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    ASPECTOS ESTTICOS DA MSICA SEGUNDO AS LEITURAS DOS LIVROS ESTTICA MUSICAL DE CARL DAHLHAUS,

    ESTTICA MUSICAL DE ENRICO FUBINI E BELO MUSICAL DE EDUARD HANSLICK.

    Mayki Fabiani Olmedo1 [email protected]

    UNESP-SP Resumo: A anlise do objeto musical tem criado diversas divergncias de ordem filosfica, analtica e interpretativa, principalmente quando a msica escrita, concreta em seus alicerces, se transforma em abstrata ao ser executada. O sentido da msica ao ser escrita e ao ser interpretada, sua intemporalidade, sua impresso subjetiva, seus conceitos transformados e re-transformados, so elementos conflitantes abordado por Dahlhaus, Fubini e Hanslick. Esse trabalho analisar como cada autor expressa a questo da esttica musical, os pontos convergentes e divergentes de cada um deles e as problemticas levantadas por cada um. Palavra-chave: Esttica, Daulhaus, Hanslick, Fubini INTRODUO

    A esttica foi fundada e nomeada em 1750, pelo filsofo alemo Alexander

    Baumgarten (1714-1762). Primeiramente concebida como teoria da percepo, da faculdade inferior do conhecimento e como complemento da lgica.2

    A palavra esttica vem do grego asthesis e significa sensao, sentimento. Segundo Rosenfield (2009), a esttica analisa o complexo das sensaes e dos sentimentos, investiga sua integrao nas atividades fsicas e mentais do homem, debruando-se sobre as produes (artsticas ou no) da sensibilidade, com o fim de determinar suas relaes com o conhecimento, a razo e a tica. 3

    A esttica estava, antes de Baumgarten, ligada a reflexes auxiliares da filosofia, porm os conceitos que a faz se tornar autnoma (enquanto reflexo), j eram discutidos h tempos.

    Rosenfield (2009) aponta Scrates e Plato como iniciadores de algumas problemticas da esttica que caminha posteriormente pelo neoplatonismo

    1 Mayki Fabiani Olmedo tcnico em Violo Popular Pela Fundao das Artes de So Caetano do Sul (FASCS), Bacharel em Composio pela Faculdade de Artes Alcntara Machado (FIAM-FAAM) e mestrando em Educao, Artes e Histria da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e mestrando em Msica na UNESP - SP. Atualmente Orientador de Artes da prefeitura de Ribeiro Pires (SP), onde leciona violo, rege a banda e o coro infantil tambm professor do Guri Santa Marcelina onde leciona teoria musical. 2 DAHLHAUS, 2003, pg. 16. 3 ROSENFIELD, 2009, pg. 7.

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    cristo, e que por ventura esto presentes at hoje, a problemtica grega associava o belo com o bem, o valor moral do indivduo: o indivduo que tem valor moral suscetvel belo e tem a possibilidade de atos moralmente bons; Plato parte desses costumes, que so ao mesmo tempo religiosos, polticos e lingusticos e sintetizam as diversas facetas semnticas do termo belo. 4

    O belo no se trata apenas do sentindo de beleza de algo, mas sim todo o contedo de uma obra, as sensaes por ela causada, por conseguinte, o belo no constitui o ponto de partida da nova disciplina da esttica, mas um elemento de prova numa argumentao, cujo objectivo era a justificao de uma emancipao da percepo sensvel. 5

    A msica oferece um vasto material para a anlise esttica, e mesmo numa anlise superficial, surge por mais de um motivo como uma arte com problemas absolutamente especficos, no comparveis aos de nenhuma arte.6

    Atravs das leituras dos textos citados vamos traar os pontos em comum de cada texto, as problemticas, e a perspectiva esttica da msica.

