I – PRINCÍPIOS DO DIREITO TRIBUTÁRIO
Sumário:1. Introdução1.1 As limitações que constituem garantias individuais do contribuinte2. Princípio da legalidade tributária2.1 Mitigação do princípio da legalidade.2.2 A medida provisória no direito tributário 2.2.1 Princípio da legalidade e a emenda constitucional n. 322.2.2 Restrições a utilização da medida provisória2.2.3 Legalidade e delegação legislativa3. Princípio da anterioridade tributária3.1 Princípio da anterioridade anual ou de exercício financeiro3.1.1 Anterioridade e revogação de isenções3.1.2 Anterioridade e medida provisória3.2 Anterioridade privilegiada ou nonagesimal3.2.1Noventena e medidas provisórias3.2.2 Anterioridade nonagesimal e prorrogação de tributo provisório3.3 Exceções ao princípio da anterioridade3.3.1 Exceções a anterioridade anual 3.3.2 Exceções a anterioridade nonagesimal3.3.3 Conclusões 3.4 Anterioridade X anualidade4. Isonomia Tributária4.1. Interpretação objetiva do fato imponível4.2. Teoria da Consideração ou Interpretação Econômica do Fato Gerador4.3. Hipóteses de tratamento tributário diferenciado4.4. A isonomia tributária no STF4.5. Princípio da uniformidade geográfica4.6. Capacidade contributiva5. Princípio da Irretroatividade da Lei Tributária 5.1. Sigilo bancário5.2. Exceções (leis produtoras de efeitos jurídicos pretéritos)5.3. Questões polêmicas6. Princípio da não confiscabilidade6.1. Conceito e finalidade6.2. Configuração6.3. Multas e não-confisco6.4. Taxas e não-confisco6.5. Princípio da capacidade contributiva x Princípio do não confisco6.6. Perspectiva dinâmica e estática da tributação do patrimônio6.7. Pena de perdimento x Confisco7. Princípio da liberdade de tráfego8. Vedações específicas à União – a proteção ao pacto federativo8.1. Princípio da uniformidade geográfica 8.2. Vedação à utilização do IR como instrumento de concorrência desleal – princípio da uniformidade da tributação da renda8.3. Vedação às isenções heterônomas9. Princípio da não discriminação baseada em procedência ou destino10. Exigência de lei específica para a concessão de benefícios fiscais
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1. Introdução
A relação jurídico-tributária não é meramente uma relação de poder, pois, como toda relação jurídica, é balizada pelo direito e, em face da interferência que o poder de tributar gera sobre o direito de propriedade, o legislador constituinte originário resolveu traçar as principais diretrizes e limitações ao exercício de tal poder diretamente na Constituição Federal.
Questão (CESPE): O poder de tributar decorre de uma relação de poder e não de uma relação jurídica, de modo que seu exercício não depende de previsão expressa no texto constitucional. Falso.
Os princípios são limitações constitucionais ao poder de tributar. Se um fenômeno tributário se conformar com os princípios constitucionais, ele será constitucional. Caso contrário, será inconstitucional. Os princípios tributários, portanto, balizam a tributação, permitindo que ela seja considerada constitucional ou inconstitucional.
O art. 150 da CF inaugura a seção “Das limitações do poder de tributar”, trazendo garantias cujo rol não é exaustivo. Nem todas as limitações ao poder de tributar, portanto, estão previstas no capítulo que regula o Sistema Tributário Nacional. Os princípios estão previstos nos art. 150, 151 e 152 da Constituição.
1.1 As limitações que constituem garantias individuais do contribuinte
Grande parte das limitações constitucionais configuram verdadeiras garantias individuais do contribuinte, que, como tais, constituem cláusulas pétreas e não podem ser objeto de mudança tendente a aboli-las. Nessa linha, é possível a realização de emendas que ampliem ou melhorem a proteção que a Constituição Federal atribuiu ao contribuinte; o que não é possível é a supressão ou redução dessas garantias, é dizer, mudanças tendentes a abolir o que ali está enumerado.
Para o STF, os princípios tributários não podem ser desafiados por emenda constitucional, destacando-se como “garantia individual do contribuinte” (ADI 939-7/93)1. O precedente mais marcante sobre o tema é
1 Já foi cobrado pelo CESPE, FGV, UNB.2
a ADI 939-7/93, na qual foi tratada a impossibilidade de modificar o princípio da anterioridade por meio de emenda constitucional.
Quando a EC n. 3/93 tentou autorizar a criação do IPMF, que deu origem a CPMF, excluindo-a da regra da anterioridade anual, o STF entendeu que a emenda era inconstitucional por tender a suprimir garantia individual dos contribuintes. Fundamento: se existe uma regra com previsão das respectivas exceções, a
ampliação das exceções põe em risco a própria regra.
Nesse mesmo julgado, o STF também considerou inconstitucional a previsão de que o CPMF não estaria sujeito a imunidade tributária recíproca, imunidade dos templos de qualquer culto, imunidade dos livros, jornais, periódicos, etc. Todas essas garantias foram também consideradas protegidas por cláusula pétrea.
EMENTA: - Direito Constitucional e Tributário. Ação Direta de Inconstitucionalidade de Emenda Constitucional e de Lei Complementar. I.P.M.F. Imposto Provisorio sobre a Movimentação ou a Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira - I.P.M.F. Artigos 5., par. 2., 60, par. 4., incisos I e IV, 150, incisos III, "b", e VI, "a", "b", "c" e "d", da Constituição Federal. 1. Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação a Constituição originaria, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precipua e de guarda da Constituição (art. 102, I, "a", da C.F.). 2. A Emenda Constitucional n. 3, de 17.03.1993, que, no art. 2., autorizou a União a instituir o I.P.M.F., incidiu em vício de inconstitucionalidade, ao dispor, no paragrafo 2. desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica "o art. 150, III, "b" e VI", da Constituição, porque, desse modo, violou os seguintes princípios e normas imutaveis (somente eles, não outros): 1. - o princípio da anterioridade, que e garantia individual do contribuinte (art. 5., par. 2., art. 60, par. 4., inciso IV e art. 150, III, "b" da Constituição); 2. - o princípio da imunidade tributaria reciproca (que veda a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros) e que e garantia da Federação (art. 60, par. 4., inciso I,e art. 150, VI, "a", da C.F.); 3. - a norma que, estabelecendo outras imunidades impede a criação de impostos (art. 150, III) sobre: "b"): templos de qualquer culto; "c"): patrimônio, renda ou serviços dos partidos politicos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistencia social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da
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lei; e "d"): livros, jornais, periodicos e o papel destinado a sua impressão; 3. Em conseqüência, e inconstitucional, também, a Lei Complementar n. 77, de 13.07.1993, sem redução de textos, nos pontos em que determinou a incidência do tributo no mesmo ano (art. 28) e deixou de reconhecer as imunidades previstas no art. 150, VI, "a", "b", "c" e "d" da C.F. (arts. 3., 4. e 8. do mesmo diploma, L.C. n. 77/93). 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente, em parte, para tais fins, por maioria, nos termos do voto do Relator, mantida, com relação a todos os contribuintes, em caráter definitivo, a medida cautelar, que suspendera a cobrança do tributo no ano de 1993. (ADI 939, Relator(a): Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 15/12/1993, DJ 18-03-1994 PP-05165 EMENT VOL-01737-02 PP-00160 RTJ VOL-00151-03 PP-00755)
2. Princípio da legalidade tributária
É aquele segundo o qual as pessoas políticas (União, Estado, Municípios e DF) somente poderão criar e aumentar tributo por meio de lei. Está previsto no art. 150 da CF:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
O vetor axiológico, fundamento que justifica a existência desse princípio é a segurança jurídica, pois a lei é o veículo que, em regra, gera segurança jurídica, traduzindo a vontade popular. Por meio da lei, “o povo tributa a si mesmo”.
O princípio da legalidade pode receber também a seguinte terminologia: princípio da reserva legal, estrita legalidade ou da tipicidade fechada (cerrada ou regra).
Como regra, os tributos são majorados por lei ordinária. Existem, contudo, quatro tributos que somente podem ser criados ou majorados por LEI COMPLEMENTAR:
a) Imposto sobre grandes fortunas;
Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.
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Sobre o imposto sobre grandes fortunas, há quem afirme que, tendo em vista que a Constituição fale apenas em “nos termos de lei complementar”, este deve ser criado por lei complementar e regulamentado por meio de lei ordinária. Entretanto, esta doutrina é minoritária e não é adotada pelas bancas de concurso.
b) Empréstimos compulsórios;
c) Imposto residual;
d) Contribuição social-previdenciária residual.
São características desses tributos:
Todos são federais;
Dois são impostos;
Dois tributos são criados no exercício de competência residual.
Tendo em vista o paralelismo de formas, se uma lei cria ou majora determinado tributo, apenas outra lei poderá extingui-lo ou reduzi-lo.
Em virtude de o patrimônio público ser, por princípio, indisponível, a concessão de benefícios fiscais ou a autorização de prática de atos que gerem impactos sobre o crédito tributário ou sobre sua exigibilidade somente pode ser feita por lei – e lei específica, conforme dispõe o art. 150, §6º da CF:
§ 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
Por fim, ressalte-se que a multa tributária, por gerar uma obrigação a ser adimplida pelo infrator também só pode ser estatuída em lei.
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O princípio da legalidade é tratado no art. 97 do CTN, indicando que a lei tributária é estrutura tipificante contendo elementos “numerus clausus”:
Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:I - a instituição de tributos, ou a sua extinção;II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo;IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;V - a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas;VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.
São elementos tributários que só podem ser alterados por lei:
a) Alíquota;
b) base de cálculo;
c) Sujeito passivo;
d) Multa e fato gerador.
É importante saber: o legislador pode atribuir ao regulamento à incumbência de complementar conceitos jurídicos que a lei deixou indeterminados, sem que isto implique em violação ao princípio da legalidade.
2.1 Mitigação do princípio da legalidade.
O princípio da legalidade pode ser atenuado, admitindo-se a intervenção do Poder Executivo em matéria de tributação. Vejamos quais são as hipóteses em que tal mitigação pode ocorrer.
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a) Interpretação a contrario sensu do art. 97 do CTN: O STF entende que o art. 97 foi recepcionado pela CF/88 e, interpretando o dispositivo a contrario sensu, conclui que as matérias ali não constantes não estão abrangidas pelo princípio da legalidade. A seguir, cita-se os principais exemplos:
Atualização de valor monetário da base de cálculo do tributo: O chefe do poder executivo pode alterar a base de cálculo dos impostos, atualizando-o por meio de índices oficiais de correção monetária do período, conforme prevê o art. 97, par. 2º do CTN:
Art. 97.
§ 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.
Se, todavia, essa alteração implicar em aumento da base de cálculo, ela será inconstitucional.
Conforme já decidiu o STF, como a legislação sobre direito financeiro encontra-se no âmbito da legislação concorrente (art. 24, I, CF), os entes federados podem utilizar-se de índices locais para a correção monetária de seus tributos. No que toca ao IPTU, contudo, tal liberdade é relativa, tendo por limite o índice oficial de correção monetária. Sobre o tema, confira a súmula 160 do STJ:
Súmula 160. É defeso, ao Município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária.
Questão: um prefeito municipal altera a base de cálculo de determinado tributo municipal, por meio de decreto. Disserte. Art. 97, parágrafos.
O prefeito não pode aumentar a base de cálculo, mas apenas atualizar. Apenas a lei pode aumentar a base de cálculo de um tributo. A base de cálculo do tributo pode ser alterada por ato do executivo, desde que se respeitem índices oficiais de correção monetária, ou seja, que se
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trate de inequívoca atualização. O aumento, por sua vez, depende de lei.
Fixação do prazo para recolhimento: relativamente ao prazo para pagamento do tributo, o STF entende ser possível a fixação por decreto, em virtude de não ter sido numerado entre as taxativas matérias que o art. 97 do CTN submete a reserva de lei.
b) Possibilidade de majoração de tributos por ato do chefe do poder executivo: o chefe do poder executivo poderá alterar a ALÍQUOTA de certos tributos.
Observe que não se trata de uma exceção ao princípio da legalidade, mas uma mitigação, pois esses tributos continuam a ser CRIADOS por meio de lei. Apenas a lei pode CRIAR tributos.
ATENÇÃO: os concursos costumam alterar o termo alíquota por base de cálculo.
Essa mitigação está prevista no art. 153, parágrafo 1º da CF:
§ 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.
São impostos cuja alteração da alíquota pode não ser feita por lei:
a) Imposto sobre importação – II;
b) Imposto sobre exportação – IE;
c) Impostos sobre produtos industrializados – IPI;
d) Impostos sobre operações financeiras – IOF;
e) Contribuição de Intervenção do domínio econômico: CIDE – combustíveis (essa exceção foi acrescentada pela EC n. 33/01)
Art. 177. (...)§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus
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derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)I - a alíquota da contribuição poderá ser: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)(...)c) reduzida e RESTABELECIDA por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150,III, b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
A CIDE é um tributo federal, cuja alíquota pode ser reduzida ou restabelecida por ato do Poder Executivo. A palavra “restabelecer” tem amplitude menor que a palavra “aumentar”, pois no restabelecimento a alíquota não pode superar o percentual anterior a uma redução porventura realizada.
Fundamento: A CIDE combustíveis é uma forma de intervenção do Estado no domínio econômico, uma forma de incentivar a economia e por isso não poderia ser alterada apenas pelo demorado processo legislativo. Nessa linha, para garantir uma rápida intervenção na economia, as tarifas dessa contribuição está prevista em lei, mas as alterações poderão ser feitas por decreto.
f) ICMS- monofásico incidente sobre combustíveis definidos em lei complementar (essa exceção foi acrescentada pela EC n. 33/01)
Art. 155 da CF. (...)§ 4º Na hipótese do inciso XII, h, observar-se-á o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)IV - as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, g, observando-se o seguinte: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, b.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)
Atenção: Essa mitigação do princípio da legalidade só pode ser feita por meio de CONVÊNIO (realizado no âmbito do CONFAZ).
