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ESCOLA DE CHICAGO: CONTRIBUTOS DO PENSAMENTO DO CRIME COMO UM FENÔMENO SOCIAL Saulo Furquim Professor de Direito da FAAT/SP

A Escola de Chicago e suas teorias sociológicas do crime

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ESCOLA DE CHICAGO: CONTRIBUTOS DO PENSAMENTO DO CRIME COMO UM FENMENO SOCIAL

ESCOLA DE CHICAGO: CONTRIBUTOS DO PENSAMENTO DO CRIME COMO UM FENMENO SOCIAL

Saulo FurquimProfessor de Direito da FAAT/SP

MUDANA DO PARADIGMA DO ESTUDO DA CRIMINOLOGIASc XIX: Desenvolvimento industrial, econmico e financeiro dos EUA, a Amrica se tornava a terra da prosperidade.

Conflitos e Estagnao econmica e financeira na Europa, desta forma a formao de cincia, pesquisa e conhecimento migraram da Europa para o EUA.

Pensamento Positivista de Lombroso foi superado por um novo movimento criminolgico nascido em Chicago/EUA.

O desenvolvimento da criminologia se perpetuo pela pesquisas sociolgicas nos EUA.

SURGIMENTO DA ESCOLA DE CHICAGO

A Escola de Chicago foi criado pelo Departamento de Sociologia da Universidade de Chicago, criado junto com a Universidade em 1890.

A Criao da Universidade se deu por Willian Harper com o estrito apoio do maior Truste dos EUA: John D. Rockefeller (dono da maior empresa petrolfera da poca a Standard Oil dona de 90% dos postos de petrleo dos EUA).

Rockefeller fez a doao de 30 milhes de dlares para a criao da Universidade.

John D. Rockefeller

Willian Harper

Com o forte aporte financeiro para atrair os melhores professores a Universidade pagava salrios que equivaliam ao dobro das outras universidades de ponta.

Trouxe os maiores nomes da Sociologia para o Departamento como: William Thomas, Robert Park, Ernest Burgess, Roderick McKenzie

Ernest BurgessRobert Park

MAS POR QUE CHICAGO?

Comeo do sc XX, crise e iminncia da I Guerra Mundial na Europa.

Grande fluxos de imigrao de europeus para as cidades dos EUA, em busca de trabalho e prosperidade.

Chicago como era um hub (ponto estratgico para empresas e para logstica a maioria das ferrovias para o oeste americano passavam por Chicago).

Devido ao crescimento industrial de Chicago a populao cresceu espantosamente.

GRFICO DO CRESCIMENTO POPULACIONAL DE CHICAGO

GRFICO DO CRESCIMENTO POPULACIONAL DE CHICAGOAno:*Populao:1840 4.0001860110.0001870300.0001890800.00019102.000.00019202.700.000

* Nmeros arredondados

A CIDADE E A CRIMINALIDADE

o crescimento da cidade do centro para periferia, criou graves problemas sociais, familiares, morais e culturais, traduzindo como fermento para a criminalidade.

O crescimento da cidade e a ocupao de seus espaos tornaram objeto de estudo da criminalidade, e Chicago era um grande campo para este estudo.

A Escola de Chicago que criou a metodologia usada hoje, do estudos das taxas de homicdio por bairros e divididas a cada 100 mil habitantes.

Chicago - 1920

DEFINIES DO QUE CIDADE

Conceito vem desde a cidade mdia, que considera cidade um lugar protegido para habitao e compra e venda de materiais.

P/ Pelletier e Delfante: a cidade ter no mnimo 2000 pessoas que atenda um critrio funcional tais como: bancos, escritrios, administraes, equipamentos de sade, espetculos.

P/ Robert Park: A cidade um estado de espirito, um corpo de costumes e tradies e dos sentimentos e atitudes organizados, inerentes a esses costumes e transmitidos por tradies.

A QUESTO DA DELINQUNCIA NAS CIDADESFator Mobilidade (mudana ou imigrao): pode levar a no integrao da comunidade.

Mobilidade constante: pode provocar o anonimato, podendo cometer diversos atos sem serem notadas.

Falta de Controle Social Informal em algumas comunidades (a vizinhana como primeira polcia).

TEORIA DO CONTROLE SOCIAL DE LEMERT

Controle Social Informal: (famlia, igreja, escola, profisso, etc). O sistema informal vai socializando a pessoa no seu convvio social, o medo do desprezo social como punio so mais que suficientes para inibir a prtica de um crime.

