcar, o que fazia com que
fosse indiferente para a usina produzir um ou outro produto”. Foram criadas linhas de
crédito subsidiado e garantias de compra do produto (VIAN, 2003, p. 87).
2.3.2. Segunda fase (1980 a 1985)
Sua segunda fase corresponde ao período do Segundo choque do petróleo (1979)
mais significativo em relação ao seu impacto negativo à economia mundial. Nesse
período houve uma maior necessidade na produção de álcool combustível com foco
maior para a produção do hidratado. Como políticas para o setor foram criados o
Conselho Nacional do Álcool – CNAL e a Comissão Executiva Nacional do Álcool –
CENAL como organismos para agilizar o Proálcool. Os créditos de subsídios
continuaram e foi estipulada uma produção de 60 mil litros/dia para as destilarias
continuarem recebendo os subsídios.
A opção pela produção do álcool em destilarias possui um custo menor do que
nas usinas (cerca de 20%) de acordo com Alcântara Filho e Silva (1981). Foi em sua
segunda fase que o programa deslanchou e obteve sucesso com a crescente produção de
álcool. Nessa fase, o incentivo era à implantação de destilarias autônomas e a produção
de álcool era mais rentável em relação à de açúcar.
O Governo Federal tinha o objetivo de aumentar e garantir a oferta de álcool anidro incentivando a instalação de novas unidades produtoras, dado que com a produção concentrada em destilarias anexas existia o risco do não cumprimento das metas de produção, uma vez que as mesmas podiam produzir mais açúcar, diminuindo o volume de álcool no momento em que o preço do primeiro no mercado externo era mais compensador. Isso ocorria porque as usinas ainda viam o álcool apenas como um subproduto da produção de açúcar (VIAN, 2003, p. 87).
Nessa fase, houve um crescimento de unidades instaladas no Oeste e Nordeste
de São Paulo, em Goiás e no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. “Entre 1981 e 1985
foram implantadas novas destilarias, principalmente em regiões que eram marcadas pela
presença de latifúndios com pecuária extensiva de corte no estado de São Paulo”
(VEIGA FILHO; RAMOS, 2006, p. 50).
49
As usinas tradicionais tinham mais de 50 anos no negócio e os novos
empresários atingiram maiores índices de produção e produtividade. Houve ainda
incentivo por parte dos Governos Federal e Estadual a compra de carros movidos a
álcool, reduzindo o IPI, além da isenção de impostos e taxas para taxistas que optassem
pelo uso de carros a álcool.
2.3.3. A fase da desregulamentação e reestruturação do setor alcooleiro (1985-
1995)
Em sua fase de estagnação (de 1985 a 1995) o Brasil passou a produzir e vender
um grande número de automóveis movidos a álcool, alcançando uma marca de 95,8%
de toda a frota vendida. No mesmo período, o preço do barril de petróleo cai
(“contrachoque do petróleo”), fazendo com que os consumidores voltassem ao uso da
gasolina, o que coincide com um período de escassez de recursos públicos no Brasil
para subsidiar a produção do etanol. Houve uma queda nos índices de produção de
etanol e corte dos subsídios, o que chamamos de desregulamentação do setor, devido
aos baixos preços pagos aos produtores, o que não relaciona com a demanda pelo
combustível por parte dos consumidores, que ainda era estimulada e subsidiada pelo
governo. Vale ressaltar que a ausência de recursos se dava apenas ao setor sendo que o
uso do álcool combustível ainda era incentivado pelo governo.
Como forma de intervenção no setor, a Sociedade Produto Açúcar e Álcool –
SOPRAL iniciou uma discussão a respeito da postura do IAA, que deveria ser uma
agência reguladora, deixando as atividades de comercialização e financiamento a cargo
dos agentes, retirando o controle da comercialização do álcool e do açúcar das
associações das entidades de representação, minimizando os conflitos e denúncias de
favorecimento de certas empresas.
Estados como Mato Grosso, Paraná, Goiás e Mato Grosso do Sul conseguiram o
fim das cotas de produção, liberando a entrada de novos fabricantes e minimizando os
efeitos da crise sobre as destilarias autônomas instaladas.
No início dos anos 90 as características estruturais básicas do complexo canavieiro brasileiro podiam ser assim resumidas: produção agrícola e
50
fabril sob controle dos usineiros, heterogeneidade produtiva (especialmente na industrialização da cana), aproveitamento baixo de subprodutos, competitividade fundamentada, em grande medida, nos baixos salários e na expansão extensiva. As diferenças eram enormes quando se comparava o Nordeste com o Centro-Sul. Mas mesmo nessa última região existiam diferenças acentuadas de produtividade e escala de produção (VIAN, 2003, p. 100).
Vian (2003) aponta a desregulamentação do complexo e as tentativas posteriores
de auto-regulação que culminaram com a consolidação da União da Agroindústria
Canavieira de São Paulo – UNICA como entidade de representação dos interesses desse
estado, como principal fato ocorrido na década de 1990. Nesse período surgiram
algumas restrições novas no complexo.
Com medidas de cunho liberalizante, o Estado iniciou a década de 1990, se retirando, gradativamente, do centro das decisões acerca do setor, deixando-o nas mãos da iniciativa privada. Essa retirada do governo do controle das atividades do setor alcooleiro foi o que caracterizou seu processo de desregulamentação, ou seja, processo no qual o Estado deixou de regulamentar a produção, estoque, comercialização e preços do setor (PEREIRA, 2007, p. 59).
Durante sua fase de estagnação, houve uma redução da participação do governo
nas decisões do setor. Isso fez com que ocorressem mudanças na forma de
comercialização e no estabelecimento dos preços do álcool, além da perda da
credibilidade dos carros movidos a álcool e no consumo do produto. A estagnação do
setor foi conseqüência da ausência de políticas públicas especificas para o setor.
Durante o governo Collor, em 1990, o IAA foi extinto. A extinção do IAA foi a
primeira medida de desregulamentação promovida pelo Estado que envolvia o setor, e
mais tarde a liberalização dos preços dos seus produtos. Houve uma estabilidade da
produção e descrédito do setor devido a falta do álcool, o que fez com que muitas usinas
quebrassem e outras mudassem o foco de produção para o açúcar. Ainda em 1990, foi
eliminado o privilégio concedido pelo governo de redução do IPI para automóveis
movidos a álcool e a frota desses veículos diminuiu.
No entanto, o governo brasileiro ainda acreditava na eficiência do álcool como
combustível e com isso passou a estimular sua produção a partir da medida provisória nº
1.662 de 28 de maio de 1998 onde o percentual de adição de álcool anidro a gasolina
tornasse obrigatório de 22 até 24%, e como forma de utilização do álcool combustível
51
os preços do etanol e da gasolina foram equiparados. Foi nesse período que houve a
inserção do capital estrangeiro.
Com a extinção do IAA, o controle e o planejamento do setor ficaram a cargo da Secretaria de Desenvolvimento Regional da Presidência da República e, posteriormente, com o Conselho Interministerial do Álcool – CIMA, presidido pelo Ministério da Indústria e do Comércio até 1999, quando passou para o Ministério da Agricultura. A indefinição quanto ao órgão responsável pela regulamentação do setor foi uma das causas da lentidão quanto à adoção de novas regras de gestão e de políticas específicas para o álcool (VIAN, 2003, p. 101).
A crise na produção do álcool combustível afetou a credibilidade do Proálcool,
que entrou numa fase de redefinição (1995 a 2000). A quantidade de cana-de-açúcar
produzida no Brasil manteve estável entre 2 e 3 milhões de toneladas como observado
na tabela 2.
Tabela 2: Brasil – Quantidade produzida de cana-de-açúcar (1990 a 1999)
Anos Produção (toneladas) 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999
262674150 260887893 271474875 244530708 292101835 303699497 317105981 331612687 345254972 333847720
Fonte: Produção Agrícola Municipal (PAM), 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Toda ação que se tentava atribuir ao setor nesse período não funcionava e
geravam críticas entre os produtores e entidades responsáveis. Uma tentativa de auto-
gestão setorial mal sucedida foi a distribuição de cotas de exportação pelas associações
de produtores (Associação das Indústrias de Açúcar e Álcool – AIAA e SOPRAL).
Segundo Vian (2003), os grupos empresariais desentenderam-se quanto à metodologia
de concessão de cotas para os vários grupos. Tem-se como falha a tentativa de atribuir
cotas a todas as empresas produtoras de açúcar, fazendo com que aquelas que não
tinham excedentes para exportação serem beneficiadas comercializando suas cotas.
52
Nessa fase de organização do setor, o Estado tratou de criar entidades de
regulação para fiscalizar as atividades do setor, bem como garantir sua representação no
governo. Nesse sentido, merecem destaque o Conselho Nacional do Açúcar e do Álcool
– CIMA, em 1997, com o objetivo de direcionar políticas para o setor sucroalcooleiro e
a Agência Nacional do Petróleo – ANP, em 1997, que, no que se refere ao álcool,
exerce atividades relacionadas à fiscalização da distribuição e à revenda desse produto
(PEREIRA, 2007, p. 69). Um fator que condicionou no processo de desregulamentação
do setor foi a ausência da intervenção estatal, no qual algumas empresas não
conseguiram se adaptar ao livre mercado, quebrando.
Com a desregulamentação e liberalização dos preços a partir de 1995, surgiram
novas distribuidoras de pequeno e médio porte, aumentando o grau de concorrência
neste mercado. Dentre essas distribuidoras, destacam-se grandes grupos, alguns de
origem familiar, presentes principalmente no Centro-Sul, como Copersucar, Crystalsev,
Cosan, São Martinho, Irmãos Biagi, João Lyra, Tércio Wanderley, Nova América e
Carlos Lyra. Alguns desses grupos estão presentes em Minas Gerais, destacando-se na
produção canavieira.
O quadro 3 resume as principais fases da agroindústria canavieira no Brasil a
partir do final do século XIX até o pós-1990, destacando os principais eventos
deflagradores, as políticas adotas e os resultados, por vezes satisfatórios, outras não.
53
Quadro 3: Principais fases do desenvolvimento da agroindústria canavieira do Brasil (Séculos XIX e XX)
Período Eventos deflagradores Políticas adotadas Resultados Final do século XIX
Crises de superprodução. Perda de participação relativa no mercado externo para produtores mais modernos. Emergência do protecionismo europeu (Antilhas, Europa).
Desvalorização cambial, subsídios para implantação de “engenhos centrais”, surgimento de “usinas”.
“Engenhos centrais” falham. Apenas as usinas atingem o objetivo de aumentar a eficiência da produção.
1905/07 Conflitos entre usinas e refinadoras/comerciantes sobre o preço interno do açúcar.
Coligação do açúcar de Pernambuco e Coligação do açúcar do Brasil.
Estabilização dos preços por dois anos-safra. Comportamento oportunista de usineiros de Campos (RJ) inviabilizou a manutenção do acordo.
1929/33 Crise mundial/superprodução de açúcar. Litígios internos (usina x fornecedor, disputa de mercado entre PE e SP).
Pesquisas e incentivo ao álcool. Criação do IAA (cotas de produção, controle dos preços).
Controle da produção nacional e estabilização dos preços.
1939/45 Guerra mundial e problemas com abastecimento de gasolina e açúcar no Brasil.
Incentivo ao “álcool-motor”.
Aumento da produção paulista.
1959/62 Revolução Cubana. Problemas sociais no Nordeste e erradicação dos cafezais em SP.
Tentativa de modernização da produção nordestina.
Exportação para os EUA. Crescimento da produção paulista.
1968/71 Alta dos preços internacionais, otimismo sobre o mercado mundial de açúcar.
