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O texto de Dulce Pandolfi nos traz um esclarecimento fundamental, o de que 1937, com a implantação da ditadura do "Estado Novo", não foi um desdobramento natural da chamada Revolução de 1930, mostrando assim que houveram inúmeras disputas políticas entre os mais variados grupos pertencentes a Aliança Liberal, além dos grupos derrotados em 1930, que não apresentavam uma única proposta de país. Sendo assim, a autora percorre a trajetória dos diversos atores-grupos políticos e suas ideias sobre os rumos que o Brasil deveria trilhar. Com isso Dulce Pandolfi nos coloca que, se houve algumas continuidades entre esse período (1930-1937), houve também inúmeras rupturas.
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Os anos 30: as incertezas do regime (Dulce Chaves Pandolfi)
A autora do texto aponta para as ambiguidades do período entre 1930 e
1937, discordando do discurso oficial que coloca o Estado Novo como uma
continuidade legítima da “Revolução” de 1930. Na visão da autora o período de
1930 à 1937 foi marcado por muitas incertezas (tal como a autora expõe
explicitamente no título do texto) e rupturas, visto que aqueles que participaram
e lutaram em 1930 não traziam consigo um único projeto de Estado para o
Brasil, havendo divergências quanto aos rumos que seriam tomados para o
país devido a heterogeneidade de interesses e projetos políticos dos grupos
participantes da Aliança Liberal (Coligação partidária de oposição que lançou a
candidatura de Vargas em 1929) . Tal como a autora coloca, se houve algumas
continuidades entre esses dois momentos (visto que o projeto varguista foi o
que prevaleceu, mas não sem tensões) houve também rupturas.
Dulce Pandolfi aponta que entre 1930 e 1937 com o Estado Novo, houve
um período de efervescência e disputa política, está sendo causado pela
diversidade de projetos em conflito dentro da própria Aliança Liberal, além da
reação daqueles que foram derrubados em 1930. A Aliança Liberal
comportava, em sua diversidade, grupos que realmente eram opositores ao
regime vigente (daquilo que depois se convencionou chamar de Primeira
República, e que com o advento do “Estado Novo”, foi denominado de
República “Velha”), e outros que apenas desgostaram do encaminhamento
dado por Washington Luís (presidente do Brasil antes de 1930) sobre a
sucessão presidencial. Compunha esse grupo também os chamados “oligarcas
dissidentes”, sendo ex-presidentes, governadores ou ex-governadores de
estados, esses que em geral se contrapuseram às medidas adotadas pelo
então Presidente Washington Luís, não buscando uma real mudança das
estruturas da República fundada em 1889. Os tenentes também marcaram
presença nesse grupo, este que deste à década de 1920 tentavam derrubar o
regime que se iniciou em 1889.
Apesar da sua heterogeneidade, a Aliança Liberal tinha seu ideário
voltado para questões de justiça social e liberdade política. Defendiam a
reforma do sistema político, incluindo em sua pauta de propostas a adoção do
voto secreto, o fim das fraudes que ocorriam com grande freqüência nas
eleições, além de pregarem a anistia para os políticos que eram perseguidos.
No campo social defendiam direitos sociais como: jornada de oito horas de
trabalho; férias; salário mínimo; regulamentação do trabalho feminino e infantil.
No campo econômico queriam a diversificação dos produtos para além do café
(que era um dos principais ou o principal produto de exportação da época,
lembrando que nesse mesmo período [1929] houve a Grande Depressão ou
Crise de 1929, que acarretou problemas para a venda do café produzido no
Brasil, causando enorme prejuízo), além disso, visavam corrigir as disparidades
econômicas regionais.
Nas eleições de 1930, Vargas, candidato pela Aliança Liberal, foi
derrotado. Posteriormente à derrota nas eleições houve aliancistas que
aceitaram, mas houve quem não admitira a derrota, esses que preparam o
movimento que depois ficaria conhecido com Revolução de 1930. Os tenentes
foram fundamentais nesse movimento junto a alguns grupos de políticos civis.
