AGRICULTURA E PECUÁRIA: O ESPAÇO RURAL E A MODERNIZ AÇÃO DA
AGRICULTURA
José Diogo Gomes1 Rafaela Harumi Fujita ²
RESUMO O presente estudo é o resultado do trabalho acadêmico realizado durante o PDE 2010, na disciplina de Geografia. Trata-se de uma pesquisa que enfocou a agricultura em uma perspectiva do desenvolvimento sustentável e agronegócio, partindo da realidade do município de Formosa do Oeste - PR, um município pequeno com predominância agrícola e com jovens abandonando o trabalho no campo em busca de melhores condições de vida e trabalho. O estudo desenvolvido investigou a identidade da agricultura deste município, buscando compreender como ela é utilizada enquanto meio de produção e estruturação desse espaço social. O desenvolvimento da pesquisa aconteceu em três momentos. Primeiramente, o resgate da fundamentação teórica sobre o assunto, em seguida, a construção de uma sequencia didática-metodológica e por final, a aplicação desta sequencia com os alunos da sexta série (sétimo ano) do ensino fundamental da Escola Estadual Antônio Franco Ferreira da Costa, em Formosa do Oeste. Como fruto do desenvolvimento dessas aulas, efetivou-se um estudo de caso onde foram entrevistadas as famílias rurais da comunidade, por meio de seus filhos, os alunos da sexta série selecionada. Ficou evidenciando que a agricultura nos pequenos municípios apresenta características e desafios próprios que precisam ir para a grade de ensino, pois a maioria dos alunos vivem nesse contexto e é de suma importância ensinar a estes alunos a realidade no campo e as novas perspectivas, assim instigá-los a desenvolver uma agricultura de forma consciente e sustentável.
Palavras-chave: Agricultura, Geografia, Desenvolvimento, Educação Ambiental.
1 Professor estadual de Geografia. Colégio Estadual Antônio Franco Ferreira da Costa. Formosa do Oeste, PR. ² Professora Mestre em Geografia da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Orientadora do PDE – 2010 – Geografia.
1. INTRODUÇÃO
O presente estudo pautou-se na problemática do êxodo rural. “A concepção
de trabalho agrícola (agronegócio) que sustentamos corresponde à realidade das
pequenas propriedades rurais do interior do Paraná?”A partir dessa indagação, faz-
se necessário refletir sobre como a escola pode ajudar a compreender essa nova
agricultura, fazendo com que o aluno use os conhecimentos da Geografia para agir
socialmente nesse contexto.
A presente pesquisa trabalhou com a agricultura numa perspectiva de
desenvolvimento sustentável e agronegócio. Embora, enquanto profissionais da
Geografia, nos comprometamos com o estudo do espaço físico, social e humano,
faz-se necessário levar o aluno a compreensão de que as mudanças que o ser
humano causou ao meio ambiente são irreversíveis. Nesse sentido, não se pode
mais pensar o trabalho com a agricultura da forma como o era antigamente. O
modelo capitalista atual pede uma nova relação com o campo, relação que também
está sendo influenciada pelas mudanças climáticas e ambientais.
Esse é um desafio para as novas gerações, sobretudo as oriundas de
pequenas comunidades, que não compreendendo a estrutura desses novos tempos,
acabam por desistir de suas terras (êxodo rural), o que gera os bolsões de pobreza
nas grandes metrópoles.
O município de Formosa do Oeste (PR) apresenta essas características. É
pequeno, com predominância agrícola e com jovens que cada vez mais não
encontram respostas no campo. Esses desafios devem fazer parte da grade da
disciplina de Geografia. E para tanto, cabe ao profissional professor de Geografia
estudar sistematicamente esse fenômeno, no sentido de propor seqüencias
pedagógicas, que de forma concisa e dinâmica, levem esses fatos para a sala de
aula, fundamentando assim nosso grupo de alunos a refletir criticamente sobre a
realidade do campo hoje. Os conteúdos estruturantes só fazem sentido quando
capacitam o aluno a interferir em sua própria realidade (SAVIANI, 1992).
Esta proposta faz parte do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE)
em Geografia (2010). Esse programa visa, em todas as disciplinas, propiciar ao
educador um momento de pesquisa e aprofundamento teórico didático em um tema
de ensino. As seções seguintes demonstram como o trabalho desenvolvimento do
PDE, foi elaborado. Durante o programa, o professor pode pesquisar seu tema e
montar seu plano de ação (um ano). Em seguida, o educador aplica seu plano de
trabalho na escola, com os alunos ( um semestre).
