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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL
Disciplina SEMINÁRIOS APLICADOS
USO DA ACETAMIDA NA PREVENÇÃO DA INTOXICAÇÃO POR
MONOFLUOROACETATO DE SÓDIO NOS ANIMAIS DOMÉSTICOS:
Revisão de literatura
Fabrício Carrião dos Santos
Orientador: Dr. Paulo Henrique Jorge da Cunha
GOIÂNIA
2014
ii
FABRÍCIO CARRIÃO DOS SANTOS
USO DA ACETAMIDA NA PREVENÇÃO DA INTOXICAÇÃO POR
MONOFLUOROACETATO DE SÓDIO NOS ANIMAIS DOMÉSTICOS:
Revisão de literatura
Seminário apresentado junto à disciplina
Seminários Aplicados do Programa de Pós-
Graduação em Ciência Animal da Escola de
Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal
de Goiás. Nível: doutorado
Área de concentração:
Patologia, clínica e cirurgia animal
Linha de pesquisa:
Alterações clínicas, metabólicas e toxêmicas dos
animais e meios auxiliares de diagnóstico.
Orientador:
Prof. Dr. Paulo Henrique Jorge da Cunha
Comitê de orientação:
Prof. Dr. Fabiano José Ferreira de Sant’Ana - FAV/UnB
Prof. Dr. Percílio Brasil dos Passos - EVZ/UFG
GOIÂNIA
2014
iii
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 1
2. INTOXICAÇÃO EXPERIMENTAL E NATURAL POR MONOFLUOROACETATO
DE SÓDIO .................................................................................................................................. 2
2.1. Monofluoroacetato de sódio ................................................................................................ 2
2.2. Mecanismo tóxico ............................................................................................................... 3
2.3. Sinais clínicos ...................................................................................................................... 5
2.4. Diagnóstico .......................................................................................................................... 7
2.4.1. Exames complementares .................................................................................................. 8
2.4.2. Achados de necropsia e histopatologia ............................................................................. 8
2.5. Diagnóstico diferencial ..................................................................................................... 10
2.6. Tratamento e Prevenção .................................................................................................... 10
2.6.1. Tratamento preventivo geral e terapia de suporte a vida ................................................ 11
2.6.2. Terapia específica ........................................................................................................... 12
3. USO DA ACETAMIDA NAS INTOXICAÇÕES POR MONOFLUOROACETATO DE
SÓDIO ...................................................................................................................................... 15
3.1. Características bioquímicas ............................................................................................... 15
3.2. Mecanismo protetor ........................................................................................................... 15
4. PROTOCOLOS DE INTOXICAÇÃO E TRATAMENTO COM ACETAMIDA NOS
ANIMAIS DOMÉSTICOS ...................................................................................................... 17
4.1. Ratos .................................................................................................................................. 17
4.2. Coelhos .............................................................................................................................. 17
4.3. Ovinos ................................................................................................................................ 18
4.4. Caprinos ............................................................................................................................. 19
4.5. Bovinos .............................................................................................................................. 20
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 21
6. REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 22
1. INTRODUÇÃO
O monofluoroacetato de sódio é uma das substâncias mais tóxicas atualmente
conhecidas. Além de uso para o controle de pragas e espécies exóticas em diversos lugares do
mundo, ainda é o agente tóxico de pelo menos 12 plantas tóxicas encontradas na Brasil (1, 2)
e muitas outras em países do hemisfério sul. Devido ao caráter superagudo e com prognóstico
desfavorável, com quase 100% de mortalidade, o tratamento muita vez é ineficaz, sendo a
alternativa preventiva a melhor opção.
As intoxicações por plantas em animais de produção no Brasil são conhecidas
desde que os pioneiros espanhóis e portugueses introduziram as primeiras cabeças de gado em
pastagens naturais da região (3). Para bovinos, eqüinos, ovinos e caprinos, as intoxicações por
monofluoroacetato de sódio, por meio de plantas tóxicas, causam grandes prejuízos à pecuária
nacional. Algumas medidas de controle como a eliminação dos exemplares das pastagens e
delimitação de áreas de risco, muitas das vezes se tornam inviáveis, devido ao
desconhecimento de plantas potencialmente tóxicas e a extensão territorial
Posto isto, a necessidade de pesquisas para definir protocolos contra as
intoxicações sejam elas pelo composto monofluoroacetato de sódio ou por meio de plantas
tóxicas se faz necessário, na medida em que centenas de animais morrem anualmente vítimas
dessas situações, com enorme impacto econômico (4).
Existem muitas pesquisas envolvendo protocolos experimentais de intoxicações
ou episódios naturais, tratamento e prevenção, porém atualmente são poucos trabalhos
envolvendo a acetamida como prevenção das intoxicações e/ou inibidor dos sinais clínicos. A
acetamida é um composto bastante conhecido, principalmente porque é um metabólico de
diversos fármacos e faz parte de vários processos metabólicos intra e extracelulares.
Com isso, o objetivo com o presente estudo é promover uma revisão de literatura
sobre o uso da acetamida de forma preventiva nas intoxicações experimentais e naturais por
monofluoroaceto de sódio.
2
2. INTOXICAÇÃO EXPERIMENTAL E NATURAL POR
MONOFLUOROACETATO DE SÓDIO
2.1. Monofluoroacetato de sódio
O monofluoroacetato de sódio (MF), conhecido também como ácido
monofluoroacético, 1080, “mão branca” e veneno de Gibflar (5) é uma das substâncias mais
tóxicas já descobertas (6). É altamente tóxico para todas as espécies de animais, inclusive para
o homem (7).
O MF foi sintetizado pela primeira vez na Bélgica em 1896 (8, 9). Sua fabricação,
comercialização e seu uso foram proibidos nos Estados Unidos em 1972 e no Brasil em 1997.
Em outros países como Austrália e Nova Zelândia, seu uso está restrito ao controle de
predadores como cães selvagens, raposas, porcos selvagens e coelhos europeus (10).
