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PROFINT – PROFISSIONAIS INTEGRADOS
Curso de Formação em Psicodrama
“Psicodrama Bipessoal ou a Dois”
Profa. Cybele M. R. Ramalho
(PROFINT, 2011)
O Psicodrama Bipessoal é uma modalidade da abordagem terapêutica proveniente
da teoria de Moreno. A teoria bipessoal não faz uso de egos-auxiliares e atende apenas
a um paciente por vez, a relação é composta por um paciente e um terapeuta e não por
todo um grupo (CUKIER, 1992).
Para Moreno, o Psicodrama a dois era exemplo de anti-espontaneidade. Além
de Moreno, outros autores minimizam a importância do Psicodrama Bipessoal. É o
caso de Rojas Bermúdes, na Argentina, e de Vitor C. Dias, no Brasil. Rojas-Bermúdez
considera que o ego-auxiliar, na função de ator ou investigador social, é parte
indispensável do enquadre terapêutico, uma vez que constitui, junto com o terapeuta, a
unidade funcional.
Vitor C. Dias considera que o Psicodrama Bipessoal apresenta sérios
problemas, segundo ele, é muito importante a questão da distância terapêutica. Do
ponto de vista do terapeuta, o fato de ter que jogar os papéis complementares do
paciente propiciaria uma alta probabilidade de contaminação contratransferencial,
prejudicando seu papel de diretor, que ficaria abandonado nessas ocasiões. Do ponto de
vista do cliente, a perda da distância terapêutica causaria uma sensação de desproteção,
um estímulo da carga transferencial e um prejuízo em sua capacidade de observação.
Para ele esse tipo de relação a dois não tem paralelos na vida real.
Dalmiro M. Bustos considerava que psicoterapia psicodramática individual
bipessoal ou psicoterapia psicodramática bipessoal repete o modelo relacional mãe-
filho, que é um vinculo mais protetor, mas também mais temido. Esta psicoterapia é
indicada nos inícios de terapia, exatamente porque propicia a investigação das
primeiras relações afetivas, e também antes de um processo grupal. Além disso,
propicia um sistema de conhecimento mais apurado, fornecendo um contexto onde as
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únicas tensões provêm do vínculo com o terapeuta. As técnicas psicodramáticas
utilizadas por Bustos incluem a montagem clássica, substituindo o ego auxiliar por
almofadas ou objetos da sala, os quais o terapeuta dá vida, emprestando sua voz, sua
força, mas raramente contracenando diretamente com o paciente. Também se utiliza do
psicodrama interno e jogos dramáticos.
De acordo com Rosa Cukier (1992), o Psicodrama Bipessoal não consiste em
uma abordagem terapêutica menos importante que outras ou necessariamente
preparatória para uma terapia grupal. A condição de ser um indivíduo precede a
condição de ser um elemento num grupo: por isso, compreender esse indivíduo em
todas as suas nuances, desde suas primeiras trocas afetivas até a complexa estruturação
de seus conflitos e defesas atuais, é primordial para qualquer procedimento terapêutico.
Cukier (1992), afirma que esses desviantes da relação télica normal ocorrem em
qualquer forma de terapia e com qualquer manejo técnico. Segundo ela, somos capazes,
ainda que isso exija algum treino, de lidar com a sobrecarga de funções que o papel de
terapeuta requer nessas condições. Além disso, a autora não acha que o terapeuta perca
seu papel de diretor, mesmo que, eventualmente contracene com o paciente. Esse é,
segundo ela, nosso papel fundamental e, ainda que por vezes nos sintamos confusos, tal
confusão deve-se mais ao material emergente do que o fato de atuar nas dramatizações.
Será utilizada por Cukier uma metodologia que consiste em: a) estimular algum
tipo de aquecimento inespecífico e específico em movimento, além do aquecimento
inespecífico verbal; b) utilizar almofadas ou objetos da sala para marcar os papéis
complementares; c) propor a técnica da tomada de papéis para que o paciente possa ir
definindo e experimentando o papel complementar; d) quando o paciente retoma o seu
papel costuma emprestar sua voz e por vezes sua força física à almofada, a fim de
manter o aquecimento e dar mais veracidade a dramatização; e) raramente contracena
ou assume o papel do paciente e quando o faz é de forma breve; f) preferencialmente
utiliza a técnica da entrevista, que lhe permite mobilidade para ir e vir entre a fantasia
do paciente e a realidade da sessão; g) além da técnica da entrevista, utiliza vários
outros recursos e as técnicas clássicas da dramatização.
