UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
SENTIDOS DE CORPO PARA MAIORES DE 60 ANOS:
Um estudo de representações sociais com praticantes de atividade física
Júlio Afonso Jacques Gambôa
Rio de Janeiro 2014
SENTIDOS DE CORPO PARA MAIORES DE 60 ANOS:
Um estudo de representações sociais com praticantes de atividade física
Júlio Afonso Jacques Gambôa
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro como requesito para a obtenção do Título de Doutor em Saúde Coletiva Orientadores: Professor Doutor Luiz Fernando Rangel Tura e Professora Doutora Ivani Bursztyn
Rio de Janeiro Abril de 2014
G192 Gambôa, Júlio Afonso Jacques.
Sentidos de corpo para maiores de 60 anos: um estudo de representações sociais com praticantes de atividade física / Júlio Afonso Jacques Gambôa. – Rio de Janeiro: UFRJ / Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, 2014.
153 f.: il.; 30 cm. Orientador: Luiz Fernando Rangel Tura. Co-orientador: Ivani Bursztyn.
Tese (Doutorado) - UFRJ / Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, 2014.
Referências: f. 138-146.
1. Saúde do idoso. 2. Representações sociais. 3. Atividade motora. 4. Corpo humano. 5. Qualidade de vida. I.Tura, Luiz Fernando Rangel. II. Bursztyn, Ivani. III. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva. IV. Título.
CDD 613.0438
Sentidos de corpo para maiores de 60 anos: um estudo de representações sociais com praticantes de atividade física
Júlio Afonso Jacques Gambôa
Orientadores: Professor Doutor Luiz Fernando Rangel Tura e
Professora Doutora Ivani Burszty Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC) da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Saúde Coletiva. Examinada por: ________________________________________________________________ Professor Doutor Luiz Fernando Rangel Tura – (UFRJ/PPGSC) ________________________________________________________________ Professora Doutora Célia Pereira Caldas – (UERJ/PPGC; PPGENF) ________________________________________________________________ Professor Doutor Ricardo Vieiralves de Castro – (UERJ/PPGPSI) ________________________________________________________________ Professora Doutora Márcia de Assunção Ferreira – (UFRJ/PPGENF) ________________________________________________________________ Professora Doutora Diana Maul de Carvalho – (ENSP; UFRJ /PPGSC) ________________________________________________________________ Professora Doutora Ivani Bursztyn – (UFRJ/PPGSC) ________________________________________________________________ Professora Doutora Angela Maria Silva Arruda – (USP; UFRJ/PPGPSI), suplente ________________________________________________________________ Professora Doutora Aura Helena Ramos – (UERJ/PPGEDU), suplente
Rio de Janeiro Abril de 2014
AGRADECIMENTOS
Aos Professores Doutores Luiz Fernando Rangel Tura e Ivani Bursztyn,
meus orientadores, pela gentileza, competência, respeito e dedicação com que
conduziram a realização desta tese. Em especial, um agradecimento ao Professor
Tura pelos constantes diálogos e profícuas reflexões que marcaram a etapa final
da análise das entrevistas, redação e organização do texto.
Aos Professores Doutores, integrantes da banca examinadora, por terem
gentilmente aceitado o convite para discutirem este trabalho. De modo particular,
às Professoras Célia Pereira Caldas, Diana Maul de Carvalho e Márcia de
Assunção Ferreira, que, tendo participado da qualificação, muito contribuíram
para a construção desta investigação.
À Professora Doutora Mirian Goldenberg, pela atenção e carinho, e por
suas observações sobre a busca de novas ideias a partir do material produzido
pelos sujeitos da pesquisa, sempre a provocar o aprofundamento das discussões.
Ao Professor Doutor Pierre Ratinaud, membro do Laboratório de Estudos e
Pesquisas Aplicadas em Ciências Sociais (LERASS) da Universidade de
Toulouse II, França, que prontamente respondeu a todos os meus e-mails a
respeito de dúvidas sobre o funcionamento do programa IRaMuTeQ.
Aos proprietários das academias Via Salus, Gávea Gym e Euclides Reis,
assim como aos seus profissionais, que gentilmente facilitaram a abordagem aos
frequentadores para que eu pudesse entrevistá-los. Aos Professores
responsáveis pelos projetos de ginástica em praça pública, Rafael e Marisa, que,
da mesma forma, motivaram seus alunos a participar desta investigação
científica.
À Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), instituição onde me
graduei, por ter consentido que pesquisasse os alunos do projeto Idosos em
Movimento: Mantendo a Autonomia (IMMA), sob a coordenação da Professora
Doutora Nádia Souza Lima da Silva, e da Universidade Aberta da Terceira Idade
(UnATI), sob a direção do Professor Doutor Renato Peixoto Veras.
Agradeço, ainda, aos participantes da pesquisa, que voluntariamente se
dispuseram a responder as questões propostas nos instrumentos de coleta de
dados e sem os quais este estudo seria inviável.
À Iná Meireles, Cláudia Ragon e Helber Medeiros, amigos do doutorado,
pelo convívio fraterno e alegre ao longo desse período de férteis questionamentos
e aprendizados.
À Maria Spanó, amiga querida, por seu exemplo, palavras de incentivo e
disponibilidade afável, e que contribuiu decisivamente para a formatação desta
tese.
Ao amigo de sempre, Marcelo Rychter, por sua permanente boa vontade
em compartilhar seus conhecimentos em informática e pelas orientações de como
organizar o banco de dados da pesquisa, facilitando sobremaneira o acesso
recorrente a ele.
À Claudia, mulher e amiga, à Lígia, principal incentivadora da minha
caminhada acadêmica, ao Mário, amigo presente e fundamental para a superação
dos momentos difíceis de doença, durante esse percurso, e aos amigos do
Colégio Militar, que comigo colaboraram e me incentivaram a percorrer todo o
processo que agora se conclui com a defesa desta tese: Jorge, Rogério, Paulo
Henrique, Marilza, Liliana e Franklin.
Enfim, a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a realização
deste trabalho, estendo o meu reconhecimento e a minha admiração.
RESUMO
GAMBÔA, Júlio Afonso Jacques. Sentidos de corpo para maiores de 60 anos: um estudo de representações sociais com praticantes de atividade física. 2014. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva) -- Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014.
Esta pesquisa teve por objetivo apreender as representações sociais de
corpo construídas por praticantes de atividade física com 60 anos ou mais, de acordo com a teoria proposta por Moscovici (2012). Inicialmente, aplicou-se um questionário semiestruturado em 152 sujeitos, contendo dois testes de evocação livre de palavras, cujos termos indutores foram corpo e atividade física. Contou-se com o auxílio do programa EVOC® 2000 para proceder-se à análise prototípica desses resultados. O elemento saúde foi o único a confirmar centralidade em todas as estruturas analisadas, mas outras cognições importantes apareceram nas evocações, associadas às capacidades cognitivas, funcionais, à aparência física e à sociabilidade. Posteriormente, foram realizadas 27 entrevistas, em que se procurou aprofundar a temática do corpo. O programa IRaMuTeQ® processou o corpus, gerando seis classes lexicais, que foram agrupadas em três eixos de sentido: o das atividades físicas, o da beleza corporal e o dos cuidados de saúde. Para que se chegasse a esses resultados, foi necessário um processo de interpretação triangulado, dando sequência à triangulação metodológica iniciada na produção dos dados, ao coletar informações através da observação, dos questionários e das entrevistas. Encontrou-se que esses eixos se interpenetram para impulsionar o corpo a uma vida longa, com qualidade, e que a atividade física funciona como um dispositivo que pode ser acionado para viabilizar a saúde, a sociabilidade e a beleza corporal, surpreendendo o interesse do grupo masculino pela beleza física. Conclui-se que os sujeitos da pesquisa também nutrem expectativas em relação às funções simbólicas do corpo, até mesmo com fins de sedução, e que esta perspectiva está relacionada ao tempo de vida ativa que ainda têm pela frente. Palavras–chave: representações sociais, corpo, atividade física, beleza, terceira idade.
ABSTRACT
GAMBÔA, Júlio Afonso Jacques. Sentidos de corpo para maiores de 60 anos: um estudo de representações sociais com praticantes de atividade física. 2014. Tese (Doutorado em Saúde Coletiva) -- Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014.
This research aimed to comprehend the social representations of the body
built by physical activity practitioners older than 60 years old, based on the theory proposed by Moscovici (2012). A questionnaire semi-structured in 152 subjects was applied, containing two tests of free word association, in which the term inducers were body and physical activity. The software EVOC® 2000 processed the prototypical analysis of these results. The element health was the only one to confirm centrality in all structures analyzed. Important cognitions appeared in evocations, associated with cognitive and functional skills, physical appearance and sociability. Twenty seven interviews were conducted, in which was sought to deepen the theme of the body. The IRaMuTeQ program processed the corpus, generating six lexical classes, which were grouped into three areas of meaning: the first one was the axis of physical activities, followed by the body beauty axis and the health care axis. In order to achieve these results, it was necessary to proceed a triangulated interpretation, followed by the methodological triangulation which started with data production once collecting information through observation, questionnaires and interviews. It was found that these axes intertwine themselves, in order to drive the body to a long life, with quality, making the physical activity to work as a device that can be activated to enable health, sociability and the beauty of the body. It was surprising the interest of the male group for physical beauty. The conclusion is that a significant part of the individuals also nourish expectations about body symbolic functions, even for purposes of seduction, and that is related to the active lifetime that remains for them. Keywords: social representations, body, physical activity, beauty, third age.
SUMÁRIO
ÍNDICE DE TABELAS _____________________________________________ i ÍNDICE DE QUADROS ____________________________________________ ii ÍNDICE DE FIGURAS _____________________________________________ iii INTRODUÇÃO __________________________________________________ 14 Capítulo 1: REFERENCIAL TEMÁTICO _____________________________ 17 Capítulo 2: PROCEDIMENTOS TEÓRICO- METODOLÓGICOS __________ 39
2.1 Referencial teórico _________________________________________ 39
2.2 Questões de pesquisa ______________________________________ 50
2.3 Objetivo geral _____________________________________________ 51
2.4 Objetivos específicos _______________________________________ 51
2.5 Levantamento de campo ____________________________________ 51
2.6 Recrutamento dos sujeitos ___________________________________ 52
2.7 Instrumentos______________________________________________ 53
2.8 Análise dos dados_________________________________________ 54
2.9 Critérios de inclusão _______________________________________ 55
2.10 Considerações éticas ____________________________________ 56
Capítulo 3: RESULTADOS E DISCUSSÃO ____________________________57
3.1 Abordagem estrutural _______________________________________ 57
3.1.1 Descrição dos sujeitos__________________________________ 57
3.1.2 A estrutura e organização das representações sociais de corpo__58
3.1.3 A estrutura e organização das representações sociais de atividade
física ___________________________________________ 82
3.2 Abordagem processual: representações sociais de corpo __________ 101
3.2.1 Descrição dos sujeitos _________________________________ 101
3.2.2 Resultados e análise da classificação hierárquica descendente_ 102
CONCLUSÃO _________________________________________________ 133 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ________________________________ 138 APÊNDICE I __________________________________________________ 147 APÊNDICE II __________________________________________________ 150 APÊNDICE III _________________________________________________ 151 APÊNDICE IV _________________________________________________ 152 APÊNDICE V __________________________________________________ 153 APÊNDICE VI _________________________________________________ 154
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1: Sujeitos segundo faixa etária e sexo ______________________ 58
ÍNDICE QUADROS
Quadro 1: Resultados do teste de evocação com o termo corpo _________58
Quadro 2: Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média de evocação com o termo corpo - Amostra total _____________59
Quadro 3: Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média de evocação com o termo corpo - Grupo feminino ____________69
Quadro 4: Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média de evocação com o termo corpo - Grupo masculino _________ 75
Quadro 5: Resumo da busca por indícios de centralidade de corpo ______81
Quadro 6: Resultados do teste de evocação com o termo atividade física_82
Quadro 7: Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média de evocação com o termo atividade física - Amostra total _____83
Quadro 8: Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média
de evocação com o termo atividade física - Grupo feminino ___90
Quadro 9: Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média
de evocação com o termo atividade física - Grupo masculino ___________94
Quadro 10: Resumo da busca por mais indícios de centralidade de atividade
física _______________________________________________100
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1: Análise de similitude das evocações de corpo - Amostra total ____ 63
Figura 2: Análise de similitude das evocações de corpo: Grupo feminino ___ 70
Figura 3: Análise de similitude das evocações de corpo - Grupo masculino _ 78
Figura 4: Análise de similitude das evocações de atividade física __________ 84
Figura 5: Análise de similitude das evocações de atividade física - Grupo
feminino _________________________________________________ 92
Figura 6: Análise de similitude das evocações de atividade física - Grupo
masculino _____________________________________________ 97
Figura 7: Esquema das interpenetrações dos três eixos das RS de corpo __ 130
Figura 8: Dendrograma indicativo das classes das RS de corpo e seus eixos _________________________________________________________________ 131
Figura 9: Dendrograma indicativo das classes das RS de corpo e suas palavras
características ____________________________________________________ 132
INTRODUÇÃO
O crescente envelhecimento da população tem sido objeto de atenção e de
debates em diversos campos da sociedade, muito em razão dos novos hábitos de
comportamento e das representações sociais (RS) mais recentes sobre essa fase
da vida, ligadas à atividade, aprendizagem, satisfação pessoal, além da
constituição de novos relacionamentos sociais e afetivos (BARROS e CASTRO,
2002; BLESSMANN, 2004; MAGNABOSCO-MARTINS, CAMARGO e BIASUS,
2009; RAMOS, 2009; SILVA, 2008; VELOZ, NASCIMENTO-SCHULZE e
CAMARGO, 1999).
A população brasileira, nos últimos anos, conquistou um significativo avanço
na sua expectativa de vida, já tendo ultrapassado os 70 anos, e com um visível
crescimento do número de pessoas com 60 anos ou mais, estimando-se que
atinja cerca de 65 milhões de idosos em 2050. Em virtude desse envelhecimento,
tem havido a necessidade de se aumentar os esforços para adiar o início de
doenças crônicas e de se promover a saúde desses indivíduos. Nesse sentido, as
principais iniciativas têm sido aquelas que visam favorecer a manutenção e a
ampliação, pelo maior tempo possível, das capacidades funcionais dos idosos,
objetivando proporcionar mais autonomia e independência para o seu
engajamento social e para a realização das suas atividades diárias (CALDAS e
VERAS, 2012).
Tem-se observado, da mesma forma, um permanente estímulo aos mais
velhos para que adotem um estilo de vida ativo, porém, referenciado nos mais
jovens. Os valores da juventude encontram-se difundidos transversalmente na
cultura contemporânea, integrando o imaginário social e, portanto, alcançando a
todos (ARRUDA, 2012). Desse modo, compreende-se que os idosos assimilem
essa influência, que poderá ser refletida não só no consumo de bens e serviços,
mas também no consumo simbólico, ao assumirem valores já não mais exclusivos
de uma determinada faixa etária. O principal incentivo subliminar a esse tipo de
consumo é mantido com a ilusória esperança de se prolongar a juventude
eternamente (DEBERT, 2010).
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Como consequência dessa nova postura perante a vida, percebe-se a
adoção de novos comportamentos e de novas sensibilidades, agora presente
nessa parcela da população, sendo visíveis há mais tempo nas classes médias
urbanas, que dispõem de mais recursos e estão culturalmente mais habituadas a
investir no combate aos sinais aparentes do envelhecimento.
Nesse contexto, verificam-se diversos dispositivos, amplamente difundidos
pela mídia, e capazes de agir sobre a plasticidade do corpo, disfarçando a
aparência envelhecida. Além da disponibilidade das dietas, das cirurgias e do uso
de cosméticos, encontra-se a oferta de várias possibilidades de programas de
atividade física (AF), bastante procurados pelos idosos e que também facilitam o
exercício da sociabilidade entre eles.
Na sociedade brasileira, pessoas mais velhas vivenciando essas
experiências revestem-se de um caráter de novidade, que tem merecido atenção
não apenas da mídia, como das pessoas em geral, ajudando a criar novas
representações sociais a respeito da velhice, dentre elas sobre o corpo que
envelhece.
Dessa forma, utilizando-se a teoria das representações sociais (TRS), como
proposta por Moscovici (2012), uma teoria interessada no conhecimento comum
produzido através das interações cotidianas, esta pesquisa analítica, de caráter
exploratório, objetivou apreender os sentidos de corpo construídos por homens e
mulheres que já atingiram a terceira idade, ou seja, pessoas maiores de 60 anos.
Conforme será abordado no Referencial Teórico, cabe salientar a estreita relação
entre o processo de atribuição de sentidos e a geração de RS, isto é, quando um
grupo social constrói sentidos sobre um objeto, está produzindo RS sobre ele.
Como os sujeitos da pesquisa são aparentemente saudáveis e praticam
exercícios regularmente, dentro do perfil dessa nova categoria de idosos, também
se procurou conhecer o seu pensamento social sobre o dispositivo da AF. Vale
assinalar que dispositivo, neste texto, está sendo empregado como um conjunto
de técnicas corporais sistematizadas, que podem ser planejadas como estratégias
com objetivos voltados para a saúde ou para a formatação dos corpos dos
sujeitos em estudo.
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Talvez seja relevante acrescentar, baseando-se em Cascais (2013), que o
termo dispositivo é um importante conceito instrumental desenvolvido por Michel
Foucault para pensar a técnica. Pode-se dizer que suas características principais
seriam a capacidade de ocupar espaço social (espacialidade), de estabelecer
uma rede social de atuação e articulação (reticularidade) e o seu potencial de
utilização segundo objetivos definidos (caráter estratégico). Dessa forma,
acredita-se que a AF possa enquadrar-se nesse conceito, tendo em vista ser um
corpo de conhecimento técnico e pedagógico, ocupar amplos espaços na
sociedade e articular-se em redes informais e institucionais, tanto públicas quanto
privadas.
O interesse para esta investigação, além do conhecimento produzido, é de
que os resultados encontrados possam contribuir no entendimento das
motivações subjetivas que levam esses indivíduos às práticas e aos cuidados
corporais a que se dedicam.
17
Capítulo 1
REFERENCIAL TEMÁTICO
Na academia, atualmente, percebe-se o esforço de diferentes áreas do
conhecimento na tentativa de melhor compreender o desenvolvimento do
processo de envelhecimento; seja através da medicina, da psicologia, da
sociologia, da antropologia, da geriatria ou da gerontologia, disciplina cuja
intenção é promover a integração das diversas abordagens sobre a velhice
(BARROS e CASTRO, 2002; COMERLATO, GUIMARÃES e ALVES, 2007;
SILVA, 2008).
Houve até mesmo a necessidade de criação de novos termos para
suavizar a descrição do envelhecimento na contemporaneidade, de forma a aliviar
a carga semântica da palavra velho, que praticamente deixou de ser usada como
substantivo. Note-se a expressão terceira idade, à qual estão associadas
características até então inéditas, se comparadas às antigas imagens usadas
para representar a velhice como uma época de inatividade, descanso e
degeneração física (BLESSMANN, 2004; DEBERT, 1999; GOLDFARB, 1998;
SILVA, 2008).
Surgiram, assim, novas formas de se dirigir à velhice, utilizando um
linguajar desvinculado das mazelas do envelhecimento. Dessa forma, autores
como Barros e Castro (2002) e Silva (2008) acreditam que o conceito de terceira
idade seja fruto da aproximação entre discursos midiáticos, políticos e de
especialistas, práticas sociais e interesses econômicos.
Sobre as condições que favoreceram o aparecimento do discurso e do
imaginário sobre a velhice, somente no século XIX iniciou-se gradualmente a
fragmentação do curso da vida em etapas definidas e formais, com a distinção de
funções, costumes e espaços determinados a cada categoria etária. O século XX
presenciou a consolidação dessas categorias e a consequente institucionalização
de marcadores sociais das fases da vida, como a entrada na escola, no mundo do
trabalho, a aposentadoria, o que propiciou a formação de identidades etárias
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caracterizadas por comportamentos, hábitos, ou mesmo expectativas para cada
uma dessas fases (DEBERT, 1999; SILVA, 2008).
Atualmente, entretanto, observa-se um movimento que aponta para a
diluição dos limites internos do curso da vida, a favor de um estilo único adequado
às idades, apesar de esse conceito ainda ser indispensável para a classificação
das pessoas na estrutura social. Para prosseguir nesse sentido, de acordo com
Debert (1999), seria preciso o estabelecimento de novas periodizações das
idades, antes da sua consolidação em um estilo unificante, para o qual
convergissem todas as demais.
Outros autores também observam essa tendência a uma redefinição das
fases da vida em direção a uma unificação das idades. A própria Debert (1999)
menciona o processo atual nas sociedades desenvolvidas do ocidente de
desconstrução da sequência cronológica da vida; Alves (2011) teoriza a respeito
do aparecimento de uma interpretação mais flexível do curso da vida e da forma
como os indivíduos têm manejado as fases e os papéis etários, menos
comprometidos com padrões universalmente estabelecidos; Motta (2013) discorre
sobre a “juvenilização” das idades, querendo salientar o fato de que as crianças
estão se tornando jovens mais cedo, mas na verdade por ficarem mais velhas
precocemente. Por outro lado, os adultos maduros e os idosos da terceira idade
se esforçam para permanecer pelo tempo que for possível com hábitos
associados à juventude, cujos valores servem de modelo à sociedade para serem
consumidos tanto pelos mais novos quanto pelos mais velhos, dando lugar a um
caminho que liga uma juventude precoce a uma juventude tardia, daí seguindo
diretamente para a senectude e deixando vago o espaço simbólico da fase adulta.
Barros (2011) chama a atenção para a maleabilidade com que as faixas
etárias têm sido classificadas, assim como para o progressivo enfraquecimento
das linhas que separam as idades ─ fenômeno pertinente às sociedades
complexas ─, assinalando que, como consequência desse processo, os
estereótipos negativos vinculados ao velho foram transferidos para uma etapa
posterior da vida, permitindo a inferência de que o estilo terceira idade de ser e
viver a velhice, hoje, é a própria representação da juventude no último período da
existência.
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Nesse ponto, talvez caiba perguntar qual a razão da excessiva valorização
do que é jovem na sociedade atual. De acordo com o pensamento de Sibilia
(2011), o motivo estaria relacionado ao antigo desejo humano de alcançar a
juventude eterna, revigorado pela atmosfera atual de permanente conquista de
poder e riqueza. O seu raciocínio indica que a juventude, hoje, seria muito
valorizada como uma fonte de poder e prestígio social. Por isso, o interesse
renovado na sua aquisição, num período cultural de grande incentivo ao acúmulo
individual de riquezas materiais e simbólicas, reacendendo, desse modo, o mito
da eterna juventude.
Sobre esse aspecto, vale a pena acrescentar que nem sempre foi assim.
Até o século XIX, início do século XX, os velhos eram valorizados e imitados em
sua aparência física pelos mais jovens, em busca de um ar imponente que lhes
desse mais respeitabilidade (COSTA, 2004a). Somente após a Segunda Guerra, a
juventude transformou-se em um valor, centralizando o espírito rebelde e
liderando as revoltas contra a hipocrisia dos padrões vigentes. Como um valor
social, une-se a determinadas formas de consumo e estilos de vida dinâmicos e
criativos e, justamente por seu caráter intangível, já desvinculado de uma faixa
etária específica, despertou o interesse de outras gerações em querer também
ostentar no próprio corpo o estilo jovem de se viver (DEBERT, 2010).
Atualmente, verifica-se a tendência ao equilíbrio, uma vez que essas
modificações comportamentais têm aberto aos idosos a possibilidade de novos
encontros e experiências significantes, com maior igualdade nas relações sociais.
Apesar disso, persiste a discriminação àqueles que estão fora do mercado
consumidor do rejuvenescimento (DEBERT, 2010).
Vendo pelo lado do mercado de consumo, ao se exaltar o que é jovem ele
acaba operando como um reflexo e também como um reforço da juventude como
valor, o que não deixa de ser comercialmente proveitoso, pois ajuda a alargar
essa fase tanto na direção das crianças quanto dos mais velhos (CASOTTI e
CAMPOS, 2011), aumentando o número de consumidores em potencial para um
mesmo tipo de produto. Essa observação pode ser constatada em Goldenberg
(2008), quando revela os resultados de pesquisa que realizou com famílias da
classe média, em que, frequentemente, as três gerações de mulheres da casa
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usavam praticamente o mesmo tipo de roupa, chegando a ter o hábito de
revezarem algumas peças do vestuário.
Dessa forma, parece ficar claro, conforme análise de Le Breton (2008), que
é financeiramente mais vantajoso para o mercado de consumo manter um padrão
a ser alcançado por todos, do que o esforço das instituições sociais para mudar
as mentalidades, a fim de prepará-las a lidar mais fraternalmente e solidariamente
com as diferenças entre as pessoas. Na verdade, é mais prático e lucrativo agir
dessa forma, mas não contribui para diminuir o estigma da velhice e pode vir a
favorecer o surgimento de mais um tipo de estigma, ao não considerar outras
possibilidades de envelhecimento fora dos padrões jovens hegemônicos.
Sobre a dificuldade, no mundo real, de como lidar com as diferenças, a
indústria da beleza revela sua intolerância, ao veicular uma noção radical de
normalidade, mas que na verdade procura fazer desaparecê-las em prol de um
padrão universal. Assim, ao contrário do que anuncia, ela não amplia a
capacidade de modelar o corpo, tema central nas discussões sobre essa
indústria. De fato, ao ensejar esperanças de embelezamento indefinidamente, ela
estimula uma busca incessante por uma beleza permanentemente jovem, apesar
da inexorabilidade da ação do tempo sobre o corpo (DEBERT, 2011). A autora
defende, ainda, uma estética própria da velhice, coerente com a normalidade do
avanço da idade e do passar do tempo, sem que, obrigatoriamente, os velhos
tenham projetado em si o corpo jovem construído pela atuação da indústria da
beleza.
Retornando à divisão das idades, diversos autores citam a obra de Ariès
sobre a emergência da categoria infância, associada à da família moderna, tida
como o marco inspirador de posteriores estudos sobre a construção social das
demais categorias etárias, como a velhice (BARROS e CASTRO, 2002;
BLESSMANN, 2004; DEBERT, 1999; SILVA, 2008).
Portanto, a velhice teve origem na sequência do desenvolvimento das
modernas sociedades ocidentais e a noção de curso da vida se transformou em
uma instituição social importante, ajudando a consolidar a transição de uma
sociedade que não valorizava a cronologia do tempo, para outra que se
organizava utilizando a sua periodização e a separação entre as suas etapas. Tal
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fato conferiu um papel proeminente à idade, a qual acabou se transformando em
parâmetro essencial para a distinção social, assim como passou a ser vista como
modelo de identidade para os indivíduos (DEBERT, 1999; SILVA, 2008).
Na passagem do século XIX para o século XX, período do surgimento do
conceito de velhice, dois fatores se destacam como cruciais para essa ocorrência:
os novos conhecimentos médicos sobre o envelhecimento e a institucionalização
das aposentadorias. Surgem a geriatria e a gerontologia, novas especialidades
que começavam a se dedicar ao corpo velho, assim como aos aspectos sociais
da velhice. A existência de um saber pré-geriátrico sobre o processo de se tornar
senil, já seria o resultado do olhar médico sobre o corpo, olhar capaz de
determinar quando um corpo está envelhecido (BARROS e CASTRO, 2002;
COMERLATO, GUIMARÃES e ALVES, 2007; SILVA, 2008).
A medicina moderna, progressivamente, passa a compreender a velhice
como um estado fisiológico específico, no qual o corpo se degenera, assumindo
inteira responsabilidade pelo diagnóstico para reconhecê-lo e identificá-lo como
um corpo em decomposição (BARROS e CASTRO, 2002; SILVA, 2008).
O médico e fisiologista americano Ignatz Nascher é bastante lembrado por
seu trabalho no início da década de 1910. Ele foi considerado o primeiro cientista
a organizar clinicamente os alicerces para a caracterização biológica da velhice e
a utilizar o termo geriatria como conceito que delimitasse o campo de estudo
particular sobre o corpo velho (BARROS e CASTRO, 2002; COMERLATO,
GUIMARÃES e ALVES, 2007; SILVA, 2008).
A geriatria veio a distinguir a velhice de outras fases da vida, porém a
identificando com a decadência física e, por conseguinte, com a doença. Essa
comparação médica influenciou a formação de outros significados no ambiente
social, expandiu-se por diferentes áreas do conhecimento e acabou por se refletir
na elaboração de políticas públicas e na criação de novas disciplinas como a
gerontologia. As ciências sociais, notadamente a sociologia, a antropologia e a
psicologia, contribuíram para constituí-la, durante o século XX, um campo de
saber onde os aspectos psicossociais da velhice passaram a ser considerados
seus objetos de estudo, sob uma perspectiva transdisciplinar que propiciasse
22
abarcar a complexidade dos fenômenos psicossociológicos (ARCURI, 2005;
COMERLATO, GUIMARÃES e ALVES, 2007; SILVA, 2008).
A institucionalização das aposentadorias, por sua vez, decorreu do
acelerado processo de industrialização e do envelhecimento da força de trabalho
associado à ideia de incapacidade produtiva e invalidez, o que veio a favorecer a
criação dos sistemas de pensão e de aposentadoria. Essa institucionalização teve
como uma de suas consequências o aparecimento dos especialistas na gestão do
envelhecimento, que ajudaram a consolidá-la como categoria etária e, tempos
depois, a definir o conceito de terceira idade (BARROS e CASTRO, 2002;
DEBERT, 1999; SILVA, 2008).
Apesar de a aposentadoria ter reforçado a relação entre velhice e
incapacidade, também contribuiu para dar a ela um caráter político, devido às
reivindicações e ao reconhecimento social de direitos legítimos. A partir da
segunda metade do século XX, com o aumento demográfico e da expectativa de
vida dos cidadãos, a universalização dos sistemas de aposentadoria e os efeitos
econômicos dela decorrentes transformaram essa categoria etária em uma
questão social visível, pondo em risco a continuidade da vida social, no que se
refere aos compromissos de solidariedade intergeracionais. Gradativamente, a
correspondência entre velhice e invalidez, vista como indigência, começa a se
desfazer, muito em função da convergência entre os discursos especializados,
que se unificam na concepção de terceira idade, indicando atividade e
participação, por volta da passagem da década de 1960 para a de 1970
(BARROS e CASTRO, 2002; BLESSMANN, 2004; DEBERT, 1996; SILVA, 2008).
Segundo Laslett (1991), a expressão terceira idade apareceu
primeiramente na França, na década de 1970, com a criação das Universidades
da Terceira Idade. Posteriormente, a partir de 1981, elas também foram
implantadas na Inglaterra, não podendo ser creditado, o seu surgimento, apenas
ao aumento da longevidade nesses países. Afirma, ainda, que as condições para
a criação dessa categoria são a existência de uma quantidade considerável de
aposentados saudáveis, que chegue a se constituir um segmento social
espalhado por todo o país, e com disponibilidade de tempo e de recursos
financeiros para adotar o estilo de vida que lhe é apropriado.
23
Assim, a terceira idade constituiu-se em um acontecimento pessoal
condicionado por circunstâncias coletivas, só podendo ser vivenciado na
companhia de outras pessoas que estejam desfrutando de situação semelhante e
que tenham aspirações, expectativas e projetos em relação ao tempo de vida que
terão pela frente, para poder usufruir dessa nova fase. No Brasil, esta é uma
possibilidade recente e, por isso, o envelhecimento representa uma novidade.
Como o presente trabalho se enquadra na perspectiva da teoria das
representações sociais, a ser examinada mais à frente, por ora vale destacar que
essa última afirmativa guarda relação com o conceito de representações sociais,
pois estabelece uma correspondência, desde a origem, entre um evento individual
e uma situação coletiva.
Em relação à velhice, essa categoria é considerada a expressão de uma
das mudanças mais importantes que ocorreram ao longo da história, modificando
a sua imagem anterior, ligada à decadência física, incapacidade, solidão, para o
desenvolvimento de novos hábitos, habilidades e sentimentos até então
esquecidos. O progresso científico, com o consequente aumento da longevidade
e da qualidade de vida, junto com a implantação dos sistemas de aposentadoria,
proporcionaram o acesso das pessoas a essa nova classe (SILVA, 2008).
Essa mudança provocou nos idosos novos comportamentos adaptativos,
atitudes compensatórias que estão de acordo com o modelo de envelhecimento
bem-sucedido, que procura minimizar as perdas da velhice e maximizar seus
ganhos, e é baseado na capacidade de seleção de objetivos alcançáveis, na
otimização de recursos disponíveis e na utilização de modos compensatórios para
alcançar tais objetivos. Estes mecanismos de seleção, otimização e compensação
(SOC) agem de forma integrada e apoiam-se no paradigma de desenvolvimento
ao longo de toda a vida, life-span, que considera o envelhecimento um processo
heterogêneo e multidimensional, orquestrado por influências genético-biológicas e
socioculturais (BALTES e SMITH, 1999).
Além das condições mencionadas para o aparecimento da terceira idade,
também podem ser acrescentados os interesses de mercado voltados para o
consumo dos aposentados, assim como a substituição do linguajar dispensado à
velhice. Na opinião de Lenoir (1979), a terceira idade já se transformou em uma
24
categoria autônoma que, ao invés de substituir ou se contrapor à velhice, localiza-
se antes desta e logo após a maturidade.
