UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS TECNOLÓGICAS DA TERRA E DO MAR – CTTMar
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA AMBIENTAL
DAGOBERTO PORT
O IMPACTO DA PESCA INDUSTRIAL DE ARRASTO SOBRE OS ECOSSISTEMAS DA
MARGEM CONTINENTAL DO SUDESTE/SUL DO BRASIL
Itajaí, SC
Fevereiro de 2015
DAGOBERTO PORT
O IMPACTO DA PESCA INDUSTRIAL DE ARRASTO SOBRE OS ECOSSISTEMAS DA
MARGEM CONTINENTAL DO SUDESTE/SUL DO BRASIL
Tese apresentada como requisito parcial para a
obtenção do título de Doutor em Ciência e
Tecnologia Ambiental, na Universidade do Vale
do Itajaí, Centro de Ciências Tecnológicas da
Terra e do Mar.
Orientador: Prof. Dr. José Angel Alvarez Perez
Co-orientador: Prof. Dr. João Thadeu de Menezes
Itajaí, SC
Fevereiro de 2015
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. José Angel Alvarez Perez, pela orientação e por acreditar que seria possível;
Ao Prof. Dr. João Thadeu de Menezes, pelas valiosas “dicas” do ArcGIS;
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela
concessão da bolsa de Doutorado (Edital Ciências do Mar 09/2009 – Projeto IGEPESCA);
A Coordenação do Programa de Pós-graduação em Ciência e Tecnologia Ambiental da
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, por atender nossas demandas, sempre que
possível;
A Isabela Germani de Oliveira Delfino e Fabíola Heloísa Tell Varela, pela presteza em
resolver nossas solicitações;
Ao Oceanógrafo Fernando N. Fiedler, amigo, que normalmente é mestre, mas as vezes é
“gafanhoto”, pela companhia na sala dos excluídos e pelas valiosas discussões sobre a
importância da “estatística inaplicada nos projetos D e F”;
Por fim, mas não por último, a Profa. Dra. Fabiane Fisch, por incontáveis motivos
existentes entre o Céu e a Terra e que nossa filosofia não precisa explicar.
6
RESUMO
O objetivo geral do presente estudo é avaliar o impacto da pesca industrial de arrasto sobre os
ecossistemas da margem continental do Sudeste/Sul do Brasil e neste sentido apresenta, pela
primeira vez, estimativas de consumo de combustível e emissões de gases de efeito estufa;
estimativas de área varrida e “pegada espacial”; além de valores de diversidade,
equitabilidade, nível trófico médio, vulnerabilidade média e resiliência média para a captura
desembarcada por esta frota. Os dados analisados são compostos por características das
embarcações, desembarques, áreas de pesca e duração dos arrastos de 10.144 operações de
pesca monitoradas, em Santa Catarina, entre 2003 e 2011. Foram consideradas três estratégias
de pesca principais: arrasto de camarões, arrasto de talude e arrasto de parelhas. Todas as
análises foram realizadas em ambiente de SIG (Sistema de Informação Geográfica) e os dados
especializados em quadrantes de 30’ × 30’. Como resultados temos que, em conjunto, estas
operações consumiram mais de 141,5 milhões de litros de diesel para desembarcar 342,3
milhões de kg de pescado. Anualmente, foram consumidos de 0,36 a 0,48 litros para cada kg
de pescado desembarcado. Esta intensidade de uso de combustível é decorrente do fato de que
todas as estratégias de pesca atuam em capturas multiespecíficas para aumentar seus
rendimentos, porém se apenas as espécies-alvo forem consideradas, as estimativas de
consumo de combustível aumentam 316-1025%. Em nove anos as operações de arrasto
emitiram 104,07 GgC para a atmosfera e entre 36.800 e 49.500 toneladas de CO2 por ano. A
delimitação da “pegada” da pesca industrial de arrasto do Sudeste e Sul do Brasil e suas
principais áreas “núcleo” foi um primeiro passo para avaliar o impacto espacial em tais áreas,
fornecendo informações preliminares para uma futura gestão ecossistêmica da pesca e
estratégias de planejamento espacial marinho. Deve-se observar que os valores obtidos para a
área varrida e “pegada espacial” podem estar subestimados em função de fatores que
limitaram a estimativa precisa das áreas varridas (pela ausência de dados de arrastos
individuais) e a extrapolação para todo o universo da frota de arrasto na região. Considerando
estas incertezas, verifica-se que a frota industrial de arrasto que opera no Sudeste e Sul do
Brasil, no período de estudo, apresentou uma área varrida de 680.697,5 km2. A maior parte da
biomassa desembarcada nos portos de Santa Catarina (55,67%), neste período, pela frota
industrial de arrasto, teve origem no intervalo de latitude Sul (sul de 29°S), sendo as classes
de substrato Areia Fina, Areia Lamosa e Lama as mais representativas da origem desta
biomassa. Capturas obtidas nas áreas de pesca mais profundas (plataforma externa, quebra da
plataforma e talude) apresentaram os menores valores de diversidade, equitabilidade e
7
resiliência média e os maiores valores para nível trófico médio e vulnerabilidade média,
enquanto que a biomassa removida das áreas mais rasas (plataforma interna e plataforma
média) apresentou um comportamento contrário. Constatou-se uma leve tendência de queda
nos valores do nível trófico médio das capturas, durante 2003-2011, padrão este fortemente
afetado pela oscilação nos desembarques das principais espécies-alvo. O índice da pesca em
equilíbrio (Fishing-in-Balance index - FiB) sofreu um incremento durante o período avaliado,
possivelmente como resultado da expansão da área de ocupação da frota de arrasteiros em
direção ao talude, explorando desta forma, um ecossistema mais amplo. A partir dos
resultados obtidos, este estudo propõe a demarcação espacial de três categorias de área de
pesca (A, B e C), baseado no grau de impacto a que cada uma delas foi submetida pela frota
industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, no período avaliado. O grau de impacto destas
áreas foi baseado em valores de emissão de Carbono, remoção de biomassa e percentual de
área varrida. Além disto, foram considerados, na classificação destas áreas os valores de
atributos das comunidades e populações marinhas (i.e. diversidade, equitabilidade, nível
trófico médio, vulnerabilidade média e resiliência média) obtidos a partir de informações da
captura desembarcada por esta frota. Para cada um destes indicadores ecológicos e de impacto
foram atribuídos valores (1, 3 e 5) para o cálculo do Índice do Estado do Ambiente (IEA). Os
valores obtidos para o IEA também foram espacializados em quadrantes de 30’ × 30’, dando
origem as três categorias de área de pesca. A área de pesca “A” é a que apresenta os maiores
valores de impacto provocados pelas altas emissões de Carbono, alta remoção de biomassa e
alto percentual de área varrida, além de alto valor de diversidade, equitabilidade e resiliência
média e baixos valores de nível trófico médio e vulnerabilidade média. Por sua vez, a área de
pesca “C” é a menos impactada por emissões de Carbono, remoção de biomassa e área
varrida, porém é a que apresenta os menores valores de diversidade, equitabilidade e
resiliência média, além de possuir os maiores valores de nível trófico médio e vulnerabilidade
média. Finalmente a área de pesca “B” apresenta valores intermediários às outras duas. A
partir destes resultados são propostas ações de gestão para esta pescaria, do tipo “freezing the
footprint” e Áreas de Exclusão de Pesca (AEP), além da implementação de outros estudos
sobre as espécies marinhas afetadas direta e/ou indiretamente, e seus habitats também
impactados.
Palavras-chave: pesca industrial de arrasto; impactos; abordagem ecossistêmica; gestão da
pesca; indicadores ecológicos; Sudeste e Sul do Brasil.
8
ABSTRACT
This study evaluates the impact of industrial trawling on ecosystems of the continental margin
of the Southeast/South of Brazil. For this it presents, for the first time, estimates of fuel
consumption greenhouse gas emissions; estimates of swept area and "spatial footprint"; and
values of diversity, equitability, mean trophic level, mean vulnerability, and mean resilience
for the catch landed by this fleet. The data analyzed consist of characteristics of the vessels,
landings, fishing areas and trawl duration, for 10,144 fishing operations monitored in the state
of Santa Catarina, between 2003 and 2011. Three main fishing strategies were considered:
shrimp, slope and pair trawls. All the analyses were performed in the GIS (Geographic
Information System) environment, and the data were spatialized into quadrants of 30'× 30'.
The results showed that together, these operations consumed more than 141.5 million liters of
diesel to land 342.3 million kg of fish. Annually, 0.36-0.48 l were consumed for every kg of
catch landed. This fuel use intensity is due to the fact that all fishing strategies work in multi-
species catches for increasing yields, but if only the target species are considered, the fuel
consumption estimates increased 316-1025%. In nine years of trawling operations, 104.07
GgC were emitted into the atmosphere, and between 36,800 and 49,500 tons of CO2 per year.
The "spatial footprint" of industrial trawling off the Southeast and South coasts of Brazil and
its main core areas was a first step in assessing these areas, providing preliminary information
for future ecosystem fisheries management and marine spatial planning strategies. It should
be noted that the values obtained for the swept area and "spatial footprint" may be
underestimated due to factors that limited the accurate estimate of the areas (due to the
absence of actual data for each fishery) and extrapolation to the whole universe of the trawler
fleet in the region. Given these uncertainties, it was observed that the industrial trawler fleet
operating in Southeast and South of Brazil, during the study period, showed a swept area of
680,591.59 km2. Most of the biomass landed in the ports of the state of Santa Catarina
(55.67%) in this period, by the industrial trawler fleet, originated in south latitude range
(south of 29°S), and the fine sand, muddy sand and mud substrate classes were the most
representative of the origin of this biomass. Catches from deeper fishing areas (outer shelf,
shelf break and slope) had the lowest values of diversity, evenness and medium resilience,
and the highest values for mean trophic level and medium vulnerability, whereas catches
removed from shallower areas (inner shelf and middle shelf) showed an opposite trend. There
was a slight downward trend in the mean trophic level of the catches landed between 2003
and 2011. This pattern, however was strongly affected by oscilantions of landings of the main
9
target species. The Fishing-in-Balance index (FiB) increased throughout the study period,
possibly as the outcome of an expansion of the trawl fleet fishing area towards the slope
exploiting a wider ecosystem. Based on the results obtained, this study proposes a spatial
demarcation of three categories of fishing area (A, B and C), according to the level of impact
to which each of them was submitted by the industrial trawling fleet of Southeast/South of
Brazil in the study period. The level of impact on these areas was based on carbon emission
levels, biomass removal and percentage of swept area. The classification of these areas also
considered values of attributes of marine communities and populations (i.e. diversity,
evenness, mean trophic level, mean vulnerability and mean resilience) obtained from
information on the catch landed by this fleet. A State of Environment Index (IEA) was
calculated for each fishing area based on scores attributed to each ecological and impact
indicators. Fishing area "A" is the one with the greatest impact values caused by the high
carbon emissions, high biomass removal and high percentage of swept area, as well as high
value of diversity, evenness and medium resilience and low values of mean trophic level and
medium vulnerability. In turn, the fishing area "C" is less affected by carbon emissions,
biomass removal and swept area; however, it shows the lowest values of diversity, evenness
and medium resiliency, and higher values of mean trophic level and medium vulnerability.
Finally fishing area "B" shows intermediate values to the other two. Based on these results,
management actions are proposed for this fishery, including "freezing the footprint" and
fishing exclusion areas (AEP), and further studies are suggested, on marine species directly
and/or indirectly affected, and the impacts on their habitats.
Keywords: industrial trawling fisheries; impacts; ecosystem approach; fisheries management;
ecological indicators; Southeast and South of Brazil.
10
APRESENTAÇÃO
Os capítulos do presente trabalho estão organizados na forma de artigos científicos,
com base nas normas para publicação dos periódicos aos quais foram ou serão submetidos.
Além disto, inicialmente é feita uma introdução geral, que aborda aspectos relacionados aos
quatro capítulos seguintes e o último capítulo, em forma de considerações finais, abrange a
relação das principais ideias e as conclusões de cada um dos capítulos.
O primeiro capítulo: “Consumo de combustível, intensidade de uso de combustível
e emissão de gases de efeito estufa da principal frota de arrasto industrial do Brasil” tem
como objetivos obter, pela primeira vez, estimativas de consumo de combustível e emissões
de gases de efeito estufa da frota industrial de arrasto que opera no Sudeste e Sul do Brasil.
Além disto, a intensidade de uso de combustíveis e o balanço de carbono das operações de
arrasto, com seus principais padrões temporais e espaciais, foram analisados para avaliar os
custos ambientais dessa atividade antrópica e seus impactos sobre a margem continental
brasileira. Este capítulo foi formatado de acordo com as normas da revista Marine Pollution
Bulletin, para a qual foi submetido, tendo sido publicado no volume 88 (2014), páginas 334-
343 (Anexo 1).
O segundo capítulo: “Evolução da “pegada espacial” da pesca industrial de
arrasto da margem continental do Sudeste e Sul do Brasil” tem como objetivos delimitar a
“pegada espacial” da pesca industrial de arrasto e estimar a extensão da área impactada pelo
arrasto em relação aos habitats de fundo, intervalos de latitude e profundidades da costa
Sudeste/Sul do Brasil, e sua evolução temporal recente. Este capítulo foi formatado de acordo
com as normas da revista Fisheries Research, para a qual foi submetido (Anexo 2).
O terceiro capítulo: “Caracterização e variação espaço-temporal de indicadores
ecológicos da captura desembarcada pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do
Brasil no período 2003-2011” tem por objetivo calcular índices ecológicos, diversidade,
equitabilidade, nível trófico, índice da pesca em equilíbrio (Fishing-in-Balance index – FiB),
vulnerabilidade e resiliência, dos componentes da captura desembarcada por esta frota nos
portos de Santa Catarina, com o propósito de aumentar a compreensão sobre os impactos
produzidos, por esta modalidade de pesca, sobre populações e comunidades bentônicas e
bento-pelágicas (demersais), contribuindo para iniciativas de gestão ecossistêmica e de
planejamento espacial do ambiente marinho. Este capítulo foi formatado de acordo com as
normas da revista Brazilian Journal of Oceanography para a qual será submetido.
11
O quarto capítulo: “Avaliação ecossistêmica do impacto da pesca industrial de
arrasto no Sudeste e Sul do Brasil” tem como objetivo avaliar, em conjunto, diversos
indicadores ecológicos (diversidade, equitabilidade, nível trófico médio, vulnerabilidade
média e resiliência média) e indicadores de impacto (consumo de combustível, emissões de
gases de efeito estufa e percentual de área varrida), com o intuito de apresentar uma visão
ecossistêmica preliminar do impacto causado pelas operações da frota industrial de arrasto no
Sudeste e Sul do Brasil. Este capítulo foi formatado de acordo com as normas da revista
Ecological Indicators para a qual será submetido.
12
SUMÁRIO
RESUMO 6
ABSTRACT 8
APRESENTAÇÃO 10
SUMÁRIO 12
INTRODUÇÃO GERAL 14
HIPÓTESE 17
OBJETIVO GERAL 18
OBJETIVOS ESPÉCÍFICOS 18
REFERÊNCIAS 19
CAPÍTULO 1 - CONSUMO DE COMBUSTÍVEL, INTENSIDADE DE USO DE
COMBUSTÍVEL E EMISSÃO DE GASES DE EFEITO ESTUFA DA
PRINCIPAL FROTA DE ARRASTO INDUSTRIAL DO BRASIL
23
RESUMO 24
ABSTRACT 24
INTRODUÇÃO 25
MATERIAL E MÉTODOS 27
Pesca de arrasto de fundo 27
Fontes dos dados 28
Transformação dos dados 30
Análise dos dados 33
RESULTADOS 34
Consumo de combustível e intensidade de uso 34
Balanço de carbono e emissões de CO2 39
Custos ambientais de pesca de arrasto 40
DISCUSSÃO 40
CONCLUSÕES 46
REFERÊNCIAS 46
CAPÍTULO 2 - EVOLUÇÃO DA “PEGADA ESPACIAL” DA PESCA
INDUSTRIAL DE ARRASTO DA MARGEM CONTINENTAL DO SUDESTE E
SUL DO BRASIL
52
RESUMO 53
ABSTRACT 53
INTRODUÇÃO 54
MATERIAL E MÉTODOS 56
RESULTADOS 62
O efeito das estratégias de pesca de arrasto 66
13
Evolução da “pegada” (footprint) 71
DISCUSSÃO 75
REFERÊNCIAS 81
CAPÍTULO 3 - CARACTERIZAÇÃO E VARIAÇÃO ESPAÇO-TEMPORAL
DE INDICADORES ECOLÓGICOS DA CAPTURA DESEMBARCADA PELA
FROTA INDUSTRIAL DE ARRASTO DO SUDESTE/SUL DO BRASIL NO
PERÍODO 2003-2011
86
RESUMO 87
ABSTRACT 87
INTRODUÇÃO 88
MATERIAL E MÉTODOS 90
Pesca de arrasto de fundo 90
Fonte dos dados – Pescaria 91
Fonte dos dados – Espécies desembarcadas 93
Transformação dos dados 96
Análise dos dados 100
RESULTADOS 100
DISCUSSÃO 114
REFERÊNCIAS 120
CAPÍTULO 4 - AVALIAÇÃO ECOSSISTÊMICA DO IMPACTO DA PESCA
INDUSTRIAL DE ARRASTO NO SUDESTE E SUL DO BRASIL 127
RESUMO 128
ABSTRACT 128
INTRODUÇÃO 129
MATERIAL E MÉTODOS 131
RESULTADOS 135
DISCUSSÃO 137
REFERÊNCIAS 141
MATERIAL SUPLEMENTAR 147
Tabela S1 148
Tabela S2 152
CONSIDERAÇÕES FINAIS 157
ANEXOS 159
Anexo 1. Primeira página do manuscrito publicado no volume 88 (2014), páginas
334-343, da revista Marine Pollution Bulletin. 160
Anexo 2. Cópia do email de confirmação da submissão do manuscrito, referente ao
Capítulo 2 desta tese, na revista Fisheries Research. 161
14
INTRODUÇÃO GERAL
A frota pesqueira industrial, em todo o mundo, é responsável pela maior parte das
capturas anuais, fornecendo, desta forma, uma parcela importante da proteína animal de
origem marinha, cuja demanda é crescente (FAO, 2012). Esta situação, benéfica por um lado,
é contrabalanceada por uma série de custos/impactos ambientais, quer sejam eles potenciais
ou efetivos, destacando-se: (a) redução da biomassa dos estoques naturais através da
sobrepesca (Garcia & Grainger, 2005), (b) alteração da estrutura da comunidade e
funcionamento do ecossistema através da redução de predadores de topo, bycatch e descartes
(Pauly et al., 1998, 2005; Kelleher, 2008), (c) a degradação de habitats através do contato de
equipamentos de pesca com o fundo do mar (Kaiser et al., 2006), (d) o consumo de
combustíveis fósseis durante as operações de navegação e pesca (Tyedmers, 2004; Tyedmers
et al., 2005;. Suuronen et al., 2012), (e) a emissão de gases de efeito estufa para a atmosfera
(Ziegler & Hansson, 2003; Fulton, 2010).
Neste mesmo cenário, a pesca de arrasto constitui mundialmente a principal fonte de
peixes demersais e bentônicos, bem como de outros frutos do mar (Thurstan et al., 2010). No
entanto, a sustentabilidade ambiental deste tipo de pescaria tem sido questionada,
principalmente porque as redes de arrasto de fundo (a) são geralmente pouco seletivas,
produzindo um volume grande e diverso de bycatch e descartes (Kelleher, 2008) e (b)
perturbam os habitats de fundo e as comunidades bentônicas devido ao contato dos
equipamentos pesados com os mesmos (Auster & Langton, 1999; Hiddink et al., 2006).
Infere-se que as consequências dessa atividade, sobre as comunidades de fundo, vão além das
relações populacionais de espécies de interesse comercial, afetando também a resiliência de
diferentes espécies não-comerciais, a estrutura das comunidades biológicas e por conseguinte,
o próprio funcionamento dos ecossistemas e sua capacidade de provisão de serviços
(Cardinale et al., 2012). Além disto, estima-se que a frota de arrasto seja ineficiente do ponto
de vista energético, como resultado dos padrões de variabilidade da captura dos estoques
(agregações e proximidade das áreas de pesca) e significativa força de arrasto produzida
durante as operações de pesca, que exigem uma grande potência de motor e alto consumo de
combustível (Wileman, 1984; Tyedmers, 2004). Variações temporais nesses elementos, por
exemplo, diminuição da abundância relativa dos estoques e aumento de tamanho e potência
dos motores dos barcos de pesca contribuem para mudanças no desempenho energético ao
longo do tempo, como relatado para várias pescarias de arrasto em todo o mundo (Tyedmers,
2004).
15
No Sudeste e Sul do Brasil (19°S - 34°S), historicamente a frota industrial de arrasto
de fundo tem produzido a principal fração das capturas demersais. No final da década de 1990
e durante os anos 2000, a frota industrial de arrasto possuía mais de 650 barcos cujos
desembarques anuais conjuntos oscilaram em torno de 89 mil toneladas, aproximadamente
1/3 de toda biomassa de pescados desembarcada na região (Perez et al., 2001; Valentini &
Pezzuto, 2006).
Segundo estimativas da ICES (International Council for the Exploration of the Sea) a
totalidade das capturas da pesca de águas profundas, no Atlântico Norte é feita além do
“limite biológico seguro” (ICES, 2010). No Brasil, esta mesma situação é apontada por Perez
et al. (2009) para o Sudeste/Sul do Brasil, destacando uma listagem de espécies de alta
vulnerabilidade, compilada de diversos trabalhos, na qual se encontram além de espécies-alvo
da pesca industrial de arrasto, outras que também compõem as capturas desembarcadas por
esta frota, todas em situação de sobrepesca, como todos os estoques de águas profundas desta
região. Ao analisar o potencial de rendimento de espécies-alvo da pesca industrial de arrasto
de talude, na mesma região, Perez (2006) prevê que as capturas de Lophius gastrophysus,
Merluccius hubbsi e Urophycis mystacea encontravam-se acima dos níveis de
sustentabilidade. Outras avaliações dos estoques produzidas ao longo deste período
concluíram que as principais populações-alvo, capturadas tanto em áreas de plataforma como
de talude, tiveram redução da sua biomassa atingindo, ou mesmo ultrapassando, os níveis
máximos sustentáveis (Haimovici, 1997; D’Incao et al., 2002; Haimovici et al., 2006). Em
geral atribuído à sobrepesca, este cenário tornou-se uma evidência do impacto direto da pesca
industrial de arrasto sobre os ecossistemas bentônicos do Sudeste e Sul do Brasil.
Analisando as variações nos valores do nível trófico médio das capturas das pescarias
em geral, Pauly et al. (1998; 2001) verificaram o efeito “fishing down the food web” que
ocorre se uma pescaria inicia direcionando seu esforço aos predadores de topo passando
subsequentemente para níveis inferiores na medida em que a abundância dos primeiros decai.
Com relação a degradação de habitats, através do contato de equipamentos de pesca
com o fundo do mar, a pesca de arrasto produz uma "pegada espacial" (i.e. não a "pegada
ecológica" sensu Swartz et al., 2010) claramente definida pela operação das redes, que são
arrastadas sobre o fundo do mar e “varrem” extensões variáveis de substrato, onde uma ou
mais espécies bentônicas/bentopelágicas são capturadas para fins comerciais. Estas redes são
equipadas com portas pesadas e cabos de solo (às vezes com correntes ou rolos)
desenvolvidas para agregar e/ou retirar os organismos (peixes, crustáceos) do fundo do mar.
Desta forma, este petrecho perturba substratos de fundo e produz modificações cujas
16
consequências ecológicas são habitat-específicas, mas particularmente graves em áreas ainda
inexploradas ou pouco impactadas (Kaiser et al., 2002; Kaiser et al., 2006).
Finalmente, no que diz respeito ao consumo de combustíveis fósseis durante as
operações de navegação e pesca e a consequente emissão de gases de efeito estufa para a
atmosfera, Tyedmers et al. (2005) estimaram que a atividade da pesca consumiu 1,2% (50
bilhões de toneladas) de todo o petróleo consumido no planeta em 2000. Este foi o custo de
combustível de quase 80 milhões de toneladas de pescado e a fonte de 130 milhões de
toneladas de CO2 liberados para a atmosfera. Considerando que a energia disponibilizada para
assimilação humana através do consumo desta quantidade de frutos do mar foi de cerca de
1/12 da energia dissipada para realizar a pesca, os autores concluíram que a eficiência da
atividade de pesca é geralmente baixa. No entanto, essa eficiência não é homogênea, pois os
vários métodos empregados atualmente para capturar recursos bentônicos, demersais e
pelágicos exigem diferentes níveis de consumo de combustíveis e consequentemente, têm
diferentes desempenhos energéticos (sensu Tyedmers, 2004). Em geral, métodos de pesca
passivos (e.g. redes de emalhe, armadilhas, espinhéis) tendem a demandar menos energia do
que métodos ativos (e.g. redes de arrasto e redes de cerco) (Tyedmers et al., 2005; FAO,
2007; Schau et al., 2009; Winther et al., 2009). De acordo com Tyedmers et al. (2005) as
pescarias que ocorrem nas áreas costeiras do Atlântico Sul Ocidental contribuíram pouco para
o consumo global de combustíveis e para as emissões de gases de efeito estufa em 2002.
Essas áreas, no entanto, não dispunham de dados empíricos e foram avaliadas principalmente
através da adoção de parâmetros provenientes de pescarias similares de outras regiões.
No Brasil, fontes de impacto nos ecossistemas, tais como, perturbação dos habitats,
mudanças na estrutura das comunidades, consumo de combustíveis fósseis e emissões de
gases de efeito estufa, tem sido pouco estudadas (e.g. Gasalla & Rossi-Wongtschowski, 2004;
Almeida & Vivan, 2011; Port et al., 2014) ou são praticamente desconhecidas.
Na maioria das vezes, a gestão da pesca tem sido feita com base em avaliações de
estoque das espécies-alvo, porém, a sustentabilidade das pescarias em geral é atualmente uma
preocupação constante e algumas abordagens ecossistêmicas têm sido propostas para gerir as
pescarias (Jennings & Kaiser, 1998; Garcia et al., 2003; Pikitch, et al., 2004). De acordo com
Grafton et al. (2008) e Squires (2009), um dos grandes desafios do gerenciamento dos
oceanos é a gestão combinada dos estoques pesqueiros e a conservação das comunidades das
quais estes estoques dependem, sendo que esta discussão vai além da sobrepesca, incluindo
aspectos ambientais, ecológicos e da biodiversidade. Por outro lado, muitos conceitos ligados
a gestão ecossistêmica, como “saúde do ecossistema”, são de difícil tradução em objetivos
17
operacionais que possam ser utilizados diretamente na elaboração de políticas de
gerenciamento (Larkin, 1996). Esta visão ecossistêmica da gestão da pesca, que vem
ganhando espaço nos últimos anos é importante, pois a atividade pesqueira afeta níveis
tróficos bem distantes das espécies que são normalmente comercializadas (Pauly et al., 1998).
Desta forma, para que seja possível uma gestão ecossistêmica das pescarias é
necessário inicialmente conhecer como ambientes, as populações e comunidades que
compõem as áreas de pesca são impactados pela atividade pesqueira. Portanto, são
necessários indicadores preditivos, que possam ser facilmente parametrizados, utilizando
dados de fácil acesso, que possam traduzir de forma simples a variedade de processos
complexos que ocorrem em um ecossistema (Christensen, 2000; Murawski, 2000; Pauly &
Watson, 2005). Entre estes indicadores, podemos destacar aqueles que descrevem a estrutura
de comunidades naturais, como Índice de Diversidade de Shannon (H’) e o Índice de
Equitabilidade de Pielou (J’) (Pielou, 1975) e outros específicos para ambientes marinhos,
mais recentes, como o Nível Trófico Médio (NTM) (Pauly et al., 1998), Índice da Pesca em
Equilíbrio (Fishing-in-Balance index - FiB, Pauly et al., 2000), Vulnerabilidade e Resiliência
(Froese & Pauly, 2014).
Neste sentido, utilizando dados referentes a 10.144 viagens da pesca industrial de
arrasto, monitoradas em Santa Catarina, entre 2003 e 2011, contendo informações das
embarcações, desembarques, áreas de pesca e das operações de arrasto propriamente ditas,
este estudo contribui com o fornecimento de algumas estimativas até então inexistentes para
esta frota e região, como: o consumo de combustível e emissões de gases de efeito estufa; a
delimitação da “pegada espacial” da pesca industrial de arrasto e estimativa da extensão da
área impactada pelo arrasto em relação aos habitats de fundo, intervalos de latitude e
profundidades; a estimativa dos valores de índices ecológicos aplicados aos componentes da
captura desembarcada; e uma avaliação conjunta destes parâmetros com o intuito de
apresentar uma visão ecossistêmica preliminar do impacto causado pelas operações da frota
de arrasto industrial nesta porção do Atlântico Sudoeste.
HIPÓTESE
Na última década, a frota de arrasteiros que opera a partir dos portos de Santa Catarina
tem sido caracterizada pela diversificação de alvos e áreas num processo de aproveitamento
dinâmico de recursos disponíveis e vulneráveis às redes de arrasto (Perez et al., 2001). Nesse
contexto esta proposta parte da hipótese de que essa atividade tem ocupado e impactado um
18
espaço significativo da plataforma continental e talude do Sudeste e Sul do Brasil, espaço este
em expansão durante esse período. As áreas arrastadas devem superar a superfície total da
área de pesca, a qual encerra uma comunidade bento-pelágica profundamente afetada por essa
atividade. Devido à pequena seletividade das redes empregadas e ao elevado aproveitamento
das capturas multiespecíficas a estrutura da comunidade deve ser afetada de forma
homogênea, porém, devido às diferentes sensibilidades demográficas dos organismos
capturados, o impacto provocado pela pesca de arrasto pode ser bastante heterogêneo.
Finalmente devido à abundante captura não-intencional descartada ao mar e ao intenso
consumo de óleo diesel necessário para promover arrastos rentáveis, hipotetiza-se que exista
um balanço neutro ou deficitário, onde os custos ambientais nas áreas de pesca são
extremamente elevados para a produção de biomassa aproveitada. Este déficit, no entanto
deve ser mais acentuado em algumas áreas da plataforma e talude do SE-S e menos em outras
permitindo uma análise espacial de possíveis estratégias de gestão da pesca de arrasto, dentro
de uma abordagem ecossistêmica.
OBJETIVO GERAL
Analisar o impacto da pesca industrial de arrasto sobre os ecossistemas da margem
continental do Sudeste/Sul do Brasil.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
- Obter, pela primeira vez, estimativas de consumo de combustível e emissões de
gases de efeito estufa da frota industrial de arrasto que opera no Sudeste e Sul do Brasil;
- Calcular a intensidade de uso de combustíveis e o balanço de carbono das operações
de arrasto, com seus principais padrões temporais e espaciais e avaliar os custos ambientais
dessa atividade antrópica e seus impactos sobre a margem continental brasileira;
- Delimitar a “pegada espacial” da pesca industrial de arrasto e estimar a extensão da
área impactada pelo arrasto em relação aos habitats de fundo, intervalos de latitude e
profundidades da costa Sudeste/Sul do Brasil, e sua evolução temporal recente;
- Calcular índices ecológicos, diversidade, equitabilidade, nível trófico, índice da
pesca em equilíbrio (Fishing-in-Balance index – FiB), vulnerabilidade e resiliência, dos
componentes da captura desembarcada pela frota industrial de arrasto nos portos de Santa
Catarina, com o propósito de aumentar a compreensão sobre os impactos produzidos, por esta
19
modalidade de pesca, sobre populações e comunidades bentônicas e bento-pelágicas
(demersais);
- Avaliar, em conjunto os diversos indicadores ecológicos e indicadores de impacto
(consumo de combustível, emissões de gases de efeito estufa e percentual de área varrida),
calculados anteriormente, com o intuito de apresentar uma visão ecossistêmica preliminar do
impacto causado pelas operações da frota industrial de arrasto industrial no Sudeste e Sul do
Brasil.
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23
CAPÍTULO 1
CONSUMO DE COMBUSTÍVEL, INTENSIDADE DE USO DE COMBUSTÍVEL E
EMISSÃO DE GASES DE EFEITO ESTUFA DA PRINCIPAL FROTA DE ARRASTO
INDUSTRIAL DO BRASIL
24
RESUMO
Este estudo apresenta, pela primeira vez, estimativas de consumo de combustível e emissões
de gases de efeito estufa produzidas pela frota industrial de arrasto que opera no Sudeste e Sul
do Brasil. Os dados analisados são compostos por características das embarcações,
desembarques, áreas de pesca e duração dos arrastos de 10.144 viagens de pesca monitoradas,
em Santa Catarina, entre 2003 e 2011. Foram consideradas três estratégias de pesca
principais: arrasto de camarões, arrasto de talude e arrasto de parelhas. Em conjunto, estas
operações consumiram mais de 141,5 milhões de litros de diesel para desembarcar 342,3
milhões de kg de pescado. Anualmente, foram consumidos de 0,36 a 0,48 litros para cada kg
de pescado desembarcado. Esta intensidade de uso de combustível é decorrente do fato de que
todas as estratégias de pesca atuam em capturas multiespecíficas para aumentar seus
rendimentos, porém se apenas as espécies-alvo forem consideradas, as estimativas de
consumo de combustível aumentam 316-1025%. Em nove anos as operações de arrasto
emitiram 104,07 GgC para a atmosfera e entre 36.800 e 49.500 toneladas de CO2 por ano.
Palavras-chave: pesca de arrasto industrial; intensidade de uso de combustível; emissões de
gases de efeito de estufa; Sudeste e Sul do Brasil; Oceano Atlântico Sudoeste.