No movimento houve apoio também dos chamados “tenentes civis”, esses que
embora não fossem membros do Exército, compartilhavam de seus ideais.
Mesmo militares legalistas, que combateram os tenentes durante a década
anterior, aderiram e participaram do movimento de 1930.
Em outubro de 1930 eclodiu o movimento revolucionário. Vitorioso, em
novembro, Getúlio Vargas assumiu a presidência do Brasil sob um Governo
Provisório (este que não tinha uma previsão sobre o tempo de sua duração).
Após a posse de Vargas o Congresso Nacional, as assembléias estaduais e
municipais foram fechadas, governadores foram destituídos de seus cargos e a
Constituição de 1891 revogada. Com isso Vargas governa o país através de
decretos-leis. (Tais medidas sem dúvida alguma são de caráter autoritário).
Após a entrada de um novo governo, houve divergências sobre a
duração do Governo Provisório, havendo aqueles que desejavam uma rápida
volta à democracia, e aqueles que pensavam primeiro serem realizadas as
reformas sociais no país para depois se voltar a uma ordem democrática (é
preciso ressaltar que o modelo liberal-democrático entrou em descrédito para
muitos países, principalmente pós-crise de 1929, sendo visto como um modelo
falho e limitado para esse grupo que era contra o retorno da democracia). Os
tenentes e seus aliados civis colocavam que era preciso desmantelar os
alicerces do poder oligárquico, e para tanto era preciso dar continuidade ao
movimento revolucionário iniciado em 1930, visto que só o movimento por si só
não foi suficiente para gerar uma mudança radical, ou seja, não era o momento
de se voltar a um regime democrático para esses.
Passou então haver disputas sobre o modelo de Estado a ser
implantado: se mais centralizador de cunho nacionalista-reformista e
apartidário (tenentes), ou se um Estado de vertente liberal que possibilite maior
autonomia para os estados da federação ("oligarcas dissidentes"), restringindo
o poder da União.
Para os estados do Norte e do Nordeste, a medida centralizadora lhes
era mais favorável, visto que no modelo federativo descentralizado eles tinham
pouco espaço no jogo político, que durante quase toda a primeira República
ficou a controle dos estados do Centro-Sul, em especial Minas Gerais e São
Paulo. Sendo assim a proposta dos tenentes era mais plausível de apoio para
os estados do Norte-Nordeste, na busca de conseguirem maior espaço de
atuação no campo político.
As primeiras medidas tomadas pelo Governo Provisório foram de caráter
centralizador e intervencionistas, tendo como base reivindicações tenentistas.
Uma das principais medidas do governo foi à criação do Sistema de
Interventorias, que de forma quase generalizada, num primeiro momento,
colocou um interventor tenentista no comando dos estados, estes nomeados
pelo próprio Vargas. Tal medida causou descontentamento das elites locais
que antes ali controlavam o cenário político.
Nos estados do Centro-Sul, por exemplo, houve crises políticas devido à
falta de ligação entre os interventores e as forças políticas locais (este que
eram contra a centralização do governo, sendo adeptos do modelo liberal e do
federalismo que lhes garantia maior autonomia). O resultado dessas crises era
frequentemente a substituição do interventor como forma de acalmar os ânimos
das forças políticas locais, com oscilações entre os períodos de permanência
no cargo em cada um dos estados. Ou seja, alguns permaneceram por mais
tempo, outros menos.
Mesmo fazendo concessões às elites políticas locais, Vargas não deixou
de adotar medidas centralizadoras, limitando a autonomia dos estados. O
Código dos Interventores é um exemplo das medidas centralizadoras de seu
governo, visto que os estados não poderiam adquirir empréstimos externos
sem a aprovação do governo central; o mesmo vale para o controle sobre o
contingente da polícia militar nos estados, para que não fossem superiores ao
do Exército Nacional. A nacionalização das Forças Armadas era fundamental
para o modelo de governo que Vargas propunha, visando assim diminuir a
força das oligarquias regionais.
