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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO POR DANO ESTÉTICO EM CIRURGIA PLÁSTICA
CARLOS VINICIUS PRIESS
Itajaí (SC), junho de 2008.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO POR DANO ESTÉTICO EM CIRURGIA PLÁSTICA
CARLOS VINICIUS PRIESS
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor MSc. Jefferson Custódio Próspero
Itajaí (SC), junho de 2008.
AGRADECIMENTO
Primeiramente a Deus, por ter sido amigo fiel em
todas as horas;
A minha mãe Rosane, pelo incentivo nesta
trajetória de minha vida;
A minha irmã Caroline, pela compreensão;
Ao meu pai, pela colaboração nos momentos
mais necessários;
A minha namorada Carolina, pelo carinho, amor e
dedicação e por se uma pessoa tão formidável;
Ao meu orientador Prof. Jefferson Custódio
Próspero, que me acolheu com paciência e
dedicação;
Aos valiosos amigos que encontrei nestes cinco
anos de Universidade;
E, especialmente, aos meus preciosos e queridos
avós;
Pessoas importantes da minha vida que eu
guardo dentro do meu coração, para sempre...
DEDICATÓRIA
À uma pessoa, lutadora, guerreira e determinada!
Pessoa esta que acorda todos os dias com a vontade e a
responsabilidade de vencer!
Pessoa esta que procuro me espelhar, pois sua força de
vontade me motiva!
Deu-me a vida com sua excelência e amor, carinho e
dedicação;
Mulher esta que esbanja esforço e compreensão!
Pessoa por quem serei eternamente grato, e que ainda que
eu nasça outras 100 mil vezes, e me dedique exclusivamente à ela, jamais
conseguiria retribuir todo esse amor, carinho e dedicação!
Por quem peço a DEUS que, por naturalidade, alivie o seu
sofrimento, aqueça-lhe o coração, fortaleça-lhe o corpo e lhe agracie com eterna
saúde;
Dedico este trabalho, reflexo de muito esforço, à VOCÊ
MÃE.
TE AMO!
4
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí (SC), junho de 2008.
Carlos Vinicius Priess Graduando
5
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Carlos Vinicius Priess, sob o título
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO POR DANO ESTÉTICO EM
CIRURGIA PLÁSTICA, foi submetida em 10 de junho de 2008 à banca
examinadora composta pelos seguintes professores: MSc. Jefferson Custódio
Próspero (Orientador e Presidente da Banca), Eduardo Erivelton Campos
(Membro) aprovada com a nota [10] (dez).
Itajaí (SC), 10 de junho de 2008
Prof. MSc Jefferson Custódio Próspero Orientador e Presidente da Banca
Prof. MSc Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
6
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AP Apelação
AP.C Apelação Cível
CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1916
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002
CP Código Penal
CF/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
RESP Recurso Especial
REXT Recurso Extraordinário
STF Supremo Tribunal de Justiça
STJ Superior Tribunal de Justiça
TJRS Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
7
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Ato ilícito
Ato praticado em desacordo com a ordem jurídica pré-estabelecida. (SILVA,
2000,p. 97).
Ato lícito:
Ato praticado sob o amparo da lei, ou seja, toda ação permitida pelas normas
jurídicas que não atente contra interesses alheios ou contra a segurança coletiva,
ou quando, os viole, encontre apoio na razão de ter sido praticado por se tornar
absolutamente necessário para a remoção do perigo. (SILVA, 2000, p. 97).
Culpa
É o vínculo de caráter interno a demonstrar a imputabilidade do resultado ao
agente, gerando o dever de restabelecer a situação anterior ao prejuízo.
(MATIELO, 2001, p. 15).
Dano
É o prejuízo causado ao bem alheio, patrimonial ou extra-patrimonial. Se o dano
foi causado ao desabrigo de qualquer das excludentes prevista na legislação,
sujeita-se ao correspondente ressarcimento, mas nenhum direito lhe assistirá,
exatamente porque obrou em dissonância ao que determina a lei. (MATIELO,
2001, p. 12).
Imperícia
Do latim imperitia (de imperitus), designa o inábil ou falto de aptidão técnica,
teórica ou prática, no desempenho de uma atividade profissional. Consiste,
portanto, a imperícia na falta de cabedal normalmente indispensável ao exercício
de uma profissão ou arte. (CROCE, Delton e CROCE JUNIOR, Delton. Erro
médico e o direito, p. 18.)
8
Imprudência
Do latim imprudentia, é a falta de atenção, o descuido ou a imprevidência no
exercício de uma ação perigosa, caracterizando-se, necessariamente, por uma
ação comissiva. (CROCE, Delton e CROCE JUNIOR, Delton. Erro médico e o
direito, p. 19.)
Negligência
Do latim negligentia (de neglegera), é inação, inércia non facere, indolência,
preguiça psíquica, ausência de reflexão necessária, falta de precaucão, falta de
interesse, não ter o devido cuidado, descuido, desleixo, desatenção, desprezar,
desatender, torpidez. (CROCE, Delton e CROCE JUNIOR, Delton. Erro médico e
o direito, p. 17)
Responsabilidade civil
É a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou
patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por
pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples
imposição legal. (DINIZ, 2006, p. 40).
Responsabilidade civil subjetiva
É decorrente de dano causado em função de ato doloso ou culposo. Esta culpa,
por ter natureza civil, se caracterizará quando o agente causador do dano atuar
com negligência ou imprudência. (GAGLIANO, 2006. p. 13).
Responsabilidade civil objetiva
É a responsabilidade que, basta, à evidência, a mera ocorrência da lesão e a
constatação de que teve origem em dado comportamento positivo ou negativo,
inexigível a imputação subjetiva ao autor. (MATIELO, 2001. p.20).
Responsabilidade Contratual
Obrigação de indenizar ou de ressarcir os danos causados pela inexecução de
cláusula contratual ou pela má execução de obrigação, nela estipulada. (SILVA,
2000, p. 714).
9
Responsabilidade extracontratual
Responsabilizar alguém pela violação de um dever jurídico pré-existente.
(GIOSTRI, 1998, p.120).
SUMÁRIO
RESUMO .......................................................................................... XII
INTRODUÇÃO .................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 ....................................................................................... 4
RESPONSABILIDADE CIVIL ............................................................. 4 1.1 CONCEITO ...................................................................................................... 4 1.2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL...................................... 6 1.2.1 AÇÃO OU OMISSÃO DO AGENTE ........................................................................ 6 1.2.2 CULPA DO AGENTE .......................................................................................... 8 1.2.3 RELAÇÃO DE CAUSALIDADE ........................................................................... 10 1.2.4 DANO ............................................................................................................ 12 1.2.5 CULPA E RISCO ............................................................................................. 14 1.3 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL ............... 15 1.4 TEORIAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ................................................. 20 1.4.1 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA ...................................................................... 20 1.4.2 RESPONSABILIDADE OBJETIVA ....................................................................... 23
CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 26
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO ...................................... 26 2.1 HISTÓRICO ................................................................................................... 26 2.2 RELAÇÃO MÉDICO – PACIENTE ................................................................ 31 2.2.1 NOÇÕES GERAIS ............................................................................................ 31 2.2.2 CONTRATO MÉDICO ....................................................................................... 37 2.2.3 DIREITOS E DEVERES DO PACIENTE................................................................. 39 2.3 CULPA MÉDICA ............................................................................................ 41 2.4 RESPONSABILIDADE MÉDICA ................................................................... 44 2.4.1 NOÇÕES GERAIS ............................................................................................ 44 2.4.2 OBRIGAÇÃO DE MEIO E DE RESULTADO ........................................................... 46 2.4.3 RESPONSABILIDADE MÉDICA E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ............ 49 2.5 AVALIAÇÃO DA RESPONSABILIDADE MÉDICA ....................................... 51 2.6 CAUSAS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO . 52 2.7 SEGUROS MÉDICOS .................................................................................... 54
CAPÍTULO 3 ..................................................................................... 56
RESPONSABILIDADE CIVIL DOS CIRURGIÕES PLASTICOS ...... 56 3.1 CIRURGIA PURAMENTE ESTÉTICA X CIRURGIA ESTÉTICA REPARADORA .................................................................................................... 56
xi
3.2 DANO ESTÉTICO .......................................................................................... 60 3.3 DANO MORAL ............................................................................................... 61 3.4 O DANO ESTÉTICO COMETIDO POR CIRURGIÕES PLÁSTICOS ............ 63 3.5 AVALIAÇÃO DO DANO ESTÉTICO: SUA INDENIZAÇÃO .......................... 64 3.6 DANO ÉSTETICO – CARÁTER ATENTATÓRIO À PERSONALIDADE ...... 68 3.7 CUMULAÇÃO DE DANO ESTÉTICO COM DANO MORAL ......................... 70 3.8 JURISPRUDÊNCIA ........................................................................................ 72
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 74
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 76
RESUMO
A presente monografia tem como objetivo fazer um estudo da Teoria da
Responsabilidade Civil, analisando seus pressupostos e objetivos. A partir daí,
examina-se a relação médico/paciente, questionando o fato gerador da
responsabilidade médica, bem como as causas excludentes. Um ponto de suma
importância é a divergência encontrada pela doutrina quanto à obrigação do
médico ser caracterizada como de meio ou de fim (resultado). Desta o presente
trabalho faz um estudo do dano estético causado pela cirurgia plástica, bem
como, a dificuldade de avaliação e a possível cumulação do dano estético com o
dano moral. Para finalizar a fixação do quantum relativo ao dano estético e dano
moral.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto de estudo,
demonstrar “a responsabilidade civil do médico por dano estético em cirurgia
plástica” e, como objetivos: institucional, produzir uma monografia para obtenção
do grau de bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI;
geral, pesquisar, à luz da doutrina pátria e do reiterado entendimento
Jurisprudencial, a Responsabilidade Civil do Médico por dano estético em cirurgia
plástica; especifico, demonstrar um tema que tem suscitado muitos
questionamentos e controvérsias, tomando um corpo maior em sua discussão
atual, uma vez que houve maior conscientização dos cidadãos para a
reivindicação de seus direitos.
Enquanto profissão, a medicina visa a prevenir os males e a
melhorar os padrões de saúde e de vida da sociedade. Saúde, pois, não apenas
como ausência de enfermidades, mas sim, o estado de completo bem estar físico
e mental da pessoa.
Hoje, mais do que nunca, os direitos do cidadão encontram-
se terrivelmente ameaçado, não só pelo progresso tecnológico, mas,
principalmente, pela falta de solidariedade e respeito dentro da sociedade
moderna, caracterizada por todos os tipos de violência.
Haja vista, que existe a necessidade de tutela aos direitos
humanos, entre eles estão os direitos da personalidade. Uma das dimensões da
personalidade humana é a aparência externa de cada um, isto é, o modo como
cada qual surge perante seus semelhantes fazendo com que se torne único.
Portanto, sendo uma das dimensões da pessoa humana, é
nela que podemos fundamentar a necessidade de reparação do dano estético.
Apesar de que a forma estética sempre ter sido uma das maiores preocupações
da humanidade.
2
Hoje em dia, por causa dos meios de comunicação e de
propaganda, que se apresenta de forma mais numerosa. Tornando-se quase uma
obrigação à boa aparência, sendo o primeiro passo para o entrosamento da
pessoa no meio social.
Sob tal influência, o número de pessoas que procuram
médicos cirurgiões estéticos para melhorar a aparência, tem aumentado
vertiginosamente. Como conseqüência, tornou-se cada vez maior o numero de
pacientes que, insatisfeitos com os resultados obtidos com a intervenção
cirúrgica, procuram alguma maneira de reparar o dano gerado.
Passa-se, então questionar acerca da responsabilidade civil
médica no tocante ao erro médico cometido nas cirurgias plásticas, em face ao
crescente volume de demandas judiciais em que se busca a reparação do dano
sofrido.
Portanto, a escolha do tema deu-se pelo grande número de
casos existentes e relatados pela imprensa, que denotam a falta de tutela dos
profissionais com seus pacientes.
Para tanto, principiar–se-á, no Capítulo primeiro, tratando de
responsabilidade Civil e apresenta a seguinte estrutura: conceito do instituto;
pressupostos (ação ou omissão do agente, culpa do agente, relação de
causalidade, dano, culpa e risco); responsabilidade contratual e extracontratual;
responsabilidade subjetiva e objetiva.
No Capítulo segundo, abordar-se-á a relação médico e
paciente, com enfoque nas noções gerais, contrato médico e direito e deveres do
paciente.
No terceiro e ultimo capítulo analisar-se-á a
Responsabilidade Civil do Médico fazendo breve abordagem acerca do histórico;
após se faz breves considerações sobre a culpa médica; em seguida, é abordado
um estudo a respeito da responsabilidade médica; passando pela avaliação da
responsabilidade médica; causas excludentes da responsabilidade civil do
3
médico; seguros médicos; por fim, será analisada a responsabilidade civil dos
cirurgiões plásticos.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre responsabilidade civil do médico no dano estético em cirurgia plástica.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
ü Na cirurgia plástica estética, a responsabilidade civil do cirurgião
é objetiva, pois independe da culpa.
ü A obrigação do médico para com seu paciente é contratual,
pois, mesmo que tacitamente, há entre eles, um acordo
bilateral de vontade.
ü O contrato é de resultado e não de meio, porque, na cirurgia
estética, há compromisso do médico com o resultado
almejado, ao contrário da cirurgia reparadora.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados
o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
CAPÍTULO 1
RESPONSABILIDADE CIVIL
1.1 CONCEITO
Todo indivíduo tem a liberdade de agir conforme sua
consciência, de forma que querendo poderá praticar atos em desconformidade
com as leis jurídicas. O que não pode deixar de ser observado é que, agindo
desta forma, mesmo que não exista normalização pré-estabelecida, poderá ser
responsabilizado por seus atos na vida civil, isto porque certos atos praticados
pelo individuo podem causar prejuízos às pessoas de forma direta ou indireta,
diante disso necessário qualificar o prejuízo experimentado pela vítima,
analisando se o mesmo deve ou não ser reparado por quem o causou.
O termo responsabilidade, pode ser utilizado para definir
varias situações no campo jurídico. A responsabilidade, em sentido amplo,
encerra a noção em virtude da qual se atribui a um sujeito o dever de assumir as
conseqüências de um evento ou de uma ação1.
Na realidade, o que se avalia em matéria de
responsabilidade segundo Sílvio de Salvo Venosa “(...) é uma conduta do agente,
qual seja, um encadeamento ou série de atos ou fatos, o que não impede que um
único ato gere por si o dever de indenizar”2.
Em analise ao entendimento de Silvio de Salvo Venosa
podemos dizer que o termo responsabilidade, tem um amplo sentido na qual
atribui deveres e conseqüências as ações de um sujeito, podendo esse, ser
responsabilizado a indenizar.
1 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p.12. 2 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil, p.13.
5
De fato, a responsabilidade civil foi definida por René
Savatier citado por Silvio Rodrigues 3 “como a obrigação que pode incumbir uma
pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de
pessoas ou coisas que dela dependam”.
Em outras palavras, a responsabilidade civil gera obrigações
para o causador do dano, sendo o mesmo responsável a reparar o prejuízo
causado.
Maria Helena Diniz4, diz que responsabilidade civil:
(...) é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar
dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato
por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por
alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.
A obrigação de reparar o prejuízo resume-se no
ressarcimento, de modo a ver preenchida a lacuna patrimonial ou extrapatrimonial
criada pelo dano.
Sobre a matéria entende Pablo Stolze Gagliano5:
(...) que a noção jurídica de responsabilidade civil pressupõe a
atividade danosa de alguém que, atuando a priori ilicitamente,
viola uma norma jurídica preexistente (legal ou contratual),
subordinando-se, dessa forma, às conseqüências do seu ato
(obrigação de reparar).
Então, como definição da responsabilidade civil poderíamos
dizer que é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar o dano
moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma
praticado, ou por pessoa quem ela responda por algo que à pertence ou, ainda, a
partir de simples imposição legal. 3 SAVATIER, Traité de la responsabilité civile. Paris, 1939, v.I, n.1, citado por RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade Civil, São Paulo: Saraiva, 2002. p.6.
4 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 20. ed. v 7. São Paulo: Saraiva, 2006 p.40.
5 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume III: responsabilidade civil. 4. ed. ver., atual. e reform. São Paulo: Saraiva, 2006 p.9.
6
A teoria da responsabilidade civil esta prevista no art. 186 do
Código Civil. Ai se diz:
Art. 186 - aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência
ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, ainda
que exclusivamente moral, comete ato ilícito.6
A regra do referido artigo define os pressupostos da
Responsabilidade Civil, que serão apontados e objeto de estudo no sub-capitulo
seguinte.
1.2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Para que seja aplicada a teoria da responsabilidade civil,
faz-se necessário a existência de pressupostos de validade apontados pela
doutrina, quais sejam, a ação ou omissão do agente, a culpa do agente, a relação
de causalidade entre o fato e o dano ocorrido e ainda a possibilidade de aplicação
da teoria do risco.
1.2.1 Ação ou Omissão do Agente
A responsabilidade do agente pode defluir de ato próprio
(fato próprio) como a calúnia e a injúria; de ato de terceiro que esteja sob a
responsabilidade do agente (fato de terceiro), e ainda de danos causados por
coisas que estejam sob a guarde deste (fato de coisa), como animais ou simples
imposição legal (Responsabilidade Objetiva)7.
No entendimento de Silvio Rodrigues8: “O ato do agente
causador do dano impõe-lhe o dever de reparar o dano não só quando há de sua
parte, infringência a um dever legal, portanto ato praticado contra lei como
também quando seu ato, embora sem infringir a lei, foge da finalidade social a
que ela se destina.
