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28 Anos D a p r o m o ç ã o h u m a n a à l u t a p o r d i r e i t o s Cáritas Brasileira Regional Nordeste 3

Revista Celebrativa de 28 anos da Cáritas Regional Nordeste 3

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  • 28 Anos

    Da promoo humana luta por direitos

    Critas BrasileiraRegional Nordeste 3

  • Esta uma publicao comemorativa da Critas Brasileira Regional Nordeste 3 dos seus 28 anos de caminhada, comprometidos com a misso de testemunhar e anunciar o Evangelho de Jesus Cristo, defendendo e promovendo a vida e participando da construo solidria de uma sociedade justa, igualitria e plural, junto com as pessoas em situao de excluso social, agosto de 2016.

    Bispo Referencial da Critas Regional Nordeste 3Dom Joo Costa

    Coordenao Colegiada da Critas Regional Nordeste 3Ctia Cardoso (Secretria Regional)Josilene Passos (Assessora Regional)Alan Lusttosa (Assessor Regional)

    Conselho Consultivo da Critas Regional Nordeste 3Otilia Balio Fava Ruy Barbosa (BA), Jos Edinaldo da Silva Estncia (SE), Magnlia Vitria dos Santos Estncia (SE), Jorge Gonalves de Oliveira Serrinha (BA), Raimundo de Jesus Santos Amargosa (BA) e Ana Tibrcio Vitria da Conquista (BA)

    Critas Brasileira Regional Nordeste 3Rua Emlia Couto, 270B Brotas40285-030 Salvador (BA)Telefone: +55 (71) [email protected]

    ExpedienteJornalista responsvel: Marilda Ferri DRT 1948 Redao: Amanda Santos, Darci Moraes, Josilene Passos, Marcos Fabrcio Oliveira, Marilda Ferri Fotos: Allan Lusttosa e acervo da Critas Regional Nordeste 3 Reviso: Vanice Arajo l arteemmovimento.orgProjeto grfico e diagramao: arteemmovimento.orgImpresso:

    EquipeAdriana Pales Santos, Alan Alves Lustosa, Alexsandro Siqueira do Nascimento, Amanda dos Santos Silva, Candice Ferreira de Arajo, Ctia Maria M. Cardoso, Clusa Alves da Silva, Ester Borges dos Santos, Eudes Ferreira Arajo, Gabriel Carneiro Reis, Iasmin Santana Barros, Josilene Nascimento Passos, Lourival Silva de Jesus, Mara Barbosa da Silva, Marcus Fabrcio G. Oliveira, Patrcio Cardozo dos S. Filho, Rodrigo Arajo da Silva, Slvia Regina Nascimento Santos, Diogo Oliveira Simas da Silva, Maurcio Silva Arajo, Paula de Oliveira Rios.

  • Sumrio

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    F na estrada

    Um servio de amor e por amor

    Nosso cho

    Constante processo de converso

    Caminhar junto com o povo

    Momento novo

    Presena solidria

    Coragem e ousadia

    A fora dos novos

    Unindo o cordo

    Sozinho, isolado, ningum capaz

    Outras palavras

    Entre na roda com a gente

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  • F na estrada

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    Como podemos ser felizes vendo tanta misria e tantas injustias? Frei Beto nos sinaliza um caminho: no somatizar essas infelicidades, opresses e injustias e empenhar a vida na direo de mudar esse estado de coisas. Quando celebramos o aniversrio de 28 anos da Critas Brasileira Regional Nordeste 3, vislumbramos que nossos agentes j fazem esse exerccio h quase trs dcadas. So centenas de mulheres, homens, jovens, trabalhadores, pescadoras, quilombolas, agricultoras, catadores, povo de rua, crianas e adolescentes que dedicam sua vida em funo de um mundo onde as condies espirituais, culturais, ambientais, sociais e polticas possibilitem a felicidade como direito de todos e todas. A Critas uma rede que acredita que a felicidade anda de mos dadas com a solidariedade e com o bem comum.

    Neste momento, estamos conectados com toda a Rede Critas Brasileira, fazendo o caminho de reflexo e celebrao. Em novembro, nos reuniremos no santurio de Nossa Senhora Aparecida para, junto com Mariama, celebrar os 60 anos de presena da Critas no Brasil. perodo de jubileu, tempo de colher os frutos semeados no semirido, no cerrado e no litoral; tempo de ver brotar o protagonismo das populaes que lutam por Economia Solidria e por uma agricultura agroecolgica; celebrarmos os plebiscitos populares, as leis de iniciativa popular, os tribunais populares do judicirio e o exerccio cidado do nosso povo, que acredita na democracia e que assume a tarefa de construir um novo mundo possvel hoje e agora.

    Quando nos desafiamos a produzir uma revista dos 28 anos da Critas Brasileira Regional NE 3, pensamos na importncia de fazer memria, de olhar o caminho percorrido e de lanar mo daquilo em que acreditamos como referncia metodolgica: construir conhecimento a partir dos saberes coletivamente acumulados e solidariamente compartilhados num movimento de ver, julgar, agir e celebrar que nos orienta e nos conduz em nosso fazer cotidiano. Provavelmente poucos dos que esto hoje assumindo a misso da Critas no nosso Regional iniciaram esse caminhar h 28 anos, mas isso no faz nenhuma diferena, porque essa obra no tem autor especfico e no se finda. Ela segue sempre em construo e conta com a inspirao do evangelho e a capacidade de sonhar de cada agente Critas que atua no seu tempo, no seu territrio e com sua f. No podemos nos esquecer de que o ser humano, certamente, tem tanta necessidade de sonho quanto de realidade. E o nosso sonho alimenta a esperana de que podemos, um dia, transformar o mundo da competitividade que vivenciamos num mundo da solidariedade que profeticamente Jesus nos deixou como legado.

    Para todas e todos uma saborosa e instigante leitura!

    Ctia CardosoSecretria Regional

    Eu vim para que todos tenham a vida, para que tenham em abundncia.

    Evangelho de Joo 10,10

  • Um servio de amore por amor

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    A Critas uma obra daquelas que so construdas por diversas mos, porm uma a mo central, a de Jesus Cristo, que fortalece e impulsiona as aes dessa entidade internacional de imensa projeo em defesa dos mais fracos. Aqui, nesta poro de terra, baiana e sergipana, a Critas tem feito um bem enorme a tantas vidas sofridas e marcadas pela excluso social.

    So 28 anos em nosso Regional Nordeste 3 de uma presena atuante, muitas vezes silenciosa, porm eficaz, na defesa de polticas pblicas que priorizem a promoo da pessoa humana, desde crianas, adolescentes e jovens at os adultos.

    A Critas surgiu com o propsito de estender as mos, de servir ao outro, tomando como exemplo o prprio Cristo: no vim para ser servido, mas para servir. essa fora impulsionadora que, em nome da Igreja, chega aos rinces com a palavra viva de Cristo no gesto concreto que alimenta e ajuda os assistidos a saber plantar e colher.

    um fermento na massa que faz expandir bons frutos, que d o peixe, mas ensina a pescar. a voz para tantos que no conseguem, por suas prprias foras, gritar. E faz ecoar nos ouvidos dos poderes constitudos o som de socorro dos desvalidos e esquecidos da sociedade.

    mais do que uma obra social. a fora de Cristo, atravs de centenas de agentes Critas, voluntrios e no voluntrios, que abraam a causa da caridade ensinada pelo apstolo So Paulo, que to sabiamente nos transmitiu e expandiu os ensinamentos de Jesus: Ainda que eu falasse as lnguas dos homens e dos anjos, se no tiver caridade, sou como o bronze que soa, ou como o cmbalo que retine. (1 Corntios 13:1).

    Esta a entidade que abraa todos, no enxerga rtulos, no exclui ningum, sejam catlicos e no catlicos, sejam crentes e no crentes. Onde quer que esteja presente e d para seus braos alcanar, a Critas este sol que brilha em todas as direes e no se exime de edificar e defender o progresso. No rumo de um desenvolvimento sustentvel em que o progresso, o meio ambiente e o homem devem viver em harmonia no presente para um futuro melhor para todos.

    Entendendo tudo isso da Critas, no podemos deixar de louvar a Deus por esse projeto de amor e por amor, e de agradecer, imensamente, a cada um e cada uma das pessoas que fazem a Critas, que vivem a Critas, em cada Diocese deste nosso Regional Nordeste 3 da CNBB, dos estados da Bahia e Sergipe.

    Que o bom Deus, atravs do manto sagrado de Nossa Senhora, cubra cada pessoa que faz parte dessa entidade. E que a Critas possa continuar sua misso, protegendo, zelando e levando o evangelho vivo a cada pessoa que precisar.

    Parabns! Com a bno de pastor,

    Dom Joo Jos CostaArcebispo Coadjutor de Aracaju e

    Presidente da Critas Nacional

    Porque o Filho do homem no veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em redeno por muitos." MC 10,45

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    Bahia e Sergipe so os dois estados que abrigam o Regional Nordeste 3 (NE 3) da Critas Brasileira. Nessas duas pores do territrio nacional, convive e dialoga uma infinidade de povos com histrias, culturas, espiritualidades e lutas. Cada um sua maneira, com suas particularidades, acolhe as aes da Critas, junto ao povo, por caminhos que garantam a qualidade de vida. A Bahia tem uma rea territorial de 564.733 km, onde habitam pouco mais de 15 milhes de habitantes, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica, 2014 (IBGE). Sergipe possui uma rea de 21.918,454 km e tem 2.242.937 habitantes (IBGE, 2014).

