Donald Super e o desenvolvimento
vocacional
Psicologia – Módulo 2Profª Isaura Silva
Conceção do desenvolvimento que se relaciona com a profissão, a carreira, o desenvolvimento vocacional.
O papel do trabalho, da carreira profissional tem vindo a ganhar progressiva importância nas últimas décadas.
As grandes transformações tecnológicas e sociais a que assistimos criaram novas exigências.
As competências requeridas ao trabalhador não se limitam ao conhecimento técnico: tem de ter capacidade de adaptação, ser criativo, tomar iniciativa, trabalhar em equipa.
Exige-se cada vez mais disponibilidade e dedicação ao trabalhador, o que gera frequentemente um desgaste profissional e emocional.
Esta nova situação veio chamar a atenção para a importância da carreira, que se transformou num dos aspetos mais relevantes no desenvolvimento e equilíbrio do indivíduo.
A psicologia teve de considerar que, na sociedade moderna, a carreira é um aspeto a ter em conta, a par da vida familiar, dos estudos, do lazer, etc.
Daí a crescente importância da escolha de uma profissão, da identificação da vocação profissional.
Super considera que a escolha de uma profissão, de uma ocupação, não se resume a um momento da vida de uma pessoa, um momento único e estático.
Super defende que é um processo que se desenvolve ao longo de toda a vida das pessoas, insistindo na ideia da continuidade do desenvolvimento humano.
O desenvolvimento vocacional é um processo contínuo que vai desde a infância até à velhice.
O autor parte de um conjunto de ideias-base, de princípios que justificam as suas conceções
as características das pessoas (capacidades, personalidade, necessidades, valores, qualificam-nas para determinadas ocupações e profissões;
cada profissão requer um conjunto de capacidades e características de personalidade, ainda que não de uma forma rígida;
as preferências vocacionais das pessoas não são estáticas: modificam-se ao longo da vida por influência da sua experiência e das situações;
o desenvolvimento vocacional decorre em vários estádios ou fases da vida marcados por características próprias.
Autoconceito
Uma das contribuições mais significativas de Super foi a importância dada a desenvolvimento do autoconceito.
Segundo o autor, cada um desenvolve um autoconceito vocacional/profissional corresponde ao conjunto de interesses, competências, valores associados a uma profissão ou ocupação.
Ao manifestar uma preferência vocacional, o indivíduo exprime a pessoa que pensa ser, a pessoa que quer ser.
Quando assume uma determinada profissão, o indivíduo atualiza o seu autoconceito.
Numa entrevista que deu a Suzanne Freeman, Super recorre a um exemplo para explicar melhor noção de
autoconceito.
"Um estudante universitário pode considerar-se bom aluno e mau atleta ou vice-versa. Qual destes é o seu autoconceito? Nenhum! São autoconceitos (role self concepts). São os autoconceitos que são importantes, tais como "Eu sou um bom aluno e um mau atleta" ou "Eu sou um mau aluno e um bom atleta". Também podemos falar de bom/mau professor bom/mau marido, bom/mau cidadão. O que cada um de nós tem é uma constelação de autoconceitos: alguns são negativos, outros são positivos."
O autoconceito muda ao longo do tempo, da vida, como resultado da experiência.
Corresponde às características ligadas ao desenvolvimento profissional de uma pessoa.
Os estádios de vida
Segundo a teoria de desenvolvimento de Super, ao longo da vida as pessoas passam por fases ou estádios que ocorrem em determinadas idades, segundo uma sequência.
As idades indicadas são aproximadas.
A cada etapa ou estádio correspondem tarefas específicas a ser realizadas.
Pode dizer-se que uma pessoa atingiu a maturidade vocacional se está pronta para tomar decisões e assumir comportamentos próprios do estádio em que se encontra.
O autor define cinco estádios:
Crescimento Do nascimento aos 13-14 anosExploração Dos 15 aos 24 anosEstabelecimento Dos 24 aos 44 anosManutenção Dos 44 aos 64 anosDescompromisso Após os 64 anos
A designação de cada estádio remete para a principal tarefa do estádio de vida.
Cada uma das tarefas principais se subdivide em três ou quatro tarefas de desenvolvimento.
Segundo Super, estes estádios não são sempre lineares, dado que a pessoa pode voltar a um estádio anterior do desenvolvimento, isto é, os estádios podem ser cíclicos.
