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  • 8/18/2019 artigo_450gr

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    Neste capítulo abordamos 'inicialmente a fun-

    ção renal normal na gestação não complicada, Em

    seguida analisamos as seguintes circunstâncias na

    gravidez: glomerulonefrite aguda e crônica,

    sín-

    drome

    nefrótica, falência renal aguda, indicações de

    biópsia

    renal, gravidez em pacientes dialíticas e

    gravidez após transplante renal.

    FUNÇÃO RENAL NA GEST AÇÃO

    Durante a gestação normal ocorrem várias mo-

    dificações hemodinâmicas, hormonais eda

    função

    renal, que merecem ser reIembradas, Verifica-seque

    o ritmo de filtração glomerular aumenta cerca de

    5 0 C 1 l e o fluxo plasmático renal se eleva de 30  a

    SO , ao mesmo tempo que o débito cardíaco cresce

    progressivamente até o final da gestação.

    Do ponto de vista anatõmico os rins aumentam

    discretamente de tamanho e ocorre evidente dilata-

    'ção pieloureteral, que persiste até cerca de dois

    meses após o parto.

    Quanto

    à avaliação da função renal deve-se

    ressaltar que o ritmo de filtração glomerular no

    terceiro trimestre da gravidez depende da posição

    adotada pela ges

    tan

    te. Verifica-se que o ritmo de

    filtração glomerular e o fluxo plasmático renal são

    cerca de 100  maiores no decúbito lateral esquerdo,

    quando comparado com o dorsal. Esse fato deve

    decorrer da compressão da veia cava inferior, pela

    massa uterina, na vigência do decúbito dorsal. Há,

    então, diminuição do débito cardíaco e do t1uxo

    plasmático renal. Verifica-se ainda que, tanto em

    gestantes normais como naquelas com

    pré-eclâmp-

    sia, o decúbito lateral esquerdo aumenta o ritmo de

    til tração glomerular, a excreção urinária de sódio e,

    nas hipertensas, diminui a resistência vascular peri-

    férica. Esses conhecimentos têm importância prope-

    dêutica e terapêutica. Como resultado do aumento

     efrop ti s

    Álvaro Naglb Atallah

    Gluseplna laqulnto Vlainlch

    da filtração glomerular na gestação, os níveis séricos

    da creatinina e do ácido úrico caem em relação à

    mulher não-grávida. EÍn gestantes normais verifica-

    se médias de creatinina sérica em tomo de 0,6mg  .

    Dessa forma um resultado de creatinina sérica em

    tomo de I ,2mg ,jú significa perda da função renal

    em gestante de cerca de 50 ; níveis de I,Rmg 

    representam perda em tomo de 70  do RFG.

    A gestação pode facilitar o surgimento de com-

    plicações que acometem a função renal, como, por

    exemplo, a pré-eclâmpsia, a insuficiência renal agu-

    da isquêmica e a necrose cortical, assim como faci-

    litar a ocorrência de infecções e pielonefrites agu-

    das. Por outro lado, uefropatias preexistentes ou

    intercorrentes podem afetar a evolução da gravidez,

    como no caso

    das

    glomerulonefrites crônicas, nefro-

    parias crônicas terminais, rins policísticos etc.

    Em estudos retrospectivos foi verificado-que a

    gestação dificilmente evolui com sucesso em ges-

    tantes com níveis de uréia plasmática acima de

    60mg , inferindo-se que o ambiente urêmico é

    incompatível com o desenvolvimento fetaI.

    Atualmente entende-se que quando

    uma ne-

    fropatia de base, e os níveis séricos da creatinina são

    inferiores a 1,5mg e a pressão arterial é bem

    controlada, o prognóstico da gestação é favorável.

    Quando os níveis série os da creatinina são maiores

    que 1,5mg  o prognóstico não é mo bom, sendo

    ainda pior se houver hipertensão grave ou

    pré-

    eclâmpsia associada. Quando a creatinina sérica

    está acima de 3,Omg , em geral a paciente não

    engravida e, quando a gestação ocorre, há neces-

    sidade de controle rigoroso da pressão arterial e

    tratamento dialítico.

    Em certas circunstâncias

    perda abrupta da

    função renal durante a gestação, como, por exemplo,

    na calculose com infecção, elevando-se

    a

    creatinina

    acima de 3,Omg . Nesses casos, além do tratamento

    da causa básica,

    h á

    necessidade de tratamento dialí-

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    ·  

    ti co, até que a função renal melhore e a creatinina

    c.ua.