Ambicioso programa de modernização agroindustrial financiado pelo IAA.
Expansão da produção paulista.
1974/75 Queda dos preços mundiais do açúcar. Primeiro choque do petróleo.
Lançamento do Proálcool.
Crescimento da produção de álcool anidro.
1979/83 Segundo choque do petróleo. Estimativas quanto ao esgotamento das reservas de óleo.
Reforço do Proálcool. Crescimento da produção de álcool hidratado.
1985/89 Reversão dos preços do petróleo, crise nas finanças públicas e falta de álcool.
Investimentos na produção nacional de petróleo.
Quebra da confiança no álcool combustível.
54
Quadro 3: Principais fases do desenvolvimento da agroindústria canavieira do Brasil (Séculos XIX e XX) conclusão
Período Eventos deflagradores Políticas adotadas Resultados
Pós-1990 Extinção do IAA. (Brasil: maior produtor mundial x protecionismo/subsídios, fontes e alternativas energéticas). Superprodução de álcool. Reestruturação produtiva: questão social e ambiental.
Medidas paliativas: pacto pelo emprego, Brasil álcool, bolsa brasileira de álcool. Auto-gestão setorial: Consecana, grupos de comercialização e redução do número de entidades de representação patronal.
Preços e mercados instáveis. Redução no uso de mão-de-obra e intensificação da mecanização da agricultura. Fusões, entrada de empresas estrangeiras e emergência de novas estratégias.
Década de 2000 Surgimento dos automóveis bicombustíveis (flexfuel). Aumento na instalação de unidades produtoras de etanol no país.
Incentivos à produção de etanol. Estudos delimitando áreas com maior aptidão na produção canavieira.
Aumento do uso de etanol como combustível doméstico. Crises na produção canavieira e aumento no preço do etanol.
Fonte: Adaptado de Belik et al. (1998), atualizado pela autora. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Os eventos ocorridos propiciaram a configuração do cenário agroindustrial
canavieiro no Brasil, que em diferentes momentos econômicos do país teve uma política
específica para solucionar os problemas ocorridos em relação a produção de
combustíveis no país e no cenário mundial.
Nos anos recentes vivenciamos uma nova expansão da monocultura canavieira
no país. Após a fase de desregulamentação e reestruturação do setor na década de 1990,
a dinâmica do complexo canavieiro passou a uma organização setorial em campos
organizacionais. As empresas investiram em maior produtividade e menores custos de
produção. Nesse sentido, houve o surgimento de novos produtos, novos segmentos de
mercado para os já existentes, e novas técnicas de produção, que fez com que a estrutura
do setor alterasse para uma estrutura heterogênea.
Os interesses comuns ao complexo canavieiro, como o papel do álcool como
combustível líquido, tributação, meio ambiente, co-geração de energia e abertura de
mercados externos, permitiram sua estabilidade atual.
[...] o complexo fragmenta-se pelo lado técnico e produtivo e torna-se coeso pelo lado institucional, algo nunca visto anteriormente no Brasil.
55
As disputas pelo acesso privilegiado ao Estado e às entidades de representação foram substituídas pelas ações conjuntas e coordenadas no âmbito institucional. Mas ainda persistem algumas disputas regionais que precisam ser resolvidas para que não voltem a causar crises sistêmicas (VIAN, 2003, p. 132).
A fragmentação do complexo agroindustrial em campos organizacionais foi
marcada pelo retorno do capital estrangeiro adquirindo empresas e formalizando
parcerias, visando à produção e a comercialização do açúcar. Durante a implementação
do Proálcool, o objetivo da intervenção estatal era o de equilibrar os mercados evitando
o desabastecimento e as variações bruscas de preços. Na fase pós-desregulamentação, o
que predomina é a concorrência empresarial na busca de inovações tecnológicas e na
produção em terras de boa qualidade. Isso se deve aos custos mais baixos e lucro acima
da média.
Temos nessa fase o investimento por parte das empresas, direcionados à
especialização da produção através do uso dos subprodutos da cana, o que não ocorria
nos anos 1980, onde os investimentos se limitavam em melhores condições técnicas
para seus equipamentos. Vian (2003) aponta como possibilidades de melhor
aproveitamento das economias de diversificação produtiva, a co-geração de energia, que
só deslanchou com a crise energética. A produção de energia pelas usinas já é uma
realidade comum em muitas empresas do Centro-Sul. Muitas empresas mineiras já
inseriram a produção de energia em seu processo produtivo e a utiliza para auto-
sustentação e ainda vendem o excedente.
Outras questões importantes no período pós-desregulamentação do setor foram
as preocupações sociais e ambientais. O Governo do Estado de São Paulo proibiu em
1997 a queima total da cana como forma de conservação e preservação do solo, além
dos prejuízos à saúde. A ação deveria ser implementada em oito anos nas áreas onde a
colheita poderia ser mecanizada e em quinze anos nas áreas onde a topografia impedia o
uso de máquinas colheitadeiras. A questão da queima da cana já foi reduzida
consideravelmente, uma vez que os investimentos na mecanização do plantio e colheita
intensificaram-se. As empresas que respeitassem as medidas em relação à queima da
cana e proibição de mão-de-obra infantil receberão uma certificação “socioambiental”.
Essa certificação é utilizada pelas empresas como uma forma de garantir aos seus
consumidores a compra de produtos que não agridam o meio ambiente, não utilizam
56
mão-de-obra infantil e que estão em dia com todos os direitos trabalhistas de seus
funcionários.
Quadro 4: Principais agentes atuantes e desafios da agroindústria canavieira no
Brasil
Agentes envolvidos Desafios
Instituições de política pública
Instituições de pesquisa
Entidades de representação de
interesses
Governos federal e estaduais
Copersucar, universidades, IPT
UNICA, pools de comercialização
Reduzir a heterogeneidade tecnológica na produção agrícola e industrial
ANP
Universidades, montadoras,
distribuidoras de combustíveis e de
energia
Anfavea, sindipeças, UNICA
Definição do papel do álcool e da cogeração com uso do bagaço na matriz energética brasileira
Governos federal e estaduais
Embrapa, sindicatos, universidades
UNICA Reconversão produtiva das terras hoje utilizadas com cana-de-açúcar
Governos federal e estaduais,
instituições privadas
Universidades e laboratórios de
pesquisa
Pools de comercialização
Promover melhora de qualidade do produto final
Governos federal e estaduais,
instituições privadas
Universidades e laboratórios de
pesquisa
Pools de comercialização
Promover a segmentação de mercado visando a atingir nichos de maior valor agregado
Governos federal e estaduais
Embrapa, IPT, INPE Pools de
comercialização
Zelar pela aplicação da legislação ambiental em vigor
Governos federal e estaduais, sindicatos,
universidades
Universidades e laboratórios de
pesquisa
Pools de comercialização
Reciclagem e recolocação da mão-de-obra liberada pelo processo de mecanização da lavoura
Governos federal e estaduais
Universidades e laboratórios de
pesquisa
Pools de comercialização
Melhoria da qualidade dos empregos gerados no setor e ampliação da renda
Governos federal e estaduais
Universidades e laboratórios de
pesquisa
Pools de comercialização
Redução da sazonalidade produtiva
CADE Universidades Pools de
comercialização Controle da concorrência
Governos federal e estaduais
Universidades e laboratórios de
pesquisa
Pools de comercialização
Atingir mercados para produtos de maior valor agregado
Fonte: Adaptado de Vian, 2003. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
57
No quadro 4 temos uma síntese dos desafios para a agroindústria canavieira para
a primeira década do século XXI. Alguns desafios apresentados segundo Vian (2003) já
estão sendo desenvolvidos, como o uso do bagaço na produção de energia, preocupação
com as questões ambientais e a reciclagem e recolocação da mão-de-obra liberada pelo
processo de mecanização da lavoura. Em relação à mão-de-obra, alguns estados estão
capacitando esses trabalhadores para se realocarem no setor, o que não implica no
desemprego de alguns, pois não resolverá todo o problema do desemprego no campo.
Foi durante o segundo mandato do governo Fernando Henrique Cardoso (1998-
2002) que surgiram os automóveis bicombustíveis – movidos a álcool e/ou gasolina, os
chamados carros flexfuel. Com isso, os investimentos no setor foram retomados e o
plantio da cana-de-açúcar para a produção do etanol avançou além das áreas tradicionais
(interior paulista e Nordeste), alcançando os cerrados.
Nesse período houve um crescimento significativo de novas unidades além de
unidades reativadas em todo o país. Muitas usinas criaram uma destilaria anexa para a
produção do etanol. Minas Gerais se insere nesse contexto como uma nova área de
expansão da monocultura canavieira no Brasil. Com essa expansão, a produção
canavieira obteve um crescimento no país. A produção de cana-de-açúcar obteve um
crescimento significativo de 2000 a 2009 passando dos 3 milhões de toneladas/ano pra
mais de 6,5 milhões de toneladas/ano (PAM-IBGE, 2011).
Segundo estimativas da SIAMIG para a safra 2011/2012 Minas Gerais aparece
em segundo lugar no ranking de moagem de cana-de-açúcar e produção de açúcar, e
terceiro lugar na produção de etanol como pode ser visualizado nas estimativas
presentes na tabela 3.
Tabela 3: Produção canavieira nos principais estados do Brasil (2011)
MOAGEM DE CANA-DE-AÇÚCAR
PRODUÇÃO DE ETANOL PRODUÇÃO DE AÇÚCAR
Estado Moagem (t) Estado Produção (m³) Estado Produção (t) 1º São Paulo 2º Minas Gerais 3º Goiás 4º Paraná 5º Mato G. do Sul 6º Alagoas
359.483.092 54.530.958 46.612.721 43.320.725 33.519.668 23.100.645
1º São Paulo 2º Goiás 3º Minas Gerais 4º Mato G. do Sul 5º Paraná 6º Mato Grosso
15.350.336 2.894.860 2.552.294 1.845.508 1.619.339
856.971
1º São Paulo 2º Minas Gerais 3º Paraná 4º Alagoas 5º Goiás 6º Pernambuco
23.443.044 3.253.961 3.022.089 2.050.766 1.805.458 1.644.900
TOTAL BRASIL (*) = 624.991.000 TOTAL BRASIL (*) = 27.699.000 TOTAL BRASIL (*) = 38.675.000 (*) Estimativa Fonte: SIAMIG, 2011, adaptada pela autora.
58
Em 2011, o setor sucroenergético vive uma queda em sua produção de etanol
devido a crise econômica de 2008 e a seca ocorrida. Com a ausência de investimentos
no setor, as usinas não renovaram seus canaviais, o que deve ocorrer num período de 5
em 5 anos. Isso fez com que a produtividade diminuísse na última safra (2010/2011),
sendo necessário importar etanol para suprir a demanda. De acordo com o Sindicato da
Indústria de Fabricação do Álcool no Estado de Minas Gerais – SIAMIG, o desafio do
setor é manter o etanol como uma fonte energética competitiva frente às demais
existentes. Com o desenvolvimento tecnológico, as empresas estão produzindo além do
já tradicional açúcar e álcool, energia e plástico utilizando os subprodutos da cana
(caldo, bagaço e palha).
2.4. A expansão da agroindústria canavieira em Minas Gerais
A partir da década de 1970, com a utilização do álcool como combustível
alternativo, houve uma necessidade de expandir as áreas de cultivo da cana no Brasil.
Diante do histórico da expansão canavieira para o Centro-Sul, o objetivo desse item é
explicar os principais fatores que fizeram com que Minas Gerais inserisse nesse
processo. Alguns aspectos importantes como as condições favoráveis de clima e solo da
região contribuíram para o aumento do cultivo da cana. Com a Revolução Verde na
década de 1970, teve início o processo de ocupação das áreas de cerrado na região do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. A produção de cana-de-açúcar ainda não era tão
expressiva no estado de Minas Gerais como em São Paulo e posteriormente no Paraná.
