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ASSOCIAÇÃO DE ESTUDOS PSICANALÍTICOS DE SÃO PAULO Suziane Cunha Sales Sasaki A CONTRIBUIÇÃO DA PSICANÁLISE NA PSICOPEDAGOGIA- Investigando o inconsciente pela interpretação do desenho:

A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia- Investigando o Inconsciente pela Interpretação do desenho. Monografia

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ASSOCIAÇÃO DE ESTUDOS PSICANALÍTICOS DE SÃO PAULO

Suziane Cunha Sales Sasaki

A CONTRIBUIÇÃO DA PSICANÁLISE NA PSICOPEDAGOGIA- Investigando o inconsciente pela interpretação do desenho:

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SÃO PAULO

2011Suziane Cunha Sales Sasaki

A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia-Investigando o inconsciente pela interpretação do

desenho:

Monografia apresentada para a obtenção do título de especialista em Psicanálise, pela Associação de Estudos Psicanalíticos de São Paulo, sob a orientação da Profª DRª Roseli Bacili Laurenti.

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São Paulo

2011

Sasaki, Suziane Cunha SalesA Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia-Investigando o Inconsciente pela Interpretação do desenho.Profª DRª Roseli Bacili Laurenti – São Paulo: 2011.-------p.Monografia de Conclusão de Especialista em Psicanálise – Associação de Estudos Psicanalíticos de São Paulo1. Psicanálise 2. Psicopedagogia 3. Inconsciente 4. Desenho

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A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia: Investigando o inconsciente pela interpretação do

desenho.

Suziane Cunha Sales Sasaki

Monografia apresentada para obtenção do título de psicanalista pela Associação de Estudos Psicanalíticos de São Paulo.

Data da Aprovação______/_______/_______.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________

ProfªDrª Roseli Bacili Laurenti (orientadora)Titulação: Drª em Psicopedagogia e Psicanalista

CONCEITO FINAL__________________________

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Dedico a todos àqueles que direta ou indiretamente, contribuíram para

que mais esse sonho torna-se realidade. À minha querida mãe Olivia, (in-

memórian) que sempre me ensinou; ser forte e nunca desistir dos meus

sonhos.

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Ser Feliz

Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes e não

esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo e que posso

evitar que ela vá á falência. Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver,

apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise. Ser

feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria

história. É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um

oásis no recôndito de sua alma. É agradecer a Deus a cada manhã pelo

milagre da Vida. Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos; é

saber falar de si mesmo e ter coragem para ouvir um não. É ter

segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta; pedras no

caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo...

Fernando Pessoa

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por ter me dado mais esta oportunidade de realização, ao meu

querido marido, Seigi Sasaki, aos meus filhos André e Fernando, que sempre

tiveram paciência e compreenderam o real motivo dos momentos que me

ausentei; em busca de realizar mais um sonho; e poder oferecer mais para

àqueles que confiam no meu trabalho psicopedagógico. Aos professores e em

especial à minha Orientadora, Profa. Dra.Roseli Bacili Laurenti, por toda sua

atenção, paciência e incentivo.

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SUMÁRIO

1. Resumo 102. Introdução 123. Breve histórico da psicanálise 154. A formação do aparelho psíquico 175. As fases de desenvolvimento psíquico 196. Psicanálise e educação 237. As Fases do Desenho Infantil 298. Investigando o inconsciente através interpretação do desenho- A

parte Secreta dos Desenhos

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9. Conclusão 5010- bibliografia 60

Anexos

RESUMO

O presente trabalho foi desenvolvido, visando à reflexão sobre a contribuição da

Psicanálise no campo da Psicopedagogia e Educação, como uma forma de

auxiliar na investigação das Dificuldades de Aprendizagem. Tendo como uma das

ferramentas de análise, a interpretação da simbologia do desenho-história

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principalmente da criança dos 02 aos 10 anos. Sigmund Freud, pai da

Psicanálise, que foi o primeiro a aplicar o método psicanalítico na investigação do

inconsciente através de produções culturais e artísticas; fez uso desse método

em suas pesquisas nas determinações do inconsciente, de manifestações

subjetivas; e afirmou que esse método, quando bem aplicado, pode contribuir

para a investigação dos bloqueios que afetam a vida de um indivíduo. Na

Psicopedagogia o profissional, terá como uma das recomendações de

investigação, aplicar a Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem - E.O.C.A

(Visca, 1987) que se trata de um instrumento de sondagem, do inconsciente, da

problemática de aprendizagem do sujeito pelo seu desenho. Vejo a possibilidade

de a Psicanálise ser uma ferramenta de extrema importância para auxiliar o

trabalho psicopedagógico e contribuir para a investigação das dificuldades de

aprendizagem que, quando não investigadas e tratadas, podem ser levadas para

a vida adulta e comprometer o futuro do indivíduo. Por esse motivo, resolvi

aceitar o desafio de iniciar um novo estudo, e olhar, para ajudar de forma mais

acertada possível, as crianças, adolescentes e adultos, que comparecem ao meu

consultório em busca de solucionar a dificuldades de aprendizagem que

apresentam no seu dia-a-dia e que compromete a realização de suas atividades

escolares. A contribuição dos especialistas Piaget e Klein, com suas pesquisas,

nos mostra a importância do desenvolvimento sadio do aparelho psíquico que

muitas vezes pode comprometer o desenvolvimento cognitivo e o

desenvolvimento do sujeito como um todo. Quero também compartilhar a rica

experiência que tive com o trabalho voluntário realizado no Hospital Albert

Einstein (2007-2009), na favela de Paraisópoles em São Paulo; quando realizei

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atendimentos psicopedagógicos e pude ver o quanto essas crianças

apresentavam bloqueios que eram representados pelos desenhos; como uma

forma de expressar algo que não estava bem e comprometia o rendimento na

escola; e por se tratar de uma nova realidade, nos atendimentos

psicopedagógicos, reforçou ainda mais a minha convicção de buscar na

Psicanálise uma nova ferramenta de trabalho e de ajuda a essas crianças. Na

introdução, do primeiro capítulo, deste trabalho abordo um breve histórico sobre a

Psicanálise; mesmo porque, falar de Psicanálise é falar sobre um infinito estudo

sobre a questão do aparelho psíquico; e mesmo que eu quisesse me aprofundar,

não haveria páginas suficientes para descrever tudo que a Psicanálise trata e

investiga.

Palavras chaves: Psicanálise, Psicopedagogia, Inconsciente, Desenho

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1. INTRODUÇÃO

Sempre procurei ser muito profissional em tudo que faço, e durante os

atendimentos psicopedagógicos, percebi o quanto era importante entender o que os

desenhos das crianças pretendiam dizer, pois, muitas vezes ficava evidentes as

expressões de angústia, medo, ou trauma que esses grafismos nos mostram, ou

parecem nos mostrar. No entanto, deparei também, com desenhos que pareciam

expressar alegria e satisfação; mas infelizmente, os primeiros modelos são os mais

evidentes e exatamente, por esse motivo resolvi elaborar esta pesquisa; para entender,

interpretar os desenhos, melhor intervir e auxiliar essas crianças.

Neste trabalho monográfico, reflito sobre as minhas experiências como

educadora, psicopedagoga e psicanalista objetivando observar a dinâmica entre o

cognitivo e o afetivo das crianças para entender a dinâmica e o funcionamento do

sujeito.

No primeiro capítulo abordo um breve histórico sobre a Psicanálise; mesmo

porque, falar de Psicanálise é falar sobre um infinito estudo sobre a questão do aparelho

psíquico; e mesmo que eu quisesse me aprofundar, não haveria páginas suficientes

para compor esse universo.

Amplio e apresento no segundo capítulo a formação do aparelho psíquico de

acordo com a descrição dada por Freud, pai da Psicanálise.

No capítulo seguinte descrevo as fases do desenvolvimento cognitivo de acordo

com Piaget; relacionando cada fase com a questão psíquica, para explicar como a

criança interpreta o mundo externo conforme a fase de desenvolvimento em que se

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encontra. E na seqüência dos demais capítulos, partindo do quarto capítulo, apresento

os modelos e técnicas de interpretação dos desenhos; e como eles podem estar

relacionados com a psique do sujeito que o realizou.

Estou convicta que esse trabalho poderá ajudar a entender um pouco mais o

que tentamos desvendar, nos atendimentos psicopedagógicos; que muitas vezes temos

a sensação de impotência por não dispormos de recursos mais explícitos e aplicáveis

para realizar os atendimentos. Nesse sentido elabora-se a seguinte pergunta:

Pode o desenho ser indicativo de problemas emocionais em crianças de 04 a

10 anos de idade?

O objetivo maior do diagnóstico psicopedagógico é procurar identificar os

desvios e obstáculos que afetam o aprendizado do sujeito e como este se revela

impedindo-o de se desenvolver dentro dos padrões esperados pela sociedade.

O diagnóstico psicopedagógico, muitas vezes, altera as atitudes tanto do

paciente quanto da sua família, que nem sempre está preparada para entender o

porquê da mudança de comportamento e das dificuldades, apresentadas,

principalmente no início do tratamento.

A família sempre espera um resultado muito breve o que nem sempre acontece

de imediato e então, sentem necessidade de comparecerem ao consultório buscando

uma resposta para as dificuldades de seus filhos. Não conseguem entender o que

implica nessa dificuldade e a razão disso tudo, sentindo-se culpados. Nesse sentido,

terão que ter muita paciência para ajudar seus filhos a superarem toda dificuldade e em

especial apoiar o tratamento que é fundamental para o desenvolvimento biopsicossocial

de seus filhos.

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Neste trabalho também estarei compartilhando algumas produções, de crianças

atendidas no Ambulatório de Paraisópoles; quando da realização de um trabalho

voluntário, no Hospital Albert Einstein, no Setor de Psicopedagogia. Foi sem dúvida

uma rica experiência; no qual pude compartilhar com outros profissionais,

conhecimentos e principalmente contribuir com o aprendizado dessas crianças.

Proponho com esse trabalho, investigar além da prática psicopedagógica aliada

à Psicanálise; por acreditar que ela, a Psicanálise, possa contribuir para montar o

quebra-cabeça das dificuldades de aprendizagem dos nossos pacientes.

Finalizo, apresentando as minhas considerações sobre as contribuições que a

Psicanálise me trouxe, não só para realizar os meus atendimentos terapêuticos, como

também na minha vida pessoal. Assim sendo, ressalto a necessidade de buscarmos

aprimorar o nosso trabalho, para proporcionar um maior crescimento não só dos nossos

pacientes, mas principalmente ao nosso crescimento pessoal.

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2. BREVE HISTÓRICO SOBRE A PSICANÁLISE

Neste capítulo apresento um breve histórico sobre a Psicanálise para explorar

um pouco do aparelho psíquico; de acordo com Freud, pai da Psicanálise. E, prossigo

com os capítulos, apresentando a contribuição de Piaget na construção do

conhecimento e também as considerações de Melanie Klein, em seus estudos

psicanalíticos especificamente com crianças.

2.1 Sigmund Freud e o surgimento da Psicanálise

A Evolução Histórica da Psicanálise dá-se desde Pré-História de forma

esquemática, e apresentada de forma dividida em história da assistência aos

transtornos mentais e emocionais em três grandes períodos: pré-história, pródomos

científicos e psicanálise como ciência.

Vou me ater ao período pródomos da Psicanálise, e da Psicanálise como ciência,

por serem os períodos que Sigmund Freud deu início as suas pesquisas; como

Neurologista e que o levou à descoberta da estrutura gonadal das energias.

Mais tarde, por meio de estudos, no campo da fisiologia, estudando o sistema

nervoso; já prenunciava a descoberta da Psicanálise palmilhando o caminho da

sexualidade e do psiquismo, que ele acreditava, no início de suas pesquisas.

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Em 1891 publicou o livro sobre Aphasia e em 1895 divulgou seus estudos sobre

paralisias cerebrais infantis; sendo conceituado como pesquisador e neurólogo,

segundo Zimerman, (1999, p.21).