O MF tem sido isolado de diversas plantas tóxicas aos animais domésticos, cuja
ingestão determina “morte súbita” em países como África do Sul, Austrália e Brasil (11). No
Brasil, as numerosas plantas capazes de induzir morte súbita em bovinos são responsáveis,
por pelo menos, metade das mortes causadas por plantas tóxicas no país. Ao exame
histopatológico, todas as plantas desse grupo determinam o aparecimento de uma lesão muito
típica, denominada degeneração hidrópico-vacuolar das células epiteliais dos túbulos
uriníferos contorcidos distais (DHV) associada à cariopicnose (1).
Cerca de 500.000 bovinos morrem anualmente no Brasil por plantas tóxicas que
causam morte súbita, dentre elas, destaca-se a Palicourea marcgravii por sua elevada toxidez
(12), ampla distribuição, boa palatabilidade e efeito acumulativo (1). Considerada como a
mais importante planta tóxica brasileira, a P. marcgravii teve o MF identificado por
cromatografia em camada delgada (13) e por espectroscopia (14), em todas as partes da
planta.
Por meio de análise quantitativa, utilizando a cromatografia líquida de alta
eficiência acoplada à espectrometria de massa sequencial com ionização química a pressão
atmosférica (HPLC-APCI-MS), o MF foi detectado em espécies de Palicourea e Amorimia do
Brasil (Quadro 1) (12, 15). Neste estudo, a concentração do MF foi bastante diferente nas
espécies, o que pode explicar as particularidades nas toxidades nestas plantas, principalmente
quando comparadas com a P. marcgravii.
3
Quadro 1. Concentração de monofluoroacetato de sódio nas plantas P.
marcgravii, Amorimia SP e Mascagnia divaricata.
Espécie de planta Concentração de MF (%)
P. marcgravii (Goiás) 0,1 / 0,06 (16)
P. marcgravii (São Paulo) 0,17
Amorimia SP. 0,005
Amorimia amazônica <0,0007
Amorimia camporum <0,0007
Amorimia exotropica 0,02
Amorimia kariniana -
Amorimia marítima -
Amorimia pubiflora 0,006
Amorimia rígida 0,002
Amorimia septentrionalis 0,002
Amorimia velutina -
Mascagnia divaricata -
Fonte: Adaptado de (12).
O quadro clínico-patológico manifestado por bovinos (17) e ovinos (18)
intoxicados experimentalmente com MF de sódio corresponde, em diversos aspectos aos
observados em casos de intoxicações por plantas tóxicas que causam morte súbita, o que
indica indiretamente que esse composto pode ser considerado como um dos fatores
importantes, senão o mais significativo, implicado na morte dos animais nessas intoxicações
(11).
O MF, independentemente da fonte, apresenta efeito acumulativo. Os animais que
receberam a dose letal ou frações dele, em determinado intervalo de tempo apresentaram
semelhança quanto a sintomatologia clínica (18). Aparentemente, alguns autores atribuem o
efeito acumulativo de MF, em grande parte à baixa velocidade de eliminação desse composto
pelo rim (8).
A intoxicação pelo MF pode ocorrer por absorção pelo trato gastrointestinal,
feridas abertas, mucosas e epitélio pulmonar (9). As diferentes vias de intoxicação não
interferem na toxicidade do composto, sendo que a pele intacta não absorve o composto (8,
9).
2.2. Mecanismo tóxico
A toxicidade ocorre exclusivamente pela ação do fluorocitrato, seu metabólico
tóxico, formado no organismo por meio da denominada “síntese letal” (18). O fluoroacetato
se liga à acetil coenzima A (CoA-SH) para formar fluoroacetil CoA, que substitui o acetil
CoA no ciclo de Krebs, conjuga-se com o oxaloacetato e reage com a enzima citrato sintase
4
para produzir fluorocitrato (19). Este composto bloqueia competitivamente a aconitase (14) e
impede a conversão do citrato em isocitrato, o que resulta no acúmulo de grandes quantidades
de citrato e lactato nos tecidos corpóreos, ocasionando efeitos cardiotóxicos e neurotóxicos,
culminando em morte (20) (Figura 1). Esse mecanismo promove a queda na geração de ATP
e na diminuição de demais processos metabólicos dependentes de energia (5).
Figura 1. Mecanismo de ação do monofluoroacetato de sódio
no ciclo de Krebs.
Fonte: (16)
O MF possui um período de latência que varia de 30min a 2h e a morte pode
acontecer entre 1 a 24h. O período de latência é determinado por três fatores: tempo
necessário para ocorrer a hidrólise do monofluoroacetato ao ácido monofluoroacético,
subseqüente translocação e a penetração celular; o tempo requerido para a síntese bioquímica
de uma quantidade letal de fluorocitrato e o tempo necessário para o fluorocitrato interromper
as funções intracelulares numa escala suficientemente relevante que induza sinais de
intoxicação (8, 9).
O período de latência em uma pesquisa desenvolvida em bovinos variou entre
2h45min e 8h50min. De acordo com o experimento, fatores determinantes para o período de
latência podem estar relacionados, por exemplo, com a raça do animal, imprimindo ou não
5
determinada resistência dos animais domésticos a intoxicação por MF, por meio da P.
marcgravii (16).
Em estudos de intoxicação experimental em bovinos, em que utilizou-se duas
doses do MF (0,5 e 1 mg/kg), verificou que independente da quantidade de MF os sinais
clínicos se iniciaram em intervalos muito semelhantes (17, 20). No entanto, os efeitos tóxicos
são muito variáveis em função da espécie intoxicada e da sensibilidade individual (Quadro
2).
