IX SEMINÁRIO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS “HISTÓRIA, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO NO BRASIL”
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EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS: CONSTRUINDO O SUJEITO DE DIREITOS NAS SALAS DE EJA (2011)
Flávia Tavares Gomes
[email protected] Auristela Rodrigues dos Santos
Ana Danielly Leite Batista Priscylla do Nascimento Silva
Rita de Cássia da Costa Mamedio Maria Elizete Guimarães Carvalho
(UFPB)
Resumo O atual trabalho apresenta as experiências vivenciadas no Projeto “Educação em Direitos Humanos: Construindo o Sujeito de Direitos nas Salas de EJA”, PROLICEN/UFPB, no decorrer do ano letivo de 2011, nas escolas campo de extensão: Escola Municipal Ministro José Américo de Almeida e Escola Municipal Senador Ruy Carneiro, ambas situadas em João Pessoa/PB, discutindo os processos educativos em Educação em/para os Direitos Humanos (EDH) vivenciados com alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Constituiu‐se objeto de estudo desse projeto a educação em direitos humanos como ferramenta necessária a futuros professores, para que pudessem atuar na construção de sujeitos de direitos, na formação de sujeitos autônomos frente às injustiças e desigualdades. Tal objeto foi investigado numa abordagem histórico‐reflexiva e prática, enfatizando‐se a necessidade de fortalecimento dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, construindo‐se um compromisso com a paz, com a justiça e com a cidadania. A EDH situou‐se como instrumento facilitador do processo de formação cidadã do sujeito de direitos. Tendo como metodologia os círculos de diálogo, fundamentados nos círculos de cultura freireanos, os relatos das violações de direitos sofridas pelos próprios alunos tornaram‐se temas geradores desses círculos, trabalhados a partir de documentos legais, internacionais e nacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), a Lei Maria da Penha (Lei n° 11.370), entre outros. Foi necessária a observação do contexto de atuação, tendo em vista o desenvolvimento de uma metodologia ativa, interativa e participativa, o estabelecimento de processos que articularam teoria e prática e que contribuiram para a compreensão da realidade. Diante disso, o projeto foi realizado durante os meses de maio a dezembro de 2011 e colaborou para o fortalecimento da condição de sujeito de direitos dos alunos jovens e adultos, favorecendo a prática da cidadania na medida em que o acesso ao conhecimento dos seus direitos e deveres funcionou como subsídios para o enfrentamento das violações. Trabalhamos com fontes bibliográficas, fundamentando‐se nas ideias dos seguintes autores: Carbonari (2007), Comparato (2007), Sacavino (2007). O projeto favoreceu a sensibilização e a criticidade dos alunos jovens e adultos, proporcionando‐lhes o acesso ao conhecimento de seus direitos e deveres, contribuindo para que se apropriassem de informações necessárias ao combate às violações aos direitos humanos. Palavras‐chave: Educação em Direitos Humanos. Sujeito de direitos. Círculos de diálogo. Introdução
O projeto Educação em Direitos Humanos: construindo o sujeito de direitos nas salas de
EJA, PROLICEN/UFPB, desenvolvido em 2011, teve por objetivo promover métodos educativos
orientados pela Educação em Direitos Humanos (EDH), tendo em vista a construção de uma
sociedade mais justa e consciente de seus direitos e deveres, considerando a característica
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fundamental dos Direitos Humanos de ser inerente a todas as pessoas, independente de etnia,
nacionalidade, cor, orientação sexual, religião e cultura.
O Projeto desenvolvido em duas escolas da rede pública de ensino da cidade de João
Pessoa/PB, Escola Municipal Ministro José Américo de Almeida e Escola Municipal de Ensino
Fundamental Senador Ruy Carneiro, com alunos e alunas da Educação de Jovens e Adultos (EJA),
especificamente nas turmas dos ciclos I e II, objetivou a reflexão e compreensão dos Direitos
Humanos, para que reconhecendo sua condição de sujeitos de direito, os educandos fossem
capazes de lutar por seus direitos.
Merece consideração a reflexão de que os discentes das salas de EJA tiveram o direito à
educação violado, pois na idade escolar não foram incluídos na escola, logo, tomando por base o
princípio da interdependência entre os Direitos Humanos, tal exclusão não foi apenas da
educação, mas também de todos os outros direitos. Como explica Benevides (2011, p. 06):
São indivisíveis e interdependentes porque à medida que são acrescentados ao rol dos direitos fundamentais da pessoa humana eles não podem mais ser fracionados, ou seja, você tem o direito até aqui, daqui pra frente é só para os homens, ou só para as mulheres, ou só para os ricos, ou só para os sábios etc.
