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N o 1.942 - Ano 42 - 30 de maio de 2016 VACINA CONTRA O SACRIFÍCIO Estudo pioneiro desenvolvido no ICB pode resultar em uma vacina contra a leishmaniose visceral canina, capaz de bloquear a infecção no organismo do inseto transmissor do agente causador da doença, impedindo, assim, que ela chegue a outros hospedeiros. Com essa vacina, o cão imunizado deixaria de ser ameaça à saúde pública e não precisaria mais ser sacrificado. Página 5 ‘Domingo no campus’ celebra Dia Mundial do Meio Ambiente Página 3 O professor Rodolfo Giunchetti coordena a pesquisa, que utiliza a proteína do próprio inseto flebótomo transmissor do protozoário Foca Lisboa BOLETIM 1942.indd 1 30/05/2016 09:27:05

Vacina contra o sacrifício - UFMG

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Page 1: Vacina contra o sacrifício - UFMG

No 1.942 - Ano 42 - 30 de maio de 2016

Vacina contra o sacrifícioEstudo pioneiro desenvolvido no ICB pode resultar em uma vacina contra a leishmaniose visceral canina, capaz de bloquear a infecção no organismo do inseto transmissor do agente causador da doença, impedindo, assim, que ela chegue a outros hospedeiros. Com essa vacina, o cão imunizado deixaria de ser ameaça à saúde pública e não precisaria mais ser sacrificado.

Página 5

‘Domingo no campus’ celebra Dia Mundial do Meio Ambiente

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O professor Rodolfo Giunchetti coordena a pesquisa, que utiliza a proteína do próprio inseto flebótomo transmissor do protozoário

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Opinião

Esta página é reservada a manifestações da comunidade universitária, por meio de artigos ou cartas. Para ser publicado, o texto deverá versar sobre assunto que envolva a Universidade e a comunidade, mas de enfoque não particularizado. Deverá ter de 5.000 a 5.500 caracteres (com espaços) e indicar o nome completo do autor, telefone ou correio eletrônico de contato. A publicação de réplicas ou tréplicas ficará a critério da redação. São de responsabilidade exclusiva de seus autores as opiniões expressas nos textos. Na falta destes, o BOLETIM encomenda textos ou reproduz artigos que possam estimular o debate sobre a universidade e a educação brasileira.

EscoLas MÉDicasEdward Tonelli*

*Professor emérito e titular de Pediatria da UFMG. Ex-presidente e membro emérito da Academia Brasileira de Pediatria. Membro emérito da Academia Mineira de Medicina.

A primeira escola médica do mundo foi criada em Bagdá, Iraque, em 765. O ensino superior no Brasil teve início

com a chegada da Família Real, quando D. João VI autorizou a fundação das duas primeiras escolas de medicina: a primeira, em Salvador, em 18 de fevereiro de 1808, e a segunda, no Rio de Janeiro, em 5 de no-vembro do mesmo ano. O ensino superior no Brasil, portanto, só teve início 257 anos após o surgimento da primeira universidade na América Espanhola, a de São Marcos, no Peru, fundada em 1551.

Atualmente, o Brasil é o segundo país no mundo em número de escolas médicas (Índia, com 381, Brasil, com 268, China, com 150, e Estados Unidos, com 141). Entre os 268 cursos médicos existentes no Brasil, 44,77% são mantidos por instituições públicas, e 55,23%, por escolas privadas. Os estados com maior número de escolas mé-dicas são São Paulo (46), Minas Gerais, (39), Rio de Janeiro (19), Bahia (17), Rio Grande do Sul e Paraná (16).

Nos últimos anos, o Conselho Federal de Medicina (CFM) e outras entidades médicas vêm questionando o Ministério da Educação sobre a autorização indiscriminada – até certo ponto irresponsável – para o funcio-namento de cursos médicos pelo país. Até a década de 1950, havia 27 escolas médicas, em sua maioria, federais. Na década de 90, já eram 105. No período de janeiro de 2000 a fevereiro de 2016, ou seja, nos últimos 15 anos, foram abertas 163 escolas de medici-na, sobretudo privadas, muitas delas sem as mínimas condições estipuladas pelo MEC.

Contudo, continua a autorização de no-vos cursos privados – no âmbito do Programa Mais Médicos – sem as mínimas condições de funcionamento. Estão sendo instituídos 36 novos cursos, em vários estados, e outros 22 cursos em cidades do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, com população superior a 50 mil habitantes e com relação médico/1.000

Em decorrência da acentuada diversi-dade socioeconômica brasileira e da falta de uma política adequada, prevalece a má distribuição de médicos nas regiões do país: Norte (1,09), Nordeste (1,30), Centro-Oeste (2,20), Sudeste (2,75) e Sul (2,18). Em al-gumas capitais, como Vitória, Porto Alegre, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, as taxas médico/1.000 habitantes são elevadas.