Quadro 2. Dose oral letal de monofluoroaceto de
sódio para diferentes espécies
Espécie Dose oral letal (mg/kg) Referência
Cães 0,06 – 0,20
(21)
Bovinos 0,15 – 0,62
(7)
Ratos 0,10 – 3,0
(8)
Ovinos 0,25 – 0,50 (7)
Caprinos 0,30 – 0,70 (7)
Gatos 0,30 – 0,50 (7)
Suínos 0,30 – 0,40 (7)
Cobaios 0,5 – 1,0 (22)
Equinos 0,5 – 1,75 (7)
Camundongos 0,5 – 17,0 (8)
Coelhos 0,80 (21)
Passeriformes 2,50 (22)
Galinhas 5,0 – 7,50 (8)
Macacos 10,0 – 12,0 (22)
Sapos 150,0 (via subcutânea) (8)
2.3. Sinais clínicos
A variação da sensibilidade e dos sinais clínicos manifestados pelas diversas
espécies de animais intoxicados por MF é uma característica toxicológica peculiar desse
composto (23). De fato, poucos são os compostos químicos conhecidos capazes de provocar
variações nos quadros clínico-patológicos em diferentes espécies animais (11).
O metabólico advindo da inibição do ciclo de Krebs resulta em sinais
neurológicos e cardíacos e acidose metabólica. A cardiotoxicidade se manifesta por arritmias
cardíacas, taquicardia ventriculares, fibrilação ventricular e insuficiências cardíacas. A
neurotoxicidade é demonstrada pela ataxia, hiperexcitabilidade e convulsões. O sistema
termoregulador também pode ser afetado. Não são raros os casos de hipocalcemia,
hipocalemia e hipotensão (24).
6
A sintomatologia e a causa morte de animais intoxicados por MF variam de
acordo com a espécie (20). Com base nessas observações, foi elaborado um sistema de
classificação em categorias (I, II, III e IV), que permitiu agrupar as espécies animais em
função do efeito provocado pelo MF (20). Entretanto, esse sistema de classificação foi revisto
e complementado (10, 18), após profunda revisão de leitura relacionada à intoxicação por MF
nas diferentes espécies, conforme o Quadro 3.
Quadro 3. Classificação por categoria pela ação do monofluoroacetato de
sódio sobre as diferentes espécies animais.
Categoria Espécie Animal Ação da MF
I Bovinos, ovinos,
caprinos e coelhos
Efeito primário sobre o coração
II Gatos, eqüinos e
suínos
Efeito se faz tanto sobre o coração
quanto sobre o SNC
III Cães, cobaios, ratos e
hamsters
Efeito se faz primariamente sobre o
SNC
IV Outras espécies Sintomatologia atípica, caracterizada
por fraqueza e extrema bradicardia
Fonte: (20), adaptado por (18).
Os animais normalmente intoxicados por MF, seja na forma pura do composto, ou
por meio de plantas tóxicas, morrem de forma súbita. A morte súbita é caracterizada quando a
morte ocorre de forma repentina, em geral sem manifestações de sinais clínicos prévios e com
ausência de achados macroscópicos relevantes (18).
Nas intoxicações por MF, o aparecimento dos sinais clínicos acontece em média
de 00h30min a 02h00min após a ingestão do princípio tóxico (7). A intoxicação experimental
por MF administrado em bovinos e ovinos induziu os primeiros sinais entre 3min a 33h5min
para ovinos (11) e entre 11h43min e 14h2min para bovinos (25). Já a intoxicação
experimental por P. marcgravii em bovinos levou a apresentação dos primeiros sinais clínicos
entre 2h45min e 4h28min (16). Entretanto, existem estudos que afirmam que o exercício
físico, pode precipitar, ou mesmo provocar, o aparecimento dos sinais clínicos e a morte dos
animais em poucos minutos (3). Os principais sinais verificados nos estudos, envolvendo
bovinos e ovinos estão descritos abaixo, no Quadro 4.
A sintomatologia da intoxicação de MF em diversas referências é dividida em
duas fases (11, 16-18, 25). Uma fase denominada de inicial, caracterizada pelos primeiros
sinais clínicos e a fase final ou também chamada de “dramática”, pois são os últimos achados
clínicos antecedentes ao óbito, normalmente caracterizada por momentos de agonia, perda de
consciência e sofrimento animal.
7
Quadro 4. Principais sinais clínicos verificados para as diferentes espécies de animais
domésticos, divididos em fase inicial e final ou dramática.
FASE INICIAL
Ratos Coelhos Caprinos Ovinos Bovinos
Taquicardia (26) (18, 26,
27)
(16, 17, 25)
Taquipneia (11) (18, 26) (16, 25)
Jugular repleta com pulso
venoso positivo
(26, 28) (14, 16, 17,
25, 29)
Respiração abdominal (26) (18, 26) (16, 17)
Perda de Equilibrio (18, 26) (16, 17, 25,
29)
Ataxia (18) (16, 17, 25)
Posição de auto-auscultação (18) (16, 17, 25)
Decúbito External (26) (18) (16, 17)
Tremores Musculares (11) (26) (18, 27) (14, 16, 17,
25)
Polaquiúria (16, 17)
Sialorréia (18) (17)
Midríase (20) (25)
FASE FINAL OU DRAMÁTICA
Apatia (11) (26) (26, 28) (18, 26-
28)
(16, 25)
Inquietação (30) (26, 30) (16, 17, 25)
Decúbito lateral (11) (26) (26, 30) (18) (16, 17, 25)
Movimentos de pedalagem (11) (26) (18, 26) (16, 17, 25)
Hiperpneia (17, 25)
Opistótomo (20) (18, 26) (16, 17, 25)
Nistagmo (18) (16, 17, 25)
Vocalização (26, 30) (26, 30) (16, 17, 25)
Morte (11) (20, 30) (26, 30) (18, 26) (16, 17, 25,
29)
2.4. Diagnóstico
O diagnóstico da intoxicação por MF é realizado pelo histórico de ingestão do
tóxico, pelo achados clínicos e pela confirmação da presença da substância por meio do
exame toxicológico (10, 31). Assim, amostras estomacais de cães e gatos com quadro
toxicológicos foram analisadas por cromatografia líquida de alta eficiência para detecção do
MF, na rotina laboratorial (31).
O citrato sério pode ser investigado como um indicador periférico da presença de
compostos que inibem o seu metabolismo, como MF (10). Porém, os níveis séricos de citrato
e nos tecidos de ovelhas intoxicadas por MF não possuem valor diagnóstico definitivo (32).