Partindo deste pressuposto, compreendemos a importância de construir o sujeito de
direito nas salas de EJA, para que estes indivíduos, de acordo com Ihering (2002), sintam a
importância do direito como condição moral de sua existência. Para isso tivemos por estratégia
metodológica os ‘Círculos de Diálogo’, que em um processo de interatividade foi possibilitado um
trabalho reflexivo, numa perspectiva de emancipação. Compreendemos que a EDH fundamenta‐se
no desenvolvimento da consciência da dignidade da pessoa humana, promovendo mudanças de
atitudes e comportamentos. É como afirma Ihering (2002, p. 41):
No direito, o homem encontra e defende suas condições de subsistência moral; sem o direito, regride à condição animalesca, tanto que os romanos, numa coerência perfeita, colocavam os escravos no mesmo nível dos animais, do ponto de vista do direito abstrato. Portanto, a defesa do direito é um dever de autoconservação moral; o abandono total do direito, hoje impossível, mas que já foi admitido, representa o suicídio moral.
Com essa visão, fizemos a coleta dos temas/situações geradores, ou seja, buscamos
informações referentes às experiências de negligência e/ou ausência de direitos vivenciadas pelos
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próprios alunos, para que estes pudessem a partir de um conhecimento das leis reivindicarem o
que lhes foi negado. Dentre os temas levantados tivemos: os Direitos da pessoa Idosa que foi
motivado por relatos de exclusão e exploração sofridos por idosos de convívio próximo dos alunos,
como vizinhos e pela presença de alguns alunos em idade próxima dessa fase; a Previdência Social
expressa no interesse dos alunos em conhecer sobre o direito à aposentadoria; a violência contra
a mulher, que foi outra temática considerada de extrema relevância tendo em vista a presença
quase maciça das mulheres nas turmas da EJA; outro tema evidenciado durante a coleta e
abordado no decorrer do projeto foi a Lei da Empregada Doméstica.
A metodologia do Projeto foi norteada por aspectos da pedagogia freireana, que pretende
uma educação libertadora, promovendo pelo diálogo a consciência crítica do indivíduo.
Observando este aspecto de diálogo e enfrentamento pela conquista dos direitos, as
temáticas do projeto foram debatidas em ‘Círculos de Diálogo’ que foram realizados no decorrer
das atividades nas duas escolas campo de extensão. Nestes espaços, os alunos puderam expor e
esclarecer suas dúvidas e pela Educação em/para os Direitos Humanos tornaram‐se aptos para um
posicionamento frente à negação dos seus direitos. Salientando que tal posicionamento é o
instrumento principal de efetivação das leis existentes, pois a luta e o direito são intimamente
ligados. Tornando‐se conhecedores, os alunos da EJA fortalecem‐se no combate a violações de
seus direitos, passando a exercer sua dignidade enquanto cidadão.
A EJA e a Educação em Direitos Humanos
Compreender a educação vai além do que meramente pensar nos aspectos cognitivos, é
preciso voltar o olhar para aqueles que fazem a educação, os sujeitos envolvidos no ato educativo,
educador, educando e sociedade. Muito se fala que é através da educação que mudaremos o
mundo, no entanto nada muda se nós, enquanto sujeitos ativos e partícipes da sociedade,
comprometidos com a educação não contribuirmos para essas mudanças.
O ser humano é um ser inacabado que está em constante transformação, que se constrói
nas relações com o outro e com o meio, e mesmo sendo influenciado por estas relações ainda
consegue ser singular em sua maneira de ser histórico, capaz de construir e mudar a história.
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Igualmente, os direitos também são frutos de construções históricas, pois foram surgindo a partir
das necessidades de cada época. O importante é compreender que o ser humano pode ou não se
constituir em sujeito de direitos e isso dependerá da qualidade de suas relações, bem como de sua
relação com a educação. Nesta perspectiva a educação em e para os direitos humanos se
apresenta como uma ferramenta importante para a formação do sujeito de direitos.