Na esfera social, ainda sob o Governo Provisório foram criados o
Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, Ministério da Educação e Saúde
Pública. Com exceção do salário mínimo, durante o governo Provisório foram
promulgados vários decretos e leis de proteção ao trabalhador, como: jornada
de 8 horas de trabalho; regulamentação do trabalho da mulher e infantil; lei de
férias; carteira de trabalho; direito de pensões e aposentarias. Essas leis
depois (em 1943, já sob o Estado Novo) fariam parte da CLT (Consolidação
das Leis do Trabalho). (É importante lembrar que o fato de Vargas criar esses
decretos leis não significa que ele, Vargas, todo benevolente concedeu direitos
aos trabalhadores, é necessário lembrar que tais direitos estiveram sempre em
pauta nas lutas trabalhistas anteriores à 1930, ou seja, já era existente uma
tradição lutas por parte dos trabalhadores para conseguirem direitos
trabalhistas. Evidentemente, que Vargas teve importância ao conseguir por em
leis tais reivindicações, pois foi quem soube ser um político perspicaz e atuar
em cima destas demandas (ou melhor, parte delas). Porém é preciso ressaltar
que as leis foram restritivas, visto que tudo isso estava a cargo de um Estado
corporativista que exercia enorme controle sobre os sindicatos dos
trabalhadores (sindicato único por categoria profissional), e que tais leis só
seriam validas para os trabalhadores urbanos sindicalizados (leve em
consideração que o número de pessoas que poderiam se sindicalizar era
limitado, sendo um sistema excludente, além de compulsório, obrigando o
trabalhador a se sindicalizar, já que só os sindicalizados estariam amparados
pelas leis trabalhistas), cuja profissão fosse reconhecida como uma pelo
Ministério do Trabalho. Assim, no que tange à questão social podemos concluir
que houve alguns avanços, mas que estes ainda eram tímidos, visto que a
maior parte da população à época (população do campo) era excluída dos
benefícios das leis trabalhistas).
Num primeiro momento, empregadores e empregados discordaram da
política trabalhista de Vargas, na qual os sindicatos, tanto o dos trabalhadores
quanto o dos empresários, ficavam sobre o controle do governo. Porém, essa
resistência imediata foi diminuindo, e aos poucos os comunistas e anarquistas,
principalmente, foram sendo afastados das lideranças sindicais, formando-se
novas lideranças, estas que eram mais próximos e coniventes com o modelo
corporativista de sindicato que o governo propunha. Os empregadores,
empresários, que num primeiro momento discordaram, pois teriam que cumprir
as leis trabalhistas, passaram a ver essa intervenção nos sindicatos com outro
olhar, visto que com a atuação do Estado no controle dos sindicatos, este (o
Estado) conteria o movimento operário e suas lutas (o que não significa dizer
que todas as reivindicações desse movimento e suas tentativas de atuação
deixaram de existir).
Na economia o governo também tomou medidas centralizadoras, como
no caso do controle sobre a produção e comercialização de produtos agrícolas
brasileiros. O governo tirou do estado de São Paulo o controle absoluto sobre a
política cafeeira com a criação do Conselho Nacional do Café. Além disso, o
governo Vargas criou outros órgãos para controlar as atividades econômicas
de outras atividades produtivas, como o álcool e o açúcar. Como a autora
coloca, os anos 30 é um momento importante para o rumo da economia
brasileira do processo de industrialização do país.
Com a execução dessas medidas intervencionistas e centralizadoras, os
setores oligárquicos e mesmo os “oligarcas dissidentes” mostravam grande
insatisfação com os rumos da Revolução de 1930. Os tenentes, “temerosos
com a força das oligarquias regionais” (p.21), se organizaram para buscar
apoio popular às propostas do Governo Provisório.
