REVISTA NOSSA TRIBO Nº 10 - MAIO/JUNHO 2014

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Um Ponto de Vista Cultural

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2|NOSSA TRIBO

no territórioCurso gratuitode iniciaçãoà História da Arte

A secretaria de Cultura de Araruama promove em agosto o curso de iniciação à História da Arte, coordenado pelo professor Jamil Abdalla Auhi.

Com duração de três meses, o curso é gratuito e tem o ob-jetivo de abordar a história da arte no espaço local e temporal, segundo as manifestações artís-ticas por elemento ou grupos sociais ou religiosos, como fenô-meno histórico-social no Brasil e no mundo.

As inscrições já estão abertas. Basta enviar um e-mail para “historiadaarte@hotmail.com” informando o nome completo, data do nascimento, grau de instrução, profissão, telefone e e-mail para contato.

Caricaturas dos jogadoresVai até o dia 20 de julho a exposição “Tor-cendo e distorcendo na Copa do Mundo 2014” com caricaturas de jogadores das Copas. O trabalho é do artista plástico Fábio Coutinho que acontece na Casa de Cultura de São Pedro da Aldeia, de segun-da a sexta-feira das 10h às 17h, sábados e domingos das 18h às 21h.

Cine Clube EstaçãoO Iphan em São Pe-

dro da Aldeia tem pro-movido sessões de cine-ma de alta qualidade. O projeto é o “Cine Clube Estação São Pedro”, que funciona às quartas-feiras com sessões das 16h30 até as 20h30.

O Cine Clube fun-ciona anexo à Biblioteca Municipal, no centro da cidade.

Para se informar sobre a programação consulte o “www.estacao dopatrimonio.blog spot.com.br”.

NOSSA TRIBO|3

Ideias esportivas

7NOSSOS CLÁSSICOS: “O PROFESSOR DO LAR” DE SAMUEL SANCHEZ REVELA UMA NECESSIDADE E CONHECIMENTO DE ÉPOCA

9CONHEÇA ALGUMAS HISTÓRIASDE JEDHIEL AZEVEDO, O GRANDE MITO DO FUTEBOL CABOFRIENSE DE TODOS OS TEMPOS

15ROSSANA MARIA PAPINI ESCREVEO QUARTO CONTO DA SÉRIE“A CIDADE E OS ERMOS”

CNPJ 17.924.249/0001-96

Circulação restrita aos membros da tribo.

NOSSA TRIBONOSSA TRIBOIdéia, Projeto Gráfico e Editoria: José CorreiaEndereço: nossatribo@bol.com.br www.facebook.com/RevistaNossaTriboFechamento: Nômade Artes Gráficas, Cabo FrioImpressão: Grafline, Rio de Janeiro

assu

ntos

No ano da Copa do Mundo no Brasil, Cabo Frio - que guarda uma rica história do futebol amador, com tantos craques talentosíssimos, em que um de seus filhos chegou profissionalmente à seleção brasileira de futebol, o craque Leandro, Cabo Frio que também inspirou o grande escritor José Lins do Rego a escrever o romance “Água-mãe” cujo perso-nagem principal é um jogador de futebol - não pode esquecer de homenagear seu craque mais admirado em todos os tempos, que é Jedhiel Azevedo (1917-1983), símbolo de uma época e que representa o valor de outros grandes craques do futebol cabo-friense e da Região dos Lagos.Os cronistas mais estimados de Cabo Frio, como Antonio Terra, Celio Mendes Guimarães, Tonga e Cláudio Machado, que viram Jedhiel Azevedo jogar, registraram em seus textos este fenômeno do espor-te. Vale a pena conferir!

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EXEMPLO DE INCIATIVA CULTURAL: HASENCLEVER OLIVEIRA E A SÉRIE DE CONCERTOS DE PIANO DE QUALIDADE134

ENTREVISTA: O BIÓLOGO EDUARDO PIMENTA EXPLICA COMO SE DEVE ENCARAR A ESPÉCIE AGRESSIVA DE PEIXE-LEÃO EM NOSSO ECOSSISTEMA

4|NOSSA TRIBO

entrevista: Eduardo Pimenta

Espécies migram normalmente

Eduardo Pimenta [foto, ao lado] é biólogo, mestre em Engenharia de Produção, professor universitário, há 33 anos trabalhando em pesquisa científica com publicação de seus trabalhos no Brasil e no exterior. A presença do peixe-leão em nossa costa marítima de Arraial do Cabo e Cabo Frio causou num primeiro momento um no-ticiário alarmista. Eduardo Pimenta explica nesta entrevista porque a migração desse espécie deve ser contextualizada em sua verdadeira dimensão. (José Correia)

O desastre ecológico-ambiental promovido pelo peixe-leão deve ser bem dimensionado

A mídia acaba de divulgar que foi descoberto no mar de Arraial do Cabo o peixe-leão, espécie agressiva, não natural da nossa região, e que pode causar desequilíbrio no ecossistema local. Isto é preocupante?

Eduardo Pimenta – Não devemos nos preocupar mais do que o necessário. O fato, uma vez comprovado a sua veracidade, deve ser investi-gado, procurando identificar a origem objetivando evitar que se repita. A todo momen-to, algumas espécies estão migrando. Essas migrações são feitas, geralmente, por indivíduos “errantes” ou os excedentes nas populações que já alcançaram o limite

máximo de recursos dispo-níveis, por indivíduos que foram expulsos dos seus terri-tórios, por causas variadas, ou ainda, acidentalmente, pela ação do vento, pelas correntes marinhas, por catástrofes na-turais, ou pela ação humana.

Quando realizada com sucesso, as migrações são importantes para a expansão da distribuição geográfica daquela espécie. Ao “chegar” a uma nova região, o imi-grante já traz consigo as suas exigências ecológicas, que, obrigatoriamente, terão que ser atendidas.

Que situações são essas de uma espécie imigrante?

Eduardo Pimenta - Vou

enumerar sete situações. Si-tuação 1: A região alcançada não apresenta o nicho ecoló-gico (corresponde ao papel desempenhado pela espécie dentro da comunidade) da espécie. Provavelmente, a migração desse indivíduo continuará para outras regi-ões, não se fixando a espécie naquele ambiente. Neste caso, não deverá haver danos ecológico-ambientais.

Situação 2: A região al-

cançada apresenta o nicho somente em determinadas épocas do ano. Se a espécie imigrante apresentar uma mobilidade eficaz, ela poderá ocupar essa nova área so-mente nas épocas favoráveis, emigrando, sazonalmente, para outras mais favoráveis. Exemplos: inúmeras espécies de aves, como as cegonhas, que migram sazonalmente da Europa para a África; ou as baleias-jubarte, que

NOSSA TRIBO|5

continua na página 6

A todo momento, algumas espécies estão migrando. Eduardo Pimenta

“Peixe-leão, espécie de peixe agressivo que não é natural de nosso

ecossistema, é motivo de estudos dos biólogos.

migram da Antártica para o arquipélago de Abrolhos na época reprodutiva. Deverão ocorrer, nestes casos, altera-ções ecológico-ambientais na nova região.