O MEC pretende atingir a relação 2,6/1.000 rapidamente, mediante a abertura de novos cursos. Contudo, o CFM, com base no excelente estudo Demografia médica, este de 2012, já projetava, para 2028, a relação 2,5/1.000, com base nas escolas médicas existentes em 2010. Portanto, era uma questão de tempo encontrar a solução para o problema.

Anualmente, cerca de 16 mil médicos são diplomados no Brasil. Nos próximos cinco anos, com as atuais 268 escolas, serão graduados 24.400. Se o governo continuar abrindo novos cursos para assegurar as anunciadas vagas até 2017, é possível que o número de médicos diplomados, anualmen-te, possa alcançar, em meados de 2025, a marca de 32 mil (CFM-nov/15).

O governo, apesar de estudos mostrarem o contrário, admite que o crescimento de diplomados é um fator favorável à fixação desses profissionais no interior e vem resis-tindo à instituição da carreira de estado para médico, no SUS, que poderia amenizar esse grave problema. É bem provável, contudo, que ocorra, em futuro próximo, fechamento de muitas escolas médicas, em decorrência do mau planejamento oficial. No momento, faltam docentes, inclusive, para alguns novos cursos nas universidades federais.

habitantes inferior a 2,7. O CFM já alertou a Justiça Federal sobre a abertura desses cursos privados. Ocorre que o governo fe-deral já anunciou, em abril do ano passado, que pretende criar, até dezembro de 2017, 11.447 vagas para medicina.

A qualidade de muitos cursos é sofrível. A última avaliação trienal dos cursos médi-cos feita pelo MEC, em 2013, contemplou 154 formações – 27 (17,5%) foram reprova-das e estão sob intervenção. Novas diretrizes curriculares para cursos médicos já estão em vigor. Eles serão examinados pela Avaliação Nacional Seriada dos Estudantes de Medi-cina (Anasem-Inep), no segundo, quarto e sexto anos (Portaria 168, MEC, 01/04/16). A primeira avaliação, em agosto deste ano, será direcionada a alunos do segundo ano, que entraram na universidade em 2015. As avaliações do segundo e quarto anos terão caráter formativo, indicando pontos fortes e deficiências. No sexto ano do curso, a prova seguirá os moldes do Revalida – Exame Na-cional de Revalidação de Diplomas Médicos expedidos no exterior –, e os estudantes deverão atingir uma nota mínima para que possam se formar. Os resultados da avalia-ção serão utilizados por cursos e instituições de ensino superior, para subsidiar processos de seleção de residência médica, e por or-ganismos públicos, para fins de avaliação da formação médica.

Segundo Mario Scheffer, coordenador da pesquisa Demografia médica (publicada em novembro de 2015 pela Faculdade de Medicina da USP e pelos conselhos Federal de Medicina e de Medicina do Estado de São Paulo), trabalham no Brasil 432.870 médicos, taxa de 2,1 médicos por 1.000 habitantes, bem próxima da dos Estados Unidos (2,5), da do Canadá (2,4) e acima da verificada no Chile (1,6) e na China (1,5). Distrito Federal, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Espírito Santo e Minas Gerais têm taxa médico/1.000 habitantes superior à média nacional.

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Cordas de slackline esticadas, toalhas e cestas de piquenique pelo gramado e um carrinho de pipoca logo na entra-

da da Estação Ecológica da UFMG. Esse é o cenário que espera o garoto Bernardo, de apenas 5 anos, que participará novamente do Domingo no campus. Desta vez, a atração será realizada em 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, a partir das 9h.

“Desde que praticou slackline pela pri-meira vez [na edição de maio de 2015], ele não esqueceu mais e sempre pergunta: quando será o próximo?”, conta o pai de Bernardo, o servidor público Frederico de Araújo Toledo, ex-aluno do curso de Edu-cação Física da UFMG. Quando frequentou a Universidade, Frederico sonhava ver o campus mais aberto à comunidade externa. “Como estudante usufruí de vários espaços da UFMG, dentro e fora da Educação Física, participei de quase tudo, aproveitei bastante. Por isso, acredito que, quando a instituição abre esse espaço tão lindo, permite que as pessoas usufruam, desenvolvam um sentimento de identificação e pertencimen-to, independentemente de serem ou não alunos, servidores, professores. Sinto que a UFMG está ficando mais horizontal, os espaços estão sendo mais democratizados e compartilhados. No domingo, teremos mais um momento para curtir a família, interagir, conhecer novas pessoas e aproveitar a UFMG como espaço de lazer”, afirma.

Quem também conta as horas para mais uma edição do Domingo no campus é a dona Maria Liberata Magnani, 84 anos, dos quais 50 trabalhando como pipoqueira, ofício que lhe possibilitou criar nove filhos e dois netos. “Trabalho como pipoqueira desde a primeira

inauguração do Mineirão [em 1965]. Junto com meu filho, Adnan, participo de eventos na UFMG já há bas-tante tempo. É um público muito fiel e que sempre elogia os sabores.”