ABSTRACT
This study provides first-time estimates of direct fuel inputs and greenhouse gas emissions
produced by the trawl fishing fleet operating off southeastern and southern Brazil. Analyzed
data comprised vessel characteristics, landings, fishing areas and trawling duration of 10,144
fishing operations monitored in Santa Catarina State from 2003 to 2011. Three main fishing
strategies were differentiated: ‘shrimp trawling’, ‘slope trawling’ and ‘pair trawling’. Jointly
these operations burned over 141.5 million liters of diesel to land 342.3 million kilograms of
fish and shellfish. Annually, 0.36-0.48 l were consumed for every kg of catch landed. This
fuel use intensity is due to the fact that all fishing strategies work in multi-species catches for
increasing yields, but if only the target species are considered, the fuel consumption estimates
increased 316-1025%. In nine years, trawling operations emitted 104.07 GgC to the
atmosphere, between 36,800 and 49,500 tons CO2 per year.
25
Keywords: industrial trawl fisheries; fuel use intensity; greenhouse gas emissions; southeast
and south of Brazil; SW Atlantic.
INTRODUÇÃO
A maior parte das capturas anuais da pesca, a nível mundial, é feita pela frota
industrial, que desta forma proporciona uma fração importante da crescente demanda global
por frutos do mar (FAO, 2012). Embora produtiva, os benefícios produzidos por esta
atividade são compensados por uma série de custos/impactos ambientais, quer sejam eles
potenciais ou efetivos, destacando-se: (a) redução da biomassa dos estoques naturais através
da sobrepesca (Garcia & Grainger, 2005), (b) alteração da estrutura da comunidade e
funcionamento do ecossistema através da redução de predadores de topo, bycatch e descartes
(Pauly et al., 1998, 2005; Kelleher, 2008), (c) a degradação de habitats através do contato de
equipamentos de pesca com o fundo do mar (Kaiser et al., 2006), (d) o consumo de
combustíveis fósseis durante as operações de navegação e pesca (Tyedmers, 2004; Tyedmers
et al., 2005;. Suuronen et al., 2012), (e) a emissão de gases de efeito estufa para a atmosfera
(Ziegler & Hansson, 2003; Fulton, 2010). A avaliação da sustentabilidade das pescarias,
durante muitas décadas, esteve centrada na sobrepesca e só recentemente, começou a
considerar os impactos nos ecossistemas marinhos (a, b, c). Menos atenção tem sido dada, no
entanto, ao fato de que esses impactos foram movidos pela disponibilidade e consumo de
combustíveis fósseis (Tyedmers, 2004; Tyedmers & Parker, 2012), que por sua vez produzem
danos ambientais adicionais através de emissões de CO2 para a atmosfera contribuindo para
as mudanças ambientais mundiais.
Tyedmers et al. (2005) estimaram que a atividade da pesca consumiu 1,2% (50 bilhões
de toneladas) de todo o petróleo consumido no planeta em 2000. Este foi o custo de
combustível de quase 80 milhões de toneladas de pescado e a fonte de 130 milhões de
toneladas de CO2 liberados para a atmosfera. Considerando que a energia disponibilizada para
assimilação humana através do consumo desta quantidade de frutos do mar foi de cerca de
1/12 da energia dissipada para realizar a pesca, os autores concluíram que a eficiência da
atividade de pesca é geralmente baixa. No entanto, essa eficiência não é homogênea, pois os
vários métodos empregados atualmente para capturar recursos bentônicos, demersais e
pelágicos exigem diferentes níveis de consumo de combustíveis e consequentemente, têm
diferentes desempenhos energéticos (sensu Tyedmers, 2004). Em geral, métodos de pesca
passivos (e.g. redes de emalhe, armadilhas, espinhéis) tendem a demandar menos energia do
26
que métodos ativos (e.g. redes de arrasto e redes de cerco) (Tyedmers et al., 2005; FAO,
2007; Schau et al., 2009; Winther et al., 2009).
Neste mesmo cenário, no mundo todo, a pesca de arrasto constitui a principal fonte de
peixes demersais e bentônicos, bem como de outros frutos do mar (Thurstan et al., 2010). No
entanto, tem se questionado a sustentabilidade deste tipo de pescaria do ponto de vista
ambiental, principalmente porque as redes de arrasto de fundo (a) são geralmente pouco
seletivas, produzindo um volume grande e diverso de bycatch e descartes (Kelleher, 2008) e
(b) perturbam os habitats de fundo e as comunidades bentônicas devido ao contato dos
equipamentos pesados com os mesmos (Auster & Langton, 1999; Hiddink et al., 2006). Além
disto, a eficiência energética da frota de arrasto é geralmente deficiente, como resultado do
comportamento dos padrões de variabilidade da captura dos estoques (agregações e
proximidade das áreas de pesca) e significativa força de arrasto produzida durante as
operações de pesca, que exigem uma grande potência de motor e alto consumo de
combustível (Wileman, 1984; Tyedmers, 2004). Variações temporais nesses elementos, por
exemplo, diminuição da abundância relativa dos estoques e aumento de tamanho e potência
dos motores dos barcos de pesca contribuem para mudanças no desempenho energético ao
longo do tempo, como relatado para várias pescarias de arrasto em todo o mundo (Tyedmers,
2004).
No Sudeste e Sul do Brasil (19°S - 34°S), historicamente a frota industrial de arrasto
de fundo tem produzido a principal fração das capturas demersais. No final da década de 1990
e durante os anos 2000, a frota industrial de arrasto possuía mais de 650 barcos cujos
desembarques anuais conjuntos oscilaram em torno de 89 mil toneladas, aproximadamente
1/3 de toda biomassa de pescados desembarcada na região (Perez et al., 2001; Valentini &
Pezzuto, 2006). Avaliações dos estoques produzidas ao longo deste período concluíram que as
principais populações-alvo, capturadas tanto em áreas de plataforma como de talude, tiveram
redução da sua biomassa atingindo, ou mesmo ultrapassando, os níveis máximos sustentáveis
(Haimovici, 1997; D’Incao et al., 2002; Haimovici et al., 2006; Perez et al., 2009). Em geral
atribuído à sobrepesca, este cenário tornou-se uma evidência do impacto direto da pesca
industrial de arrasto sobre os ecossistemas bentônicos do Sudeste e Sul do Brasil. Outras
fontes de impacto nos ecossistemas, tais como, perturbação dos habitats, mudanças na
estrutura das comunidades, consumo de combustíveis fósseis e emissões de gases de efeito
estufa, tem sido pouco estudadas (e.g. Gasalla & Rossi-Wongtschowski, 2004; Almeida &
Vivan, 2011) ou são praticamente desconhecidas.
27
De acordo com Tyedmers et al. (2005) as pescarias que ocorrem nas áreas costeiras do
Atlântico Sul Ocidental contribuíram pouco para o consumo global de combustíveis e para as
emissões de gases de efeito estufa em 2002. Essas áreas, no entanto, não dispunham de dados
empíricos e foram avaliadas principalmente através da adoção de parâmetros provenientes de
pescarias similares de outras regiões. Este estudo fornece, pela primeira vez, estimativas de
consumo de combustível e emissões de CO2, produzidas ao longo de nove anos, pela frota
industrial de arrasto que opera no Sudeste e Sul do Brasil. A intensidade de uso de
combustíveis e o balanço de carbono das operações de arrasto, com seus principais padrões
temporais e espaciais, foram analisados para avaliar os custos ambientais dessa atividade
antrópica e seus impactos sobre a margem continental brasileira. No geral, pretende contribuir
para uma avaliação mais ampla dos custos e benefícios desta produção em larga escala de
pescado no Brasil.
MATERIAL E MÉTODOS
Pesca de arrasto de fundo
A pesca industrial de fundo nas regiões Sudeste e Sul do Brasil desenvolveu-se na
década de 1960 essencialmente como uma pescaria de camarões costeiros (Farfantepenaeus
paulensis, F. brasiliensis e Xyphopenaeus kroyeri). Durante os 40 anos seguintes, com o
decréscimo nos estoques de camarões, a pesca de arrasto expandiu sua área de atuação ao
longo da plataforma continental e diversificou seus alvos, incluindo peixes demersais da
família Sciaenidae (i.e. Micropogonias furnieri, Cynoscion guatucupa, Macrodon ancylodon,
Umbrina canosai, entre outros) e os linguados (Paralychthys spp.), bem como outros
crustáceos e moluscos de valor comercial (i.e. camarões Artemesia longinaris e Pleoticus
muelleri, lagostas Metanephrops rubellus e Scillarides depressus e cefalópodes Doryteuthis
plei e Octopus vulgaris). Na última década, as operações de arrasto expandiram suas
atividades para as áreas de talude (até 800 m de profundidade), iniciando uma exploração sem
precedentes dos recursos de águas profundas como o peixe-sapo (Lophius gastrophysus),
merluza (Merluccius hubbsi), abrótea-de-profundidade (Urophycis mystacea), calamar-
argentino (Illex argentinus) e os camarões de profundidade (Família Aristeidae) (Perez et al.,
2001; Perez et al., 2009).
Desde o final da década de 1990, mais de 650 embarcações de arrasto de fundo
operam do Espírito Santo (19°S) até o limite sul da ZEE brasileira (34°S), estabelecendo uma
área de operação que se estende de águas costeiras (~10 m de profundidade) até o talude
28
(~800 m de profundidade). A frota é composta por barcos de arrasto duplo (75%), arrasto de
parelhas (23%) e arrasto simples (2%) que apresentam padrões distintos de operação, com
base na disponibilidade espacial e temporal dos recursos demersais e a capacidade de suas
artes de pesca. Estes padrões, identificados por Dias et al. (2012a; 2012b) e Dias & Perez
(2012), foram utilizados para caracterizar três principais “estratégias de pesca”, utilizadas
neste estudo:
Arrasto de camarões (AC): principalmente barcos de arrasto duplo que operam na
plataforma interna e média, concentrando suas atividades em duas áreas distintas; uma
entre 24°S-29°S tendo como espécies-alvo principais o camarão-rosa (Farfantepenaeus
spp.) e o camarão-sete-barbas (Xyphopenaeus kroyeri), e uma segunda ao sul de 29°S
dirigida a outros camarões costeiros (A. longinaris e P. muelleri) e um grupo de peixes
demersais que incluem a castanha (U. canosai), cabrinha (Prionotus punctatus) e
linguados (Paralychthys spp.). Estas espécies representaram mais de 60% da biomassa
total desembarcada por esta estratégia de pesca no período de 2003-11.
Arrasto de talude (AT): barcos de arrasto duplo e arrasto simples que atuam nas áreas de
talude (250-400 m de profundidade), tendo como alvo principal abrótea-de-profundidade,
merluza e peixe-sapo. Estas espécies, juntamente com U. canosai e P. punctatus,
compreendem mais de 64% da biomassa desembarcada por estes barcos entre 2003 e
2011.
Arrasto de Parelhas (AP): nesta estratégia operam duas embarcações arrastando uma única
grande rede. Estes barcos atuam na plataforma interna, tendo como espécies-alvo alguns
peixes cianídeos, incluindo U. canosai, Micropogonias furnieri, Cynoscion guatucupa, C.
acoupa e C. jamaicensis, que compõem aproximadamente 78% do total da biomassa
desembarcada por estas embarcações entre 2003-2011.
Fontes dos dados
O conjunto de dados analisados é composto por informações de capturas, esforço e
áreas de pesca de 10.144 viagens de pesca (arrasto duplo = 8.012 viagens; arrasto simples =
949 viagens; arrasto de parelhas = 1.183 viagens) que desembarcaram suas capturas nos
portos de Santa Catarina entre 2003 e 2011. Os dados foram reportados pelos mestres das
embarcações, nos diários de bordo ou durante entrevistas no momento do desembarque, de
29
acordo com um protocolo de amostragem estabelecido pelo serviço de estatística pesqueira
industrial de Santa Catarina (Perez et al., 1998; www.univali.br/gep). Como parte deste
protocolo de rotina, as informações obtidas através destes dois instrumentos foram avaliadas
por analistas experientes, com base nas tendências de longo prazo da pesca de arrasto
industrial na região (e.g. áreas de pesca, profundidades, espécies comuns nas capturas,
quantidades capturadas, duração das viagens, etc.). Os resultados desta análise foram
classificados como “confiável”, “duvidoso” e “não confiável” e apenas aqueles incluídos na
primeira categoria foram utilizados no banco de dados analisado. Uma vez que resultados
“duvidosos” não são comuns e necessariamente não contém informações falsas, estes foram
submetidos a uma segunda avaliação e eventualmente foram “resgatados” dos que haviam
sido rejeitados. Este é o caso em particular quando mais de um instrumento (diário de bordo e
entrevista) estava disponível para o mesmo desembarque e as informações podiam ser
cruzadas para verificar a consistência dos dados.
Os relatórios de desembarque analisados representam uma fração conhecida
(aproximadamente 70%) dos desembarques totais nos portos de Santa Catarina
(UNIVALI/CTTMar, 2004, 2006, 2007a, 2007b, 2008, 2009, 2010, 2011, 2013). Portanto, as
variáveis transformadas (e.g. viagens de pesca, consumo de combustível, emissões de
carbono) foram projetadas para a totalidade da pesca industrial de arrasto registrada em Santa
Catarina (Tabela 1). Não foram feitas tentativas para projetar estes números para todo Sudeste
e Sul do Brasil, pois isto exigiria o registro completo dos desembarques em outros estados
(principalmente São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul) que não estão disponíveis ou
são incomparáveis com as amostragens feitas em Santa Catarina. Mas assume-se que estes
dados são altamente representativos de toda a região uma vez que, os portos de Santa Catarina
abrigam quase 60% de toda a frota e registram anualmente 50-70% dos desembarques da frota
industrial de arrasto (Perez et al., 2001). Além disso, o volume dos descartes não foi incluído
na análise devido à falta de dados sobre os mesmos. Esta fração pode chegar a 30-40% das
capturas totais obtidas pela frota de arrasto industrial (Perez et al., 2001).
Os dados de capturas (kg), esforço (horas de arrasto) e todas as variáveis de cada
viagem de pesca foram atribuídos a quadrantes de 30’ x 30’ de acordo com as informações
dos mestres das embarcações. Em viagens onde os dados individuais de arrasto não estavam
disponíveis, os valores de capturas e esforço foram divididos, igualmente, entre todos os
quadrantes visitados (UNIVALI/CTTMar, 2010).
30
Tabela 1. Resumo da frota de arrasto industrial e das viagens de pesca monitoradas em portos de Santa Catarina,
Sul do Brasil, entre 2003 e 2011. Os dados são agregados por tipo de embarcação e ano.
Tipo de arrasto Ano Barcos Viagens de pesca Potência do motor (hp)
Min Max
Duplo
2003 275 1133 115 390
2004 271 1021 115 425
2005 293 1096 113 600
2006 315 1300 115 600
2007 320 1577 115 600
2008 288 1409 113 600
2009 325 1570 107 600
2010 277 1215 110 425
2011 268 1187 113 425
Média±dp 292,4 ± 22,2 1278,7 ± 201,5 112,9 ± 2,8 518,3 ± 97,4
Simples
2003 26 151 261 750
2004 25 98 261 750
2005 39 108 195 750
2006 23 105 290 392
2007 25 112 267 392
2008 28 101 267 392
2009 26 175 260 385
2010 33 230 180 425
2011 29 204 291 392
Média±dp 28,2 ± 5,0 142,7 ± 49,7 252,4 ± 38,8 514,2 ± 177,2
Parelha
2003 46 292 190 380
2004 46 203 180 380
2005 48 217 190 380
2006 45 214 160 380
2007 39 294 195 425
2008 33 205 190 425
2009 27 195 160 425
2010 24 166 190 425
2011 26 141 160 425
Média±dp 37,1 ± 9,7 214,1 ± 50,8 179,4 ± 15,1 405,0 ± 23,7
Todos barcos
(2003-2011)
Média±dp 357,8 ± 23,6 1635,4 ± 217,7 181,6 ± 62,5 479,2 ± 125,0
Total - 14719 - -
Transformação dos dados
A quantidade total de combustível consumido durante cada viagem de pesca foi
estimada a partir do total de horas de arrasto e as características dos motores dos barcos,
seguindo uma equação geral estabelecida pelo Ministério da Pesca e Aquicultura na Instrução
Normativa nº 10, de 14 de outubro de 2011 (Brasil, 2011) descrita a seguir:
31
𝐹𝐶𝑒𝑖 = 𝑇𝐻𝑒𝑖 × 𝐹𝐻𝑃 × 𝐻𝑃𝑒 (Equação 1)
onde 𝐹𝐶𝑒𝑖 é a quantidade de litros de combustível consumido pelo barco (e) durante a viagem
de pesca (i); 𝑇𝐻𝑒𝑖 é a quantidade de horas de arrasto do barco (e) durante a viagem (i); 𝐹𝐻𝑃 é
a quantidade de litros de combustível consumidos por hora por HP de potência do motor
utilizado (valor constante definido como 0,0963 l/HP para os barcos de arrasto industrial); e
𝐻𝑃𝑒 é a potência do motor do barco (e). A intensidade de uso de combustível de cada viagem
de pesca (𝐹𝑈𝐼𝑖) foi expressa pela relação:
𝐹𝑈𝐼𝑖 = 𝐹𝐶𝑒𝑖
𝐿𝐶𝑖
(Equação 2)
onde 𝐿𝐶𝑖 é a captura desembarcada (em kg) da viagem (i).
O balanço de carbono no contexto deste estudo é definido como a relação estabelecida
entre a quantidade de carbono retirado do ambiente marinho e a quantidade de carbono
emitido para a atmosfera por meio do consumo de combustíveis fósseis pelas operações de
arrasto. Para avaliar essa relação, a biomassa desembarcada (kg), por cada viagem de pesca,
foi inicialmente transformada em unidades (gigagramas) de carbono (𝐶𝑖), usando a equação:
𝐶𝑖 = 𝐿𝐶𝑖/𝐶𝑅
1000000
(Equação 3)
onde 𝐶𝑅 é a proporção de conversão de biomassa/carbono, considerada como sendo 9: 1
(Pauly & Christensen, 1995; Ziegler, 2006; Ziegler & Valentinsson, 2008; Fulton, 2010).
Posteriormente, o combustível consumido durante cada viagem de pesca foi convertido para
uma unidade comum definida como tEP (BRASIL, 1999), em que 1 tEP = 45,2 x 10-3
Tera-
Joules (TJ = 1012 Joules), usando a equação proposta por Álvares Júnior & Linke (2002),
Macêdo (2004) e Pinto & Santos (2004):
𝐸𝐶𝑒𝑖 = 𝐹𝐶𝑒𝑖 × 𝐹𝑐𝑜𝑛𝑣 × 45,2 × 10−3 × 𝐹𝑐𝑜𝑟𝑟 (Equação 4)
Nesta equação 𝐸𝐶𝑒𝑖 é a energia dissipada pela embarcação (e) durante a viagem de
pesca (i) expressa em TJ; 𝐹𝑐𝑜𝑛𝑣 é o fator de conversão da unidade física de medida da
32
quantidade de combustível para tEP, com base no poder calorífico superior (PCS) do
combustível, conforme determinado anualmente pelo Balanço Energético Nacional -
Ministério de Minas e Energia (EPE, 2011). O valor utilizado foi o determinado para o óleo
diesel náutico em 2010: 0,848 tEP/m3. Os valores de 𝐹𝐶𝑒𝑖 foram convertidos de litros para m
3.
𝐹𝑐𝑜𝑟𝑟 é o fator de correção de PCS para PCI (poder calorífico inferior). No Balanço
Energético Nacional, o conteúdo energético tem como base o PCS, mas para o IPCC
(Intergovernmental Panel on Climate Change), a conversão para unidade comum de energia
deve ser feita pela multiplicação do consumo pelo PCI. Para combustíveis sólidos e líquidos o
Fcorr = 0,95, (Brasil, 2006).
A quantidade de carbono emitida pelo consumo de combustível durante as operações
da pesca de arrasto foi calculada usando a seguinte equação (Álvares Júnior & Linke, 2002;
Macêdo, 2004; Pinto & Santos, 2004):
𝐶𝐸𝑒𝑖 = 𝐸𝐶𝑒𝑖 × 𝐹𝑒𝑚𝑖𝑠𝑠 × 10−3 (Equação 5)
onde 𝐶𝐸𝑒𝑖 é o carbono emitido pela embarcação (e) durante uma viagem de pesca (i),
expressa em Giga gramas de Carbono (GgC = 1000 toneladas de carbono); 𝐹𝑒𝑚𝑖𝑠𝑠 é o fator
de emissão de carbono, expresso em toneladas de carbono (tC) por Tera-joule (TJ), que para o
diesel corresponde a 20,2 tC/TJ (IPCC, 1996; Brasil, 2006). Este fator é multiplicado por 10-3
,
a fim de expressá-lo em GgC. Finalmente, o balanço de carbono de cada viagem de pesca foi
expresso como uma razão entre 𝐶𝐸𝑒𝑖/𝐶𝑖.
A fim de que fosse possível a comparação com outros trabalhos semelhantes, realizou-
se a conversão dos valores obtidos em Giga gramas de Carbono (GgC) para toneladas de
Dióxido de Carbono (CO2), usando a seguinte equação (Macêdo, 2004):
𝐸𝐶𝑂2 = (𝐶𝐸𝑒𝑖 ×44
12) × 1000
(Equação 6)
Finalmente, a fim de verificar a área efetivamente utilizada pela frota industrial de
arrasto da região Sudeste/Sul do Brasil, estimou-se a área disponível para a mesma
(delimitada pelos paralelos 19°S - 35°S e pela isobata de 2.000 m), usando o software
ArcGIS® (ESRI - Environmental Systems Research Institute, Inc.).
33
Análise dos dados
A obtenção de estimativas agregadas de consumo de combustível, intensidade de uso
do combustível, emissões de carbono e balanço de carbono da pesca de arrasto industrial na
região Sudeste/Sul do Brasil foi o principal objetivo deste estudo. Nesse sentido, essas
variáveis transformadas foram agrupadas por ano e para todo o período do estudo. Os padrões
de variabilidade temporais (estações, anos) e espaciais (quadrantes, latitude), potencialmente
influenciados pelas estratégias de pesca adotadas pela frota de arrasto, também foram
explorados (Fig. 1). Quando atendidos os pressupostos estatísticos, estes valores foram
testados através da Análise de Variância unifatorial (ANOVA). Nos casos em que um dos
pressupostos da ANOVA não foi atendido, aplicou-se o teste não paramétrico de Kruskal-
Wallis (Day & Quinn, 1989; Zar, 2010). Todas as análises foram realizadas em ambiente SIG
(Sistema de Informação Geográfica), utilizando o software ArcGIS® (ESRI - Environmental
Systems Research Institute, Inc.).
Fig. 1. Fluxograma da obtenção, transformação e análise dos dados da frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul
do Brasil, no período de 2003 – 2011.
Pesca industrial de arrasto de fundo
Arrasto de camarões Arrasto de talude Arrasto de parelhas
Estratégias de pesca
Esforço pesqueiro (horas de arrasto)
2003 - 2011
Biomassa desembarcada (kg) Consumo de combustível (litros)
Emissões de C (GgC) Remoção de biomassa (GgC)
Emissões de CO2 Balanço de Carbono
Georreferenciamento – SIG (ArcGIS)
34
RESULTADOS
Consumo de combustível e intensidade de uso
Durante o período de estudo (2003-2011) a frota industrial de arrasto desembarcou,
anualmente, 28.000-45.000 toneladas de peixes, crustáceos e moluscos nos portos de Santa
Catarina (Fig. 2). Esta produção resultou de 570-1.518 viagens de pesca monitoradas por ano
realizadas pelas embarcações de arrasto industrial, nas três estratégias de pesca pré-definidas
(Fig. 2). Desembarques da estratégia de pesca de arrasto de camarões (AC) predominaram,
durante todo o período, sobre as outras estratégias. Desembarques das estratégias de pesca de
arrasto de camarões (AC) e de arrasto de talude (AT) aumentaram a partir de 2006, com o
arrasto de parelhas (AP) permanecendo relativamente estável ao longo de todo o período. As
três estratégias de pesca de arrasto contribuíram igualmente para os desembarques anuais de
biomassa, com exceção do arrasto de talude, que foi consideravelmente mais produtivo do
que as outras estratégias nos últimos cinco anos do período de estudo (Fig. 2).
Todas as estratégias de pesca que operam ao largo da costa Sudeste e Sul do Brasil,
durante todo o período de nove anos, consumiram cerca de 141,5 milhões de litros de diesel;
em média, 15,7 milhões de litros por ano (dp = 1,682 milhões de litros) (Tabela 2). Quase a
metade desse montante (48,42%) foi consumida pelo arrasto de camarões, e a outra metade
em conjunto pelo arrasto de talude (32,82%) e o arrasto de parelhas (18,76%). Juntas, estas
três estratégias de pesca de arrasto desembarcaram 342,3 milhões kg de peixes, crustáceos e
moluscos, usando 0,413 litros de combustível por kg desembarcado (413 litros/tonelada).
O arrasto de camarões utilizou quase o dobro de combustível por kg de biomassa
desembarcada do que as outras estratégias de pesca (~0,6 l/kg) (Tabela 2). Esta intensidade de
uso do combustível aumenta em 316% e 1025%, quando são considerados apenas os
desembarques das principais espécies-alvo desta estratégia de pesca, ou seja, todas as espécies
de camarões e Farfantepenaeus spp. + Xiphopenaeus kroyeri, respectivamente (Fig. 3). O
mesmo padrão foi observado para o arrasto de talude e para o arrasto de parelhas (Fig. 3). A
pesca de arrasto realizada em áreas ao sul de 25°S (intervalos Centro e Sul) consumiu 78,6%
de todo o combustível utilizado pela frota no período de estudo, mas também produziu 87%
da biomassa desembarcada (Tabela 2). Estas operações exigiram menos energia (0,31-0,49
l/kg) do que aquelas realizadas ao norte de 25°S (0,71 l/kg). Este efeito latitudinal no uso de
combustível mostrou-se significativo em todas as estratégias de pesca (teste de Kruskal-
Wallis, p <0,05), exceto quando comparados os intervalos Norte e Centro da estratégia de
pesca de parelhas (teste de Kruskal-Wallis, p = 0,5726); o menor consumo de combustível por
35
biomassa desembarcada foi registrado pelas operações nas áreas mais ao sul (Fig. 4). Os
efeitos sazonais não foram significativos na intensidade de uso de combustível para a
estratégia de arrasto de talude (ANOVA, p = 0,3576). Para o arrasto de camarões, existe
diferença na intensidade de uso de combustível entre o primeiro e o terceiro trimestres
((ANOVA – Tukey, p < 0,01), com uma tendência a um maior consumo de combustível no
segundo semestre. Por sua vez, para o arrasto de parelhas existe diferença na intensidade de
uso de combustível entre o segundo trimestre comparado com o terceiro e quarto trimestres
(ANOVA – Tukey, p < 0,05 e p < 0,01, respectivamente), com uma tendência a um menor
consumo de combustível no segundo semestre (Fig. 4).
Fig. 2. Variação anual da biomassa desembarcada (A) e número de desembarques (B) das operações de pesca de
industrial de arrasto do Sudeste e Sul do Brasil, de 2003 a 2011, e a contribuição relativa das três estratégias de
pesca: arrasto de camarões (shrimp), arrasto de talude (slope) e arrasto de parelhas (pair).
36
Tabela 2. Síntese dos valores registrados pelos mestres das embarcações nos diários de bordo ou durante as
entrevistas no momento do desembarque, no período 2003-2011, extrapolados para a totalidade da pesca de
arrasto registrada em Santa Catarina (UNIVALI/CTTMar, 2004, 2006, 2007a, 2007b, 2008, 2009, 2010, 2011,
2013). CC=consumo de combustível estimado em litros; BD=biomassa desembarcada (kg e GgC); EC=emissões
de carbono (GgC) a partir do combustível consumido durante as operações de arrasto. GgC=Giga gramas de
Carbono; AC=arrasto de camarões; AT=arrasto de talude; AP=arrasto de parelhas; Norte=latitudes ao norte de
25°S; Centro=latitudes entre 25° e 29°S; Sul=latitudes ao sul de 29°S.
CC
(litros)
BD
(kg) CC/BD
EC
(GgC)
CO2
(ton)
BD
(GgC) EC/BD
Estratégia
de pesca
AC 68.507.789,32 102.156.749,52 0,67 50,39 184.764,55 11,35 4,44
AT 46.438.360,43 127.379.294,56 0,36 34,16 125.244,89 14,15 2,41
AP 26.545.362,96 112.764.857,08 0,24 19,53 71.592,70 12,53 1,56
Todas 141.491.512,71 342.300.901,16 0,41 104,07 381.602,14 38,03 2,74
Latitude
Norte 30.304.507,81 42.886.503,13 0,71 22,29 81.730,64 4,77 4,68
Centro 52.845.498,51 108.854.028,95 0,49 38,87 142.523,91 12,09 3,21
Sul 58.341.506,39 190.560.369,08 0,31 42,91 157.347,59 21,17 2,03
A intensidade anual do uso de combustível da frota de arrasto variou de 0,36 a 0,48
l/kg (média = 0,42 ± 0,05 l/kg). Foi observada uma tendência de queda na variação interanual
da intensidade de uso de combustível no arrasto de parelhas (p = 0,0085). Apesar de também
haver uma diminuição da intensidade de uso de combustível no arrasto de camarões e no
arrasto de talude, ao longo dos anos avaliados, a mesma não é significativa para estas
estratégias de pesca (p = 0,2703 e p = 0,2056, respectivamente) (Fig. 5). Esta tendência de
queda foi encontrada nas operações do arrasto de camarões, quando foram considerados
apenas os desembarques de camarão-rosa e camarão-sete-barbas (p = 0,0023), e também as
duas espécies de peixes ósseos (U. canosai e P. punctatus) presentes em abundância nos
desembarques (p = 0,0123). O mesmo efeito, no entanto, não foi significativo para outros
camarões costeiros (A. longinaris e P. muelleri), capturados principalmente nas áreas do sul
(p = 0,6300).
Uma das três principais espécies-alvo do arrasto de talude, a abrótea-de-profundidade
(U. mystacea), também apresentou uma tendência interanual decrescente de intensidade uso
de combustíveis (p = 0,0474). Quando foram considerados os desembarques individuais de
espécies-alvo do arrasto de parelhas, este efeito foi significativo apenas para M. furnieri (p =
0,0377).
37
Fig. 3. Intensidade de uso de combustível (l/kg), no período de 2003-2011, pelas estratégias de pesca e suas
espécies-alvo. Shrimp trawlers (arrasto de camarões): Total=total da biomassa desembarcada; all
shrimps=biomassa total de camarões desembarcada; pink + bobtail shrimps=Farfantepenaeus spp. +
Xiphopenaeus kroyeri; coastal shrimps=Artemesia longinaris + Pleoticus muelleri; demersal fish=Umbrina
canosai + Prionotus punctatus; Slope trawlers (arrasto de talude): Total= total da biomassa desembarcada; all
target=Urophycis mystacea + Merluccius hubbsi + Lophius gastrophysus + U. canosai + P. punctatus; Pair
trawlers (arrasto de parelhas): Total=total da biomassa desembarcada; all target=U. canosai + Micropogonias
furnieri + Cynoscion guatucupa + C. acoupa + C. jamaicensis. As caixas indicam o primeiro e terceiro percentis
(25 e 75%), o traço no centro indica a mediana e as barras de erro indicam os valores máximo e mínimo.
38
Fig. 4. Variação latitudinal e sazonal da intensidade de uso do combustível (l/kg) apresentado pelo arrasto de
camarões (AC), talude (AT) e parelhas (AP), no Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011.
Norte=latitudes ao norte de 25°S; Centro=latitudes entre 25° e 29°S; Sul=latitudes ao sul de 29°S. Trimestres:
1=Janeiro-Março; 2=Abril-Junho; 3=Julho-Setembro; 4=Outubro-Dezembro. As caixas indicam o primeiro e
terceiro percentis (25 e 75%), o traço no centro indica a mediana e as barras de erro indicam os valores máximo
e mínimo.
Fig. 5. Variação interanual da intensidade de uso de combustível do arrasto de camarões (AC), talude (AT) e
parelhas (AP), do Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011.
39
Balanço de carbono e emissões de CO2
O combustível consumido, pelas operações de arrasto no período 2003-2011, resultou
em uma emissão total de 104,07 GgC e 381.602,14 tCO2 para a atmosfera, quase 2,74 GgC e
1,11 tCO2 emitidas para cada GgC e tonelada de biomassa desembarcadas, respectivamente.
A Tabela 2 apresenta os valores absolutos de emissões de Carbono e CO2 e os valores do
balanço de Carbono, agrupados por estratégia de pesca de arrasto e intervalos de latitude.
Considerando que as emissões de Carbono são proporcionais ao consumo de combustível, os
padrões de variabilidade se repetem conforme os encontrados para a intensidade de uso de
combustível e, portanto não são novamente descritos. Além disto, em função do esforço de
pesca ser correlacionado com o número de desembarques, as emissões de Carbono também
apresentam uma forte correlação com a biomassa desembarcada (Fig. 6). Neste sentido, pode
ser generalizado que (a) o arrasto de camarões (AC) produziu os maiores níveis de emissões
de Carbono (e CO2) e também os mais altos índices de balanço de Carbono (determinado por
seus numerosos desembarques e relativamente baixa biomassa desembarcada,
respectivamente), seguido pelo arrasto de talude (AT) e o arrasto de parelhas (AP), e (b) as
emissões de Carbono aumentam de Norte para Sul, sendo que o padrão inverso é apresentado
pelo balanço de Carbono (porque a biomassa desembarcada aumenta em direção ao Sul)
(Tabela 1). Em conjunto todas as estratégias de pesca emitem anualmente para a atmosfera
36.800-49.500 tCO2 (média 42.400,24 ± 4.535,70) e 0,05-0,07 tCO2 por km2 de área de pesca
disponível.