Freud também nesse período interessou por estudar a utilização da hipnose com

o neurologista Charcot, empregando-a para fins científicos. E Freud resolveu estagiar

com Charcot podendo, desta forma, observar a dissociação da mente, induzida pela

hipnose para tratamento de seus pacientes.

Um pouco antes de realizar os estudos com Charcot, outro neurologista

J.Breuer, já havia apresentado a Freud a realização da hipnose para tratamento de seus

pacientes histéricos, sendo um dos casos principais o de Ana O (cujo verdadeiro nome

era Berta Papenhein).

No decorrer dos atendimentos, Freud se deu conta que era mau hipnotizador e

resolveu experimentar a livre associação de idéias; mesmo em pacientes despertados e

finalmente faz uso do método coercitivo, solicitando que seus pacientes deitassem no

divã. (Zimerman, 1999, p.23). Assim que percebeu que os conflitos psíquicos passaram

a ser concebido como resultante do embate entre as forças instintivas e as repressoras

e os sintomas, a representação simbólica deste conflito inconsciente, é que se inaugura

a psicanálise como uma nova ciência.

Zimerman, 1999, em seu livro, Fundamentos Psicanalíticos, ressalta que de uma

forma extrema e esquemática, podemos dividir a evolução histórica da psicanálise, com

as contribuições de Freud, em cinco estágios: teoria do trauma, teoria topográfica, teoria

estrutural, conceituações sobre o narcisismo e dissociação do ego.

O autor acrescenta ainda que Freud representa a intersecção de dois períodos; o

da medicina, da física e química e na elaboração teóricas psicanalíticas; sendo essas

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totalmente desconhecidas, criando e propondo a existência de uma dinâmica

inconsciente, podendo explicar alguns pelas suas novas teorias, e outras por meio de

cogitações metapsicologias.

2.2 A formação do aparelho psíquico

Segundo Freud, o aparelho psíquico é composto de três partes: Id, Ego e Superego.

Estes conjuntos de elementos estão em constante relacionamento entre si, e interferem

uns nos outros.

No id encontramos a matéria-prima, a substância vital, o conteúdo instintivo; no ego

o controle e a consciência e no superego o lado corretivo das ações.

2.2.1 O Id

O Id é o nosso lado inconsciente como instância psíquica; fundamentalmente

constituído pelas pulsões; e regido pelo princípio do prazer, logo, pelo processo

primário. Do ponto de vista da dinâmica psíquica, o id abriga e interage com as funções

do ego e com os objetos, tanto os da realidade exterior, como aqueles que introjetamos.

O id quase sempre entra em conflitos com o superego procurando de alguma

forma estabelecer uma aliança com o mesmo.

2.2.2 O Ego

Para Freud o ego desenvolve-se a partir do id, pela persistente influência do

mundo externo e da necessidade de adaptação ao mesmo. Segundo M. Klein e mesmo

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para autores mais modernos, o ego é inato, tem energia própria e de forma rudimentar,

desde o nascimento do bebê, o ego já está interagindo com a mãe. (Zimerman. 1999,

p.83).

O ego, como principal instância psíquica, acaba funcionando como mediador

integrador e harmonizador entre as pulsões do id; e as exigências do superego com a

realidade exterior.

2.2.3 O Superego

Para Freud o superego é o herdeiro do Complexo de Édipo; pois este é

constituído pelo precipitado de introjeções e identificações que herdamos dos nossos

pais. Apresenta-se com suas proibições, exigências, mandamentos, ameaças, padrões

de conduta e o tipo de relacionamento entre esses pais. Ele representará os valores

morais, éticos, ideais, preconceitos e crenças de acordo com a cultura que o sujeito

estiver inserido.

Todo homem deverá buscar um bom equilíbrio, entre esse três elementos do

aparelho psíquico para que ocorra o desenvolvimento de um ego forte; um superego

moderado para que possa reconhecer a natureza dos impulsos provindo do id; para não

se desequilibrar e entrar em conflito.

Para isso, há necessidade de por em prática um dos ensinamentos dos grandes

filósofos Platão e Sócrates que já nos diziam: A maior vitória é vencer a si próprio.

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2.3 As fases do desenvolvimento psíquico

2.3.1 Estágios de Desenvolvimento

1º Estágio- (de 0 a 2 anos) Esquema sensório-motor, segundo Piaget

Este estágio de desenvolvimento representa o estágio mais primitivo do

desenvolvimento. O desenvolvimento predominante é o das percepções, e os

movimentos do bebê estarão concentrados na boca levando-o a reconhecer o mundo ao

colocar as coisas na boca.

Freud também se referiu a esse período como fase oral, por ser a boca a zona

geradora de prazer. É uma fase em que o bebê é bastante egocêntrico, narcisista e

pensa ser uma extensão de sua mãe. Denominamos essa fase como uma fase de

dependência primária.

O parto é o primeiro trauma que o bebê sofre; pois precisa vivenciar um mundo

desconhecido e desprotegido, totalmente diferente do útero materno.

Depois há o segundo trauma, por razão do desmame, quando o bebê

experimenta a cisão do seio bom e do seio mau; passando a ter a noção da separação

da figura materna e se percebendo como um indivíduo distinto da mãe.

Nessa fase, o bebê vai procurar ser sempre ser atendido de acordo com suas

necessidades, pelo seio bom, da mãe que sempre o atende, principalmente no que se

refere ao querer mamar. Mas caso o bebê sinta-se rejeitado por essa mãe, a idéia

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dessa rejeição, o fará conhecer o seio mau; que não atende as suas necessidades e

poderá apresentar sintomas de neurose de abandono. Tanto a falta como o excesso de

cuidados, poderá resultar em fixações libidinais, contribuindo para quadros patológicos.

2º Estágio - (de 2 a 7 anos) Esquema Simbólico-Pré-operacional concreto:

Nessa fase, a descoberta do símbolo e da realidade pode ser representada

através da fala. A criança também se torna capaz de realizar representações mentais

tanto de pessoas, como de situações, e já tem uma percepção global das coisas que

estão ao seu redor. Mas ainda é centrada em si mesma, egocêntrica, pois não

consegue se colocar no lugar do outro, ou seja, não consegue relacionar as situações e

ainda não desenvolveu uma consciência abstrata, precisando ainda do concreto.

Freud denominou essa fase de anal; pois envolve o ato de reter e soltar as fezes,

nesse momento ocorre a maturação do controle neuromuscular; trazendo para a criança

a noção de limites.

[...] Geralmente, esta etapa é considerada como aquela em que as transformações vão ocorrendo no curso do segundo e terceiro anos, sendo que outras importantes funções devem ficar incluídas nesta fase, como são as de aquisição da linguagem; engatinhar e andar; curiosidade e exploração do mundo exterior; progressivo aprendizado do controle esfincteriano; controle da motricidade e prazer com atividade muscular; ensaios de individuação e separação (por exemplo, comer sozinho, sem a ajuda de outros); o desenvolvimento da linguagem e comunicação verbal, com a simbolização da palavra; os brinquedos e brincadeiras; a aquisição da condição de dizer não, etc. [...] Em resumo, é na fase anal que a criança desenvolve sentimentos sádicos e masoquistas, a ambivalência, as noções de poder e de propriedade privada, a rivalidade e competição com os demais, bem como o surgimento das dicotomias, tipo grande X pequeno; bonito X feio; dentro X fora; ativo X passivo; bom X mau; masculino X feminino, etc., etc. (ZIMERMAN, 1999 p.93)

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Nessa fase podemos observar as sensações de domínio ou de sujeição e as

implicações emocionais nas questões do receber, reter, eliminar, tomar e dar, etc.

(ZIMERMAN, 1999, p. 93).

O período anal representa essencialmente, um período de esforço à

independência e separação do controle dos pais.

3º Estágio- Operacional concreto- (de 07 a 11 anos) estruturas concretas:

Nessa fase, a criança é capaz de estabelecer uma relação com diferentes

aspectos do que ocorre ao seu lado; e até mesmo abstrair dados da realidade, mas

ainda necessita do concreto para chegar a essa abstração. Consegue também refazer

um trajeto mental; portanto consegue realizar a inversão e até mesmo dar explicações

de todo processo.

Nesse estágio, a criança passa do pensamento lógico, intuitivo, para operatório;

tendo inclusive condições de discussão sobre algo, ou seja, dar a sua opinião.

A fase que corresponde à fase fálica e está relacionada aos órgãos genitais; mas

diferentemente da fase genital adulta, ainda não há a noção do significado de uma

genitália feminina.

A criança começa a ter a noção de si mesma e de suas partes sexuais; podendo

ocorrer às primeiras manifestações de masturbação, exibicionismo, curiosidade sexual,

cena primária (imaginação), Complexo de Édipo, Período de Latência (sublimação dos

desejos), Puberdade e Adolescência e as Posições (M. Klein).

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[...] Até M. Klein, a concepção freudiana de fases evolutivas guardava uma hegemonia total entre todos os psicanalistas. A partir dos estudos dessa autora, houve uma significativa mudança na forma de entender nos movimentos evolutivos do psiquismo infantil, embora a concepção de fases continue vigente e perfeitamente válida em muitos aspectos teóricos e clínicos.[...] M.Klein descreveu dois tipos de posição: a esquizoparanóide (PEP), em 1946, e a depressiva (PD), em 1934, embora a certa altura de seus estudos ela tenha descrito uma terceira modalidade, a posição maníaca à qual não mais retornou. (ZIMERMAN, 1999, p.96)

É uma fase em que as meninas podem sofrer do complexo de inferioridade, por

não terem o mesmo poder fálico dos meninos; e esses por sua vez, o medo da

castração.

O narcisismo e a vaidade também estão nessa fase, podendo trazer conflitos

inconscientes e até mesmo, a formação de um senso de identidade sexual se faz

necessário para a resolução do conflito edipiano.

4º Estágio- Lógico-formal- (de 12 anos em diante) Estruturas formais:

Nessa fase a representação permite a total abstração e a criança já consegue

pensar de uma forma lógica; podendo até mesmo explicar o significado de um provérbio. É a

fase genital e o estágio final do desenvolvimento libidinal instrumental.

É o começo da puberdade, passando para adolescência até atingir a idade

adulta. Volta ocorrer o despertar da sexualidade que se manteve adormecida na fase de

latência e a maturação fisiológica do aparelho sexual, psicológica e a busca por uma

identidade, individualidade ou participação social e grupal.

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É nessa fase que também podem ocorrer às fixações ou regressões, neurose,

psicose ou perversão; ou pode ocasionar o estancamento do desenvolvimento libidinal e até

comprometer a vida adulta.

Arcuri (2006), nos fala da difícil tarefa de tentar explicar como a mente

afeta o corpo:

[...] Estamos em uma confluência entre esses dois universos - queremos deixar a visão fragmentada do homem, mas não sabemos como fazê-lo, pois estamos ainda impregnados dessa visão mecanicista.Assim sendo, a psicossomática não consegue explicar como a mente afeta o corpo, porque sempre parte de uma explicação reducionista da mente. (ARCURI, 2006, p.50)

A autora ainda enfatiza que:

[...] A grande dificuldade em transpor as barreiras do paradigma científico newtoniano se dá devido ao fato de que não sabemos lidar com o imprevisível - em relação ao questionamento que fazemos na relação do corpo com inconsciente e ego e essa mudança paradigmática cientifica. Sendo assim, o corpo pode ser considerado uma expressão da materialidade física da psique. As teorias sobre o arquétipo apontam para uma explicação psicossomática. (ARCURI, 2006, p.53,54)

E embora, não seja uma tarefa fácil, é exatamente o que buscamos nos

atendimentos psicopedagógicos e psicanalíticos; ajudar o paciente tomar consciência,

daquilo que é inconsciente através do seu pensar e sentir, para que possa desenvolver a

percepção de si mesmo e promover mudanças de paradigmas.