Posse coletivaEspaço público é, por

definição, aquele de uso comum e de posse coletiva. Há ambientes de circulação (ruas e praças), de lazer e recreação ( parques, play-grounds e pistas de skate), de contemplação (jardins públicos e monumentos) e de preservação e conservação (reserva ecológica e prédio tombado). A Estação Ecológica se enquadra nesta modalidade e é também ambiente de extensão e pesquisa universitária. Por meio do Domingo no campus, a UFMG tem incen-tivado o compartilhamento de seus espaços, que nem sempre são vistos pela população como opção de lazer e interação. Na ava-liação da pró-reitora de Extensão, Benigna Maria de Oliveira, a receita tem dado certo. “O público tem sido maior a cada edição, inclusive o formado por pessoas da comu-nidade externa”, afirma.

Para atender com qualidade a esse públi-co, que também é convidado a trazer seus lanches e aproveitar para fazer um piqueni-que ao ar livre, a infraestrutura do evento contará com postos de limpeza, banheiros e opções de alimentação com food truck de crepioca, cachorro quente e carrinho de pipoca. A programação inclui, entre outras

atividades, oficinas intera-tivas, para todas as idades, relacionadas à educação ambiental, danças, cami-nhadas ecológicas, plane-tário e exibição de curtas no Cineclube Olaria.

Entre os responsáveis pelo sucesso do evento também estão os estu-dantes, como destaca a pró-reitora de Exten-são. “A participação dos monitores, bolsistas e voluntários dos projetos parceiros, como o Tô de Boa Tô no Campus e o

Programa Estação Ecológica, é muito im-portante e fortalece a dimensão acadêmica da extensão universitária”, conclui Benigna Maria de Oliveira.

O Domingo no campus é iniciativa con-junta das pró-reitorias de Extensão (Proex), de Administração (PRA) e de Assuntos Estudantis (Prae), da Diretoria de Ação Cultural (DAC), da Coordenadoria de As-suntos Comunitários (CAC) e do Centro de Comunicação da UFMG (Cedecom). Mais informações estão disponíveis na página do evento no Facebook: https://www.facebook.com/domingonocampusufmg/.

ansiEDaDE a MiLPróximo Domingo no campus celebra Dia do Meio Ambiente; frequentadores de edições anteriores falam de suas expectativas

Zirlene Lemos*

*Jornalista da Assessoria de Comunicação da Pró-reitoria de Extensão

Atrações• Ginásticaprimitiva

• Caminhadasecológicas

• Trilhadosossego

• Trilhadocerrado

• Trilhadasborboletas

• Oficinasinterativas

• Bicho-pau

• Cerâmica

• Cartõesecológicos

• Dançacigana

• Dançadesalão

• Planetário

• SessõesdoCineclubeOlaria

• TôdeBoa,TônoCampus

• Piquenique

Bernardo e os pais: sentimento de identificação com o campus

Maria Liberata: clientela fiel

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elO Grande Prêmio UFMG de Teses 2015 para a área de Ciências Humanas, Ciências Sociais e Aplicadas, Linguística, Letras e Artes foi entregue no último dia

25, no gabinete da Reitoria. Natascha Stefania Carvalho de Ostos venceu com o trabalho Sociabilidade parlamentar em cena: atores políticos, cotidiano e imprensa na cidade do Rio de Janeiro (1902-1930), defendida no Programa de Pós-graduação em História, sob orientação da professora Regina Horta Duarte.

O trabalho vencedor aborda as representações do Parla-mento na imprensa da Primeira República, no Brasil. De acordo com a autora, sua pesquisa enfatizou os aspectos informais e de sociabilidade observados na atuação de deputados e senadores, como frequência às sessões, viagens durante o funcionamento das casas legislativas, relações público-privado e indicações de parentes para cargos públicos. “Mostro como a movimentação cotidiana dos parlamentares aparece nos veículos de imprensa e como essa representação ajudou a sedimentar, na sociedade, a ideia do que é política”, explicou Natascha.

Doze teses foram indicadas pelos respectivos programas para concorrer ao prêmio prin-cipal. Duas delas foram agraciadas com Menção Honrosa: Incomensurável comum: políticas da escrita em Graciliano Ramos, de Willy Carvalho Coelho, orientado pelo professor Wander Melo Miranda (Programa de Pós-graduação em Estudos Literários), e Ao fim da cidade: conjuntos habitacionais nas bordas urbanas, de André Luiz Prado, orientado pela professora Silke Kapp (Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo).

Os grandes prêmios das áreas de Ciências Agrárias, Ciências Biológicas e Ciências da Saúde e de Ciências Exatas e da Terra e Engenharias foram entregues em outubro do ano passado. A premiação na área de Humanidades foi adiada porque, à época, não houve consenso entre os avaliadores.

