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AS AÇÕES E OS EFEITOS DO CRACK NO ORGANISMO: UMA SEQUÊNCIA
DIDÁTICA NA PERSPECTIVA CTS NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
FERNANDA MARIANO ZACARIAS POMBO1
CLAUDIA REGINA XAVIER2
MARCELO LAMBACH3
LEONIR LORENZETTI4
Resumo: O trabalho analisa a proposta de uma sequência didática, a partir do viés do Ensino
de Química e desenvolvida de forma interdisciplinar, realizada com a Educação de Jovens e
Adultos (EJA), utilizando a abordagem Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) a fim de
identificar e compreender as ações e os efeitos do crack no organismo para, posteriormente,
caracterizar as funções orgânicas presentes na molécula de dopamina. A metodologia
utilizada foi a aplicação de um questionário durante o desenvolvimento das aulas com o
propósito de analisar as respostas dos estudantes sobre o assunto. Foram utilizados recursos
didáticos como vídeos, simuladores e imagens. Observou-se que a sequência didática,
articulada de forma interdisciplinar com os conteúdos de Química e Sociologia, na abordagem
CTS foi positiva, pois valorizou e enriqueceu as aulas, possibilitando a inserção do
conhecimento científico no contexto social do estudante, contribuindo com uma melhor
compreensão dos conteúdos de cada disciplina e colaborando para a formação de um cidadão
crítico e responsável sobre os distintos aspectos em relação ao uso do crack. Identificou-se
que na tríade CTS, a ciência e a sociedade são as abordagens que possibilitaram maior
destaque no estudo e que as discussões quanto à tecnologia não foram totalmente esgotadas.
Palavras-chave: CTS; Contextualização; Crack; EJA; Química.
INTRODUÇÃO
Tomando como premissa que a educação escola deve estar em sintonia com a
realidade do estudante, é preciso que as disciplinas sejam planejadas com o propósito de
prepará-los para enfrentar as mudanças determinadas pela sociedade.
Dessa forma, o ensino de química, no presente caso para a EJA, que tem como
características estudantes jovens e adultos que não puderam realizar os estudos na idade
própria, pode a contribuir com propostas metodológicas, que permitam a apropriação e a
contextualização do conhecimento por meio de distintas abordagens. Uma delas pode ser a
que sustenta a perspectiva da Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), vindo contribuir
1 Mestranda do Programa de Pós Graduação em Formação Científica e Tecnológica - PPGFCET, Universidade
Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR, Curitiba, Brasil. E-mail: [email protected]. 2 Pesquisadora (PQ) do PPGFCET – UTFPR – Curitiba, Brasil. E-mail: [email protected]. 3 Pesquisador (PQ) do PPGFCET – UTFPR – Curitiba, Brasil. E-mail: [email protected] . 4 Pesquisador (PQ) do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e em Matemática - PPGECM,
Universidade Federal do Paraná – UFPR – Curitiba, Brasil. E-mail: [email protected].
2
significativamente para a compreensão do conhecimento científico e das suas inter-relações
com a sociedade e a tecnologia. Assim, é nesse contexto que buscou-se propor, como
metodologia de ensino de Química no ensino da EJA, uma sequência didática sobre a temática
“As ações e os efeitos do crack no organismo”, utilizando a abordagem da Ciência Tecnologia
e Sociedade (CTS).
Com isso, espera-se contribuir, por um lado, para a promoção de uma prática docente,
em abordagem CTS; e do outro com o aluno para propiciar uma reflexão sobre o contexto
social formando-o cidadão crítico e consciente.
A contextualização sob a perspectiva CTS
É notório que os avanços dos conhecimentos científicos e tecnológicos vêm
repercutindo nas sociedades modernas, influenciando também a prática escolar. Assim,
oensino de Química voltado para a formação de atitudes cidadãs precisa, além de desenvolver
a compreensão de conceitos químicos, ampliar o entendimento desses conhecimentos para
outras questões de caráter social, ambiental e tecnológico (MARCONDES et. al.,2009: 284).
Neste sentido, Santos e Schnetzler (2010) apontam para a necessidade de se buscar
estratégias metodológicas para se trabalhar com estudantes de forma contextualizada.