    Nos dois estados, o modelo de desenvolvimento marcado pela concentrao das riquezas, investimento em grandes projetos do capital, como monoculturas, agronegcio e explorao mineral, em oposio aos interesses dos agricultores familiares, dos povos tradicionais e indgenas.

    Cada estado a seu modo apresenta uma cultura marcante e plural, caracterizada por uma confluncia de gneros de vida europeus, africanos e indgenas, constituindo um mosaico tnico e cultural importante do patrimnio imaterial do Brasil, abrigado em uma diversidade de biomas: Caatinga, Cerrado e Mata Atlntica.

    No Cerrado, as pequenas rvores de troncos torcidos e recurvados e de folhas grossas, esparsas, em meio a uma vegetao rala e rasteira, misturam-se com campos limpos ou matas de rvores no muito altas. A Caatinga atravessa o serto como uma floresta de rvores pequenas e retorcidas, ora como formao arbustiva, ora como uma escassa vegetao rasteira. E a Mata Atlntica, com sua densa e exuberante floresta, rica em biodiversidade, com presena de diversas espcies de animais e vegetais.

    Nosso cho

    Tem massa de mandioca, batata assada, tem ovo cru, banana, laranja, manga, batata,

    doce, queijo e caju, cenoura, jabuticaba, guin, galinha, pato e peru, tem bode,

    carneiro, porco, se duvid... int cururu...A Feira de Caruaru, Luiz Gonzaga

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    Para alm da riqueza, importncia e diversidade que cada bioma guarda, h uma caracterstica comum a todos: o processo de extino em ritmo acelerado, desencadeado pelo modelo de desenvolvimento agroexportador, alicerado nos grandes projetos do capital, a exemplo do monocultivo, agronegcio, minerao, entre outros.

    Na contramo dessa histria de explorao extensiva e perversa, h muitas tramas sendo desenvolvidas, experimentadas e vivenciadas por jovens, mulheres, sertanejos, fundos de pasto, ribeirinhos, pescadores e indgenas, que juntam suas foras e capacidades de luta na defesa dos seus territrios e pela vida com dignidade.

    nesse cho, que tem homem e mulher, jovem e criana, negro e indgena, massa de aipim ou macaxeira, laranja, banana, jabuticaba, guin, galinha, bode, pequi, buriti, umbu, se duvid... int cururu, que a Critas Regional NE 3 est assentada, evangelizando e sendo evangelizada, sendo presena solidria na escuta, na caminhada, na alegria e na luta.

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    Declaro promulgado o documento da liberdade, da democracia e da justia social do Brasil. Com essa fala, o ento deputado federal Ulysses Guimares anunciou ao povo brasileiro a sua nova Constituio, na tarde de 5 de outubro de 1988. O documento marco simblico do rompimento com a Constituio de 1967, elaborada pela ditadura militar, que comandou o pas de 1964 at 1985 resultado de intensa agitao, pela mobilizao de diversos setores da sociedade civil, alguns setores da Igreja Catlica, entre eles a Critas Brasileira, e os movimentos sociais que desejavam influir decisivamente no processo de construo da nova democracia.

    O Regional NE 3 nasce nessa conjuntura poltica. Um ambiente difcil, pautado por diversas foras, que tinham a democracia como ponto comum, mas com diferenas sobre a forma de alcan-la. J a Critas Nacional que neste ano completa 60 anos , foi criada em 1956, em um cenrio tambm muito difcil, com dois projetos de sociedade sendo claramente disputados. O capitalista, que vai se consolidando, e o pensamento socialista, que avanava na Amrica Latina e encontrava resistncia das foras dominantes. O pastor Djalma Torres, da Igreja Batista de Nazareth, amigo e parceiro do Regional NE 3, lembra das lutas desse perodo. Para alm da abertura poltica, estvamos lutando, desde os anos 1970, pela revitalizao da Igreja, pela criao de movimentos e instituies, como a Coordenadoria Ecumnica de Servio (CESE), o Centro Ecumnico de Documentao e Informao (CEDI) e o Conselho Nacional de Igrejas Crists (CONIC). Aqui na Bahia, participamos da criao do Comit de Solidariedade aos Povos da Amrica Latina e Caribe (COSPAC), do Comit de Solidariedade a Cuba e do engajamento na Semana de Orao pela Unidade dos Cristos. Desenvolvemos um programa de apoio a presos polticos e s suas famlias e um trabalho de acolhida a pessoas expulsas de igrejas e da sociedade, comenta o pastor.

    Constante processode converso

    graa divina comear bem. Graa maior persistir na caminhada certa.

    Mas graa das graas no desistir nunca.

    Dom Helder Cmara

  • A Critas Nacional surge numa vertente mais assistencialista, com os objetivos de articular, em plano nacional, todas as obras sociais catlicas ou de inspirao catlica; e planejar, executar e fiscalizar a distribuio de donativos do povo norte-americano ao povo brasileiro, atravs da Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), conforme documentos oficiais.

    O Regional NE 3 surge em outro momento. Eram tempos de investimento em aes de promoo humana atravs dos cursos de formao para o trabalho, da organizao de grupos comunitrios populares, j ali lanando as primeiras sementes para o que hoje vem a ser a Economia Popular Solidria e as finanas solidrias, observa Ctia Cardoso, Secretria Regional NE 3. Nesse tempo j h um tmido comeo da funo dos fundos rotativos, uma semente plantada pelas vrias Critas Diocesanas do Regional, como Ruy Barbosa, que tem mais de 50 anos; e a Critas Diocesana de Amargosa, que celebra meio sculo em 2016. O Regional NE 3 se alicera nessas experincias e metodologias desenvolvidas pelas Critas Arqui(Diocesanas) da Bahia e Sergipe e inicia a sua caminhada com aes voltadas para o trabalho de formao comunitria, incorporando elementos da educao popular, do ver, julgar, agir e transformar, tendo como primeiro secretrio regional padre Nelson Luiz da Franca, seguido de Daniel Carvalho.

    A dinmica social, poltica e econmica foi apontando novos caminhos de atuao. Aps 17 anos, o Regional inaugura a sua gesto colegiada, tendo como Secretrio Regional padre Eliomar Gomes, seguido de Cleusa Alves, e aos poucos vai superando a perspectiva de promoo humana, se debruando para a dimenso da luta por direitos; do desenvolvimento sustentvel, solidrio e territorial. A metodologia da Economia Popular Solidria vai ganhando fora com a experincia dos Projetos Alternativos Comunitrios (PACs), se constituindo como subsdio importante para todo o acmulo em torno da questo dos fundos rotativos solidrios FRS, da qualificao do debate em torno do tema, da organizao social, da construo do Frum de Economia Solidria, e da constituio do Conselho de Segurana Alimentar e Nutricional.

    O mbito das polticas pblicas, da incidncia, tambm so destaque da metodologia do Regional NE 3, e expressa a fase do pescar junto, de ratificar que no so as instituies que detm conhecimento e passam para os grupos acompanhados, para as comunidades e agentes, mas que h um conhecimento produzido por todos e que essa troca de saberes vai construindo tecnologias sociais e metodologias populares. E ainda da necessidade de um trabalho articulado envolvendo organizaes e movimentos sociais e populares, sociedade civil e poder pblico. A experincia da Articulao Semirido Brasileiro (ASA), uma rede de organizaes sociais que a Critas integra, e que defende, propaga e pe em prtica, inclusive atravs de polticas pblicas, o projeto poltico da convivncia com o semirido, um exemplo disso.

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    Nessa mesma linha, a experincia da Articulao de Polticas Pblicas da Bahia (APP), um coletivo de organizaes sociais, do qual o Regional NE 3 participa, se notabiliza animando o processo de controle social sobre a gesto pblica, a exemplo da campanha Quem No Deve No Teme (2005 a 2010) e Tribunal Popular do Judicirio (2011 a 2012), entre outras.

    Passados 28 anos, o Regional est consolidado, mas em constante aprendizado, tendo como diretriz geral o compromisso com a construo do Desenvolvimento Solidrio Sustentvel e Territorial, na perspectiva de um projeto popular de sociedade democrtica. E, como prioridades estratgicas, a promoo e fortalecimento de iniciativas locais e territoriais de desenvolvimento solidrio e sustentvel; a defesa e promoo de direitos, mobilizaes e controle social das polticas pblicas; e a organizao e fortalecimento da Rede Critas.

    Est inserido na Rede Critas Nacional, composto de 12 escritrios regionais e quatro articulaes, o NE 3, que rene 17 entidades-membro, distribudas entre os estados da Bahia e Sergipe, que funcionam de forma autnoma junto s comunidades, numa perspectiva de estar junto, de ser fermento, em um constante processo de converso, como dizia o seu fundador, dom Helder Cmara.

  • A vida luta. Volta e meia, as pessoas nas comunidades trazem essa mxima, ora com muita desesperana, ora como um sinal de que esto na caminhada, firmes e fortes, prontas para os enfrentamentos. certo, como bem lembra Josilene Passos, assessora do Regional NE 3, que a luta tem momentos marcados pela apatia, cooptao de lideranas, descrenas, falta de unidade e medos. Mas tambm h conquistas e vitrias que no podem ser esquecidas e animam a continuar em frente.