Fig. 6. Variação das emissões de Carbono para a atmosfera pelas operações de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil,
durante 2003-2011 e a sua biomassa desembarcada. Ambas as variáveis foram convertidas para Giga gramas de
Carbono (GgC).
40
Custos ambientais de pesca de arrasto
A biomassa desembarcada e as emissões de Carbono foram mais significativas nas
áreas da plataforma continental ao sul de 25°S (Fig. 7). No entanto, quando examinamos o
balanço de Carbono, os intervalos de latitude Centro e Norte apresentam um alto custo
ambiental ao longo do ano (Fig. 8), ou seja, na maioria dos quadrantes os valores agregados
de Carbono emitido para a atmosfera são muito maiores que a quantidade de Carbono
desembarcado como pescado, oriundo destes mesmos quadrantes. Este cenário é observado
principalmente durante o inverno e (a) na plataforma interna entre 25°S e 27°S, onde o arrasto
se concentra para a pesca do camarão-rosa e o camarão-sete-barbas, e (b) nas áreas de talude
ao norte de 27°S (Fig. 8).
Fig. 7. Distribuição espacial da biomassa desembarcada (Landed Biomass) e das emissões de Carbono para a
atmosfera (Carbon Emissions) da frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011.
DISCUSSÃO
Os custos ambientais e os impactos da maior atividade pesqueira industrial de arrasto
do Brasil foram abordados através de estimativas de consumo de combustível, intensidade de
uso do combustível e emissões de gases de efeito estufa. Uma análise detalhada dos números
apresentados, no entanto, deve considerar que eles foram subestimados, em certa medida,
devido aos efeitos combinados de fatores que limitaram (a) a estimativa precisa do consumo
de combustível de cada viagem de pesca e/ou (b) a extrapolação dos valores para toda frota e
capturas na região.
41
Fig. 8. Distribuição espacial do balanço de Carbono das operações da pesca de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil,
no período de 2003-2011, por trimestres (A=Janeiro-Março; B=Abril-Junho; C=Julho-Setembro; D=Outubro-
Dezembro).
Estes efeitos foram essencialmente direcionados pela natureza dos dados analisados,
que permitiu a estimativa do consumo de combustível durante o tempo de arrasto, mas não
durante o deslocamento da embarcação entre os portos e as áreas de pesca, e entre cada área
de pesca. O arrasto de fundo é considerado uma modalidade de pesca de alto consumo de
combustível, que pode utilizar três vezes mais energia durante a operação de arrasto
propriamente dita, do que nos deslocamentos entre uma área e outra (Notti et al., 2012).
Portanto, o consumo de combustível e as emissões de gases estimados neste estudo podem ser
aumentados em 30% ou mais, dependendo (a) da distância das principais áreas de pesca e os
portos de desembarque em Santa Catarina e (b) a relação entre a distância das principais áreas
42
de pesca e o esforço (horas de arrasto). Neste sentido, por exemplo, Perez et al. (2007)
demonstraram que as embarcações de arrasto duplo que operaram no litoral de Santa Catarina
na década de 1990, estabeleceram uma correlação positiva entre a distância até as áreas de
pesca e o esforço, um cenário que tem a tendência de manter estável a relação entre o
consumo de combustível durante o deslocamento e durante as operações de arrasto
propriamente ditas (e.g. 30%). Considerando os efeitos adicionais de embarcações de arrasto
que operam em pelo menos três portos não monitorados neste estudo (Rio Grande, Santos e
Rio de Janeiro), as quantidades absolutas estimadas de consumo de combustível e emissões de
gases podem ter excedido substancialmente os valores obtidos. Uma simulação assumindo
30% e 40% de aumento dos efeitos devido ao consumo de combustível referente aos
deslocamentos (entre portos e áreas de pesca; e entre as áreas de pesca) e as embarcações não
monitoradas, respectivamente, resultaria em quase o dobro dos valores originais (e.g.
257.514.553,13 litros de combustível consumido, 189,4 GgC e 694.515,90 tCO2 emitidas
para a atmosfera durante todo o período).
No geral, considerando as incertezas discutidas acima, temos que as embarcações de
arrasto que operaram no Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011, consumiram entre
13.600.000 e 18.400.000 de litros, ou 11.560-15.640 toneladas de diesel por ano
(considerando a densidade do diesel como 0,85). Estes números representam 5,4-21,7% do
combustível consumido anualmente por toda a indústria de alimentos do país, no mesmo
período (72-237 mil toneladas) (EPE, 2013). O óleo diesel é uma fonte pouco importante de
energia para esta indústria. No entanto, este montante global de combustível necessário para a
produção de frutos do mar, que atualmente representa cerca de 1,5% da dieta diária do
brasileiro (em gramas) (IBGE, 2011), não é insignificante, considerando que o estudo
abordou uma determinada região (Sudeste/Sul) e apenas uma fração da indústria pesqueira. A
produção de tais benefícios também gera custos ambientais, aqui caracterizados pela emissão
para a atmosfera de cerca de 36.800-90.100 tCO2 por ano. Este montante é de
aproximadamente 1,9% do total anual de CO2 emitido pela indústria de alimentos no Brasil,
porém novamente se destaca que a energia consumida por esta indústria é em grande parte
derivada de outras fontes que não o diesel (e.g. bagaço de cana-de-açúcar, energia
hidrelétrica, lenha, etc.) (EPE, 2013). Não obstante, as emissões de Carbono não aparecem
como um grande custo ambiental da pesca industrial de arrasto, cuja neutralização exigiria
anualmente uma área limitada (3.800-9.700 ha) de floresta nativa no Sul do Brasil, de acordo
com as taxas de captura de carbono (1,4-2,6 tC/ha ano) estimadas por Pellico Neto et al.
(2008) e Lima et al. (2007).
43
Em termos de intensidade de uso de combustível, as estimativas anuais obtidas para o
período 2003-2011 (356-483 litros de diesel por tonelada desembarcada) também podem ser
aumentadas em 30%, considerando os deslocamentos entre áreas de pesca e portos e entre
cada área de pesca (vide acima), atingindo cerca de 463-628 litros de diesel por tonelada
desembarcada. Este intervalo de valores sugere uma utilização de combustível abaixo da
média mundial (620 l/ton., Tyedmers et al., 2005) e do registrado para a atividade pesqueira
de várias regiões (1.410 l/ton., Ziegler & Hansson, 2003; Tyedmers, 2004; 640–4.710 l/ton.,
Degnbol, 2009; 280–1.500 l/ton., Furuya et al., 2011). Por outro lado, considerando uma área
total de pesca no Sudeste e Sul do Brasil (delimitada pelos paralelos 19°S - 35°S e pela
isobata de 2.000 m) de 502.190 km2 (ver Capítulo 2), teria-se em média um consumo de 512
litros de óleo diesel por km2, o que está acima das estimativas pretéritas realizadas para a
região (100 – 300 litros por km2, Tyedmers et al., 2005) e se aproxima dos níveis de utilização
praticados para, por exemplo, a plataforma patagônica, área de elevada produção pesqueira do
Atlântico Sul. No entanto tal percepção não parece realista, essencialmente porque todas as
estratégias de pesca de arrasto (AC, AT e AP) reduzem sua intensidade de uso de combustível
pela captura e desembarque de muito mais biomassa do que aquela obtida pelas espécies-alvo
de cada estratégia. Esta é uma estratégia oportunista de diversificação das capturas para
aumentar o rendimento total, bem caracterizada em avaliações anteriores da dinâmica desta
pescaria (Perez & Pezzuto, 1998, 2006; Perez et al., 2001, 2007; Benincá, 2013). Quando são
considerados apenas os desembarques das espécies-alvo, a intensidade de uso de combustível
das viagens de pesca individuais sobe para níveis comparáveis aos relatados para outras
pescarias de arrasto de fundo, em todo o mundo, que normalmente se concentram em
espécies-alvo (Fig. 9). A exceção é a pesca de arrasto parelhas, que tem uma intensidade
menor de uso de combustível, durante o período analisado. Os baixos valores obtidos para a
intensidade de uso de combustível podem ser explicados pelo maior volume de biomassa
desembarcada (aproximadamente 33% do total desembarcado pela frota industrial de arrasto
em Santa Catarina), com uma frota muito menor (média de 37,1 ± 9,7 dp) e potência de motor
menor (mín. 179,4 hp ± 15,1 dp;. máx. 405,0 hp ± 23,7 dp) do que o arrasto de camarões e o
arrasto de talude em conjunto (vide Tabela 1).
44
Fig. 9. Intensidade de uso de combustível da pesca de arrasto de fundo no mundo. Referências: 1 = Ziegler &
Hansson (2003); 2–8 = Furuya et al. (2011); 9–19 = Tyedmers (2004). Linhas tracejadas horizontais = valores
obtidos por este trabalho para o arrasto de camarões (Shrimp), talude (Slope) e parelhas (Pair), para o
desembarque da totalidade das espécies-alvo.
Os valores das principais espécies-alvo, bem como seus padrões de distribuição
temporal e espacial parecem desempenhar um papel importante na variabilidade observada na
intensidade de uso de combustível e na emissão de gases de efeito estufa da pesca de arrasto.
O arrasto de camarões, por exemplo, foi o que mais frequentemente consumiu e emitiu os
maiores valores de combustível e CO2, respectivamente. Uma vez que a abundância de
camarões é limitada e concentrada no espaço e no tempo, as suas capturas são baixas e
requerem um maior consumo de combustível e emitem mais CO2 para a atmosfera do que as
outras estratégias de pesca de arrasto. No entanto, vários fatores são responsáveis por seu
relativo sucesso na região. Em primeiro lugar, os camarões tem alto valor de mercado no
Brasil, ou seja, o camarão-rosa (Farfantepenaeus spp.) representa, em média, 4% da biomassa
desembarcada e 35% da receita total total (Benincá, 2013). Portanto, os custos extras de
combustível tendem a ser compensados pelas receitas totais das operações de pesca. Em
segundo lugar, porque as atuais autorizações de pesca permitem que as embarcações de
arrasto atuem sobre diferentes estoques, por exemplo, embarcações licenciadas para a pesca
do camarão-rosa e camarão-sete-barbas em áreas ao norte, durante o outono-inverno, podem
atuar sobre os estoques de A. longinaris e P. muelleri, em áreas mais costeiras no sul, durante
os meses de primavera-verão. Enquanto estas são áreas mais distantes e as espécies de
camarão são menos valiosas do que o camarão-rosa, as capturas são elevadas e contribuem
para equilibrar o desempenho econômico do arrasto de camarões a cada ano (Benincá, 2013).
A alternância entre os estoques mais valiosos e os mais abundantes, durante o ano, podem
45
produzir a diminuição observada na intensidade de uso de combustível, desta estratégia de
pesca, de norte a sul.
Um cenário semelhante pode explicar os padrões exibidos pelo arrasto de talude, que
começou a operar em 2000, particularmente focado nos recursos de águas profundas,
sobretudo a merluza, abrótea-de-profundidade e peixe-sapo (Perez et al., 2002; Perez &
Pezzuto, 2006). Estes recursos são menos produtivos do que os peixes ósseos explorados na
região da plataforma (Perez, 2006) e exigem o deslocamento para áreas de pesca mais
distantes e arrastos mais longos. Portanto, é o alto valor comercial e não os volumes das
capturas desses recursos, particularmente do peixe-sapo cujas capturas são destinadas à
exportação (Perez et al., 2009), que motivam esta estratégia de pesca cujo consumo de
combustível é elevado, principalmente nas áreas de pesca mais ao norte, onde estão as
concentrações de peixe-sapo, merluza e abrótea-de-profundidade (Perez & Pezzuto , 2006).
Em conjunto, as operações do arrasto de camarões e de talude determinam o
estabelecimento de áreas onde a pesca de arrasto possui altos custos ambientais, por exemplo,
onde a quantidade de Carbono emitida pelo consumo de combustíveis é igual ou superior ao
equivalente em Carbono, extraído do ambiente marinho, através da biomassa desembarcada.
Estas áreas contrastam com a plataforma continental sul, onde as capturas elevadas reduzem a
intensidade de uso de combustível. Além de extensa, esta área da plataforma é sazonalmente
enriquecida por águas produtivas do estuário do Rio da Prata e pela corrente das
Malvinas/Falkland, que sustentam a maior parte da pesca demersal do Brasil (Haimovici et
al., 2006; Rossi-Wongtshchowski et al., 2006).
A redução do consumo de combustível pela frota de arrasto (e.g. através do uso de
motores mais econômicos) e/ou o aumento dos desembarques das espécies-alvo pode causar a
tendência de redução da intensidade de uso de combustível observada ao longo do período de
estudo. Apesar de não haver nenhuma evidência empírica, atualmente disponível, que sustente
esta hipótese, a biomassa desembarcada de pelo menos três importantes espécies-alvo, do
arrasto de camarões e de talude, o camarão-rosa, o camarão-sete-barbas e a abrótea-de-
profundidade, aumentou aproximadamente 2,5 vezes de 2003 a 2011 (UNIVALI/CTTMar,
2004, 2006, 2007a, 2007b, 2008, 2009, 2010, 2011, 2013). Estes estoques não tem sido
continuamente avaliados, portanto um potencial aumento na sua abundância e/ou
capturabilidade no Sudeste/Sul do Brasil é, atualmente, incerto.
46
CONCLUSÕES
A quantidade de combustível consumido pela pesca de arrasto industrial mais
produtiva do Brasil e a emissão resultante de gases de efeito estufa foram estimados, pela
primeira vez. Consistente com as estimativas produzidas por Tyedmers et al. (2005) para a
região, os valores anuais parecem baixos quando comparados com áreas mais produtivas e
com grande volume de pesca no mundo, porém são maiores do que o previamente estimado
para a região. Estes valores também parecem limitados quando comparados com o
desempenho da indústria brasileira de alimentos e aparentemente as emissões podem ser
neutralizadas por uma área limitada da floresta nativa. Estas conclusões, no entanto, requerem
algum cuidado, pois essas estimativas incorporam um número considerável de incertezas que
precisam ser melhor detalhadas, por exemplo, em estudos futuros sobre o consumo de
combustível de viagens individuais de pesca.
A frota brasileira de arrasto reduz a intensidade de uso de combustível através do (a)
desembarque de uma grande fração de suas capturas que incluem muito mais espécies do que
suas espécies-alvo, e (b) pela exploração de diferentes áreas de pesca e recursos durante o
ano, alternando entre aqueles com maior abundância e aqueles com maior valor. Enquanto a
grande diversidade de espécies-alvo são características de pesca em ecossistemas tropicais,
tais estratégias têm sido altamente influenciadas por políticas de pesca multiespecíficas.
A demanda por pescados de alto valor, como o camarão-rosa e os peixes de águas
profundas, pode induzir a concentração de custos ambientais (consumo de combustíveis
fósseis, emissões de CO2) em áreas relativamente pequenas. É importante que essas relações
de custo/benefício sejam consideradas em avaliações futuras da pesca industrial de arrasto e
desempenhem um papel de orientação na criação de políticas e incentivos econômicos para a
atividade pesqueira no país.
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CAPÍTULO 2
EVOLUÇÃO DA “PEGADA ESPACIAL” DA PESCA INDUSTRIAL DE ARRASTO
DA MARGEM CONTINENTAL DO SUDESTE E SUL DO BRASIL
53
RESUMO
Este estudo estabelece pela primeira vez a “pegada espacial” (spatial footprint) da frota
industrial de arrasto do Sudeste e Sul do Brasil, sendo que também foram estimadas a área
varrida e o Índice de Utilização (área varrida/área disponível) desta frota. Além disto, como
uma medida de custo/benefício do arrasto, a biomassa desembarcada acumulada foi expressa
como uma proporção da área varrida acumulada (Índice da Biomassa-Área varrida). Estes
valores foram calculados para todo o período de estudo e anualmente de 2003 a 2011. Estas
variáveis foram mapeadas e os valores obtidos foram alocados em quadrantes de 30’ × 30’,
sendo que seus padrões de variabilidade foram associados a diferentes estratégias de pesca
(arrasto de camarões, arrasto de talude e arrasto de parelhas); intervalos de latitude (Norte,
19° - 25°S; Centro, 25°- 29°S; Sul, 29°- 34°S); intervalos de profundidade (<75m, 75 – 100m,
100 – 200m, >200m); e tipos de substrato. A análise dos resultados obtidos forneceu uma
avaliação preliminar da área da margem continental provavelmente utilizada (e impactada)
pela maior pesca de arrasto industrial do Brasil. Impactos do arrasto no substrato foram
produzidos principalmente pela estratégia de pesca de arrasto de camarões. Em comparação
com as outras estratégias, estas embarcações utilizaram a área mais extensa da plataforma e
perturbaram mais a superfície dos habitats de areia/lama para produzir o menor volume de
biomassa desembarcada. A delimitação da "pegada" da pesca industrial de arrasto do Sudeste
e Sul do Brasil e suas áreas "núcleo" compõe um primeiro passo para avaliar o impacto em
tais áreas, fornecendo informações preliminares para futuras ações de gestão ecossistêmica da
pesca e estratégias de planejamento espacial marinho.
Palavras-chave: pegada espacial; área varrida; pesca de arrasto; Sudeste e Sul do Brasil.
ABSTRACT
This study establishes for the first time the spatial footprint of the industrial trawl fishing fleet
operating off southeastern and southern Brazil. Also the swept area and the Utilization Index
(swept area/available area) of this fleet were estimated. Moreover, as a measure of
costs/benefits of trawling the cumulative landed biomass was expressed as a proportion of the
cumulative swept area (Biomass-Swept Area Index). These values were calculated annually
between 2003 and 2011 and cumulatively for the entire 9-year period. These variables were
mapped and the values obtained were divided into quadrants of 30’× 30’, and their patterns of
variability were associated to fishing strategies (shrimp trawling, slope trawling and pair
54
trawling); latitudinal strata (North, 19° - 25°S; Center, 25°- 29°S; South, 29°- 34°S); depth
strata (<50m, 50 – 100m, 100 – 200m, >200m); and substrate types. The analysis of the
results provided a preliminary assessment of the area of the continental margin likely
demanded (and impacted) by Brazil’s largest industrial trawl fishing. Trawling impacts on the
substrate were primarily produced by the dominating shrimp trawling strategy. In comparison
with other strategies, these vessels used the most extensive shelf area, and disturbed more
sand/mud habitat surface to produce less landed biomass. Delimiting the trawl fishery
footprint off Southeastern and Southern Brazil and its main core areas comprised a first step
towards in evaluating fishing impact in such areas, providing preliminary information for
future ecosystem-based fisheries management and marine spatial planning strategies.
Keywords: spatial footprint; swept area; trawling; Southeast and South of Brazil.
INTRODUÇÃO
Em conjunto com outras várias atividades humanas que interagem com o fundo
marinho, as pescarias de fundo impactam os ecossistemas bentônicos em proporção a sua
intensidade e distribuição espacial do esforço de pesca (Halpern et al., 2008). Remoção de
biomassa de espécies-alvo e não-alvo, modificação física do substrato do fundo do mar,
perturbação das comunidades bentônicas e adição de poluentes na água do mar e na atmosfera
são considerados impactos da pesca de fundo, cuja dispersão geográfica define a sua "pegada
espacial" (i.e. mas não a "pegada ecológica" sensu Swartz et al., 2010).
A pesca de arrasto produz uma “pegada” claramente definida pela operação das redes,
que são arrastadas sobre o fundo do mar e “varrem” extensões variáveis de substrato, onde
uma ou mais espécies bentônicas/demersais são capturadas para fins comerciais. Estas redes
são equipadas com portas pesadas, cabos de aço e entralhamento (às vezes com correntes ou
rolos) desenvolvidas para agregar e/ou desapegar os organismos (peixes, crustáceos) do fundo
do mar facilitando sua captura. Desta forma, este petrecho perturba substratos de fundo e
produz modificações cujas consequências ecológicas variam de habitat para habitat marinho,
e são particularmente graves em áreas ainda inexploradas ou pouco impactadas (Kaiser et al.,
2002; Kaiser et al., 2006).
Avaliar o impacto produzido por um determinado tipo de pesca de arrasto de fundo no
ecossistema marinho requer, inicialmente, a delimitação de sua “pegada” e, portanto a
extensão da área atualmente impactada pela atividade de arrasto. Isto pode ser obtido pela
55
sobreposição da área varrida de um determinado número de operações de pesca,
desenvolvidas em uma área de pesca, durante certo período de tempo (e.g. Benn et al., 2010;
Jennings et al., 2012; Penney & Guinotte, 2013; Gerritsen et al., 2013). Esta abordagem, por
si só, permite estimar as probabilidades de perturbação de diferentes tipos de habitats e
comunidades biológicas (e.g. recifes de coral, Penney & Guinotte, 2013), bem como
comparações diretas e sobreposições com a “pegada espacial” de outras atividades humanas
(Hapern et al., 2008; Benn et al., 2010). Por exemplo, no Atlântico nordeste a extensão
espacial do arrasto de fundo é de uma ordem de magnitude maior do que a de outras
atividades baseadas no oceano, incluindo: cabos submarinos de comunicação, deposição de
resíduos e extração de petróleo e gás (estruturas, poços e dutos) (Benn et al., 2010).
Dentro da “pegada” delimitada, o impacto real exercido pela pescaria deve se originar
de uma avaliação da sensibilidade dos habitats afetados à perturbação provocada pela
atividade da pesca de arrasto, geralmente medida pela diminuição da abundância da
comunidade bentônica, produção, tamanho e diversidade dos organismos e da quantidade de
tempo requerida para sua recuperação após a ocorrência de um evento de perturbação
provocado pela pesca (Kaiser et al., 2002; Kaiser et al., 2006; Lambert et al., 2011).
Combinados, estes fatores têm se tornado cada vez mais relevantes, como subsídios
científicos, para o processo de implementação de medidas de gestão ecossistêmicas (i.e.
posição, extensão e delimitação de áreas marinhas protegidas) (Jennings et al., 2012) e nos
esforços para conciliar a pesca de fundo com outras atividades humanas no fundo do mar
(Halpern et al., 2008;. Benn et al., 2010). Além disso, os estoques comerciais podem exibir
padrões de distribuição particulares, relacionados com a idade, no tempo e espaço, que
influenciam fortemente o comportamento dinâmico da frota pesqueira. O estabelecimento de
uma “pegada da pesca” e sua evolução temporal, tem permitindo a definição de áreas
essenciais e marginais para a sua sustentabilidade econômica, bem como a incorporação de
medidas espaciais em planos de gestão baseados em estoques.
A pesca de arrasto industrial é responsável pela maioria dos desembarques de recursos
demersais marinhos na costa brasileira. A atividade iniciou seu desenvolvimento no início dos
anos 1960, no Sudeste e Sul do Brasil, quando estava inicialmente restrita a área da
plataforma continental interna, sendo sustentada por alguns recursos costeiros, como o
camarão-rosa (Farfantepenaeus spp.). Desde então, a frota de arrasto expandiu-se
continuamente até atingir, no final da década de 1990 e ao longo da década de 2000, mais de
650 embarcações, que operam em um amplo intervalo de latitude (19° – 34°S) e profundidade
(20 – 1000 m). Nos últimos anos, seu desembarque anual oscilou em torno de 89 mil
56
toneladas, cerca de 1/3 de toda biomassa de pescado desembarcada na região (Perez et al.,
2001; Valentini & Pezzuto, 2006). A sobrepesca das espécies-alvo tem sido o principal
impacto registrado, por diversas avaliações, como uma consequência direta dos crescentes
níveis de esforço exercido pela frota de arrasto ao longo do tempo (Haimovici, 1997; D’Incao
et al., 2002; Haimovici et al., 2006; Perez et al., 2009). No entanto, a distribuição espacial
destes impactos sobre os estoques comerciais e no ecossistema marinho como um todo, em
geral não tem sido abordada, em parte por causa da escassez de dados de captura e esforço
georreferenciados. Esta situação, por sua vez, impediu a maioria dos regimes de gestão de
incorporar medidas espaciais, ou quando fizeram (e.g. não utilização de áreas em zonas
costeiras, nas proximidades de plataformas de petróleo e áreas marinhas protegidas), sua
desconexão com os padrões espaciais atuais da frota de arrasto, tem impedido a sua aceitação
e cumprimento pela indústria da pesca.
Este cenário tem mudado gradualmente, ao longo da última década, com a
implementação de sistemas de monitoramento de embarcações (VMS - Vessel Monitoring
System), observadores de bordo e programas de entrevistas com os mestres das embarcações,
os quais, combinados têm permitido a disponibilização de um banco de dados
georreferenciado das operações da frota de arrasto (e.g. UNIVALI/CTTMar, 2010). Esta
situação criou oportunidades para analisar a distribuição espacial do esforço da pesca de
arrasto, ao longo de quase uma década, na costa Sudeste/Sul do Brasil, juntamente com uma
série de outros indicadores que representam impactos no ecossistema além da sobrepesca dos
estoques. Usando uma série de dados de nove anos, o presente estudo delimita a recente
“pegada espacial” da pesca industrial de arrasto e estima a extensão da área impactada pelo
arrasto em relação aos habitats de fundo, intervalos de latitude e profundidades da costa
Sudeste/Sul do Brasil. Em conjunto com uma avaliação prévia do consumo de combustível e
as emissões de gases de efeito estufa, produzidos por estas embarcações de arrasto (Capítulo 1
- Port et al., 2014), esta análise pretende aumentar a compreensão atual sobre o impacto
exercido pela pesca de fundo nos ecossistemas bentônicos da margem continental, como uma
contribuição para iniciativas de regimes de gestão ecossistêmica e planejamento espacial
marinho.
MATERIAL E MÉTODOS
Entre o final da década de 1990 e ao longo da década de 2000, mais de 650
embarcações de arrasto operaram na plataforma continental e talude (~10 a 800 m de
57
profundidade) do Espírito Santo (19°S) até o limite sul da ZEE brasileira (34°S), (Perez et al.,
2001). As operações de pesca não são homogêneas e variam de acordo com o sistema de
arrasto utilizado (arrasto duplo, arrasto de parelhas e arrasto simples) e pelo mesmo por três
grandes “estratégias” de pesca definidas por Dias et al. (2012a; 2012b) e Dias & Perez (2012).
O arrasto de camarões (AC) é a estratégia de pesca mais frequente na região, operada
principalmente por barcos de arrasto duplo. Estas embarcações operam na plataforma interna
e média, concentrando suas atividades em duas áreas distintas; uma entre 24°-29°S tendo
como espécies-alvo principais o camarão-rosa (Farfantepenaeus spp.) e o camarão-sete-
barbas (Xyphopenaeus kroyeri), e uma segunda ao sul de 29°S dirigida a outros camarões
costeiros (Artemesia longinaris e Pleoticus muelleri) e um grupo de peixes demersais que
incluem a castanha (Umbrina canosai), cabrinha (Prionotus punctatus) e linguados
(Paralychthys spp.). O arrasto de talude (AT) é realizado por barcos de arrasto duplo e arrasto
simples que atuam nas áreas de talude (250-400 m de profundidade), tendo como alvo
principal a abrótea-de-profundidade (Urophycis mystacea), merluza (Merluccius hubbsi) e
peixe-sapo (Lophius gastrphysus) (Perez et al., 2009). O arrasto de parelhas (AP), concentra
sua atividade na plataforma interna, tendo como espécies-alvo uma variedade de peixes
cianídeos, incluindo castanha (U. canosai), corvina (Micropogonias furnieri), maria-mole
(Cynoscion guatucupa), pescada-amarela (C. acoupa) e goete (C. jamaicensis).
Este estudo aborda os efeitos da pesca industrial de arrasto como um todo, bem como
os produzidos por cada estratégia de pesca (AC, AT e AP), individualmente. Os dados
utilizados neste trabalho são referentes a informações de capturas, esforço e áreas de pesca de
10.144 viagens de pesca (arrasto duplo = 8.012 viagens; arrasto simples = 949 viagens;
arrasto de parelhas = 1.183 viagens) que desembarcaram suas capturas nos portos de Santa
Catarina entre 2003 e 2011 (Port et al., 2014) (Tabela 1). Estes dados representam
aproximadamente 70% do total de desembarques nos portos de Santa Catarina
(UNIVALI/CTTMar, 2004, 2006, 2007a, 2007b, 2008, 2009, 2010, 2011, 2013) e são
altamente representativos da atividade de pesca industrial de arrasto realizada no Sudeste/Sul
do Brasil; os portos de Santa Catarina abrigam quase 60% de toda a frota e registram
anualmente 50-70% dos desembarques da frota industrial de arrasto (Perez et al., 2001).
Estes dados foram reportados pelos mestres das embarcações, nos diários de bordo ou
durante entrevistas no momento do desembarque, de acordo com um protocolo de
amostragem estabelecido pelo serviço de estatística pesqueira industrial de Santa Catarina
(Perez et al., 1998; www.univali.br/gep). Estas informações foram avaliadas por analistas
experientes, com base nas tendências de longo prazo da pesca de arrasto industrial na região
58
(e.g. áreas de pesca, profundidades, espécies comuns nas capturas, quantidades capturadas,
duração das viagens, etc.) e somente os dados das viagens de pesca que foram considerados
como “confiáveis” foram utilizados no banco de dados analisado.
Tabela 1. Resumo da frota de arrasto e operações de pesca monitoradas nos portos de Santa Catarina, sul do
Brasil, entre 2003 e 2011. Os dados estão agregados por tipo de embarcação e ano.
Tipo de arrasto Ano Embarcações Viagens
Arrasto duplo
2003 275 1133
2004 271 1021
2005 293 1096
2006 315 1300
2007 320 1577
2008 288 1409
2009 325 1570
2010 277 1215
2011 268 1187
Média±dp 292,4 ± 22,2 1278,7 ± 201,5
Arrasto simples
2003 26 151
2004 25 98
2005 39 108
2006 23 105
2007 25 112
2008 28 101
2009 26 175
2010 33 230
2011 29 204
Média±dp 28,2 ± 5,0 142,7 ± 49,7
Arrasto de parelhas
2003 46 292
2004 46 203
2005 48 217
2006 45 214
2007 39 294
2008 33 205
2009 27 195
2010 24 166
2011 26 141
Média±dp 37,1 ± 9,7 214,1 ± 50,8
Todas embarcações (2003-2011) Média±dp 357,8 ± 23,6 1635,4 ± 217,7
Total - 14719
A avaliação da “pegada” da frota de arrasto foi precedida da estimativa da área varrida
de cada viagem de pesca avaliada. Considerando que a maioria dos dados relatados não
incluem as posições precisas de início/fim dos arrastos, a área varrida total (Sa) de uma
embarcação (i) durante uma viagem (j) foi estimada considerando o tempo total gasto no
arrasto e a velocidade média da embarcação durante o arrasto, de acordo com a equação
adaptada de Sparre & Venema (1998):
59
𝑆𝑎𝑖𝑗 = 𝑛𝑖𝑗 × �̅�𝑖𝑗 × �̅� × 𝐻𝑅𝑙𝑖 × 𝑥 (Equação 1)
onde 𝑛 e 𝑑 são o número de arrastos e a duração média do arrasto (em horas), de acordo com
o informado pelo mestre da embarcação, após uma viagem de pesca, respectivamente. Uma
velocidade média constante (v) de 3,0 nós (5,6 km.h-1
) foi assumida de acordo com estudos
prévios realizados na região por Simões et al. (2003), Klippel et al. (2005) e Santos et al.
(2009). O comprimento da tralha superior (𝐻𝑅𝑙, em metros) das redes utilizadas, durante cada
viagem de pesca, considerou valores médios previamente conhecidos para as redes de cada
modalidade de arrasto (simples, parelhas e duplo) (Correia, 2008). Finalmente, 𝑥 é a fração do
comprimento da tralha superior (𝐻𝑅𝑙) efetivamente estendida durante o arrasto. Um valor
constante de 0,56 foi adotado, em função de considerações gerais sobre o desempenho de
operação das redes de arrasto (Sparre & Venema, 1998) e estudos anteriores realizados na
mesma região (Haimovici, 2007; Sant’Ana, 2013). No caso da frota de arrasto duplo, que
utiliza duas redes idênticas ao mesmo tempo, a área varrida estimada para uma única rede foi
posteriormente multiplicada por dois.
A espacialização geográfica dos valores da área varrida e da biomassa desembarcada,
durante cada viagem de pesca, considerou os intervalos de latitude e profundidade das
operações de pesca de acordo com as informações fornecidas pelos mestres das embarcações.
Estas informações permitiram a atribuição de cada viagem de pesca em quadrantes de 30’ ×
30’, delimitados pelas latitudes 19°S e 35°S e pela isóbata de 2.000 m (Figura 1). Quando os
intervalos de latitude e profundidade excederam um único quadrante, a área varrida estimada
e a biomassa desembarcada foram divididas, igualmente, entre todos os quadrantes visitados
(UNIVALI/CTTMar, 2010).
A “pegada” da pesca industrial de arrasto, isto é, a área total afetada pela pesca de
arrasto monitorada durante o período de estudo (Penney & Guinotte, 2013), foi delimitada por
todos os quadrantes com áreas varridas alocadas, desconsiderando as sobreposições entre as
operações de pesca. A “área total disponível” (AA) e a área delimitada da “pegada” da pesca
industrial de arrasto foram estimadas utilizando o software ArcGIS®
(ESRI - Environmental
Systems Research Institute, Inc.).
60
Figura 1. “Área-núcleo” (core), “pegada” (footprint), área varrida (swept area), Índice de Utilização (utilization index) da frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil,
no período de 2003-2011.