Fundamento: o objetivo dessa mitigação do princípio da legalidade é minimizar a guerra fiscal entre os Estados, razão porque a alteração da alíquota nesses casos somente pode ser feita por convênio – resultado de
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uma deliberação entre os poderes executivos dos Estados.
Questão: Todas as mitigações do princípio da legalidade são impostos. FALSO. Lembre-se da CIDE-combustíveis.
Questão: Todas as mitigações do princípio da legalidade referem-se a tributos federais. FALSO. Lembre-se do ICMS-combustíveis.
CUIDADO: Se a alteração da alíquota ultrapassar o mero restabelecimento de patamar anteriormente fixado, deve-se obedecer a anterioridade.
Tributo Mitigação da legalidade
Exceção a anterioridade
Ato normativo
CIDE-combustíveis
Redução e reestabelecimento
de alíquotas
Redução e reestabelecimento
de alíquotas
Decreto
ICMS-combustíveis
Fixação de alíquotas (inclusive redução e
aumento)
Redução e reestabelecimento
de alíquotas
Convênio (CONFAZ)
2.2 A medida provisória no direito tributário
2.2.1 Princípio da legalidade e a emenda constitucional n. 32
De acordo com o art. 62 da CF, alterado pela emenda n. 32, parágrafo 2º, é plenamente possível o direito tributário ser objeto de medida provisória, que pode criar e alterar impostos no Brasil.
A emenda n. 32, colocando em cheque a segurança jurídica do princípio da legalidade, previu que a medida provisória pode criar e aumentar IMPOSTOS no Brasil.
Essa possibilidade é extremamente criticada pela doutrina, pois fragiliza o princípio da legalidade e, por conseguinte, a segurança jurídica.
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Embora seja objeto de crítica na doutrina, o STF já admitia essa possibilidade antes mesmo da edição da emenda n. 32.
Questão: O presidente da república pode aumentar ou criar impostos por meio de medida provisória? Sim. Essa possibilidade está previsto no art. 62, parágrafo 2º da CF.
Cuidado: Para o STF, é possível que uma medida provisória crie ou aumente um imposto não federal, desde que faça a observância simétrica do processo legislativo federal. ADI 425/TO e ADI 2391/SC.
2.2.2 Restrições a utilização da medida provisória
a) Restrição aos impostos
De acordo com a Constituição federal, apenas o IMPOSTO pode ser objeto de medida provisória.
ATENÇÃO: O STF considera há muito tempo que a medida provisória pode criar e aumentar TRIBUTO e não apenas impostos.
b) Impedimento constitucional a utilização de medida provisória em matéria tributária cuja disciplina está reservada a lei complementar
Não poderão ser objeto de medida provisória as matérias objeto de lei complementar, conforme dispõe o art. 62, §1º, inciso III, da CF:
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)§ 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)III - reservada a lei complementar; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)
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Qualquer ponto da CF que se refira a lei complementar não pode ser objeto de medida provisória. “Onde a lei complementar versar, a medida provisória não irá habitar”.
c) Está impedida a edição de medidas provisórias para regulamentar artigos da CF cujas redações tenham sido alteradas pelas emendas constitucionais n. 05/95 a 32/01.
Art. 246. É vedada a adoção de medida provisória na regulamentação de artigo da Constituição cuja redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada entre 1º de janeiro de 1995 até a promulgação desta emenda, inclusive. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)
No que concerne à matéria tributária, a restrição aplica-se as seguintes emendas:
EC n. 12/96: outorgou competência à União para a instituição da CPMF, hoje extinta;
EC n. 20/98: traz importantes repercussões sobre as contribuições para financiamento da seguridade social;
EC n. 21/99: prorrogou a CPMF, hoje extinta;
EC n. 29/2000: autorizou a progressividade fiscal do IPTU e a diferenciação das respectivas alíquotas com base no uso e na localização do imóvel;
EC n. 31/2000: instituiu o Fundo de Combate a erradicação da pobreza.
2.2.3 Legalidade e delegação legislativa
É possível que, havendo delegação do Congresso Nacional por meio de RESOLUÇÃO, o Presidente da República edite Lei Delegada em matéria tributária.
3. Princípio da anterioridade tributária
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O princípio da anterioridade é também chamado de princípio da eficácia diferida ou da não surpresa2.
A publicação e vigência da lei, em regra, ocorrem na mesma data, mas a eficácia somente ocorre após o transcurso de tempo das duas esperas, que serão estudadas a seguir.
Cuidado: o princípio da anterioridade tem a finalidade de proteger o contribuinte, se a lei reduzir o tributo haverá pronta incidência. Lei que reduz tributo possui pronta incidência.
3.1 Princípio da anterioridade anual ou de exercício financeiro
O princípio da anterioridade anual está prevista na redação originária da Constituição. De acordo com esse princípio, a eficácia da lei majoradora ou criadora do tributo fica adiada para o primeiro de janeiro do ano seguinte.
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:(...)III - cobrar tributos:b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
Note: o princípio da anterioridade toma como base a data de publicação da lei e não a data de vigência.
O STF entende que a norma que se restringe a mudar o prazo para pagamento do tributo, mesmo antecipando-o, não agrava a situação do contribuinte, não se sujeitando a regra da anterioridade anual.
Do mesmo modo, a mera atualização monetária do valor do tributo ou de sua base de cálculo, por não significar majoração do mesmo, não se sujeita a anterioridade.
2 Aula de Tatiane no curso de PGE-Podivm.13
O STF também entende que não configura aumento de tributo a mera redução ou extinção de desconto legalmente previsto, não sendo o caso, portanto, de incidência do princípio da anterioridade.
3.1.1 Anterioridade e revogação de isenções
Segundo o art. 104, inciso III, do Código Tributário Nacional, os dispositivos de lei que revoguem isenções relativas a impostos sobre o PATRIMÔNIO ou a RENDA somente entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte aquele em que ocorra a sua publicação, salvo se a lei dispuser de maneira mais favorável ao contribuinte. Isto é, a revogação de isenção de imposto sobre o PATRIMÔNIO e a RENDA (ex: IPVA, IR) submete-se ao princípio da anterioridade.
Art. 104. Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou a renda:I - que instituem ou majoram tais impostos;II - que definem novas hipóteses de incidência;III - que extinguem ou reduzem isenções, salvo se a lei dispuser de maneira mais favorável ao contribuinte, e observado o disposto no artigo 178.
Nesse passo, a revogação de isenção de ICMS não está sujeito ao princípio da anterioridade. É o que conclui a súmula 615 do STF:
O princípio constitucional da anualidade (par-29 do art-153 da CF) não se aplica à revogação de isenção do ICM.
A despeito disso, o STF entendeu que as isenções não condicionadas ou sem prazo definido podem ser revogadas a qualquer tempo por lei, voltando o tributo a ser imediatamente exigível, ou seja, não se aplicando o princípio da anterioridade. RE 204.062. A decisão é antiga e um tanto nebulosa. Em provas de concurso tem sido cobrada tanto a literalidade do CTN quanto este posicionamento do STF. Fique atento as manifestações jurisprudenciais sobre o tema!!
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Observação: Para gerar direito adquirido, não podendo ser revogada, a isenção deve preencher dois requisitos: i) ser por prazo certo; e ii) sob condição específica. O fundamento dessa disposição está no art. 178 do CTN:
Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104. (Redação dada pela Lei Complementar nº 24, de 7.1.1975)
Exemplo: não pode ser revogada uma isenção concedida sob a condição de construir uma indústria a uma empresa que tenha investido R$1.000.000,00 por conta de tal benefício
3.1.2 Anterioridade e medida provisória
A EC n. 32 também estabeleceu que, ressalvados o II, IE, IPI, IOF e os impostos extraordinários de guerra, a medida provisória que implique majoração de imposto só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se for convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada. É o que dispõe o art. 62, §2º da CF:
Art. 62. (...) § 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)
Pegadinha: a restrição relativa à necessidade da conversão em lei no exercício financeiro da edição da medida provisória aplica-se exclusivamente aos IMPOSTOS. Em relação aos outros tributos, a regra da anterioridade deve ser observada com base na data da publicação da MP e não de sua conversão em lei.
3.2 Anterioridade privilegiada ou nonagesimal
Quando da promulgação da constituição federal, a obediência a um prazo mínimo de noventa dias entre a data da publicação de uma lei que
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majorasse ou criasse tributo era aplicável exclusivamente às contribuições para financiamento da seguridade social (de competência da União), por força do art. 195, §6º da CF:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (...)§ 6º - As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas depois de decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b".
Segundo o STF, o termo “modificado” aplicado no aludido artigo significa inequívoca onerosidade (inclusão de sujeito passivo como devedor), de sorte que o princípio da anterioridade não se aplica a alteração da data de pagamento do tributo. A matéria, inclusive, foi sumulada:
Súmula 669 do STF. Norma legal que altera o prazo de recolhimento da obrigação tributária não se sujeita ao princípio da anterioridade.
A alteração na data de pagamento da contribuição previdenciária não significa onerosidade suficiente para avocar a noventena.
Para Sabag, esse entendimento é absurdo.
Parte da doutrina denominava o princípio de anterioridade especial, mitigada ou privilegiada, pois se tratava, em tese, de uma mitigação do princípio da anterioridade anual. Ao denominar de mitigada, a doutrina parecia imaginar que seria uma garantia menor ao contribuinte.
Sabag entende que, como a anterioridade nonagesimal sempre existiu para as contribuições previdenciárias sociais, ela não deveria ser chamada de mitigada ou privilegiada, cabendo essa expressão para a anterioridade nonagesimal criada pela emenda 42.
Na prática, contudo, a anterioridade anual tornou-se uma garantia meramente formal, dado o costume de concentrar a publicação das
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alterações na legislação tributária no final do exercício. Assim, a anterioridade dita mitigada terminava sendo uma garantia muito mais efetiva para o contribuinte, pois lhe assegurava um período mínimo de dias para que adequasse o seu orçamento.
Nesse contexto, tornou-se um clamor dos contribuintes que a “noventena” se tornasse uma regra geral, o que foi atendido pela EC n. 42/2003 que incluiu a alínea “c” do inciso III do art. 150 da CF, prevendo a anterioridade nonagesimal.
De acordo com a anterioridade nonagesimal, a eficácia da lei fica adiada para o nonagésimo primeiro dia a partir da publicação da lei. O fundamento desse princípio é a proibição da tributação de surpresa, ratificando a segurança jurídica.
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:(...)III - cobrar tributos:c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
Observe que a única diferença aparentemente relevante entre a norma acrescentada pela EC n. 42/03 e o art. 195, § 6º da CF é que o novo texto exige o cumprimento do prazo de 90 dias nos casos de instituição ou aumento de tributo, enquanto o art. 195, §6º exige o cumprimento em caso de instituição ou modificação. O STF, contudo, entendendo que a anterioridade nonagesimal existe para beneficiar o contribuinte contra mudanças que repercutam negativamente em seu patrimônio, decidiu que o art. 195, §6º só é aplicável no caso de instituição ou majoração. O art. 195, §6º e o art. 150, inciso III, “c” tratam, portanto, do mesmo instituto jurídico.
DICA: caso o tributo seja criado ou majorado de 01 de janeiro até dois de outubro (inclusive), a incidência da lei ocorrerá e 1º de janeiro do ano seguinte. Se a lei for publicada de 03 de outubro até 31 de dezembro, a data da incidência será posterior a primeiro de janeiro em razão do impacto dos 90 dias.
Exemplo:17
Lei publicada em 15 de dezembro de 2009 5 de mar de 2010.
Lei publicada em agosto de 2009 1º de jan de 2010.
Taxa criada em 16 de nov de 2010 será paga em 90 dias.
3.2.1Noventena e medidas provisórias
Anteriormente a emenda constitucional n. 32/01, as medidas provisória possuíam vigência por apenas trinta dias, mas poderia ser reeditadas indefinidamente, o que levou à prática de sucessivas reedições (cuja possibilidade foi ratificada pelo STF). Naquela época, estavam sujeitas a noventena apenas as contribuições sociais para financiamento da seguridade social.
Nesse contexto, o STF entendeu que, se não houvesse mudança relevante no texto nas reedições, o prazo da “noventena” deveria ser contado da edição da primeira medida provisória, pois, em face da continuidade normativa (com as sucessivas reedições), não haveria surpresa para o contribuinte. Por outro lado, se houvesse mudança substancial no texto da medida provisória no momento de sua conversão em lei, o prazo seria contado da publicação da lei de conversão.
Após o advento da EC n. 32/01, as medidas provisórias passaram a ter vigência por sessenta dias, prorrogáveis por mais sessenta. Por conseguinte, na metade do prazo da segunda prorrogação, completam-se os noventa dias, incidindo a cobrança do tributo nos últimos 30 dias de sua vigência.
Caso a medida provisória seja rejeitada ou perca a eficácia, o tributo deixa imediatamente de ser cobrado. Nesse caso, como houve cobrança com base na MP por 30 dias, cabe ao Congresso Nacional disciplinar por decreto legislativo as relações jurídicas geradas, ou seja, definir se haverá ou não devolução dos valores recolhidos. Caso o Congresso silencie pelo prazo de 60 dias, as relações jurídicas geradas conservam-se regidas pela MP, ou seja, na prática, os valores pagos não serão devolvidos.