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3- PSICANÁLISE E EDUCAÇÃO

Em entrevistas com os pais, a grande maioria, traz como queixa principal, que

seus filhos não conseguem aprender; embora percebam que há um desejo por parte

dos mesmos. Esse não desejo está presente em crianças e na grande maioria em

adolescentes que são levados pelos pais ao consultório receosos que essa atitude

venha comprometê-los em seu futuro.

Ao iniciar o atendimento psicopedagógico tanto as crianças como os

adolescentes parecem apresentar motivos emocionais, demonstrados através dos

desenhos projetivos, por exemplo, e as questões que estão por trás dessa resistência,

ou dificuldade em aprender.

Talvez a idade, dessas crianças ou adolescentes, não lhes permita ter esse

olhar, e também por se tratar de uma fase em que estão vivenciando muitas

transformações físicas e psicológicas, principalmente os adolescentes, levam um tempo

bem maior para entender ou aceitar o atendimento psicopedagógico.

Lajonquiére (2007) nos fala da capacidade que o sujeito tem de repetir

insistentemente um mesmo erro, e que a mudança desse comportamento seria a chave

para poder aceitar, por exemplo, um atendimento que o ajudasse aprender. [...] ¨Ou seja,

no nosso juízo, o erro mostrar-se como sendo a ponta de um iceberg, que não só não navega

arbitrariamente, como também esta empenhado em chocar-se com tudo o que se interpõe a sua

frente¨(ZIMERMAN, 1999, p.93).

Quando temos um olhar além daquilo que vemos ou percebemos, podemos

buscar outras fontes que nos proporcione explicações, mais detalhadas dos problemas,

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que no momento devemos enfrentar. E é exatamente com esse olhar, que procuro

analisar os problemas de aprendizados dos meus pacientes. Perceber o problema que

aparece é apenas a ponta de um iceberg e que terei de investigar muito além do que

estou conseguindo enxergar.

Na prática psicopedagógica, é muito importante investigar as causas das

dificuldades e/ou problemas de aprendizagem e por isso, procuro ajuda na Psicanálise, na

Neurociência, na Pedagogia, na Psicologia e tantas outras ciências; que possam ajudar

não só esclarecer as minhas dúvidas, mas também que possam me mostrar alguma

solução para os problemas contidos na aprendizagem.

Procurarei me ater à Psicanálise, a Pedagogia e a própria Psicopedagogia; por

ser o meu objetivo, e também por ser a minha experiência de trabalho. Lajonquiére (2007,

p.21) ressalta que o homem é o único animal a tropeçar duas vezes na mesma pedra; ou,

pelo contrário, que ele é capaz de dar livre curso a sua voracidade epistêmica para assim

acabar apropriando-se de tudo aquilo que o rodeia.

Desta forma, podemos levantar hipóteses e pensar se as questões

inconscientes para determinado comportamento pode alterar a questão do aprendizado.

¨Se os conhecimentos errados se desbaratam no instante mesmo que irrompe um saber

que diz respeito à Verdade (do desejo) do sujeito, então, na determinação do erro, ele

também deve estar implicado.¨(LAJONQUIÉRE, 2007)

O mesmo autor acrescenta que o ¨conhecimento é o efeito da inteligência que o

produz a seu modo e o saber é o efeito do (desejo) inconsciente que, para não ser

menos o produz a seu modo ¨ (LAJONQUIÉRE, 2007, p. 26)

A minha questão central, ao desenvolver essa pesquisa, é referente à

contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia, mais especificamente; e como ela, a

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Psicanálise, pode proporcionar um maior vínculo com a educação e ajudar entender como

os métodos terapêuticos de investigação do inconsciente, podem contribuir para resolver

as dificuldades de aprendizagem e entender a subjetividade do ser humano pela

interpretação do desenho.

Como assinala Dupas (2008, p.13) a Psicanálise possui importantes instrumentos

teóricos e competência prática para contribuir na compreensão da subjetividade humana.

Psicanálise e Educação na construção do vínculo e prevenção de agravos; tem por objetivo investigar como os instrumentos e conceitos da Psicanálise formulados, principalmente, por Bion podem ser utilizados pela Educação para diminuir agravos no processo que vai da imaturidade à maturidade. (DUPAS, 2008, p.22)

Freud observou que os primeiros anos da criança possuem uma importância

especial, pois incluem o surgimento da sexualidade, e que esta fase deixa conseqüências

decisivas para a vida sexual na maturidade. Também nos fala quando o ego ainda não

consegue desviar as turbulências emocionais, sendo provocada pela repressão, a criança

adquire na infância todas as disposições para uma doença ulterior e caminha para

distúrbios funcionais.

Como a primeira tarefa da educação é ensinar a criança a controlar seus

instintos; e em toda sua história, procurou fazer a criança a inibir, proibir e suprimir; mas

que toda essa supressão dos instintos envolve o risco de doença neurótica. Deixando

claro que as maiorias das crianças podem atravessar uma fase neurótica no curso de seu

desenvolvimento. (Dupas, 2008, p. 27)

É justamente a frustração que se transforma em uma educadora e exige muito do ser humano. Ela representa a realidade externa-as chamadas

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Page 26: A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia- Investigando o Inconsciente pela Interpretação do desenho. Monografia

exigências da vida, ou melhor, necessidades- que podem perturbar e alterar o curso estabelecido do desenvolvimento do desenvolvimento de qualquer indivíduo. (DUPAS. 2008, p.28)

É importante observar que de modo geral os desenvolvimentos psíquicos e/ou

emocional estarão acontecendo concomitantemente, assim como o cognitivo ou biológico;

e que estarão sujeitos às alterações internas ou externas de acordo com a dinâmica de

vida do sujeito.

Por esse motivo a necessidade de ter uma linha investigativa no trabalho

psicopedagógico; para procurar as várias causas da dificuldade de aprendizado.

Dupas (2008, p.30) nos lembra da fala de Freud, quando enfatiza que a

Educação e o tratamento psicoterapêutico podem se interrelacionar: a primeira procura

garantir que algumas das disposições inatas das crianças não causem prejuízo ao

indivíduo ou á sociedade, enquanto o tratamento terapêutico pode entrar em ação se

essas mesmas disposições já conduziram ao resultado não desejado dos sintomas

patológicos.

Assim verificamos que é possível a contribuição da Psicanálise na Educação, até

mesmo como forma de prevenção. É uma forma de darmos mais atenção, e observar que

algo não esta bem com as nossas crianças. Que por muitas vezes sentem-se sozinhas,

com dificuldade de expressar seus sentimentos; ou só conseguem se expressar muitas

vezes através da violência.

Seria uma forma de investigar o aspecto invisível e/ou inconsciente de um

comportamento, que acabou comprometendo seu desenvolvimento ou a realização de um

desejo de aprender.

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Page 27: A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia- Investigando o Inconsciente pela Interpretação do desenho. Monografia

As histórias de vida passam pelos estágios que vão desde a infância até a maturidade, da dependência à autonomia, das perdas naturais necessárias chegando até a morte. Reagimos a vários conflitos que são passados de geração para geração, quase inconscientemente, proporcionando um modelo de família e uma narração individual que ocupam lugares fundamentais em cada um de nós. (LAURENTI, 2006, p.18)

É muito difícil diferenciar, inicialmente, o real motivo da dificuldade de

aprendizagem; mas sabemos, por experiência, que é impossível dissociar o aprender do

emocional; e que não há nenhuma formula mágica que faça uma pessoa despertar para

o aprendizado tendo o seu lado emocional comprometido.

4. OS DESENHOS COMO TESTES PROJETIVOS GRÁFICOS

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Page 28: A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia- Investigando o Inconsciente pela Interpretação do desenho. Monografia

Neste capítulo abordo as fases do desenho infantil visando à questão psíquica;

como forma de comunicação e expressão da criança. A importância do desenho no

atendimento terapêutico e sua utilização como um instrumento diagnóstico psicológico.

Campos (1969, p.13) ressalta que o primeiro trabalho, digno de menção, sobre

o desenho como fenômeno expressivo, foi realizado por Ricci, em Bolonha, em 1887. E

ainda acrescenta:

Entre os primeiros interessados na expressão da atividade psicológica infantil, através do desenho, podem-se mencionar ainda os nomes de Kerschensteiner, grande pedagogo de Munich (1905). M. Verworn de Gotinga (1906) e Paola Bencini de Florença (1908). [...] E, assim, foram-se multiplicando os estudos do desenho como forma de projeção psicológica, surgindo técnicas perfeitamente válidas para serem empregadas como instrumentos de diagnóstico psicológico. (CAMPOS, 1969, p. 14)

O trabalho psicopedagógico desenvolve-se dentro do âmbito tanto da

objetividade, quanto da subjetividade e ambos estão relacionados com a questão do

aprender. Com o auxilio do atendimento psicopedagógico, para a construção simbólica do

sujeito, procuramos com esta práxis psicopedagógica, fazer com que esse sujeito

cognoscente, consiga trazer para a objetividade as questões subjetivas.

O desenho seria uma das formas da criança poder expressar sentimentos e/ou

emoções dentro de um processo de construção de sua aprendizagem. As elaborações

simbólicas são muito importantes para o sujeito cognoscente, expressar-se

cognitivamente, socialmente ou afetivamente. E investigar o lado subjetivo que está por

trás dos desenhos apresentados de forma objetiva, sendo o desenho propriamente dito, é

um dos maiores desafios para quem tem que traduzir o seu significado.

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Page 29: A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia- Investigando o Inconsciente pela Interpretação do desenho. Monografia

4.1 As fases do desenvolvimento do desenho infantil

Sans (2009, p. 43) explica que existem muitas variações nos pormenores do

desenvolvimento gráfico de uma criança, do primeiro rabisco ao primeiro desenho de

uma figura humana, podendo-se observar nitidamente suas diferentes fases.

4.1.1 Fase inicial

A criança de 01 a 02 anos mesmo não tendo uma coordenação muscular

madura, é capaz de riscar em uma folha de papel, sendo geralmente, linhas simples e

curvas.

A criança, por volta de dois e três anos, desenvolve um controle muscular suficiente para empunhar um instrumento qualquer, até o próprio dedo, e começa a rabiscar em diversas superfícies, quer seja no papel, na parede, na areia, na terra ou até mesmo na água. [...] Em torno do três anos, o movimento circular passa por uma simplificação, até que surgem os primeiros círculos.Esse tipo de rabisco freqüentemente é de extensão circular e, muitas vezes, a página fica sobre inúmeras marcas repetitivas. Geralmente depois de ter um domínio sobre formas circulares, a criança explora outros modos, como é comum desenhar uma seqüência de pequenos enovelados, aparentando uma espécie de escrita. (SANS, 2009, p.45)

Explicita o mesmo autor que:

Embora essa fase não seja valorizada pelo adulto é nela que a criança obtém a autoconfiança necessária para progredir com maior vigor às etapas seguintes.Inicialmente, surgem experiências sensório-motoras, nas quais a criança procura estabelecer domínios sobre certos movimentos físicos de seu corpo, ás vezes, dialogando, cantando como o desenho para completar o sentido da ação. (SANS, 2009, p.46)

Schoenfeldt (1999, p. 4) enfatiza que a criança entre 01 a 0 3 anos de idade, já

consegue perceber a relação do EU e o outro e experiência a dependência de quanto gosta

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daqueles que estão próximos a ela; podendo demonstrar seus sentimentos, por essas

pessoas, através do desenho. E levanta a seguinte questão:

A questão aqui levantada é a seguinte: será possível encontrar alguma indicação quanto a este problema na expressão gráfica da criança, talvez em seu desenho, ou até na sua assinatura? [...] Características individuais são notadas quase desde os primeiros traços e problemas infantis como, por exemplo, de ciúmes e de angústia se descobrem e se revelam nos desenhos. (SCHOENFELDT, 1999, p.4)

Em seu livro, Schoenfeldt, (1999, p.5) relata a história de uma primogênita de 03

anos e 11 meses que expressa o desejo de ter a mãe para si, desenhando a mãe e ela

própria sob seu braço; e que afirma por duas vezes estarem os braços da mãe fechado-

e também desenha o pai, com apetrechos masculinos, a empregada e a irmã, a neném

de um ano e meio bem distantes dela.