A contextualização deve ser utilizada no ensino de Química para relacionar os
conhecimentos científicos com o cotidiano do estudante, e tem sido defendida em vários
trabalhos (SANTOS; MORTIMER, 2002; SANTOS, 2007; MARCONDES et al., 2009;
WARTHA; SILVA; BEJARANO, 2013) como um meio de possibilitar ao aluno uma
educação para a cidadania, juntamente à aprendizagem de conhecimentos científicos.
Santos (2007), observa que a contextualização pode ser vista com os
seguintesobjetivos:
1) desenvolver atitudes e valores em uma perspectiva humanística diante das
questões sociais relativas à ciência e à tecnologia; 2) auxiliar na aprendizagem de
conceitos científicos e de aspectos relativos à natureza da ciência; e 3) encorajar os
estudantes a relacionar suas experiências escolares em ciências com problemas do
cotidiano. (SANTOS, 2007:5).
O autor destaca, ainda, que é fundamental a articulação da proposta pedagógica
abordando esses objetivos, na qual vivências e saberes têm papel fundamental na relação com
os estudantes.
Nessa perspectiva, Santos e Schnetzler (2010) salientam que uma das possibilidades
de se obter um ensino contextualizado seria trabalhar de maneira integrada alcançar temas que
contemple a informaçãoquímica e o contexto social. Ainda, segundo eles,
[...] os temas sociais explicitam o papel social da química, as suas aplicações e
implicações e demonstram como o cidadão pode aplicar o conhecimento na sua
3
vida diária. Além disso, os temas têm o papel fundamental de desenvolver a
capacidade de tomada de decisão, propiciando situações em que os alunos são
estimulados a emitir opinião, propor soluções, avaliar custos e benefícios e tomar
decisões, usando o juízo de valores. (SANTOS; SCHNETZLER, 2010: 105). Desse modo, objetivou-se trabalhar em sala de aula com esses alunos a abordagem
CTS, valorizando a interação do conteúdo científico com o cotidiano desses sujeitos, e ainda
podendo desenvolver uma reflexão de forma crítica e discussão sobre seus diversos aspectos e
suas relações na sociedade.
Conforme Santos e Mortimer (2002), a educação na perspectiva CTS no ensino médio
tem como o objetivo o desenvolvimento da alfabetização científica e tecnológica dos cidadãos
e o desenvolvimento de valores, sendo que.
Esses valores estão vinculados aos interesses coletivos, como os de solidariedade,
de fraternidade, de consciência do compromisso social, de reciprocidade, de
respeito ao próximo e de generosidade. Tais valores são, assim, relacionados às
necessidades humanas, o que significa um questionamento à ordem capitalista, na
qual os valores econômicos se impõem aos demais (SANTOS; MORTIMER,
2002:5). Por isso, a importância de se discutir a temática droga, por ser um problema social
enfrentado pela sociedade e que deve ser abordado em sala de aula. E ainda, esse tema
relaciona-se a problemas de vida real que envolvem aspectos sociais, tecnológicos
econômicos e políticos, o que significa preparar o indivíduo para participar ativamente na
sociedade democrática. (SANTOS; SCHNETZLER, 2010).
Segundo Ramsey (1993) apud AULER; DALMOLIN; FENALTI, (2009:72) os temas
para serem abordados como sociais devem estar em consonância a alguns critérios:
1. Se é, de fato, um problema de natureza controvertida, ou seja, se existem opiniões
diferentes a seu respeito;
2. Se o tema tem significado social;
3. Se o tema, em alguma dimensão, é relativo à ciência-tecnologia.
Assim, de acordo com os critérios acima apresentados, consideramos as drogas como
um tema social, visto que são um problema social e de saúde pública.
Por ser um problema social e de saúde pública, o escolhemos como temática para
apresentar uma proposta de sequência didática para o ensino de Química para a EJA, na
perspectiva CTS. O objetivo foi discutir sobre as ações e os efeitos do crack no organismo,
trabalhando o conteúdo de forma contextualizada e utilizando os pressupostos da abordagem
CTS, valorizando a construção do conhecimento científico e o cotidiano do sujeito para
tomadas de decisões.