    NDICE

    Entre os ttulos mencionados o mais antigo Do Belo Musical, um contributo para a Reviso da Esttica da arte dos Sons escrito por Eduard Hanslick em 1854. O livro est dividido em sete captulos sendo: Captulo I, a) Ponto de vista no cientfico da Esttica musical anterior; b) Os sentimentos no so o fim da msica. Captulo II, os sentimentos no so o contedo da msica. Captulo III, o Belo musical. Captulo IV, anlise da impresso subjectiva da msica. Captulo V, a percepo esttica da msica em comparao com a patolgica. Captulo VI, as relaes entre a msica e a natureza. Captulo VII, os conceitos de contedos e forma na msica.

    A Esttica Musical de Carl Dahlhaus escrito em 1967 dividida da seguinte maneira, Texto Inicial de Advertncia; Pressuposto Histrico; Msica como Texto e Obra; Transformaes da Esttica do Sentimento; Emancipao da Msica Instrumental; Juzo Artstico e Juzo de Gosto; Gnio, Entusiasmo, Tcnica; Afecto e Ideia; Dialtica da Interioridade Ressoante; A Polmica em torno do Formalismo; Msica Programtica; Tradio e Reforma na pera; Esttica e Histria; Para a Fenomenologia da Msica; Critrios.7

    O terceiro texto analisado de Enrico Fubini publicado em 1995 est dividido em dez captulos e em duas grandes partes: Primeira parte, Os problemas estticos e histricos da msica, Segunda Parte Breve histrico do

    4 ROSENFIELD, 2009, pg. 11. 5 DAHLHAUS, 2003, pg. 16. 6 FUBINI, 2008, pg 14. 7 As palavras de grafia diferenciada so extradas do portugus de Portugal.

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    pensamento musical. Os captulos so: As caractersticas da disciplina; Ocidente cristo e a ideia de msica; A msica e o sentido da sua historicidade; Marginalidade social do msico; Msica e percepo; O mundo antigo; Entre o mundo antigo e o medieval; A nova racionalidade; O Iluminismo e a msica; Do idealismo romntico ao formalismo de Hanslick; A crise da linguagem musical e a esttica do sculo XX.

    A julgar pelas diferentes datas de publicao e pelos ttulos de cada captulo vemos as preocupaes focadas em diferentes pontos, em algum momento os pontos de vistas se convergem e os assuntos tornam-se os mesmos. Tanto Dahlhaus como Fubini tiveram contato com a literatura de Hanslick, possvel tambm que Fubini tenha tido contato com a literatura de Dahlhaus.

    A PROBLEMTICA MUSICAL

    Eduard Hanslick em seu esforo em direo a reviso da esttica da arte do som parte do pr-suposto que a msica est para traz das outras artes no que se diz respeito ao estudo da esttica, a msica uma arte, mas necessrio reconhecer como instncia esttica sua fantasia e no o sentimento. 8 Nessa mesma circunstncia da arte dos sons est desfavorecida, Fubini (2008) complementa: Os limites da reflexo sobre a msica talvez no sejam to embatidos quanto amplos, bastante mais amplos do que as reflexes paralelas sobre as outras artes.9

    Os limites da observao da problemtica musical so amplos, a prpria histria da msica at o sculo XIX foi, de facto e de direito, uma histria independente da das outras artes,10 e isso colaborou para que a msica tivesse anlises mais tardias comparadas as outras artes. A msica como pontua Dahlhaus (2003) transitria; passa, em vez de resistir reflexo,11 ou seja, no tem a mesma existncia como um quadro ou uma escultura, na esttica de Hegel, reaparece ainda a mesma ideia, a concepo de que a estrutura temporal da msica uma deficincia.12

    Segundo Fubini (2008), a histria nasce precisamente da recordao e da reflexo sobre o passado e da conscincia de que o presente, de certa forma, se associa a um interior em que se reconhece e em que radica, e complementa dizendo, nada disso ocorreu com a msica, que cresceu segundo modalidades diferentes das outras artes, sem elaborar uma histria a que pudesse remeter ao longo do seu trajecto. 13