Controle Social Formal: (polcia, ministrio pblico e justia criminal e priso). Aquelas pessoas que no respeitam as regras sociais e cometem uma infrao criminal passam a serem controladas por essas instncias, bem mais agressivas e repressoras que as instncias informais.

PRIMEIROS PREMISSAS DA ESCOLA DE CHICAGOMaior Importncia ao Controle Social Informal no combate ao crime.

Os bairros que eram mais pobres tinham maiores ndices de criminalidade.

Degradao e pobreza traz a desorganizao pessoal

A multido serve como uma forma de camuflagem e anonimato ao criminoso

A cidade crescia ignorando o crescimento da pobreza.

POLTICAS DE SEGURANA NAS CIDADES NOS DIAS DE HOJEMovimento chamado: Criminologia Administrativa (a criminologia das estatsticas)

Maior Vigilncia de todos os espaos (sociedade Big Brother).

Poltica voltada a detectar e reprimir crimes como meio de preveno (tolerncia zero).

Momento atual (Sociedade do Controle Deleuze): toda informao na sociedade usada para vigilncia e monitoramento (caso Snowden e NSA).

(...) Os que trabalham tm medo de perder o trabalho; os que no trabalham tm medo de no encontrar trabalho; quando no tm medo da fome tm medo da falta de comida; os civis tm medo dos militares; os militares tm medo da falta de armas e as armas tm medo da falta de guerras. o tempo do medo, medo da mulher da violncia do homem e medo do homem da mulher sem medo. Medo dos ladres, medo da polcia. Medo da porta sem fechaduras (...) Eduardo Galeano Medo Global(...) H muros que separam naes, h muros que dividem pobres e ricos, mas no h hoje, no mundo um muro, que separe os que tm medo dos que no tm medo. Sob as mesma nuvens cinzentas vivemos todos ns, do sul e do norte, o ocidente ao oriente (...) h quem tenha medo que o medo acabe.

Mia Couto Murar o Medo

ECOLOGIA CRIMINAL

O que Ecologia criminal?

Ecologia: a cincia que estuda a relao dos seres vivos e seu ambiente, como seu relacionamento dentro desse sistema.

Ecologia Criminal: estuda os delitos praticados na cidade e sua relao das pessoas que a habitam com o ambiente onde o delito praticado.

Problema central de Chicago:

Crescimento desenfreado, imigrao, pobreza, degradao da cidade e o crescimento da criminalidade. Criminalidade maior entre os imigrantes.

ECOLOGIA CRIMINAL

Desconstruindo Lombroso:

Relatrio: O campons polons na Europa e na Amrica 1918.

Concluiu que o ascendentes dos criminosos imigrantes pesquisados no tinham ligao nenhuma com o crime.

No havia relao nenhuma com o atavismo.

ECOLOGIA CRIMINAL

THOMAS, William; ZNANIECKI, Florian. O campons polons na Europa e na Amrica, 1918.

ECOLOGIA CRIMINAL

Desorganizao Social:

a perda de influncia das regras sociais de conduta existentes sobre os membros do grupo.No havia um Controle Social Informal nestes lugares.

Advinda dos bairros pobres de Chicago, onde residia a maior parte dos imigrantes da cidade, nestes bairros as condies de vida eram pssimas.

ECOLOGIA CRIMINAL

ECOLOGIA CRIMINAL

ECOLOGIA CRIMINAL

reas de Delinquncia:

As cidades se desenvolve em reas diferentes com classes sociais diferentes que ocupam cada reas.

Cada rea da cidade tem um padro homogneo das situaes socioeconmica das pessoas.

P/ Park, Burgess e McKenzie, as grandes cidades se desenvolvem por meio de um conjunto de zonas ou anis a partir do centro, a chamada teoria dos crculos concntricos.

ECOLOGIA CRIMINAL

Teoria dos Crculos Concntrico

ECOLOGIA CRIMINAL

Zona I Loop: rea central da cidade, rea de negcios, zona intensa de atividade comercial, predominncia de escritrios e comrcio. Ex: Centro de SP.Zona II Transio: A parte mais degradada da cidade, um centro de transio as pessoas que vivem ali querem sair dali. Predominncia de cortios, prostibulo, apartamentos abandonados e invadidos. Ex: Regio da Luz, Repblica, Bom Retiro, etc.Zona III: rea residencial dos trabalhadores em geral, aqueles que devido ao trabalho conseguiram local melhor para viver. Ex: Mooca, Santana, Barra Funda.Zona IV: So os distritos residenciais das classes media alta, geralmente so os trabalhadores individuais. Ex: Moema, Itaim, Campo Belo, Alto de Pinheiros.Zona V: Compreende as reas fora da cidade e suas cidades satlites, local onde vive a classe mais afortunada da cidade em condomnios fechados. Ex: Alphaville, e o Morumbi na poca que foi construdo, pois era muito longe do centro visto quase como uma outra cidade.