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METODOLOGIA
O presente trabalho é caracterizado como uma Pesquisa-Ação. De acordo comGil
(2002: 55), a pesquisa-açãoé uma pesquisa com “base empírica que é concebida e realizada
em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo”.
O estudo foi aplicado para 06 estudantes, com faixa etária entre 18 e 57 anos, na
disciplina de Química da turma da EJA, do período noturno, de um colégio estadual,
localizado no município de Curitiba-PR. A sequência didática abordou o conteúdo das
funções orgânicas e para a aplicação houve a participação dos professores de Química e
Sociologia, trabalhando a temática de forma interdisciplinar. Foram utilizadas 5 horas-aulas,
com duração de 45 minutos cada uma.
É importante ressaltar que, para esta proposta, utilizou-se uma sugestão de sequência
de aulas5, de autoria da professora Fernanda M. Z. Pombo (PARANÁ, 2013), mas para sua
utilização foram feitas adequações necessárias em conformidade ao perfil dos estudantes da
EJA.
O instrumento utilizado junto aos estudantes para o levantamento de dados foi o
questionário respondido anonimamente, contendo cinco questões discursivas e uma atividade
de elaboração de um cartaz, esse instrumento auxilia no melhor entendimento no momento da
investigação, a fim de analisar posteriormente os resultados.
Assim, a opção por utilizar questionários se justifica por ser um instrumento de coleta
de dados de característica qualitativa e, segundo Silva e Menezes (2005: 33), “deve ser um
documento contendo uma série ordenada de perguntas que devem ser respondidas pelos
sujeitos por escrito”. Estes questionários têm por objetivo analisar as respostas dos estudantes,
frente ao entendimento sobre o assunto, nesse caso, os estudantes do ensino médio da EJA.
Dessa forma, no primeiro momento foi apresentada como problemática uma
reportagem do Jornal Hoje, com duração de 06 minutos e 02 segundos6, em que as pessoas
saem às ruas em busca de seus parentes e usuários de drogas.
Após o vídeo, houve um debate partindo das seguintes questões: 1) Quais as condições
de vida dos usuários de crack? 2) Por que muitas pessoas recorrem ao uso de drogas? Foi
pedido aos alunos que relatassem em uma folha de papel as respostas dos questionamentos
para posteriores discussões e análise da coleta de dados.
5 Sequência de aulas: são sugestões de aulas que podem auxiliar os professores na prática docente,
disponíveis no portal Dia a Dia Educação da Secretária de Estado da Educação do Paraná. 6 Reportagem – Usuários de crack deixam trabalho e famílias pela droga. Jornal Hoje, São Paulo, 09
Mai. 2013. Disponível em:<http://goo.gl/nrYNf5>. Acesso em: 29 Out. 2015.
5
Na sequência, em conexão interdisciplinar, a professora de Sociologia apresentou uma
tabela, que traz o resultado de uma pesquisa sobre o uso do crack - “Motivo principal pelo
qual os usuários relataram ter iniciado o uso de crack e/ou similares”7, realizadas entre 2011 e
2013 pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça.
No segundo momento, foi solicitado aos estudantes para analisarem a tabela e indicar
quais os motivos que levam ao uso de crack e/ou drogas similares. Eles deveriam estabelecer
uma relação entre fator da curiosidade/vontade e ao valor/preço, indicados na tabela.
Logo após, os estudantes deveriam observar as respostas indicadas em relação aos
questionamentos do vídeo e verificar se elas correspondiam aos dados expostos na tabela. As
respostas foram analisadas com os estudantes e foi feita uma comparação entre as respostas e
os motivos do uso da droga, que resulta da combinação de três aspectos: o sujeito, o produto
(droga) e o contexto sociocultural (PARANÁ, 2013).
Na terceira aula, a professora de Química apresentou um segundo vídeo – 10 passos
do ataque do crack no organismo8, com duração de 01 minuto e 29 segundos e um simulador
“Ação da Cocaína e Crack no Sistema Nervoso Central (SNC)”9, que traz os mecanismos
bioquímicos da ação da cocaína e do crack no SNC, bloqueando a reabsorção da dopamina
nos neurotransmissores.