Se, todavia, a medida provisória for convertida em lei sem alteração substancial do texto, a cobrança continua. Se a conversão se der
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com alteração substancial, deve-se reiniciar a contagem da data da publicação da lei de conversão.
Lembre-se: se o tributo criado ou majorado for um IMPOSTO, a cobrança a partir do exercício subseqüente dependerá da conversão da medida provisória em lei. Devem ser simultaneamente observadas às regras relativas à anterioridade do exercício financeiro e da noventena.
3.2.2 Anterioridade nonagesimal e prorrogação de tributo provisório
Segundo o STF, a prorrogação de uma lei que estabelece um tributo provisório não se submete ao princípio da anterioridade nonagesimal, pois o contribuinte não será surpreendido por um tributo que já existe.
O princípio da anterioridade nonagesimal, portanto, aplica-se somente aos casos de instituição ou modificação da contribuição social, e não ao caso de simples prorrogação da lei que a houver instituído ou modificado.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONTRIBUIÇÃO PROVISÓRIA SOBRE MOVIMENTAÇÃO OU TRANSMISSÃO DE VALORES E DE CRÉDITOS E DIREITOS DE NATUREZA FINANCEIRA-CPMF (ARTS. 84 E 85, ACRESCENTADOS AO ADCT PELO ART. 3º DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 37, DE 12 DE JUNHO DE 2002). 1 - Impertinência da preliminar suscitada pelo Advogado-Geral da União, de que a matéria controvertida tem caráter interna corporis do Congresso Nacional, por dizer respeito à interpretação de normas regimentais, matéria imune à crítica judiciária. Questão que diz respeito ao processo legislativo previsto na Constituição Federal, em especial às regras atinentes ao trâmite de emenda constitucional (art. 60), tendo clara estatura constitucional. 2 - Proposta de emenda que, votada e aprovada na Câmara dos Deputados, sofreu alteração no Senado Federal, tendo sido promulgada sem que tivesse retornado à Casa iniciadora para nova votação quanto à parte objeto de modificação. Inexistência de ofensa ao art. 60, § 2º da Constituição Federal no tocante à supressão, no Senado Federal, da expressão "observado o disposto no § 6º do art. 195 da Constituição Federal", que constava do texto aprovado pela Câmara dos Deputados em 2 (dois) turnos de votação, tendo em
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vista que essa alteração não importou em mudança substancial do sentido do texto (Precedente: ADC nº 3, rel. Min. Nelson Jobim). Ocorrência de mera prorrogação da Lei nº 9.311/96, modificada pela Lei nº 9.539/97, não tendo aplicação ao caso o disposto no § 6º do art. 195 da Constituição Federal. O princípio da anterioridade nonagesimal aplica-se somente aos casos de instituição ou modificação da contribuição social, e não ao caso de simples prorrogação da lei que a houver instituído ou modificado. 3 - Ausência de inconstitucionalidade material. O § 4º, inciso IV do art. 60 da Constituição veda a deliberação quanto à proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais. Proibida, assim, estaria a deliberação de emenda que se destinasse a suprimir do texto constitucional o § 6º do art. 195, ou que excluísse a aplicação desse preceito a uma hipótese em que, pela vontade do constituinte originário, devesse ele ser aplicado. A presente hipótese, no entanto, versa sobre a incidência ou não desse dispositivo, que se mantém incólume no corpo da Carta, a um caso concreto. Não houve, no texto promulgado da emenda em debate, qualquer negativa explícita ou implícita de aplicação do princípio contido no § 6º do art. 195 da Constituição. 4 - Ação direta julgada improcedente. (ADI 2666, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 03/10/2002, DJ 06-12-2002 PP-00051 EMENT VOL-02094-01 PP-00177)
3.3 Exceções ao princípio da anterioridade
Art. 150. (...)
§ 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
3.3.1 Exceções a anterioridade anual
O princípio da anterioridade nonagesimal não se aplica aos seguintes impostos:
a) II, IE, IPI, IOF;
Essas quatro primeiras exceções existem porque esses impostos possuem características marcantemente extra fiscais,
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constituindo-se em poderosos mecanismos de intervenção no domínio econômico.
b) Impostos extraordinários de guerra;
c) Empréstimos compulsórios para a calamidade pública e para guerra;
Quanto a essas duas exceções (“b” e “c”), a não sujeição à anterioridade deve-se à indiscutível urgência na obtenção de recursos para enfrentar as graves situações que autorizam a instituição dos tributos. Nesses casos, a segurança nacional prepondera sobre o interesse particular de não ser surpreendido por imediata majoração de carga tributária.
d) Contribuições para financiamento da seguridade social (art. 195, §6º, CF);
Desde a promulgação da Constituição, essas contribuições sujeitam-se à regra específica de não surpresa: o princípio da noventena, posteriormente estendido pela EC n. 41/03 para as demais espécies tributárias.
e) Restabelecimento da alíquota da CIDE-combustíveis e do ICMS- combustíveis (EC n. 33/2001);
A regra é inovadora, pois permite que, após a realização de uma redução é possível uma majoração subseqüente sem observância da anterioridade, desde que respeitado como teto o percentual anterior.
3.3.2 Exceções a anterioridade nonagesimal
O princípio da anterioridade nonagesimal não se aplica aos seguintes tributos:
a) II; IE; IOF
Atenção: A EC n. 42 ao estender o princípio da noventena para a maioria dos tributos, não excetuou o IPI, que passou a ser o único dos impostos reguladores cujos efeitos das majorações porventura realizadas estão sujeitos a prazo (noventena). Isso porque, entre os impostos, o IPI é o segundo maior arrecadador federal de modo que parte da doutrina já o classifica como um imposto fiscal. Sendo o IPI tratado não apenas como um mecanismo de intervenção na economia, mas como fonte de arrecadação foi necessário criar um mecanismo de defesa para o contribuinte contra majorações repentinas de sua incidência.
21
b) IR;
Ricardo Alexandre critica essa exceção: “talvez o tributo que mais merecesse uma eficaz regra de proteção ao contribuinte, ficou livre de noventena”.
c) Impostos extraordinários de guerra;
d) Empréstimo compulsório para calamidade pública e guerra;
e) Alterações na base de cálculo do IPTU e IPVA
Fundamento: O momento mais propício para que as Fazendas Públicas Estaduais e municipais procedam às revisões dos valores dos veículos e imóveis, respectivamente, é o fim de cada exercício.
Primeiro, por possibilitar levar em consideração toda a variação daquele ano.
Segundo, porque as leis municipais e estaduais elegem geralmente o dia 1º de janeiro como aqueles em que se consideram ocorridos os respectivos fatos geradores.
3.3.3 Conclusões
Incidência imediata: II, IE, IOF, Empréstimo compulsório para calamidade pública e guerra, impostos extraordinário de guerra.
Incidência sempre após 90 dias: IPI, ICMS-combustíveis e CIDE combustíveis.
Incidência a partir de 1º de janeiro: IR e leis que alterem a base de cálculo de IPTU e IPVA.
Exigência imediata
Exige-se apenas após 90 dias
Exige-se no 1º dia do exercício seguinte
Imposto extraordinário de guerra
Empréstimo compulsório3
IPI
ICMS- combustível
CIDE-combustível
IR
Leis que alterem a base de cálculo do IPTU e do IPVA
3 Para a guerra ou calamidade publica22
II, IE, IOF Contribuições destinadas ao financiamento da seguridade social
Atenção: O que não for exceção será regra, aplicando-se ambas as anterioridades: ISS, ITR, taxa, ICMS (exceto ICMS combustíveis), IPTU e IPVA (apenas base de cálculo). Também não se aplicam essas exceções as taxas.
Quadro comparativo das exceções a anterioridade
Exceção a anterioridade anual Exceção a anterioridade nonagesimal
II, IE, IOF, impostos extraordinários de guerra, empréstimos compulsórios para calamidade pública e guerra.
IPI4 IR
CIDE-combustíveis
ICMS-combustíveis
Alterações na base de cálculo do IPTU e IPVA.
Contribuições para financiamento da seguridade social
3.4 Anterioridade X anualidade
O princípio da anterioridade não se confunde com o da anualidade. O princípio da anterioridade esteve presente na Constituição de 1946, condicionando a eficácia da lei tributária a dois requisitos: i) prévia estipulação do fenômeno na lei orçamentária anual (anualidade); ii) publicação da lei no ano anterior (anterioridade).
Nos textos constitucionais posteriores, o tema oscilou, desaparecendo a partir de 1969. Portanto, a anualidade não encontra respaldo no hodierno sistema constitucional tributário brasileiro5. A anterioridade refere-se ao direito financeiro e não ao direito tributário. Para a lei tributária ser eficaz, não se exige previsão em lei orçamentária, mas
4 O IPI sera pago depois de 90 dias.5 Já foi cobrado no TRF-4, CESPE.
23
apenas o respeito as duas esperas (a anualidade). Sobre o tema, confira o teor da súmula n. 66 do STF:
É legítima a cobrança do tributo que houver sido aumentado após o orçamento, mas antes do início do respectivo exercício financeiro.
4. Isonomia Tributária
A isonomia é tratada genericamente em vários dispositivos ao longo
da CF: art. 5º, caput, art. 5º, I, art. 3º, IV etc. por isso, diz-se que a
isonomia é um super-princípio. Especificamente, a isonomia é tratada do
art. 150, II:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
Antes de 1988, havia distinção em razão de cargo. Entre 1967 e
1969, determinadas pessoas auferiam renda e não pagavam imposto de
renda em razão da função exercida.
O art. 150, II dispõe que é vedado o tratamento tributário desigual a
contribuintes que se encontram em situação de equivalência. Tal comando,
quer indicar a proibição dos “privilégios odiosos”. Busca-se a realização da
justiça fiscal, da justiça distributiva.
QUESTÕES DE FIXAÇÃO:
QUESTÃO (MPF): O IPI, cujas alíquotas, nos limites da lei, podem sofrer majoração por decreto, não se submete ao princípio da legalidade, mas obedece a regra da anterioridade nonagesimal. VERDADE.
QUESTÃO (procurador federal): As alíquotas dos impostos de importação e exportação podem ser alterada por decreto, de
24
acordo com os limites previstos em lei, que constitui atenuação ao princípio da legalidade. VERDADE.
QUESTÃO (Procurador federal): O prazo para o recolhimento do tributo, por se tratar de elemento que tem repercussão na definição do montante a ser recolhido, deve ser definido em lei, não podendo ser estabelecido em regulamento. FALSO. O STF entende que alteração de prazo afasta o princípio da legalidade e da anterioridade.
QUESTÃO: Somente a lei tributária pode fixar o tempo de pagamento do crédito tributário [já tá falso], atualizar monetariamente a base de cálculo [errado também] alterar a alíquota do imposto de importação [falso também]. FALSO, as três afirmativas estão erradas.
QUESTÃO: A definição de infração tributária e a fixação das respectivas penalidades pecuniárias são tarefas do legislador ordinário. VERDADE, essa é a regra.
QUESTÃO: O princípio previsto no art. 150, II, “c” da Constituição Federal é inaplicável às contribuições de seguridade social. VERDADE.
QUESTÃO: Caso seja promovido o aumento da alíquota de ITCM e doação, por lei publicada na lei 31/12/2004, a majoração poderá incidir sobre os fatos geradores a ocorrerem a partir de 01/01/2005, em face do princípio da anterioridade tributária. FALSO. Em 31.12.04 já existiam as duas anterioridades, pois a anterioridade nonagesimal foi instituída pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003.
CESPE: Os impostos extrafiscais são aqueles que possuem como primacial função carrear disponibilidade financeira aos cofres públicos. FALSO, pois é a finalidade fiscal que serve para carrear recursos.
MP TCU/2007: Em relação aos tributos e suas espécies, é possível afirmar que o tributo tem função extrafiscal quando seu objetivo principal é a interferência no domínio econômico, não se limitando apenas à simples arrecadação de recursos financeiros. VERDADE.
CESPE: Quando ao IOF, é possível afirma que tem função predominantemente extrafiscal. VERDADE.
25
CESPE: Quando ao IOF é possível afirmar que suas alíquotas somente podem ser modificadas por lei em sentido estrito. FALSO, pois são exceções à legalidade.
CESPE: É vedado à União exigir o imposto sobre produtos industrializados antes de decorrer dos 90 dias da data da publicação. VERDADE.
QUESTÃO (juiz/SP): Em relação aos sujeitos passivo e ativo da obrigação tributária, é possível afirmar que a capacidade tributária do sujeito ativo independe que esteja regularmente constituída a sociedade, bastando que configure uma unidade econômica profissional. VERDADE.
ESAF: O principio da anterioridade tributária não pode ser afastado por meio de emenda, ainda que em relação a imposto determinando, não constante de enumeração excetuada no próprio texto constitucional original. VERDADE.
4.1. Interpretação objetiva do fato imponível
Quem são os iguais? Os iguais são aqueles que realizarem o fato
gerador do tributo, prevalecendo a INTERPRETAÇÃO OBJETIVA DO FATO
IMPONÍVEL. Importa ao intérprete o FG e não os aspectos externos a ele:
menoridade civil (recém nascido é contribuinte!), ilicitude do ato (não é a
ilicitude do fato gerador porque não existe FG ilícito6), imoralidade do ato
(ex: prostituição).QUESTÃO: Incide imposto de renda sob a renda oriunda de atividade ilícita? Sim, em razão do princípio do non olet incide IR sobre a renda auferida pelo bicheiro ou pelo cafetão, dono de casa de prostituição.
Incide ICMS sobre a venda de drogas?Não.