    8 HANSLICK, pg. 16. 9 Ibidem, pg.. 12. 10 FUBINI, 2008, pg. 13. 11 Ibidem, pg. 23. 12 Ibidem, pg. 23. 13 Ibidem, pg. 35.

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    A prpria estrutura da msica a coloca em posio diferenciada das outras artes, com problemas especficos, porm, a msica, de modo anlogo a uma obra de arte plstica, tambm objecto esttico, objecto de contemplao esttica, 14

    Alm do problema da historicidade, a msica apresenta problemas em sua concepo artstica, em sua escrita, em sua execuo e em seu reconhecimento como obra de arte.

    COMPLEXIDADE MUSICAL.

    O contedo da msica no o sentimento, sobre essa temtica est o captulo II de Hanslick, se, o contedo de uma obra de arte potica ou plstica pode expressar-se com palavras e reduzir-se a conceitos, na msica, os sons e a sua combinao artstica seriam, pois, unicamente o material, o meio de expresso, com que o compositor representa o amor, a coragem, a devoo, o arrebatamento,15 o nico e exclusivo contedo e objecto da msica so formas sonoras em movimento,16 a matria prima da msica o som, todas as artes so capazes de representarem sentimentos atravs da matria prima de cada uma.

    De modo anlogo, os materiais elementares da msica tonalidades, acordes e timbres so j em sim caracteres. Temos tambm uma arte de interpretao demasiado diligente para o significado dos elementos musicais; sua maneira, a simblica das tonalidades de Schubert proporciona o equivalente da interpretao das cores levadas a cabo por Goethe. 17

    Representativamente a msica teve a mxima de suscitar sentimentos mais do que a ideia de ser associada matemtica, a doutrina dos afectos, por muito que salientasse o efeito da msica, o movimento do nimo, pressupunha implicitamente uma concepo, antes de mais, objectivadora das caractersticas sentimentais musicais, a concepo de que o objectivo da msica representar e suscitar afectos constitui um topos, que penetrou to profundamente na histria como a tese oposta de que a msica matemtica ressoante.18

    A msica uma arte temporal, extingue-se, apaga-se sem deixar rasto com o acto da sua execuo,19 na medida em que ela forma, alcana, falando em termos paradoxais, a sua existncia verdadeira justamente no momento em que se esvai.20

    14 Ibidem, pg. Pg. 23. 15 HANSLICK, 2002, Pg. 23. 16 Ibidem, 2002, Pg. 42. 17 Ibidem, 2002, Pg. 27. 18 DAHLHAUS, 2003, Pg. 30. 19 FUBINI, 2008, Pg. 36. 20 Ibidem, 2003, Pg. 24.

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    A questo da msica como texto e obra, o captulo trs de Dahlhaus, a citao 18 foi extrada desse captulo e apresenta toda a discusso da temporalidade da msica, e sua ao enquanto poiesis e praxis:

    O chantre Nicolaus Listenius, que estudara em Wittenberg e sofrera influncia de Melanchthon, atribura em 1537, na sua Msica, a composio poiesis. Separou da musica practica, da actividade musical, uma musica poetica, que fazer e produzir: um trabalho, por meio do qual produzido, que mesmo depois da morte do autor representa ainda uma obra completa e por si subsistente.21

    A msica obra plstica na medida em que o documento musical preservado, contudo, por vezes, o que representou em seu tempo de criao um valor diferente do que representa em tempos posteriores, a Paixo segundo So Mateus de Johann Sebastian Bach, escrita para o ofcio da igreja, representa hoje obra prima mxima, a actividade do compositor plstica sua maneira e comparvel do artista plstico.22 A msica a atividade mxima do compositor e o material sentimental usado pelo compositor para a construo da composio indiferente do ponto de vista da esttica:

    Do ponto de vista esttico indiferente se Beethoven, em todas suas composies escolheu determinados assuntos; no os conhecemos, por isso, no existem na obra. O que existe a prpria obra, sem comentrio algum, e assim o jurista elucubra a partir do mundo o que no est registrado nas actas, assim para o juzo esttico no existe o que vive fora da obra de arte.23

    Atravs do documento musical a msica atinge o status de obra plstica, mas s a partir de quando se iniciou a preocupao com a escrita musical que se pode analisar o contedo musical, tendo assim, pouco restante do pensamento musical de sociedades antigas

    Podemos ter uma prova desta ausncia de conscincia da sua dimenso histrica ao verificar que as primeiras e parciais experimentaes de histrias da msica aparecem apenas em finais do sculo XVIII, ao passo que nas outras artes se escreveu a histria, embora de forma diversa da dos nossos critrios histricos, em tempos bem mais remotos.24

    A tradio musical em determinado momento se dividiu entre uma tradio culta, chamada de erudita e sua correspondente do povo, popular, a msica popular pouco se preocupou com a tradio escrita, tornando assim de difcil anlise a tempos posteriores, fazendo uso da tradio oral, quando possvel, portanto a msica tem um modelo de historicidade diferenciado das outras artes,

    21 Ibidem, 2003, Pg. 22. 22 HANSLICK, 2002, Pg. 60. 23 Ibidem, 2003, pg. 51. 24 Ibidem, 2008, Pg. 37.

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    a msica precisamente feita de sons e no de palavras, de pedras ou de cores sobre ela.25

    A anlise da natureza musical torna-se ainda mais complexa ao destacarmos sua ao em duas partes a escrita e a executada:

    O compositor eficiente tem o conhecimento prctico do caractr de cada elemento musical, quer seja de um modo mais instintivo quer mais consciente. Mas a explicao cientfica dos diversos efeitos e impresses musicais exige um conhecimento terico dos mencionados caracteres e da sua riqussima combinao at ao ltimo elemento discriminvel.26

    A composio no em si a msica ainda, porm j tem contido o elemento da natureza musical: enquanto composio, como escrita, a arte expressiva musical enreda-se num paradoxo que, no entanto, no se pode abolir como contradio morta, mas se deve conceber antes como contradio viva, que impele e evoluo histrica.27

    LINGUAGEM MUSICAL

    Como escreveu Adorno, a msica tende para uma linguagem sem intenes. (FUBINI, 2008, Pg. 25).

    A msica ganha aos poucos status de linguagem, uma linguagem que suscita sentimentos, como j abordado:

    Uma espcie de linguagem que vem antes da linguagem, linguagem que vem antes do poder denotativo da palavra mas que mesmo assim rica em evocaes e ressonncias, talvez devido como dissemos a um certo isomorfismo da linguagem dos sons com a dos sentimentos e dos afectos.28

    A arte sonora que at certo ponto estava sombra da palavra (oratrio, madrigal, pera), se liberta e se torna autnoma, a msica passa a ser instrumental, a ausncia das palavras carecia de justificao, embora a emancipao da msica instrumental, relativamente ao prottipo da vocal contasse j sculo e meio e fosse reconhecida....29 A msica ao se desvincular da palavra ganha o ttulo de absoluta apesar de opinies contrrias: Se a opinio de que a msica instrumental incompleta e exige um complemento mediante as palavras constitua, no sistema de Hegel, um momento parcial de uma dialctica

    25 FUBINI, 2008, Pg. 45. 26 HANSLICK, 2002, Pg. 47. 27 DAHLHAUS, 2003, Pg. 37 28 FUBINI, 2008, Pg. 33. 29 DAHLHAUS, 2003, Pg. 40.