Após entregar placas e diplomas, o reitor Jaime Ramírez destacou que a UFMG tem como alicerce a valorização do mérito e do avanço do conhecimento. “O prêmio constitui estímulo aos autores, em suas carreiras acadêmica e profissional, e inspiração para os programas”, disse. A pró-reitora de Pós-graduação, Denise Trombert de Oliveira, acrescentou que, ao reconhecer os melhores trabalhos, a Universidade incentiva os doutorandos a buscar, em sua produção, resultados que tenham impacto relevante”.

Deu no ufmg.br

no EsPELHoTese sobre a representação do Parlamento na imprensa durante a Primeira República vence Grande Prêmio UFMG 2015 na área de Humanidades

Teses indicadasAdministração

Armando Araújo de Souza Júnior, orientado pelo professor Ricardo Silveira Martins

Artes

Francisco Sebastião de Paula, orientado pela professora Maria do Carmo de Freitas Veneroso

Ciência da Informação

Rodrigo Moreno Marques, orientado pela professora Marta Macedo Kerr Pinheiro

Ciência Política

Viviane Petinelli e Silva, orientada pela professora Cláudia Feres Faria

Comunicação Social

Danila Gentil Rodriguez Cal, orientada pela professora Rousiley Celi Moreira Maia

Demografia

Sulma Marcela Cuervo Ramírez, orientada pelo professor Alisson Flávio Barbieri

Economia

Leandro Alves Silva, orientado pelo professor Eduardo da Motta e Albuquerque

Educação

Juliana Batista dos Reis, orientada pelo professor Juarez Tarcisio Dayrell

Filosofia

Marco Antônio Sousa Alves, orientado pelo professor Rodrigo Antônio de Paiva Duarte

Solenidade reuniu autores e orientadores das teses premiadas no gabinete da Reitoria

Regina Horta e Natascha de Ostos: aspectos informais da atuação parlamentar

Matéria publicada no Portal UFMG, seção Notícias da UFMG, em 25/05/2016

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Pesquisa: Desenvolvimento tecnológico aplicado ao estudo de uma nova vacina capaz de bloquear a transmissão da leishmaniose visceral canina

Equipe: Rodolfo Cordeiro Giunchetti, Walderez Ornelas Dutra, Daniella Castanheira Bartholomeu, Ricardo Toshio Fujiwara, Nelder de Figueiredo Gontijo, Ludmila Zanandreis de Mendonça, Patrícia Silveira, Jaqueline Costa Leite, todos da UFMG, em parceria com Rodrigo Correa Oliveira, Olindo Assis Martins Filho e Denise da Silveira Lemos, da Fiocruz/MG, Alexandre Barbosa Reis e William de Castro Borges, da Ufop

financiamento: Capes, PNPD do Programa de Pós-graduação em Biologia Celular (ICB) e PPSUS, iniciativa do Ministério da Saúde, CNPq e Fapemig

A eutanásia de cães infectados ainda é um dos procedimentos que compõem a estratégia adotada pelo Ministério da Saúde para evitar a transmissão da leishmaniose visceral canina.

Vacina em desenvolvimento no Instituto de Ciências Biológicas (ICB) pode preservar a vida desses animais, uma vez que os torna incapa-zes de transmitir o protozoário causador da doença. Coordenada por Rodolfo Cordeiro Giunchetti, médico veterinário e professor do Departamento de Morfologia, a pesquisa já tem patente depositada.

O estudo, pioneiro no mundo, utiliza proteína do próprio inseto flebótomo que transmite o protozoário, para interferir no seu ciclo biológico. Desenvolvida em parceria com pesquisadores da Univer-sidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e do Centro de Pesquisas René Rachou (Fiocruz/MG), a formulação busca causar desequilíbrio no inseto, induzindo à diminuição do número de ovos e bloqueando a infecção em seu organismo, de modo a evitar que ele leve a outros hospedeiros o parasito Leishmania chagasi.

A intenção é que, ao se alimentar do sangue de um cão que esteja imunizado por essa vacina, o flebótomo ingira – além do próprio sangue e do parasito – anticorpos contra suas próprias proteínas. “Assim, mesmo doente, o cão com leishmaniose visceral não teria importância na transmissão desse protozoário e poderia ser submetido ao tratamento, sem causar impacto para a saúde pública”, prevê o pesquisador.

Prova de conceitoPor ser uma abordagem inédita, a pesquisa precisou passar pela

chamada prova de conceito, constituída, nesse caso, de testes que confirmem a hipótese de que as proteínas do inseto podem bloquear a infecção pelo protozoário causador da leishmaniose visceral. A primeira etapa foi realizada em camundongos. “Tivemos a grata surpresa de perceber que os insetos alimentados no grupo de ca-mundongos imunizados põem número de ovos significativamente menor do que quando se alimentam no grupo controle, que recebeu placebo”, conta o professor.