Para se contrapor ao avanço do tenentismo, as oligarquias que outrora
havia se cindindo, tornaram a se rearticular, exigindo o fim do Governo
Provisório. Em São Paulo, principal foco de descontentamento com o Governo
Vargas, o Partido Republicano Paulista e o seu opositor, o Partido
Democrático, (que fora vitorioso em 1930) se aliaram formando a Frente Única
Paulista junto às associações de classe do comércio, da indústria e da lavoura.
No Rio Grande do Sul e em Minas Gerais (mas claro, não era um consenso
entre todo o estado se voltar contra o governo federal) também houve aqueles
que queriam o fim do Governo Provisório e a criação de uma nova
Constituição.
As Forças Armadas durante o período 1930 à 1934 passou por
constantes crises, com ocorrência de revoltas, conspirações, protestos. Essas
crises e cisões dentro das Forças Armadas têm forte motivo na insatisfação da
alta oficialidade em relação ao fortalecimento do tenentismo. A Revolução de
1930, na verdade, não contou com um amplo apoio e participação dos militares
da alta oficialidade, sendo apenas uma parcela que apoiara o movimento
revolucionário (segmentos inferiores). A alta oficialidade teve de suportar ver a
anistia dos tenentes revoltosos da década anterior, e ainda vê-los ocupando
postos-chave no governo. Para o alto escalão isso era quebra de hierarquia,
elemento esse muito prezado dentro da instituição, acirrando as tensões entre
a baixa e a alta oficialidade já existentes anteriormente. Vargas ainda tenta
amenizar a situação concedendo postos importantes à aqueles que viam com
maus olhos o poder que ganhara os tenentes, mas isso não impediu que se
insurgissem contra o governo, se juntando com grupos civis para lutar pela
reconstitucionalização do país.
A autora destaca que o primeiro semestre de 1932 foi de intensas
agitações e crises em âmbito civil e militar. Nesse momento de conturbação, o
governo pressionado edita o Código Eleitoral, esse que atendia a diversos
interesses da Aliança Liberal. Esse código apresentou as seguintes medidas:
criação da Justiça Eleitoral; adoção do sufrágio universal, direto e secreto
(diferentemente do sistema utilizado na Primeira República); as mulheres
adquiriram cidadania política com direito a voto e representação, mas podendo
exercê-lo somente após 21 anos de idade (lembrando, o direito de voto das
mulheres vem de reivindicações e lutas destas). Ainda que tivesse havido
alguns avanços, estavam excluídos de seus direitos políticos e do processo
eleitoral os analfabetos, os praças (soldados de baixo escalão na hierarquia
militar) e os religiosos de ordem monástica.
O Código Eleitoral, atendendo a uma reivindicação tenentista, criou a
representação classista (que estaria presente e participando da futura
Assembléia Constituinte junto aos parlamentares eleitos pelo voto direto dos
eleitores), sendo os representantes escolhidos por eleição indireta através dos
votos dos delegados escolhidos pelos sindicatos dos trabalhadores, dos
empresários, representastes dos profissionais liberais e de funcionários
públicos. Tal medida visava enfraquecer o poder dos setores oligárquicos, para
que estes não tivessem forças durante a futura Assembléia Constituinte.
Após a criação do Colégio Eleitoral houve constantes crises tanto em
âmbito civil e militar, que desembocaria em julho em São Paulo na
posteriormente conhecida Revolução Constitucionalista de 1932. “São Paulo se
sentia o grande perdedor da Revolução de 30. Insatisfeitos com a política
centralizadora de Vargas e com a lentidão das medidas que restaurariam o
Estado de direito, os paulistas, em armas, exigiam o fim imediato do regime
ditatorial e maior autonomia para São Paulo. Era de tal ordem a insatisfação no
estado que a população, em massa, aderiu à revolução” (p.25). “São Paulo não
recebeu apoio oficial de nenhum governo estadual, mas conseguiu adesões de
expressivas lideranças, sobretudo gaúchas e mineiras” (p.25). Após 3 meses
de batalha, São Paulo foi encurralado pelo Governo Federal, os levando à
rendição. Com isso, os lideres do movimento constitucionalista foram presos e
tiveram seus direitos políticos suspensos por 3 anos, além de muitos terem
sido exilados. Mesmo com a derrota do movimento, São Paulo teve ganhos
políticos, como a substituição do antigo interventor por um interventor civil e
paulista. Além disso, o movimento teve importância para o Governo Provisório
“levar adiante o processo de reconstitucionalização do país” (p.26).