Esta situação - voltar a um estádio anterior -, a que Super chama de reciclagem, não tem uma conotação negativa. É um processo inerente ao desenvolvimento vocacional.
Crescimento
Desde o nascimento, a criança desenvolve-se num contexto social através do processo de socialização.
É na relação com os outros (pais, professores, outros adultos significativos e colegas) que, ao identificar-se com eles, ela vai construir o autoconceito vocacional: preocupa-se com o futuro, compreende a importância de ter sucesso na escola, adquire hábitos e rotinas de trabalho, procura ser competente.
Apesar de este estádio abranger idades com características muito diferentes, o percurso que a criança efetua é no sentido de as capacidades e interesses serem progressivamente dominantes.
Exploração
Esta fase vai desde a adolescência ao início do estado adulto e corresponde a um período de exploração de si próprio, do mundo do trabalho e dos papéis das outras pessoas nas suas ocupações.
O autoconceito vocacional constrói-se na interação com os outros, com as experiências pessoais, com o desempenho dos papéis em casa, na escola e noutros contextos de vida.
Num primeiro momento, as opções vocacionais são ensaiadas nas conversas com os outros e na fantasia.
Progressivamente, o jovem vai construindo o seu autoconceito vocacionai em contacto com a realidade.
Escolhida uma profissão, desenvolve as tarefas desta fase, especificando, implementando a sua opção.
Contudo, a escolha não está finalizada.
Estabelecimento
Na fase do estabelecimento, que decorre entre os 25 e os 44 anos, podem surgir questões relacionadas com experimentações e ensaios na procura de um autoconceito vocacional seguro.
Esta situação pode refletir-se, por exemplo, na mudança de emprego e na procura de novos percursos de vida profissional através de novas experiências laborais.
À medida que o tempo avança, o adulto procura dar solidez do mundo do trabalho, estabilizando, consolidando e progredindo na sua ocupação.
Manutenção
A designação deste estádio reflete a principal preocupação das pessoas: preservar e manter com sucesso o autoconceito vocacional estabelecido.
Desenvolver, conservar e cuidar são as tarefas que caracterizam esta etapa.
Contudo, tal não significa estagnação.
Se a pessoa não se sente autorrealizada na sua ocupação pode abraçar novos desafios.
É comum, nesta fase da vida, muitos colocarem a si próprios a pergunta: "É isto que quero fazer nos próximos anos?".
Neste contexto podem surgir mudanças e, por isso, inovar é também uma tarefa deste estádio de desenvolvimento.
A frustração pode surgir se a pessoa não conseguir estabilizar-se numa ocupação que a autorrealize, que seja adequada ao seu perfil.
Descompromisso
É a fase da vida em que se assiste a uma desaceleração no desenvolvimento da carreira através da pré-reforma ou mesmo da aposentação.
Assiste-se a uma diminuição da energia, ao abrandamento dos ritmos de atividade, ao declínio dos processos físicos e mentais.
O trabalho a tempo inteiro pode ser substituído por um trabalho a tempo parcial e por hobbies.
O elemento comum neste estádio é a necessidade de se reformular o estilo e a estrutura de vida.
Algumas pessoas encaram este período de uma forma positiva, outras sofrem com sentimentos de desilusão e desapontamento.
É cada vez mais importante o planeamento atempado da reforma para se poder responder ao desafio de uma nova de vida.
A importância da teoria de Super
As grandes mudanças tecnológicas e sociais e a importância da profissão na vida das pessoas criaram um novo cenário que Super soube interpretar. Este autor, através da sua teoria sobre o desenvolvimento vocacional, veio enriquecer e dar mais sentido ao desenvolvimento humano, sobretudo das sociedades mais industrializadas.
É de realçar na sua teoria a ideia de que o desenvolvimento que se processa por estádios não é linear: podem surgir questões num estádio que correspondem a etapas anteriores. Uma pessoa que se encontre no último estádio pode, por exemplo, procurar novos papéis ocupacionais, o que é uma tarefa própria do estádio de crescimento. Esta é uma perspetiva de dinâmica do desenvolvimento humano.
Super apresentou uma aplicação prática da sua teoria para apoiar os orientadores de carreira.
Chama-se Modelo de Avaliação e Orientação de Carreira e é um instrumento muito utilizado pelos orientadores profissionais para auxiliar as pessoas a resolverem os seus problemas de carreira.