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197 RESUMO: Um dos principais objetivos do estudo da biologia molecular é compreender os mecanismos bioquímicos capazes de determinar o comportamento biológico das células em seus respectivos tecidos conforme observado à microscopia e macroscopia. A análise histológica da mucosa colonica normal nos mostra que esta é uma estrutura essencialmente dinâmica, com uma grande rotatividade em suas células, a qual é determinada pela concentração nestas células das proteínas que atuam sobre o controle do ciclo celular. Dentre estas, a proteína APC é aparentemente um elemento chave, promovendo a inibição da ação estimulante sobre as divisões celulares exercida por outras proteínas de grande relevância, como a beta-catenina e a survivina. Além de representar a marca genotípica da polipose adenomatosa familiar, a mutação da proteína APC parece desempenhar uma função de gatilho nos processos de desequilíbrio proliferativo observado no processo neoplásico colorretal, o qual pode variar desde a formação de um pequeno adenoma (ou carcinoma intramucoso) até o desenvolvimento de neoplasias invasivas avançadas. A utilização da imunoistoquímica nos permite demonstrar esta relação entre as concentrações de proteínas e o aspecto histológico, representando uma importante ferramenta para um conhecimento cada vez melhor do processo de carcinogênese colorretal. Descritores: neoplasia colorretal, biologia molecular, imunoistoquímica A ESTÓRIA BIOMOLECULAR DO PÓLIPO ADENOMATOSO PINHO MSL. A estória biomolecular do pólipo adenomatoso. Rev bras Coloproct, 2005;26(2):197-203 Trabalho realizado na Disciplina de Clínica Cirúrgica da UNIVILLE e Departamento de Cirurgia do Hospital São José, Joinville, Santa Catarina, SC MAURO DE SOUZA LEITE PINHO 1 INTRODUÇÃO Um dos principais objetivos do estudo da biologia molecular é compreender os mecanismos bioquímicos capazes de determinar o comportamento biológico das células em seus respectivos tecidos conforme observado à microscopia e à macroscopia. Considerando-se que este comportamento biológico é causado principalmente pela interação entre um grande número de proteínas que são expressas a partir do próprio DNA celular, compreende-se que Recebido em 04/05/2006 Aceito para publicação em 04/06/2006 1 Disciplina de Clínica Cirúrgica da UNIVILLE e Departamento de Cirurgia do Hospital São José, Joinville, Santa Catarina, SC GENÉTICA E BIOLOGIA MOLECULAR _______________________________________ estes estudos visam correlacionar a presença ou não de determinada(s) proteína(s) com as respectivas ações celulares ou arranjos estruturais de tecidos. Tal princípio tem norteado as pesquisas na biologia molecular do câncer, possibilitando não apenas a avaliação prognóstica tumoral a partir da análise do espécime cirúrgico, mas também possibilitando o desenvolvimento de medicações capazes de influir no metabolismo tecidual de forma específica como a atuação sobre receptores de membrana celular ou bloqueio da angiogênese.

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Rev bras ColoproctAbril/Junho, 2006

A Estória Biomolecular do Pólipo AdenomatosoMauro de Souza Leite Pinho

RESUMO: Um dos principais objetivos do estudo da biologia molecular é compreender os mecanismos bioquímicos capazes dedeterminar o comportamento biológico das células em seus respectivos tecidos conforme observado à microscopia e macroscopia. Aanálise histológica da mucosa colonica normal nos mostra que esta é uma estrutura essencialmente dinâmica, com uma granderotatividade em suas células, a qual é determinada pela concentração nestas células das proteínas que atuam sobre o controle dociclo celular. Dentre estas, a proteína APC é aparentemente um elemento chave, promovendo a inibição da ação estimulante sobre asdivisões celulares exercida por outras proteínas de grande relevância, como a beta-catenina e a survivina. Além de representar amarca genotípica da polipose adenomatosa familiar, a mutação da proteína APC parece desempenhar uma função de gatilho nosprocessos de desequilíbrio proliferativo observado no processo neoplásico colorretal, o qual pode variar desde a formação de umpequeno adenoma (ou carcinoma intramucoso) até o desenvolvimento de neoplasias invasivas avançadas. A utilização daimunoistoquímica nos permite demonstrar esta relação entre as concentrações de proteínas e o aspecto histológico, representandouma importante ferramenta para um conhecimento cada vez melhor do processo de carcinogênese colorretal.