Situação 3: A região al-cançada apresenta o nicho completamente desocupado. Neste caso geralmente ocorre uma explosão populacional, considerando que a imigrante não traz consigo os respec-tivos predadores, aliando-se à inexistência de outras espécies, para a competição interespecífica. Deverão ocor-rer alterações ecológico-am-bientais consideráveis nessa nova região.

Situação 4: A região al-cançada apresenta o nicho parcialmente ocupado por outra espécie. Teoricamente é possível a nova ocupação, como o exemplo, para as aves cormorão-negro e cormorão-com-poupa, que nidificam juntas nas mesmas falésias da

Inglaterra, na mesma época e vão pescar nas mesmas águas. Porém, não há compe-tição por alimentação porque as presas não são as mesmas. O primeiro mergulha nas profundidades e se alimenta de animais bênticos, enquan-to o segundo mergulha nas águas rasas. Ainda assim, de-verão ocorrer alterações eco-lógico-ambientais na região.

Situação 5: A região al-cançada apresenta o nicho ocupado por outra espécie (nativa) mais apta na explo-ração do que pela espécie

imigrante. Teoricamente, neste caso, deverá ocorrer a exclusão competitiva da espé-cie recém-chegada, ou, como migrante, ela continuará seu deslocamento para outras regiões mais favoráveis. Sob o

ponto de vista ecológico-am-biental os danos esperados serão mínimos.

Situação 6, que é onde se encaixa o caso do peixe-leão:

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A região alcançada apre-senta o nicho ocupado por outra espécie menos apta na exploração dos recursos do que pela espécie imigrante. Possivelmente deverá ocorrer aqui a extinção da espécie na-tiva (exclusão competitiva). Geralmente, como conse-qüência secundária, ocorre uma explosão populacional na espécie exótica.

Trata-se de um verdadeiro desastre ecológico-ambien-tal, onde medidas urgentes precisam ser tomadas para a não completa extinção da espécie nativa, dentre outras alterações ambientais.

Situação 7: A região al-cançada apresenta o nicho completamente desocupa-do, porém a imigrante é uma espécie peri-domiciliar. Considerando que as ditas espécies exóticas preferem conviver como comensais do homem nas cidades, ra-ramente se deslocando para as áreas silvestres, os danos ecológico-ambientais ge-ralmente são mínimos. É o que ocorre com o pombo, o camundongo doméstico, o rato-de-telhado, a ratazana, as baratas e o pardal, dentre outras.

Você já fez uma avaliação

da nossa capacidade pesquei-ra. Melhoramos ou não?

Eduardo Pimenta - O re-gistro que faço, da inovação no processo produtivo pes-queiro da região tem sua origem a partir da demanda de exportação de pescado, na década de 1970, com o setor alicerçado no esforço de pesca em torno de poucas espécies pelágicas e, agora sob norma federal de defeso.

O setor demandava uma reestruturação, onde diversas empresas operavam, empre-gando um grande contingen-te, e o executivo se mostrava interessado em política se-torial, principalmente na possibilidade de geração de

trabalho e renda, motivados pelo mercado exportador, que modifica a estrutura de demanda, o saber tradicional, mas sem o recurso da tecno-logia mais atualizada se reve-la insuficiente para suprir as necessidades da exportação. Isso situava o planejamento da atividade num patamar de incerteza cada vez mais elevado, o que se traduzia por uma ineficiência produtiva e inadequação da produção às distintas exigências dos mercados externos à região.

Barcos fora da especifica-ção legal acabam se lançando a expedições, incorrendo em riscos e retirando da fisca-lização o espaço para uma atuação ordenadora. Regu-lamentos e fiscais passam a ser representados como mais contrastes para a atividade pesqueira.

O que resultou desse

diagnóstico?

Eduardo Pimenta - Neste quadro configurado, fora criado o GEPesca, um grupo multidisciplinar de estudos da pesca em 1990 e desen-volvidos estudos nos planos organizacional, social e evo-lutivo.

No plano organizacional, a questão se voltou para as diferentes ações de trabalho ao longo da cadeia de produ-ção, bem como os produtos e serviços existentes no macro complexo da pesca.

No plano social, são des-critas a formação e a condição de trabalho e de saúde do pescador.

No plano evolutivo, al-guns desenvolvimentos já diagnosticados como neces-sidades para a proposta de modernização para o setor.

Configura-se, então, uma ação na busca da adaptação da tecnologia à produção em termos culturais, sociais, econômicos, geográficos e

continuação da página 5 organizacionais materializa-da mediante a consolidação do Grupo Multidisciplinar de Estudos da Pesca - GEPesca e praticada através da gestão do Escritório Regional do IBAMA em Cabo Frio, no período de setembro de 1994 a novembro de 1999, como também, pelas Secretarias e Pesca de Cabo Frio e Arraial do Cabo para o mesmo pe-ríodo, quando foi colocado em prática o plano de gestão costeira integrada com as três esferas do poder público e as representatividades de classe. Na gestão são considerados o potencial e as limitações dos ecossistemas e das pessoas envolvidas, não os tratando isoladamente, mas sim de forma holística.

Que trabalho você vem

fazendo em seu curso na Uni-versidade Veiga de Almeida com os alunos?

Eduardo Pimenta - A par-tir de 2008, o GEPesca se transferiu para a Universida-de Veiga de Almeida | Cam-pus Cabo Frio e se instalou no recem criado Laboratório de Avaliação de Recursos Vivos dos Cursos de Gestão Ambiental e de Engenharia Ambiental, foi certificado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq e passou a compor a estrutura do Sub-comitê Científico do Comitê Consultivo Permanente de Gestão sobre Atuns e Afins do Ministério da Pesca e Aquicultura, responsável pelo aporte de dados estatístico da pesca brasileira na Comissão Internacional para a Con-servação do Atum Atlântico – ICCAT através do Comitê Permanente de Pesquisa e Estatística da ICCAT.

Com base nesses estudos são feitas propostas para a adoção de medidas de orde-namento e conservação ne-cessárias para a manutenção dos estoques em níveis com-patíveis com o rendimento máximo sustentável.

O pombo, o camundongo doméstico, o rato- de-telhado, a ratazana, as baratas e o pardal, são espécies que encontram um nicho desocupado e preferem conviver como comensais do homem nas cidades.

NOSSA TRIBO|7

NossosCLÁSSICOS

José Correia

“O Professor do Lar”, livro de Samuel Sanchez,

lançado em 1929.