    Katz e Liudheim er I nO  relataram a ev olução

    de  

    21

    gestações em RI} pacientes com netropauas,

    porém com creatinina inferior a   ,4mg

    l

    },. Encontra-

    r.un   Iperdas de conceptos, sendo cinco intra-ute-

    rinas e seis no período neonatal. Noventa e um por

    cento dos conceptos sobreviveram. Embora a função

    renal nesse tipo de pacientes possa piorar em algu-

    mas 

    tal fato não altera a história natural da doença.

    Os referidos autores sugerem que a gravidez não

    deve ser totalmente desaconselhada em nefropatas

    quando a creatinina é inferior a   ,5mg  .

    Existem controvérsias quanto

    à

    evolução da

    gravidez nos casos em que a nefropatia de base é a

    glnmerulnnet'rite memhranoprnliferativa, a glome-

    rulopatia

    por IgA

    ou

    a nefropatia do refluxo. Kincaid

    Smi

    III

    e Farley

     I

    Y i< relataram piora ela nefropatia

    por IgA durante a gestação. enquanto Surian (I9X4),

    Ahe (

    I

    YX5)e Jungerx  J 9 i<   consideruram a

    evolu-

    ç: \O satisL\tl'iria.

    Nos casos de Iúpus eritematoso sístêmico dis-

    cure-se

    se a

    ges taçã o

    exacerba ou não

    a doe nç a.

    As

    ev id ênc ia s mais convincentes sugerem que aquelas

    pacientes que engravidam após período ele remissão

    de pelo menos seis meses de atividade lúpica têm

    melhor prognóstico, ou seja, menor probabilidade

    ele exacerbação da doença. A maioria dos autores

    aumenta a dose dos corticosteróides no pós-parto

    imediato. É importante, nesses casos, pesquisar a

    presença de anücoagulante lúpico  que é anticorpo

    antitosfolípide. Este, por estar presente na parede

    plaquetária, sofre lesão pelo anticorpo, ocorrendo

    agregação plaquetária e rnfarto placentário, com

    conseqüente perda fetal. O an ticorpo pode ser detec-

    tado também por teste anticardiolipina. Quando o

    teste é positivo o uso de aspirina em doses baixas

    (entre 50 e IOOmg/dia) pode aumentar as pos-

    sihilidades elegestação bem-sucedida.

      U >M ERULO NEFRITE AGUDA

    Como a maioria elas glomerulopatias, a glome-

    rulonefrite aguda pode resultar de uma ou várias

    causas, incl uindo-se entre elas as infecciosas, doen-

    ças sistêmicas e desordem primária do glomérulo.

    Todas são caracterizadas por aumento abrupto da

    proteinúriae hematúria  acompanhadas por variados

    graus de insuficiência renal, levando a retenção ele

    sal e água. causando edema, hipertensão e congestão

    circulatória. A glomerulouefrite pós-estreptocócica

    é o protótipo dessa síndrome.

    A glomerulonefrite pós-estreptocócica rara-

    mente se desenvolve durante a gestação. O diagnós-

    tico no decurso da gravidez é feito pela história da

    infecção estreptocócica da faringe ou cutânea 

    144

    antecedendo IIquadro renal, a presença ele hematú-

    ria e o aumento dos títulos de anuestreptolisina.

    É doença de grande risco após a segunda meta-

    ele da gestação, quando pode ser confundida com

    pré-eclâmpsia. A bi ópsia renal pode ser útil em I   Ú

    circunstância, uma vez que pode excluir pré-

    eclâmpsia e identificar o tipo de doença glomerular.

    De acordo com a literatura o futuro obstétrico,

    assim como o matemo, certamente fica comprome-

    tido nos casos de glomerulonefrite rapidamente

    progressiva. De forma geral a glomerulonefrite di-

    fusa aguda não compromete a evolução da gravidez,

    desde que haja controle hidrossalino e pressórico.

    No entanto, pode ocorrer abortamento, PéLf(O prema-

    turo e óbito fetal.

    Segundo Lindheir ner e Kat z  11 .. 77  o curso

    natural da doença não se altera nas pacientes com

    GNDA curada.

    O tratamento, em geral, não elifere daquele em

    mulher não-grávida. Deve-se restringir o sal e os

    líquidos. Para a infecção estreptocócica administra-

    se penicilina G benzatina, na

    dose

    ele 1.200JX)OUI,

    por via 1M, por dois dias consecutivos.

