“Morar no sítio é tudo pra mim, eu não agüento aquela agitação, aquele
barulho da rua, por isso trabalho na roça o ano todo e todo dia”, esse é um dos
sentimentos do agricultor experimentador Francisco Cassimiro
(Chiquinho), quando perguntado o que significa a vida no campo. O
agricultor mora na comunidade Santa Quitéria, localizada na Serra do
Comissário, cerca de 740 metros acima do nível do mar, no município de
Santa Cruz alto sertão da Paraíba.
Ao lado da família, sua mãe dona Maria Rodrigues, seu pai o senhor
Francisco Cassimiro, e do seu irmão Francinaldo Cassimiro, Chiquinho
desenvolve uma experiência importantíssima de convivência com o
semiárido. Através de sistemas integrados de plantio de leguminosas, palma
forrageira, técnicas de conservação da terra, raleamento da mata nativa, e a
caprinocultura, a família encontrou o bem viver, e o bem querer da vida no
campo.
É visível a alegria da família em receber a prosperidade que a natureza
dá quando é respeitada. Um pouco dessa história é narrada pelo próprio
agricultor neste informativo - Vivo plantando, experimentando, tenho quase
dois hectares de palma forrageira. Faço o ralei da caatinga porque preciso de
uma pastagem rasteira. As folhas que caem, os animais comem. Entre as
palmas planto o feijão gandu, o milho, feijão macassa, leucena e macaxeira.
Nesse processo eu sempre adubo a terra com o próprio esterco de criação,
faço o tipo devolução. Retiro em forma de ração e devolvo a terra em forma de
esterco, assim, a terra vai melhorando cada vez mais. Possuo cerca de
sessenta e cinco caprinos. A nossa criação vive em pasto cercado.
Quando 'escassia' a pastagem nativa, a gente coloca a palma e vai
alimentando os animais. O caprino em si, ele não é uma criação de
confinamento, se manter eles nesse sistema não se desenvolvem, tem que ser
uma época na pastagem e outro no confinamento. A minha opção em criar o
caprino é porque eles aproveitam bem à caatinga, e é um dos animais que eu
gosto de criar por que se adaptam facilmente na região.
O manejo da caatinga ajuda a esse tipo de animal a se desenvolver
melhor. Depois que eu comecei esse manejo de conservação da terra e das
matas, e do raleamento tem estimulado o surgimento das espécies, animais
nativos, os que antes desapareceram, voltam hoje ao seu ambiente natural
como o beija flor, rolinha branca, teiú e até onça. Na propriedade temos uma
grande variedade de plantas, são mais de trinta espécies: a canafístula do
besouro, louro, juazeiro, mororó, caatingueira, arapuá, piraque, burra leiteira,
aroeira, limãozinho, feijão bravo. Com a estiagem dos últimos dois anos, eu fui
Manejo da caatinga e plantio consorciado, uma experiência de resistência e saberes acumuladosAlternativa de renda e convivência para agricultor experimentador
Outubro 2013Santa Cruz - PB
Realização Patrocínio
atingido também, só que com uma diferença, devido o meu trabalho
com o plantio de palma desde 1998, consegui agora vender entre fevereiro e
março de 2013 vários caminhões de palma, o que me rendeu cerca de cinco
mil reais. Mas, ninguém ganha com a seca não. Se não fossem as cisternas, o
sofrimento seria maior ainda.
O cisternão segurou a água de beber dos animais. Só que em relação às
outras épocas de poucas chuvas, os impactos não foi tão forte pra mim,
quanto aos outros companheiros que criam gado. Eu não precisei comprar
ração fora, tudo foi produzido na propriedade.
A palma é uma agricultura que não é muito exigente, quando ela está
nova é só manter livre de roedores, quando vai crescendo um pouco
endurece o caule e já ganha resistência.
Eu prefiro o plantio da palma em consórcio, é o sistema melhor que tem,
porque se planta o feijão, com a produção do feijão dá pra cobrir as despesas
das outras plantas.
A cisterna-calçadão melhorou 90% o meu dia a dia, auxiliando em
diversas atividades, na dessedentação animal e na produção da farinha. A
farinhada é feita de forma artesanal, essa atividade é cultural na família, vem
do meu avô paterno.
A cada dois anos, mantemos a tradição, e nesse período gera emprego
para vários agricultores da comunidade. Neste ano de 2013 conseguimos
produzir 18 sacos. O procedimento é arrancar a mandioca, levar pra
descascar, colocar dentro de vasilhas com água, enroladas num pano para a
retirada da fécula (goma). Depois tritura, prensa a massa, passa na peneira,
vai ao forno, quando torrada é levada para o esfriadouro e está pronta para o
consumo. O saco chega a custar hoje cerca de trezentos reais.
A minha renda varia de um ano para outro, tem ano que trabalho mais,
tem outro trabalho menos, depende do que vou plantar, mas, no balanço final
do ano ganho líquido de 14 a 15 mil reais, colocando minha mão-de-obra.
Procuro sempre fazer minha parte pra deixar a propriedade sustentável.
Aqui os terrenos são muito declinados, trabalho sempre no plantio com curva
de nível, essa é uma solução para esbarrar a força da água que escorre, com
essa prática mantenho assegurado o composto da terra, maior umidade e o
roçado produtivo.
Com o manejo da caatinga vejo que melhora o clima na área trabalhada,
favorece o surgimento de outras espécies nativas, e amplia a alimentação
animal. Faço o manejo do raleamento rebaixado que é possível manter ao
alcance da criação a forragem das árvores. Tenho o controle das espécies
lenhosas fazendo o corte necessário quando preciso.
O nosso trabalho aqui é todo familiar, em conjunto. Aprendi muito com
os intercâmbios, com essa troca de conhecimento, eles vão abrindo nosso
contato com outros agricultores, nunca a gente sabe de tudo, sempre falta
alguma coisa. Me considero um agricultor experimentador, e graças a Deus,
eu tenho me dado muito bem com a agricultura, eu sei até fazer outras
atividades, mas eu só estou bem se eu estiver na agricultura. Pra mim o foco
mesmo é o que já tenho conquistado, e me sinto melhor no que faço - contou
Chiquinho.