Estão abertas as inscrições até o dia 29 de julho para a segunda edição do Concurso de Poesia Victorino Carriço. Dividido em três categorias – Infantil, Juvenil e Adulto – o Concurso terá como tema: “Artistas de Nossa Terra Amada”.

Para participar, os interessados poderão se inscre-ver em três diferentes pontos culturais da cidade: no Charitas - Centro Cultural José de Dome, que funcio-na à Avenida Assunção 855, Centro de Cabo Frio, de terça a sexta-feira, das 14h às 19h; no Centro Cultural Anderson Gigabyte, que funciona à Avenida Ézio Car-doso da Fonseca, no Jardim Esperança, de segunda a quarta-feira, das 13h30 às 16h, e de terça a sexta-feira, das 9h às 11h30; e na Sala de Leitura do Pólo Cultural de Tamoios (Ginásio João Augusto Teixeira Silva), que funciona à Avenida Amaral Peixoto, Km 107-Tamoios, de segunda a sexta-feira, das 14h às 20h.

O prêmio para os primeiros colocados em cada categoria será de R$ 1mil. Para os segundos melhores de cada categoria, R$ 750. Já os terceiros colocados re-cebem R$500. Mais informações sobre o regulamento podem ser obtidas no “blog:www.cabofriominhaterra amada.blogspot.com.br” ou na Fan Page:“www. face-book.com/PoetaVictorinoCarrico.”

A segunda edição do Concurso de Poesia Victorino Carriço é uma realização do PROEDI/Secretaria de Cul-tura, com produção da Atual Comunicação Integrada. (Viviane Teixeira)

Foto: Domingos Palmeira

Inscrições para o Concurso de Poesia Victorino Carriço terminam em julho

O compositor e poeta Victorino Carriço (1912-2001)

No ano de 1929, as “Officinas Graphicas do O Arauto”, na Rua Major Bellegard número 46, de propriedade do controvertido pa-raibano Pedro Guedes Alcoforado, publicavam o livro “O Professor do Lar”, de Samuel Sanchez. Com 96 páginas, impresso em papel jornal, “O Professor do Lar” trazia “receitas industriaes, culinarias, pharmaceuticas, veterinárias, chimicas e outras muitas informações de imprescindível necessidade para os lares”. Um livro importante, não por suas intenções literárias, mas por nos dar um perfil das necessidades da vida cotidiana de Cabo Frio nessa época. A maioria das 151 receitas envolve a manipulação de ácido azótico, clorídico, carbonato de potássio, óxido de zinco, ácido lactico, enxofre pulve-rizado, ácido bórico, ácido nítrico, sulfato de zinco, sulfato de ferro, nitrato de prata, borato de sódio, etc.

Pelo livro, vemos que os conhecimentos do dia-a-dia do leitor de 1929 permitiam-lhe pegar “O Professor do Lar” e em sua própria casa misturar 10 gramas de borato de sódio, com 10 gramas de amido, 5 gramas de ácido salicílico, 5 gramas de sulfato de alumínio, 6 gra-mas de naptol e 30 gotas de essência de rosa, e, pronto, obtinha-se o remédio “Para evitar o suor dos pés e das mãos”.

Nas primeiras décadas do século XX, o verde dominava o centro de Cabo Frio. As casas residenciais possuiam quintais e dividiam es-paço com as firmas comerciais. Era bastante natural essas residências possuírem os seus animais domésticos. Para exemplificar, vamos ler uma nota curiosa saída no jornal cabofriense “O Itajuru” de 23 de junho de 1901, sob o título “Peru Fugidio”, onde o Sr. Adolpho Beranger publicava um aviso em que dizia ter aparecido em sua casa um peru. O Sr. Adolpho queria entregá-lo só a seu dono desde que este declarasse a cor, a data do desaparecimento do peru e que pagasse a despesa do aviso publicado. No jornal seguinte, de 30 de junho, o Sr. Adolpho Beranger republicava o aviso, mas acrescentava que, como não havia aparecido o dono do peru, ele o havia entregado ao festeiro do Espírito Santo, “como dádiva de anonymo, para ser posto em leilão”.

Em “O Professor do Lar”, lançado vinte e oito anos depois do acontecimento publicado em “O Itajuru”, é curioso notar que os animais são tema de preocupação do livro, notadamente os cavalos pela importância que possuiam na época como meio de transporte, merecendo uma atenção especial com receitas para curar tosse, para eliminar os carrapatos, o modo de lhes dar purgantes, como tonificar os cavalos aguados, o que fazer para curar suas cólicas e como tratar das pisaduras. Há também manipulações contra perce-vejos, moscas e ratos. A conservação de alimentos é outro assunto importante no livro. A desinfecção de quartos de doentes é também preocupação do autor, assim como a tuberculose, que aparece no índice mas não no texto.

Estes e outros temas então rotineiros motivaram a publicação de “O Professor do Lar”, um livro que nos ajuda a compreender um tempo e que ainda pode-nos ensinar tantas coisas.

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Quem está na foto?Acyr Rocha consegue identificar algumas pessoas na passeata de trabalhadores de Cabo Frio

Passeata do Sindicato dos Arrumadores de Cabo Frio em 1963, quando havia uma grande movimentação sindicalista no Brasil.

Foto: Wolney Teixeira

1 - João Marciano, presidente do Sindicato da Resistência2 - Oswaldo Rodrigues, vereador e sindicalista3 - Nicanor Couto (possivel-mente)4 - Alcedino Marques (taxista)5 - Eugênio Sales (prefeito interino)6 - Castor Sardinha7 - Carlos Cordeiro (goleiro e expedicionário, conhecido como “Boca Mole”)

A foto da passeata do Sindicato dos Arru-madores de Cabo Frio, em 1963, de autoria do fotógrafo Wolney Teixeira, foi capa da “Nossa Tribo” na edição número 9 em matéria sobre os “50 anos do golpe militar”. E ela motivou o po-lítico cabofriense Acyr Rocha, por quatro vezes presidente da Câmara Municipal e identificado com a história política e cultural da cidade, a procurar identificar quem ele conhece que estava na foto.

“Naquela época, os salineiros formavam a categoria mais rica da sociedade. Tudo girava em torno da economia do sal. Você pode ver na foto que a passeata era quase que um festejo, com as pessoas bem arrumadas, com terno, com a participação de crianças, porque envolvia os trabalhadores e suas famílias, cuja reivindica-ção era o reconhecimento da importância dos trabalhadores e com isso a melhoria salarial, portanto, a melhoria de vida”, observa Acyr Rocha, que acha que o atual prefeito de Cabo Frio, Alair Corrêa, está entre os manifestantes.