61
Dentro de cada quadrante foi calculado o Índice de Utilização (UI) considerando a
área varrida pelas embarcações de arrasto acumulada durante todo o período de estudo,
dividida pela área de cada quadrante de 30’ × 30’. Este índice foi interpretado como uma
medida espacial da intensidade do impacto da rede de arrasto. O Índice de Utilização, na
“pegada” da pesca industrial de arrasto (𝑈𝐼𝑓), foi estimado como:
𝑈𝐼𝑓 =∑ ∑ ∑ 𝑆𝑎𝑖𝑗𝑞
𝐽𝑗=1
𝐼𝑖=1
𝑄𝑞=1
∑ 𝐴𝐴𝑞𝑄𝑞=1
(Equação 2)
onde 𝐽, 𝐼 e 𝑄 são o número total de viagens de pesca (𝑗), embarcações arrasteiras (𝑖) e
quadrantes (𝑞), respectivamente.
Como uma medida de custo/benefício do arrasto em cada quadrante (q), a biomassa
desembarcada acumulada (LB) foi expressa como uma proporção da área varrida acumulada
(Índice da Biomassa-Área varrida, BSAq). Dentro de toda a área da “pegada” da pesca
industrial de arrasto este índice foi estimado pela equação:
𝐵𝑆𝐴𝑓 =∑ ∑ ∑ 𝐿𝐵𝑖𝑗𝑞
𝐽𝑗
𝐼𝑖=1
𝑄𝑞=1
∑ ∑ ∑ 𝑆𝑎𝑖𝑗𝑞𝐽 𝑗=1
𝐼𝑖=1
𝑄𝑞=1
(Equação 3)
A “pegada” da pesca industrial de arrasto, UI e BSA, foram calculados para todo o
período de estudo e anualmente de 2003 a 2011. Estas variáveis foram mapeadas usando o
software ArcGIS® (ESRI - Environmental Systems Research Institute, Inc.) e seus padrões de
variabilidade foram associados as (a) estratégias de pesca (arrasto de camarões, arrasto de
talude e arrasto de parelhas), (b) intervalos de latitude (Norte, 19° - 25°S; Centro, 25°- 29°S;
Sul, 29°- 34°S), (c) intervalos de profundidade (<75m, 75 – 100m, 100 – 200m, >200m) e (d)
tipos de substrato. Este último seguiu a distribuição espacial dos substratos de fundo
produzida por Bizzi et al. (2003). Dentro da área delimitada por cada quadrante (30’ × 30’)
utilizado, a proporção de área coberta por cada intervalo de profundidade e tipo de substrato
foi estimada e multiplicada pela “pegada”, área varrida acumulada, UI e BSA. Quando
atendidos os pressupostos estatísticos, estes valores foram testados através da Análise de
Variância unifatorial (ANOVA). Nos casos em que um dos pressupostos da ANOVA não foi
atendido, aplicou-se o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis (Day & Quinn, 1989; Zar,
2010).
62
RESULTADOS
A área total da margem continental do Sudeste/Sul do Brasil, limitada pela isóbata de
2.000 m, é de 502.190 km2; 45,9% desta área está localizada ao norte de 25°S (Norte), 25,4%
entre os paralelos 25°S- 29°S (Centro) e 28,7% ao sul de 29°S (Sul). As áreas mais extensas
situam-se em profundidades menores de 75 m e maiores de 200 m de profundidade; a área
entre os intervalos de profundidade intermediários (75 – 200 m) é mais extensa no intervalo
de latitude Norte (Tabela 2). Mais de 99% da área é coberta por substratos moles e, portanto,
quase totalmente disponível para a pesca de arrasto de fundo. O intervalo de latitude Norte
apresenta uma maior variedade de tipos de sedimentos, enquanto que areia e lama dominam
em grande parte os intervalos Centro e Sul.
A “pegada” da pesca industrial de arrasto, durante o período de estudo, foi composta
por 100% da área disponível (i.e. todos os quadrantes apresentaram registros de área varrida)
e a área varrida total pelas operações de arrasto foi de 680.697,5 km2, 1,4 vezes a área
disponível (Figura 1; Tabela 2). Mais de 67% dos quadrantes (150) tiveram suas áreas de
pesca varridas entre 1 e 2 vezes e apenas 18 quadrantes (8,1%) não foram totalmente
utilizados durante o período de estudo (UI<1) (Figura 2). A “área-núcleo” da atividade de
arrasto, definida como os quadrantes cuja área total disponível foi “varrida” mais de uma vez
(UIq>1), corresponde a mais de 40,5% do total da “pegada” (203.120,3 km2), e localiza-se
principalmente ao sul de 25°S e em áreas com uma profundidade menor do que 100 m (Figura
1).
Figura 2. Numero de quadrantes (30’ × 30’) por intervalo do índice de utilização.
63
Mais de 74% da área varrida pelas embarcações de arrasto encontra-se nos intervalos
de latitude Sul (36,7%) e Centro (37,6%) (Tabela 1). Estas regiões tiveram suas áreas
“varridas” entre 1,7 e 2,0 vezes, respectivamente, enquanto que as áreas do intervalo Norte
tiveram menos operações de arrasto e não foram totalmente “varridas” (UI = 0,8) (Figura 3).
A atividade da pesca de arrasto concentrou-se em áreas mais rasas do que 75 m (61% da área
varrida, UI = 2,35) e ocorreu em apenas uma pequena fração da grande área disponível da
região de talude (>200 m: 10,7% da área varrida, UI = 0,37) (Tabela 2; Figura 3).
Quase 60% da área varrida acumulada (398.813,7 km2) afetou áreas cobertas por areia
lamosa e lama (Tabela 2; Figura 3). Areia fina e média foram os substratos afetados por
29,3% da área varrida restante. Sedimentos do talude e substratos de cascalho também são
altamente disponíveis em áreas mais profundas do que 200 m e no intervalo de latitude Norte,
respectivamente, mas foram pouco impactados pela pesca de arrasto (Tabela 2; Figura 3).
A pesca industrial de arrasto desembarcou 342.297,6 toneladas nos portos de Santa
Catarina durante todo o período de estudo. Aproximadamente 70% desta biomassa foi
desembarcada após a área varrida acumulada, por todas as estratégias de pesca, ser
equivalente a área total da “pegada” (UI = 1; Figura 4). Em média, 0,5 toneladas foram
desembarcadas por km2 (Tabela 3). O intervalo de latitude Sul foi o mais produtivo (0,76
t.km-2
), seguido pelos intervalos Centro (0,43 t.km-2
) e Sul (0,25 t.km-2
).
Quase 63% da biomassa desembarcada foi originária de áreas produtivas, com
substrato de areia lamosa e lama, de onde 0,52-0,56 toneladas foram desembarcadas, em
média, por km2. No intervalo de latitude Sul, estes índices aumentam para 0,74 e 0,87 t.km
-2,
respectivamente (Tabela 3). Áreas com sedimentos de talude, particularmente do intervalo
Sul, produziram, em média, 0,82 t.km-2
durante o período de estudo. Estas áreas foram
relativamente menos varridas (6% do total da área varrida, Tabela 2), e sua contribuição para
o total desembarcado foi pequena (7% do total da biomassa desembarcada, Tabela 3).
64
Tabela 2. Área disponível (km2) e área varrida (km
2), por tipo de substrato, intervalo de latitude e intervalo de profundidade, da margem continental do Sudeste/Sul do Brasil.
Área
%
Área
%
Norte Centro Sul
Norte Centro Sul
Tipo de substrato disponível %
19°-25° 25°-29° 29°-34°
varrida %
19°-25° 25°-29° 29°-34°
Talude 142871,1 28,5
13,1 9,4 6,0
40606,6 6,0
1,0 3,4 1,6
Areia lamosa 105881,9 21,1
8,9 5,5 6,7
200253,6 29,4
6,7 11,5 11,2
Lama 85839,3 17,1
3,3 5,9 7,9
198560,1 29,2
3,4 14,2 11,6
Cascalho 52766,1 10,5
10,5 0,0 0,0
14589,5 2,1
2,1 0,0 0,0
Areia média 49777,1 9,9
3,6 3,2 3,1
74417,2 10,9
2,1 5,3 3,5
Areia fina 44886,8 8,9
5,0 0,8 3,1
124941,6 18,4
9,0 2,0 7,3
Recife 2791,1 0,6
0,6 0,0 0,0
40,3 0,0
0,0 0,0 0,0
Areia grossa 1627,3 0,3
0,3 0,0 0,0
1546,9 0,2
0,2 0,0 0,0
Cascalho lamoso 1437,7 0,3
0,1 0,2 0,0
3905,8 0,6
0,3 0,3 0,0
Não identificado 13681,6 2,7
0,5 0,4 1,9
21825,2 3,2
0,8 0,8 1,5
< 75 m 176924,2 35,2
15,5 6,9 12,8
415098,9 61,0
12,5 20,1 28,4
75 - 100 m 33172,7 6,6
4,1 1,5 1,0
68864,6 10,1
3,9 4,4 1,9
100 - 200 m 95843,18 19,1
8,0 6,5 4,5
124107,1 18,2
5,1 9,3 3,8
>200m 196249,9 39,1
18,2 10,5 10,4
72626,9 10,7
4,2 3,9 2,6
Área total 502190,0
230322,2 127204,6 144033,2
680697,5
174770,9 255880,6 250035,2
%
45,9 25,3 28,7
25,7 37,6 36,7
Legenda:
<5% 5-10% 10-20% >20%
65
Figura 3. Índice de utilização por intervalo de latitude, intervalo de profundidade e tipo de substrato.
66
Figura 4. Biomassa desembarcada acumulada (toneladas) por índice de utilização (UI).
O efeito das estratégias de pesca de arrasto
O arrasto de camarões (AC) atuou em todo o intervalo de latitude considerado, em
profundidades menores que 100 m (Figura 5), atingindo 78,92% da “pegada” total da pesca de
arrasto (396.333,9 km2). Estas operações de pesca foram responsáveis por mais da metade da
área varrida total da frota de arrasto, durante o período de estudo (57,6%), estando
distribuídas na maior parte, em águas mais rasas (<75 m) dos intervalos de latitude Centro e
Sul (Tabela 4). Este intervalo de latitude e profundidade foi “varrido” de 0,9 a 1,7 vezes
durante o período de estudo (Figura 6) e os picos de utilização (UI>6) foram estabelecidos em
áreas da costa de Santa Catarina, sul de São Paulo e sul do Rio Grande do Sul (Figura 5). Em
associação com estes padrões de “pegada” e área varrida, o arrasto de camarões afetou,
principalmente áreas cobertas por areia lamosa, lama, areia fina e areia média (Tabela 4). A
área compreendida por estes habitats foi “varrida” pelo menos uma vez por esta estratégia de
pesca, sendo que os substratos de areia fina foram “varridos” mais de duas vezes (Figura 6). A
área núcleo para esta estratégia (UI >1) foi estimada em 115.852,7 km2, 29,2% de sua
“pegada” no período considerado.
67
Tabela 3. Biomassa desembarcada e Índice da Biomassa-Área varrida (BSA), por tipo de substrato, intervalo de
latitude e intervalo de profundidade, da margem continental do Sudeste/Sul do Brasil.
Biomassa desembarcada
BSA
(t) %
Norte Centro Sul Total
Talude 23596,0 6,89
0,47 0,50 0,82 0,58
Areia lamosa 104275,7 30,46
0,25 0,47 0,74 0,52
Lama 111142,3 32,47
0,25 0,38 0,87 0,56
Cascalho 5850,3 1,71
0,40
0,40
Areia média 35290,0 10,31
0,19 0,43 0,71 0,47
Areia fina 47597,1 13,91
0,19 0,23 0,66 0,38
Recife 3,0 0,00
0,08
0,08
Areia grossa 618,4 0,18
0,40
0,40
Cascalho lamoso 1354,9 0,40
0,32 0,37
0,35
Não identificado 12569,8 3,67
0,21 0,76 0,67 0,58
< 75 m 193363,9 56,49
0,20 0,29 0,70 0,47
75 - 100 m 33168,6 9,69
0,26 0,47 0,97 0,48
100 - 200 m 69828,7 20,40
0,29 0,51 1,05 0,56
>200m 45936,3 13,42
0,31 0,87 0,81 0,63
Total 342297,6
42885,2 108853,2 190559,3
%
12,5 31,8 55,7
BSA (t/km²) 0,50
0,25 0,43 0,76
Legenda:
<5% 5-10% 10-20% >20%
O arrasto de parelhas (AP) foi o que apresentou a “pegada” menos extensa (3,2% da
“pegada” total da pesca de arrasto) representando 8,2% da área varrida total da frota de
arrasto (Tabela 4; Figura 5). Os padrões espaciais foram, em geral, similares aos exibidos pelo
arrasto de camarões (Tabela 4) exceto pela alta concentração da atividade de arrasto nos
intervalos Sul (61,2% da área varrida) e Centro (32,8%). O índice de utilização, durante o
período de estudo, foi marginal (UI = 0,11, Tabela 3) e altamente concentrado em sua área
núcleo (UI > 1), estimada em 8.192,3 km2, 3,19% de sua “pegada”.
69
Tabela 4. Área varrida (km2) por estratégia de pesca (AP=arrasto de parelhas; AC=arrasto de camarões; AT=arrasto de talude), tipo de substrato, intervalos de latitude e
intervalos de profundidade, da margem continental do Sudeste/Sul do Brasil.
AP
AC
AT
Área %
Norte Centro Sul
Área %
Norte Centro Sul
Área %
Norte Centro Sul
Talude 171,7 0,31
0,00 0,00 0,30
1301,2 0,33
0,04 0,15 0,15
39133,6 16,79
2,76 9,65 4,38
Areia lamosa 18535,6 33,35
1,64 13,14 18,58
112312,2 28,64
5,81 11,78 11,05
69405,8 29,79
9,36 10,74 9,69
Lama 19224,7 34,60
0,29 10,96 23,35
110964,1 28,30
2,54 16,87 8,89
68371,3 29,34
5,61 10,46 13,27
Cascalho 242,7 0,44
0,44
2677,7 0,68
0,68
11669,1 5,01
5,01
Areia média 4965,0 8,93
0,53 4,58 3,82
49093,3 12,52
2,98 5,84 3,70
20358,8 8,74
1,04 4,67 3,03
Areia fina 8733,6 15,72
2,67 0,98 12,06
98277,5 25,06
13,55 2,52 9,00
17935,5 7,70
2,94 1,37 3,39
Recife
15,3 0,00
0,00
25,0 0,01
0,01
Areia grossa 10,9 0,02
0,02 0,00 0,00
188,3 0,05
0,05
1347,7 0,58
0,58
Cascalho
lamoso 5,7 0,01
0,00 0,01 0,00
943,5 0,24
0,09 0,15
2956,6 1,27
0,66 0,61
Não
identificado 3680,8 6,62
0,41 3,11 3,10
16325,5 4,16
1,34 0,84 1,98
1818,9 0,78
0,07 0,30 0,42
< 75 m 39498,6 71,1
1,20 23,54 46,34
319776,1 81,56
24,10 27,96 29,50
55824,2 23,96
5,35 6,40 12,21
75 - 100 m 11389,9 20,5
4,25 6,84 9,41
28561,6 7,284
1,57 3,14 2,57
28913,2 12,41
3,49 4,60 4,32
100 - 200 m 3934,6 7,08
0,42 2,27 4,39
40164,5 10,24
1,31 6,68 2,25
80008,0 34,33
10,95 15,02 8,37
>200m 749,6 1,35
0,12 0,14 1,09
3598,5 0,918
0,09 0,37 0,46
68278,8 29,30
8,24 11,78 9,28
Total 55570,7
3332,2 18213,2 34025,3
392098,6
106129,0 149603,2 136366,4
233022,4
65314,7 88064,2 79643,5
%
6,00 32,77 61,23
27,07 38,15 34,78
28,03 37,79 34,18
Legenda:
<5% 5-10% 10-20% >20%
70
Figura 6. Índice de utilização por estratégia de pesca (Pair, Shrimp e Slope), intervalo de latitude, intervalo de profundidade e tipo de substrato.
71
O arrasto de talude (AT) ficou concentrado em áreas além da isóbata de 100 m (63,6%
da área varrida) (Tabela 4). Considerando que esta estratégia de pesca frequentemente está
sobreposta com a pesca de camarões (e.g. a mesma viagem de pesca realiza arrastos no talude
e na plataforma interna), sua “pegada” estendeu-se a áreas de plataforma atingindo 96,6%
(485.321,1 km2) da “pegada” total da pesca de arrasto (Tabela 3; Figura 5). A área varrida
total pelo arrasto de talude foi quase a metade da área da “pegada” total (UI = 0,46) e os picos
de utilização da área (UI = 1-6) ocorreram entre o Sul de São Paulo e Santa Catarina e na
porção central da costa do Rio Grande do Sul (Figura 5; Tabela 3). Áreas entre as isóbatas de
75 e 200 m foram quase que totalmente “varridas” durante o período de estudo (UI = 0,83-
0,87) e as áreas mais impactadas por esta estratégia de pesca, incluiram habitas com cobertura
de lama (UI = 0,80), cascalho lamoso (UI = 2,06) e areia grossa (UI = 0,83). Estes dois
últimos tipos de substrato estão normalmente presentes nos intervalos de latitude Centro e
Norte (Figura 6). A “área-núcleo” estimada para esta estratégia de pesca foi de 54.881,6 km2,
11,3% de sua “pegada” no período.
O arrasto de parelhas (AP) desembarcou em média 2,03 t por km2, excedendo em
muito o arrasto de talude (0,55 t.km-2
) e o arrasto de camarões (0,26 t.km-2
). Este padrão foi
mantido em todos os intervalos de latitude, embora a produtividade tenha aumentado, de
forma consistente, de norte para sul (Figura 7). As operações do arrasto de camarões
envolveram impactos espaciais consideravelmente mais elevados do que aqueles associados
às outras estratégias de arrasto, por exemplo, para desembarcar 50.000 toneladas de biomassa,
as embarcações de arrasto de camarões “varreram” uma área 2,2 e 7,6 vezes maior do que o
arrasto de talude e o arrasto de parelhas, respectivamente (Figura 4).
Evolução da “pegada” (footprint)
A “pegada” estimada para a pesca de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil variou,
anualmente, entre 353.390 e 448.812 km2, sem diferença significativa entre os anos (p = 0,51,
Tabela 5; Figura 8A). Grande parte desta variabilidade foi consequência direta das expansões
e contrações da “pegada” do arrasto de talude. Ligeiras tendências anuais de acréscimo e
decréscimo foram observadas para o arrasto de camarões e o arrasto de parelhas,
respectivamente, porém sem diferença significativa entre os anos (p > 0,10 e p > 0,22, Tabela
5; Figura 8A).
72
Figura 7. Índice da Biomassa-Área varrida (BSA) por estratégia de pesca (Pair, Shrimp e Slope), intervalo de
latitude e total.
Por outro lado, o arrasto de parelhas e o arrasto de talude apresentaram uma tendência
significante de decréscimo e acréscimo em suas áreas varridas, respectivamente (p = 0,03,
Tabela 5; Figura 8B), ao contrário do arrasto de camarões, cuja área varrida aumentou até
2006 decrescendo em seguida.
Cumulativamente, todas as estratégias de pesca de arrasto “varreram” uma área
equivalente a toda a “pegada” após sete anos de operações (Figura 9A). As áreas altamente
utilizadas pela frota de arrasto nos intervalos de latitude Centro e Sul foram totalmente
“varridas” entre quatro e cinco anos, com as áreas do Centro varridas duas vezes após nove
anos (Figura 9A). As áreas abaixo da isóbata de 100 m foram totalmente “varridas” em quatro
anos e duas vezes varridas entre oito e nove anos. As áreas da quebra de plataforma (100-200
m) foram totalmente “varridas” em sete anos (Figura 9B).
73
Tabela 5. Correlações entre pegada, área varrida, Índice de Utilização (UI), “área-núcleo” (core) e Índice da
Biomassa-Área varrida (BSA), por ano analisado. Valores de p em negrito são significativos.
Pegada x ano
Intersecção Inclinação p R2
Parelhas
9470375,514 -4619,880 0,220 0,206
Camarões
-8839122,543 4552,039 0,100 0,339
Talude
5478361,669 -25465,527 0,437 0,297
Todas estratégias
5686488,174 -2643,680 0,512 0,253
Área varrida x ano
Parelhas
986586,043 -488,496 0,030 0,511
Camarões
-1390239,597 714,403 0,578 0,211
Talude
-3747490,354 1880,110 0,032 0,506
Todas estratégias
-4151142,908 2106,017 0,105 0,331
UI x ano
Parelhas
3,958 -0,002 0,159 0,262
Camarões
-1,345 0,001 0,850 0,006
Talude
-10,938 0,005 0,030 0,513
Todas estratégias
-8,276 0,004 0,105 0,331
Área-núcleo x ano
Parelhas
Camarões
-743363,000 372,200 0,280 0,163
Talude
Todas estratégias
-1320511,046 661,366 0,206 0,217
BSA x ano
Parelhas
-166,511 0,084 0,029 0,517
Camarões
-9,435 0,005 0,393 0,106
Talude
-7,484 0,004 0,517 0,020
Todas estratégias
4,527 -0,002 0,832 0,007
74
Figura 8.“Pegada” (A) e área varrida (B) de toda a frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil e das
diferentes estratégias de pesca (Pair, Shrimp e Slope trawlers), por ano.
75
Figura 9. Índice de utilização total, por intervalo de latitude (A) e intervalo de profundidade (B) de toda a frota
industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, por ano.
DISCUSSÃO
A distribuição espacial do impacto da pesca industrial de arrasto em ambientes
bentônicos/bentopelágicos do Sudeste e Sul do Brasil foi avaliada a partir da análise da
distribuição do esforço durante os últimos dez anos. Como os trajetos percorridos pelas
embarcações de pesca não são conhecidos, as áreas varridas estimadas foram agregadas em
quadrantes de 30' × 30', o que gera uma incerteza sobre a á área exata impactada,
principalmente nas áreas de baixa atividade pesqueira (vide Gerritsen et al., 2013). No
entanto, a análise forneceu uma avaliação preliminar da área da margem continental
provavelmente utilizada (e impactada) pela maior pesca de arrasto industrial do Brasil. A área
A
B
76
varrida total (e o impacto espacial) estimados, são muito mais consistentes para as áreas ao sul
de 24°S, onde as embarcações de arrasto que operam nos portos de Santa Catarina realizam a
maior parte de sua atividade pesqueira. Ao norte desta área, arrasteiros baseados nos portos de
São Paulo e Rio de Janeiro podem incluir um importante impacto, não considerado neste
estudo.
A "pegada" delimitada representa um cenário marcadamente diferente do período
anterior ao desenvolvimento da pesca de arrasto no Brasil, quando as operações para além da
plataforma extrerna eram raras e praticamente restritas a avaliações científicas (Haimovici,
2007; Perez et al., 2001). A partir de 2000, a pesca de arrasto na região do talude teve uma
grande expansão, em parte como resultado de políticas governamentais que estimularam a
ocupação de áreas profundas por embarcações de arrasto estrangeiras e a exploração de alguns
recursos destinados a exportação, como o peixe-sapo (Lophius gastrophysus) e a merluza
(Merluccius hubbsi) (Perez et al., 2009b). Em 2003, quando a maioria das embarcações
estrangeiras já havia encerrado suas operações em águas brasileiras, mais de 270 barcos
nacionais de arrasto duplo e simples já estavam operando na região da quebra da plataforma e
talude superior, continuando o regime de exploração das antigas espécies e também da
abundante abrótea-de-profundidade (Urophycis mystacea) (Perez & Pezzuto, 2006).
Independentemente dos esforços para regular o arrasto em áreas de talude, essa expansão
continua descontrolada até hoje e muitas dessas embarcações também podem operar em
diferentes áreas da plataforma ao longo do ano (Perez et al., 2009a).
Apesar desse processo de expansão da frota, as zonas costeiras têm permanecido como
essenciais para a atividade da pesca de arrasto e muito impactadas por ela. A área "núcleo" foi
delineada em torno de duas áreas importantes onde as concentrações de recursos valiosos
ainda representam uma fração importante dos desembarques e receitas anuais da indústria da
pesca de arrasto (Benincá, 2013). A primeira, ao norte abrange a área da plataforma
continental do embaiamento sudeste do Brasil (22 - 28°S, sensu Matsuura, 1995), onde
embarcações de arrasto duplo tem como alvo camarões peneídeos (Farfantepenaeus spp. e
Xyphopenaeus kroyeri), atividade historicamente desenvolvida desde 1960 (D’Incao et al.,
2002). Esta área é delimitada por um grande número de sistemas estuarinos e de manguezais
(Knoppers et al., 2009), que são essenciais para as fases iniciais destes camarões e muitas
outras espécies de plataforma. Durante os meses de verão (dezembro-março) o regime
dominante de ventos induz a intrusão da Água Central do Atlântico Sul (ACAS) que aumenta
a produtividade, tanto no sistema pelágico como no bentônico e a disponibilidade de
77
alimentos para populações de peixes, moluscos e crustáceos demersais (Borzone et al., 1999;
Sumida et al., 2005;. Rossi-Wongstchowski et al., 2006).
A segunda área de atividade de arrasto está centrada na plataforma continental ao
largo do Rio Grande do Sul, no extremo sul da ZEE brasileira. Esta é uma das mais extensas
áreas de plataforma da margem continental brasileira, influenciada pelo escoamento dos
estuários La Plata e Lagoa dos Patos e águas subantárticas, transportadas pela corrente das
Malvinas em direção norte, principalmente durante os meses de inverno-primavera (Rossi-
Wongstchowski et al., 2007). Como estas águas costeiras e oceânicas são ricas em nutrientes,
a produtividade primária e secundária da plataforma tem um grande aumento e sustenta
grandes populações de peixes, moluscos e crustáceos, alguns deles migrantes da plataforma
patagônica. Esta área sustenta a maior parte da biomassa desembarcada de recursos demersais
do Brasil, e uma pesca de arrasto histórica direcionada a peixes cianídeos (Micropogonias
furnieri, Cynoscion acoupa, C. guatucupa, Umbrina canosai), linguados (Paralichthyes spp.)
e duas espécies de camarões costeiros (Pleoticus muellery e Artemesia longinaris)
(Haimovici, 2007).
Habitats de fundo dentro desta área "núcleo" são formados por sedimentos moles,
particularmente lama e areia, onde a produtividade de pesca foi mais elevada (0,5-0,6 t / km2),
em particular na área da plataforma sul, onde até 1 tonelada foi desembarcada por km2, em
média, durante o período de estudo. Além disto, o arrasto sobre estes habitats "varre",
cumulativamente, em aproximadamente seis anos, uma área equivalente a 1,5-2,0 vezes a
superfície disponível, atingindo valores extremos (4 a mais de 14 vezes) em algumas áreas
rasas. Considerando-se que esta área "núcleo" tem sido explorada por pelo menos 30 anos
(Perez et al., 2009a), é possível que estes sejam os habitats bentônicos mais perturbados na
margem continental brasileira, e que a pesca de arrasto de fundo seja a sua principal pressão
ambiental. Além da sobrepesca e perturbação dos fundos oceânicos, a pesca de arrasto, e seus
efeitos específicos produzidos sobre a abundância e diversidade de invertebrados (Kaiser et
al., 2002; Lambert et al., 2011), pode também contribuir para a degradação de habitats
bentônicos e desempenhar um papel importante no declínio da biomassa de espécies
comerciais que teve lugar desde o final da década de 1970 (D'Incao et al., 2002; Haimovici,
1997). Até que ponto essas consequências ecológicas são plausíveis, no entanto, é atualmente
incerto, mas parece importante considerar que, apesar delas, a área "núcleo" manteve-se como
fundamental para a estabilidade econômica da pesca de arrasto na última década (Benincá,
2013), implicando que o impacto espacial da pesca pode estar exagerado e/ou há um elevado
índice de resiliência das comunidades bentônicas nesta área. Explorar tais hipóteses requer
78
considerações sobre a influência da escala espacial, intensidade e frequência de perturbações
naturais dos fundos marinhos vs. perturbações provocadas pela pesca de arrasto e padrões de
taxas de recuperação da biota bentônica e a diversidade em habitats perturbados de areia/lama
(Kaiser et al., 2002).
Uma análise inicial refere-se ao fato de não ter sido possível avaliar a expansão efetiva
da área varrida calculada, dada a natureza dos dados analisados. Assim, por exemplo, se uma
área da plataforma equivalente à superfície de um quadrante de 30’ × 30’ foi "varrida" pela
atividade da pesca de arrasto num período de seis anos, poderia significar: o resultado de uma
ocupação progressiva de 1/6 da superfície da área por ano; um aumento regular da área
varrida distribuída de forma homogênea sobre toda a superfície do quadrante; ou um arrasto
intenso em algumas pequenas áreas localizadas dentro da área da superfície do quadrante,
deixando sem perturbação uma fração importante desta superfície. Considerando que, nas
duas primeiras situações poderia haver tempo suficiente para a recuperação das comunidades
bentônicas, neutralizando os efeitos da perturbação de pesca, na última, tais áreas limitadas
seriam tão frequentemente impactadas que poderiam entrar num "estado alterado permanente"
pela atividade da pesca de arrasto (Kaiser et al., 2002). Esta hipótese, por ser mais típica do
comportamento da frota industrial de arrasto, implica de fato em menos consequências
ecológicas do que as anteriores (Kaiser et al., 2002).
Em uma segunda análise, sabe-se que as populações e as comunidades bentônicas são
submetidas a perturbações naturais de diferentes escalas e frequências (e.g. ação de
predadores, correntes de marés, tempestades), e têm uma capacidade de resistência inerente a
algumas delas. A pesca de arrasto precisa ultrapassar estes níveis (e.g. ser mais frequente), a
fim de provocar consequências ecológicas significativas a longo prazo. Nesse sentido,
habitats rasos de fundo mole da plataforma continental tendem a ser frequentemente
reestruturados por processos físicos e as suas comunidades bentônicas podem experimentar
níveis naturais mais elevados de perturbação do que habitats marinhos mais profundos (Kaiser
et al., 2006). Em trabalho realizado no litoral norte de São Paulo, Pires-Vanin (1993)
verificaram que ocorrem duas comunidades bentônicas distintas, a primeira em profundidades
menores do que 50m, estruturada com mais espécies r-estrategistas/oportunistas, e a segunda
em profundidades maiores do que 50m, composta por mais espécies k-estrategistas,
organizadas desta forma, principalmente pela diferença no grau de estabilidade física destas
duas áreas. Isso poderia explicar o aumento da resiliência das comunidades bentônicas dentro
da área "núcleo" da pesca industrial de arrasto nas regiões Sudeste e Sul do Brasil,
particularmente nas áreas rasas fortemente "varridas", que muitas vezes são submetidas a
79
flutuações das condições climáticas e oceanográficas ao longo do ano (Rossi-Wongstchowski
et al., 2007; Knoppers et al., 2009).
Finalmente, o efeito ecológico dos distúrbios provocados pela pesca de arrasto é
dependente do equipamento utilizado e do tipo de substrato. Comunidades que utilizam
habitats de plataforma com substrato de areia e lama apresentam importantes impactos
negativos de curto-prazo quando sofrem a ação de dragas, beam-trawls e arrasto-de-portas
(Kaiser et al., 2006). Estes impactos necessitam de períodos relativamente longos de
recuperação quando o distúrbio é causado por beam-trawls e dragas (200 dias até mais de 8
anos). No caso de arrasto-de-portas, no entanto, os efeitos tendem a ser de curta duração
(Kaiser et al., 2006), mesmo em áreas mais profundas (Kenchington et al., 2001). Este
petrecho é consideravelmente mais leve do que os anteriores, tendo seu contato com o fundo
oceânico limitado às suas portas, e pode produzir uma perturbação no leito marinho
comparável àquela produzida pelo equipamento de arrasto duplo e arrasto de parelhas,
amplamente utilizados na costa brasileira. Enquanto estes resultados sugerem impactos um
pouco reduzidos desta frota na grande área de areia e lama da plataforma, nas áreas ao norte
(norte de 24°S), onde o cascalho e substratos de origem biogênica estão submetidos a
atividade da pesca de arrasto (não totalmente avaliada por este estudo), impactos ecológicos
mais importantes são esperados. Experimentos realizados com diferentes petrechos de arrasto,
para avaliar a situação antes e depois da ação do petrecho, em áreas com substrato de cascalho
e de origem biogênica, indicaram em geral que a recuperação da comunidade bentônica ao seu
estado original pode levar anos (Kaiser et al., 2002; 2006).
Impactos do arrasto na área "núcleo" foram produzidos principalmente pela estratégia
de pesca de arrasto de camarões. Mais de 300 embarcações utilizaram esta estratégia de pesca
ao longo do ano, combinando operações tanto no extremo norte da área "núcleo", visando o
camarão-rosa e o camarão-sete-barbas, como da plataforma sul, tendo como alvo os camarões
costeiros e linguados (Valentini & Pezzuto, 2006). Em comparação com as outras estratégias,
estas embarcações utilizaram a área mais extensa da plataforma e perturbaram mais a
superfície dos habitats de areia/lama para produzir o menor volume de biomassa
desembarcada. Em conjunto com as suas altas taxas de consumo de combustível e emissão de
gases de efeito estufa (Port et al., 2014), a mais alta produção de mortalidade indireta em
função do bycatch e descartes (Perez et al., 2001) e seu potencial de sobrepesca e esgotamento
de estoques locais (D’Incao et al., 2002; Perez, 2002; Pezzuto & Borzone, 2004), o arrasto
duplo de camarões pode figurar entre o principal estressor dos ambientes de fundo da costa
Sudeste e Sul do Brasil. O manejo desta importante atividade econômica e social, visando sua
80
sustentabilidade dentro de um sentido ecológico amplo, conciliando com outras modalidades
de pesca e usos das áreas de plataforma, tem sido uma tarefa crítica na agenda ambiental do
ambiente marinho do país e deve exigir soluções complexas.