Nessa época surgiram as primeiras unidades no estado.
Segundo dados da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo – UNICA, a
produção de cana-de-açúcar aumentou na região Centro-Sul e diminuiu na região
Nordeste na década de 1990. Foi nesse mesmo período que Minas Gerais alcançou um
crescimento na produção da cana, principalmente, nas Mesorregiões do Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba e Sul/ Sudoeste de Minas.
O setor sucroenergético de Minas Gerais tem recebido inúmeros investimentos
de diversas regiões do país, acelerando sua expansão nos últimos anos. Minas Gerais
tornou-se o segundo estado maior produtor de cana-de-açúcar do país, ultrapassando o
59
Paraná, ficando atrás apenas de São Paulo7. A moagem de cana no estado atingiu até a
primeira quinzena de fevereiro de 2010 mais de 50 milhões de toneladas, mostrando um
crescimento de 18% em relação à produção da safra de 2008/2009. A previsão para a
safra 2011/2012 é de 51 milhões e meio de toneladas (SIAMIG, 2011). O pequeno
aumento em relação às safras passadas é devido à seca que ocasionou essa baixa
produtividade. A previsão da safra antes da seca era de 58 milhões de toneladas.
Observando o mapa do zoneamento da cana-de-açúcar mostra a aptidão
edafoclimática de Minas Gerais (Mapa 2) para essa cultura. Fazendo um contraponto
com o mapa das usinas no estado (Mapa 3), podemos nos certificar da capacidade das
condições de clima e solo de diversas áreas do estado, áreas estas onde predominam as
unidades sucroenergéticas.
Mapa 2: Minas Gerais – Zoneamento da cultura da cana-de-açúcar (2008)
Fonte: Zoneamento da cana-de-açúcar e do eucalipto: aspectos geofísicos e bióticos, 2008.
7 Dados do Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool de Minas Gerais - SIAMIG.
60
Mapa 3: Minas Gerais – Unidades Sucroenergéticas instaladas e projetadas (2011)
Fonte: UDOP, 2011 Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Nota-se que as áreas em que existe maior aptidão para a cultura canavieira (áreas
em azul onde a aptidão é boa e/ou moderada) são onde os empreendimentos estão
instalados, um dos fatores que o Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba lidera o número de
usinas das demais regiões do estado.
2.5. O Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) e a expansão da monocultura
canavieira
O Zoneamento Ecológico Econômico é uma ferramenta importante no
fornecimento de informações importantes como resposta a problemas bem definidos e
específicos. “É a representação gráfica de um território dividido em zonas homogêneas
quanto a possibilidade de um dado empreendimento humano ser viável sustentável
socioeconômica e ambientalmente” (SEPÚLVEDA, 2008, s/p). De acordo com o
61
zoneamento edafoclimático de Minas Gerais, foram determinadas as áreas onde há
aptidão para a cultura da cana-de-açúcar. A mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba e região central possuem boa aptidão, ao contrário da região Norte do estado,
onde a irrigação torna-se necessária, portanto o cultivo não é eficaz. O ZEE de Minas
Gerais8 foi criado para justificar a expansão desenfreada da monocultura canavieira no
estado – mais precisamente na mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.
A cana-de-açúcar possui um longo ciclo vegetativo e o clima torna-se
determinante para o sucesso do cultivo. Ela requer temperaturas iguais ou superiores a
21° C, disponibilidade hídrica e meses relativamente secos. O solo também é um fator
importante para determinar onde o cultivo da cana obtém melhor desempenho. No
zoneamento edafoclimático de Minas Gerais foi apresentado os tipos de solos e sua
aptidão agrícola edáfica de acordo com a classe de declividade.
Minas Gerais possui grande área em que o solo presente é o latossolo,
principalmente a mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba que possui uma
declividade suave, onde é verificado o latossolo roxo, sendo caracterizada como “boa”
para a aptidão agrícola da cana-de-açúcar.
O objetivo principal do Zoneamento Ecológico-Econômico - ZEE de Minas
Gerais constituído em 2008 foi o de verificar as áreas que são aptas a cultura da cana-
de-açúcar sem causar maiores danos ao ambiente e prejudicar a qualidade dos solos. O
ZEE corresponde a uma carta de potencialidade social – que indica a possibilidade de
um município em gerar desenvolvimento econômico. A Potencialidade Social “é o
conjunto de condições atuais, medida pelos potenciais produtivo, natural, humano e
institucional que determina o ponto de partida de um município ou uma microrregião
para alcançar o desenvolvimento sustentável” (SEPÚLVEDA, 2008, s/p), e a
Vulnerabilidade Natural – que indica a fragilidade de um ecossistema. Na carta de
vulnerabilidade natural de Minas Gerais foi considerada a integridade da flora e da
fauna; a susceptibilidade dos solos à contaminação; a susceptibilidade dos solos à
erosão; a susceptibilidade geológica à contaminação das águas subterrâneas; a
disponibilidade natural de água e as condições climáticas.
8 O ZEE-MG foi criado em 2008 em um convênio com o governo do estado de Minas Gerais e a Universidade Federal de Lavras e apoio da Fundação João Pinheiro. O ZEE é uma ferramenta cartográfica que caracteriza e define as Zonas de Desenvolvimento segundo as peculiaridades regionais, e áreas estratégicas para Proteção e Conservação da Biodiversidade e para o desenvolvimento sustentável do Estado de Minas Gerais, orientando os investimentos do Governo e da sociedade civil.
62
Mapa 4: Minas Gerais - Zoneamento Ecológico Econômico (2008)
Fonte: Zoneamento Ecológico Econômico do Estado de Minas Gerais, 2008.
A união dos dois componentes do zoneamento de Minas Gerais (Carta de
Vulnerabilidade Natural e carta de Potencialidade Social) gerou uma terceira carta onde
as zonas ecológico-econômicas foram caracterizadas a partir do resultado dos estudos
do zoneamento. Como aponta Sepúlveda (2008) no estudo do Zoneamento Ecológico
Econômico de Minas Gerais (Mapa 4) foram caracterizadas seis zonas ecológico-
econômicas no estado.
A Zona 1 corresponde a um alto potencial social em terras de baixa
vulnerabilidade e está presente em grande parte do estado, mostrando sua aptidão para a
cultura da cana. É nesta área que também se concentra as unidades sucroenergéticas
como pode ser visualizado no Mapa 3; a Zona 2 corresponde a um alto potencial social
em terras de alta vulnerabilidade, o que também torna a área apta para a cultura da cana;
a Zona 3 corresponde a uma área de médio potencial social em terras de baixa
63
vulnerabilidade; a Zona 4 corresponde a uma área de baixo potencial social em terras de
baixa vulnerabilidade; a Zona 5 corresponde a uma área de médio potencial social em
terras de alta vulnerabilidade; e a Zona 6 corresponde a uma área de baixo potencial
social em terras de alta vulnerabilidade. As zonas 5 e 6 são consideradas inaptas a
cultura da cana.
O zoneamento agroecológico de Minas Gerais traz o grau de aptidão das áreas
para a cultura da cana-de-açúcar e a atividade agrícola presente nessas áreas, como
pastagem, agropecuária e agricultura. É comum a concentração dessas áreas na
mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, reforçando a potencialidade da
mesorregião. O zoneamento agroecológico foi criado para mostrar para a comunidade
internacional as áreas de plantação da cana, devido a pressão internacional que
questionava se o Brasil poderia estar cultivando cana nas áreas da Amazônia.
64
3. A CONFIGURAÇÃO DA AGROINDÚSTRIA CANAVIEIRA EM
MINAS GERAIS E AS CONSEQUÊNCIAS DA PRODUÇÃO DE
AGROCOMBUSTÍVEIS NO TRIÂNGULO MINEIRO/ALTO PARANAÍBA
Dizem que todo trabalho É digno e não é verdade
Cortar cana, quebrar pedra, É uma barbaridade,
Trabalho que o homem faz Por pura necessidade.9
Pedro Costa
3.1. A expansão da agroindústria canavieira na Mesorregião do Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba (1980-2009)
O processo de expansão das agroindústrias canavieiras na mesorregião do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, assim como em Minas Gerais é considerado recente
frente às demais regiões do país em que a cana-de-açúcar é cultivada. Esse processo
teve um rápido desenvolvimento a partir da década de 2000, período em que houve
grandes incentivos à produção de etanol no estado, e estudos delimitando as áreas com
maior aptidão à produção, o caso do ZEE de Minas Gerais. Ao todo, o estado possui 59
unidades, sendo essas 46 instaladas e 13 projetadas (como demonstrado no Mapa 3 do
Capítulo 2). No quadro 5 apresentamos essas unidades e o município em que as mesmas
estão localizadas.
Quadro 5: Minas Gerais – Relação das Unidades Sucroenergéticas Instaladas e
Projetadas (2011) Nome/ Razão Social Localização
Agropéu Agroindústria de Pompéu S/A Pompéu Alcana Destilaria de Álcool de Nanuque S/A Nanuque Destilaria Alpha Ltda. Cláudio Usina Alvorada Açúcar e Álcool Ltda. Araporã Alvorada do Bebedouro S/A – Açúcar e Álcool Guaranésia Usina Araguari Ltda. * Araguari Destilaria Atenas Ltda. São Pedro dos Ferros Total Agroindústria Canavieira Ltda. Bambuí Bioenergética Vale do Paracatu S/A João Pinheiro Bioenergética Aroeira Ltda. Tupaciguara