Descritores: neoplasia colorretal, biologia molecular, imunoistoquímica

A ESTÓRIA BIOMOLECULAR DO PÓLIPO ADENOMATOSO

PINHO MSL. A estória biomolecular do pólipo adenomatoso. Rev bras Coloproct, 2005;26(2):197-203

Trabalho realizado na Disciplina de Clínica Cirúrgica da UNIVILLE e Departamento de Cirurgia do Hospital São José, Joinville, Santa Catarina, SC

MAURO DE SOUZA LEITE PINHO1

INTRODUÇÃO

Um dos principais objetivos do estudo dabiologia molecular é compreender os mecanismosbioquímicos capazes de determinar o comportamentobiológico das células em seus respectivos tecidosconforme observado à microscopia e à macroscopia.

Considerando-se que este comportamentobiológico é causado principalmente pela interação entreum grande número de proteínas que são expressas apartir do próprio DNA celular, compreende-se que

Recebido em 04/05/2006Aceito para publicação em 04/06/2006

1Disciplina de Clínica Cirúrgica da UNIVILLE e Departamento de Cirurgia do Hospital São José, Joinville, Santa

Catarina, SC

GENÉTICA E BIOLOGIA MOLECULAR _______________________________________

estes estudos visam correlacionar a presença ou nãode determinada(s) proteína(s) com as respectivas açõescelulares ou arranjos estruturais de tecidos.

Tal princípio tem norteado as pesquisas nabiologia molecular do câncer, possibilitando não apenasa avaliação prognóstica tumoral a partir da análise doespécime cirúrgico, mas também possibilitando odesenvolvimento de medicações capazes de influir nometabolismo tecidual de forma específica como aatuação sobre receptores de membrana celular oubloqueio da angiogênese.

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Um dos aspectos mais característicos do câncercolorretal é apresentar-se na maior parte dos casoscomo o resultado de um processo evolutivo a partir depólipos neoplásicos da mucosa colônica, inicialmentede natureza benigna e não invasiva, denominados comoadenomas ou carcinomas intramucosos, dependendoda classificação adotada pelo médico patologista.

Na verdade, esta evidente evolução de umamucosa normal até o surgimento de um carcinomainvasivo passando por um espectro de alteraçõesmorfológicas microscópicas e macroscópicaspossibilitou o desenvolvimento de uma das principaisbases do estudo da biologia molecular do câncer, emespecial devido à existência da polipose adenomatosafamiliar, doença na qual estas alterações podem serobservadas em grande volume e em diferentes estágioscoexistentes em um mesmo paciente.

Entretanto, antes da análise das anormalidadesocorridas na mucosa intestinal torna-se necessária acompreensão de que a mucosa colônica, assim comoos epitélios em geral, são tecidos dotados de umadinâmica especial bastante ativa, a qual tem como basea necessidade de reposição constante de novas célulasem sua superfície afim de substituir aquelas perdidasem um contínuo processo de autodestruição pelaapoptose.

Visando fornecer subsídios para uma melhorcompreensão dos pólipos adenomatosos intestinais e

sua participação no processo de surgimento do câncercolorretal, o objetivo deste texto será apresentar algunsaspectos referentes ao estado atual dos estudos dacorrelação entre os achados histológicos ebiomoleculares observados em sua estrutura, quandocomparada àquela existente em uma mucosa normal.