    Diuréticos terão indicação na dependência do

    grau de edema, dos níveis pressóricos e de insufi-

    ciência cardíaca. Como a

    hip ert ensã o

    é volume-

    dependente, o uso ele diuréticos tem precedência

    sobre vasodilatadores, embora estes últimos não

    sejam contra-indicados.

    O tratamento obstétrico fica na dependência

    das eventuais complicações próprias da gravidez.

    GLOMERULONEFRITE RÔNI

    Esta doença é caracterizada por progressiva

    destruição dos rins, num período de tempo de [mos

    ou décadas, produzindo diminuição da função renal.

    Em muitos casos a causa é desconhecida, mas a

    doença pode aelvir após alguns anos de glomerulo-

    nefrite aguda ou ele síndrome nefrótica Microsco-

    picameute a lesão renal pode ser proliferati va, escle-

    rótica ou membranosa.

    A glornerutonetrite crônica pode ser detectada

    de várias formas, Algumas pacientes podem perma-

    necer assintomáticas por muitos N10S e a pr oteinú ri a

    ou o sedimento urinário anormal, ou ambos, podem

    ser indicativos da doença. Pode ser descoberta du-

    rante a investigação ele uma hipertensão crônica ou

    pode ser a primeira manifestação de síndrome ne-

    frótica. Por vezes exacerba-se e manifesta-se como

    glomerulonefrite aguda. A falência renal pode ser

    sua primeira manifestação, assim como pode ser

    diagnosticada durante a investigação de síndrome

    hi pertensiva na gestação.

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    SÍNDROME NEFR.)TICA

    A síudrome

    nefrótica ou netrose é

    desordem

    renal cuja etiologia é variada. Caracteriza-se por

    proteinúria excessiva (3 e 4g por dia), hipoalbumi-

    nemia, hiperlipidemia e edema generalizado. A

    maioria das pacientes apresenta lesão renal micros-

    cópica e, em muitas, tem-se acompanhado algumas

    evidências de disfunção renal. Os efeitos na barreira

    da parede capilar glomerular, com excessiva perda

    das proteínas plasmáticas, podem advir de causa

    imuuoiógica.

    injúria tóxica, doença

    metabólica.

    doença vascular e, comumente  de lesão glomerular

    primária. As formas não-prohterativas, como a le-

    são membranosa as hialinosas segmentar e focal e

    a >lesões mínimas, levam li síndrome nefrótica.

    Forma rara de nefrose é a síndrome nefrótica

    transitória

    da

    gravidez, em que a proteinúria

    desen 

    vol ve-se durante a gestação, desaparece após O parto

    e recidiva em gestações subseqüentes (Haslam e

    Wallace, 1975).

    O tratamento e o prognóstico materuo-fetal

    dependem da causa lia doença e do grau de insufi-

    ciência renal. Em revisão da literatura, Weisman e

    cols. ( 1973) observaram que as pacientes que não se

    tornaram hipertensas e não apresentavam insufi-

    ciência renal grave geralmente tiveram sucesso na

    gravidez, o mesmo não acontecendo com os CL L015

    < 20

    >

    50

    >2

    50

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    gulação intravascular disseminada, sendo o volume

    urinário nas 24 horas próximo de zero. Na NT A o

    volume de urina de 24 horas em geral é maior que

    100ml.

    Em geral os néfronsjustamedulares são preser-

    vados e, em se mantendo a paciente viva com diálise

    por alguns meses e com controle hidroeletrolítico

    rigoroso, enquanto se aguarda possível recuperação

    parcial dos rins (por hipertrofia dos glornérulos res-

    tantes), pode-se proporcionar que a mesma prescin-

    da de tratamento dialítico por alguns

    iUlOS

    O prognóstico depende da extensão da lesão

    necrótica; em parte dos casos a sobrevida só é pos-

    sível com diálise crônica ou transplante.

    INDICAÇÕES PARA BIÓPSIA RENAL

    Em virtude dos riscos serem, em geral, maiores

    que os benefícios, são cada vez mais raras as reali-

    zações de

    biópsia

    renal durante a gestação. No nosso

    entendimento, apenas quando há perda progressiva

    da função renal, acompanhada de sinais que suge-

    rem glomerulonefrite, a biópsia está indicada para

    afastar a glomerulonefrite crescêntica (rapidamente

    progressiva).