Primeiramente, buscou-se referências teóricas sobre a relação entre a
Agricultura, o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável na perspectiva da
Educação Ambiental, tendo como parâmetro os objetivos didáticos da disciplina de
Geografia. Em seguida, demonstram-se as aulas aplicadas na sexta série (sétimo
ano), um planejamento que contemplou o conteúdo estruturante de geografia: a
Agricultura, porém levando o aluno a refletir sobre como o conhecimento possibilita a
organização social do homem do campo em torno de atividades econômicas que
lhes possibilitem viver da terra, todavia respeitando o meio ambiente.
Por fim, no desenvolvimento das aulas foi efetivada uma pesquisa de campo
com os alunos selecionados, cujos quais moram na zona rural, sobre as
perspectivas de trabalho dos mesmos e de suas famílias. Os dados recolhidos foram
tabulados em gráficos e demonstrados para a comunidade escolar.
Esse é um desafio da Educação Ambiental, ou seja, fazer a reflexão prática
sobre o impacto do trabalho com o meio ambiente na vida do cidadão. Dentro da
Pedagogia Social dos Conteúdos (SAVIANI, 1992), esse trabalho visa levar o
educando a compreender um problema social e buscar o conhecimento para superar
seus dilemas reais.Os conteúdos estruturantes só fazem sentido quando capacitam
o aluno a interferir em sua própria realidade (SAVIANI, 1992).
2. AGRICULTURA: UMA HISTÓRIA
A história da agricultura acompanhou a história dos povos. Ela evoluiu com as
mudanças nos sistemas de produção e também em relação as mudanças do meio
ambiente. Para Cunha (2010):
A agricultura se originou na região do Crescente Fértil, a leste da bacia do Mediterrâneo, há cerca de 11.000 anos. Logo depois, apareceu no norte da China, e poucos milênios mais tarde, nas Américas. Nos milênios posteriores, se espalhou para outras regiões e se sofisticou. Há cerca de 2.000 anos, a maioria dos alimentos conhecidos hoje já eram cultivados em algum lugar do mundo.
Dannemman (2008) resume a história da agricultura pela passagem dos
anos, conforme descrito no quadro 1:
Época Acontecimentos históricos que influenciaram a agric ultura 10000 a.C Aumenta a temperatura, melhora o clima e a agricultura vira um
meio de vida; Entre 8.000 e 6.000 a. C Cultiva-se diferentes culturas em diversas áreas do mundo. Com
o aumento da população e das necessidades, começa a escravidão e a produção agrícola em escala, já com intuito de suprir a fome
4.000 a.C. Introdução do arado e busca por constantes terras. O povoamento do mundo aconteceu em função da busca por novos horizontes agrícolas.
Quadro 1: História da Agricultura. Fonte: Dannemman (2008).
Esse modelo foi se intensificando e passou a andar junto com o consumo no
século XX. “Em âmbito mais geral, nas regiões de agricultura moderna mais
avançada do Brasil, o que estamos vendo é uma modificação na composição do uso
da mão-de-obra sem significar uma melhoria das condições de vida” (Cruz e Torrez,
2010, p. 419): O mesmo autor também aponta a contradição que a agricultura
trouxe, ou seja:
Dessa maneira falar desses instrumentos de trabalho, conhecê-los, utilizá-los, valorizá-los ...não somente voltar ao passado com mais dificuldade, mas mostrar que a agricultura moderna tão propagada pela burguesia da agroindústria e do agronegócio, traz fome, miséria, comodidade, doenças incuráveis, poluição das águas, dependências dos agricultores, dentre outras mazelas. Por outro lado, essas tecnologias modernas que surgiram nos últimos 30 anos, possibilitou aos agricultores que conseguiram o seu acesso, terem mais tempo livre, na medida que gastam menos tempo para realizar trabalhos que antes duravam semanas e agora podem fazer em três ou quatro dias CRUZ; TORRES, 2010, p.423).
Essa dicotomia é um desafio para o agricultor atual, pois o momento em que
vivemos pede uma nova relação com a terra. Compreender essa evolução histórica
e situar-se nela é um dos principais desafios, pois significa reconhecer a relação da
agricultura com os meios de produção capitalista, mas também pensando-a como
uma ação social com consequências que devem ser previstas, analisadas e
trabalhadas com um novo enfoque.