O auferir renda é ato lícito, não importando a forma pela qual ela foi auferida. Por conta disso, a renda proveniente de atos ilícitos, imorais são tributáveis. Todavia, a venda de drogas – ato distinto da renda proveniente da droga – que seria o fato gerador do
6 Logo em seguida, Sabbag se contradiz e diz que o FG pode ser ilícito, que o que não pode se ilícito é a HI.
26
ICMS é o próprio ato ilícito, contaminando assim o fato gerador. A própria ilicitude contamina a hipótese de incidência. Logo, o ICMS não incide sobre a venda de drogas.
Segundo o princípio tributário do non olet, a hipótese deve ser
entendida de forma que o intérprete se abstraia da licitude ou ilicitude da
atividade exercida.
De fato, há de haver uma universal incidência do tributo, porquanto a
hipótese de incidência, materializando-se no fato imponível, é circunstância
bastante para a irradiação equitativa da incidência tributária. Quanto à possível restituição do tributo em virtude da incidência tributária diante de um ato considerado nulo ou anulável, perante o Direito Privado, há de se fazer duas observações: a) se o Judiciário declarar a nulidade do negócio jurídico, e este não tenha produzido os seus efeitos, haverá direito à restituição do imposto eventualmente recolhido; b) se o Judiciário declarar a nulidade do negócio jurídico, e este já tiver produzido os seus efeitos, a Fazenda não estará obrigada a restituir o tributo.
Dialética ou contraditório existente na tributação do ilícitoQUESTÃO: Ao se tributar a renda ilícita, haveria confusão entre tributo e multa (sanção)? Há colisão de direitos?
QUESTÃO: Sendo o direito uno, como pode, então, o direito penal perseguir o evento (estipulando penalidades para desestimular a conduta) e o Estado tributá-lo? O Estado torna-se sócio do crime?
Bernardo Ribeiro de Moraes entende que o direito penal, por um
lado, reprime o ilícito, enquanto o direito tributário, de outro lado, seria
cúmplice/sócio do ilícito.
Ademais, alguns autores sustentam que ter-se-ia criado uma
antinomia com o art. 3º do CTN, segundo o qual “tributo é toda prestação
pecuniária compulsória, em moeda cujo valor nela se possa exprimir, que
não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante
atividade plenamente vinculada. Tributo, portanto, pressupõe a prática de
27
ato lícito.
O STJ, STF e a maioria da doutrina, contudo, entendem possível a
incidência do tributo nessa situação. Entende-se que, nas palavras de
Sabbag, “não há ilicitude na hipótese de incidência do tributo, mas
pode haver em sua concretização”. Assim, enquanto a hipótese de
incidência é “auferir tributo”, o fato gerador pode ser o “recebimento de
dinheiro pelo jogo do bicho”. Dessa forma, o fato gerador pode ser ilícito
(entendido como o momento da concretização da hipótese legal tributária).
Essa idéia está contida em Hugo de Brito. Cuidado, pois Sabbag está todo confuso com essa idéia – primeiro disse que o fato gerador jamais era ilícito e depois disse que ele poderia ser ilícito e a hipótese de incidência é que jamais seria.
A tributação do ilícito não se confunde com a multa, cuja finalidade
é o desestímulo ao descumprimento de uma obrigação tributária. O art. 3º
do CTN mostra que tributo não se confunde com multa.
Ao tributar todas as atividades, independentemente de sua licitude ou
ilicitude, o direito tributário homenageia o princípio da isonomia, evitando
que a atividade criminosa se configure mais vantajosa, inclusive pela
isenção tributária.
4.2. Teoria da Consideração ou Interpretação Econômica do Fato
Gerador
Na versão atenuada da interpretação econômica, sustenta-se que o
FG (ou HI, com maior rigor terminológico) deve ser interpretado com total
fidelidade ao modo como se encontra descrito em lei, sem alteração de
fatores externos.
O art. 118 do CTN é a demonstração da adoção (atenuada) da
“Teoria da Consideração ou Interpretação Econômica do Fato Gerador”.
Pode ser questão da PFN. Essa teoria entrou no sistema brasileiro por meio
do art. 118, refletindo a doutrina alemã (Enno Becker).
Por meio desse dispositivo, o legislador sinaliza que, ocorrida a
hipótese econômica na lei abstratamente descrita, não cabe perquirir sua
28
validade formal, a licitude no negócio jurídico subjacente, ou seus reais
efeitos.Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se:
I - da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos;
II - dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos.
Veja que o Estado, apropriando-se do patrimônio proveniente do
ilícito (carros, casas etc.), terá direito aos tributos incidentes no momento
da adjudicação deste patrimônio ao particular (leilões públicos). Esta
doutrina foi objeto de normatização, em nosso Código, pela porta do art.
118 do CTN (que reflete a doutrina alemã).
4.3. Hipóteses de tratamento tributário diferenciado7
Temos na Constituição hipóteses de tratamento tributário
diferenciado, o que não fere o princípio da isonomia. Ex: micro e
pequenas empresas:Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.
Art. 146. Cabe à lei complementar:
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
De acordo com os artigos 179 e 146, III, “d”, tais empresas têm
tratamento tributário diferenciado, justamente porque não estão em pé de
7 Caderno J.29
igualdade com as empresas de grande porte. Esse tratamento diferenciado e
favorecido é, na verdade, um instrumento de realização da isonomia, já que
tem o objetivo de trazer as pequenas empresas para as mesmas condições
de concorrência das empresas maiores.
4.4. A isonomia tributária no STF
A. Contribuição previdenciária dos servidores inativos – discriminação
de servidores de diferentes esferas
A EC n. 41/03 trouxe a contribuição previdenciária dos servidores
inativos e dos pensionistas, já considerada constitucional pelo STF.
O grande problema foi que, para os inativos e pensionistas da União,
a incidência era sobre a remuneração que excedesse 60% do limite
máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência
social. Já para os beneficiários dos Estados, DF e M, a contribuição
incidiria sobre a remuneração que excedesse 50% do limite.
O STF, julgando a ADI 3.105, pôs fim ao tratamento discriminatório.
B. Discriminação com base na função ou ocupação exercida
Outra situação em que o STF entendeu haver tratamento
discriminatório sem fundamento foi quando julgou insubsistente pretensão
de contribuinte que, fundamentado em lei do Município de Niterói-RJ,
pretendia ver reconhecida isenção do IPTU exclusivamente como
decorrência de sua qualidade de servidor público (AI 157.871-AgR).
Ou seja: a função exercida pelo contribuinte não pode ser tomada
como parâmetro para diferenciação.
C. Discriminação entre as empresas lucrativas e deficitárias
A COFINS e a CSLL são duas contribuições para financiamento da
seguridade social. A primeira incide sobre a receita ou o faturamento (art.
194, I, B, CF), sendo, portanto, paga por todos os contribuintes, lucrativos 30
ou não. Já a segunda incide sobre o lucro líquido, de forma que os
contribuintes que registram prejuízos no exercício não estão sujeitos a seu
pagamento.
Ao majorar a alíquota da COFINS de 2 para 3%, a Lei 9.718/98
previu que o contribuinte sujeito a ambas contribuições teoria o direito de
abater até 1/3 da COFINS com a CSLL, quando obtivesse lucro.
Os contribuintes alegaram que a lei agredia a isonomia, pois tratava
de maneira beneficiada as empresas lucrativas. O STF, por outro lado,
entendeu que a isonomia estava sendo respeitada, pois a lei apenas
tentava atenuar a carga tributária das empresas sujeitas a dupla
tributação.
D. SIMPLES – discriminação entre empresas com base na atividade
exercida
A Lei 9.317/96, revogada pela LC 123/06, instituiu o SIMPLES
(Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das
microempresas e das empresas de pequeno porte). A Confederação
Nacional das Profissões Liberais ajuizou ADI, argumentando que a
exclusão das sociedades profissionais liberais das vantagens tributárias
agredia a isonomia.
Decidiu o STF: as sociedades civis de prestação de serviços
profissionais relativos ao exercício de profissão regulamentada não sofrem
o impacto do domínio do mercado pelas grandes empresas. Não são objeto
da missão do SIMPLES. Logo, não há ofensa à isonomia.
4.5. Princípio da uniformidade geográfica
Outro desdobramento lógico do princípio da isonomia é o
PRINCÍPIO DA UNIFORMIDADE GEOGRÁFICA, previsto no art.
151, I da CF.Art. 151. É vedado à União:
31
I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País;
Esse princípio informa que a União não poderá estabelecer
tratamento tributário diferenciado entre os entes da federação. As
normas federais tributárias devem ser uniformes em todo território
nacional.
Há uma ressalva: concessão de incentivos que tenham for finalidade
promover o equilíbrio do desenvolvimento econômico e social, entre as
diversas regiões do país.
Um exemplo clássico é a chamada Zona Franca de Manaus, prevista
no art. 40 do ADCT:Art. 40. É mantida a Zona Franca de Manaus, com suas características de área livre de comércio, de exportação e importação, e de incentivos fiscais, pelo prazo de VINTE E CINCO ANOS , a partir da promulgação da Constituição.
Parágrafo único. Somente por lei federal podem ser modificados os critérios que disciplinaram ou venham a disciplinar a aprovação dos projetos na Zona Franca de Manaus.
O prazo de vigência da Zona Franca de Manaus, previsto
originalmente em 25 anos, foi recentemente prorrogado pela EC n.
42/03 (art. 92 do ADCT), que garantiu mais 10 anos de prazo.Art. 92. São acrescidos dez anos ao prazo fixado no art. 40 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
Por fim, o art. 152 da CF reforça o princípio da uniformidade
geográfica, complementando o art. 151, I:Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino.
Obs: Entende o STF que a concessão de isenção se funda no juízo de
conveniência e oportunidade que gozam as autoridades públicas, não
cabendo ao Poder Judiciário, que não pode substituir o legislador,
32
estender a isenção a contribuintes não contemplados, a título de
isonomia (RE 344.331).
4.6. Princípio da Capacidade Contributiva
A análise do princípio da isonomia depende do estudo de um “sub-
princípio”, que lhe serve como corolário (conseqüência), o princípio da
capacidade contributiva (art. 145, § 1º da CF).
O art. 145, §1º merece uma análise acurada, em três partes:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
§ 1º - Sempre que possível , os IMPOSTOS terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
O art. 126 do CTN dispõe sobre a capacidade tributária:
Art. 126. A capacidade tributária passiva independe:
I - da capacidade civil das pessoas naturais;
II - de achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação do exercício de atividades civis, comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócios;
III - de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional.
A capacidade tributária passiva é plena. Nessa medida, a capacidade civil é irrelevante para o contexto tributário. Por isso, a tributação alcançará o menor e o recém nascido8.
8 MP/RR (CESPE)33
Caso a pessoa natural esteja sujeita a medidas privativas do exercício de atividade profissional, isso será irrelevante para a tributação.
Exemplos: médico não habilitado que clinica deve pagar tributos.
Caso a pessoa jurídica não esteja formalmente constituída e tenha realizado o fato gerador, ela será tributada.
I. “Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal”
A norma fala em “impostos” e não em tributos. A CF de 1946 falava
em tributos. O STF entendeu que onde se fala impostos, deve-se entender
tributo, ou seja, para o STF, o princípio da capacidade tributária será
aplicado a outras espécies tributárias que não o imposto.CESPE: O princípio da capacidade contributiva pode se estender às taxas. CORRETO.
Fala também em “sempre que possível” e não em sempre. “Sempre
que possível” significa “de acordo com as possibilidades técnicas de cada
imposto” (Ricardo Lobo Torres). Significa que os impostos terão como fato
gerador uma conduta relativa ao sujeito passivo (contribuinte). Ou seja:
na medida do possível, o fato gerador terá por base aspectos subjetivos
relacionados ao indivíduo. Exemplo clássico: Imposto de Renda.
Os impostos pessoais são comumente comparados com os impostos
reais.
Impostos pessoais Fato gerador consiste em conduta relativa
ao contribuinte;
Impostos reais Fato gerador se relaciona com um bem: leva
em conta a propriedade de um bem ou a transmissão da
propriedade de um bem. A preocupação do imposto real é o bem,
e não com a pessoa a ele vinculada. Ex: IPTU, ITR, IPVA, ITBI,
ITCMD.QUESTÃO (CESPE): Qual a diferença entre a Constituição Federal de 88 e a de 1946 em relação à capacidade tributária? A CF/46 previa o princípio expressamente para os tributos em geral, enquanto a CF/88 o prevê apenas aos impostos. Nada obstante, o STF conferiu
34
interpretação extensiva ao princípio, aplicando-se sobre todos os tributos.
II. “e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte”
a) Amplitude
A primeira pergunta que se impõe é: apenas os impostos pessoais
serão graduados segundo a capacidade econômica ou também os reais?
Responder a esta pergunta é saber o alcance do princípio da
capacidade contributiva. O STF já se manifestou sobre a questão: o
princípio da capacidade contributiva se aplica aos impostos reais e
pessoais.
E mais: Apesar de a norma fazer referência apenas aos impostos,
entendeu o STF que nada impede a aplicação do princípio a outras
espécies tributárias (o STF aplicou esse princípio para a “taxa de
fiscalização dos mercados de títulos e valores mobiliários”).
DICA: A banca vai trocar a expressão “sempre que possível” por “sempre” e “impostos” por “tributos” e vai questionar “segundo a Constituição Federal” ou “segundo o STF” e a resposta vai mudar de acordo com essa afirmação.
b) Capacidade contributiva x capacidade econômica
Questão (MPF): Qual a diferença entre capacidade contributiva
e capacidade econômica?
CAPACIDADE ECONÔMICA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
É a manifestação da aptidão de determinado
sujeito de receber rendimentos e majorar
seu patrimônio.
Não necessariamente implica capacidade
contributiva.
É a aptidão do contribuinte (sujeito passivo)
relacionada com a imposição do ônus tributário.
