AULA: ANEMIAS CARENCIAIS NA
INFÂNCIADario Palhares
Pediatra, Hospital Universitário de Brasília
OBJETIVOS DA AULA Conhecer o quadro clínico-laboratorial
das anemias carenciais Reconhecer a deficiência de ferro e a
anemia ferropriva como situação de grande prevalência populacional
Promover as práticas de impacto social na prevenção de anemia ferropriva
Tratar as anemias carenciais
ROTEIRO Etimologia Definição Breve revisão da fisiologia da
eritropoiese e da cinética do ferro, do ácido fólico e da cianocobalamina
Quadro clínico Tratamento Situação epidemiológica Práticas recomendadas para a
prevenção
ETIMOLOGIA Anemia: an = prefixo de negação haima = do grego, sangue ia = sufixo que significa
processo
Etimologicamente: anemia = ausência de produção de sangue.
DEFINIÇÃO Anemia: segundo a Organização Mundial da
Saúde, a anemia é definida segundo a concentração sanguínea de hemoglobina:
a) Do nascimento aos 6 meses de vida: valores inferiores a 9 g/dL
b) Dos 6 meses aos 6 anos e também gestantes: valores inferiores a 11 g/dL
c) Dos 6 aos 14 anos e mulheres adultas: valores inferiores a 12 g/dL
d) Homens adultos: valores inferiores a 13 g/dL
DEFINIÇÃO Algumas considerações:
a) Outros valores podem ser adotados. Do ponto de vista clínico, isso tem pouco impacto, mas do ponto de vista epidemiológico pode significar
diferenças (ex: considerar 10 g/dL de hemoglobina como normal para grávidas)
b) Tendo-se em vista a alta prevalência de erro alimentar, os valores normais de hemoglobina são tomados:
1) em bases populacionais sabidamente bem-nutridas 2) em experimentos onde a suplementação
nutricional faz aumentar o nível de hemoglobina
ANEMIA CARENCIAL
Anemia decorrente de insuficiência no aporte de nutrientes à medula óssea.
ERITROPOIESE1) Pronormoblasto2) Macroblasto3) Eritroblasto
basófilo4) Eritroblasto
acidófilo5) Normoblasto
picnótico6) Reticulócito7) Eritrócito
ERITROPOIESE Dura em média 7 dias, e a taxa de
produção pode ser aumentada em até 8 vezes.
Regulação: eritropoietina Secretada pelos rins (90 a 95%) e pelo
fígado Age diretamente nas linhagens
precursoras Produção relacionada ao nível de
oxigenação nos tecidos.
NECESSIDADES NUTRICIONAIS A formação das hemácias exige:-> aminoácidos-> ferro (componente heme)-> ácido fólico (essencial para formação
de ácidos nucleicos)-> cianocobalamina (cofator contendo
cobalto)
-> vitaminas A, B2 (riboflavina), C
CINÉTICA DA CIANOCOBALAMINA Uma vez ingerida, forma complexo com
glicoproteína gástrica Absorvida na região ileal Armazenada no fígado
Causas de deficiência:-> dieta veganista-> erro genético: não-produção da
proteína gástrica (anemia perniciosa)-> ressecção, lesão do íleo.
CINÉTICA DO ÁCIDO FÓLICO Encontrado naturalmente em alimentos
crus, principalmente folhas Absorvido no íleo Armazenado nos tecidos Degradado e excretado: necessidade de
ingestão diária Causas de deficiência:-> alimentação desbalanceada-> situações de hipercatabolismo
(hemoglobinopatia, infecções, neoplasias, etc.)
CINÉTICA DO FERRO Absorção de ferro: ou pela forma iônica
(menos eficiente) ou por formas orgânicas
Formas orgânicas: ferro ligado ao grupo heme ou formando quelatos com aminoácidos
Formas inorgânicas: íon Fe 3+ não é absorvível, há necessidade de redução ao íon Fe 2+
CINÉTICA DO FERRO
Fatores que aumentam a disponibilidade do íon ferroso: ácidos, vitamina C
Fatores que diminuem a disponibilidade do íon ferroso: ftatos e oxalatos (presentes em certos vegetais crus).
CINÉTICA DO FERRO Absorvido principalmente no duodeno
Deficiências nutricionais de cobre e zinco podem reduzir a absorção do ferro.
No sangue: liga-se à transferrina, proteína carreadora de ferro e produzida pelo fígado.
CINÉTICA DO FERRO Na medula óssea, e nos tecidos, o ferro
é ativamente absorvido O excedente de ferro é armazenado na
ferritina, proteína do sistema reticuloendotelial.
A ferritina: duas formas: uma tissular e outra sérica (em equilíbrio constante)
QUADRO CLÍNICO Varia de formas graves a formas silentes
Formas graves: insuficiência cardíaca (dispneia progressiva, astenia).
O sinal semiológico de palidez cutâneo-mucosa tem baixa sensibilidade e reprodutibilidade, mas é útil para casos extremos.