“Ele naquela época já era audacioso”, afirma Acyr Rocha.

Acyr Rocha foi Chefe de Gabinete do prefeito Edilson Duarte (PTB) no final dos anos de 1950

e participou ativamente da candidatura a prefei-to de Cabo Frio de seu irmão Joel Rocha, pelo

MDB, em 1970 e 1972.

Personagens

porta da história

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NOSSA TRIBO|9

Jedhiel Azevedo,o craque do futebol cabofriense que ahistória não esqueceEle levava a torcida ao delírio e decidia uma partida fazendo do futebol uma categoria da arte do belo

José Correia

Autêntico gênio, fenômeno no futebol, craque excepcio-nal, o maior desportista que Cabo Frio já conheceu, o craque do século. Estas são algumas máximas dos mais representativos cronistas de Cabo Frio que viram Jedhiel Azevedo jogar ou que jogaram com ele, como o futebolista e cronista Tonga, e os cronistas e admiradores do futebol como Antonio Terra, Cláudio Machado e Célio Mendes Guimarães.

Jedhiel Duarte de Azevedo (1917-1983) é o símbolo do fute-bol cabofriense. Com ele, conviveu uma galeria de desportistas do mais alto talento, numa época - dos anos de 1930 até 1960 - em que o futebol despertava grande paixão, era aplaudido e arrastava torcidas. Em um tempo em que o futebol era forte e revelava valores não só em Cabo Frio, como em São Pedro da Aldeia e em Arraial do Cabo. Mas que ainda não significava uma carreira profissional promissora que justificasse uma dedicação ao esporte.

Conta Antonio Terra: “Assisti à chegada dum navio do Loyd que vinha da velha Europa. Chegando a bordo, um marinheiro perguntou-me por Jedhiel. Eu, admirado, perguntei-lhe: ‘Você o conhece?’. Ele às gargalhadas: ‘Todos os jogos de futebol que assistimos na Europa, Buenos Aires, Montevidéu, o teu irmão Jonas, no meio do jogo, grita entusiasmado: Se Jedhiel estivesse ali naquela linha já teria metido o gol!’”.

Jedhiel Azevedo jogava com a convicção de que o futebol era uma verdadeira construção da arte do belo. Não era ape-nas fazer pragmaticamente o gol. Mas o gol formosamente construído, de imprevisível elegância, com a jogada primo-rosamente inesperada. Quando a bola então não se tornava presa do goleiro, era a beleza do esporte que se revelava ao chegar ao fundo da rede. Por isso, a arte do futebol virava o espetáculo que encantava o público. E aí Jedhiel Azevedo fazia a diferença.

Acyr Rocha, com muitos mandatos de vereador e de presidente de Câmara, identificado com a cultura cabofrien-se, lembra que por vezes acontecia do Clube Tamoyo estar sofrendo no primeiro tempo um jogo difícil, perdendo para o adversário, a caminho da derrota, e a solução era colocar Jedhiel Azevedo no segundo tempo.

“O problema então era achar Jedhiel. Aonde? Ele podia estar em casa, na casa da namorada Dacy ou na restinga pe-gando passarinho. Enfim, tinha de se encontrar Jedhiel para resolver o jogo. E era assim: ele entrava no segundo tempo e dava o placar da vitória ao Tamoyo.”

O cronista Cláudio Machado, sobrinho de Jedhiel Azevedo, detalha em seu livro “O amanhecer em minha cidade” (2005) um desses casos. O Tamoyo terminava empatado o primeiro

Jedhiel Azeve-do (em pé, na

foto) foi o craque

do futebol cabofriense

que iluminou uma geração

de desportistas, revelando a

qualidade de um futebol que

era praticado em Cabo Frio e

na Região dos Lagos.

ídolo da terra

10|NOSSA TRIBO

tempo por 1 X 1 com o Luzitano e temia perder a partida, pois, além do jogo propriamente dito, o juiz favorecia o adversário. O pai de Jedhiel, Nico Félix, dá então a missão a um amigo de procurar o filho. O amigo sai a cavalo do campo de futebol, que ficava no final da Avenida Nilo Peçanha, perto da praia, e acha o craque cabofriense na restinga.

“Faltando vinte minutos para o término [do jogo], eis que aparece no estádio, Antonio de Nicota com o tio Jedhiel na garupa do cavalo. (...) Foi um delírio. Entrou o tio Jedhiel, mas estava uma dureza. (...) Mas craque é craque e numa bola que tio Jairo, que era beque (hoje, zagueiro), lançou ao tio, ele de fora da área não teve dúvidas, emendou de primeira e a bola foi parar no fundo da rede. Foi um delírio geral. Tamoyo 2 x Luzitano 1”, conta Cláudio Machado. Naquela noite foi uma festa na casa de Nico Félix comemorando o gol de Jedhiel Azevedo, “que, mais uma vez, havia tirado o nosso querido clube [Tamoyo] do sufoco”, lembra Cláudio Machado.

O cronista Célio Mendes foi outro cabofriense que chegou a ver Jedhiel jogar futebol.

“Jedhiel e os irmãos Laurinho, Totonho e Jairo eram também craques. Mas Jedhiel foi o verdadeiro craque, um excelente jogador. Ele se deslocava muito. Foi o pioneiro nos dribles de corpo, coisa que nem se falava na época. Saía da ponta esquerda, ia driblando, chegava na área e chutava cer-teiro ao gol. Uma vez vi um adversário cair sentado no campo depois do drible desconcertante de Jedhiel. Isso marcava o talento dele.”

Antonio Terra, que também assistiu a Jedhiel jogar futebol, dá sua impressão no livro “Crônicas” (2003).

“Quando no tapete verde a bola lhe chegava aos pés, saía ‘redondinha’ para os pés dum companheiro ou para um ‘gol de placa’ e o povo, então, delirava, aclamava-o. O povo che-gava ao fanatismo com os seus dribles de corpo, os chutes retumbantes, a cabeçada certeira e consciente daquele jogador

que os amigos chamavam de Tigide e os demais de Jedhiel. Quando o Tamoyo entrava em campo, todo o seu talento, sua alma e coração convergiam para os pés, era enfim... um virtuoso com a bola.”

Tonga, um jogador de futebol competente, mas mais novo que Jedhiel Azevedo, conta em uma crônica a oportunidade que teve de jogar algumas partidas de futebol de areia na Praia do Forte ao lado do “velho craque”, quando então Jedhiel já havia parado de participar oficialmente do futebol de campo.

“Jedhiel terminou o campeonato como artilheiro de nosso time, graças à incrível precisão com que ele chutava a bola descaindo no ângulo da balisa.”