Destarte, se faz necessário refletir sobre que modelo de sociedade almejamos, pois é o
sujeito formado a partir dessas relações que irá atuar na sociedade, daí a necessidade de construir
um sujeito crítico e partícipe, capaz de intervir, questionar, problematizar e lutar por uma
sociedade mais justa, um sujeito consciente de seu papel, não como um mero reprodutor, mas
como um questionador.
Nesse sentido, percebemos que o público da EJA por muito tempo não teve acesso a uma
educação de qualidade e, quando sim, era uma educação voltada, exclusivamente, para a
alfabetização, não como um processo de ler, escrever e interpretar, mas com finalidade explícita
de aprendizagem da grafia do nome para a votação direcionada em eleições.
Se refletirmos sobre a violação aos Direitos Humanos, e em particular, a violação ao
direito à educação de jovens e adultos, perceberemos que eles tiveram este direito negado, pois
não tiveram acesso à educação em idade escolar. Tal violação aos direitos produz vítimas, são
vítimas sociais, excluídas não apenas do direito à educação, mas também do direito à saúde, à
segurança, ao trabalho, ao lazer, à assistência, entre outros. Esta violação deve ser compreendida
a partir da própria natureza dos direitos humanos, naturais, universais, históricos, indivisíveis e
interdependentes, logo, quando um direito é violado, os demais também o são.
Assim, partindo da concepção dos próprios Direitos Humanos, os educandos da EJA são
vítimas, tendo em vista que “à luz dos direitos humanos, vítima é um ser de dignidade e direitos
cuja realização é negada (no todo ou em parte). É, portanto, agente (ativo) que sofre
(passivamente) violação.” (CARBONARI, 2007, p. 170)
Fazendo um resgate histórico sobre a educação de jovens e adultos no cenário brasileiro,
veremos que a mesma sempre foi relegada a um plano secundário, principalmente no que se
refere às iniciativas políticas e legais. Desde o período colonial a educação brasileira foi
direcionada às crianças, filhos dos colonos, cabendo aos indígenas apenas a catequização, pois a
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Companhia de Jesus tinha a função de catequisar e alfabetizar na língua portuguesa os indígenas
que viviam na colônia portuguesa. Com a expulsão dos Jesuítas (1759), poucas mudanças
ocorreram em relação à EJA no período das reformas pombalinas, chegando ao Império sem
grandes transformações, restringindo‐se a educação à população mais abastada.
É nesse momento, a partir da Constituição de 1824, que se estabeleceu o “direito à
instrução primária e gratuita a todos os cidadãos”, no entanto esta determinação ficou apenas no
papel, ao mesmo tempo em que Carta Constitucional garantia o ensino elementar acabava por
restringir seu acesso, logo o público da EJA foi desprovido de tal direito, tendo em vista que não
havia condições de implantação de uma rede escolar específica. Durante a Primeira República, a
sociedade buscava a modernização, mas continuava presa a mesma estrutura colonial política,
social e econômica, pois apesar de neste período a educação ter passado por reformas a partir da
Constituição Republicana de 1891 e a emergência dos movimentos educacionais “entusiasmo
pela educação” e “otimismo pedagógico”, ainda assim a educação continuava a atender aos
interesses das elites dominantes, sendo feito quase nada pela educação de jovens e adultos.
Como percebemos a escolarização de jovens e adultos no Brasil nunca foi prioridade, É só
no final dos anos 1940 que são implementadas as primeiras políticas públicas voltadas para a
educação escolar de adultos, pois foi neste período que se começou a detectar altos índices de
analfabetismo no país surgindo, assim, campanhas de alfabetização por todo o território nacional.
Em 1945, com o final da ditadura de Vargas, iniciou‐se um movimento de fortalecimento
dos princípios democráticos no país. Com a criação da UNESCO (Organização das Nações Unidas
para a Educação, Ciência e Cultura), ocorreu, então, por parte desta, a solicitação aos países
integrantes (e entre eles, o Brasil) de se educar os adultos analfabetos. Devido a isso, em 1947, o
governo lançou a 1ª Campanha de Educação de Adultos. Nessa época, o analfabetismo era visto
como causa (e não como efeito) do baixo desenvolvimento brasileiro.