Nessa fase, se a criança não sentir ser amada pelos pais, passará a confrontá-

los; principalmente com relação à autoridade destes. E caso ocorra uma fixação nesta

fase, por conta de representar as defesas anais, que são vistas comumente nas

neuroses obsessivo-compulsivas, e também por estar associada a um momento de

ambivalência e ao conflito sobre a separação, a individuação e a independência

(controle dos esfíncteres) a criança poderá apresentar traços patológicos, como;

ambivalência elevada, cólera, desordens, e até tendências sados-masoquistas; segundo

Zimerman:

Abraham descreveu duas subetapas; fase anal expulsiva e fase anal retentiva. Na primeira, a criança tanto pode proporcionar um prazer, ao mesmo tempo auto-erótico e de um presente para os pais, quando também pode representar uma manifestação sádico-anal. [...] Muitos

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autores pensam que este ponto de fixação constitui um importante elemento do prazer auto-erótico masoquista para a criança e também como uma forma de controlar e manipular as pessoas que cuidam dela, por meio da retenção das próprias fezes. Em resumo, é na fase anal que a criança desenvolve sentimentos sádicos e masoquistas, a ambivalência, as noções de poder e de propriedade privada, a rivalidade e competição com os demais. [...] (ZIMERMAN, 1999, p.93)

Bédard (1998, p.5) nos alerta que analisar um desenho não é o mesmo que

interpretá-lo, pois existe uma diferença real e concreta entre ambos os conceitos.

A análise responde a um enfoque técnico e racional e se fundamenta em bases solidamente comprovadas. É o mesmo delineamento que encontramos em psicologia e em psiquiatria. [...] A interpretação dos desenhos das crianças é o resultado ou a síntese da análise.Tanto a análise como a interpretação têm muitos pontos em comum com a grafologia, tais como a informação transmitida pela orientação espacial do diálogo, pelas sua dimensões, pela pressão do lápis,etc.(BÉDARD, 1998, p. 5)

O autor ainda acrescenta:

O desenho representa, em parte, a mente consciente, mas também, de uma maneira mais importante, faz referência ao inconsciente. Não devemos esquecer-nos de que o desenho transmite-nos, não a sua perfeição estética.

Sem perceber, a criança transporta seu estado anímico ao papel. (BÉDARD, 1998, p.6)

Prosseguindo as fases do desenvolvimento do desenho infantil, a criança

dos 04 aos 05 anos de idade, já escolhe as cores em função da realidade e sua capacidade

imaginativa é muito forte.

Bédard (1998, p. 13) também nos fala das ocorrências da criança limpar os

traços, que não lhe agradem totalmente, e que essa reação fala-nos dos estados anímicos,

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e principalmente, podem fazer referência a uma situação pouco agradável ocorrida no

passado e que consciente ou inconscientemente não foi esquecida.

Durante as minhas pesquisas sobre a interpretação do desenho infantil,

me deparei com uma fala de Méredieu, (1974, p.1); que me chamou atenção e que acredito

ser importante transcrevê-la:

[...] gerou numerosos mitos: mito da espontaneidade infantil (como se não soubéssemos até que ponto a criança é condicionada pelo meio), mito da arte infantil, quando é evidente que a criança se situa aquém de qualquer pesquisa estetizante, embora de início não ignore qualquer preocupação estética, no sentido etimológico do termo. Mito enfim que consiste em fazer do desenho uma miraculosa via de acesso à personalidade, mas a hermenêutica do desenho infantil esconde muitas armadilhas e querer interpretá-lo a todo custo não é menos perigoso que a recusa de toda leitura em favor de uma apreensão por assim dizer ingênua e espontânea, na verdade já ideológica e, portanto, falseada do começo ao fim. Constitui-se assim uma abundante literatura, preocupada ora em interpretar, e isto quase sempre numa ótica psicológica e psicanalítica, já que os outros modos de análise- sociológicos e sobre tudo estético- mal foram abordados. (MÉREDIEU, 1974, p.1)

Acredito que Méredieu, reforça em sua fala, da importância de se realizar uma

interpretação do desenho infantil; tendo como base de referência as ciências que melhor

investigam o aparelho psíquico, como a Psicologia e/ou a Psicanálise.

Como já citei anteriormente, à medida que realizamos os atendimentos

psicopedagógicos, podemos perceber o quanto é importante nos apropriar de outros

conhecimentos como forma de auxílio, e a Psicanálise, mais especificamente, me trouxe

este auxilio tão importante para realizar meus atendimentos psicopedagógicos com

maior segurança.

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Greig (2004, p.24) também nos faz uma observação muito importante com

relação ao desenvolvimento do desenho infantil:

[...] Observa-se nas séries de dossiês clínicos, já na época dos rabiscos, que a precocidade ou o atraso em relação à norma é o reflexo fiel do potencial de êxito ou de fracasso de uma criança. A forte predominância dos círculos em geral associa-se a traços psicológicos regressivos, enquanto a predominância dos vaivens normalmente associa-se à afirmação e à oposição. [...] Quando essa evolução é rica, graças ao potencial da criança e a um clima familiar favorável, encontra-se toda a amostragem descrita na trajetória de Laure, dos rabiscos primitivos aos rabiscos compostos. Mas, quando as condições são muito menos favoráveis, não só apenas se manifesta o atraso, como também a etapa de rabiscos primitivos não aparece, a de rabiscos compostos é ausente, e tudo se apaga em proveito unicamente dos rabiscos de base tardios. Quando uma criança continua fixada desse modo nos rabiscos de base até os 3 anos ou mais, sem dúvida há certo atraso. (GREIG, 2004, p.26)

Acredito também ser importante observar, na fala de Greig, que o desenho

pode nos revelar se há certo atraso com o desenvolvimento da criança.

Abaixo apresento um quadro-resumo, de Ribeiro, 2010 (Ribeiro, Mônica,

apostila, 2010, p.4) das fases de desenvolvimento do desenho infantil; de acordo com

os autores: Luquet, Lowenfeld e Bernson.

LUQUET (1927/1969) LOWENFELD (1947/1977)Realismo Fortuito (sem querer, ao acaso)

(2 a 3 anos): analogia entre traço e

objeto, dando nome sem querer.

Realismo fracassado ou mal sucedido (3

a 4 anos):

Garatujas (2 a 4 anos)

• Desordenadas: risca

desordenadamente, além da

folha;

• Nomeada: tira o lápis do

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Page 34: A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia- Investigando o Inconsciente pela Interpretação do desenho. Monografia

A criança aprende a representar, mas há

fracassos e sucessos.

Badameco girino: desenha a figura

humana com os braços e as pernas

partindo da cabeça;

Badameco: desenha a figura humana

com corpo.

Realismo intelectual; (4 a 8 anos):

A criança desenha o que sabe e não o

que vê:

* transparência: desenha o interior do

objeto;

* plano deitado: desenha como estivesse

vendo de cima;

* rebatimento: desenha dois lados iguais.

Realismo visual: (9 a 12 anos):

A criança perde a espontaneidade. A

criança desenha o que vê.

papel nomeando o que faz;

• Diagramada: traços que se

unem formando mandalas e

mosaicos.

• Pré- esquemática (4 a 7

anos):

• Desenha a figura humana.

• Cabeça-pé : as pernas e os

braços saem da cabeça.

• Justaposição : falta

organização espacial

• Esquemática: (7 a 9 anos):

• Linha de base: no final da

folha, um risco ou uma figura

ao lado da outra;

• Raio –X: desenha os objetos

dentro das suas

representações;

• Plano deitado: desenha

como se estivesse vendo de

cima;

• Dobragem: desenha os dois

lados iguais;

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• Omissões e exageros:

seguindo um critério de

interesse no momento;

• Espaço-tempo: seqüência

temporal.

• Realismo: (9 a 12 anos)

• Pseudonaturalismo (12 a 14

anos)

• Decisão: (14 a 17 anos):

• Preocupação com a

perspectiva, profundidade,

sobreposição, detalhes e

pormenores, desenhos

satíricos e desenha por

opção.

MARTHE BERNSON

* GARATUJAS: primeira manifestação gráfica da criança.

* VEGETATIVO MOTOR: (18 a 24 meses) Traços repetidos, arredondados ou

alongados.

* REPRESENTATIVO IMITATIVO: (2 a 3 anos) Começa a tirar o lápis do papel,

esboços isolados/ Aglomeração Evolutiva/ Figura de Irradiação.

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Page 36: A Contribuição da Psicanálise na Psicopedagogia- Investigando o Inconsciente pela Interpretação do desenho. Monografia

• COMUNICATIVA SOCIAL (3 a 4 anos) Boneco-girino/ diferente garatujar,

desenhar, escrever.

(Ribeiro, Monica, apostila, 2010, p. 4) das fases de desenvolvimento do desenho infantil, de

acordo com os autores Luquet, Lowenfeld e Berson.

5.INVESTIGANDO O INSCONSCIENTE ATRAVÉS DA INTERPRETAÇÃO

DO DESENHO - A PARTE SECRETA DOS DESENHOS

Nesse capítulo dou início à questão da importância da interpretação do desenho,

como forma de investigação do inconsciente; e como um desenho pode revelar um

estado emocional do sujeito, substituindo uma expressão verbal da fala ou da escrita.

À medida que damos início a uma análise do desenho infantil, percebemos a

necessidade de buscar apoio em especialistas que se dedicaram a essa técnica; e para

oferecer uma visão voltada para a questão psicanalítica, decidi concluir esse trabalho

monográfico apresentando os trabalhos de Furth por considerar uma fonte riquíssima de

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interpretação do desenho infantil e por amparar suas pesquisas junto a uma abordagem

junguiana.

No prólogo da obra de Furth, Elisabeth Kubler-Ross enfatiza que:

Os desenhos permitem uma interação de informações das várias áreas, manifestas ou reprimidas, da psique individual. [...] Outro aspecto fecundo das interpretações de imagens do autor é o que eu chamo de ¨psiquiatria preventiva¨ Ele nos mostra de maneira inquestionável, em especial no pungente estudo de caso de sua Introdução, que doenças somáticas podem, às vezes, ser expressas secretamente nas imagens inconscientes.(sic) Semanas, meses ou até mesmo anos antes de serem diagnosticadas. Imagens inconscientes podem, dessa forma, ser um instrumento eficaz de diagnóstico. [...] (KUBLER-ROSS, apud, FURTH, 2004, p. 4)

Diante deste olhar de Kubler, podemos perceber que um desenho não só pode

tentar nos transmitir algo que não está muito bem com o autor do desenho; como

também é possível servir de diagnóstico preventivo.

Kubler ( apud Furth, 2004, p. 11) ainda complementa que:

O mundo secreto dos desenhos esta sendo publicado em uma época particularmente promissora. A interação psique/soma mencionada tem ganhado um grande apoio dos médicos nos últimos anos. [...] (KUBLER-ROSS, apud, FURTH, 2004, p.11)

Considero a fala de Kolck, citada por Arcuri, (2006, p.83), com relação ao

desenho, também muito importante:

O uso do desenho e da pintura como TECTC possibilita a reestruturação do mundo interno, pois o desenho trabalha a concretude, a ação e a percepção; trabalha-se a evolução do ponto para a linha. No nosso corpo, o desenho se referia ao próprio corpo, o que nos remete à questão da imagem corporal, que traz vários conceitos, assim também, como existem vários estudos sobre o tema, aqui cabe uma breve

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reflexão: [...] A imagem corporal é projetada no desenho da figura humana e, conseqüentemente, o conceito de si mesmo. [...] Todas essas imagens se entremeiam ou se incorporam para produzir à complexa e sutil projeção do eu. Em nível mais inconsciente são adicionados os símbolos que têm significado universal. (KOLCK, apud, ARCURI, 1984, p. 83)

Existem condições necessárias para se desenvolver a aprendizagem e o estado

emocional de forma equilibrada, é uma dessas condições.