Por outro lado, a exploração espacial das áreas de talude tem sido moderada em
relação à grande área disponível. Dentro da área "núcleo" identificada, no entanto, apesar da
alta produtividade em geral, uma área significativa foi "varrida" em associação com o
consumo elevado de combustível e emissões de CO2 (Port et al., 2014). Além disto, foram
relatadas importantes reduções de curto-prazo da biomassa de estoques-chave, como o peixe-
sapo, abrótea, merluza, cherne-poveiro e outros (vide Perez et al., 2009a). Como geralmente
atribuído aos estoques de águas profundas (Koslow et al., 2000), estes são menos produtivos e
menos resilientes do que os estoques de plataforma (Perez, 2006). Não foi possível concluir
uma expansão da "pegada" da pesca de arrasto de talude, na última década, parcialmente em
função da resolução espacial "grosseira" dos dados analisados, mas também não foi possível
descartar esta expansão, considerando o aumento significativo da área varrida por esta
estratégia de pesca. No geral, considerando as evidências existentes, "congelar a pegada"
(freezing the footprint) atual da pesca de arrasto de talude, junto com o esforço e/ou
limitações de mortalidade por pesca (Perez et al., 2009a), é uma medida de precaução
desejável para assegurar a conservação destes ecossistemas frágeis da margem continental
brasileira profunda. Isto pode vir a ser benéfico também para o desenvolvimento da atual e
futura exploração de petróleo em alto mar, cujas áreas se sobrepõe parcialmente com as áreas
de pesca de arrasto de talude (Agência Nacional do Petróleo - ANP; www.anp.gov.br).
Jennings et al. (2012) analisando a "pegada" da pesca de arrasto no Mar do Norte
concluíram que os impactos críticos resultam da expansão do esforço de pesca das áreas
"núcleo" para as áreas marginais, pouco impactadas. Eles concluíram que a definição de áreas
de pesca que excluem estas áreas marginais pouco impactadas poderia reduzir,
substancialmente, o impacto nos habitats. A delimitação da "pegada" da pesca industrial de
arrasto do Sudeste e Sul do Brasil e suas áreas "núcleo" compõe um primeiro passo para
avaliar tais áreas marginais, por exemplo, na quebra da plataforma e no talude em
profundidades menores do que 500 m, fornecendo informações preliminares para futuras
ações de gestão ecossistêmica da pesca e estratégias de planejamento espacial marinho. Este
processo irá se beneficiar, em grande parte, com a análise de dados georeferenciados mais
precisos de esforço, como os produzidos por sistemas de monitoramento de embarcações
(VMS - Vessel Monitoring System) (Jennings & Lee, 2012; Gerritsen et al., 2013).
81
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CAPÍTULO 3
CARACTERIZAÇÃO E VARIAÇÃO ESPAÇO-TEMPORAL DE INDICADORES
ECOLÓGICOS DA CAPTURA DESEMBARCADA PELA FROTA INDUSTRIAL DE
ARRASTO DO SUDESTE/SUL DO BRASIL NO PERÍODO 2003-2011
87
RESUMO
Este estudo apresenta pela primeira vez a caracterização e variação espaço-temporal de
indicadores ecológicos da captura desembarcada pela frota industrial de arrasto de fundo que
opera na região Sudeste e Sul do Brasil. Os indicadores analisados são referentes aos
desembarques por esta frota, nos portos de Santa Catarina, no período de 2003-2011. Foram
calculados os índices de diversidade de Shannon, equitabilidade de Pielou, nível trófico
médio, índice da pesca em equilíbrio (Fishing-in-Balance index), vulnerabilidade média e
resiliência média, para a frota de arrasto industrial como um todo e separadamente para cada
uma das três estratégias de pesca que ocorrem na região (arrasto de parelhas, arrasto de
camarões e arrasto de talude). Capturas provenientes das áreas de pesca mais profundas
(plataforma externa, quebra da plataforma e talude) apresentaram os menores valores de
diversidade, equitabilidade e resiliência média e os maiores valores para nível trófico médio e
vulnerabilidade média. Por outro lado, capturas removidas das áreas mais rasas (plataforma
interna e plataforma média) apresentaram um comportamento contrário. Constatou-se uma
leve tendência de queda nos valores do nível trófico médio das capturas, durante 2003-2011,
padrão este fortemente afetado pela oscilação nos desembarques das principais espécies-alvo.
O índice da pesca em equilíbrio (Fishing-in-Balance index – FiB) sofreu um incremento
durante o período avaliado, possivelmente como resultado da expansão da área de ocupação
da frota de arrasteiros em direção ao talude, explorando desta forma, um ecossistema mais
amplo.
Palavras-chave: pesca de arrasto; indicadores tróficos; vulnerabilidade; resiliência; Oceano
Atlântico Sudoeste.
ABSTRACT
This study provides first-time the characterization and spatio-temporal variation of ecological
indicators of landed biomass by the trawl fishing fleet operating off southeastern and southern
Brazil. Analyzed indicators are from landed biomass by this fleet in the harbors of Santa
Catarina state between 2003 and 2011. We calculated the Shannon diversity index, Pielou
evenness index, mean trophic level, Fishing-in-Balance index, medium vulnerability and
medium resilience, for the industrial trawl fleet as a whole and separately for each one of the
three fishing strategies that occur in the region (pair trawl, shrimp trawl and slope trawl). The
88
biomass captured from deeper fishing areas (outer shelf, shelf break and slope) had the lowest
values of diversity, evenness and medium resilience and the highest values for mean trophic
level and medium vulnerability, while the biomass captured from more shallow areas (inner
and middle shelf) showed an opposite behavior. There was a slight downward trend in the
mean trophic level of the catches landed between 2003 and2011This pattern, however was
strongly affected by oscilantions of landings of the main target species. The Fishing-in-
Balance index (FiB) increased throughout the study period, possibly as the outcome of an
expansion of the trawl fleet fishing area towards the slope exploiting a broader ecosystem.
Keywords: trawl fisheries; trophic indicators; vulnerability; resilience; SW Atlantic.
INTRODUÇÃO
A frota industrial, em todo o mundo, é responsável pela maior parte das capturas
anuais da pesca, fornecendo, desta forma, uma parcela importante da proteína animal de
origem marinha, cuja demanda é crescente (FAO, 2012). Apesar desta contribuição
importante para a alimentação humana, esta atividade tem como consequência uma série de
impactos ambientais (potenciais ou efetivos), tais como o consumo de combustíveis fósseis
durante as operações de navegação e pesca (Tyedmers, 2004; Tyedmers et al., 2005;.
Suuronen et al., 2012; Port et al., 2014); a emissão de gases de efeito estufa para a atmosfera
(Ziegler & Hansson, 2003; Fulton, 2010; Port et al., 2014); a degradação de habitats através
do contato de equipamentos de pesca com o fundo do mar (Kaiser et al., 2006; Queirós et al.,
2006; Olsgard et al., 2008; Ivanovic et al., 2011; Korpinen et al., 2013); redução da biomassa
dos estoques naturais através da sobrepesca (Garcia & Grainger, 2005); e alteração da
estrutura da comunidade e funcionamento do ecossistema através da redução de predadores de
topo, bycatch e descartes (Pauly et al., 1998, 2005;. Kelleher, 2008).
Neste mesmo cenário, no mundo todo, a pesca de arrasto constitui a principal fonte de
peixes demersais e bentônicos, bem como de outros frutos do mar (Thurstan et al., 2010).
Entre as várias formas de impacto exercido pelas redes de arrasto, em geral, destaca-se a sua
pequena seletividade e tendência a gerar capturas multi-específicas (Kelleher, 2008) cujas
consequências sobre as comunidades de fundo vão além das relações populacionais de
espécies de interesse comercial afetando também a resiliência, diferentes espécies não-
comerciais, a estrutura das comunidades biológicas e por conseguinte, o próprio
89
funcionamento dos ecossistemas e sua capacidade de provisão de serviços (Cardinale et al.,
2012).
Esta situação é similar no Sudeste e Sul do Brasil (19° - 34°S), onde a frota industrial
de arrasto é responsável pela principal fração das capturas demersais, atuando com mais de
650 embarcações, desde o final da década de 1990, desembarcando, aproximadamente 1/3 da
biomassa anual da região (Perez et al., 2001; Valentini & Pezzuto, 2006). De acordo com
avaliações dos estoques, realizadas no final dos anos 1990 e durante os anos 2000, as
principais populações-alvo, tanto de áreas de plataforma como de talude tiveram redução da
sua biomassa (Haimovici, 1997; D’Incao et al., 2002; Haimovici et al., 2006; Perez et al.,
2009), apresentando-se esta situação como uma evidência do impacto direto da pesca
industrial de arrasto sobre os ecossistemas bentônicos do Sudeste e Sul do Brasil. Outros
impactos desta modalidade de pesca, como a perturbação dos habitats, as mudanças na
estrutura das comunidades, o consumo de combustíveis fósseis e as emissões de gases de
efeito estufa, foram pouco estudadas (e.g. Gasalla & Rossi-Wongtschowski, 2004; Almeida &
Vivan, 2011; Port et al., 2014) ou são praticamente desconhecidas.
Nos últimos anos, a sustentabilidade da pesca tem sido uma preocupação generalizada,
e algumas abordagens ecossistêmicas têm sido propostas para gerir as pescarias (Jennings &
Kaiser, 1998; Garcia et al., 2003; Pikitch, et al., 2004). De acordo com Grafton et al. (2008) e
Squires (2009), um dos grandes desafios do gerenciamento dos oceanos é a gestão combinada
dos estoques pesqueiros e a conservação das comunidades das quais estes estoques dependem,
sendo que esta discussão vai além da sobrepesca, incluindo aspectos ambientais, ecológicos e
da biodiversidade. Por outro lado, muitos conceitos ligados a gestão ecossistêmica, como
“saúde do ecossistema”, são de difícil tradução em objetivos operacionais que possam ser
utilizados diretamente na elaboração de políticas de gerenciamento (Larkin, 1996). Esta visão
ecossistêmica da gestão da pesca, que vem ganhando espaço nos últimos anos é importante,
pois a atividade pesqueira afeta níveis tróficos bem distantes das espécies que são
normalmente comercializadas (Pauly et al., 1998).
Desta forma, para que seja possível uma gestão ecossistêmica das pescarias é
necessário inicialmente conhecer como ambientes, as populações e comunidades que
compõem as áreas de pesca são impactados pela atividade pesqueira. Portanto, são
necessários indicadores preditivos, que possam ser facilmente parametrizados, utilizando
dados de fácil acesso, que possam traduzir de forma simples a variedade de processos
complexos que ocorrem em um ecossistema (Christensen, 2000; Murawski, 2000; Pauly &
Watson, 2005). Entre estes indicadores, podemos destacar alguns descritores da estrutura de
90
comunidades biológicas, como Índice de Diversidade de Shannon (H’) e o Índice de
Equitabilidade de Pielou (J’) (Pielou, 1975) e outros específicos para ambientes marinhos,
mais recentes, como o Nível Trófico Médio (NTM) (Pauly et al., 1998), Índice da Pesca em
Equilíbrio (Fishing-in-Balance index - FiB, Pauly et al., 2000), Vulnerabilidade e Resiliência
(Froese & Pauly, 2014).
Assim sendo, junto com uma prévia avaliação do consumo de combustível e as
emissões de gases de efeito estufa (Port et al., 2014) e a avaliação da “pegada espacial”
(footprint) nos ambientes de fundo oceânico (Capítulo 2), resultados da atuação da frota
industrial de arrasto de fundo da região Sudeste e Sul do Brasil, este trabalho tem por objetivo
avaliar, através de índices ecológicos aplicados aos componentes da captura desembarcada
por esta frota nos portos de Santa Catarina, os impactos populacionais e ecossistêmicos
produzidos, por esta modalidade de pesca, sobre os ecossistemas bentônicos, contribuindo
para iniciativas de gestão ecossistêmica e de planejamento espacial do ambiente marinho.
MATERIAL E MÉTODOS
Pesca de arrasto de fundo
A pesca industrial de arrasto de fundo nas regiões Sudeste e Sul do Brasil
desenvolveu-se na década de 1960 essencialmente como uma pescaria de camarões costeiros
(Farfantepenaeus paulensis, F. brasiliensis e Xyphopenaeus kroyeri). Durante os 40 anos
seguintes, com o decréscimo nos estoques de camarões, a pesca de arrasto expandiu sua área
de atuação ao longo da plataforma continental e diversificou seus alvos, incluindo peixes
demersais da família Sciaenidae (i.e. Micropogonias furnieri, Cynoscion guatucupa,
Macrodon ancylodon, Umbrina canosai, entre outros) e os linguados (Paralychthys spp.),
bem como outros crustáceos e moluscos de valor comercial (i.e. camarões Artemesia
longinaris e Pleoticus muelleri, lagostas Metanephrops rubellus e Scillarides depressus e
cefalópodes Doryteuthis plei e Octopus vulgaris). Na última década, as operações de arrasto
expandiram suas atividades para as áreas de talude (até 800 m de profundidade), iniciando
uma exploração sem precedentes dos recursos de águas profundas como o peixe-sapo
(Lophius gastrophysus), merluza (Merluccius hubbsi), abrótea-de-profundidade (Urophycis
mystacea), calamar-argentino (Illex argentinus) e os camarões de profundidade (Família
Aristeidae) (Perez et al., 2001; Perez et al., 2009).
Desde o final da década de 1990, mais de 650 embarcações de arrasto de fundo
operam do Espírito Santo (19°S) até o limite sul da ZEE brasileira (34°S), estabelecendo uma
91
área de operação que se estende de águas costeiras (~10 m de profundidade) até o talude
(~800 m de profundidade). A frota é composta por barcos de arrasto duplo (75%), arrasto de
parelhas (23%) e arrasto simples (2%) que apresentam padrões distintos de operação, com
base na disponibilidade espacial e temporal dos recursos demersais e a capacidade de suas
artes de pesca (Perez et al., 2001). Estes padrões foram utilizados para caracterizar três
principais “estratégias de pesca” (Dias et al., 2012a; 2012b; Dias & Perez, 2012), utilizadas
neste estudo: (a) arrasto de camarões (AC) é composto basicamente por barcos de arrasto
duplo que operam na plataforma interna e média, concentrando suas atividades em duas áreas
distintas; uma entre 24°-29°S (tendo como espécies-alvo camarão-rosa e camarão-sete-
barbas) e uma segunda ao sul de 29°S dirigida a outros camarões costeiros (A. longinaris e P.
muelleri) e um grupo de peixes demersais (castanha, cabrinha e linguados); (b) arrasto de
talude (AT) realizado por barcos de arrasto duplo e arrasto simples que atuam nas áreas de
talude (250-400 m de profundidade) tendo como alvo principal abrótea-de-profundidade,
merluza e peixe-sapo; e (c) arrasto de parelhas (AP) operado por duas embarcações arrastando
uma única grande rede. Estes barcos atuam na plataforma interna, tendo como espécies-alvo
alguns peixes cianídeos, incluindo U. canosai, Micropogonias furnieri, Cynoscion guatucupa,
C. acoupa e C. jamaicensis.
Fonte dos dados – Pescaria
O conjunto de dados analisados é composto por informações de capturas, esforço e
áreas de pesca de 10.144 viagens de pesca (arrasto duplo = 8.012 viagens; arrasto simples =
949 viagens; arrasto de parelhas = 1.183 viagens) que desembarcaram suas capturas nos
portos de Santa Catarina entre 2003 e 2011 (Port et al., 2014) (Tabela 1). Os dados foram
reportados pelos mestres das embarcações, nos diários de bordo ou durante entrevistas no
momento do desembarque, de acordo com um protocolo de amostragem estabelecido pelo
serviço de estatística pesqueira industrial de Santa Catarina (Perez et al., 1998;
www.univali.br/gep). Como parte deste protocolo de rotina, as informações obtidas através
destes dois instrumentos foram avaliadas por analistas experientes, com base nas tendências
de longo prazo da pesca de arrasto industrial na região (e.g. áreas de pesca, profundidades,
espécies comuns nas capturas, quantidades capturadas, duração das viagens, etc.). Os
resultados desta análise foram classificados como “confiável”, “duvidoso” e “não confiável” e
apenas aqueles incluídos na primeira categoria foram utilizados no banco de dados analisado.
Uma vez que resultados “duvidosos” não são comuns e necessariamente não contém
informações falsas, estes foram submetidos a uma segunda avaliação e eventualmente foram
92
“resgatados” dos que haviam sido rejeitados. Este é o caso em particular quando mais de um
instrumento (diário de bordo e entrevista) estava disponível para o mesmo desembarque e as
informações podiam ser cruzadas para verificar a consistência dos dados.
Tabela 1. Resumo da frota de arrasto e operações de pesca monitoradas nos portos de Santa Catarina, sul do
Brasil, entre 2003 e 2011. Os dados estão agregados por tipo de embarcação e ano.
Tipo de arrasto Ano Embarcações Viagens
Arrasto duplo
2003 275 1133
2004 271 1021
2005 293 1096
2006 315 1300
2007 320 1577
2008 288 1409
2009 325 1570
2010 277 1215
2011 268 1187
Média±dp 292,4 ± 22,2 1278,7 ± 201,5
Arrasto simples
2003 26 151
2004 25 98
2005 39 108
2006 23 105
2007 25 112
2008 28 101
2009 26 175
2010 33 230
2011 29 204
Média±dp 28,2 ± 5,0 142,7 ± 49,7
Arrasto de parelhas
2003 46 292
2004 46 203
2005 48 217
2006 45 214
2007 39 294
2008 33 205
2009 27 195
2010 24 166
2011 26 141
Média±dp 37,1 ± 9,7 214,1 ± 50,8
Todas embarcações (2003-2011) Média±dp 357,8 ± 23,6 1635,4 ± 217,7
Total - 14719
Os relatórios de desembarque analisados representam uma fração conhecida
(aproximadamente 70%) dos desembarques totais nos portos de Santa Catarina
(UNIVALI/CTTMar, 2004, 2006, 2007a, 2007b, 2008, 2009, 2010, 2011, 2013).
Todas as variáveis de cada viagem de pesca foram atribuídas a quadrantes de 30’ x 30’
de acordo com as informações dos mestres das embarcações. Em viagens onde os dados
93
individuais de arrasto não estavam disponíveis os valores foram divididos, igualmente, entre
todos os quadrantes visitados (UNIVALI/CTTMar, 2010).
Fonte dos dados – Espécies desembarcadas
Todas as espécies (peixes, crustáceos e moluscos) desembarcadas nos portos de Santa
Catarina pela frota industrial de arrasto, entre 2003 e 2011, foram consideradas neste estudo.
Desembarques com informações insuficientes sobre a identificação das espécies foram
excluídos (aproximadamente 2% da biomassa total desembarcada) das análises. Estimativas
do nível trófico, resiliência e vulnerabilidade das espécies desembarcadas foram obtidas a
partir das bases de dados FishBase (Froese & Pauly, 2014), SeaLifeBase (Palomares & Pauly,
2014) e SeaAroundUs (http://www.seaaroundus.org/) ou, se os valores referentes a alguma
espécie não estavam disponíveis nestas bases, de acordo com referências específicas (e.g.
Patterson, 1988; Haimovici et al., 1998; García-Rodriguez et al., 2000; Leite Jr. & Petrere Jr.,
2006; Metri, 2007; Campos et al., 2011; Duarte et al., 2011; Nascimento et al., 2012; Milessi
& Jaureguizar, 2013; Romero et al., 2013; Garcia & Giarrizzo, 2014), assumindo que tais
valores foram invariáveis ao longo do tempo. Para as categorias que incluem mais de uma
espécie foi utilizado o maior valor encontrado para as espécies individualmente. Para maiores
informações vide a Tabela 2.
Tabela 2. Lista de espécies (ou grupo de espécies) desembarcadas pela frota industrial de arrasto nos portos de
Santa Catarina, entre 2003-2011, com o respectivo nível trófico, resiliência, vulnerabilidade e representação
percentual do total da biomassa desembarcada durante o período de estudo. Nível trófico, resiliência e
vulnerabilidade de acordo com FishBase (Froese & Pauly, 2014), SeaLifeBase (Palomares & Pauly, 2014) e
SeaAroundUs (http://www.seaaroundus.org/) ou, se os valores referentes a alguma espécie não estavam
disponíveis nestas bases, de acordo com referências específicas (e.g. Patterson, 1988; Haimovici et al., 1998;
García-Rodriguez et al., 2000; Leite Jr. & Petrere Jr., 2006; Metri, 2007; Campos et al., 2011; Duarte et al.,
2011; Nascimento et al., 2012; Milessi & Jaureguizar, 2013; Romero et al., 2013; Garcia & Giarrizzo, 2014).
Resiliência: 1=muito baixa; 2=baixa; 3=média; 4=alta. Vulnerabilidade: baixa (≤25); baixa a moderada
(>25≤35); moderada (>35≤45); moderada a alta (>45≤55); alta (>55≤65); alta a muito alta (>65≤75); muito alta
(>75). Espécies em ordem de representação percentual do total da biomassa desembarcada durante o período de
estudo.
Grupo/Espécies Nível
trófico Resiliência Vulnerabilidade
% da biomassa
desembarcada
Peixes
Umbrina canosai 3,90 3 30 15,206834
Prionotus punctatus 3,80 2 55 10,627239
Urophycis mystacea 4,00 2 62 10,013567
Cynoscion guatucupa 4,20 3 39 8,771908
Micropogonias furnieri 3,30 3 66 8,130711
Merluccius hubbsi 4,20 2 58 4,828137
Várias espécies das famílias Rajidae
e Arhynchobatidae (1) 4,02 2 77 3,675716
Cynoscion acoupa 4,10 3 45 3,081374
94
Urophycis brasiliensis 3,80 3 36 2,934923
Paralichthys spp. 4,00 3 55 2,641181
Cynoscion jamaicensis 4,20 4 32 2,550088
Lophius gastrophysus 4,50 3 52 2,191587
Paralichthys isosceles
P. triocellatus 4,30 3 52 1,814611
Balistes capriscus 3,60 3 32 0,801021
Percophis brasiliensis 4,30 3 57 0,707726
Cynoscion spp. 4,12 3 57 0,641233
Macrodon ancylodon 3,90 3 36 0,607191
Menticirrhus spp. 3,90 3 38 0,597096
Genypterus brasiliensis 4,00 2 57 0,573002
Paralonchurus brasiliensis 3,10 4 24 0,468620
Trichiurus lepturus 4,50 3 57 0,459648
Várias espécies de Arhynchobatidae (2) 4,50 1 75 0,369635
Peprilus paru 4,00 4 20 0,327687
Mullus argentinae 3,50 3 27 0,302389
Rhinobatos horkelii
R. percellens 3,80 1 71 0,270447
Lopholatilus villarii 3,70 2 76 0,223337
Polymixia lowei 4,00 3 37 0,221644
Haemulon aurolineatum 3,20 3 37 0,183258
ARIIDAE 3,50 1 35 0,179288
Porichthys porosissimus 3,70 3 35 0,161980
Nemadactylus bergi 3,20 3 52 0,156449
Zenopsis conchifer 4,50 2 54 0,148889
Pequenos tubarões (3) 4,10 1 90 0,119836
Helicolenus lahillei 4,40 1 68 0,108590
Tubarões (4) 4,10 1 90 0,105641
Chloroscombrus chrysurus 3,20 3 29 0,100357
Conger orbignyanus 3,70 3 63 0,082089
Squatina spp. 4,00 1 90 0,080588
Paralichthys orbignyanus 3,50 3 51 0,065207
Pomatomus saltatrix 4,50 3 58 0,047279
Oligoplites saurus 4,50 3 25 0,043665
Selene spp. 3,90 3 35 0,041356
Cynoscion leiarchus 4,10 3 37 0,039658
Pagrus pagrus 3,70 3 66 0,038816
Diapterus rhombeus 2,90 4 18 0,036442
Conodon nobilis 3,50 3 33 0,036319
Squalus spp. 4,00 1 90 0,025034
Cynoscion virescens 4,00 3 57 0,019053
CONGRIDAE
OPHIDIIDAE 3,98 2 63 0,016361
Pseudopercis numida 3,90 2 65 0,016320
Centropomus spp. 4,10 3 55 0,013329
Chaetodipterus faber 4,50 3 37 0,013141
Larimus breviceps 3,10 4 25 0,012957
Squalus spp. 4,00 1 90 0,010045
Trachinotus carolinus 3,50 3 37 0,009316
POLYPRIONIDAE
SERRANIDAE 4,00 2 66 0,008906
Priacanthus arenatus 4,00 4 25 0,008023
95
Cynoscion microlepidotus 4,10 2 56 0,007401
Carcharhinus spp. 4,20 1 62 0,005960
Mustellus spp. 3,60 1 90 0,004395
Mugil curema
M. liza 2,00 3 59 0,004129
Diplodus argenteus 3,10 3 45 0,004020
Seriola dumerili 4,50 3 54 0,003869
Squalus acanthias 4,30 1 69 0,003859
Lagocephalus laevigatus 4,00 2 60 0,003451
Parona signata 3,40 3 35 0,002482
Astroscopus sexspinosus 4,20 3 42 0,002353
Stellifer rastrifer 3,50 4 16 0,002292
Lutjanus spp. 4,30 2 66 0,001677
Mustelus canis
M. schmitti 3,70 1 87 0,001415
Eucinostomus spp. 3,30 3 25 0,001170
Isurus oxyrinchus 4,50 1 86 0,000958
Caulolatilus chrysops 3,60 3 49 0,000869
Caranx latus 4,40 3 57 0,000817
Bagre marinus 2,50 2 56 0,000650
Sphyrna spp. 4,50 1 90 0,000636
Scomberomorus brasiliensis 3,30 3 67 0,000635
Epinephelus marginatus 3,70 2 72 0,000631
Carcharias taurus 4,50 1 68 0,000571
Carcharhinus spp. 4,40 1 90 0,000499
Diplectrum spp. 3,90 4 35 0,000477
Elops saurus 4,00 3 38 0,000472
Beryx splendens 4,40 2 57 0,000442
Pogonias cromis 3,90 3 62 0,000433
Macruronus magellanicus 3,90 2 71 0,000433
Seriola lalandi 4,10 2 69 0,000273
Trachurus lathami 4,00 3 37 0,000260
Polyprion americanus 4,10 2 76 0,000236
Engraulis anchoita 2,50 3 35 0,000208
Caranx crysos 4,40 3 34 0,000201
Brevoortia aurea
B. pectinata 3,40 4 38 0,000139
Epinephelus itajara 4,10 2 70 0,000113
Opisthonema oglinum 4,50 3 24 0,000095
Gempylus serpens 4,40 4 63 0,000095
Epinephelus flavolimbatus 3,80 2 66 0,000088
Aulostomus maculatus 4,30 3 50 0,000087
Xiphias gladius 4,50 2 72 0,000075
Barbatana de tubarão (5) 4,10 1 90 0,000074
Coryphaena hippurus 4,40 4 39 0,000061
Archosargus probatocephalus 3,50 3 36 0,000060
Prionace glauca 4,20 1 67 0,000022
Mitsukurina owstoni 4,10 1 90 0,000017
Lepidocybium flavobrunneum 4,30 2 85 0,000009
Masturus lanceolatus 4,20 3 86 0,000009
Galeocerdo cuvieri 4,50 2 64 0,000008
Scomber japonicus
S. colias 3,90 3 46 0,000004
96
Obs.: (1) Rioraja agassizii, Atlantoraja castelnaui, Psammobatis spp., Sympterygia spp., Dipturus spp.,
Atlantoraja platana; (2) Atlantoraja cyclophora, A. castelnaui, A. platana, Rioraja agassizii; (3) Pequenos
tubarões de várias famílias (TRIAKIDAE, SPHYRNIDAE, CARCHARHINIDAE, SQUALIDAE); (4) Tubarões
de várias famílias (LAMNIDAE, CARCHARHINIDAE, TRIAKIDAE, ODONTASPIDIDAE, SPHYRNIDAE,
ALOPIDAE, SQUALIDAE); (5) Barbatana de tubarão. A identificação da espécie não é possível.
Transformação dos dados
A partir dos dados analisados foram calculados diversos índices ecológicos, de acordo
com as equações a seguir descritas. Ressalta-se que os valores encontrados para os diferentes
índices não representam as capturas totais, mas sim as capturas desembarcadas, uma vez que
não foram considerados os descartes. Desta forma, estes índices podem refletir uma
associação entre a diversidade de espécies das áreas arrastadas e o processo de
aproveitamento/rejeição de espécies a bordo, estabelecido por cada estratégia de pesca.
Índice de diversidade de Shannon (H’)
H′ = − ∑y
Y× log
y
Y (Equação 1)
Scomberomorus cavalla 4,50 2 69 0,000003
Crustáceos
Artemesia longinaris 2,70 3 10 6,262745
Xiphopenaeus kroyeri 2,70 4 10 2,714824
Pleoticus muelleri 2,20 3 10 1,577515
Farfantepenaeus paulensis
F. brasiliensis 2,70 4 10 1,186427
Plesionika longirostris 2,50 4 10 0,379497
Pleoticus muelleri
Artemesia longinaris 2,70 3 10 0,233324
Metanephrops rubellus 2,83 3 14 0,206917
Litopenaeus schmitti 2,50 4 10 0,065539
Scyllarides deceptor 2,83 4 10 0,053930
Aristaeopsis edwardsiana 2,50 3 10 0,002466
Chaceon ramosae
C. notialis 2,23 2 10 0,000726
Aristaeomorpha foliacea 2,50 4 10 0,000236
Aristeus sp. 2,50 3 10 0,000013
Moluscos
Doryteuthis pleii
D. sanpaulensis 3,20 1 25 1,300445
Illex argentinus 4,00 3 19 0,632172
Eledone massyae
E. gaucha
Octopus vulgaris
3,57 3 78 0,356883
Euvola ziczac 2,00 3 10 0,000470
97
Onde, H’ é o índice de Shannon; y é a biomassa desembarcada de cada espécie (ou
grupo de espécies); e Y é o total da biomassa desembarcada.
Índice de equitabilidade de Pielou (J’)
J′ =H′
log𝑛 𝑆𝑖
(Equação 2)
Onde H’ é o índice de Shannon e lognSi é o máximo valor de H’ onde Si = número
total de espécies.
Nível trófico médio
O nível trófico médio é calculado pela seguinte equação:
NTMk = ∑ YikTLi
mi=1
∑ Yikmi=1
(Equação 3)
Onde, 𝐍𝐓𝐌𝐤 é o nível trófico médio no ano (𝐤); 𝐘𝐢𝐤 é o peso desembarcado da espécie
𝐢 no ano 𝐤 e 𝐦 é o número de espécies ou grupo de espécies capturadas no ano 𝐤; e 𝐓𝐋𝐢 é o
nível trófico da espécie 𝐢 (Pauly et al., 2001). Este índice tem sido utilizado para avaliar os
efeitos ecossistêmicos da pesca tomando como base o pressuposto que esta atividade tende a
reduzir a biomassa e a diversidade de espécies de níveis tróficos mais elevados (por ex.
predadores de topo) e reduzindo o nível trófico médio do ecossistema explotado. Isso ocorre
se uma pescaria inicia direcionando seu esforço aos predadores de topo passando
subsequentemente para níveis inferiores na medida em que a abundância dos primeiros decai
(efeito “fishing down the food web”, Pauly et al., 1998).
Índice da Pesca em Equilíbrio (FiB)
O Índice da Pesca em Equilíbrio (Fishing-in-Balance index, Pauly et al., 2000) foi
desenvolvido para avaliar as consequências de uma diminuição no nível trófico médio,
quando esta ocorreu pela “escolha” de direcionar a pesca para níveis tróficos inferiores
(Kleisner & Pauly, 2011). Nesse caso se esperaria um aumento na biomassa desembarcada
coerente com o aumento da disponibilidade de biomassa dos níveis tróficos inferiores. O
98
índice deveria se manter constante (FiB = 0) se a pescaria for “equilibrada”, ou seja todas as
mudanças nos níveis tróficos são acompanhadas por mudanças “ecologicamente
equivalentes” nas capturas. FiB deveria aumentar (FiB > 0) quando há um incremento na
produtividade primária do ambiente (efeito “bottom-up”) ou quando a pescaria se expande
para novas áreas aumentando a dimensão do ecossistema explotado. Por fim FiB deveria
diminuir (FiB < 0) pelo efeito do descarte não representado nas capturas registradas, ou se o
funcionamento do ecossistema é limitado pela remoção de níveis excessivos de biomassa ou
outro fator natural ou antrópico. FiB foi um índice proposto para ser analisado conjuntamente
com o índice do nível trófico médio e desta forma avaliar se eventuais mudanças no nível
trófico médio tem sido compensadas por alterações nas capturas (Kleisner & Pauly, 2011):
FiBk = log (Yk (
1
TE)
𝑇𝐿̅̅̅̅ 𝑘
) − log (Y0 (1
TE)
𝑇𝐿̅̅̅̅ 0
) (Equação 4)
Onde k é o ano, 0 = ano base (2003), Y = capturas, 𝑇𝐿̅̅̅̅ = nível trófico médio da
captura, e TE = eficiência de transferência entre níveis tróficos = 0,1 (Pauly & Christensen,
1995).