O fato é que o advento dessa identidade etária provocou demandas por
serviços especializados, cujos profissionais ajudaram a consolidar um estilo de
vida próprio, que valoriza as atividades sociais, físicas e culturais, o que acabou
incentivando a criação dos espaços de convivência para o lazer e a educação,
como as universidades da terceira idade (BARROS e CASTRO, 2002; SILVA,
2008).
Sobre os programas desenvolvidos nesses locais, Debert (1996) chama a
atenção para o sucesso alcançado, surpreendente até para os seus idealizadores,
mesmo sabendo que os frequentadores são, em média, relativamente jovens. O
resultado positivo fez com que os participantes desses programas deixassem de
encarar a velhice como um processo incessante de perdas e começassem a vê-la
como uma oportunidade para novos aprendizados e para a realização pessoal.
Segundo a autora, isso provocou uma mudança no discurso da gerontologia, que
passou a se dedicar prioritariamente à luta contra o envelhecimento, num
movimento de responsabilização individual por esse processo, chamado por ela
de “reprivatização da velhice”. Este fato fez com que essa área de estudo se
afastasse do seu objeto, em virtude de as pessoas mais velhas, que mais
necessitam de apoio por já apresentarem perdas de controle físico e psíquico,
dificilmente participarem desse tipo de programas.
Lenoir (1979) também assinala a convergência entre a identidade da
terceira idade e as características das classes médias, grupo capaz de investir,
desde cedo, no retardamento da velhice, através dos vários recursos oferecidos
pela biotecnologia do rejuvenescimento, de que tratam, por exemplo, autores
como Caradec (2011), Debert (2011) ou Sibilia (2011). Concomitantemente ao
surgimento dessa expressão, a palavra velho, termo depreciativo impregnado
pela imagem de decadência corporal e improdutividade, normalmente usada para
indicar os velhos pobres, começa a ser substituída por idoso, palavra sem
conotação pejorativa, mais respeitosa e adequada às camadas médias, cuja
tendência tem sido a de ingressar na aposentadoria mais cedo e já estando
25
habituadas a níveis de consumo bem mais elevados do que as gerações
anteriores (DEBERT, 1999; GOLDFARB, 1998; SILVA, 2008).
De acordo com Laslett (1991), a expressão terceira idade representa a
verdadeira novidade e implica um arranjo das fases da vida diferente de qualquer
outro que tenha sido anteriormente proposto, ficando como a época de
realizações e de satisfação pessoal e deixando a quarta idade como o último
período, o da perda de autonomia e da senilidade.
A esse respeito, Baltes e Smith (1999) enfatizam as diferenças entre a
terceira e a quarta idade, não sendo a última uma continuidade da primeira.
Enquanto as pessoas da terceira idade, em torno de 60 – 80 anos, ainda
apresentam plasticidade, capacidade adaptativa e de compensação de perdas, as
da quarta idade, a partir de 85 anos, aproximadamente, apresentam um risco
muito maior de manifestar disfunções, incapacidades e, por conseguinte,
diminuição da qualidade de vida.
A difusão da ideia de terceira idade atrelada ao envelhecimento ativo, bem
sucedido e com qualidade de vida ganhou força nos meios de comunicação.
Começou-se a falar na indústria do envelhecimento, nas estratégias de marketing
para aqueles que se aposentavam, na adoção de um estilo de vida consumista
para os novos velhos, próprio dos mais jovens, que, de certa maneira, ajudou a
construir um cenário favorável à expectativa do processo de envelhecimento
(BARROS e CASTRO, 2002; SILVA, 2008).
Interessante assinalar que em estudo que procura compreender o
comportamento das pessoas mais velhas como consumidoras de beleza, com o
objetivo de vislumbrar estratégias de marketing que aumentem a oferta de
produtos e serviços e o consumo dessa parcela da população, constatou-se que,
para esse mercado, mais importante do que identificar marcadores do ingresso na
velhice, como a aposentadoria, por exemplo, é conhecer o estilo de vida e o
comportamento de consumo dos idosos (CASOTTI e CAMPOS, 2011).
Simultaneamente ao aparecimento dessa recente categoria etária, também
surgiu ao seu redor todo um aparato de profissionais, práticas e discursos
especializados, a fim de sustentar as necessidades criadas pelo mercado para os
integrantes dessa nova categoria (BARROS e CASTRO, 2002; SILVA, 2008).
26
De fato, há uma convergência de interesses entre os integrantes da
terceira idade e a gama de novos conhecimentos veiculados como capazes de
mantê-los por mais tempo afastados da velhice. Desse modo, rompe-se com os
estigmas negativos associados à improdutividade, incapacidade, doença, solidão,
ao se assegurar que o indivíduo que desfrute de qualidade de vida, encontre-se
em um processo de envelhecimento bem sucedido (BARROS e CASTRO, 2002).
Por um lado, os velhos se sentem melhor, mais valorizados e participantes
do grupo social ao serem incluídos nessa categoria. Por outro, o mercado aprova
esse ingresso oferecendo mercadorias e serviços especializados, com o propósito
de atender às novas demandas criadas, referentes a um novo estilo de vida e de
consumo e à nova sensibilidade diante do envelhecimento. Articuladamente, os
meios de comunicação indicam aos consumidores as suas deficiências em termos
de saúde e beleza, a fim de sugerir os produtos apropriados a cada necessidade
(BLESSMANN, 2004).
A quase obrigatoriedade em seguir os modelos padrões parece mais uma
estratégia globalizante para a circulação dos produtos identificados com o
comportamento e a maneira com que as pessoas da terceira idade atuam no
mundo. Como essa visão hegemônica também é reforçada pelos discursos dos
profissionais de saúde, cuja opinião ainda é muito respeitada na sociedade, o
ciclo se fecha. Portanto, a cada dia o mercado é instado a lançar novos produtos
e soluções condizentes com as novas descobertas científicas, os novos
resultados de estudos que modificam, por exemplo, as taxas sanguíneas ideais,
os percentuais convenientes de gordura corporal, os meios para alcançar tais
objetivos e as modas adequadas para acompanhar essa evolução corporal em
direção à saúde perfeita.
Para Sudo e Luz (2007), de um modo geral, as necessidades de saúde dos
indivíduos têm sido definidas mais por padrões estéticos do que pelo
conhecimento médico-científico; desde os cuidados nutricionais até as cirurgias
plásticas, passando pelos medicamentos e pelas atividades físicas. Os meios de
comunicação, a partir de uma presumível imparcialidade do discurso científico,
encobrem as relações entre a moda, a indústria cultural, o mercado e o padrão de
beleza que incitam a ter, através dos permanentes apelos à aquisição da forma
27
física que, supostamente, levará ao corpo ideal. Desse modo, acabam
condenando as pessoas a apresentar um corpo bonito e saudável à sociedade.
Assim, evidencia-se que os gastos e sacrifícios exigidos em direção ao mito da
juventude eterna, de modo algum são naturais, conforme os argumentos
sustentados pelos veículos de comunicação. Acena-se, na verdade, com a
recompensa de um corpo que, antes de ser saudável, estará de acordo com os
rígidos padrões de beleza estabelecidos.
Não se pode deixar de observar que o sistema capitalista lucra com a
produção simbólica dos modos de existir dessa nova classe etária. A ação das
práticas e os discursos especializados sobre a população da terceira idade
reforçam a necessidade do consumo para a aquisição da saúde, beleza, bem-
estar, apresentando-se favoravelmente ao maior prolongamento possível da
juventude (BARROS e CASTRO, 2002).
Mais uma vez, nota-se a valorização social do padrão jovem e a tácita
desvalorização da última fase da vida. Por detrás dessas evidências, vê-se a
criação massiva de bens e serviços capazes de produzir em série um número
cada vez maior, não só de produtos, mas de consumidores ávidos por adquiri-los.
Ao mesmo tempo, como assinala Debert (1999, 2011), observa-se um
contrassenso: se por um lado se constata o aumento significativo de idosos e da
expectativa de vida da população, por outro aumenta a rejeição à estética do
corpo envelhecido.
Sibilia (2011) argumenta que a geração que está no comando das
instituições atualmente é a geração do pós-guerra (os baby boomers), a mesma
que liderou a revolução dos costumes nos anos 1960 e 1970, lutou por liberdade,
direitos, igualdade entre os sexos, justiça social. Hoje, como consequência
desses movimentos, pode-se ver a expansão da diversidade de experiências
individuais e coletivas, ou a crescente participação das mulheres nas instâncias
de poder. Entretanto, ao contrário do que se poderia esperar, esses avanços
democráticos não impediram o aparecimento da presente imposição de uma
determinada estética da aparência e da boa forma, nem tampouco da intolerância
aos sinais corporais que acompanham a passagem dos anos e que são
frequentemente interpretados como símbolo de fraqueza moral. Apesar de
28
compreender que os corpos e as subjetividades são conformados pelo contexto
de uma época, quem mais sofre o preconceito contra o corpo velho são as
mulheres e, paradoxalmente, muitas delas participantes ativas naquelas
manifestações vanguardistas. O final dos anos 1960 e início dos 1970 marcou a
fixação da juventude como um valor simbólico, indo além do seu papel de
categoria etária.
No entanto, cumpre perguntar se a importância alcançada pela juventude
como um valor, em grande parte uma contribuição dos movimentos estudantis
desse período, não estaria, contraditoriamente, ajudando a reforçar a
padronização estética e comportamental jovem ou, de outro modo, será que a
moral vigente, refletida na profunda atração exercida pelos modelos corporais
exemplares, não é uma consequência imprevista e adversa das lutas e bandeiras
libertárias de jovens contestadores, àquele tempo, mas hoje sexagenários em
postos de decisão?
Também é possível conjecturar que o discurso que fundamenta o estilo de
vida associado à terceira idade poderia ser um preparativo para a manutenção
dessas pessoas nos processos produtivos. Isso diminuiria as chances de futuros
problemas previdenciários em função do maior tempo que permaneceriam no
mercado de trabalho, contribuindo também por mais tempo para a aposentadoria
das gerações que a precedem. Além do que, pelo maior número de trabalhadores
disponíveis no mercado, a tendência é diminuir ou estabilizar os níveis salariais
pagos pelos empregadores.
Na verdade, os velhos são as principais vítimas da exclusão e segregação
provocadas pelo padrão estético jovem, hegemônico a todas as idades, o que
pode provocar estigmas comparáveis aos que eram gerados em relação aos
velhos anteriores a essa categorização, identificados com a pobreza e o
abandono (BARROS e CASTRO, 2002).
Hoje também se reconhecem imagens de incentivo ao consumo dos
padrões estéticos da juventude, nas mensagens midiáticas dirigidas aos idosos,
inclusive através da internet. Dentre os vários temas veiculados, encontra-se o da
beleza física, sinalizando com a possibilidade de adiar a chegada do
envelhecimento, ao mesmo tempo em que se busca modelar o corpo através de
29
dispositivos como as ginásticas ou de outros procedimentos especializados
(ARRUDA, 2012).
É provável que esse tipo de apelo venha surtindo efeito nos idosos, ao
menos nos mais novos, senão a publicidade não continuaria propagandeando
seus produtos e serviços. Mas, pergunta-se: que tipo de subjetividade poderia ser
despertado nessas pessoas?
Em pesquisa no campo da TRS com jovens (18 a 25 anos) e adultos (40 a
60 anos), encontraram-se aspectos contranormativos nas funções sociais ligadas
às RS do corpo. Isto significa que foram identificadas opiniões conscientemente
admitidas que, embora compartilhadas tacitamente, não foram manifestadas por
não terem aprovação social, como seria o caso de se admitir publicamente que o
investimento na construção corporal teria como um dos seus objetivos principais a
obtenção de poder de influência sobre o outro (CAMARGO, JUSTO e ALVES,
2011).
Pode-se até supor que a felicidade pretendida ao alcançar o corpo tido
como ideal passe antes pelo desejo da conquista de poder, significando
ascendência sobre o outro e capacidade de sedução, além do reconhecimento da
sociedade (GAMBÔA, 2009).
Sobre a relação entre estética e saúde nas representações sociais do
corpo, Camargo et al. (2011) ressaltam com inquietação que, apesar da pouca
idade dos sujeitos que pesquisaram (média de 23 anos), houve um número
representativo de jovens sem qualquer preocupação com a possibilidade da
existência de riscos à saúde ─ relativos às cirurgias estéticas ─ quando o tema foi
a busca pelo corpo considerado perfeito, objetivo compartilhado por todos.
Quando do primeiro contato com outras pessoas, a aparência também foi
considerada mais importante do que a saúde, assim como as características
subjetivas do outro. Interessante notar esses resultados, uma vez que,
paradoxalmente, a saúde foi a palavra de maior frequência e a mais prontamente
lembrada pelos participantes, o que não os impediu de valorizar a beleza em
detrimento da saúde, fato que evidencia o culto excessivo a um padrão corporal
normatizado socialmente.
30
Resultados semelhantes também foram encontrados por Gambôa (2009),
em pesquisa com adolescentes (média de 17,5 anos) sobre as representações
sociais de corpo, em que o ter saúde foi considerado essencial para a aquisição
de outros atributos muito valorizados como a beleza corporal a ser admirada ou
exposta à admiração, qualidade assinalada como facilitadora à sociabilidade e
aos encontros sensuais.
Goldenberg e Ramos (2007) afirmam que, pela intensa exposição e
veiculação de imagens de corpos seminus, pode-se acreditar que, por esse
motivo, as pessoas estejam se sentindo mais à vontade, com mais liberdade em
relação ao próprio corpo. Entretanto, ao contrário do que parece, esses corpos
têm sido, cada vez mais, conformados e submetidos ao processo de
internalização de normas sociais de sustentação do padrão de beleza
contemporâneo. Os esforços empreendidos para construir esse corpo seriam,
com base na figura que utilizam, um ritual disciplinado para vestir com músculos e
pouca gordura aparente, um corpo que, mesmo despido, já não está mais nu.
Em estudo comparativo intergeracional sobre as funções sociais das
representações do corpo, já mencionado, constatou-se que os jovens são mais
atentos aos padrões corporais e, por isso, mais submetidos a eles, valorizando a
sua importância na interação social, muito mais do que os adultos. No entanto,
essa diferença de postura não se expressa na atenção dada ao corpo pelos dois
grupos, uma vez que ambos se dedicam da mesma forma aos cuidados e práticas
corporais (CAMARGO, JUSTO e ALVES, 2011).
Neste sentido, vale refletir sobre o uso que é feito pela indústria da beleza
─ ocupada em retardar o aparecimento dos efeitos corporais da velhice ─ dos
significados da frustração por não se conseguir evitar as consequências deletérias
do envelhecimento, ajudando a manter acesa a esperança por um novo produto
ou tratamento rejuvenescedor (SIBILIA, 2011). Esse seria um exemplo do que
Caradec (2011) considera como a dimensão prática das estratégias
empreendidas pelas pessoas, com o intuito de agir sobre o corpo que envelhece.
Essa dimensão faz referência aos inúmeros dispositivos disponíveis, utilizados
com o objetivo de postergar ou evitar os efeitos do envelhecimento, numa
sociedade que valoriza excessivamente os padrões da juventude. Dentre eles, as
31
práticas físico-esportivas são as estratégias mais empregadas, como as cirurgias,
os tratamentos cosméticos, nutricionais, hormonais, entre outros.
Esse intento pode ser temporariamente conquistado, mas as pessoas
inexoravelmente envelhecem, os seus corpos inevitavelmente vão se modificar
em direção ao declínio físico, além de a moda variar constantemente. A todo o
momento surgem novidades ou retornos que procuram ressignificar os modos de
se vestir ou de se comportar. No caso da atual moda corporal, largamente
difundida pelos meios de comunicação, existe todo um aparato técnico, médico,
científico, constituindo-se no que poderia ser denominado de um complexo
médico-industrial da beleza. Este complexo dá sustentação à moda corporal e
ainda oferece as mais diversas opções para que todos possam ter acesso a ela,
de acordo com os recursos de que disponham. Desde as orientações midiáticas,
de alcance praticamente global, às cirurgias e ao consumo de fármacos,
passando pela dieta alimentar e pelos exercícios de modelagem física.
Não se pretende negar os benefícios à saúde trazidos pela ciência ou o
direito à modificação do corpo em direção à moda corporal almejada. Entretanto,
seria ético impor tacitamente modelos estéticos corporais? E qual seria o princípio
desse fundamentalismo estético? Essa imposição tem como um dos seus
objetivos aumentar o número de consumidores e como uma de suas
consequências a segregação das pessoas mais velhas, principalmente porque
não podem mais atingir essa meta, devido a já não estarem mais jovens, espírito
esse associado à postura social e às atitudes concernentes ao padrão ideal do
ser corporal jovem, asséptico, ascético e belo. Porém, ao se renderem aos apelos
sociais dirigidos à aquisição dos atributos da juventude, caem em um novo
estigma, por não procurarem, na idade em que estão, as suas próprias condições
de desenvolvimento e de identidade, preferindo as referências da juventude.
Inspirando-se em Le Breton (2008) e Palmeira (2005), outros problemas
poderiam ser considerados como, por exemplo, a questão ética de não se aceitar
o corpo que se tem e partir em busca da sua transformação, ou a delimitação das
fronteiras entre as intervenções com finalidades estéticas ou terapêuticas. Além
disso, a excessiva preocupação com a estética pessoal poderia exacerbar o
individualismo, colocando em risco a solidariedade intergeracional, isto é, o
32
comprometimento das gerações mais novas com as mais velhas, conforme os
sujeitos desta pesquisa. Daí decorrerem questões sobre o limite entre saúde e
beleza. Por fim, pode-se pensar na perspectiva de se conciliar os avanços
científicos, para melhorar a qualidade de vida dos idosos, e a moral da
corporeidade, não signatária de um texto corporal distante do eu, mas a favor da
integralidade do ser.
Sobre essa temática, a pesquisa de Camargo, Justo e Alves (2011) revela
que um número considerável de jovens já se submeteu ou está disposto a se
submeter a cirurgias plásticas, no intuito de alcançar a todo custo o modelo
almejado de beleza.
Da mesma forma, tem sido relatado que por motivos de elevação da
autoestima ou por uma exigência social e profissional para manter uma aparência
jovem e dinâmica, as mulheres que passaram por cirurgia estética o fizeram com
a determinação de modificar o corpo em prol da conquista de um padrão de
beleza, capaz de lhes proporcionar felicidade, deixando em segundo plano o
sofrimento da dor física para atingir esse objetivo (CASOTTI e CAMPOS, 2011;
DEBERT, 2011). Inclusive, na opinião de Debert (2011), essas mulheres acabam
tomando essa atitude por causa do medo que sentem de envelhecer e não pela
esperança de permanecer jovens, ambição sabidamente inatingível.
Retornando ao aparecimento da categoria terceira idade, tanto a
universalização das aposentadorias e o respectivo aparecimento de uma
quantidade expressiva de aposentados de classe média, quanto o discurso
engajado da gerontologia social, assim como os interesses da cultura do
consumo, aparentam ter participado da construção desse conceito (BARROS e
CASTRO, 2002; SILVA, 2008).
Portanto, as origens do aparecimento das concepções de velhice e de
terceira idade levam a algumas questões a respeito dos vínculos entre a
significação dessas duas identidades etárias. Sendo assim, Silva (2008) indaga
se a terceira idade não seria a substituta contemporânea da velhice ou se ambas
continuariam a existir no pensamento social; se a terceira idade é, de fato, uma
nova categoria ou apenas uma atualização do antigo conceito de velhice ou,
ainda, se são dois caminhos para o envelhecimento, independentes e
33
coexistentes, como duas identidades relativas a etapas distintas da vida, uma
associada à atividade e a outra à decadência corporal. Não há dúvida quanto às
diferenças do percurso histórico e às especificidades de cada uma dessas
noções, construídas em diferentes épocas, submetidas a interesses e influências
políticas do momento. No entanto, também ainda não é possível responder a
esses questionamentos, inclusive se as duas categorias, no dia-a-dia, são
empregadas pelos indivíduos para exprimir diferentes modos de vida, ou se se
confundem e se mesclam indistintamente (SILVA, 2008).
É importante destacar que se os atributos da terceira idade, associados à
juventude e excessivamente valorizados, tiverem como efeito afastar as pessoas
da opção de envelhecerem quietas, inativas, reclusas, elas estarão sendo
privadas de usufruir da diversidade das práticas de vida e das possibilidades de
obter satisfação pessoal com a escolha que quiserem fazer. Assim, é provável a
permanência simultânea dessas duas identidades etárias no imaginário social, o
que poderá aumentar as opções de formas de existência adequadas e
convenientes aos sujeitos, como também contribuir para novas experiências de
vida relativas às sensibilidades contemporâneas dos mais velhos (SILVA, 2008) e
à sua capacidade de desenvolvimento e crescimento dentro das limitações
biológicas de cada ser humano (ARCURI, 2005).
Almeida e Cunha (2003) assinalam que o idoso continua a ser
representado socialmente como uma figura improdutiva, fatigada, enferma,
persistindo a tendência a desvalorizá-lo em relação à idade adulta. No estudo que
fizeram, afirmam que mesmo no grupo formado pelos sujeitos mais velhos, a
representação sobre os idosos tende a excluir a noção de desenvolvimento
durante a velhice, aproximando-se das teorias que por muito tempo só admitiram
a existência dessa ideia na infância e na adolescência, desconsiderando as
habilidades próprias de cada fase da vida e tomando como referência aqueles
comportamentos associados às competências do adulto. Esse grupo, por ser
formado por pessoas mais velhas, ainda em atividade, possivelmente, por esse
motivo, tenha evitado assumir a identidade culturalmente construída do velho
dependente e decadente. Tanto é que apesar das referências ao abandono do
idoso em prol do atendimento às necessidades das crianças da família, a
34
representação da velhice foi associada às responsabilidades do trabalho e à vida
adulta.
Resultado parecido encontraram Santos, Tura e Arruda (2013) ao
pesquisarem as representações sociais de “pessoa velha” construídas por idosos,
os quais não se identificaram com essa expressão, associada a características
negativas como “rabugice” ou “solidão”. Pelo contrário, valorizam as atividades
que exercem, profissionalmente ou não, e manifestam a alegria que ainda sentem
de viver.
Isso confirma o que dizem outros autores sobre as inúmeras possibilidades
de construção da identidade individual do idoso, que foge dos estigmas da idade
nomeando o outro como velho e não ele próprio (GOLDFARB, 1998;
MERCADANTE, 2005), refletindo a existência de uma identidade hegemônica,
aparentemente natural (RAMOS, 2009), da qual ele tenta escapar.
Outros estudos (BARROS, 2011; CARADEC, 2011) também citam
estratégias baseadas em discursos compensatórios, em que o indivíduo se
compara a alguém em situação pior que a dele, normalmente os do seu círculo
mais próximo, com a intenção de não se deixar confundir com aqueles que julga
realmente idosos. Barros (2011) aborda alguns comentários com conotação
sexual, que poderiam parecer agressivos, mas que são admitidos como
brincadeira pelo grupo de velhos pesquisados por ela, homens e mulheres, que
se utilizam desse recurso para depreciar o outro, talvez como uma forma de
aliviar os sentimentos negativos associados à velhice. Caradec (2011) conclui que
os discursos sobre o próprio envelhecimento são muito mais positivos do que se
imagina, se comparados aos estigmas sociais vigentes e à excessiva valorização
do ser jovem.
Desse modo, seria o caso de se acatar a proposição de Mercadante (2005)
para a constituição de uma identidade que não mais esteja em contraste com a do
jovem, mas elaborada a partir de uma subjetividade que rejeite o estigma social
da velhice.
Neste ponto, cabe uma reflexão: ser um velho jovem é uma forma de tentar
escapar dos antigos estigmas da velhice, mas hoje, também pode ser visto como
um caminho socialmente determinado. As opções que se apresentam parecem
35
estar resumidas em, ou se assumir a velhice estigmatizada do passado, ou o
estilo de vida da juventude na terceira idade. Mercadante (2005) propõe a
construção de uma identidade da velhice não contrastiva à do jovem e em
nenhum momento insinua que isto signifique assumir, em substituição, a
identidade dele. Entretanto, essa proposta poderia ser mal interpretada, como um
incentivo velado à homogeneização dos corpos na direção do padrão jovem de
beleza. Debert (2011), conforme já aludido, ajuda a explicitar essa questão
quando propõe a criação de uma estética própria da velhice, que define como não
sendo a estética carregada dos estigmas de decadência física e incapacidade,
nem tampouco a estética jovem incentivada pela indústria da beleza e da boa
forma, que pode acabar gerando estereótipos negativos, porque mesmo que se
esforcem bastante, os velhos jamais recuperarão os anos passados.
Por essa razão, a necessidade de se oferecer um significado de vida a eles
para se posicionarem no mundo (BLESSMANN, 2004; MEDEIROS, 2005), sem
ter de recorrer a atividades sem sentido, como um disfarce por sua inutilidade
(GOLDFARB, 1998). Isso é decorrente de uma abordagem reducionista que os vê
como um problema social passível de soluções pontuais, mas que não abrangem
todos os efeitos incidentes sobre as esferas psicológicas, da saúde, políticas,
sociais e econômicas do indivíduo velho (CÔRTE, 2005; MERCADANTE, 2005).
Atualmente, já existe um processo de modificações de atitudes e práticas
na perspectiva de um envelhecimento saudável dirigido para a autonomia e
independência, mas isso ainda não é suficiente para que esse assunto tenha
deixado de suscitar preconceitos (VELOZ, NASCIMENTO-SCHULZE e
CAMARGO, 1999).
A valorização excessiva do desempenho físico e mental acaba por reforçar
crenças referentes às mudanças e perdas associadas à velhice ─ relativas aos
vínculos com a família, com o trabalho etc. ─, transmitidas como representações
nas conversas cotidianas entre os indivíduos e veiculadas entre os grupos. As
concepções mais próximas da vida anterior aos 60 anos terminam sendo
incorporadas e também contribuem para a construção das representações que os
idosos têm sobre si mesmos e sobre a velhice, porém, evidenciando a
complexidade de entendimentos que os próprios idosos têm sobre o assunto
36
(SANTOS, TURA e ARRUDA, 2013; VELOZ, NASCIMENTO-SCHULZE e
CAMARGO, 1999).
Em outras palavras, a referida valorização pode acentuar a sensação de
perdas nesse processo. Para não sentirem essas perdas, os idosos se apegam
às representações anteriores aos 60 anos para continuarem a viver. Por outro
lado, eles possuem uma representação da velhice que não querem assumir, mas
que talvez esteja chegando a hora de fazê-lo. A complexidade pode se dar no
sentimento contraditório de serem avisados pelo espelho ou por outro de que o
tempo já chegou, mesmo que não seja percebido internamente, ou que se
neguem a oportunidade de percebê-lo (BEAUVOIR, 1990).
A velhice como um fenômeno complexo também é ressaltada por
Mercadante (2005), ao salientar a interdependência dos aspectos biológicos,
psicológicos, socioculturais e históricos desse fenômeno heterogêneo, que
comporta inúmeras outras formas de viver além daquelas caracterizadas pelos
estigmas ideológicos produzidos pela sociedade.
Esses estigmas podem ser os relacionados tanto ao declínio físico da
velhice, quanto àqueles vinculados aos modos de se permanecer jovem pelo
tempo que for possível, correndo-se o risco, nesse caso, de a pessoa velha ser
considerada uma caricatura fora de contexto, tanto pelos pares quanto pelos
jovens, sofrendo, dessa forma, um duplo estigma.
Além das preocupações com a saúde, autonomia, inserção social da
população idosa e uma valorização enfática das características jovens da
categoria terceira idade, também se evidencia a importância generalizada da
temática do corpo. Esse assunto está cada vez mais presente nos veículos de
informação, nas conversas cotidianas e é refletido pela multiplicação de
profissionais dedicados aos cuidados corporais e de ambientes próprios para
essas práticas como as academias, clínicas estéticas ou terapêuticas (GAMBÔA,
2009).
A frequência com que matérias relacionadas à saúde, mais precisamente ao
corpo, às dietas, à forma física, são veiculadas na mídia, pode denotar tanto o
interesse de grande parte da população em usufruir desse tipo de informação,
quanto os interesses econômicos do complexo médico-industrial-financeiro. Um
37
conhecimento especializado que vem a incentivar o consumo para a saúde e a
boa forma, ao mesmo tempo em que responsabiliza incisivamente o sujeito por
seu desempenho corporal, não importando em que época da vida esteja
(ARRUDA, 2012; SUDO e LUZ, 2007).
A excessiva responsabilização individualizada parece ser um reflexo da atual
fixação na imagem do corpo esbelto, propagado pelo mercado da beleza, o qual
se utiliza do discurso científico da saúde para tornar obrigatório um determinado
padrão estético. Em pleno século XXI, a saúde virou a meta a ser conquistada,
um estilo de vida a ser alcançado, em que o ter saúde esteja projetado no corpo.
Essa procura incessante por um corpo ao mesmo tempo magro e forte,
apresentado como perfeito e saudável, transformou-se em uma exigência social a
ser cumprida por todos, independentemente de classe social, idade, sexo etc.
(SUDO e LUZ, 2007).
Os novos significados da saúde levantados por Arruda (2002) poderiam ser
estendidos em relação ao corpo, tendo em vista, hoje em dia, ser um assunto
constante nos meios de comunicação e representar um atrativo para o consumo,
o que mostra o seu forte enraizamento no modo de vida urbano contemporâneo
como um objeto de interesse social. Transformado em uma categoria abrangente,
o corpo ideal invade debates em diversos âmbitos sociais, não restritos aos meios
especializados, proporcionando a elaboração de um novo saber coletivo a seu
respeito.
A preocupação com a forma física e a saúde, traduzida pela expressão
‘cultura do corpo’, designa a importância assumida pelo corpo na moderna
construção das identidades, tornando as características físicas individuais
determinantes para a referida construção. Essa aplicação da valorização corporal
é percebida, hoje em dia, pela frequência com que índices biomédicos, dietas
direcionadas e exercícios físicos específicos são mencionados usualmente,
deixando transparecer os ideais corporais e de saúde a serem conquistados
(COSTA, 2004b).
O bem-estar físico passou a ser visto como um objetivo autônomo e o corpo
ideal, amplamente veiculado na mídia, tem exercido um enorme fascínio sobre as
pessoas, inclusive sobre aquelas com 60 anos ou mais. Com base na elaboração
38
original de Moscovici (2012), esse fascínio por um objeto enraizado socialmente,
parte da realidade social, é fruto da sua permanente difusão pelos meios de
comunicação, juntamente à noção coletiva de pertencer ao mesmo universo que
ele.
As novidades corporais são ditadas pela moda como mais um objeto de
consumo, aturdindo a todos nos diversos lugares destinados à aquisição da
saúde perfeita e da estética corporal idealizada, o que acaba produzindo reflexos
nas diferentes faixas etárias da população (COSTA, 2004b).
No entanto, a vinda do corpo físico para o primeiro plano da cena pública
desvendou outras possibilidades de realização pessoal, não exclusivas do ideário
da juventude imposto pelos patrocinadores dos meios de comunicação de massa,
que incentivam a contínua transformação física para que o indivíduo permaneça
moralmente e psicologicamente jovem (COSTA, 2004b).
Dessa forma, a cultura somática se encontra inevitavelmente presente no
mundo contemporâneo e faz parte da permanente construção das identidades
dos indivíduos, inclusive dos mais velhos. Cabe a cada um utilizar as novas
experiências corporais para a sua própria autonomia, ou para aprofundar a
angústia provocada pela frustração de não ser possível obter a perfeição física
desejada (COSTA, 2004b).
Como já foi aludido, esse padrão atual de comportamento corporal,
largamente difundido na mídia, tende a atribuir unicamente ao indivíduo o mérito
pela conquista do modelo de corpo ideal, adequado a um determinado estilo de
vida, ou a responsabilidade pelo fracasso de não o ter alcançado, não lhe sendo
oferecidas outras opções estéticas ou comportamentais a atingir.
39
Capítulo 2
PROCEDIMENTOS TEÓRICO- METODOLÓGICOS
2.1 Referencial Teórico
A pesquisa teve como fundamento a teoria das representações sociais, de
acordo com o proposto por Moscovici (2012), Jodelet (1989) e seus seguidores.
Essa teoria foi desenvolvida por Moscovici na década de 1960, numa
atualização do conceito de representações coletivas, elaborado por Durkheim
ainda no século XIX. Desde o princípio da sua elaboração, Moscovici teve o
cuidado de salientar a velocidade, a diversidade e a força dos fenômenos das
sociedades contemporâneas (MOSCOVICI, 2001), decidindo substituir a
expressão representações coletivas por representações sociais, para não
localizar a sua teoria somente no campo da sociologia e porque a nova noção
teria como explicar tanto as uniformidades quanto as diferenças e a criatividade
coletiva (CASTRO, 2002). Além disso, também por considerá-la mais apropriada
às sociedades modernas, bem mais complexas do que as que foram examinadas
por Durkheim (FARR, 2002). Essa mudança de nomenclatura está relacionada à
necessidade de acompanhar a evolução das sociedades atuais,
permanentemente sujeitas aos processos de interação comunicacional, tornando
possível o movimento simultâneo entre o individual e o social na formação das
representações (MOSCOVICI, 2001).