Já no início dos anos 1960, movimentos de educação e cultura popular desenvolveram
experiências de alfabetização de adultos que contribuíram para a mudança das iniciativas públicas
de educação de adultos, tendo em vista que a mesma era uma educação voltada para o caráter
humano de conscientização, de analisar criticamente a realidade e de intervir para transformar a
sociedade. Uma nova visão sobre o problema do analfabetismo foi surgindo, junto à consolidação
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de uma nova pedagogia de alfabetização de adultos, que tinha como principal referência Paulo
Freire. O analfabetismo, que antes era apontado como causa da pobreza e da marginalização,
passou a ser, então, interpretado como efeito de uma sociedade injusta e não igualitária. Mas,
estes movimentos foram interrompidos pelo Golpe Militar de 1964, surgindo alguns anos mais
tarde, pelo regime militar, com diretrizes contrárias, o Movimento Brasileiro de Alfabetização ‐
MOBRAL, que tinha um caráter político‐social.
Posteriormente com a lei 5.692/1971 o ensino supletivo foi regulamentado, tendo a
função de suprir a escolaridade não realizada na infância e na adolescência. O referido ensino não
incorporou as contribuições dos movimentos do início da década de 60, pois o ensino supletivo
era voltado para a formação profissional, aderindo aos preceitos tecnicistas de industrialização da
aprendizagem, era uma instrução programada com o objetivo de atender o maior número de
alunos à curto prazo. Mesmo com o surgimento de novas experiências em educação de jovens e
adultos, o ensino supletivo continuou bem presente nesta modalidade educativa, principalmente
por conta da escassez de recursos financeiros (CARVALHO, 2011).
Com o fim do regime militar, é proclamada Constituição de 1988, signatária da Declaração
Universal dos Direitos Humanos, emergindo os ideais democráticos, evidenciando os direitos
sociais do cidadão, como trabalho, saúde, educação, entre outros, frutos do Estado Democrático
de Direito. Dentre esses direitos encontra‐se explicitado os direitos dos que não se escolarizaram
na idade tida como correta, como pode‐se perceber no inciso I, artigo 208 da Constituição,
assegurando o Ensino Fundamental obrigatório, “assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para
todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria”.
Assim, o direito à educação foi se estruturando mediante avanços e retrocessos, mas
ainda há um longo caminho a percorrer para que as taxas de analfabetismo e evasão que ainda
fazem parte da realidade da educação brasileira, especialmente das salas de EJA, sejam superadas,
bem como o reconhecimento e a valorização desta modalidade de ensino já que ainda não é
considerada como Educação Básica. Sendo considerada modalidade de ensino, a EJA fica
desprovida de alguns privilégios e direitos, garantidos pelo art. XXVI da Declaração Universal dos
Direitos Humanos:
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Todo homem tem direito à Educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução técnico‐profissional será generalizada; o acesso aos estudos superiores será igual para todos, em função dos méritos respectivos. (COMPARATO, 2007, p. 236).
A educação de jovens e adultos é um direito de cidadania, um direito que assegura a jovens
e adultos a permanência no sistema de ensino público e gratuito e a continuidade de estudos em
uma educação continuada ao longo da vida (V CONFINTEA, 1997). De acordo com a LDB/1996, em
seu art. 37: “A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou
continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria.”
No entanto, esta educação dependerá de um processo educacional que permita a jovens
e adultos desenvolverem a consciência, com conhecimentos, com valores, com capacidade de
compreensão, e essa ressignificação do processo educativo vai muito além do que uma mera
educação formal, que norteia o ambiente escolar, caminha para uma visão de compreensão de
mundo, de si mesmo e do outro, no respeito as singularidades e diferenças de cada indivíduo.
(SADER, 2007)
Proporcionar uma Educação em Direitos Humanos (EDH) aos educandos da EJA é
primordial para a promoção de uma educação cidadã, fundamentada no respeito, na tolerância,
no reconhecimento da dignidade humana do outro, como alternativa de enfrentamento às
injustiças sociais sofridas por este público, numa perspectiva de transformação e defesa da
efetivação dos direitos, tendo na EDH uma prática mobilizadora que avança em direção à justiça e
correção de injustiças.