9 Cordel da cana: A migração e o trabalho na lavoura de cana em São Paulo, Pedro Costa (2007).
65
Quadro 5: Minas Gerais – Relação das Unidades Sucroenergéticas Instaladas e Projetadas (2011) conclusão
Nome/ Razão Social Localização Braspart Bioenergia Usina da Glória Ltda. * Santo Hipólito Bunge - Unidade Frutal - Usina Frutal Açúcar a Álcool S/A Frutal Bunge - Unidade Itapagipe - Usina Itapagipe - Açúcar e Álcool Ltda. Itapagipe Cabrera Central Energética S/A Limeira do Oeste Destilaria Cachoeira Ltda. Tupaciguara Campina Verde Bioenergia Ltda. * Campina Verde Carneirinho Agro Industrial S/A Carneirinho Usina Cerradão Ltda. Frutal Central Energética de Veríssimo Ltda. Veríssimo Usina Coruripe Açúcar e Álcool - Campo Florido Campo Florido Usina Coruripe Açúcar e Álcool - Iturama Iturama Usina Coruripe Açúcar e Álcool - Limeira do Oeste Limeira do Oeste Damfi - Destilaria Antonio Monti Filho Ltda. Canápolis Usina Zanin Açúcar e Álcool Ltda. * Prata Dasa Destilaria de Álcool Serra dos Aimorés S/A Serra dos Aimorés Usina Caeté S/A - Unidade Delta Delta Destilaria Veredas Ind. de Açúcar e Álcool Ltda. João Pinheiro Companhia Energética de Açúcar e Álcool do Triângulo Mineiro Ltda. * Uberlândia Fle Empreendimentos Ltda. * Gurinhatã Ical Energética Ltda. * Felixlândia Ituiutaba Bioenegia Ltda. Ituiutaba Cia. Agrícola Pontenovense Urucânia Destilaria Junivan S/A Senhora de Oliveira LDC Bioenergia S/A Lagoa da Prata Usina Mendonça Agroindustrial e Comercial Ltda. Conquista Usina Monte Alegre Ltda. Monte Belo Agroindustrial Nova Ponte Ltda. * Nova Ponte Central Energética Paraíso S/A São Sebastião do Paraíso Usina Açucareira Passos S/A Passos Agroindustrial Patos de Minas Ltda. Patos de Minas Planalto Agroindustrial Ltda. Ibiá Destilaria Rio do Cachimbo Ltda. João Pinheiro Destilaria Rio Grande S/A Fronteira Destilaria Jeribá * Sacramento Agroindustrial Santa Juliana S/A Santa Juliana Santa Vitória Açúcar e Álcool Ltda. * Santa Vitória U.S.A. - Usina Santo Ângelo Ltda. Pirajuba Sada Bioenergia e Agricultura Ltda. Jaíba Destilaria Senhor do Bonfim Ltda. Varjão de Minas Laginha Agro Industrial S/A - Unidade Triálcool Canápolis Usina Tupaciguara Açúcar e Álcool Ltda. * Tupaciguara Usina Uberaba S/A Uberaba União de Minas Agroindustrial Açúcar e Álcool * União de Minas Destilaria Vale do Paracatu Agroenergia Ltda. Paracatu Laginha Agro Industrial S/A - Unidade Vale do Paranaíba Capinópolis Companhia Energética Vale do São Simão Santa Vitória Companhia Energética de Açúcar e Álcool Vale do Tijuco Ltda. Uberaba Usina Caeté S/A - Unidade Volta Grande Conceição das Alagoas WD Agroindustrial Ltda. João Pinheiro
Fonte: UDOP, 2011. (*) Unidades Projetadas. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
66
O Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba se destaca das demais regiões do estado
devido aos aspectos econômicos – maior proximidade com os principais centros
econômicos do país; ambientais – solo propício para a produção, com pouca
declividade, o que permite a inserção de máquinas no processo produtivo e condições
climáticas favoráveis a cultura. São 38 usinas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba,
sendo essas 27 instaladas e 11 projetadas. Das unidades ainda em fase de instalação,
somente duas usinas não se encontram no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba: Braspart
Bioenergia Usina da Glória Ltda. no município de Santo Hipólito, e Ical Energética
Ltda. em Felixlândia.
A região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba lidera a produção canavieira
estadual. Além das condições climáticas favoráveis é uma região estratégica por sua
localização próxima dos grandes centros do país como São Paulo, Belo Horizonte e
Brasília, e obteve resultados favoráveis ao cultivo segundo o zoneamento de Minas
Gerais.
De acordo com o portal Rede Energia10, Minas Gerais receberia, até 2013, 56
novas usinas de álcool, 36 delas seriam implantadas até 2009, o que não ocorreu na
realidade. Segundo Carvalho (2009), até o ano de 2007 foram implantadas 30 unidades
em Minas Gerais, sendo 16 no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, 3 no Sul/ Sudoeste de
Minas, 3 no Noroeste de Minas, 2 no Vale do Mucuri, 2 na Zona da Mata, 2 na Central
Mineira, 1 no Oeste de Minas e 1 no Norte de Minas. Em 2011, já são registradas 59
unidades, sendo 38 (63,3%) no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, número que
ultrapassa a quantidade de usinas existentes em Minas Gerais no ano de 2007. O gráfico
1 permite visualizar as unidades por mesorregião, onde elas estão distribuídas em quase
todas as mesorregiões do estado. Nota-se que apenas a mesorregião Vale do Rio Doce
não possui participação na produção canavieira e também não possui nenhuma usina
instalada e/ou projetada, o contrário da mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba que possui a maior produção e maior número de unidades instaladas e/ou
projetadas, o que mostra o dinamismo desse setor no país, que possui um alto grau de
crescimento num curto espaço de tempo.
10 MINAS Gerais vai receber 56 novas usinas de álcool até 2013. Portal Rede Energia. 02 out. 2008. Disponível em: < http://redeenergia.org/minas-gerais-vai-receber-56-novas-usinas-de-alcool-ate-2013.html>. Acesso em 12 jul. 2010.
67
Gráfico 1: Minas Gerais – Usinas instaladas e projetadas por Mesorregião (2011)
Fonte: UDOP, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Devido aos incentivos do uso do etanol como combustível e a instalação de
usinas, o número das mesmas no Triângulo teve um aumento considerável. No mapa 5
podemos observar a evolução da instalação das usinas na década de 1980. Nessa década
instalaram-se cinco unidades, Usina Alvorada, no município de Araporã, Destilaria
Cachoeira em Tupaciguara, Trialcool em Canápolis, Usina Santo Ângelo em Pirajuda e
Usina Mendonça em Conquista.
Algumas unidades representadas no mapa 5 foram instaladas ainda na década de
1970. Em 1980 o número de usinas não era tão expressivo como atualmente e a inserção
do etanol como combustível estava em fase inicial. A década de 1990 se apresentou
pouco expressiva no cenário das agroindústrias canavieiras. Nesse período, houve a
instalação de duas unidades, uma em Conceição das Alagoas (Usina Caeté – Unidade
Volta Grande) e a outra em Iturama, a primeira unidade do Grupo Tércio Wanderley na
região, como pode ser observado no mapa 6.
68
Mapa 5: Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba – Unidades Sucroenergéticas (1980 -
1989)
Fonte: UDOP, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Na década de 1980 eram apenas 5 unidades, sendo algumas delas instaladas
ainda na década de 1970. Nesse período, o número de usinas não era tão expressivo
como atualmente e a inserção do etanol como combustível estava em fase inicial. A
década de 1990 se apresentou pouco expressiva no cenário das agroindústrias
canavieiras. Nesse período, houve a instalação de duas unidades, uma em Conquista e a
outra em Iturama, a primeira unidade do Grupo Tércio Wanderley na região, como pode
ser observado no mapa 6.
A partir da década de 2000 houve a instalação de outras 20 unidades na
mesorregião, totalizando as 27 que estão em operação até o presente momento. Isso
ganhou notoriedade no momento em que as discussões ambientais ganharam destaque
no cenário mundial, onde são propostas formas de se pensar em alternativas energéticas
menos prejudiciais ao meio ambiente. Comparado a gasolina, o etanol emite 89%
menos CO2, sendo considerado uma opção mais viável, além de não derivar de um
subproduto esgotável como o petróleo.
69
Mapa 6: Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba – Unidades Sucroenergéticas (1980 -
1999)
Fonte: UDOP, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Mapa 7: Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba – Unidades Sucroenergéticas (1980 -
2009)
Fonte: UDOP, 2011. Org: CAMPOS, N. L., 2011.
70
No mapa 7 temos a espacialização dessas unidades na década atual (2000),
período em que houve maior número de unidades instaladas no estado, sobretudo na
mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. As 27 unidades em operação na
mesorregião foram implantadas entre os anos de 2000 a 2009, não tendo registros de
novas unidades que iniciaram operação após esta data, embora algumas unidades
projetadas previam iniciar as operações em 2010 e 2011.
3.2. Os principais grupos econômicos atuantes e a presença do capital
estrangeiro no setor canavieiro
Diante a crise no setor alcooleiro na década de 1990 e a baixa produtividade que
se agravou com a crise internacional de 2008 que reduziu os recursos financeiros,
muitas empresas nordestinas faliram e vários projetos tiveram seus cronogramas
adiados ou suspensos. A produção da cana-de-açúcar no período concentrava-se na
região Nordeste e no estado de São Paulo. Com a crise, os grupos nordestinos
tradicionais direcionaram seu capital para as novas áreas de expansão da atividade
canavieira. Nesse contexto, Minas Gerais recebeu filiais desses grupos que implantaram
novas unidades e/ou adquiriram unidades já existentes, formando parcerias e ampliando
seu capital. De acordo com o Diágnóstico de Impactos de grandes Projetos em Direitos
Humanos, (2009) essa situação “[...] implica num processo de desterritorialização e
reterritorialização do agronegócio canavieiro no Brasil, provocando toda uma cadeia de
impactos no território nacional”.
Os principais grupos nordestinos (re)territorializados em Minas Gerais originam
de Alagoas, assim como a mão-de-obra migrante para trabalhar nas lavouras. São eles:
João Lyra, Carlos Lyra, Tércio Wanderley e João Tenório (adquirido pela Bunge, em
2007).
Na figura 1 temos o deslocamento espacial desses grupos nordestinos para
Minas Gerais. Nota-se sua concentração na mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba. É possível perceber que essa introdução de grupos nordestinos está presente
em toda região Centro-Sul do país principalmente.
71
Figura 1: Movimento espacial do capital agroindustrial canavieiro do Nordeste para outras regiões do Brasil (2007)
Fonte: OLIVEIRA, A. M. S., 2007.
O Grupo João Lyra, sediado em Alagoas, possui ramificações no estado da
Bahia e Minas Gerais. Totaliza dez empresas no ramo da agroindústria canavieira e de
fertilizantes e adubos. No setor canavieiro o grupo possui cinco usinas: Laginha, Uruba
e Guaxuma, em Alagoas, além da Triálcool (Canápolis) e Vale do Paranaíba
(Capinopólis), em Minas Gerais.
72
O Grupo Carlos Lyra é o segundo maior grupo do setor canavieiro no país e
segundo maior produtor de açúcar. Responsável pelo açúcar Caeté, também nome de
suas unidades, uma localizada no município de Delta e outra em Conceição das
Alagoas.
Em relação ao número de unidades no estado, o Grupo Tércio Wanderley é o
que possui maior representatividade. Responsável pelas Usinas Coruripe, sua matriz
localiza-se no município de mesmo nome, em Alagoas. Em Minas Gerais, temos a
Coruripe Filial Iturama, Coruripe Filial Campo Florido, a Coruripe Filial Limeira do
Oeste, a Carneirinho Agro industrial S/A e a União de Minas Agroindustrial Açúcar e
Álcool ainda em fase de implantação. A usina Coruripe corresponde a uma empresa
familiar de capital familiar fechado e existe desde 1925. Faz parte do grupo Tércio
Wanderley desde 1941.
Além das cinco unidades no estado, a empresa de Iturama possui a Coruripe
Energética, que gera energia elétrica a partir do bagaço da cana, reforçando a nova
estratégia das usinas na produção de energia, mudando o conceito de sucroalcooleiro
pra sucroenergético, conforme abordado no capítulo 1. Essa energia produzida é capaz
de abastecer a empresa e sua produção excedente é comercializada junto a Cemig. O
grupo pretende estabelecer uma central energética em cada unidade, evitando futuros
racionamentos de energia.
O grupo João Tenório (TRIUNFO) instala-se na região em 2003 com a
construção da Agroindustrial Santa Juliana, adquirida em 2007 pela Bunge. Foi a partir
da década de 2000 que a introdução do capital estrangeiro obteve maior participação nas
empresas mineiras. A abertura ao capital estrangeiro deve-se as crises econômicas
ocorridas no setor. Segundo a Siamig, a participação estrangeira no setor corresponde a
20% da produção, em torno de 10 milhões de toneladas de cana.
No quadro 6 apresentamos os principais eventos ocorridos devido a inserção do
capital estrangeiro em Minas Gerais a partir da década de 2000, no qual grupos
estrangeiros passaram a atuar no estado com a compra e/ou parceria com unidades
mineiras.
73
Quadro 6: Inserção do capital estrangeiro na aquisição de unidades em Minas
Gerais (2001-2011)
Ano Evento 2001 1) Coinbra (Dreyfus) compra a Usina Luciânia, em Lagoa da Prata.
2006 1) Adecoagro compra a Usina Monte Alegre, em Monte Belo; 2) Infinity compra a Usina Alcana, em Nanuque; 3) Cargil em sociedade com a Moema inaugura a Usina Itapagipe.