Sendo a construção coletiva de um saber, as representações têm a função
de criar convenções sobre os objetos, para que sejam compartilhados pela
comunidade. Funcionam como uma tradução da realidade, uma ferramenta para
acomodar a novidade no universo preexistente (ARRUDA, 2002; JODELET, 2001;
MOSCOVICI, 2003), num processo de transformação do não familiar em direção
ao familiar, através do trabalho das representações sociais, que cumprem assim a
sua principal função (FARR, 2002).
Para Jodelet (2001), os indivíduos geram as representações sociais como
forma de se adequar ao mundo em que vivem. Também chamadas de saber de
senso comum, são diferentes do saber científico, mas igualmente importantes de
40
serem estudadas, em razão do papel que exercem nas atividades rotineiras dos
indivíduos, como, por exemplo, quando produzem um conhecimento vulgar pela
incorporação da ciência, que poderá vir a orientar com eficácia as práticas sociais.
Vala (1993) utiliza a metáfora da orquestra de jazz para fazer analogia com a
teoria das representações sociais. Essa metáfora utiliza a imagem do improviso
musical jazzístico, protagonizado por um dos músicos, que ao mesmo tempo em
que exprime a sua criativa individualidade musical, não deixa de estar em
harmonia com os demais integrantes da orquestra e nem com o tema principal, a
que todos retornam antes de cada novo solo improvisado.
Na verdade, essa metáfora representa a atuação de um sujeito
independente, senhor da sua própria atividade cognitiva e necessariamente ligado
aos vínculos sociais que ajuda a criar, através das interações que estabelece.
Nesse sentido, Castro (2002) assinala que as representações sociais, de
fato, tanto podem estar na mente quanto nas relações dos indivíduos com o
mundo e, tendo dois sentidos, podem ser analisadas de forma independente, uma
vez que são pensamento individual e prática social ao mesmo tempo.
De acordo com Vala (1993), o conceito de representações sociais salienta a
importância da atividade cognitiva para a execução da ação, da mesma forma que
a relaciona à construção de sentido e do mundo real. Acrescenta que essa teoria
organiza crenças, atitudes, explicações e ações e que, no âmbito das
comunicações cotidianas, gera novas representações sociais a partir das
interações nos grupos e entre os vários grupos.
Para esse autor, o grupo social deve ser considerado o sujeito das
representações sociais e, desse modo, ficará mais claro o entendimento sobre
esse conceito vinculado à produção de sentidos e significados referentes às
relações grupais. Em outras palavras, torna-se mais fácil entender os sentidos e
significados gerados nas interações (intra)intergrupais, quando se considera que,
nessa produção, o sujeito é social e não um sujeito individual. Assim, Vala (1993)
estimula que se imagine uma orquestra de jazz executando uma música em
compasso ternário, porque, dessa forma, estará incluído na relação entre o sujeito
(individual ou coletivo) e o objeto, um outro (indivíduo ou grupo), em constante
intermediação triangular.
41
Indo na mesma direção, Jovchelovitch (2008) define a representação como
uma “forma triangular” constituída pela “arquitetura básica” das “inter-relações
sujeito-outro-objeto” (p. 41) e assegura que a representação pode ser vista como
uma ação comunicativa que faz a ligação entre essas três instâncias ─
sublinhando a importância do “entre” ─, construindo símbolos capazes de dar
sentido e significado a objetos e pessoas. No caso da presente pesquisa, intenta-
se investigar as maneiras como o corpo dos maiores de 60 anos ─ entendido
como um objeto de interesse social ─ é representado e revestido de símbolos nas
interações dessas pessoas, praticantes regulares de atividade física.
Moscovici (2003) propôs, num passo à frente a Durkheim, que a psicologia
social visse a concepção de representação social como um fenômeno, não mais
apenas como um recurso de análise. Jovchelovitch (2008) ajuda a esclarecer
essa proposição, quando afirma que as representações sociais são tanto uma
teoria quanto um fenômeno. Por um lado, são uma teoria que procura estudar a
formação e a transformação dos saberes sociais, a partir dos processos de
comunicação e interação. Por outro, são um fenômeno composto de
regularidades empíricas que envolvem valores e práticas humanas relativas a
objetos específicos, referentes a processos sociais comunicativos e expressivos.
Contudo, o interesse principal dessa teoria é a investigação do fenômeno
das representações sociais, no qual são encontrados os saberes cotidianos
produzidos na vida comum e que não são considerados distorções ou erros pela
teoria. Essa característica, inclusive, é destacada por Castro (2002) como uma
das precisões a clarificar o conceito de representações sociais e que enfatizaria a
irredutibilidade dessa concepção a qualquer outro tipo de conhecimento, assunto
a ser retomado mais adiante. Resumidamente, a título de informação, outra
precisão assinalada por essa autora seria que as representações são forjadas
coletivamente, expressadas por grupos, servindo para produzir comportamentos e
guiar a comunicação; por último, a precisão básica e indispensável, relativa à sua
função de transformar o estranho em familiar, através da apropriação social da
novidade.
Com respeito à criação de novas representações, Harré (2001) chama
atenção para o fato de que elas também surgem e se apresentam na fala, cujo
42
vocabulário desempenha o papel de suporte e as palavras o de vetores a
transmitir os valores, crenças e conhecimentos de senso comum de uma cultura.
Moscovici e Vignaux (2005) sugerem que a teoria das representações
sociais seja entendida não como uma nova ciência, mas como um novo
paradigma para a abordagem de fenômenos sociais construídos e veiculados
principalmente através do discurso. Assim, consideram que as representações
sirvam à elaboração de sistemas explicativos e do consenso para a ação
socialmente vinculada, permanentemente reconstruindo visões de mundo e
mentalidades que orientam comportamentos, a partir das interações individuais.
Além dessas interações, não se pode esquecer o papel da mídia na
divulgação de imagens criadoras de representações da nova velhice e do
envelhecimento, não só no que se referem aos modos atualizados de se
comportar, mas aos cuidados dedicados à boa forma e à aparência corporal a
partir da terceira idade.
O trabalho seminal de Moscovici foi fundamental para a compreensão do
importante papel da comunicação na construção e na transformação das
representações sociais, pois inaugurou a tradição teórica de incluir a realidade
social como constitutiva dos fenômenos psicológicos, sem desconsiderar os
processos mentais nela envolvidos (JOVCHELOVITCH, 2008), nem o caráter
simbólico existente nas relações sociais (MOSCOVICI, 2001).
Sendo todo conhecimento simultaneamente simbólico e social, as
representações expressam os consensos do senso comum, atuantes na produção
de saberes, que se mostra incapaz de impedir as complexas interferências da
vida social nesse processo (JOVCHELOVITCH, 2008). Esse fato guarda relação
com o papel do conceito de themata na criação dos saberes científicos, pois
mesmo a ciência é produzida com base em representações-fonte de longa
duração, que continuamente atravessam a história e prescindem de
comprovação. Esse conceito se refere às premissas inquestionáveis de uma
sociedade, de uma cultura, de uma época, de que partem os cientistas em suas
elaborações teóricas (MOSCOVICI e VIGNAUX, 2005).
Ao propor que a concepção de representações dê sentido teórico à conduta
dos seres humanos, numa perspectiva do grupo, e também seja uma teoria que
43
busque compreender a construção do conhecimento de senso comum, restituindo
a sua importância, Moscovici leva em consideração o individual e o coletivo
simultaneamente, sem se despreocupar com o contexto histórico e cultural
(HARRÉ, 2001; ARRUDA, 2002 e JOVCHELOVITCH, 2008). De tal modo que
chega a compará-la a uma “Antropologia da cultura moderna” (MOSCOVICI,
2001, p. 63), no sentido da investigação do que há de social no pensamento das
pessoas.
No esforço para restabelecer o prestígio da sabedoria do senso comum,
normalmente vinculada ao erro e à ignorância, a teoria das representações
sociais a apresentou como um tipo de conhecimento irredutível a qualquer outro
sistema de saber. Esse conhecimento, produzido no cotidiano pelas apropriações
e transformações operadas por sujeitos e coletividades, deve ser avaliado,
principalmente, pelo que de importante significa para aqueles que o produzem.
Portanto, nessa tentativa de recuperação de reconhecimento, a teoria das
representações sociais defende a sabedoria relativa de todos os sistemas de
conhecimento e a superação da rigidez dos limites entre o conhecimento racional
e o fundamentado na experiência dos sentidos (JOVCHELOVITCH, 2008).
Como teoria, ela investiga e tenta explicar a reciprocidade das relações entre
indivíduo e sociedade e como fenômeno são ressignificações dos saberes
compartilhados pelo grupo (COMERLATO, GUIMARÃES e ALVES, 2007).
Tomando-se como exemplo esta pesquisa, procurou-se o embasamento
teórico das representações sociais para investigar e tentar interpretar como os
indivíduos maiores de 60 anos, na qualidade de um grupo etário numeroso e
importante, representam o corpo socialmente.
Moscovici deu origem a essa abordagem, ao ter a sua atenção despertada
para a capacidade de os meios de comunicação divulgarem amplamente os
novos conhecimentos científicos, ao mesmo tempo em que os digerem,
transformando-os, alterando, assim, as maneiras coletivas de pensar. Esses
saberes adquiridos por todos visam a conformar o mundo real e modelam as
atitudes dos indivíduos. As informações quando apreendidas sofrem modificações
nas interações e, assim, representações são criadas para a comunicação e a
ação das pessoas (MOSCOVICI, 2001).
44
Em relação ao papel da função simbólica das representações, elas
constroem o mundo através dos símbolos, indo além da realidade empírica. De
fato, por meio desse processo as representações criam mundos simbólicos, antes
ausentes do mundo objetivo (JOVCHELOVITCH, 2008).
Conforme Abric (2001), a representação organiza opiniões, atitudes, crenças
e informações a respeito de uma situação, levando-se em conta a história do
sujeito, sua inserção na sociedade e suas relações mais amplas com o contexto
social. Nesse mesmo sentido, Jovchelovitch (2008) afirma que todo
conhecimento, mesmo se admitindo que tenha sido produzido por uma única
pessoa, trás em si o contexto social, cultural, histórico e psicológico formador
desse mesmo indivíduo.
A partir dessa constatação ficaria mais fácil compreender, em sentido inverso
e por extensão, como o desejo de uma categoria etária por assumir os valores e
buscar identificação na juventude, pode não ser espontâneo, sendo conformado
pelo próprio contexto sócio-histórico e cultural que, simultaneamente e
paradoxalmente, subsidia o indivíduo em seu impulso criador. Essa dinâmica é
paradoxal porque, ao mesmo tempo em que o contexto impulsiona o sujeito
(individual ou coletivo) a criar e a desejar, também conforma o seu desejo e o seu
ímpeto criativo. Seja a criação de uma pessoa ou de um grupo de idosos, seja a
produção de conhecimento científico ou o desenvolvimento de saberes práticos
capazes de proporcionar a adequação dos mais velhos aos valores dos mais
jovens.
Moscovici (2003) assegura que a finalidade das representações é
transformar o não familiar em familiar, localizando-o em um universo consensual
do pensamento coletivo, tributário da memória, da tradição e das convenções. Ele
define dois mecanismos que procedem a essa transformação em direção ao
familiar: a ancoragem, que classifica e nomeia o novo, traduzindo-o em termos de
um universo já conhecido; e a objetivação, que tende a concretizar as abstrações
que se apresentam, dirigindo-as para o mundo físico, a fim de poder controlá-las.
Ambos os mecanismos dizem respeito à memória coletiva, tanto no que se refere
à classificação e nomeação de um objeto, quanto à sua reprodução no mundo
externo.
45
Arruda (2002) contribui para a compreensão desses mecanismos, ao
explicar a ancoragem como a metáfora do movimento de jogar âncora nos
conhecimentos existentes, para apreender a novidade. Descreve o processo de
objetivação da representação como o que se consegue captar de mais evidente
do objeto e frisa que a objetivação não é o enraizamento da novidade, mas a
forma como ela se reorganiza. Esses dois processos constituem o cerne da
representação, a imagem sintética e organizada dos seus elementos.
Independentemente da mudança de nomenclatura, Moscovici (2001) confere
a Durkheim a autoria desse conceito, cuja utilização torna possível a elucidação
de inúmeros fatos sociais. Aquele autor assinala que, ao distinguir as
representações coletivas das representações individuais, Durkheim defende a
ideia de uma “inteligência única” da sociedade, em posição superior às
“inteligências particulares” que compõem o grupo (MOSCOVICI, 2001, p. 48).
Sustenta até mesmo que as representações coletivas são partilhadas por todos
os integrantes de uma comunidade, cujo papel é uniformizar o pensamento e a
ação, atravessando o tempo ao coagir incessantemente os membros da
sociedade.
Moscovici (2001) ressalta que a maioria das observações de Durkheim diz
respeito a sociedades mais simples, sem o grau de complexidade das sociedades
contemporâneas. No entanto, para o primeiro estudioso, as ideias de Piaget e
Freud esclarecem pontos obscuros sobre o pensamento de Durkheim, ao
diminuírem a importância do papel constantemente coercitivo das sociedades
sobre os indivíduos, preconizado por ele.
Ao identificar as fontes intelectuais da psicologia social das representações,
Jovchelovitch (2008) relaciona as obras de Durkheim, Lévy-Bruhl, Piaget,
Vygotsky e Freud.
Em Durkheim, Moscovici buscou desenvolver e aprofundar o seu conceito de
representações coletivas, referente à noção de uma consciência coletiva da
sociedade, a qual vincula o social à maneira individual de pensar e agir.
Entretanto, na tentativa de superar esse conceito, Moscovici recusou a ideia da
evolução linear do pensamento comum para formas superiores, conforme
acreditava Durkheim, causada pelo progressivo abandono dos vínculos afetivos e
46
sociais dos sistemas de classificação do pensamento primitivo
(JOVCHELOVITCH, 2008). Isso significa que quanto mais evoluídas fossem as
formas de pensar, menor seria a interferência dos laços socioafetivos nos
processos mentais classificatórios, pressupondo a existência de uma neutralidade
objetiva a ser alcançada.
Segundo Jovchelovitch (2008), a obra de Lévy-Bruhl inspirou Moscovici
justamente na compreensão da irredutibilidade das representações sociais a
outras formas de pensamento e o ajudou a entender o processo de como o
conhecimento científico é ressignificado pelas pessoas comuns, desde o
momento em que começa a circular pelos espaços sociais. Essa ressignificação
não representa, portanto, uma distorção. São representações sociais com
racionalidades, lógicas e funções próprias e específicas, não obedientes a um
modelo pré-estabelecido.
Moscovici (2001) informa não ser possível conceber a explicação de fatos
sociais a partir da individualidade da mente e que cada grupo possui a sua
mentalidade peculiar. Recupera as dimensões afetiva e cognitiva na elaboração
das representações e identifica a lógica da atividade mental em grupo.
Tal lógica, mesmo sem ser pronunciada, pode levar a comportamentos e
práticas coletivas com vistas a um objetivo aparentemente apenas pessoal, porém
almejado inconscientemente ou tacitamente pela maioria do grupo. Esse
pensamento se refere ao desejo íntimo de se construir um corpo ideal, digno de
distinção e reconhecimento, mas que na verdade se trata de uma aspiração
coletiva por um modelo hegemônico. Cabe salientar que, embora seja
amplamente visível o esforço e a dificuldade para essa conquista individualmente
coletiva, o corpo ideal está presente simbolicamente e de forma constante na
sociedade, seja através da mídia, seja através das interações pessoais.
Foi através de Piaget que Moscovici teve acesso à obra de Durkheim e Lévy-
Bruhl. Conheceu a sua conceituação de representação, os seus estudos sobre as
concepções de mundo das crianças, que enfatizam a sua capacidade cooperativa
ao invés dos aspectos coercitivos, ao contrário de Durkheim (JOVCHELOVITCH,
2008).
47
Na verdade, a teoria das representações sociais se propõe a investigar todas
as representações, independentemente das suas características, desde que
sejam geradas durante os processos comunicativos e interativos, o que as tornam
sociais, e resultantes da ideação coletiva a partir de novos conhecimentos
produzidos e transmitidos através da sociedade (MOSCOVICI, 2001). Moscovici
também encontrou semelhança nos processos de assimilação e acomodação,
definidos por Piaget, e mais tarde traduzidos por ele como os processos de
ancoragem e objetivação (JOVCHELOVITCH, 2008).
Apesar de a obra de Vygotsky não ter participado da elaboração inicial da
teoria, o seu pensamento tem sido bastante influente e se aproxima ao de Lévy-
Bruhl no que diz respeito à coexistência de diferentes racionalidades na
sociedade, princípio fundamental na elaboração do conceito de polifasia cognitiva,
desenvolvido posteriormente por Moscovici (JOVCHELOVITCH, 2008).
Farr (2002) comenta que Freud, ao desenvolver a psicanálise, acabou
elaborando uma teoria social da mente humana, cuja difusão, na França, inspirou
Moscovici a escrever a sua obra fundadora (La psychanalyse: son image et son
public, 1961), somente em 2012 traduzida para o português.
Para Jovchelovitch (2008), a importância do médico austríaco se deu pela
compreensão dos processos inconscientes na constituição dos saberes sociais.
Em complementação a essa ideia, Moscovici (2003) argumenta que, para a
psicologia social que propõe, as representações são processos sociais
lentamente internalizados, até assumirem a forma de processos psíquicos.
Como se vê, o movimento circular ─ do individual para o social e deste para
o indivíduo ─ encontra-se presente na mente humana e na vida social.
A influência desses pensadores ajuda a explicar a ligação entre a teoria das
representações sociais e as ciências humanas (JOVCHELOVITCH, 2008), e a
obra inaugural de Moscovici procura entender o processo que leva de um lado ao
outro o conhecimento científico e o saber de senso comum (JODELET, 2001), ao
mesmo tempo buscando sintetizar as relações entre os indivíduos e a sociedade
(JOVCHELOVITCH, 2008).
48
As representações sociais ocupam, assim, o lugar das representações
coletivas, de traços mais fixos, voltadas às sociedades menos complexas.
Moscovici (2001) destaca o papel assumido pela comunicação, que centraliza os
sentimentos individuais e coletivos, fazendo com que seja possível o movimento
simultâneo entre o individual e o social na formação das representações, que
tendem a ultrapassar o universo das tradições em direção ao das inovações.
Essa ideia é complementada por Jodelet (2001), para quem a abrangência
das representações é atribuída à partilha social, que não se restringe aos limites
de um grupo, embora sirva à afirmação de uma unidade de pertencimento. Vale
acrescentar que, justamente por ultrapassarem os limites do grupo, as
representações terminam facilitando as inovações, em detrimento da preservação
das tradições.
Sá (1998) considera conveniente esclarecer que o termo ‘representação
social’ não se limita aos estudos da escola moscoviciana, sendo utilizado
livremente por autores de outras áreas de conhecimento.
Na mesma linha, Flament (2001) diz que tanto a palavra representação,
quanto a expressão representação social têm sido usadas de forma bastante
imprecisa pelas ciências humanas, principalmente quanto ao descuido em
especificar esse último conceito como compartilhado pelos componentes de um
mesmo grupo.
Sá (1998) recomenda a escolha de um referencial teórico já constituído
para balizar a construção de um objeto de pesquisa, como a TRS de Moscovici,
observando a existência de outros teóricos importantes nesse campo de
pesquisa. Aqui ele menciona as três primeiras abordagens dessa teoria: Jodelet
(1989), Doise (1985) e Abric (1994). Entretanto, deve-se ressaltar que atualmente
existem outras expressões acadêmicas que também têm aprofundado ou
desenvolvido novas reflexões teóricas.
Segundo assinala Sá (1998), Jodelet tem tornado a teoria mais objetiva, ao
mesmo tempo em que mantém a preocupação original com uma descrição
abrangente das representações sociais, tarefa considerada primordial por
Moscovici (2003) para tentar compreendê-las em toda a sua complexidade, uma
49
vez que, por exemplo, quanto menor a consciência que se tem delas, maior é o
seu poder.
Doise articula a teoria a uma abordagem sociológica (SÁ, 1998) e acredita
que a definição de representações vá além de um consenso de opiniões, sendo
uma tomada de posição a partir de diferentes perspectivas (DOISE, CLEMENCE
e LORENZI-CIOLDI, 1992; DOISE, 2001).
Abric é o responsável pela elaboração inicial da abordagem estrutural,
interessada na estrutura cognitiva e nas conexões entre representações sociais e
comportamento (SÁ, 1998).
Wagner e Hayes (2011) ressaltam a estabilidade dos esquemas prototípicos
mentais, organizados pelo acúmulo de experiências vividas e que constituem o
acervo para o enfrentamento de situações diárias semelhantes às já conhecidas.
Marková (2003; 2006) tem apontado para a importância dos conceitos de
thema (singular) e de themata (plural) na teoria das representações sociais.
Entretanto, não há consenso quanto à capacidade metodológica atualmente
disponível para investigá-los, em que pese serem reconhecidos como constructos
ideológicos a que estão subordinadas as representações, concebidas em uma
estrutura hierárquica das formações simbólicas do pensamento social
(CAMARGO e WACHELKE, 2010).
Moscovici e Vignaux (2005) definem themata como as ideias axiomáticas de
uma época, muitas vezes expressando ideias opostas como bom/mau,
saúde/doença, vida/morte (MARKOVA, 2003, 2006). Seriam as ideias primárias
de longa duração, onde estariam as origens dos temas aceitos por todos sem a
necessidade de comprovação e em torno das quais seriam organizadas as
representações sociais.
No entanto, mesmo não havendo consenso metodológico, Marková (2003)
afirma que a análise dos themata é especialmente adequada à técnica dos grupos
focais, método de pesquisa baseado na comunicação em grupo e que não visa
reduzir a complexidade da linguagem.
Por outro lado, de acordo com Camargo e Wachelke (2010), embora haja
evidências e o entendimento de que as representações sociais estejam
50
relacionadas a outras formas de pensamento, há espaço na teoria para se lidar
com a gênese das representações, através do mecanismo de ancoragem. Esse
processo possibilitaria apontar a existência de representações que parecem
influenciar a origem e a dinâmica de representações subordinadas, sem que se
faça referência aos themata, cuja explicação iria até às esferas sociológicas e
antropológicas. Sem dúvida, essa é uma discussão que permanece em aberto.
Em vista das diferentes perspectivas, Sá (1998) reconhece o campo das
representações ainda bastante dependente da criatividade do pesquisador para
desenvolver métodos próprios.
No mesmo sentido, Marková (2003) diz que a análise dos dados produzidos
pelos grupos focais ainda não foi suficientemente elaborada, o que abre caminho
à capacidade de inovação dos estudiosos. Ao prosseguir em seu raciocínio, ela
enfatiza que a imaginação do pesquisador é fundamental para conciliar outros
métodos com essa técnica, assim como os resultados também podem ser
submetidos a diversos procedimentos de análise, com a intenção de abranger
toda a complexidade da comunicação no processo interpretativo e avaliativo.
Por fim, Camargo, Justo e Alves (2011) assinalam a dificuldade para se
coletar os dados empíricos numa pesquisa de representações sociais, evitando-
se distorções que comprometam seus resultados. Assim, sugerem a utilização
múltipla de técnicas, tanto qualitativas quanto quantitativas, a fim de melhor se
aproximar dos conteúdos psicossociais das crenças, opiniões, práticas e dos
sentidos compartilhados sobre um determinado objeto de interesse social, tal
como o corpo físico tem sido visto, experimentado, desejado e submetido aos
processos de manutenção e formatação de uma aparência desejada, mesmo
depois dos 60 anos.
2.2 Questões de pesquisa
Diante das reflexões possibilitadas pelos autores referidos, foram
elaboradas as seguintes questões:
1) Que relações há entre as representações sociais do corpo encontradas
e as práticas de atividade física observadas durante o trabalho de campo?
51
2) Quais as expectativas dos sujeitos em relação às funções simbólicas do
corpo?
2.3 Objetivo geral
Apreender as representações sociais de corpo construídas por homens e
mulheres maiores de 60 anos de idade, praticantes regulares de atividade física.
2.4 Objetivos específicos
1) Descrever o perfil sociofamiliar dos sujeitos da pesquisa.
2) Caracterizar as representações sociais do dispositivo utilizado pelos
participantes do estudo: a atividade física.
3) Identificar, no grupo investigado, crenças, normas, valores, atitudes e
práticas relativas ao corpo.
2.5 Levantamento de campo
Na primeira etapa da pesquisa foi organizado um processo de observação
da realidade sociocultural dos espaços territoriais identificados. Essa opção
metodológica fundamentou-se na necessidade de se aproximar dos loci de
investigação, uma vez que nem todos eram conhecidos pelo pesquisador.
Procurou-se observar o comportamento habitual dos investigados nos locais
destinados às atividades físicas, objetivando revelar redes de significados,
práticas, códigos estabelecidos, em um processo de coleta de dados que se
concretiza com uma menor rigidez de protocolos, como assinalado por Adler e
Adler (1998). Essa metodologia exigiu a presença frequente no campo de
pesquisa e um esforço de se apreender os modos de agir e as formas de
comunicação entre os indivíduos (EISENHART e HOWE, 1992).
52
Estar junto com esses grupos possibilitou o aprendizado acerca de suas
normas, crenças, atitudes e práticas em relação ao corpo, através dos exercícios
que desenvolviam, além do processo de sociabilidade existente entre eles.
Isso foi possibilitado pela convivência com o cotidiano de um espaço cultural
e está incluído naquilo que se tem nomeado ─ pensando em procedimento de
investigação ─ como a observação sistemática, ou seja, um procedimento de
investigação que demanda o dispêndio de um tempo grande dedicado ao olhar,
ao diálogo com os sujeitos da pesquisa e, nesse contexto, não se pode
estabelecer roteiros muito fixos, tempos muito precisos.
Buscou-se estar atento aos acontecimentos e situações que envolvem a
rotina das atividades físicas desses grupos e que se constituem em hábitos,
costumes, práticas culturais.
Diante do acúmulo de dados a respeito dessa população e de suas formas
de convivência, foi possível ─ numa segunda etapa da investigação ─ a
construção de instrumentos de coleta de dados adequados ao ambiente
sociocultural e à linguagem desses grupos sociais.
A fim de se procurar proporcionar validade ao estudo, de acordo com Madiot
e Dargentas (2010), adotou-se a estratégia da triangulação metodológica. Além
da observação sistemática, foram utilizados, como instrumentos para a produção
de dados, o questionário semiestruturado e a entrevista em profundidade. Durante
o processo de análise, buscou-se a conexão permanente entre os resultados
obtidos e as hipóteses interpretativas, levando-se em consideração a lógica
natural do pensamento coletivo dos indivíduos, em articulação com os princípios
da TRS (ARRUDA, 2005).
2.6 Recrutamento de sujeitos
Para a aplicação do questionário, foram incluídos na amostra intencional 152
homens e mulheres com 60 anos ou mais, praticantes regulares de atividade
física em academias, grupos de ginástica ao ar livre, no projeto “Idosos em
Movimento: Mantendo a Autonomia (IMMA)” e da Universidade Aberta da Terceira
Idade (UnATI), ambos da UERJ. Todos aceitaram o convite para participar da
53
pesquisa, concordando em assinar um Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido ─ TCLE (Apêndice II).
Esta etapa foi facilitada pela cooperação da coordenação do projeto IMMA e
da direção da UnATI que autorizaram a realização do trabalho de campo e
fizeram a apresentação do pesquisador aos alunos e responsáveis pelas
atividades desenvolvidas. Contatos preliminares, igualmente favoráveis, também
foram feitos com os proprietários de três academias e com os professores de um
grupo de ginástica na praça.
Vale acrescentar que o trabalho de campo foi realizado de maio de 2012 a
outubro de 2013, desde as primeiras observações e aplicações do questionário
piloto até a última entrevista em profundidade realizada. Todo material foi
transcrito e digitalizado pelo pesquisador, sendo que os dados do questionário
foram tabulados com a ajuda do programa Excel® 2007.
2.7 Instrumentos
A abordagem estrutural da TRS, como assinala Abric (2003), preconiza que
toda RS está organizada hierarquicamente a partir de um sistema central (SC).
Seus elementos refletem a memória coletiva, o consenso do grupo, dão sentido e
organizam a estrutura da RS, caracterizando-se por atuar na sua estabilidade e
unificação.
O sistema periférico (SP), por sua vez, tem características de instabilidade e
flexibilidade, faz a intermediação entre o SC e a realidade, adaptando-o a novas
situações concretas, visando proteger a sua estabilidade. Por esse contato mais
próximo com o cotidiano, é por seu intermédio que se inicia a ancoragem de
novos elementos, possibilitando a dinâmica do processo de mudança nas RS.
Essa elaboração contribui para a compreensão das contradições internas das RS,
ao atribuir características e funções bem distintas aos elementos dos respectivos
sistemas (ABRIC, 2003).
Para identificar os conteúdos e a organização da representação, aplicou-se
um questionário com perguntas abertas e fechadas sobre a condição sociofamiliar
dos participantes, com dois testes de associação livre de palavras, uma série de
54
perguntas abertas e fechadas objetivando identificar normas, crenças, valores,
atitudes e práticas relacionadas ao corpo e à AF (Apêndice I). Foram utilizados os
termos indutores corpo e atividade física, respectivamente. Com o intuito de que
as respostas ao Teste de Evocação de Palavras (TEP) fossem dadas o mais
prontamente possível, a fim de melhor capturar o pensamento imediato,
espontâneo, dos participantes, os termos indutores não se encontravam escritos
no questionário. Eles foram preenchidos somente após a explicação e o pleno
entendimento da dinâmica de como se realiza esse teste (TURA, 1998).
Após ouvirem o termo indutor, os sujeitos informaram as quatro primeiras
palavras que lhes vieram à cabeça. Em seguida, solicitou-se que selecionassem
as duas mais importantes, desempenhando assim um trabalho cognitivo de
hierarquização das evocações realizadas, pedindo-se, ainda, que justificassem as
escolhas.
2.8 Análise dos dados
Com o auxílio do programa EVOC® 2000 (VERGÈS, SCANO e JUNIQUE,
2000), procedeu-se à análise prototípica dos resultados do TEP, analisando-se
em simultâneo as dimensões coletiva e individual envolvidas no processo de
evocação, através da análise das frequências e das ordens médias de evocação,
respectivamente. O corpus foi organizado unificando-se gênero, número e
sinônimos das evocações. Realizado esse procedimento, as evocações já
categorizadas foram distribuídas em gráfico de dispersão, onde a interseção das
linhas das médias de frequência e de ordem média de evocação o divide em
quadrantes ou em casas, como assinala Abric (2003).
No quadrante superior esquerdo situam-se as palavras com as frequências
mais elevadas e com as menores ordens médias de evocação, isto é, estão acima
da média das frequências encontradas (Fm) e abaixo da média das ordens
médias de todas as evocações (OME). Por essas características considera-se
que, provavelmente, esses elementos componham o SC, por terem sido
evocados prontamente por um número maior de sujeitos.
55
No quadrante inferior direito acham-se as categorias com as frequências
mais baixas e as maiores ordens médias de evocação, quer dizer, estão abaixo
da Fm e acima da OME, compondo o SP. São palavras lembradas tardiamente
por um número menor de participantes.
Nas duas outras casas encontram-se elementos da periferia próxima ou
sistema intermediário (SI), próximos do SC e que guardam características de
instabilidade da RS (FLAMENT, 1994; 2001), justamente por essa proximidade.
Dando sequência, a próxima etapa consistiu em verificar a organização dos
elementos constituintes da estrutura identificada, tarefa que foi cumprida com a
utilização da análise de similitude, técnica que permite estimar o valor simbólico
através do estudo das coocorrências existentes entre esses elementos, revelando
as relações significativas entre os conjuntos formados por eles (BOURRICHE,
2003; PEREIRA, 2005). A execução dessa técnica foi facilitada pelo emprego do
programa informático Dressing® (VERGÈS e JUNIQUE, 1999).
As respostas às perguntas fechadas foram analisadas segundo a sua
frequência e proporção. A análise do material das perguntas abertas o foi com
base na categorização do seu conteúdo (BARDIN, 2003; SALDAÑA, 2009).
Posteriormente, a partir da análise dos questionários respondidos, foi
elaborado um roteiro para entrevista em profundidade (Apêndice III). Dos 27
indivíduos entrevistados, nove já haviam respondido ao questionário. Foram
pessoas que se predispuseram a colaborar com a pesquisa, em função do
interesse demonstrado em continuar expressando suas opiniões a respeito dos
temas suscitados pelas questões inicialmente propostas.
2.9 Critérios de inclusão
Foram incluídos na amostra considerada, todos os indivíduos de ambos os
sexos com 60 anos ou mais, praticantes regulares de atividade física, e que
aceitaram o convite para participar como sujeitos da pesquisa, além de
concordarem em assinar o TCLE.
56
2.10 Considerações éticas
O projeto foi encaminhado para a análise do Comitê de Ética em Pesquisa
(CEP) do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC) da UFRJ e atendeu a
todas as exigências de acordo com a legislação vigente, tendo sido aprovado e
recebido o parecer número 179.998. Antes da aplicação dos instrumentos, todos
os participantes foram esclarecidos quanto aos objetivos do estudo e orientados a
respeito de como proceder durante a sua realização. Também foi ressaltada a
importância das informações prestadas por cada um deles para a consecução
desses objetivos, assim como foi assegurada a todos a liberdade de interromper a
sua participação em qualquer fase da pesquisa, sem nenhum prejuízo ao
pesquisado. Aqueles que se colocaram à disposição para responder ao
questionário assinaram o TCLE. Todas as precauções foram tomadas para
garantir o anonimato dos sujeitos e o sigilo das informações, cuja utilização tem
unicamente finalidade científica.