A DINÂMICA NORMAL DA MUCOSAINTESTINAL

Conforme demonstrado na Figura 1, a mucosacolônica é composta por criptas dispostas de formavertical, paralelas entre si e entremeadas por um tecidodenominado como lâmina propria. Inferiormente àlinha correspondente ao posicionamento das bases dascriptas iremos observar a camada muscular da mucosa,abaixo da qual encontraremos na submucosa um tecidorico em vasos sanguíneos e linfáticos.

AS CRIPTAS E SUA ATIVIDADEPROLIFERATIVA

A análise mais detalhada da histologia destascriptas nos mostrará que suas células apresentam umpadrão característico, o qual pode ser melhorcompreendido a partir de uma hipotética subdivisãoem três áreas distintas, conforme demonstrado naFigura 2:

Figura 1 – O epitélio colônico normal

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a. Zona proliferativa 1 – Situada na parte maisinferior das criptas, as células desta região apresentam-se predominantemente ainda indiferenciadas, sem oaspecto característico das células da mucosa intestinal,com ausência de células caliciformes em conseqüênciade uma baixa produção de muco. Do ponto de vistaproliferativo, estas células apresentam uma elevadafreqüência de mitoses e ausência de apoptoses,demonstrando sua importante função na produção denovas células, as quais irão progressivamente ascenderao longo da cripta em direção à superfície da mucosa.

b. Zona proliferativa 2 - Ocupandopredominantemente a região média da cripta,observamos nesta zona células com padrão histológicotípico dos colonócitos, com produção de mucorepresentada pela presença de múltiplas célulascaliciformes e a polaridade dos núcleos dispostos deforma uniforme na base das células, próximo à suafixação à membrana basal. Em relação à atividadeproliferativa, esta persiste de forma ativa, sendo aindaencontrado um alto número de mitoses e ausência demorte celular apoptótica.

c. Superfície epitelial – Nesta região maissuperficial da cripta, junto à luz intestinal, iremosobservar ainda a presença de colonócitos típicos,

embora com redução gradual da produção de mucina.O achado mais importante nesta região, no entanto, é apresença de uma inversão do padrão proliferativocelular em relação àquele observado na base da cripta,com acentuada redução da atividade mitótica e aocorrência de morte celular programada (apoptose) emum grande número de células, seguida de descamaçãopara a luz intestinal.

Ao analisarmos em conjunto estas três regiões,compreendemos que ocorre uma atividade dinâmicapermanente nas criptas intestinais, caracterizada pelosurgimento de novos colonócitos na base da cripta, apartir das células indiferenciadas (células tronco), osquais irão sofrer um processo de maturação gradual aolongo de sua ascensão até atingir a luz intestinal. Tendocompletado esta evolução de forma completa, durantea qual esteve exposta aos agentes agressores desteepitélio e o conseqüente risco de lesão em seu DNAnuclear, esta célula irá desencadear o processo de auto-destruição não inflamatório característico da apoptoseque levará à sua descamação na luz intestinal. Duranteeste período, não deverá ocorrer qualquer atividade dedivisão celular a fim de evitar o surgimento de umalinhagem de células-filhas capazes de herdar eventuaismutações em seu DNA.

Figura 2 – A atividade proliferativa da cripta normal

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Estima-se que este ciclo de surgimento,maturação e morte das células nas criptas ocorra emum período compreendido entre três a oito dias, e queem conseqüência disto o epitélio colônico sofra umprocesso de renovação a cada três a quatro dias.

PÓLIPOS ADENOMATOSOS: ODISTÚRBIO PROLIFERATIVO

O surgimento dos pólipos adenomatosos,também descritos como carcinomas intramucosos pelosdefensores da classificação japonesa, é conseqüênciade uma alteração da dinâmica proliferativa em relaçãoà mucosa normal, conforme descrito acima.