2007 1) Bunge compra a Usina Santa Juliana; 2) Infinity compra a Destilaria Cepar, em São Sebastião do Paraíso.
2008
1) Em parceria com a Santa Elisa fundos de private equity inauguram a Usina Ituiutaba – CNAA; 2) Dow Chemical anuncia em parceria com a Crystalsev a instalação de uma alcoolquímica em Santa Vitória.
2009
1) Fundo de private equity americano se associa a CMAA – Vale do Tijuco, em Uberaba; 2) ADM em parceria com o Grupo Cabrera inaugura usina em Limeira do Oeste; 3) Bunge anuncia compra de 100% das Usinas Frutal e Itapagipe do Grupo Moema; 4) Petrobrás anuncia entrada no setor de produção com a compra de 40% da Total agroindústria, em Bambuí.
2010 1) Bertin anuncia compra de 70% da Infinity com duas usinas em Minas Gerais.
2011 1) British Petroleum compra CNAA; 2) Parceria Dow/ Mitsui.
Fonte: SIAMIG, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
O capital estrangeiro em Minas Gerais tem origem inglesa, estadunidense e
argentina principalmente, tendo grupos japoneses e chineses no setor. Ele se instala no
setor de infraestrutura e de commodity agrícola-energética e se constituem a partir da
construção e aquisição de usinas, compra de terras e controle da tecnologia, bem como a
expansão de redes transnacionais (Diagnóstico de Impactos de Grandes Projetos em
Direitos Humanos, 2009, p. 33).
O quadro 7 (anexo) apresenta as unidades localizadas no Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba, no que discrimina informações pertinentes quanto ao ano de instalação das
unidades, a capacidade produtiva de cana, álcool (anidro e hidratado) e açúcar, o grupo
ao qual pertence e a origem do capital. Com ele, podemos observar a participação do
capital estrangeiro na mesorregião, que já é uma tendência no setor no Brasil. Os dados
são aproximados quanto à capacidade de produção das usinas e algumas unidades não
foram possíveis encontrar informações.
O ano de instalação das unidades projetadas é uma previsão, visto que algumas
unidades previam instalação anterior a 2011 como a Usina Araguari, a Campina Verde,
a Da Prata, a Floresta do Lobo e a Santa Vitória. A unidade Da Prata está com seu
74
projeto paralisado devido à ausência de cumprimento às normas do licenciamento
ambiental.
A produção de álcool da Coruripe Filial Carneirinho ocorre em parceria com a
Coruripe Filial Iturama, que conta também com a Coruripe Energética, que gera energia
elétrica a partir do bagaço da cana. Essa energia produzida é capaz de abastecer a
empresa e sua produção excedente é comercializada junto a Cemig.
A presença dessas unidades gera inúmeras mudanças no território onde elas se
concentram. Aumento no preço da terra, expansão para outros territórios e expulsão de
trabalhadores do campo são alguns exemplos de impactos negativos da expansão
canavieira. A usina Coruripe em Campo Florido recebe cana de municípios como Prata,
Veríssimo, Pirajuba, Conceição das Alagoas, além do próprio município. Algumas
usinas fazem contratos com produtores locais de arrendamentos de terra, que tem
gerado um grande impacto a esses produtores devido a queda nos preços da tonelada da
cana a partir da crise de 2008. Com isso, há uma desvalorização das terras e as usinas
compram com facilidade por possuírem direito de eventual compra pelos contratos. No
item seguinte trataremos de alguns impactos em relação ao arrendamento de terras para
as usinas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.
3.3. Impactos da expansão da monocultura canavieira na agricultura e pecuária
de Minas Gerais
A produção canavieira foi uma das primeiras atividades produtivas e econômicas
no Brasil desde o início da colonização, primeiramente voltada à produção de açúcar, e
ainda configura-se como uma atividade de grande importância no cenário econômico
nacional. O Brasil é o maior produtor de cana-de-açúcar no mundo o que propiciou
experiências na produção de agrocombustíveis.
Desde então, houve um processo de expansão das lavouras de cana-de-açúcar
recente (década de 1970), voltada à produção do álcool como combustível, com a
expressão do território dos agrocombustíveis, por ser utilizado como combustível
75
“limpo”, menos poluente e inesgotável por não derivar de um recurso natural não-
renovável como o petróleo.
Para que a produção de etanol como combustível ocorresse de forma mais
significativa, foi a partir da década de 1970 e com a criação do Proálcool, um programa
de substituição em larga escala dos derivados de petróleo criado pelo governo federal,
que essa produção ganhou importância e o número de unidades de produção aumentou
significativamente no país.
A produção de cana-de-açúcar ainda não era tão expressiva no estado de Minas
Gerais como em São Paulo e posteriormente no Paraná. Com a modernização produtiva
da agricultura e com os incentivos do estado surgiram às primeiras unidades de
produção em Minas Gerais. Como aponta Pessôa (1982), essa modernização da
agricultura trouxe apenas desenvolvimento econômico, mas não desenvolvimento rural,
pois está pautada no aumento de produção e produtividade.
[...] a modernização da agricultura não conduz, necessariamente, ao desenvolvimento rural e sim ao desenvolvimento econômico, porque está diretamente interessada no aumento da produção e produtividade; não leva em conta o homem, elemento importante nesta transformação e em todo processo de desenvolvimento também, pois as condições sócio-econômicas das pessoas que participam diretamente no processo de produção constituem preocupações do desenvolvimento rural (PESSÔA, 1982, p. 20).
A partir dessa discussão, temos as implicações que o agronegócio gera no
campesinato a partir da intensificação da monocultura canavieira e seu modo de
produção, que necessita de áreas cada vez maiores para o seu desenvolvimento. Minas
Gerais se inseriu nesse contexto por possuir áreas extensas a essa produção, além de
condições climáticas e os tipos de solo favoráveis que contribuíram para essa expansão.
Com isso, teve início o processo de ocupação das áreas de cerrados na região do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.
Com o surgimento dos automóveis bicombustíveis (flexfuel), e os constantes
aumentos no preço da gasolina a partir da década de 2000, o número de unidades
produtivas teve um significativo aumento em todo o país, assim como na região
estudada e a tendência é a implantação de mais unidades e extensão das lavouras de
cana em todo o estado.
76
Para esse segmento econômico funcionar é preciso organizar um complexo
produtivo que envolva desde o plantio da cana, da colheita, do armazenamento e
transporte até chegar às agroindústrias onde a cana é processada e a matéria prima
transformada.
A expansão canavieira tem aumentado de forma acelerada nos últimos anos,
incorporando novas áreas de cultivo. Isso reflete nas discussões a respeito da ameaça à
produção de alimentos onde sua área cultivada está diminuindo devido o
desenvolvimento de empresas do agronegócio. No mapa 8 temos as principais empresas
exportadoras atuantes no Brasil.
Mapa 8: Brasil – Produção de cereais, leguminosas e oleaginosas e empresas
mundiais (2007)
Fonte: MDIC e IBGE, 2007. Org.: OLIVEIRA, A. U.; FARIA, C. S., 2007.
77
Nota-se a concentração dessas empresas mundiais na região do Triângulo
Mineiro/Alto Paranaíba, revelando a forte presença agroindustrial de vários setores do
agronegócio. Nessa discussão que permeia a expansão do agronegócio e a monocultura
canavieira, a produção de alimentos é que tem se discutido pelo campesinato em relação
a ameaça que o agronegócio representa a ela. No que diz respeito a produção agrícola da
região, milho, soja, entre outros, a área plantada das lavouras de cana-de-açúcar obteve
grande salto frente as outras culturas, que se mantiveram estáveis ou diminuíram suas
áreas de cultivo, e grande participação econômica segundo o IBGE.
O que ocorre é uma “tendência de diminuição das variedades produzidas, com o
avanço e predomínio das monoculturas ligadas ao agronegócio” (Diagnóstico de
Impactos de grandes Projetos em Direitos Humanos, 2009, p.61). Esses dados podem
ser observados na tabela 4, que traz a variação da área plantada das principais culturas
da região, destacando a cana com o maior saldo positivo frente as demais e o arroz com
expressiva redução em sua área plantada.
Tabela 4 – Variação da área plantada (%) de cultivos selecionados na Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2007-2009)
Culturas
2007 2009 Variação da área plantada 2007-2009 (em %)
Área plantada (em ha)
Área plantada (em %)
Área plantada (em ha)
Área plantada (em %)
Cana-de-açúcar Soja
Milho Sorgo
Algodão Feijão Arroz
290.237 544.254 401.719 42.480 10.992 35.562 10.996
21,72 40,73 30,06 3,17 0,82 2,66 0,82
467.258 556.195 377.816 57.726 3.213 50.233 5.244
30,78 36,64 24,89
3,8 0,21 3,3
0,34
60,99 2,19 -5,95 35,88 -70,76 41,25 -52,3
Total da Lavoura
Temporária 1.336.204 100 1.517.685 100 13,58
Fonte: PAM-IBGE, 2007 e 2009/ AFES, 2009, adaptada pela autora. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Como apontado no estudo sobre os impactos de grandes projetos em direitos
humanos, a expansão da cana no cerrado pode estar ocorrendo em áreas agrícolas ou
remanescentes de vegetação nativa e as regiões que estão sendo afetadas por essa
expansão já apresenta grande queda na produção de alimentos, como já ocorreu no
78
Estado de São Paulo onde a produção da cana superou a de cultivos como milho, feijão,
café, arroz e laranja.
A partir da análise dos mapas referentes a área plantada com cana-de-açúcar no
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (Mapas 9, 10, 11, 12 e 13), percebemos a evolução
dessa área no período de 1990 a 2009. Temos que essa evolução tende a se expandir
cada vez mais em diversos municípios que antes não apresentava participação na
produção canavieira.
Mapa 9: Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1990)11
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
11 Os municípios que apresentam a variável zero não possuem registro de informação sobre a área plantada, segundo os dados da Produção Agrícola Municipal, IBGE.
79
Mapa 10: Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1995)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011
Mapa 11: Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2000)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
80
A evolução da área plantada com cana-de-açúcar foi branda até a década de
2000, incorporando poucos municípios nesse processo produtivo. Essa evolução
moderada deve-se ao fato de a região ainda não possuir muitos empreendimentos
canavieiros, que teve seu desenvolvimento após a década de 2000 como já mencionado.
Com o crescente número de unidades, as áreas plantadas na mesorregião aumentaram
significativamente, incorporando novos municípios na cultura da cana-de-açúcar.
Registra-se que no período de 2005 a 2009 houve um grande aumento da área
plantada, principalmente na área central da mesorregião, onde houve a inserção da
monocultura em municípios que até então não haviam lavouras de cana e a forte
concentração em municípios onde a monocultura já era acentuada no início dos anos
1990, como Frutal, Iturama, Tupaciguara e Uberaba. Municípios como Prata e
Uberlândia só entraram nesse cenário a partir de 2005.
Mapa 12: Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2005)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
81
Mapa 13: Evolução da área plantada de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2009)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Muitos municípios possuem área plantada mas não unidade(s) de produção, o
que mostra que as lavouras extrapolam os limites municipais. O gráfico 2 mostra essa
evolução da área plantada com cana-de-açúcar na mesorregião no período de 1990 a
2009, bem como o número de usinas instaladas no mesmo período. Essa evolução pode
ser melhor visualizada através dos mapas que discriminam os municípios que possuem
lavouras canavieiras.
82
Gráfico 2: Evolução da área plantada de cana-de-açúcar e número de usinas
instaladas na Mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1990 a 2009)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Temos que a expressão da produção canavieira (Mapas 13, 14, 15, 16 e 17) é
semelhante a da área plantada no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. A mesma análise é
válida tendo que a produção se acentuou na área central da mesorregião e obteve um
forte crescimento nos municípios de Frutal, Iturama, Tupaciguara e Uberaba. Diversos
municípios produzem cana-de-açúcar para usinas localizadas em sua proximidade,
fazendo com que a área plantada e a produção se desenvolva em grande parte da
mesorregião.
83
Mapa 14: Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (1990)12
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Mapa 15: Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto
Paranaíba (1995)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
12 Os municípios que apresentam a variável zero não possuem registro de informação sobre a área plantada, segundo os dados da Produção Agrícola Municipal, IBGE.
84
Mapa 16: Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2000)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
A produção canavieira aumentou assim como a área plantada a partir da década
de 2000. O aumento da produção está relacionado ao desenvolvimento dos automóveis
bicombustíveis e sua crescente oferta no mercado. A partir do ano de 2005, a frota de
automóveis bicombustíveis aumentou significativamente e a população passou a
adquirir os automóveis com essa tecnologia, fazendo com que o consumo do etanol
ultrapassasse o da gasolina em 2009 e 2010. Em 2011, de cada 100 veículos vendidos
no Brasil, 90 possuem a tecnologia flexfuel (SIAMIG, 2011). Mesmo com as crises, a
baixa produção da safra 2011/2012 e o aumento no preço do etanol, a preferência por
veículos com a tecnologia flexfuel ainda é crescente.
85
Mapa 17: Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2005)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Mapa 18: Evolução da produção de cana-de-açúcar no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2009)
Fonte: PAM-IBGE, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
86
Nesse sentido, novas áreas passaram a participar da produção canavieira no
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. O município de Uberaba, conhecido
tradicionalmente pela pecuária e o gado zebu, vem se destacando na produção
canavieira, o que desencadeia a crítica a expansão nas áreas de pastagem. O que deve
ser analisado é até que ponto a expansão das lavouras de cana pode ser notada em áreas
de agriculura e de pastagem do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. A região se destaca
na produção de carne e leite, o que pode prejudicar a demanda dessa produção tanto em
quantidade quanto no custo final do produto. Esse proceso teve início a partir da década
de 1990, com a substituição das áreas de pastagem por lavouras de cana-de-açúcar, e o
impacto é ainda maior se analisado os municípios separadamente. No período em que se
iniciou a expansão da monocultura canavieira, foi observado um decréscimo no efetivo
bovino da região, assim como na área de pastagem onde o gado está requerendo menos
espaço pelos confinamentos.
Tabela 5: Área de agricultura, pecuária e florestas substituídas pela cana-de-açúcar (ha.) (2007-2008)
Atividades 2007 2008
MG GO MS MT MG GO MS MT Agricultura Pecuária Florestas
93.883 25.656
739
59.442 25.703
0
26.823 18.395 1.119
15.134 8.440 1.892
91.959 48.284
876
108.072 34.514
0
38.908 48.465
0
17.761 10.555 2.385
Total 120.306 85.559 46.446 25.524 141.190 143.255 87.434 30.735 Fonte: CANAST-INPE, 2007-2008 Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
A tabela 5 mostra como a cana-de-açúcar vem incorporando novas áreas para o
seu cultivo. A área correspondente a pecuária em Minas Gerais dobrou de 2007 para
2008 e no Mato Grosso do Sul o aumento foi ainda maior. Em relação a agricultura, o
estado de Goiás é o que apresenta maior impacto, tendo quase 50% de sua área
substituída pela expansão canavieira.
87
3.3.1. Impactos da monocultura canavieira sobre o trabalho
Além das implicações do modo de produção dos agrocombustíveis com a
agricultura e a pecuária, queremos também enfocar neste trabalho a sujeição dos
trabalhadores no plantio e beneficiamento da cana, um trabalho degradante e exaustivo
que subordina o trabalhador a uma forma de vida precária. Os trabalhadores da cana-de-
açúcar, em sua maioria, são constituídos de migrantes, que saem do seu local de origem
de maneira esporádica para trabalhar nas lavouras.
Essa demanda populacional nos municípios canavieiros faz com que o poder
local e demais instituições públicas tenham que lidar com um número maior de
equipamentos sociais e serviços públicos nas áreas da saúde, educação, habitação,
segurança, saneamento básico entre outros e geralmente elas não tem aumento de
recursos públicos para lhe dar com essa situação. A presença dos migrantes modifica o
modo de vida da população desses municípios. Em relação a moradia, muitos dividem
“residências coletivas” com cerca de 30 homens em uma residência que comportaria no
máximo seis pessoas, de acordo com o Diagnóstico de Impactos de Grandes Projetos
em Direitos Humanos (2009). Essa situação prejudica a saúde dos trabalhadores que
fica comprometida devido a falta de higiene local.
A região do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba recebe trabalhadores
principalmente da região Nordeste do país e do Vale do Jequitinhonha em Minas
Gerais. A figura 2 mostra o fluxo da mão-de-obra que saem dessas regiões em direção
as áreas canavieiras do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba.
Analisando o processo migratório, observamos que o fluxo de trabalhadores tem
origem dos estados do Maranhão, Piauí, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco,
Alagoas, Sergipe e Bahia, além da mesorregião do Vale do Jequitinhonha, que são
consideradas regiões pobres por serem atingidas pelas secas.
Esses trabalhadores que em sua maioria são provenientes dessas regiões do páis,
geralmente são ou já foram camponeses praticantes de agricultura de subsistência em
pequenas áreas rurais. Eles encontram nos canaviais uma forma de complementação de
renda para o sustento de suas famílias. “A maioria dos trabalhadores migrantes para os
canavias do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba vem de Alagoas, estado citado em todos
88
os municípios visitados pela pesquisa” (Diagnóstico de Impactos de Grandes Projetos
em Direitos Humanos, 2009, p. 83).
Figura 2: Fluxo da mão-de-obra para a agroindústria canavieira no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2009)
Fonte: AFES, 2009.
Os trabalhadores do corte da cana estão cada vez mais dependentes desse
emprego precário e temporário. Muitos trabalham na lavoura por não terem outra
oportunidade e recebem salários muito baixo, além de possuir despesas como aluguel,
alimentação, sobrando pouco para a sobrevivência. Os estudos de Mendonça (2010),
apresentado no Relatório de Direitos Humanos a partir de relatos dos trabalhadores13 do
corte da cana em alguns municípios do estado de São Paulo registra a indignação
desses trabalhadores para com as usinas que exploram sua mão-de-obra. Eles relatam
situações de exploração e precariedade não só por meio do transportes até a região e a 13 As entrevistas foram realizadas em setembro de 2009.
89
situação dos alojamentos, mas que chegam a ser enganados durante a pesagem e/ou na
qualidade da cana cortada, onde paga-se R$3,00 pela tonelada cortada que custaria R$
5,00.
Além dessa exploração da mão-de-obra, a falta de assistência médica é um fato
comum nas usinas. Muitos trabalhadores morrem de exaustão ou em acidente de
trabalho sem receber assistência, além de inalar agrotóxicos e a cinza oriunda da queima
da cana. Uma forma que algumas usinas encontraram para evitar que os trabalhadores
morressem de exaustão foi a distribuição de estimulantes com sais minerais. Essa
medida só faz com que esses trabalhadores tenham um melhor condicionamento físico,
não solucionando os principais problemas vividos no corte da cana.
Esse trabalho, ainda que precário, se faz necessário na vida de muitas pessoas
que não encontram outras oportunidades e se deparam sempre com essa realidade. A
maioria desses trabalhadores são jovens, com menos de 45 anos de idade e homens que
tem que suportar a dura rotina do trabalho, que em sua maioria encontra-se no corte da
cana.
Essa questão da precariedade no trabalho não é diferente em Minas Gerais. No
início do processo de expansão canavieira na década de 1980, o trabalho nos canaviais
era visto como uma oportunidade de ganhar dinheiro. De acordo com o Presidente do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares de Centralina e Araporã, a
instalação de uma usina fazia com que muita gente se deslocasse para trabalhar nelas, e
hoje (após a crise de 2008) o setor parou.
Quando chegou a cana... chegou a coisa do futuro pra se ganhar dinheiro, chegou pra assim tudo. Então todo mundo começou a... No início, pro cê tê uma noção, pessoas jovens que tava estudando foi trabalha na cana é... crianças [...] Tudo foi maravilhoso nos anos oitenta, mas a partir daí eu creio que hoje (eu já vou pular pros dias de hoje) nós tamo é com problema, o setor tá... parô de ganhá milhões de dinheiro, e os trabalhadores tão aí a deus-dará14 (ALMEIDA; MORAIS; RESENDE, 2009, p. 214).
O que mais preocupa os trabalhadores das lavouras canavieiras é a mecanização
das colheitas que pretende atingir 100% da área plantada no estado até o ano de 2014,
de acordo com a Deliberação Normativa COPAM nº 133/09. Com isso, muitos poderão 14 Entrevista com Eurípedes Batista Ferreira, Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares de Centralina e Araporã, In: História & Perspectivas, 2009, p. 214.
90
ficar sem emprego. Hoje (2011) cerca de 80% da colheita já é mecanizada no estado.
Segundo Mendonça (2009) “a expansão e a crescente mecanização no setor canavieiro
têm gerado maior exploração da força de trabalho, através de formas precárias de
arregimentação, contratação, moradia e alimentação”. Com a mecanização, o
trabalhador está sujeito a necessidade de exercer mais sua força de trabalho para
competir com os índices de produção das máquinas.
Como forma de minimizar os problemas sociais decorrentes da mecanização, foi
criado pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais –
FETAEMG, o Plano Nacional de Qualificação do Setor Sucroalcooleiro financiado com
recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador, a fim de preparar 25 mil trabalhadores
para serem recolocados no setor. Os trabalhadores que participarão do curso serão
indicados pelas empresas. Em Minas Gerais, 43 empresas aderiram o curso de
qualificação, sendo 66% delas localizadas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba –
Campo Florido, Conceição das Alagoas, Fronteira, Frutal, Itapagipe, Iturama, João
Pinheiro, Monte Belo, Pompéu, Santa Juliana e Serra dos Aimorés.
O projeto, apesar de sua importância, não resolverá todo o problema. Para isso,
cabe ao governo criar vagas em outros setores para absorver essa mão-de-obra
desempregada, e em relação aos migrantes, incentivar os municípios de origem a criar
postos de trabalho para que esse pessoal não necessite sair de seu local de origem para
complementar sua renda na busca do sustento de suas famílias.
Recentemente, em maio de 2011, houve uma Audiência Pública organizada
pelas Comissões do Trabalho, da Previdência e da Ação Social e de participação
popular da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, no município de Araçuaí (Vale do
Jequitinhonha-MG) para discutir a situação dos trabalhadores da região (30 a 35% da
mão-de-obra adulta) que se deslocam para trabalhar no corte da cana em São Paulo.
Nesta audiência, foram discutidos formas de geração de emprego para essas pessoas em
suas cidades, a fim de evitar que elas se desloquem para trabalhar nos canaviais.
Segundo o deputado André Quintão (PT), “a mecanização do corte de cana pode se
tornar uma boa oportunidade para fixar os trabalhadores em suas próprias cidades,
desde que eles tenham opções de emprego e renda na região” (CEDEFES, 2011).
91
3.3.2. Impactos da produção canavieira sobre a produção rural familiar e
camponesa e nos assentamentos rurais do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba
Outro problema da expansão da cana e a produção dos agrocombustíveis é que
essas lavouras canavieiras não atingem apenas áreas de grandes produtores agrícolas.
Tem-se que essa expansão está atingindo áreas destinadas à produção camponesa. A
expansão em Minas Gerais fez ressurgir inquietações que ultrapassam as problemáticas
discutidas ao longo do desenvolvimento desse trabalho, tais como os impactos da
produção de etanol sobre o cultivo de alimentos, uma vez que a monocultura consiste
numa ameaça potencial à produção familiar, no caso, aos assentamentos de reforma
agrária. Minas Gerais é o estado da Região Sudeste onde mais se concentram
assentamentos rurais.
Segundo os dados do Banco de Dados da Luta pela Terra – DATALUTA foram
criados 371 assentamentos rurais em Minas Gerais no período de 1986 a 2009. Só no
ano de 2009 foram criados 22 assentamentos no estado, sendo 8 deles localizados na
mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba. A mesorregião em questão possuía
82 assentamentos nesse período. Durante os governos Fernando Henrique Cardoso
(1994-2002) e Luis Inácio Lula da Silva (2003-2010), foram criados mais
assentamentos em todo o país, principalmente devido a uma política de incentivos e
como forma de minimizar as lutas dos movimentos sociais. Durante o governo FHC
foram criados 4.304 assentamentos no Brasil sendo 187 em Minas Gerais e no governo
LULA foram criados 3.218 assentamentos no Brasil, sendo 161 em Minas Gerais. Esses
números não revelam a verdadeira realidade, sabendo que nem todos os assentamentos
foram criados no período e sim regularizados, a fim de apresentarem um número maior
de assentamentos criados.
Os assentamentos, em sua maioria, são frutos de ocupações de terras realizadas
por movimentos sociais.
As ocupações sempre foram responsáveis pelo aumento do número de assentamentos implantados. A maior parte dos assentamentos rurais é fruto das ocupações de terra. Com a diminuição das ocupações, também diminuiu o número de assentamentos, por essa razão o governo teve que maquiar os números de 2001, como a Folha de São Paulo denunciou amplamente. Para atingir a meta de 2001, o Ministério do Desenvolvimento Agrário teve que contar famílias que só seriam
92
assentadas em 2002 e, pior, incluiu ainda milhares de famílias que haviam preenchido as fichas da “reforma agrária pelo correio”. Contabilizou também as famílias que compraram terra por meio do Banco da Terra, e as terras resultantes de regularização fundiária das áreas de posseiros. E chamou tudo isso de reforma Agrária. (FERNANDES, 2001, s/p).
Isso ocorre devido às pressões realizadas pelos movimentos para obter a
desapropriação das terras a fim de Reforma Agrária. Após a conquista da terra a luta
não termina. Falta apoio político e infraestrutura nos assentamentos e ainda há conflitos
e perseguições entre assentados e latifundiários. Além dessas questões, alguns
assentados estão tendo que lutar contra o modelo produtivo do agronegócio.
De acordo com a pesquisa realizada por Souza (2010) sobre a dinâmcia
agroindustrial no município de Campo Florido-MG, observou-se que tem ocorrido a
adoção do arrendamento de lotes no PA Nova Santo Inácio Ranchinho devido à chegada
da Usina Coruripe no município. Nesse local é possível visualizar o processo de
territorialização do capital sucroalcooleiro envolvendo áreas de pequena produção. A
produção de cana, por meio do arrendamento dos lotes, pode garantir remuneração
suficiente para assegurar o sustento das famílias no assentamento. Entre os fatores que
contribuíram para a configuração deste quadro no assentamento, destacam-se as
dificuldades de acesso ao crédito e a ausência de políticas públicas adequadas à reforma
agrária, capazes de impulsionar a geração de renda para a agricultura familiar. Mesmo
sendo permitido o arrendamento dos lotes para o plantio da cana, algumas famílias
ainda tentam resistir à implantação desta cultura, permanecendo com as atividades
relacionadas à pecuária para a produção leiteira.
Além de grande produtor de cana-de-açúcar, o Brasil também possui destaque
nas produções de laranja, milho, soja, café, e trigo. Essas produções se dão
principalmente para a exportação, o que faz com que a economia do país se desenvolva
possitivamente. Esse modelo agroexportador ao qual o Brasil está inserido faz com que
o mesmo ganhe destaque em sua produção, movimente a economia do país além de
gerar grandes lucros. Aliás, isto constrói a representação de modernidade e
sustentabilidade, deixando de lado os impactos negativos que esse modelo gera sobre a
natureza e as condições de trabalho.
93
Mas, o que não podemos deixar de questionar é até que ponto essas extensas
monoculturas afetam as pequenas produções, como a agricultura familiar, que já é
comprovada a principal fornecedora de alimentos à mesa dos brasileiros.
Além disso, embora o etanol como combustível seja considerado uma fonte de
energia limpa, menos prejudicial ao meio ambiente, o seu modo de produção traz
inúmeras implicações em relação às questões ambientais além de expulsar os
trabalhadores do campo e ameaçar a produção de alimentos. Segundo Fabrini (2010), o
processo de modernização da agricultura e a incorporação de novas terras à dinâmica
capitalista provocaram a expulsão de milhares de pequenos proprietários, rendeiros,
ribeirinhos, caiçaras, posseiros, quilombolas, dentre outros camponeses, e indígenas de
suas terras.
O pequeno produtor está cada vez mais cercado pela cana e muitos deles optam
em arrendar as suas terras para essa monocultura. Segundo o presidente do Sindicato
dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares de Centralina e Araporã, 89% das
terras na região desses municípios é arrendada. A própria usina possui pouca lavoura e
arrendam terras num período de dez anos, no qual ela é responsável pelo plantio da
cana. Nesses municípios não existem mais pequenos produtores. O pequeno produtor
está na cidade e sua terra arrendada pra usina.
[...] hoje nós não temo pequeno mais. O pequeno tá aqui na cidade, ele tá... tá aposentado (aposentou) e ficô só na praça... e alugô a terra dele, e tá só na praça... pescando, não tão fazendo nada. Então, a usina monopolizou. Ela é dona de tudo praticamente... é a prefeita, delegada, juiza do município...15 (ALMEIDA; MORAIS; RESENDE, 2009, p. 216).
Os pequenos produtores sofrem pressão diante da instalação de uma usina, e
acabam se submetendo a vender ou arrendar suas terras por não conseguir produzir.
Segundo o estudo, os agricultores familiares do PA Água Vermelha em Iturama ficaram
ilhados pelas plantações de cana. A gravidade do problema fez com que ao agricultores
do assentamento passassem a utilizar agrotóxicos para proteger suas plantações devido
as pragas que migravam das plantações de cana (Diagnóstico de Impactos de Grandes
15 Entrevista com Eurípedes Batista Ferreira, Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares de Centralina e Araporã, (História & Perspectivas, 2009).
94
projetos em direitos humanos, 2009, p. 74). Isso fez com que o preço da produção
aumentasse, consequentemente aumentando o valor final do produto comercializado.
Essas discussões nos levam a uma série de qustões que implicam em até que
ponto o desenvolvimento do agronegócio, no caso as agroindústrias e investimento
energético do país possa ameaçar e gerar impactos e/ou prejuízos às outras atividades
econômicas no campo, como a agricultura (familiar/camponesa) e afetando o modo de
vida camponês.
95
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O agronegócio tem causado bastante discussão nos debates da questão agrária
atual no que diz respeito aos impactos gerados pelas monoculturas, que necessitam cada
vez mais de extensas áreas para sua produção, apropriando de territórios camponeses,
promovendo a exclusão do pequeno produtor rural no desenvolvimento do capital.
Nesse sentido, esse trabalho teve como principal objetivo compreender a recente
expansão da monocultura canavieira no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba e suas
implicações na produção de agrocombustíveis.
A conceituação e caracterização do agronegócio permitiram compreender o seu
desenvolvimento no país a partir do processo de industrialização da agricultura, que
subordina a natureza ao capital. Com isso, cria-se o conceito de Complexo
Agroindustrial (CAI) em substituição ao termo Complexo Rural. Nesse processo temos
o nascimento das agroindústrias, devido ao investimento tecnológico, mecanização e
outros fatores que modernizaram o campo. A agricultura atual não se distingue tanto da
agricultura do passado. Ambas são voltadas ao lucro e acumulação de capital, sendo a
do passado para o desenvolvimento econômico das metrópoles e a atual para o
desenvolvimento econômico do país.
Concordamos com Porto Gonçalves (2011), que a modernização tecnológica
que estamos vivendo hoje, com o agronegócio e seus equipamentos modernos é um
mito, pois o Brasil do século XVI já exportava produtos manufaturados como o açúcar.
O país já era moderno tecnologicamente, o que distinguia era que essa tecnologia era
colocada para nos explorar e, não nos servir, nos fazendo questionar essa ideologia de
modernidade que vivenciamos hoje.
A vocação agrícola do Brasil fez com que ele tornasse o maior exportador do
mundo de algumas espécies de cereais, grãos, frutas. Essa vocação já existia, e sempre
voltada aos interesses do capital. O interesse que abordamos nesse trabalho é em relação
ao desenvolvimento energético que despontou o setor canavieiro nesse processo.
O planejamento agroindustrial, respectivamente o das agroindústrias canavieiras,
mostra as estratégias do capital em organizar o setor para a produção do etanol, que
estava nascendo como um dos principais subprodutos da cana-de-açúcar deixando o
açúcar em segundo plano. O uso do etanol como combustível surgiu como uma opção
96
de nova fonte energética para superar as crises em relação ao petróleo e os constantes
aumentos do preço do barril. Consideramos que a produção do etanol a partir da cana-
de-açúcar se mostrou mais vantajoso econômico e ambientalmente, fazendo com que o
Brasil despontasse como pioneiro nessa produção.
No primeiro capítulo, buscamos demonstrar como o agronegócio canavieiro vem
se desenvolvendo no país e criando novos produtos além do etanol. Com isso, o setor
passou de sucroalcooleiro para sucroenergético, que abrange as demais produções que
estão iniciando o seu desenvolvimento nas usinas e destilarias de todo o país.
A abordagem territorial permitiu compreender como o agronegócio se configura
em nossa sociedade e as relações de poder. Utilizando o termo “território dos
agrocombustíveis”, temos que a apropriação do território pelas lavouras canavieiras é a
principal causa dos conflitos e disputas territoriais no campo brasileiro, como tratamos
no terceiro capítulo.
No intuito de compreender as políticas públicas desenvolvidas ao setor
canavieiro, fizemos um recorte do histórico da cana-de-açúcar no Brasil e como se deu
seu desenvolvimento, antes voltado ao açúcar e aguardente, até os dias atuais onde
temos a produção do etanol, energia, dentre outros subprodutos ainda em
desenvolvimento.
Na década de 1930 quando se inicia a criação das políticas públicas e uma maior
preocupação com a produção canavieira, com a criação do IAA (1933) que foi
importante como órgão controlador do mercado de açúcar e incentivando a produção do
anidro no país. Por volta da década de 1960 e com o movimento expansionista das
agroindústrias, surgiram preocupações a respeito dos impactos, problemas ambientais e
a forma insustentável da produção de agrocombustíveis. O Proálcool foi a política
pública em nível nacional mais importante para o setor, no início da década de 1970,
que em sua primeira fase objetivou a produção de álcool para ser adicionada à gasolina
e a segunda fase caracterizada pela produção de álcool como combustível, utilizado nos
veículos movidos exclusivamente a álcool hidratado. O programa, embora visto como
bem sucedido, gerou inúmeras críticas no que diz respeito ao aumento da área de cultivo
da cana-de-açúcar, enquanto a de alimentos se manteve inalterada, despertando as
críticas devido aos problemas sociais gerados no campo.
97
De acordo com as diferentes visões, o Proálcool só teria sucesso e seria viável se
compatível com uma política energética global e com uma política agrária e agrícola
que considerasse todas as conseqüências do crescimento desse programa. Os problemas
em relação ao modelo de produção do agronegócio é que instigaram o objetivo principal
desse trabalho, que analisou os impactos da produção canavieira na mesorregião do
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (MG).
Em relação a expansão canavieira em Minas Gerais, partimos do Zoneamento
Ecológico Econômico como uma das principais ferramentas utilizada pelo governo
estadual para justificar o aumento da monocultura canavieira no estado. Ele induz ao
pensamento de que a região é apta a produção canavieira, causando mínimos impactos
em relação a outras regiões.
Nesse sentido, um dos principais objetivos da pesquisa foi buscar as explicações
da expansão das monoculturas, como elas transformam o território e impacta no modo
de vida camponês e a reforma agrária. Destacamos as condições dos trabalhadores nas
lavouras de cana, que muitas vezes são camponeses e se submetem a esse tipo de
trabalho por ser uma vítima do modelo capitalista imposto à sociedade e que mesmo
precarizado é uma forma de trabalho do qual dele muitos são dependentes, seja para o
sustento das famílias, seja como complementação de renda. Assim, a análise do avanço
do agronegócio nos permitiu constatar a sua influencia nas condições políticas,
econômicas e sociais do país, além de criar uma gama de situações a serem estudadas
devido a sua expansão.
Diante do processo de compreensão do modelo do agronegócio no Brasil,
passamos por diversos aspectos que em sua maioria consideramos prejudicial para as
pessoas ligadas ao campo, seja o camponês ou o agricultor familiar. A inserção de
monoculturas, como a da cana-de-açúcar, vem prejudicando a produção rural familiar e
camponesa que está perdendo espaço, perdendo o seu território (desterritorializando),
além de ter que se submeter a esse modelo agrícola voltado a geração de lucro e
acumulação de capital, por não conseguir competir com um oponente forte como o
agronegócio.
Assim, surge a preocupação em relação à produção de alimentos, que em
algumas áreas tem diminuído tanto em extensão quanto em sua variedade. As
microrregiões de Frutal, Ituiutaba e Uberaba possuem municípios onde a cana-de-açúcar
98
já representa entre 60% e 90% da área plantada, comparando a outras agriculturas e a
pecuária. O modelo do agronegócio traz enormes prejuízos não só para os trabalhadores
rurais, mas para toda a sociedade brasileira. A incorporação de terras para a
monocultura canavieira já está sendo observada no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, e
é um dos principais problemas dos conflitos sociais em Minas Gerais.
A mesorregião do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba encontra-se na área de
Cerrado e é tradicionalmente marcada pela pecuária e mais recentemente, pela cultura
de grãos. A “modernização” da agricultura foi a incentivadora na consolidação do
agronegócio nos Cerrados, transformando-o em um espaço da expansão da fronteira
agrícola. Com isso, a agricultura na região se reestruturou como agronegócio em
detrimento das outras formas de cultivares, como a agricultura familiar.
Vimos diferentes tipos de impactos relacionados à expansão canavieira no
Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, impactos relacionados aos assentamentos rurais, a
agricultura familiar, ao campesinato, ao trabalho, dentre outros. O êxodo rural também
se configura como vítima da expansão canavieira na região, onde os produtores rurais se
deslocaram para a cidade ou para outras regiões, por não conseguirem se manter no
campo, devido aos embates com a produção canavieira e as dificuldades de produzir em
suas terras.
Devemos considerar que esse desenvolvimento energético gerou
desenvolvimento econômico e lucro ao país. O problema é que esse desenvolvimento
não levou em consideração o desenvolvimento social, e não podemos deixar de
questionar até que ponto esse desenvolvimento econômico é positivo, tendo que esse
lucro venha a ser necessário ser utilizado na exportação de alimentos, uma vez que o
país opte pelo modelo do agronegócio, o que é inadmissível a um país com grande
vocação agrícola.
99
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VIAN, C. E. F. Agroindústria canavieira: estratégias competitivas e modernização. Campinas: Átomo, 2003.
107
ANEXO
108
Quadro 7: Caracterização das agroindústrias canavieiras implantadas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2011)
Nome Razão Social Localização Ano de
instalação/previsão
Capacidade de Produtividade/Processamento
(ton. Cana/dia)
Capacidade de Álcool Anidro e Hidratado (litros/dia)
Álcool Anidro (L)
Álcool Hidratado
(L)
Açúcar (ton.)
Grupo Econômico Origem do capital
Alvorada Usina Alvorada Açúcar e Álcool Ltda.
Araporã 1972 5.800 300.000 16.342.000 53.971.000 81.139 Grupo Irmãos
Franceschi Brasil
Araguari * Usina Araguari Ltda. Araguari 2009 UN UN UN UN UN Concrenor Ind. Com. Participações LTDA
Brasil
Bioarueira Bioenergética Aroeira Ltda.
Tupaciguara 2010 − − − − −
Maurílio Biagi, Maubisa, José Rubens
Bevilaquia, Saci e Perplan.
Brasil
Bunge - Unidade Frutal
Bunge - Unidade Frutal - Usina Frutal Açúcar a Álcool S/A
Frutal 2007 5.479 − − − − Moema/Bunge Brasil-EUA
Bunge - Unidade Itapagipe
Bunge - Unidade Itapagipe - Usina Itapagipe - Açúcar e Álcool Ltda.
Itapagipe 2006 − − 79.632.000 Não produz Não
produz Moema/Bunge Brasil-EUA
Cabrera Energética
Cabrera Central Energética S/A
Limeira do Oeste
2009 2.191 − − − − Cabrera/ ADM Brasil-EUA
Cachoeira Destilaria Cachoeira Ltda. Tupaciguara 1984 − − − − − − −
Campina Verde * Campina Verde Bioenergia Ltda.
Campina Verde 2010 UN UN UN UN UN
CNAA- Comp. Nac. de Açúcar e Álcool,
Carlyle/Riverstone, DiMaio Capital, Global
Brasil-EUA
109
Quadro 7: Caracterização das agroindústrias canavieiras implantadas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2011) continuação
Carneirinho Carneirinho Agro Industrial S/A
Carneirinho 2008 4.109 54.246 − − − Tércio Wanderley Brasil
Cerradão Usina Cerradão Ltda. Frutal 2009 4.109 − − − − J.P.
Queiróz/Pitangueiras Brasil
CEV Central Energética de Veríssimo Ltda.
Veríssimo 2008 5.479 90.000 − − − Santo Ângelo Brasil
Coruripe - Filial Campo Florido
Usina Coruripe Açúcar e Álcool - Campo Florido
Campo Florido 2002 6.000 − 92.208.000 4.605.000 205.623 Tércio Wanderley Brasil
Coruripe - Filial Iturama
Usina Coruripe Açúcar e Álcool - Iturama
Iturama 1994 14.000 600.000 106.248.000 13.138.000 282.005 Tércio Wanderley Brasil
Coruripe - Filial Limeira do Oeste
Usina Coruripe Açúcar e Álcool - Limeira do Oeste
Limeira do Oeste
2005 9.722 − 50.419.000 49.863.000 Não
produz Tércio Wanderley Brasil
Damfi Damfi - Destilaria Antonio Monti Filho Ltda.
Canápolis 2007 − − − − − Antônio Monti Filho
LTDA Brasil
Da Prata * Usina Zanin Açúcar e Álcool Ltda.
Prata 2009 UN UN UN UN UN Zanin Brasil
Delta Usina Caeté S/A - Unidade Delta
Delta 2000 16.000 630.000 40.477.000 43.024.000 358.868 Carlos Lyra Brasil
Floresta do Lobo * Companhia Energética de Açúcar e Álcool do Triângulo Mineiro Ltda.
Uberlândia 2010 UN UN UN UN UN Emerson Fittipaldi Brasil
Gurinhatã * Fle Empreendimentos Ltda.
Gurinhatã 2012 UN UN UN UN UN FLE Empreendimentos
LTDA Brasil
Ituiutaba Ituiutaba Bioenegia Ltda. Ituiutaba 2009 6.849 − − − − British Petroleum
compra CNAA Inglaterra
Mendonça Usina Mendonça Agroindustrial e Comercial Ltda.
Conquista 1904 6.000 − − − 61.908 Grupo Mendonça Brasil
110
Quadro 7: Caracterização das agroindústrias canavieiras implantadas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2011) continuação
Monte Alegre Usina Monte Alegre Ltda. Monte Belo 2006 5.280 168.000 Não produz 29.962.000 69.867 Adecoagro Argentina
Nova Ponte * Agroindustrial Nova Ponte Ltda.
Nova Ponte 2014 UN UN UN UN UN Bunge EUA
Patos de Minas Agroindustrial Patos de Minas Ltda.
Patos de Minas − − − − − − −
Planalto Planalto Agroindustrial Ltda.
Ibiá 2007 − − Não produz 14.721.000 Não
produz Carolo Bortolo Brasil
Rio Grande Destilaria Rio Grande S/A Fronteira 2010 1.761 55.199.000 Não produz 55.199.000 Não
produz Grupo Vale do Ivaí Brasil
Sacramento * Destilaria Jeribá Sacramento 2012/2013 UN UN UN UN UN Carlos Lyra
Santa Juliana Agroindustrial Santa Juliana S/A
Santa Juliana 2007 4.722 − 30.956.000 19.176.000 Não
produz Bunge EUA
Santa Vitória * Santa Vitória Açúcar e Álcool Ltda.
Santa Vitória 2009 UN UN UN UN UN Crystalsev - Dow
Chemical Brasil-EUA
Santo Ângelo - USA
U.S.A. - Usina Santo Ângelo Ltda.
Pirajuba 1984 1.805 138.888 Não produz 73.774.000 97.476 Santo Ângelo Brasil
Triálcool Laginha Agro Industrial S/A - Unidade Triálcool
Canápolis 1988 7.200 450.000 44.517.000 59.477.000 95.179 João Lyra Brasil
Tupaciguara * Usina Tupaciguara Açúcar e Álcool Ltda.
Tupaciguara − UN UN UN UN UN British Petroleum Inglaterra
Uberaba Usina Uberaba S/A Uberaba 2008 4.383 155.000.000 Não produz 155.000.00
0 Não
produz Balbo Brasil
União de Minas * União de Minas Agroindustrial Açúcar e Álcool
União de Minas
2014 UN UN UN UN UN Tércio Wanderley Brasil
Vale do Paranaíba Laginha Agro Industrial S/A - Unidade Vale do Paranaíba
Capinópolis 2001 − − 2.367.000 80.655.000 71.207 João Lyra Brasil
111
Quadro 7: Caracterização das agroindústrias canavieiras implantadas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba (2011) conclusão
* Unidades Projetadas UN – Unidade Nova (-) Sem informação Fonte: UDOP, 2011/ SUCRAL, 2011/ SIAMIG, 2011. Org.: CAMPOS, N. L., 2011.
Vale do São Simão Companhia Energética Vale do São Simão
Santa Vitória 2009 − 41.416.000 − 41.416.000 98.118 Andrade Brasil
Vale do Tijuco Companhia Energética de Açúcar e Álcool Vale do Tijuco Ltda.
Uberaba 2010 5.479 180.000.000 − − Não
produz Antonio Kandir, Banco
Pactual Brasil
Volta Grande Usina Caeté S/A - Unidade Volta Grande
Conceição das Alagoas
1996 10.000 500.000 127.182.000 22.430.000 239.744 Carlos Lyra Brasil