O material reunido ─ questionários preenchidos, o áudio das entrevistas e
suas respectivas transcrições ─ está arquivado sob a responsabilidade do
pesquisador. A confidencialidade dos dados foi preservada e a beneficência dos
resultados avaliada visando a sua possível aplicação nos grupos de indivíduos
maiores de 60 anos.
De acordo com os princípios éticos, os pesquisadores deverão divulgar
amplamente os achados e as conclusões dessa investigação através de
seminários e congressos, tendo como perspectiva a publicação de dois artigos em
revistas científicas indexadas.
Os resultados encontrados serão devolvidos aos sujeitos da pesquisa a partir
do entendimento com as instituições envolvidas e de acordo com a
disponibilidade de horário e o interesse manifestado pelos participantes. Os
pesquisadores também se colocarão à disposição para esclarecimentos ou outras
atividades de cunho educativo que possam contribuir para a promoção da saúde
e das práticas corporais dos idosos.
Pretende-se que os conhecimentos produzidos sejam difundidos e que
tenham utilidade no aprimoramento das orientações relativas ao corpo e dirigidas
a essa faixa etária.
57
Capítulo 3
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os achados serão comentados, inicialmente, a partir da abordagem
estrutural de corpo e depois de atividade física, analisando-se tanto os resultados
da amostra total, quanto, separadamente, os resultados do grupo feminino e do
masculino.
Posteriormente, apresentar-se-á a análise do corpus das entrevistas,
segundo a abordagem processual, com base na classificação hierárquica
descendente (CHD) realizada pelo programa IRAMUTEQ®, momento em que os
seus resultados serão articulados com os obtidos através da observação
sistemática e do questionário.
3.1 Abordagem estrutural
3.1.1 Descrição dos sujeitos
Na amostra investigada, a amplitude da idade correspondeu ao intervalo de
60 a 93 anos, sendo encontrada a média de 73,6 anos, a mediana de 72,5 anos e
a distribuição de idades se mostrou bimodal, apresentando maior concentração
nas idades 67 e 84 anos, que ocorreram nove vezes cada uma (Tabela 1).
No conjunto havia 80 mulheres (52,6%) que se distribuíram de forma
equânime pelas décadas de 60, 70 e 80 anos. Quanto aos homens, houve um
nítido decréscimo conforme a idade aumentava e apenas quatro mulheres e um
homem informaram ter 90 anos ou mais. A média feminina foi de 75,1 anos e a
masculina de 72,1. Os homens apresentaram nível de escolaridade mais elevado,
sendo apurado que 27,6% concluíram o ensino superior, contra 17,1% das
mulheres. Estão aposentados 88,2% dos sujeitos, embora 18,4% ainda
mantenham alguma atividade profissional (11,8% homens).
A situação conjugal dos respondentes foi distribuída da seguinte forma:
42,1% casados, 30,9% viúvos (21,7% mulheres), 12,5% solteiros (9,9% mulheres)
e 11,8% divorciados ou separados.
58
Estes dados estão de acordo com os achados por estudos que analisaram o
perfil sociodemográfico de idosos brasileiros (CRUZ e FERREIRA, 2011; MARIN
et al., 2010; PEREIRA e OKUMA, 2009).
Tabela 1 - Sujeitos segundo faixa etária e sexo
Faixa
Etária
Feminino Masculino Total
f % f % f %
60 a 69 25 16,4 30 19,7 55 36,2
70 a 79 23 15,1 24 15,8 47 30,9
80 a 89 24 15,8 12 7,9 36 23,7
90 a 93 4 2,6 1 0,7 5 3,3
Ñ informa 4 2,6 5 3,3 9 5,9
Total 80 52,6 72 47,4 152 100,0
3.1.2 A estrutura e organização das representações sociais de corpo
No tratamento do corpus produzido pelo TEP analisou-se 75% do total do
material evocado, considerando-se palavras com frequência mínima igual ou
acima de 5. Verificaram-se 414 evocações com 31 palavras diferentes e média de
2,7 evocações por sujeito. A média das ordens médias das evocações (OME) foi
2,5 e a frequência média (Fm) igual a 13 (Quadro 1).
Quadro 1 - Resultados do teste de evocação com o termo corpo
Variáveis f Sujeitos 152 Palavras diferentes evocadas 31 Total de evocações 414 Média de evocações por sujeito 2,7 Média das ordens médias de evocações (OME) 2,5 Média das evocações (FM) 13
As dez maiores frequências corresponderam a 61,6% do corpus e referem-
se às seguintes evocações: saúde (66), beleza (39), aparência (24), cabeça (22),
pernas (19), bem-estar (18), atividade física (16), movimento (14), agilidade (13),
peso (12) e braços (12).
59
Os elementos que reuniram as condições iniciais para comporem o SC foram
saúde, beleza, aparência e cabeça, justamente as quatro maiores frequências
encontradas (Quadro 2).
Quadro 2 - Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média
de evocação com o termo corpo - Amostra total
Fm OME < 2,5 OME ≥ 2,5
Elementos f ome Elementos f ome
≥ 13
Saúde 66 1,985 Pernas 19 2,632
Beleza 39 2,179 Bem-estar 18 2,500
Aparência 24 2,250 Atividade física 16 2,688
Cabeça 22 1,818 Movimento 14 2,643
Agilidade 13 3,077
< 13
Braços 12 2,333 Forma física 11 2,545 Peso 12 2,417 Força 10 2,900 Mente 11 2,273 Higiene 8 2,625 Equilíbrio 11 2,455 Alegria 8 3,000 Mãos 9 2,333 Tronco 8 3,000 Olhos 9 2,444 Cuidado 7 2,571 Postura 8 2,250 Determinação 7 3,429 Coração 8 2,375 Caminhar 6 3,167 Disposição 8 2,375 Elegância 7 2,286 Vida 7 2,429 Alimentação 6 2,333 Magreza 5 2,400 Musculação 5 2,400
Na procura por mais indícios de centralidade, averiguou-se a
proporcionalidade destas evocações relativamente às vezes em que foram
indicadas como as mais importantes, verificando-se que somente saúde e cabeça
superaram 50% de indicações (68,2%), um atributo a favor da confirmação
desses componentes como centrais (CAMPOS, 2003).
Conforme aludido anteriormente, o SC espelha os consensos e a memória
do grupo, tende a manter a coerência interna dos seus componentes, gerando os
significados da RS (ABRIC, 2003). Dessa forma, percebe-se a indissociabilidade,
para os sujeitos, do objeto de RS com a manutenção da saúde física e mental,
sendo eles pessoas ativas que ainda pensam no futuro, como essa participante
de 84 anos que aos 69 começou a fazer ginástica e musculação, dizendo que
60
tomou essa iniciativa “por mim mesmo, pelo corpo, até comecei a viver mais,
fiquei mais desinibida”. Outro exemplo é um homem de 71 anos cuja principal
motivação para continuar se exercitando é “a vontade de viver mais”.
Mesmo não tendo sido confirmadas na indicação como as palavras mais
importantes, beleza e aparência compuseram o quadrante superior esquerdo com
a segunda e terceira maiores frequências, podendo ser um indicador da
relevância dos sentidos partilhados e atribuídos a essas cognições. Isso,
provavelmente, é reflexo da superexposição midiática de corpos perfeitos e de
receitas de beleza e saúde, o que é coerente com a reflexão de Moscovici (2012)
sobre o fascínio exercido por objetos sociais intensamente difundidos pelos meios
de comunicação.
O ideal de aparência e a imagem do corpo em forma estão presentes
simbolicamente e de forma constante na sociedade, seja na mídia, seja nas
interações pessoais. No Brasil, amenizar os efeitos do envelhecimento é um dos
principais motivos para investir no corpo, em função de se buscar a beleza no
prolongamento da juventude (GOLDENBERG, 2011).
Nesta pesquisa, o elemento aparência também surge em alusão à busca da
jovialidade, como uma participante de 70 anos ao dizer que hoje sobressai “a
preocupação de não envelhecer com a aparência que os anos têm”, ou o
comentário de um homem de 76 anos sobre quem ainda encontra-se em forma
mesmo depois dos 60 anos: “que tem aparência de menor idade”.
O SP agrupou cuidado, higiene, determinação, caminhar, forma física,
tronco, força e alegria. Esses elementos refletem a atenção conferida ao
autocuidado, incluindo a força de vontade necessária para se exercitarem e
melhorarem sua condição física geral, além da satisfação demonstrada com o
universo relacionado às atividades que praticam. Como o SP é o lugar de
ancoragem de novos sentidos, é possível que alegria esteja ancorando sentidos
associados ao convívio social proporcionado pelas práticas em grupo, assim
como à melhora percebida da própria saúde física e mental, conquistada com
determinação, dedicando-se com afinco às práticas desenvolvidas.
Em diversas oportunidades os sujeitos referem-se à alegria; como, por
exemplo, quando afirmam que envelhecer bem é “ter saúde, alegria e viver bem
61
com as pessoas” (mulher, 67), ou quando dizem que é “ter um corpo saudável,
trabalhar, ter alegria de viver” (mulher, 82).
Aqui vale ressaltar que para alguns participantes, a questão de envelhecer
bem nem sempre é abordada com uma definição pessoal desse processo. Este é
tomado como um conceito já conhecido, implicitamente entendido por todos como
envelhecer ativamente, prescindindo, portanto, de explicação. Dessa forma, é
visto como um objetivo a ser alcançado, subentendendo-se que, para esses
sujeitos, a postura do envelhecimento ativo (CALDAS e VERAS, 2012) já foi
adotada perante a vida. Portanto, envelhecer bem pode ser visto como:
“um objetivo a ser buscado” (mulher, 64).
“tudo isso que a gente tá fazendo agora” (mulher, 83).
“ser como eu estou. Eu tenho 73 anos e sou da melhor qualidade” (homem, 73).
Pressupõe-se, então, que esta atitude, compreendida como um modo de
representar a velhice, também seja compartilhada pelo grupo sociocultural de
quem respondeu dessa maneira. Essa interpretação também se presta à
suposição de que dentre o volume de informações veiculadas na sociedade, o
conceito de envelhecimento bem sucedido (GONÇALVES et al., 2006) já está
incorporado por uma parcela significativa da população.
Ao mesmo tempo, os outros conteúdos podem significar sentidos
partilhados no cotidiano visando cuidar da saúde, da aparência corporal e do bom
funcionamento da mente, da vida psíquica, expressado no conteúdo cabeça,
fundamental pelo papel desempenhado na autonomia (HERNANDEZ et al., 2010)
desses idosos. É o que se pode observar pela justificativa para a escolha de
cabeça e físico entre as quatro evocações realizadas: “se a cabeça não regular o
corpo, o físico paga!” (mulher, 70); ou pelas declarações sobre um
envelhecimento positivo, ou por sublinhar a importância do bom estado de saúde
e da memória para preservar a autonomia:
“Você ter saúde, boa cabeça, boa memória, alegria” (mulher, 63).
“A pessoa ter boa memória, poder fazer as coisas, não depender dos outros” (mulher, 93).
62
O SI constituiu-se de 19 elementos que poderiam ser agrupados por
afinidade temática, conforme a seguir: alimentação, peso, magreza, postura,
elegância (indicando preocupação com a aparência corporal); disposição, bem-
estar, mente e vida (referência aos benefícios alcançados); movimento, atividade
física, musculação, agilidade, equilíbrio (referência às capacidades funcionais e à
autonomia) e, por último, pernas, braços, mãos, olhos, coração (referência às
partes do corpo, à anatomia humana). Sendo a periferia próxima uma zona de
instabilidade da RS, esses conteúdos tanto guardam uma relação de proximidade
de sentido com o SC (grupos aparência e benefícios), quanto com o SP (grupos
autonomia e anatomia).
Prosseguindo a exploração do material com a finalidade de verificar o valor
simbólico expressado pelo poder de organização interna dos diversos elementos
constituintes desta representação, usou-se o recurso da análise de similitude, que
permite avaliar as coocorrências existentes no corpus em estudo (PEREIRA,
2005). (Figura 1).
63
Figura 1 - Análise de similitude das evocações de corpo - Amostra total
Inicialmente, observa-se a formação de seis estrelas, quando um elemento
está ligado diretamente a, pelo menos, outros cinco. Os seis organizadores
dessas estrelas são: saúde (16 conexões), cabeça, peso, alimentação, atividade
física (cinco conexões cada) e musculação (seis conexões). Assim, saúde e
cabeça confirmam o valor simbólico de cognições centrais, através do poder de
conexidade apresentado.
Pelos extratos abaixo, pode-se perceber que os vínculos aparentes com
saúde têm como finalidade o prolongamento da vida com qualidade:
“sempre saúde e vigor porque engloba tudo. Com saúde e vigor físico concretiza a longevidade” (homem, 85).
“um indivíduo com saúde, a tendência é ter uma vida prolongada” (homem, 74).
“vida porque através de exercícios você proporciona uma longevidade saudável, com qualidade” (mulher, 71).
Saúde associa-se com alegria, vida, bem-estar (denotando o prazer de
viver) ─ higiene, cuidado, peso, alimentação, aparência, beleza (indicando os
64
cuidados com a saúde e com a apresentação pessoal) ─ determinação,
disposição (alusão à força de vontade necessária à manutenção dos cuidados) ─
caminhar, movimento, forma física, agilidade e equilíbrio (referência à
independência e à autonomia) e estabelecendo sua ligação mais densa com bem-
estar, uma vez que o índice de similitude exprime as coocorrências, ou seja, o
número de sujeitos que lidam da mesma forma com as duas categorias de uma
aresta (PEREIRA, 2005). Cabeça, por sua vez, une-se a mãos, pernas, tronco,
coração e musculação, mantendo com os elementos anatômicos uma ligação
mais intensa.
Sobre o vínculo entre as categorias cabeça e pernas, é interessante notar
que o foco de atenção dessa ligação é a preocupação dos indivíduos com a
capacidade de locomoção:
“perna para poder se locomover e a cabeça é que faz você andar” (homem, 84).
“a cabeça para pensar e as pernas para poder andar” (mulher, 79).
“a cabeça é mais importante porque tando com a cabeça boa eu posso andar sem me perder. As pernas porque guentam o corpo em cima” (homem, 78).
Despertou atenção a existência de mais quatro estrelas, todas
centralizadas por componentes do SI. Musculação organiza mente, cabeça, peso,
alimentação, forma física e atividade física, exibindo seu valor simbólico. De fato,
ela foi a modalidade indicada como a mais praticada (52%). Atividade física, além
de musculação, tem conexidade com determinação, higiene, cuidado e
alimentação que, por sua vez, além de atividade física e musculação, também
está conectada a saúde, a higiene e a peso que, afora musculação e alimentação,
também se conecta a magreza, cuidado e saúde, com a qual estabelece uma
intensa ligação em termos de coocorrências.
Os elementos musculação e atividade física podem estar favorecendo a
ancoragem de novos sentidos relacionados às práticas físicas. Da mesma
maneira, a preocupação com uma alimentação saudável e com o controle do
peso corporal parece ter a dupla função de ancorar sentidos de cuidados com a
saúde, assim como com a aparência física também.
65
Comparada às estrelas centralizadas por elementos do SI, a organizada
por cabeça distingue-se por ter quatro ligações densas (um subconjunto de
elementos com conteúdos anatômicos), ao passo que as outras têm no máximo
duas. Liga-se a olhos indiretamente, forma um círculo com mãos, pernas, braços
e tronco, outro com tronco, mente, musculação e dois triângulos: com pernas e
mãos e pernas e tronco. Os triângulos são esquemas que podem ser observados
no mapa de similitude e que ajudam a detalhar com maior precisão a relação
entre os elementos da RS (SANTOS, TURA e ARRUDA, 2011), que neste caso
são eminentemente anatômicos, apesar da polissemia apresentada pela cognição
cabeça:
“A cabeça dirige o corpo e os olhos apresentam as maravilhas da vida” (homem, 70).
De certa forma, estranha-se a tendência de cabeça a unir-se com
elementos de dimensão anatômica, visto que nos discursos dos sujeitos, cabeça
aparece com conotações de mente ou mesmo de memória, conforme
anteriormente aludido. Contudo, ressalte-se que são elementos da periferia
próxima ou do SP, local permitido para as contradições e para as trocas do
cotidiano.
Retornando à cognição saúde, o maior número de elementos que organiza
indica que seja o polo de significação da RS de corpo, dando sentido aos seus
elementos internos. Desse modo, articulando os conteúdos diretamente ligados a
ela, os sujeitos buscam viver com alegria e bem-estar, preocupam-se com a
higiene pessoal dentre os cuidados de saúde, que engloba o controle do peso
corporal e, portanto, da alimentação, também visando atingir uma aparência
saudável, ao mesmo tempo expressiva da beleza que ainda preservam. Para
isso, é preciso ter determinação e disposição para caminhar, a fim de alcançar a
forma física e desenvolver a agilidade e o equilíbrio através do movimento.
Foram verificadas dez formações triangulares e saúde é uma das duas
cognições que mais contribuem para a constituição dessas formações. Forma um
triângulo com vida e cuidado, outro com peso e cuidado e mais dois com
alimentação, acrescentando-se peso ao primeiro e higiene ao segundo.
66
Alimentação participa da formação de cinco triângulos. Os dois já citados
com saúde, dois com musculação (um com peso e outro com atividade física), e o
último com atividade física e higiene.
Estas formações triangulares podem estar explicitando a importância dos
sentidos atribuídos pelos sujeitos à alimentação para a saúde do corpo. Ela está
relacionada aos cuidados com higiene, ao controle do peso e à atividade física,
como se observa na justificativa de um sujeito para a escolha das evocações
saúde e aparência como as palavras mais importantes:
“Sujeito que faz ginástica tem aparência saudável. Atividade física e alimentação propicia a eliminação de determinadas doenças que se tem por ser sedentário” (homem, 68).
Apesar de não terem confirmado sua centralidade, beleza e aparência
formam uma ligação linear com elegância, postura e saúde, que pode ser uma
indicação de como os sujeitos constroem e partilham os sentidos desses
conteúdos estéticos mediados por saúde.
Vale assinalar que nos conteúdos sobre o significado de estar em forma,
quatro categorias sobressaíram. A principal delas referia-se a ter saúde (física e
mental), seguida pela preservação da autonomia, pela manutenção de um corpo
equilibrado, com as medidas proporcionais, e pela sensação de bem-estar.
Apenas 15,1% disseram não se considerar em forma, ao passo que 71,1%
foram taxativos ao dizer que sim. Nas explicações, o ponto mais importante das
considerações foi a comparação favorável com pessoas da mesma idade,
assunto comentado na literatura (BARROS, 2011; CARADEC, 2011; NERI, 2006).
Logo após, vieram a manutenção da autonomia, o fato de ainda praticarem
AF (80,9% praticam ao menos duas modalidades por semana), assim como de
participarem de diversas atividades sociais, intelectuais, mantendo um
envolvimento ativo com a vida (CALDAS e VERAS, 2012).
A próxima categoria encontrada nas explicações do porquê se consideram
em forma diz respeito ao controle do peso.
No campo do discurso técnico da educação física, o significado de estar
fisicamente em forma normalmente está relacionado com estar bem preparado
67
fisicamente, em boas condições físicas. Entretanto, coerente com os
pressupostos da TRS, os sujeitos ressignificaram este sentido pertencente ao
universo reificado, dando preferência à noção consensual de estar em forma
como sendo a apresentação de uma aparência física que os deixe satisfeitos.
Contraditoriamente ao que se poderia esperar das explicações, se levadas
em consideração as respostas sobre o significado de estar em forma, nestas
justificativas saúde apareceu somente como a quinta categoria mais saliente.
Ora, não seria de se esperar que, sendo saúde a principal resposta para o
que significa estar em forma e, além disso, com mais de 70% dos participantes
considerando-se em forma, que o ter saúde também não tivesse sobressaído nas
respostas do por que acreditam que estão em forma? Qual a razão para que
utilizassem, antes de saúde, outras categorias para justificarem a sua condição de
estar em forma? Por que justamente nas explicações inverteu-se a hierarquia da
lógica informal até então seguida? Essas dúvidas fazem pensar que a definição
subjetiva do que seja ter um corpo em forma vá, de fato, além da declaração de
se gozar de um bom estado de saúde.
Bem, levando-se em conta que a amostra é composta por pessoas
aparentemente saudáveis, fisicamente ativas, mas cuja média de idade é um
pouco superior a 70 anos, é natural ─ e isso é dito por eles ─ que se preocupem
com as doenças. Ainda mais com a atual responsabilização individualizada pelos
cuidados de saúde (DEBERT, 1999), que tende a culpar quem adoece. Desse
modo, pergunta-se, pensar em saúde não levaria a pensar na sua antinomia, a
doença, resgatando um tema de oposições de longa duração, no qual os
indivíduos também ancoram suas incertezas em relação ao tempo de vida que
terão pela frente e, com isso, preferem a satisfação íntima de pensar nos que
estão em situação pior que a deles, do que na própria saúde?
Ou, quem sabe, em se estando bem de saúde, tem-se a liberdade e a
possibilidade de pensar em outros valores na sua frente, como a
indissociavelmente humana preocupação com a própria aparência física.
“No fundo, você dizer assim: eu não ligo prá isso, não ligo mesmo, passou o tempo... Mentira! Mentira! Quando alguém fala prá você: cê tá bem cara, tá muito bem, cê fica todo orgulhoso..., (...) não fala nada, mais fica todo
68
prosa. No débito e crédito é um grande crédito que você ganha” (homem, 72).
Sobre as variadas opiniões colhidas a respeito de idosos fisicamente
ativos, encontrou-se que 80% ou mais acreditam que eles sejam independentes,
produtivos, saudáveis, bem-humorados, competentes, atuantes, desinibidos e que
ainda sejam vigorosos. Um conjunto de 71,1% acham os idosos valorizados
socialmente, 65,8% os consideram fisicamente atraentes, 57,9% não julgam os
mais velhos conservadores e 57,2% são de opinião que as pessoas maiores de
60 anos permanecem ativas sexualmente.
Sobre essa última questão, vale a pena reproduzir alguns comentários
acrescentados no fim do questionário, ou em conversa com o pesquisador. Esses
comentários foram, principalmente, os referidos à atração física e à atividade
sexual:
"As pessoas me acham atraente pelo que eu faço de acordo com a idade que tenho" (mulher, 92).
Sobre o item 'sexualmente ativas', disse o respondente: "Aí tem um monte de mentira! Quando perguntei se podia tomar um azulzinho o Dr. falou: tá maluco!!!" (homem, 77).
Sobre o mesmo item anterior: “Acho que falam muita mentira! dizem que fazem não sei quantas vezes, mas não fazem nada!" (mulher, 79).
Sobre o mesmo item exclamou: "60 anos é nova!" (mulher, 66).
"Digo por mim, porque se não fosse viúva, continuaria a ser" (mulher, 84).
"Comparo o sexo ao carro: dirigir quando é novo, depois não quer mais" (homem, 84).
[Respondente viúva e estrangeira] “Me sinto muito sozinha. Tenho só uma filha que mora fora do país e não tenho neto. Casei, me separei, casei de novo e os dois já morreram. Depois não quis mais, eu estava acabando com os homens [risos]. Até há pouco tempo eu arranjava uns homens. Lá no meu país eu poderia pagar por uns homens bonitos, não tem importância, mas aqui...” (mulher, 88).
Em se tratando de investigar os sentidos de corpo, torna-se relevante
explorar como eles são construídos entre homens e mulheres deste estudo.
Primeiramente, serão apresentados os resultados da análise prototípica
referentes ao corpus oriundo das evocações femininas.
69
As 80 mulheres produziram um corpus com 271 evocações. Desse total,
foram analisadas 203 palavras (75% do corpus), com frequência mínima igual a 4
e média de 3,4 evocações por participante (Quadro 3).
Quadro 3 - Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média
de evocação com o termo corpo - Grupo feminino
Fm OME < 2,5 OME ≥ 2,5
Elementos f ome Elementos f ome
≥ 8
Saúde Beleza Aparência Cabeça Forma física
31 16 10 10 8
1,806 2,375 2,200 1,800 2,250
Bem-estar Pernas Atividade física Agilidade
14 11 10 8
2,643 2,727 3,000 3,750
< 8
Elegância Peso Magreza Movimento Cuidado Disposição Olhos Postura Vaidade
7 7 5 5 4 4 4 4 4
2,286 2,000 2,400 2,400 2,000 2,250 2,000 2,2501,250
Higiene Alegria Braços Equilíbrio Alimentação Estética Musculação Tronco
7 6 6 6 4 4 4 4
2,857 3,167 2,667 2,500 3,000 2,5002,500 3,000
Com a finalidade de buscar outros indícios de centralidade dos elementos
situados no quadrante superior esquerdo, espaço onde se espera que se
localizem os componentes do núcleo central da RS, verificou-se,
proporcionalmente, o quanto cada uma dessas categorias foi considerada pelos
sujeitos uma das palavras mais importantes. Nesta etapa, constatou-se que
cabeça (70%), saúde (61,3%) e aparência (60%) foram as cognições que
ultrapassaram 50% de indicações.
Procedeu-se, posteriormente, ao teste de dupla negação (TDN), onde os
sujeitos foram perguntados se era possível pensar em corpo, sem pensar em
cada uma das categorias inicialmente classificadas como pertencentes ao SC.
Neste caso, espera-se uma proporção mínima de 75%, num intervalo de
confiança de 95%, de respostas negativas categóricas que refutem o
questionamento, para que seja considerado mais um indício de essencialidade
desses elementos.
70
Somente saúde (92,1%) e cabeça (76,3%) suplantaram a proporção
mínima estabelecida, sendo mais uma indicação a favor da centralidade desses
elementos.
Dando sequência à investigação e para se averiguar o valor simbólico, ou
seja, o poder de organização dos elementos desta RS, submeteu-se o corpus
encontrado à análise de similitude, procedimento que, através de cálculos
estatísticos, permite reproduzir a observação das ligações e a densidade das
coocorrências presentes no material de estudo, como pode ser visto na figura 2.
Figura 2 - Análise de similitude das evocações de corpo - Grupo feminino
Iniciando-se a interpretação do mapa de similitude, nota-se a existência de
cinco estrelas, formação em que uma das categorias une-se diretamente a pelo
menos outras cinco, através das conexões que faz com cada uma delas,
representadas pelas linhas do grafo.
A mais significativa das estrelas, por seu valor simbólico explicitado pelo
71
seu poder organizador, o que lhe confere proeminência na geração dos sentidos
partilhados no grupo sobre o objeto corpo, foi saúde, que organiza outras 12
cognições.
Quatro delas dizem respeito aos aspectos objetivos da saúde: alimentação,
cuidado, peso e higiene; três fazem referência a aspectos da ampliação da
capacidade de autonomia e do desempenho físico: forma física, disposição e
agilidade; três compõem o subconjunto relacionado a aspectos da beleza e da
satisfação com a imagem do corpo: beleza, estética e vaidade; por fim, aspectos
subjetivos da saúde como bem-estar e alegria, que atravessam e ultrapassam os
demais, evidenciando a multiplicidade de fatores determinantes da saúde.
Retomando a análise, as outras estrelas foram organizadas por pernas,
musculação, beleza e cabeça, as duas últimas confirmando, assim, o seu caráter
de componente central da representação em estudo, por terem demonstrado
saliência na análise prototípica e poder de organização na análise de similitude.
Cabeça está ligada a tronco, braços, pernas, atividade física e postura. É
curioso observar que cabeça, apesar de aparecer nos discursos no sentido de
boa capacidade de raciocínio, boa memória, lucidez e até de alegria, qualidades
abstratas, apresenta-se mediando as relações com a anatomia corporal,
construção detalhada pela presença de três triângulos com elementos de
conteúdos anatômicos, que remetem à dimensão biológica do ser humano.
Provavelmente, porque esteja ancorada na memória dos ensinamentos escolares
do passado, época da aprendizagem do reconhecimento das partes do corpo na
infância, repetida e memorizada como se segue: cabeça, tronco e membros. Ou,
explicitando a influência dos meios de comunicação e de estratégias de marketing
em que se procura dar destaque a estes componentes anatômicos.
As suas associações com os elementos atividade física e postura
possivelmente estão relacionadas ao papel atribuído à cabeça de comando das
ações do corpo, capaz de conduzi-lo em direção à prática de AF, visando a uma
boa postura, qualidade física bastante valorizada.
Pernas, depois de saúde, forma a estrela mais numerosa. Estabelece
conexões com sete outras cognições: braços, tronco, olhos, cabeça, higiene,
forma física e musculação. São sentidos principalmente ancorados à preocupação
72
em preservar a autonomia através da manutenção da capacidade de locomover-
se com as próprias pernas. Referências a exercícios para o seu fortalecimento
também são feitas, visando a melhorar o equilíbrio (“firmeza nas pernas”) e aliviar
as dores que dizem sentir.
Musculação, alimentação, peso, atividade física, pernas e vaidade,
provavelmente, estão explicitando significados ancorados na prevenção da
osteoporose e na manutenção da independência através da melhora no
desempenho das atividades cotidianas dentro e fora de casa. Em menor escala,
fala-se da capacidade de se modificar ou manter o corpo através dessa atividade,
fato merecedor de comentários:
“porque quando a gente vê o resultado, dá vontade de fazer mais. Não é por vaidade, mas por necessidade” (mulher, 79).
“porque ainda tenho (...) um manequim apreciável! Minha vaidade!” (mulher, 60).
Peso traz o sentido principal da manutenção do peso corporal, de não se
deixar engordar, de ter o peso proporcional à altura, por questões tanto objetivas
quanto subjetivas de saúde. O círculo: peso ─ cuidado ─ atividade física ─
postura ─ beleza ─ magreza parece expressar de forma sintética as
preocupações e os sentidos atribuídos pelos idosos ao peso do corpo.
“Atualmente se preocupam com o peso, colesterol etc.” (mulher, 66).
“Musculação? Eu vi o resultado em duas semanas! Fui fazer compras e achei as sacolas leves. O peso é uma atividade que dá muito mais força, resistência” (mulher, 85).
“um corpo sem muito peso, elegante” (mulher, 86);
“peso bom, os músculos não flácidos, um corpo que permita ficar bem com a sua cabeça” (mulher, 68).
Beleza, também centro de estrela, conecta-se a: postura, elegância,
magreza, forma física e saúde. O elemento beleza conota principalmente a beleza
física, mas, algumas participantes expandiram o seu conceito para beleza
espiritual, de sentimentos, de caráter, num aparente processo de compensação
de perdas como assinalado por Neri (2006), substituindo a concretude do corpo
pela imaterialidade da alma.
73
Houve crítica ao atual momento que se está vivendo de excessiva
valorização da beleza, chegando-se a afirmar que esse era um atributo reservado
aos jovens e que aos velhos competia a sabedoria. Inversamente, também se
declarou que as pessoas não falam de beleza por vergonha, ou que já está
havendo mudança de percepção em relação a esse assunto, haja vista o
incentivo aos concursos de beleza da pessoa idosa. Valorizam a elegância do
corpo magro, a postura ereta, pois, do contrário, fica-se com a aparência de
doente, além de ser prejudicial à coluna.
A associação de beleza com forma física pode ser entendida por esta
compartilhar poucos sentidos relativos a aspectos físico-orgânicos como
resistência ou capacidade de se desempenhar bem fisicamente. Prioritariamente,
as pesquisadas referem-se à forma como o contorno corporal, a silhueta de quem
chega até a despertar inveja.
“A academia está repleta de amigas (...) em forma e muitas causam até inveja, com o ‘corpinho’ que possuem” (mulher, 68).
“Em geral os meus amigos estão gordos. Embora vivam fazendo regime, comem excessivamente e têm inveja de quem está em forma” (mulher, 64).
Outro sentido relacionou forma física a conteúdos afetivos como ter alegria,
felicidade e amizades, denotando o estado de satisfação com o próprio corpo e o
prazer proporcionado pelo convívio social.
Por fim, o elemento saúde é construído no contexto da sua relação com
beleza, tanto por afinidade quanto por oposição. Observa-se a oposição de
sentidos quando fazem comparações entre o que era valorizado no passado e o
que é valorizado atualmente em termos de saúde e de beleza. Observação
semelhante também é feita quando surgem hierarquizações contrapondo uma
categoria à outra, ocasião em que, como seria de se esperar, saúde fica à frente
da estética.
Outras participantes, no entanto, parecem compreender saúde e beleza de
maneira mais integrada, assumindo a importância de ambas e sopesando o
momento em que podem valorizar a beleza, sem que seja em detrimento da
saúde. A propósito, criticam os corpos estereotipados de hoje, falsamente
construídos, e relembram, com aprovação, dos corpos naturais das estrelas de
74
cinema de meados do século XX.
É interessante ressaltar o triângulo formado por saúde, alimentação e
higiene. Como se viu, esses esquemas mentais ajudam a detalhar com mais
clareza a relação existente entre os conteúdos de uma RS. Este triângulo é
representativo por expressar preocupações mais objetivas com a saúde, tal como
alimentação e higiene, requisitos necessários para se alcançar a saúde.