Em etapa posterior, a equipe do professor Giunchetti realizou testes com cães. “Estamos terminando a prova de conceito”, in-forma. Os experimentos em andamento revelaram indícios de que a infecção não se estabelece no trato digestório do inseto que se alimenta com o sangue de um animal imunizado. “Isso mimetiza o estado do animal doente que foi vacinado. Ele produz anticor-pos que atacam o funcionamento dos mecanismos biológicos do inseto e inibem etapas de seu desenvolvimento e a infecção pelo protozoário no próprio inseto vetor”, explica o professor. Segundo ele, após a ingestão do sangue, o parasito não se desenvolveria no inseto, sendo eliminado. “Assim, esse inseto não se torna infectante. Já temos evidências de que isso vai funcionar”, enfatiza.

A ideia é utilizar a vacina, inicialmente, em animais que já estejam infectados. Mas Giunchetti também prevê sua aplicação associada com vacinas que venham a ser lançadas comercialmente e que não induzam proteção estéril, isto é, que não sejam capazes de impedir completamente a infecção de cães. “Há consenso entre os pesquisadores de que a ciência talvez precise de décadas para avançar e ser capaz de desenvolver uma vacina totalmente eficaz contra protozoários – no caso da Leishmania chagasi, que induza resposta imune no cão, para que ele não seja infectado”, pondera.

Para EVitar a EUtanÁsiaVacina pode impedir que cães infectados transmitam leishmaniose visceral e sejam sacrificados

Ana Rita Araújo

TratamentoAtualmente, não há tratamento reconhecido no país para

cães infectados por Leishmania chagasi. “O Ministério da Saúde já manifestou que, caso venha a surgir tratamento para a doença em animais, não pode ser com os fármacos de uso humano. Com o uso desses fármacos, o cão, ainda que aparente melhora, fica assintomático, e mantém o parasito com uma grande chance de transmissão, ao ser picado pelo flebótomo”, explica o pesquisador. Segundo ele, a droga usada para tratar as leishmanioses no ser humano são os antimoniais pentavalentes – no Brasil é comerciali-zada com o nome de Glucantime®. No entanto, o cão excreta mais de 90% desse fármaco na primeira hora de administração, o que impede que ele atue de forma eficiente no organismo do animal.

De acordo com o pesquisador, diferentemente da forma como se manifesta nos cães, no ser humano o parasito normalmente não fica na pele, mas em órgãos viscerais, como medula óssea, baço e fígado. “A espécie que causa a leishmaniose visceral aqui no Brasil – a Leishmania chagasi ou Leishmania infantum, consideradas a mesma espécie – tem essa característica e é transmitida no chama-do ciclo zoonótico. O homem é um simples hospedeiro acidental, que acaba se infectando. Desse modo, quem mantém o ciclo no ambiente urbano é o cão, e, exatamente por isso, uma das ações de controle é a eutanásia”, explica o professor.

Rodolfo: vacina interfere no ciclo biológico do mosquito transmissor

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Entrevista/Jørgen Bruhn

A análise midiática é uma nova abordagem na literatura comparada?

O que estou sugerindo é uma nova dimensão na análise tex-tual, comparável a vários outros enfoques, como gênero e etnia. Na minha abordagem, o foco é a mídia e as relações entre as mídias, nas quais encontro novas dimensões no texto, o que faz surgir outras perguntas. Meu alvo é o desenvolvimento de uma teoria da linguagem, e busco examinar textos específicos com meus alunos, com base em um modelo analítico de três passos.

Como a medialidade pode ser identificada em textos que parecem ser monomidiáticos? Um texto está sempre associado a outra ferramenta midiática?

Essa é minha premissa fundamental, mas não é algo novo. Nasceu com outros teóricos como William J. T. Mitchell [pesqui-sador da Universidade de Chicago que estuda a teoria da mídia e a cultura visual]. Mitchell afirmou que “todas as mídias estão misturadas”, e busco traduzir isso em um conceito que chamo

Todos os tEXtos estão MEscLaDos desde a criaçãoRodrigo Carvalho

O objetivo do método é demonstrar que, se as pessoas se concentram no registro e na ordenação das mídias de um texto, sua atenção é levada a contextos maiores, que vão além da mediação e da representação em si.

1º Passo: registro aberto e abrangente das representações de produtos de mídia, tipos e aspectos da medialidade. Esse registro deve levar em consideração o maior número possível de aspectos conectados direta e indiretamente a um dispositivo midiático.

2º Passo: organização do vasto – e muitas vezes incoe-rente – material coletado no passo anterior. Aqui se deve construir uma ordem preliminar, ou estrutura que proporcione sugestões de interpretação baseadas na lista de medialidades preparada na etapa anterior.

3º Passo: as estruturas do passo anterior podem, nesta etapa, ser relacionadas a um contexto biográfico ou psicológico do autor, ou remeter a uma compreensão estética e teórica ou a padrões e formações em áreas como arte e sociologia.