8
2.4.1. Exames complementares
A hiperglicemia pode ser um achado significativo na intoxicação por este
composto (33). Aparentemente, esse aumento é decorrente da elevação das concentrações de
cortisol endógeno, que tem seu metabolismo prejudicado pela diminuição dos níveis de ATP
necessários para a metabolização no fígado (10).
Esta alteração também foram relatadas juntamente com o aumento da ureia,
creatinina, alanina aminotransferase e das concentrações de citrato sérico em cães e gatos
intoxicados experimentalmente. Em gatos intoxicados experimentalmente pelo MF
intravenoso, na dose de 3mmol/kg, ocorreram significativa diminuição no cálcio ionizado e
grave acidose metabólica com aumento nos níveis de lactato e piruvato (34). Os parâmetros
bioquímicos revelaram alteração hepática em bovinos intoxicados experimentalmente pela P.
marcgravii (16). Na análise dos parâmetros sérios de uréia e creatinina revelaram moderada a
acentuada azotemia de ovinos intoxicados experimentalmente por MF (18).
Em ovinos intoxicados experimentalmente por MF verificaram por exame
ecocardiográfico a dilatação cardíaca e redução da fração de encurtamento sistólico (18).
2.4.2. Achados de necropsia e histopatologia
Na necropsia as alterações macroscópicas são de pouca significância por serem
praticamente negativas ou inespecíficas em todas as espécies animais (2). Na histopatologia
uma lesão muito típica, denominada degeneração hidrópico-vacuolar das células epiteliais dos
túbulos uriníferos contorcidos distais (Figura 2), associada à cariopicnose é identificada (2,
16, 17) e marcada picnose nuclear (17).
Em ovinos e bovinos apresentaram lesões histológicas renais, variando de discreta
a acentuada degeneração hidrópico-vacuolar dos túbulos uriníferos contornados distais
associada à picnose nuclear (18, 26).
Em ovinos (18) e ratos (11), a intoxicação por MF levou além a DHV, a
ingurgitamento moderado de aurículas e veias jugulares, cavas, ázigos, pulmonares e em
alguns animais edema pulmonar. Em ratos, verificaram também leve a acentuada congestão
hepática, e em alguns ratos, verificou-se evidenciação do padrão lobular (11).
Os achados macroscópios encontrados nessas intoxicações foram distribuídos no
Quadro 5, de acordo com a espécie, além da lesão histopatológica tipicamente encontrada.
9
Figura 2. Rim bovino intoxicado experimentalmente por Palicourea marcgravii, com
degeneração hidrópico-vacuolar dos túbulos uriníferos contornados distais
(setas), corado em hematoxilina eosina, visualizado em objetiva 40X (16).
Quadro 5. Principais achados de necropsia e histopatologia verificados para as diferentes
espécies de animais domésticos.
ACHADOS MACROSCÓPICOS
Ratos Coelhos Caprinos Ovinos Bovinos
Aurículas e veias
principais ingurgitadas
(11) (26) (26) (18, 26) (16, 17, 25)
Edema pulmonar (11) (18, 26) (17)
Avermelhamento da
mucosa do abomaso
(30) (17, 25)
Petéquias na mucosa
da vesícula biliar
(17, 25)
Acentuação do padrão
lobular do fígado
(17, 25)
Esplenomegalia (17, 25)
Congestão hepática (11) (26, 30) (26) (26) (16, 17, 25)
Hidropericárdio (18) (17, 25)
HISTOPATOLOGIA
DHV (11) (26) (18) (16, 17, 25,
29)
Avaliações histopatológicas realizadas em gatos revelaram alterações sugestivas
de processos isquêmicos e degenerativos, especialmente no cérebro, miocárdio, pulmões,
10
fígado e rins (34). O relato de várias mortes de cães intoxicados acidentalmente descreve a
congestão e hemorragia renal e pancreática, além da congestão e degeneração gordurosa
hepática verificada no exame histopatológico (35).
2.5. Diagnóstico diferencial
Diversas enfermidades capazes de induzir à morte súbita de bovinos, ovino,
caprinos e outros animais devem ser considerados no diagnóstico diferencial. Embora
acentuada deficiência de cobre possa provocar morte súbita, a anemia e evidente
acromotriquia nos animais deficientes nesse elemento se diferem da DHV verificada nos
animais intoxicados por MF (10).
A intoxicação por plantas cianogênicas também cursa com evolução superaguda,
porém o acido cianídrico é absorvido rapidamente e os sintomas da intoxicação aparecem
logo após ou já durante a ingestão da planta, além dos achados histopatológicos verificados
nos animais intoxicados por MF (35).
O diagnóstico diferencial da MF deve ser realizado, sobretudo, com base nos
dados epidemiológicos, principalmente em situações que a intoxicação ocorreu por via oral,
por meio de planta tóxicas em que o princípio é o MF. Em animais de companhia, o
envenenamento criminoso, provocado pelo composto MF deve ser diferenciado das
intoxicações por outros compostos como carbamato, organofosforado, estricnina e
organoclarado, que pode ser feito com base nos aspectos clínico-patológicos e análise
toxicológica (10).
2.6. Tratamento e Prevenção
A intoxicação por MF foi tratada no início das pesquisas, em meados de 1949
somente de forma sintomática, porém os esforços não apresentaram resultados satisfatórios.
(36). Alguns autores (22) chegaram a utilizar de anticonvulsivantes e sedativos, porém sem
conseguir evitar os sinais e a morte dos indivíduos, provocados pelo envenenamento.
Na metade do século passado, após a descoberta da inibição específica do MF
sobre o metabolismo no ciclo de Krebs, tentou-se sem grande sucesso o uso do acetato de
sódio como forma preventiva contra a intoxicação, em coelhos. Mais tarde, também foram
reportados alguns bons resultados de proteção em macacos, na associação do acetato com
11
etanol. Durante essas fases de grandes descobertas, também foi verificado a eficiente proteção
da intoxicação do MF como o uso do acetato de glicerol (36).