O círculo a ser destacado agrupa nove cognições: cabeça, atividade física,
agilidade e equilíbrio, que reúnem conteúdos das dimensões autonomia e
afetividade, importantes no processo de envelhecimento. Tais sentidos de corpo
podem estar ancorando-se no dispositivo AF, em que estão presentes o caráter
socializante e agregador dessas atividades. Além desses, encontram-se os
componentes postura, beleza, saúde, alimentação e elegância, exibindo sentidos
ancorados na dimensão da estética corporal.
O subgrupo masculino foi composto por 72 sujeitos com idades que
variaram de 60 a 91 anos. A média de idade dos participantes foi de 72,1 anos, a
mediana 70,5 anos e a moda 67 anos, com uma frequência de 7 ocorrências.
O corpus produzido pelo TEP foi analisado com auxílio do EVOC® e os
resultados da análise prototípica podem ser observados no quadro 4.
75
Quadro 4 - Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média
de evocação com o termo corpo - Grupo masculino
Fm OME < 2,5 OME ≥ 2,5
Elementos f ome Elementos f Ome
≥ 7
Saúde Beleza Aparência Cabeça Mente
35 19 14 12 10
2,143 1,947 2,286 1,833 2,100
Movimento Pernas
9 8
2,778 2,500
< 7
Braços Atividade física Coração Agilidade Equilíbrio Bem-estar Intestino Postura
6 6 6 5
5
4
4
4
2,000 2,167 2,333 2,000 2,400
2,000
2,250
2,250
Força Forma física Mãos Determinação Olhos Peso Vida Tronco Vigor Amizade Caminhar Longevidade
7 7 6 6 5 5 4 4 4 4 4 4
2,857 3,286 2,667 3,333 2,800 3,000 2,750 3,000 3,000 3,500 3,500 3,500
O quadrante superior esquerdo é o local onde provavelmente se encontram
os elementos pertencentes ao SC, por terem sido lembrados mais rapidamente
(ome < 2,5) e por um número maior de sujeitos (frequência ≥ 7).
O SC exprime a essência da RS e, por isso, normalmente é constituído por
um número reduzido de componentes que refletem a sua faceta mais conhecida,
consensual e mais enraizada no pensamento social (SÁ, 2002). No interior deste
quadrante constata-se um par de palavras relativo às preocupações mentais ─
cabeça e mente ─, um segundo par relacionado à beleza corporal ─ beleza e
aparência ─ e a palavra saúde, categoria abrangente que transcende os seus
significados mais restritos e consegue estender-se às outras nos sentidos
partilhados pelos pesquisados.
O SP opõe-se ao SC na estrutura, localizando-se no quadrante inferior
direito e possui características antagônicas às suas. Reúne os elementos
lembrados mais tardiamente (ome ≥ 2,5) e por um número menor de pessoas
(frequência < 7). Atua como protetor da estabilidade do SC e é o local onde se
iniciam as possíveis mudanças representacionais, através da ancoragem de
76
novos conteúdos que são classificados e rotulados pelo grupo, de acordo com a
memória coletiva e o conhecimento prévio existente.
A periferia próxima ou sistema intermediário (SI) é o local de instabilidade
da RS e ocupa os dois quadrantes restantes com palavras que foram lembradas
rapidamente, porém, não por um número significativo de respondentes ─
quadrante inferior esquerdo ─ e com palavras que alternam essas propriedades,
evocadas por um número significativo de pessoas que, entretanto, delas custaram
a se lembrar ─ quadrante superior direito (PEREIRA, 2005).
Foram produzidas 275 evocações e posteriormente analisadas 207 delas, o
que corresponde a 75% do corpus. A frequência mínima por palavra foi igual a 4 e
obteve-se a média de 3,8 evocações por sujeito.
Na busca por mais indícios de centralidade, conferiu-se a proporção de
indicação de palavra mais importante das que estão no quadrante superior
esquerdo, aquele que agrupa as categorias de maior frequência e menor ordem
média de evocação. Verificou-se que, das cinco existentes, apenas saúde
(74,3%), cabeça (66,7%) e mente (100%) superaram a proporção mínima exigida
de 50% (CAMPOS, 2003).
Verificando-se os resultados do TDN, essas três cognições novamente
apresentaram indícios de centralidade, com proporção mínima superior a 75%
(p<0,05): saúde com 88,2%, cabeça com 77,4% e mente com 76,5%.
Na formação do SP distinguem-se três conjuntos de palavras:
determinação, caminhar, peso, forma física, força e vigor ─ mãos, olhos e tronco
─ vida, longevidade e amizade. O primeiro deles ancora sentidos no dispositivo
AF, relacionados à prática de exercícios físicos e aos seus efeitos sobre o
organismo. Determinação e caminhar referem-se à disciplina necessária para o
cumprimento regular dessa atividade, uma das mais praticadas pelos indivíduos.
O controle do peso corporal é uma preocupação mais estética do que de saúde,
em busca da forma física, que tanto significa ter um corpo delineado quanto
disposição para enfrentar as atividades com força e vigor, características físicas
tradicionalmente masculinas, em oposição às imagens femininas de fraqueza e de
graça (BOLTANSKI, 2004). As cognições mãos, olhos e tronco formam o grupo
composto por elementos anatômicos, que faz referência às mãos como
77
instrumentos, aos olhos como visão e ao tronco como caixa torácica. Vida,
amizade e longevidade ancoram sentidos no curso da vida, mediando aspirações
subjetivas de alcançar uma vida longa cercada de amigos.
No SI, as cognições encontradas também podem ser agrupadas segundo
os sentidos compartilhados: movimento, agilidade, atividade física, braços e
pernas ─ intestino e coração ─ bem-estar, equilíbrio e postura. O primeiro
subgrupo contém elementos relacionados ao movimento corporal, à capacidade
de locomoção e de ampliação da autonomia. O segundo, juntamente a pernas,
forma o subgrupo referente às partes do corpo. Deve-se ressaltar a curiosidade
de que apenas as mulheres atribuíram sentidos de subjetividade ao coração,
também visto como órgão do sentimento. O terceiro subgrupo agrega a sensação
de bem-estar físico e psicológico simultaneamente ao equilíbrio, que guarda
sentidos de preocupação com o equilíbrio emocional, equilíbrio entre as medidas
de peso e altura e o principal deles, o equilíbrio físico, relacionado à atenção dada
à prevenção de quedas (PINHO et al., 2012). Seguido ao equilíbrio está o cuidado
com uma postura ereta, dita correta e saudável, que pode estabelecer um vínculo
com o movimento corporal, retornando-se, assim, ao primeiro subgrupo.
Dando continuidade ao processo de investigação, buscou-se explorar a
organização interna dos conteúdos representacionais através da valorização do
seu poder simbólico, realizando-se a análise de similitude. O gráfico obtido pode
ser considerado como um mapa semântico produzido por essa técnica, que
permite observar o grau de conexidade existente entre os diversos elementos. O
poder de organização, caso haja, provém dos sentidos gerados pelas cognições
centrais, aquelas que preservam a identidade em essência das RS. (Figura 3).
78
Figura 3 - Análise de similitude das evocações de corpo - Grupo masculino
Observando-se a figura 3, percebe-se a formação de três estrelas
organizadas por saúde, beleza e mente, que, dessa forma, confirmaram suas
características de centralidade. Cabeça e aparência, localizadas no quadrante
superior esquerdo, segundo a análise prototípica, não ratificaram seus atributos
de cognição central, não chegando a organizar nenhuma formação estelar ao seu
redor.
Vale frisar que é considerada uma estrela quando uma cognição une-se
simultaneamente e de forma direta a um mínimo de cinco outras (PEREIRA,
2005).
A estrela centralizada por saúde estabelece união com 15 palavras, que
podem ser arranjadas em subgrupos, a fim de facilitar a compreensão da lógica
natural do pensamento desse grupo social: mente, bem-estar, longevidade, vida e
79
amizade ─ determinação, caminhar, equilíbrio, agilidade, força e vigor ─ forma
física, peso, aparência e beleza.
À exceção de beleza e de mente, as demais cognições pertencem ao SP ─
longevidade, vida, amizade, determinação, caminhar, força, vigor, forma física e
peso ─, ou à periferia próxima ─ bem-estar, equilíbrio e agilidade. A este grupo,
pode-se adicionar o elemento aparência, que, como foi dito, não teve o seu valor
simbólico confirmado, mas agrega sentidos relativos ao corpo em forma,
adequado aos padrões aceitos atualmente, ao corpo com aparência saudável,
causando a impressão de ter menos idade do que de fato tem.
O poder de conexidade de saúde com as cognições periféricas exibe a sua
função organizadora dos conteúdos internos da RS de corpo, decorrente dos
sentidos que é capaz de gerar.
O elemento saúde ancora sentidos da saúde do corpo e da mente, sendo
algumas vezes repetida de forma adaptada a máxima latina mens sana in corpore
sano, querendo ressaltar a importância de se levar uma vida saudável e
emocionalmente equilibrada. Sobre a abrangência do conteúdo saúde, muitos
afirmam que “saúde é tudo”, englobando vários aspectos da vida, desde a
ausência de doenças, ao ânimo para a vida, à possibilidade de prolongá-la com
qualidade, vivê-la desfrutando da sensação de bem-estar físico e subjetivo.
Beleza centralizou uma estrela composta de sete cognições: saúde e vida
─ peso, forma física, agilidade, força e vigor. As duas primeiras cognições
aproximam-se de um conceito de beleza mais amplo, integrador, e pode ser
ilustrado pela seguinte fala: “não há diferença de beleza e saúde” (homem, 70).
As demais cognições abrangem categorias cujos sentidos, mais restritivos, estão
objetivamente ligados à beleza corporal.
O conceito de beleza é referido na comparação dos padrões de hoje e do
passado, havendo divisão das opiniões. Para 15,2% dos sujeitos não há
diferenças ou não quiseram responder; 22,2% disseram preferir o padrão de
beleza de 50 anos atrás, dito por sujeitos cuja idade média era de 70,3 anos, ao
passo que 62,5% (média de 72,8 anos) disseram preferir os padrões atuais,
considerados mais modernos, saudáveis, com mais recursos tecnológicos
80
disponíveis para a manutenção da beleza, associada com a forma física e a
estética corporal.
Não se pode deixar de relatar que o grupo masculino, quando se refere a
comparações entre os padrões de beleza corporal de ontem e de hoje, quase que
invariavelmente, de maneira espontânea, inconsciente, tece considerações sobre
as formas femininas.
Os pesquisados que afirmam preferir os modelos da segunda metade do
século XX acreditam que a beleza dos corpos era mais natural, valorizava-se a
beleza do rosto, a formalidade das vestes e o modo de vida mais simples, que se
refletia na beleza da época.
Há referência à eternidade do padrão de beleza, que desde os gregos
valoriza as proporções do corpo humano. Também há menção à vigente ditadura
da beleza e opiniões que compreendem esse fenômeno como o fato de tanto a
beleza quanto a saúde andarem juntas, serem dois objetivos integrados,
interdependentes, possíveis de serem alcançados simultaneamente.
“O [corpo] de hoje é muito melhor. O homem, além da saúde, procura a estética. O exercício traz beleza. (...) tá despertando o lado feminino dele, quer ser bonito e ter saúde (...). É a busca do novo homem” (homem, 71).
Mente organiza uma estrela com cinco elementos: braços e tronco ─
caminhar e equilíbrio ─ saúde, confundindo-se com cabeça, em seu sentido
anatômico, na relação com os dois primeiros elementos. Como sede do controle
sobre o corpo, mente o impulsiona disciplinadamente a caminhar com equilíbrio,
equilíbrio também necessário à saúde mental. Além disso, mente contém
significados do controle das emoções para o bom convívio social e da
preocupação com a manutenção da lucidez.
Os dados da pesquisa mostram que 81,9% dos participantes já estavam
aposentados e haviam interrompido suas atividades profissionais, enquanto
11,1%, também aposentados, ainda continuavam no mercado de trabalho. Pelo
que se pôde observar durante o trabalho de campo, ser aposentado não foi
determinante para que esses sujeitos se recolhessem às suas casas. Pelo
contrário, demonstraram ter uma agenda repleta de atividades.
81
Para se ter uma ideia, 72,2% dos investigados declararam fazer mais de
uma modalidade de AF semanal, sem que se leve em consideração outras
atividades praticadas por eles. Dessa forma, pela adoção de um estilo de vida
ativo, desfrutam de uma visibilidade social que torna compreensível que procurem
cuidar mais e melhor da própria aparência, até mesmo com finalidades de
sedução (COSTALAT-FOUNEAU et al., 2002), como se pode constatar pela fala a
seguir:
“a aparência do corpo torna o mesmo interessante aos olhos dos outros” (homem, 70).
Como se pode observar no Quadro 5, saúde configurou-se no principal
polo gerador e organizador de sentido da RS de corpo, sendo o único elemento a
confirmar centralidade tanto na amostra total quanto nos subgrupos feminino e
masculino.
Quadro 5 - Resumo da busca por indícios de centralidade de corpo
Relação de importância ≥ 50% TDN ≥ 75% Análise Similitude Confir. SC
SC tot ? fem ? mas ? fem ? mas ? tot fem mas tot fem mas
Saúde 68% S 61% S 74% S 92% S 88% S S S S S S S
Beleza 33% 38% 37% 32% 44% S S S S
Aparência 46% 60% S 36% 56% 50%
Cabeça 68% S 70% S 67% S 76% S 77% S S S S S
Mente 100% S 76% S S S
Form. Física 25% 53%
Na leitura de todo material coletado, constata-se o olhar favorável que os
sujeitos concedem ao processo de envelhecimento por que estão passando. Isso
pode ser observado pelas conotações positivas de palavras como amizade,
alegria, vida, bem-estar, disposição, movimento. Outro sinal da postura ativa que
mantêm é a referência à prática de atividades físicas e sociais e aos benefícios
biopsicossociais alcançados através delas, coerente com os resultados de
Santos, Tura e Arruda (2013). Vale acrescentar que não houve evocações de
corpo que remetessem aos aspectos negativos da velhice, embora haja algumas
poucas respostas registrando dificuldades de aceitar o envelhecimento.
Portanto, prevalecendo o otimismo e a elevada autoestima dos sujeitos ao
envelhecer, alegria (cumprindo a função de elemento periférico) parece sintetizar
82
e mediar os sentidos atribuídos ao corpo com os sentimentos de afeto
compartilhados entre os pares, nas práticas corporais vivenciadas no cotidiano.
Visando o aprofundamento da compreensão sobre o pensamento social do
grupo, realizou-se a análise prototípica relativa ao dispositivo AF, em virtude de
ser uma atividade praticada por todos.
3.1.3 A estrutura e organização das representações sociais de atividade
física.
O conjunto de evocações dos 152 participantes compôs um corpus de 555
palavras, com média de 3,65 evocações por sujeito. Para o cálculo da frequência
média por palavra e das ordens médias de evocação foram consideradas
somente as palavras cuja frequência mínima foi igual a 7, correspondendo a 75%
do total. A frequência média (Fm) foi igual a 19 e a média das ordens médias das
evocações (OME) correspondeu a 2,5 (Quadro 6).
Quadro 6 - Resultados do teste de evocação com o termo atividade física
Variáveis Idosos
Número de sujeitos 152
Número de palavras diferentes evocadas 22
Número total de evocações 555
Média de evocações por sujeito 3,65
Média das ordens médias de evocações (OME) 2,5
Média das evocações (FM) 19
Na análise inicial, pôde-se constatar que os dez elementos mais evocados ─
saúde (76), bem-estar (37), ginástica (29), disposição (28), caminhada (28),
amizade (21), corpo (21), alegria (19), determinação (16) e exercício (15) ─
corresponderam a 69,4% de todo material.
A análise com base na frequência e ordem média de evocação permitiu
evidenciar um SC composto por bem-estar, caminhada, corpo, ginástica, e saúde
e um SP composto por agilidade, alongamento, corrida, equilíbrio, força, mente,
natação e prazer.
83
Em relação à composição do SC, deve-se assinalar que somente saúde e
caminhada obtiveram escores acima de 50% quando escolhidas como palavras
mais importantes (CAMPOS, 2003), indicação de mais um indício de centralidade
destes elementos.
A composição do SP, onde predominam cognições associadas com as
práticas dos sujeitos ou com as qualidades físicas desenvolvidas por elas, revela
o processo de ancoragem dos sentidos partilhados de AF. Das oito categorias
que o compõem, sete referem-se a algum tipo de AF ou de aspectos relacionados
com as atividades corporais: alongamento, corrida, natação ─, agilidade,
equilíbrio, força, mente. Estas, qualidades físicas e mentais almejadas pelos
idosos e trabalhadas regularmente com o intuito de aprimorá-las. Além delas,
distingui-se o prazer, referido não só pela satisfação proporcionada pela prática,
como pelo convívio social com os pares (MEURER, MAZO e BENEDETTI, 2012).
Possivelmente, prazer simbolize uma síntese das ancoragens dos sentidos de AF,
diante das práticas e objetivos pretendidos pelos idosos (Quadro 7).
Quadro 7 - Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média
de evocação com o termo atividade física - Amostra total
Fm OME < 2,5 OME ≥ 2,5 Elementos f ome Elementos f ome
≥ 19
Saúde Bem-estar Ginástica Caminhada Corpo
76 37 29 28 21
1,605 2,405 1,759 2,429 2,333
Disposição Amizade Alegria
28 21 19
3,000 3,048 2,895
< 19
Determinação 16 2,250 Mente 12 2,583 Exercício 15 2,267 Alongamento 11 2,545 Musculação 15 2,267 Corrida 10 2,700 Forma física 13 2,462 Força 10 2,700 Dança 12 2,250 Natação 10 3,200 Movimento 11 2,364 Equilíbrio 9 3,111 Prazer 8 3,250 Agilidade 7 2,714
Na periferia próxima, encontram-se alegria, amizade e disposição no
quadrante superior direito e dança, determinação, exercício, forma física,
movimento e musculação no quadrante inferior esquerdo.
84
Observando-se o SI, pode-se dividi-lo em dois subconjuntos, cada um deles
correspondendo a uma dimensão distinta. Dança, exercício e musculação
correspondem a tipos específicos de AF que requerem o movimento
sistematizado para alcançar a forma física. Alegria, amizade, disposição e
determinação, com traços mais abstratos, apresentam equivalência às categorias
mais abrangentes, como bem-estar, saúde (SC), mente e prazer (SP), cujas
definições podem se tangenciar, ao remeterem a um estado subjetivo de
harmonia dinâmica entre o corpo, a mente e o ambiente social em que vivem os
sujeitos. Note-se que dança, apesar de ser uma prática física, por ter um forte
componente afetivo observado durante o trabalho de campo, também poderia
integrar o subconjunto formado por dimensões mais subjetivas.
A fim de explorar a organização interna dos elementos representacionais e
ratificar o valor simbólico dos conteúdos centrais, foi realizada a análise de
similitude para verificar o grau de conexidade entre os componentes centrais e
periféricos (AÏSSANI, 2009). Esta técnica possibilita a confirmação das funções
geradoras de sentido e, por isso, organizadoras, propriedades dos elementos
centrais (Figura 4).
Figura 4 - Análise de similitude das evocações de atividade física – Amostra
85
total
Observa-se que saúde tem conexidade com um grande número de
componentes da RS, sendo o centro da única estrela da matriz, o que corrobora o
seu valor simbólico e consequente poder organizador, característico de uma
cognição central.
As três cognições que sobressaem por estabelecerem conexões mais
densas com saúde são alegria, forma física e disposição. A partir destes
elementos, também se poderia pensar num subconjunto relacionado aos ganhos
psicológicos do investimento em saúde através da rotina da prática física,
formado tanto pelo prazer intrínseco da atividade, quanto pela alegria de se estar
em plena forma física, com disposição para a vida e o convívio com antigas e
novas amizades, muitas delas construídas recentemente, nos espaços
frequentados para esse fim (MEURER, MAZO e BENEDETTI, 2012).
Além disso, deve-se ressaltar a capacidade que sentem os sujeitos,
motivados pelos exercícios regulares, de manter e até melhorar o seu equilíbrio
mental e físico. Sobre o elemento equilíbrio, vale salientar a polissemia que
apresenta, englobando as dimensões física e mental e muito valorizado pelos
sujeitos, haja vista a preocupação demonstrada por eles em evitar quedas e
conservar os seus níveis atuais de lucidez e consciência. Afora isso, remete à
sensação de harmonia que os exercícios provocam, em busca de um incremento
na sua qualidade de vida (LOJUDICE et al., 2010, PINHO et al., 2012, SANTANA,
2010).
Foi encontrado um único triângulo, constituído por bem-estar, saúde e
determinação. Essa configuração é uma das formas de esquemas que aparecem
no mapa cognitivo, detalhando determinadas relações, sendo eles o fundamento
dos processos mentais das informações recebidas e parte integrante das
representações elaboradas socialmente (PEREIRA, 2005). Nesse caso, pode
significar a sensação de bem-estar alcançada, como um benefício pelo esforço
empreendido e a determinação necessária para interagir com o objeto de
representação, somente possível quando se está com saúde.
86
Ao justificarem a escolha das palavras mais importantes, consideraram
fundamental ter disciplina, entendida como determinação, para atingir um estado
de bem-estar, nele incluídas suas preocupações relativas à qualidade de vida:
“Sem determinação não se faz nada” (homem, 66).
“Bem-estar é a satisfação de fazer a ginástica, é o resultado” (homem, 81).
“(...) atividade física proporciona o melhor condicionamento físico para ter qualidade de vida” (mulher, 71).
Afirmaram também ser preciso empenhar-se nesse tipo de comportamento,
para criar o hábito de exercícios físicos regulares, costume que 30,9% disseram
cultivar desde quando estavam na escola. Vale ressaltar que 33,6% responderam
que iniciaram após os 60 anos.
“Se tiver disciplina para fazer ginástica e ter uma vida regrada, vai ter saúde” (homem, 78, praticante desde a infância).
“Porque faço tudo por isso, para melhorar a saúde e porque acho que a pessoa tem que ter força de vontade para vir todo dia” (mulher, 68, iniciou na terceira idade).
Aqui, deve-se lembrar a relevância da AF na busca da autonomia para os
afazeres da vida diária, que engloba equilíbrio, agilidade e flexibilidade, ampliando
os movimentos. Essa busca também produz satisfação e a sensação de bem-
estar proveniente dos exercícios e do condicionamento físico progressivamente
adquirido.
O subconjunto formado por agilidade, exercício, corpo, movimento, força e
saúde, conteúdos relacionados aos resultados alcançados com as AF, configurou-
se imprescindível para a manutenção das atividades diárias que necessitam do
movimento corporal suficientemente preservado (CARADEC, 2011; FERREIRA et
al., 2010).
“Porque isso me faz abaixar a pressão e me dá força corporal” (mulher, 79).
“Quando uma pessoa pratica exercício ela tem mais agilidade e, com agilidade, mais segurança para andar, para subir no ônibus, se desviar das mochilas etc.” (mulher, 85).
87
Uma observação interessante proporcionada pela análise de similitude é o
fato de os diversos tipos de AF ─ alongamento, dança, corrida, musculação,
ginástica e natação ─, direta ou indiretamente, estarem organizados em torno de
caminhada ─ elemento com alguns atributos de centralidade ─ num conjunto sem
conexão com a estrela em torno de saúde, sugerindo a existência de um processo
de mudança na representação estudada.
A prática de AF é valorizada pelos idosos, por todos os benefícios que traz,
associando-se à saúde, não só do corpo, mas também como um dispositivo a
acionar para manter a mente saudável, preservar a memória e estimular a
inteligência, além de ajudar a afastar a depressão e a tristeza, por serem
atividades divertidas e prazerosas, feitas em grupo. O convívio social é
considerado importante porque lhes dá suporte emocional para querer viver mais
e com qualidade os anos de velhice que ainda têm pela frente.
Essa interpretação corrobora estudo de Hernandez et al. (2010) a respeito
dos benefícios da AF sobre as funções cognitivas dos idosos, ao identificarem
associação com agilidade e equilíbrio, atributos avaliados em um programa
sistemático de seis meses de duração. Em levantamento na literatura realizado
por Guerra e Caldas (2010), encontrou-se que a participação social, decorrente
de um estilo de vida ativo, é capaz de reduzir o declínio cognitivo na velhice, o
que é corroborado por Ferreira et al. (2010) ao relatarem os sentidos que unem os
idosos ativos a atividades físicas e lazer, cujos discursos fazem referência às
formas positivas de se envelhecer, sobressaindo palavras como bom, felicidade,
alegria, diversão, saúde. Além disso, essas atividades podem remeter à ocupação
do tempo livre visando gozar a vida, assim como escapar da solidão.
Neste estudo, 92,8% dos sujeitos apresentaram uma visão favorável da
velhice, explicitando a relação entre envelhecimento ativo com a independência
funcional, como ilustra o comentário sobre o envelhecimento bem-sucedido:
“Ter saúde. Ser independente e viver bem tendo sempre o exercício físico e boa alimentação” (mulher, 60).
Apesar da idade e embora não seja o principal interesse expressado, sobre
os motivos que os levaram a fazer AF, não deixaram de mencionar os cuidados
88
com a silhueta corporal, através do controle do peso, do alcance e da
manutenção da forma física:
“Foi a preocupação que sempre tive de manter o peso. Comecei depois que tive filho, há uns 35 anos atrás” (mulher, 65).
“A necessidade de ficar mais em forma, de ficar mais bem com a vida” (homem, 72).
Da mesma maneira, a preocupação com a estética é observada ao
elencarem as razões para as escolhas das modalidades que praticam ou o que
mais os motiva a continuar praticando:
“A vontade de melhorar a estética” (homem, 84).
“A saúde, o desenvolvimento sexual e a beleza estética também” (homem, 60).
Ao caracterizarem alguém maior de 60 anos e ainda com o corpo em forma,
mantiveram a associação entre forma física e estética corporal, sem esquecer a
importância da saúde:
“Ah! Esse cara tá em forma, tá preocupado com a saúde” (homem, 65).
“Você tá inteiro, tá conseguindo manter sua forma, sem barriga” (homem, 69).
Assinalam que ficam orgulhosos pelos elogios recebidos diante da forma
física que apresentam:
“A opinião de meus amigos é que eu mantenho sempre uma alegria infinita e ‘continua elegante’. Este elogio massageia meu ego” (mulher, 60).
“Todos admiram (...). É bom as pessoas dizerem: pô, você tá bem cara! É a recompensa pelas atividades, pelo sacrifício” (homem, 77).
Tais afirmações expressam a atenção que conferem à valorização da
aparência e à satisfação com a própria imagem, sentidos que também relacionam
com a saúde.
Tem sido relatada a construção de RS da velhice em oposição à juventude,
contendo os estereótipos característicos associados às respectivas imagens.
Enquanto ao velho são agregados aspectos negativos como doença, fraqueza,
feiura, ao jovem são atribuídas qualidades como saudável, forte e belo (CRUZ e
FERREIRA, 2011; FERREIRA et al., 2010). São sentidos mais amplos,
89
duradouros e podem acabar apreendidos pelos idosos, num processo de
internalização de preconceitos existentes contra eles.
Como as RS são forjadas e compartilhadas nas relações sociais e na
comunicação, desde as mais abrangentes às circunscritas aos grupos e em
consonância com as histórias individuais, estes sujeitos, por serem idosos ativos,
independentes e praticantes regulares de AF, parecem ter ancorado às suas RS
preocupações estéticas não encontradas em outros grupos pesquisados. Isso
pode ser visto, não só pelas falas anteriormente descritas, em que os sujeitos
externam o valor que dão à aparência física, como pela presença dos elementos
periféricos forma física e corpo, podendo ser compreendidos como determinantes
no processo de ancoragem daquelas preocupações, através das experiências
pessoais dedicadas aos esforços para a construção e manutenção de um corpo
em forma, ainda capaz de exercer a sedução:
“(...) a gente tem que melhorar o corpo físico, tem que ficar gostosa! Sem barriga, sem estômago, saradinha, bem torneadinha. Porque uma mulher de 60, 65 anos hoje, é jovem” (mulher, 62).
Essa atitude afirmativa soa como uma tomada de posição diante da imagem
estigmatizada da velhice que, para a grande maioria dos participantes da
pesquisa, parece servir como um fator de motivação para que eles atestem a sua
vitalidade, assim como suas potencialidades, provavelmente porque não se
percebam velhos e sim adultos que já ultrapassaram os 60 anos, negando a
velhice estereotipada e os preconceitos sociais a ela imputados (GUERRA e
CALDAS, 2010; SANTOS, TURA e ARRUDA, 2013).
É de se ressaltar a ausência de categorias com sentidos negativos nas RS
construídas. Os sujeitos, apesar da idade, são todos funcionalmente
independentes e, em sua maioria, fazem dos locais das práticas um ponto de
encontro onde exercem a sociabilidade e o sentimento de pertença ao grupo. O
aparecimento de palavras como velhice, doença e quedas está mais associado a
um sentido preventivo, para o qual a prática de AF é tida como relevante e, por
isso, servem de guia para o desenvolvimento de atitudes e práticas a fim de
retardar os efeitos deletérios do envelhecimento e de procurar conservar a
juventude que ainda nutrem dentro de si.
90
Na análise global do corpus investigado, sobressaiu o interesse
demonstrado pela estética corporal de forma mais acentuada do que era
esperado, sem, contudo, suplantar as preocupações com saúde, autonomia e
independência. Talvez essa preocupação seja coerente com a postura dos
integrantes da categoria terceira idade, que buscam, além de novas
oportunidades de lazer, convívio, aprendizagem, práticas e cuidados, novas
experiências, novos relacionamentos afetivos, quem sabe indicando um
movimento de mudança nas representações estereotipadas da velhice.
Quadro 8 - Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média
de evocação com o termo atividade física - Grupo feminino
Fm OME < 2,5 OME ≥ 2,5 Elementos f ome Elementos f ome
≥ 9
Saúde Ginástica Musculação Exercício Corpo
34 20 11 9 9
1,353 1,500 2,2732,1112,222
Bem-estar Caminhada Disposição Amizade Alegria
17 14 11 11 9
2,706 2,643 2,909 3,091 3,111
< 9
Determinação Memória
8 4
2,000 2,250
Corrida Alongamento Agilidade Força Forma física Natação Do-lar Respiração Mente Prazer Lazer Movimento
7 6 6 6 5 5 4 4 4 4 4 4
3,000 2,500 2,667 2,667 2,600 3,000 2,500 2,750 3,000 3,250 3,500 3,500
O TEP feminino com o termo indutor atividade física gerou 274 evocações,
com a média de 3,43 evocações por participante (N = 80). Foram consideradas
palavras com frequência mínima igual a quatro, correspondendo a 24 palavras
diferentes, que produziram 216 evocações, representando 78,8% do corpus
feminino.
A frequência média (Fm) das categorias foi igual a 9 e a média das ordens
médias de evocação (OME) igual a 2,5. Em sequência, essas categorias foram
distribuídas no gráfico de dispersão (Quadro 8), conforme esses critérios.
91
A hipótese inicial que fundamenta essa distribuição é a de que as
cognições localizadas no quadrante superior esquerdo componham o SC da RS,
por terem sido evocadas mais rápido do que as outras (abaixo da média), além
terem obtido uma frequência importante, igual ou superior à média. Em outras
palavras, mostraram-se salientes tanto na dimensão individual (ome - ordem
média de evocação), quanto na coletiva (frequência).
Dois procedimentos foram adotados posteriormente, com a finalidade de
prosseguir investigando indícios de centralidade das cognições, nesse primeiro
momento consideradas pertencentes ao SC.
Inicialmente, verificou-se a importância relativa de cada uma dessas
palavras para os sujeitos, comparando proporcionalmente a sua frequência com o
número de vezes em que foram indicadas como as mais importantes. Considera-
se como um indício de centralidade quando essa relação for maior ou igual a
50%, isto é, quando em mais da metade das vezes em que foi evocada, foi
indicada como uma das mais importantes. De acordo com esse critério, somente
musculação (36%) não atingiu a proporção mínima considerada, o que não
ocorreu com as demais palavras: corpo (56%), ginástica (55%), exercício (56%) e
saúde (97%).
Corpo, como objeto técnico necessário para a prática física (MAUSS,
2003), parece mediar a preocupação das participantes com a saúde, localizando
essa preocupação no físico, instrumento a ser utilizado nos exercícios.
Posteriormente, realizou-se o TDN, ocasião em que se espera alcançar
uma proporção mínima de 75%, num intervalo de confiança de 95%, de refutação
ao questionamento da essencialidade das cognições supostamente centrais (SÁ,
2002).
Os resultados desse teste produziram indícios de centralidade às
cognições corpo (82%), exercício (87%) e saúde (97%).
O próximo passo foi a confirmação através da análise de similitude, em que
é possível se ter uma imagem gráfica da localização e das associações feitas
pelas cognições, em termos de coocorrências. Mais importante é a observação da
capacidade dessas cognições de organizarem as demais, seu grau de
92
conexidade com os elementos periféricos, tudo isso decorrente da relevância
simbólica conferida a essas categorias, pelas participantes da pesquisa.