6 BRASIL, Código Civil; Comercial; Processo Civil; Constituição Federal./ obra coletiva da autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. 3 ed. São Paulo: Saraiva. 2007. p.278.
7 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.15. 8 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.15.
7
Existem atos que não colidem diretamente com a norma
jurídica, mas sim, com o fim social por ela almejado. São atos praticados com
abuso de direto, e, se o comportamento abusivo do agente causa dano a outrem,
a obrigação de reparar, imposta àquele, apresenta-se inescusável.
Em relação ao fato de terceiro exemplifica Silvio Rodrigues: 9
(...) ”o pai responde pelos atos dos filhos menores que estiverem em seu poder ou
em sua companhia, bem como, o patrão responde pelos atos de seus
empregados”.
Sendo assim, podemos perceber que a responsabilidade do
agente, pode advir de ato próprio ou ato de terceiro. Mas pode, igualmente, ser
ele obrigado a reparar o dano causado por coisa ou animal que estava sob sua
guarda, ou por dano de coisas que tombem de sua moradia.
Sobre a forma positiva (ação) entende Maria Helena Diniz10:
A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o
ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou licito, voluntário e
objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o
fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem,
gerando o dever de satisfazer os direito do lesado.
Em referencia a forma negativa (omissiva) dispõem o Pablo
Stolze Gagliano11:
Trata-se de atuação omissiva ou negativa, geradora de dano. Se,
no plano físico, a omissão pode ser interpretada como um “nada”,
um “não fazer”, uma “simples abstenção”, no plano jurídico, este
tipo de comportamento pode gerar dano atribuível ao omitente,
que será responsabilizado pelo mesmo.
Observando o artigo 186 do Código Civil veremos que impõe
a obrigação de indenizar aquele que (...) “por ação ou omissão voluntária” causar
9 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.15. 10 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p.43. 11 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume III: Responsabilidade civil, p.9.
8
prejuízo a outrem. Entretanto, devemos destacar que também na ação omissiva a
voluntariedade da conduta se faz presente. Isso porque, se faltar este requisito,
haverá ausência de conduta na omissão, inviabilizando, por conseguinte, o
reconhecimento da responsabilidade civil.
1.2.2 Culpa do Agente
O segundo pressuposto para caracterizar a responsabilidade
pela reparação do dano é a culpa ou o dolo do agente que causou o prejuízo. A
lei declara que, se alguém causou prejuízo a outrem por meio da ação ou
omissão voluntária, negligência ou imprudência, fica obrigado a reparar. De modo
que nos termos da lei para que a responsabilidade se caracterize, mister se faz a
prova de que o comportamento do agente causador do dano tenha sido doloso ou
ao menos culposo12.
O dolo ou resultado danoso, afinal alcançado, foi
deliberadamente procurado pelo agente. Ele desejava causar dano e seu
comportamento realmente o causou. Em caso de culpa, por outro lado, o gesto do
agente não visava causar prejuízo a vítima, mas de sua atitude negligente, de sua
imprudência oi imperícia resultou um dano para ela.
Segundo entendimento de Silvio Rodrigues13 na idéia de
negligência se inclui a de imprudência, bem como a de imperícia, senão vejamos:
Aquele que age com imprudência, negligência em tomar as
medidas de precaução aconselhadas para situação em foco,
como, também, a pessoa que se propõe a realizar uma tarefa que
requer conhecimentos especializados ou alguma habilitação e a
executa sem ter aqueles ou esta, portanto, negligenciou em
obedecer às regras da profissão.
Ainda sobre o tema escreve Silvio Rodrigues:
Já vimos que a regra básica da responsabilidade civil, consagrada
em nosso Código Civil, implica a existência do elemento culpa
12 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.15. 13 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.16.
9
para que o mister de reparar possa surgir. Todavia,
excepcionalmente, e em hipóteses especificas, nosso direito
positivo admite alguns casos de responsabilidade sem culpa, ou
irrefragavelmente presumida, sem culpa baseada na idéia do
risco.
Sobre o tema, ensina Maria Helena Diniz14 que “(...) a culpa
é a violação de um dever jurídico, imputável a alguém, em decorrência de fato
intencional ou de omissão de diligência ou cautela”.
Enfatiza Maria Helena Diniz15, que:
(...) a imperícia é a falta de habilidade ou inaptidão para praticar
certo ato; a negligência é a inobservância de normas que nos
ordenam agir com atenção, capacidade, solicitude e
discernimento; e a imprudência é a precipitação ou ato de
proceder sem cautela.
Segundo Silvio Rodrigues16:
A distinção entre Dolo e Culpa, bem como entre os graus de
Culpa, de um certo modo perde sua oportunidade. Isto porque,
quer haja Dolo, quer haja Culpa grave, leve ou levíssima, o dever
de reparar se manifesta com igual veemência, pois o legislador
parece ter adotado a norma romana segundo o qual in Lex Áquila
et levíssima Culpa venit. Ou seja, dentro da responsabilidade
aquiliana, ainda que seja levíssima a Culpa do agente causador
do dano, cumpre-lhe indenizar a vítima. Ora, como a indenização
deve ser a mais possível completa, posto que indenizar significa
tornar indene a vítima, o agente causador do dano, em tese, tem a
obrigação de repara-lo integralmente, quer tenha agido com Dolo,
quer com Culpa levíssima.
Portanto, pode-se classificar a Culpa em seus diversos
graus, bem como, a distinção entre a conduta culposa e dolosa, sendo que,
subsiste a obrigação de indenizar, em que se pese tenha o agente ocasionado à
ofensa por um comportamento doloso ou culposo. Na culpa independe se foi de 14 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.46. 15 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.46. 16 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.16.
10
forma grave, leve ou levíssima, basta apenas que tenha havido, para a incidência
da responsabilidade.
1.2.3 Relação de Causalidade
O nexo causal refere-se à relação direta entre a ação do
agente e o dano causado. É uma relação que une a conduta do agente ao
resultado que conduzem à responsabilidade, quer objetiva, quer subjetiva.
Portanto, tem-se que o vinculo de causalidade é elemento
indispensável para a caracterização da responsabilidade, seja baseada na culpa
ou no risco.
Destaque-se que, não basta que a condição ou fato tenha
sido fator determinante do dano, é essencial que o fato seja uma causa adequada
à produção daquele resultado.
Henry e Tunc Mazeaud; citado por Miguel Kfouri Neto17 “(...)
não é suficiente, para que seja exigível a responsabilidade civil, que o
demandante haja sofrido um prejuízo nem que o demandado tenha agido com
culpa”. Deve reunir-se um terceiro e ultimo requisito, a existência de um vinculo
de causa e efeito entre a culpa e o dano, é necessário que o dano sofrido seja
conseqüência da culpa cometida.
Segundo entendimento de Silvio Rodrigues18 seria nesse
passo o estudo das excludentes da responsabilidade “Se o acidente ocorreu não
por culpa do agente causador do dano, mas por culpa da vítima, é manifesto que
faltou o liame de causalidade entre o ato daquele e o dano por este
experimentado”.
A existência da relação de Causalidade é fator indispensável
para o devido cumprimento da obrigação reclamada, sendo que a relação de
Causalidade cria condições para que a responsabilidade seja imputada ao seu
17 KFOURI, Miguel Neto. In. Responsabilidade civil do médico. 6 ed. São Paulo; Editora Revista dos Tribunais, 2007. p.63.
18 RODRIGUES, Silvio. Direito civil p.09.
11
verdadeiro causador, resguardando assim o direito da pessoa que porventura
viesse a ser confundida.
Para Maria Helena Diniz19:
O vinculo entre o prejuízo e a ação designa-se “nexo causal”, de
modo que o fato lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente
ou como sua conseqüência previsível. Tal nexo representa,
portanto, uma relação necessária entre o evento danoso e a ação
que o produziu, de tal sorte que o dano resulte apenas
imediatamente do fato que o produziu.
Miguel Maria Serpa Lopes20 traz o seguinte trecho em sua
obra:
Uma das condições essenciais à responsabilidade civil é a
presença de um nexo causal entre o fato ilícito e o dano por ele
produzido. É uma noção aparentemente fácil e limpa de
dificuldade. Mas se trata de mera aparência, porquanto a noção
de causa é uma noção que se reveste de um aspecto
profundamente filosófico, além das dificuldades de ordem pratica,
quando os elementos causais, os fatores de produção de um
prejuízo, se multiplicam no tempo e no espaço.
Assim como no Direito Penal, a investigação deste nexo que
liga o resultado danoso ao agente infrator é indispensável para que se possa
concluir a responsabilidade civil.
Por obvio, somente se poderá responsabilizar alguém cujo
comportamento houvesse dado causa ao prejuízo.
Contudo, essa discussão é de especial importância para a
responsabilidade médica, tendo em vista que nessa área existem ocorrências
diversas, em variadas atividades, que por si só são capazes de causar certo
dano, independentemente do atuar do médico, são chamadas intercorrências
médicas.
19 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.110. 20 LOPES, Miguel Maria Serpa. Curso de Direito Civil / Fontes Contratuais das Obrigações e
Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001 p. 218.
12
1.2.4 Dano
Somente haverá possibilidade de indenização se o ato ilícito
ocasionar dano. O dano ou interesse deve ser atual e certo, não sendo
indenizáveis, a principio, danos hipotéticos. Sem dano ou sem interesse violado,
patrimonial ou moral, na se corporifica a indenização. Sílvio de Salvo Venosa21
dispõe que (...) “A materialização do dano ocorre com a definição do efetivo
prejuízo suportando pela vítima”.
Caio Mário da Silva Pereira22 Observa:
(...) É claro, então, que, se a ação se fundar em mero dano
hipotético, não cabe reparação, Mas esta será devida se
considerar, dentro na idéia de perda de uma oportunidade e puder
situar-se na certeza do dano.
No entendimento de Maria Helena Diniz23:
(...) O dano é um dos pressupostos da responsabilidade civil,
contratual ou extracontratual, visto que não poderá haver ação de
indenização sem a existência de um prejuízo. Só haverá a
responsabilidade civil se houver um dano a reparar. Isto é assim
porque a responsabilidade resulta em obrigações de ressarcir,
que, logicamente não poderá concretizar-se onde nada há que
reparar.
Ainda Maria Helena Diz24;
(...) Não pode haver responsabilidade civil sem a existência de um
dano a um bem jurídico, sendo imprescindível à prova real e
concreta dessa lesão. Deveras, para que haja pagamento da
indenização pleiteada é necessário comprovar a ocorrência de um
dano patrimonial ou moral, fundados não na índole dos direitos
subjetivos afetado, mas nos efeitos da lesão jurídica.
21 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil, p.12. 22 PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade Civil. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p.28.
23 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.65. 24 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.66.
13
Sendo o dano um pressuposto da responsabilidade civil, não
pode se falar em obrigação de indenizar sem que haja comprovação de que o ato
do agente causou dano á vítima, sendo que, só haverá responsabilidade civil se
houver um dano.
Carlos Roberto Gonçalves25 explana sobre o tema que:
Sem prova do dano, ninguém pode ser responsabilizado
civilmente. O dano pode ser material ou simplesmente moral, ou
seja, sem repercussão na órbita financeira do ofendido. O Código
Civil consigna um capitulo sobre liquidação do dano, ou seja,
sobre o modo de se apurarem os prejuízos e a indenização
cabível.
Com absoluta propriedade, Sérgio Cavalieri Filho26, em sua
excelente obra Programa da Responsabilidade Civil, salienta a inafastabilidade do
dano nos seguintes termos:
O dano é, sem duvida, o grande vilão da responsabilidade civil.
Não haveria que se falar em indenização, nem em ressarcimento,
se não houvesse o dano. Pode haver responsabilidade sem culpa,
mas não pode haver responsabilidade sem dano. Na
responsabilidade objetiva, qualquer que seja a modalidade do
risco lhe sirva de fundamento – risco profissional, risco proveito,
risco criado etc -, o dano constitui o seu elemento preponderante,
Tanto é assim que, sem dano, não haverá o que reparar, ainda
que a conduta tenha sido culposa ou até dolosa.
Nesses termos, poderíamos conceituar o dano ou prejuízo
com sendo a lesão a um interesse jurídico tutelado – patrimonial ou não -,
causado por ação ou omissão do sujeito infrator, fato este que da azo ao dever de
indenizar e permito o exercício do direito subjetivo de ação.
25 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 6 ed, São Paulo: Saraiva, 2000, p.27. 26 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil, 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.70.
14
1.2.5 Culpa e Risco
A Idéia da culpa sempre foi a idéia informadora da
responsabilidade civil, isso porque há um fundamento no princípio geral de direito,
segundo o qual aquele que causa dano à outrem deve repará-lo, mas só deve se
infringiu uma regra de conduta legal, social ou moral.
Portanto, a Teoria da Responsabilidade27 foi criada baseada
no tradicional conceito de culpa, mas, com a evolução da sociedade e o aumento
dos acidentes de diversas naturezas, essa idéia de culpa, apresentava-se talvez
inadequada para atender aquele anseio de ressarcimento que começou a brotar
na sociedade. Isso porque, importa a vítima, como pressuposto para ser
ressarcida, o encargo de demonstrar não só o liame de causalidade, como por
igual comportamento culposo do agente causador do dano, equivalia a deixá-la
irressarcida28.
Sendo assim a Teoria do Risco29 se inspira na idéia de que o
elemento culpa é desnecessário para caracterizar a responsabilidade. A
obrigação de indenizar não se apóia em qualquer elemento subjetivo, de
indagação sobre o comportamento do agente causador do dano, mas se fixa no
elemento meramente objetivo, da indagação sobre o comportamento do agente
causador do dano, ma se fixa no elemento meramente objetivo, representado pela
relação de causalidade entre o ato causador do dano e este.
Dessa forma, ficando comprovada a existência de dano,
entre o fato gerador e o prejuízo, o agente agido culposamente, o mesmo terá a
obrigação de reparar.
Sendo assim, aquele que, no seu interesse, cria um risco e
causar dano a outrem, terá que repará-lo se este dano sobrevier. A
27 Teoria da responsabilidade: é a divisão de duas teorias, ou seja, responsabilidade objetiva (teoria do risco) e responsabilidade subjetiva (teoria da culpa).
28 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. São Paulo: Saraiva, 2002. p.156. 29 Teoria do risco: é a justificativa para a responsabilidade objetiva.
15
responsabilidade deixa de resultar da culpabilidade, para derivar exclusivamente
de causalidade material. Responsável, portanto, seria aquele que causou o dano.
1.3 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL
Demonstrados os pressupostos genéricos da
responsabilidade civil, não há a menor duvida de que, abstraídas as hipóteses de
responsabilidade subjetiva com presunção da culpa, ou de responsabilidade
objetiva, existe uma grande dificuldade na demonstração da culpa do agente ou
da antijuricidade de sua conduta para ensejar a sua responsabilidade civil.
Carlos Roberto Gonçalves30, apud REMÉDIO; FREITAS E
LOZANO JÚNIOR, traça as diferenças básicas entre as duas espécies de
responsabilidade, que podem ser assim resumidas:
a) ônus da prova: na responsabilidade contratual, o credor
apenas tem a obrigação de provar que a prestação foi
descumprida, independente da culpa, tendo o devedor que
demonstrar a ocorrência de alguma das excludentes legais para
se eximir da obrigação de indenizar. Na extracontratual, a vítima
deverá demonstrar que o fato se deu por culpa do agente, já que
não existe a presunção de culpa ocorrente na relação contratual;
b) fonte: a responsabilidade contratual deriva da convenção
entre as partes, enquanto a extracontratual decorre da obrigação
legal de não causar dano a ninguém (art. 389 do CC);
c) capacidade do agente: na responsabilidade contratual, a
capacidade é mais limitada que na extracontratual. O contrato
exige sempre a capacidade do contratante ao tempo da sua
celebração, sob pena de não ter validade e não produzir efeitos
indeniza-tórios. Já no caso da obrigação decorrente de um delito,
o ato do incapaz pode gerar a obrigação de indenizar do seu
guardião;
d) gradação da culpa: na responsabilidade contratual, a culpa é
escalonada, variando de intensidade de acordo com as diferentes
30 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p 5.
16
hipóteses em que ela ocorre, enquanto na delitual ela é mais
rigorosa, alcançando até a falta ligeiríssima.
Essa dificuldade é minorada quando a conduta ensejadora
do dano é resultante do descumprimento de um dever contratual, pois, nessa
hipótese, presumir-se-ia a culpa, uma vez que a própria parte se obrigou,
diretamente, à obrigação, ora descumprida.
A depender, portanto, da natureza da norma jurídica violada
pelo agente causador do dano, uma subdivisão, muito mais didática e legislativa
do que propriamente cientifica, pode ser feita, sub tipificando-se a
responsabilidade civil em: contratual e extracontratual ou aquilina31.
Questão de grande relevância é a distinção entre
responsabilidade contratual32 e extracontratual33, pois uma pessoa pode causar
prejuízo à outra tanto por descumprir uma obrigação contratual como por praticar
outra espécie de ato ilícito.
Enquanto o artigo 189 do Código Civil disciplina,
genericamente, as conseqüências derivadas da responsabilidade aquiliana, o
artigo 389 do referido Codex cuida dos efeitos resultantes da responsabilidade
contratual.
Senão vejamos, o artigo 389 do Código Civil34·: Não
cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e
atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e
honorários de advogado.
31 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.9. 32 Responsabilidade contratual: obrigação de indenizar ou de ressarcir os danos causados pela inexecução de cláusula contratual ou pela má execução de obrigação, nela estipulada.
33 Responsabilidade extracontratual: responsabilizar alguém pela violação de um dever jurídico pré-existente.
34 BRASIL, Código Civil; Comercial; Processo Civil; Constituição Federal/ obra coletiva da autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. 3 ed. São Paulo: Saraiva. 2007. p.298.