A Revolução Constitucionalista foi importante para o governo fazer uma
limpa em âmbito civil e militar, afastando as forças contrárias ao governo para
longe do processo político. Após a Revolução, o governo se viu na tarefa de
reestruturar as Forças Armadas, sendo a ação revolucionária a ocasião perfeita
para o governo ter os motivos para eliminar os generais (que participaram da
revolução enquanto oposição ao governo federal) nomeados anteriormente à
1930, e ainda nomear novos generais afinados com o governo Vargas.
A autora destaca que a reconstituicionalização do país era uma derrota
para o tenentismo e seus aliados civis. Diante de tal situação, basicamente
inevitável da elaboração de uma nova constituição para o país, houve variadas
posturas assumidas por esse grupo, como: tentativa rearticulação das
agremiações partidárias e participação no processo eleitoral como alistados;
postura de neutralidade e distanciamento diante das eleições; adentrando em
movimentos contestatórios do atual regime, como o dos comunistas e dos
integralistas, por considerarem que a Revolução de 1930 se desvirtuou; haviam
aqueles ainda que “defendiam a necessidade de uma ditadura militar”. (p.27).
Sem partidos de caráter nacional, os tenentes se empenharam em
conseguir formá-lo, porém sem sucesso. O que se formou foi diversos partidos
em âmbitos estadual articulados pelos interventores. Esses partidos eram
provisórios, atuando somente em períodos de eleições. Além disso, era
permitido candidaturas avulsas, sem que o elegível fosse membro de algum
partido. A igreja se mobilizou em defesa de sua doutrina social e também as
mulheres tiveram participação.
Os situacionistas, os que eram apoiados pelos interventores, se saíram
melhor nas eleições. Com os eleitos no parlamento e mais a representação
classista foi realizada a Assembléia Constituinte em 1933, sendo no ano
seguinte, em 16 de julho de 1934, promulgada a nova Constituição. Vargas foi
eleito indiretamente pelos constituintes como Presidente da República, mas
para tal teve de fazer uma série de concessões. Durante os trabalhos da
constituinte houve tentativa de grupos militares para depor Vargas e formar um
governo sob o comando de um grupo de generais. Era também tarefa da
Assembléia Constituinte aprovar as ações exercidas durante o Governo
Provisório, que contou com pouco mais de 50% de aprovação, demonstrando a
insatisfação com o governo no país.
A autora coloca que a Constituição de 1934 foi inovadora em muitos
aspectos, atendendo os anseios liberais democráticos que se encontravam
presentes na Revolução de 1930, como: Estado mais liberal e menos
centralizador; limitação da autonomia financeira dos estados, mas com o
regime federativo assegurado; intervencionismo do Estado em assuntos
econômicos e sociais; fortalecimento do Estado, e não do Executivo;
predomínio do Legislativo e controle do Executivo; representação classista;
direito de voto aos homens e mulheres maiores de 18 anos (mas isso não inclui
os analfabetos); consagração dos direitos sociais; As eleições seguintes (1938)
para presidente, governador e prefeito passariam a ser diretas; mandato de
quatro anos sem direito a reeleição, ou seja, Vargas não poderia ser reeleito.
Nas palavras da autora, “Vargas não escondeu o descontentamento com
a nova Constituição” (p.29), fazendo críticas as limitações que ela punha,
principalmente sobre ele (poder executivo). Vargas então diz: “Serei o primeiro
revisor da Constituição”. (p.29;30). Não durou muito tempo e de fato a
Constituição de 1934 fora derrubada em 1937 por um Golpe de Estado.