Cuida-se de uma capacidade econômica
específica, que resulta na possibilidade de
pagamento de tributos.
Ex: Para a incidência do IR, não basta ter capacidade econômica,
devendo o contribuinte ter, também, capacidade contributiva. Alguém com
35
renda de R$500,00 tem capacidade econômica, mas é isento (não tem
capacidade contributiva).
Ora, o art. 145, §1º, ao dispor que os tributos serão graduados
segundo a capacidade econômica dos contribuintes, está se referindo
justamente à capacidade de ganhar dinheiro. A partir daí, chega-se à
capacidade contributiva (resultado da medição da capacidade econômica).
III. Técnicas de graduação da capacidade econômica
O princípio da capacidade contributiva deverá ser aplicado aos mais
diferentes impostos, por meio de técnicas de incidência de alíquotas sobre a
capacidade econômica dos contribuintes. As técnicas que a lei utiliza para
graduar a capacidade econômica e, assim, chegar à capacidade contributiva
são, entre outras:
a) Progressividade fiscal (alíquotas progressivas) É uma técnica
de incidência de alíquotas variáveis, perante bases de cálculo que
também variam. Assim, imposto progressivo é o imposto que tem
alíquotas variáveis.
Pista: alíquotas variáveis.
Os 3 impostos progressivos previstos expressamente na Constituição
são: IR, ITR e IPTU.
IR – A progressividade do IR tem intuito apenas fiscal
(arrecadatório) e não extrafiscal.
O IR é geral, universal e progressivo.
ITR – O ITR incide sobre a propriedade de glebas rurais. O ITR
busca evitar o ausentismo (art. 5º, XXIII da Constituição Federal,
que prevê que toda propriedade deve ter função social). A
progressividade do ITR tem caráter extrafiscal, pois visa ao
desiderato de atender à função social da propriedade, e não abastecer
os cofres públicos.
36
IPTU – A progressividade do IPTU foi introduzida pela EC
29/2000, que alterou o art. 156, §1º, I e II da CF. Sua
progressividade tem caráter extrafiscal + fiscal. O IPTU pode variar
conforme o valor da propriedade (demonstra seu caráter fiscal).
QUESTÃO: Quais são os dois impostos progressivos com finalidade extrafiscal? IPTU e ITR.
QUESTÃO: Qual o imposto não federal que detém progressividade prevista na CF? IPTU.
A técnica mais discutida é a da progressividade de alíquotas. A
progressividade de alíquotas que tem por objetivo medir a capacidade
contributiva é a progressividade fiscal.
Em regra, na progressividade fiscal, quanto maior a base de cálculo,
maior a alíquota. (aumento de alíquota em função da base de cálculo).
No geral, é assim que funciona a progressividade fiscal. Ex: no IR, v.g.,
quanto maior a renda, maior a alíquota.
Mas a progressividade fiscal nem sempre tem relação com a
variação da base de cálculo:
a. No IPTU, há uma variedade de alíquotas em função do valor do
imóvel, localização deste bem e uso do imóvel (residencial,
comercial ou industrial). Assim dispõe o art. 156, §1º da CF.Art. 156, § 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I [IPTU] poderá:
I - ser progressivo em razão do valor do imóvel; e
II - ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel.
b. No IPVA, temos a variação da alíquota com base no tipo de
veículo e na sua utilização. Assim dispõe o art. 155, §6º da CF.Art. 155, § 6º O imposto previsto no inciso III [IPVA]:
I - terá alíquotas mínimas fixadas pelo Senado Federal;
II - poderá ter alíquotas diferenciadas em função do tipo e utilização.
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Obs: Segundo o STF, não se admite ITBI progressivo no Brasil
(súmula 656)! – CESPESúmula 656 do STF. É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o Imposto de Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel.
b) Proporcionalidade (tributação proporcional) É uma técnica de
incidência de alíquotas fixas, perante bases de cálculo que podem
variar. Neste caso, não há alíquotas progressivas, mas sim uma
alíquota única.
Pista: alíquotas fixas.
Geralmente, na técnica da proporcionalidade, há situações de base
de cálculo variável, resultando numa tributação proporcional à
manifestação de riqueza. Ex: A alíquota do ICMS é fixa (percentual determinado). Essa alíquota sobre uma base de calculo de X reais resulta num valor menor que aquele obtido quando incidente sobre 1000X reais.
Todos os impostos que não são progressivos são proporcionais,
assim organizados:
Alíquota fixa;
Base de cálculo variável.
Obs: Enquanto a progressividade tem previsão explícita na CF, a
proporcionalidade tem previsão meramente implícita.
A maioria dos impostos brasileiros tem vocação proporcional, incidindo sobre o consumo (ICMS, IPI). Isso provoca um icomodo efeito colateral, pois quem ganha mais paga proporcionalmente menos; quem ganha menos paga relativamente mais, gerando uma progressividade as avessas. Trata-se de uma anomalia chamada de regressividade, indicadora
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de uma má gestão da nossa carga tributária: “relação entre a totalidade de tributos pagos pela sociedade e o PIB”9.
Como a maioria da tributação no Brasil está voltada para o consumo, na prática ocorre o contrário da progressividade, fenômeno chamado de regressividade. Isso porque, como a carga tributária está voltada para o consumo e ricos e pobres que consomem os mesmos produtos pagam os mesmos impostos, a carga tributária termina recaindo proporcionalmente sobre os mais pobres.
c) Seletividade Técnica de incidência de alíquotas que variam:
na “razão inversa” da ESSENCIALIDADE do bem;
na razão direta da superfluidade10;
na razão direta da nocividade do bem.
Assim, quanto mais essencial for o bem, menor o imposto seletivo;
quanto mais supérfluo for o bem, maior o imposto seletivo.QUESTÃO (estilo PFN): Quem mais paga imposto no Brasil é o pobre. Comente.
A carga tributaria brasileira está deslocada para o consumo e não para o patrimônio. Como o pobre tem mais consumo que patrimônio, paga mais tributo que o rico, que acumula patrimônio. Isso é o que os doutrinadores chamam de REGRESSIVIDADE. As famílias que ganham até 2 salários mínimos pagam metade do que ganham em tributos. Comparativamente, as famílias ricas pagam 25% de sua renda de tributo. Com o intuito de alterar essa situação, foi criada a seletividade.
A seletividade busca inibir a REGRESSIVIDA, anomalia do sistema
tributário brasileiro segundo a qual quem ganha mais paga menos e quem
ganha menos paga mais.
Os dois impostos seletivos previstos expressamente na CF são ICMS
e IPI.
9 Isso foi cobrado no concurso para fiscal estadual do Acre (CESPE/2009)
10 Superfluidade advém do adjetivo supérfluo. Quanto mais supérfluo for o bem, maior será o imposto incidente sobre bem.
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A aplicação do princípio da seletividade ao ICMS está previsto no art. 155, par. 2º, inciso III da CF.
Tendo em vista que o aludido dispositivo fala em poderá, a doutrina chama esse princípio de seletividade facultativa.
O art. 153, par. 3º, inciso I da CF trata da seletividade do IPI.
Como o dispositivo fala em “deverá”, a doutrina sustenta que a seletividade do IPI é obrigatória.
A seletividade busca realizar a igualdade entre os contribuintes, tratando de forma diferente os desiguais.
d) Nocividade técnica de caráter extrafiscal que segue a mesma
ordem inversa da seletividade. Quanto mais nocivo for o bem; maior
será o imposto. Ex: cigarros.
e) Etc.
IV. “facultado à administração tributária, especialmente para conferir
efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos
individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as
atividades econômicas do contribuinte”.
Esta última parte faz alusão aos poderes de fiscalização, com a
finalidade de a Administração ir atrás da capacidade contributiva. Trata-se
dos instrumentos que a fiscalização poderá utilizar para atingir essa
capacidade contributiva.
Ex: quebra de sigilo bancário. Muita atenção: em concursos, convém
citar como fundamento constitucional para a possibilidade de quebra do
sigilo bancário o art. 145, §1º da CF.
Limites à fiscalização tributária:
40
Para aferir a capacidade contributiva, a Administração poderá
identificar:
Rendimentos;
patrimônio e;
atividades econômicas do contribuinte.
Na quebra do sigilo bancário, p. ex., temos a identificação dos
rendimentos, para aferição da capacidade contributiva e aferição de fatos
geradores.
A quebra de sigilo bancário realizado diretamente pela
Administração Fazendária (sem necessidade de decisão judicial) atende às
duas condições previstas no art. 145, §1º:
a) Ter previsão leal – A lei que trata da quebra do sigilo bancário é a
LC 105/2002;
b) Respeitar os direitos e garantias individuais – O respeito decorre
do fato de que as informações ficam sujeitas ao sigilo fiscal. Por
conta disso, não se deve falar em “quebra” do sigilo bancário, mas
sim “transferência” do sigilo bancário à Administração.
OBS: A requisição às instituições financeiras de informações dos
contribuintes, prevista na LC 105/02, é excepcional, só se justificando
quando não haja outro meio à disposição da Administração Fazendária de
obter as informações indispensáveis à consecução de seu mister
constitucional.
Art. 6º da LC 105/01. As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.
Obs: O decreto 3.724/2001 define em que casos o exame de dados protegidos por sigilo bancário pode ser considerado indispensável pela autoridade fiscal, em seu art. 3º.
41
5. Princípio da Irretroatividade da Lei TributáriaArt. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
Tal princípio informa que as alterações da lei tributária têm
aplicação prospectiva (para o futuro), não se podendo cobrar tributo em
relação a fatos geradores anteriores à sua vigência. Assim, a lei não
poderá ter vigência retrospectiva.
O valor axiológico homenageado pelo princípio da irretroatividade é
a segurança jurídica.
Cuidado para não confundir:
Princípio da Anterioridade Princípio da Irretroatividade
Relaciona-se com a EFICÁCIA da
lei (que fica diferida, adiada).
Relaciona-se com a VIGÊNCIA da
lei.
Comporta exceções em relação a
alguns tributos (previstos no art.
150, §1º da Constituição Federal.
Ex: IOF, impostos extraordinários)
Comporta exceções para figuras não
tributárias (multas/infrações)
Obs: A grande maioria das leis tributárias entra em vigor
na data da publicação.
5.1. Sigilo bancário (tema em voga nos concursos federais)
O sigilo bancário é tema que estava regulado originalmente no art.
38, §5º da Lei 4.595/64. Essa norma previa que a Administração
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somente poderia ter acesso à movimentação bancária dos
contribuintes através de autorização judicial.
Em 1996, foi publicada a Lei 9.311/96, que criou a CPMF, cobrada
sobre a movimentação financeira. Por conta do sigilo protegido pelo
Poder Judiciário, o art. 11 dessa lei dispunha que a Administração
não poderia usar os dados bancários para outra utilidade, senão
a cobrança da CPMF.
Em 2001, a Lei Complementar 105/01 revogou a Lei 4.595/64,
afastando a necessidade de autorização judicial para que a
Administração Fazendária possa quebrar o sigilo bancário dos
contribuintes (arts. 5º e 6º). Por esse diploma, a Administração pode
requisitar, sozinha, informações às instituições financeiras, quando
houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal
em curso.Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente. (Regulamento)
Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária.
Também em 2001, a Lei 10.174/01 altera a Lei 9.311/96 (CPMF),
possibilitando o cruzamento de dados bancários (para fins de
cobrança de IR, v.g.).
A grande questão é: poderia a Administração, em 2001, utilizar a
possibilidade de cruzamento de dados/fiscalização em relação a fatos
geradores passados, ocorridos quando não era possível a quebra de sigilo
bancário sem autorização judicial? A receita começa a proceder desta
maneira, chegando a questão ao STJ.
Veja: Para o STJ, não haveria qualquer problema na conduta da
Administração, em razão do disposto no §1º do art. 144:
43
Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada.
§ 1º Aplica-se ao lançamento a legislação que, posteriormente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros.
Esse dispositivo informa a retroatividade da norma que traz novos
procedimentos de fiscalização, já que a mudança legislativa, nestes casos,
é meramente procedimental:
ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO – UTILIZAÇÃO DE DADOS DA CPMF PARA LANÇAMENTO DE OUTROS TRIBUTOS – QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO – PERÍODO ANTERIOR À LC N. 105⁄2001 – APLICAÇÃO IMEDIATA – RETROATIVIDADE PERMITIDA PELO ART. 144, § 1º, DO CTN – PRECEDENTES DESTE SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – REsp 675293, DJe 27.05.08, STJ
1. É possível a aplicação imediata do art. 6º da LC n. 105⁄2001, porquanto trata de disposição meramente procedimental. Pelo disposto no artigo 144, § 1º, do CTN, revela-se possível o cruzamento dos dados obtidos com a arrecadação da CPMF para fins de constituição de crédito relativo a outros tributos em face do que dispõe o art. 1º da Lei n. 10.174⁄2001, que alterou a redação original do art. 11, § 3º, da Lei n. 9.311⁄96.
2. Não há ofensa ao princípio da irretroatividade da lei tributária, porquanto a Lei Complementar n. 105⁄2001, bem como a Lei n. 10.174⁄01, não instituem ou majoram tributos, mas apenas dotam a Administração Tributária de instrumentos legais aptos a promover a agilização e o aperfeiçoamento dos procedimentos fiscais.
3. Não existe direito adquirido de obstar a fiscalização de negócios tributários, pois enquanto não extinto o crédito tributário a autoridade fiscal tem o poder-dever vinculado de realizar o lançamento em correspondência ao direito de tributar da entidade estatal. Precedentes: REsp 685.708⁄Fux; REsp 701.996⁄Zavascki; REsp 985.432⁄Humberto Martins, REsp 628.116⁄Meira; AgRg no REsp 669.157⁄Falcão; REsp 691.601⁄Calmon.