    Entre os altos e baixos das batalhas cotidianas, o Regional NE 3 tem feito um esforo para estar junto, nas trincheiras por um modelo de desenvolvimento mais justo. E, para dar concretude a essa presena solidria no meio do povo, desenvolve e participa de projetos e aes. Alguns deles so destaques nesta publicao.

    O Grito dos(as) Excludos(as), que acontece anualmente no dia 7 de setembro em todo o Brasil, um espao aberto a grupos, movimentos e igrejas comprometidos com a causa dos excludos e excludas, que a cada ano vem se desenvolvendo como um processo articulado e coletivo na tentativa de que seja verdadeiramente ouvido o grito de excludos e excludas da sociedade. Desde que surgiu no Brasil no ano de 1995 at hoje, o NE 3 presena na animao, articulao e participao no Grito dos(as) Excludos(as). Atualmente, tem articulado a participao de representantes desse regional no Encontro Nacional do Grito. E ainda o regional que promove o encontro de formao para os(as) animadores(as) do Grito em nvel regional ou estadual. Ao longo desses anos, muitas entidades-membro puxam, animam e/ou ajudam na organizao do Grito nas dioceses da Bahia e de Sergipe.

    Caminhar juntocom o povo

    Transformar oque no d mais

    Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto porque eles so pobres, chamam-me de comunista. Pobre no precisa s de caridade, mas tambm de Justia.Dom Helder Cmara

    Caminhar junto com o povo 9

  • O Regional NE 3 da Critas uma das organizaes que realizam, assim como toda a Rede, a Semana Social Brasileira, iniciativa da Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que convoca e anima as foras populares e intelectuais a debater questes sociopolticas relevantes e traar perspectivas para o pas, baseadas no Ensino Social da Igreja.

    At aqui, foram cinco edies de Semana Social que contaram com a participao da Critas Regional NE 3. Nos estados da Bahia e Sergipe, lideranas religiosas, de pastoral, movimentos sociais e organizaes populares no pouparam esforos para mobilizar e animar a sociedade a discutir sobre questes importantes da realidade sociopoltica e econmica do pas e suas consequncias na vida de todos os brasileiros, contribuindo para a compreenso e identificao dos meios de democratizao do Estado brasileiro, numa perspectiva propositiva de iniciativas transformadoras na construo do bem viver.

    Construir o bemviver

    A campanha da rea de Livre Comrcio das Amricas (ALCA) foi mais uma que contou com ampla participao do Regional NE 3. De olho nos riscos que uma rea de livre comrcio, com a eliminao de barreiras alfandegrias, poderia causar para a economia dos pases perifricos, entre eles o Brasil, a campanha botou o bloco na rua. Teatro, jogral, cartazes, cantos se somaram a outros recursos metodolgicos, fazendo chegar a todas as camadas da populao informaes sobre esse projeto e suas consequncias. A mobilizao popular foi exitosa, colocando, desde 2005, quando ocorreu a ltima Cpula das Amricas, o projeto na geladeira. Foi um trabalho gigante nesse Regional. Conseguimos mobilizar 12 mil militantes e coletamos um milho de assinaturas, com a participao, claro, de vrios movimentos e organizaes. Mas a rede ligada Igreja, as Pastorais Sociais, no s a Critas, foi muito importante, testemunha Ctia Cardoso. Essa ao animou o trabalho dos outros plebiscitos, como o da dvida externa, da Vale do Rio Doce. Foram momentos importantes, educativos, que permitiram que a populao discutisse temas que antes estavam s no meio da universidade, da intelectualidade, completa a secretria.

    Um milho deassinaturas

    Caminhar junto com o povo10

  • O Tribunal Popular do Judicirio foi outra ao desenvolvida pela APP em vista de uma reflexo profunda sobre o papel e atuao do Poder Judicirio baiano. A motivao dessa iniciativa deve-se a uma histrica situao de negao e violao dos Direitos Humanos no Estado, sem que as instituies que compem a estrutura do Poder Judicirio assumam efetivamente suas responsabilidades constitucionais, comenta Ctia Cardoso, Secretria do Regional NE 3. Como resultado concreto dessa inciativa, foram sistematizados e denunciados 14 casos de negao de direitos para organismos de controle nacional e internacional de defesa dos Direitos Humanos, apontando a responsabilidade do Poder Judicirio baiano nos casos de negao e violao de direitos.

    importante salientar que essa foi uma iniciativa que se inspirou na experincia do Maranho, com o objetivo de promover a democratizao do sistema de justia brasileiro.

    A Articulao em Polticas Pblicas do Estado da Bahia (APP) foi mais que uma parceria, representou a unio de foras de movimentos, pastorais, entidades e organizaes da sociedade civil em torno da causa comum: formulao, elaborao, execuo e controle de polticas pblicas.

    Ela foi criada em 2001, reunindo pastorais e organizaes sociais que tinham aes no mbito da incidncia em polticas pblicas e eram apoiados pela Misereor, agncia de cooperao alem. Esse espao permitiu trocas de experincia, acompanhamento e fiscalizao das contas pblicas, denncias de casos de abusos, omisses e conivncias do Poder Judicirio, criao de uma mentalidade e cultura de participao poltica democrtica e popular na Bahia. Participar de campanhas como Quem no deve no teme; Participao Poltica e Voto no tem preo, tem consequncia constituiu um marco na histria poltica baiana, em terras de coronis, onde um manda, muitos obedecem e no se atrevem a desafiar, enfatiza Josilene Passos.

    As foras juntar

    Caminhar junto com o povo 11

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    O projeto Reciclando Vidas promoveu mudanas significativas na vida dos catadores e catadoras, oportunizando a sada da invisibilidade, atravs de formao poltica e orientao para formao de cooperativa.

    Desenvolvido pelo Regional NE 3, em parceria com as Critas Diocesanas de Barreiras e de Amargosa, no perodo de 2009 a 2012, o projeto promoveu conquistas, incluso, cidadania e dignidade na vida de inmeras pessoas nos municpios de Barreiras e Santo Antnio de Jesus. Costumamos dizer que a reciclagem no s dos resduos, mas, sobretudo, do modo de ver a vida, possibilitando um momento novo, sinaliza Josilene Passos.

    Embora contabilize avanos, ainda h um caminho longo a ser percorrido pela sociedade brasileira e pelo Estado, que ainda no se v como elemento importante no processo de reciclagem, e no conhece e/ou reconhece a Poltica dos Resduos Slidos e sua contribuio para a conservao do meio ambiente.

    Momento novo

    Mais que comum dos dias, olhei o mais que pude os rostos dos pobres, gastos pela

    fome, esmagados pelas humilhaes, e neles descobri teu rosto, Cristo Ressuscitado!

    Dom Helder Cmara

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    Presena solidria

    Em 1989, o Regional NE 3 passa a atuar junto a pessoas infectadas pelo vrus do HIV/Aids, em parceria com as Critas Diocesanas de Ilhus, Vitria da Conquista, Barreiras, em parceria com o Dignivida Promoo da Vida Humana; Salvador e Feira de Santana, na Bahia; Aracaju, Estncia e Propri, em Sergipe, atravs do Projeto Solidariedade e Esperana Aids (PSE/AIDS). A agente Maria DAjuda Ferreira lembra que a iniciativa foi uma forma que o Regional encontrou de dar resposta epidemia, sendo presena solidria junto s famlias e s pessoas contaminadas.

    O primeiro passo do trabalho foi conhecer as pessoas que contraram o vrus. Iam aos hospitais e, naquele momento, quando no havia ainda medicamentos apropriados para o enfrentamento da doena, o quadro era muito difcil, com os pacientes j em estado terminal. A gente fazia um trabalho de acompanhamento e apoio, do hospital ao cemitrio. Procurvamos orientar sobre os diretos aposentadoria e auxlio-doena. Levvamos para fazer exames em Salvador, explica a agente.

    Ao lado desse acompanhamento, as equipes diocesanas, com o apoio do Regional, passaram a atuar na preveno, promovendo encontros orientadores sobre as formas de contgio. amos aos estacionamentos dos caminhes conversar com as meninas que se prostituam, completa DAjuda. O trabalho notabilizou-se, sendo reconhecido por rgos pblicos. Hoje, a atuao pautada pela orientao preveno. Apesar de o acesso e a evoluo do tratamento levarem ao aumento da sobrevida dos portadores do HIV/Aids, no se pode perder o medo e o cuidado, pois ainda se trata de uma doena. Os desafios continuam. Alm do suposto controle, precisamos continuar orientando as pessoas sobre as doenas sexualmente transmissveis, entre elas o HIV/Aids, chama a ateno DAjuda.

    H criaturas como a cana: mesmo postas na moenda, esmagadas de todo, reduzidas a bagao, s sabem dar doura. Dom Helder Cmara

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    Segundo dados de 2012 do governo federal, a cada 5 minutos uma mulher agredida no pas. Em 80% dos casos, o agressor o marido, companheiro ou namorado. Recentemente, o caso de estupro envolvendo uma jovem de 16 anos, abusada por pelo menos 30 homens, no Rio de Janeiro (RJ), ganhou espao na mdia nacional e internacional. A Lei Maria da Penha, de 2006, que prev o aumento de punio contra o agressor e agora foi classificada como crime de tortura, um avano, mas ainda insuficiente para inibir a prtica desses crimes, restando s mulheres cada vez mais se organizarem na luta pelos seus direitos.