São três as etapas de uma sessão psicoramática: aquecimento, dramatização e
compartilhar. Veremos abaixo estas etapas e as técnicas utilizadas na fase da
dramatização.
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.1 Aquecimento
O aquecimento pode ser de dcois tipos: inespecífico e específico. O
aquecimento inespecífico visa situar o paciente na sessão, focando sua atenção em si
mesmo e despistando as resistências, permitindo que o novo apareça na sessão. Pode
ser um aquecimento inespecífico verbal ou em movimento, (CUKIER, op. cit.).
O aquecimento inespecífico verbal refere-se às primeiras verbalizações do
paciente que vai aos poucos concentrando sua atenção nos conteúdos relatados. O
aquecimento inespecífico em movimento evita a tentação de se ficar no verbal, meio de
comunicação que os terapeutas melhor dominam e com o qual mais se defendem. Tem
por objetivo resgatar a percepção do corpo, da respiração, enfim, do si mesmo do
paciente.
Outras possibilidades de aquecimento inespecífico em movimento são:
caminhar, alongar, alcançar o teto, trabalhar com almofadas, visualizar a situação que
causa maior dificuldade no momento, massagem, consciência corporal, respiração,
coisas que se quer versus coisas que não se quer, stop, ritmo alternado, andar em
texturas distintas, andar em linha reta e em linha curva e sentir o rosto.
Já o aquecimento específico visa a preparação do paciente para a dramatização.
Este aquecimento tem especial importância quando o trabalho se faz com cena aberta
e/ou psicodrama interno.
O aquecimento específico para dramatização de cenas envolve tanto a
caracterização de uma situação e/ou local, como a composição de personagens com
quem o protagonista vai contracenar. Quanto ao aquecimento especifico para um
Psicodrama Interno visa acalmar o paciente e auxiliá-Io a desligar sua atenção do
mundo externo, para mergulhar no espaço do mundo interno. Todas as técnicas de
relaxamento são aqui apropriadas.
2 Dramatização
Serão apresentadas aqui algumas técnicas utilizadas nesta fase, do psicodrama
bipessoal, acordo com Cukier (1992): técnicas clássicas (Duplo, Espelho, inversão de
Papéis, Solilóquio, Maximização e Concretização), a Dramatização em Cena Aberta, o
Psicodrama Interno, o Onirodrama (trabalho com sonhos), o Trabalho com imagens e
jogos dramáticos.
2.1 Técnicas Clássicas
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- Técnica do Duplo:
Esta técnica tem por objetivo entrar em contato com a emoção não verbalizada
do paciente a fim de ajudá-lo a expressá-la. Quanto mais o terapeuta estiver
identificado com o paciente, melhor duplo será capaz de fazer. O perigo desta técnica é
de não se integrar no papel e confrontar o paciente com sentimentos e emoções que não
são dele necessariamente, ou de integrado no papel não dar tempo para o paciente
sentir a emoção.
- Técnica do Espelho:
Esta consiste em o terapeuta se colocar na postura física que o paciente assume
em determinado momento com o objetivo de que o paciente, olhando para si de fora da
cena, perceba com todos os aspectos presentes nela. É um recurso útil para o fim de
dramatizações, pois é uma das técnicas que melhor favorece o insight. No caso do
Psicodrama Bipessoal, o terapeuta pode se colocar no papel do paciente ou pode colocar
uma almofada em seu lugar e descrever verbalmente o que percebe, sugerindo que o
paciente assim o veja também. Porém, essa técnica corre o risco de ser uma técnica
agressiva, sobretudo se tomar a forma de uma caricatura. Seu beneficio terapêutico se
perde, suscitando um acirramento das defesas.
- Técnica da Inversão de Papéis.
Essa provavelmente é uma das técnicas clássicas mais utilizadas na clínica.