Mas como era Jedhiel em sua particularidade? Seu genro Carlos Leger Sherman Palmer responde:

“Era um homem apaixonado. Apaixonado por sua esposa Dacy, por seus filhos e netos, por sua família e, incondicional-mente, por sua terra natal. Amava sua casa, seu carro antigo, os seus pássaros cantadores, os velhos albuns ‘long-plays’ de músicas românticas e até um certo blazer cor de vinho.”

Um traço distintivo de Jedhiel Azevedo, segundo seu filho Reinaldo, era a alegria e a espirituosidade. Sentia-se à vontade com a vida social, externada nos encontros no clube Tamoyo, reconhecido como um “pé-de-valsa”, cujo lema de vida era: “é tão fácil ser feliz.”

Jedhiel Azevedo jogava com a convicção de que o futebol não era simplesmente um esporte pragmáti-co, mas uma verdadeira construção da arte do belo compensada com a marca do gol

NOSSA TRIBO|11

olhar dos cronistas

Desde os primórdios de sua infância, Jedhiel revelou a todos os cabo-frienses que era um “predestinado”, um monstro sagrado - como dizia Nelson Rodrigues - nos es-portes, na luta pela vida. Seus pais eram de classe média, mas mesmo assim ele gozava do prestígio de um príncipe, pois ... quando menino adoeceu com um “virulento tifo”. Os garotos que eram seus vizinhos formavam uma cor-rente em volta da casa de seus pais para pedirem aos que passavam que não fizessem barulho porque o Tigide ou Jedhiel estava bem doente e um choque qualquer poderia lhe ser fatal. Jedhiel ficou bom e a meninada festejou o evento com uma pelada bem em frente ao casarão da Rua Direita e, à noite, um pique de arromba.

Desde garoto, o Tigide revelou-se no futebol, natação, basquete, ping-pong, o dançar com mais elegância e dentro do ritmo. Nos estudos sempre captava com mais facilidade os ensinamentos da competente professora. Era um menino prodígio, extraordinário.

Os fios da barba chegaram e com eles seu futebol foi melhorando, aperfeiçoando como um dom, não à custa de técnicos e preparadores físicos, etc.

Casado com uma moça bonita e sadia, com ótimos antecedentes, “mente sã em corpo são”, Jedhiel abandonou

o esporte bretão para se dedicar à graciosa esposa e ao trabalho. Do feliz casal nasceram três filhos e como nas histórias de Carochinha: a felicidade imperou no lar do grande sportman.

Em 1981, o Jedhiel sentiu algo estranho no peito, pro-curou logo o Papa da Cardiologia fluminense, seu sobrinho Dr. Heraldo, que reside e trabalha em Niterói. Jedhiel foi terminantemente proibido de fumar e enfrentar forte emoções e sempre fazendo uso de remédios, mas ... Seu coração foi se abalando até com as emoções de alegrias como o nascimento do neto, sua esposa escolhida como a mãe do ano, tudo isso afetou o atleta-sentimental.

A nossa tristeza pela perda irreparável do autêntico gênio nos esportes cabo-frienses vai ao encontro à alegria dos seus fãs inveterados que lá ... bem pra lá, estão à sua espera: Araci, Lilinho, Jonas e Erico Terra, Jamil, Zezéca, Totonho, Eugênio, Félix, Henrique, Bôca, Chico Cezario, Jerônimo e Rubens de Dodô, Braguinha, Ismael Nobre, Nelson Macedo, etc... etc...

Trechos da crônica de Antonio Terra publicada em seu livro “Crônicas” (2003).

Antonio TerraO vencedor

Célio Mendes GuimarãesO Tamoyo e seu atleta

Jedhiel Azevedo [foi] o mais glorificado craque que Cabo Frio conheceu em toda sua história, treinando no auge de sua carreira no América Futebol Clube e no Fluminense Clube de Regatas, regressando à terra natal, atendendo ao desejo de seus pais.

Entre as inúmeras façanhas do grande ídolo, uma não se perde no tempo do pretérito, quando o Tamoyo nos idos anos quarenta, disputou uma rivalíssima partida com o Confiança, do Rio de Janeiro. Destaque-se que o Tamoyo perdia por 1 x 0, quando Jedhiel na improvisação de seus desconcertantes dribles de corpo, marcou três gols, saindo o Tamoyo vencedor da histórica partida por 3 x 1.

Jedhiel poderia, sem contestação, ser considerado ofi-cialmente o craque do século de Cabo Frio. Modesto no seu proceder, não se sentia à vontade em ouvir merecidos elogios. E não foi só o futebol que o eternizou como o mais completo desportista a que Cabo Frio assistiu. Tudo que se propôs fazer, fez com a supremacia de seus adversários.

Pena é que a morte o levou prematuramente, deixando no adeus a lembrança de seus familiares e amigos.

Trechos da crônica de Célio Mendes Guimarães publicada no tablóide “Caderno do Tamoyo” (1999).

12|NOSSA TRIBO

Não vamos admitir que maculem o nome desse homem que se projetou por ser digno, honrado, fiel a seus amigos e exemplar chefe de família. O troco foi dado pelo seu genro Leger Palmer e seu filho Reinaldo.

Transcrevo aqui um fato da sua vida em um importan-te jogo de futebol em que ele, mais uma vez, só nos deu alegria. Numa tarde muito bonita, estávamos assistindo e torcendo muito para Marquinhos que jogava suas primei-ras partidas no time do Tamoyo, com um desempenho muito favorável. Pintava outro craque na família. Numa torcida muito animada estavam Robinson, Penha, Dudú, Lindinha, Teté, Helcinho, Bebeco, eu e outros primos e amigos de quem não me recordo agora.

O juiz da partida era considerado um melancia (ver-melho por dentro, não preciso citar seu nome) e já estava nos causando irritação com sua marcação sempre contra o Tamoyo. Dudú, minha irmã, a mais irritada com a situação e descontrolada, de vez em quando xingava o juiz.

Acontece que, naquele dia, tio Jedhiel teve um pequeno atrito com vovô Nico e não compareceu ao campo para o jogo. Ele era o craque do Tamoyo e quem resolvia as par-tidas com seus belos gols. Foi para a restinga com gaiola e alçapão pegar passarinho. A certa altura do primeiro tempo, o Tamoyo estava ganhando de 1 x 0 e, faltando

poucos minutos para terminar, o juiz marcou um penalti de Waldir, que não tinha sido. Foi uma vergonha a atitude desse árbitro infeliz.

Ficamos todos esperando o começo do segundo tempo, vovô Nico preocupadíssimo com a marcação tendenciosa do juiz, ainda mais por não contar com tio Jedhiel no campo, ele que sempre fazia seus gols e resolvia a partida a nosso favor. E agora?