Figura 5 - Análise de similitude das evocações de atividade física - Grupo
feminino
A figura 5 mostra o mapa de similitude das RS femininas de AF, com as
diferentes cognições que a constituem. Duas únicas estrelas sobressaem: as
organizadas por saúde e por ginástica, exibindo o poder simbólico desses
elementos. Saúde organiza a estrela, estabelecendo conexões com: bem-estar,
disposição, mente, determinação, corpo, movimento, forma física, força, agilidade,
lazer, prazer, alegria e amizade. O pensamento natural envolvido nessas
associações poderia ser a consciência das respondentes de que o desejo de
alcançar o bem-estar e de ter disposição dependeria de uma atitude mental
determinada para colocar o corpo em movimento, em busca da forma física e de
capacidades que ampliem a autonomia, como força e agilidade. Essas atividades
dão prazer, alegria, são momentos de lazer em que novas amizades são
cultivadas. Deve-se assinalar que, para essas idosas, a expressão forma física
está mais fortemente associada à forma do corpo, do que com a ideia de um
93
corpo bem condicionado fisicamente.
Ginástica, sem conexão direta com saúde, é o centro da outra estrela
formada com as cognições: corrida, natação, caminhada, musculação, do-lar
(contém as referências aos serviços domésticos) e memória. Memória foi
lembrada como um benefício atribuído à prática de exercícios, como explicita o
triângulo ginástica – memória – do-lar. Segundo informações colhidas depois,
ginástica (67,5%), musculação (61,2%) e caminhada (33,7%) são as modalidades
mais praticadas, de acordo com o que declararam as pesquisadas. Curioso foi o
aparecimento do elemento do-lar, lembrado não só como uma atividade que
requer esforço físico, mas pelos benefícios que a ginástica traz para o bom
desempenho dos afazeres domésticos.
Essas duas estrelas estão ligadas por agilidade, no alto, e respiração, em
baixo, evidenciando o papel dinâmico e contínuo dos esquemas periféricos como
interface entre o SC, saúde e ginástica, e as trocas sociais diárias, vivenciadas na
periferia da RS (TURA, CARVALHO e GAZE, 2012).
As associações de maior densidade de saúde são com mente, alegria,
lazer, forma física e disposição, as duas últimas cognições podendo ser
interpretadas como complementares, sendo que disposição assume a conotação
do estado de se sentir bem condicionado, fisicamente em forma.
Três triângulos adjacentes, com um vértice em comum, saúde, são
completados por corpo e mente, mente e movimento e por movimento e bem-
estar. Esses três triângulos unidos podem ser integrados em um círculo
constituído pelos cinco elementos, aproximando os sentidos atribuídos à AF, ao
bem-estar físico e mental provocado pela prática do movimento corporal regular e
sistematizado.
O subconjunto organizado por ginástica agrupa categorias diretamente
relacionadas à AF ou aos efeitos favoráveis que provoca na vida dessas idosas.
Outra cognição que aparentemente está deslocada é memória,
componente mencionado somente pelas participantes, mas justificado em razão
da melhora que sentem quando praticam regularmente suas atividades de
escolha. Esse achado da pesquisa está de acordo com estudos sobre a influência
94
positiva da prática de AF sobre as funções cognitivas do idoso (HERNANDEZ et
al., 2010).
Sobre os significados de ginástica e exercício, a matriz de similitude deixa
visível o sentido mais amplo de ginástica do que de exercício, constituindo-se em
uma categoria abrangente. Convém assinalar que, dos elementos a que está
vinculada diretamente, sobressaem duas ligações mais densas, com natação e
corrida, corroborando a interpretação polissêmica de que, para as idosas, essas
seriam duas maneiras importantes de se fazer ginástica.
No processo de observação, foi constatado que é muito mais frequente a
presença de mulheres do que de homens nos ambientes destinados às aulas de
ginástica. Dessa forma, devido ao contato frequente com essa atividade, torna-se
compreensível o uso dessa cognição como uma categoria abrangente.
Provavelmente por terem um histórico de proximidade com esse tipo de
aula, as participantes reduziram os sentidos mais amplos de AF na figura da
ginástica, ou seja, objetivaram, conforme Moscovici (2012), as diversas formas de
AF na ginástica.
Quadro 9 - Distribuição dos elementos segundo frequência e ordem média
de evocação com o termo atividade física - Grupo masculino
Fm OME < 2,5 OME ≥ 2,5 Elementos f ome Elementos f ome
≥ 11
Saúde Bem-estar Caminhada Corpo
42 20 14 12
1,810 2,150 2,214 2,417
Disposição
17 3,059
< 11
Dança Forma física Ginástica Mente Movimento
9 9 9 8 7
1,889 2,444 2,333 2,375 1,714
Alegria Amizade Determinação Equilíbrio Exercício Manutenção Alongamento Futebol Natação
10 10 8 6 6 6 5 5 5
2,700 3,000 2,500 2,833 2,500 2,667 2,600 3,400 3,400
O quadro 9 expõe os resultados da análise prototípica, feita a partir das
evocações dos participantes do estudo, desencadeadas pelo termo indutor
atividade física.
95
Das 281 palavras evocadas pelos 72 respondentes, foram analisadas 208,
com frequência mínima igual a 5, o que correspondeu a 75% do corpus produzido
a partir do TEP. Os sujeitos evocaram em média 3,9 palavras e todos
mencionaram, ao menos uma vez, uma das 19 palavras diferentes distribuídas no
Quadro 9, segundo sua frequência e ordem média de evocação.
As dez categorias com as maiores frequências ─ saúde, bem-estar,
disposição, caminhada, corpo, amizade, alegria, ginástica, forma física e dança ─
perfizeram 73% das 208 selecionadas para a análise.
As cognições localizadas no quadrante superior esquerdo ─ saúde, bem-
estar, caminhada e corpo ─, provavelmente componentes do SC por terem sido
evocadas mais prontamente e com uma frequência acima da média, podem ser
articuladas como significando o objetivo de se alcançar a saúde e o bem-estar
através de atividades corporais como a caminhada, atividade que 45,8% disseram
praticar.
O SC guarda o núcleo de sentidos da RS e está ligado às tradições e ao
consenso coletivo. Dando sequência à investigação com o intuito de perscrutar se
essas cognições supostamente centrais guardam relação com a história social do
grupo, primeiramente verificou-se o grau de importância dessas palavras para os
sujeitos, comparando a frequência de cada uma ao número de vezes que foram
escolhidas como as mais importantes. Para essa relação ser favorável, espera-se
uma proporção de 50% ou mais. No caso em análise, apenas caminhada (71%) e
saúde (83%) atingiram esse objetivo.
A seguir, procedeu-se à realização do TDN, em que se considera a
existência de um indício de centralidade, quando houver ao menos 75% (p<0,05)
de respostas de dupla negação ao questionamento de cada categoria inicialmente
identificada como central. O resultado do TDN apontou que saúde (94%), bem-
estar (88%) e corpo (79%) ultrapassaram a proporção esperada (Quadro 10).
Mais adiante, poder-se-á confrontar esses resultados com o mapa cognitivo
produzido pela análise de similitude, onde é possível visualizar a organização
interna dos conteúdos da RS, hierarquizada a partir dos seus elementos centrais.
96
O SP possui características opostas ao SC por reunir elementos com
frequências abaixo da média, lembrados posteriormente às primeiras evocações.
É através deste sistema que acontecem as interações comunicativas cotidianas,
capazes de gerar novos sentidos a serem incorporados às RS, alterando seus
conteúdos e, consequentemente, sua estrutura organizacional.
Este sistema pode ser compreendido como o que congrega elementos
atuantes no processo de novas ancoragens. Neste caso, alegria e amizade
podem exercer a função de contribuir para a ancoragem de conteúdos
socioafetivos. Determinação refere-se à disciplina, à força de vontade necessária
para dar continuidade às práticas físicas, a fim de manter a saúde e o físico em
bom estado, evitando o sedentarismo. Equilíbrio, exercício, alongamento, futebol
e natação reúnem exemplos concretos de exercícios físicos, praticados no
passado ou no presente, além de uma qualidade física que recebe bastante
atenção dos idosos, o equilíbrio. Vale acrescentar que equilíbrio, além de
transportar o sentido de equilíbrio físico, considerado o mais importante, também
significa equilíbrio emocional e corporal.
“Equilíbrio em função das calçadas, o velho levar tombo é um problema sério” (homem, 77).
“Porque a pessoa estando bem, ela se projeta de uma maneira mais eficaz para conseguir a felicidade e o equilíbrio faz parte desse processo” (homem, 69).
Nos quadrantes superior direito e inferior esquerdo encontra-se a periferia
próxima ou SI. Palavras lembradas rapidamente por um número não significativo
de pessoas e, inversamente, lembradas por muitos, porém, tardiamente. Reflete a
possível instabilidade da RS pela proximidade ao SC, podendo, eventualmente,
de acordo com a dinâmica representacional, assumir algumas características de
centralidade.
Seus conteúdos: dança, ginástica, movimento e forma física estão
diretamente associados ao objeto deste recorte do estudo, o dispositivo AF.
Disposição, categoria com elevada frequência, refere-se a uma atitude mental
positiva, mas, notadamente, à vitalidade e energia desenvolvidas através dos
exercícios físicos.
97
Dando sequência à investigação dos conteúdos centrais, procedeu-se à
análise de similitude, conforme a Figura 6.
Figura 6 - Análise de similitude das evocações de atividade física - Grupo
masculino
Esse grafo é composto por elementos constituintes das RS de AF da
amostra masculina. De imediato, percebe-se um esquema triangular, formado por
saúde, bem-estar e alongamento, identificando-se quatro estrelas centralizadas
por saúde, exercício, caminhada e bem-estar. Dessa forma, saúde, pelas
conexões que faz e pelo poder de organizar a estrutura, provenientes do seu valor
simbólico para os sujeitos, confirma-se como o principal elemento componente do
SC das RS de atividade física, juntamente a caminhada e bem-estar. Com isso,
essas cognições demonstram estar presentes no pensamento social dos
indivíduos, mostrando-se simbolicamente consensuais.
Os participantes referem-se à saúde como consequência natural da prática
de AF ─ alongamento, exercício, movimento, forma física ─, buscam a AF como
uma forma de cuidado com a saúde ─ manutenção, corpo, mente ─, pensam em
longevidade, qualidade de vida ─ bem-estar ─, fazem associações com alegria,
98
felicidade, autonomia, com a convivência entre amigos ─ alegria, disposição,
amizade ─ o que justifica a sua intensa ligação com amizade na matriz de
similitude.
Ao se dividir a árvore produzida pela análise de similitude, prolongando-se
a linha que une saúde a exercício, verificam-se dois subconjuntos com
características distintas.
No subconjunto inferior encontra-se a estrela organizada por caminhada,
que, além de exercício, reúne as modalidades de AF citadas pelos idosos ─
ginástica, futebol, natação e alongamento ─ com exceção de dança, à qual está
ligada indiretamente. À direita dessa estrela encontram-se categorias mais
amplas, mas ainda referenciadas às características psicomotoras e ao
condicionamento físico (movimento, disposição, forma física). Com um caráter
psicossocial mais enfático, têm-se alegria e amizade, provavelmente fazendo
referência à alegria do convívio e às amizades construídas nos espaços
destinados a essas atividades em grupo.
Na parte superior encontra-se a estrela organizada por bem-estar,
cognição diretamente associada a saúde, equilíbrio, exercício, determinação e
alongamento, numa alusão mais direta ao bem-estar físico proporcionado pelas
atividades praticadas. Neste subconjunto estão presentes conteúdos que podem
remeter aos benefícios da AF, como a manutenção da saúde do corpo e da
mente, a obtenção do equilíbrio em seu sentido polissêmico, assim como a
conquista da sensação de bem-estar. Mas, para que isso aconteça, é preciso ter
determinação, entendida como disciplina, para o pleno exercício da prática física
regular.
Assim, caminhada organiza as modalidades de AF e bem-estar faz a
mediação entre as práticas físicas e os seus benefícios.
A estrela centralizada por exercício (SP) sobressai pelo número de
conexões que estabelece e por reunir em torno de si cognições ligadas ao objeto
de RS, ao qual se assemelha pelos sentidos partilhados: corpo, movimento, forma
física, dança, ginástica, caminhada e alongamento ─ determinação, disposição,
manutenção, bem-estar, alegria e saúde.
99
Um aspecto teoricamente interessante a ser considerado com relação a
esta categoria periférica, é o fato de desempenhar um importante papel na
organização da RS, corroborando o conceito da interdependência entre SP e SC
na complementaridade estrutural das RS (PEREIRA, 2005; SANTOS, TURA e
ARRUDA, 2011).
Segundo Pereira (2005), as formações triangulares representam esquemas
mentais organizados no nível da consciência, diferentemente dos círculos (a partir
de quatro elementos), cuja associação é estabelecida inconscientemente. Os
esquemas ajudam a detalhar nuances das RS, sendo a base das ações mentais
para o processamento dos novos conteúdos apreendidos, também fazendo parte
da própria RS.
Ao pensar em AF, os sujeitos especificaram várias relações a partir de
esquemas mentais já existentes, como, por exemplo, a conexão triangular entre
saúde, corpo e mente, ou seja, ao ouvirem o termo indutor AF, logo o associaram
à saúde física e mental. Outro exemplo seria: para alcançar o bem-estar, é
necessário ter determinação para praticar exercícios.
Esse processo individual esquemático pode ser observado no mapa de
similitude, já como uma produção coletiva. Se a princípio os indivíduos pensam
por esquemas, assim como os indivíduos, os esquemas também fazem parte de
um conjunto maior, que vem a ser o pensamento social. E o pensamento
socialmente elaborado sobre um objeto, constitui-se na RS desse objeto.
Ao todo, o mapa cognitivo apresenta 23 triângulos, todos eles contendo
saúde, ou exercício, ou as duas categorias ao mesmo tempo. Dos 42 círculos
encontrados, 41 deles são compostos por ao menos uma dessas cognições.
Pelo que se pôde depreender, existe uma grande afinidade, no interior da
RS, entre saúde, caminhada, bem-estar e o dispositivo AF, expressada pelos
sentidos partilhados por exercício. Desse modo, revela-se a simbiose existente,
produto da difusão midiática, entre o objeto de RS e a própria RS, observando-se,
ainda, que a categoria exercício demonstrou-se abrangente para o grupo
masculino, da mesma forma que ginástica o foi para o grupo feminino.
100
Quadro 10 - Resumo da busca por mais indícios de centralidade de atividade
física
Relação de importância ≥ 50% TDN ≥ 75% Análise Similitude Confir. SC
SC tot ? fem ? mas ? fem ? mas ? tot fem mas tot fem mas
Saúde 89% S 97% S 83% S 97% S 94% S S S S S S S
Bem-estar 30% 35% 88% S S S
Caminhada 64% S 71% S 56% S S
Corpo 38% 56% S 25% 82% S 79% S
Ginástica 45% 55% S 50% S S
Exercício 56% S 87% S
Musculação 36% 32%
Com base no exposto e considerando-se todas as possibilidades realizadas
de verificação de centralidade das cognições inicialmente consideradas centrais,
tanto das evocações de corpo quanto das de AF, assim como na amostra total e
nos subgrupos feminino e masculino, constatou-se que o elemento saúde foi o
único a ratificar a sua essencialidade em todas as oportunidades examinadas
(Quadros 5 e 10).
Desse modo, inspirando-se na afirmação feita por Moscovici na sua obra
fundadora, de que o “complexo é o símbolo da psicanálise” (MOSCOVICI, 2012,
p. 221), pode-se dizer, que a saúde é o símbolo tanto do corpo quanto do
dispositivo utilizado por todos os sujeitos da pesquisa, a atividade física.
Segundo a teorização desse autor, o símbolo faz o elo entre o discurso
difundido da ciência e a linguagem comum, fundamentada nos themata
circulantes, os quais contribuem para os processos de nomeação e classificação
das novas experiências, isto é, para os processos de ancoragem. Por outro lado,
o símbolo sintetiza essa ligação em imagem, objetivando o que se quer
apreender.
Em suma, de acordo com o detalhamento dos resultados encontrados a
partir da abordagem estrutural, pode-se dizer que saúde seja a própria
objetivação de corpo e de atividade física para os sujeitos da pesquisa, a imagem
com que eles os representam socialmente, ancorando-os a saberes reificados
disponíveis e já transformados pelas interações, como se pôde notar nas falas
produzidas. Foram relatos, entre outros, a respeito dos cuidados dispensados ao
corpo, em que se evidenciou o valor da AF como dispositivo utilizado
101
estrategicamente, principalmente em três vertentes de viabilização: a da saúde, a
da estética corporal e a da sociabilidade. Além disso, pela dinâmica da vida, cada
uma delas pode assumir uma importância relativa, em função das especificidades
do momento, analogamente ao recurso de se lançar mão de diferentes
racionalidades coexistentes na sociedade.
Admite-se que os participantes submetam seus corpos a essas atividades
com objetivos variados, cuja importância de cada um deles também é variável,
conforme foi possível perceber, até aqui, no curso da investigação, o que remete
à heterogeneidade do processo de envelhecimento (NERI, 2006).
Certo é que, independentemente do valor conferido à beleza do corpo, ao
uso social da aparência, ao exercício da sociabilidade, ao prazer de viver, o
sentido de corpo e de atividade física que foi mais amplamente compartilhado
pelos sujeitos foi saúde, aí incluídas as preocupações com as capacidades
funcionais e com a saúde mental.
A seguir, examinar-se-ão as entrevistas em profundidade, oportunidade em
que seus achados serão triangulados com a observação realizada e os resultados
produzidos pelo questionário.
3.2 Abordagem processual: representações sociais de corpo
Análise das entrevistas com base nos resultados obtidos através do
processamento do corpus pelo programa IRaMuTeQ - Interface de R pour les
Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (CAMARGO e
JUSTO, 2013; RATINAUD e LOUBÈRE, 2014).
3.2.1 Descrição dos sujeitos
Foram entrevistados 27 praticantes regulares de algum tipo de atividade
física (AF), sendo 14 mulheres (52%). A idade variou entre 60 e 89 anos, a média
encontrada foi de 69,1 anos, a mediana, 69 anos, e a moda, 60 anos. Nesse
102
conjunto, 24 sujeitos já estavam aposentados e, destes, seis continuavam a
trabalhar, mesmo que não em tempo integral. Apenas quatro participantes
(somente um homem) disseram ser viúvos e a maioria (12) declarou-se casada. O
nível de escolaridade predominante foi o superior (48%), seguido pelo ensino
médio (33%).
Os locais de moradia com as maiores frequências foram as zonas norte
(52%) e sul (33%) da cidade. Esta descrição está de acordo com a amostra da
abordagem estrutural.
3.2.2 Resultados e análise da classificação hierárquica descendente -
CHD
Durante o processamento do corpus, o IRAMUTEQ identificou as 27
entrevistas como sendo os textos ─ as unidades de contexto inicial ─ a serem
analisados e os dividiu em 710 segmentos de texto (ST) ─ as unidades de
contexto elementar ─ compostos por 3134 formas (palavras) distintas. Em
seguida, essas formas foram lematizadas automaticamente, gerando 2129
lexemas (unidades léxicas).
O processo de lematização consiste em colocar os verbos no infinitivo e as
palavras no masculino singular (CHARTIER e MEUNIER, 2011). Do total de 710
ST, o programa classificou 612 segmentos (86,20%), que foram separados em
seis diferentes classes, de acordo com a classificação hierárquica descendente
(CHD) realizada. Nesta classificação, o corpus sofre sucessivas partições
segundo as semelhanças e diferenças de vocabulário entre os ST existentes. A
CHD visa agrupar em classes os ST cujo vocabulário é parecido entre si, mas
diferente do vocabulário dos ST das outras classes a serem constituídas, sendo o
objetivo a formação de classes lexicais que expressem modos diferentes de
atribuição de sentido a um determinado objeto de estudo (CAMARGO, 2005;
KRONBERGER e WAGNER, 2010).
Em outras palavras, o uso de um vocabulário peculiar fornece informações
específicas não só sobre a origem sociocultural de quem fala, como a respeito
103
dos diferentes modos de apreensão de um determinado objeto (PALMEIRA,
QUEIROZ e FERREIRA, 2013).
O grau de ligação de uma palavra com a classe à qual pertence é expresso
através do qui-quadrado (X²) relativo à palavra e utilizado como critério de
valoração da associação existente. Por essa técnica, quanto maior o X², mais
significativa a relação entre a palavra e a classe, quer dizer, é mais comum
encontrá-la na classe considerada e mais improvável a sua presença nas outras
classes da partição.
Após esse procedimento, o próximo passo é a categorização/nomeação
das classes encontradas. Para isso, buscam-se identificar as formas com os
traços mais característicos, mais salientes em relação às outras, e que melhor
representem em seu conjunto a ideia exprimida através de cada uma das classes.
As formas foram selecionadas de acordo com o seu valor simbólico para o
contexto semântico da respectiva classe e por sua força de associação com a
classe, representada pelo valor do X² que lhe foi atribuído. Os valores
considerados foram superiores a duas vezes o mínimo estabelecido ─ 3,84 ─,
para que se diminuísse a chance de erro nessa associação (CAMARGO, 2005;
GOETZ et al., 2008).
Essas são indicações utilizadas na tentativa de se reconhecer o valor
simbólico de cada forma, levando-se em consideração tanto seus atributos
quantitativos, quanto a importância do seu significado na relação do sujeito com o
objeto de representação, e revelado no interior dos contextos discursivos
(CHARTIER e MEUNIER, 2011; LAHLOU, 2012).
Auxilia nesse processo de nomeação ter em mente princípios da Teoria
das Representações Sociais (TRS), como o de que toda a RS é a representação
de alguém sobre algum objeto e de que as RS são elaboradas diante de normas,
valores, afetos, crenças, atitudes, práticas partilhadas por indivíduos e grupos,
construídas e difundidas através da comunicação (ARRUDA, 2005; CRUZ e
FERREIRA, 2011; JODELET, 2001; MOSCOVICI, 2012).
Portanto, podem estar presentes no material discursivo em análise, ao lado
de teorias elaboradas pelos participantes a respeito da imagem de um corpo ideal
ou do próprio corpo em processo de envelhecimento. De como se utilizam do
104
dispositivo AF na construção corporal, se é que utilizam, dando indícios das
relações que estabeleceram entre esses objetos, a partir da sua experiência de
vida e sob inúmeras e ininterruptas mensagens midiáticas e sociais sobre esse
tema e suas implicações.
Uma vez que os dados foram produzidos através da triangulação
metodológica e devido ao volume de material obtido tanto a partir da observação,
quanto dos questionários e das entrevistas, optou-se por não se restringir a
análise aos ST classificados pelo IRAMUTEQ. Esses ST (RATINAUD e
LOUBÈRE, 2014) foram utilizados como um guia inicial para se fazer o caminho
do mundo semântico representado pelo corpus processado, ao discurso mais
abrangente construído pelos indivíduos, procedendo-se a uma triangulação
também na análise dos dados, a fim de se tentar alcançar a complexidade do
pensamento social, sem se reduzir a complexidade da linguagem (MARKOVÁ,
2003). Além disso, acreditou-se que o estudo ficaria mais consistente se
procurasse articular todo o material reunido ─ a partir das observações de campo
e dos instrumentos para a produção de dados textuais ─ durante as necessárias
idas e vindas entre as hipóteses interpretativas e os resultados obtidos através
dos programas e da categorização temática (MADIOT e DARGENTAS, 2010).
De início, na primeira partição do corpus, o subconjunto que deu origem às
classes 1 e 2 foi destacado do restante. Essas duas classes formam o eixo cujo
polo de atração é o dispositivo AF. O valor do X² correspondente a cada forma
encontra-se entre parênteses, logo após a respectiva palavra.
A classe 1, ATIVIDADE FÍSICA e SOCIABILIDADE, foi composta por 81
ST (13,24%), sendo destacadas as seguintes formas para caracterizá-la: jogar
(163.76), tênis (106.27), esporte (92.73), futebol (66.64), vôlei (39.72), praticar
(34.06), hidroginástica (33.14), turma (32.39), gosto (29.98), natação (25.93),
amigo (24.01), musculação (18.45), dança de salão (17.13), conviver (15.06).
Para a construção desta classe contribuíram, principalmente, indivíduos do
sexo masculino, moradores da zona sul da cidade, com nível médio de
escolaridade e divididos entre a faixa etária mais nova (60 a 69 anos) e a mais
velha (80 a 89). Congrega os discursos dos sujeitos que dizem praticar algum tipo
de atividade há muitos anos.
105
Dentre elas, destacou-se o esporte tênis. Vale ressaltar que essa
modalidade desportiva também é utilizada, conforme o avanço da idade, como
uma prática compensatória, não somente em função do menor esforço físico
empregado em relação a outras modalidades, mas visando a aquisição de novos
comportamentos, considerados mais adequados para o convívio em sociedade.
“já quase coroa, lá pros meus 50 anos, (...) fui jogar tênis (...). Eu até cheguei a jogar futebol, fui criado no meio do esporte, mas o futebol, você sabe que é muito diferente do tênis. O tênis me ajudou muito, inclusive as pessoas com quem eu passei a conviver e você acaba aprendendo, (...) tem uma (...) elegância do esporte, (...) muitas vezes me vi em situações de terminar e me criticar por coisas que tenha feito durante uma partida” (homem, 60).
“você vai substituindo (...) você não jogava futebol? Aí você vai jogar peteca, (...) você nadava no mar, (...) vai nadar na piscina, o mar fica só prá você se bronzear (...). Não deixa de nadar, mas foi prá piscininha, porque não corre risco, não é?” (homem, 71).
Esses são exemplos de atitudes compensatórias, segundo a perspectiva
do desenvolvimento ao longo de toda a vida, já referida.
A sociabilidade é considerada um fator muito importante e os espaços
destinados às práticas, assim como as práticas propriamente ditas, são espaços
também de convivência social.
“É (...) uma atividade social boa, porque (...) o esporte é uma coisa aglutinadora, é difícil fazer uma atividade física sozinho, você sempre interage com alguém” (homem, 61).
“Olha, isso é muito bom pro corpo e prá alma da gente, (...) porque a gente tem que tá sempre alegre, sempre convivendo no meio de pessoas, eu convivo demais, é na hidro[ginástica], (...) que eu adoro, é aqui também, que eu adoro essa turma” (mulher, 74).
No entendimento dos pesquisados, além dos benefícios físicos, a
convivência proporcionada pela prática regular de AF é uma oportunidade para
construir novas amizades, vínculo afetivo bastante valorizado por eles.
“eu (...) pratico (...) essas atividades, já tem uns 15 anos. (...) ajuda o corpo, ajuda o relacionamento, a gente encontra novas amizades, só tem fatores positivos nesse tipo de vida que eu levo” (mulher, 62).
106
Esse aspecto da importância dada ao convívio social também foi ressaltado
durante a aplicação do questionário. Neste caso, a fala a seguir pertence a um
sujeito que participou dos dois instrumentos de coleta da pesquisa:
“é o bem-estar que a gente sente e também a convivência com outras pessoas, fazendo novas amizades. O ser humano é um ser de relações” (homem, 69, qes1).
Esses extratos estão de acordo com os resultados encontrados por Goetz
et al., 2008, em que distinguem duas temáticas referentes às RS do corpo na
mídia impressa, uma essencialmente física e a outra constituindo-se em uma
unidade físico-psíquica, em que são realçadas questões subjetivas como o bem-
estar e a interação social.
Uma das formas (palavras) significativas desta classe é uma atividade
física que, quando abordada por seus praticantes, revela todo o seu potencial
para abranger ambas as temáticas em seus aspectos objetivos e subjetivos.
Antes de se proceder à análise a respeito dessa prática, seguem alguns trechos
dos seus entusiastas:
“(...) a dança de salão (...) tem marcado a minha vida bastante (...). Porque eu acho que a dança trabalha o corpo e o espírito junto e aí traz a vida mais leve, mais alegre, você faz novas amizades e todo mundo só pensa em dançar, em alegria, (...) deixa os problemas fora da academia” (mulher, 60).
“a gente nunca associa a dança com ginástica, (...) quando a gente fala atividade física, a gente já pensa numa natação, numa caminhada” (homem, 64).
“a dança é uma terapia que é uma beleza! (...) eu já faço (...) há muito tempo, (...) ela me ajuda muito, porque ajuda (...) a esquecer que está envelhecendo, (...) se a gente está dançando (...) não pensa em nada” (mulher, 82).
Os dois excertos seguintes foram colhidos por ocasião do questionário. O
primeiro sujeito também respondeu aos dois instrumentos:
“a dança é muito amorosa, te leva à trigamia. Eu tenho três mulheres atualmente. Sou casado há 40 anos e tenho duas na rua e cumpro o meu dever” (homem, 71, qes).
1 A abreviatura ‘qes’, dentro dos parênteses, aparecerá para indicar quando as falas forem
retiradas do questionário.
107
“a dança... ela é tudo. Mexe com a cabeça, mexe com o corpo, você se exibe. Ontem eu cheguei em casa e parecia uma menina” (mulher, 80, qes).
Não se pode deixar de observar a importância da dança para os sujeitos da
pesquisa, particularmente para as mulheres, seu público mais presente. Um dado
curioso, observado no trabalho de campo realizado na UnATI, refere-se ao
processo de inscrição para o sorteio das vagas disponíveis na oficina dança de
salão. Os alunos normalmente recebem senhas individuais para as atividades que
realizar, entretanto, para a dança de salão, as senhas são distribuídas para
casais, não necessariamente espelhando uma relação conjugal. Existe uma
grande procura por esse curso e é comum ouvir comentários a respeito de
senhoras em busca de cavalheiros para formarem seus pares e procederem à
inscrição.
Recorde-se que na abordagem estrutural dança também apareceu. Ela é
um dos componentes da estrutura das RS de AF, localizada no sistema
intermediário e fazendo parte do conjunto de modalidades reunidas em torno de
caminhada, na análise de similitude.
Portanto, a dança de salão aparece como um traço lexical saliente, uma
das modalidades de prática física com força de associação com esta classe.
Contudo, não é apenas esta expressão que faz alusão à dança no discurso dos
sujeitos. Ao se percorrer o corpus por inteiro, observa-se que o verbo dançar e o
substantivo dança também foram classificados em outra classe, embora não
tenham sido considerados formas significativas para a sua caracterização.
O que vale destacar é que, analisando-se o contexto semântico onde se
insere, verifica-se que a dança ocupa um espaço socioafetivo importante nas
relações dos seus adeptos, que vai muito além de uma AF. Ela é tida como
terapia, auxilia a não se pensar em demasia no processo de envelhecimento, é
entendida como linguagem, forma de expressão e comunicação entre os
dançarinos, trabalha o corpo e a emoção simultaneamente, além do aspecto
festivo das apresentações e dos bailes que frequentam. Estas observações são
coerentes com os resultados de pesquisas que relacionam a dança ao sentimento
de satisfação pessoal e ao bem-estar físico, social e psicológico; ao fato de os
dançarinos tenderem a encará-la mais como uma atividade social do que como
108
uma AF, além de ter evidenciado eficácia na melhora da qualidade de vida dos
idosos (LEAL e HAAS, 2006; OLIVEIRA, PIVOTO e VIANNA, 2009; SOARES et
al., 2011).
“eu gosto de dançar, de vez em quando tem uns bailinhos bom, adoro dançar. (...) não tem coisa melhor prá melhorar o astral do que a dança de salão!” (mulher, 74).
A classe 2, ATIVIDADE FÍSICA e ENVELHECIMENTO SAUDÁVEL,
agrupa 84 ST (13,73%), e ressalta a dimensão biológica do envelhecimento,
sendo distinguida pelas seguintes formas selecionadas: alimentação (44.80), sol
(38.09), remédio (31.69), correr (31.65), falta (27.19), preciso (24.79), UERJ
(24.79), caminhada (23.56), semana (22.81), comer (21.62), caminhar (20.37),
atividade física (15.20).
Foi constituída, na maior parte, por sujeitos entre 70 e 79 anos, de nível
médio de ensino. Como o IRAMUTEQ não indicou nenhuma variável
correspondente ao sexo, subentende-se que houve equilíbrio entre eles na
produção dos ST.
Esta classe complementa a classe anterior no que diz respeito aos
exercícios, como correr e caminhar, ao local de prática com a maior concentração
de participantes, à frequência semanal com que praticam AF e à necessidade que
têm dessa prática. Sobressai o interesse pela alimentação como componente
essencial à manutenção da saúde e a sua articulação com a AF e a estética
corporal, além do prazer de comer.
“devido a essa vida saudável que eu levo, eu aprendi, até modifiquei minha alimentação. Eu comecei a me alimentar de forma mais saudável (...) a partir da atividade física” (mulher, 62).
“o meu sonho é a barriga, (...) você vai no médico, (...) procura alimentação adequada, e todo mundo diz o seguinte: na sua idade é difícil (...) e eu tô comendo muito pão, aí passa sem comer pão uma semana, tomar café sem pão é horrível (...)” (homem, 72).
Em artigo sobre as RS do corpo e da alimentação elaboradas por mulheres
com mais de 75 anos, Costalat-Founeau et al. (2002) consideraram interessante
assinalar que a categoria “corpo sedução”, entendida como a conservação de
uma aparência agradável, com maior visibilidade social, está ligada às categorias
109
referidas às restrições alimentares, como “alimentação sobrevivência” e
“alimentação saúde”. Para os autores, esta ligação revela as tendências atuais de
se cuidar do corpo nas suas dimensões nutricionais e estéticas, a fim de se
conservar a juventude e a beleza.
Em outro sentido, em pesquisa sobre o significado de alimentação
saudável para pessoas idosas, Menezes et al. (2010) concluíram que os seus
resultados estão proximamente ligados à preocupação dos sujeitos com a saúde,
com a prevenção e o tratamento de doenças crônico-degenerativas e afastados
da esfera subjetiva.