2.1 AGRICULTURA, DESENVOLVIMENTO E SUSTENTABILIDADE
A agricultura é mais do que uma simples atividade humana. Ela é trabalho, no
sentido mais categórico de mudar a natureza, bem como é uma forma de produção,
de organização social. Dessa forma, é considerada uma das principais revoluções
da história humana.
Todavia, a agricultura deve respeitar a base da relação do homem com a
natureza, ou seja, a agricultura deve ser “a arte de modificar os ecossistemas,
emtermos econômicos e sem produzir danos irreversíveis” (MALAVOLTA, 1997,
p.1).
Seguindo essa linha de pensamento, também são “fazeres humanos” o
capitalismo, a tecnologia e o desenvolvimento econômico. Partes de uma rede
maior, essas questões sempre envolveram o meio ambiente, que hoje não tem mais
recursos e está a beira da exaustão. Cabe ao professor de geografia tratar disso
articulando esses conceitos numa “análise das relações entre a sociedade, o espaço
e a natureza (PARANÁ, 2010, p. 69).
Essa relação leva à necessidade da compreensão da agricultura, numa
perspectiva moderna, ou seja:
Uma agricultura moderna,baseada em desenvolvimentos científicos, ao mesmo tempo aumente a produtividade,proteja e economize o meio ambiente, tem havido uma preocupaçãocrescente em minimizar eventuais danos. Nos últimos anos discute-se, cada vezcom mais intensidade, o que veio a ser chamado de “agricultura sustentável (PATERNIANI, 2001, p.303).
O que está sendo questionado é o dilema da sociedade do consumo e o uso
do meio ambiente para sustentar tal consumo.Citando Amorim e Pereira (2009, p.1):
Os rápidos avanços tecnológicos viabilizaram formas de produção de bens com consequências indesejáveis que se agravam com igual rapidez. A exploração dos recursos naturais passou a ser feita de forma demasiadamente intensa, a ponto de pôr em risco a sua regeneração. Sabe-se agora da necessidade de entender mais sobre os limites d estes recursos, que às vezes, são básicos como a água.
Ainda nessa linha, Câmara (2000, p.9) observa que:
A época em que vivemos se caracteriza, ao mesmo tempo, pelo acelerado crescimento da população mundial e por um extraordinário desenvolvimento tecnológico e, como consequências naturais desses dois fatos, há um gigantesco consumo de recursos naturais que provoca profundas alterações ambientais decorrentes das atividades humanas.
Este é um alerta quanto à explosão demográfica, à erosão do solo,
àsmodificações ambientais e ao desenvolvimento tecnológico. A cada dia o
patrimônio natural se empobrece e futuramente, não teremos condições de
prosseguir com um desenvolvimento sustentável.
A agricultura está nessa linha de raciocínio. Assim, é preciso mostrar aos
agricultores, sobretudo os pequenos produtores, alternativas para que se criem
condições nos macro e micro sistemas. Esse é um problema que precisa ser
amplamente discutido. Levantar essa problemática é despertar para a necessidade
de frear esta caminhada dilapidadora e começar um trabalho consciente de
reparação e conservação do solo e da natureza, dar condições à sobrevivência da
própria raça humana na terra. Mas isso precisa ser feito com uma natureza que está
a serviço do capitalismo.
Os agricultores devem perceber essa evolução humana e usar o meio rural
para sobrevivência compreendendo as novas relações de trabalho. Tal reflexão
tornaria possível a permanência de muitas famílias em seus sítios, ou seja:
Assim, promover a melhoria da qualidade de vida da população rural, reduzindo os efeitos da exclusão social, fruto, sobretudo do desemprego, mediante uma nova alternativa de ocupação estável e de complementação de renda, reduzir o fluxo e os efeitos do êxodo rural (PORTUGUEZ, 1999, p.4).
Como as sociedades modernas não conseguem negar o fundo capitalista,
faz-se necessário olhar de uma nova forma para o campo e suas possibilidades. E
isso é desenvolvimento sustentável.
