A Critica da FIESP a LEVY

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  • 7/25/2019 A Critica da FIESP a LEVY

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    16 onj unt ura E c onmi c a | S e t e mbro 2 0 1 5

    PONTO DE VISTA

    O Brasil enfrentou por dcadasinflao elevada e crescente, proces-so que desaguou na hiperinflao dosanos 90. A escalada inflacionria noBrasi caracterizou-se por dois mo-tores: o processo de indexao, queempurra para os preos qualquerchoque na economia; e a capacidade

    que os grupos organizados da socie-dade tm de impedir que a po ticaeconmica estanque esse processo.

    Nossa hiperinflao foi fruto deuma coalizo inflacionria, que jun-tava os interesses dos empresrios edos tra a adores organizados. Osdois grupos repassavam para, res-pectivamente, os preos e os salriosqualquer aumento de custos ou de

    custo de vida. Dessa forma, a infla-o crescia como o a de neve.A funo da poltica monetria

    precisamente a de disciplinar oconflito distributivo do capital e dotrabalho, evitando que se transfor-me em impu so in acionrio. Assim,tambm se impede que a aceleraoda inflao, que pode resultar doconflito distributivo, piore a vidados trabalhadores mais desorgani-

    zados, que apresentam piores con-dies de se defender da subida per-sistente dos preos. De forma maisgeral, a poltica monetria defendeo direito di uso de toda a sociedadede no ser prejudicada pelas muitasconsequncias danosas da acelera-o inflacionria. H farta evidncia

    na literatura econmica e nossa ex-perincia dos anos 80 e 90 uma de-monstrao de que no longo prazoa inflao ruim para todos.

    Trazendo o foco para a conjun-tura atual, aps um perodo razoa-ve mente ongo de onana e depoisde quatro anos 2011 at 2014 de negao dos problemas, estes seacumularam. A taxa de desemprego

    caiu abaixo da taxa neutra, a infla-o adquiriu inrcia em torno doteto da banda do regime de metas,apesar dos preos represados, o dfi-cit pblico aumentou e surgiu dficitexterno de mais de US$ 100 bilhes.

    Nesse contexto, trazer a in aopara a meta significa quebrar a espiralpreos-salrios. A poltica monetriaatinge esse objetivo reduzindo o poderde barganha que empresrios e traba-

    lhadores tm de resolver seu conflito

    distri utivo repassando-o ao resto dasociedade. A maneira de faz-lo acriao de desemprego e a reduo docrescimento promovidos pela reduoda demanda agregada. O desempregoimpede que os tra a adores consigamrepassar toda a inflao passada paraseus salrios. J a recesso provocaelevao dos estoques e dificulta paraos empresrios repassar o aumento decustos aos preos no mercado consu-

    A crtica da Fiesp a Levy ea coalizo inflacionria

    Samuel Pessa

    Pesquisador associado da FGV/IBRE

  • 7/25/2019 A Critica da FIESP a LEVY

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    PONTO DE VISTA

    midor. In e izmente, a umanidadeno encontrou outra forma de lidarom a inflao.

    O presidente da Fiesp, Paulo Skaf,tem recorrentemente atacado Joa-

    quim Levy, a egando que o ministroda Fazenda no liga para o emprego,e que se dedica apenas a apoiar o au-mento dos juros e a elevar os impos-tos. A atitude de Skaf ecoa a coalizoin acionria que oi vitoriosa nosanos 70 e 80, e que acabou nos le-ando hiperinflao nos anos 90.

    Surpreende que pessoa bem infor-mada e que tem posio to destacada

    em nossa sociedade no ten a apren-dido a lio das dcadas de 70 e 80e incio dos anos 90: no longo prazo,a inflao sempre mortfera para obom desempenho da economia e aca-a piorando a vida de todos. Surpreen-

    de que o presidente da Fiesp no tenhaaprendido com a inflao em 35% aoano na Argentina e muito acima de100% ao ano na Venezuela.

    S a deveria estar atento ao atode que, quando a inflao dispara eo populismo toma conta do processopoltico, muito comum que o bodeexpiatrio pela alta descontroladados preos aca e sendo a prprialasse empresarial, que demoniza-

    da pelas lideranas polticas. Este um processo j em franco curso naVenezuela, onde inclusive leva a de-

    sapropriaes de ativos e empresas,e que ocorre de forma episdica naArgentina. muito difcil entenderomo poderia ser do interesse das

    empresas uma escalada inflacionriaque arruinaria a economia no mdioe longo prazo e estimularia o popu-lismo anticapitalista.

    , no entanto, outra agendapossvel em tese para lderes desindicatos patronais e laborais.

    actve reduzir o custo socia pro-movido pelo esforo de desinflaose o capital e o trabalho sentareme conversarem entre si. O objetivotem de ser a moderao das expec-

    tativas de aumentos de sa rios ede preos. Tudo deve ser feito pornegociao, sem interferncia go-ernamental ou coero de qual-

    quer espcie. Pases da Europaontinenta adotam mecanismos de

    negociao abrangente para ajudara autoridade monetria a fazer oseu trabalho anti-inflacionrio.

    O problema, porm, que, comomencionado acima, a tradio brasi-

    eira no de negociaes do tipo des-rito, que so tpicas da histria eco-nmica das ltimas dcadas de pasesomo a Alemanha. L, a abrangncia

    e a representatividade dos sindicatos,em relao ao total da fora de tra-balho, so muito maiores. O podersindical mais centralizado e menospulverizado do que no Brasil.

    O mesmo ocorre do lado patro-nal, e o pano de fundo um ban-

    co centra com tradio de durezae independncia at o adventodo euro, o Bundesbank, que virouo cerne do atual Banco Central Eu-ropeu (BCE). Capital e trabalho

    sa em que a autoridade monetriano vai avalizar uma eventual coa-lizo inflacionria, e so forados apactuar entre si uma moderao deseus objetivos. Imaginar que tal mo-de o possa ser transp antado para oBrasil num ato de mgica ou de vo-luntarismo do governo uma recei-ta para obter, em seu lugar, a espiralde salrios e preos que atormentou

    o Brasi por dcadas.Se, por outro lado, patres e tra-

    balhadores tentarem por si mesmosuma agenda desse tipo, nada a obs-tar. O governo deveria observar deorma neutra e re orar a indepen-

    dncia do BC, para que este s mu-dasse sua poltica monetria se efeti-vamente houvesse a implementaode acordos consistentes de modera-

    o de preos e sa rios.Jogar pedras no ministro Levy ou

    atacar o Banco Central no colocara inflao na meta. A ideia de quea forte crise atual resulta das polti-cas de Levy, menos de um ano nocargo, e no de erros acumulados aolongo de seis anos de um regime depoltica econmica desastroso co-nhecido por nova matriz econmica

    , miopia di ci de entender a me-nos do debate movido pela disputapoltica. Todas as pessoas bem in-formadas sabiam que a situao eracrtica h muito tempo. A desacele-rao da economia bem anterior ida do ministro Levy Fazenda.O investimento vem caindo h oitotrimestres seguidos. Impressiona quePaulo Skaf no tenha aprendido aslies da hiperinflao brasileira.

    A funo da poltica

    monetria precisamente

    a de disciplinar o conflito

    distributivo do capital e

    do trabalho, evitando quese transforme em impulso

    inflacionrio