Após, reproduzir o simulador, a professora explicou como ocorrem os estímulos
elétricos das células nervosas. Foi explicado, também, que as células apresentam potenciais de
membrana que decorrem da concentração e movimento dos íons Sódio (Na+), Potássio (K+),
Cálcio (Ca+2) e Cloro (Cl-), através da membrana intracelular e extracelular.
Os estudantes foram questionados quanto aos mecanismos químicosque causam no
organismo ao usar o crack/cocaína com base no vídeo e o simulador apresentados na aula.
Alguns autores, como Estevinho e Fortunado (2003), afirmam que, ao fumar crack, a
droga dispara no organismo do usuário substâncias químicas para o cérebro. A cocaína
presente no crack se liga ao transportador da dopamina e se encaixa no receptor presente no
neurônio, com isso é como se acontecesse um “entupimento do receptor” - a dopamina, antes
ligada ao receptor, acaba sobrando, fazendo com que o estímulo se prolongue na sinapse,
gerando a sensação de prazer. Ou seja, com os receptores alterados, a célula espera receber 7 Dados da tabela – Motivo principal pelo qual os usuários relataram ter iniciado o uso de crack e/ou
similares. Pesquisa Nacional sobre o uso de crack, Rio de Janeiro: Editora ICICT/FIOCRUZ, 2014. Disponível
em: <http://goo.gl/7Sws0f>. Acesso em: 30 Out. 2015. 8 Vídeo – 10 passos do ataque do crack no organismo. Disponível em:<http://goo.gl/ychYZR>. Acesso
em: 29 Out. 2015. 9 Simulador – Ação da cocaína e crack no sistema nervoso central. Disponível em:
<http://goo.gl/OKHVon>. Acesso em: 29 Out. 2015.
6
mais dopamina, que pode ser considerado um combustível do neurônio que dá energia e
disposição e cria uma sensação de prazer. A dependência nasce aí. E é por isso que ocorre a
liberação da dopamina e faz com que o usuário de crack fique mais agitado.
Logo após, apresentou-se a imagem da estrutura molecular da dopamina por meio do
projetor multimídia, solicitado aos estudantes que observassem e identificassem as funções
químicas presentes na estrutura molecular, bem como orientado que registrassem na folha de
papel as funções e a fórmula molecular da dopamina.
Na quarta aula, a professora de Sociologia iniciou abordando as questões da
vulnerabilidade social, do papel do Estado diante de questões de ordem pública e a função das
instituições sociais diante das situações de vulnerabilidade que o usuário está submetido.
Na sequência, a professora de Química explicou as formas de tratamento para os
usuários de drogas, sendo elas a ambulatorial e o internamento, este pode servoluntário,
involuntário ou compulsório. Existem, também, técnicas de tratamento, como os
psicoterápicos, medicamentosos e autoajuda. Após, a professora lançou uma problemática,
realizando alguns questionamentos, como os apresentados a seguir, e pediu para que
respondessem em uma folha de papel.
● Você conhece um usuário de crack? Ele precisa de ajuda para o tratamento?
● O que faria? Quais os procedimentos adotados?
● Existem locais de tratamento em sua cidade e/ou no seu estado?
● Na saúde pública tem tratamento? Quais? Como funcionam?
● Existem grupos de ajuda na cidade? Quais? Como funcionam?
Os estudantes discutiram sobre essas questões, considerando os pressupostos da
abordagem CTS.
Na última aula, a professora de Química distribuiu uma folha de sulfite A4 a cada
aluno e solicitou que realizassem a produção de um cartaz sobre a temática, considerando os
vários aspectos sociais, químicos e econômicos envolvendo o consumodo crack. Para auxiliar
a produção do cartaz, a professora disponibilizou revistas, jornais, lápis de cor, giz de cera e
também acesso à sala de informática com acesso à internet.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
7
Para a pesquisa realizada, utilizou-se os dados coletados a partir de um questionário e
uma atividade de elaboração de cartazes, durante a aplicação da sequência didática.