Chicago Zona 2

Chicago Zona 5

ECOLOGIA CRIMINAL

Consequncias da diviso:

A Z.II foi a rea onde o cometimento de crimes era maior.

A delinquncia estava ligada a degradao, a segregao fsica, pobreza e falta de interveno social do Estado.

Em 1926 37% dos crimes praticados por jovens foram cometidos prximos as reas da Z.II.

Os crimes tinham motivao socioeconmica.

Fator Cidade Grande vs Cidade Pequena: controle social informal maior nas cidades pequenas = menos crime.

PROPOSTAS DA ECOLOGIA CRIMINAL

Nenhuma reduo contra a criminalidade possvel se no houver mudanas nas condies sociais e econmicas das crianas e dos adolescentes.

Tratamento e preveno da criminalidade por meio da Interveno Social do Estado, incentivo as instituies locais (escola, igreja, associao de bairros).

Criao de comits e entidades de bairro.

Criao de Atividades Comunitrias para os jovens.

Melhoria das moradias e da infraestrutura.

Criao do Projeto: rea de Chicago (efetivao destas polticas sociais).

Passados quase 100 da Escola de Chicago o Brasil segue na contramo das polticas com a criminalidade.

A (M) APLICAO DAS IDEIAS DE CHICAGO: o surgimento da Tolerncia ZeroTeoria das Janelas Quebradas (Broken Windows Theory)

Experincia realizada por Philip Zimbardo

Foram deixados 2 carros abandonados (Bronx NY e Palo Alto CA).

O Carro do Bronx foi rapidamente saqueado.

O do Palo Alto continuava intacto.

Philip quebrou a janela do carro e logo depois ele comeou a ser saqueado.

Concluso: o delito e a desordem esto conectados, j que bens em desordem aparentam abandono, propiciando os primeiros passos para o vandalismo e a violncia. Logo, qualquer pequena desordem deve ser combatida = desastre criminal

Palo Alto Califrnia

Bronx Nova York

A (M) APLICAO DAS IDEIAS DE CHICAGO: o surgimento da Tolerncia Zero

Com base nessa experincia foi publicado o artigo de: WILSON, James Q; KELLING, George L; SKOGAN, Wesley G. Broken windows: the police and neighborhood safety, Boston: Atlantic Monthly, 1982.

A (M) APLICAO DAS IDEIAS DE CHICAGO: o surgimento da Tolerncia ZeroEfetivao das Janelas Quebradas: as polticas de tolerncia zero.

Implantada por Rudolph Giuliani (prefeito de NY nos 90).

A mnima desobedincia deve ser castigada e o melhor meio de evitar delitos graves punir muito severamente as mais leves faltas.

Os delitos mais leves como: mendicncia, prostituio, vandalismo eram punidos severamente como priso.

A (M) APLICAO DAS IDEIAS DE CHICAGO: o surgimento da Tolerncia ZeroEfeitos:A curto prazo: reduziu o nmero de crimes com represso.A longo prazo: taxa de crimes voltou a crescer (avalanche de reincidncia).Poltica carssima: gastava com a represso.A taxa de criminalidade do meio dos anos 90 havia cado devido a crescente econmica do pas.

A (M) APLICAO DAS IDEIAS DE CHICAGO: o surgimento da Tolerncia ZeroCrticas:

Loic Wacquant (punir os mais pobres), Jock Young (sociedade excludente) e David Garland (Cultura do Controle): poltica viciosa, repetitiva e sem efeitos considerveis, do qual s tem um alvo para ser encarcerado, a pobreza.

Encarceramento em massa da juventude pobre e negra.

Alto ndice de Reincidncia.

APLICAO DAS IDEIAS DA ESCOLA DE CHICAGO NO BRASIL: O Modelo das Upps:

DISTRIBUIO DA UPPs NAS COMUNIDADES DO RIO DE JANEIRO

APLICAO DAS IDEIAS DA ESCOLA DE CHICAGO NO BRASIL: O Modelo das Upps:A UPPs priorizam o controle da criminalidade por meio do Controle Social Formal (policiais).