Em 1953, já havia pesquisadores que afirmavam que a acetamida teria a
capacidade de proteger ratos dos sinais e da morte da intoxicação por MF, quando fornecido
antes ou em até 24 horas o fornecimento do principio tóxico. Porém, caso a acetamida fosse
administrada em animais em fase inicial de toxidez, com sinais clínicos ainda leves, o efeito
protetor já não era mais percebido (36).
Atualmente, as pesquisas visam criar alternativas na prevenção dos sinais clínicos
e morte dos animais, por meio de composto químicos como a acetamida e o desenvolvimento
de alternativas biológicas como a inoculação intra-ruminal de bactérias Butyrivibrio
fibrisolvens geneticamente modificadas com a intodução de um gene de uma espécie de
Moxarella, capaz de degradar o MF, reduzindo os sinais clínicos e evitando a morte da
maioria dos animais (37).
Outra alternativa biológica também utilizada para os casos de intoxicação por MF
provocadas por plantas tóxicas é a aversão alimentar condicionada. A aversão alimentar tem
como objetivo evitar que o animal faça a ingestão da planta. Para isso, são utilizados
compostos como o cloreto de lítio, para condicionar o animal a apresentar repúdio à planta. Já
que tradicionalmente tem se afirmado, por parte de produtores e técnicos, que os animais após
iniciarem a ingestão da planta, desenvolvem vício pela mesma (38).
2.6.1. Tratamento preventivo geral e terapia de suporte a vida
A maioria das tentativas de reversão dos efeitos tóxicos do MF tem falhado e
poucos estudos relataram uma terapia de sucesso absoluto contra esta intoxicação em animais
domésticos (35). Um protocolo geral de conduta de urgência nas intoxicações por MF deve
ser estabelecido incluindo medidas que dificultam a absorção do agente, medidas de suporte e
terapia específica da intoxicação (39).
De maneira geral, a primeira medida que pode ser tomada no sentido de evitar a
intoxicação é adotar medidas que dificulta a absorção do agente. A via natural de intoxicação
pelo MF é através da exposição gastrointestinal, portanto medidas que impeçam ou reduzam a
absorção do MF podem ser consideradas desde que a ingestão tenha ocorrido recentemente
(39).
A indução da êmese é uma manobra que não possui sua eficácia confirmada,
havendo controvérsia em relação à sua eficiência. Contudo, (39) afirmam que a êmese não
12
influência na morbidade e letalidade de animais intoxicados. Outra alternativa é lavagem
gástrica, podendo ser utilizada em eqüinos e em pequenos animais e deve ser realizada logo
após a ingestão do agente tóxico através de sondagem nasogástrica e orogástrica,
respectivamente.
O emprego de substâncias que possam transformar o agente tóxico numa forma
não absorvível pode ser tentado pela formação de um precipitado ou complexo insolúvel,
alteração do pH do trato digestivo ou o uso de adsorventes como o carvão ativado. O carvão
ativado é amplamente empregado na rotina veterinária, principalmente quando o agente
tóxico específico é desconhecido. Está substância possui elevado poder adsorvente, sendo que
um grama de carvão ativado pode oferecer uma superfície de adsorção de 100 m² (39).
As medidas de suporte à vida devem ser consideradas incluindo o emprego de
medidas adjuvantes para correção dos sintomas que podem acompanhar essas intoxicações
como convulsão, alterações na temperatura, dificuldade respiratória, distúrbios
hidroeletrolíticos e ácido-básico, excitabilidade, vômitos persistente, entre outras alterações.
Essas medidas terapêuticas, em geral, não diferem das utilizadas em outras emergências
toxicológicas (39).
2.6.2. Terapia específica
O gluconato de cálcio é empregado rotineiramente a clínica veterinária, com
utilização na intoxicação por MF para antagonizar o quadro de hipocalcemia apresentado por
algumas espécies como os gatos (34) e assim, reduzir a agitação muscular, normalizar a
retração do miocárdio e aumentar a sobrevida do animal intoxicado (40).
O tiossulfato é um oxianião de enxofre produzido pela reação de íons sulfito com
o elemento enxofre, em água a ferver. Os tiossulfatos são estáveis apenas em soluções neutras
ou alcalinas. O tiosulfato de magnésio possui mecanismo de ação desconhecido na
intoxicação por MF, contudo sua ação benéfica nessas intoxicações pode ser atribuída aos
seus vários efeitos positivos no organismo, visto que o MF possui ação principal no sistema
nervoso e cardíaco (41).
O tiosulfato de magnésio apresentou ação antagônica ao efeito da atividade tóxica
da P. marcgravii em camundongos brancos. Os autores administraram 50 g da mesma
solução, via intravenosa, num novilho prostrado de 300 Kg intoxicado com a P. marcgravii e
no dia seguinte o animal estava recuperado (41).
13
Entre as terapias específicas, podemos agrupar alguns compostos cuja terapia
funciona como antídoto para a intoxicação pelo monofluoracetato de sódio visa o
desenvolvimento de um meio de impedir a síntese de fluorocitrato e o bloqueio na
mitocondria da aconitase, proporcionanando a tranformação do citrato em isocitrato. Os grupo
doadores de acetato evitam a metabolização do MF em fluorcitrato. Espera-se que compostos
precursores de acetato (referidos como “doadores de acetato”) sejam capazes de reduzir a
inibição competitiva do fluoracetato pelo mesmo sítio ativo (coenzima A), exercendo um
efeito protetor na intoxicação pelo MF, por meio da diminuição da síntese de fluorcitrato.
Para alcançarem sucesso terapêutico essas substâncias devem ser solúveis e penetrar
rapidamente nas estruturas celulares (10).
Com exceção do etanol, estas substâncias não são facilmente encontradas no
mercado de produtos químicos e muito menos nos estabelecimentos que comercializam
medicamentos de uso veterinário, de forma que o fornecimento é feito por empresas
estrangeiras. O grupo dos doadores de acetato é composto além da acetamida, pelo etanol,
monoacetato de glicerol e o acetato de sódio.