A Educação em Direitos Humanos é voltada para a construção do sujeito de direitos,
construído na alteridade, pela educação, percebendo que,
[...] o sujeito de direitos não é uma abstração formal. É uma construção relacional; é intersubjetividade que se constrói na presença do outro e tendo a alteridade como presença. A alteridadetem na diferença, na pluralidade, na participação, no reconhecimento seu conteúdo e sua forma. [...] a relação entre sujeitos tem a diferença como marca constitutiva e que se traduz em diversidade e pluralidade, elementos que não adjetivam a relação, mas que se constituem em substantividade mobilizadora e formadora do ser sujeito, do ser sujeito de direitos (CARBONARI, 2007, p. 177)
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Desta forma, a EDH busca instigar nos alunos a reflexão sobre seus direitos e deveres,
bem como o exercício de seu papel de cidadão consciente, fazendo‐se necessário compreender a
importância dos direitos humanos para a construção desta consciência crítica, pois o tema em
questão é essencial para a formação de uma cultura que respeite a dignidade do ser humano.
Esta dignidade não tem relação com o poder aquisitivo de cada indivíduo e nem com
status em que está inserido, mas sim pelo fato de ser humano. A EDH favorece aos alunos da EJA,
o exercício crítico da realidade e o desenvolvimento da capacidade de emancipação, fomentando
os princípios de igualdade e respeito à dignidade humana, tentando contribuir para superar as
dificuldades vividas por esse público.
Junto com esta reflexão, vincula‐se também a reflexão sobre os valores do ser humano,
sua liberdade, solidariedade, política, sexualidade, cultura, etc, tendo em vista a sua criticidade
para exercer a cidadania consciente e coerente, pois a Educação em e para os Direitos Humanos
deve ser compreendida como um intermédio para a humanização das pessoas, a solidariedade e a
paz.
Para tanto, torna‐se necessário contribuir para a construção de um sujeito de direitos, um
sujeito autônomo, emancipado, livre, consciente de seus direitos e deveres e de sua função na
sociedade, um sujeito que deve ser construido na alteridade, pela educação.
A alteridade tem na diferença, na pluralidade, na participação, no reconhecimento seu conteúdo e sua forma. [...] a relação entre sujeitos têm a diferença como marca constitutiva e que se traduz como diversidade e pluralidade, elementos que não adjetivam a relação, mas que se constituem em substantividades mobilizadoras e formatadora do ser sujeito, do ser sujeito de direitos. (CARBONARI, 2007, p. 177).
Nesta concepção, podemos perceber que as marcas históricas de “negação/ exclusão”
oportunizaram a fragilidade da cidadania dessa clientela educacional, sendo consideradas como
violência aos direitos humanos.
A Intervenção e os Círculos de Diálogo
Todos os futuros educadores devem ter como subsídio de sua atuação os fundamentos que
envolvem os direitos humanos e se fazer defensores de tais direitos, uma vez que os direitos
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humanos são considerados como princípio organizador fundamental para o exercício profissional.
Desta maneira, conhecer Documentos e Convenções que os abordem, e fazer uma reflexão sobre
eles são fatores de suma importância dentro deste contexto.
Desse modo, compreende‐se que uma pedagogia pautada na educação em direitos
humanos precisa de educadores sensíveis ao tema que percebam que este processo educativo é
contínuo, não é como ensinar uma matéria que será completada à medida que o conteúdo do
programa vai sendo entendido e avaliado pelos alunos, é uma educação permanente e global,
complexa e difícil, mas não impossível (BENEVIDES, 2007). Nesse sentido, essa educação requer
práticas pedagógicas que conduzam para a promoção, proteção, defesa e reparação da violação
ao direito à educação sofrida pelos alunos da EJA, de forma que a educação é compreendida como
um direito em si mesmo e um meio indispensável para o acesso a outros direitos.
A metodologia abordada nesse projeto contemplou a Educação em Direitos Humanos
como um subsídio para a construção do sujeito de direitos nas salas de Educação de Jovens e
Adultos (EJA), adequando‐se a uma prática pedagógica que permitiu um novo olhar, uma nova
análise da realidade, objetivando uma postura crítica perante ela. Logo, desenvolvemos nos
procedimentos metodológicos a relação entre teoria e prática, ou seja, uma metodologia ativa,
interativa e participativa.
A metodologia utilizada contemplou as discussões e reflexões resultantes de uma prática
pedagógica norteada por aspectos da pedagogia freireana, em que foi considerado o
levantamento de situações geradoras, os relatos das histórias de vida dos próprios alunos, o
diálogo e a conscientização, trabalhados em “Círculos de Diálogo”, realizados nas salas de aula
com os alunos jovens e adultos.