[...] de acordo com a Psicanálise, o que do desenho da criança se apóia na imagem do corpo e exige, do ponto de vista subjetivo, uma representação. Nesse caso, é preciso levar em conta o sujeito cognoscente, tal como é nomeado no construtivismo - aquele que se apropria do código da linguagem escrita – e o sujeito do inconsciente, aquele que a Psicanálise investiga. (sic) (CARVALHO, 2005, p.21)

Esperamos que o ambiente seja um local de aprimoramento e que deverá

proporcionar todas as condições de crescimento do sujeito de forma saudável. Mas a

complexidade das relações humanas é muito grande; e o sujeito se desenvolverá de

acordo com a realidade das interações sociais do local que está inserido.

O desenho poderá representar os aspectos inconscientes vividos pelo sujeito,

como traumas; medo; angústia; ansiedade e etc.

Furth também comenta essa questão acima quando ressalta a sua experiência:

A minha pesquisa inicial de doutorado revelou que conteúdos psíquicos inconscientes importantes eram transmitidos não apenas pelos desenhos dos pacientes gravemente doentes, mas também dos saudáveis. Aqueles a quem chamamos indivíduos normais, tanto psíquica quanto fisicamente. Se esse conteúdo é decifrado, ele fornece insights terapêuticos de grande valor. Além de descobrir que o desenho traz informações sobre o indivíduo que o executa, compreendi que a informação colhida no desenho poderia se aplicar também nos outros, principalmente nos membros da família do paciente. (FURTH, 2004, p. 17)

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Furth nos alerta para a questão da mensagem que um desenho traz; podendo

revelar conteúdos importantes não só de pessoas doentes, mas também as

consideradas saudáveis. É esse exercício de busca de interpretação do desenho, que

acredito ser importante na prática psicopedagógica e até mesmo psicanalítica, ou seja,

realizar um percurso de investigação pelas relações do inconsciente e do consciente

transmitido pelo desenho.

Segundo esse mesmo autor, nenhum ponto do desenho é um indicativo definitivo

sobre o que está acontecendo na psique do paciente. E que uma série de desenhos

com todos os pontos focais precisam ser avaliados antes de se poder fazer um

diagnóstico ou um prognóstico.

Como foi dito anteriormente, para a conclusão dessa pesquisa, procurei me ater

ao trabalho de Furth justamente por ele desenvolver uma tese de doutorado com uma

abordagem junguiana voltada para a questão da cura pela arte; e também poder

apresentar as contribuições da psicanálise tanto para a interpretação do desenho

infantil, quanto para das dificuldades de aprendizagem; pois a psicanálise pode falar do

sujeito de uma forma analítica, ou seja, no sujeito do inconsciente.

Considero muito rico seu trabalho de interpretação do desenho; pois nos traz uma

posição do desenho como forma de diagnóstico, e acredito que isso é muito importante

para os atendimentos terapêuticos que realizo.

[...] Como já deveria estar claro, os desenhos em geral, [...] expressam grandes quantidades de informação sobre os conteúdos psíquicos inconscientes. Parece que há uma ligação direta, inconsciente, entre patologias psíquicas e somáticas; dessa forma, quando o inconsciente

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fala por meio de um desenho, ele normalmente exprime anomalias somáticas potenciais que a mente consciente ou não está preparada para encarar ou não consegue compreender. (FURTH, 2004, p. 25)

O trabalho desenvolvido por Furth nos traz explicações concretas de suas

experiências teóricas e/ou clínicas que nos possibilita o encontro da leitura psicanalítica

dos fenômenos que compõem o funcionamento mental com a parte cognitiva expressa

pelo desenho. São poucos os autores que apresentam essa preocupação em

desenvolver a análise do desenho a partir de um olhar voltado às questões psíquicas e

principalmente voltadas às idéias de Carl Gustav Jung; que enfatizou a importância dos

símbolos; e que nos explica que os desenhos inconscientes é uma das formas pelas

quais esses símbolos são expressos.

De acordo com Furth (2004, p. 29) duas pessoas contribuíram para expandir o

trabalho de Carl Jung: Jolande Jacobi e Susan Bach.

[...] Jung enxergava o valor dos desenhos que contém símbolos do inconsciente, percebendo que eles poderiam ser úteis como agentes de cura. No entanto, ele não desenvolveu nenhum método para analisar os desenhos a partir de seus conteúdos inconscientes. Jolande Jacobi incumbiu-se dessa tarefa no seu livro Vom Bilderreich der Seele (1969), em que ela se arrisca pela primeira vez, a ensinar a interpretação de desenhos a outras pessoas. Susan Bach foi mais além no seu Acta paychosomatica; spontaneous paintings of severely ill pacients (1969), não apenas demonstrando que os conteúdos inconscientes dos desenhos podem ser decifrados psicologicamente, como também que por meio deles o inconsciente pode projetar, de uma maneira empírica, o que está acontecendo com o corpo. (FURTH, 2004, p. 29, 30)

De acordo também com esse autor, há uma lição muito importante na

interpretação do desenho, que se deve passar um bom tempo com a figura do desenho,

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estudando-a, medindo-a, e até mesmo esboçá-la, desenhando-a de novo para fazer

interpretação de um desenho.

Na concepção de Jung, o reino do inconsciente, coletivo ou pessoal, pode ser representado na arte por meio das imagens e dos símbolos. Essas imagens e símbolos estão expostos na pintura, escultura, poesia, dança, na música, literatura e em muitas outras formas de expressão artística, sendo expressões que surgem do lado criativo do ser humano. Esse conteúdo origina-se no inconsciente, o berço da criatividade.As imagens provenientes do inconsciente coletivo são arquetípicas e se manifestam nos sonhos e nas fantasias, no mito e na religião. Quando elas surgem, somos tocados de alguma forma, como se soubéssemos que elas pertencem a nós, que são verdadeiras e que trazem um sentido, que não podemos explicar. Compreender e admitir que os símbolos presentes nos desenhos possam vir da camada coletiva do inconsciente ajuda-nos a responder a questões específicas em relação às figuras e à sua interpretação. (FURTH, 2004, p. 31)

5.1Características do complexo

Furth relata-nos a importância das características do complexo e a relação com o

estudo dos desenhos.

Os complexos, tanto positivos quanto negativos, surgem do inconsciente e manifestam-se, muitas vezes, nos desenhos. Um paciente dificilmente procura um terapeuta por causa de um complexo positivo. [...]. Devemos nos lembrar de que o material inconsciente que se origina na psique permanece na psique ao mesmo tempo em que se manifesta externamente em momentos de dificuldade, como se dissesse à consciência: ¨Olhe para mim! Estou aqui.¨ Essas dificuldades e adaptações aparecem de forma simbólica nos desenhos ou nos sonhos. Por meio do símbolo, chegamos ao complexo com a qual o problema se mistura, permitindo que a energia ligada ao complexo volte a fluir. Como a energia não pode mais continuar estagnada, ela começa a fluir no momento em que a encontramos, podendo, assim, ser trazida para a consciência. (FURTH, 2004, p.31)

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A apresentação desta visão de Furth, na questão do complexo, nos remete a outra

questão; da necessidade de trazer para o consciente um conflito inconsciente mesmo

que seja através do desenho, ou seja, proporcionar ao paciente a condição de perceber

o que lhe esta provocando uma situação incômoda. Mas o paciente poderá negar que

algo esteja errado com ele; e a negação, que é um mecanismo de defesa e uma forma

que o homem encontra para atingir a estabilidade emocional, poderá evoluir para outros

quadros psíquicos mais graves, como a neurose ou psicose.

Nero (2002, p. 148) nos apresenta uma classificação dos mecanismos de defesa

no quadro abaixo e reconhece que o processo defensivo, explicado pela psicanálise,

não seria um indício de possíveis sintomas patológicos.

Mecanismos de defesa

Neuróticos Psicóticos Recalque Clivagem Repressão Anulação Deslocamento * Negação

Isolamento Identificação Projetiva Formação Reativa Identificação Projetiva Identificação Identificação Introjetiva Introjeção Atuação Projeção Regressão (NERO, 2002, p. 149)

Negação: Este mecanismo tem por objetivo a não aceitação, a rejeição ou recusa da

percepção de um fato, interno ou externo, que possa, por seu aspecto doloroso,

prejudicar a estabilidade emocional. (NERO, 2002, p. 154)

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Furth (2004, p. 34) afirma que um terapeuta precisa estar alerta ao fluxo de

energia proveniente do inconsciente do paciente.

[...] Isso pode ser averiguado por meio dos desenhos oriundos do inconsciente, bem como pela análise sem desenhos, no entanto, desenhos são comunicações diretas vindas do inconsciente e não podem ser facilmente camufladas, diferentemente da comunicação verbal. (FURTH, 2004, p. 34)

Por isso, embora o paciente se utilize dos mecanismos de defesa, como no caso

da negação, durante uma sessão, o desenho fará o papel de trazer do inconsciente

seus conflitos. E o terapeuta poderá, através da interpretação do desenho, auxiliar

melhor o seu paciente.

Na Psicopedagogia, observamos que muitos pacientes, embora tentem

desenvolver suas atividades, apresentam dificuldades para realizá-las. E as causas

dessas dificuldades podem ser por várias questões ou circunstâncias; mas a questão

emocional, muitas vezes, acaba por comprometer muito mais do que até mesmo a parte

cognitiva. Pois sabemos de casos de crianças com comprometimentos cognitivos mais

graves, conseguirem corresponder às expectativas quando são bem estimuladas.

Mas quando a questão emocional prevalece sobre todas as outras dificuldades, o

que parecia ser importante, como aprender algo, por exemplo, a criança pode parar de

participar de coisas que ela passa a não considerar importante, até que todo conflito se

resolva ou pelo menos amenize; dando-lhe condições de novamente aprender.

Quando um indivíduo passa por um momento difícil como o de uma tragédia, em geral, o que acontece é que ele pára de participar de coisas que não são prioridade, redistribuindo a energia psíquica para poder dar conta desse peso. O que antes era considerado importante

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agora é deixado de lado devido à responsabilidade de se carregar uma carga diferente, talvez mais trágica. A redistribuição da energia psíquica é importante para o equilíbrio da psique. Sob essas circunstâncias, o individuo não recebe mais do que pode suportar, pois a psique reordena as prioridades, e uma redistribuição de energia ocorre, permitindo que se lide com as novas responsabilidades. [...] Relacionando isso diretamente ao uso e à interpretação dos desenhos, o terapeuta e o paciente podem determinar, a partir de pontos focais nos desenhos, onde a energia está situada. (FURTH, 2004, p. 36)

5.2 Os pontos focais para a interpretação dos desenhos

Os pontos focais para a interpretação dos desenhos, de acordo com Furth, (2004,

p. 75) é um guia para facilitar a tarefa da interpretação de desenhos; mas o autor nos

chama a atenção para a questão de que nenhum ponto focal sozinho pode determinar o

estado da psique e sim um a combinação de vários pontos focais e suas características

é que devem ser consideradas. E que embora, nesse trabalho, ele lide com desenhos,

os mesmos pontos focais podem ser reconhecidos em argila, colagem, montagem,

escultura e outros tipos de arte.