A seguir analisaremosalgumas das respostas características dos estudantes às cinco
questões do questionário, acompanhadas de possíveis interpretações, elaboradas a partir
desses registros. A questão 1 foi em relação ao vídeo sobre a reportagem do Jornal Hoje,
indicando “Quais as condições de vida dos usuários de crack?”. Para as opiniões dos
estudantes, utilizou-se os termos Aluno 1 (A1) e Aluno 2 (A2) para não haver identificação
dos nomes reais. Os estudantes responderam, de maneira geral, da seguinte forma:
A1 - “É péssima essa situação em ser humano, abandonar sua família, sua casa,
seus filhos para viver em um estado de calamidade.”
A2 - “Muito ruim, são pessoas sem vida.”
A3 - “Descriminados, isolados, sentem fome, roubos para poder comprar a droga.
Vivem em condições precárias, sujos, vivem no meio da sujeira”.
A4 - “Escravos da droga aonde se submetem a qualquer tipo de coisa para suprir
sua necessidade da droga e não usam mais ela, mas sim ela usa eles.”
A5 - “Perdem a família, emprego, passam por diversos preconceitos, dormem na
rua, passam fome e sede, são solitários, correm risco de morte por várias maneiras,
são tristes e agressivos.”
A6 - “Não tem o mínimo necessário para viver com qualidade na alimentação,
moradia e não se socializa. Vivem à margem da sociedade, com discriminação e
isolamento.” De acordo com as respostas dos estudantes, eles evidenciaram que os usuários de
crack vivem nas ruas, que eles são discriminados, marginalizados, e que vivem em um
isolamento social e sofrem degradação física e mental. Assim, é possível relacionar com os
pressupostos da abordagem CTS, caracterizando o vértice S (Sociedade) da tríade, uma vez
que o crack é um tema social. Nesse sentido, Santos e Schnetzler (2010:105) enfatizam que,
“os temas sociais explicitam o papel social da química, as suas aplicações e implicações e
demonstram como o cidadão pode aplicar o conhecimento na sua vida diária”.
Em relação a questão 2, quando se perguntou “Por que muitas pessoas recorrem ao uso
de drogas?”. As respostas dos estudantes foram,
A1 - “Às vezes é só por diversão, pressão de amigos, um momento, um instante que
acaba refletindo em toda a sua vida, é um provar que muitas vezes, acaba com a sua
vida.”
A2 - “As vezes por motivos de brigas nas famílias ou por motivos de dívidas.”
A3 - “Porque acha que a vida já não tem mais sentido, quando entra nesse mundo
difícil de sai para não prejudicar a família preferem viver longe. Também, por
pressão de amigos, perda de emprego, vida ruim.”
A4 - “Por vários motivos, mas o principal e de sentir efeito da droga.”
A5 - “Muitos por curiosidade e influência de colegas e outros por problemas sociais
e familiares.”
A6 - “Curiosidade, falta de estrutura familiar.” Com essa questão, pode-se observar que os estudantes apontaram que as pessoas
recorrem às drogas por diversos motivos: por diversão, por busca de relacionamento de grupo,
por fuga de problemas familiares, por querer sentir prazer e satisfação, pela busca de novas
8
sensações, entre outros. Assim, os motivos do uso da droga consistem em um fenômeno
complexo que resulta da combinação de três aspectos fundamentais: o sujeito, o produto
(droga) e o contexto sociocultural (PARANÁ, 2013).
Os estudantes ao serem questionados em relação à explicação química ao usar o
crack/cocaína conforme abordado no vídeo e no simulador, eles responderam na sua grande
maioria de forma descritiva os passos do crack, podendo ser verificado as respostas a seguir.
A1 - “No vídeo existem vários, ocorre no inalar o crack, a fumaça vai para o
pulmão e cai na corrente sanguínea, depois vai pro SNC e os neurônios da
dopamina são bloqueados daí os estímulos dos neurônios que dá a sensação prazer,
ai volta pra corrente, fígado, rim e ai inicia o vício, porque ai o corpo da pessoa
quer mais.”
A2 - “No SNC a dopamina da sensação de prazer para os fumantes de crack.”