17
No caso da responsabilidade contratual, antes da obrigação
de indenizar emergir, existe, entre o inadimplente e seu co-contratante, um
vinculo jurídico derivado da convenção; na hipótese da responsabilidade
aquiliana, nenhum liame jurídico existe entre o agente causador do dano e a
vítima ate que o ato daquele ponha em ação os princípios geradores de sua
obrigação de indenizar.
Para Silvio Rodrigues, poderíamos entender que as duas
responsabilidades são de igual natureza, não havendo por que disciplina-las
separadamente, pois, tanto na configuração da responsabilidade contratual como
na aquiliana vários pressupostos são comuns. Nunca e noutra necessária se faz a
existência do dano, a culpa do agente e a relação causalidade entre o
comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima ou pelo outro
contratante. A fim de exemplificar, o autor35 diz que:
Alguém atropela um homem que, no desastre, perde um braço. O
agente causador desse dano fica obrigado a repará-lo, e sua
responsabilidade e extracontratual. A indenização consistira no
pagamento correspondente às despesas de tratamento da vítima,
lucros cessantes até o fim da convalescença, e ainda, no dever de
fornecer uma pensão correspondente à diminuição de sua
capacidade laborativa. Note-se que essa indenização não é a
devolução do braço perdido; apenas substitui, por cifra em
dinheiro, aquilo que aproximadamente se calcula tenha sido o
prejuízo da vítima do ato ilícito.
Na responsabilidade contratual a indenização, em muitos
casos, se não em todos, é, por igual, um substitutivo da prestação contratada. A
indenização nesse caso abrangerá o prejuízo efetivo, bem como, o lucro
cessante, mas, a cifra arbitrada em dinheiro, não será a prestação permitida, mas
apenas um sucedâneo dela36.
Em matéria de prova, na responsabilidade contratual,
demonstrado pelo credor que a prestação foi descumprida, o ônus probandi se
transfere para o devedor inadimplente, que terá que evidenciar a existência de
35 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.9. 36 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.10.
18
culpa de sua parte, ou a presença de força maior, outra excludente da
responsabilidade capaz de eximi-lo do dever de indenizar, enquanto, se for
aquiliana a responsabilidade, caberá à vítima o encargo de demonstrar a culpa do
agente causador do dano.
Sobre a matéria entende Pablo Stolze Gagliano37:
Assim, se o prejuízo decorrente diretamente da violação de um
mandamento legal, por força da atuação ilícita do agente infrator
(caso do sujeito que bate em um carro), estamos diante da
responsabilidade extracontratual, Por outro lado, se, entre as
partes envolvidas, já existia norma jurídica contratual que as
vinculava, e o dano decorre justamente do descumprimento de
obrigação fixada neste contrato, estaremos diante de uma
situação de responsabilidade contratual.
Ainda sobre a matéria, demonstra Pablo Stolze Gagliano 38 o
seguinte quadro esquemático:
Responsabilidade Civil:
1. Contratual → inadimplemento da obrigação prevista no
contrato (violação de norma contratual anteriormente fixada pelas partes);
2. Extracontratual ou Aquiliana → violação direta de uma
norma legal.
Note-se, que o elemento subjetivo representado pelo
conceito amplo de culpa nem sempre será indispensável, uma vez que poderá
haver responsabilidade civil independentemente da sua aferição, em hipóteses
especiais previstas na forma expressa da lei, ou quando a sua atividade
normalmente desenvolvida pelo causador do dano importa em risco para os
direitos de outrem39.
37 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume III: Responsabilidade Civil, p.16. 38 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume III: Responsabilidade Civil, p.17. 39 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume III: Responsabilidade Civil, p.17.
19
Maria Helena Diniz40 preconiza o tema separadamente,
demonstrando a priori que responsabilidade contratual:
(...) oriunda de inexecução de negócio jurídico bilateral ou
unilateral. Resulta, portanto de ilícito contratual, ou seja, de falta
de adimplemento ou da mora do cumprimento de qualquer
obrigação. É uma infração a um dever especial estabelecido pela
vontade dos contratantes, por isso decorre de relação obrigacional
preexistente e pressupõe capacidade para contratar.
Destarte, uma vez feito entre os contratantes o pacto, a
regra geral, é que não há como se libertar unilateralmente do avençado,
passando o contrato a ter força de lei entre aqueles que o firmaram41.
(...) O ônus da prova, na responsabilidade contratual,
competira ao devedor, que deverá provar, ante o inadimplemento, a inexistência
de sua culpa ou a presença de qualquer excludente do dever de indenizar. O
devedor, para ilidir a obrigação de indenizar, deverá evidenciar que o
descumprimento contratual foi devido a caso fortuito ou força maior.
Assim sendo, o inadimplemento contratual gera para o outro
pactuante uma frustração de expectativa, ocasionando para o mesmo um dano,
seja na esfera patrimonial, seja de ordem moral.
(...) se atribui descumprimento ou má prestação de uma atividade
à qual alguém estava obrigado em virtude de liame contratual e se
esse inadimplemento visava, diretamente, a satisfazer um
interesse extrapatrimonial do credor, o dano será também
diretamente não – econômico. É o que acontece com os danos
oriundos da atividade médica, quando o médico responderá
contratualmente pela mala práxis ( ou má pratica da medicina). P.
ex: Se o médico, imprudentemente, provocar lesões no paciente,
ter-se-á dano patrimonial indireto, consistente em gastos com o
tratamento e um lucro cessante pelo que o doente deixou de
auferir durante sua convalescença.
40 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.136. 41 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.136.
20
Em suma, a responsabilidade contratual nasce da
inexecução do estipulado em um contrato, pressupondo acordo de vontades e
sendo restrita pelo acordo entre as partes.
Ainda referente ao tema Maria Helena Diniz42 conceitua
responsabilidade extracontratual:
A responsabilidade extracontratual, delitual ou aquiliana decorre
de violação legal, ou seja, de lesão a um direito subjetivo ou da
pratica de um ato ilícito, sem que haja nenhum vinculo contratual
entre lesante e lesado. Resulta, portanto, da inobservância da
norma jurídica ou de infração ao dever jurídico geral de abstenção
atinente aos direitos reais ou de personalidade, ou melhor, de
violação à obrigação negativa de não prejudicar ninguém.
Como foi demonstrado, podemos enquadrar a natureza da
obrigação do médico com de origem contratual, a desrespeito de estar contida
junto à responsabilidade extracontratual na sistemática do nosso Código. E assim
sendo, pode ser resultante de um contrato de meios, em geral, o que não ocorre
no caso do cirurgião plástico, na cirurgia plástica estética, quando a obrigação é
de resultados.
1.4 TEORIAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
A responsabilidade civil divide-se em duas teorias, ou seja,
responsabilidade objetiva e responsabilidade subjetiva. Para melhor entendimento
analisaremos independentemente cada teoria.
1.4.1 Responsabilidade Subjetiva
A Responsabilidade Subjetiva é fundamentada na culpa,
podendo derivar na inobservância de um dever disposto, implícita ou
explicitamente, no ordenamento jurídico ou no contrato, onde o lesado deverá
provar o dano (pessoal, moral ou patrimonial); ação ou omissão e nexo causal.
Nas lições de Pablo Stolze Gagliano43:
42 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.533.
21
A responsabilidade civil subjetiva é a decorrente de dano causado
em função de ato doloso ou culposo. Esta culpa, por ter natureza
civil, se caracterizará quando o agente causador do dano atuar
com negligência ou imprudência, conforme cediço
doutrinariamente, através da interpretação da primeira parte do
art. 159 do Código Civil de 1916 (“Art. 159. Aquele que, por ação
ou omissão voluntária negligenciar, ou imprudência, violar direito,
ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”),
regra geral mantida, com aperfeiçoamentos, pelo art. 186 do
Código Civil de 2002 “ (Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligencia ou imprudência, violar direito e causar dano
a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”)
Portanto, para que seja configurada a teoria subjetiva,
deverá existir um elemento de cunho subjetivo, que poderá decorrer do dolo, ou
seja, da ação ou omissão voluntária do agente causador ou decorrer da culpa,
negligência, imprudência ou imperícia do agente.
Segundo a teoria subjetiva, deverá existir uma ligação
psíquica do agente com o resultado danoso, podendo o resultado ser almejado
pelo causador ou aceitável como viável ou passível de ocorrer diante da conduta
exercida.
Existem duas espécies de dolo, quais sejam, dolo direito e
dolo eventual.
De acordo com a primeira espécie, o dolo direto, ação ou
omissão do agente é consciente e direcionada ao alcance do resultado, existe,
portanto, uma vontade deliberada de infringir um dever legal. Já na segunda
espécie de dolo, o eventual, o agente tem consciência da conduta praticada
poderá causar um dano, mesmo assim, ignora o risco e prossegue rumo ao que
deseja44.
43 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume III: responsabilidade civil, p.13. 44 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade Civil, p.533.
22
Se o dano for causado por culpa, ou seja, imprudência45,
negligência46 ou imperícia47, constata-se que no agente não existe a pretensão de
causar o prejuízo, que será ocasionado justamente pelo comportamento ilícito.
Sérgio Cavalieri Filho, apud na obra de Antonio Couto Filho
e Alex Pereira Souza48, faz a seguinte distinção:
Diferente do dolo, a culpa não é vontade de praticar determinado
ato ilícito. É, antes, a vontade de praticar ato licito, mas o agente
por não adotar a conduta adequada, acaba por praticar ato ilícito.
Vê-se, então que há na culpa uma conduta mal dirigida a um fim
licito; uma conduta inadequada aos padrões sociais, ato ou fato
que uma pessoa prudente e cautelosa não teria praticado. É
imprevisão do previsível por falta de cautela do agente. Já na
culpa, em ultima instância um erro de conduta.
Portanto, para a teoria da responsabilidade subjetiva, a
prova da culpa do agente causador do dano é indispensável para que surja o
dever de indenizar. A responsabilidade é subjetiva porque dependerá do
comportamento do sujeito49.
Caio Mario da Silva Pereira50 assim demonstra seu
entendimento sobre o assunto:
Na tese da presunção de culpa subsiste o conceito genérico de
culpa como fundamento da responsabilidade civil. Onde se
distancia da concepção subjetiva tradicional é no que concerne ao
ônus da prova. Dentro da teoria clássica da culpa, a vítima tem de
demonstrar a existência dos elementos fundamentais de sua
pretensão, sobressaindo o comportamento culposo do
demandado. Ao se encaminhar para a especialização da culpa
45 Imprudência: é a falta de cuidados básicos ou cautela que deveriam ser tomados em determinado caso.
46 Negligência: é a falta de diligência, atenção no momento necessário. 47 Imperícia: é a conduta produzida à margem de conhecimentos suficientes, deficiência na formação do profissional ou incompetência na prática profissional por falta de estrutura técnica.
48 COUTO FILHO, Antonio Ferreira; Souza, Alex Pereira. A improcedência no suposto erro médico. Editora Lúmen Júris, 1999, p. 13.
49 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.11. 50 PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade Civil, p.265-266.
23
presumida, ocorre uma inversão do ônus probandi. Em certas
circunstâncias, presume-se o comportamento culposo do
causador do dano, cabendo-lhe demonstrar a ausência de culpa,
para se eximir do dever de indenizar. Foi um modo de afirmar a
responsabilidade civil, sem a necessidade de provar o lesado a
conduta culposa do agente, mas sem repelir o pressuposto
subjetivo da doutrina tradicional. Em determinadas circunstâncias
é a lei que enuncia a presunção. Em outras, e a elaboração
jurisprudencial que, partindo de uma idéia tipicamente assentada
na culpa, inverte a situação impondo o dever ressarcitório, a não
ser que o acusado demonstre que o dano foi causado pelo
comportamento da própria vítima.
Entretanto, hipóteses há em que não é necessário sequer
ser caracterizada a culpa. Nesses casos, estaremos diante do que se
convencionou chamar de responsabilidade objetiva.
1.4.2 Responsabilidade Objetiva
Na responsabilidade objetiva não há necessidade de se
comprovar a culpa por parte do agente, para que esteja caracterizada a obrigação
de reparar o dano, desde que exista o nexo causal entre o dano causado a vítima
e o ato do agente.
Sobre o tema, é importante a lição de Silvio Rodrigues:
Na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do
agente causador do dano é de menor relevância, pois, desde que
exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela
vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha
este agido ou não culposamente51.
Carlos Roberto Gonçalves52 trata sobre a teoria do risco
como justificativa para a responsabilidade objetiva, dizendo que:
Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade cria
um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo,
ainda que sua conduta seja isenta de culpa. A responsabilidade
51 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p.11. 52 GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade civil, p.18.
24
civil desloca-se da noção de culpa para a idéia de risco, ora
encarada como “risco-proveito”, que se funda no principio
segundo o qual é reparável o dano causado a outrem em
conseqüência de uma atividade realizada em beneficio do
responsável (...).
Portanto, a teoria do risco é a da responsabilidade objetiva.
Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria um risco de dano
para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e o seu
comportamento sejam isentos de culpa, para tanto, examina-se a situação, e, se
for verificada, objetivamente, a relação causa e efeito entre o comportamento do
agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por
aquele.
Caio Mário da Silva Pereira53 assim demonstra seu
entendimento sobre o assunto.
Cada um deve sofrer o risco de seus atos, sem cogitação da idéia
de culpa, e, portanto, o fundamento da responsabilidade civil
desloca-se da noção de culpa, porem deve viver ao seu lado. (...)
a teoria do risco ou da responsabilidade objetiva na atualidade
encontra resistência na doutrina, no tocante à sua aplicação
ampla com que se defendeu o seu préstimo. Isso não obstante,
conquistou aceitação na doutrina e na jurisprudência e penetrou
no principio constitucional do art. 5.º, ns. V e X, da Carta de 1988.
O legislador brasileiro adotou tanto a responsabilidade
subjetiva (teoria da culpa) quanto á teoria da responsabilidade objetiva (teoria do
risco) em seu ordenamento jurídico.
O Código Civil de 1916 particularmente, adotou a teoria
subjetiva, disposta em seu artigo 159, exigindo a comprovação do dolo e da culpa
como fundamento para caracterizar a reparação do dano.
Entretanto, o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº
8.078, de 11/09/1990), como exemplo, adota a teoria objetiva, para resguardar os
direitos do consumidor.
53 PEREIRA, Caio Mário da Silva, Responsabilidade Civil, p.271.
25
Ainda referente ao tema Maria Helena Diniz54 conceitua
responsabilidade objetiva:
A responsabilidade objetiva, fundada na teoria do risco, decorre
no direito brasileiro de acidentes de trabalho; acidentes
resultantes do exercício de atividades perigosas; furto de valores
praticado por empregados de hotéis contra hóspedes; queda de
coisas de uma casa ou seu lançamento de lugar indevido;
pagamento de cheque falsificado por banco; comportamentos
administrativos comissivos prejudiciais a direito de particular e
atos praticados no exercício de certos direitos, e diversas outras.
Ainda, no tocante a comprovação da conduta culposa, como
requisito essencial para caracterizar a responsabilidade civil subjetiva, traz-se os
seguintes julgados, exemplificativamente:
Não se há de imputar responsabilidade indenizatória ao médico,
em face do insucesso de intervenção cirúrgica, se não restar
evidenciada sua conduta culposa, uma vez que o compromisso
assumido constitui obrigação de meio não de resultado. TA-MG,
Ap. Cív. 170.1851, 6a Câmara Cível, Rel. Juiz Salatiel Resende, j.
28/04/94) (LEAL; SAMPAIO, 1999, p. 65).
Ou ainda:
Responsabilidade civil - Cirurgia - Culpa - Nexo Causal -
Obrigação de Meio. Constituindo a prestação de serviços médicos
em obrigação de meio e não de resultado, não se pode atribuir
responsabilidade indenizatória ao médico por lesão decorrente de
intervenção cirúrgica, sem a prova da conduta culposa do
profissional, bem como do nexo de causalidade entre a cirurgia e
o resultado lesivo. (TA-MG, Ap. Cív. 189.139-8, 7a Câmara Cível,
Rel. Juiz Antônio Carlos Cruvinel) (LEAL; SAMPAIO, 1999, p. 65).
No entanto, a distinção da culpa se objetiva ou subjetiva é,
na prática, de difícil estabelecimento. Com estas considerações sobre a
responsabilidade civil, encerra-se este capitulo, para se iniciar o segundo,
destinado a tratar da relação médico – paciente.
54 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, p.59
26
CAPÍTULO 2
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO
2.1 HISTÓRICO
As doenças e as dores nasceram juntamente com o homem.
Por isso, desde seu primeiro momento de racionalidade, tratou, ele de predispor
os meios necessários para combater ambos os males55.
No dizer de Genival Veloso de França56: “(...) a Medicina é
tão antiga quanto à dor e seu humanismo tão velho quanto à piedade humana”.
Os primeiro estudos eram direcionados à cura das doenças
e não propriamente à análise das patologias. No intuito de amenizar a dor,
curandeiros receitavam determinadas ervas, era o chamado empirismo57.
Desde os primórdios, caso não ocorresse à cura, a culpa
recaia sobre o feiticeiro (médicos), acompanhada da acusação de imperícia ou de
incapacidade. Muitas vezes, porém o que se considerava culpa dos médicos era
apenas o resultado da insuficiência dos conhecimentos da arte de curar. Quanto
mais a medicina se transformava em ciência, maior foi se tornando o rigor
científico na avaliação dos erros profissionais58.