Mas vovô não ficou parado. Chamou Antônio de Ni-cota e mandou que fosse, a cavalo, buscar tio Jedhiel na restinga. Antônio sabia onde ele poderia estar pois era seu companheiro de passarinhada, embora naquele dia não o acompanhasse por causa do jogo.

Faltando 20 minutos para o término, eis que aparece no estádio Antônio de Nicota com tio Jedhiel na garupa do cavalo. Foi um delírio. Entrou tio Jedhiel, mas estava uma dureza. Mas craque é craque e numa bola que tio Jairo, que era beque (hoje, zagueiro), lançou ao tio, ele de fora da área não teve dúvidas, emendou de primeira e a bola foi parar no fundo da rede. Foi um delírio geral. Nós pulávamos e gritávamos “Tamoyo 2 x Luzitano 1”.

Trechos da crônica de Cláudio Machado publicada em seu livro “O amanhecer na minha cidade” (2005).

Cláudio MachadoMeu tio Jedhiel - Minha irmã Dudú

Poucas vezes eu tive oportunidade de jogar futebol com Jedhiel Azevedo do time do Tamoyo, pois quando comecei ele já estava parando de jogar oficialmente futebol de campo. Mesmo assim, tenho histórias para contar sobre ele.

Jedhiel era um craque excepcional e a história esporti-va do Tamoyo é colorida de páginas gloriosas sobre suas atuações na defesa da camisa do nosso Clube.

Dentre as poucas vezes que jogamos juntos pelo Ta-moyo, lembro de um amistoso contra a Associação de São Pedro da Aldeia, time do saudoso Badu, que fez questão da presença do amigo Jedhiel para lhe prestar uma homena-gem, pois ele o considerava o mais completo jogador de todos os tempos da nossa região.

Entretanto, eu e Jedhiel jogávamos sempre juntos as peladas de sábado à tarde lá no campo do Sítio de Paulo Burle, quando ele levava pela mão seu filho pequeno,

nosso Presidente Reizinho, na época um menininho re-chonchudo.

Naquele tempo, lembro-me, foi fundada em Cabo Frio a Liga de Futebol de Praia. Acontece que eu e outros companheiros de juventude tinhamos um time. Nós tocá-vamos a bola para Jedhiel e fazíamos uma parede contra os adversários, enquanto ele armava o chute. A bola saía mansamente, pelo alto, em direção ao gol e o goleiro se atrapalhava todo para saltar. Era gol em cima de gol, para alegria do nosso time e admiração dos espectadores que lotavam o local dos jogos nos domingos pela manhã.

Jedhiel Azevedo foi, realmente, um Fenômeno no Futebol.

Trechos da crônica inédita de Ayrton Christovam dos Santos (Tonga).

TongaUm fenômeno no futebol

NOSSA TRIBO|13

Ele nasceu em Itaperuna e há 14 anos vive em Cabo Frio. Em 2002, criou a “Série Jovens Pianistas”, que marca o circuito cultural de Cabo Frio. Hasenclever da Silva Oliveira [foto, ao lado] é esse itaperunense que no ano de 2000 mudou-se para Cabo Frio a fim de iniciar uma carreira de funcionário pú-blico e depois de professor de Matemática.

“Eu sou um verdadeiro amante de música clássica e iniciei meus estudos musicais em minha cidade natal. Fiz também aulas de piano com alguns professores particula-res. Em virtude do aumento gradativo de minhas respon-sabilidades no trabalho, alia-da ao tempo cada vez mais escasso, decidi interromper meus estudos musicais, de-dicando-me integralmente à família, ao trabalho e à ‘Série Jovens Pianistas’”, afirma.

Quando Hasenclever criou a “Série Jovens Pianis-tas”, em setembro de 2002, ele era um pianista amador e tinha a intenção de divulgar a música clássica em Cabo Frio, formar novas platéias e dar aos jovens músicos de grande talento uma oportunidade de se apresentarem.

“A série foi criada graças a uma proposta de recital que me foi feita, quando ainda estudava seriamente a arte pianística. Achei então melhor declinar do convite na ocasião e propus uma apresentação de um pianista já formado. Com o sucesso retumbante do evento, o que era para ser apenas um recital, foi, na verdade, o pon-tapé inicial para uma série de recitais na cidade e hoje já se contabilizam quase 50

Uma série de concertos de piano

Hasenclever Oliveira, funcionário público e professor, um exemplo de amor à música e de esforço em man-ter recitais de piano em Cabo Frio que já duram 12 anos

concertos realizados.”Hasenclever explica que

os pianistas que já se apresen-taram, são, em sua maioria, jovens em início de carreira, alguns já em franca ascensão, e quase todos detentores de prêmios dos mais impor-tantes concursos de música nacionais e, em alguns casos, até internacionais.

“Daí a excelência das apre-sentações. A maioria dos recitais foi para piano solo, mas, em alguns casos, foram realizados também recitais de música de câmara englo-bando outros instrumentos, tais como violão, canto lírico, violino e duo pianístico.”

Para a temporada 2014, foram programados cinco concertos. A próxima apre-sentação será um recital para 2 de agosto com o pianista Rogério Tutti, com um pro-grama inteiramente dedicado ao compositor húngaro Franz Liszt. Finalizando a tempora-da, no dia 20 de setembro, o pianista Daniel Burlet fará uma apresentação contento obras também de Liszt, além

de Chopin e outros compo-sitores.

“A ‘SJP’ se tornou bastante conhecida entre os músicos de várias partes do país. Com os resultados já obtidos, o reconhecimento do público e dos músicos, sinto um misto de orgulho e dever cumprido. E tudo isso só foi conseguido

graças à receptividade do público, do apoio da mídia local e, principalmente, da Se-cretaria de Cultura de Cabo Frio e de seus funcionários, que sempre me apoiaram em todos os recitais”, declara Hasenclever Oliveira, criador e diretor artístico da “SJP”, disse Hasenclever Oliveira.

Desde sua criação, a série vinha sendo realizada no Museu José de Dome (Charitas), quando em 2011 a Secretaria de Cultura transferiu os

concertos para o Teatro Municipal de Cabo Frio.

Fotos: Arquivo de Hasenclever Oliveira

iniciativa cultural

14|NOSSA TRIBO

Luiz Carlos da Cunha Silveira

As singularidades de CABO FRIO

Você sabia? ... Que uma frutinha da praia cabo-friense deu nome à mais antiga feitoria no continente americano?

As fotos abaixo são dos anos de 1980. Aonde foram tiradas? A constatação é que Cabo Frio mudou muito.

[1] Ponte de mão única? Pois assim era a ponte ... até 1981, quando em 1982 ela então foi duplicada.

[2] Hoje, essa avenida tem mão única. Mas antigamente tinha mão e contramão. Que local é esse?

[3] Caminhão de cerveja tomba em uma curva perigosa. A garotada assiste ao desastre no início da avenida ...?

Resposta: 1- Ponte Feliciano Sodré (Foto: José Correia) 2- Praça Santo Antonio em frente ao Convento (Foto: José Correia) 3 - Avenida Joaquim Nogueira (Foto: Jorge Martins).

veja se localiza?

Embora sempre se ressalte a primazia da feitoria cabo-friense no território continental (“mainland”) americano, ou seja, no hemisfério ocidental, esta foi, de fato, precedida por outra instalada pelos “vikings” cinco séculos antes no Cabo do Bacalhau (Cape Cod; o “outro Cabo Frio” ianque situado próximo a Boston), a qual apresenta impressionan-tes semelhanças históricas e geográficas – e até botânicas, conforme verificaremos – com a sua congênere fluminense e cujo nome, Vinland, significava “terra do vinho”.

Como seria possível, porém, uma região nas altas lati-tudes produzir uvas? Afinal, ninguém jamais saboreou um vinho russo, canadense ou inglês. Não foi a toa que as “uvas” foram consideradas, por muito tempo, como simples lenda ou então confundidas com a groselha.

A este respeito ocorreu, aliás, um fato bastante curioso quando o bispo da diocese da Vinlândia e Groenlândia, a mais extensa e remota da Cristandade medieval, preocu-pado com o alto custo e a dificuldade do frete para o vinho necessáriamente importado de longe para uso na comunhão das missas – isto numa época quando os sacerdotes católicos romanos ainda se casavam e procriavam e todos os fiéis tomavam vinho na Eucaristia, não apenas o oficiante – es-creveu ao Sumo Pontífice na longínqua Roma, propondo-lhe uma alternativa aparentemente prática e revolucionária. A resposta do papa Gregório IX, datada de maio de 1237 e preservada até hoje, foi incisiva:

“Afirmas, amado irmão, que em algumas igrejas de tua jurisdição é impossível proceder a Eucaristia por causa da escassez de vinho e perguntas se seria permitido enganar o povo com alguma simulação de piedade e lhes dar cerveja ou outra bebida em vez do vinho. Quanto a isto, respondemos-te que de modo algum podes fazer tal coisa, pois o vinho de uva, consagrado pelo ministério do sacerdote com as palavras do Criador, é necessário elemento do sacramento.”

E o vinho alienígena continuou a ser importado dificul-tosamente pelos cristãos groenlandeses. Quanto à “uva” dos escandinavos, trata-se simplesmente de uma típica planta das restingas arenosas, disseminada ao longo de toda a orla atlântica das Américas, independentemente das con-dições climáticas equatoriais ou temperadas desses litorais, apresentando extraordinária semelhança e sabor com as uvas verdadeiras, cognominada “coccoloba ochreolata” ou “uvífera” pelos botânicos que a pesquisaram e catalogaram (Linnaeus em 1753 e Weddell em 1850) ou popularmente uva-da-praia (“sea grape” nos Estados Unidos), conhecida pelos tupinambás da Região dos Lagos como “guaiaquica”, frutinha ainda encontradiça apesar da devastação ecológica sofrida por estas restingas ao longo dos anos, e com a qual os “vikings” da Vinlândia produziam seu vinho alternativo.

NOSSA TRIBO|15

A cidade e os ermos (4)

Rossana Maria Papini

Queria ir para junto dos seus, para a paz do outro lado. Lá pros tempos de pescarias, de andar da Passagem ao São Bento pela beira d’água, mariscando, brincando junto às crianças, faceiras, afogueadas pelo sol, os limos verdes, o cheiro bom de limo de camarão

Foto: José Correia

conto

Ela caminhava por sua cidade e já não a reconhecia. Tão triste aquilo. Sua cidade tão querida, amada, indo embora. Todo mundo que conhecera, que também de certa forma ama-ra. As famílias tradicionais, ricos e pobres, fora os remediados. Sabia a casa de quase todos, seus nomes, seu parentesco, li-nhagens inteiras. Os quarteirões, a posição das antigas casas. Tudo isto para quê? O tempo já se findara. Poucos chegaram até ali, aos seus oitenta anos.

A cidade quase toda fora embora, sem despedidas. A nova, que chegara, não respeitava nada nem ninguém, tinha sede de lucros, era voltada a uma outra realidade, não mais às boas vizinhanças, ao apego louco ao lugar, aos ventos, às águas azuis, cristalinas, da lagoa, que era como uma respiração, a encher (inspirar) e esvaziar (expirar). Tinha quatro marés por dia, quando o mar só tinha duas. Quem queria agora saber? Havia o tempo das pitangas, das gabirobas, dos coquinhos guriris; tempos outros. Ela pequena e linda, encravada em meio às dunas, ao restingal, colorindo com seus casarios an-tigos e barcos artesanais a paisagem. Entregue a mercancia, se convertera num produto, sua própria e tão querida cidade. Se deixara destruir, ou talvez se transformar tanto que quase não mais a reconhecia, autofágica, num culto à modernidade, à imponência de tantos prédios, à privatização da orla, ao anonimato de centro regional.

Bem, não importava. Por tantas gerações fora pequena, joia encravada entre o mar e o continente, por entre a restinga, os prados salgados, como diziam os velhos portugueses. Suas lembranças passeavam por lugares de memórias, aqueles só existentes em velhas narrativas, em fotos esmaecidas. Ia ao braço com a filha, como cega, não se encontrando mais naquelas paragens, perguntava: “mas aonde estamos agora?” E esta, ao lhe responder, procurava dar algum sentido ao sem sentido do inexorável do tempo, retê-la mais um pouco, descrevendo o agora e o que era antes, lhe pedindo com ternura: “não vai, mãe; não vá...”. Mas a velha sentia a cidade antiga a lhe chamar, lá aonde ela existia com força, queria ir para junto dos seus, para a paz do outro lado. Lá pros tempos de pescarias, de andar da Passagem ao São Bento pela beira d’água, mariscando, brincando junto às crianças, faceiras, afogueadas pelo sol, os limos verdes, o cheiro bom de limo de camarão, as épocas – sabia todas as épocas – do camarão na lagoa, da tainha, das mantas de paratis e coiós, das carapebas. Queria ir para os ermos do tempo, para boa parte de sua vida, aonde não havia tanta apropriação dos ricos, sendo menor a ganância dos opulentos, aonde a natureza era de todos, ou quase todos. Se perguntava: “cadê os barcos de pesca, as marinas públicas, beira de cais, cheias deles, a tremularem ao sabor das marés, o mundo de redes ao sol e os homens de

agulhas compridas a consertá-las?” Velhos ofícios párias, meio varridos para não ‘enfearem’ a nova cidade, não mais sua, mais de tantos, invasões, rios de gente, hordas; atarantada procurava por si, pelos seus, por tudo que não estava mais ali. A tristeza da condição humana, do ir se apagando...