Terminados os trabalhos sobre a nova Constituição, Vargas reformulou
seu ministério. Nesta reforma os tenentes ficaram em segundo plano, e Vargas
distribuiu as pastas ministeriais para os estados que estiveram ao seu lado na
Constituinte. O presidente para se fortalecer e enfraquecer as oligarquias
regionais buscou apoio na área militar, e para tal teria de atuar em favor da
política do Exercito, com respeito a hierarquia e a disciplina, buscando a
unificação e fortalecimento da instituição para que essa somasse forças ao
governo federal. Porém esse projeto era pouco viável, porque os punidos em
1932 foram anistiados e recebidos com grande apoio popular, o que era um
mau sinal para o governo Vargas que os havia punido anteriormente. As
eleições (que foram conflituosas) realizadas em 1934 para o Congresso
Nacional e assembléias estaduais, e com grandes derrotas para os
interventores que lá estavam, tendo-se a volta das forças políticas que caíram
em 1930.
Com a volta da ordem legal, movimentos sociais exerceram forte
participação política, com a eclosão de greves, radicalizando o processo
político. Nesse contexto de agitação, duas organizações não-partidárias se
tornaram bastante expressivas: a AIB (Ação Integralista Brasileira), surgida em
1932, que tinha influências do modelo europeu fascista da Itália de extrema
direita, eram nacionalistas e moralistas, tendo maior adesão entre militares e
católicos conservadores, se aliando ao governo Vargas no combate ao
comunismo (isso até 1938, quando a alta patente da organização tentou
golpear Vargas, mas sem sucesso, levando ao fechamento do desta e prisão
de seu líder, Plínio Salgado); e a ANL (Aliança Nacional Libertadora), surgida
em 1935, que formava uma frente única (embora não homogênea) contra o
governo autoritário de Vargas e o imperialismo, tendo em sua organização:
comunistas, socialistas e liberais, além de lideranças civis e militares (inclusive
tenentes, o que é em certa medida explicável pela nova postura de Vargas em
relação aos tenentes, que foram preteridos em relação aos militares mais
graduados) que romperam com o segmento dado à revolução de 1930, tendo
como liderança o ex-tenente e líder comunista Luís Carlos Prestes. Essas duas
organizações possuíam núcleos por várias cidades do país.
A ANL logo cedo foi colocada na ilegalidade. A autora aponta que
mesmo na clandestinidade o grupo se organizava para derrubar pelas armas e
com apoio popular o governo Vargas, fazendo de Luís Carlos Prestes o novo
líder da nação. Em novembro de 1935, houve levantes militares em algumas
regiões (no Recife, em Natal e no Rio de Janeiro, com um pouco mais de
expressividade), e com isso esperavam que o operariado contribuísse com o
desencadeamento de uma sucessão de greves por todo o país, o que não
ocorreu, sendo a rebelião violentamente reprimida e derrotada. (A esse
movimento o governo chamou de “Intentona Comunista”, que seria um
movimento organizado pelos comunistas para fazer uma revolução socialista
sob as ordens de Moscou. Porém tal leitura dos acontecimentos já foi
questionada e desconstruída pela historiografia mais recente, que aponta o
movimento como de caráter tenentista, embora tenha havido sim a participação
de comunistas no movimento).
“Depois da rebelião, uma forte repressão se abateu não só contra os
comunistas, mas contra todos os considerados opositores do regime” (p.32),
havendo inúmeras prisões em todo o país, inclusive de políticos, expulsão de
inúmeros soldados subalternos do Exército e a prisão de Luís Carlos Prestes.