Como se vê, dois olhares distintos sobre um mesmo objeto.
Sobre a maior visibilidade social apontada anteriormente, ressalte-se a fala
do informante a seguir, aposentado que continua trabalhando normalmente.
“eu vejo que as pessoas cada vez tão estendendo mais o tempo de trabalho e, ao estender o tempo de trabalho, você fica (...) aos olhos dos outros, você também não quer se mostrar (...) um bagaço (...), então, isso (...) reverte prá que você faça exercício, (...) prá que você trate da sua aparência, que é fundamental” (homem, 60).
No caso desta investigação, a alimentação também retrata a preocupação
em ingerir alimentos saudáveis, menos calóricos e em quantidade moderada,
muitas vezes sendo esse um objetivo a ser alcançado e não uma realidade
estabelecida, como afirma um participante que reconhece que está bem acima do
peso aceitável, ao contrário de outro que vem conseguindo manter os hábitos da
sua reeducação alimentar.
“se eu comer um pouquinho menos, eu acho que as coisas melhoram pro meu lado” (homem, 60).
“essas atividades de hoje, elas me ensinaram a me alimentar, (...) eu não sabia me alimentar, hoje (...) não faço uso de alguns alimentos, (...) ovo, carne vermelha, (...) o pão, com muita parcimônia e aprendi realmente a me alimentar, isso prá mim foi fundamental” (homem, 69).
O prazer de comer sem a preocupação do passado de não engordar,
assim como a substituição de valores em relação ao corpo são lembrados:
“Tinha uma época que eu dizia: vou começar o regime na 2ª feira (...). Se eu emagreço 2 quilos, eu me sinto melhor, mas eu não tenho essa capacidade mais. (...) eu adoro comer (...) e acho que tô numa idade que
110
tenho que fazer as coisas que eu gosto, (...) eu já tive um corpo muito bonito, eu sei que eu tive (...), mas hoje em dia tem outras coisas tão, tão na frente do meu corpo muito bonito...” (mulher, 73).
Da mesma forma, são criticados aqueles que exageram nos regimes
alimentares, numa atitude comparável à autopunição.
Elas [suas amigas] acham que eu sou uma louca! Porque eu tô gorda, porque eu bebo, porque eu como. (...) Elas não fazem nada! Tem uma que não ri prá não fazer ruga (...). Se ela (...) vai numa festa, passa cinco dias sem comer nada, (...) tudo com regime” (mulher, 73).
Retomando a ideia de dimensão biológica do envelhecimento e analisando
as atitudes tomadas pelos idosos para um envelhecimento saudável, constata-se
que a maioria dos conteúdos significativos denota essa preocupação. Observe-se
que a própria caminhada pode ser prescrita e encarada como parte de um
tratamento de saúde.
“eu sou cardíaco, eu tenho três stents no peito e uma das condições do tratamento é você caminhar, e eu caminho diariamente seis mil metros” (homem, 78).
Este mesmo sujeito, um pouco depois, refere-se a outro tipo de benefício
proporcionado pela caminhada, dessa vez relatando a sua capacidade de
modificar para melhor o ânimo e a sensação de bem-estar subjetivo.
“Você às vezes tá.... a..., um..., a..., vou dar uma caminhada. Aí (...) começa a ver outras pessoas, (...) aí você começa a ver ..., acho que é endorfina que chama e aí começa te dar um... melhor! Aí você, pô! Não é bem isso, eu tava parado por que? Por que que eu tava parado lá?!” (homem, 78).
Do mesmo modo, fazem alusão à realidade dos medicamentos com que
são obrigados a conviver, o que faz parte da sua rotina, ao mesmo tempo em que
sobrecarrega o orçamento doméstico.
“depois dos 60, que a gente está aposentada, que tem um tempinho, (...) pode gastar um dinheiro extra, a gente não tinha que tá gastando com remédio, (...) vai o dinheiro no remédio, tem que tá economizando prá pagar remédio, prá pagar médico (...) lá vai...” (mulher, 82).
Após a primeira partição, procedeu-se a mais uma divisão do corpus,
gerando dois subgrupos. Cada um deles deu origem a um eixo de sentido
formado por duas classes lexicais cada um.
111
A classe 3 (106 ST – 17,32%) e a classe 4 (114 ST – 18,63%) representam
o eixo centralizado pela beleza do corpo.
A classe 3, CORPO, ESTÉTICA e MÍDIA agrupou 106 ST,
correspondendo a uma proporção de 17,32% dos 612 ST classificados. As
palavras importantes que conformam o sentido atribuído à classe são: gordo
(58.95), padrão (56.72), mídia (56.45), magro (43.80), bumbum (38.69), seio
(33.80), cirurgia (32.67), sociedade (32.67), ideal (30.35), bonito (29.79), botar
(27.89), lindo (22.07), beleza (20.25), botox (19.22), belo (19.22), Brasil (18.44).
Contribuíram para a organização desta classe lexical, sobretudo mulheres
entre 70 e 79 anos, moradoras da zona norte e da zona oeste do município do Rio
de Janeiro.
Foram destacadas palavras que, majoritariamente, refletem a crítica ao
corpo gordo, o preconceito contra a pessoa gorda e a preocupação com o
aumento da obesidade no Brasil.
“na verdade, todo gordo é complexado. Se alguém olha prum sujeito muito mais gordo, olha primeiro prá barriga. Se você tem oportunidade de ser promovido, se não foi, é porque você é barrigudo, o corpo não pega bem (...) o gordo é deselegante, o gordo não é bonito (...) ninguém gosta de gordo” (homem, 72).
“hoje a gente vive uma ditadura do corpo, (...) a nossa sociedade (...) valoriza essa estética de magreza, (...) as pessoas até se sentem mal quando não tão dentro do padrão, (...) brincadeiras jocosas, ô gordo! (...) e nunca a população do Brasil teve tão gorda (...), aquela população (...) que não tinha acesso (...) à alimentação (...) tá se alimentando mal (...)” (homem, 60).
Curioso como outro pesquisado, ao relacionar o corpo à sedução, reproduz
os estereótipos do gordo e do magro, presentes no imaginário social:
“tem (...) cara que (...) é gordo, mas é engraçado, mulher gosta de homem que faz ela rir, (...) meu corpo sempre foi legal (...) sempre pratiquei esporte, mas conheço alguns amigos muito inteligentes, gordo ou magro demais, (...) o que é magro demais (...) caminha pelo lado intelectual, eu acho que tem prá tudo que é gosto” (homem, 60).
O padrão de beleza corporal veiculado na mídia (GOETZ et al., 2008;
LEAL, et al., 2010; SUDO e LUZ, 2007), tendendo à magreza, recebeu críticas e
112
houve a manifestação nostálgica em relação às formas mais arredondadas de
meados do séc. XX.
“Prá mim, o padrão de beleza é o que era em mil novecentos e..., aquelas divas que tinha na década de 50, de 60, Ava Gardner, aquelas mulheres bonitas, cheinhas, (...) acho que o corpo (...), umas pernas bonitas tem que ter. Agora cê vê uma esquelética andando no meio da rua, curva, ah não, sai fora!” (homem, 78).
A mídia é vista como tendenciosa e responsável pela rigidez do padrão de
beleza imposto no Brasil, principalmente à mulher (DEBERT, 2011; SIBILIA,
2011). Afirmou-se que a imposição desse valor pode gerar angústia nas mulheres
da terceira idade, causando uma diminuição, talvez evitável, da autoestima
dessas mulheres, embora uma respondente de 82 anos tenha se lastimado com a
perda da beleza ocasionada pela velhice (GOLDENBERG, 2008.).
“O Brasil, eu acho que é muito (...) cruel. A sociedade é muito cruel com a mulher, principalmente essa questão (...) da cobrança do belo (...) o padrão de beleza que é imposto” (mulher, 60)
“a velhice é muito chata, (...) nós vamos perdendo o que tinha de bonito e mexe muito com a cabeça da gente, principalmente com a minha...” (mulher, 82).
Parece que dando razão ao que disseram essas participantes, note-se o
depoimento feito no questionário, de outro indivíduo que também respondeu aos
dois instrumentos:
“Para a mulher, o corpo, a aparência é muito mais importante (...). A mulher é que sofre com isso (...) a ditadura da beleza (...), o mercado da beleza. O homem não. Tem mulher que gosta de homem careca, barrigudo, baixinho. Para o homem (...) é o que ele vê, para a mulher são outros olhares (...)” (homem, 63 qes).
De acordo com os sujeitos e com autores que pesquisam esse assunto
(GOETZ et al., 2008; LEAL, et al., 2010; SUDO e LUZ, 2007), os meios de
comunicação tendem a impor um determinado tipo de corpo magro como sendo o
bonito, com a intenção de incentivar o consumo de produtos para um corpo
adequado ao lançamento das modas que divulgam, sendo a moda
essencialmente dirigida à juventude, o que também é objeto de queixa (SIBILIA,
2011; DEBERT, 2011).
113
Na verdade, os sujeitos objetivam nas exigências mercadológicas e nos
interesses econômicos da indústria da beleza, a imagem que fazem da mídia.
“a mídia é venda. Ela vende o corpo perfeito. (...) e eles (...) vão lançar o corpo perfeito (...) porque eles lançam modas. É em cima desse corpo perfeito que eles estão lançando moda. (...) A aparência jovem é a mídia que está ali em cima de você o dia todo (...)” (homem, 69).
E o mesmo sujeito, respondendo ao questionário, acrescenta:
“O corpo ideal é imposto pela mídia” (homem, 69, qes).
Prosseguindo com os protestos dirigidos especialmente à mídia e à falta de
roupas intermediárias entre a juventude e a velhice:
“Ah, a cobrança (...) é enorme! (...) é o jovem (...) que vale (...) mas é uma dificuldade que eu tenho. Ou é aquela roupa bem senhorinha, ou então muito jovenzinha” (mulher, 61).
“A mídia é um caso muito sério, (..) faz a pessoa (...) favorecer a mídia e não a si. A televisão mostra uma pessoa magra, que é muito boa, e eu não acho assim, eu acho um gordo lindo! Uma gorda feliz é muito bonito!” (mulher, 75).
“é só a Rede Globo botar (...) novela de gordinha, (...) aí todo mundo vai querer engordar. Então, a mídia faz isso, o povo (...) faz o que (...) a mídia quer que o povo faça” (homem, 64).
Os participantes acreditam que a mídia valorize demasiadamente a beleza
corporal, enaltecendo somente os belos, o novo e, com isso, ajuda a discriminar o
velho.
“A mídia (...) não favorece os fracos, não favorece os feios, a mídia sempre enaltece os belos” (homem, 72).
“A mídia enaltece por demais o belo, o novo, (...) consequentemente, (...) o velho não está sendo enaltecido” (homem, 75).
“A mídia, de um modo geral, contra o velho... existe (...) preconceito. Pode ter programa, mas no dia a dia você percebe que existe, (...) a imagem é uma coisa tão forte, tão dominante, que as pessoas (...) hostilizam até inconscientemente um velho, porque não tem aquela aparência padrão” (homem, 60).
“eu acho que a mídia valoriza muito essa parte de ser magro (...) muita gente (...) até discrimina, já tem esse preconceito, aí fala assim: ah! Tá velha!” (mulher, 74).
114
Em contrapartida, também é lembrado que desde sempre o Homem
persegue a beleza física, a perfeição, a proporcionalidade das formas, havendo o
reconhecimento de que a pessoa é mais bem vista na sociedade, se estiver de
acordo com os padrões culturalmente reconhecidos, uma vez estarem projetados
no próprio corpo e visíveis aos olhos dos outros. A primeira fala, retirada do
questionário, é um bom exemplo sobre a perenidade do conceito de beleza no
mundo ocidental.
“O conceito de beleza é eterno e foi estabelecido pelos gregos, que valorizam as proporções do corpo humano e que permanecem até hoje” (homem, 84, qes).
“Eu acho que não só a mídia não, (...) desde que o mundo é mundo (...) todo ser humano (...) busca e prefere a perfeição” (homem, 61).
“Que que você acha mais bonito? Olhar um corpo bonito de uma pessoa jovem ou um corpo de uma senhora mais velha? (...) Você pode até dizer: essa senhora tem um corpo muito bom prá idade dela, mas que é muito bonito olhar coisa bonita, eu acho” (mulher, 73).
“A questão da aparência corporal (...) é (...) muito influente nessa área, a pessoa se apresenta (...) prá pretender alguma coisa descuidado com seu próprio corpo, (...) barrigudo, obeso, (...) já não tem a mesma receptividade, não tem a mesma aceitação” (homem, 89).
Sobre a mesma temática e referindo-se ao corpo do idoso, um respondente
do questionário também deixa transparecer suas representações sobre as
funções sociais do corpo, assunto já pesquisado por Jodelet (2009), assim como
por Camargo, Justo e Alves (2011):
“Hoje, é ter uma postura correta, apresentar músculos. (...) tem que mostrar que tem físico, que tem músculo. O homem, uma postura saudável, uma expressão de saúde, aí a pessoa tem uma acolhida diferente” (homem, 68 qes).
A pressão midiática a favor do consumo para a aparência jovem e bela tem
levado à procura cada vez maior pelas cirurgias estéticas, procedimento
condenado com veemência, em especial pelas participantes do estudo, porém de
forma ambígua (CAMARGO, JUSTO e ALVES, 2011; CASOTTI e CAMPOS,
2011; DEBERT, 2011). A construção artificial dos corpos é tratada como
impostura (EDMONDS, 2007) e um assunto que desperta reações indignadas,
comparáveis às reações diante de trapaças ardilosas.
115
“a mídia (...) tá extrapolando, porque essas mulheres (...), não sei se elas botam botox lá no (...) bumbum, deve fazer... e eu acho isso um absurdo! Eu não vou falar nas coisas artificiais (...) porque, com sinceridade, pegar lá uma coisa e botar no seio, esses botox ou esses silicone eu acho isso agressão ao corpo” (mulher, 73).
“veja essas maluquices dessas mulheres (...) que ficam se preenchendo, (...) com a boca assim... (...), parece que têm todas 20 anos com 70 e tal. Eu acho isso horrível! (...) eu acho super válido você se cuidar e fazer uma plástica, fazer um preenchimento. Agora, você ficar a vida inteira querendo ficar jovem... fica ridículo, (...) fica um filme de terror (...) essas mulheres todas iguais, com a cara toda esticada, sem uma ruga. Acho que a gente tem que ter as nossas expressões” (mulher, 73).
Contudo, em suas falas também se consegue captar sentimentos, atitudes,
emoções, desejos, contraditórios ao próprio discurso, o qual desvaloriza o
caminho “fácil” dos procedimentos e com viés moralista valoriza o empenho, o
esforço, a dedicação aos exercícios, na direção da beleza física. Curioso que
essa valorização moral do esforço físico também tenha sido encontrada por
Sabino (2007) em pesquisa com jovens fisiculturistas usuários de anabolizantes,
revelando a existência de uma representação comum aos dois grupos.
“Ela tem é que fazer ginástica prá ela chegar ao corpo ideal que ela quer, (...) que ela pode ter (...), porque nem todo corpo vai se adaptar a um corpo bonito. Agora, eu não sou a favor da plástica (...), não, no rosto, se a pessoa quiser fazer, se não mudar [muito], eu não faço, não sou a favor de nada. Agora, lipoaspiração aceito, (...) faria, (...) se tivesse dinheiro, a minha barriga (...)” (mulher, 73).
E logo após dizer que se dispusesse de recursos financeiros se submeteria
a uma cirurgia estética, a mesma respondente retoma as críticas ao artificialismo
e à falta de esforço físico para proceder às transformações corporais, moralmente
admitidas por ela:
“Mas eu acho as mulheres enormes aí, se apresentando, (...) é uma coisa artificial ela ficar bonita (...). Elas querem ir no médico fazer o atletismo delas, o botox no rosto, fazer sem fazer força, suspender o seio (...) botando silicone (...). E eu vejo aquelas perna que eu não acredito que elas..., (...) eu não sei (...) se (...) mesmo botando os botox delas, os silicone, elas têm que fazer ginástica” (mulher, 73).
Igualmente, a participante anterior a essa, após criticar o exagero das
modelagens cirúrgicas feitas por suas amigas, além de revelar seu orgulho pela
plástica que fez, remete à indagação já mencionada no texto, de que se haveria
116
limite ético para as modificações corporais direcionadas ao rejuvenescimento, ou
qual seria o limite para esse empreendimento.
“Eu já fiz uma plástica (...) há quase 20 anos atrás, muito pequena, tanto é que eu não tenho nem uma cicatriz. É uma plástica até modelo, que eles sempre me chamam prá mostrar” (mulher, 73).
A prática excessiva da musculação também integra o rol de dispositivos
disponíveis para a criticada construção artificial do corpo.
“hoje em dia, essas pessoas que fazem musculação, elas fabricam um corpo muito bonito que elas não tinham... Eu não gosto, eu acho muito feio essas mulheres tipo mármore, (...) aquela pessoa que é toda dura. (...) tudo quanto for fabricado eu detesto” (mulher, 73).
“o corpo bonito prá mim (...) tem que ser mais natural. O que você vê de muita formação de massa muscular, excesso de massa muscular, eu acho feio, principalmente na mulher, (...) eu não gostaria, mesmo eu fazendo a musculação, se começar a ficar muito exagerado, eu vou (...) pedir ao professor prá reduzir os exercícios” (mulher, 65).
Os pesquisados fazem alusão à beleza do corpo da mulher que, para ser
considerado bonito, é preciso não ter barriga, mas ter o “bumbum” grande. Além
disso, esse corpo seria capaz de compensar a falta de beleza do rosto.
“corpo bonito é esse que esteticamente se apresenta aí. (...) muitas curvas, (...) o da mulher, (...) o do homem... discorrer sobre o homem..., mas muitas curvas, bunda grande... proporções e altura também (...). Não sei se já é produto da lavagem cerebral ou não, mas é prá mim também (...). Não sei nem se é uma atitude inconsciente. Se eu gosto porque isso me foi imposto ou se é realmente isso o que eu gosto” (homem, 60).
“uma mulher com um corpo..., às vezes ela nem tem um rosto bonito, mas ela com um corpo lindo... olha, é fundamental prá mim se não tiver barriga. Se eu não tivesse... (...) mas essa não tem jeito... (...). Eu acho que a mulher sequinha é... eu acho isso lindo (...). Quando eu estou mais magra, que a minha barriga sai um pouquinho, eu fico radiante! ” (mulher, 73).
Mais adiante, na próxima classe, aprofundar-se-á a discussão sobre a
beleza da mulher e sobre as contradições aparentes no interior do material
discursivo, no que concerne à hierarquia ou congruências no esforço para a
obtenção, manutenção ou compensação de elementos no plano da saúde e da
beleza física.
Por ora, vale registrar que o último respondente a ser citado (homem, 60)
evitou discorrer sobre a beleza masculina, concentrando-se nos atributos da
117
beleza corporal feminina, comportamento reproduzido pela imensa maioria dos
homens, possivelmente até inconscientemente. Por outro lado, a pesquisada
expôs o seu pensamento absolutamente fundamentado na beleza feminina, como
também o fizeram a quase totalidade das mulheres, aproveitando a oportunidade
para falarem do próprio corpo, da forma em que está, ou de como gostariam que
estivesse. Os dois fragmentos anteriores permitem perceber valores e crenças
que ancoram antigas RS do homem e da mulher e inferir atitudes reveladoras do
nível de enraizamento psicológico desses traços culturais, que atravessam essas
RS (PEREIRA, 2005).
Além disso, é de se notar a relevância da preocupação dessa participante
com o abdômen. Assim como ela, vários pesquisados de ambos os sexos, em
todo o material coletado, também se referem à barriga como um símbolo da
elegância corporal a ser conquistado, comparável a um objeto sonho de consumo.
Ressalte-se que em todas as oportunidades em que a barriga foi
mencionada, o foi por questões de estética corporal e não por questões de saúde,
mesmo sendo difundida nos meios de comunicação a informação científica da
associação da circunferência abdominal com fatores de risco cardiovascular
(REZENDE et al., 2006; CABRERA et al., 2005).
Sabe-se que a mídia é uma poderosa veiculadora de RS, mas, ao que tudo
indica, a difusão desse conhecimento acadêmico não tem sido suficiente para a
conscientização das pessoas em relação à preservação de medidas abdominais
adequadas. O que os sujeitos parecem expressar é a aspiração à conquista de
um status corporal distintivo na sociedade brasileira, em especial na sociedade
carioca (GOLDENBERG e RAMOS, 2007), mesmo já estando classificados como
integrantes da categoria terceira idade.
Desse modo, admitindo-se que a construção corporal é determinante para
a construção da identidade (COSTA, 2004b), e que a construção social da
identidade está relacionada à ideia de ascensão social e de prestígio (VELHO,
2008), presume-se que as intenções e ações de mudanças operadas
deliberadamente no corpo busquem, de fato, poder simbolizar ao outro, a
pretensa, ou mesmo reconhecida, elevação de prestigio social conquistado
118
através das modificações biopsicossociais trabalhadas e externadas através do
corpo.
Não significa dizer que os pesquisados não tenham o direito de tentar se
aproximar de uma silhueta comum nos jovens. No entanto, a permanente
circulação de imagens corporais apolíneas parece também influenciar a
elaboração das RS de corpo dos idosos, reforçando a ideia da impossibilidade de
se permanecer totalmente imune ao processo de difusão midiática, fazendo com
que, inicialmente nesta questão abdominal específica, emerja uma aparente
incoerência entre as preocupações manifestadas com respeito aos cuidados com
a saúde e à atenção despendida com a beleza. Como declara uma respondente
sobre o valor socialmente conferido à imagem do corpo,
“Hoje em dia, mais do que antigamente, (...) a imagem do corpo é muito importante. É muito mais importante do que o que a pessoa realmente é, do que o ser, é a aparência, é o visual” (mulher, 61).
Essa é uma das contradições apreendidas nos dados encontrados.
Posteriormente, como já dito, haverá continuidade do desenvolvimento dessas e
de outras questões afins.
Antes disso, é interessante relatar que os sujeitos se referem à existência
de mais de um tipo ideal de corpo, veiculado pela mídia, no que se assemelha ao
conceito de polifasia cognitiva desenvolvido por Moscovici (2012). São diferentes
representações do que venha a ser um corpo ideal, elaboradas socialmente e
compartilhadas pelos componentes da amostra, podendo ser requisitadas
segundo as circunstâncias e conveniências das interações comunicativas dos
sujeitos.
Identificaram-se quatro RS de corpo ideal, sendo as três primeiras as mais
difundidas pela mídia, conforme a análise do corpus:
1ª) o corpo magro das modelos das passarelas, condenado pelos sujeitos
até por estimular a anorexia nas adolescentes;
2ª) o corpo sarado, malhado, atlético, musculoso e sem gordura, mais
comum nos homens, mas cada vez mais frequente nas mulheres, e normalmente
construído à base de muito treino e de suplementação alimentar e hormonal;
119
3ª) o corpo volumoso, visto como o corpo da “gostosona” ─
representação similar também encontrada por Sabino (2007) ─, cujas formas são
exageradamente acentuadas, principalmente os seios, as coxas e as nádegas,
geralmente submetidos à aplicação de botox e a cirurgias para o implante de
próteses de silicone, além de muito exercício e alimentação controlada. Note-se
que os três tipos possuem a idealizada “barriga de tanquinho”, em que a
musculatura abdominal fica aparente;
4ª) o corpo normal, o corpo almejado explicitamente pelos idosos, sem
excessos e funcional.
De fato, afirmam que o tipo de corpo ideal para a terceira idade não deve
ser gordo nem muito magro, mas, sobretudo funcional, com autonomia e
independência. Deve ser adequado ao tipo físico de cada um e que a pessoa se
sinta bem com ele, visando à saúde e não a beleza estética.
“eu acho que seria cada um de acordo com o seu tipo físico, (...) se ele tiver com uma boa mobilidade, acho que isso aí já é um corpo perfeito. (...) Se eu fosse mais nova, talvez eu pensasse mais nisso, hoje, eu não penso na estética corporal não, eu tou pensando mesmo no meu bem-estar” (mulher, 65).
“eu não viso muito a estética, viso o bem-estar, (...) me sentir com disposição, não ligo prá estética não, sinceramente, você se sentir bem, de acordo com o seu corpo, você gostar de você mesmo. Nunca me preocupei com isso não” (mulher, 69).
“eu não quero ter (...) um corpo ideal, um corpo bonito, (...) quero pelo menos ficar normal” (homem, 60).
“eu tenho 72 anos, no fundo (...) todo mundo (...) procura uma estética, ser normal, (...) você não procura ser melhor, você tenta ser a média (...), você não quer ser barrigudo, você não quer ser seco demais, (...) eu quero ser normal” (homem, 72).
A classe 4, CORPO e FASES DA VIDA, reuniu 114 ST, perfazendo
18,63% do total de ST classificados. Como palavras características desta classe,
destacaram-se: mulher (33.57), homem (32.61), cabelo (23.41), idade (22.42),
tendência (21.63), feio (18.64), hoje em dia (18.05), existir (17.63), normal (17.36),
excesso (16.74), aparência (14.96), jovem (14.73).
120
Esta classe foi elaborada por sujeitos da região metropolitana deste
município, com nível superior de escolaridade e situados na faixa etária
intermediária, entre 70 e 79 anos. Houve equilíbrio entre homens e mulheres.
Chamando a atenção para o comentário feito anteriormente sobre homens
e mulheres, quando o tema abordado referia-se à beleza corporal, os sujeitos,
sem diferenciação de sexo, predominantemente, falam da beleza do corpo
feminino. Possivelmente não é um comportamento incomum, guardando relação,
por exemplo, com os resultados do estudo de Gonzalez e Seidl (2011) sobre o
envelhecimento na perspectiva de homens idosos e ancora-se em valores
culturais relativos ao universo feminino, mais afeito aos ideais de beleza.
Na perspectiva dos sujeitos, a palavra mulher também apresenta
conteúdos tais como a ideia da aproximação da mulher ao homem em função da
rápida "evolução" que ela teve a partir da segunda metade do século XX, quando
se desenvolveu em todos os aspectos e, com isso, assemelhou-se ao homem.
Passou a usar roupas parecidas com as do homem, a fazer, como ele, os
mesmos exercícios físicos.
“com a evolução, a mulher (...) cresceu bastante, (...) ela aproximou o homem da mulher (...). Não há mais aquela distinção da mulher que ficava em casa, (...) a tendência é se assemelhar cada vez mais com o homem” (homem, 72).
Sobre esse aspecto, critica-se o aumento da massa muscular da mulher, a
construção artificial do seu corpo, seja pelas cirurgias, seja pela musculação
excessiva, seja pela magreza anoréxica, conforme já abordado. Curioso que essa
crítica não é dirigida ao corpo masculino construído artificialmente, dando-se a
impressão de existir um consentimento silencioso, inconsciente ou não, mas
baseado em valores culturais que se manifestam através de RS compartilhadas
por todos. Esses relatos, normalmente, têm um tom de censura, porque as
próprias participantes do estudo também estão submetidas aos mesmos valores
geradores das RS que orientam as suas opiniões e atitudes nas interações
comunicativas.
“do jeito que essa mulherada anda nas academias, deve ser tudo igual do homem, com músculos, querer fazer os exercícios que o homem faz, as atividades que o homem tá fazendo, na profissão, vai ser tudo igual...” (mulher, 69).
121
“eu sou a favor da cirurgia plástica prá quem tem defeito e corrigir, (...) prá questão de estética sou totalmente contrário. (...) a maioria vaidade” (homem, 78).
Como estão cientes das fases da vida, observe-se o comentário a seguir
sobre a proliferação de implantes de silicone entre as mulheres:
“um dia (...) a pele (...) vai ser flácida, não existe o milagre prá quando for a idade. (...) aqueles peso todo que ela tem, ela vai ter [que] tirar, porque senão vai pro joelho, pras coxa, e o seio vai prá barriga. (...) tem que pensar no tempo da idade” (mulher, 73).
Em relação à consciência que têm do passar dos anos, sabem que existe
um desgaste natural do organismo, mas, mesmo assim, os conceitos que emitem
sobre si mesmos é frequentemente favorável. Proferem palavras de incentivo à
prática de AF, como de outras atividades também. Dizem não pensar na idade
que têm, mas nas coisas que ainda são capazes de fazer, buscando
naturalmente, com alegria e entusiasmo, adaptações compensatórias às
atividades que fazem, sem deixar de aproveitar o tempo e projetar para o futuro,
tanto a continuidade das práticas atuais, quanto o início de outras.
“Os meus filhos me admiram muito (...) pela capacidade que eu tenho de fazer as coisas que eu faço hoje na minha idade. Eu nunca pensei em idade, eu penso naquilo que eu posso fazer, dentro dos meus limites, então, é muito prazeroso prá mim, meus filhos, pô, pai! 100 anos prá você! (...) Cê tá muito bem!!” (homem, 78).
“eu faço tudo que eu gosto, (...) e futuramente, o ano que vem devo fazer mais coisas ainda, (...) eu pretendo entrar em algum curso aqui, (...), ou espanhol (...), que eu gosto, ou o italiano, ou outros... o que pintar” (mulher, 74).
Quanto à tendência futura de aumentarem as semelhanças entre os sexos,
acreditam que não será apenas na esfera comportamental, mas também na
conformação dos corpos, como foi observado nas conversas e condutas entre os
que frequentam as academias.
“dos corpos, (...) das ações, (...) das roupas, (...) tudo ficou um pouco parecido, em função da (...) mudança, do (...) crescimento” (homem, 72).
“Eu fico imaginando que talvez não haja assim muita diferença entre o corpo feminino e o masculino. Vai ficar uma coisa mais uniforme” (mulher, 65).
122
Interessante o aparecimento da ideia de que se vive um processo de
aproximação entre o corpo da mulher e do homem, cujo ápice seria quase que a
unificação dos corpos, remetendo à discussão desenvolvida por Laqueur (1994) a
respeito do modelo da anatomia humana anteriormente ao século XVIII,
fundamentado na crença de que tanto os homens quanto as mulheres
representavam duas formas diferentes do mesmo sexo.
Apesar da idade, há o reconhecimento de que a mulher continua vaidosa,
presunção espontaneamente admitida por poucos homens e entremeada no
discurso, quando talvez já estivessem mais à vontade para falar e mais
suscetíveis às contradições. Aqui, lembre-se que, na abordagem estrutural, a
cognição beleza apareceu como um conteúdo importante na estrutura das RS de
corpo, porém, como elemento do SP, justamente o local onde há espaço para as
contradições individuais.
“Não quero beleza, nada, mas um corpo saudável, assim, um corpo que (...) o seu manequim não ultrapasse os 44” (homem, 78).
Em outro momento, o mesmo sujeito faz a seguinte afirmação:
“Todo homem tem que ser vaidoso. Passa na praça, tem um monte de homem jogando carta, bebendo cerveja, barriga enorme... Não quero isso prá mim não!” (homem, 78).
Nesse ponto, vale abrir parênteses para mostrar o desenvolvimento do
raciocínio de uma informante, observado após a realização do TDN2.
“O idoso tem que pensar em saúde, já o jovem, pensa na vaidade, ficar bonito, ficar gostoso, para a mulher ficar toda certinha, poder botar o biquine. Eu sou vaidosa!”
Também há referências à autoexigência da mulher em função, não só de
ser mais notada que o homem, como também de querer ser mais notada do que
ele, de estar mais bonita, de se cuidar mais do que ele, ainda mais que aumenta,
com a atual multiplicação dos bailes da terceira idade, a possibilidade dos
encontros amorosos. Enfim, parece haver um consenso de que a mulher é
submetida ao próprio olhar e ao da sociedade de forma mais impiedosa, conforme
já referido.
2 Na realização do teste de dupla negação (TDN), não há necessidade de se solicitar aos sujeitos
que informem a idade, desde que estejam dentro dos critérios de inclusão do estudo.
123
A observação a ser destacada na comparação entre os discursos de
homens e mulheres, quando o tema é a beleza corporal, é a de que ambos falam
da beleza feminina. Provavelmente porque, na cultura brasileira, conforme
salientado por Edmonds (2007), a beleza feminina é um mito sustentado tanto por
homens quanto por mulheres.
Forma-se a ideia, portanto, de que a mulher objetiva as RS de corpo pela
aceitação e reconhecimento consensual do modelo de beleza que representa
para os sujeitos da amostra. Nesse caso, parece que a imagem da mulher foi
construída de modo independente, ao passo que a do homem foi construída em
oposição à dela, invertendo o mito da criação da mulher. Se conjectura-se que os
homens não discorram sobre o corpo masculino por íntimas e poderosas
convicções axiológicas e psicossociais, pode-se suspeitar que as mulheres talvez
evitem falar sobre eles por estarem submetidas à sua dominação simbólica, cuja
presença pode ser percebida pela fala a seguir:
“sou um cara vaidoso, não vou negar, (...) [mas] jamais faria uma cirurgia plástica, gosto muito de mim, gosto da cara de cachorro velho, não tem problema. Homem muito bonito é veado, fica dividindo espelho com mulher. Eu quero ser bonito, mas quero ser macho, (...) e tratar a mulher como ela tem que ser tratada, como mulher. Porque o homem que trata a mulherzinha demais, de repente ele fica no lugar dela” (homem, 60).