Vulnerabilidade média
A vulnerabilidade é considerada como o risco de extinção resultante da atividade
pesqueira, desconsiderando outros fatores (Cheung et al., 2004; 2005; Strona et al., 2013;
Strona, 2014). A vulnerabilidade média é calculada pela seguinte equação (adaptado de Pauly
et al., 2001):
VMk = ∑ YikVi
mi=1
∑ Yikmi=1
(Equação 5)
Onde, 𝐕𝐌𝐤 é a vulnerabilidade média no ano (𝐤); 𝐘𝐢𝐤 é o peso desembarcado da
espécie 𝐢 no ano 𝐤 e 𝐦 é o número de espécies ou grupo de espécies capturadas no ano 𝐤; e 𝐕𝐢
é a vulnerabilidade da espécie 𝐢. O valor da vulnerabilidade de cada espécie foi obtida nos
bancos de dados de FishBase (Froese & Pauly, 2014), SeaLifeBase (Palomares & Pauly,
2014) e SeaAroundUs (http://www.seaaroundus.org/) ou, se os valores referentes a alguma
espécie não estavam disponíveis nestas bases, de acordo com referências específicas (e.g.
99
Patterson, 1988; Haimovici et al., 1998; García-Rodriguez et al., 2000; Leite Jr. & Petrere Jr.,
2006; Metri, 2007; Campos et al., 2011; Duarte et al., 2011; Nascimento et al., 2012; Milessi
& Jaureguizar, 2013; Romero et al., 2013; Garcia & Giarrizzo, 2014).
Os valores obtidos para a vulnerabilidade foram enquadrados em sete categorias, de
acordo com o proposto por Froese & Pauly (2014) (Tabela 3).
Tabela 3. Categorias de vulnerabilidade e respectivos intervalos de valores, de acordo com Froese & Pauly
(2014).
Categoria Intervalo
Baixa ≤ 25
Baixa a Moderada > 25 ≤ 35
Moderada > 35 ≤ 45
Moderada a Alta > 45 ≤ 55
Alta > 55 ≤ 65
Alta a Muito Alta > 65 ≤ 75
Muito Alta > 75
Resiliência média
A resiliência é a capacidade de uma população se recuperar de perturbações da pesca
intensiva (UN, 1997). A resiliência média é calculada pela seguinte equação (adaptado de
Pauly et al., 2001):
RMk = ∑ YikRi
mi=1
∑ Yikmi=1
(Equação 6)
Onde, 𝐑𝐌𝐤 é a resiliência média no ano (𝐤); 𝐘𝐢𝐤 é o peso desembarcado da espécie 𝐢
no ano 𝐤 e 𝐦 é o número de espécies ou grupo de espécies capturadas no ano 𝐤; e 𝐑𝐢 é a
resiliência da espécie 𝐢. O valor da resiliência de cada espécie foi obtida nos bancos de dados
de FishBase (Froese & Pauly, 2014), SeaLifeBase (Palomares & Pauly, 2014) e SeaAroundUs
(http://www.seaaroundus.org/) ou, se os valores referentes a alguma espécie não estavam
disponíveis nestas bases, de acordo com referências específicas (e.g. Patterson, 1988;
Haimovici et al., 1998; García-Rodriguez et al., 2000; Leite Jr. & Petrere Jr., 2006; Metri,
2007; Campos et al., 2011; Duarte et al., 2011; Nascimento et al., 2012; Milessi &
Jaureguizar, 2013; Romero et al., 2013; Garcia & Giarrizzo, 2014).
Os valores obtidos para a resiliência foram enquadrados em quatro categorias, de
acordo com o proposto por Froese & Pauly (2014) (Tabela 4).
100
Tabela 4. Categorias de resiliência e respectivos intervalos de valores, de acordo com Froese & Pauly (2014).
Categoria Intervalo
Alta ≥ 4
Média ≥ 3 e < 4
Baixa ≥ 2 e < 3
Muito baixa ≥ 1 e < 2
Análise dos dados
A obtenção de valores agregados temporal e espacialmente dos índices de diversidade,
equitabilidade, nível trófico, resiliência e vulnerabilidade das pescarias de arrasto industrial,
na região Sudeste e Sul do Brasil, foi um dos principais objetivos deste trabalho. Neste
sentido, os valores médios destas variáveis foram agrupados por ano e para todo o período de
estudo, sendo também avaliados os padrões de variabilidade por estratégia de pesca e sua
distribuição espacial. Quando atendidos os pressupostos estatísticos, estes valores foram
testados através da Análise de Variância unifatorial (ANOVA). Nos casos em que um dos
pressupostos da ANOVA não foi atendido, aplicou-se o teste não paramétrico de Kruskal-
Wallis (Day & Quinn, 1989; Zar, 2010). Todas as análises espaciais foram realizadas em
ambiente SIG, utilizando o software ArcGIS® (ESRI - Environmental Systems Research
Institute, Inc.).
RESULTADOS
Índice de diversidade de Shannon e índice de equitabilidade de Pielou
Os valores do índice de diversidade de Shannon, referentes aos desembarques totais da
frota industrial de arrasto que opera no Sudeste/Sul do Brasil, variaram no período de 2003-
2011 de 0,32 a 3,03 e os valores do índice de equitabilidade de Pielou variaram de 0,07 a 0,63
no mesmo período (Figura 1).
Considerando os intervalos de latitude, a região central da área de estudo (entre 25° e
29°S) apresentou os maiores valores de diversidade (1,25 a 3,03) e equitabilidade (0,26 a
0,63) nos desembarques, seguida da região norte (norte de 25°S) com valores de diversidade
entre 0,34 a 2,83 e equitabilidade entre 0,07 a 0,59, e finalmente, a região sul (sul de 29°S)
com os menores valores, oscilando a diversidade entre 0,32 a 2,80 e a equitabilidade entre
0,07 a 0,58. Comparando os valores destes dois índices, nos diferentes intervalos de latitude,
verificamos que existe diferença significativa entre o intervalo de latitude Centro e Norte
(ANOVA – Tukey, p<0,01) e entre o intervalo Norte e Sul (ANOVA – Tukey, p<0,01), não
101
existindo diferença entre os intervalos Centro e Sul, tanto para a diversidade como para a
equitabilidade.
Figura 1. Distribuição espacial do índice de diversidade (Shannon) e do índice de equitabilidade (Pielou) para os
desembarques da frota industrial de arrasto que operam no Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011.
Em relação aos intervalos de profundidade, os maiores valores dos índices de
diversidade e equitabilidade ocorrem em profundidades menores que 100 m, principalmente
nos intervalos de latitude Centro e Sul. Comparando os valores da diversidade e
equitabilidade dos diferentes intervalos de latitude e os respectivos intervalos de
profundidade, todos apresentaram diferenças significativas, exceto o intervalo de
profundidade de 100-200m do intervalo de latitude Sul quando comparado com as mesmas
profundidades dos intervalos Norte e Centro e também os valores das profundidades maiores
do que 200m do intervalo de latitude Centro quando comparados com os intervalos Sul e
Norte (Tabela 5).
Ao avaliarmos os valores do índice de Shannon e do índice de Pielou para as
diferentes estratégias de pesca, ao longo dos anos analisados (2003-2011), verificamos que o
arrasto de talude (AT) e o arrasto de camarões (AC) têm os maiores valores destes índices em
relação ao arrasto de parelhas (AP) (p < 0,01, Tabela 6). A comparação entre estratégias, para
ambos os índices, indicou que o arrasto de parelhas difere significativamente do arrasto de
camarões e talude, cujos índices médios por sua vez são indistintos (p > 0,05).
102
Tabela 5. Resultados dos testes estatísticos comparando o índice de diversidade de Shannon e o índice de
equitabilidade de Pielou em relação aos intervalos de latitude (N=Norte; C=Centro; S=Sul) e os respectivos
intervalos de profundidade (<75m, 75 – 100m, 100 – 200m, >200m) (ns=não significativo).
Parâmetro Teste estatístico Comparações Valor de p
Índice de diversidade
Kruskal-Wallis - <0,0001
Student-Newman-Keuls
<75 N x <75 C <0,0001
<75 N x <75 S <0,0001
<75 C x <75 S <0,01
75-100 N x 75-100 C <0,0001
75-100 N x 75-100 S <0,0001
75-100 C x 75-100 S <0,05
100-200 N x 100-200 C <0,05
100-200 N x 100-200 S ns
100-200 C x 100-200 S ns
>200 N x >200 C ns
>200 N x >200 S <0,01
>200 C x >200 S ns
Índice de equitabilidade
Kruskal-Wallis - <0,0001
Student-Newman-Keuls
<75 N x <75 C <0,0001
<75 N x <75 S <0,0001
<75 C x <75 S <0,01
75-100 N x 75-100 C <0,0001
75-100 N x 75-100 S <0,0001
75-100 C x 75-100 S <0,05
100-200 N x 100-200 C <0,05
100-200 N x 100-200 S ns
100-200 C x 100-200 S ns
>200 N x >200 C ns
>200 N x >200 S <0,01
>200 C x >200 S ns
Tabela 6. Resultados dos testes estatísticos comparando o índice de diversidade de Shannon e o índice de
equitabilidade de Pielou entre as três estratégias de pesca (AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de talude;
AC=arrasto de camarões).
Parâmetro Teste estatístico Comparações Valor de p
Índice de diversidade
ANOVA - p<0,01
Tukey
AP x AT p<0,01
AP x AC p<0,01
AT x AC não significativo
Índice de equitabilidade
ANOVA - p<0,01
Tukey
AP x AT p<0,01
AP x AC p<0,01
AT x AC não significativo
As três estratégias apresentaram variações nestes valores ao longo dos anos (Figura 2 e
3), sendo que arrasteiros de talude e de camarões demonstraram uma tendência declinante na
103
diversidade (p=0,0364 e p=0,0758) e equitabilidade (p=0,0358 e p=0,0464) de seus
desembarques no período de estudo. O contrário pode ser o caso das parelhas,
especificamente no caso da diversidade (p=0,0662) (Tabela 7).
Figura 2. Variação do índice de diversidade de Shannon e do índice de equitabilidade de Pielou, entre 2003-
2011, para as três estratégias de pesca industrial de arrasto (AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de talude;
AC=arrasto de camarões) do Sudeste/Sul do Brasil.
Figura 3. Variação do índice de diversidade de Shannon e do índice de equitabilidade de Pielou para as três
estratégias de pesca industrial de arrasto (AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de talude; AC=arrasto de
camarões) do Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011). Na caixa estão representados o primeiro e
terceiro percentis e a mediana, a barra de erros indica os valores mínimo e máximo.
Tabela 7. Regressão linear entre ano (2003-2011), índice de diversidade de Shannon e índice de equitabilidade
de Pielou, por estratégia de pesca (arrasto de camarões, arrasto de talude e arrasto de parelhas). Os valores de p
em negrito são significativos.
Estratégia de pesca Regressão Valores
α β p R2
Arrasto de camarões Ano x Shannon 2037,9846 -11,9580 0,0758 0,3787
Ano x Pielou 2041,1570 -53,0023 0,0464 0,4505
Arrasto de talude Ano x Shannon 2047,6747 -15,5115 0,0364 0,4834
Ano x Pielou 2039,3967 -52,0661 0,0358 0,4860
Arrasto de parelhas Ano x Shannon 1979,5050 12,8082 0,0662 0,3992
Ano x Pielou 1996,0968 20,9677 0,5865 0,0454
104
Nível trófico médio
O nível trófico das espécies que compõem a captura desembarcada no período de
2003-2011 pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil variou, entre os peixes, de
2,00 a 4,5, entre os crustáceos de 2,20 a 2,83 e entre os moluscos de 2,00 a 4,00 (ver Tabela
2).
Os valores do nível trófico médio (NTM) da biomassa desembarcada pela frota
industrial de arrasto nos portos de Santa Catarina no período de 2003-2011 variaram entre
2,57 e 4,19 (Figura 4), sendo que valores maiores que 3 concentraram-se nos setores externos
da plataforma continental e talude.
Figura 4. Distribuição espacial dos valores do nível trófico médio da biomassa desembarcada pela frota de
arrasto industrial do Sudeste/Sul do Brasil no período de 2003-2011.
Neste período, a biomassa desembarcada oscilou entre 13.058,02 (2004) e 33.658,71
(2009) toneladas, verificando-se uma tendência de queda nos valores do nível trófico médio
até 2009, seguida de um aumento nos últimos anos (R2=0,0056) e uma forte tendência no
105
aumento da biomassa desembarcada até 2006, com uma subsequente estabilização
(R2=0,6838) (Figura 5).
Figura 5. Variação do nível trófico médio (NTM) e biomassa desembarcada (ton), no período de 2003-2011, para
a frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil. A linha tracejada representa a tendência do NTM.
Considerando os intervalos de latitude, as regiões norte (norte de 25°S) e central (entre
25° e 29°S) da área de estudo apresentaram valores maiores do NTM, entre 2,72 - 4,16 e 2,70
a 4,19, respectivamente, do que os valores encontrados na região sul (sul de 29°S) que
oscilaram entre 2,57 a 4,11. Mesmo assim, comparando os valores do NTM entre os
intervalos de latitude Sul e Norte e entre os intervalos Centro e Norte verificamos que existe
diferença significativa entre eles (teste de Kruskal-Wallis, p<0,0001 e p<0,001), enquanto que
entre os intervalos Sul e Centro esta diferença não ocorre (teste de Kruskal-Wallis, p>0,05).
Ao avaliarmos os valores NTM para as diferentes estratégias de pesca, ao longo dos
anos analisados (2003-2011), verificamos que o arrasto de talude (AT), seguido pelo arrasto
de parelhas (AP) têm os maiores valores deste índice em relação ao arrasto de camarões (AC)
(Figura 6), sendo que todas estas diferenças foram significativas (Tabela 8). As três
estratégias apresentaram variações nestes valores ao longo dos anos. Verifica-se uma leve
tendência de queda nos valores do nível trófico médio do AT e AP enquanto que o AC
apresenta uma leve tendência de aumento no NTM (Figura 7), porém estas tendências não são
significativas para nenhuma das três estratégias de pesca (p=0,8477; p=0,6293; e p=0,5760).
106
Figura 6. Variação do nível trófico médio (NTM) para as três estratégias de pesca de arrasto (AP=arrasto de
parelhas; AT=arrasto de talude; AC=arrasto de camarões) do Sudeste/Sul do Brasil no período de 2003-2011. Na
caixa estão representados o primeiro e terceiro percentis e a mediana, a barra de erros indica os valores mínimo e
máximo.
Figura 7. Variação do nível trófico médio (NTM) e biomassa desembarcada (ton), no período de 2003-2011, para
as três estratégias de pesca de arrasto no Sudeste/Sul do Brasil. As linhas tracejadas representam as tendências
no NTM.
Tabela 8. Resultados dos testes estatísticos comparando o nível trófico médio entre as três estratégias de pesca
(AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de talude; AC=arrasto de camarões).
Parâmetro Teste estatístico Comparações Valor de p
Nível trófico médio
Kruskal-Wallis - p<0,01
Student-Newman-Keuls
AP x AT p<0,05
AP x AC p<0,05
AT x AC p<0,01
Apesar da leve tendência de queda nos valores do nível trófico médio do AT e AP e da
leve tendência de aumento no NTM dos desembarques do AC, o desembarque das principais
107
espécies-alvo destas pescarias não acompanharam estas tendências. No caso do AT,
Urophycis mystacea, Merluccius hubbsi e Lophius gastrophysus, todas espécies com nível
trófico alto, apresentaram aumento na biomassa desembarcada no período. Por sua vez, a
biomassa desembarcada das espécies-alvo do AP (Umbrina canosai, Micropogonias furnieri
e Cynoscion guatucupa) manteve-se praticamente constante no período 2003-2011, com
algumas pequenas oscilações. Por fim, as principais espécies-alvo do AC (Farfantepenaeus
spp., Artemesia longinaris, Xiphopenaeus kroyeri e Pleoticus muelleri) registraram oscilações
na biomassa desembarcada, ao longo do período analisado, atingindo os valores máximos
entre 2007 e 2009 e com declínio nos anos seguintes (Figura 8).
Figura 8. Biomassa desembarcada total (ton) das principais espécies-alvo, das três estratégias de pesca da frota
industrial de arrasto (arrasto de talude, arrasto de parelhas e arrasto de camarões), do Sudeste/Sul do Brasil no
período de 2003-2011. Ucan=Umbrina canosai; Mfur=Micropogonias furnieri; Cgua=Cynoscion guatucupa;
Umys=Urophycis mystacea; Mhub=Merluccius hubbsi; Lgas=Lophius gastrophysus; Farf=Farfantepenaeus
spp.; Alon=Artemesia longinaris; Xkro=Xiphopenaeus kroyeri; Pmue=Pleoticus muelleri.
Índice da Pesca em Equilíbrio (FiB)
Os valores do índice da pesca em equilíbrio (FiB) para a frota industrial de arrasto do
Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011, variaram desde valores negativos para os
anos de 2004 (-0,23) e 2005 (-0,12), apresentando um grande aumento nos anos de 2006
(0,01) e 2007 (0,18). Em 2008, o valor do FiB apresenta uma pequena queda (0,12), voltando
a aumentar (2009 = 0,15; 2010 = 0,20), atingindo seu maior valor, em 2011 (0,21) (Figura 9).
108
Figure 9. Índice da pesca em equilíbrio (FiB) para a frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil durante
2003-2011.
Analisando os valores do índice da pesca em equilíbrio (FiB), separadamente, para as
três estratégias de pesca de arrasto industrial do Sudeste/Sul do Brasil, entre 2003 e 2011,
verificamos que o mesmo comporta-se de forma diferenciada para cada estratégia. Para o
arrasto de camarões (AC), após um pequeno valor negativo em 2004 (-0,17), o índice tem um
crescimento constante entre 2005 e 2007, com valores entre 0,23 e 0,46. Em 2008 apresenta
uma pequena queda (0,36), voltando a aumentar nos anos seguintes (2009 = 0,42; 2010 =
0,54; e 2011 = 0,53). Neste mesmo período, os valores do FiB, para o arrasto de talude (AT),
apresentaram uma tendência de queda com valores negativos entre 2004 (-0,29) e 2005 (-
0,31), retomando um crescimento nos valores do índice a partir de 2006 até 2011, com valores
entre -0,07 e 0,29. Finalmente, o arrasto de parelhas (AP) foi o que apresentou as maiores
oscilações entre valores positivos e negativos do índice da pesca em equilíbrio. Para esta
estratégia de pesca, apesar do FiB iniciar com valores negativos nos anos de 2004 (-0,14) e
2005 (-0,01), o índice continuou em ascendência, já com números positivos, nos anos de 2006
(0,02) e 2007 (0,22). A partir de 2008, iniciou-se uma sequência de declínio do FiB,
culminando com valores negativos nos anos de 2010 (-0,05) e 2011 (-0,09) (Figura 10).
109
Figura 10. Índice da pesca em equilíbrio (FiB) das três estratégias de pesca da frota industrial de arrasto
(AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de talude; AC=arrasto de camarões) do sudeste/Sul do Brasil durante 2003-
2011.
Vulnerabilidade
A vulnerabilidade das espécies que compõem a biomassa desembarcada no período de
2003-2011 pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil variou, entre os peixes, de
16 a 90 (Baixa a Muito Alta), entre os crustáceos de 10 a 14 (Baixa) e entre os moluscos de
10 a 78 (Baixa a Muito Alta) (ver Tabela 2).
Os valores da vulnerabilidade média (VM), da biomassa desembarcada pela frota
industrial de arrasto nos portos de Santa Catarina no período de 2003-2011, variaram entre
10,00 e 59,64 (Baixa a Alta) havendo uma clara concentração de espécies desembarcadas
mais vulneráveis nas áreas de plataforma externa e talude, em profundidades maiores do que
200m, principalmente nos intervalos de latitude Centro e Sul (Figura 12).
Observando os valores da vulnerabilidade média dos diferentes intervalos de latitude e
os respectivos intervalos de profundidade, encontramos diferenças significativas quando
comparados os valores de todos os intervalos de profundidade da região Norte com todos os
intervalos de profundidade da região Sul. Além disto, encontramos diferenças significativas
entre os valores da vulnerabilidade média das profundidades de 100-200m e maiores do que
200m do intervalo Norte quando comparados aos valores das mesmas profundidades do
intervalo Centro. Para as demais profundidades e intervalos de latitude não houve diferença
significativa nos valores da vulnerabilidade média (Tabela 9).
110
Figura 12. Distribuição espacial da vulnerabilidade média (VM) da captura desembarcada pela frota industrial de
arrasto do Sudeste/Sul do Brasil no período de 2003-2011.
Tabela 9. Resultados dos testes estatísticos comparando os valores da vulnerabilidade média em relação aos
intervalos de latitude (N=Norte; C=Centro; S=Sul) e os respectivos intervalos de profundidade (<75m, 75 –
100m, 100 – 200m, >200m) (ns=não significativo).
Parâmetro Teste estatístico Comparações Valor de p
Vulnerabilidade média
Kruskal-Wallis - <0,0001
Student-Newman-Keuls
<75 N x <75 C ns
<75 N x <75 S <0,05
<75 C x <75 S ns
75-100 N x 75-100 C ns
75-100 N x 75-100 S <0,01
75-100 C x 75-100 S ns
100-200 N x 100-200 C <0,01
100-200 N x 100-200 S <0,05
100-200 C x 100-200 S ns
>200 N x >200 C <0,0001
>200 N x >200 S <0,0001
>200 C x >200 S ns
111
Considerando os intervalos de latitude, as regiões norte (norte de 25°S), central (entre
25° e 29°S) e sul (sul de 29°S) da área de estudo não apresentaram valores de vulnerabilidade
média muito diferentes entre si, variando de 11,11 a 58,68, 10,00 a 59,14 e 10,00 a 59,64,
respectivamente, enquadrando-se nas categorias de Baixa a Alta vulnerabilidade. Comparando
os valores da vulnerabilidade média, entre os três intervalos de latitude, encontramos
diferença significativa entre os intervalos Sul e Norte (teste de Kruskal-Wallis, p<0,0001) e
entre os intervalos Centro e Norte (teste de Kruskal-Wallis, p<0,0001). Por sua vez, entre os
intervalos Sul e Centro a diferença não foi significativa (teste de Kruskal-Wallis, p=0,5904).
Ao avaliarmos os valores da vulnerabilidade média para as diferentes estratégias de
pesca, ao longo dos anos analisados (2003-2011), verificamos que a composição de espécies
desembarcadas pela pesca de arrasto de talude (AT) possui uma vulnerabilidade média maior
dos que as outras duas estratégias. Por sua vez, para a pesca de arrasto de parelhas, a
vulnerabilidade média da biomassa desembarcada é intermediária entre o arrasto de talude e o
arrasto de camarões. Finalmente, a biomassa desembarcada pela pesca de arrasto de camarões
apresentou a menor e mais variável vulnerabilidade média de todas as três estratégias de pesca
de arrasto (Figura 13).
Figura 13. Variação na vulnerabilidade media da biomassa desembarcada, no período 2003-2011, das três
estratégias de pesca de arrasto industrial do Sudeste/Sul do Brasil (AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de
talude; AC=arrasto de camarões).
As diferenças encontradas nos valores de vulnerabilidade média, das três estratégias de
pesca de arrasto industrial do Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011, são
significativas para todas as comparações realizadas (Tabela 10).
112
Tabela 10. Resultados dos testes estatísticos comparando a vulnerabilidade média, da biomassa desembarcada,
entre as três estratégias de pesca (AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de talude; AC=arrasto de camarões).
Parâmetro Teste estatístico Comparações Valor de p
Vulnerabilidade média
Kruskal-Wallis - p<0,01
Student-Newman-Keuls
AP x AT p<0,05
AP x AC p<0,05
AT x AC p<0,01
Resiliência
A resiliência das espécies que compõem a biomassa desembarcada no período de
2003-2011 pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil variou, entre os peixes, de
1 a 4 (Muito Baixa a Alta), entre os crustáceos de 2 a 4 (Baixa e Alta) e entre os moluscos de
1 a 3 (Muito Baixa a Média) (ver Tabela 2).
Os valores da resiliência média (RM), da biomassa desembarcada pela frota industrial
de arrasto nos portos de Santa Catarina no período de 2003-2011, variaram entre 1,31 e 4,00,
Muito Baixa a Alta, respectivamente (Figura 14). O padrão espacial da resiliência média é
inverso ao da vulnerabilidade, com espécies desembarcadas de maior resiliência originadas
principalmente das capturas nos quadrantes mais costeiros e vice-versa.
Considerando os intervalos de latitude, os valores da resiliência média, da biomassa
desembarcada pela frota industrial de arrasto nos portos de Santa Catarina no período de
2003-2011, oscilaram entre 1,32 e 3,95 (Muito Baixa e Média) na região norte (norte de
25°S), entre 2,08 e 3,03 (Baixa e Média) na região sul (sul de 29°S) e entre 2,10 e 4,00 (Baixa
e Alta) na porção central (entre 25° e 29°S) da área de estudo. Comparando os valores da
resiliência média entre os intervalos de latitude, somente entre os intervalos Centro e Norte
houve diferença significativa (p<0,01).
Considerando as diferentes estratégias de pesca (AP, AT, AC), ao longo dos anos
analisados (2003-2011), os valores de resiliência média das espécies desembarcadas foram
maiores para o arrasto de parelhas, seguido dos valores do arrasto de camarões e com os
menores valores de resiliência média das espécies desembarcadas pelo arrasto de talude
(Figura 15). Nota-se uma tendência de aumento temporal da resiliência média nas espécies
capturadas pelo arrasto de camarões (p<0,001).
113
Figura 14. Distribuição espacial dos valores da resiliência média (RM) da biomassa desembarcada pela frota
industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil no período de 2003-2011.
Figura 15. Variação dos valores da resiliência média da biomassa desembarcada pelas três estratégias de pesca
de arrasto industrial do Sudeste/Sul do Brasil (AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de talude; AC=arrasto de
camarões), no período de 2003-2011.
Os valores da resiliência média da biomassa desembarcada pelas três estratégias de
pesca de arrasto industrial (AP, AT, AC) apresentam diferença significativa entre o arrasto de
114
parelhas e o arrasto de talude e entre o arrasto de talude e o arrasto de camarões, não
apresentando diferenças entre o arrasto de parelhas e o arrasto de camarões (Tabela 11).
Tabela 11. Resultados dos testes estatísticos comparando a resiliência média, da biomassa desembarcada, entre
as três estratégias de pesca (AP=arrasto de parelhas; AT=arrasto de talude; AC=arrasto de camarões).
Parâmetro Teste estatístico Comparações Valor de p
Resiliência média
Kruskal-Wallis - p<0,01
Student-Newman-Keuls
AP x AT p<0,01
AP x AC não significativo
AT x AC p<0,01
DISCUSSÃO
Alguns indicadores ecológicos estão relacionados com aspectos das espécies
(populações), outros têm vinculo com questões ligadas as comunidades. Dentre os primeiros
temos o nível trófico, a vulnerabilidade e a resiliência, enquanto que o índice de diversidade
(H’) e o índice de equitabilidade (J’) são representantes do segundo grupo. Existe ainda outro
tipo de índice ecológico que utiliza atributos tanto das espécies (populações) como das
comunidades, onde se destacam o nível trófico médio (NTM), o índice da pesca em equilíbrio
(FiB - Fishing-in-Balance index) a vulnerabilidade média (VM) e a resiliência média (RM).
Os valores e a variação espaço-temporal do índice de diversidade de Shannon (H’),
equitabilidade de Pielou (J’), nível trófico médio (NTM), índice da pesca em equilíbrio (FiB -
Fishing-in-Balance index), vulnerabilidade média (VM) e a resiliência média (RM), da frota
de arrasto industrial do Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011, foram abordados a
partir da captura desembarcada por esta frota nos portos de Santa Catarina.
A captura desembarcada nos portos de Santa Catarina, pela frota industrial de arrasto
do Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011, composta por aproximadamente por 130
espécies de peixes, mais de 15 espécies de crustáceos (camarões, caranguejos e lagostas) e
sete espécies de moluscos (polvos, lulas e bivalves) (ver Tabela 2) apresentou índices de
diversidade e equitabilidade decrescentes em direção às áreas mais externas e profundas da
plataforma e talude. Estes padrões influenciaram os valores encontrados entre as três
estratégias de pesca que utilizaram estas áreas de forma diferenciada (Dias & Perez, 2012;
Dias et al., 2012a; 2012b). É importante notar, entretanto, que estes índices podem refletir
uma associação entre a diversidade de espécies das áreas arrastadas e o processo de
aproveitamento/rejeição de espécies a bordo, estabelecido por cada estratégia.
115
De acordo com Dias et al. (2012a; 2012b) e Dias & Perez (2012), o arrasto de talude
(AT), tem como espécies-alvo a abrótea-de-profundidade (Urophysis mystacea), merluza
(Merluccius hubbsii) e peixe-sapo (Lophius gastrophysus), porém além destas desembarca
outras espécies características de áreas que vão desde a plataforma interna até a quebra da
plataforma, além de recursos de talude. Como principais representantes destas outras espécies
destacam-se: congro-rosa (Genypterus brasiliensis), ferrinho (Polymixia lowei), galo-de-
profundidade (Zenopsis conchifer), calamar-argentino (Illex argentinus), sarrão (Helicolenus
dactylopterus), batata (Lopholatilus villarii), camarão-cristalino (Plesionika sp.), pitu
(Metanephrops rubellus), linguado-areia (Paralichthys sp.), castanha (Umbrina canosai),
cabra (Prionotus punctatus), abrótea-comum (Urophysis brasiliensis), maria-mole (Cynoscion
guatucupa), camarão-rosa (Farfantepenaeus sp.), camarão-barba-ruça (Artemesia longinaris)
e raias emplastro (Família Rajidae). O arrasto de camarões (AC), que atua principalmente na
plataforma interna e média apresenta como espécies-alvo o camarão-rosa (Farfantepenaeus
spp.), camarão-sete-barbas (Xyphopenaeus kroyeri), camarão-barba-ruça (A. longinaris) e
camarão-santana (P. muelleri), e um grupo de peixes demersais que incluem a castanha (U.
canosai), cabrinha (P. punctatus) e linguados (Paralychthys spp.). Além destas, outras
espécies de importância nos desembarques desta estratégia de pesca são a lula (Doryteuthis
plei), abrótea (Urophycis brasiliensis), abrótea-de-profundidade (U. mystacea), merluza
(Merluccius hubbsi), o peixe-sapo (L. gastrophysus), congrio-rosa (Genypterus brasiliensis),
maria-mole (C. guatucupa), a corvina (Micropogonias furnieri), palombeta (Chloroscombrus
chrysurus) e as raias emplastro (Família Rajidae). Finalmente, o arrasto de parelhas (AP), que
opera principalmente em águas mais costeiras (<75m), tem como espécies-alvo a castanha (U.
canosai), a corvina (M. furnieri) e a pescada maria-mole (C. guatucupa ). No desembarque
desta estratégia de pesca tem importância também a pescada-amarela (Cynoscion acoupa),
goete (Cynoscion jamaicensis), cabra (P. punctatus), raias emplastro (Família Rajidae),
pescadinha-real (Macrodon ancylodon), corcoroca (Orthoplistis ruber), gordinho (Perpilus
paru) e olho-de-boi (Seriola sp.).
A maior diversidade (H’) e equitabilidade (J’) obtidas pelas estratégias de pesca de
arrasto de talude (AT) e arrasto de camarões (AC) pode ser explicada pelo maior número de
espécies-alvo destas pescarias, e a maior amplitude de suas áreas de pesca que vai da
plataforma interna até áreas de talude. Por outro lado, o arrasto de parelhas (AP), tem como
espécies-alvo uma menor variedade de espécies e uma área de atuação mais restrita
(plataforma interna). Ao considerarmos a totalidade da pesca industrial de arrasto do
Sudeste/Sul do Brasil, verificamos que a sobreposição das áreas de operação, das três
116
estratégias de pesca, indica uma maior utilização dos intervalos de latitude Sul e Centro,
concentrando-se em áreas mais rasas do que 75m (61% da área varrida), enquanto que na
região de talude (>200m) a área varrida representou apenas 10,7% (vide Port et al., dados não
publicados – Capítulo 2). Esta maior utilização das áreas mais rasas, associado a um melhor
aproveitamento das espécies capturadas, contribui para que os valores dos índices de
diversidade e equitabilidade diminuam em direção às áreas mais externas e profundas da
plataforma e talude.
As espécies de peixes registradas na biomassa desembarcada representam
aproximadamente 10% do número de espécies registradas para plataforma brasileira e 70%
das espécies registradas para a região entre o Cabo de São Tomé (Rio de Janeiro) e o Chuí
(Rio Grande do Sul) (Miloslavich et al., 2011).
Os valores de riqueza, diversidade (H’) e equitabilidade (J’) obtidos a partir das
capturas desembarcadas pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, no período
de 2003-2011 são bastante altos se comparados com outras áreas de pesca do Atlântico SW.
Na Zona Comum de Pesca Argentino-Uruguaia (ZCPAU), foram registradas 97 espécies,
aproximadamente 95% do total desembarcado por todas as modalidades de pesca, no período
de 1989-2010 (Milessi & Jaureguizar, 2013). No golfo de San Matías (Patagônia, Argentina)
entre 2006 e 2007, 34 espécies foram registradas nas capturas da frota de arrasto demersal,
sendo apenas 15 espécies de valor comercial e normalmente reportadas nas estatísticas
pesqueiras (Romero et al., 2013). Para o ecossistema da convergência subtropical do Sul do
Brasil (30°40' até 34°30' S), na região da plataforma externa e talude superior (124 até 587m
de profundidade), foram registradas 93 espécies de peixes demersais (Haimovici et al., 1994).
Apesar dos altos valores registrados, é preciso deixar claro que a riqueza, diversidade (H’) e
equitabilidade (J’), encontrados para a biomassa desembarcada pela frota industrial de arrasto
do Sudeste/Sul do Brasil, no período avaliado, não representam a totalidade das capturas, uma
vez que não foram considerados os descartes.