O autor prossegue dizendo que da mesma forma que o paciente sente dificuldade

de explicar um sonho, e que a explicação verbal tem pouco a ver com os seus próprios

conteúdos inconscientes, o mesmo ocorre com a explicação do paciente em relação ao

seu desenho; e que o propósito de todo seu trabalho é de auxiliar analistas e terapeutas

a se tornarem mais familiarizados com essa tão difícil técnica de interpretação do

desenho, sendo “essa é uma tarefa difícil, pois o terapeuta encontra-se em níveis muito

diferentes de conhecimento nesse campo. Desse modo, esses pontos focais amplos em

sua extensão e são feitos para facilitar o processo analítico ao sugerir questões e

possíveis direções a serem adotadas.” (FURTH, 2004, p. 76)

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Furth prossegue explicando:

[...] como um complexo se desenvolve e como ele pode se manifestar externamente. Chegamos à conclusão que de, ao se fazer contato com qualquer aspecto de um complexo, a sua estrutura geral é sempre afetada. Independentemente da parte do complexo que é tocada, ele e a sua potência serão alterados. Voltemos aos desenhos com essa idéia em mente. Sabemos que o conteúdo é inconsciente e que ele ativa a energia psíquica. Essa energia esta conectada ao complexo de alguma maneira. Então, por onde começamos o trabalho com os desenhos? Sabemos que pouco importa por onde começamos, já que todos os complexos pessoais estão de alguma forma, interconectados. Podemos começar com cores, formas, tamanhos, direção de movimento, etc; o que importa é que no desenho o complexo esta entrelaçado com todos os seus componentes de uma forma altamente intrincada. O terapeuta e o paciente começam pelo que esta sinalada pelos símbolos. Esses sinais fazem-se conhecidos por meio dos pontos focais que chamam a atenção do terapeuta e do cliente. Por meio dos pontos focais, o inconsciente conduz o processo de cura. (FURTH, 2004, p. 76)

5.3 Que sentimentos os desenhos nos transmitem?

Furth (2004) considera a questão da interpretação do desenho; um dos aspectos

mais importantes e, particularmente, em seu trabalho explica a questão do sentimento

que está por trás do desenho:

Uma figura ou um desenho sempre comunica um sentimento. É importante capturar primeiro a impressão inicial e espontânea e, se possível, condensá-la em uma só palavra - tal como feliz, triste, frustrado, assustado, confinado -, em vez de avaliar a figura de forma concreta. [...] Se houver um conflito entre a impressão que se teve e a impressão do paciente, não se deve transferir as próprias reações para o paciente, mas, sim, sondar a natureza das experiências dele em relação à figura. Por meio desse processo de examinar as reações divergentes e variadas, o terapeuta pode chegar a uma maior compreensão dos sentimentos do paciente. (FURTH, 2004, p. 83)

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O autor ressalta uma citação de Jung sobre os pontos focais e sobre a análise de

pinturas de sonhos, considerando que a observação é muito importante; e o fato de

estarmos realmente explorando um território desconhecido, devemos ter sempre em

mente esse aspecto da observação ao começarmos a análise dos pontos focais das

figuras do inconsciente.

O terreno que pisamos é totalmente inexplorado, e o que importa, em primeiro lugar, é adquirir suficiente experiência. Por motivos extremamente sérios, quero evitar – por se tratar deste campo precisamente – toda conclusão precipitada. Esta em jogo um processo vital, extra consciente, da alma, que temos a oportunidade de observar indiretamente. Ainda não sabemos até que desconhecidas profundezas o nosso olhar pode penetrar nesse processo. (JUNG, 1976, CW 16, p. 51, apud. FURTH, 2004, p.83)

Quando andamos por terrenos desconhecidos, percebemos que além de ser

bastante perigoso é também no mínimo complicado. Sendo assim, atentemos ao alerta

de Jung para essa questão e, do cuidado que devemos ter ao tentar desvendar ou

explorar o universo inconsciente e de precipitar uma conclusão através da interpretação.

O trabalho de interpretação do desenho exige do terapeuta muito treino e estudo

cuidadoso; para não comprometer o tratamento do paciente e sim, ele deve utilizar-se

essa ferramenta de investigação, para ajudar seu paciente alcançar a cura.

Anning, no Prefácio de seu livro (2009) pontua que:

Quando uma criança pequena desenha, ela está nos oferecendo uma janela para o seu próprio entendimento em desenvolvimento do mundo e de seus relacionamentos com pessoas, coisas e locais importantes que a cercam. Os desenhos proporcionam ricos insights no pensamento e no desenvolvimento da percepção do self das crianças pequenas, incluindo seus papéis de gênero. Desenhar também proporciona as

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crianças uma ferramenta para contarem para si mesmas e para nós histórias elaboradas. (ANNING, 2009).

Rappaport (1984, p. 05) ressalta a importância sobre a utilização do desenho, no

espaço e nos atendimentos terapêuticos:

[...] Vem sendo usado também no contexto psicoterápico como meio de contato, investigação e tratamento. A partir da orientação psicanalítica, mais ortodoxa, até abordagens como a gestáltica e a análise transacional, passando naturalmente pela psicologia analítica de Jung, tem sido utilizado como importante elemento de psicoterapia. Paralelamente, tem-se desenvolvido seu uso no conjunto da Terapia pela Arte: o desenho com valor terapêutico em si mesmo. No plano do diagnóstico psicológico o grafismo, e em especial o desenho, tem ocupado lugar de destaque como instrumento indispensável. Desde a escala métrica de inteligência elaborada por Binet e Simon em 1905, o desenho tem empregado em e como teste de desenvolvimento mental e de aptidões específicas, assim como em testes para diagnósticos especiais. No plano da avaliação da personalidade, o desenho desempenha inestimável papel. (RAPPAPORT, 1984, p2).

Rappaport, ainda acrescenta:

Estamos aí diante do uso projetivo do desenho propriamente dito. Como ressaltamos em várias oportunidades, ele se constitui em condições ótimas para a projeção da personalidade, possibilitando a manifestação mais direta de aspectos de que o sujeito não tem conhecimento, não quer ou não pode revelar, isto é, aspectos mais profundos e inconscientes; isso porque, sendo um meio menos usual de comunicação do que a linguagem tem um conteúdo simbólico menos reconhecido. Alem da projeção, mecanismos como identificação e introjeção podem eventualmente se manifestar, mas é certo que a expressão e a adaptação constituem dois importantes processos que têm lugar quando um desenho é produzido. Adaptação, expressão e projeção estão presentes juntos no ato de desenhar, e, mais do que em qualquer outra produção pessoal, devem ser analisados cuidadosamente. (RAPPAPORT, 1984, p.2)

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5.4 Significado dos aspectos gerais dos desenhos - Linhas básicas da

interpretação

Passo a apresentar as orientações de Rappaport, para uma análise dos

desenhos e como esses desenhos podem, revelar um comportamento e/ou

personalidade inconsciente de quem os realiza. ¨Aplicam-se aqui os dados de

interpretação resultantes de estudos sobre as produções gráficas de maneira geral.

Uma apresentação mais complexa do que vai sumariado a seguir se encontra em

Lourenção van Kolck (1981)¨ apud (RAPPAPORT, 1984, p. 7)

A. Posição da folha

Significado geral: representando a folha o ambiente delimitado pelas bordas do

papel e imposto ao sujeito, sua posição indicará como este se coloca perante ele e o

manipula. Esquematicamente, com relação a duas possíveis posições temos: uso da

folha na posição apresentada ou pequeno ajeitamento natural para a escrita - nada a

observar.

Modificação radical na posição em que o papel foi apresentado, isto é, se de

deitado ou na horizontal é posto em pé ou na vertical (...) ou vice-versa = liberdade em

relação à ordem dada e, portanto, indício de espírito curioso e cheio de iniciativa, e

possível oposição e negativismo.

1. Localização da página

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Significado geral: o lugar em que o sujeito coloca seu desenho revela muito de

sua orientação geral no ambiente e consigo próprio. Centro = segurança,

autovalorização, emotividade, comportamento emocional e adaptativo, equilíbrio;

pessoa centrada em si mesma e autodirigida.

1º quadrante (canto superior direito) = contato ativo com a realidade, rebelião e ataque,

projetos para o futuro.

2º quadrante (canto inferior direito) = força dos desejos, impulsos e instintos; obstinação

e teimosia.

3º quadrante (canto inferior esquerdo) = conflitos, egoísmo, repressão, fixação em

estágio primário.

4º quadrante (canto superior esquerdo) = passividade, atitude de expectativa diante da

vida, inibição, reserva, nostalgia; desejo de retornar ao passado e/ou permanecer

absorto em fantasia.

Metade superior (faixa entre o 4º e o 1º quadrantes) = espiritualidade, misticismo,

energia, objetivos muito altos, possivelmente inatingíveis, satisfação na fantasia, ¨estar

no ar¨.

Metade inferior (faixa entre o 2º e o 3º quadrantes) = materialismo, fixação a terra e ao

inconsciente, orientação para o concreto, insegurança e inadequação, com depressão.

Metade direita (faixa entre o 1º e o 2º quadrantes) = extroversão, altruísmo, atividade,

socialização, relação com o futuro, progresso.

Metade esquerda (faixa entre o 3º e o 4º quadrantes) = introversão, egoísmo,

predomínio da afetividade, do passado e do esquecido, comportamento compulsivo.

Em diagonal na página- projeção da perda de equilíbrio (Marbry, 1964)

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2. Tamanho em relação à folha

Significado geral: exprime a relação dinâmica do sujeito com seu ambiente; como está reagindo às pressões do mesmo: se com sentimentos de inadequação e inferioridade, em um extremo, se com fantasias compensatórias de supervalorização, em outro. De maneira geral, quanto maior o desenho, maior a valorização de si mesmo; e essa valorização será tanto mais compensatório quanto mais exagerado for o tamanho. (RAPPAPORT, 1984, p. 8.

Esquematicamente os significados atribuídos aos desenhos de acordo com seu

tamanho são:

Muito grande: (folha toda ou quase) = evidência de agressividade e descarga motora.

Quando exagerado, saindo do papel = sugere sentimento de constrição por parte do

ambiente, com fantasia supercompensatória, o que lembra aspectos paranóides.

Possível indício de organicidade.

Grande: (2/3 e metade da folha) = sentimento de expansão e agressão; falta de controle

e de inibição; narcisismo e idéias de grandeza que podem encobrir sentimentos de

inadequação.

Médio: (1/3, 1/4, 1/6 e 1/8 da folha) = nada a interpretar.

Pequeno: (1/16 e 1/32 da folha) = inferioridade, inibição, constrição e depressão,

comportamento emocionalmente dependente e ansioso.

Muito pequeno: (1/64 e 1/128) sentimento de inadequação, e mesmo rejeição pelo

ambiente; tendências ao isolamento.

3. Qualidade do grafismo

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Significado geral: o tipo de linha e a consistência do traçado indicam a manifestação de energia, vitalidade, decisão, iniciativa, em um extremo e de emotividade, insegurança, falta de confiança em si, ansiedade, em outro. O resumo das principais idéias de interpretação vem a seguir: (RAPPAPORT, 1984, p.8)

Linha grossa: (correspondendo à espessura do traçado feito pelo lápis nº1) = energia,

vitalidade, iniciativa, decisão, constância, confiança em si, possivelmente agressão e

hostilidade para com o ambiente, esforço para manter o equilíbrio da personalidade,

falta de adaptação (a ênfase levaria a suspeita de psicose).

Linha média: (correspondendo ao traço do lápis nº 2) = nada a interpretar.

Linha fina: (correspondendo ao traço do lápis nº3 ou 4) = insegurança, timidez,

sentimento de incapacidade, falta de energia e de confiança em si, mas também

personalidade hipersensível e artística.

Traçado contínuo: decisão, rapidez, energia, esforço dirigido, auto-afirmação, mas

também falta de sensibilidade e de vida, medo de iniciativas_ quando muito contínuo,

como se o lápis tivesse ficado aderido ao papel.

Traços de avanços e recuos = emotividade, ansiedade, falta de confiança em si,

timidez, insegurança, hesitação ao encontrar novas situações, mas também sentido

artístico, intuição, sensibilidade.

Traço interrompido = medo, insegurança, sensibilidade; e se presente em todo o

desenho = intoxicação do eixo nervoso por alcoolismo ou fadiga extrema, traços

involutivos.

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Rappaport nos faz um alerta:

[...] Lembrar, entretanto, que: 1) freqüentemente o desenvolvimento da técnica de desenho nos leva à utilização do traço de avanços e recuos; 2) crianças, de maneira geral, apresentam com mais freqüência o traço contínuo, com linha firme, grossa e pesada. (RAPPAPORT, 1984, p.10)

4. Resistências

Conforme a explicação de Rapport, as rejeições ou resistências em não fazer um

desenho, podem ocorrer em graus diferentes de intensidade até a negação total em

desenhar. Essas resistências significam basicamente atitudes negativas e de oposição.