44
Em síntese, entendeu o STJ ser aplicável de imediato a LC n. 105 aos
fatos pretéritos, possibilitando o cruzamento de dados obtidos com a
arrecadação da CPMF, já que:
Trata-se de disposição meramente procedimental, sem criar
ou majorar tributos.
Conforme dispõe o art. 144, §1º do CTN, a legislação que
amplia poderes de investigação tem aplicação retroativa.
Não há direito adquirido de obstar a fiscalização de negócios
tributários.
No STF, existem diversas ADIs ajuizadas contra a LC 105/01, para
questionar a validade da quebra de sigilo bancário diretamente pela
Administração Fazendária. O Supremo ainda não se manifestou e não há
liminares. Atente: este tema é altamente relevante para concursos federais.
Apesar de a CPMF ter sido extinta, ainda subsiste a necessidade de
as instituições financeiras enviarem notificação à receita quanto às
movimentações bancárias acima de determinados valores.
5.2. Exceções (leis produtoras de efeitos jurídicos pretéritos)
Reforçando o princípio da irretroatividade, dispõe o CTN, em seu
art. 105, que “a legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos
geradores futuros e aos pendentes”.
Maiores discussões sobre o princípio da irretroatividade residem nos
fatos geradores que o CTN denomina de pendentes. A controvérsia
existente desses fatos decorre de uma não menos controversa classificação
dos fatos geradores dos tributos como periódicos ou instantâneos.
Não confundir (já caiu em prova):
Fato gerador instantâneo Ocorre num momento preciso da
linha do tempo, dando ensejo, ao surgimento, em cada caso de
ocorrência, de uma nova obrigação tributária. Ex: inciso II.
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Fato gerador periódico É o fato gerador que se prolonga no
tempo, ocorrendo nos instantes legalmente determinados, gerando, a
cada período concluído, uma nova obrigação tributária. Dividem-se
em:
a. Fato gerador periódico simples ou continuado É o fato
gerador que toma em conta um único evento que se prolonga
no tempo, como é o caso dos impostos sobre a propriedade (a
propriedade é perpétua, prolongando-se no tempo, mas é um
evento único). Ex: IPTU, IPVA.
b. Fato gerador periódico composto ou complexivo É o fato
gerador composto por vários eventos que devem ser
considerados de maneira global, dentro de um período de
tempo legalmente definido. Ex: IR e CSLL. No decorrer do
exercício, o fato gerador destes tributos encontra-se pendente.
A questão é que, nos fatos gerados periódicos (que se prolongam no
tempo, sejam continuados ou complexivos), a lei estipula exatamente o
instante da completude e perfeição. Verificada inovação legislativa antes
deste momento, mas durante os eventos que compõem o fato gerador, este
fato será considerado pendente, sendo-lhe aplicável o art. 105.
Há de se ressaltar, entretanto, que atualmente a tendência é a de
entender que todos os FG são instantâneos, uma vez que, mesmo naqueles
que parte da doutrina denomina periódicos, a lei estabelece, com precisão,
o instante em que o ciclo se completa, considerando-se ocorrido o FG.
Percebe-se, ademais, que hoje em dia a discussão sobre a existência
dos chamados FG periódicos tem importância meramente acadêmica, visto
que a adoção de quaisquer das correntes chegará exatamente à mesma
conclusão.
Segundo RICARDO ALEXANDRE, o princípio da irretroatividade da lei
tributária, conforme enunciado no art. 150, III, a, da CF, não possui
qualquer exceção (não há qualquer hipótese em que se possa cobrar tributo
em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei
que os instituiu ou aumentou).
46
Isto não significa, todavia, que o princípio seja é incompatível com a
possibilidade de leis com efeito retroativo, como as expressamente
interpretativas e as que versem sobre infrações e sejam melhores para o
infratores.
Olhando-se sob o prisma a irretroatividade prevista no CTN
disciplinado no CTN, a abrangência é mais ampla, o que ensejo ao
surgimento de exceções. A maior amplitude ocorre porque o CTN trata da
irretroatividade de toda a legislação tributária e não apenas da lei que
institua ou majore tributos.
São casos de retroatividade da lei tributária previstos no CTN: art.
144, §1º e art. 106. Sabbag segue a linha de Dirley e não denomina esse tópico de “exceções ao princípio da irretroatividade”, mas sim “leis produtoras de efeitos jurídicos pretéritos”, pois entende que as duas hipóteses existentes não são propriamente exceções, pois vigem para trás por sua natureza jurídica.
ESAF: “A CF não prevê exceção alguma ao princípio da irretroatividade”. CORRETO (a questão fazia menção aos artigos 150 a 152 da CF).
CESPE: “O princípio da irretroatividade da lei tributária não é incompatível com a existência de leis tributárias que produzam efeitos jurídicos sobre atos pretéritos. CORRETO.
I. Lei expressamente interpretativa
É a lei que vem retirar os pontos obscuros da norma pretérita, fruto
de interpretação autêntica/legal/legislativa (interpretação emanada do
mesmo órgão responsável pela elaboração da norma interpretada)11.
É a lei que tem por objetivo interpretar o dispositivo de uma outra lei
ou de uma outra norma, sem introduzir novos comandos, novas
determinações no ordenamento12.
11 Quanto à fonte, a interpretação pode ser classificada em: a) administrativa; b) doutrinária; c) jurisprudencial; e d) autêntica.
12 Obs: muitos autores dizem que as leis interpretativas são um paradoxo, pois se alterarem algo, serão modificativas e, se não alterarem nada, perdem seu objeto. Na prática, Sabbag diz que, se utilizadas corretamente, podem ser importantes.
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Atenção: A pretexto de interpretar, a lei interpretativa não pode
impor uma penalidade, fazendo-a incidir sobre atos pretéritos. Assim, não
pode esta lei resultar na aplicação de penalidade à infração dos dispositivos
interpretados.Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;
QUESTÃO: A lei aplica-se a ato ou fato pretérito, em qualquer caso, quando seja interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados. Falso, pois só quando for EXPRESSAMENTE interpretativa.
A expressão “em qualquer caso” foi mal utilizada, pois significa
“apenas quando a lei for expressamente interpretativa”.
A existência dessas leis expressamente interpretativas é bastante
criticada pela doutrina, pois essa previsão é utilizada de forma inadequada
pelo Poder Legislativo, que diversas vezes edita leis modificativas
dizendo-as interpretativas, visando aplicá-las retroativamente.
Um exemplo clássico são os arts. 3º e 4º da LC 118/2005,
dispositivos questionados porque se entendeu que não eram expressamente
interpretativos.
LC 118/2005
O CTN, no seu art. 168, prevê que o direito de pleitear a restituição de tributos extingue-se com o decurso do prazo de 5 anos, contados da data da extinção do crédito tributário.
O STJ, interpretando o dispositivo, firmou jurisprudência no sentido de que a data da extinção do crédito tributário seria a data do pagamento, nos casos de lançamento de ofício ou por declaração e a data da homologação, nos lançamentos por homologação.
Na prática, o efeito era fazer com que, nos casos de lançamento por homologação, sendo esta tácita, o prazo para o pedido de restituição fosse de 10 anos, pois antes da homologação o pedido poderia ser feito, apesar da contagem do prazo de 5 anos não se ter iniciado (tese dos 5 + 5).
Em seu art. 3º, a LC 118 afirma que, para efeito de interpretação do CTN, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito
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a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1º do art. 150 da referida Lei.
Em razão do art. 4º da LC 118, a nova lei interpretativa poderia ser aplicada aos atos e fatos pretéritos. Conseqüência pretendida: todos os pedidos de restituição pendentes estariam sujeito ao novo prazo, de forma que os pedidos formulados há mais de 5 anos da data da ocorrência do FG seriam denegados.
O STJ, analisando, a matéria concluiu que a norma era modificativa e não interpretativa, dando eficácia prospectiva ao art. 3º da LC 118 de sorte a apenas permitir a sua incidência sobre situações que venham a ocorrer a partir da sua vigência.
Voto do Min. Rel. Albino Zavascki: “Assim, na hipótese em exame, com o advento da LC 118/2005, a prescrição, do ponto de vista prático, deve ser contada da seguinte forma: relativamente aos pagamento efetuados a partir da sua vigência “que ocorreu em 09.06.2005), o prazo para ação de repetição de indébito é de 5 anos a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de 5 anos a contar da vigência da lei nova.”
II. Lei mais benéfica quanto às INFRAÇÕES (multas) Revogação
de infração tributária e redução de penalidadeArt. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
II - tratando-se de ato não definitivamente julgado:
a) quando DEIXE DE DEFINI-LO COMO INFRAÇÃO;
b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo;
c) quando lhe comine PENALIDADE MENOS SEVERA que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática.
Há quem confunda “infrações” com “tributos”. Mas atenção, pois se
a lei diminui a alíquota do tributo, não incide sobre o fato gerador pretérito,
mesmo sendo mais benéfica. Assim, não existe possibilidade de retroação
para lei que diminui tributo (questão de CESPE).
GRAVAR: Em se tratando de regras materiais sobre tributos, a
legislação aplicada será sempre a vigente na data do fato gerador.
49
O inciso II ratifica diretriz do direito penal (art. 2º, parágrafo único
do CP) segundo a qual à lei deve retroagir para beneficiar o réu.Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.
Ocorre que este benefício (retroação da lei que reduz a penalidade ou
extingue a infração), diferentemente do que ocorre no campo penal,
depende de uma condição: “que o ato (relacionado com a infração ou com
a penalidade) não esteja definitivamente julgado”. Ou seja, este ato deve
estar em aberto .
Não terá benefício aquele que já pagou a multa (penalidade
tributária), sobrevindo lei mais benéfica, pois, neste caso, o ato não estará
em aberto, mas já concluído. Assim, enquanto perdurar a discussão
administrativa ou judicial, sobrevindo multa mais benéfica, esta retroagirá.
Segundo o STJ, enquanto não realizada a arrematação, adjudicação
ou remição (mesmo que encerrada a esfera administrativa, a ajuizada a EF,
efetivada a penhora, oferecidos e rejeitados EE), ainda que há julgamento
definitivo, sendo possível a aplicação de nova legislação mais benigna.
Alguns autores defendem não existir qualquer diferença entre as
hipóteses previstas nas alíneas “a” e “b”, pois deixar de tratar algo como
contrário a qualquer exigência de ação ou omissão seria o mesmo que
deixar de defini-lo como infração.
Entretanto, o fato de a alínea “b” exigir que o ato não seja
fraudulento e não tenha implicado falta de pagamento de tributo aponta no
sentido de que o dispositivo se refere exclusivamente às obrigações ditas
acessórias (que não têm conteúdo pecuniário), de formas que a alínea “a”
seria aplicável às infrações relativas às obrigações principais (com
conteúdo pecuniário).
A alínea “c” do inciso II, que tem sido exaustivamente cobrada em
concursos (em pegadinhas com trocadilhos), traz o mais típico caso de
50
retroatividade da lei tributária que define infrações ou comina penalidade,
qual seja quando “comine penalidade menos severa que a prevista na lei
vigente ao tempo da sua prática.”Ex: Quando ocorreu o fato gerador, em 2008, estava vigendo e incidindo a lei A, que previa a multa de 50% (desde 2007). Em 2009 foi editada uma nova lei B que diminuiu a multa para 10%. O auto de infração ocorreu em 2010. Qual a multa que deve ser aplicada? 10%, pois é de valor menor que o de 50%. Se a alteração fosse para aumentar a multa, seria mantida a aplicação da lei A.
DICA: Em todas as provas deve-se verificar o atendimento da condição “estar em aberto”. Prevalecerá o valor de 10% se, por exemplo, tiver ocorrido uma discussão administrativa ou judicial, indicando que o ato está em aberto (situação em que estará atendida a condição). Se já tiver decisão transitada em julgado, não será aplicada a lei B.
Sabbag aponta que já foi cobrada como verdadeira que “o princípio
da irretroatividade tributária vale tanto para tributo quanto para a
multa, exceto no caso das multas mais benéficas” (situações em que se
afasta o princípio e retroage a lei).
ATENÇÃO: Segundo Ricardo Alexandre, em concursos deve-se
seguir o entendimento segundo o qual a Constituição não prevê qualquer
exceção ao princípio da irretroatividade tributária.
Para o autor, com base em orientação da ESAF, este princípio não
possui qualquer exceção. Mesmo o art. 105 do CTN não traz exceções, já
que não gera a cobrança de tributos relativos a fatos geradores pretéritos,
mas simples aplicação retroativa de lei interpretativa. O que o art. 150, III,
“a”, proíbe é a cobrança de tributos em relação a fatos anteriores à lei.
QUESTÃO (CESPE): O princípio da irretroatividade da lei tributária não é incompatível com a existência de leis tributárias que produzam efeitos jurídicos sobre atos pretéritos. CERTO.
QUESTÃO (ESAF): Não há exceção ao princípio da irretroatividade tributária. CERTO!
5.3. Questões polêmicas
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I. Princípio da irretroatividade e o pagamento do Imposto de Renda
(Súmula 584/STF).
O fato gerador do imposto é complexivo: consiste num conjunto de
eventos que se prolongam no tempo, sendo considerados em sua totalidade.
A renda ocorre aos poucos, no decorrer do ano-base. Por previsão
legislativa, a declaração e o pagamento do IR somente serão realizados no
exercício seguinte (ano-calendário), mais especificamente em abril.
Exemplo prático: pode acontecer de, v.g., em outubro de 2008, ser
publicada uma lei que aumenta a alíquota do IR (lei publicada no ano do
fato gerador). Esta lei entrará em vigor em 01.01.2009 (princípio da
anterioridade). A questão é: essa norma será aplicada à declaração, a
ser realizada em abril/09, e que se refere ao ano-base de 2008?
Se a resposta for positiva, haverá aplicação retroativa da norma aos
fatos ocorridos em 2008. Tratando do tema, dispõe a Súmula 584/STF:
aplica-se a lei vigente no momento da entrega da declaração (havendo,
pois, retroatividade).Súmula 584 do STF - Ao imposto de renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração.
Essa Súmula é muito questionada, justamente porque foi editada
antes da CF/88. E veja: o STJ já firmou entendimento de que tal
enunciado é inaplicável, como se observa abaixo:RECURSO ESPECIAL N° 179.966 - RS (1998⁄0047631-8)
1. O fato gerador do Imposto de Renda identifica-se com a disponibilidade econômica ou jurídica do rendimento (CTN, art. 116). Inaplicabilidade da Súmula 584⁄STF, construída à luz de legislação anterior ao CTN.
3. A lei vigente após o fato gerador, para a imposição do tributo, não pode incidir sobre o mesmo, sob pena de malferir os princípios da anterioridade e irretroatividade.
Mas atente: embora o STJ não aplique a Súmula, o STF ainda não
afastou a sua incidência, questão pendente de julgamento no RE 183.130.
Deste modo, a despeito do entendimento do STJ, a Súmula ainda está em
vigor.
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Segundo Ricardo Alexandre, em concursos (CESPE e ESAF) tem
prevalecido o entendimento do STJ (inaplicabilidade da súmula), salvo se
a questão trouxer o texto expresso do enunciado.
CESPE: Se o Congresso Nacional aprovar lei instituindo o IR sobre os rendimentos dos Planos Garantidores de Benefícios Livres (PGBLs) e essa lei for publicada no Diário Oficial do dia 31/12/2001, o imposto incidirá sobre os fatos geradores ocorridos a partir do dia seguinte, 1º/1/2002. VERDADE.
II. Irretroatividade e CSLL
Como já visto, a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido)
excepciona a anterioridade do exercício, respeitando apenas a
anterioridade nonagesimal.
Com efeito, entende o STF que embora incida sobre o lucro líquido
anual, essa contribuição tem fato gerador a ocorrer no dia 31 de dezembro
de cada ano. Assim sendo, se uma lei majoradora da CSLL fosse
publicada até o dia 2 de outubro de 2008 (quando faltam 90 dias para o dia
31/12), poderia atingir os lucros percebidos desde o início do exercício. Tal
foi o entendimento do STF no AI-AgR-ED 333.209/PR, em 2007.
Esse entendimento parece violar a segurança jurídica. Apesar disso,
segundo o STF, não viola a irretroatividade. Isso porque:
Adotando-se a teoria do fato gerador complexivo, esse fato estaria
pendente até 31/12, sendo possível a aplicação da lei nova.
Não sendo adotada essa teoria, o fato gerador seria instantâneo, em
31/12, sendo possível aplicar a lei nova que lhe é anterior.CASO: O Presidente editou a MP 413, em 3 de janeiro de 2008, majorando a CSLL incidente sobre o lucro líquido auferido por pessoas jurídicas que atuam no setor financeiro. O art. 18, II da MP previu que o aumento produziria efeitos a partir do primeiro dia do 4º mês subseqüente ao da publicação em obediência ao prazo de 90 dias estatuído no art. 195, §6º da CF/88. Na prática, o contribuinte que apura a CSLL anualmente vai se sujeitar à majoração durante todo o exercício de 2008, inclusive os três meses iniciais. Entretanto, como o fato gerador do tributo é concluído no dia 31 de dezembro, a
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irretroatividade estará, nos termos da jurisprudência do STF, obedecida. A MP 413/08 está sendo discutida na ADI 4.003, mas ainda não houve decisão.
Mas atente: o STF já decidiu que lei que majora a CSLL após o dia 2
de outubro não pode majorar a CSLL apurada em 31/12 do ano em que foi
editada a lei, em respeito à anterioridade nonagesimal.
Passemos ao outro bloco de princípios, relacionados com o valor
justiça.
6. Princípio da não confiscabilidade (art.150, IV, CF)
Esse princípio é chamado também de não confiscatoriedade ou da
vedação do tributo com efeito de confisco ou princípio da razoabilidade ou
princípio da proporcionalidade da carga tributária.
Embora muitos chamem esse tributo de “princípio do não confisco”,
Sabbag ressalva que esse princípio não veda o tributo confiscatório
(proibição decorrente da própria definição de tributo, uma vez que
confisco, no Brasil, é punição e tributo, por definição, não pode ser sanção
por ato ilícito), mas o tributo com efeito de confisco. Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
IV - utilizar tributo com efeito de confisco;
6.1. Conceito e finalidade
Este princípio informa que os tributos não poderão ter caráter
confiscatório. Utilizar tributo com efeito de confisco é o mesmo que criar
um tributo tão gravoso/pesado que o contribuinte acabe por entregar
quase todo seu patrimônio ao fisco (expropriação). É gravame que
supera o limite do razoável, sendo abusivo. É também chamado de
princípio da razoabilidade ou proporcionalidade da carga tributária.
QUESTÃO (oral): O que é carga tributária?
Carga tributária é o volume de tributo que incide em determinado Estado. A carga tributária é analisada sempre de forma relacional,
54
pois é relacionada com o volume do produto do país: PIB. Nossa carga tributária representa mais de 40% do PIB. Significa que 40% do que o país produz equivale ao que as pessoas contribuem com tributo, e deveria voltar para elas com serviços públicos de qualidade.
Nossa carga tributária é excessiva, escorchante, diante da inexistência de “retribuição do Estado” com serviços de segurança, educação, saúde etc.
QUESTÃO: A carga tributária global, como um todo, no país, pode ser um mecanismo a ser utilizado pelo intérprete para aferir se o tributo tem efeitos confiscatórios? É um paradigma suficiente para identificar a ocorrência de confisco?
Segundo o STF, a aferição do confisco pode levar em conta a carga tributária em sua globalidade (ADI MC 2.010/DF de 1999).
Veda-se “qualquer pretensão governamental que possa conduz ir, no
campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, do
patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, comprometendo-lhes,
pela insuportabilidade da carga tributária, o exercício do direito a uma
existência digna, ou a prática de atividade profissional lícita ou, ainda, a
regular satisfação de suas necessidades vitais (educação, saúde e habitação,
por exemplo)” (STF, ADI 2.010).
Houve uma discussão no STF sobre a possibilidade de este princípio
ser analisado em controle abstrato de constitucionalidade. Veja: se a análise
do efeito confiscatório é casuística, então, em controle abstrato de
constitucionalidade, em tese, não se poderia analisar este princípio (a
análise é casuísta).
Mas atente: na ADI 2.010, decidiu o STF ser cabível, em sede de
controle normativo abstrato, a possibilidade de a corte examinar se
determinado tributo ofende ou não o princípio constitucional de
confiscatoriedade.
A TRIBUTAÇÃO CONFISCATÓRIA É VEDADA PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende cabível, em sede de controle normativo abstrato, a possibilidade de a Corte examinar se determinado tributo ofende, ou não, o princípio constitucional da não-confiscatoriedade consagrado no art. 150, IV, da Constituição. Precedente: ADI 1.075-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO (o Relator ficou vencido, no precedente mencionado, por entender que o exame do efeito
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confiscatório do tributo depende da apreciação individual de cada caso concreto). – [...] Resulta configurado o caráter confiscatório de determinado tributo, sempre que o efeito cumulativo - resultante das múltiplas incidências tributárias estabelecidas pela mesma entidade estatal - afetar, substancialmente, de maneira irrazoável, o patrimônio e/ou os rendimentos do contribuinte.
6.2. Configuração
O conceito de confisco é expresso em cláusula aberta ou conceito
jurídico indeterminado, cabendo ao prudente arbítrio do juiz, em cada caso
que lhe for submetido, avaliar a existência ou não de confisco.
Além disso, entende o STF que a análise do tributo não deve ser
feita de maneira isolada, mas também acrescida aos outros tributos
cobrados pelo mesmo ente.
No julgamento da ADI 2.010, entendeu o STF que o estabelecimento
de contribuição previdenciária dos servidores públicos federais em 25%
fere o não-confisco, pois, somado com os 27,5% do IR, implicavam na
entrega de quase 50% da renda do trabalhador à União.
A ESAF já entendeu que o contribuinte com renda líquida superior a
10 mil reais possui capacidade contributiva que justifica a tributação do
excedente a esses 10 mil com alíquota de 41%.
Obs: O tributo confiscatório não se confunde com a pena de
perdimento (plenamente aceitável)! Tributo não é sanção.
6.3. Multas e não-confisco
Pergunta-se: o princípio do não-confisco se aplica às multas
tributárias?
Na ADI 1.075, o STF decidiu que as multas não poderão ser
confiscatórias, reconhecendo a aplicação do princípio a estas. Entende o
Supremo que as multas tributárias devem ser proporcionais à ofensa
causada.
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Fixação de valores mínimos para multas pelo não-reconhecimento e sonegação de tributos estaduais. Violação ao inciso IV do art. 150 da Carta da República. A desproporção entre o desrespeito à norma tributária e sua conseqüência jurídica, a multa, evidencia o caráter confiscatório desta, atentando contra o patrimônio do contribuinte, em contrariedade ao mencionado dispositivo do texto Constitucional Federal – STF, Tribunal Pleno, ADI 155/RJ, Rel. Min. IImar Galvão, DJe 14/02/2003
CESPE: “Contra a imposição de multas por sonegação fiscal ou mesmo pelo não recolhimento do tributo, não se pode argumentar com a proibição constitucional de utilização de tributo com efeito de confisco, já que se tributo não se trata.” INCORRETA
6.4. Taxas e não-confisco
Ao contrário dos impostos, as taxas não se fundamentam
primordialmente na solidariedade social; não têm por fato gerador uma
manifestação de riqueza do contribuinte.
As taxas têm caráter contraprestacional e, por isso, a verificação da
existência ou não do caráter confiscatório é feita comparando-se o custo da
atividade com o valor cobrado a título de taxa.
6.5. Princípio da capacidade contributiva x Princípio do não confisco
Entendendo-se a capacidade contributiva como a capacidade
econômica/patrimonial de arcar com o pagamento do tributo (que os
ingleses chamam de ability to pay), o tributo confiscatório desafiará tal
princípio da seguinte maneira:
Ação AQUÉM da capacidade contributiva – Quando o tributo
atingir o mínimo existencial da pessoa (campo blindado),
agredindo o hipossuficiente (art. 7º, IV da CF), terá feição
confiscatória.
Se o tributo incidir sobre o campo mínimo existencial do indivíduo,
pode ser afastado por ter feição confiscatória, o que se fundamenta
na relação entre o princípio do não confisco com o princípio da
capacidade contributiva.57
Ação ALÉM da capacidade contributiva – Quando o tributo ferir o
direito de propriedade ao se manifestar com alíquotas predatórias,
será confiscatório.
Assim, é possível utilizar o princípio do não confisco para as multas
excessivas ou escorchantes, mesmo diante da constatação que tributo
não é multa. O STF corrobora essa tese, superando o entrave do art.
3º do CTN, em homenagem ao direito de propriedade que está
garantido no art. 5º, caput e inciso XXII da CF, sem deixar de lado
os necessários efeitos da razoabilidade e proporcionalidade na
tributação (ADI 1.075/DF de 1988).
Esse raciocínio é muito bom para sentença!!!
6.6. Perspectiva dinâmica e estática da tributação do patrimônio
A tributação do patrimônio pode ser analisada sob as perspectivas
estática e dinâmica.
Na perspectiva estática, analisa-se a tributação do patrimônio em si
mesmo, não havendo preocupação em se aferir potenciais mutações que
acresçam valor do bem tributado.
Na perspectiva dinâmica, levam-se em consideração as potenciais
mutações que constituam acréscimos patrimoniais, como é o caso do
rendimento produzido por imóvel (aluguel).
Perceba-se que a propriedade estaticamente considerada é um fato
perene, que se protrai no tempo. Assim, somente por ficção é que se afirma
que a cada dia 1º de janeiro ocorre novo fato do IPTU. Como o fato é único
e a riqueza tributada não é renovável, a repetição ano a ano da cobrança
resultaria em confisco, pois, a cada incidência, parcela da riqueza do
contribuinte estaria sendo entregue ao Estado, num lento (às vezes nem
tanto) processo confiscatório. Não obstante este raciocínio, a mesma CF
que proíbe a existência de tributo com efeito confiscatório expressamente
autoriza a tributação do patrimônio, deixando entrever que não só o aspecto
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estático deve ser lavado em consideração para que se configure vedado
efeito confiscatório.
Para solucionar o aparente conflito, parte da doutrina propõe que se
leve em consideração a riqueza que o bem tributado é capaz de gerar.ESAF:
“Os impostos sobre o patrimônio podem ser confiscatórios, quando considerados em sua perspectiva estática”. CORRETO
“O imposto de transmissão causa mortis, na sua perspectiva dinâmica, pode ser confiscatório.” CORRETO
A primeira assertiva foi considerada correta provavelmente seguindo o raciocínio detalhado acima. A segunda assertiva também o foi, diante do entendimento de que a transmissão da propriedade imobiliária não é riqueza renovável, de forma que, mesmo sob uma perspectiva dinâmica, haveria confisco.
6.7. Pena de perdimento x Confisco
O tributo, como visto, não é sanção por ato ilícito. Já a pena de
perdimento, como a própria designação demonstra, tem caráter punitivo.
Nada impede, portanto, que, em casos de comprovação de graves
infrações tributárias, a legislação específica preveja como punição o
perdimento de bens.