O nível trófico médio (NTM) da biomassa desembarcada é utilizado como um índice
de sustentabilidade dos ecossistemas marinhos explotados, uma vez que a pesca pode tender a
remover peixes de maior nível trófico, fazendo com que os remanescentes no ambiente sejam
representantes de níveis tróficos mais baixos, e desta forma, com o passar do tempo pode
gerar uma tendência de decréscimo no NTM dos desembarques (Pauly et al., 1998).
O nível trófico das espécies registradas na biomassa desembarcada pela frota industrial
de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, entre 2003-2011, variou entre 2,00 e 4,50. Estes valores
são similares aos encontrados por Garcia & Giarrizzo (2014) para peixes da costa brasileira
117
(TL = 2,03 – 4,80). Em outras regiões, como o Mar Mediterrâneo, Mar Báltico, Mar Negro,
Mar do Sul da China, Mar do Caribe e Mar do Norte, apesar das diferenças ambientais,
extensão geográfica, número de espécies avaliadas, os valores encontrados para o nível trófico
também variaram entre 2,00 e 4,50 (Stergiou & Karpouzi, 2002; Froese et al., 2004).
A leve tendência de declínio que encontramos nos valores do nível trófico médio
(NTM) da biomassa desembarcada pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil,
entre os anos de 2003 e 2011, não é significativa (p=0,8417) e portanto não pode ser
comparada diretamente com outros trabalhos, nos quais também foi registrada uma
diminuição no NTM (Pauly et al., 1998; Bhathal & Pauly, 2008; Milessi & Jaureguizar,
2013). Por outro lado, Freire & Pauly (2010) encontraram uma tendência de aumento do
NTM para todos os desembarques ocorridos no Brasil, entre 1978 e 2000, atribuindo este fato
ao colapso da pesca da sardinha (espécie de baixo nível trófico) no período.
A tendência de declínio que encontramos não foi acompanhada pelas três estratégias
de pesca da mesma forma. Enquanto que o arrasto de parelhas (AP) e o arrasto de talude (AT)
também apresentaram uma leve tendência de diminuição do NTM da biomassa desembarcada,
o arrasto de camarões (AC) indica uma leve tendência de aumento no NTM dos seus
desembarques, sendo que esta situação pode ser explicada pela forma de atuação desta
estratégia de pesca que, em determinado período, busca espécies de baixo nível trófico
(camarões) e fora da temporada de pesca destas, tem como espécies-alvo peixes demersais de
maior nível trófico (Benincá, 2013). Quando analisamos a biomassa desembarcada das
principais espécies-alvo das três estratégias de pesca, verificamos que não houve diminuição
correspondente nas capturas de espécies de maior nível trófico (TL) conforme ocorreu no
estudo de Milessi & Jaureguizar (2013). Por outro lado, as espécies de menor nível trófico,
alvo do arrasto de camarões, registraram fortes variações em sua biomassa desembarcada no
período de 2003-2011. As grandes variações ocorridas na biomassa desembarcada,
principalmente de Umbrina canosai, espécie-alvo do arrasto de parelhas, Urophycis mystacea
e Merluccius hubbsi (arrasto de talude) e Artemesia longinaris, Xiphopenaeus kroyeri e
Pleoticus muelleri foco do arrasto de camarões, influenciaram fortemente a tendência de
queda encontrada no NTM da frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul. Considerando esta
situação, não fica caraterizado o fenômeno conhecido por Fishing Down Marine Food Webs
(Pauly et al., 1998), para o período analisado.
A fim de avaliar corretamente o impacto da pesca em relação às variações no NTM,
Pauly et al. (2000) propuseram a utilização de outro índice em conjunto, o índice da pesca em
equilíbrio (FiB - Fishing-in-Balance index). Este índice foi criado para avaliar se as mudanças
118
no nível trófico médio foram compensadas por alterações nas capturas. As variações nos
valores do FiB podem ser interpretadas como: a) constante (FiB=0) se as alterações no nível
trófico são compensadas por alterações “ecologicamente corretas” nas capturas; b) aumenta
(FiB>0) se ocorre um efeito bottom up (aumento da produção primária, expansão geográfica
da pesca e exploração de um ecossistema mais amplo); c) diminui (FiB<0) se ocorre descarte
e este não é considerado nas capturas ou se as pescarias removem tanta biomassa do
ecossistema que o seu funcionamento é prejudicado (Pauly & Watson, 2005).
Os valores que encontramos para o FiB da pesca industrial de arrasto do Sudeste/Sul
do Brasil, no período de 2003-2011, apesar dos valores negativos em 2004 e 2005, sugerem
um aumento de produtividade nesse período ou um processo de expansão das atividades da
frota por toda a plataforma, alcançando as áreas de talude, explorando desta forma um
ecossistema mais amplo, confirmando o descrito por Perez et al. (2001; 2009). Neste período
ocorreu um aumento na área varrida pela frota industrial de arrasto, influenciado pelo
aumento da área varrida do arrasto de camarões que quase dobrou esta área (94,04%) e pelo
arrasto de talude que aumentou sua área varrida em 27,45%. Inversamente, o arrasto de
parelhas reduziu em 63,48% sua área varrida de 2011 em relação ao ano de 2003,
representando em 2011 apenas 4,53% da área varrida pelas três estratégias de pesca (Capítulo
2). Analisando separadamente os valores do FiB das três estratégias de pesca (AC, AT e AP),
encontramos situações diferenciadas, onde o AC e AT seguem o padrão da pesca de arrasto
geral e o arrasto de parelhas, que inicialmente acompanhou este padrão (2004 a 2007),
começou a registrar um declínio no valor do FiB a partir de 2008, com valores negativos em
2010 e 2011. Esta situação em particular do AP pode indicar que o ambiente explorado por
esta estratégia de pesca (plataforma interna) possa estar com suas funções ecológicas
prejudicadas.
A maioria das espécies (aprox. 70%) que compõem a captura desembarcada no
período de 2003-2011, pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, apresenta uma
vulnerabilidade que varia entre Baixa e Moderada a Alta. Outros 26% da captura
desembarcada é composta por espécies com vulnerabilidade entre Alta e Alta a Muito Alta.
As espécies com vulnerabilidade Muito Alta (4%) são em sua grande maioria representantes
de elasmobrânquios. Esta maior vulnerabilidade dos elasmobrânquios também já foi detectada
por Dransfeld et al. (2013), segundo os quais estes são intrinsecamente mais vulneráveis à
pesca do que os teleósteos.
Com relação à vulnerabilidade média (VM) da captura desembarcada pela frota
industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, que variou entre Baixa e Alta, ao analisarmos a
119
origem desta biomassa, verificamos que os valores mais altos têm origem em pescarias de
águas mais profundas (plataforma externa, quebra da plataforma e talude), onde atua a
estratégia de pesca de arrasto de talude (AT). A maior vulnerabilidade de espécies de águas
profundas já havia sido detectada por Koslow et al. (2000), que apontam a longevidade e a
formação de agregações como alguns dos aspectos que tornam estas espécies mais
vulneráveis. Segundo estimativas da ICES (International Council for the Exploration of the
Sea) a totalidade das capturas da pesca de águas profundas, no Atlântico Norte é feita além do
“limite biológico seguro” (ICES, 2010). Esta mesma situação é apontada por Perez et al.
(2009) para o Sudeste/Sul do Brasil, destacando uma listagem de espécies de alta
vulnerabilidade, compilada de diversos trabalhos, na qual se encontram além de espécies-alvo
da pesca industrial de arrasto, outras que também compõem as capturas desembarcadas por
esta frota, dentre as quais Lophius gastrophysus, Merluccius hubbsi, Polyprion americanus,
Urophycis mystacea, Aristaeopsis edwardsiana, Chaceon ramosae e C. notialis, todas em
situação de sobrepesca, como todos os estoques de águas profundas desta região. Ao analisar
o potencial de rendimento de espécies-alvo da pesca industrial de arrasto de talude, na mesma
região, Perez (2006) prevê que as capturas de L. gastrophysus, M. hubbsi e U. mystacea
encontram-se acima dos níveis de sustentabilidade.
Por sua vez, a maioria das espécies (67,3%) que compõem a captura desembarcada no
período de 2003-2011, pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil apresenta uma
resiliência que varia entre Média e Alta e o restante (32,7%) são espécies que têm resiliência
entre Muito Baixa e Baixa, sendo que a absoluta maioria são espécies de alto nível trófico
(TL>3,5). As várias espécies apresentam necessidades distintas de habitat, com diferentes
capacidades de se recuperar de perturbações da pesca intensiva (Kaiser et al., 1999).
Novamente os elasmobrânquios apresentam os menores valores de resiliência do que os
teleósteos (Dransfeld et al., 2013).
Analisando a origem da biomassa desembarcada pela frota industrial de arrasto do
Sudeste/Sul do Brasil, cuja resiliência média variou entre Muito Baixa a Alta, verificamos que
os valores mais altos têm origem em águas mais rasas (plataforma interna e média) enquanto
que os menores valores de resiliência média (RM) resultam da biomassa removida de águas
mais profundas, cujas espécies apresentam uma menor capacidade de recuperação frente aos
impactos provocados pela pesca intensiva (Koslow et al., 2000).
Numa visão integrada da aplicação dos indicadores ecológicos, pode-se evidenciar um
cenário bem definido onde se contrasta, por um lado, a exploração de recursos em áreas
costeiras, onde a diversidade tende a ser maior e os organismos capturados têm menor nível
120
trófico (por ex. camarões), menor vulnerabilidade e maior resiliência à pesca, com a
exploração das áreas externas da plataforma e talude, menos diversas, com espécies de maior
nível trófico e mais vulneráveis e menos resilientes às capturas. Não se confirma uma
mudança no nível trófico das espécies exploradas por essas atividades, porém é importante
notar a possibilidade de expansão de áreas de pesca, ou áreas varridas, sobretudo na região do
talude. Se confirmada esta tendência corrobora uma tendência mundial de busca de áreas
profundas já identificada no Brasil (Morato et al., 2006; Perez et al., 2009) e que implica em
ajustes no processo de gestão dessas áreas ainda relativamente pouco perturbadas (ver
Capítulo 2).
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127
CAPÍTULO 4
AVALIAÇÃO ECOSSISTÊMICA DO IMPACTO DA PESCA INDUSTRIAL DE
ARRASTO NO SUDESTE E SUL DO BRASIL
128
RESUMO
Este estudo propõe a demarcação espacial de três categorias de área de pesca (A, B e C),
baseado no grau de impacto a que cada uma delas foi submetida pela frota industrial de
arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, no período de 2003-2011. O grau de impacto destas áreas foi
baseado em valores de emissão de Carbono, remoção de biomassa e percentual de área
varrida. Além disto, foram considerados, na classificação destas áreas os valores de atributos
das comunidades e populações marinhas (i.e. diversidade, equitabilidade, nível trófico médio,
vulnerabilidade média e resiliência média) obtidos a partir de informações da biomassa
desembarcada por esta frota. Para cada um destes indicadores ecológicos e de impacto foram
atribuídos valores (1, 3 e 5) para o cálculo do Índice do Estado do Ambiente (IEA). Os
valores obtidos para o IEA foram especializados em quadrantes de 30’ × 30’, dando origem as
três categorias de área de pesca. A área de pesca “A” é a que apresenta os maiores valores de
impacto provocados pelas altas emissões de Carbono, alta remoção de biomassa e alto
percentual de área varrida, além de alto valor de diversidade, equitabilidade e resiliência
média e baixos valores de nível trófico médio e vulnerabilidade média. Por sua vez, a área de
pesca “C” é a menos impactada por emissões de Carbono, remoção de biomassa e área
varrida, porém é a que apresenta os menores valores de diversidade, equitabilidade e
resiliência média, além de possuir os maiores valores de nível trófico médio e vulnerabilidade
média. Finalmente a área de pesca “B” apresenta valores intermediários as outras duas. A
partir destes resultados são propostas ações de gestão para esta pescaria, do tipo “freezing the
footprint” e Áreas de Exclusão de Pesca (AEP), além da implementação de outros estudos
sobre as espécies marinhas afetadas direta e/ou indiretamente, e seus habitats também
impactados.
Palavras-chave: abordagem ecossistêmica; gestão da pesca; indicadores ecológicos; Oceano
Atlântico Sudoeste.
ABSTRACT
This study proposes the spatial demarcation of three fishing area categories (A, B and C),
based on the degree impact that each of them was submitted by the industrial trawl fishing
fleet operating off southeastern and southern Brazil, between 2003 and 2011. The degree of
129
impact of these areas was based on carbon emission levels, biomass removal and percentage
of swept area. Moreover, were considered in the classification of these areas the attributes of
marine communities and populations (i.e. diversity, evenness, mean trophic level, medium
vulnerability and medium resilience) obtained from landed biomass by this fleet. Scores (1, 3
and 5) were assigned for each of these ecological and impact indicators and used for the
calculation of State for Environment Index (IEA). The values obtained for the IEA were
assigned to 30 'x 30' quadrants, giving rise to the three categories of fishing area. The fishing
area "A" is the with the greatest impact values caused by the high carbon emissions, high
biomass removal and high percentage of swept area, as well as high value of diversity,
evenness and medium resilience and low values of mean trophic level and medium
vulnerability. In turn, the fishing area "C" is less affected by carbon emissions, biomass
removal and swept area, however, it shows the smallest values of diversity, evenness and
medium resiliency, and have higher values of mean trophic level and medium vulnerability.
Finally the fishing area "B" shows intermediate values in relation to the other two. From these
results are proposed management actions for this fishery, such as "freezing the footprint" and
Fishing Exclusion Areas (EPA), and the implementation of other studies on marine species
affected directly and/or indirectly, and their habitats also impacted.
Keywords: Ecosystem approach; Fisheries management; ecological indicators; SW Atlantic.
INTRODUÇÃO
A gestão e conservação dos ambientes marinhos é um tema que vem ganhando
destaque nos últimos anos. De acordo com Halpern et al. (2008) não existem mais áreas que
não foram afetadas pelas atividades humanas e aproximadamente 41% dos oceanos estão
fortemente afetados por múltiplas atividades. A definição dos impactos ecológicos das
atividades humanas nos oceanos necessita de uma metodologia capaz de interpretar e localizar
os seus efeitos em ecossistemas específicos, sendo que a identificação do impacto cumulativo,
dos componentes estressores e da vulnerabilidade do ecossistema podem ser úteis para
iniciativas públicas de gestão e conservação (Halpern et al., 2009).
Em um estudo realizado para quantificar as ameaças antrópicas em ambientes
marinhos, Halpern et al. (2007) verificaram que o aumento da temperatura do mar,
contaminação orgânica e a pesca demersal foram os agentes impactantes mais importantes.
130
A sustentabilidade das pescarias em geral é atualmente uma preocupação constante e
vários autores já apresentaram propostas de gestão ecossistêmica (e.g. Jennings & Kaiser,
1998; Brodziak & Link, 2002; Garcia et al., 2003; Nguyen, 2012; Pikitch, et al., 2004; Garcia
& Cochrane, 2005; Fulton et al., 2014).
De acordo com Grafton et al. (2008) e Squires (2009), um dos grandes desafios do
gerenciamento dos oceanos é a gestão dos estoques pesqueiros e a conservação das
comunidades das quais estes estoques dependem, sendo que esta discussão vai além da
sobrepesca, incluindo aspectos ambientais, ecológicos e da biodiversidade. Por outro lado,
muitos conceitos ligados a gestão ecossistêmica, como “saúde do ecossistema”, são de difícil
tradução em objetivos operacionais que possam ser utilizados diretamente na elaboração de
políticas de gerenciamento (Larkin, 1996). Esta visão ecossistêmica da gestão da pesca, que
vem ganhando espaço nos últimos anos é importante, pois a atividade pesqueira afeta níveis
tróficos bem distantes das espécies que são normalmente comercializadas (Pauly et al., 1998).
Desta forma, para que seja possível uma gestão ecossistêmica das pescarias é
necessário inicialmente conhecer os ambientes, as populações e comunidades que compõem
as áreas de pesca. Portanto, são necessários indicadores preditivos, que possam ser facilmente
parametrizados, utilizando dados de fácil acesso, que possam traduzir de forma simples a
variedade de processos complexos que ocorrem em um ecossistema (Christensen, 2000;
Murawski, 2000; Pauly & Watson, 2005).
No que se refere a pesca de arrasto, os fundos de substratos moles das plataformas
continentais têm sido muito perturbados (Gray et al., 2006), sendo necessário que sejam
instituídas nestas áreas abordagens de gestão ecossistêmica (Thrush & Dayton, 2010). A falta
de estudos prévios e a falta de dados sobre a pesca e suas espécies-alvo é a principal
dificuldade para implementação de ações que tenham esta abordagem (Thrush et al., 1998;
Greenstreet & Rogers, 2004; Juan & Demestres, 2012). Mesmo assim, é urgente a
necessidade de obtenção de indicadores para os ecossistemas sensíveis às perturbações
ocasionadas pela pesca de arrasto (Juan et al., 2009; Juan & Demestres, 2012).
Um primeiro indicador de impacto da pesca de arrasto foi proposto por Bremner et al.
(2003), utilizando informações sobre megabentos e a epifauna por terem características
biológicas conhecidas e responderem as perturbação do arrasto em uma direção esperada.
Outros indicadores para avaliar o estado biológico de uma população de peixes, através de
dados da pesca de arrasto, foram propostos, considerando as capturas como constantes no
tempo e nas áreas, utilizando como parâmetros abundância, peso, comprimento, idade e
reprodução (Cotter et al., 2009).
131
No Brasil, a frota industrial de arrasto de fundo é responsável pelo maior volume de
capturas demersais no Sudeste e Sul (19° - 34°S). Esta frota, desde o final dos anos 1990
opera com mais de 650 embarcações que são responsáveis por aproximadamente 1/3 de toda
biomassa de pescados desembarcada na região (Perez et al., 2001; Valentini & Pezzuto,
2006). Em decorrência desta atuação, avaliações de estoques realizadas neste período
concluíram que, as principais espécies-alvo tiveram redução da sua biomassa atingindo, ou
mesmo ultrapassando, os níveis máximos sustentáveis (Haimovici, 1997; D’Incao et al., 2002;
Haimovici et al., 2006; Perez et al., 2009). Esta situação de sobrepesca é uma evidência do
impacto direto da pesca industrial de arrasto sobre os ecossistemas bentônicos do Sudeste/Sul
do Brasil, sendo relativamente bem conhecida. Por outro lado, impactos (efetivos ou
potenciais) causados por perturbação de habitats, mudanças na estrutura das comunidades,
consumo de combustíveis fósseis e emissões de gases de efeito estufa são praticamente
desconhecidos ou ainda muito pouco estudados (e.g. Gasalla & Rossi-Wongtschowski, 2004;
Almeida & Vivan, 2011; Port et al., 2014).
Assim sendo, a partir de resultados de outros estudos executados na mesma área,
Sudeste/Sul do Brasil (19° - 34°S), com dados referentes a frota industrial de arrasto que atua
na região, onde foram avaliados: o consumo de combustível, as emissões de gases de efeito
estufa e a biomassa desembarcada (Port et al., 2014); a “pegada espacial” (footprint) nos
ambientes de fundo oceânico (Capítulo 2); e indicadores como o índice de diversidade de
Shannon, equitabilidade de Pielou, nível trófico médio, vulnerabilidade média e resiliência
média dos componentes da captura desembarcada por esta frota nos portos de Santa Catarina
(Capítulo 3), este trabalho propõe uma avaliação conjunta destes parâmetros com o intuito de
apresentar uma visão ecossistêmica preliminar do impacto causado pelas operações da frota
de arrasto industrial nesta porção do Atlântico Sudoeste.
MATERIAL E MÉTODOS
Desde o final da década de 1990 mais de 650 embarcações de arrasto industrial
operam na plataforma continental e talude (~10 to 800 m de profundidade) do Espírito Santo
(19°S) até o limite sul da Zona Econômica Exclusiva do Brasil - ZEE (34°S) (Perez et al.,
2001). As operações de pesca destas embarcações não são homogêneas e variam de acordo
com o sistema de arrasto utilizado (duplo, parelhas e simples) e também conforme cada uma
das três estratégias de pesca (sensu Port et al., 2014): (1) arrasto de camarões (AC) composto
principalmente por barcos de arrasto duplo que operam na plataforma interna e média,
132
concentrando suas atividades em duas áreas distintas; uma entre 24°-29°S tendo como
espécies-alvo principais o camarão-rosa (Farfantepenaeus spp.) e o camarão-sete-barbas
(Xyphopenaeus kroyeri), e uma segunda ao sul de 29°S dirigida a outros camarões costeiros
(A. longinaris e P. muelleri) e um grupo de peixes demersais que incluem a castanha (U.
canosai), cabrinha (Prionotus punctatus) e linguados (Paralychthys spp.); (2) arrasto de
talude (AT) realizado por barcos de arrasto duplo e arrasto simples que atuam nas áreas de
talude (250-400 m de profundidade), tendo como alvo principal a abrótea-de-profundidade
(Urophycis mystacea), merluza (Merluccius hubbsi) e peixe-sapo (Lophius gastrphysus)
(Perez et al., 2009); e (3) arrasto de parelhas (AP) que concentram sua atividade na plataforma
interna, tendo como espécies-alvo uma variedade de peixes cianídeos, incluindo castanha (U.
canosai), corvina (Micropogonias furnieri), maria-mole (Cynoscion guatucupa), pescada-
amarela (C. acoupa) e goete (C. jamaicensis).
Os dados utilizados neste trabalho são referentes a informações de capturas, esforço e
áreas de pesca de 10.144 viagens de pesca (arrasto duplo = 8.012 viagens; arrasto simples =
949 viagens; arrasto de parelhas = 1.183 viagens) que desembarcaram suas capturas nos
portos de Santa Catarina entre 2003 e 2011 (Port et al., 2014). Estes dados foram reportados
pelos mestres das embarcações, nos diários de bordo ou durante entrevistas no momento do
desembarque, de acordo com um protocolo de amostragem estabelecido pelo serviço de
estatística pesqueira industrial de Santa Catarina (Perez et al., 1998; www.univali.br/gep).
Como parte deste protocolo de rotina, as informações obtidas através destes dois instrumentos
foram avaliadas por analistas experientes, com base nas tendências de longo prazo da pesca de
arrasto industrial na região (e.g. áreas de pesca, profundidades, espécies comuns nas capturas,
quantidades capturadas, duração das viagens, etc.). Os resultados desta análise foram
classificados como “confiável”, “duvidoso” e “não confiável” e apenas aqueles incluídos na
primeira categoria foram utilizados no banco de dados analisado. Uma vez que resultados
“duvidosos” não são comuns e necessariamente não contém informações falsas, estes foram
submetidos a uma segunda avaliação e eventualmente foram “resgatados” dos que haviam
sido rejeitados. Este é o caso em particular quando mais de um instrumento (diário de bordo e
entrevista) estava disponível para o mesmo desembarque e as informações podiam ser
cruzadas para verificar a consistência dos dados.
Os relatórios de desembarque analisados representam uma fração conhecida
(aproximadamente 70%) dos desembarques totais nos portos de Santa Catarina
(UNIVALI/CTTMar, 2004, 2006, 2007a, 2007b, 2008, 2009, 2010, 2011, 2013) e são
altamente representativos de toda a região Sudeste/Sul do Brasil, uma vez que, os portos de
133
Santa Catarina abrigam quase 60% de toda a frota e registram anualmente 50-70% dos
desembarques da frota industrial de arrasto (Perez et al., 2001).
Além disto, foram utilizados resultados de trabalhos prévios, que se valeram da mesma
base de dados, e que calcularam, por quadrante de 30’ × 30’, as emissões de Carbono e
biomassa desembarcada (Port et al., 2014, Capítulo 1), a área varrida (Capítulo 2) e os valores
do índice de diversidade de Shannon, equitabilidade de Pielou, nível trófico médio,
vulnerabilidade média e resiliência média (Capítulo 3), para a frota industrial de arrasto do
Sudeste e Sul do Brasil, no período de 2003-2011 (vide material suplementar - Tabela S1 e
Figura 1).
Os oito indicadores utilizados foram divididos em dois grupos: (1) Indicadores
Ecológicos, composto pelo índice de diversidade de Shannon (H’), equitabilidade de Pielou
(J’), nível trófico médio (NTM), vulnerabilidade média (VM) e resiliência média (RM); e (2)
Indicadores de Impacto, composto por área varrida (AV), emissões de Carbono (EC) e
biomassa desembarcada (BD). A partir do valor máximo de cada indicador (vide Tabela 1)
atribuímos pontos para cada um dos mesmos, por quadrante de 30’ × 30’, variando entre 1, 3
ou 5, correspondendo a 25%, 25-75% e 75%, respectivamente, do valor máximo do índice de
diversidade de Shannon (H’), equitabilidade de Pielou (J’), resiliência média (RM), área
varrida (AV), emissões de Carbono (EC) e biomassa desembarcada (BD). Para os indicadores
do nível trófico médio (NTM) e vulnerabilidade média (VM), foram considerados os valores
inversos, ou seja, 5, 3 e 1, correspondendo aos mesmos percentuais de 25%, 25-75% e 75%,
respectivamente (adaptado de Karr, 1981; Roth et al., 1999; Ferreira & Cassati, 2006) (Tabela
1).
Tabela 1. Indicadores ecológicos (H’=índice de diversidade de Shannon; J’=índice de equitabilidade de
Pielou; NTM=nível trófico médio; VM=vulnerabilidade média; RM=resiliência média); indicadores de impacto
(AV=área varrida; EC=emissões de Carbono; BD=biomassa desembarcada) e pontuação atribuída (adaptado
de Karr, 1981; Roth et al., 1999; Ferreira & Cassati, 2006).
Indicadores Pontuação
5 3 1
Ecológicos
H’ >=2,273 0,758>n<2,273 <=0,758
J’ >=0,472 0,157>n<0,472 <=0,157
NTM <=3,0 3,0>n<=3,5 >3,5
VM <=14,9092 14,9092>n<44,7276 >=44,7276
RM >=2,6667 1,3334>n<2,6667 <=1,3334
Impacto
AV >=16897,6722 5632,5574>n<16897,6722 <=5632,5574
EC >=2,4253 0,8084>n<2,4253 <=0,8084
BD >=1,0045 0,3348>n<1,0045 <=0,3348
134
Figura 1. Distribuição espacial dos indicadores (biomassa desembarcada, emissões de Carbono, área varrida, índice de diversidade de Shannon, índice de equitabilidade de
Pielou, nível trófico médio, vulnerabilidade média e resiliência média) decorrentes das operações da frota industrial de arrasto do Sudeste e Sul do Brasil, no período de 2003-
2011. Para maiores informações sobre biomassa desembarcada e emissões de Carbono vide Port et al. (2014) e para os demais indicadores vide Port et al. (dados não
publicados – Capítulos 2 e 3).
135
Após a atribuição dos respectivos valores, para cada atributo, por quadrante de 30’ ×
30’, foi calculado o índice do estado do ambiente (IEA), de acordo com a seguinte fórmula:
𝑰𝑬𝑨 =∑ 𝑽𝑰
𝑽𝑴𝑰
onde 𝑉𝐼 é o valor atribuído aos indicadores (H’=índice de diversidade de Shannon; J’=índice
de equitabilidade de Pielou; NTM=nível trófico médio; VM=vulnerabilidade média;
RM=resiliência média; AV=área varrida; EC=emissões de Carbono; BD=biomassa
desembarcada); e 𝑉𝑀𝐼 é o valor máximo possível de atribuição aos indicadores (5 × 8
indicadores = 40).
A partir dos valores obtidos para o índice do estado do ambiente (IEA), por quadrante
de 30’ × 30’, foram estabelecidas três categorias de áreas de pesca (A, B e C), de acordo com
as características dos indicadores ecológicos e de impacto. Onde na categoria “A” temos para
os indicadores ecológicos uma área de alta diversidade, alta equitabilidade, alta resiliência
média, baixo nível trófico médio e baixa vulnerabilidade média e para os indicadores de
impacto temos uma área de alto percentual de área varrida, alta emissão de Carbono e alta
biomassa desembarcada. Na categoria “C”, temos uma situação contrária, com os indicadores
ecológicos registrando uma baixa diversidade, equitabilidade e resiliência média e um alto
valor de nível trófico médio e vulnerabilidade média e para os indicadores de impacto temos
baixos valores de percentual de área varrida, emissão de Carbono e biomassa desembarcada.
Por fim, na categoria “B”, temos os valores intermediados de todos os indicadores (ecológicos
e de impacto) (Tabela 2).
As diferentes categorias de áreas de pesca (A, B e C) foram especializadas em
ambiente de SIG (Sistema de Informação Geográfica), utilizando o software ArcGIS® (ESRI -
Environmental Systems Research Institute, Inc.).
RESULTADOS
Os valores do índice do estado do ambiente (IEA) foram calculados para todos os
quadrantes de 30’ × 30’, utilizados pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, no
período de 2003-2011, variando de 0,30 até 0,90 (vide material suplementar - Tabela S2).
136
Tabela 2. Descrição das categorias de áreas de pesca e os respectivos intervalos do índice do estado do ambiente
(IEA).
Categoria IEA Indicadores Descrição
A ≥ 0,65
Ecológicos
Alta diversidade
Alta equitabilidade
Baixo nível trófico médio
Baixa vulnerabilidade média
Alta resiliência média
Impactos
Alta % de área varrida
Alta emissão de Carbono
Alta biomassa desembarcada
B 0,35-0,65
Ecológicos
Média diversidade
Média equitabilidade
Médio nível trófico médio
Média vulnerabilidade média
Média resiliência média
Impactos
Médio % de área varrida
Média emissão de Carbono
Média biomassa desembarcada
C ≤ 0,35
Ecológicos
Baixa diversidade
Baixa equitabilidade
Alto nível trófico médio
Alta vulnerabilidade média
Baixa resiliência média
Impactos
Baixo % de área varrida
Baixa emissão de Carbono
Baixa biomassa desembarcada
Do total de quadrantes utilizados pela frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do
Brasil, no período de 2003-2011, 29 foram enquadrados na categoria de área de pesca “A”
(IEA≥0,65), 121 quadrantes foram incluídos na categoria “B” (0,35<IEA<0,65) e os restantes
54 quadrantes ficaram na categoria “C” (IEA≤0,35) (Figura 2 e Tabela 3).
Após a espacialização dos valores do índice do estado do ambiente (IEA) verificamos
que a categoria de área de pesca “A” localiza-se, aproximadamente, entre as coordenadas
24,75°-33,25°S e as isóbata de 0-100m (ao sul de São Paulo até o sul do Rio Grande do Sul).
A categoria “C” localiza-se, aproximadamente, entre as coordenadas 20,25°-34,25°S, a partir
da isóbata de 100m (do centro-sul do Espírito Santo até o sul do Rio Grande do Sul). A
categoria “B”, por sua vez, encontra-se distribuída nas demais áreas da região de estudo
(Figura 3).
137
Figura 2. Número de quadrantes (30’ × 30’) por índice do estado do ambiente (IEA) e categorias de áreas de
pesca (A, B e C).
Tabela 3. Síntese da representatividade de cada categoria de área de pesca, em número de quadrantes (30’ × 30’),
km2 e percentual, decorrente da atuação da frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, no período de
2003-2011.
Categoria Intervalos Quadrantes Km2 %
A IEA≥0,65 29 69,331.52 13,81
B 0,35<IEA<0,65 121 285,342.80 56,82
C IEA≤0,35 54 147,515.68 29,37
DISCUSSÃO
A delimitação de áreas impactadas pela pesca industrial de arrasto no Sudeste/Sul do
Brasil, a partir de estimativas de emissões de Carbono, biomassa desembarcada (Port et al.,
2014), área varrida (Capítulo 2) e indicadores ecológicos da biomassa desembarcada
(diversidade, equitabilidade, nível trófico médio, vulnerabilidade média e resiliência média)
por esta frota (Capítulo 3), fornece uma importante ferramenta para a gestão, com enfoque
ecossistêmico, desta modalidade pesca. A partir de uma visão integrada destes indicadores,
foi possível estabelecer três distintas categorias de áreas de pesca, para a frota industrial de
arrasto que atua na região, bem como definir a sua espacialização.
138
Figura 3. Distribuição espacial das categorias de áreas de pesca (A, B e C), decorrentes das operações da frota industrial de arrasto do Sudeste e Sul do Brasil, no período de
2003-2011.
139
A categoria de área de pesca “A”, localizada na porção centro-sul da área de estudo,
entre as isóbatas 0-100m, é a mais impactada considerando-se os níveis de emissão de
Carbono, remoção de biomassa e área varrida. Além disto, a composição de sua captura
desembarcada pode ser considerada como menos suscetível a impactos, pois é a que apresenta
o conjunto de espécies com os menores valores de nível trófico e vulnerabilidade e os maiores
valores de resiliência, destacando-se ainda com o maior índice de diversidade e
equitabilidade.
De outro lado, categoria de área de pesca “C”, localizada ao longo de toda a área de
estudo, a partir da isóbata de 100m, apresenta uma condição que podemos definir como sendo
a menos impactada, do ponto de vista dos níveis de emissão de Carbono, remoção de
biomassa e área varrida, porém esta região é a que possui as espécies, registradas na captura
desembarcada, com os maiores níveis tróficos, uma alta vulnerabilidade e baixa resiliência,
além de baixa diversidade e equitabilidade, caracterizando uma comunidade mais suscetível a
impactos.
Por sua vez, categoria de área de pesca “B”, distribuída nas demais áreas da região de
estudo, é uma região medianamente impactada pela emissão de Carbono, remoção de
biomassa e área varrida e a composição da sua biomassa desembarcada é caracterizada por
valores medianos de todos os indicadores avaliados.