Miguel Kfouri Neto explana acerca dos Primórdios da
Responsabilidade Civil do Médico:59:
O primeiro documento histórico que trata do erro médico é o
Código de Hammurabi (1790 – 1770 a.C), que impunha ao
55 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.47. 56 FRANÇA, Genival Veloso de, Direito Médico, p.28. 57 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.47. 58 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.47. 59 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.48.
27
cirurgião a máxima atenção e perícia no exercício da profissão;
em caso contrario, desencadeava-se severas penas que iam até a
amputação da mão do medico imperito (ou desafortunado). Tais
sanções eram aplicadas quando ocorria morte ou lesão ao
paciente, por imperícia ou má pratica, sendo previsto o
ressarcimento do dano quando fosse mal curado um escravo ou
animal.
Hildegard Taggesell Giostri60 demonstra em seu registro
que:
O Código de Hammurabi previa penas rigorosas ao médico que
de alguma maneira contribuísse para a morte de um paciente ou o
deixasse cego ainda que se esse paciente fosse um awilum61,
seria-lhe cortada a mão, porém, se o morto fosse um escravo,
deveria substituí-lo por outro.
Rígida e inflexível, a legislação de Hammurabi62 recepciona
primeiramente uma noção de vingança delimitada pelo Estado, para só depois
apresentar idéias pertinentes às modernas indenizações, como hoje são
conhecidas por toda nossa sociedade. Não havia, no momento de efetivar a
responsabilidade, uma distinção formal entre ilícito civil e criminal, na forma em
que os regramentos atuais procuram classificar. 63
Percebe-se assim, que não havia ainda o conceito de culpa,
num sentimento jurídico moderno, enquanto vigorava a responsabilidade objetiva
coincidente com a noção atual, qual seja, se o paciente morreu em seguida à
intervenção cirúrgica, o médico o matou e, portanto deverá ser punido64.
60 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada, p.26. 61 Awilum: é o termo usado para designar o homem livre, com todos os direitos de cidadão. 62 Hammurabi: nascido supostamente por volta de 1810 a.C. e falecido em 1750 a.C., foi o sexto rei da primeira dinastia babilônica. Conseguiu, durante o seu reinado, conquistar a Suméria e Acádia, tornando-se o primeiro rei do Império babilônico. Tornou-se famoso por ter mandado compilar o mais antigo código de leis escritas, conhecido como Código de Hamurabi no qual consolidou uma legislação pré-existente, transcrevendo-a numa estela de diorito em três alfabetos distintos.
63 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.48 64 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.48
28
A medicina em Roma era praticada por sacerdotes que
utilizavam à prática curativa. Nessa época existiam muitas superstições o que
fazia com que o povo temesse a novidade que representava a ciência médica65.
No Direito Romano, previa-se punição para a imperícia
médica. Durante a Idade Média eram rigorosamente punidos os médicos que, por
inabilidade, ocasionavam a morte do paciente. A princípio era utilizada a vingança
privada, mais tarde com o advento da Lei Aquília (25 a.C), iniciou-se a
generalização da responsabilidade civil. O ato ilícito, implicava na obrigação de
indenizar a parte lesada e a condenação a uma pena pecuniária. 66
Mas é com a Lex Aquilia de dammo, do século III a.C, que
se formulou um conceito de culpa, bem como fixaram-se algumas espécie de
delitos que os médicos poderiam cometer, como erros derivados da imperícia e
das experiências perigosas67.
Como conseqüência, estabelece-se a obrigação de reparar o
dano, limitando-o ao prejuízo econômico, sem considerar o chamado dano
moral68.
É na Lex Aquilia que se encontram os primeiros rudimentos
de responsabilidade médica, prevendo a pena de morte ou deportação do médico
culpado de falta profissional. Já naquela época havia uma grande quantidade de
reclamações de impunidade médica69.
O modo de exercer a profissão em Roma, não se
distanciava muito do que é hoje, os médicos recebiam os clientes no seus
consultório visitavam, davam conselhos, prescreviam medicamentos, praticavam
intervenções cirúrgicas com auxilio de assistentes70.
65 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.50. 66 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada, p.26. 67 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.49. 68 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.49. 69 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.49. 70 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.49
29
No Egito, os médicos, possuíam elevada posição social,
desde que respeitassem as regras, mesmo que o paciente viesse a morrer, não
eram punidos. Seguindo à risca o livro de regras, livravam-se de toda e qualquer
interpelação judicial. Caso contrário eram punidos com a morte, qualquer que
fosse o desfecho da doença. Para eles problema de saúde era considerado não
um fato privado do cidadão, mais objeto de interesse publico e social, ainda que
de forma limitada71.
Portanto, seriam responsabilizados os médicos que não
tivessem seguindo o ordenamento da época.
Entretanto, o primeiro verdadeiro estudo no campo da
medicina surgiu na Grécia antiga. Trata-se do Corpus Hippocraticum, de
construção filosófica aristotélica que contem noções de uma Medicina não apenas
empírica, mas permeada de elementos racionais e científicos72.
Assim, vai-se lentamente firmando o principio de que a culpa
do medico não se presume somente pelo fato de não ter ele obtido êxito no
tratamento, e sim deve ser analisada com base na conduta exercida pelo
profissional.
O progresso da ciência aliado ao desenvolvimento das
especulações filosóficas, fez com que os médicos não se limitassem a aprofundar
seus estudos no campo da anatomia e dos fenômenos patológicos, embasando
de forma mais adequada a racional a atividade de diagnosticar a cura. 73
Na Grécia, onde encontramos os primeiro estudos
rudimentares no campo da medicina, no Século V a.C (Corpus Hippocraticum),
tínhamos a responsabilidade médica com fundamentos encontrados na regra
egípcias74.
71 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.51. 72 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.51. 73 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.51. 74 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.51.
30
Já no começo do Século XIX, quase desapareceu a
responsabilidade jurídica, com a decisão da Academia de Medicina de Paris, em
1829, que proclamou a exclusiva responsabilidade moral dos profissionais da arte
de curar75.
Atualmente é plena a reparabilidade do dano médico, entre
os povos civilizados, não sendo diferente no ordenamento jurídico pátrio, onde a
responsabilidade do médico é baseada na sua culpa latu sensu (inclui a culpa em
sentido estreito – negligência, imprudência e imperícia – e o dolo), conhecida
como teoria subjetiva da responsabilidade civil, uma vez que, como bem adverte
Miguel Kfori Neto76:
Dar cobertura a todo risco de doença ou morte, em atividade
médica, corresponderia a obrigar o médico a dar a saúde ao
doente, a prolongar a vida, ultrapassando as potencialidades do
médico enquanto homem, para transformá-lo num Deus.
Na idade Moderna (séc. XV até a Revolução Francesa, em
1.789)< foram poucos os progressos ocorridos, em matéria de responsabilização
pelo dano causado a terceiro. Quer dizer, prevaleceram ainda as concepções do
Direito Romano, baseadas na dicotomia consistente na responsabilidade
contratual, em virtude de inadimplemento, ou no dano causado a outrem, pela
pratica de um ilícito77.
Porem, na Idade Contemporânea (a partir da Revolução
Francesa), o advento do Código Civil Francês (1.804), denominado Código de
Napoleão, serviu de marco histórico, acerca do principio da responsabilidade civil
fundada na culpa influenciando a legislação dos paises civilizados, de maneira
geral.
Este pequeno histórico alem da evolução pela qual
passaram os conceitos morais da Medicina, nos dá conta do por que dessa
75 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.52. 76 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.52. 77 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada. P.28
31
profissão ter sido e ainda hoje permanece sendo considerada um profissão
“Magnânima”78.
2.2 RELAÇÃO MÉDICO – PACIENTE
A compreensão da relação existente entre o médico e o seu
paciente é necessária para a conclusão deste trabalho, mormente pelo fato de
que embora em muitos casos, o contrato tácito é de cura ou melhoria na condição
de saúde do cliente médico e, nem sempre, a vista das circunstâncias (gravidade
e estado geral) isso é possível.
Diante deste fato, é que o estudo envereda por esta seara
tão delicada que é a relação contratual entre eles existente.
2.2.1 Noções Gerais
A respeito da natureza contratual da relação médico –
paciente, diz Fabrício Zamprogna Matielo79 em sua obra Responsabilidade civil do
médico:
Durante longo período houve intensa discussão em torno da
natureza jurídica da relação médico/paciente. Isso ocorreu porque
o legislador inseriu o erro médico entre os atos que ensejariam
indenização tendo em vista a sua ilicitude, e não como derivação
da simples inobservância ou descumprimento de obrigação
previamente assumida.
Porém tal entendimento, não segue a linha de René
Savatier80 que diz:81
Entre o médico e o paciente estabelece-se um contrato. Do
conteúdo desse contrato, depende a responsabilidade de um
frente ao outro; se apresenta, portanto como uma 78 Esta percepção decorre em muito do pressuposto: salvar vidas ou lidar com a vida humana, muito comum de ser atribuído aos profissionais médicos no sentido místico da profissão.
79 MATIELO, Fabrício Zamprogna. Responsabilidade civil do médico. 2 ed. Porto Alegre: Sagra Luzzato, 2001 p.44
80 SAVATIER, René, p 375-376. 81 SAVATIER, René, p 375-376.
32
responsabilidade contratual. Após muito tempo decidindo o
contrario, a Corte de cassação reconheceu esse principio. E os
tribunais e cortes de apelação são também unânimes em
confirmá-lo82.
Como também afirma Miguel Kfouri Neto83: "Apesar de o
Código Civil Brasileiro colocar a responsabilidade médica entre os atos ilícitos,
não mais acende controvérsias caracterizar-se a responsabilidade médica como
ex contractu".
Já em 1991, dizia o mesmo Reynaldo Andrade da Silveira84:
Primeiramente, impõe-se situar a responsabilidade civil do
médico, como do tipo de responsabilidade contratual. Muito já se
discutiu na doutrina, com reflexos na jurisprudência dos tribunais,
sobre a responsabilidade do profissional da medicina seria
contratual ou extracontratual. Hoje já não mais paira duvidas a
respeito dessa responsabilidade.
Resta saber que tipo de contrato. É Miguel kfouri Neto85
quem afirma não haver doutrinariamente consenso quanto ao tipo de contrato que
se estabelece entre medico e paciente, já que as mais destacadas tendências
preconizam ser similar esse contrato a um mandato, contrato de empreitada, de
locação de serviços, contrato inominado ou um contrato multiforme.
Encontram-se nesse contrato, características como: ser
intuito personae, bilateral, oneroso ou gratuito, comutativo, aleatório e de caráter
civil. Evidencia-se como um contrato principal, tendo na sua constituição contratos
acessórios.
82Entre le médecin et le malade, intervient un contrat. Du contenu de ce contrat, dépend la responsabilité de l'un envers l'autre; il s'agit donc d'une responsabilité contractuelle. Après avoir paru longtemps décider le contraire, la Cour de cassation a reconnu ce principe. Et les tribunaux et cours d'appel sont maintenant unanimes à l'affirmer.
83 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.71. 84 SILVEIRA, Reynaldo Andrade da. Responsabilidade Civil do Médico. RT, São Paulo. dez.1991, p.60.
85 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.71.
33
A reflexão de Fabrício Zamprogna Matielo86 traz significativa
contribuição ao entendimento dessa relação contratual:
Essa espécie de contratação não encontra espaço particular na
legislação nacional ou como previsão consagrada pela autonomia,
sendo, então figura atípica, inominada, mas nem por isso com
menor tutela jurídica. Para vigorar não necessita de forma
especial, nem de definição exata quanto ao objeto em suas
minúcias, tampouco preço e condições de pagamento. A forma,
como visto, é absolutamente livre, sendo suficiente que se prove a
existência do liame das partes entre si, o que gerará os direitos e
as obrigações pertinentes. Por objeto do contrato não se deve
entender uma cirurgia, ou a ministração deste ou daquele
medicamento, mas a atividade médica globalmente considerada,
isto é, a aplicação zelosa de todos os meios que se fizerem
necessários e estiverem razoavelmente disponíveis.
Para melhor entendimento, Hildegard Taggeselli Giostri87 em
seu livro “Erro Médico À Luz da Jurisprudência Comentada” reporta à
classificação das obrigações proposta nos anos vinte, pelo jurista francês René
Demongue que, considerando o objeto e o conteúdo dessas obrigações,
classificou-se em duas categorias: Obrigação de meios e obrigação de resultado.
Na primeira, o contratante se obriga a utilizar os meios
adequados para alcançar um resultado – o comportamento do profissional,
tecnicamente falando, o agir propriamente dito, é que é englobado na relação
jurídica – cumprindo com a obrigação àquele que se obrigou se, na relação
profissional que se processou, comportou-se de maneira adequada, compatível
com o que foi contratado. 88
Na segunda, o compromisso é de realizar um determinado
ato médico para obter um resultado preciso. Nessa relação, dentro da relação
86 MATIELO, Fabrício Zamprogna. Responsabilidade civil do médico, p.49. 87 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada, p.79-81. 88 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.72.
34
jurídica, se encontra o resultado, sendo esse devido pelo obrigado ao que o
contratou, podendo esse resultado ser uma coisa ou não. 89
O medico no referido contrato, assume uma obrigação de
meio e não obrigação de resultado, ou seja, o médico não se obriga a curar, mas
atuar em conformidade com as regras e os métodos da profissão. Deve, por
conseguinte, envidar todos os esforços para alcançar a cura, mesmo que não a
consiga. Uma prova de erro diagnostica não pressupõe culpa no agir do médico
ao atender o paciente. É a sua própria atuação o objeto do contrato, como bem
descreve Marcos Fridolin Sommer Santos90:
A não obtenção do diagnóstico correto, apenas demonstra que o
resultado esperado não foi alcançado. Mas se o profissional. Na
busca do diagnostico utilizou-se corretamente de todos os meios
que o estado da técnica e as condições de trabalho lhe
proporcionam, não há que se falar em culpa profissional. O objeto
da obrigação, que é a prestação de serviços médicos, não se
confunde com a sua finalidade. O fim é a obtenção de um
resultado correto. A não obtenção do resultado esperado não se
confunde com a violação da obrigação
Já na obrigação de resultado, o profissional médico, fica
obrigado a alcançar o objetivo certo – fim especifico – a que se propôs e, ai, o que
importa é o resultado de sua atuação, pois não o alcançando não terá adimplido a
sua obrigação.
Com a afirmação que, em geral, a obrigação contratual do
médico não é de resultado comunga José de Aguiar Dias91:
O que se torna preciso observar é que o objeto do contrato
médico não é a cura, obrigação de resultado, mas a prestação de
cuidados conscienciosos, atentos, e, salvo de circunstâncias
excepcionais, de acordo com as aquisições da ciência, na formula
da Corte Suprema de França.
89 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.72. 90 SANTOS, Marco Fridolin Sommer. A AIDS sob a perspectiva da responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 1999, p.83.
91 DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade civil, p.255.
35
Em geral, nas especialidades que tenham por finalidade a
cura direta do paciente, como, além de outras, em Medicina Intensiva,
Gastroenterologia, Geriatria, Cirurgia Geral, Cardiologia, o especialista
compromete-se com uma obrigação de meios. Por conseguinte, sua
responsabilidade restringe-se à execução do ato médico, obrando diligentemente,
sempre dentro do estado atual de desenvolvimento da Ciência Médica92.
Por outro lado, há uma série de especialidades cujo objetivo
definido é serem usadas para auxiliarem a alcançar a cura direta do enfermo. No
momento, há juristas com argumentos para se considerar que os médicos
especializados nesta áreas, como, exemplificando, Bioquímica, Análises Clínicas
e Radiologia, se comprometem com uma obrigação de resultado. Por si próprio o
exame por eles realizados não leva à cura93.
Cabe mencionar no que se refere à atividade do médico
cirurgião plástico, é predominante, na doutrina e jurisprudência, o entendimento
de que esse ao executar cirurgias plásticas estéticas - embelezadoras, está
assumindo uma obrigação de resultado. Como ilustra a ementa abaixo
transcrita94:
RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO. RESPONSABILIDADE
CONTRATUAL. CIRURGIA PLÁSTICA. ERRO MÉDICO.
OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MATERIAL E MORAL. COBRANÇA DO SALDO DOS
HONORÁRIOS. PRESCRIÇÃO. PROCEDÊNCIA, EM PARTE, DA
AÇÃO E IMPROCEDÊNCIA DA RECONVENÇÃO. A
responsabilidade civil do médico, como sabido, é contratual,
sendo a obrigação , em princípio de meio e não de resultado.
Todavia, em se tratando de cirurgia plástica, a obrigação é de
resultado, assumindo o cirurgião a obrigação de indenizar pelo
não cumprimento da mesma obrigação. Demonstrado o
inadimplemento, inverte-se o ônus da prova, cabendo ao médico a
obrigação de demonstrar que não houve culpa ou que ocorreu
caso fortuito ou força maior. Indenização pelos danos de ordem
92 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.75. 93 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.75. 94 TJRS – Processo n° 597183383 – 3ª Câmara Cível – Rel. Tael João Selistre – 05/03/98.
36
material e moral. Procedência, em parte, da ação, por ter sido
excluído o pedido de dote. Prescreve em um ano a ação para a
cobrança de honorários médicos, contado o prazo a partir da data
do último serviço prestado. Tendo isso ocorrido em maio de 1993
e a reconvenção protocolada em outubro de 1994, caracterizada
está a prescrição. Sentença mantida. Apelação não provida".
(TJRS – Processo n°597183383 – 3ª Câmara Cível – Rel. Tael
João Selistre – 05/03/98).
Indiscutivelmente, na cirurgia plástica estética (e não na
cirurgia plástica reparadora), verifica-se uma aceitação generalizada de, pela não-
efetivação do resultado, presumir-se a culpa do médico. É diferente da cirurgia
geral, na qual, é pacífico o entendimento de que a obrigação seja de meios.