“A despeito do fracasso, a chamada “revolta comunista” (grifos meus) serviu
de forte pretexto para o fechamento do regime. A partir de novembro de 1935,
o Congresso passou a aprovar uma série de medidas que cerceavam seu
próprio poder, enquanto o Executivo ganhava poderes de repressão
praticamente ilimitados. (...) Mesmo antes da “revolta comunista” (grifos
meus), em abril de 1935, sob o impacto das várias greves que vinham
ocorrendo, o Congresso aprovou a Lei de Segurança Nacional, suprimindo
diversas franquias democráticas presentes na Constituição de 1934. A lei
previa a censura aos meios de comunicação e prisão de um a dez anos para
aqueles que estimulassem ou promovessem manifestações de indisciplina nas
Forças Armadas ou greves nos serviços públicos. As entidades sindicais
consideradas suspeitas poderiam ser fechadas” (p.33). Vargas tinha a intenção
de limpar o setor público da “ameaça comunista”. Para tal o Estado funcionava
como uma rede de vigilância e repressão da população. Assim têm-se, após a
insurreição de 1935, a legalização da repressão ao comunismo e aos
opositores do regime.
Mesmo Vargas tendo todo esse poder concedido via aprovação do
congresso, ele não conseguiu que aprovassem a prorrogação de seu mandato.
Os principais governadores (com exceção de Minas Gerais) foram contra a
prorrogação, se afastando definitivamente do governo central.
Mesmo dentro de um contexto de repressão estatal, a movimentação a
respeito sucessão presidencial foi destaque na cena política. Em 1937, o
Congresso negava o pedido de manutenção do estado de guerra que vigorava
desde o ano anterior. Porém, poucos meses depois, o estado de guerra e a
suspensão das garantias constitucionais voltaram, tendo prazo de 90 dias. A
ocorrência se deu pelo seguinte “fato”: “no dia 30 de setembro, o governo,
através da imprensa, divulgou um documento, o "Plano Cohen", relatando a
preparação de uma insurreição comunista no Brasil. Tratava-se de uma peça
de ficção, mas ela serviu aos seus objetivos. Os setores oposicionistas, que
eram minoria no Congresso Nacional, questionaram o novo pedido de
decretação do estado de guerra. Contestavam as evidências de que realmente
houvesse uma ameaça subversiva, associando o novo pedido a uma tentativa
do governo de impedir a realização das eleições presidenciais. Mesmo aqueles
que eram totalmente contra o continuísmo de Vargas, deram seu voto positivo
ao estado de guerra. Assim, por mais que o Congresso não gostasse da idéia
de se instalar o estado de guerra, havia em primeiro lugar: o medo do
comunismo, que era tido (e ainda hoje o é por parcela da população) como o
fantasma da sociedade ocidental; e em segundo lugar, a possibilidade de uma
intervenção militar, duas situações não quistas por eles. Com isso abrindo
espaço para as pretensões golpistas de Vargas, que quase não sofreram
resistências.
Vargas agora precisava de apoio para empreender seu plano. Com
exceção da Bahia e de Pernambuco, Vargas obteve apoio dos estados do
Norte e Nordeste. Em São Paulo havia grupos divergentes: aqueles que eram
contrários as manobras continuístas do governo (ligados a Armando Sales, que
sairia candidato a presidência); e os que estavam se alinhando com o governo
federal, coniventes com a troca do regime (Cardoso de Melo Neto, governador
de São Paulo à época).
Em novembro de 1937, o Congresso Nacional é fechado e muda-se o
regime. Eis que surge o “Estado Novo” sob a liderança de Getúlio Vargas.
“Parte expressiva dos aliados de 1930 estava marginalizada do poder. O
afastamento dos aliados civis e militares foi se dando de forma lenta e gradual”.
Com isso a autora conclui reafirmando suas considerações iniciais
depois de toda a explanação dos vários interesses e projetos políticos em
disputas, mostrando as descontinuidades existentes entre os períodos de 1930
e 1937. No dizer dela: “Sem dúvida, a ação de Vargas, no sentido de garantir
bases de sustentação para o golpe, teve sucesso. Entretanto, o Estado Novo
esteve longe de ser um desdobramento natural da Revolução de 30. Foi um
dos resultados possíveis das lutas e enfrentamentos diversos travados durante
a incerta e tumultuada década de 1930.” (p.35).
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