Sobre as aparentes contradições presentes nos discursos, sobressaem
aquelas já referidas à hierarquia da importância dada a questões de saúde e de
beleza, tais como a que segue:
“o que não me satisfazia era não ter um cuidado maior pela saúde. Mas, pela estética, eu não teria tomado nenhuma atitude (...) e pelo pouco tempo que eu já estou na musculação, (...) já noto uma diferença prá melhor. (...) já melhorou alguma coisinha esteticamente, mas, prá mim, a satisfação é de eu estar bem, de eu me sentir bem” (mulher, 65).
Cabe assinalar que, no Brasil, o uso da palavra vaidade tem uma
conotação positiva, em especial entre as mulheres (EDMONDS, 2007), o que
pode ajudar a explicar o embaraço observado nos homens idosos em lidar com
assuntos dessa natureza, haja vista a acepção dessa palavra estar associada à
futilidade, presunção.
124
Outras pessoas, absolutamente desviantes do padrão de beleza
estabelecido, mesmo para os mais velhos, num discurso defensivo e protetor da
própria autoestima, menosprezaram esta pesquisa e, com evasivas, rispidez ou
respostas monossilábicas, distanciaram-se de questões, para eles,
aparentemente incômodas. Distanciar-se significa não ter que pensar sobre um
tema que lhes seja desagradável e, sobretudo, não ter que falar sobre ele, o que
lhes poderia causar desconforto.
Como essas questões mais delicadas giram em torno da beleza corporal,
não só do próprio sujeito sobre si, mas de como ele vê o olhar do outro sobre um
terceiro, ou de como concebe a imagem de um corpo perfeito, as falas dos
indivíduos tendem a ser, dizerem que não ligam para a estética corporal, que o
tempo da beleza já passou.
Não significa afirmar que aqueles que responderam dessa forma tenham
dificuldades de aceitar o próprio corpo. O que se pretende expor é que na
hierarquia do que seja mais importante para a vida do corpo, a saúde está na
frente, mas, em se estando com saúde, em alguns momentos pode-se priorizar o
investimento na beleza corporal, através do dispositivo AF, assumindo, assim,
naquele período, a primazia em relação a outros conteúdos das RS de corpo.
Na dinâmica das RS, esses conteúdos podem se alternar, mudar de
posição internamente, as RS estudadas podem incorporar novos elementos,
outros podem abandonar a sua estrutura.
Como todos os sujeitos pesquisados são aparentemente saudáveis, ativos
e relativamente jovens (76% do total abaixo de 80 anos), sentem-se, portanto,
jovens com energia suficiente para dar atenção ao aspecto físico, que nem todos
puderam dar ao longo da vida, e no qual ainda veem utilidade ─ dimensão
funcional das RS ─ para facilitar novos relacionamentos e proporcionar-lhes, com
os efeitos dos exercícios e do convívio com os pares, satisfação pessoal,
felicidade (DEBERT, 2011) e consequente elevação da autoestima e da sensação
de bem-estar subjetivo ─ dimensão afetiva das RS (SANTOS, TURA e ARRUDA,
2013).
Desse modo, a aparente incoerência apresentada, nos fragmentos dos
discursos, entre os elementos de interesse pela saúde e pela beleza, começa a
125
se dissipar. Assim como, no dizer de um sujeito que participou do TDN, “corpo é
mente”, um respondente do questionário afirmou que:
“Não há diferença de beleza e saúde. Acho que há mais recursos para manter a forma física e a estética” (homem, 70, qes).
Desse modo, parece haver um pensamento social apontando para a
interpenetração dessas dimensões que, simultaneamente, influenciam-se
reciprocamente.
A classe 5, SAÚDE, CUIDADO e BEM-ESTAR (144 ST - 23,53%) e a
classe 6, VIVER BEM (83 ST - 13,56%) constituem o eixo mais expressivo
estatisticamente, por congregar o maior número de ST classificados,
apresentando um eixo com o contexto semântico vinculado às preocupações com
a saúde, bem-estar e qualidade de vida.
A classe 5 é a maior dentre elas, sendo que as formas salientes
selecionadas foram: saúde (63.77), preocupação (36.63), mente (30.33), satisfeito
(27.55), atividade (25.88), ativo (24.81), importante (24.16), bem-estar (23.01),
cuidado (21.04), estética (20.09), bom (19.07), corporal (18.02), preocupar
(15.18), atenção (14.94), ego (13.09), autoestima (13.09).
Identificaram-se como as principais contribuições à construção desta
classe, mulheres mais velhas, situadas entre 80 e 89 anos, e com o nível mais
baixo de escolaridade, o ensino fundamental.
A preocupação principal é concedida aos cuidados com a saúde (física e
mental), ao envelhecimento ativo e saudável, à prevenção de doenças.
“agora, depois da idade, tem que cuidar, né? (...) hoje (...) a gente vive mais, (...) as pessoas se sentem mais comprometida (...), ligam mais prá própria saúde, antigamente a gente não ligava (...) quando eu comecei a ir a médico (...) foi na época que eu tava prá ter meus filhos, já tinha 30 e poucos anos” (mulher, 82).
“a grande preocupação do idoso é a doença, (...) então ele procura essas atividades prá fugir das enfermidades” (homem, 71).
A estética corporal é levada em consideração pelos sujeitos como uma
consequência natural da vida esportiva que levam, estando associada com a
busca pelo bem-estar. Demonstram preocupação com os jovens, mais voltados à
126
construção rápida de um corpo exemplar, nos moldes da “fôrma” estética
circulante, ressaltando ser essa uma construção que deva ser pensada a longo
prazo, e que tal comportamento apressado poderá trazer consequências adversas
à saúde deles, quando estiverem mais velhos, tiverem atingido a idade em que se
encontram os pesquisados.
Admitem alguns que começaram a dar mais atenção à prática de AF
visando à saúde depois de alcançar a maturidade, tendo sido essa inversão de
prioridades uma das conquistas do processo de envelhecimento bem-sucedido
por que passam.
Reproduzem a visão da primazia da mente sobre o corpo, mas
reconhecendo a influência recíproca existente. Demonstram satisfação com o
estado corporal em que se encontram, principalmente quando se comparam
favoravelmente com outras pessoas da mesma idade, remetendo à noção de
contraste descente desenvolvida por Caradec (2011), em que o importante é que
a comparação com o outro seja sempre favorável a quem a faça.
“Minha autoestima está sempre elevada, principalmente quando eu me olho no espelho, principalmente quando eu vejo pessoas da minha idade que estão mais caidinhas. Isso eu fico muito (...) lisonjeada” (mulher, 67).
Procuram as AF e outras atividades mais voltadas à sociabilidade e ao
estímulo das capacidades mentais visando à manutenção da lucidez, da
independência e da autonomia pelo tempo máximo que for possível, pois lhes
incomoda profundamente a ideia de dar trabalho e despesa aos filhos no futuro.
“eu acho que a gente tem (...), até a hora do fim, (...) que procurar prolongar esse fim o mais longe possível e da melhor maneira possível. Então, o corpo é importante, porque o corpo bem, a mente vai atrás” (homem, 65).
Além disso, para eles é uma felicidade e uma satisfação pessoal muito
grande continuar a fazer suas atividades. Esforçam-se para não se deixarem
vencer pela idade, uma vez que acreditam ainda manter um “corpo bom”, sendo
capazes de experimentar uma roupa nova e se sentirem bem, o que lhes eleva a
autoestima, confiança possível de ainda ser cultivada na idade em que estão.
127
Por último, é interessante observar que, ao externarem a sua visão sobre a
figura do idoso fisicamente ativo, notou-se a presença de três vieses na base das
definições descritivas e conceituais que fizeram sobre ele.
Há os sujeitos que fundamentam as características do idoso fisicamente
ativo, ancorando suas narrativas em suas memórias desportivas e nas
capacidades psicomotoras de ainda permanecerem praticando esportes por muito
tempo, no sentido abrangente das práticas físicas.
“Então, isso (...) é uma glória, (...) chegar nessa idade e poder participar num jogo de vôlei com a (...) garotada de 35, 40 anos, (...) isso (...) é uma vitória de vida, é um prêmio que eu tô recebendo” (homem, 89).
Outros centram suas explanações apoiados nas capacidades psicossociais
do idoso ativo, necessárias para o convívio social em ambientes, até há pouco
tempo, não frequentados por eles. Seja porque ainda não estivessem
aposentados, seja por razões de ordem familiar, e que são desenvolvidas nos
diversos espaços onde haja o estímulo ao exercício da sociabilidade. Essa
imagem parece ancorar-se na necessidade humana atávica de pertencimento
grupal.
“comecei há 13 anos, estava muito sozinha, eu era vendedora, mas fechou. Os meus amigos foram feitos agora, nesse período. Sou uma pessoa rica” (mulher, 75).
A terceira vertente fundamenta sua conceituação na preservação das
capacidades funcionais do idoso fisicamente ativo. A imagem que lhes sobressai
é a do medo de perderem a autonomia e a independência, de darem trabalho aos
outros, de perderem os movimentos, ficarem acamados, presos a uma cadeira de
rodas. Ao que parece, a ideia de proximidade da morte é a responsável pela
ancoragem dessa imagem prototípica do idoso fisicamente ativo.
“Hoje (...) já vê gente com 90 e poucos anos (...) tendo a memória boa, eu acho que (...) vai até os 150, (...) se a pessoa (...) andar. (...) eu moro num prédio que (...) era todo mundo da mesma idade (...), já morreu alguns e os que estão vivo tão em cadeira de roda, tão muito mal, (...) e quando eu vejo, eu procuro nem olhar, porque aquilo me faz um mal horrível, (...) eu penso (...) o seguinte: eu ficar entrevada numa cadeira de roda, eu vou acabar morrendo, porque (...) eu não me sinto assim, (...) eu gosto de
128
andar, de fazer as coisas, eu tenho muita energia e eu tenho que ter energia e alegria prá poder viver com saúde” (mulher, 82).
A classe 6, VIVER BEM (83 ST - 13,56%), apresentou as seguintes
palavras relevantes: exercício (42.57), dor (37.80), vida (31.59), melhor (27.81),
olhar (26.08), amizade (25.66), mudar (13.86), sentir (13.56), academia (12.77),
cabeça (12.75), exercício físico (9.72).
Agrupou ST elaborados, em sua maioria, por indivíduos mais novos (entre
60 e 69 anos), moradores nos bairros da zona norte e com nível universitário. Não
houve prevalência entre os sexos dos sujeitos.
Esta classe tem o seu contexto semântico, e de construção de sentidos,
associado com a qualidade da vida que levam e de como aproveitam a vida após
a aposentadoria ou a independência dos filhos.
Salientam mudanças de hábitos, principalmente os alimentares e os
comportamentais relacionados à prática dos exercícios físicos. Comentam
positivamente sobre as mudanças corporais sofridas, decorrentes da regularidade
com que praticam AF, sendo esse dispositivo considerado uma das obrigações
mais prazerosas da sua rotina, com o qual se sentem comprometidos, muito em
função das amizades construídas nos locais onde se exercitam.
Para alguns, devido ao tipo de vida que levavam anteriormente, esses
ambientes proporcionaram a oportunidade para que fizessem grandes amizades,
mesmo após os 60 anos. Ter amigos é enfaticamente valorizado e aqueles que
dizem ter amigos mais jovens, em função da prática esportiva, jactam-se dessa
situação com indisfarçável satisfação, como observado no processo de
investigação.
Procuram levar uma vida saudável, da qual se orgulham, e consideram os
exercícios, devido aos seus benefícios biopsicossociais, uma das coisas mais
importantes das suas vidas.
“Eu busco (...) a satisfação, busco a saúde, busco (...) o comprometimento, (...) essa coisa passa a ser a mais importante da minha vida. Eu deixo de fazer outras coisas em função do exercício, em função da atividade física” (homem, 72).
129
Acreditam que estejam fazendo o melhor que possam para evitar a
decadência física, esforçam-se para não se deixarem relaxar, cujo adjetivo
correspondente, “relaxado”, é compreendido como uma acusação de lassidão
moral. Com forte conotação pejorativa, ninguém gostaria de ser classificado
nessa categoria, mas ela é utilizada e construída em oposição à imagem que
fazem de si, merecedora dos próprios elogios. Como mencionado, o autoconceito
apresentado por idosos em diversas pesquisas é muito mais favorável do que
inicialmente se poderia supor (CARADEC, 2011), conforme pode ser verificado a
seguir, em comentário sobre o corpo ideal na terceira idade:
“posso dar como exemplo o meu corpo? O ideal seria (...) um homem na faixa de 70 quilos, (...) se puder manter a musculatura, porque a idade torna a musculatura decadente, os músculos vão sumindo. Numa atividade física, ele vai mantendo (...), porque a velhice leva o cara à decadência, ele começa a relaxar, o cara tem que ter perseverança, força de vontade, é manter o melhor possível” (homem, 71).
Quando estão praticando continuamente suas AF, sentem-se gratificados
com o próprio corpo, bem consigo mesmos e perante os outros, têm a
necessidade da prática e afirmam que os exercícios aliviam as dores do corpo,
características da idade.
Referem-se à conexão existente entre o corpo e a mente, normalmente
substituída por “cabeça”, como visto na abordagem estrutural das RS, conferindo
importância a seu papel de impulsionar o corpo em direção à AF, muito mais do
que a capacidade dos exercícios de modificarem positivamente um estado
psicológico de desânimo e prostração.
Entretanto, alguns sujeitos demonstraram dominar um conhecimento
oriundo da ciência, num exemplo de apropriação leiga de um saber reificado
(MOSCOVICI, 2012), ao prontamente estabelecerem relação entre a prática de
AF, a produção de endorfina (ou endomorfina) e a consequente melhora do
humor a partir dos exercícios físicos. Por isso, ao exemplificar as formas de
reação das pessoas quando estão prostradas psicologicamente, um participante
desportista de 60 anos tenha se utilizado como exemplo para exclamar:
“Endorfina, sem dúvida! Se o cara tiver mal, [a AF] é uma válvula de escape sim
senhor!”
130
Na Figura 7 pode-se observar um esquema onde se procurou reproduzir a
interpenetração dos três eixos identificados na CHD ─ o eixo das AF, o eixo da
beleza, e o eixo da saúde e da qualidade de vida ─, assim como a sua
subordinação ao objeto de pesquisa, o corpo, este inserido no campo mais amplo
da vida, que simboliza a vontade manifestada pelos sujeitos de continuar a
(con)viver com qualidade.
Figura 7 - Esquema das interpenetrações dos três eixos das RS de corpo
131
Figura 8 - Dendrograma indicativo das classes das RS de corpo e seus eixos
correspondentes
132
Figura 9 - As classes das RS de corpo e suas palavras características
133
CONCLUSÃO
O corpo é um objeto de interesse social, conformado pela natureza e pela
cultura, com uma relevante dimensão psicossocial na sua construção; e este
trabalho, fundamentado na teoria das representações sociais, objetivou captar e
compreender como os componentes de uma determinada estrutura cognitiva
interagem com a vida social através das relações do cotidiano. Em sentido
inverso, como os sujeitos se utilizam desses componentes nas suas relações com
os outros, ou ainda, como eles surgem a partir dessas relações. Esse processo
simultaneamente individual e coletivo é produzido e (re)produz pensamentos
sociais, incorpora novos conhecimentos que as pessoas ressignificam e utilizam
para agir individualmente ou em grupo.
Nesta pesquisa, tratam-se dos sentidos atribuídos ao corpo e socialmente
compartilhados por uma amostra de idosos ativos, das camadas médias da
população e praticantes regulares de AF. Prática, essa, que se mostrou atuante
na produção dos sentidos de corpo expressados pelos sujeitos, que procuraram
esse dispositivo a fim de dar vazão aos apelos sociais por saúde e por uma
estética corporal que anuncie, sem precisar de palavras, o gozo da saúde
estampado no corpo.
Na presente investigação sobre as RS de corpo, este objeto inseriu-se no
campo mais amplo dos projetos individuais e coletivos do prolongamento da vida,
a longevidade com qualidade.
Por sua vez, o dispositivo AF surgiu como merecedor do investimento dos
sujeitos para viabilizar tanto a saúde do corpo quanto a beleza física, adequada
às idades. Além disso, demonstrou potencial para proporcionar momentos
prazerosos de sociabilidade, o que tende a aprofundar o seu envolvimento ativo
com a vida e de forma saudável.
As RS de corpo encontradas, além da prioritária preocupação com a
saúde, incluídas as relativas à manutenção das capacidades mentais e
funcionais, também apresentaram indicações da relevância conferida pelos
idosos, inclusive pelos homens, aos aspectos da aparência física, da beleza
corporal.
134
Tal achado surpreendeu o pesquisador, mostrando-se diferente do
esperado, levando-se em consideração a cultura masculina brasileira, em que os
atributos de beleza são pensados como pertencentes ao universo feminino. Em
acréscimo, não se pode esquecer que a média de idade dos homens pesquisados
foi de aproximadamente 72 anos, ou seja, em média, a maioria nasceu no início
da década de 1940, na primeira metade do século XX, época em que os valores
da juventude ainda não estavam consagrados.
Em compensação, viveram desde o princípio toda a revolução de costumes
do pós-guerra, o avanço das tecnologias, a consolidação do pensamento
psicanalítico, a conquista de liberdades individuais. Essas transformações podem
ter contribuído para que grande parte não se recusasse a abordar o tema ainda
tabu da beleza corporal, embora nem sempre ficassem à vontade. De todo modo,
os resultados parecem indicar uma tendência no pensamento social do homem
idoso em incluir a temática da aparência física nas suas preocupações com o
corpo, sem que isso se confunda com fatuidade.
Atualmente, os idosos, homens e mulheres, vivem mais, chegam à última
etapa da existência com as suas capacidades cognitivas e funcionais
preservadas, em condições de desenvolver potencialidades inexploradas, com
tempo livre, alguma renda e a esperança de viver com saúde por muitos anos
ainda. Portanto, podem alimentar planos para o futuro, podem aspirar ao início de
uma nova fase da vida.
Em relação aos participantes desta pesquisa, encontrou-se que o corpo
estaria sendo preparado para desempenhar-se não apenas funcionalmente, mas
com expectativas simbólicas em relação ao seu uso social. Em outras palavras,
pela triangulação metodológica adotada, observou-se que os sujeitos dão
importância às dimensões funcionais e também afetivas das RS de corpo que
constroem, cujos diversos relatos a respeito foram citados ao longo do trabalho.
Note-se que essa revelação nem sempre foi obtida de forma direta,
estando nas entrelinhas das falas, nas ambiguidades dos discursos, nas
expressões faciais e corporais, dando a entender que, nessas situações, tratava-
se de manifestações espontâneas, inconscientes.
135
Assim, pode-se dizer que os sujeitos nutrem expectativas em relação às
funções simbólicas do corpo, ao seu uso social até mesmo com fins de sedução e
que esta perspectiva está diretamente relacionada ao tempo de vida ativa que
ainda têm pela frente.
Durante a observação, viu-se que os idosos praticam, em sua grande
maioria, atividades físicas moderadas, inclusive os adeptos da musculação. A
intensidade do treinamento a que se submetem não permite supor que almejem
construir um corpo exemplar, nos moldes das imagens difundidas na mídia.
Entretanto, as práticas observadas estão de acordo com as RS
encontradas. Primeiramente, são exercícios de baixa intensidade, mas que visam
ao condicionamento cardiorrespiratório, ao desenvolvimento da força, do
equilíbrio, do ritmo, da coordenação motora, da flexibilidade, isto é, estão
diretamente relacionados à aquisição ou manutenção da saúde e da autonomia,
dois conteúdos fundamentais nessas RS.
Além disso, são proporcionais e adequadas à RS de corpo ideal para o
idoso, almejada pelos pesquisados, a qual nomearam de “corpo normal”, a RS
considerada a mais apropriada a essa faixa etária.
As práticas observadas, principalmente a dança, foram eloquentes em
conteúdos afetivos, demonstrados pelo carinho aos professores, assim como pela
criação de grandes amizades.
Curioso observar que, na abordagem estrutural das RS de corpo, a
cognição amizade só tenha aparecido no SP do subgrupo masculino. Talvez
fosse de se esperar, uma vez que na análise prototípica do dispositivo AF, essa
palavra tenha se constituído num conteúdo presente em toda a amostra.
Por outro lado, o valor da amizade foi enfaticamente ressaltado pelos
sujeitos nas entrevistas realizadas, cujo corpus foi processado pelo IRAMUTEQ.
Os resultados obtidos através da abordagem estrutural revelaram o
elemento saúde como o único a confirmar seus atributos de cognição central das
RS de corpo e do dispositivo AF. Considerou-se, nesses achados, a totalidade
das possibilidades examinadas nos subgrupos feminino e masculino, assim como
na amostra total. No interior das RS de corpo, além dos conteúdos mais
136
diretamente associados com os cuidados de saúde ─ cuidado, bem-estar,
alimentação ─, apareceram cognições importantes relacionadas à preservação
das capacidades mentais ─ cabeça, mente ─, das capacidades funcionais ─
pernas, equilíbrio, agilidade ─, dos atributos físicos ─ aparência, beleza, forma
física ─, e, com menos força, da convivência social ─ amizade, alegria.
Esses resultados estão coerentes com os encontrados pela CHD, que, ao
dividir o corpus em seis classes lexicais, possibilitou a que se chegasse, após um
longo e trabalhoso processo de interpretação triangulado, a três eixos de sentidos
de corpo partilhados pelo grupo: o eixo do dispositivo AF, que agrupa as
modalidades referidas pelos sujeitos, assim como as formas a elas associadas; o
eixo dos discursos sobre a beleza e a estética corporal; e o eixo mais significativo
estatisticamente, o dos cuidados com a saúde e qualidade de vida. Esses eixos
se interpenetram para impulsionar o corpo a uma vida longa e com qualidade.
É importante chamar a atenção para o aspecto estatístico porque, sem
querer questionar o seu papel, nem sempre a classe com a maior proporção de
ST será a de maior participação na construção de sentidos do objeto em análise.
Este trabalho se propôs a fazer a triangulação metodológica na produção
dos dados, ao coletar informações através da utilização da observação, de
questionários e de entrevistas. Assim sendo, procurou constantemente analisar os
resultados encontrados em sua totalidade, a partir das classes definidas pelo
IRAMUTEQ, através de incontáveis idas e vindas a todo o material reunido, em
busca da confirmação dos significados interpretados desde as formas inicialmente
classificadas pelo programa. Em seguida, passou-se ao exame contextualizado
das formas, até a seleção das que melhor articulassem o sentido de cada classe,
além de procurar lhes dar um nome que conseguisse abranger a sua
complexidade, tarefa sempre incompleta.
Em resumo, o pesquisador procurou ser o mais fiel possível aos sentidos
das classes, respeitando os seus conteúdos em contexto que, afinal, são os que
lhe dão sentido.
Como no restante do material encontram-se outros conteúdos correlatos e
pertinentes aos classificados pelo IRAMUTEQ, não se poderia deixar de utilizá-
los, sob pena de empobrecimento da triangulação feita durante a análise dos
137
dados. Por outro lado, isso ajuda a corroborar a eficácia do programa na
classificação lexicográfica, ao mesmo tempo em que evidencia a similaridade das
RS de corpo expressadas nas diversas oportunidades, o que ratifica o acerto da
decisão de adotar a triangulação metodológica na coleta e na análise dos dados.
Por fim, o interesse maior deste estudo não está voltado para a mera
apuração de uma grande quantidade de dados coletados, mas intenta a detida
observação dos discursos produzidos pelos sujeitos, de forma a poder apontar
uma tendência, um caminho original, para que, aí sim, não se fique preso ao
conhecimento do senso comum, mas à produção do conhecimento científico.
138
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APÊNDICE I
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Instituto de Estudos em Saúde Coletiva CORPO E ATIVIDADE FÍSICA PARA MAIORES DE 60 ANOS: UM ESTUDO DE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS. 1. Quais são as 4 primeiras palavras que vêm à sua cabeça quando se fala em ________? ____________________________ _____________________________ ____________________________ _____________________________ 2. Destas, quais são as 2 mais importantes para você? _________________________ e _________________________ 3. Por favor, justifique porque você escolheu essas duas palavras. ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 4. Quais são as 4 primeiras palavras que vêm à sua cabeça quando se fala em ________? ____________________________ _____________________________ ____________________________ _____________________________ 5. Destas, quais são as 2 mais importantes para você? _________________________ e _________________________ 6. Por favor, justifique porque você escolheu essas duas palavras. ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 7. Envelhecer bem é _______________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 8. Em sua opinião, o que significa estar em forma? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 9. Você se considera em forma? ( ) Sim ( ) Não. Por que? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 10. De um modo geral, qual a opinião dos seus amigos e amigas sobre alguém com mais de 60 anos que tenha um corpo em forma? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 11. Marque sua resposta com um X no quadro a seguir.
Pensando nas pessoas praticantes de atividade física com 60 anos ou mais, você acredita que elas sejam:
Nenhum pouco Pouco Bastante Totalmente
Dependentes
Produtivas
Saudáveis
Mal-humoradas
Competentes
Sexualmente ativas
Conservadoras
Atuantes
Discriminadas socialmente
Tímidas
Valorizadas
Frágeis
Fisicamente atraentes
12. Para você, como seria um corpo ideal? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 13. Que pessoa pública com mais de 60 anos tem um corpo que lhe pareça o mais próximo do ideal? Mulher:__________________________________________________________ Homem:_________________________________________________________ Porque você pensa assim? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 14. Você se sente influenciado(a) pelas imagens dos corpos de pessoas famosas? ( ) Sim ( ) Não Por que? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 15. De um modo geral, que diferenças você destacaria entre o corpo ideal de hoje em dia e o de 40, 50 anos atrás? Qual deles você prefere? Por que? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________
16. Que elementos de beleza e de saúde você destacaria nos corpos de hoje em dia e nos de antigamente (40, 50 anos atrás)? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 17. O que levou você a fazer atividade física e quando começou? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 18. Com que frequência e quais as atividades físicas que pratica regularmente? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 19. O que mais o(a) motiva a continuar praticando essas atividades? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 20. Das atividades físicas que você pratica ou já praticou, qual delas lhe trouxe os melhores resultados? Por que? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 21. Qual ou quais dos motivos abaixo foram mais importantes para a escolha da(s) atividade(s) física(s) que você pratica? (mais de uma opção pode ser marcada). ( ) Notícias de jornais e revistas ( ) Ver o resultado alcançado por outras
pessoas ( ) A orientação de um profissional de
educação física ou fisioterapeuta ( ) A minha própria experiência
( ) Matérias ou programas de rádio ou televisão
( ) A opinião de amigos e familiares
( ) O aconselhamento médico ( ) Leituras técnicas sobre o tema Se quiser, pode acrescentar outros motivos: _____________________________________ ________________________________________________________________________ Sobre você: Idade: ____ Sexo: ____ Estado civil: _________________________________________ Profissão? _______________________________________ Ocupação atual? __________________________________ Aposentado? ( ) Sim ( ) Não Escolaridade: _________________________________________________________________ Eu me considero de cor: ____________________________ Bairro de moradia? __________ Se você quiser fazer mais algum comentário, por favor, use o verso desta página.
APÊNDICE II CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Instituto de Estudos em Saúde Coletiva Doutorado em Saúde Coletiva - 2012
Temos a satisfação de convidá-lo(a) a participar da pesquisa que estamos fazendo. Trata-se de um estudo que visa contribuir para a melhor compreensão do pensamento dos maiores de 60 anos sobre atividade física, saúde, cuidados com o corpo. Para isso, estamos aplicando um questionário e entrevistando pessoas que já atingiram essa faixa etária e que sejam praticantes regulares de atividade física. Você não é obrigado(a) a responder, se não quiser, mas para nós seria muito importante contar com a sua opinião a respeito desses temas. Os resultados encontrados e as conclusões do estudo poderão ser publicados ou divulgados em eventos científicos. Nós lhe asseguramos que tudo o que for dito será utilizado somente como material de pesquisa e a sua identidade será mantida em sigilo. Por último, esclarecemos que a decisão de participar, ou não, caberá somente a você, que terá total liberdade para deixar de participar a qualquer momento. Em caso de dúvidas, entre em contato conosco através do e-mail, dos telefones ou do endereço abaixo.
Muito obrigado por sua colaboração,
Pesquisador: Doutorando Júlio Afonso Jacques Gambôa. Orientadores: Prof. Dr. Luiz Fernando Rangel Tura e Profª. Dra. Ivani Bursztyn. E-mail: [email protected] Tel: 21 25989282. UFRJ - Instituto de Estudos em Saúde Coletiva. Tele/fax: 21 22700097 e 21 25989274. Av. Brigadeiro Trompowski s/nº, Praça da Prefeitura – Ilha do Fundão, RJ. Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva. Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Caso você tenha dificuldade em entrar em contato com o pesquisador responsável, comunique o fato à Comissão de Ética em Pesquisa do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva pelo telefone 21 2598 92 93 ou pelo e-mail [email protected]”
Estou de acordo com os termos apresentados no CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO.
Rio de Janeiro, ______ de __________ de 201__.
NOME:____________________________________________________________
ASSINATURA:_______________________________________________________
ASSINATURA DO PESQUISADOR:_______________________________________
Data de elaboração do TCLE: 27 de julho de 2012. Revisado no dia 11 de outubro de 2012.
APÊNDICE III
ROTEIRO PARA ENTREVISTA EM PROFUNDIDADE
Identificação (condições de produção das RS: quem fala, de onde fala).
Data: local: nome/sexo: idade: escolaridade: bairro de moradia: raça/cor: situação
conjugal: aposentado(a)?: profissão: continua trabalhando?: na mesma profissão?:
1 - Fale sobre as AF que você faz, os cuidados que mantém com o corpo e a importância
desse comportamento.
2 - Hoje, esses cuidados têm um papel mais importante do que tinham antes?
3 - O que você acha que as pessoas associam com a imagem do corpo?
4 - Você considera importante a estética corporal?
5 - Para você, como é um corpo bonito?
6 - Gostaria de modificar alguma parte do seu corpo (acrescentar, diminuir)?
7 - O que você faz, toma alguma iniciativa, se você se olha no espelho e não fica satisfeito
com o seu corpo?
8 - Você deixaria de ir a algum lugar, a alguma atividade social, dependendo de como
estivesse o seu corpo?
9 - Na sua opinião, como a mídia retrata o corpo perfeito?
10 - Você acredita que a mídia reforce algum tipo de preconceito contra o corpo
envelhecido?
11 - Como você imagina o padrão de beleza corporal no futuro?
12 - Para você, como é ser (ou como você descreveria) uma pessoa ativa fisicamente na
terceira idade?
13 - Para você, existe um tipo de corpo ideal para a 3ª idade?
14 - Na sua opinião, existe algum tipo de cobrança para que você mantenha uma
aparência jovem?
15 - Você acha que o seu corpo interfere na sua maneira de pensar e agir? (ou como a sua
cabeça interfere no seu corpo e vice-versa?)
16 - Houve algum tema que não tenha sido abordado e que você gostaria de falar?
APÊNDICE IV
CURRÍCULO LATTES (formato resumido)
Luiz Fernando Rangel Tura (orientador) <http://lattes.cnpq.br/9928401128863971>
Possui graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina (1968), mestrado em Educação pela
Fundação Getúlio Vargas (1980) e doutorado em Medicina pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro (1997). Atualmente é pesquisador associado da Universidade de Évora e professor
associado da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tem experiência na área de Saúde Coletiva,
com ênfase em Saúde Pública, atuando principalmente nos seguintes temas: prevenção,
representações sociais, aids, representações sociais, envelhecimento e práticas em saúde.
Ivani Bursztyn (orientadora) <http://lattes.cnpq.br/1943907256479341>
Possui graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1978), mestrado em
Msc Gestão Em Saúde pela Universidade de Heidelberg (1991), doutorado em Medicina pela
Universidade de Heidelberg (1997) e doutorado em Saúde Coletiva pela Fundação Oswaldo Cruz
(2004). Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e preside a
Rede de Investigação em Sistemas e Serviços de Saúde no Cone Sul e pesquisa da Organização
Panamericana de Saúde. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Saúde
Pública, atuando principalmente nos seguintes temas: investigação em Sistemas e Serviços de
Saúde, humanização do cuidado, saúde do adolescente, representações sociais.
Júlio Afonso Jacques Gambôa (doutorando) <http://lattes.cnpq.br/0994138437179669>
Possui graduação em Educação Física pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ-1979)
e mestrado em Saúde Coletiva pelo Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC-UFRJ-2009).
Atualmente é doutorando do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do mesmo instituto.
É professor do Colégio Militar do Rio de Janeiro e atua principalmente nos seguintes temas:
corpo, estudantes, educação física, envelhecimento e representações sociais.
APÊNDICE V
DECLARAÇÕES
Os pesquisadores declaram para os devidos fins que os resultados da pesquisa serão
tornados públicos, sejam eles favoráveis ou não.
Os pesquisadores asseguram que os dados da investigação serão usados exclusivamente
para fins da pesquisa e que todo o material reunido ─ incluindo os questionários
preenchidos ou outras formas de coleta como as gravações de áudio, vídeo e suas
respectivas transcrições ─ ficará guardado sob a sua inteira responsabilidade.
APÊNDICE VI
TERMO DE COMPROMISSO
O pesquisador responsável, Prof. Dr. Luiz Fernando Rangel Tura, assume o compromisso
de cumprir os termos da resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, assim como
todo o teor do protocolo de pesquisa.