A intermidialidade, que consiste na interseção do texto com imagens e sons, é um fenômeno apressadamente associado à modernidade propiciada pelas novas plataformas tecnológicas. No entanto, ele está

longe de ser algo recente, pondera o professor de literatura comparada Jørgen Bruhn, da Universidade Linnæus, na Suécia. “Existem poemas gregos de mais de dois mil anos que carregam imagens, elementos visuais nas palavras. Essa história é bem longa”, diz Bruhn, que esteve na UFMG, neste mês, como convidado do Programa Cátedras Fundep/Ieat.

Reconhecido especialista em análise midiática, o professor lecionou um minicurso na UFMG para alunos de áreas como Música, Letras, Belas-artes e Comunicação e ministrou conferência durante a quinta edição da Jornada Intermídia. E ainda encontrou tempo na agenda apertada – sua estada na Universidade durou menos de duas semanas – para conceder a seguinte entrevista ao BOLETIM. Confira os principais trechos.

de heteromidialidade, que significa basicamente que todos os textos estão mesclados desde sua criação. Em vez de pensar que primeiro temos a literatura e depois vêm as imagens e sons, eu digo que todos os textos literários e música são, originalmente, textos. Até podemos “fingir” que são monomidiáticos ou puros. Quando olhamos para uma folha escrita, não apenas palavras são traduzidas em nossas mentes, mas também uma organização gráfica do texto. O aspecto sonoro da língua também existe no texto, pois, ao lermos, deparamos com um som interno do que é lido. Minha tese é a de que todas as mídias estão misturadas, e meu trabalho busca demonstrar como isso ocorre.

Entre os estudiosos da comunicação, parece haver um entendimento de intermídia diferente daquele que vigora na literatura...

Na Suécia, já deixo meus alunos avisados de que ficarão con-fusos após as minhas aulas, mas é uma confusão positiva. Alguns reconhecem que, de fato, incorporam essa ideia quando abrem um livro, escutam música ou vão a uma mostra de arte.

Esse modo de pensar a literatura pode mudar a maneira como ela é escrita?

Isso já está acontecendo e pode servir de inspiração. Há muitas coisas ocorrendo na literatura, na fanfiction e na poesia eletrônica, mas isso não chega a ser novidade. Existem poemas gregos de mais de dois mil anos que carregam imagens, elementos visuais nas palavras, e isso também aconteceu na Renascença. É tentador imaginar que o fenômeno esteja circunscrito à contemporaneidade, mas essa história é bem mais longa.

Em que medida a intermidialidade pode favorecer a formação de novos escritores e de outras formas de literatura?

Não sou especialista em novas mídias, mas frequentemente ouvimos a afirmação de que a literatura está ameaçada, as pessoas não leem mais e os livros estão desaparecendo – até acredito que isso seja parcialmente correto. Por outro lado, as pessoas continuam escrevendo, valendo-se de novas plataformas, como o Twitter. Por isso, é possível imaginar que novas formas de literatura estejam se configurando por conta da evolução tecnológica.

Bruhn: mistura de linguagens é fenômeno de longa data

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Acontece

apadrinhamento de estudantes

Servidores e estudantes da UFMG interessados em participar do Programa de Apadrinhamento (segundo semestre de 2016) de alunos estrangeiros podem se inscrever até 12 de junho por meio de formulário eletrônico disponível no link http://bit.ly/1saxMFd. A iniciativa, organizada pelo Programa Bem-vindo e pela Diretoria de Relações Internacionais, contribui para o processo de interação e adaptação dos alunos estrangeiros na UFMG e na capital mineira.

Para participar, os interessados deverão comparecer à reunião de orientações. O padrinho ou a madrinha tem a atribuição de acompanhar a trajetória do intercambista na UFMG, participando de eventos, apre-sentando a ele as unidades da instituição e sugerindo programação cultural e de lazer para fins de semana e feriados.

A chamada pode ser l ida no site da DRI:http://bit. ly/1sA58x7 . Outras informações podem ser solicitadas pelo e-mail [email protected].

mostra univercidade Está aberta à visitação pública, no mezanino da Reitoria, campus Pampulha, até 10

de junho, de segunda a sexta-feira, das 8h às 22h, a exposição UniverCidade coleciona, idealizada por alunos do curso de Museologia. A mostra explora as relações estabeleci-das entre a Universidade e Belo Horizonte, com base no conceito de cidade e no ato de colecionar. O trabalho expográfico põe os alunos em contato com o trabalho denso e prático da montagem de exposições – da concepção à realização.

UniverCidade coleciona apresenta três temáticas: a primeira, Universidade imaginada e construída, explora os planos e projetos para o campus universitário, desde a fundação da Universidade, em 1927. Reúne desenhos arquitetônicos, maquetes e fotografias que documentam a construção da cidade universitária da UFMG. O segundo eixo, Patrimônio e coleção, conta com objetos e registros de coleções artísticas, científicas e bibliográficas da Universidade, desenvolvidas por professores, alunos e servidores técnico-administrativos. A terceira temática, Apropriações, propõe uma reflexão sobre apropriação dos espaços planejados e construídos da UFMG.