Formas moderadas: possibilidades de expressão:-> baixo rendimento intelectual-> redução na velocidade de crescimento-> maior suscetibilidade a infecções
Ou seja: silente, mas que insidiosamente prejudica o pleno desenvolvimento da criança.
O LABORATÓRIO Hemograma: dosa-se o número de
eritrócitos por mL, a hemoglobina por dL e o hematócrito
O hematócrito é sempre aproximadamente 3 vezes o valor da hemoglobinaÍNDICE CÁLCULO SIGNIFICADO
VCMVolume corpuscular médio
Ht/GV Tamanho da hemácia
HCM ( pg )Hemoglobina corpuscular média
Hb/GV Cor da hemácia
CHCM ( % )Concentração de hemoglobina corpuscular média
Hb/Ht ou HCM/VCM Cor da hemácia
RDW (% )Cell distribution width
________ Anisocitose
Ht ( % )Hematócrito
GV x VCM Volume eritrocitário
DEFICIÊNCIA DE FOLATO E CIANOCOBALAMINA Anemia megaloblástica: hemácias com
volume corpuscular médio acima de 95 fL.
Leucograma: leucopenia, hipersegmentação de neutrófilos
Diagnóstico clínico:calcado na anamnese e antecedentes:
ex: veganistas: défice de cianocobalamina
histórico de ressecção ileal: défice de folato, etc.
Diagnóstico laboratorial: dosagem sérica de cianocobalamina e de folato (pouco acessíveis no SUS).
TRATAMENTO DA ANEMIA CARENCIAL MEGALOBLÁSTICA1) Reponha cianocobalamina por via
parenteral (intramuscular) antes da oferta de ácido fólico
-> Há relatos que a reposição isolada de ácido fólico em meio a défice de cianocobalamina desencadeia neuropatias
2) Correção da dieta e suplementação com ácido fólico
DEFICIÊNCIA DE FERRO A deficiência de ferro precede à anemia.
Depleção: esgotamento das reservas Deficiência: hemoglobina normal, mas
sinais de insuficiência de ferro Por fim, anemia ferropriva
DEFICIÊNCIA DE FERRO É um diagnóstico laboratorial baseado, mais
comumente, nos seguintes exames:
-> Ferritina sérica baixa-> Protoporfirina eritrocitária livre-> Volume corpuscular médio
Obs: a ferritina é também proteína de fase aguda (estados infecciosos podem aumentar a ferritina sérica)
O diagnóstico epidemiológico exige pelo menos dois valores reduzidos
DEFICIÊNCIA DE FERRO/ANEMIA FERROPRIVA Hemograma: volume corpuscular médio
inferior a 80 fL Concentração de hemoglobina
corpuscular média inferior a 30% Anisocitose: RDW (red cell width) maior
que 14
DEFICIÊNCIA DE FERRO: CAUSAS 1) Aporte insuficiente na dieta.
Na criança, o rápido crescimento corporal pode não ser acompanhado do aporte adequado de ferro.
2) Parasitoses intestinais
3) Perdas insensíveis>>>Grupo heterogêneo de doenças com
investigação laboratorial mais complexa
ANEMIA FERROPRIVA: TRATAMENTO A princípio, toda criança com anemia,
sem outros sintomas, deve ser abordada como carencial.
Já no adulto, anemia carencial é menos provável de ocorrer
ANEMIA FERROPRIVA: TRATAMENTO 1) Tratamento empírico com vermífugos 2) Suplementação com sulfato ferroso
ou ferro quelato 4-6 mg/kg.dia 3) Realização de contagem de
reticulócitos: há aumento nos reticulócitos circulantes em 2-3 dias após o início da suplementação
4) Espera-se um aumento de 1 g/dL nos níveis de hemoglobina a cada 28 dias.
5) Casos muito graves podem exigir transfusão sanguínea.
ANEMIA FERROPRIVA: IMPLICAÇÕES SOCIAIS Prevalência de anemia ferropriva no
Brasil: varia conforme os grupos sociais Varia de 25 a 50% das crianças como
um todo Varia de 35 a 65% nas crianças menores
de três anos. Até 10% dos casos de anemia
hipocrômica microcítica são devidos a défices vitamínicos (A, B, C).
ANEMIA FERROPRIVA: IMPLICAÇÕES SOCIAIS 1) Triagem laboratorial de rotina mostrou-se
cara, ineficaz e sem custo/benefício.
2) O que é eficaz:a) Aleitamento materno exclusivo até os seis
mesesb) Uso de fórmulas lácteas e também não usar
leite de vaca integral como único alimento no primeiro semestre
c) Acompanhamento de curvas de crescimentod) Anamnese alimentar e orientação dietéticae) Saneamento básico
ANEMIA FERROPRIVA: FUTURO
Discute-se, ainda, a indicação de suplementação de ferro rotineira a partir do sexto mês de vida.
A resolução da Anvisa RDC número 344, de 13/12/2002 obriga a fortificação de ferro e ácido fólico das farinhas de trigo e de milho.
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