    Nos demais casos deve-se controlar os níveis

    pressóric os, manter dieta hip ossó dica e com pro-

    teínas de alto valor biológico (leite, carne. ovo),

    protelando-se a biópsia para período após o parto.

    GESTAÇÃO EM PACIENTE COM

    TRA T AMENTO DIALÍTICO CRÔNICO

    Embora as pacientes com insuficiência renal

    terminal raramente ovulem, não é infreqüente a

    ocorrência de gestação em mulheres em tratamento

    dialíuco, na medida em que esse tipo de tratamento

    vem se expandindo. Para tais pacientes recomen-

    damos as seguintes condutas:

    I . Hemod iáli se

    com banho de bicarbonato de

    só dio (para prevenção de hip o tensão arterial) cinco

    vezes por semana. Todo esforço deve ser feito para

    prevenir hipotensão durante a hemodiálise. Nos ca-

    sos específicos a diálise peritoneal ambulatorial

    contínua (CAPO) pode ser manüda até a 20

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    Deve-se manter as taxas de creatinina plasmá-

    tica abaixo de 2mg/dl (se possível menos de

    I .Smg/dl

    e de uréia abaixo de JOOmg. A proteinúria

    ocorre em cerca de 40  das pacientes durante o

    terceiro trimestre da gestação e desaparece no pôs-

    parto: só é significativamente grave se for acompa-

    nhada de hipertensão.

    Episódios de rejeição podem ocorrer em cerca

    de 9 7 r das pacientes e são mais freqüentes no pri-

    meiro trimestre da gravidez. Talvez seja isto

    bene-

    tfcio às transplantadas, mil', é entretanto assunto

    controverso.

    O estado imunológico próprio da gestação be-

    neficia a não-rejeição, que só será problema grave

    quando adquire forma subclfnica porém progres-

    siva, atingindo o período puerperal. Deve ser sus-

    peitada quando surgir deterioração da função renal

    ou oligúria. Difícil é distingui-Ia da glomerulopatia

    recorrente e da pré-eclâmpsia,

    A

    ultra-souografia pode mostrar alguma altera-

    ção na ecogenicidade do parêuquima renal. Pode-se

    real izar hiópsia, encontrando-se aIterações suges-

    tivas de rejeição.

    Incidência de

    pré -ec lâmps ia

    em pacientes

    transplantadas é de aproximadamente 3 ) l1  n ; rapida-

    mente evolui para eclâmpsia.

    Durante o pré-natal o obstetra deve estar atento

    para intercorrências como anemia e suscetibilidade

    a infecções. A incidência de infecção do trato uriná-

    rio pode chegar a 40 e a evolução com pielonefrite

    pode levar a insuficiência renal. Também se nota

    maior incidência de infecção por citomegalovírus e

    herpes simples.

    Desordens gastríntestinaís, como esofagite e

    dispepsia são sintomas comuns. A corticoterapia

    imunossupressora

    pode levar a ulcerações gas-

    trintestinais e malformações tetais.

    Ao nosso ver as consultas

    pré -u ata is

    devem ser

    realizadas a cada duas semanas, antes da 32ª semana

    da gestação, e posteriormente semanalmente, com

    controle laboratorial (hemograma completo com

    contagem das plaquetas, creatinina, Na, K, provas

    de função hepática, proteinúria de 24 horas, urocul-

    tura e sorologia para círomegalovírus) a cada seis

    semanas.

    A terapia imuuossupressora em geral é mantida

    e ajustada de acordo com a contagem de Ieucócitos

    e plaquetas.

    A azatioprina induz à toxicidade hepática, que

    em geral responde bem à

    redução

    da dose. Para o

    lado tetal pode ocorrer prematuridade e a incidência

    de crescimento intra-uterino retardado é de aproxi-

    madamente 20 (variando na literatura entre X  e

    45 ). Tais complicações não estão necessariamente

    relacionadas com doenças vasculares ou hiperten-

    são maternas (Pirsone e cols., 1985). A teratogeni-

    cidade equivale a doses maiores que ómg/kg/dia,

    sendo

    que a usada é menor que 2mg kg/dia.

    A ciclosporina é embriotóxica e fetotóxica em

    animais, quando administrada em doses duas e cinco

    vezes maiores que

    a

    humana. Alguns fetos podem

    apresentar atrofia do timo, hipoplasia da medula,

    redução de IgM e IgG, septicemia, aberrações

    cromossômicas, redução de lin fóci tos, hipoglicemia

    e insuficiência adrenocortical.

    nnu.roc

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