Por sustentabilidade compreende-se, como cita Alva (1997):
“Desenvolvimento Sustentável é aquele que permite à geração atual suprir as suas
necessidades sem comprometer a capacitação das gerações futuras”. Este conceito
diz respeito à compreensão de que "a terra proporciona o bastante para satisfazer a
necessidade de cada homem, mas não com a voracidade de todos os
homens”(SCHUMACHER, 1983, p.26).
Essa relação já é prevista na Agenda 21 brasileira (2004), que retoma em um
de seus tópicos “ocampo”, através do Tema Agricultura Sustentável. Sendo assim, o
desafio é tomar o meio ambiente como um todo, de forma acompreender melhor
este grande ecossistema.
2.2 AGRICULTURA E O ÊXODO RURAL
ParaFroehlich eRauber (2009, p. 4) “A urbanização e a modernização da
agricultura foram as principais propulsoras doêxodo rural no caso brasileiro.”Já para
Camarano e Abramovay (1999), o êxodo rural apresenta-se de duas formas: a
masculinização e o envelhecimento da população rural. E isso é observado nas
pequenas comunidades, como a de Formosa do Oeste.
A palavra êxodo sempre esteve ligada a grandes migrações. É tratada nos
textos bíblicos e na literatura brasileira apresenta destaque, principalmente quando
se trata do nordeste. Todavia, o êxodo rural faz parte de um grande processo de
expansão capitalista, que lida com fatores ambientais, econômicos e sociais. Então,
as populações que antes migravam em busca de emprego na cidade hoje já não o
encontram mais. E o campo, em função do agronegócio, pode ser lucrativo, todavia,
não dispõe de jovens com estudo e empenho. Ou seja:
Há consenso entre os pesquisadores de que a grande mudança constatada nosúltimos anos tem sido a de que o êxodo rural generalizado vem sendo convertidonum processo bastante mais seletivo, que preferencialmente remete às cidades apopulação jovem e altamente produtiva. (ANJOS E CALDAS, 2005, p.673).
É preciso uma reflexão séria sobre esses dados, pois o agronegócio atual,
aqui tomado por“a soma total das operações deprodução e distribuição de
suprimentos agrícolas” (JÚNIOR, 2011, p. 11), tem uma demanda que na verdade
não é suprida. Ainda em Júnior (2011, p.1) essa revolução no modelo de produção
tem três facetas: “uma bem evidente, que é a tecnológica,e outras duas pouco
mensuráveis, a gerencial e a de modelo”. Não há pessoas qualificadas para
entenderem e trabalharem com o novo modelo de gestão do campo. Também a
agricultura familiar pode ser uma forma de organização social viável, sobretudo nas
pequenas cidades, o que frearia o êxodo rural dos pequenos produtores.
Sendo assim, refletir sobre o êxodo rural requer pensar em políticas públicas
de distribuição e planejamento social, considerando o campo como parte
fundamental no processo de produção.
Até que ponto o meio rural pode ser um espaço propício na construção dacidadania e de condições de vida capazes de promover a integração econômica ea emancipação social das populações que aí vivem? A resposta a essa questãosupõe, antes de tudo, que se abandone a idéia conservadora de que é necessário‘fixar o homem ao campo’. O êxodo predominantemente jovem mostra, aocontrário, que o campo se abre cada vez mais para o contato com as cidades. Resta saber se esta abertura dará lugar a laços construtivos e interativos ou selevará à desagregação do tecido social existente hoje no meio rural. (CAMARANO; ABRAMOVAY, 1999, p.19).
É essa ruptura entre o campo e a cidade que tece o objeto de pesquisa aqui
proposto. A agricultura precisa ser revista pensando nas futuras gerações. É um
desafio complexo, pois envolve reconhecer que o modelo usado é ultrapassado, que
o jovem terá uma relação mais comercial com a terra, mas que há uma base de
sustentação social que advém da relação com a terra e que essa relação precisa ser
mantida. Nesse caso, conter o êxodo rural é, além de ganhar dinheiro com a terra,
garantir a alimentação dos povos da cidade.
2.3 O ENSINO DE GEOGRAFIA E OS AVANÇOS NO CAMPO
Segundo Andrade (1987), diferentes povos sempre buscaram entender a
natureza e dominar as transformações sociais no intuito de assim compreender o
proprio fazer humano. A disciplina de Geografia nasceu deste olhar para o meio
ambiente e a organização social e deve trabalhar com essas questões.
De acordo com Araújo (2003, p. 24):
Somente em fins do século XVII, esses temas começaram a passar pelo ‘olhar objetivador da ciência’. Nessa época, o reconhecimento do método
indutivo experimental como método científico deu às pesquisas sobre a natureza uma legitimidade científica que, mais tarde, abrangeria as pesquisas em Geografia.
A pesquisa almejada busca essa ciencia, mas com uma perspectiva
ambientalclara. De acordo com o PCNs (BRASIL, 1997, p. 14) justifica-se: “A
perspectiva ambiental consiste num modo de ver o mundo em que se evidenciam as
inter-relações e a interdependência dos diversos elementos na constituição e
manutenção da vida”. Em termos de educação, essa perspectiva contribui para
evidenciar a necessidade de um trabalho vinculado aos princípios da dignidade de
ser humano. Dessa forma, compreendendo nosso espaço, nosso sistema de
produção e as possibilidades do meio ambiente, torna-se possível viver da terra,
respeitando os limites da natureza.
Dentro desse conteúdo básico, é pedido que o professor trabalhe com o
aluno, dentre outros (PARANÁ, 2010, p. 94):
• Relacione as migrações e a ocupação do território brasileiro;
• Identifique a importância dos fatores naturais e o uso de novas tecnologias na
agropecuária brasileira;
• Entenda o processo de transformação das paisagens brasileiras, levando em
consideração as formas de ocupação, as atividades econômicas
desenvolvidas, a dinâmica populacional e a diversidade cultural;
• Entenda como a industrialização acelerou a exploração dos elementos da
natureza e trouxe consequências ambientais;
• Estabeleça relação entre o uso de tecnologias nas diferentes atividades
econômicas e as consequentes mudanças nas relações sócio-espaciais e
ambientais;
• Reconheça a configuração do espaço de circulação de mão-de-obra,
mercadorias e sua relação com os espaços produtivos brasileiros
Trabalhar os desafios da agricultura moderna, com enfoque em uma realidade
especifica, representa esse olhar atual da geografia, que tem esse prisma
caracterizado nos últimos anos, principalmente a partir da segunda guerra mundial
(PARANÁ, 2010, p. 43). A disciplina que nasceu com a Lei 5692\71 quer hoje uma
‘Geografia Crítica’, ou seja, o objeto de estudo da Geografia é o espaçogeográfico,
entendido como o espaço produzido e apropriado pela sociedade(LEFEBVRE, 1974,
P. 51).
3. PROPOSTA DIDÁTICA PARA O ESTUDO DO ESPAÇO RURAL E A
MODERNIZAÇÃO DA AGRICULTURA
A proposta didática, que segue, corresponde a uma sequência de 20 aulas
(Quadro 2) sobre o tema “Agricultura e pecuária: o espaço rural e a modernização
da agricultura”, elaborada para ser trabalhada no ensino fundamental,
principalmente em municípios que possuem predominância agrícola.
Aulas Desenvolvimento
1ª Assistir ao documentário “Ilha das Flores”, que comenta sobre pessoas que vivem do lixo e traz a dificuldade de conciliar alimentação, desenvolvimento e consumo nas grandes cidades. Depois, é preciso que sejam explicadas as características do município do educando (nessas áreas do Paraná a predominância é agrícola), os alimentos que são produzidos e a história da cidade. Desses comentários, produz-se um texto coletivo sobre as caracterizações geográficas da cidade.
2ª Retomar as discussões da aula anterior e formular os conceitos de:Agricultura;Meio ambiente; Desenvolvimento sustentável e Êxodo rural. Para que os mesmos conceitos sejam fixados, os alunos ganharam um caça-palavras, montado a partir do recurso do Google- criador de caça palavras. Nesse site, o professor clica as palavras que deseja e o programa monta o jogo:
3ª Levar os alunos ao laboratório de informática para que eles pesquisem e montem um texto informativo sobre a história da Agricultura e sobre os diferentes tipos de cultura em relação ao fazer agrícola.
4ª Fazer a brincadeira das cadeiras ao contrário, para trabalhar a noção de sustentabilidade. Cada aluno tem uma cadeira (principio de dança da cadeira). É tocada a música “Planeta azul”, de Chitãozinho e Xororó. Quando a música para, é tirado uma cadeira, mas o número de participantes permanece o mesmo. As cadeiras vão sendo tiradas sucessivamente, até ver o máximo de sustentabilidade dessa comunidade, ou seja, quantas cadeiras suportam o total de crianças da sala. Após essa atividade, dialoga-se e define-se o conceito de sustentabilidade, que os alunos registrarão em seus cadernos.
5ª Buscar em revistas e jornais imagens que correspondam à constituição dos seguintes espaços: Cidade, Campo, Plantação, Floresta, Água, Meio poluído, Meio saudável, Escola. A partir dessas imagens, criar um slogan sobre o meio ambiente e separando a sala em grupos, cada grupo irá fazer um cartaz com a seguinte frase: “O MEIO AMBIENTE ESTÁ EM NÓS”.
6ª Fazer um ditado com a música Planeta Azul, de Chitãozinho e Xororó. Levar o clipe da música para ser passado na TV pendrive. A cada verso da música é dado uma pausa para que o aluno copie a frase. No final, o aluno assiste ao clipe sem interrupções e compara com o que escreveu. Em seguida, os alunos podem fazer uma história em quadrinhos com a música.
7ª e 8ª Realizar um quebra-cabeça, um jogo de frases sobre o meio ambiente. Os alunos achavam as palavras com pistas. O professor vai dizendo as pistas e os alunos vão procurando que palavras podem ser a sequência. A principal pista é que cada frase começa com letra maiúscula e termina no ponto final. O professor também irá dar dicas do tipo: é um nome próprio, é uma qualidade, é uma palavra feminina. Com lápis de cor, os alunos vão ligar todas as frases com cores diferentes. No final haverá um verdadeiro mapa na folha do jogo e os alunos vão montar todas as frases seguindo as linhas das cores. Após essa atividade, cada aluno fará um texto a partir das frases do quebra-cabeça. Ambos os jogos resultavam em textos sobre a agricultura e a sustentabilidade.
9ª Montar um texto a partir de frases fatiadas. As frases estão fora de ordem e os alunos vão colocá-las na ordem correta. A sequência do texto é: (1) falar do solo; (2) citar exemplos reais de problemas do solo e (3) apresentar soluções para a questão do solo. Depois de mostrar uma possível seq00uência para o texto e analisar as sequências montadas pelos alunos, as palavras sublinhadas nas frases fatiadas serão explicadas no caderno, podendo ser consultado também o livro didático do aluno e o dicionário.
10ª Avaliação: Montar um debate. Dividir a sala em três grupos e cada um ao outro grupo sobre:Quais os desafios atuais para a agricultura?Quem quer viver do campo e por quê?Quais as soluções para acabar com o êxodo rural?O que é desenvolvimento sustentável e como mantê-lo? Um grupo será a favor do capitalismo, um grupo a favor do meio ambiente e um grupo será equilibrado, defenderá uma postura intermediaria. Ao fim do debate, será registrado nos cadernos as soluções encontradas pelo grupo intermediário, ou seja, como fazer o mundo se desenvolver respeitando o meio ambiente, sobretudo na agricultura?
11ª Montar com os alunos um questionário a ser aplicado com seus pais ou com vizinhos, parentes ou amigos que vivem no campo e que trabalham diretamente com a agricultura. A turma deverá realizar o questionário em tempo real, entrevistando as pessoas e registrando os resultados em um questionário subjetivo.
12ª13ª Transpor com os alunos os dados dos questionários para gráficos com porcentagem.
14ª e15ª
Assistir ao filme “O dia depois de amanhã” (2004). Este exemplar pode ser encontrado para ser comprado na internet (livraria submarino, saraiva), bem como em locadoras.
16ª Com o auxilio dos computadores os alunos vão pesquisar clipes sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável. Esses clipes serão transpostos para a mídia compatível com a TV pendrive para, num momento futuro, fazerem parte de uma exposição a toda a comunidade escolar.
17ª18ª O material pesquisado será organizado em forma de apresentação. Os alunos apresentarão os gráficos de suas pesquisas, os clipes selecionados na aula anterior e uma sequência expositiva onde eles definam os termos estudados nas aulas e onde esses termos foram encontrados na pesquisa realizada pela turma, ou seja, qual a relação entre a abordagem do conteúdo e a vida real dos alunos e da comunidade.
19ª20ª Realizar a apresentação da pesquisa para a comunidade escolar, preparando os alunos para mostrarem o que eles aprenderam e como constataram seus conhecimentos na prática. No final da apresentação, ler com a comunidade a carta do Cacique Seattle, de 1855. Esta carta foi produzida há muito tempo, mas além de ser literária, trabalha com questões polêmicas que se tornaram atuais, sobretudo a questão do capitalismo X o desenvolvimento sustentável. O texto nos faz refletir sobre a essência da nossa relação com o planeta e com os nossos iguais, ou seja, qual a base da nossa educação.
Quadro 2: Plano de aula aplicado na sexta série (sétimo ano) do Colégio Estadual Antônio Franco Ferreira da Costa, em Formosa do Oeste, em agosto e setembro de 2011. PDE Geografia (2010).
Esta proposta correspondeu a um bimestre escolar e visou atingir toda a
sequência fundamental do plano de ensino: apresentação do conteúdo, motivação,
fixação e avaliação. A estrutura das aulas segue a linha metodológica da Pedagogia
Histórico Critica (SAVIANI, 1992), bem como os pressupostos da Agenda 21, os
Parâmetros Nacionais para a Educação Ambiental (BRASIL, 1997) e as Diretrizes
Curriculares para o ensino de Geografia (PARANÁ, 2010).
A proposta de trabalho foi aplicada na disciplina de Geografia, para a 6ª série
do Ensino Fundamental da Escola Estadual Antônio Franco Ferreira da Costa,
localizada no município Formosa do Oeste, PR, entre os meses de agosto e
setembro de 2011, desenvolvida no período vespertino, em contra turno e com a
participação de 18 alunos estudando em dois encontros semanais de duas horas
aula cada.
Ao longo das aulas, os alunos apresentaram muito interesse pelas aulas
ministradas, principalmente pelo trato diferenciado dos conteúdos de geografia e a
integração da disciplina com outras áreas, como português, história, filosofia e
ciências.
Nesta etapa, também foi realizado um questionamento sobre a realidade atual
dos alunos e a agricultura em nossa cidade, utilizando leituras de textos e debates
sobre a agricultura, bem como os fatores que comprometem a atual produção,
mudanças climáticas e poluição.
Juntamente com os alunos foi elaborado um questionário para ser aplicado
com pessoas que vivem no campo e/ou trabalham com agricultura, neste caso
decidimos em conjunto aplicar com os próprios familiares dos alunos envolvidos no
projeto. Por meio dos resultados obtidos a partir dos questionamentos foi
possível“analisar como a comunidade vê seu trabalho agrícola no momento atual”.
3.1 A IDENTIDADE DA AGRICULTURA NO MUNICÍPIO DE FORMOSA DO OESTE,
PR
Uma região de vastas matas e terra fértil chamou atenção da Colonizadora
Sociedade Imobiliária Noroeste do Paraná – SINOP, para a colonização e
exploração dessas terras, as quais originaram em março de 1960 o município de
Formosa do Oeste. Formosa do Oeste localiza-se na região Oeste do Estado do
Paraná e teve sua colonização atrelada à agricultura e a pecuária.
Ao longo do tempo, as terras foram sendo desprovidas de suas matas
originais em nome da agricultura e a pecuária, que atualmente são a principal fonte
de sustento da cidade.
O Município como já foi mencionado, possui sem nenhum exagero as melhores terras, as mesmas vem sendo exploradas desde o início da história do Município com variados tipos de plantações: menta (hortelã), café, soja, trigo, algodão, girassol, feijão, milho, arroz e outros, todos continuam em menor escala fazendo parte da economia do Município, com exceção do hortelã, que já não faz mais parte da nossa agricultura. Como se vê a base de sustentação econômica do Município foi e continua sendo a agricultura (...). Buscando a diversificação da economia, aos poucos a pecuária vem se desenvolvendo no Município, com destaque citamos aqui a prosperidade de: bovinos, suínos e galináceos que hoje, são explorados no Município, onde criadores experientes investem seus capitais confiantes no retorno breve, de um lucro certo e seguro. (FORMOSA DO OESTE, 2012, p.4).
A partir da pesquisa realizada com ospais dos alunos, que corresponderam a
18 famílias da zona rural, constatou-se que atualmente o município possui uma
predominância de pequenos proprietários, dos quais 79% possuem mais de 40
anos. Diferentemente do que ocorria nas décadas de 1960 e 1970, a constituição
familiar que antes era numerosa passou a ser semelhante a da organização urbana,
em geral o casal e dois filhos.
A atividade agrícola é o cultivo da soja, ou seja, produção mecanizada, mas
ainda outros produtos também são cultivados como milho, café e pasto.Viver só da
terra já deixou de ser característica primordial dos moradores, pois 80% dos
entrevistados garantem que para manter uma boa renda é necessária uma atividade
extra. Atualmente o rendimento dos entrevistados gira em torno de R$10.000,00 a
R$24.000,00, somando-se aqui a renda extra. Aqueles que ainda se mantém
somente do campo, apenas quatro entrevistados, ganham menos de R$1.000,00 por
mês.
As mudanças comentadas, a passagem das grandes para as pequenas
propriedades e a diminuição do tamanho das famílias que trabalham na terra é
negativa para esse tipo de atividade agrícola (agricultura familiar). Produz-se menos
e se ganha também menos ou se produz, mas se perde pelos impactos ambientais.
Isso justifica a necessidade de haver outro ganho por parte das famílias.
Com as políticas e leis ambientais, tais como a Lei 9795/99, que prevê a
Educação ambiental, e a Lei 4771 de 15 de setembro de 1965, com várias ementas
que reza sobre o Código florestal; a agricultura e principalmente os pequenos
agricultores foram influenciados positiva e negativamente. É positiva a preocupação
com a terra, com o uso excessivo de agrotóxico e com a preservação das matas
ciliares. Mas financeiramente é negativa a perda de terra produtiva em função
damata ciliar e da reserva legal (BRASIL, 1965).2Também é negativo o trabalho de
cultura única. A terra se cansa mais e o plantio de grande escala é mais apropriado
para grandes propriedades.
Para obter maior lucro é necessário utilizar mais insumos e implementos.
Esse fator, levantado na pesquisa, é o que leva a agricultura a exaustão dos
recursos naturais. Uma vez que ela é um negócio, não se pode parar de produzir.
Mas o circulo natural da vida não é esse. Os agricultores entrevistados percebem
isso e se encontram em um impasse: como ganhar mais?
Diante do exposto, verificou-se que os pequenos agricultores de Formosa do
Oeste, mesmo sendo pressionados pelas questões ambientais, muitas vezes
passando por problemáticas no campo, não querem deixar suas terras para viver na
cidade (85%). Porém para que isso ocorra, é necessária por parte da escola e da
sociedade umamelhor conscientização quanto às técnicas e investimentos que
podem ser aplicados no campo.
Tendo em vista a faixa etária de nossos agricultores (50% com mais de 50
anos), temos que pensar em quem irá cuidar dessas terras? Assim o papel da
escola e de nós, professores, é de fornecero acesso a uma educação de qualidade e
equivalente a das escolas urbanas dando condições de aperfeiçoamentos
específicos para essa demanda, ou seja, cursos voltados para a Agricultura familiar,
para o agronegócio e as questões da pecuária, de forma geral.
2 Essa lei corresponde ao código florestal brasileiro e já foi alterada várias vezes. Atualmente é palco de discussões e confronte de interesses políticos, sendo que há previsão de mudanças para o presente ano de 2012.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho teve preciosas implicações pedagógicas. Inicialmente, mostrou
que é possível ensinar Geografia de forma diferente e partindo da
interdisciplinaridade. Além disso, demonstrou que é preciso fazer o educando refletir
e agir sobre sua realidade.
A falta ao educador tempo para estudar e preparar seu conteúdo de ensino.
Só com muito estudo e dedicação se é possível elaborar aulas com esse teor.
Mudar, pois, envolve políticas públicas de educação, que precisam ser revistas.
Este estudo evidenciou que a agricultura nos pequenos municípios apresenta
características e desafios próprios que precisam ir para a grade de ensino. O
agronegócio, a questão da sucessão familiar nas terras e o êxodo rural são
elementos centrais do trabalho com as questões do campo, pois a maioria dos
alunos são os herdeiros das terras e consequentemente das dificuldades.
Assim, por meio das discussões e trabalhos objetivados em sala é possível
mostrar novas perspectivas e possibilidades. Se a educação ministrada não ajudar
nossos jovens a lidar com esses dilemas, estará sendo somente fomentadora de
diplomas, mas não de aprendizagem. Assim sendo, como diz Saviani (1982), ”todo o
conhecimento científico usado para compreender essa realidade também é o
conhecimento necessário para mudá-la. Isso é dialética no ensino de geografia”.
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