Predomina, também, na doutrina e na jurisprudência95, o
entendimento de que em caso de execução defeituosa numa cirurgia estética
(frustração do resultado), isso corresponderá juridicamente a uma inexecução
total da obrigação de fazer, por parte do cirurgião plástico.
É considerado, o erro médico, um inadimplemento, bem
definido, do contrato. Contratualmente falando, trata-se de uma conduta bem
caracterizada de falha na prestação de serviços médicos, enquadrando-se na
abrangência do campo da responsabilidade contratual quando acompanhada de
culpa, gerando uma obrigação de indenizar o lesado (aquele paciente que teve o
seu direito violado).
Relevantes para o seu regime jurídico são ainda as
seguintes qualificações:
ü é um contrato civil (nunca é um acto de comércio);
ü é um contrato celebrado intuitu personae;
ü é um contrato de consumo e portanto merecedor da aplicação
das adequadas regras de proteção dos consumidores".
Fica bem nítido o enquadramento no âmbito da
responsabilidade contratual. O erro médico caracteriza-se, pois, via de regra,
95 Doutrinadores: Tereza Ancona Lopez Magalhães, Miguel Kfouri Neto, Fabrício Z.Matielo.
37
como uma quebra do contrato de serviço. Para melhor entendimento, no próximo
subtítulo analisaremos o contrato médico.
2.2.2 Contrato Médico
A natureza jurídica da relação médico - paciente é objeto de
análise da maioria dos doutrinadores que dissertam sobre o instituto jurídico da
responsabilidade civil e, em especial dos que detém da responsabilidade médica.
O embate jurídico gira em torno de a caracterização ser
contratual ou extracontratual. Grande parcela dos doutrinadores firma
posicionamento de que, em todas as ocasiões, o vinculo médico – paciente é
negocial, repelindo a idéia de que possa tratar-se de uma responsabilidade civil
em sentido estrito (Extracontratual).
Alguns juristas, após se defrontarem com o tema, sustentam
ser o debate meramente acadêmico, vez que, independente de ser contratual ou
extracontratual, o dispositivo aplicável à especial sempre será o artigo 951 do
Código Civil Brasileiro96:
Art.951. O disposto nos arts. 948,949 e 950 aplica-se ainda no
caso de indenização devida por aquele que, no exercício de
atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia,
causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.
Esta regra vincula a condenação do médico à ocorrência de
uma conduta culposa, em qualquer de suas modalidades: negligência,
imprudência ou imperícia, lembrando que a responsabilização do médico também
ocorrerá em caso de ato doloso.
Silvio Rodrigues97 se filia à corrente que entende que esta
relação jurídica não mais merece discussão, por ser nitidamente negocial: “ A
96 BRASIL, Código Civil; Comercial; Processo Civil; Constituição Federal/ obra coletiva da autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes, p.353.
97 RODRIGUES Silvio, Direito Civil, p.268.
38
responsabilidade de tais profissionais98 é contratual, e hoje tal concepção parece
estreme de duvida”.
No mesmo entendimento Carlos Roberto Gonçalves citado
por Sílvio Rodrigues afirma que99:
Não se pode negar a formação de um autêntico contrato entre o
cliente e o medico, quando este o atende. Embora muito já se
tenha discutido a esse respeito, hoje não pairam mais dúvidas a
respeito da natureza contratual da responsabilidade médica.
Wanderby Lacerda Panasco100 um dos primeiros juristas a
escrever obra unicamente destinada às repercussões jurídicas da atividade
medica, amparado na lição de Orlando Gomes, entende, assim como os mestres
anteriores, ser contratual, pois:
(...) o médico que atende, em seu consultório particular, um
paciente ou o faça mesmo através de chamado telefônico,
informando-o dos cuidados a tomar, e prescreve produtos
farmacológicos, permite a elaboração de um vinculo contratual.
Estabelece-se consequentemente, um contrato bilateral entre
medico e enfermo, contrato, na realidade, intuitu personae.
Em outra linha de pensamento Jerônimo Romanelo Neto101
discorda sobre a importância da natureza do contrato:
(...) não há duvidas sobre a natureza jurídica da responsabilidade
médica, pouco importa a natureza do contrato que vincula o
profissional a seu cliente, de qualquer modo, em se tratando de
uma obrigação de meio, ao prejudicado cabe o ônus da prova de
infringência dessas obrigações.
Portanto, não se encontra na literatura jurídica moderna
consultada para a realização deste trabalho, quem sustente ser a relação médico
98 O autor está se referindo aos médicos, cirurgiões e aos farmacêuticos. 99 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, p 255 e 256. 100 PANASCO, Wanderby Lacerda, A responsabilidade civil, penal e ética dos médicos, p.48. 101 ROMANELO NETO, Jerônimo. Responsabilidade Civil dos Médicos. 5 ed. São Paulo: Jurídica Brasileira, p.56.
39
- paciente somente de origem aquiliana ou extracontratual. Todavia, há os que
afirmam que o vinculo em apreço é contratual apenas em regra, existindo
situações incongruentes com a teoria contratualista; não restando outra opção,
senão admitir-se, nestes casos, a responsabilidade civil médica extracontratual.
Independentemente de se situarem na corrente contratual do
liame médico – paciente, ou de aceitarem a possibilidade de responsabilidade
aquiliana para tais casos, a questão torna-se sem proveito prático, pois ambos os
posicionamentos impõe ao lesado o ônus de comprovar a culpa102.
Para melhor entendimento deves pontuar os direitos e
deveres do Paciente, conforme disposto no próximo subtítulo.
2.2.3 Direitos e Deveres do Paciente
Além do direito de recorrer ao judiciário para pleitear a
reparação de quaisquer danos que lhe tenham sido culposamente infringidos por
obra do médico, o paciente dispões de outras prerrogativas.
Miguel Kfouri Neto apud E. Christian Gauderer diz103:
Dentre outros, destaca-se o referido autor o direito de o paciente
obter todas as informações sobre seu caso, em letra legível, e
cópias de sua documentação médica: prontuários, exames
laboratoriais, raios X, anotações de enfermagem, laudos diversos,
avaliações psicológicas etc. Em caso de recusa do médico ao
fornecimento desses dados, o hábeas data é remédio jurídico
eficaz para compelir o profissional a conceder tais informações.
Ainda Miguel Kfouri Neto completa que: “O paciente, cônjuge
e filhos, tem o direito de gravar ou filmar os atos médicos que sobre ele recaiam”.
E. Christian Gauderer104 acrescenta que:
102 Culpa em sentido lato, compreendendo neste conceito o dolo. 103 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.31. 104 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.31.
40
Temos o direito de solicitar que os profissionais se reúnam para
discutir nossa doença. O médico seguro de sua competência não
fará objeções. Temos direito a uma morte digna, escolhendo onde
e como morrer, e de recusar tratamentos, internações,
intervenções cirúrgicas.
O paciente tem o dever de remunerar o médico, direta ou
indiretamente105, seguir os conselhos profissionais e realizar rigorosamente as
prescrições. Não fazendo ocorrerá, ocorrerá a resilição do contrato, podendo o
médico abster-se de continuar a lhe prestar assistência106.
Os deveres dos médicos, segundo Miguel Kfouri Neto107,
nascidos dessa relação de natureza contratual que se estabelece entre ele e o
paciente, se situam-se em três momento: antes do inicio do tratamento, durante e
depois do tratamento.
Ainda Miguel Kfouri Neto108 citando Jorge Mosset Iturraspe
diz:
O profissional deve ouvir o paciente, interrogá-lo e averiguar a
etiologia da moléstia: ao paciente incumbe fornecer ao médico
todos os dados que interessem a esse fim, úteis para a formação
do histórico clinico do enfermo. Depois, incumbe-lhe aplicar todos
os seus esforços, utilizando os meios que dispõe, para obter a
cura valendo-se da prudência e dedicação exigíveis.
No caso da cirurgia plástica é fundamental que o cirurgião
médico especializado neste seguimento da medicina, exponha com a maior
amplitude possível ao paciente todos os riscos inerentes a este tipo de cirurgia,
inclusive fazer uma análise profunda de todas as condições físicas e psíquicas do
paciente.
105 Dever de remunerar indiretamente: quando associado a plano de saúde ou beneficiário da Previdência.
106 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.31. 107 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.31. 108 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.31.
41
Não menos importante é fazer com que o paciente ao aceitar
os riscos faça de forma expressa e com testemunhas. Cabendo ao médico ainda
sopesar109 se o beneficio da cirurgia é insignificante em relação ao risco que o
paciente iria enfrentar. Se a analise for que os riscos a ser enfrentados torna-se
muito grande em relação ao beneficio o mesmo não deve executar a cirurgia,
ainda que o paciente assim queira.
2.3 CULPA MÉDICA
Para que seja caracterizada a culpa basta que a conduta
seja voluntária, não sendo necessária a intenção. Para João de Matos Antunes
Varela110, “(...) culpa é no fundo, a imputação ético-jurídica do fato a uma pessoa,
mas imputação no sentido de transcendente da reprovabilidade ou
censurabilidade”.
Diferente do dolo, na culpa o agente não visa causar o
prejuízo à vítima, mas de sua atitude negligente, imprudente ou imperita, resulta
dano a outrem.
O direito civil brasileiro adotou a culpa na teoria da
responsabilidade médica. A vítima, ao provar a imprudência, negligência e
imperícia do profissional deve ser ressarcida.
Miguel Kfouri Neto111, a respeito da culpa dos profissionais
da saúde (art. 1.545, do C/C1916 atual art. 951 do C/C2002), oportuna a
transcrição de comentários de Clóvis Beviláqua:
A responsabilidade das pessoas indicadas neste artigo, por atos
profissionais, que produzem morte, inabilitação para o trabalho, ou ferimento, funda-se na
culpa; e a disposição tem por fim afastar a escusa, que poderiam pretender invocar, de
ser o dano um acidente no exercício de sua profissão. O direito exige que esses
109 Sopesar: Suspender (qualquer coisa) com as mãos para avaliar-lhe o peso. / Equilibrar pesos com as mãos; contrapesar. / Distribuir parcimoniosamente. / V.pr. Ficar em equilíbrio; equilibrar-se.
110 VARELA, João de Matos Antunes. Das obrigações em geral. Coimbra: Almedina, 1982, p.485 111 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.78..
42
profissionais exerçam a sua arte segundo os preceitos que ela estabelece, e com as
cautelas e precauções necessárias ao resguardo da vida e da saúde dos clientes e
fregueses, bens inestimáveis, que lhe confiam, no pressuposto de que os zelem. E esse
deve de possuir a sua arte e aplicá-la, honesta e cuidadosamente, tão imperioso que a lei
repressiva lhe pune as infrações.
Miguel Kfouri Neto112 para caracterizar a culpa médica,
demonstra que os julgadores em geral são muito rigorosos como, por exemplo:
A culpabilidade somente pode ser presumida na hipótese de erro
grosseiro, de imprudência ou imperícia, devidamente
demonstrados. Se os profissionais se utilizaram de sua vasta
experiência e dos meios técnicos indicados, com os habituais
cuidados pré e pós-operatórios, somente uma prova irretorquível
poderá levar à indenização pleiteada. Não tendo sido
demonstrado o nexo causal entre a cirurgia e o evento morte,
correta esteve a sentença dando pelo improvimento da ação.
(RJTJRGS 146/340.)113.
Sendo assim, para que seja caracterizada a negligência
médica, devera haver um ato omissivo, como o abandono do doente, a omissão
de um tratamento e ainda, sempre que o profissional deixar de observar um dever
que a situação do paciente indicar como indispensável para o tratamento.
Haverá imprudência medica sempre que o profissional tomar
atitudes não justificadas, ou seja, atitudes precipitadas, agindo com desprezo às
cautelas necessárias.
Finalmente, tratar-se de imperícia médica, quando houver
incapacidade para o exercício da profissão, seja por falta de habilidade ou por
ausência dos conhecimentos necessários à pratica da função.
Para Hildegard Taggassell. Giostri114,”imperícia é a falta de
habilidade para praticar determinados atos que exigem conhecimento”.
112 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.78-79. 113 RJTJRGS 146/340 114 GIOSTRI, Hildegard Taggasell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada, p.44.
43
Portanto, caracterizada a culpa, não se deve exigir do
julgador profundas discussões cientificas. Para Miguel Kfouri Neto115 “qualquer
juiz medianamente culto e imparcial poderá responsabilizar o medico”.
A prova pericial, embora revestida de caráter técnico e
cientifico, poderá apresentar defeitos, razão pela qual o juiz poderá decidir pelo
não acatamento do laudo, de acordo com o principio da livre convicção.
Alguns princípios gerais para avaliação da culpa médica são
sugeridos por Teresa Ancona Lopez116:
1. quando se tratar de lesão que teve origem em diagnóstico
errado, só será imputada responsabilidade ao médico que tiver
cometido erro grosseiro;
2. o clinico geral deve ser tratado com maior benevolência que o
especialista;
3. a questão do consentimento do paciente em cirurgia que se
recusou terminantemente ao permitir que fosse amputada sua
perna esmagada em acidente, sobrevindo-lhe a morte em
conseqüência de gangrena gasosa. Os médicos que propuseram
a operação não poderiam ter agido de outro modo, dada a
comprovada lucidez do paciente ao rejeitar a intervenção
cirúrgica;
4. o mesmo assentimento se exige no caso de tratamento que
deixe seqüelas, como na radioterapia. E age com culpa grave o
médico que submete o cliente a tratamento perigoso, sem antes
certificar-se da imperiosidade de seu uso;
5. dever-se-á observar se o médico não praticou cirurgia
desnecessária.
6. não se deve olvidar que o médico pode até mesmo mutilar o
paciente, se um bem superior, como a própria vida do enfermo,
exigir;
115 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.80. 116 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez. Responsabilidade Civil dos Médicos, p.308.
44
7. outro dado importante é que o médico sempre trabalha com
uma margem de risco, inerente ao seu oficio, circunstância que
deverá ser preliminarmente avaliada e levada em consideração;
8. nas intervenções médicas sem finalidade terapêutica ou
curativa imediata, cirurgia plástica estética propriamente dita, a
responsabilidade por dano devera ser avaliada com muito mais
rigor.
Apesar de cada caso de culpa médica ser singular, esses
princípios gerais são plenamente observáveis. Não é preciso que a culpa do
médico seja grave: basta que seja certa. A gravidade da culpa, agora, repercutirá
na quantificação da indenização.
2.4 RESPONSABILIDADE MÉDICA
2.4.1 Noções Gerais
A medicina é considerada a ciência mais importante para a
sociedade, pois está relacionada diretamente com a vida, saúde e bem estar,
cabendo ao médico em determinadas situações, o poder sobre a vida do
paciente117.
Sendo assim, a este poder corresponde uma
responsabilidade, sujeitando-o a responder sobre seus atos, tanto na esfera cível
como na criminal e ética.
Para Hildegard Taggassell Giostri,118 “a responsabilidade
médica surge da mesma forma que a responsabilidade civil de qualquer
profissional ou de quem quer que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem”.
Assim, o medico deverá agir com diligência, seguindo as
regras dispostas no Código de Ética Médica.
117 MATIELO, Fabrício Zamprogna. Responsabilidade civil do médico. p.41. 118 GIOSTRI, Hildegard Taggasell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada, p.38.
45
Para Jose de Aguar Dias119, “existem algumas obrigações
cabíveis ao médico em qualquer relação com o paciente, quais sejam: conselhos,
esclarecendo sobre a doença; os riscos; cuidados especiais e abstenção de
abuso ou desvio de poder”.
E ainda segundo o entendimento de João Batista Gomes
Moreira120, “o esclarecimento é o melhor meio de defesa para o médico,
informando-o dos riscos do tratamento”.
No caso de cirurgia, principalmente a estética, a informação
deve ser completa e exaustiva, a ponto de não mais existirem duvidas no
paciente. Assim como, em toda intervenção médica, o profissional deve ter o
consentimento do paciente ou de seu responsável, salvo, nos casos de
atendimento de emergência, havendo risco de vida ou de dano físico irreparável.
Como já visto, a responsabilidade civil dos profissionais da
saúde esta disposta no artigo 951 do Código Civil Brasileiro121.
Art.951. O disposto nos arts. 948,949 e 950 aplica-se ainda no
caso de indenização devida por aquele que, no exercício de
atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia,
causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.
O preceito legal prevê, portanto, que para a caracterização
da responsabilidade civil do profissional será necessária a prova da culpa.
Com o advento do Código de Defesa do Consumidor122, esta
questão veio a se consolidar. O artigo 6º do referido código, dispõe que alem da
verificação da culpa é necessário o ônus da prova em determinados casos, para
que o consumidor defenda seus direitos.
119 DIAS, Jose de Aguiar. Responsabilidade Civil, p.22. 120 MOREIRA, João Batista Gomes, Responsabilidade civil por erro médico. Revista da OAB Goiás, Caderno de Temas Jurídicos. Abril e julho de 2005, p.27.
121 BRASIL, Código Civil; Comercial; Processo Civil; Constituição Federal/ obra coletiva da autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. 3 ed. São Paulo: Saraiva. 2007. p.353.
122 Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.
46
Possível perceber que os usuários dos serviços médicos,
nos dias que atuais, principiam a ter uma idéia mais clara de seus direitos,
enquanto pacientes. Não há propriamente, uma mudança no comportamento das
pessoas em relação aos médicos, que continuam sendo respeitados, acatados e
vistos como benfeitores pela sociedade. O que vem mudando ao longo do tempo,
e a clara percepção do erro inescusável, da imperícia inadmissível, da negligencia
criminosa que impele as pessoas à busca da reparação.