    A Critas repudia toda e qualquer forma de violncia e se solidariza com as mulheres em suas lutas, presente na histria do cotidiano feminino. Foi assim nas reivindicaes por direitos sociais, ao voto, divrcio, educao, trabalho, liberdade sexual e mais recentemente contra a violncia que est em um patamar insustentvel e por respeito aos direitos reprodutivos.

    O Regional NE 3, apesar de no ter um projeto direcionado para o trabalho, nunca perdeu de vista essa dimenso. Em todas as suas aes, a questo de gnero um tema presente, na perspectiva do empoderamento das mulheres. E so as prprias mulheres que vo dando a linha de como trabalhar, atravs da atuao concreta em suas comunidades. No semirido, cada vez mais comum encontrar as mulheres frente dos processos de Economia Solidria, quintais produtivos e feiras agroecolgicas, ou seja, em aes que oportunizam gerao de renda e autonomia.

    O trabalho das mulheres da comunidade de Queimada Grande, em 2001, ilustra bem esse crescimento da participao feminina em espaos de deciso. Localizada no municpio baiano de Banza, a comunidade se intitulava Pau Ferro, aps uma remoo devido a um conflito entre ndios

    Coragem e ousadia

    Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. No por vaidade, mas para

    corresponderes obrigao sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor,

    para a construo do mundo.Dom Helder Cmara

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    e posseiros no qual os primeiros buscavam a retomada de suas terras. Os(as) trabalhadores(as) rurais que viviam no povoado permaneceram, resistiram e, aps o reconhecimento e a devoluo da terra para os ndios kiriris, fundaram a comunidade de Queimada Grande, em 13 de setembro de 1997, a 3 km do seu territrio original.

    Aps uma retomada indgena, a comunidade removida ficou abrigada embaixo da lona, sem nenhuma perspectiva. A partir de uma ao de Economia Solidria do Regional NE 3, o trabalho com as mulheres foi sendo construdo. Aos poucos, elas foram se empoderando e perceberam a possibilidade no s de aumentar a renda, atravs do artesanato que produziam, mas de reconstruir a dignidade, de pensar em um projeto de desenvolvimento para aquele novo territrio.

    Dessa provocao surge toda uma forma organizativa, com a conquista de polticas pblicas, com a construo da escola, do posto mdico, da fbrica de beneficiamento de castanha e da sede da associao para produo do artesanato. Hoje essas mulheres esto no mundo passando sua experincia, intercambiando saberes que no se restringem ao crescimento da comunidade, mas tambm construo de novas formas de relacionamento com a famlia, que antes no via com bons olhos a sada das mulheres para participao em encontros e feiras, e hoje entende a importncia desse protagonismo, avalia Ctia Cardoso, Secretria Regional NE 3.

    As conquistas dessas mulheres do conta de um processo de crescimento no s delas, mas tambm da prpria Critas, que contribui e, se alimentando dessas experincias, se transforma tambm. At pouco tempo, no havia muitas mulheres nos espaos de gesto da instituio. Hoje, no entanto, h um contnuo processo de equidade de gnero, com mais mulheres participando de todas as aes.

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    O cuidado com o ser, o sujeito, respeitando sua individualidade e coletividade, bem como a contribuio para as conquistas e garantia dos seus direitos, numa construo coletiva e participativa de todos e todas, marca da metodologia da Critas. E isso se materializou, entre outras aes, no trabalho com crianas e adolescentes, atravs do Programa de Defesa e Promoo dos Direitos da Infncia, Adolescncia e Juventude (PIAJ).

    Em 2003, a Critas Brasileira ampliou o trabalho desenvolvido com crianas e adolescentes incluindo a juventude. A ao saiu da linha das emergncias para a de direitos, passando a partir da a ser o PIAJ. Isso muda significativamente a orientao poltica, que passa a assumir o trabalho com o carter permanente e extensivo a todas as crianas e adolescentes em situao de excluso e vulnerabilidade.

    Diante de tamanho desafio, o trabalho se desenvolveu com os grupos e entidades parceiras nas dioceses. A partir do planejamento, eram promovidas formaes em polticas pblicas, orientando crianas e adolescentes e seus responsveis a ocupar os espaos democrticos, como fruns e conselhos de criana e adolescente. Essas iniciativas ampliavam o poder de deciso e viso de mundo das crianas e adolescentes que integravam o programa, pois a autonomia era um princpio que permeava o trabalho.

    Assim, no s as aes mais locais iam ganhando fora, como tambm as bandeiras estaduais e nacionais, em relao aos direitos de crianas e adolescentes, passaram a entrar na agenda dos grupos.

    A fora dos novos

    Tem pena, Senhor, tem carinho especialcom as pessoas muito lgicas, muito

    prticas, muito realistas, que se irritam com quem cr no cavalinho azul.

    Dom Helder Cmara

  • 17

    Em sua caminhada de 10 anos, o PIAJ acumulou momentos marcantes na vida de todas e todos envolvidos, direta ou indiretamente. Entre eles, destacam-se os encontros regionais que congregavam participantes do Programa da Bahia e Sergipe; o projeto de participao poltica, no qual crianas e adolescentes, entre 7 e 12 anos, estudavam o Estatuto da Criana e do Adolescente (ECA), em especial o artigo 4, indo a campo na sua comunidade para fotografar onde esses direitos estavam garantidos ou violados; a campanha de participao poltica, que reuniu, a partir de um coletivo, candidatos a prefeito para debater e se comprometer com a juventude; concurso em escolas pblicas sobre a temtica da infncia e juventude; e o projeto Tecendo Redes de Enfrentamento ao Trabalho Infantil, com nfase na Explorao Sexual Comercial e do Trfico de Crianas e Adolescentes, com o envolvimento de adolescentes, educadores e educadoras de escola pblica e a rede de proteo criana e ao adolescente.

    Para Darci Moraes, ento assessora do PIAJ, o trabalho contribuiu no s para mobilizao em torno do tema e articulao com diversos setores da sociedade, mas sobretudo para a reflexo crtica das crianas, adolescentes e jovens sobre suas realidades, para a incidncia poltica, e protagonismo das lutas e reivindicaes, comenta.

    Alexsandro Nascimento participou do PIAJ, pertencia ao coletivo Rede de Jovens do Nordeste e lembra com carinho desse tempo. Ele credita boa parte da sua formao poltica aos momentos de formao e participao oportunizados pelo Programa. Eu e outros jovens fomos acolhidos e encontramos nesse espao a possibilidade de fortalecer as nossas reflexes sobre as questes que envolviam a juventude, afirma.

    As aes desenvolvidas pelo PIAJ foram tambm fator de integrao com a comunidade, fortalecendo crianas, jovens e adolescentes a participar das decises e da caminhada da comunidade. Existe uma concepo que permeia alguns adultos em relao autonomia de crianas no que tange ao seu pensar sobre a realidade que vivenciam. Em muitos casos, as crianas so entendidas apenas como adultos em miniatura, ou que basta suprir suas necessidades bsicas. A Critas entende as crianas como sujeitos de direitos. Que pensa como criana, elabora sua realidade como criana e sabe decidir o que quer, afirma Darci Moraes.

    As juventudes tambm so alvos de concepes equivocadas e geralmente responsabilizadas pelos males que ocorrem na sociedade, estereotipadas como acomodadas, irresponsveis. recorrente a afirmao de que a juventude de hoje no quer nada. A Critas discorda completamente dessa afirmao, pois testemunha concretamente articulaes com jovens que sonham e lutam pela construo do bem viver, mas que tambm so vtimas desse sistema capitalista excludente, pontua Amanda Santos, assessora do Regional.

  • Afirmada com a Poltica de Infncia, Adolescncia e Juventude que est em processo de construo, a Critas reconhece as juventudes como sujeitos de direitos que tm faixa etria entre 15 e 29 anos com variadas expresses: polticas, sociais, culturais, religiosas, urbanas, rurais, quilombolas, indgenas, ribeirinhas, entre outras, e se empenha no fortalecimento dessas para a construo de seus projetos de vida e consolidao do projeto popular de uma sociedade justa e solidria.

    No cenrio atual de retrocessos de direitos conquistados e de total desrespeito jovem democracia, importante valorizar o fortalecimento institucional da Critas Brasileira em nvel nacional e tambm no Regional NE 3, no que se refere atuao com juventudes, ocorrido desde 2003, com uma articulao com a Rede de Jovens do Nordeste, Rede de Protagonismo Juvenil, alm das pastorais de juventudes (PJ, PJMP e PJR), Levante Popular da Juventude, Juventude da Teia dos Povos e organizaes que atuam com juventudes na Bahia, como Comunicao Interativa (CIP), Centro de Educao e Cultura Popular (CECUP), Assessoria ao Movimento Popular de Salvador (ISPAC). Isso tem possibilitado processos formativos em polticas pblicas com juventudes; participao na Campanha contra a Violncia e o Extermnio de Jovens; o encontro internacional de juventudes Critas, no qual os jovens de diversos pases, maioria da Amrica Latina, intercambiaram saberes e desafios e politizaram a participao na Jornada Mundial da Juventude com a Tenda das Juventudes; fortalecimento do Grito dos(as) Excludos(as); encontros regionais com as juventudes da Bahia e Sergipe; formao do GT de Juventudes Critas NE 3, animando jovens a se integrar em espaos dentro e fora da Rede Critas, seja no mbito da Economia Solidria, convivncia com o semirido, incidncia em polticas pblicas e rede de comunicadores.

    O cuidado com as relaes tem sido essencial nesse caminho de pedras e flores. Por isso, a juventude continua resistente, com sonhos sendo construdos coletivamente e com a convico de que no se pode pretender construir um futuro melhor sem pensar na crise do meio ambiente e no sofrimento dos(as) excludos(as), como bem provoca o papa Francisco.

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  • Ao longo dos 28 anos de caminhada do Regional NE 3, a Economia Popular Solidria (EPS) vem sendo considerada como um dos pilares estratgicos para a construo social do desenvolvimento sustentvel, solidrio e territorial. Iniciou-se por meio dos Projetos Alternativos Comunitrios (PACs), onde, desde o ano de 1984, serviu-se como gesto concreto s necessidades de sobrevivncia e organizao de grupos e comunidades, sendo instrumento de promoo da justia social, fortalecimento poltico-institucional, valorizao das lutas populares e apoio s iniciativas locais de desenvolvimento comunitrio.

    A Ir. Delires Brun faz memria desses tempos iniciais dos PACs. Ela conta que eram feitas visitas formativas nas dioceses com o objetivo de dialogar e incentivar o processo de fortalecimento institucional da Critas e dar maior visibilidade questo solidria na regio. Eram momentos de marcar presena junto aos grupos de base, entidades e movimentos locais. A minha experincia nesse perodo era acompanhar os PACs com foco nos grupos produtivos, que, mesmo em sua finalizao, eram a forma de enfrentamento pobreza e combate fome, pontua a religiosa.

    Ainda nesse perodo, iniciou-se a avaliao dos PACs. Um dos aspectos apontados nesse processo foi a necessidade de incentivar os grupos beneficirios para uma interao mais efetiva junto aos movimentos sociais, isto , a necessidade de provoc-los para uma participao maior no Grito dos(as) Excludos(as), nas campanhas e reivindicaes dos trabalhadores.

    Com as mudanas, nos anos de 1990, no perfil da cooperao internacional, que apoiava, por meio de dotao de recursos, os fundos de apoio aos PACs, a Critas partiu para um dilogo com a CNBB, motivando o fortalecimento do Fundo Nacional de Solidariedade, como proposta de apoio aos PACs. Mesmo sendo um perodo bastante desgastante, foi possvel ajustar outras formas de apoio aos grupos e assim continuar a solidariedade prpria da Critas, destaca Delires.

    Unindo o cordo

    Quando sonhamos sozinhos, s um sonho; mas quando sonhamos juntos, o incio de uma nova realidade.Dom Helder Cmara

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    O Regional NE 3 notabilizou-se na dinmica de divulgao e circulao e no intercmbio em rede de conhecimentos dos projetos bem-sucedidos, visando articular entidades parceiras, envolver instituies governamentais e influir nas polticas pblicas.

    A partir dessa realidade, aos poucos os PACs foram incorporados linguagem da Economia Popular Solidria tambm em nvel nacional. Foi um perodo rico que favoreceu a articulao e a participao nos Fruns Sociais Mundiais, acentua Delires.

    Essa linha de ao iniciada na poca dos PACs ainda um elemento central da atuao do Regional, principalmente na dinmica de articulao dos movimentos sociais na construo da poltica de Economia Solidria nos estados da Bahia e Sergipe, evidenciado sobretudo no esforo coletivo de entidades de apoio e fomento, empreendimentos econmicos solidrios e poder pblico na criao do Frum Baiano e Sergipano de Economia Solidria, nos anos de 2003 e 2004, respectivamente.

    Outro elemento de destaque por parte do Regional NE 3 est no desenvolvimento de programas e projetos, em articulao com o Estado, em seus diversos mbitos de atuao. Destaca-se ao longo dos anos, uma srie de projetos, entre os quais o Projeto de Segurana Alimentar e Nutricional para Acampamentos e Pr-Assentamentos de Reforma Agrria do Semirido dos estados da Bahia e Sergipe (PSAN), iniciado no ano de 2006 e envolvendo diversos parceiros no mbito dos governos federal e estaduais (Bahia e Sergipe); projetos de fortalecimento de empreendimentos econmicos solidrios, com apoio do Banco do Nordeste do Brasil, realizados nos anos de 2006 e em 2012; Fortalecer as Finanas Solidrias no Estado da Bahia atravs da Consolidao de Metodologias de Constituio de Implementao e Gesto de FRS, construdo a partir de uma parceria da sociedade civil com o governo do estado da Bahia, tendo seu processo de articulao, iniciado no ano de 2009 e sua finalizao no ano de 2015.

    Ao longo dos anos, a Critas Brasileira Regional NE 3 vem cumprindo um papel de articuladora no fortalecimento da poltica pblica de Economia Popular Solidria e dinamizadora da metodologia de Fundos Rotativos Solidrios, sendo essa metodologia de finanas solidrias uma estratgia essencial de fortalecimento de acesso a recursos financeiros e no financeiros, constituindo-se como eixo integrador das polticas pblicas, principalmente aquelas que visam construo de modelo de desenvolvimento calcado na sociedade do bem viver e tendo o empoderamento poltico e econmico dos sujeitos.

  • Com o recrudescimento das polticas de desenvolvimento, tendo maior enfoque no rentismo, partindo da excessiva mercantilizao dos bens coletivos, principalmente a natureza; o enfraquecimento do papel do Estado na implementao de polticas pblicas com gravssimos retrocessos poltico-institucionais, faz-se necessrio a retomada das articulaes dos movimentos sociais, tendo como foco a construo de um modelo de desenvolvimento que permeie a coletividade e a relao harmoniosa com a natureza, reflete Marcos Fabrcio Oliveira, assessor da Critas Regional NE 3.

    Enquanto proposies de aes para o fortalecimento da Economia Popular Solidria como elemento de transformao da realidade, apontam-se a construo de uma poltica pblica permanente, tendo como eixo essencial a construo de um sistema de finanas solidrias que permita acesso ao crdito de forma apropriada com as necessidades dos grupos produtivos; o assessoramento tcnico permanente, considerando a perspectiva dos Centros Pblicos de Economia Solidria (CESOL), focando no respeito aos princpios da Economia Solidria e garantindo acesso ao assessoramento tcnico, de forma contextualizada com as diversas dinmicas territoriais; fortalecimento da comercializao e formao de redes colaborativas, considerando as dinmicas territoriais e as cadeias produtivas, tendo como princpios a solidariedade e as relaes harmoniosas entre todos os participantes da cadeia.

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  • Com um jeito bem particular de ser presente, o Regional NE 3 norteia a sua caminhada fundamentada em espiritualidade ecumnica e de dilogo inter-religioso. No desenvolvimento de suas aes, frente ao mundo de demarcaes religiosas, busca firmar sua identidade reconhecendo e valorizando as diferenas, respeitando a religiosidade, a crena, a cultura e a histria de cada povo. Tudo isso junto com a militncia social so alguns elementos que tornam real e significativo o sentido de ser Critas sempre atenta aos sinais dos tempos e comprometida com a construo do Reino de Deus.

    Ir ao encontro dos irmos e irms e caminhar juntos parte essencial da nossa misso. Esse compromisso se expressa em cada gesto de defesa da vida, frequentemente ameaada e violentada, enfatiza Cleusa Alves, assessora Regional.

    Se incialmente a solidariedade tinha como marca dar o peixe, em uma relao recproca, grupos e entidades foram travando novas formas de exercer a escuta, o apoio, sempre de forma respeitosa, se colocando no lugar do outro, acolhendo e partilhando saberes, de modo a efetivar a busca por dignidade e justia. Temos essa marca da solidariedade, no da promoo social, mas da promoo do discurso do sujeito. As famlias dizem que temos um jeito diferente, uma forma de tratar as questes sociais, um modo particular de lidar com os contedos, uma mobilizao para a solidariedade. Isso uma marca, a nossa identidade, comenta padre Francisco Jos de Almeida, agente da Critas Diocesana de Irec.

    A maneira de ajudar os outros provar-lhes que eles so capazes de pensar.

    Dom Helder Cmara

    Sozinho, isoladoningum capaz

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  • Essa presena solidria no expressa somente no mbito das relaes com as comunidades, mas tambm atravs da cooperao de entidades parceiras, com recursos humanos e materiais, que possibilitam ao Regional desenvolver projetos e aes de apoio aos que mais necessitam. no compromisso comum na luta por justia que realmente vamos construindo juntos esse caminhar em comum: seja na preparao e na execuo do Grito dos(as) Excludos(as) a cada ano; na construo da Campanha da Fraternidade Ecumnica, em especial a de 2016; na luta pelo Rio So Francisco, ressalta Joel Zeferino, pastor na Igreja Batista Nazareth e Presidente da Aliana de Batistas do Brasil.

    A cooperao, o voluntariado, o trabalho conjunto e a solidariedade so uma marca tambm dos agentes Critas, sem os quais o trabalho no seria possvel. So os agentes que levam adiante a misso institucional, motivados pela vivncia da espiritualidade, sentindo Deus em todas as coisas. Ser agente Critas embriagar-se de uma energia que brota do Evangelho, de uma espiritualidade embasada na f, na ressurreio, e inspirada na prtica libertadora de Jesus de Nazar. Com gratido, o Regional registra a alegria de poder contar com uma rede de agentes comprometidos com a misso da instituio e com a construo da sociedade do bem viver.

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  • Eu ainda era um jovem adolescente quando ecoava em todas as rdios e TVs do Brasil essa linda msica, obra coletiva de grandes artistas brasileiros. Lanada em meados dos anos 1980 (1985), a msica era parte de um disco que era o elemento central de uma campanha em prol do povo nordestino, que sofria com o flagelo de mais um perodo longo de estiagem na regio. Exemplos como esse mostram que a solidariedade e a preocupao humanitria sempre foram uma constante quando o assunto eram as secas e a Regio Nordeste, seja na sociedade como todo, seja em setores especficos, ou mesmo instituies.

    O fenmeno climtico de estiagens prolongadas no semirido brasileiro um fator natural que acontece nessa regio h muitos sculos, tendo um territrio que se estende por uma rea que abrange a maior parte dos estados da Regio Nordeste (86,48%), a regio setentrional do estado de Minas Gerais (11,01%) e mesmo com questionamentos tcnicos e cientficos, para muitos, se amplia ao norte do Esprito Santo (2,51%). Possui 1.133 municpios e ocupa uma rea de 974.752 km. o maior e mais populoso do mundo. Com mais de 22,6 milhes de habitantes, representa 11,8% da populao brasileira, sendo 44% desta residente na rea rural, a maior porcentagem do pas.

    Depois da chuva,o sol da manh

    Chega de mgoa... Chega de tanto penarCanto e o nosso canto... Joga no tempo uma semente

    Gente, olha essa gente... Olha essa gente, olha essa genteTe quero gua de beber... Um copo d gua

    Marola mansa da mar... Mulher amadaTe quero terra pra plantar... Te quero verde, hum

    Te quero casa pra morar... Te quero redeDepois da chuva, o sol da manh...

    Luiz Cludio Mandela*

    Outras palavras24

  • Desde o Brasil Imprio que essa regio tem motivado posicionamentos, aes e tambm processos polticos. A clebre frase Venda-se o ltimo brilhante da coroa, contanto que nenhum brasileiro morra de fome!, proferida pelo o Imperador Dom Pedro II, um exemplo histrico e emblemtico. Ainda no perodo do Estado Novo, foi criado o DNOCS, e mais frente, em 1959, o governo, motivado e sensibilizado por uma srie de posicionamentos polticos e tcnicos, especialmente pela carta final do Encontro dos Bispos do Nordeste, realizado em 1956, criou a SUDENE e instituiu fundos federativos para financiar o desenvolvimento da regio.

    No entanto, o grande problema do Nordeste e do semirido nunca foi atacado, pelo contrrio, as aes para promover o desenvolvimento nessa regio sempre foram equivocadamente pautadas no ataque natureza, como inclusive est presente no prprio nome do Departamento Nacional de Obras contra as Secas (DNOCS), e no na promoo da convivncia com essa realidade. Igualmente ao restante do Brasil, o semirido uma regio com alto grau de concentrao da terra, das riquezas, com forte presena do patriarcado, do fisiologismo poltico e da corrupo. Tudo isso se agrava pelo empobrecimento congnito, causado por sculos de explorao das pessoas e dos recursos naturais.

    A presena viva, companheira e proftica da Igreja na regio, tem sido sempre constante e definitiva para esses povos. Exemplos como o do padre Ibiapina, dos conselheiristas, de D. Fragoso, assim como os leigos engajados em suas pastorais, que tm no decorrer da histria reafirmado e construdo junto com os povos sertanejos a dimenso da convivncia com o semirido e da garantia dos direitos.

    A Critas, nos seus quase 60 anos, sempre esteve presente e ativamente em ao e misso nessa terra to sofrida que o semirido. Acompanhando os passos e os processos da sociedade, essa presena se deu ora atravs de campanhas para arrecadar e distribuir alimentos, ora mobilizando e desenvolvendo experincias para buscar autonomia alimentar e hdrica das famlias da regio. Foi durante um perodo de longa estiagem e pensando em mais uma campanha que a Critas, j inspirada em vrias experincias exitosas, props a parceiros da cooperao internacional o Projeto El Nio, uma proposta de trabalhar durante um perodo (dois anos) uma ao piloto de convivncia com o semirido, pautada nas obras hdricas descentralizadas, na educao ambiental e na produo apropriada, principalmente na pecuria de pequenos e mdios animais (caprinos e ovinos).

    A experincia desenvolvida pelo Projeto El Nio foi avaliada muito positiva e produziu acmulos para que a Rede Critas, em seu I Congresso, realizado no ano de 1999 em Fortaleza, no Cear, definisse, aps uma longa reflexo, colocar o tema do semirido como uma das suas prioridades. E, alm disso, criar um programa de aes tendo como horizonte estratgico e metodolgico a convivncia com o semirido, baseado em trs pilares: gua, produo e formao.

    Outras palavras 25

  • J se passaram mais de 15 anos, desde ento, e o PCSA, como chamado at hoje o Programa de Convivncia com o Semirido da Critas Brasileira, vem contribuindo de forma significativa para as transformaes na realidade dessa imensa regio. Com atuao em todos os estados do Nordeste e mais parte de Minas Gerais, o PCSA foi a primeira ao regional pensada para a regio, tendo a convivncia com o Semirido como estratgia de atuao. um orgulho para a Critas ter servido como exemplo e espelho para o que se tornou a maior e mais participativa experincia de poltica pblica no Brasil.

    Os programas de convivncia com o Semirido propostos pela ASA (Articulao no Semirido), alm de executados pela articulao e suas mais de 3 mil instituies, so hoje assumidos e executados por governos estaduais e municipais de todos os estados que compem o territrio. Diferentemente das obras contra a seca, esses programas, conceitualmente e na prtica, so processos de mobilizao social, com forte participao das famlias, das mulheres e tambm de uma juventude cada vez com mais vontade de morar e viver no semirido.

    Nessa caminhada, podemos perceber e confirmar que o semirido no e nunca foi uma regio pobre por natureza, e muito menos est pobre por motivo da falta de chuvas ou mesmo pela sua m distribuio. Para ns, foi construda no decorrer de sculos uma estrutura de pensamento, levando a sociedade brasileira a pensar que o problema da regio a falta de gua, e no a sua democratizao. Da mesma forma, foi concebido o estigma de que o grande inimigo dos povos do semirido o clima em que vivem, e no a concentrao da terra, da renda e riqueza produzida e existente nessa regio. Esse pensamento levou todos, de dentro e de fora do semirido, a achar que esse clima deve ser combatido, pois as possibilidades endgenas de gerao de desenvolvimento para essa regio so nfimas nesse clima e com to grande populao.

    Outras palavras26

  • * Engenheiro Agrnomo e mestre em poltica e desenvolvimento, Diretor Executivo Nacional da Critas Brasileira

    Muitos avanos foram constatados nesses anos, so populaes inteiras de municpios que j tm segurana hdrica para superar os perodos de seca, crianas que crescem estudando de forma contextualizada, aprendendo como viver e conviver com o semirido. No entanto, desafios ainda permanecem, principalmente os relacionados democratizao da terra e da gua, assim como o da consolidao das polticas pblicas que promovam o desenvolvimento da regio.

    O que podemos dizer que uma grande conquista do PCSA e, por conseguinte, da ASA e de suas tantas entidades, a virada desse pensamento, o que o professor e pesquisador Roberto Marinho afirma ser a mudana paradigmtica, na qual o antes ecossistema inspito e impossvel de gerar desenvolvimento passa a ser um espao de possibilidades. Essa mudana de paradigma refletido pelo pesquisador no se justifica e se restringe a apenas a milhares de cisternas implantadas em todo o territrio, ela tem a ver com as modificaes vistas, ouvidas, sentidas por todos os povos de dentro e de fora do semirido. Essas mudanas esto nas msicas, que pararam de falar de tristeza, de mgoa, esto nas imagens que deixaram de retratar a morte, esto na mdia que para de falar e retratar os saques e o xodo, assim como esto nos dados e ndices sociais e econmicos, pois comeamos a ver uma regio que de forma endgena comea a ter uma educao contextualizada, uma produo apropriada e uma cultura da alegria e da vida. Afinal de contas, como diria a poetiza do norte de Minas Gerais: no semirido que a vida pulsa.

    Outras palavras 27

  • Convidado para escrever sobre a contribuio da Critas Regional Nordeste 3 nas experincias da Articulao em Polticas Pblicas (APP) e no Tribunal Popular do Judicirio (TPJ), gostaria de colocar-me na condio de testemunha ocular de um valoroso processo poltico-pedaggico que tem seus fundamentos tericos e prticos no mtodo da educao popular e no jeito prprio de ser, estar e fazer profticos num contexto histrico to complexo e desafiante.

    Do ano de 2002 pra c, meus olhos tm acompanhado o esforo da Critas, em conjunto com outras pastorais e movimentos sociais, num intenso processo de produo e sistematizao de contedos educativos com os objetivos de denunciar as mazelas produzidas pelo modelo de desenvolvimento economicista vigente que tudo transforma em mercadoria e lanar sementes de esperana, democracia direta, solidariedade, justia, paz, acolhida, aconchego, empoderamento, compaixo, mobilizao social.

    Atravs da Articulao em Polticas Pblicas APP, foi possvel perceber uma forte ao socioeducativa de empoderamento de lideranas comunitrias e agentes pastorais sobre os caminhos a serem percorridos para a realizao de uma incidncia eficaz junto ao poder executivo, tendo em vista a transparncia do oramento pblico e a efetivao de direitos e polticas pblicas fundamentais. A campanha Quem no deve no teme tornou-se uma referncia efetiva de controle social e seus ecos foram alm dos limites geogrficos e polticos do regional. Nesse seu fazer trabalho de base, a Critas tornou-se importante ncora de animao e agregao de organizaes sociais em torno desse importante tema.

    O controle social sobre o poder executivo no bastava para avanar na efetivao de direitos e polticas. Era preciso fortalecer e subsidiar as organizaes sociais, potencializar as mobilizaes sociais e incidir sobre um poder judicirio ultraconservador e historicamente alheio s demandas das organizaes e movimentos populares do campo e da cidade.

    Contribuies da Critasnas experincias daAPP e TPJ

    Gilmar Santos*

    Outras palavras28

  • O Tribunal Popular do Judicirio serviu pra denunciar os desmandos e as omisses do judicirio e contribuiu para uma reflexo crtica sobre o papel dessa instituio frente aos direitos civis, polticos e sociais. Lembro-me das vrias reunies de preparao, dos e-mails e das diversas ligaes telefnicas feitas pela Critas para garantir a realizao das atividades do TPJ.

    Sementes lanadas caem em terrenos diversos. Alm de despertar e motivar envolvimento de organizaes sociais e das comunidades sobre esse tema, o TPJ produziu um importante dossi sobre casos emblemticos denunciados pelas comunidades tradicionais (quilombolas, pescadores, indgenas, trabalhadores(as) do campo e da cidade) que foram alvos do descaso do poder judicirio.

    Hoje, 2016, observo que toda onda/reao conservadora do Congresso Nacional, do Judicirio e o golpe de estado contra a democracia so respostas violentas a um perodo de muita ousadia, incidncia poltica, democracia ativa-direta. Perodo de afirmao de identidades: tnico-racial, gnero, orientao sexual, religiosas, juventudes, pessoas com deficincias, formas de convivncia com o semirido, visibilidade das resistncias e lutas dos povos e comunidades tradicionais, experincias de Economia Solidria, etc.

    Vida que segue. A contribuio da Critas junto APP e ao TPJ nos ensina que, mais do que produzir peas crticas e postar nas redes sociais, preciso avaliar profundamente o caminho. Intensificar o trabalho de base. Contribuir mais ainda para a formao poltica do nosso povo. Aglutinar foras. Continuar lanando sementes.

    Sem sombra de dvidas, as sementes que brotaram at aqui so resultado de um intenso processo coletivo de educao popular com a notvel contribuio da Critas Regional NE 3 nos seus 28 anos de servio na Bahia e em Sergipe.

    *Arte-Educador Popular Integrante do Conselho Pastoral dos Pescadores (BA)

    Outras palavras 29

  • A Critas e o Servio Federal de Processamento de Dados (Serpro), empresa pblica vinculada ao Ministrio da Fazenda, j fazem parcerias h uns 8 anos, desde a implantao do 1 telecentro em Ilhus, na Casa de Acolhimento, em 14/11/2008 e, na sequncia, em Queimada Grande, no dia 21/11/2008. Evidentemente que os agentes, parceiros, agregados ou todos que so protagonistas nas aes com a Critas logo desejaram ter telecentros em seus ambientes sociais. E a foram contemplados a Comunidade Quilombola de Paus Altos, no municpio de Antnio Cardoso, a Arquidiocese de Amargosa, no municpio de Iau, o Movimento da Populao de Rua, no Pelourinho, em Salvador, e a Escola de Msica EMARTES, em Serrinha. Ou seja: a Critas solicitava, avalivamos o projeto e invariavelmente aprovvamos a solicitao, por constatar que os solicitantes tinham trabalho social relevante em suas comunidades.

    Para ns do Serpro, uma empresa pblica de informtica, cada telecentro implantado significa a vitria de uma gesto que apostou num projeto dessa magnitude. Antes esses computadores eram vendidos em leiles para a iniciativa privada. Mudar o foco e disponibilizar acesso tecnologia da informao para camadas populares de forma gratuita descaracteriza a ideia individualizante de cada um ter o seu, principalmente para camadas sociais que no se enquadram nesse perfil. Aqui, todos so donos e devem cuidar solidariamente do patrimnio. uma forma diferente de pensar o organismo Estado como elemento provedor.

    Entre solicitar um telecentro e t-lo efetivamente implantado, nos deparamos com desafios e algumas dificuldades. Uma coisa desejar ter, outra reunir condies para ter. A vm as questes de infraestrutura bsica, como espao fsico, mesas, cadeiras apropriadas, rede eltrica e lgica, climatizao, estabilizadores, monitores, etc. Nesse momento, outras parcerias tornam-se necessrias, pois nem sempre a comunidade tem condies de arcar com esses custos. Outro fator importante a necessidade de se ter um projeto definindo claramente o uso desses equipamentos, qual pblico, contedo, horrios de funcionamento, quem vai orientar (monitor), se voluntrio ou

    Jorge Vasconcelos*

    Contribuies da Critas nas experinciascom organizao doEstado

    Outras palavras30

  • com ajuda de custo ou salrio. Cabe registrar que doamos as mquinas, preparamos a monitoria, presencial ou a distncia, e atualmente ajudamos na manuteno dos equipamentos. Oferecemos tambm uma grade de contedos com cursos a distncia e certificao, que so fornecidos pela nossa Universidade Corporativa do Serpro UniSerpro.

    Durante essa trajetria, aprendemos muita coisa com nossos erros e acertos. Do nosso ponto de vista, que envolve a criao de outros telecentros, alm dos feitos com a Critas, ter um projeto bem definido pela comunidade solicitante ajuda a estabelecer a durabilidade de uma experincia como essa. Alguns telecentros esto vivos at hoje, outros j se perderam pelo caminho. As causas so variadas, vai desde quem est gerindo as aes daquela comunidade, pessoa, grupos, etc., passando pela importncia fundamental das monitorias, pelos estmulos que so suscitados nos diversos segmentos que frequentam um telecentro, pelo estabelecimento de aes educativas que deem sentido e vinculao prtica ao cotidiano das pessoas, percebendo os diversos tipos de usurios: os pontuais, os que estudam de forma seriada, os que utilizam o espao pelos infinitos motivos que aqui no cabe elencar.

    Na prtica, o espao vira uma espcie de escola informal, pelas caractersticas do trabalho, para um pblico ecltico, que em tese no teria condies de ter computadores e internet sua disposio para estudar, pesquisar, divertir e "conhecer o mundo". Um telecentro pode potencializar as aes de uma comunidade carente de forma significativa na vida das pessoas. preciso saber us-lo e transform-lo em um projeto de aes afirmativas. Acho interessante que a Critas, enquanto entidade intermediria nas doaes dos equipamentos, at aqui, possa refletir sobre os resultados alcanados. Isso ponto de partida, para uma retomada nessas aes, agora sob uma nova tica do MROSC Marco Regulatrio das Organizaes da Sociedade Civil.

    Outra parceria importante so os Bazares Solidrios nas instalaes do Serpro, o que j uma marca consagrada que, a cada ano, os empregados cobram sua realizao. Vender objetos em um bazar, nesse caso, nessa parceria, no pode ser uma ao apenas mercadolgica, consumista. Tem todo um trabalho anterior e durante o processo de explicao e esclarecimento. O que a Critas? Que aes realiza? Para onde vai o dinheiro arrecadado? Ao passar essas informaes em flderes, cartazes, boca a boca e jornal, estamos ajudando os empregados a fazer uma compra mais consciente e ao mesmo tempo entender como funcionam algumas entidades da sociedade civil, mudar o olhar de colegas para alm das informaes da grande mdia que, muitas vezes, descaracterizam um trabalho srio. Fica legal o raciocnio assim posto: eu compro um item e esse dinheiro servir, por exemplo, para a construo de uma cisterna no semirido. O empregado fica duplamente satisfeito: se beneficia com um preo bom e ajuda uma obra social.

    Da nossa disposio de servir as comunidades carentes, ter um parceiro como a Critas s amplia nosso horizonte de atuao, considerando a capilaridade que o Regional NE 3 tem para os estados da Bahia e Sergipe, nas suas extenses territoriais e no compromisso poltico, filosfico e tico at ento demonstrados.

    *Coordenador Regional PSID Programa Serpro de Incluso Digital

    Outras palavras 31

  • Celebrar a existncia da Critas Nordeste 3 poder comemorar a histria de uma organizao que tem como marcas identitrias a solidariedade, a luta pela construo de uma sociedade justa e igualitria e o compromisso com a transformao social. No estamos falando de algo somente simblico, mas de um conjunto de princpios e diretrizes que se materializam em resultados concretos na vida de milhares de pessoas, sobretudo das mais pobres.

    Atravs da integrao de uma rede de solidariedade, que perpassa os diversos coletivos e pessoas, a Critas contribuiu para semear esperana e promover uma vida digna nos lugares mais necessitados do nosso estado e regio. Seu trabalho voltado para o processo de articulao dos movimentos sociais, pastorais sociais e organizaes da sociedade civil, para o desenvolvimento sustentvel e a luta pela garantia dos direitos humanos, foi fundamental para os avanos que pudemos experimentar nos ltimos anos de forma mais ampla.

    Quando cheguei Bahia na dcada de 1980, junto com um grupo de missionrios, lembro de quanto era forte a atuao da Critas, junto com a CPT e outros organismos que se articulavam em defesa do semirido. Tema alis que se transformou numa das principais bandeiras de luta, sempre denunciando a indstria da seca, pautando a democratizao do acesso gua e colaborando com a implementao de projetos pioneiros de convivncia com o semirido. Um dos exemplos foi o apoio ao municpio de Pintadas, que no ano de 2005 se tornou o primeiro do Nordeste a efetivar 100% de cisternas na zona rural do municpio. Essa conquista foi motivo de comemorao no Festival das guas realizado em dezembro desse mesmo ano com a presena de dezenas de organizaes integrantes da Articulao do Semirido Brasileiro (ASA).

    Sou testemunha da presena da Igreja, especialmente na regio da Diocese de Ruy Barbosa, animando as comunidades e despertando o esprito solidrio do povo na luta pela gua, pela terra,

    Neusa Cadore*

    Critas Nordeste 3: 28 anos semeandovida e promovendocidadania

    Outras palavras32

  • pelo combate fome e violncia. Na formao de grandes lideranas, no incentivo organizao popular, sobretudo da juventude e das mulheres, so importantes as contribuies da Critas e muitos os frutos que se multiplicaram no decorrer dessa trajetria.

    O trabalho de fomento s iniciativas da Economia Popular e Solidria, de Segurana Alimentar e Nutricional, o estmulo aos Fundos Solidrios, a luta em prol dos(as) agricultores(as), acampados(as) e assentados(as) de reforma agrria, das populaes ribeirinhas, das comunidades quilombolas e indgenas, dos povos em situao de riscos e afetadas por desastres socioambientais mostram a pluralidade e a grandeza da sua atuao. Quero ressaltar ainda o apoio educao do campo, atravs das Escolas Famlias Agrcolas, que promovem um modelo de ensino diferenciado com valorizao do homem e da mulher do campo, da proteo e respeito natureza. No que se refere agricultura familiar, destaco o apoio dado ao desenvolvimento de diversas experincias de produo no campo. As inmeras iniciativas, sem dvida, contriburam para a promoo da igualdade social, para o empoderamento das populaes vulnerveis, a auto-organizao e reconhecimento de muitas comunidades.

    Na linha das conquistas estruturantes, quero lembrar da importante participao da Critas junto Plataforma das Organizaes Sociais da Bahia para a aprovao do Marco Regulatrio das Organizaes Sociais. A legislao o reconhecimento da inestimvel contribuio dos movimentos e entidades sociais para o fortalecimento da democracia no pas, esta, alis, que se encontra ameaada pelas foras conservadoras e opressoras que querem usurpar o poder conquistado pelo povo de forma legtima.

    Na atual conjuntura, em que os direitos conquistados duramente pela classe trabalhadora tm sido atacados, preciso destacar tambm os processos de educao popular, a luta da Critas pela democracia participativa e por uma cultura poltica baseada na tica, na transparncia e no respeito. Nesse sentido, insere-se a campanha por eleies limpas e a formao permanente de agentes pblicos para a compreenso da poltica como instrumento para a efetivao dos direitos e a cidadania plena.

    Congratulamo-nos com esta bonita caminhada da Critas ao lado do povo, alimentando a utopia da liberdade e da justia social, apostando num processo educativo e emancipatrio, no dilogo e na tolerncia por um mundo melhor para todos e todas.

    * Deputada Estadual (PT)

    Outras palavras 33

  • Entre na roda coma gente

    Vinte e oito anos de caminhada contribuindo para a participao dos pobres e excludos na construo de um pas justo, democrtico, solidrio e sustentvel. O momento de celebrar, de renovar o compromisso, de ser presena fecunda no meio do povo, de refletir sobre a caminhada e focar nos desafios, que no so poucos, sobretudo diante do estarrecedor cenrio poltico que estamos vivendo, com profunda desorganizao administrativa, poltica, econmica e tica.

    Embora o momento seja de perplexidade, a histria nos mostra que nesse modelo de desenvolvimento perverso e excludente nada nunca foi fcil para as camadas mais empobrecidas da sociedade. Ento, sigamos na luta, regozijando as conquistas obtidas, denunciando as injustias e anunciando a esperana.

    Assim, com esperana que nos debruamos sobre a realidade, enfrentando os desafios. A comear, com uma reflexo da nossa ao pastoral de conjunto, entendendo a sua complexidade e a beleza de sua riqueza, investindo no dilogo com as diferentes dimenses do projeto de Jesus Cristo, de forma a contribuir com mais elementos de comunho, que nos fortalea como ao da Igreja.

    Olhando para fora das aes pastorais, tempo de investir ainda mais na colaborao para a consolidao da democracia, atravs da construo de um projeto popular para o Brasil. J nascemos com esse compromisso e no podemos perd-lo de vista. Esse processo no vai acontecer de uma hora para outra. Demanda tempo, mas tem que ser iniciado com brevidade.

    Quando os problemas se tornam absurdos, os desafios se tornam apaixonantes.

    Dom Helder Cmara

    34

  • Do ponto de vista da Rede, a provocao que est posta a renovao. Como nos atualizamos enquanto Rede? Como trazer novos agentes para a roda? Como encantar os jovens para esse jeito de ser Igreja? O protagonismo da juventude a chave. No esquecendo tambm a presena do voluntariado, priorizando a sua qualificao, tanto tcnica quanto da nossa mstica e espiritualidade, dedicando o tempo necessrio para a reflexo, para o exerccio do raciocnio crtico.

    Nessas quase trs dcadas, as inquietaes tm mais fora que as certezas. Que possamos ter sabedoria para aprofund-las, e assim continuar a nossa trajetria junto com a chegada de novos atores sociais, unidos na construo do Reino, aqui na Terra.

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  • Rede Critas Regional Nordeste 3Associao Escolas Comunidades Famlias Agrcolas da Bahia AECOFABA

    Av. do Agricultor, s/n Stio So Flix46470-970 Riacho de Santana (BA)Telefone: +55 (77) [email protected]

    Critas Arquidiocesana de Feira de Santana

    Av. Getlio Vargas, 39444025-010 Feira de Santana (BA)Telefone: +55 (75) [email protected]

    Critas Diocesana de Paulo Afonso

    Avenida Getlio Vargas, 614 Centro 48601- 000 Paulo Afonso (BA)Telefone: +55 (75) [email protected]

    Critas Diocesana de Propri

    Travessa Municipal, 117 Centro 49900-000 Propri (SE)Telefone: +55 (79) [email protected]

    Critas Diocesana de Serrinha

    Rua Emiliano Santigo, 291 Centro48700-000 Serrinha (BA)Telefone: +55 (75) [email protected]

    Critas Arquidiocesana de Vitria da Conquista

    Parquia Nossa Senhora das Candeias Av. Franklin Ferraz, 179 45028-185 Vitria da Conquista (BA)Telefone: +55 (77) [email protected]

    Critas Diocesana de Ruy Barbosa

    Rua Antnio Novais Centro46800-000 Ruy Barbosa (BA)Telefone: +55 (75) 3252-2605 /[email protected]

    Critas Diocesana de Irec

    Rua Noel Nuts, 28 44900-000 Irec (BA)Telefone: +55 (74) [email protected]

    Critas Diocesana de Ilhus

    Rua Dom Tepe, 21 Cria Diocesana45653-230 Ilhus (BA)Telefone: +55 (73) [email protected]

    Critas Diocesana de Amargosa

    Av. Lomanto Jnior, 11 Centro45300-000 Amargosa (BA)Telefone: +55 (75) [email protected]

    Critas Arquidiocesana de Aracaju

    Praa Olmpio Campos, 22849010-040 Aracaju (SE)Telefone: +55 (79) [email protected]

    Critas Diocesana de Barreiras

    Rua 26 de maio, 427 47805-090 Barreiras (BA)Telefone: +55 (77) [email protected]

    Critas Diocesana de Caetit

    Centro Paroquial Nossa Senhora SantanaRua Baro de Caetit, 316, Sala 09 Centro46400-000 Caetit (BA)Telefone: +55 (77) [email protected]

    Critas Diocesana de Alagoinhas

    Praa Antnio Conselheiro, 640 Centro48480-000 Crispolis (BA)Telefone: +55 (75) [email protected]

    Critas Diocesana de Eunpolis

    Praa Frei Calisto, s/n Centro45820-430 Eunpolis (BA)Telefone: +55 (73) [email protected]

    Critas Diocesana de Estncia

    Rua Dr. Vicente Portela, 41 49200-970 Estncia (SE)Telefone: +55 (79) [email protected]

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