ETANOL
O etanol (CH3CH2OH), também chamado álcool etílico ou simplesmente álcool é
uma substância orgânica obtida da fermentação de açúcares, hidratação do etileno ou redução
a acetaldeído. O etanol é o mais comum dos álcoois. Seu emprego como medicamento,
remonta á era hipocrática, apresentando inúmeras indicações terapêuticas como pneumonias,
moléstias febris, síncopes, desfalecimentos, hemorragias diversas, hidropisias e fraqueza
cardíaca (42).
No organismo, a oxidação do etanol resulta na produção de acetato, exercendo
papel de antídoto frente as intoxicações por MF. Além disso, o etanol catalisa a oxidação do
acetato pelas células acometidas pelo MF. Estudos relataram o efeito protetor do etanol na
dose de 800 mg/ kg, por via subcutânea, em camundongos e suínos intoxicados com 0,25 e
0,5 mg/kg de MF (42).
MONOACETATO DE GLICEROL
O monoacetato de glicerol, conhecido como Monoacetin® é um éster resultante
da acetilação do glicerol. O monoacetato glicerol possui baixa toxicidade, podendo ser
empregada in vivo, com uso bem sucedido como um doador de acetato no tratamento de
intoxicações por MF. Em um estudo realizado com coelhos, cães, macacos e ratos o
14
monoacetato de glicerol se mostrou eficiente no tratamento da intoxicação pelo MF, pelas
vias intramusculares e intravenosa (43).
Provavelmente, o tratamento com monoacetato de glicerol baseia-se no fato de
que o composto consegue reduzir o acúmulo de citrato nos tecidos. Em estudos, comparando
o uso de monoacetato de glicerol e acetamida em intoxicações por MF, os dois compostos
foram capazes de reduzir as concentrações de citrato nos cérebro, coração e rins de ratos. Em
destaque, observa a maior diminuição do citrato no cérebro de ratos tratados com monoacetin
quando pareados aos tratados com acetamida (36).
O mecanismo de ação e a eficácia do monoacetato de glicerol ainda não estão
completamente esclarecidos, principalmente quanto a sua ação no sistema nervoso central.
Contudo, sabe-se que a ausência de convulsões nos animais tratados com o essa substância
indicou uma diminuição na síntese de fluorocitrato ou a interferência na passagem deste pela
barreira hematoencefálica (24).
ACETATO DE SÓDIO
O acetato de sódio também conhecido como sal de sódio, é um composto
cristalino incolor, solúvel em água e etanol. No corpo, ele é metabolizado sendo transformado
em acetilcoenzima A no ciclo de Krebs, até sua completa oxidação. Quando o acetato é
fornecido ao paciente como um sal de sódio, ele é metabolizado à CO2 e água resultando nas
formações de um mole de bicarbonato de sódio para cada mole de acetato de sódio consumido
(43).
Segundo pesquisas (43), o acetato de sódio é ineficaz no envenenamento pelo MF,
em coelhos intoxicados experimentalmente, provavelmente pelo fato deste composto não
apresentar um caráter neutro e ser altamente carregado de íons. Apesar da sua capacidade de
fornecer algum acetato utilizável, o acetato de sódio produz uma alcalose que vai
potencializar a ação do MF e produzir arritmias. Portanto o acetato de sódio não pode ser
recomendado como antídoto para animais intoxicados pelo MF.
15
3. USO DA ACETAMIDA NAS INTOXICAÇÕES POR MONOFLUOROACETATO
DE SÓDIO
3.1. Características bioquímicas
A acetamida (C2H5NO) é uma substância orgânica classificada como amida do
ácido acético e apresenta solubilidade na água. Vários são os trabalhos que tem empregado a
acetamida no tratamento de animais intoxicados experimentalmente pelo MF ou por plantas
que o possuem como princípio tóxico, devido seu papel de substância doadora de acetato (11,
25, 26, 44, 45). Aparentemente, a acetamida é capaz de penetrar no interior da mitocôndria e
interfere nas reações do MF no ciclo de Krebs (36).
3.2. Mecanismo protetor
Uma das possíveis explicações para o efeito benéfico da acetamida em
intoxicações por MF, é que a acetamida impede o acúmulo de citrato (36). Em um
experimento, analisaram as concentrações de citrato no tecidos frescos do cérebro, coração e
rim de ratos machos, em intervalos de 35 ou 60 minutos após a intoxicação de MF em doses
de 5 ou 10mg/kg. Aqueles tratados com acetamida receberam o composto duas horas antes da
intoxicação, por uma injeção subcutânea.
A Tabela 1 mostra as concentrações de citrato nos três órgãos de ratos
intoxicados com duas diferentes doses de MF e em dois intervalos diferentes.
Os resultados apontam que em todos os casos, o uso da acetamida não alterou as
concentrações de citrato no tecido cerebral. Porém, acúmulo de citrato é muito maior nos
tecido cardíaco e renal em animais não tratados com acetamida, em relação ao intoxicados
tratados com o composto (36).
Sobre a dose tóxica, a tabela aponta que quanto maior dose maior também é o
acúmulo de citrato nos tecidos. Entretanto, com relação ao tempo de avaliação, nota-se que
devido a natureza muito aguda da intoxicação, não houve grandes diferenças em relação ao
acúmulo de citrato (36).
O fato da acetamida reduzir o efeito tóxico do MF e diminuir o acúmulo de citrato
nos tecidos suporta a opinião (19) de que o acúmulo de citrato pode ser responsável
totalmente ou parcialmente pelo distúrbios tóxicos causando pelo MF (36). Porém, na
16
intoxicação por MF em ovelhas, os níveis de citrato no sangue ou tecidos não foram
importantes nos achados clínicos (32).
Tabela 1. Concentração de citrato de tecidos após a injeção de monofluoroacetato de sódio
e acetamida (125mg/kg).
Tempo após a
intoxicação
(min)
Dose tóxica
do MF
(mg/kg)
Nº Cérebro Coração Rim
35 5 4
C/ acetamida 233 ± 85 342 ± 132 254 ± 55
S/ acetamida 240 ± 60 567 ± 108 647 ± 220
S/ intoxicação 97 59 42
60 5 3
C/ acetamida 222 ± 60 353 ± 36 228 35
S/ acetamida 283 ± 26 1147 ± 76 816 180
S/ intoxicação 81 31 29
35 10 3
C/ acetamida 278 ± 50 454 ± 24 369 ± 126
S/ acetamida 285 ± 65 1209 ± 145 1033 ± 130
S/ intoxicação 97 38 37
60 10 3
C/ acetamida 274 ± 16 710 ± 119 627 ± 225
S/ acetamida 279 ± 63 1277 ± 291 1291 ± 245
S/ intoxicação 98 56 52
Fonte: Adaptado de (36).