A3 - “Reação que começa no fumar do crack, que vai pra diversas partes do corpo,
10 segundos depois vai para os neurônios, aonde tem estímulos na célula nervosa e
com a dopamina que dá a sensação de prazer e depois ataca o psicológico da
pessoa que acaba virando viciado um dependendo do crack.”
A4 - “O crack é inalado atinge o pulmão e a corrente sanguínea em 10 segundos,
chega no cérebro no sistema nervoso central onde libera a sensação de prazer pela
dopamina, depois vai pros rins para ser eliminado pela urina.”
A5 - “o caminho do crack que sai do cachimbo, circulação arterial, atinge o
cérebro, os neurônios, que ocorre as reações com a dopamina receptora e assim
afeta diretamente os neurônios provocando lesão.”
A6 - “Substâncias químicas, inaladas no crack vão direto no cérebro em 10
segundos.” Pode verificar que, os estudantes de modo geral entenderam que ao fumar o crack,
ocorre a liberação da dopamina no SNC, criando uma sensação de prazer, e esta sensação se
dá por meio do mecanismo bioquímico apresentado tanto no vídeo como no simulador. Vale
ressaltar, que houve compreensões distintas entre as respostas dos estudantes, a exemplo das
falas A1 e A6, podendo perceber uma maior compreensão do estudante A1.
A quarta questão consistiu em identificar as funções orgânicas presentes na molécula
de dopamina, sendo elas álcool, fenol e amina, 5 estudantes identificaram as 3 funções e 1
aluno identificou 2 funções orgânicas. A professora pediu também que indicassem a fórmula
molecular da dopamina (C8H11NO2) e todos apresentaram a fórmula mínima corretamente.
Alguns estudantes manifestaram a princípio dificuldade em compreender as funções presentes
na molécula, mas ao final mostraram satisfação em observar a estrutura da dopamina através
do atomlig10.
Nas questões anteriores, se destacam as vértices C (Ciência) e T (Tecnologia) da
abordagem CTS, visto que o Ensino de Química para a formação do cidadão, propõem o
desenvolvimento do conhecimento químico por meio de uma visão de ciência que cumpra o
seu papel social, que seja resultado de um processo de construção histórico-social (SANTOS,
10 Atomlig: é um recurso didático para professores e estudantes de química, onde permite a construção de
moléculas químicas. Disponível em: <http://atomlig.com.br/>.
9
2007; SANTOS, SCHNETZLER, 2010). E também, o estudante deve ser capaz de participar e
tomar decisões de forma crítica.
Na quinta questão foi lançada uma problemática aos estudantes para identificarem
informações e posições sobre as formas de tratamento para os usuários de crack conforme
explicado pelas professoras, considerando os pressupostos da abordagem CTS. Dessa forma,
quando questionados se conheciam algum usuário de crack, dois estudantes responderam que
sim e quatro não tinham conhecimento de alguém usuário de crack. Dos estudantes que
responderam sim, um afirmou que o usuário precisava de tratamento. Nesta questão, se
evidenciam as vértices C (Ciência) e Tecnologia(T) da abordagem CTS. Como referido por
Santos (2007), para uma visão crítica do papel da ciência e da tecnologia, é necessário que o
estudante perceba além, ao refletir sobre questões sociais, culturais, éticas, econômicas,
políticas, e ambientais.
Sobre o conhecimento de locais de tratamento na cidade e/ou estado, as respostas dos
estudantes foram quatro citações para ONGs, casas de recuperação três, clínicas e igrejas uma
citação. Os estudantes entenderam as questões da vulnerabilidade social colocada pela
professora de sociologia, que os usuários têm o direito de atendimento e qual é papel do
Estado sobre as políticas e programas desenvolvidos para o tratamento ao usuário de crack e
outras drogas.
Médicos e pesquisadores, como Kessler e Pechanky (2008: 98), destacam que os
programas de atendimento e as políticas desenvolvidas poderiam ser mais eficazes se fossem
embasados nas evidências científicas já disponíveis sobre o tratamento das dependências
químicas. Nesse sentido, identifica-se a necessidade de ações mais efetivas do poder público,
com disponibilização de mais recursos voltados aos tratamentos dos usuários e principalmente
para prevenção, pois o crack é uma realidade social. Também nessa perspectiva, os
pesquisadores como Santos e Schnetzler (2010), indicam que trabalhar uma abordagem CTS
deve-se apresentar aspectos sociais voltados para a cidadania, ou seja, formar cidadãos para
participar de uma forma crítica e responsável na sociedade.