A produção de portfólios desenvolvidos pelas participantes do projeto, tendo como base os
Círculos de Diálogos, realizados nas escolas campo, permitiu um melhor entendimento de como
tal trabalho se deu de fato nas salas de EJA e de como tal experiência foi importante para esse
público. Além de possibilitar para o grupo que faz parte do projeto uma rica oportunidade
acadêmica na elaboração de trabalhos científicos.
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Figura 1 Figura 2
Tema: II Círculo de Diálogo na Escola Ruy Carneiro
Fonte: Arquivo PROLICEN/2011
Os Círculos de Diálogos proporcionaram a percepção que os alunos da EJA são jovens e
adultos muitas vezes conhecedores de seus direitos, mas que não sabem como garantir sua
efetivação, ou porque não tiveram acesso a informações importantes, de como e onde recorrer
nos momentos de necessidade, ou porque estão conformados com a situação na qual se
encontram, até porque assistem na televisão notícias de pessoas que passam anos lutando por
uma causa e no final não conseguem a justiça esperada.
Diante das falas e depoimentos dos alunos da EJA, percebemos que a construção do
sujeito de direitos é um trabalho lento e progressivo que requer força de vontade por parte
daqueles que buscam construir um espaço educativo que privilegie a conscientização e a formação
desses sujeitos.
Nesse contexto, compreendemos que é possível modificar situações estabelecidas,
contribuindo a educação para possibilidades de compreensão e intervenção na realidade.
Percebemos que os jovens e adultos participantes dos círculos compreenderam a importância do
trabalho desenvolvido, como uma troca de experiências e de aprendizado, como afirmou um
aluno: “Essa troca de informações é muito importante para que a gente aprenda. Nós aprendemos
com vocês e vocês aprendem com a gente.” Logo, percebemos que Educar em Diretos Humanos é
cooperar com a construção de um sujeito consciente, capaz de considerar‐se enquanto sujeito
ativo e partícipe da sociedade.
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Considerações Finais
Considerando a Educação em Direitos Humanos (EDH) como um instrumento que
possibilita a construção de sujeitos de direitos, podemos destacar a importância do referido
projeto: “Educação em Direitos Humanos: construindo o sujeito de direitos nas salas de EJA”,
desenvolvido nas salas de Educação de Jovens e Adultos (EJA) e que contribuiu para o
desenvolvimento da consciência cidadã, promovendo processos educativos através dos Círculos
de Diálogo, realizados nas escolas‐campo de extensão.
A sociedade atual configura‐se como desafiadora em garantir a todos os direitos humanos,
visto que consecutivamente tais direitos são desrespeitados, como consequência, muitas vezes, do
desconhecimento, o que se configura como impedimento para sua concretização. Partindo do
pressuposto da necessidade em construir sujeitos de direitos, que atuem na sociedade de maneira
que exercite a plena cidadania, o projeto possibilitou nas salas da EJA a promoção de espaços de
aprendizagem como exercício da reflexão e atuação frente as muitas situações de violação de
direitos, tentando construir nas salas da EJA sujeitos que discutam sobre seus direitos e deveres,
educando‐os para a compreensão de sua efetivação.
Entendemos que a constituição de sujeitos de direitos nas salas da EJA supõe um trabalho
pedagógico preocupado com o contexto e realidade desses educandos, em busca de promover
uma prática educativa que diminua a violência aos Direitos Humanos, despertando a sociedade
para novas atitudes de respeito à pessoa humana. É nessa perspectiva, que o projeto teve o
compromisso de fortalecer o exercício da cidadania dos discentes da EJA, através da EDH,
propiciando a afirmação dos direitos humanos, conscientizando os alunos de sua responsabilidade
social na luta contra as injustiças, contribuindo para uma sociedade de paz, justiça e igualdade.
Referências
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BRASIL. Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, 2006. Brasília: UNESCO, 2006.
BRASIL. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos. 2007.
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CARVALHO, Maria Elizete G. (Org.). Direitos humanos e educação: estudos e experiências. João Pessoa: Editora da UFPB, 2009.
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CARVALHO, Maria Elizete G. (Org.). História, educação e direitos humanos. João Pessoa: Editora da UFPB, 2011.
COMPARATO, Fábio K. Afirmação histórica dos direitos humanos. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
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