17
4. PROTOCOLOS DE INTOXICAÇÃO E TRATAMENTO COM ACETAMIDA NOS
ANIMAIS DOMÉSTICOS
4.1. Ratos
O fornecimento de acetamida (CH3CO-NH2) a animais recém intoxicações por
monofluoracetato resulta em considerável efeito protetor (11). Já foi demonstrado em ratos
que o fornecimento desse antídoto, uma hora antes da intoxicação por P. marcgravii, evita o
aparecimento de sinais clínicos e da morte em 100% dos casos (45).
Pesquisas confirmam que quanto mais rápido a aplicação da acetamida maiores as
chances de sucesso no efeito protetor. Entretanto, ratos que receberam 10mg/kg de MF e
tratados com acetamida 8 minutos depois da intoxicação, permaneceram assintomáticos (36).
O uso da acetamida na intoxicação por MF foi testado juntamente com plantas
tóxicas que causam morte subida em ratos, observando com resultados satisfatórios. Tanto o
MF (4 e 8mg/kg) quanto a acetamida (8g/kg) foram administrados por via oral (sonda
orogástrica), em doses únicas. O intervalo de tempo entre a administração dos compostos foi
de duas horas. O início dos primeiros sinais clínicos ocorreu entre 33 minutos e 1h37 mim,
após a intoxicação (11).
A acetamida, quando administrada previamente em doses suficientemente altas,
evitou o aparecimento dos sinais clínicos ou morte dos animais intoxicados por MF. No
mesmo experimento, todos os ratos foram novamente submetidos ao mesmo protocolo
experimental, porém sem a administração de acetamida. Assim, todos os animais
manifestaram sinais clínicos e morte. O estudo também comprova que os resultados esperados
com o uso na acetamida nessas intoxicações depende da dose administrada e da toxidez da
planta em questão (11).
O experimento realizado por (11) não explica como a acetamida foi capaz de
evitar os sinais clínicos e a morte dos ratos.
4.2. Coelhos
Foi realizado um estudo em coelhos, em que três animais receberam por via
intragástrica, respectivamente 1, 0,5 e 0,5g/kg de brotos de Pseudocalymma elegans, planta de
distribuição mais limitada, presente somente no estado do Rio de Janeiro, cujo princípio
tóxico é o MF, previamente dessecados, triturados e suspendidos em 50 ml de água. Os
18
animais receberam tratamento prévio com 3g/kg de acetamida diluída em 25 ml de água, duas
horas antes da administração da planta. Os três animais intoxicados permaneceram
assintomáticos, após a intoxicação (26).
Em um segundo momento, os mesmos três animais foram novamente intoxicados,
da mesma forma, porém sem o uso da acetamida. Dessa forma, os coelhos iniciaram sinais
clínicos de intoxicação em torno de uma hora após o receberem a planta tóxica, cursando com
apatia, tremores musculares e vocalização. Os três animais morreram em menos de 50
minutos após o inicio da sintomatologia clínica. Durante a necropsia e o exame
histopatológico, observou-se corpúsculos de choque na veia centrolobular e nos sinusóides
hepáticos, tumefação e vacuolização de hepatócito. Porém, os autores não verificaram a
presença da DHV, característica típica da histopatologia da intoxicação por MF. (26)
4.3. Ovinos
Na África do Sul foi realizado um experimento, com o objetivo de testar a
acetamida como antídoto para as intoxicações por Dichapetalum cymosum, planta africana,
que tem como princípio tóxico a MF. Na dosagem de 2g/kg de acetamida antes ou
simultaneamente a planta tóxica, 100% dos animais sobreviveram a intoxicação, enquanto que
nenhum animal sobreviveu a intoxicação no grupo que não recebeu a acetamida. Segundo os
autores, a acetamida demonstrou valor terapêutico como antídoto nessas situações (44).
Em um determinado estudo (Experimento I), seis ovinos foram intoxicados com
uma planta, contendo como princípio tóxico, o MF. Primeiramente, dois desses ovinos
receberam, por via oral, 1 g/kg de brotos roxos frescos de Pseudocalymma elegans, sendo que
um recebeu 2g/kg de acetamida anteriormente a intoxicação. Após exame clínico, nenhum
dos dois animais apresentou sinais clínicos de intoxicação (26).
Já em um segundo experimento (Experimento II), dois ovinos foram previamente
tratados com acetamida 2g/kg e 3g/kg e posteriormente receberam a P. elegans, por via oral,
duas doses diferentes (0,67g/kg e 1g/kg, respectivamente). Nenhum dos animais sobreviveu a
intoxicação, sendo que um animal apresentou morte repentina, assintomático e outro morreu
12h54min após a intoxicação com sinais de polaquiúria, taquicardia, nistagmo, ranger de
dentes, movimentos de pedalagem, midríase, diminuição de reflexos pupilares, dispnéia
expiratória, ruídos inspiratórios e respiração abdominal (26).
19
O terceiro experimento (Experimento III) avaliou dois ovinos, em que receberam
0,33g/kg de P. elegans e previamente tratados com 2g/kg de acetamida. Os animais não
apresentaram sintomatologia após a intoxicação. Da mesma forma, uma semana depois, os
mesmos animais foram intoxicados novamente, porém sem a prevenção da acetamida. Nessa
segunda situação, os sinais foram verificados 3h01min e 3h36min após a administração da
planta, acompanhado de morte súbita três e cinco minutos posteriormente ao início da
sintomatologia clínica.