A gestão da pesca nestas diferentes áreas pode ter distintas abordagens dependendo do
grau de impacto e características da comunidade e do ambiente. Uma das formas de gestão
possível é conhecida como “freezing the footprint”, que é o “congelamento” dos níveis atuais
de esforço, capturas e áreas de pesca (Hourigan, 2009; Rieser et al., 2013; Ardron et al.,
2014). Em geral, esta abordagem é utilizada para áreas com corais, mas também pode ser
utilizada para outros ambientes ou comunidades sensíveis a impactos. Esta é uma medida de
precaução, utilizada até que se conheça o ambiente e os organismos que nele vivem, como
forma de evitar a expansão da atividade pesqueira para áreas mais sensíveis (Shester &
Warrenchuk, 2007). Esta não é uma abordagem recomendada para a pesca de arrasto de fundo
em áreas onde as operações de pesca são realizadas em habitats vulneráveis (Rieser et al.,
2013).
Outra forma de gestão é a criação de áreas de exclusão de pesca (AEP) (Duineveld et
al., 2007; Perez, 2007; Brown, 2008; Rieser et al., 2013). As AEP são uma ferramenta
poderosa tanto para a gestão da pesca como para a conservação da biodiversidade marinha
(Kelleher, 1999) apresentando, em geral, resultados qualitativos melhores do que àqueles
obtidos apenas através do manejo convencional da atividade pesqueira (e.g. limitar a pesca a
140
alguma fração do tamanho total estimado do estoque) (Roberts et al., 2005). Uma vez que o
tamanho das AEP e o período de sua duração sejam compatíveis com as exigências biológicas
dos estoques que se queira manejar, estas áreas podem prevenir o colapso destes estoques,
aumentando inclusive a produção pesqueira de áreas adjacentes (Roberts et al., 2001; Gell &
Roberts, 2003).
Com relação a este trabalho, uma análise detalhada dos números apresentados deve
considerar que eles estão subestimados, em função de efeitos combinados que limitaram (a) a
estimativa precisa do consumo de combustível de cada viagem de pesca; (b) a extrapolação da
biomassa desembarcada para toda a frota e capturas na região; (c) a estimativa de área varrida;
(d) os valores de diversidade, equitabilidade, nível trófico médio, vulnerabilidade média e
resiliência média, pois estes foram calculados apenas para a biomassa desembarcada, não
considerando os descartes.
Mesmo assim, na região Sudeste/Sul do Brasil, com base nos resultados deste estudo,
poderia ser avaliada a utilização das duas ferramentas, “freezing the footprint” e AEP, onde
num primeiro momento é recomendável o “congelamento” dos níveis atuais de esforço,
capturas e áreas de pesca, não permitindo a expansão da frota industrial de arrasto. Na
sequência, a utilização efetiva de um sistema de monitoramento das embarcações (Vessel
Monitoring System – VMS) é importante para identificar as áreas efetivamente utilizadas pela
pesca industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil, uma vez que as informações disponíveis
para a realização deste trabalho registram os quadrantes de 30’ × 30’ e não o local exato dos
arrastos, podendo estar superestimada a área efetivamente impactada. Além disto, é necessária
uma avaliação total das capturas, considerando além da biomassa desembarcada (utilizada
neste estudo), os descartes que são uma fração importante e que segundo Perez et al. (2001)
podem chegar a 30-40% das capturas totais obtidas pela frota industrial de arrasto. Deve ser
considerada também uma melhor compreensão da interação do petrecho de arrasto com o
fundo oceânico, pois esta interação provoca alterações na estrutura física e composição
biológica do fundo (He & Winger, 2010). Finalmente, ao dispor destas informações, é
possível propor a criação de AEP, utilizando como critérios para sua definição, a localização
de áreas onde as espécies marinhas apresentem principalmente, uma baixa resiliência, alta
vulnerabilidade, alto nível trófico e a comunidade apresente uma baixa diversidade e
equitabilidade, sendo que estas características estão presentes, no caso dos resultados deste
estudo, na categoria de área de pesca “C”, ou seja, aproximadamente, entre as coordenadas
20,25°-34,25°S, a partir da isóbata de 100m (do centro-sul do Espírito Santo até o sul do Rio
Grande do Sul).
141
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Itajaí, SC, 69pp.
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Tabela S1. Valores obtidos para os diferentes indicadores (H’=índice de diversidade de Shannon; J’=índice de
equitabilidade de Pielou; NTM=nível trófico médio; VM=vulnerabilidade média; RM=resiliência média;
AV=área varrida; EC=emissões de Carbono; BD=biomassa desembarcada), por quadrante de 30’ × 30’
(LAT=latitude; LONG=longitude, em graus decimais), decorrentes das operações da frota industrial de arrasto
do Sudeste e Sul do Brasil, no período de 2003-2011. Para maiores informações sobre EC e BD vide Port et al.
(2014), e para os demais indicadores vide Port et al. (dados não publicados – Capítulos 2 e 3).
LAT LONG H’ J’ NTM VM RM AV EC BD
-34,75 -52,75 1,5676 0,3252 4,0617 40,5924 2,8565 75,0084 0.0208 0,0139
-34,75 -52,25 1,9686 0,4084 3,9628 41,3177 2,7086 178,8074 0.0379 0,0337
-34,75 -51,75 2,3164 0,4806 4,0268 52,6782 2,3427 162,9994 0.0273 0,0204
-34,25 -53,25 2,1911 0,4546 3,9234 43,2168 2,9014 822,4699 0.1835 0,1106
-34,25 -52,75 2,1581 0,4477 3,9662 43,1313 2,8776 2211,3271 0.4795 0,2941
-34,25 -52,25 2,0885 0,4333 3,9489 41,9799 2,8725 1987,8533 0.4441 0,3248
-34,25 -51,75 2,3632 0,4903 3,9551 45,0541 2,7401 2058,3699 0.4008 0,2834
-34,25 -51,25 1,9053 0,3953 4,0660 55,9326 2,1844 279,8743 0.0393 0,0274
-33,81 -53,20 2,3555 0,4887 3,7528 38,6914 2,9160 586,3259 0.1128 0,0571
-33,75 -52,75 2,3430 0,4861 3,8983 42,9779 2,8757 3402,9727 0.6902 0,3855
-33,75 -52,25 2,2722 0,4714 3,9291 43,3834 2,8735 5303,2581 1.0857 0,6060
-33,75 -51,75 2,2559 0,4680 3,9457 43,8703 2,8192 3885,3328 0.8353 0,5615
-33,75 -51,25 2,5221 0,5232 3,9609 49,8876 2,5936 3151,2514 0.5896 0,3607
-33,75 -50,75 1,8534 0,3845 4,0675 58,2548 2,1557 1822,7980 0.2697 0,1494
-33,75 -50,25 1,0081 0,2091 4,1109 59,6368 2,1431 16,3365 0.0021 0,0014
-33,33 -52,67 2,3846 0,4947 3,3717 31,5083 2,9633 1419,5323 0.2356 0,1065
-33,25 -52,25 2,5458 0,5281 3,7918 42,6631 2,8420 8020,8214 1.3981 0,6707
-33,25 -51,75 2,3240 0,4821 3,9073 44,1608 2,8486 6225,9498 1.2240 0,6473
-33,25 -51,25 2,3399 0,4854 3,9200 45,5561 2,8005 4058,3323 0.9393 0,5690
-33,25 -50,75 2,5352 0,5259 3,9790 52,1490 2,4658 6029,1935 1.0681 0,5857
-33,25 -50,25 1,6837 0,3493 4,0486 58,0625 2,1480 3767,6091 0.5605 0,3204
-32,76 -52,23 2,5198 0,5227 3,3102 31,4412 2,9222 8135,4262 1.1759 0,4292
-32,75 -51,75 2,6103 0,5415 3,8315 44,7245 2,8438 7568,0873 1.3043 0,5342
-32,75 -51,25 2,2711 0,4712 3,8953 44,0105 2,8482 3610,9101 0.7552 0,4174
-32,75 -50,75 2,2879 0,4746 3,8985 45,4801 2,7459 2885,7298 0.6582 0,4195
-32,75 -50,25 1,9631 0,4073 4,0296 56,6279 2,2150 7024,4056 1.0949 0,6485
-32,75 -49,75 2,3852 0,4948 4,0270 56,2082 2,2836 148,7391 0.0236 0,0077
-32,31 -52,14 1,8732 0,3886 2,9419 21,1649 2,9642 9320,8044 1.1689 0,4029
-32,25 -51,75 2,6042 0,5403 3,4407 35,3575 2,8908 22530,2296 3.2338 1,1782
-32,25 -51,25 2,6607 0,5520 3,8472 45,5426 2,8396 15371,4723 2.6320 1,1225
-32,25 -50,75 2,2855 0,4742 3,8785 44,2195 2,8202 5235,8128 1.0877 0,6218
-32,25 -50,25 2,0759 0,4307 4,0085 54,8885 2,2830 10474,0428 1.6407 1,0162
-32,25 -49,75 2,4795 0,5144 3,9999 55,5310 2,3011 161,6565 0.0255 0,0082
-31,78 -51,23 2,7989 0,5807 3,6599 42,1954 2,8764 9051,6082 1.4507 0,5640
-31,75 -50,75 2,6729 0,5545 3,8299 45,9419 2,8198 6830,8988 1.2030 0,5212
-31,75 -50,25 2,4934 0,5173 3,9126 50,8899 2,4448 2263,8647 0.3908 0,2234
-31,75 -49,75 2,2741 0,4718 3,9857 53,3752 2,2908 804,5547 0.1268 0,0769
-31,75 -49,25 0,9401 0,1950 3,8711 51,5345 2,1498 2,6739 0.0008 0,0006
-31,73 -51,75 2,5849 0,5362 3,4266 34,6631 2,9504 3641,7358 0.5603 0,2261
-31,36 -51,70 0,5804 0,1204 2,5664 10,0000 3,0000 13,3046 0.0016 0,0004
-31,29 -50,71 2,5070 0,5201 3,4439 34,6481 2,9196 13166,2724 2.0750 0,9799
-31,25 -50,25 2,4914 0,5169 3,8513 46,2080 2,7351 5683,9652 1.0632 0,5593
-31,25 -49,75 2,3171 0,4807 3,9036 50,7393 2,4103 1912,9898 0.3304 0,2213
-31,25 -49,25 1,8483 0,3834 4,0320 56,3966 2,1895 503,1973 0.0766 0,0401
-31,25 -48,75 0,9401 0,1950 3,8711 51,5345 2,1498 2,6739 0.0008 0,0006
-31,25 -51,30 2,5726 0,5337 3,4449 34,9479 2,9411 2644,8905 0.4308 0,1821
-30,78 -51,20 0,5804 0,1204 2,5664 10,0000 3,0000 13,3046 0.0016 0,0004
-30,76 -50,23 2,6613 0,5521 3,5969 39,6760 2,8722 7925,0540 1.3792 0,6168
-30,75 -49,75 2,5881 0,5369 3,8531 47,2447 2,7239 3861,5502 0.9660 0,4467
-30,75 -49,25 2,3209 0,4815 3,8878 51,0015 2,4091 1480,0855 0.2683 0,1601
-30,75 -48,75 2,3437 0,4862 3,9918 55,4533 2,2575 505,5030 0.0830 0,0425
149
LAT LONG H’ J’ NTM VM RM AV EC BD
-30,75 -48,25 1,8884 0,3918 4,0582 56,8107 2,2093 289,3461 0.0428 0,0232
-30,73 -50,81 2,4476 0,5078 3,4056 34,2266 2,9396 6271,6712 1.0118 0,4500
-30,38 -50,75 0,3182 0,0660 2,6516 10,0000 3,0000 57,0359 0.0074 0,0026
-30,29 -50,12 2,1570 0,4475 3,2194 27,6663 2,9762 20638,3916 3.0678 1,3393
-30,25 -49,75 2,6320 0,5460 3,8143 46,2836 2,9094 8858,9289 1.8475 0,8512
-30,25 -49,25 2,1440 0,4448 3,8711 47,4723 2,5375 2909,4928 0.5566 0,3531
-30,25 -48,75 1,9158 0,3974 3,8716 47,3735 2,5043 1902,8186 0.3948 0,2911
-30,25 -48,25 2,1105 0,4378 4,0415 56,6188 2,2115 640,8706 0.0968 0,0477
-30,25 -47,75 1,4716 0,3053 4,0617 58,6692 2,1137 225,3958 0.0343 0,0165
-29,91 -50,04 2,5787 0,5350 3,7411 42,5869 2,9806 2206,1165 0.4793 0,2371
-29,76 -49,74 2,6471 0,5492 3,8422 45,4512 2,9620 6629,1075 1.4178 0,6949
-29,75 -49,25 2,6793 0,5558 3,8524 46,5573 2,8547 6463,5863 1.3510 0,6605
-29,75 -48,75 2,0077 0,4165 3,8635 47,6304 2,5206 2627,2672 0.5197 0,3812
-29,75 -48,25 2,2230 0,4612 3,9562 49,5386 2,3973 1074,0865 0.1752 0,1130
-29,75 -47,75 1,9051 0,3952 4,0506 53,2797 2,2651 545,0566 0.0855 0,0425
-29,75 -47,25 1,4568 0,3022 3,9993 56,9504 2,0779 26,0614 0.0042 0,0022
-29,36 -49,62 2,6295 0,5455 3,8495 44,1693 3,0258 2668,1380 0.5978 0,2963
-29,25 -49,25 2,6754 0,5550 3,8305 45,3795 2,9660 7319,8442 1.4498 0,6608
-29,25 -48,75 2,4771 0,5139 3,8477 47,9629 2,6431 6553,6355 1.1888 0,5765
-29,25 -48,25 2,0041 0,4158 3,8975 46,5430 2,5079 2888,8700 0.5533 0,4264
-29,25 -47,75 2,0759 0,4306 4,0567 52,0546 2,3187 1249,3940 0.1920 0,0909
-29,25 -47,25 1,8819 0,3904 4,1043 57,4386 2,1947 75,2281 0.0111 0,0050
-28,89 -49,15 2,7779 0,5763 3,7973 45,3818 2,9591 4819,0513 0.8801 0,3700
-28,77 -48,73 2,8223 0,5855 3,7712 45,2271 2,7924 12467,0524 1.9960 0,7110
-28,75 -48,25 2,2098 0,4584 3,8442 45,2812 2,6260 8861,2393 1.4394 0,6977
-28,75 -47,75 2,2884 0,4747 3,9521 47,1450 2,4661 4167,1549 0.6622 0,4083
-28,75 -47,25 1,7763 0,3685 4,0548 50,8689 2,3250 3409,0567 0.5015 0,2391
-28,75 -46,75 1,3834 0,2870 4,0529 59,1431 2,1021 233,7256 0.0353 0,0149
-28,30 -48,63 2,8994 0,6015 3,4318 34,7259 2,9482 6462,4858 0.9132 0,2337
-28,25 -48,25 2,8971 0,6010 3,5989 41,1604 2,7326 13581,3415 1.9039 0,4620
-28,25 -47,75 2,2080 0,4581 3,8669 51,8694 2,3295 3005,6837 0.4889 0,2004
-28,25 -47,25 1,6596 0,3443 4,0701 56,9521 2,2091 4131,9483 0.5911 0,2320
-28,25 -46,75 1,3706 0,2843 4,0702 59,0906 2,1146 487,9697 0.0727 0,0320
-27,77 -48,57 2,5531 0,5297 3,1405 27,4339 3,0669 102,9256 0.0263 0,0034
-27,76 -48,24 2,9484 0,6117 3,6383 42,9118 2,6603 10922,9629 1.5444 0,2783
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150
LAT LONG H’ J’ NTM VM RM AV EC BD
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151
LAT LONG H’ J’ NTM VM RM AV EC BD
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-22,25 -39,25 1,2551 0,2604 2,7552 19,5157 2,6919 5,2364 0.0015 0,0000
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-21,25 -39,75 1,2551 0,2604 2,7552 19,5157 2,6919 5,2364 0.0015 0,0000
-20,76 -40,24 1,4744 0,3059 3,7442 44,1247 1,8437 14,8022 0.0020 0,0003
-20,75 -39,75 1,4969 0,3105 3,8324 49,4298 2,2618 9,0201 0.0020 0,0002
-20,75 -39,25 1,2551 0,2604 2,7552 19,5157 2,6919 5,2364 0.0015 0,0000
-20,29 -40,13 0,4093 0,0849 3,1288 22,8640 1,4272 11,0185 0.0015 0,0001
-20,25 -39,75 1,4744 0,3059 3,7442 44,1247 1,8437 14,8022 0.0020 0,0003
-20,25 -39,25 1,2551 0,2604 2,7552 19,5157 2,6919 5,2364 0.0015 0,0000
-19,78 -39,72 2,1194 0,4397 3,4176 34,3390 3,1464 54,0491 0.0071 0,0006
-19,75 -39,25 2,0245 0,4200 3,1710 26,8512 3,3734 55,5019 0.0081 0,0004
-19,75 -38,75 1,2551 0,2604 2,7552 19,5157 2,6919 5,2364 0.0015 0,0000
-19,75 -38,25 1,2551 0,2604 2,7552 19,5157 2,6919 5,2364 0.0015 0,0000
-19,25 -39,62 1,7883 0,3710 3,2072 27,4895 3,4327 50,2654 0.0066 0,0004
-19,25 -39,25 1,7883 0,3710 3,2072 27,4895 3,4327 50,2654 0.0066 0,0004
152
Tabela S2. Valores atribuídos para os diferentes indicadores (H’=índice de diversidade de Shannon; J’=índice de
equitabilidade de Pielou; NTM=nível trófico médio; VM=vulnerabilidade média; RM=resiliência média;
AV=área varrida; EC=emissões de Carbono; BD=biomassa desembarcada), somatório dos valores (∑) e Índice
do Estado do Ambiente-IEA (∑/40), por quadrante de 30’ × 30’ (LAT=latitude; LONG=longitude, em graus
decimais).
LAT LONG H' J' NTM VM RM AV EC BD ∑ IEA
-34,75 -52,75 3 3 1 3 3 1 1 1 16 0.40
-34,75 -52,25 3 3 1 3 5 1 1 1 18 0.45
-34,75 -51,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-34,25 -53,25 3 3 1 3 5 1 1 1 18 0.45
-34,25 -52,75 3 3 1 3 5 1 1 1 18 0.45
-34,25 -52,25 3 3 1 3 5 1 1 1 18 0.45
-34,25 -51,75 5 5 1 1 5 1 1 1 20 0.50
-34,25 -51,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-33,81 -53,20 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-33,75 -52,75 5 5 1 3 5 1 1 3 24 0.60
-33,75 -52,25 3 3 1 3 5 1 3 3 22 0.55
-33,75 -51,75 3 3 1 3 5 1 3 3 22 0.55
-33,75 -51,25 5 5 1 1 3 1 1 3 20 0.50
-33,75 -50,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-33,75 -50,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-33,33 -52,67 5 5 3 3 5 1 1 1 24 0.60
-33,25 -52,25 5 5 1 3 5 3 3 3 28 0.70
-33,25 -51,75 5 5 1 3 5 3 3 3 28 0.70
-33,25 -51,25 5 5 1 1 5 1 3 3 24 0.60
-33,25 -50,75 5 5 1 1 3 3 3 3 24 0.60
-33,25 -50,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-32,76 -52,23 5 5 3 3 5 3 3 3 30 0.75
-32,75 -51,75 5 5 1 3 5 3 3 3 28 0.70
-32,75 -51,25 3 3 1 3 5 1 1 3 20 0.50
-32,75 -50,75 5 5 1 1 5 1 1 3 22 0.55
-32,75 -50,25 3 3 1 1 3 3 3 3 20 0.50
-32,75 -49,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-32,31 -52,14 3 3 5 3 5 3 3 3 28 0.70
-32,25 -51,75 5 5 3 3 5 5 5 5 36 0.90
-32,25 -51,25 5 5 1 1 5 3 5 5 30 0.75
-32,25 -50,75 5 5 1 3 5 1 3 3 26 0.65
-32,25 -50,25 3 3 1 1 3 3 3 5 22 0.55
-32,25 -49,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-31,78 -51,23 5 5 1 3 5 3 3 3 28 0.70
-31,75 -50,75 5 5 1 1 5 3 3 3 26 0.65
-31,75 -50,25 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-31,75 -49,75 5 3 1 1 3 1 1 1 16 0.40
-31,75 -49,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-31,73 -51,75 5 5 3 3 5 1 1 1 24 0.60
-31,36 -51,70 1 1 5 5 5 1 1 1 20 0.50
-31,29 -50,71 5 5 3 3 5 3 3 3 30 0.75
-31,25 -50,25 5 5 1 1 5 3 3 3 26 0.65
-31,25 -49,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
153
LAT LONG H' J' NTM VM RM AV EC BD ∑ IEA
-31,25 -49,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-31,25 -48,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-31,25 -51,30 5 5 3 3 5 1 1 1 24 0.60
-30,78 -51,20 1 1 5 5 5 1 1 1 20 0.50
-30,76 -50,23 5 5 1 3 5 3 3 3 28 0.70
-30,75 -49,75 5 5 1 1 5 1 3 3 24 0.60
-30,75 -49,25 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-30,75 -48,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-30,75 -48,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-30,73 -50,81 5 5 3 3 5 3 3 3 30 0.75
-30,38 -50,75 1 1 5 5 5 1 1 1 20 0.50
-30,29 -50,12 3 3 3 3 5 5 5 5 32 0.80
-30,25 -49,75 5 5 1 1 5 3 3 3 26 0.65
-30,25 -49,25 3 3 1 1 3 1 1 3 16 0.40
-30,25 -48,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-30,25 -48,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-30,25 -47,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-29,91 -50,04 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-29,76 -49,74 5 5 1 1 5 3 3 3 26 0.65
-29,75 -49,25 5 5 1 1 5 3 3 3 26 0.65
-29,75 -48,75 3 3 1 1 3 1 1 3 16 0.40
-29,75 -48,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-29,75 -47,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-29,75 -47,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-29,36 -49,62 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-29,25 -49,25 5 5 1 1 5 3 3 3 26 0.65
-29,25 -48,75 5 5 1 1 3 3 3 3 24 0.60
-29,25 -48,25 3 3 1 1 3 1 1 3 16 0.40
-29,25 -47,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-29,25 -47,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-28,89 -49,15 5 5 1 1 5 1 3 3 24 0.60
-28,77 -48,73 5 5 1 1 5 3 3 3 26 0.65
-28,75 -48,25 3 3 1 1 3 3 3 3 20 0.50
-28,75 -47,75 5 5 1 1 3 1 1 3 20 0.50
-28,75 -47,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-28,75 -46,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-28,30 -48,63 5 5 3 3 5 3 3 1 28 0.70
-28,25 -48,25 5 5 1 3 5 3 3 3 28 0.70
-28,25 -47,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-28,25 -47,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-28,25 -46,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-27,77 -48,57 5 5 3 3 5 1 1 1 24 0.60
-27,76 -48,24 5 5 1 3 3 3 3 1 24 0.60
-27,75 -47,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-27,75 -47,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-27,75 -46,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-27,75 -46,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
154
LAT LONG H' J' NTM VM RM AV EC BD ∑ IEA
-27,25 -48,55 1 1 5 5 5 1 1 1 20 0.50
-27,25 -47,75 5 5 1 1 3 3 3 1 22 0.55
-27,25 -47,25 3 3 1 1 3 3 3 1 18 0.45
-27,25 -46,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-27,25 -46,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-27,25 -45,75 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-27,24 -48,24 5 5 1 3 5 3 3 1 26 0.65
-26,75 -48,25 5 5 1 3 3 5 5 3 30 0.75
-26,75 -47,75 5 5 1 3 3 3 3 1 24 0.60
-26,75 -47,25 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-26,75 -46,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-26,75 -46,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-26,75 -45,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-26,75 -45,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-26,74 -48,58 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-26,25 -48,25 5 5 1 3 5 5 5 3 32 0.80
-26,25 -47,75 5 5 3 3 5 3 3 1 28 0.70
-26,25 -47,25 5 5 1 1 3 3 3 1 22 0.55
-26,25 -46,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-26,25 -46,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-26,25 -45,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-26,25 -45,25 3 3 1 1 5 1 1 1 16 0.40
-26,25 -48,58 3 3 3 3 3 1 1 1 18 0.45
-25,76 -48,23 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-25,75 -47,75 5 5 1 3 5 3 3 1 26 0.65
-25,75 -47,25 5 5 1 3 5 3 3 1 26 0.65
-25,75 -46,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-25,75 -46,25 5 5 1 1 3 3 3 1 22 0.55
-25,75 -45,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-25,75 -45,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-25,75 -44,75 3 3 1 3 5 1 1 1 18 0.45
-25,38 -48,20 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-25,26 -47,74 3 3 3 3 5 3 3 1 24 0.60
-25,25 -47,25 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-25,25 -46,75 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-25,25 -46,25 5 5 1 1 3 3 3 1 22 0.55
-25,25 -45,75 5 5 1 1 3 3 3 1 22 0.55
-25,25 -45,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-25,25 -44,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-25,25 -44,25 3 3 1 3 5 1 1 1 18 0.45
-24,90 -47,64 3 3 5 5 5 1 1 1 24 0.60
-24,78 -47,22 3 3 5 5 5 3 3 1 28 0.70
-24,75 -46,75 3 3 5 3 5 3 1 1 24 0.60
-24,75 -46,25 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-24,75 -45,75 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-24,75 -45,25 5 5 1 1 5 1 1 1 20 0.50
-24,75 -44,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
155
LAT LONG H' J' NTM VM RM AV EC BD ∑ IEA
-24,75 -44,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-24,75 -43,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-24,75 -43,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-24,46 -47,05 1 1 5 5 5 1 1 1 20 0.50
-24,33 -46,71 1 1 5 5 5 3 3 1 24 0.60
-24,25 -46,25 3 3 5 3 5 3 1 1 24 0.60
-24,25 -45,75 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-24,25 -45,25 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-24,25 -44,75 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-24,25 -44,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-24,25 -43,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-24,25 -43,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-24,25 -42,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-24,25 -42,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-23,92 -46,11 1 1 5 5 5 1 1 1 20 0.50
-23,89 -45,76 3 3 5 5 5 1 1 1 24 0.60
-23,77 -45,20 5 5 3 3 5 1 1 1 24 0.60
-23,75 -44,75 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-23,75 -44,25 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-23,75 -43,75 5 5 1 1 3 1 1 1 18 0.45
-23,75 -43,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-23,75 -42,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-23,75 -42,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-23,75 -41,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-23,75 -41,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-23,75 -40,75 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-23,33 -44,68 3 3 1 3 5 1 1 1 18 0.45
-23,27 -44,25 5 5 1 3 3 1 1 1 20 0.50
-23,26 -43,75 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-23,25 -43,25 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-23,25 -42,25 5 5 3 3 5 1 1 1 24 0.60
-23,25 -41,75 5 5 3 3 5 1 1 1 24 0.60
-23,25 -42,75 5 5 1 3 5 1 1 1 22 0.55
-23,25 -41,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-23,25 -40,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-23,25 -40,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-22,98 -42,71 3 3 3 3 5 1 1 1 20 0.50
-22,97 -42,26 3 3 1 1 5 1 1 1 16 0.40
-22,75 -41,74 3 3 3 3 5 1 1 1 20 0.50
-22,75 -41,25 3 3 3 3 5 1 1 1 20 0.50
-22,75 -40,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-22,75 -40,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-22,75 -39,75 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-22,39 -41,64 3 3 3 3 5 1 1 1 20 0.50
-22,25 -40,75 3 3 1 3 3 1 1 1 16 0.40
-22,25 -40,25 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-22,25 -39,75 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
156
LAT LONG H' J' NTM VM RM AV EC BD ∑ IEA
-22,25 -39,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-21,75 -40,25 3 3 1 3 3 1 1 1 16 0.40
-21,75 -39,75 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-21,75 -39,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-21,75 -40,75 3 3 1 3 3 1 1 1 16 0.40
-21,27 -40,72 1 1 3 3 1 1 1 1 12 0.30
-21,25 -40,25 3 3 1 3 3 1 1 1 16 0.40
-21,25 -39,75 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-20,76 -40,24 3 3 1 3 3 1 1 1 16 0.40
-20,75 -39,75 3 3 1 1 3 1 1 1 14 0.35
-20,75 -39,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-20,29 -40,13 1 1 3 3 3 1 1 1 14 0.35
-20,25 -39,75 3 3 1 3 3 1 1 1 16 0.40
-20,25 -39,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-19,78 -39,72 3 3 3 3 5 1 1 1 20 0.50
-19,75 -39,25 3 3 3 3 5 1 1 1 20 0.50
-19,75 -38,75 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-19,75 -38,25 3 3 5 3 5 1 1 1 22 0.55
-19,25 -39,62 3 3 3 3 5 1 1 1 20 0.50
-19,25 -39,25 3 3 3 3 5 1 1 1 20 0.50
157
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A quantidade de combustível consumido, a emissão resultante de gases de efeito
estufa, a “pegada espacial”, a área varrida, os valores dos índices de diversidade,
equitabilidade, pesca em equilíbrio (Fishing-in-Balance index - FiB), nível trófico médio,
vulnerabilidade média e resiliência média, além da variação espaço-temporal destes
indicadores, referentes captura desembarcada da frota industrial de arrasto mais produtiva do
Brasil, foram avaliados, pela primeira vez.
Conforme a hipótese inicial deste trabalho foi possível verificar que a pesca industrial
de arrasto ocupa e impacta uma área significativa da costa Sudeste e Sul do Brasil, sendo que
os valores obtidos para o índice da pesca em equilíbrio (FiB) indicam que esta modalidade de
pesca expandiu suas atividades ao longo do período avaliado (2003-2011) por toda a
plataforma, alcançando as áreas de talude, explorando desta forma um ecossistema mais
amplo.
Além disto, a área varrida pela frota industrial de arrasto, que realizou seus
desembarques nos portos de Santa Catarina, foi maior do que a superfície total da área de
pesca na região Sudeste/Sul do Brasil. Ressalta-se que os valores obtidos para a área varrida
podem estar subestimados em função de fatores que limitaram a estimativa precisa das áreas
varridas (pela ausência de dados reais de cada pescaria) e a extrapolação para todo o universo
da frota de arrasto na região.
Verifica-se ainda que o impacto provocado pela pesca de arrasto é bastante
heterogêneo ao longo da costa Sudeste/Sul do Brasil, afetando de forma diferenciada os
ambientes e os organismos, sazonalmente e ao longo de intervalos de latitude e profundidade.
Esta heterogeneidade dos impactos é decorrente, entre outros fatores, pela existência de três
diferentes estratégias de pesca (Arrasto de Camarões, Arrasto de Talude e Arrasto de
Parelhas) atuando na região.
Finalmente, o balanço de Carbono apresenta-se como deficitário na área avaliada, uma
vez que as operações de pesca emitem muito mais Carbono, decorrente do consumo de
combustíveis fósseis, do que removem em função da biomassa desembarcada. Este balanço
não é homogêneo ao longo da plataforma e talude, sendo influenciado também por fatores
sazonais e de intervalos de latitude e profundidade. A demanda por pescados de alto valor
(e.g. camarão-rosa, peixes de águas profundas), pode induzir a concentração de custos
ambientais (consumo de combustíveis fósseis, emissões de CO2) em áreas relativamente
pequenas.
158
Desta forma, os padrões geográficos heterogêneos de intervalos de latitude,
profundidade e sazonais apresentados pelos diferentes impactos (e.g. emissões de Carbono e
CO2, consumo de combustíveis fósseis, remoção de biomassa, área varrida, perturbações nos
substratos, alterações na estrutura de populações e comunidades) identificados para a frota
industrial de arrasto, que realizou seus desembarques nos portos de Santa Catarina, no período
de 2003-2011, permitem uma análise de possíveis estratégias de gestão para esta modalidade
de pesca, dentro de uma abordagem ecossistêmica.
Considerando o impacto que a pesca industrial de arrasto provoca, na região
Sudeste/Sul do Brasil, sugere-se, como ação de gestão emergencial, a utilização da ferramenta
conhecida como “freezing the footprint”, ou seja, o “congelamento” dos níveis atuais de
esforço, capturas e áreas de pesca desta frota pesqueira.
Paralelamente, sugere-se a (a) necessidade de utilização efetiva de um sistema de
monitoramento das embarcações (Vessel Monitoring System – VMS) para identificar as áreas
efetivamente utilizadas pela pesca industrial de arrasto do Sudeste/Sul do Brasil; (b)
necessidade de realização de novos estudos para o conhecimento do total das capturas, ou
seja, biomassa desembarcada + descartes da frota industrial de arrasto do Sudeste/Sul do
Brasil; (c) necessidade de realização de novos estudos para compreensão da interação dos
petrechos de arrasto com o fundo oceânico e os impactos decorrentes da atividade; (d) criação
de áreas de exclusão de pesca (AEP), utilizando como critérios para sua definição, a
localização de áreas onde as espécies marinhas apresentem principalmente, uma baixa
resiliência, alta vulnerabilidade, alto nível trófico e a comunidade apresente uma baixa
diversidade e equitabilidade, além de características relacionadas a complexidade e estrutura
do habitat.
160
Anexo 1. Primeira página do manuscrito publicado no volume 88 (2014), páginas 334-343, da revista Marine
Pollution Bulletin.
161
Submission Confirmation
Fisheries Research ([email protected])
Para: [email protected]
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EVOLUTION OF THE INDUSTRIAL TRAWL FISHERY FOOTPRINT OFF
SOUTHEASTERN AND SOUTHERN BRAZIL" has been received by the Editorial Office
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The Editorial Office will contact you with a manuscript reference number and further details
of the review process in due course.
Thank you for submitting your work to our journal.
Kind regards,
Editorial Office Fisheries Research
Anexo 2. Cópia do email de confirmação da submissão do manuscrito, referente ao Capítulo 2 desta tese, na
revista Fisheries Research.