7. Princípio da liberdade de tráfegoArt. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;
O objetivo do legislador constituinte foi evitar que os entes políticos
criassem tributos (normalmente taxas) incidentes sobre a passagem de
pessoas e bens em seus territórios, ferindo o direito que possuem as pessoas
de se locomover livremente no território nacional de posse dos seus bens
(art. 5º, XV da CF).
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A regra possui exceções. A primeira é a possibilidade de cobrança de
ICMS estadual. Como essa cobrança tem fundamento constitucional, é
plenamente válida, não havendo que se discutir a sua legitimidade.
No que se refere ao pedágio, a questão é bastante controversa,
principalmente com relação a sua natureza jurídica (tributária ou não). Por
uma questão de lógica, se CF afirmou que sobre determinada situação não
se pode instituir tributos, ressalvada a cobrança de pedágio, é porque, para
o legislador constituinte, o pedágio é tributo (natureza de taxa, segundo
STF).
Atente-se para o fato de que o pedágio considerado como tributo, nos
termos constitucionais, é apenas aquele cobrado pelo Poder Público pela
utilização das vias por ele conservadas.
Atualmente, entretanto, o pedágio tem sido cobrado por particulares
em regime de concessão, permissão e autorização. O regime inerente a tais
formas de delegação a entidade de direito privado é o contratual. Também
terá natureza contratual o pedágio cobrado, que, em tais casos terá a
natureza de preço público ou tarifa (aqui as expressões são utilizadas como
sinônimas).
8. Vedações específicas à União – a proteção ao pacto federativo
A CF/88 traz, em seu art. 151, 3 vedações voltadas à União:Art. 151. É vedado à União:
I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País;
II - tributar a renda das obrigações da dívida pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como a remuneração e os proventos dos respectivos agentes públicos, em níveis superiores aos que fixar para suas obrigações e para seus agentes;
III - instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.
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São regras protegidas por cláusula pétrea, em virtude de se
configurarem como verdadeiras garantias da Federação.
8.1. Princípio da uniformidade geográfica
Previsão: art. 151, I da CF.
O STF entende que a concessão de isenção se funda em juízo de
conveniência e oportunidade de que gozam as autoridades públicas na
implementação de suas políticas fiscais e econômicas. Portanto, não cabe
ao Judiciário, que não pode substituir o legislador, estender a isenção a
contribuintes não contemplados pela lei, a título de isonomia (STF, RE
344311/PR).
8.2. Vedação à utilização do IR como instrumento de concorrência
desleal – princípio da uniformidade da tributação da renda
A restrição é aplicável exclusivamente ao imposto sobre a renda:
É vedado à União tributar os rendimentos gerados pelos títulos
estaduais e municipais de maneira mais gravosa que aqueles gerados
pelos títulos que ela mesma emite.
É vedado à União tributar os rendimentos dos servidores estaduais e
municipais de maneira mais gravosa do que aquela estipulada para os
servidores públicos federais.
8.3. Vedação às isenções heterônomas
A regra é a de que as isenções sejam autônomas/autonômicas, já que
derivam diretamente do poder de tributar (novidade da CF de 1988).AFRF: “Com o advento da Constituição de 1988, a concessão de isenção heterotópica passou a ser proibida.” CORRETO em relação à novidade trazida pela CF de 1988, mas deveria ter sido anulado porque existem exceções a essa regra.
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Assim, não pode a União instituir isenções de tributos que não sejam
da sua competência (por simetria, também não poderá o Estado instituir
isenção de tributo municipal). Atente às exceções:
i. Art. 155, §2º, XII, “e” Permite que a União conceda, por meio de
lei complementar, isenção heterônoma do ICMS incidente nas
operações com serviços e produtos destinados ao exterior. Esta
disposição é inútil, já que a EC n. 42/2003 passou a prever que o
ICMS não incide sobre operações que destinem mercadorias ao
exterior (mas a norma não foi revogada, devendo seguir o seu texto
nas provas objetivas).
ii. Art. 156, §3º, II A União pode conceder, também por lei
complementar, isenção heterônoma do ISS, da competência dos
Municípios, nas exportações de serviços para o exterior.
iii. Possibilidade de tratados internacionais concederem isenções
heterônomas. Esta exceção, muito cobrada em provas, não possui
previsão expressa. Com efeito, na ADI 1600, entendeu o STF que
quando a União se apresenta na ordem externa, atua em nome da
República. Logo, a concessão de isenção via tratado não se sujeita
á vedação à concessão de isenção autônoma.
Os casos concretos mais relevantes se referem ao Acordo Geral
Sobre Tarifas e Comércio – GATT –, tratado internacional multilateral do
qual o Brasil faz parte, que, ao prever a equivalência de tratamento entre o
produto importado, quando este ingressa no território nacional, e o produto
similar nacional (regra do tratamento nacional), acaba por estender àquele
isenções eventualmente concedidas a estes.ESAF: “A União não pode criar situações de isenção ao ICMS, por via indireta, ou seja, por meio de tratado ou convenção internacional que garanta ao produto estrangeiro a mesma tributação do similar nacional”. INCORRETA.
9. Princípio da não discriminação baseada em procedência ou destino
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Por este princípio, não é lícito a um Estado, DF ou Município criar
adicionais, redutores ou quaisquer outras diferenças de tratamento tomando
por base a procedência ou o destino da mercadoria.Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino.
Relembre-se que a União – e somente ela – está autorizada a
estipular tratamento tributário diferenciado entre os Estados da federação
tendo por meta diminuir as desigualdades socioeconômicas. Mas atente:
A vedação constitucional só se aplica no âmbito interno, não
impedindo o tratamento diferenciado quando o bem é procedente do
exterior.
Contudo, não podem os Estados, por exemplo, estabelecer alíquotas
mais elevadas de IPVA para veículos importados. Essa proibição tem
sede constitucional, e é ratificada pela cláusula do tratamento
nacional, que prevê a equivalência de tratamento entre o produto
importando, quando este integra o território nacional, e o produto
similar nacional.
10. Exigência de lei específica para a concessão de benefícios fiscais
O gestor público administra o patrimônio de outrem, não podendo
praticar atos de que resultem impactos negativos sobre tal patrimônio sem a
autorização do verdadeiro titular das disponibilidades, o povo.
O crédito tributário é parte do patrimônio público. Os benefícios
fiscais ora extinguem (remissão), ora excluem (isenção, anistia), ora
diminuem (redução de BC, concessão de crédito presumido) o crédito
tributário.
Como conseqüência, não é possível a concessão de benefícios fiscais
por intermédio de qualquer ato infralegal sem eu haja previsão em lei
regularmente editada pelo parlamento respectivo. Frise-se, porém, que,
apesar de a matéria se referir a uma limitação constitucional ao poder de
tributar, a norma isentiva, por não estar regulando tal limitação, mas sim
63
excluindo a tributação, poderá ser uma lei ordinária, salvo nos casos em
que o próprio tributo isentado só possa ser criado por lei complementar.§ 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
O motivo da exigência de especificidade da lei é evitar a prática de
esconder benefícios fiscais dentro de leis que tratam de matéria totalmente
diversas da tributária. Assim, não se deve dar a essa norma interpretação
tão restritiva a ponto de considerar inconstitucional a concessão de um
benefício fiscal por uma lei que não trata exclusivamente de matéria
tributária, já que a finalidade da norma é impedir a inserção de benefícios
fiscais em leis de conteúdo totalmente alheio àquele relativo ao benefício.
Outro ponto relevante, também consagrado pelo STF, é a
impossibilidade do Poder Judiciário, invocando o princípio da isonomia,
substituir o juízo discricionário do legislador e estender a outras pessoas
benefícios fiscais que a lei só destinou expressamente a determinada
categoria de contribuintes.
“SEM PREJUÍZO DO DISPOSTO NO ART. 155, § 2.º, XII, G”
O art. 155, § 2º, XII, g da CF exige que a concessão de benefícios
fiscais de ICMS seja precedida de deliberação conjunta dos Estados e do
DF, conforme regulado em LC.
Atualmente, dessa deliberação toma a forma de convênio celebrado
no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ.
A concessão de benefícios fiscais relativos ao ICMS dependerá
sempre de decisão unânime dos Estados representados; a sua revogação
total ou parcial dependerá de aprovação de 4/5, pelo menos, dos
representantes presentes.
Dentro de 10 dias, contados da data final da reunião em que o
64
convênio foi firmado, a resolução nela adotada será publicada no Diário
Oficial da União. Após esse prazo, o Poder Executivo de cada unidade da
Federação disporá de 15 dias para publicar decreto ratificando ou não os
convênios celebrados, considerando-se ratificação tácita dos convênios a
falta de manifestação no prazo assinalado. Tais regras também se aplicam
às Unidades da Federação cujos representantes não tenham comparecido à
reunião em que hajam sido celebrados convênios.
A não ratificação pelo Poder Executivo de todas as Unidades da
Federação (no caso de concessão de benefício) ou de, no mínimo, 4/5 das
Unidades da Federação (no caso de revogação) implica rejeição do
convênio firmado.
Até 10 dias depois de findo o prazo de ratificação dos convênios,
deve ser publicada no Diário Oficial da União a informação relativa à
ratificação ou à rejeição. Os convênios entrarão em vigor no 30º dia após
tal publicação, salvo disposição em contrário, vinculando, a partir daí,
todas as Unidades da Federação, inclusive as que, regularmente
convocadas, não se tenham feito representar na reunião em que o ato foi
celebrado.
Obs; esse procedimento para concessão de benefício fiscal apenas é
admitido para o ICMS.
Algumas observações13:
O direito tributário está previsto, basicamente, em dois diplomas: CF e CTN. Na
CF/88, temos o sistema tributário nacional; ao passo que no CTN, temos as
normas gerais de direitos tributário, aplicáveis à União, Estados, DF e
Municípios.
O sistema tributário nacional é dividido em dois blocos:
PRINCÍPIOS, segundo os quais a tributação deve ser realizada. Do
ponto de vista formal, tais princípios informam como e em quais
13 Parte introdutória do caderno de Ju65
condições os tributos podem ser criados. Obs: a CF estatui as principais
limitações ao exercício da competência tributária, mas não
necessariamente todas. Assim, é lídimo afirmar que as garantias
estatuídas formam um rol não-exaustivo14.
Alguns princípios já foram associados, pelo STF, a direitos e garantias
individuais (princípio da anterioridade tributária, v.g.), o que lhes dá o timbre de
núcleo imodificável na CF (art. 60, §4º, IV, CF).
É preciso entender que a relação jurídico-tributária não é meramente
uma relação de poder15, pois, como toda relação jurídica, é balizada pelo
direito e, como tal, possui diretrizes e limitações traçadas pelo legislador
constituinte.
COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA: como o poder de tributar pode ser
exercido, sob o ponto de vista material (quem pode criar o quê. Ex.: o
que o Estado pode criar em termos de tributo).
Os princípios constitucionais tributários estão na CF para realizar dois
valores:
Certeza na tributação Princípios que querem garantir a segurança
jurídica do contribuinte. São eles:
i. Legalidade;
ii. Anterioridade da lei tributária;
iii. Irretroatividade da lei tributária.
Justiça na tributação Princípios que buscam a justiça fiscal (a
tributação deve ser justa). São eles:
i. Isonomia;
14 CESPE: “boa parte das limitações ao poder de tributar está no capítulo que regula o Sistema Tributário Nacional, mas nem todas”. CERTO
15 CESPE: “o poder de tributar decorre de uma relação de poder e não de uma relação jurídica” ERRADO.
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ii. Capacidade contributiva;
iii. Não-confisco;
iv. Não-cumulatividade (ICMS, IPI e algumas contribuições
previdenciárias).
Boa parte das limitações constitucionais ao poder de tributar está
protegida contra mudanças que lhe diminuam o alcance ou a amplitude, por
configurarem verdadeiras garantias individuais do contribuinte.
Nesta linha, quando a EC n. 3/93 tentou autorizar a criação do Imposto
Provisório sobre a Movimentação Financeira (que deu origem à CPMF, hoje
extinta), excluindo-o da regra da anterioridade, o STF entendeu que a emenda
era inconstitucional (ADI 939-2). Pergunta-se: qual a justificativa do STF, já que
este princípio possui exceções na CF?
O Tribunal não acatou o argumento de que a Emenda será constitucional
por apenas criar uma nova exceção a uma regra que já possui várias. Veja:
entendeu-se que a criação de novas exceções a uma regra existente tende a
abolir a própria regra, que está protegida por cláusula pétrea.
Mas atente: por óbvio, as emendas que ampliarem garantias individuais
do contribuinte são válidas. Aquelas que diminuírem, criarem exceções ou de
qualquer forma enfraquecerem tais garantias é que são inconstitucionais.
O STF também considerou cláusula pétrea, além da anterioridade, o
princípio da imunidade tributária recíproca e de outras imunidades, como a de
templos e a dos livros, jornais e periódicos (também a proteção a diversas
instituições cujas atividades são consectários de outras garantias
constitucionalmente protegidas como a liberdade sindical, a liberdade de criação
e filiação a partidos políticos etc).
Obs: alguns autores modernos consideram boa parte dos princípios
constitucionais tributários como regras, visto que são disjuntivos (aplicando-se
ou não a cada caso concreto, sem qualquer ponderação). Nesse sentido, p. ex., a
regra da anterioridade e a da irretroatividade. Diferentemente da anterioridade, a
isonomia é um verdadeiro princípio, vez que admite ponderação no caso
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concreto. Os concursos, contudo, não tocam neste ponto.
CESPE: A relação jurídica tributária envolve parcela de soberania do Estado sobre o indivíduo, mas não pode corretamente considerada apenas como relação de poder, porquanto é também relação jurídica, em que as normas jurídicas refreiam a ação do poder estatal. CORRETO.
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