Segundo os autores, o tratamento prévio com acetamida do terceiro experimento,
evitou o aparecimento dos sinais clínicos e o óbito com evolução superaguda.(26). Esses
resultados foram semelhantes aos descritos por (11), nos quais a administração anterior de
acetamida a ratos que receberam folhas frescas de P. marcgravii, extratos concentrados de
plantas tóxicas e por MF, também impediu o óbito. A administração prévia de 2g/kg de
acetamida aos bovinos que receberam 0,5mg/kg de MF ou 1g/kg de P. marcgravii, também foi
capaz de evitar o aparecimento dos sinais clínicos e a morte de todos os animais (25). O efeito
protetor da acetamida evidenciado nesse estudo foi similar aos outros trabalhos (44), que
avaliaram a eficácia da administração do MF em cobaios e ovinos intoxicados.
Assim, como citados por outros autores, na histopatologia do rim dos ovinos, foi
identificado a DHV, típica nessas situações (26).
4.4. Caprinos
O protocolo experimental realizado com ovinos foi testado em caprinos. E assim
como nos ovinos, no Experimento I, realizado com dois animais (1g/kg de brotos roxos
frescos de Pseudocalymma elegans, sendo que um recebeu 2g/kg de acetamida) os caprinos
intoxicados não apresentaram sinais clínicos.
Também no Experimento II (um recebeu acetamida 2g/kg de acetamida e
0,67g/kg de brotos frescos e outro recebeu 3g/kg de acetamida e 1g/kg de brotos de P.
elegans, por via oral) e no Experimento III (dois caprinos receberam 0,33g/kg de P. elegans e
previamente tratados com 2g/kg de acetamida) os resultados foram semelhantes aos que
ocorreram em ovinos, sendo que os animais que receberam doses diferentes da planta e da
acetamida apresentaram sinais clínicos e posteriormente vieram a óbito.
20
Já no Experimento III, a acetamida se mostrou mais eficaz, sendo que no primeiro
momento ela evitou os sinais e a morte, porém quando novamente intoxicados, porém sem a
acetamida, os animais apresentaram sintomalogia e morreram em poucos minutos.
4.5. Bovinos
A acetamida foi testada na prevenção da intoxicação por MF (0,5mg/kg) em
bovinos, em um experimento com 5 animais, sendo que três foram intoxicados por MF e dois
por folhas secas de P. marcgravii (1,0g/kg). Dois animais na primeira situação receberam
acetamida (0,38 e 2g/kg) e somente um da segunda situação recebeu o antídoto (1,0g/kg) (25).
A acetamida evitou o aparecimento dos sinais clínicos e a morte de quatro dos
cinco animais estudados. O único animal que apresentou sinais clínicos e óbito recebeu
apenas 0,38g/kg de acetamida, o que pode justificar a não eficácia do antídoto, já que (11)
também verificaram que em doses menores a acetamida não é capaz de induzir proteção nas
intoxicações por MF (25).
Os animais cuja administração de acetamida preveniu a sintomatologia, receberam
novamente, após uma semana, a mesma dose anteriormente utilizada, porém sem a acetamida.
Nesse segundo momento, todos os animais apresentaram sinais da intoxicação e morreram
(25).
Logo, o estudo afirma que utilização da acetamida na tentativa do tratamento de
animais, sobretudo, naqueles cujo quadro clínico de intoxicação foram mais protraído, ou
seres humanos intoxicados por MF deve ser realizada sempre que possível. Segundo os
autores, em relação aos bovinos, o emprego da acetamida no tratamento do intoxicação por
plantas tóxicas que causam morte súbita, deve ser vista com cautela, uma vez que, para ser
eficaz, o composto deve ser administrado aos animais poucas horas antes ou imediatamente
após o animal ingerir a planta (25).
21
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, acredita-se que a acetamida possa auxiliar na prevenção de
casos de intoxicação por monofluoroaceto de sódio. Uma alternativa preventiva é mais barata
e mais eficiente do que tratar animais acometidos, que na maioria dos casos, em função de um
caráter superagudo, impede qualquer solução terapêutica. A eficácia da acetamida depende de
diversos fatores, como a toxidez da planta em casos de intoxicação por ervas tóxicas, tempo
decorrido entre a intoxicação e o fornecimento do antídoto e as doses de acetamida (44).
Entretanto, o uso deveria ser realizado de forma contínua, em áreas de risco de
intoxicações, já que o fornecimento do composto para animais comprovadamente intoxicados
é quase inviável, para a grande maioria dos casos, dada a rápida evolução clínica. Além disso,
pesam contra o alto valor comercial deste antídoto e sua difícil aquisição e disponibilidade no
campo (25).
Caso, após inúmeras pesquisas e seja realmente comprovado que a acetamida
pode prevenir os sinais e as mortes provocadas por intoxicações por monofluroacetato de
sódio, não seja indicada para uso em animais, o mecanismo protetor pode ser mimetizado por
outras moléculas naturais ou fabricadas, no intuito de repetir o efeito.
É notória a escassez de conhecimento sobre o uso da acetamida nas intoxicações
por monofluoroaceto de sódio, visto que ainda não se conhece os reais efeitos protetores. A
acetamida abre um universo de opções nas intoxicações por monofluoracetato de sódio, já que
o estudo sobre possíveis tratamentos parece perder força diante de pesquisas sobre a produção
de bactérias geneticamente modificadas capazes de quebrar o monofluoracetato de sódio no
aparelho digestivo dos animais e impeça a intoxicação.
Talvez o desenvolvimento de pesquisas mais consistentes, que realmente
coloquem a prova a eficácia do composto, possa minimizar a atual incapacidade de reação de
médicos veterinários de todo mundo, quando se depara com animais acometidos pelo
monofluoroacetato de sódio.
A confecção de literatura como esta, além de aumentar e concretizar o
conhecimento de quem escreve, ainda permite a difusão do que foi e está sendo desenvolvido
e gera um senso crítico capaz de agigantar aqueles que durante a rotina médico-veterinária se
deparam com casos severos de intoxicação por monofluoroacetato de sódio. Sendo assim, os
tornam capazes ao menos de entender o mecanismo tóxico e o que tem sido testado em todo o
mundo para minimizar as grandiosas perdas.
22
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