A mostra é resultado de produção acadêmica no âmbito de disciplinas lecionadas pelas professoras Verona Segantini e Ana Panisset.

estudos sobre futebolAté 19 de junho, são aceitas inscrições

de trabalhos para apresentação no 2º Sim-pósio Internacional Futebol, Linguagem, Artes, Cultura e Lazer, que será realizado de 8 a 10 de setembro, em Belo Horizonte. As propostas devem ser enviadas para o e-mail [email protected]. O simpósio vai reunir pesquisadores brasi-leiros e estrangeiros que atuam em diversas áreas do conhecimento e que contemplam o tema do futebol nos seus estudos. A ideia é fomentar o intercâmbio de pesquisas, que transcendam a visão pragmática do futebol e abordem questões como gênero, educação, memória, história, globalização do esporte e a relação do futebol com as ciências humanas e sociais.

Promovido pelo Grupo de Estudos sobre Futebol e Torcidas (Gefut) e pelo Núcleo de Estudos sobre Futebol, Linguagem e Artes (Fulia), o evento terá atividades no Museu Brasileiro do Futebol (MBF), no Estádio do Mineirão e na Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG. Mais informações podem ser obtidas na pá-gina www.facebook.com/simposiofutebol/.

palco livreMúsicos e grupos musicais que tenham

interesse em se apresentar no Conservató-rio UFMG podem se inscrever, até dia 19 de junho, em processo seletivo do projeto Palco Livre. As propostas selecionadas vão compor a programação do segundo semestre de 2016. As apresentações serão às quintas-feiras, de agosto a novembro, sempre às 20h. Interessados devem ler o edital, preencher e enviar o formulário disponível na página do Conservatório UFMG (www.ufmg.br/conservatorio). Serão admitidas apenas propostas de apresentações gratuitas.

patentesA UFMG ocupa o segundo lugar geral

no ranking dos depositantes nacionais de patentes em 2015, divulgado pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Se consideradas apenas as instituições de pes-quisa, a Universidade foi a que mais depo-sitou patentes: 56. Em outras 13, a UFMG foi cotitular, mas elas não são computadas para o ranking porque foram depositadas pelas instituições parceiras.

A Whirlpool S.A., que registrou 90 pe-didos, manteve o primeiro lugar, posição que ocupa pelo terceiro ano consecutivo. A Unicamp está em terceiro lugar, com 52 pedidos. Em seguida, estão a Universidade Federal do Paraná, com 50, a Petrobras, com 48, e a USP, com 44 pedidos.

O ranking das 50 empresas e instituições que mais depositaram patentes no ano passado está neste endereço: www.ufmg.br/online/arquivos/anexos/Ranking_2015.pdf.

Imagem retrata início da construção da cidade universitária (acervo Departamento de Projetos/ PRA)

jornada de língua inglesaA comunidade universitária e profes-

sores da rede pública podem se inscrever nas oficinas sobre técnicas de ensino e de aprendizagem da língua inglesa que serão realizadas em 24 de junho como parte da programação da Jornada de Língua Inglesa. Serão discutidos temas como pronúncia, habilidades de escrita e seu uso na acade-mia, o emprego de filmes e de músicas no processo de aprendizagem e o contraste entre as culturas.

As oficinas serão simultâneas, a partir das 13h30, na Faculdade de Letras (Fale) e no Centro de Atividades Didáticas de Ciências Humanas (CAD 2). A programação também inclui mesas-redondas e grupos de trabalho. Mais informações podem ser obtidas no site www.ufmg.br/dri/jornada-de-lingua-inglesa.

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Page 8: Vacina contra o sacrifício - UFMG

30.5.2016 Boletim UFMG8

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E Reitor: Jaime Arturo Ramírez – Vice-reitora: Sandra Goulart Almeida – Diretor de Divulgação e Comunicação Social: Marcílio Lana – Editor: Flávio de Almeida (Reg. Prof. 5.076/MG) – Projeto Gráfico: Marcelo Lustosa – Diagramação: Romero Morais – Revisão: Cecília de Lima e Josiane Pádua – Impressão: Imprensa Universitária – Tiragem: 4,6 mil exemplares – Circulação semanal – Endereço: Diretoria de Divulgação e Comunicação Social, campus Pampulha, Av. Antônio Carlos, 6.627, CEP 31270-901, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil – Telefone: (31) 3409-4184 – Internet: http://www.ufmg.br e [email protected]. É permitida a reprodução de textos, desde que seja citada a fonte.