Propicia além da vivência do papel do outro, o emergir de dados sobre o próprio papel
que, sem este distanciamento, não seria possível.
Para Rosa Cukier (1992), no psicodrama bipessoal, a evolução da tomada de
papel à possibilidade de realmente experimentar ser o outro, se dá através do
aquecimento. A técnica da entrevista feita pelo terapeuta, durante a fase da tomada de
papel do outro e, o fato de o terapeuta emprestar sua voz à almofada, que representa o
próprio sujeito vão criando este aquecimento e propiciando um "como se" mais
substancial, onde aquela relação parece estar ocorrendo no aqui e agora.
As informações colhidas nessa técnica se prestam a várias funções: saber
melhor como o paciente se sente visto pelo papel complementar; enxergar uma nova
verdade através da tomada do ponto de vista do outro; responder para si mesmo as
perguntas que tem por fazer ao papel complementar. Porém, a utilização desta técnica
fica prejudicada quando o paciente não tem condições de discriminar seu mundo
interno do outro ou quando perdem esta capacidade devido à intensidade da emoção
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evocada.
- Técnica de Maximização:
Esta consiste em pedir ao paciente que maximize um gesto, uma forma verbal,
uma postura corporal ou qualquer sinal destoante do resto de sua comunicação, quando
esta soa estereotipada, formal ou estéril
- Técnica do Solilóquio:
Esta consiste em se pedir ao paciente que "pense alto", como se fosse possível
haver um alto-falante em sua cabeça. É útil sempre que o paciente apresenta-se inquieto
ou dá mostras de estar se atendo a condutas socialmente esperadas e, portanto,
estereotipadas.
- Técnica da Concretização:
Esta consiste na materialização de objetos inanimados, emoções, conflitos, partes
corporais, doenças orgânicas, através de imagens, movimentos e falas dramáticos. No
psicodrama bipessoal, essa técnica implica uma dificuldade a mais, pois tradicionalmente
cabe ao ego auxiliar jogar o papel das sensações concretizadas. Uma solução seria jogar
com o paciente, mas intermediando nosso contato físico com um objeto (almofadas,
livros) sobre o qual, quer pressionando ou imobilizando, consegue-se o efeito desejado.
.2.2. Dramatização em Cena Aberta
Esta consiste em pedir ao paciente que monte na sessão, a situação concreta que
ele quer trabalhar. A ação dramática é externa. O trabalho com cena aberta envolve:
montagem de um cenário em que a ação se desenrola; definição do tempo em que a
ação se passa; colocação dos personagens vividos em cena; interação desses
personagens, que é manejada com todas as técnicas clássicas do Psicodrama.
.2.3. Psicodrama Interno
Este é um trabalho de dramatização onde a ação dramática é simbólica. Este
tipo de trabalho envolve sempre: uma fase inicial de relaxamento; uma segunda fase,
calcada em algum indicador físico, emocional ou imaginário, que conduz ao mundo
interno e seus personagens; a interação desses personagens, onde são utilizados os
recursos do psicodrama clássico. Esta técnica é utilizada com o objetivo de ajudar o
paciente a elaborar seus conflitos, através das imagens, sensações e associações
internas que aparecem. Também igualmente ao psicodrama clássico, a observação recai
sobre o material obtido: o lócus, a matriz e o status nascendi destes conflitos.
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.2.4. Trabalho Psicodramático dos Sonhos
Esta técnica foi sugerida por Moreno em 1959, em seu livro Psicoterapia de
grupo e Psicodrama. Wolf sistematiza melhor as idéias de Moreno a respeito do
trabalho com sonhos, que chamou essa forma de trabalho de Onirodrama (CUKIER,
op. cit.).
Basicamente sua técnica consiste em: retomada dos fatos ocorridos no dia
anterior ao sonho, até a hora em que o paciente vai dormir; montagem em cena aberta
do quarto onde o paciente dorme; divisão do espaço da sala terapêutica; montagem em
cena aberta dos conteúdos do sonho; interação dos personagens; volta do protagonista
ao cenário original, ou seja, o quarto de dormir.