Em sua cabeça habitavam velhos personagens, lugares per-didos, engolidos pela fome da cidade burguesa, do novo século, vozes de outros tempos, como a chegada de Maria Conca, naquele reino uma das mais pobrezinhas, a arrastar a filharada, peque-ninos, pés no chão, a ficar feliz com a lembrança dos outros, as sacolas de compras e roupas. Não ouvia conselhos nem sermões, não os queria, se fosse para falar, ia-se embora. Havia o Antônio, acolhido em suas limitações, a habitar um pequeno quartinho de fundos quando os agregados eram bem aceitos e o povo mi-sericordioso, fora a velha outra, temida, de grande bócio, a pitar cachimbo em frente a lagoa, a gostar da maré atrevida que lhe chegava à casa. Louca, diziam todos, e ela ria, a molhar os pés na maré de lua. “Alguma maré sempre nos invade, nos leva um dia”, pensava, e não ligava pra língua do povo.

Pelo menos não os perdera de todo, fragmentos mágicos de seu mundo ainda a habitavam, semeando vida em sua imagina-ção, estando lá como companhia, como um encontro possível, a ajudá-la na travessia de portais.

16|NOSSA TRIBO

{Sob nossa MIRA}

Campos Novos

“A literatura, como toda a arte, é uma confissão de que a vida não basta.” Fernando Pessoa

poesiaA boa notícia é que finalmente a

Fazenda Campos Novos - considerada um dos mais ricos exemplares da arquitetura rural jesuítica do Brasil e desapropriada pela Prefeitura de Cabo Frio em 1993 - foi tombada pelo Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, em Brasília. O superinten-dente do Iphan no Rio, Ivo Barreto (que já dirigiu o Iphan em nossa Região e conhece bem a importância histórica da Fazenda Campos Novos), disse que já foi licitado o projeto de obras emergenciais para a Fazenda. A prioridade, segundo Ivo Barreto, é acabar com as goteiras no telhado, que estão comprometendo a estrutura do conjunto arquitetônico.

Com o tombamento, o passo seguinte será o projeto de restaura-ção, que contará com levantamento arquitetônico completo do bem, mapeamento e diagnóstico de danos, e terminará com a proposta de adap-tação, projeto elétrico e hidráulico e análise de risco estrutural.

O tombamento protege o entorno da Fazenda Campos Novos e estabele-ce diretrizes para a área.

Perguntar não ofendeQue tipo de momento passa a vida

cultural em nossa Região?

É para registrarO envolvimento da empresa “Sa-

lineira” na programação da semana do meio ambiente - além de outras iniciativas comunitárias que ela promove e participa - é um exemplo de como uma empresa integrada à Região dos Lagos pode ajudar a me-lhorar o nosso índice de cidadania e de qualidade de vida.

Copa e artesanatoO artesanato da Região dos Lagos

esteve representado em quatro cida-des-sede da Copa do Mundo. Lindalva dos Santos Moraes, 66 anos, baiana, moradora de Arraial do Cabo, teve suas peças de artesanato escolhidas entre cinco projetos selecionados pelo Estado. Seu tema é “Suplá de taboa”. São peças feitas com taboa, planta típica de manguesais, como base para colocar o prato na mesa.

NOSSA TRIBO|17

A família de Antonio Leite está fincada em Cabo Frio. Embora tenha vivido boa parte de sua vida no Rio de Janeiro, nunca perdeu de vista sua terra, sendo neto de Zilá Leite. Sempre fez artesanato e expôs na General Osório e na Praça XV. Mas de seus 52 anos de idade, há 27 anos está direto em Cabo Frio.Seu tema é a arte náutica. Antonio Leite constrói os barcos na escala, destacando os mínimos deta-lhes. Não repete seus trabalhos. Estuda o barco que vai construir, pega a planta, enfim, nem só os cole-cionadores entendem o que ele faz, o público em geral percebe o valor do trabalho que ele produz.O atelier de Antonio Leite fica no Braga e suas peças têm os mais diversos preços, de R$ 800,00 a até R$ 8 mil.

arte: Antonio Leite

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Nossa Tribo tem experiência e qualidade em edições. Dis-ponibilizamos serviços e condições para pequenas e grandes tiragens de livros (e outras publicações). Arte, diagramação, re-visão, copidesque, registro do livro junto à Biblioteca Nacional, fotolito, impressão, acabamento e entrega, a preço acessível. Confira.Contato: nossatribo@bol.com.br

18|NOSSA TRIBO

Um dia como outro qualquerNa Praia do Forte, um canto nostálgico arrasta o ser ao nada irresistível do Oceano Atlântico

Olhei para a frente da praia. A Praia do Forte. As pessoas lá embaixo continuavam a caminhar como se nada estivesse acontecendo. Tudo se tornara um silêncio. Havia só paisagem. A correnteza do mar, lenta e eficientemente, me arrastava para o fundo. Tentei reagir acionando as forças que tinha para voltar para a margem, tocar meu pé no fundo, na areia, e sentir-me seguro.

Estava cansado. Iria me afogar. A morte me en-contrara. E surpreendentemente para mim - eu ainda estava sob meu comando - não me desesperei porque meu cérebro - tenho-o também como um organismo que sabe de sua existência e que também luta pela vida - aceitou resignadamente o que acontecia.

“Preciso respirar? Preciso escutar? Preciso saborear, afogar-me, engolir-me? Em brisas embalsamadas sua-vemente destruir-me? Na plenitude da onda, no ruído dos ecos, no sopro absoluto onde se exala o mundo, abismar-me... fundir-me... nada mais ser... alegria su-prema... alegria!”

Ouvia Isolda (Richard Wagner) cantar o epílogo de seu romance enquanto eu era conduzido a me integrar à respiração inconsciente da natureza. Era assim uma fusão do ser, do nada e do mundo, acompanhando a melodia da corrente que me conduzia para o fundo.

Giro o rosto para ter a última visão do canto do Forte São Matheus e - olha só! - meu ser reage apontando-me a saída tão simples: já que não havia como resistir à cor-rente cega, por que não sair nadando de qualquer jeito para o lado da praia, para fora da música encantadora?

Estava sem forças porque costumava caminhar na Praia do Forte com minha namorada Márcia (que se tornaria minha mulher, mãe de minhas filhas) de um ponto em frente ao Braga até o Forte São Matheus e voltar para as dunas do Braga.

Mergulhei como sempre, nadei como sempre. Exaus-to, fiquei em pé ancorado na areia olhando a praia. E quando percebi estava sendo levado pela irresistível força do marzão Oceano Atlântico sem destino.

José Correia

Meu Diário

NOSSA TRIBO|19