Rappaport também nos explica com maiores detalhes, o que pode estar por traz

dessas resistências:

[...] A negação pode assumir outros significados como intensa inferioridade da pessoa, que se sente muito inadequada para arriscar-se à imperfeição e ao julgamento; severo bloqueio, em um histérico e desconfiança do paranóico (Katz, 1960, apud Rappaport, 1984)No caso especial do não completamento do desenho, a omissão de partes determinadas ainda pode ser analisada em conexão com o significado próprio da área em que aparece. Sempre com o sentido de resistência para desenhar, a omissão de uma parte integrante da figura constitui indício de problemas e conflitos em relação a essa parte e ao que ela significa. Será considerada de maior ou menor gravidade segundo a extensão e a área em que se apresenta e ao fato de estar ou não associada a outros aspectos característicos. Pode chegar a ser indício de perturbações graves, como deficiência mental, esquizofrenia, histeria, depressão. (RAPPAPORT, 1984, p. 10)

Seguramente, esse trabalho de Rappaport, e suas explicações nos fazem ter, no

mínimo, uma maior certeza de que o desenho deve ser utilizado como um instrumento

de investigação do campo psíquico de nossos pacientes.

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E a pesquisa de Parente (2010), que por também ser, Psicopedagoga e

Psicanalista; em seu livro, consegue expressar muito do que eu pretendo passar com a

realização dessa pesquisa. O sentimento de que a busca pelo melhor para os nossos

pacientes é fundamental e que o caminho ou todo recurso que dispomos, será uma

forma de proporcionar uma ajuda, para que eles, (os pacientes) consigam superar suas

dificuldades tanto de aprendizagem quanto emocionais. Que também fica praticamente

arriscada a realização do atendimento psicopedagógico, sem o auxílio de outra área do

campo da saúde mental; podendo também ser, é claro, a própria psicanálise.

O que me chamou atenção no trabalho de Parente, foi à comparação realizada

em sua pesquisa com as teorias de Melanie Klein, Sara Pain e D.W. Winnicott, e como

ela buscou auxiliar a criança na psicopedagogia, fazendo uma ponte com a psicanálise.

Parente enfatiza na introdução de seu livro que:

[...] O objetivo da trilogia é apresentar uma reflexão realizada ao longo de um percurso de mais de 20 anos com base no diálogo entre o atendimento clínico às crianças com queixas de problemas de aprendizagem e as fundamentações teóricas de Melanie Klein, Sara Paín e D. W. Winnicott. A metodologia que usei para estabelecer um diálogo entre a experiência clínica e as diferentes teorias me permitiu tomar o desenvolvimento do meu próprio pensamento clinico como objeto de reflexão. [..] Vale lembrar que Winnicott teorizava, rabiscando, Privilegiava a experiência, a relação com o outro, reconhecendo a importância da adaptação ativa e sensível do analista às necessidades de seus pacientes. [...][...] Na experiência clínica foi o aspecto relativo ao tempo que me levou a caminhar da clínica dos problemas de aprendizagem (Paín) para a do desenvolvimento psíquico e aprendizagem (Winnicott com Paín) Assim, passei a reconhecer que o desenvolvimento do potencial criativo da criança é condição para a constituição do espaço psíquico que possibilita o brincar, o pensar e o caminhar em direção à criação da externalidade do mundo. E, conseqüentemente, é condição para o estabelecimento de um trânsito, de um movimento entre as dimensões da subjetividade e objetividade que caracteriza o processo criativo de aprendizagem. (PARENTE, 2010.)

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A autora ainda ressalta que:

Como nunca se sabe o tipo de funcionamento psíquico que está por trás de uma criança ou adolescente que chega ao consultório, devido às queixas de problemas de aprendizagem, o diagnóstico diferencial, independentemente da linha teórica que sustenta a atuação do profissional, é de fundamental importância. [...] Desenvolvidas de forma paralela, questões teórico-clínicas, provenientes do campo da aprendizagem foram se imbricando e possibilitando um diálogo com outras questões provenientes do campo da constituição e desenvolvimento psíquico, o que permitiu aproximar as minhas duas vertentes de formação e atuação: como psicanalista e como psicopedagoga. Definiu-se, assim, um campo de interesse e investigação da prática clinica: o das relações entre as dimensões afetiva e cognitiva do pensamento do sujeito que pode (ou não) aprender. (PARENTE, 2010.)

5.5 Etapas sugeridas aos terapeutas para desenvolver análise e interpretação dos

desenhos, segundo Furth (2004)

Mantendo uma visão psicanalítica, sobre a interpretação dos desenhos, e

confirmando, através de toda pesquisa levantada, que existe a possibilidade de um

desenho representar sentimentos inconscientes; passo a descrever as etapas sugeridas

por Furth (2004) e de como o terapeuta deve desenvolver sua análise e interpretação

dos desenhos.

Além da questão dos sentimentos transmitidos pelos desenhos, já citados

anteriormente, Furth também considera importante outros aspectos e garante ser uma

forma do terapeuta, cometer menos erros e/ou obter um maior sucesso em sua análise.

E para maiores detalhes sobre a utilização do desenho, como testes projetivos, sugiro a

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leitura de seu livro que nos trás muitas outras informações a respeito da interpretação

dos desenhos no espaço clínico.

1. O que parece estranho?

Tentar descobrir o motivo pelo qual algumas coisas se apresentam de forma peculiar

ou anormal. Por exemplo, um relógio com letras em vez de números, um carro voando

no céu; etc. Essas representações estranhas normalmente apontam para uma área

problemática específica da qual o indivíduo pode ou não estar consciente e que precisa

ser trazida à tona.

2. Obstáculos

Os obstáculos podem ser representados por uma pessoa, planta, árvore ou um

objeto inanimado, como: parede, cadeira, porta ou um carro; algo ou alguém que esta

impedindo uma comunicação.

3. O que esta faltando?

A ausência ou o que foi deixado de fora podem ser bastante significativos, pois

podem simbolizar ou representar algo ausente na vida da pessoa. Pessoas ausentes,

em geral, representam sinais de conflitos.

4. O que é central?

Muitas vezes, o que esta posicionada no centro do desenho pode indicar onde

esta o núcleo do problema ou o que é importante para a pessoa. Uma cicatriz,

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geralmente um trauma na vida da pessoa e uma árvore simboliza o feminino, os

aspectos acolhedores, protetores, sustentadores, nutridores da Grande Mãe.

5. Tamanho

Tanto a proporção dos objetos quanto das pessoas, em um desenho é

importante. Devemos descobrir o que as figuras de tamanho excessivo enfatizam e o

que as de tamanho reduzido podem estar desvalorizando.

6.Formas distorcidas

Quando alguma parte de uma figura ou objeto for desenhada fora de proporção, isso

pode representar simbolicamente áreas onde uma maior concentração e compreensão

poderiam ajudar a trazer a distorção de volta à normalidade.

7.Objetos repetidos

Os objetos repetem-se nos desenhos e devem ser contados; pois, o número de

objetos é quase sempre significativo, pois estão relacionados a medidas de tempo ou

eventos de importância no passado, presente ou futuro.

8.Perspectiva

Devemos observar a partir da qual o desenho foi feito; pois, perspectivas diferentes

no mesmo desenho podem indicar inconsistências que podem estar relacionadas a

inconsistências na própria vida da pessoa.

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a. Em um desenho grosseiramente fora de perspectiva, deve-se

procurar por uma psicose; pois isso representa, muitas vezes

uma ligação direta com o inconsciente.

9.Entre no desenho

O terapeuta deve tentar se tornar um objeto do desenho para que ele possa sentir,

ouvir ou ver como eles se comportam e compreender melhor a relação deles com o

todo.

10.Sombreado

Uma energia investida no sombreado pode indicar fixação ou ansiedade a respeito

do que o objeto sombreado representa simbolicamente.

11.Desenhos de canto

O desenho feito de canto é uma forma de estar presente e, ainda sim, permanecer

do lado de fora. É um método de se envolver parcialmente sem se comprometer de uma

forma mais completa.

12.Compare com o mundo em volta

Um desenho deve ser comparado com o estado do mundo físico real acima e além

do que está representado na figura. O que é estranho ou esquisito; e do que faz parte

do mundo de um pode não o ser no mundo de outro ou pertença à outra cultura; essa

diferença pode ser significativa na vida psicológica do paciente.

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13.Fora de época

Normalmente os desenhos são apropriados para a época que estão sendo

realizados e, devem ser questionados se não o forem.

14.Encapsulação

Encapsulação significa prisão, e a necessidade de se desenhar limites específico ao

redor de si mesmo, para se colocar de lado ou longe dos outros. Devemos questionar

do que o paciente tem medo, porque motivo ele precisa ficar preso, ou ao redor dele

que o prende.

15. Extensões

Uma extensão é qualquer instrumento desenhado nas mãos de uma figura.

Podendo ser uma colher, bengala ou muleta, taco de golfe ou de beisebol – qualquer

coisa que permita que o indivíduo exerça maior controle sobre o ambiente. Significa ou

que a pessoa se vê tendo controle maior (complementar-compensatório), e ela pode ter

sucesso ou não nesse intento.

16. Verso do desenho

O desenho feito no verso do papel deve ser analisado pelo terapeuta, em verificar o

que ou quem foi desenhado, pois pode ser um indicativo de conflito; e porque ele não

pode ser desenhado com os outros desenhos na parte da frente.

17. Sublinhado

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O desenho sublinhado, normalmente, indica falta de sustentação (complementação).

No entanto, se todos os outros desenhos estão sublinhados e uma única figura não

esta, ela é a mais forte (compensação). É importante ter em mente a teoria de Jung ao

examinar esse ponto focal.

18. Rasuras

Devemos prestar atenção nas rasuras e comparar com o que foi refeito e com o

que havia antes. Em geral, as rasuras indicam material conflituoso ou áreas em que a

representação do símbolo na vida esta ganhando novas significações.

Se o desenho na área rasurada estiver melhor do que o anterior, é bem provável

que isso seja verdade na vida do sujeito. Se ao contrário, ou seja, se a qualidade do

material rasurado for inferior, o material representado também terá deteriorado. Se a

pessoa rasurar e não desenhar de novo em cima da rasura, ela pode ainda estar em

conflito a respeito do material representado.

19. Palavras nos desenhos

As palavras nos desenhos requerem uma atenção especial. O paciente teme não

ter transmitido de maneira clara a mensagem ou o argumento do desenho. E as

palavras serviram para dar uma definição mais clara do que ele quer dizer.

Devemos perguntar o que é que foi mal interpretado. É também uma questão do

quanto o paciente confia na comunicação não- verbal.

20. Linha atravessando o alto da página

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Uma linha atravessando o alto da página, como o céu ou apenas uma linha

desenhada, pode indicar algo psicologicamente opressor. Esse algo é, com freqüência,

um peso para o paciente e ele teme ter que carregar esse peso.

21. Transparência

Transparência é enxergar alguma coisa através de uma barreira, como por exemplo,

uma parede. Esse tipo de desenho é muito comum em crianças pequenas. A

transparência com adolescentes ou adultos, aparece com menos freqüência e

intensidade. No entanto, quando se percebe a freqüência dessas transparências

aumentarem; acompanhada da intensidade ao focar algumas áreas tabus (como a

sexualidade), isso pode representar um problema de orientação da realidade, em que

pode existir uma situação de negação.

22. Movimento (trajetória)

O terapeuta deve acompanhar a trajetória de objetos em movimento, armas e

pessoas, e prestar atenção na sua direção e determinar quais serão as conseqüências.

Em desenhos abstratos, é bastante instrutivo prestar atenção no movimento e no fluxo

da cor e/ou forma, percebendo se eles são abundantes e para onde eles estão se

movendo.

23. Cheios versus vazio

Pode-se olhar para o desenho como se ele fosse, de certa maneira, a vida da

pessoa. Ele está cheio ou vazio? Como o espaço foi usado? Pacientes doentes

fisicamente ou sem energia psíquica podem não conseguir preencher toda a folha. Por

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outro lado, a folha pode estar excessivamente preenchida se a pessoa estiver

transbordando energia, ou se estiver fazendo uma supercomposição.

24. Árvores e idade

Ao se olhar para uma árvore como um símbolo da vida, deve-se perguntar se há um

equilíbrio na árvore, se ela esta saudável, ou se suas folhas são capazes de fazer a

fotossíntese. Deve-se prestar atenção em seu enraizamento e fixação no solo.

Acredito que o objetivo maior desta pesquisa, que foi procurar comprovar que os

desenhos podem revelar conteúdos inconscientes; ou no mínimo, provocar uma atenção

maior aos desenhos aplicados nos atendimentos terapêuticos, foi alcançado. E que sua

utilização nos atendimentos terapêuticos, seguindo os cuidados citados pelos autores

aqui pesquisados, principalmente Furth, (2009..) que demonstra em seu livro, que o

desenho é uma riquíssima ferramenta para o terapeuta ajudar seus pacientes, de forma

a prever ou até mesmo ajudá-los a alcançarem a cura de uma doença.

Principalmente o psicanalista, que observa o sujeito numa perspectiva analítica,

também pode ajudar seus pacientes, através da interpretação de seus desenhos, a

trabalhar com os conteúdos internos trazendo-os para o consciente; e o psicopedagogo,

ter uma referência de investigação do motivo da dificuldade de aprendizagem e que

essa dificuldade, é apenas uma parte visível do problema, tendo, portanto, a

necessidade de uma maior investigação.

Durante a realização desta pesquisa, também encontrei no trabalho de Kolck

riquíssimas explicações de como o desenho pode ser utilizado no campo da

comunicação, e das terapias e principalmente que o desenho é utilizado entre as

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crianças, constituindo-se uma atividade tão essencial quanto o jogo ou o brinquedo,

quando a autora explica da utilização do desenho no campo da Psicanálise:

[...] Como expressão de psicopatologia, o grafismo recebe especial destaque nas abordagens sobre arte de doentes mentais e nas discussões sobre arte e primitivismo. Vem sendo usado também no contexto psicoterápico como meio de contato, investigação e tratamento. A partir da orientação psicanalítica mais ortodoxa, até abordagens como a gestáltica e a análise transacional, passando naturalmente pela psicologia analítica de Jung, tem sido utilizado como importante elemento de psicoterapia. Paralelamente, tem-se desenvolvido seu uso no conjunto da Terapia pela Arte: o desenho com valor terapêutico em si mesmo.No plano do diagnóstico psicológico o grafismo, e em especial o desenho, tem ocupado lugar de destaque como instrumento indispensável. Desde a escala métrica de inteligência elaborada por Binet e Simon em 1905, o desenho tem sido empregado em e como teste de desenvolvimento mental e de aptidões específicas, assim como em testes para diagnósticos especiais. No plano da avaliação da personalidade, o desenho desempenha inestimável papel. (sic) (KOLCK, 1984, P. 1)

A criança normalmente gosta de desenhar, diferentemente do adulto, e

expressa através do desenho o seu universo inconsciente. Sem dúvida ao ficarmos

atentos às mensagens que os desenhos procuram nos transmitir, é que podemos

perceber, muitas vezes, um quadro patológico envolvendo a questão da dificuldade de

aprendizagem, de um comportamento agressivo e/ou até mesmo apático.

6.0 O TRABALHO VOLUNTÁRIO – RICA EXPERIÊNCIA

Sem dúvida a oportunidade de realizar um trabalho voluntário, é bastante

gratificante. É uma forma de poder auxiliar o próximo com o que de melhor sabemos

fazer. Eu já havia realizado o trabalho voluntário na área da Psicopedagogia, em outra

instituição antes de me inscrever no Hospital Albert Einstein; e que também foi bastante

promissor.

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No Hospital Albert Einstein, permaneci por um tempo um pouco maior; e

somente ausentei-me por necessidade de alterar os horários dos atendimentos no

consultório.

No hospital iniciei em um projeto pedagógico, como auxiliar da professora em

sala de aula e assim que implantaram o projeto psicopedagógico fui convidada para

fazer parte dele, como voluntária. Os atendimentos eram realizados em uma unidade

ambulatorial na favela de Paraisópoles.

Uma rica oportunidade de colocar em prática mais uma vez a teoria; e, poder

atender uma classe de crianças diferentes das que eu estava acostumada a atender no

consultório oportunizou-me uma nova vivência. Essas crianças apresentavam muito

mais dificuldades de aprendizagem; também problemas econômicos e familiares

exigindo mais delas emocionalmente.

Ao iniciar aos atendimentos psicopedagógicos percebi que emocionalmente as

crianças não conseguiam lidar adequadamente com as situações conflitivas vivenciadas

que ocasionavam o não desenvolvimento para o aprender.

Farei um pequeno resumo de dois casos que considerei complexos e que,

principalmente por meio da interpretação dos desenhos, e dos atendimentos

psicopedagógicos, foi possível dar a essas crianças a oportunidade de expressarem

seus bloqueios inconscientes e ajudá-las a voltarem a ter o gosto pelo aprender.

Alicia Fernández (1991, p.41) destaca que não podemos entender a patologia

do aprender de uma criança analisando somente o presente, fazendo somente um corte

transversal da situação. Sendo assim, entendo que desta forma a origem da dificuldade

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do não aprender envolverá, certamente, fatores ambientais, emocionais, orgânicos e até

mesmo neurológicos e que merecem serem investigados. Apresentarei em breves

relatórios os atendimentos; que mais evidenciaram a necessidade de se investigar os

motivos emocionais que estavam comprometendo o aprendizado; dessas crianças

atendidas nesse projeto psicopedagógico.

1º Caso:

O caso de F. aluna da 3ª série do fundamental, filha única e moradora em

Paraisópoles; encaminhada para o atendimento psicopedagógico; com queixa de

dificuldade específica em matemática, língua portuguesa; e agressão aos colegas. F.

não admitia a ideia de a mãe ter outro filho, bastante autoritária e muito mimada por

todos na família. F. correspondeu de forma bastante satisfatória ao atendimento e

evoluiu muito no aprendizado; no entanto, o que mais ficou em evidência, no

atendimento de F; foi à necessidade que tinha em procurar controlar de forma autoritária

as sessões; pois era acostuma a ser sempre atendida nos seus desejos e não admitia

de forma alguma perder evidenciado durante os jogos que realizávamos, sempre

tentando impor suas vontades. Os atendimentos psicopedagógicos de F. foram

realizados conjuntamente ao atendimento psicológico; o que garantiu um excelente

resultado; pois na verdade, uma vez trabalhado as questões emocionais de F; as

dificuldades de aprendizagem foram sendo minimizadas.

2º Caso:

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O caso de E. aluna da 2ª série do fundamental; que foi encaminhada para o

atendimento psicopedagógico, com dificuldade de aprendizagem e, desde o início

apresentou-se bastante hipoacomodada, com baixa auto-estima e pouca aceitação ao

se deparar com frustrações. Mantinha-se relutante em participar com o grupo, quando

se sentia exposta; parecia também não apresentar nenhuma conservação e com muitas

dificuldades em realizar as operações básicas da matemática. Apresentava dificuldades

de relacionamento devido à dinâmica familiar, da mesma forma que o caso anterior.

Porém, E. tinha muitos irmãos para conseguir ser notada pela família e também

necessitou de um acompanhamento psicológico para evoluir no atendimento

psicopedagógico. E. na verdade já sabia ler, mas toda vez que se via em evidência,

não conseguia mostrar que já o sabia.

Observamos nos dois casos citados, que a dinâmica familiar é muito importante

e o excesso, ou a falta de atenção na família pode provocar desequilíbrios emocionais e

comprometer o aprendizado de uma pessoa.

Felizmente os atendimentos psicopedagógicos, nesses dois casos citados,

tiveram um excelente resultado e essas crianças conseguiram avanços significativos no

processo de desenvolvimento da aprendizagem, certamente, com muito mais segurança

do que quando chegaram para os atendimentos. No entanto, sabemos que o caminho

da aprendizagem está em constantes mudanças e haverá sempre a necessidade de

uma nova adaptação para que possam superar esse processo natural do

desenvolvimento humano.

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7.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante a realização dessa pesquisa, procurei trabalhar tanto a questão

psicológica, psicopedagógica e psicanalítica; através da interpretação do

desenho e também propor a contribuição, em especial, da Psicanálise nos

atendimentos psicopedagógicos. Procurei, sim, manter essa visão psicanalítica,

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sobre a interpretação dos desenhos, e confirmar, através de toda pesquisa

levantada, que existe a possibilidade de um desenho representar sentimentos

inconscientes e que a Psicanálise pode ser um caminho para desenvolver esse

olhar.

Mantendo esse olhar diferenciado, como Psicanalista e Psicopedagoga,

concluo essa pesquisa; com a certeza de ter atingido os meus dois objetivos

maiores, o de chamar a atenção para a questão do universo psíquico, pela

interpretação do desenho, e de como podemos colocar em risco todo trabalho

terapêutico, se não dermos a devida atenção para essa questão do

inconsciente.

Como tudo pode depender da maneira que direcionamos o nosso trabalho

ou das nossas escolhas na vida; cabe a nos mesmos, buscar um melhor

caminho para promover uma vida social e pessoal de forma mais harmoniosa;

mesmo que esse caminho seja através das terapias.

Sugiro a quem também se interesse pelo assunto, a leitura dos autores

aqui apresentados para um maior aprofundamento. Pois não tem como finalizar

um trabalho que fundamenta o pensamento complexo e a dinâmica do

psiquismo; sem se debruçar em pesquisas.

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

Anning, Ângela. Os significados dos desenhos de crianças. Porto Alegre: Artmed,

2009.

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Arcuri, Irene Gaeta. Memória corporal - o simbolismo do corpo na trajetória da vida.

São Paulo: Vetor, 2006.

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1998.

Campos, Dinah Martins de Souza. O teste do desenho como instrumento de

diagnóstico da personalidade. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 1969.

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Del Nero, Sonia. Eros e Thanatos: fundamentos psicanalíticos. São Paulo: Vetor, 2002.

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2008.

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Furth, M. Gregg. O mundo secreto dos desenhos - uma abordagem junguiana da cura

pela arte. São Paulo: Paulus, 2004.

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Laurenti, Roseli Bacili. Psicopedagogia: um modelo fenomenológico. São Paulo: Vetor,

2006.

Lajonquiére, Leandro de. Para repensar as aprendizagens / de Piaget a Freud. A

psicopedagogia entre o conhecimento e o saber. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.

Meredieu, Florence. O desenho infantil. São Paulo: Editora Cultrix, 1974

Parente, Sonia Maria B.A. Diagnóstico e intervenção na clínica do desenvolvimento

e aprendizagem: pelos caminhos da ilusão e do conhecimento. São Paulo: Vetor, 2010.

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Ribeiro, França Cintrão Mônica. Seminário de psicopedagogia - o desenvolvimento

infantil no contexto clínico e institucional - procedimentos de análise e intervenção.

Apostila- 2010.

Sans, Paulo de Tarso Cheida. Pedagogia do desenho infantil. Campinas: Editora

Alínea, 2009.

Schoenfeldt, Bettina Katzenstein. Auto-identificação desenho e assinatura da

criança: estudo de 120 crianças do pré até a 2ª série. São Paulo: Vetor, 1999.

Van Kolck, Odette Lourenção. Testes projetivos gráficos no diagnóstico

psicológico. São Paulo: EPU, 1984.

Zimerman, David E. Fundamentos psicanalíticos: teoria, técnica e clínica-uma

abordagem didática. Porto Alegre: Artmed, 1999.

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Anexo 1

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Anexo 2

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Anexo 3

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Anexo 4

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