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    segundo a qual a msica, enquanto arte perde o que ela, como msica, ganha, e perde enquanto msica o que, como arte, ganha....30

    Quanto ao surgimento da msica instrumental, surge tambm a reflexo sobre o prprio significado da msica:

    Evidentemente, o problema do significado da msica assumiu as mais dspares formas ao longo dos sculos, e ainda que na substncia se reduza sempre ao mesmo mago, tenta-se reconhec-lo frequentemente por detrs das mscaras usadas consoante o contexto histrico, ideolgico e filosfico em que se insere. 31

    A msica torna-se singular do ponto de vista da anlise do significado, com efeito, todo o discurso sobre msica uma interpretao da prpria msica, uma tentativa de revelar o seu significado e as interpretaes so infinitas, no sentido de nunca esgotarem o que a msica nos pode sugerir.32

    O captulo IV de Hanslick tem por ttulo anlise da impresso subjectiva da msica, trata de expor o carter da fantasia que se utiliza a obra musical, sendo esse um dos pontos do belo musical.

    Porque a fantasia, enquanto actividade por intuir, e no o sentimento, o rgo a partir do qual e para o qual nasce todo o belo artstico, a obra de arte musical surge tambm como uma criao no condicionada pelo nosso sentir, especialmente esttica, que a considerao cientfica, separando-a dos acessrios psicolgicos da sua origem e efeito, deve apreender na sua constituio intrnseca.33

    De fato o substrato da msica de carter subjetivo, suas impresses passam possivelmente diferenciadas pelo juzo do compositor, do interprete e do ouvinte, ainda que tenhamos de reconhecer a todas as artes, sem exceo, o poder de influir sobre os sentimentos, no se pode negar-se que o modo como a msica o exercita algo especfico, somente a ela peculiar.34

    Hanslick faz uma crtica em relao ao desenvolvimento da esttica: Nada impediu tanto o desenvolvimento cientfico da esttica musical como o valor excessivo que se atribuiu aos efeitos da msica sobre os sentimentos.35

    Fubini aponta um suposto parentesco da msica com a linguagem verbal por utilizarem, tanto a linguagem verbal quanto a msica, o som: Assim como a linguagem verbal normalmente tende a prescindir do elemento musical a ponto

    30 Ibidem, 2003, Pg. 45. 31 Ibidem, 2008, Pg. 28. 32 Ibidem, 2008, Pg. 32. 33 HANSLICK, 2002, Pg. 59. 34 Ibidem, 2002, Pg. 64. 35 Ibidem, 2002, pg. 75.

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    de abdicar completamente dele, tambm a msica pode chegar a tornar-se uma linguagem autnoma, prescindindo do elemento discursivo. 36

    A NATUREZA MUSICAL

    O homem tentou fazer da msica um elemento de transferncia da essncia da natureza, porm ao tentar fazer com que os sons combinados gerem imagens, a msica, se distancia da natureza e j no pode atingir essa essncia.

    A natureza musical tem particularidades que a distancia da natureza: Ela percorre as partes singulares, reflecte sobre elas, mantm-nas todas juntas para restaurar a impresso precedente, compara. Quanto mais exactamente reflecte, quanto mais intesamente compara, tanto mais evidente se torna o conceito de beleza e, por isso, um conceito claro de beleza j no uma contradio em si; nada mais do que uma perfeita distino da sua sensao confusa. (HERDER apud DAHLHAUS, 2003, pg. 121).

    Hanslick expe que as relaes naturais da msica costumavam sobretudo considerar-se apenas do ponto de vista fsico, e pouco se foi alm das ondas e figuras sonoras, do monocrdio, etc. E, no entanto, a relao da msica com a natureza desfralda as mais importantes consequncias para a esttica musical. Para Hanslick a msica sugere duas matrias, uma matria bruta que trabalhada e em seguida se torna a msica, essa resultante a segunda matria.

    Em ambos os pontos, a natureza comporta-se perante as artes como a dispensadora maternal do primeiro e mais importante dote. Vale a pena tentar rever de passagem este equipamento no interesse da esttica musical e examinar o que a natureza, cujos dons so razoveis e, por isso, desiguais, fez em prol da arte sonora.37

    A reflexo que Hanslick faz sobre natureza e msica profunda, a natureza gera os materiais primrios para msica: se se indagar at que ponto a natureza proporciona matria para a msica, depreende-se que ela o fez apenas no nfimo sentido do material bruto, que o homem fora a emitir som.38 A principal finalidade dessa matria extrada da natureza produzir som, se por um lado no encontramos na natureza uma organizao sonora (melodia e harmonia), parecida com que criou o homem, foi com o trabalho do material vindo da natureza que se fez a natureza musical.

    A natureza musical abrange todo o universo dos sons, melodia, harmonia, ritmo, e suas desdobras, como as caractersticas sonoras: timbre, altura e

    36 FUBINI, 2008, pg. 33. 37 Ibidem, 2002, pg. 88. 38 HANSLICK, 2002, pg. 88

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    durao. A linguagem musical que foi altamente desenvolvida durante os diferentes perodos tem em si, em cada perodo, uma qualidade diferenciada das linguagens que se sucederam.

    Fubini (2008) apresenta a percepo musical ligada natureza do homem: A ideia de que a percepo da msica tem seu fundamento na natureza do homem e de que as regras que presidem composio musical so, ao invs, em boa parte fruto da cultura e, portanto, da histria, apresentou-se mais do que uma vez ao pensamento ocidental, se bem que no de modo unvoco.

    A natureza da msica vai ser transmitida pelo campo da histria e da anlise formal de maneira no apropriada muitas vezes, uma maneira que no demonstra a impresso do desenvolvimento da arte sonora, mas como se a msica tivesse se fundamentado em blocos, o que de fato no aconteceu.

    CONCLUSO O todo de uma obra musical, pr-apreendido, suposto, em expectao vazia ou fracamente determinada, tem alguma semelhana com o todo de um objecto visvel que, a princpio, dado numa vaga impresso de conjunto para, em seguida, atravs de momentos individuais que o observador apreende uns aps outros, ser pouco a pouco determinado com mais pormenor. DALHAUS, 2003, pg. 113).

    A esttica da msica vai trazer luz do conhecimento, elementos prprios, que a histria e a anlise no se comprometem em esclarecer. De fato a esttica de uma arte a mesma das outras, porm a esttica musical se desdobra de maneira singular em relao s outras artes, mostrando a problemtica do campo da temporalidade musical ou atemporalidade da matria musical e suas formas abstratas que afetam de maneira direta o homem, denominados fantasias, tratados como o belo. O que foi chamado de sentimento ocasionado pela msica a substncia esttica agindo na esfera humana.

    A msica e todas as qualidades estticas intrnsecas so relatadas por Hanslick, Dahlhaus e Fubini de maneira complementar, mas de pontos de vista diferenciadas. Hanslick trata das questes do belo musical e essas questes so utilizadas por Dahlhaus e Fubini. A esttica musical de Dahlhaus e esttica da msica de Fubini so esclarecedores do ponto de vista da abordagem esttica e do aprofundamento reflexivo.

    Buscando a essncia que nutre a msica, as trs obras citadas de maneira, vo alm do objeto histrico ou meramente analtico ou filosfico, e tratam da esttica e de seus fundamentos.

    Ao perguntarmos, qual o contedo da msica? possvel que a resposta surja de maneira simples e objetiva sem que quem a responde sublime o conjunto sonoro e sua grandeza no palpvel no limitvel e imprevisvel; Contudo a

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    cincia musical por assim dizer emblemtica em sua concepo, podendo significar em sua totalidade muito mais do que as somas das partes.

    BIBLIOGRAFIA

    DALHAUS, Carl. Esttica musical. Lisboa: Edies 70, 2003. FUBINI, Enrico. Esttica da musica. Lisboa: Edies 70, 2008. HANSLICK, Eduard. Do belo musical: um contributo para a reviso da Esttica da Arte dos Sons. Lisboa: Edies 70, 2002. ROSENFIELD, Kathrin H. Esttica. Rio de Janeiro: Zahar, 2006.