Nestes casos, pode-se observar à microscopiaum crescimento da zona proliferativa 1, ocorrendoentão uma perda progressiva do padrão característicoda zona proliferativa 2 com a conseqüente substituiçãodos colonócitos normais por células poucodiferenciadas e redução acentuada da produção demucina, como demonstrado na Figura-3.

Além deste crescimento da zona proliferativacom um aumento do número de mitoses e oconseqüente surgimento de novas células, uma outraalteração irá ocorrer na extremidade superior da cripta,

onde iremos observar uma redução do número deapoptoses (Figura-4).

Como conseqüência destas duas alteraçõesproliferativas simultâneas caracterizadas por uma maiorprodução de novas células na cripta e redução da mortecelular epitelial, iremos observar um progressivoacúmulo destas células ao nível da superfície mucosa(Figura-5), inicialmente evidenciado apenas àmicroscopia. A progressão deste acúmulo celularconseqüente ao desequilíbrio proliferativo iráfinalmente dar origem a um pólipo macroscopicamenteidentificável através de exames endoscópicos.

OS MECANISMOS BIOMOLECULARESDO EQUILÍBRIO PROLIFERATIVO

Conforme dito anteriormente, as atividadescelulares são determinadas pela ação de proteínas, asquais podem atuar a partir de sua presença no interiorda célula ou mediante contato externo a esta, comreceptores existentes em sua membrana, os quais, porseu turno, podem desencadear efeitos intracelularesatravés de uma seqüência de reações em cascata.

O grande número de estudos a respeito dosaspectos biomoleculares do câncer colorretal e seus

Figura 3 – O distúrbio proliferativo no pólipo adenomatoso

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precursores tem permitido a identificação de diversasproteínas, as quais exercem um importante controlesobre a atividade proliferativa das células da mucosacolônica.

Para melhor compreensão dos mecanismosbiomoleculares responsáveis pelo equilíbrio prolife-rativo desta mucosa, faremos a seguir uma breverevisão de algumas proteínas consideradas comoprincipais controladoras do ciclo celular:

PROTEÍNA APC: O FIO DA MEADA

Um achado de grande relevância para acompreensão da biologia molecular do câncercolorretal foi a identificação de uma proteína cujaalteração é considerada como um “gatilho” para osurgimento de distúrbios proliferativos na mucosacolônica, sejam estes no estágio de póliposadenomatosos ou carcinomas invasivos. Por ter sido

Figura 4 – Alterações proliferativas no pólipo adenomatoso

Figura 5 - Acúmulo de células epiteliais na formação do polipo adenomatoso

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inicialmente identificada em pacientes portadores depolipose adenomatosa familiar, esta proteína, assimcomo seu respectivo gene, foi denominada como APC(Adenomatous poliposis coli). Estudos posterioresconfirmaram que mutações desta proteína APC estãopresentes em cerca de 80% dos adenomas em faseinicial, mesmo em pacientes não portadores de poliposefamiliar, sendo esta mutação considerada hoje como aalteração mais precoce no processo de carcinogêneseda mucosa colônica, motivo pelo qual é a ela atribuídaa função de “guardiã” (“gatekeeper”).

Embora as diversas funções da proteína APCestejam ainda em fase de melhor definição, existemfortes evidências de que estas são relacionadas a doisaspectos principais: adesão e proliferação celular.

Em relação à sua participação no equilíbrioproliferativo da mucosa colônica, a proteína APCexerce, em condições normais, uma importante funçãosupressora através da inibição da divisão celular.Considerando-se a dinâmica do epitélio colônicoapresentado acima, torna-se então compreensível ademonstração por diversos autores de uma elevadaconcentração da proteína APC na parte alta das criptas,e sua ausência nas células situadas na base destas. Estadisposição tecidual é portanto bastante compatível coma elevada proliferação na base das criptas e com a mortecelular observada na superfície epitelial.

Para melhor compreender o mecanismo peloqual a proteína APC atua na inibição da divisão celular,torna-se necessário o conhecimento sobre outraproteína de grande relevância no controle proliferativodo epitélio colônico, denominada como beta-catenina.