2.4.2 Obrigação de Meio e de Resultado
A obrigação assumida pelo médico para com seu paciente
poderá ser de meio ou de resultado, ou seja, obrigação de meio é aquela em que
o devedor deverá empregar determinados meios sem ter em vista o resultado,
enquanto obrigação de resultado é aquela na qual o médico se obriga a alcançar
um resultado exato, tendo que suportar as conseqüências caso ocorra o contrário.
Ensina Jose Aguiar Dias123 que:
Muitos admitem que o contato de assistência médica seja uma
locação de serviços. Outros, que a forma correta é considerá-lo
um contrato sui generis, em virtude da especificidade e da
delicadeza mais singular entre o profissional e o seu paciente.
Dentro do conteúdo das obrigações positivas, onde se exige
do devedor um comportamento ativo de dar ou de fazer alguma coisa, são
reconhecidas duas modalidades de obrigações: a de meios e a de resultado.
No entendimento de Miguel Kfouri Neto124;
Há obrigação de meios, segundo Demogue, o formulador da teoria
quando a própria prestação nada mais exige do devedor do que
pura e simplesmente o emprego de determinado meio sem olhar o
resultado. É o caso do medico, que se obriga a envidar seus
melhores esforços e usar de todos os meios indispensáveis à
obtenção da cura do doente, mas sem jamais assegurar o
resultado, ou seja a própria cura.
123 DIAS, José Aguiar. Da responsabilidade civil, p.27.. 124 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.80.
47
Portanto, na primeira, existe o compromisso da utilização de
todos os recursos disponíveis para se ter um resultado, sem, no entanto, a
obrigação de alcançar esse êxito tão legítimo. Busca-se, é claro, um resultado,
mas em não se cumprindo e inexistindo a culpa do devedor, não há o que cobrar.
Na obrigação de resultado a prestação do serviço tem um
fim definido. Se não houver o resultado esperado, há inadimplência e o devedor
assume o ônus por não satisfazer a obrigação que prometeu.
Assim entendo, que existe na responsabilidade contratual
civil do médico uma obrigação de meios ou de diligências, onde o próprio
emprenho do profissional é o objeto do contrato, sem compromisso de resultado.
Cabe-lhe, todavia, dedicar-se da melhor maneira e usar todos os recursos
necessários disponíveis. Isso também não quer dizer que ele esteja imune à
culpa.
Segundo o entendimento de Fabrício Zamprogna Matielo125 :
Obrigação de meios é a que vincula o profissional à aplicação
diligente de todos os recursos disponíveis para a melhor condução
possível do caso clinico que será alvo dos seus préstimos. O
médico não fica adstrito a um resultado final, mais tem de envidar
todos os esforços e utilizar-se dos aparatos técnicos que
estiverem razoavelmente ao seu alcance.
A existência de obrigação de meios seria a justificativa da
liberdade de atuação do profissional da área médica, haja vista, o fato de que
muitas doenças são ainda incuráveis e todo esforço contra elas despendido nada
mais do que uma tentativa de minimizar sofrimento.
Assim, enquanto a obrigação de meios desaparece ao
serem utilizados os recursos e os mecanismos apropriados para o quadro clínico,
a obrigação de resultado somente promove a desvinculação do dever mediante a
verificação total do objetivo fixado.
Para Teresa Ancona Lopez126: 125 MATIOLO, Fabrício Zamprogna. Responsabilidade civil do médico, p.53.
48
A questão da presunção da culpa e conseqüente inversão do ônus
probandi não se liga a divisão entre a culpa contratual aquiliana,
mas sim ao fato de a doutrina e a jurisprudência, mais
recentemente, interpretarem as obrigações contratuais como
obrigações de meio e obrigações de resultado, pois neste último
caso haverá inversão do ônus da prova e a vítima da lesão ficar=a
em posição mais cômoda. Ora, obrigação de meios o que se exige
do devedor é pura e simplesmente emprego de determinados
meios sem ter em vista o resultado. É a própria atividade do
devedor que está sendo objeto do contrato. Esse tipo de
obrigação é o que aparece em todos os contratos de prestação de
serviços, como o de advogado, médicos, publicitários, etc. desta
forma, a atividade médica tem de ser desempenhada da melhor
maneira possível com a diligência necessária e normal dessa
profissão para melhor resultado, mesmo que este não seja
conseguido. O médico deve esforçar-se, usar de todos os meios
necessários para alcançar a cura do doente, apesar de nem
sempre alcançá-la.
Portanto, na obrigação de meios a finalidade é a própria
atividade do devedor e na obrigação de resultado, o resultado desta atividade.
Sendo assim, podemos perceber que a obrigação do médico pode ser de meios,
como geralmente é, mas também de resultado, no caso da cirurgia plástica
estética.
A obrigação de resultado, onde se exige o devedor ativo de
dar ou fazer alguma coisa, parece à cobrança contratual dos prestadores de
serviços de coisas materiais, ao não cumprirem a promessa quantitativa ou
qualitativa de uma empreitada.
Mesmo assim, qualquer que seja a forma de obrigação de
meios ou de resultado, diante do dano, o que se vai apurar é a responsabilidade,
levando em conta principalmente o grau da culpa, o nexo de causalidade e a
dimensão do dano, ainda mais diante das ações de indenizações por perdas e
danos.
126 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez. Responsabilidade Civil dos Médicos, p.113.
49
No ato médico, a discutida questão entre a culpa contratual
e a culpa aquiliana, e, em conseqüência a existência de uma obrigação do meio
ou obrigação de resultado, parece-nos apenas um detalhe. Na pratica, o que vai
prevalecer mesmo é a relação entre a culpa e o dano, pois até mesmo a
exigência do ônus probandi hoje já tem remédio para a inversão da prova,
qualquer que seja a modalidade de contrato.
2.4.3 Responsabilidade Médica e o Código de Defesa do Consumidor
O artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor127 dispõe
sobre a responsabilidade por danos causados aos consumidores por serviço
prestado de forma defeituosa e consagra a responsabilidade objetiva, in verbis:
O fornecedor de serviço responde independentemente da
existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos
consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem
como por informações insuficientes e inadequadas sobre a sua
fruição e riscos.
O parágrafo 4º do referido dispositivo, mantém em relação
aos profissionais liberais a verificação da culpa como pressuposto da
responsabilidade.
Comentando tais preceitos, Zelmo Denari128 assinala:
(...) os médicos são contratados com base na confiança que
inspiram aos pacientes. Assim sendo, somente serão
responsabilizados por danos quando ficar demonstrada a
ocorrência da culpa subjetiva, em quaisquer das suas
modalidades, negligência, imprudência ou imperícia.
Para Miguel Kfouri Neto, apud Antonio Herman de
Vasconcelos Beijamin129:
127 Lei 8.078 de 11.09.1990 – Artigo 14 128 DENARI, Zelmo. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado por autores do
ante projeto, p.95. 129 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.199.
50
Em todo seu sistema, prevê uma única exceção ao principio da
responsabilização objetiva para os acidentes de consumo seriam
os serviços prestados por profissionais liberais, dentre eles os
médicos, para os quais se manteve o sistema baseado na culpa.
Necessário salientar que a exceção não atinge as pessoas
jurídicas, se o médico trabalhar par um hospital, responderá ele apenas por culpa,
enquanto a responsabilidade civil do hospital será apurada objetivamente.
Comentando tais preceitos, Miguel Kfouri Neto130 assinala
que:
Em suma, existindo vinculo empregatício entre o médico e a casa
hospitalar, a vítima demandaria a reparação em face do
estabelecimento, apenas provada a efetiva ocorrência do dano –
incumbindo ao hospital provar as excludentes do art. 14, como
único modo de se exonerar do encargo.
E ainda quanto à problemática da caracterização da
responsabilidade objetiva ou subjetiva Miguel Kfouri Neto131, concluiu da seguinte
forma:
O dano médico deve ser apreciado a partir da analise do elemento
subjetivo, da culpa, quer seja o profissional vinculado a
estabelecimento hospitalar ou não. Objetarão os estudiosos das
relações de consumo que a conclusão contraria o sistema do
Código, inteiramente voltado a responsabilidade objetiva. Dirão,
mais, que em havendo culpa do médico, o hospital poderá voltar-
se, por direito de regresso, contra seu empregado. Acrescentarão,
por fim, que ao consumidor/vítima interessa pleitear o
ressarcimento da pessoa jurídica, economicamente mais
poderosa.
Com relação à responsabilidade do médico face ao Código
de Defesa do Consumidor, não há unanimidade na doutrina e jurisprudência, haja
vista a divergência quanto o parágrafo 4º do artigo 14, que isenta a
responsabilidade objetiva dos profissionais liberais, prevalecendo então, a
130 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.199. 131 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.200.
51
responsabilidade subjetiva, sendo fundamental a comprovação do elemento culpa
por parte do agente.
2.5 AVALIAÇÃO DA RESPONSABILIDADE MÉDICA
Avaliar não é algo que se realize de forma simples,
principalmente quando tratamos de dano e, especialmente quando se trata de
dano estético, que atinge o ser humano de forma bastante contundente.
Isso torna ainda mais difícil determinar o grau de
responsabilidade de um médico quando da ocorrência de algum dano em seu
paciente, aliás, como ensina Teresa Ancora Lopez132:
Deverão ser apreciadas certas circunstâncias para caracterização
da responsabilidade médica. Se houver infração contratual, isto é,
descumprimento de deveres estabelecidos contratualmente,
deverá ser analisado se a obrigação contratada era de meio ou de
resultado.
Caso haja infração a dever extracontratual, ou seja, lesão a
direito subjetivos absolutos, como saúde, integridade física e vida, neste caso
teremos o concurso de duas responsabilidades, a contratual e a extracontratual
também conhecida como aquiliana.
De qualquer forma, deverão ser analisadas as circunstâncias
objetivas do dano, local, espécie e extensão da lesão. A medida do dano será
proporcional à indenização.
E ainda, para caracterização da responsabilidade civil do
médico, deverá ser realizado um exame das circunstâncias subjetivas da vítima e
do ofensor não só da saúde anterior, como da parte psicológica do paciente.
Ressalta Teresa Ancona Lopez Magalhães:133
132 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez. O dano estético, p.87. 133 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez. O dano estético, p.87.
52
Devemos lembrar que o médico sempre trabalha com uma zona
de risco a seu favor, pois cada pessoa é uma e as reações dos
indivíduos ao mesmo tratamento podem varias, sendo impossível
prever o resultado.
E ainda, na avaliação da culpa médica, deverão ser levados
em conta alguns princípios e regra gerais, como por exemplo: 1) Dever de
informação, regra básica de qualquer tratamento ou intervenção, presente
também durante todo tempo de tratamento. 2) Consentimento do paciente, ou de
sua família, seja expresso ou tácito, principalmente quando se coloca a risco de
vida, mutilação ou seqüelas (informação-consentimento). 3) Tipos de pratica
médica. O erro de diagnóstico somente leva a condenação quando for por total e
grave imperícia, imprudência e negligência.
Diante de todo exposto, mostraremos a seguir, em outro
subtítulo, algumas causas excludentes da responsabilidade civil do médico.
2.6 CAUSAS EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO
As causas que excluem a responsabilidade civil são
também, aquelas que excluem a ilicitude penal, ou seja, são fatos atípicos ou de
exclusão da antijuridicidade, conforme preconiza o Código Penal134:
Art. 25: entende-se legítima defesa quem, usando
moderadamente dos meios necessários repele injusta agressão,
atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Legitima defesa, age em legitima defesa quem, com o uso
moderado dos meios, repele injusta agressão, atual e iminente, a direito seu ou a
outrem. Vale lembrar que haverá responsabilidade se terceiro for atingido, embora
cabível ação regressiva contra o agressor.
Art. 24: Considera-se em estado de necessidade quem pratica o
fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua
vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio,
cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
134 DELMANTO, Celso et al. Código Penal Comentado. 5 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p 45.
53
§ 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever
legal de enfrentar o perigo.
§ 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito
ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.
Estado de necessidade consiste na ofensa de direito alheio
para remover perigo iminente, quando as circunstâncias o tornam absolutamente
indispensável e quando não exceder o limite necessário para a remoção do
perigo. Como por exemplo, tem-se o médico que sacrifica a vida de um feto para
salvar a vida da mãe. O artigo 23 do Código Penal explicita:
Art. 23 - Não há crime quando o Agente pratica o fato:
I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular
de direito.
Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste
artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.
Exercício regular de direito e cumprimento de dever legal –
O dever legal é decorrente de qualquer tipo de norma legal, seja ela, penal, civil
ou administrativa. Para restar caracterizada deve ter sido conduzida em estrita
obediência aos limites do dever, caso contrario pode configurar abuso de direito.
Fato exclusivo de terceiro – Figura ao lado do caso fortuito
ou força maior135 como expressão de “causa estranha”. Para a doutrina em
135 Caso fortuito ou força maior – Caso fortuito é o fato imprevisível provindo da natureza sem qualquer intervenção humana. Na força maio o agente não tinha possibilidade de evitar o resultado danoso ainda que previsível. Na pratica são figuras que se equivalem. Consistem no fato necessário, cujos efeitos eram impossíveis de evitar ou impedir. Não basta que tenha sido um mero imprevisto para o médico, devem ser excepcionais para ele e pra as outra pessoas que se colocadas em seu lugar também não poderiam prevê-lo ou evita-lo.
54
geral, somente exonera a responsabilidade quando afasta totalmente o nexo de
causalidade136.
Fato da vítima exclusivo ou concorrente – A culpa da vítima,
quando exclusiva, elide a causalidade entre o dano e o fato. A culpa concorrente
gera uma responsabilidade bipartida, fazendo com que cada um responda
proporcionalmente a sua parcela de culpa, conforme disciplina o art. 21 do Código
Penal.
Art. 21 : O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a
ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá
diminuí-la de um sexto a um terço.
Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou
se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era
possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.
Erro de ignorância – O erro configura-se como a falsa
representação da verdade e quando inevitável isenta de pena. A ignorância
pressupõe total desconhecimento a respeito de determinada matéria.
Dessa forma, percebe-se que as causas que excluem a
responsabilidade civil são resumidas e o ônus probatório caberá ao médico.
2.7 SEGUROS MÉDICOS
O seguro nada mais é que a transferência da
responsabilidade civil, de uma pessoa física ou pessoa ou jurídica, para uma
instituição, a qual dispõe maiores recursos econômicos para prestar o pronto
atendimento das indenizações pleiteadas. Desta forma, o seguro passa ao publico
a idéia de segurança. Lembra-se que este tipo de seguro é denominado seguro
mal práxis.
136 Ausência de nexo de causalidade - Não existe nexo causal entre o dano e o fato não há o que se falar em responsabilidade Civil.
55
Assim, melhor se faz em adotar os órgãos de defesa do
consumidor, para mostrar as condições do médico no mercado de trabalho, suas
dificuldades e as situações em que são expostos os médicos.
Jerônimo Romanelo Neto137 entende ser:
Necessária a criação de um seguro para médicos e hospitais que
venha, efetivamente, cobrir os danos e prejuízos causados a
pacientes por erros decorrentes de tratamentos, intervenções
cirúrgicas, diagnósticos, aparelhos médicos, etc. É a forma mais
pratica de pode o médico prosseguir o seu trabalho com maior
tranqüilidade; e poder o paciente, em caso de sofrer dano ou
prejuízo, ser real e efetivamente ressarcido. Entretanto,
ressalvamos que a lei para esse tipo de seguro deverá conter
disposições mais especificas e mais rígidas do que as destinadas
aos seguros existentes atualmente em nosso pais, pois, do
contrario, poderiam as companhias seguradoras eximir-se de sua
obrigação de pagar o sinistro ou questioná-las.
Diz ainda, Miguel Kfouri Neto138 que:
Tais seguros excluem os danos estéticos, atos e intervenções
proibidos por lei, favorecimento ou convivência com o terceiro
reclamante, quebra de sigilo profissional, tratamento radiológico e
similares (salvo convenção em contrário), difamação ou calúnia e
uso de técnicas experimentais com medicamentos ainda não
aprovados pelo órgão competentes.
A classe médica diverge muito em relação ao contrato de
seguro médico, pois uma parte da classe considera o prévio reconhecimento da
incapacidade e incompetência do profissional, enquanto outros membros da
categoria consideram tão somente um meio de prevenção, achando que se deva
fazer um seguro de responsabilidade civil por dano a terceiros, para que não
venham a sofre um aniquilamento no seu patrimônio quando eventualmente
ocorrer dano a um paciente. Com esse seguro ficaria garantido o exercício de sua
atividade, bem como a indenização ao lesado.
137 ROMANELO NETO, Jerônimo. Responsabilidade civil dos médicos, p.178-179. 138 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.28.
56
CAPÍTULO 3
RESPONSABILIDADE CIVIL DOS CIRURGIÕES PLASTICOS
3.1 CIRURGIA PURAMENTE ESTÉTICA X CIRURGIA ESTÉTICA
REPARADORA
De acordo com estudos históricos a cirurgia plástica surgiu
como especialidade a partir de 1914, diante da necessidade de readaptar os
soldados que retornavam da guerra. Já no fim do século XIX, os estudiosos da
medicina, a partir das primeiras próteses nasais, começaram a descobrir a
cirurgia plástica dando origem ao que hoje se chama rinoplastia139.
Inicialmente convêm demonstrar que a cirurgia estética se
subdivide em duas modalidades: a) cirurgia de caráter estritamente estético
(cirurgia puramente estética) e b) cirurgia estética lato sensu (cirurgia estética
reparadora).
Segundo Miguel Kfouri Neto140, cirurgia de caráter
estritamente estético é:
(...) na qual o paciente visa a tornar seu nariz, por exemplo – que
de modo algum destoa da harmonia de suas feições - , ainda mais
formoso, considerando, por vezes, um modelo ideal de beleza
estética. Neste caso, onde se expõe o paciente a riscos de certa
gravidade, o médico se obriga a um resultado determinado e se
submete à presunção de culpa correspondente e ao ônus da
prova para eximir-se da responsabilidade pelo dano
eventualmente decorrente da intervenção (a jurisprudência
alienígena registra caso de cirurgião que, no propósito de corrigir
a linha do nariz, terminou por amputar parte de órgão).
139 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.56. 140 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.182.
57
Portanto, é notório que a cirurgia plástica de caráter
estritamente estético, como bem diz o titulo, seja única e exclusivamente voltada
ao modelo ideal de beleza estética. Cirurgia esta que faz gerar uma obrigação de
resultado por parte do medico, aonde o mesmo, deverá apreciar com imenso rigor
os detalhes, pois, quando uma pessoa procura um cirurgião plástico no intuito de
melhorar seu aspecto externo, deseja exatamente o resultado almejado e para
que este seja alcançado faz-se necessária a aplicação de maior diligência e
conhecimento cientifico do profissional.
Para Rui Stoco141:
(...) esse maior rigor vem sendo enfatizado com relação a cirurgia
meramente estética, pois a chamada plástica reparadora é
considerada tão necessária quanto qualquer outra intervenção
cirúrgica, pois tem a mesma finalidade terapêutica que as demais.
Na obrigação de resultado o dever, ao contrario, obriga-se a
chegar a determinado fim sem o qual não terá cumprido sua
obrigação. Ou consegue o resultado avençado ou deverá arcar
com as conseqüências.
Como bem definido por Rui Stoco, na cirurgia de caráter
estritamente estético o médico se obriga chegar a um resultado exitoso, caso
contrario, terá cumprido sua obrigação imperfeitamente. Logicamente o contrato
será inexitoso, restando para o mesmo, conseqüências de descumprimento de
contrato.
Teresa Ancona Lopez Magalhães 142 enfatiza que:
Ramo da medicina bem desenvolvido hoje e o que diz respeito as
operações que visam melhorar a aparência externa de alguém.
Isto é, que objetivam o embelezamento da pessoa. São operações
plásticas estéticas ou cosmetológicas. Tais intervenções foram
muito combatidas no passado e, atualmente, apesar de aceitas e
até em moda, a responsabilidade pelos danos produzidos por elas
é vista com muito maior rigor que as operações necessárias a
saúde e vida do doente.
141 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua interpretação jurisprudencial, p.199. 142 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez. O dano estético, p.90-91.
58
Todavia, somente a plástica estética propriamente dita
recebe esse tratamento, porque a plástica reparadora é considera tão necessária
quanto qualquer outra operação, tendo da mesma forma finalidades terapêuticas
como nos casos, por exemplo, de queimaduras deformantes.
Com relação a cirurgia estética lato sensu (cirurgia estética
reparadora), diz Miguel Kfouri143 Neto:
(...) que não encerra risco relevante ao paciente e se destina a
corrigir pequena imperfeição da natureza, que ocasiona mal-estar
psíquico à pessoa. Tem-se, aqui, o caso da paciente, jovem, de
belo rosto, no qual sobressai nariz aquiliano e de linhas
irregulares, em absoluta desarmonia estética. Ao corrigir a
distorção, deverá o medico atentar ao dever de prudência
normalmente exigido – e não está adstrito a uma obrigação de
resultado. O resultado estético é subjetivamente apreciado pelo
paciente.
Para tanto, a cirurgia estética lato sensu, tem como objetivo
a correção de pequenas imperfeições da natureza, que ocasiona mal-estar
psíquico ao paciente. Exemplo o aluno que tem orelhas grandes, que é torturado
psiquicamente pelos colegas de turma, sendo apelidado de orelhudo, dumbo144,
telefone orelhão etc. Paciente este que se submete a uma cirurgia reparadora
procurando amenizar seu sofrimento.
No mesmo sentindo a distinção formulada por Hildegard
Taggsell Giostri145: “As cirurgias plásticas do tipo reparadora se destinam a
corrigir defeitos congênitos ou adquiridos”.
Nos casos da cirurgia estética reparadora prevalece a regra
geral da obrigação de meio, e não de resultado. Quando a cirurgia meramente
estética há uma forte corrente de doutrinadores que entende que a obrigação
143 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.183. 144 Dumbo: Personagem da Walt Disney que tinha orelhas grandes e voava com as mesmas. 145 GIOSTRI, Hildegard Taggasell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada, p.42.
59
assumida pelo cirurgião é de resultado, ocorrendo culpa presumida quando o
resultado esperado não é atingido146.
No caso de cirurgia reparadora, se o resultado não foi obtido
e não foi agravado o estado do paciente, ao médico caberá restituir-lhe aquilo que
pagou pelo serviço.
Porém, no caso de cirurgia puramente estética, se o
procedimento não alcançar o resultado pretendido e agravar a situação do
paciente, a jurisprudência pátria tem entendido que caberá ao médico restituir o
que recebeu ou deixar de receber o valor contratado, e ainda, submeter o
paciente a nova cirurgia.
Caso o defeito não seja corrigível, o medico responsável
devera devolver tudo o que recebeu e, além disso, deverá indenizar o paciente
pelo dano estético criado, na proporção do dano e sues efeitos.
Neste sentido ementa do Egrégio Tribunal de Justiça de São
Paulo:
Indenização – Responsabilidade Civil – Ato ilícito – Dano estético
– Deformidade causada por erro medico em cirurgia plástica –
Condenação do réu no custeio de outra cirurgia reparadora –
escolha do medico e do hospital a critério da autora – verba fixada
na fase de liquidação, que será por artigos – Sentença
confirmada. (TJSP – 6ªC – Apelação – Relator Melo Junior,
julgamento em 19/12/91 TJSP 137/182).
No caso das cirurgias plásticas mal conduzidas e mal
executadas, os tribunais tem entendido que naquela que resultem deformação
física no paciente, causando-lhe depressão psíquica, terá direito inclusive aos
lucros cessantes.
Tratando em deformidade deve-se verificar afinco o que é
dano estético e como é configurado. No subtítulo a seguir estará demonstrado
todo seu conceito e características.
146 STJ – 3ª Turma – Resp 10.536 RJ - Rel. Min. Dias Trindade- AC 21/06/91 – RSTJ33/55
60
3.2 DANO ESTÉTICO
Para que seja configurado o dano estético, deve haver uma
modificação na aparência da pessoa, em relação a aparência que mantinha antes
do fato que ensejou o dano.
Para Miguel Kfouri Neto147:
(...) caracteriza o dano estético a lesão à beleza física, à harmonia
das formas externas de alguém. Sendo assim, o dano estético
pode ser definido com qualquer modificação duradoura ou
permanente na aparência externa de uma pessoa, modificação
esta que acarreta um “enfeitamento” e lhe cause humilhações e
desgosto, dando origem, portanto a um dano moral (...)
Portanto, todo procedimento que resulta em uma lesão na
qual modifique as formas do paciente, caracteriza o dano estético. Essa
modificação pode resultar em uma humilhação na qual acarreta no dano moral.
Na lição de Wilson Melo da Silva148:
(...) o dano estético, na esfera civil do Direito Civil, não seria
apenas o aleijão. Abrangeria também as deformidades ou
deformações ouras, as marcas e o defeitos, ainda que mínimos e
que pudessem implicar, sob qualquer aspecto, um “afeitamento”
da vítima.
Para a responsabilidade civil, ao contrario da penal, basta a
pessoa ter sofrido uma transformação, deixando de ter a aparência que tinha,
sem a necessidade de deformação ser grave, apenas comprovando a
modificação com relação à aparência anterior.
Ressalta Teresa Ancona Lopez Magalhães149 que:
147 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.104. 148 SILVA, Wilson de Melo, apud KFOURI NETO, p.104. 149 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.101.
61
(...) A modificação deverá ser exterior, no entanto não é
necessário que seja visível, basta que ela exista no corpo da
pessoa. Ainda, que o defeito seja notado através dos movimentos
do corpo, também pode ser considerando dano estético.
Conforme o texto acima, mister se faz ressaltar que não é
necessário que o dano estético seja visível, basta que o mesmo exista no corpo
da pessoa.
3.3 DANO MORAL
Etimologicamente, dano vem de derame, que significa tirar,
apoucar, diminuir150.
No entendimento de Miguel Kfouri Neto151:
Nos dias que correm, nenhuma duvida há quanto à plena
possibilidade de se compensar o dano moral, ou seja, o dano
decorrente de “privação ou diminuição daqueles bens que têm um
valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade
de espírito, a liberdade individual, a integridade física, a honra e is
demais sagrados afetos (...) dano que afeta a parte afetiva do
patrimônio moral (dor, tristeza saudade etc); e dano moral que
provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz
deformante etc), e dano moral puro (dor, tristeza etc). O art. 186
do novo CC brasileiro consagrou, agora também no âmbito
infraconstitucional, a plena reparabilidade do dano, ainda que
exclusivamente moral. Também esses danos não-patrimoniais
podem originar-se ato culposo do médico, acarretando o dever de
compensação.
Portanto, a idéia de dano surge das modificações do estado
de bem-estar da pessoa, que vem em seguida à diminuição ou perda de qualquer
dos seus bens originários ou derivados, extrapatrimoniais ou patrimoniais. O dano
portanto é um diminuição no patrimônio, tanto material como moral.
150 FERNANDES, Francisco. Dicionário brasileiro Globo. 32 ed. São Paulo: Globo, 1993. p.421. 151 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico, p.106.
62
O dano moral poderia ser definido como o dano que traz
prejuízos a bens ou valores que não possuem cunho econômico.
Segundo Teresa Ancona Lopez Magalhães152:
(...) o dano moral se divide em três espécies, quais sejam, dano
moral objetivo, dano moral subjetivo e dano moral à imagem
social.(I) O dano moral objetivo seria aquele que ofende os
direitos da pessoa tanto no aspecto privado, quanto no aspecto
publico, com direito à vida, liberdade. (II) O dano moral subjetivo,
seria a ofensa aos valores íntimos da pessoa, nas suas afeições.
Como sofrimento dos pais pela perda do filho amado. Este tipo
integra e é absorvido pelos danos morais à pessoa, mas podem
constituir em dano autônomo, quando somente a dor esta sendo
objeto de reparação. (III) A terceira espécie seria o dano moral a
imagem social, a constituição federal não se refere ao aspecto
físico da pessoa, mas a sua dimensão ética perante a
coletividade, implicando necessariamente um dano moral. É a
imagem social que se diferencia do direito à própria imagem, que
alguns autores correlacionam ao direito à intimidade e outros ao
direito à honra; é, portanto, o direito de não ver produzida nem
desrespeitada a sua imagem física, qualquer representação da
pessoa, não autorizada.
Portanto o dano moral objetivo seria aquele que ofende os
direitos da pessoa (aspecto privado e publico). O dano moral subjetivo seria a
ofensa aos valores íntimos da pessoa. E por fim o dano moral a imagem social é
o direito de não ver produzida nem desrespeitada a imagem física da pessoa.
Sobre o tema dispõe Yussef Said Cahali153:
(...) Se inclui na integridade corporal a integridade de aparência,
da imagem, principalmente os tipos da face e os movimentos
habituais de uma pessoa e haverá atentado a existência física não
somente em caso de ferimento, mas também quando o gravame é
feito à aparência física (...) cada individuo poderá ser julgado pela
sua aparência, e esta aparência pode favorecer ou prejudicar o
desenvolvimento de sua personalidade.
152 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.101. 153 CAHALI, Yussef Said: Dano moral. São Paulo: RT, 2005, p.70.
63
Portanto, o dano moral existe porque o sofrimento existe não
só por causa dos aleijões, das desfigurações e doenças, mas também porque no
meio social sua imagem mudou, levando a uma dupla desgraça.
No exercício da medicina danos estético podem acontecer
em qualquer de seus campos, tanto em tratamentos de pele, aplicações de
radioterapia, operações curativas, e também, pela cirurgia estética, da qual
trataremos no próximo item.
3.4 O DANO ESTÉTICO COMETIDO POR CIRURGIÕES PLÁSTICOS
No ramo da cirurgia estética, cabe ao médico agir de
maneira mais cautelosa possível, e por ser uma cirurgia realizada em pessoa sã,
deverá agir com mais cuidados do que aquele que vai operar pessoa doente, para
o qual muitas vezes não resta nenhuma alternativa.
Dessa forma, cabe ao cirurgião informar o paciente
claramente dos riscos pelos quais vais passar – dever de informar
expressamente. Se os perigos forem maiores que as vantagens, deve negar-se a
operar154.
Alem disso, deverá analisar o estado psicológico do
paciente, verificando se o momento é propicio para uma mudança do aspecto
externo da pessoa.
Nesse assunto, algumas considerações devem ser feitas,
tendo em vista a existência das duas correntes doutrinarias a respeito da natureza
da obrigação ser de meio ou de resultado.
Segundo Teresa Ancona Lopez Magalhães 155:
(...) A corrente que considera a culpa estética como obrigação de
meio afirma que esta intervenção tem a álea de qualquer outra.
Dentre seus defensores temos os juristas Luis O. Adorno e Ruy
154 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.91. 155 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.93.
64
Rosado Aguiar Junior. De outro lado, a corrente que defende a
obrigação de resultado vê a cirurgia plástica como a obrigação de
cumprir-se o que se prometeu, caso contrário, estará o devedor
inadimplente.
Ainda Teresa Ancona Lopez Magalhães,156 diz que o
problema pode ser equacionado da seguinte forma:
Quanto ao ato cirúrgico propriamente dito e suas complicações,
considera-se a área de toda a intervenção. Sendo assim,
estaremos diante de uma obrigação de meio. Sobre a mudança
estética prometida, que constitui o fim e a causa da operação, não
há como considerar obrigação de resultado. Ou seja, foi feito um
croqui, um desenho do que se pretende. O resultado final tem de
ser alcançado e, conforme o modelo, o desenho. É considerada
uma escultura que tem que dar certo. Mas pode ser que, além de
não cumprir o prometido no contrato, o médico plástico cause
dano a pessoa operada. Daí estaremos diante da
responsabilidade extracontratual, que poderá ser cumulada com a
contratual até a vítima seja totalmente ressarcida em seus danos
estéticos, morais e materiais.
Portanto, mesmo que se considere a cirurgia plástica
obrigação de meios, o médico que não cumpriu o que estava no contrato foi
inadimplente e deverá pagar por isso, posto que ninguém são vai se sujeitar a
passar por uma operação se não for para ficar melhor.
3.5 AVALIAÇÃO DO DANO ESTÉTICO: SUA INDENIZAÇÃO
A reparação do dano estético apresenta grandes
dificuldades, da mesma forma que enfrentam todos aqueles que tentam ver
ressarcida uma lesão a um direito não patrimonial.
Miguel Kfouri Neto157 diz que:
A avaliação do dano estético deve ser feita por ocasião do
julgamento, o mais tarde possível. A cicatriz, a deformidade, pode
156 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.93. 157 KFOURI, Miguel Neto. Responsabilidade civil do médico,104.
65
atenuar-se. (...) Assim, quando se trata de dano moral ou estético,
apropriado seria falar em compensação, como forma de
restabelecer uma situação que se havia modificado, em função de
prejuízo ou dano causado. Verifica-se , entretanto, larga aplicação
do vocábulo reparação, especificamente em relação ao dano
moral, insuscetível de valoração monetária absoluta.
O que se pretende, com a reparação do dano estético é dar
a pessoa lesada o que lhe é devido. Isto é, o ressarcimento pelo mal sofrido
injustamente. Portanto, haja a dificuldade que houver, o respeito à pessoa e aos
seus direitos devem ser mantidos.
A primeira dificuldade quando se trava de dano
extrapatrimonial era a alegação de que seria imoral compensar a dor sofrida com
dinheiro.
Segundo Tereza Ancona Lopez Magalhães158: hoje essas
objeções estão totalmente superadas. Afirma que, a reparação do dano moral foi
elevada a norma constitucional com apoio irrestrito da doutrina e da jurisprudência
pátrias.
De acordo com a doutrina, o problema mais difícil de solução
na indenização do dano estético é o que se refere a avaliação. A dificuldade
estimada dos sofrimentos de ordem moral, para posterior fixação do quantum
devido pela ofensa, é a grande discussão da doutrina quanto a reparação dos
danos sofridos.
Importante destacar, que a avaliação do dano estético e sua
reparação, não se trata de colocar um preço na dor e, sim, encontrar um meio de
compensar com dinheiro aquele que sofreu injustamente uma lesão a um direito
seu.
158 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.93.
66
Como parâmetro para a questão temos o artigo 949 do
Código Civil159 que diz:
Art. 949: No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor
indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros
cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro
prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.
E ainda, o artigo 950 do referido Código Civil160,
complementa:
Art. 950: Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não
possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a
capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do
tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença,
incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para
que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Parágrafo único: O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a
indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.
Sendo assim, de acordo com o Código de Processo Civil, no
caso de lesão ou outra ofensa a saúde, o ofensor terá que indenizar ofendido das
despesas de tratamento, bem como lucro cessante até o fim da convalescença.
Optando o prejudicado pelo recebimento de indenização arbitrada pelo juiz e
sendo paga de uma só vez.
Na opinião de Teresa Ancona Lopez Magalhães161:
A jurisprudência brasileira poderia seguir diretrizes para chegar,
futuramente, a um padrão básico de conduta diante do caso
concreto, observando as diferenças individuais de cada situação.
159 BRASIL, Código Civil; Comercial; Processo Civil; Constituição Federal/ obra coletiva da autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes, p.353.
160 BRASIL, Código Civil; Comercial; Processo Civil; Constituição Federal/ obra coletiva da autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes, p.524.
161 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.101.
67
Para isso, elaborou critérios, quais sejam, a análise da gravidade
objetiva do dano e as circunstâncias particulares do ofendido.
Para a análise da gravidade do dano, seria levado em conta
a extensão material do prejuízo no caso particular. Tratando-se de lesão
permanente, como a do dano estético propriamente dito, deverá ser observado e
avaliado que tipo de deformidade abatera mais a pessoa lesionada, pois, uma
deformação no rosto poderá ser mais grave que no resto do corpo, da mesma
forma que, a perda de um braço e muito pior que uma cicatriz no rosto.
Quanto às circunstâncias particulares do ofendido, teremos
que ter em conta, a idade, o sexo, as condições sociais e até a beleza da vitima,
pois, o atentado a estética poderá ser mais grave quanto maior for a beleza da
vitima.
Tereza Ancona Lopez Magalhães162, por fim faz uma
ressalva: Ao considerar as condições pessoais da vítima não deve o juiz colocá-la
acima da gravidade do próprio dano. É a extensão deste que vai dar a medida da
indenização.
Essa lição deverá ser considerada, sob pena de ocorrer
grandes injustiças como negar indenização a pessoas humildes ou operários
braçais.
Sendo o dano estético um tipo de dano moral, em certos
casos, poderá ser considerado também dano patrimonial. Neste sentido, Jose de
Aguiar Dias, apud por Yussef Said Cahali163, aduz:
A alteração do aspecto estético, se acarreta maior
dificuldade no granjeio da subsistência, se torna mais difíceis para a vitima as
condições de trabalho, se diminui suas possibilidades de colocação ou de
exercício da atividade a que se dedica, constitui sem dúvida um dano patrimonial.
Não se pode objetar contra a sua reparação, nem quanto, erradamente, se
162 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.101. 163 CAHALI, Yussef Said: Dano moral, p.88.
68
considere dano moral, porque nem apresenta dificuldade para avaliação. Deve
ser indenizado, pois, como dano patrimonial, o resultado prejudicial da ofensa ao
aspecto estético, sempre que se traduza em repercussão de ordem material,
porque a lesão sentimento ou a dor psíquica, com repercussões patrimoniais,
traduz dano patrimonial. É dessa natureza o dano estético que deforme
desagradavelmente as feições, de modo que cause repugnância ou ridículo e
portanto, dificuldades à atividade da vítima.
Danos morais são aqueles danos não patrimoniais, ou seja,
quando não há possibilidade de demonstrar o seu valor, como da honra, dor,
sofrimento, saudade, vergonha, humilhação, entre outras causas. Esses danos,
portanto, pode ter origem em ato culposo ou doloso do ofensor, no caso vertente,
o médico, acarretando-lhe por óbvio a obrigação de compensá-los.’
3.6 DANO ÉSTETICO – CARÁTER ATENTATÓRIO À PERSONALIDADE
Direitos da personalidade são aqueles direitos da pessoa
sobre ela mesma, direitos esses insuscetíveis de serem avaliados em dinheiro.
São as faculdades jurídicas cujo objeto é os diversos aspectos da própria pessoa
do sujeito, bem como suas emanações e prolongamentos. 164
São ainda, as prerrogativas do sujeito em relação as
diversas dimensões de sua própria pessoa. Assim, na sua dimensão física o
homem exerce os direitos sobre sua própria vida, seu próprio corpo. Dentro desta
integridade física, faz parte a saúde e a aparência estética, por isso, a doutrina
afirma ser o dano estético, como o sano moral, uma ofensa a um direito de
personalidade.
Sobre os direitos de personalidade, Carlos Alberto Bittar165,
apud a Limongi França, ensina que:
Com efeito, a ordem jurídica reconhece às pessoas direitos
denominado de personalidade, descritos por Limongi França, os
164 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopez, O dano estético, p.45. 165 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais, p.58.
69
quais incidem sobre elementos materiais e imateriais que
compõem a respectiva estrutura, a fim de possibilitar-lhes a
individualização e a identificação no meio social, permitindo-lhes o
conseqüente alcance das metas visadas. Através desses direitos
é, pois que as pessoas se apresentam, se movimentam e se
afirma no convívio social, perseguindo os objetos eleitos na
realização de sua missão órbita terrestre.
Teresa Ancona Lopez Magalhães classifica os direitos da
personalidade, de acordo com a natureza dos bens jurídicos envolvidos, em
direitos sobre a integridade física, direitos a integridade moral e direitos sobre a
integridade intelectual166.
Os primeiros compreenderiam os direitos a saúde física e a
aparência estética. Os direitos a integridade intelectual abrangeria os direitos das
pessoas sobre suas próprias criações artísticas, literais e científicas, assim como
o direito de manifestar opiniões. Dentre os direitos à integridade moral estaria o
direito a liberdade, a honra, ao segredo, ao recato ao nome, e a própria
imagem.167
Sobre o tema Teresa Ancona Lopez Magalhães168 conclui:
Em resumo, diríamos que o dano estético é a lesão a um direito
da personalidade – o direito a integridade física, especialmente na
sua aparência externa. Como todo direito da personalidade,
qualquer dano que o seu titular possa sofrer vai ter conseqüências
materiais e, principalmente, morais. Portanto não podemos
conceber prejuízo estético que não seja também prejuízo moral,
pois a pessoa a partir do momento da lesão esta menos feliz do
que era antes.
A Constituição Federal de 1988, consagrou os direitos de
personalidade no seu artigo 5º e incisos, assegurando o direito a indenização pelo
dano material ou moral decorrente de sua violação, sendo o dano estético uma
ofensa a um direito de personalidade – o direito à integridade física, o responsável
166 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopes, O dano estético, p.46. 167 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopes, O dano estético, p.46. 168 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopes, O dano estético, p.47-48.
70
pelo dano ficará desde logo, obrigado à reparar os prejuízos, morais e materiais,
causados a vítima.
3.7 CUMULAÇÃO DE DANO ESTÉTICO COM DANO MORAL
Existe grande discussão na doutrina, quanto a possibilidade
de cumulação de dano estético com dano moral. Para a Teresa Ancona Lopez
Magalhães169 não há duvidas de que o dano estético é uma espécie do dano
moral, pois se trata de ofensas a bens inestimáveis, sendo um dano à pessoa.
Entretanto, afirma Teresa Ancona Lopez Magalhães170, que
o dano deformante à integridade física não pode ser considerado igual a qualquer
outro tipo de dano moral, é sem dúvida, a mais grave e mais violenta das lesões à
pessoa, pois, além de gerar sofrimento pela transformação física, o chamado
dano moral objetivo, gera um outro dano moral, que é o dano moral à imagem
social.
Percebe-se então, que ao sofrer um dano estético, a pessoa
deformada sofre uma óbvia e cruel dificuldade para se inserir socialmente, não só
por estar complexada ou triste, mas também porque a sociedade passará a tratá-
la de forma diferente, dificultando ainda mais a condução do problema.
A jurisprudência pátria tem admitido algumas vezes a
cumulação do dano estético com o dano moral, o que, poderá parecer um bis in
idem171, haja vista que o entendimento de que o dano estético é uma espécie de
dano moral, porém, as indenizações serão determinadas sobre fatos distintos, ou
seja, uma pelo dano estético, com grave deformação física, e outra pelas tristezas
e sofrimentos interiores que acompanharão sua vitima para sempre.
Teresa Ancona Lopez Magalhães, soluciona o problema da
seguinte forma:
169 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopes, O dano estético, p.46. 170 MAGALHÃES, Teresa Ancona Lopes, O dano estético, p.125. 171 Bis in idem: Duas vezes sobre o mesmo; repetição.
71
Pensamos que essa celeuma pretoriana poderá ser resolvida de
uma outra forma, sempre no intuito de melhor proteger a vítima do
dano e continuando a admitir a cumulação dos dois tipos de dano
moral, mas sobre outro fundamento. Dessa forma, a base legal
para a admissão da cumulação do dano moral e do dano estético
é o art. 5º, V, da nossa Carta Magna, pois a referida norma
constitucional admite reparação para três tipos de danos: o
material, o moral e o dano à imagem. (...) não se trata do direito à
própria imagem no sentido estrito (que proíbe reproduções não
autorizadas das pessoas), mas da imagem no valor ético, que
inclui o respeito e a aceitação social.
A referida autora, conclui, portanto, que não só é possível,
como justa a cumulação do dano estético com o dano moral, por serem dois tipos
diferentes de danos morais à pessoa, ou seja, atingem bens jurídicos diferentes.
Neste linha de entendimento segue a Jurisprudência do
Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina172:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE MÉDICA -
PERDA DA VISÃO E EVISCERAÇÃO DO GLOBO OCULAR -
DANO MORAL CONFIGURADO - INDENIZAÇÃO QUE ATENDE
AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE, RESPEITANDO A
QUESTÃO DA CULPA CONCORRENTE - MAJORAÇÃO
INDEVIDA - DANO ESTÉTICO - CUMULAÇÃO -
POSSIBILIDADE. É possível a cumulação de dano moral e
dano estético, mesmo decorrentes do mesmo fato, quando
forem passíveis de apuração em separado. A perda da visão do
olho lesionado é motivo justificante para a ocorrência de dano
moral; já a extração do globo ocular constitui causa autônoma
para indenização do dano estético. CULPA DO FACULTATIVO
DEMONSTRADA - NEGLIGÊNCIA E IMPRUDÊNCIA NO PÓS-
OPERATÓRIO - ALTA HOSPITALAR PREMATURA E DESCASO
COM OS SINTOMAS DE AGRAVAMENTO DA INFECÇÃO -
OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR INAFASTÁVEL - SUCUMBÊNCIA
RECÍRPOCA NÃO VERIFICADA. Em se tratando de medicina
curativa, o profissional assume uma obrigação de meios, na qual
não se compromete a obter um certo resultado, mas, sim, a
prestar um serviço com o cuidado e a diligência exigidos pelas
172 TJSC - Acórdão: Apelação Cível 2000.006745-8 Relator: José Mazoni Ferreira Data da Decisão: 31/10/2002
72
circunstâncias, fazendo uso dos recursos disponíveis para tentar
atingir a cura. O fato de não alcançá-la, uma vez empregados
todos os esforços para tanto, não acarretará a culpa do
profissional da saúde. Ao revés, verificada a omissão ou o
descaso para com o paciente, deixando o facultativo de envidar
todos os meios ao seu alcance para impedir o agravamento da
lesão, caracterizada está sua culpa nas modalidades de
negligência e imprudência, restando patente seu dever de
indenizar a vítima. (TJSC - Acórdão: Apelação Cível 2000.006745-
8 Relator: José Mazoni Ferreira Data da Decisão: 31/10/2002).
Hoje, concluindo, conforme demonstrado, a polêmica em
torno da possibilidade ou não de cumulação de danos estéticos com os morais
(principalmente em face de fato único) vem se arrefecendo mais, de maneira que,
do mesmo modo como no passado se deu a pacificação dos entendimentos
quanto à possibilidade de indenização por danos morais, deve ocorrer quanto à
cumulação de reparação por danos morais estéticos, sendo esta, aliás, a corrente
que mais se aproxima de um juízo mais equânime e atento à realidade dos fatos.
3.8 JURISPRUDÊNCIA
Só para ilustrar, colecionamos alguns julgados:
O dano médico resultante de cirurgia plástica deve ser indenizado
pelo médico em razão de inadimplemento contratual, já que
assume ele obrigação de resultado. Não há que falar em decisão
extra petita pelo reconhecimento da responsabilidade contratual
se a inicial, apesar de não distinguir claramente a opção do autor
pela indenização contratual ou delitual, erige aquela em causa de
pedir (Ap. Cív. 102.063-1, 1a Câmara Cível TJSP, Res. Des.
Roque Komatsu, j. 25/10/1988)
E ainda, julgados no sentido de demonstrar o
posicionamento dos tribunais quanto à obrigação de meio e de resultado nas
cirurgias estéticas:
RESPONSABILIDADE CIVIL - Cirurgia plástica - Erro profissional
- Deformação - Indenização - Hospital responsável. Há
responsabilidade civil de estabelecimento hospitalar por erro
profissional de sua equipe médica quando ocorre culpa in
73
eligendo. Na cirurgia estética existe responsabilidade do médico
quando há resultado diverso do pretendido pelo paciente. (RT
566/919 e 192)
DIREITO CIVIL - Responsabilidade civil por erro médico - Cirurgia
plástica de natureza estética - Obrigação médica de resultado. A
cirurgia plástica de natureza meramente estética embelezadora.
Em tal hipótese, o contrato médico-paciente é de resultado, não
de meio. A prestação do serviço médico há que corresponder ao
resultado buscado pelo paciente e assumido pelo profissional da
medicina. Em sendo negativo esse resultado, ocorre presunção de
culpa pelo profissional. Presunção só afastada se fizer ele prova
inequívoca de que tenha agido observando estritamente os
parâmetros científicos exigidos, decorrendo, o dano, de caso
fortuito ou força maior, ou outra causa exonerativa o tenha
causado, mesmo desvinculada possa ser a própria cirurgia ou
posterior tratamento. Forma de indenização correta. Dano moral.
Sua correta mensuração (180 salários mínimos). Ação julgada
procedente, em parte, em primeiro grau de jurisdição. Provimento,
em parte, do apelo da autora, no que diz com a mensuração do
dano moral, e não conhecimento por intempestivo, do apelo do
réu (TJRS – Ap. Cív. N.º 595068842 – 6.ª Câm. Cív. – j. 10.10.95
– Rel. Des. Osvaldo Stefanello – in RJTJRS 175/572) (KFOURI
NETO, 1998, p. 272).
CIRURGIA PLÁSTICA - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO -
INDENIZAÇÃO -DANO MATERIAL E MORAL. Contratada a
realização de cirurgia estética embelezadora, o cirurgião assume
obrigação de resultado, sendo obrigado a indenizar pelo não-
cumprimento da mesma obrigação, tanto pelo dano material
quanto pelo dano moral, decorrente de deformidade estética,
salvo prova de força maior ou caso fortuito.(STJ, in Ver. Jur.
170/145)
CIRURGIA ESTÉTICA – Obrigação de meio. O profissional que se
propõe a realizar cirurgia, visando melhorar a aparência física do
paciente, assume o compromisso de que, no mínimo, não lhe
resultarão danos estéticos, cabendo ao cirurgião a avaliação dos
riscos. Responderá ele por tais danos, salvo culpa do paciente ou
a intervenção de fator imprevisível, o que lhe cabe provar.(Agravo
Reg. No Ag. 37.060-9 – RS. Rel. Min. Eduardo Ribeiro),
74
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo investigar, à luz da
legislação, da doutrina e da jurisprudência nacional, a responsabilidade civil do
médico no dano estético em cirurgia plástica.
O interesse pelo tema abordado deu-se em razão de sua
atualidade e pela diversidade de modo que o tema vem sendo abordado no
contexto nacional.
A responsabilidade civil do médico é uma questão que tem
suscitado muitos questionamentos e controvérsias, tomando um corpo maior em
sua discussão atual, uma vez que houve maior conscientização dos cidadãos
para a reivindicação de seus direitos.
Para seu desenvolvimento lógico o trabalho foi dividido em
três capítulos.
O primeiro, tratou da responsabilidade civil, no ordenamento
jurídico brasileiro, através do entendimento de diversos doutrinadores.
Dito isto, se percebeu que conforme previsto no art. 186 do
Código Civil, a responsabilidade civil, consiste na obrigação de reparar o prejuízo
causado a outrem, por ato próprio ou de pessoa ou coisa que deste dependa,
sendo caracterizada pelos seguintes pressupostos: ação ou omissão, culpa ou
dolo do agente, dano e relação de causalidades.
Conforme disposto naquele capítulo, a responsabilidade civil
pode ser: subjetiva, quando depende da comprovação do elemento culpa;
objetiva, quando independe da comprovação de culpa por parte do agente;
contratual, quando decorre da violação de um contrato previamente acordado
entre as partes; extracontratual, quando decorre da violação de um dever jurídico
pré-existente.
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O segundo capítulo foi destinado a tratar especificamente da
responsabilidade civil do médico, observando que a responsabilidade do médico é
na maioria das vezes, contratual, sendo sua obrigação de meio.
Entretanto, na Obrigação de Resultado, por sua vez, o
médico se compromete a empregar todos os meios disponíveis e apropriados
para obtenção de um determinado resultado, sem, contudo, se vincular a obtê-lo.
Na obrigação de resultados, por sua vez, o médico se obriga
a um resultado fixo, pré-determinado, do qual ele não pode afastar-se, sob pena
de ser considerada inadimplida sua obrigação.
No terceiro e último capítulo, estudou-se a responsabilidade
civil do cirurgião plástico, demonstrando a diferença entre cirurgia puramente
estética e cirurgia estética reparadora, sendo que a primeira o médico tem a
obrigação de resultado e a segunda o médico tem obrigação de meio.
Outro possível aspecto é a cumulação do dano estético com
o dano moral, por serem dois tipos diferentes de danos morais à pessoa, ou seja,
atingem bens jurídicos diferentes.
Por fim, retoma-se as três hipóteses básicas da pesquisa:
1ª) na cirurgia estética, a responsabilidade civil do cirurgião é objetiva, pois
independe da culpa; 2ª) a obrigação do médico para com seu paciente é
contratual, pois, mesmo que tacitamente, há entre eles, um acordo bilateral de
vontade; 3ª) o contrato é de resultado e não de meio, porque, na cirurgia estética,
há compromisso do médico com o resultado almejado, ao contrário da cirurgia
reparadora, para registrar que todas foram integralmente confirmadas.
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