Outros recursos importantes no uso desta técnica são: procurar evitar o relato do
sonho antes do aquecimento, reservar pelo menos vinte e cinco minutos para execução
da técnica completa e sempre retomar ao quarto do paciente e finalmente ao
consultório. Cukier ainda propõe a “extensão psicodramática do sonho”, um manejo
utilizado por Moreno, que consiste em propor ao sonhador que termine o seu sonho da
forma que melhor lhe convier.
3. Compartilhar
Moreno chama essa fase de participação terapêutica do grupo, pois nela todos os
participantes são solicitados a compartilhar com o protagonista os sentimentos, as
emoções e os pensamentos eliciados pelo trabalho dramático. No psicodrama bipessoal
processual, Cukier adverte que esse compartilhar de experiências e emoções deve ser
entendido com certa cautela. Em primeiro lugar, a relação terapêutica é, de fato,
assimétrica em muitos aspectos. Em segundo lugar, não é possível imaginar o cotidiano
de um terapeuta que compartilhe experiências em todas as sessões dramatizadas com
todos os pacientes. A autora ainda adverte que o terapeuta tem que sempre avaliar se o
seu Compartilhar está a serviço dele mesmo ou de seu paciente e que esta avaliação não é
fácil, posto que exige certa humildade de perceber as próprias necessidades e a
capacidade de direcionar a obtenção de satisfação narcísica em outras fontes que não no
paciente.
As Técnicas Básicas no Psicodrama Bipessoal:
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Segundo Gonçalves (1993), a palavra grega tékne significava, em sua origem,
“arte manual, indústria, exercício de um ofício, profissão, arte, habilidade para fazer
alguma coisa, meio, expediente, produto de arte, etc”(p. 19). Em relação ao
Psicodrama, as técnicas estariam ligadas a maneira de se fazer algo ou de agir
relacionadas à arte teatral, à encenação do drama.
Para fins da composição deste trabalho, faz-se necessária a explicação de
algumas técnicas psicodramáticas, dentre elas: o duplo, o espelho, a inversão de papéis,
a entrevista no papel, o solilóquio e a concretização. Técnicas não somente utilizadas na
psicoterapia de grupo, como também no psicodrama bipessoal, sendo esta modalidade
uma adaptação dos estudos de Moreno e que se dá, basicamente, na relação entre um
psicoterapeuta e um paciente. Quem melhor nos conceitua esta modalidade é Rosa
Cukier (1992):
Por psicodrama bipessoal se designa a abordagem terapêutica oriunda do psicodrama, que não faz uso de egos auxiliares e atende apenas a um paciente de cada vez, configurando uma relação bipessoal, ou seja, um paciente e um terapeuta (p. 17).
De acordo com esta autora, não se sabe ao certo quem inventou esta modalidade,
mas o que se sabe é a opinião contrária de muitos psicodramatistas quanto à eficácia de
sua prática. O próprio Moreno, em uma conversa com Bustos, afirmou que o
psicodrama bipessoal seria um retrocesso, um exemplo de anti-espontaneidade e que se
devia à incapacidade do diretor para incluir outros (a saber, ego-auxiliares) em seu
trabalho. Apesar desta crítica, sabe-se que Moreno fez uso, pelo ao menos duas vezes,
de um atendimento bipessoal1 (Cukier, 1992).
Conforme esta mesma autora, aquele que melhor avaliou a utilização desta
modalidade foi Bustos. Segundo este autor, esta situação favorece a repetição do
modelo relacional mãe-filho, apresentando-se através de um vínculo mais protetor, mas
que também, por outro lado, pode ser visto como temido por conta da maior
probabilidade de surgirem transferências. Esta modalidade seria indicada no início da
terapia, principalmente porque propicia a investigação das primeiras relações afetivas,
“ fornecendo um contexto terapêutico protetor, onde o paciente é o único foco de
atenção profissional” (p. 22). Bustos recomenda um determinado tempo de tratamento
1 No caso Rath e no Psicodrama de Adolf Hitler.
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individual, que varia de seis meses a dois anos; tempo considerado, por ele, suficiente
para que o paciente se integre a um grupo terapêutico.
Contrariando as demais opiniões, Cukier (1992) defende que o psicodrama
bipessoal não seria uma abordagem terapêutica “menor”, ou necessariamente
preparatória para uma terapia grupal. Para ela, a condição de ser um indivíduo precede a
condição de ser um elemento em um grupo, por isso:
(...) compreender esse indivíduo em todas as suas nuanças, desde as peculiaridades de suas primeiras trocas afetivas até a complexa estruturação de seus conflitos e defesas atuais, é primordial para qualquer procedimento terapêutico (p. 24).
Afirma, ainda, que o psicodrama bipessoal não se propõe a estimular e nem ao
menos criar neuroses de transferência, mas por outro lado, também, não tem a pretensão
de que estes desviantes de uma relação télica normal não ocorram. Pois se sabe que
estes ocorrem em qualquer forma de terapia e com qualquer manejo técnico.
Esclarecidos estes pontos, retomaremos a apresentação de algumas técnicas
psicodramáticas, já apresentadas anteriormente. Na terapia, o psicodramatista pode
utilizá-las para nortear a ação do protagonista, no entanto, não se faz obrigatório o uso
de técnicas em todas as sessões. Inclusive, Gonçalves (1993) destaca uma ausência
delas nos protocolos escritos por Moreno, apontando para o descompromisso do
Psicodrama em relação a quaisquer instrumentos previamente definidos.
Técnica do Duplo. Utilizada quando o protagonista encontra-se impossibilitado
ou apresenta muita dificuldade para se expressar verbalmente. Antigamente, para
aplicação desta técnica, o terapeuta – na função de um ego-auxiliar - adotava a mesma
postura, expressão corporal e gesticulação do paciente, falando a partir de sentimentos e
emoções que captava. Atualmente, muitos terapeutas utilizam-na sem reproduzir a
expressão corporal do paciente, pois o fato deste poder se sentir imitado, pode perturbá-
lo. Deste modo, o terapeuta somente coloca a mão no ombro do paciente, mostrando
que está junto a ele e passando à expressão verbal com a entonação dramática que lhe
parece adequada para aquela situação.
Técnica do Espelho. Esta técnica consiste em transformar o cliente em um
espectador de si mesmo, fazendo-o permanecer na platéia e assistindo a cenas em que o
próprio terapeuta enquanto ego-auxiliar desempenha, propiciando ao protagonista certas
condições de melhorar sua autopercepção. A representação deve ser a mais precisa
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possível, no entanto esta técnica exige muita preparação e cuidado para que o
protagonista não se sinta caricaturado.
Técnica da Inversão dos Papéis. Os pacientes fazem os papéis de seus
antagonistas, em que cada uma desempenha o papel do outro tal como o percebe, diante
do outro. Gonçalves (1993) salienta que a inversão ou troca de papéis somente ocorre
quando as pessoas envolvidas estão presentes. Neste caso, quando o paciente troca de
papel, desempenhando o papel de alguém a quem está se referindo - real ou imaginário -
ele está usando uma variação da técnica de apresentação de papéis, em que ele toma o
papel do outro (tomada de papéis), expressando o modo pelo qual o vê. Podendo-se
também o psicoterapeuta utilizar-se da entrevista no papel para pesquisar mais sobre a
vida do protagonista e dos outros que o cercam.
Em relação à inversão de papéis, podem-se destacar alguns pontos. Moreno
acreditava que esta vivência psicodramática permitia que houvesse uma intuição a
respeito do outro, em que cada um veria o outro com seus próprios olhos e com os olhos
do outro. No entanto, não basta propor o uso da técnica para que este fenômeno ocorra.
Na maioria das vezes, é com a proposta desta técnica que o paciente percebe o quanto
está distanciado do outro e o quanto tem se fechado nos seus próprios pontos de vista.
Alguns terapeutas relacionam a capacidade de inverter papéis com a saúde mental, desta
forma, seria preciso ter a percepção de si mesmo e do outro bem desenvolvida para
desempenhar a inversão.
Técnica do Solilóquio. De acordo com Moreno (apud Santos, 1993 in Monteiro,
1993), é usada pelo paciente para duplicar sentimentos e pensamentos ocultos que ele
teve em uma situação com um companheiro ou, no aqui e agora, no momento do
desempenho de determinada ação. Inicialmente, era utilizada nas terapias vinculares
quando o outro participante da relação estava contracenando com aquele que fazia o
solilóquio, ambos atuando como ego-auxiliares um do outro. No entanto, também pode
ser utilizada quando o protagonista está desempenhando algum papel em cena.
Técnica da Concretização. Conforme Santos (1993), esta técnica abrange a
representação de objetos inanimados, partes do corpo e abstrações (como os
sentimentos) com a utilização de imagens, movimentos, tomada de papel, solilóquios e
duplos. Tem como objetivo concentrar as sensações e as emoções presentes em
determinadas relações, de modo a torná-las visíveis para o paciente, para o terapeuta e,
em caso de terapia grupal, para o grupo.
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A Técnica do Esquema de Papéis
Quem melhor nos explica sobre esta técnica é Cukier em seu livro “Psicodrama
Bipessoal: sua técnica, seu terapeuta e seu paciente” (1992). Também denominada
como a técnica de tirar roupas, visa explorar os papéis que o paciente desempenha em
sua vida.
Como funciona? Primeiramente, pede-se ao paciente que defina quais os papéis
que ocupa em seu cotidiano, como por exemplo: filho, irmão, namorado, etc. Para uma
melhor visualização e posterior concretização, pede-se que ele os distribua no chão da
sala ou do consultório com o auxílio de almofadas, deixando-os marcados.
Em seguida, sugere-se que o paciente entre no papel que julga ser seu papel
principal e que atue no “como se”, apresentando este papel. O terapeuta pode auxiliar,
entrevistando o personagem. Depois de explorar bem este papel com a ajuda de algumas
técnicas básicas do Psicodrama, pede-se que ele vá se despedindo deste papel e
escolhendo outro para incorporar. E assim sucessivamente, repetindo-se as mesmas
instruções, o processo vai seguindo até que o paciente experimente todos os diferentes
papéis que joga na sua vida.
Esta técnica pode ser utilizada tanto no início do tratamento, na fase de
avaliação, para se conhecer melhor o paciente ou no decorrer do mesmo para que se
possam aprofundar determinadas questões trazidas pelos diferentes papéis.
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
EM PSICODRAMA E PSICODRAMA BIPESSOAL
Uma avaliação psicológica pode ser realizada nas primeiras sessões de psicodrama bipessoal, através das técnicas abaixo:
• Átomo Social e/ou Familiar. • Esquema de Papéis. • Desdobramento de partes do eu (concretização). • Esculturas e Fotografias. • Construção de Imagens (com o corpo, almofadas, tecidos, miniaturas, argila,
etc). • Historiodrama. Existem três formas de intervenção no psicodrama bipessoal: 1)Verbais: interação coloquial, assinalamentos, ecos, elucidações, questionamentos, etc. 2)Dramáticas: duplo, espelho, inversão de papéis, solilóquios, onirodrama, entrevista nos papéis, sandplay, jogos dramáticos, etc.
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3) Expressivas e gráficas: desenho, colagem, pintura, psicodança, psicomúsica, etc. São cinco as etapas do processo psicodramático bipessoal ou a dois:
• 1) Vinculação. • 2) Avaliação compreensiva psicodramática. • 3) Horizontalização. • 4) Verticalização. • 5) Re-projetação no Futuro. • 6) Terminação. Na fase do Acolhimento e avaliação, consideramos importante: • Formação da aliança terapêutica - exigindo do terapeuta a correta compreensão
do princípio da “confirmação”. • Redução da ansiedade e promoção do vínculo mais télico e espontâneo criador. • Técnicas previstas: escuta ativa, duplo, jogos dramáticos simples e relaxamentos
corporais. Na fase da Horizontalização é importante considerar: • Ocorre após a Avaliação Psicodramática: átomo social, esquema de papéis,
desdobramento do Eu e Historiodrama; • O cliente não só fala da sua queixa, mas já questiona a sua existência; • Levantamento das questões atuais / interpessoais e transferenciais; • Técnicas previstas (básicas): duplo, espelho, inversões, solilóquios, esculturas e
construção de imagens. Na fase da Verticalização pode acontecer: • Pode acontecer na relação Terapeuta-Cliente a re-vivência de situações
transferenciais do passado; • Mais insigts dramáticos, percepções télicas e catarses de integração; • Técnicas previstas: onirodrama, sandplay, psicodrama interno, dramatizações
internalizadas e em cena aberta. Na fase da Terminação: • Avaliação do grau de espontaneidade-criatividade nos diferentes papéis, assim
como se encontra a percepção télica, nos seus vínculos; • Desenho conjunto e encaminhamento de um novo projeto de vida para o cliente
(projeção para o Futuro); • Avaliação interativa do processo de encerramento. • Experiência emocional corretiva, com o questionamento e a renovação dos
valores e conceitos (abertura para novos sentidos e subjetivações). O Psicodrama Bipessoal realiza-se em 2 eixos: 1) Horizontal ( relacional): Atende ao desenvolvimento do Ser, partindo do estado indiferenciado e confuso, até a possibilidade de estabelecer relações mais télicas (eu-tu), despojadas ao máximo de situações transferenciais;
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2) Vertical: Representa as marcas registradas na história da pessoa, que impediram o desenvolvimento da sua matriz de identidade original (questionamento das defesas construídas e das lógicas afetivas de conduta transferidas), atualizadas no aqui e agora.
O terapeuta deve operar com o “Princípio do duplo” na jornada a dois, de confiança e compromisso mútuo (em sintonia télica). Caberá ao terapeuta, através de um adequado conhecimento de si mesmo, instrumentalizar a diferenciação entre o que é télico do que é transferencial, em prol do reconhecimento da matriz de identidade do cliente, dentro de um vínculo Eu-Tu. Todas as operações de insight e de catarse só serão válidas dentro do marco que lhes empresta uma relação T-C real e reparatória. O terapeuta deve compartilhar com o cliente a co-direção do seu processo, desmontando a estrutura hierárquica dominante.É possível aplicar o psicodrama individual sem maiores concessões a outras abordagens, como resultante de uma ação sociométrica e sociodinâmica da “díade terapêutica”. PSICODRAMA A DOIS : Para Moreno, esta díade terapeuta-cliente é o menor grupo possível. Paciente e terapeuta são membros de um grupo, onde não há superioridade do terapeuta sobre o cliente. Para Moreno, o psicodrama a dois é: “... Situação primária simples, de dois indivíduos com experiências pregressas diversas, com expectativas e papéis diferentes, encarando um ao outro, um terapeuta em potencial frente a outro terapeuta em potencial...” (1983, p.20). Observamos no Psicodrama a dois terapeuta e paciente como parceiros, membros de um mesmo grupo, com flexibilização das posições na relação terapêutica e complementaridade de papéis.É o terreno onde mais dificilmente se distingue a especificidade do psicodrama em relação às demais abordagens psicoterápicas. É uma situação de co-construção de múltiplas subjetividades, onde a cena não pode ser desvinculada do conceito de co-criação. Papéis e funções extras do terapeuta do psicodrama bipessoal: Os papéis e funções de ego auxiliar e platéia serão desempenhados de acordo com as demandas específicas das cenas. A dinâmica destes papéis só se define no Momento ou aqui e agora da ação e não previamente. Diretor e protagonista têm poucos recursos no psicodrama a dois. Ou se contentam com um ego auxiliar ou com a ausência de diretor (quando este atua como ego auxiliar). Frente a estas limitações, alguns psicodramatistas se sentem desestimulados, ou se apegam às técnicas para facilitar o desenvolvimento da ação. Se o terapeuta se colocar disponível para transitar entre os diferentes papéis e funções, ao invés de preocupar-se unicamente em “como fazer o paciente dramatizar”, a parceria para a construção do projeto dramático tem maiores possibilidades de ocorrer.
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A principal questão é “como viabilizar a dramatização, considerando as limitações impostas por uma configuração grupal reduzida ao mínimo possível?” “O psicodrama não é uma cura pela atuação, como alternativa a uma cura pela conversa” (MORENO, 1979). A dramatização, em si, não constitui garantia de desenvolvimento da Tele e da espontaneidade dramática. Se tomada como um “dever” e não como um instrumento disponível , a encenação perde seu caráter libertador. “Muitas vezes a encenação fortalece as teses conscientes do cliente” e não libera o inconsciente, se for forçada. A ação não substitui a palavra, e vice versa. O diálogo é a base sobre a qual se desenvolverá o texto dramático. O objeto de pesquisa do psicodrama é a relação, o entendimento da cena que, com outras cenas, constituem a trama. O foco diz respeito à subjetividade nas relações e sua objetivação cênica. A partir dos discursos, histórias e reflexões surgidas no contexto grupal, se delineiam os personagens e os conflitos que compõem o drama a ser transposto para o palco. O objeto de pesquisa do psicodrama bipessoal é a relação, o entendimento da cena que, com outras cenas, constituem a trama. O foco diz respeito à subjetividade nas relações e sua objetivação cênica. A partir dos discursos, histórias e reflexões surgidas no contexto grupal, se delineiam os personagens e os conflitos que compõem o drama a ser transposto para o palco. No Psicodrama Bipessoal, a subjetividade do T está mais diretamente implicada no estabelecimento do clima protagônico. É a sua disponibilidade, identificação ou adesão afetiva, que dará ou não vida aos personagens emergentes que se apresentam na ação dramática. Ele se torna cúmplice para que o relato se faça drama ( função observador-participante). A medida que os diferentes personagens do discurso do protagonista se concretizam no cenário, diretor e protagonista negociam a melhor forma de apresentá-los. Ao cliente cabe escolher o tempo, o lugar, a cena, o ego-auxiliar que ele precisa para produzir o seu psicodrama, etc. Quanto melhor for o treinamento do terapeuta para ser ego-auxiliar / ator, menores serão suas dificuldades para atuar nos papéis propostos pelos clientes. O terapeuta tem a liberdade de recusar-se a atuar um papel e pode recorrer a objetos, almofadas, miniaturas, tecidos, fantoches, etc. Tal estratégia pode ser limitante, pois exige do protagonista um nível elevado de aquecimento para interagir com um objeto (algo que não interage socialmente). Mesmo usando objetos, o fluxo da ação dramática dependerá da habilidade do terapeuta para manter o aquecimento e transitar entre o papel de diretor e o de ego auxiliar ( usar a flexibilização de papéis). No compartilhar final, o terapeuta fala a partir de sua vivência como ego-auxiliar e como platéia. A função de analista, na maioria das vezes fica em segundo plano. Importa mais as trocas existenciais afetivas e as associações entre as dramatizações e outras experiências da vida do cliente. A dramatização cria uma nova realidade
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para aqueles que dela participam, propicia uma re-significação dos papéis e de sua sociodinâmica, redimensionam as relações nos demais contextos. As transformações se estendem para a vida do terapeuta e para a relação terapeuta-cliente. O Psicodrama se ancora na definição do ser humano como ser relacional, cujo eu é derivado dos papéis, tendo a sua subjetividade como um fenômeno interpessoal. A interação cria os sujeitos. O terapeuta não teme / evita misturar-se com o paciente. A co-criação não é um risco, mas uma oportunidade. Especialmente no psicodrama a dois, cabe ao psicodramatista procurar ativamente criar as interações que promovam a espontaneidade-criatividade. O papel do terapeuta é criar condições para o cliente / autor possa expressar e solucionar seu drama por meio do exercício e condução cênica de vários papéis. O psicodramatista compromete-se ativamente com o projeto de investigação e alivio do sofrimento proposto pelo cliente. “Terapeuta e cliente são agentes terapêuticos em potencial” (MORENO, 1983). Qualificados como “parceiros” e complementares, terapeuta e cliente estão livres para criarem e atuarem em conjunto.A dramatização é um recurso a mais e não uma meta a ser alcançada. Longe de ser um desvio do projeto socionômico, o psicodrama a dois é um desafio à nossa capacidade de torná-lo realidade original.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
• ALMEIDA, Wilson Castello de. Encontro existencial com as psicoterapias. São
Paulo: Editora Ágora, 1991.
• CUKIER, Rosa. Psicodrama Bipessoal: sua técnica, seu terapeuta e seu paciente.
São Paulo: Editora Ágora, 1992.
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