BETA-CATENINA: O ESTÍMULO ÀDIVISÃO CELULAR

Um crescente número de estudos tende aatribuir a esta proteína uma função central no equilíbrioproliferativo da mucosa colônica e, por extensão, aopróprio mecanismo da carcinogênese colorretal.

Tais conceitos representam uma mudança emrelação à impressão inicial de que a função da beta-catenina restringia-se à adesão entre células, motivadapor sua participação em um complexo no qualrepresentava um elemento de ligação com uma proteínatransmembrana, denominada como e-caderina. Estudosmais recentes, no entanto, demonstram que além destaforma relacionada à membrana, a beta-catenina pode

ainda ser observada em uma forma livre no citoplasmae ainda no interior do núcleo. Além disto, foidemonstrado que a redução dos níveis celulares daproteína APC está associada a uma elevação daconcentração nuclear da beta-catenina, a qual, por seuturno, representa um importante estímulo à divisãocelular. Este estímulo proliferativo é conseqüência daação positiva da beta-catenina para a expressão nuclearde outras proteínas que desempenham um importantepapel na divisão celular, como a ciclina D1, gastrina, c-myc, COX-2 e MMP-7, sendo estas duas últimasclaramente relacionadas à angiogênese e à invasãoestromal, respectivamente.

SURVIVINA

Esta é outra proteína cujo papel no controledo ciclo celular na mucosa colônica e no mecanismode carcinogênese colorretal vem ganhando umacrescente relevância. Sua função está relacionada aocontrole do ciclo celular, no qual desempenha uma açãoinibidora da apoptose, conferindo à célula portantouma sobrevida mais prolongada. Assim sendo, éperfeitamente compreensível a observação em estudosde imunoistoquímica da mucosa colonica normal deuma presença expressiva da survivina nos colonócitossituados na base da cripta intestinal, onde a atividadeproliferativa é intensa e sua ausência nas célulassituadas na porção superior da cripta, onde a apoptosetorna-se necessária para o equilíbrio tecidual. Assimcomo a beta-catenina, a expressão celular de survivinaé também inibida pela presença da proteína APC,embora não esteja ainda bem definido o mecanismorelacionado a esta ação repressora.

Resumindo, podemos ver então que a mucosacolonica é uma estrutura essencialmente dinâmica, comuma grande rotatividade em suas células, a qual édeterminada pela concentração nestas células dasproteínas que atuam sobre o controle do ciclo celular.Neste sentido, a proteína APC é aparentemente umelemento chave, promovendo a inibição da açãoestimulante sobre as divisões celulares promovidas pelabeta-catenina e pela survivina.

A utilização da imunoistoquímica nos permitedemonstrar esta relação entre as concentrações deproteínas e o aspecto histológico, representando umaimportante ferramenta para um conhecimento cada vezmelhor do processo de carcinogênese colorretal.

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SUMMARY: One of the main objectives of molecular biology studies is the understanding of biochemical mechanisms which willultimately contribute to biological behavior of tissues as observed by macroscopic or microscopic analysis. Hystological examinationof normal colonic mucosa shows a relevant cellular turnover, determined by local concentration of proteins related to circle cellcontrol. Among these proteins, APC seems to be a key element, promoting inhibition of other important circle cell stimulatingproteins as beta-catenin and survivin. Thus, besides its role as genotypic landmark in familiar polipose patients, there are severalstrong evidences that APC acts in a trigger function in proliferative disorders of colonic mucosa from small adenomas to advancedinfiltrative carcinomas. The current use of immunohystochemistry has provided relevant information of this close relationshipbetween cellular protein profile and histological findings and have contributed to an improved comprehension of colorectal cancercarcinogenesis.

Key words: colorectal neoplasm, molecular biology, immunohystochemistry

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Endereço para correspondência:MAURO PINHORua Palmares,38089203-230 Joinville - SC

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS