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Boletim da S.B.H.H. - Volume VI - Julho/84 - 125 13 A ESPLENECTOMIA E A CRIANÇA A esplenectomia é um procedimento diag- nóstico e terapêutico por vezes utilizado na criança com afecção hematológica. Mais de 50% das esplenectomias realizadas em pacientes pediátricos são indicadas por moléstias hemato- lógicas, destas aanemia microesferocíticaé a de indicação cirúrgica eletiva mais comum. A partir da década de 60, observa-se na literatura a crescente preocupação de numero- sos autores para a conservação do baço, quer nos traumatismos esplênicos quer na hiperten- são portal. As indicações da esplenectomia tendem a diminuir nos traumas do baço, graças ao gradativo aperfeiçoamento de técnicas de ressecções parciais e das suturas esplênicas, e na hipertensão portal, além do aprimoramento técnico, graças a medidas de suporte quando da realização de anastomoses venosas porto-sistê- micas. O objetivo principal desta comunicação é promover a discussão de alguns aspectos da indicação e das complicações da esplenectomia pelos diversos especialistas envolvidos: o Pedia- tra, o Hematologista, o Cirurgião e inclusive o AneStesista. A maioria das séries de pacientes com púrpu- ra trombocitopênica idiopática submetidos a esplenectomia apresentam remissão clínica e laboratorial em acima de 70% das crianças. Com relação as anemias hemolíticas, é im- portante ressaltar a possibilidade de associação com litíase biliar (principalmente na microesfe- rocitose e na anemia falciforme), e portanto a necessidade de documentar a presença ou au- sência de cálculos na vesícula biliar, fato que muda o tipo de via de acesso. Além dessas indicações clássicas, em outras doenças hema- tológicas pode estar indicadaa retirada do órgão. Cabe chamar atenção para a hidratação cuidado- sas dessas crianças no pré e no trans-opera- tório. FLAvIO SAAD - Auxiliar de Ensino da Disciplina de Cirurgia Pediátria - Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas de Santos. Rua Oswaldo Cruz, 179 - 11.100 - Santos - SP. Flávio Saad No estadiamento da moléstia de Hodgkin, algumas particularidades referentes a criança devem ser consideradas: 1 - O local mais comum de doença abdomi- nal é o baço e os glânglios hiliares lienais; 2 - A laparotomia muda o tipo de estadia- mento em 30 a 40% dos pacientes; 3 - Cerca de 25% dos baços clinicaQ1ente normais estão histologicamente comprometi- dos; 4 - Aproximadamente 50% dos baços palpá- veis encontram-se livres de envolvimento histo- lógico. Apesar destes fatos, em crianças com doen- ça de Hodgkin, especialmente naquelas menores de 5 anos, a possibilidade de esplenectomia parcial e biópsias múltiplas, a nosso ver, deveria ser considerada. Mais dois outros aspectos mereceriam uma discussão mais ampla: o primeiro está mais relacionado ao cirurgião e o outro intimamente relacionado com os profissionais responsáveis pelo acompanhamento clínico: 1 - Não é demais insistir no emprego das vias de acesso transversas, reconhecidamente de menor morbidade e mortalidade no grupo etário em questão. 2 - A possibilidade de sépsis fulminante pós- -esplenectomia, justifica a avaliação imunológi- ca periódica, o emprego de penicilina profilática elou vacinação anti-pneumocóccica, especial- mente em crianças esplenectomizadas, antes dos 5 anos. Esse risco bastante aumentado de septicemia fulminante faz com que a indicação de esplenectomia em crianças abaixo de 2 anos deva ser judiciosamente analisada.

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Boletim da S.B.H.H. - Volume VI - Julho/84 - N° 125 13

A ESPLENECTOMIA E A CRIANÇA

A esplenectomia é um procedimento diag­nóstico e terapêutico por vezes utilizado na criança com afecção hematológica. Mais de 50% das esplenectomias realizadas em pacientes pediátricos são indicadas por moléstias hemato­lógicas, destas aanemia microesferocíticaé a de indicação cirúrgica eletiva mais comum.

A partir da década de 60, observa-se na literatura a crescente preocupação de numero­sos autores para a conservação do baço, quer nos traumatismos esplênicos quer na hiperten­são portal. As indicações da esplenectomia tendem a diminuir nos traumas do baço, graças ao gradativo aperfeiçoamento de técnicas de ressecções parciais e das suturas esplênicas, e na hipertensão portal, além do aprimoramento técnico, graças a medidas de suporte quando da realização de anastomoses venosas porto-sistê­micas.

O objetivo principal desta comunicação é promover a discussão de alguns aspectos da indicação e das complicações da esplenectomia pelos diversos especialistas envolvidos: o Pedia­tra, o Hematologista, o Cirurgião e inclusive o AneStesista.

A maioria das séries de pacientes com púrpu­ra trombocitopênica idiopática submetidos a esplenectomia apresentam remissão clínica e laboratorial em acima de 70% das crianças.

Com relação as anemias hemolíticas, é im­portante ressaltar a possibilidade de associação com litíase biliar (principalmente na microesfe­rocitose e na anemia falciforme), e portanto a necessidade de documentar a presença ou au­sência de cálculos na vesícula biliar, fato que muda o tipo de via de acesso. Além dessas indicações clássicas, em outras doenças hema­tológicas pode estar indicadaa retirada do órgão. Cabe chamar atenção para a hidratação cuidado­sas dessas crianças no pré e no trans-opera­tório.

FLAvIO SAAD - Auxiliar de Ensino da Disciplina de Cirurgia Pediátria - Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas de Santos. Rua Oswaldo Cruz, 179 -11.100 - Santos - SP.

Flávio Saad

No estadiamento da moléstia de Hodgkin, algumas particularidades referentes a criança devem ser consideradas:

1 - O local mais comum de doença abdomi­nal é o baço e os glânglios hiliares lienais;

2 - A laparotomia muda o tipo de estadia­mento em 30 a 40% dos pacientes;

3 - Cerca de 25% dos baços clinicaQ1ente normais estão histologicamente comprometi­dos;

4 - Aproximadamente 50% dos baços palpá­veis encontram-se livres de envolvimento histo­lógico.

Apesar destes fatos, em crianças com doen­ça de Hodgkin, especialmente naquelas menores de 5 anos, a possibilidade de esplenectomia parcial e biópsias múltiplas, a nosso ver, deveria ser considerada.

Mais dois outros aspectos mereceriam uma discussão mais ampla: o primeiro está mais relacionado ao cirurgião e o outro intimamente relacionado com os profissionais responsáveis pelo acompanhamento clínico:

1 - Não é demais insistir no emprego das vias de acesso transversas, reconhecidamente de menor morbidade e mortalidade no grupo etário em questão.

2 - A possibilidade de sépsis fulminante pós­-esplenectomia, justifica a avaliação imunológi­ca periódica, o emprego de penicilina profilática elou vacinação anti-pneumocóccica, especial­mente em crianças esplenectomizadas, antes dos 5 anos. Esse risco bastante aumentado de septicemia fulminante faz com que a indicação de esplenectomia em crianças abaixo de 2 anos deva ser judiciosamente analisada.