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E Reitor: Jaime Arturo Ramírez – Vice-reitora: Sandra Goulart Almeida – Diretor de Divulgação e Comunicação Social: Marcílio Lana – Editor: Flávio de Almeida (Reg. Prof. 5.076/MG) – Projeto Gráfico: Marcelo Lustosa – Diagramação: Romero Morais – Revisão: Cecília de Lima e Josiane Pádua – Impressão: Imprensa Universitária – Tiragem: 4,6 mil exemplares – Circulação semanal – Endereço: Diretoria de Divulgação e Comunicação Social, campus Pampulha, Av. Antônio Carlos, 6.627, CEP 31270-901, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil – Telefone: (31) 3409-4184 – Internet: http://www.ufmg.br e [email protected]. É permitida a reprodução de textos, desde que seja citada a fonte.

Em 1964, Aluísio Pimenta (à esquerda) foi afastado e logo depois reconduzido ao cargo de reitor da UFMG; na foto, ele aparece cumprimentando o interventor Expedito Orsi Pimenta

Dissertação: Professores universitários na mira das ditaduras: a repressão contra os docentes da UFMG (Brasil, 1964-1969) e da UTE (Chile, 1973-1981)

autor: Luan Aiuá Vasconcelos Fernandes

orientador: Rodrigo Patto Sá Motta

Defesa em 30 de março, no Programa de Pós-graduação em História

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taNos três primeiros anos da ditadura instaurada pelos mili-tares no Chile, em 1973, com a deposição do presidente Salvador Allende, só a Universidad Técnica del Estado (UTE)

teve cinco professores assassinados, entre os quais dois brasileiros exilados. Houve demissão de elevado contingente de docentes, principalmente nos meses seguintes ao golpe, centenas de mestres foram presos, e dezenas deles chegaram a ser torturados.

Na UFMG, foram mais de dez professores presos pela ditadura militar, e dois deles – Celson Diniz Pereira e Simon Schwartzman – relataram ter sofrido violência física na prisão. Aqui, a vigilância e a repressão contra os professores foram mais intensas com o aumento das manifestações estudantis e após o Ato Institucional nº 5, de 1968, quando 17 professores foram exonerados, incluindo o então reitor Gerson Boson e o reitor à época do golpe, Aluisio Pimenta.

Os dados são fornecidos pelo historiador Luan Aiuá Vasconcelos Fernandes, que, em março deste ano, apresentou, na Fafich, sua pesquisa de mestrado sobre a perseguição de professores nas duas universidades. Ele mergulhou em arquivos no Brasil e no Chile – chegou a morar em Santiago por cinco meses – e reuniu cerca de 20 relatos colhidos por ele próprio e por outros pesquisadores.

“Tanto no Brasil como no Chile, a repressão contra os pro-fessores esteve estreitamente relacionada às lutas do movimento estudantil em contexto de reforma universitária”, diz o pesquisador. “A aproximação com os estudantes e o grau de apoio às reformas foram fatores relevantes, aliados, naturalmente, à identificação dos docentes com alguma cultura política de esquerda.”

Modelo socialistaLuan Fernandes explica que a UTE – que em 1981 passaria a se

chamar Universidade de Santiago de Chile (Usach) – era modelo de universidade do governo socialista de Salvador Allende e abrigava muitos militantes da esquerda. O prédio da reitoria foi bombardeado no dia do golpe – assim como o Palácio de La Moneda e a residência oficial do presidente –, e o reitor Enríque Kirberg chegou a fazer trabalhos forçados em campo de concentração no Sul do Chile. Uma das entrevistadas por Luan Fernandes foi a professora de História Neuda Aguilar Duhau, exonerada logo após o golpe.

“Na UTE, a repressão foi ainda maior que em outras universidades chilenas, porque foi reforçada por um viés classista e racista. A instituição abrigava filhos de trabalhadores e imigrantes pobres, estudantes indígenas e negros, que eram tratados com mais rigor. Muitos morreram nos meses pós-golpe, e a maioria foi expulsa da UTE”, afirma Fernandes.

acossaDos pelas BaionEtas Pesquisa da História conta como as ditaduras militares perseguiram docentes na UFMG e em universidade chilena

Itamar Rigueira Jr.

HabilidadeLuan Fernandes lembra que os professores da UFMG contaram,

nos primeiros tempos pós-golpe, com a habilidade do reitor Aluísio Pimenta, que, apesar de identificado com a esquerda – era ligado ao PTB –, soube usar suas boas relações com o ministro da Justiça, Milton Campos, com o governador de Minas, Magalhães Pinto, e com a imprensa conservadora. “Era um reitor jovem, apoiado por professores também jovens e progressistas e pelos estudantes que defendiam reformas. Conseguiu reduzir a 48 horas uma intervenção na Reitoria que certamente foi planejada para durar muito mais”, conta o pesquisador.

O trabalho mostra também que as reformas durante os regimes militares foram de naturezas opostas nas duas universidades. “ Enquanto a UFMG foi modernizada, com o fim das cátedras e a criação dos departamentos, a UTE sofreu mudanças de teor neolibe-ral que resultaram no fechamento de muitos centros de pesquisa”, diz Luan Fernandes.

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