Chicago priorizava o controle da criminalidade por meio do Controle Social Informal.

Os 4 anos da instalao das UPPs no foram efetivamente criadas escola, creche ou hospitais nas comunidades.

As Upps s substituram a existia do poder paralelo pelo poder da polcia.

A desorganizao social e as reas de delinquncia ainda impera nas comunidades mesmo com a interferncia das Upps.

Modelo de comunidade que distingue das demais: Dona Marta, urbanizao do local, atraiu o turismo e o comrcio

MODELO DE UPPs CONFORMES AS IDEIAS DE CHICAGO

PROJETOS URBANISTCOS ADVINDOS DAS IDEIAS DE CHICAGO:Revitalizao de Puerto Madero em Buenos Aires.

Revitalizao do Centro Histrico de Lima no Peru.

Puerto Madero Buenos Aires

Centro Histrico de Lima no Peru

POLTICA URBANA DO BRASIL NA CONTRAMO DOS IDEIAIS SOCIAISProjetos de revitalizao no so realizados em prol da populao que deixa de usufruir (ocupe estelita e parque augusta).

Expulso de moradores para revitalizar o ambiente (ex: copa do mundo)

Interesse em tornar o espao pblico em privado (shoppings, prdio, etc).

A classe mdia se isola e exclui os demais, para tanto ela se enclausura em ambientes privados fechados. (Ex: Rolezinhos).

Manso Matarazzo Av. Paulista

CONSIDERAES POSITIVAS E CRTICAS DA ESCOLA DE CHICAGOPositivas:Superou as vises etiolgicas de Lombroso, Ferri e Garfalo (desconstruiu a ideia de criminoso determinado).

Iniciou o modelo de criminologia partindo das ideias de sociologia criminal.

Asfaltou caminho para as Teorias posteriores como a Teoria da Subculturas Delinquncias.

Inaugurou o modelo de criminologia como base para polticas criminais (modelo de Controle Social Informal como poltica criminal).

CONSIDERAES POSITIVAS E CRTICAS DA ESCOLA DE CHICAGOCrticas:Teoria conservadora: as pessoas deveriam ter os valores dominantes da sociedade para no incumbir ao crime (modelo de famlia tradicional, e seguir os dogmas religiosos que a sociedade ordena).

Deveria haver um consenso na sociedade sobre cultura, identidade, valores morais e smbolos, o que fugisse disso era tido como Desorganizao Social.

No Levava em Conta a cifra negra: diferena entre crimes de ricos e crimes de pobres.

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

ANDRADE, Manuel da Costa; DIAS, Jorge de Figueiredo. Criminologia: O Homem Delinqente e a Sociedade Crimingena. 1. Ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2013.

ANITUA, Gabriel Ignacio. A histria dos pensamentos criminolgicos. Traduo Sergio Lamaro. Rio de Janeiro. Editora Revan, 2008.

BARATTA, Alessandro. Criminologia crtica e crtica do direito penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Revan/ICC, 2002.

CARVALHO, Salo de. Antimanual de Criminologia. 2. Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris. 2008.

GARCIA PABLOS-DE MOLINA, Antonio. Tratado de Criminologa. 5 ed. Valencia: Tirant lo Blanc, 2014.

SHECAIRA, Srgio Salomo. Criminologia. 5 edio. So Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2013.

REFERNCIAS AVANADAS

BURGESS, Ernest. O crescimento da cidade: introduo a um projeto de pesquisa. Estudos de ecologia humana. So Paulo: livraria Martins, 1948.

PARK, Robert; BURGESS, Ernest. The City. Chicago: Chicago University Press, 1925.

PARK, Robert. A cidade: sugestes para investigao do comportamento humano. O fenmeno humano. Rio de Janeiro: Zahar, 1967.

PIERSON, Donald (org.). Estudos de ecologia humana. So Paulo: Martins, 1948.

SHAW, Clifford; McKAY, Henry. Juvenile delinquency and urban areas. Chicago: The University of Chicago Press, 1928.

ESCOLA DE CHICAGO: CONTRIBUTOS DO PENSAMENTO DO CRIME COMO UM FENMENO SOCIAL

Saulo Ramos FurquimProfessor de Direito da FAAT/[email protected]