E em relação ao questionamento: “Na saúde pública tem tratamento? Quais? Como
funcionam? três estudantes responderam que há tratamento, como as casas de recuperação,
que são ONGs que recebem do governo por meio de licitação; dois estudantes indicaram o
Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) e um estudante não respondeu por não
conhecer tratamento na saúde pública referente ao crack.
10
Pode-se perceber que nesta questão um estudante apresentava um maior conhecimento
devido a um parente já encaminhado a rede de tratamento da saúde pública. Indicou quais os
problemas enfrentados, sendo um deles a burocracia dos órgãos competentes.
Essas respostas evidenciam que situações reais, conforme apresentadas na sequência
didática, indica segundo Santos (2007) um processo de construção e negociação de
significados do conhecimento científico relevante socialmente em uma proposta pedagógica.
E para o último questionamento se “Existem grupos de ajuda na cidade? Quais? Como
funcionam?”. De modo geral, responderam que conhecem e que os usuários podem ser
encaminhados via assistente social, postos de saúde, CRAS, ONGs, e apenas 1 estudante
ficou sem responder. Observou-se que as informações sobre os direitos das pessoas para
encaminhar aos tratamentos, sendo usuários de drogas e familiares foram importantes a alguns
estudantes que sabiam que tinha tratamento disponível, porém não sabia qual o caminho
tomado.
Cabe destacar que essa problemática de vida real envolveu aspectos sociais,
tecnológicos, econômicos e políticos, o que permite segundo Santos e Schnetzler (2010)
preparar o estudante para participar de forma ativa na sociedade.
Como atividade final, os estudantes realizaram a elaboração de um cartaz sobre a
temática abordada. Alguns deles são apresentados na figura 1.
Figura 1 – Produção de cartaz pelos estudantes.
Fonte: Trabalho realizado pelos estudantes de Química do Ensino Médio (2015).
Percebeu-se que a maioria dos estudantes entenderam a proposta da temática, pois ao
analisar os cartazes produzidos, observa-se a reflexão do contexto sociale do conhecimento
científico trabalhado, no momento em que foi colocado “se isola na sociedade, descriminado,
diga não ao crack, dá sensação de prazer e a estrutura molecular da dopamina”, indicando
assim um ensino de química contextualizado utilizando a abordagem CTS. Assim, é possível
evidenciar nos cartazes as vértices C (Ciência) e S (Sociedade) da tríade, segundo Santos
11
(2007) as situações reais e existenciais para os estudantes, buscando o desenvolvimento de
atitudes e valores ligado a capacidade de tomada de decisão.
Portanto, trabalhar a sequência didática com uma abordagem CTS envolvendo uma
temática relevante socialmente foi importante no processo de ensino-aprendizagem de
Química de forma interdisciplinar com Sociologia, valorizando a construção do conhecimento
científico e o cotidiano do sujeito para tomada de decisões.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do tema social abordado, ao ensinar conceitos químicos necessários para que
os estudantes-cidadãos sejam capazes de entenderem e compreenderem suas
responsabilidades diante da sociedade e do poder público.
Nesse sentido, percebeu-se que objetivos lançados na sequência didática foram
atingidos, pois se verificou por meio das atividades desenvolvidas a compreensão das ações e
efeitos do crack presentes no organismo, os estudantes identificaram as funções orgânicas
presentes na molécula de dopamina e ficaram entusiasmados com a construção da estrutura da
molécula estudada.
A sequência didática, articulada de forma interdisciplinar na abordagem CTS
valorizou e enriqueceu as aulas, em diferentes aspectos de cada disciplina participante e
contribuiu para uma melhor compreensão sobre o tema, visto que possibilitou a inserção de
conteúdo no contexto social do estudante.
É possível afirmar que na tríade CTS, a Ciência e a Sociedade é abordagem que
tiveram maior destaque no estudo. No entanto, identificou-se que as discussões quanto à
tecnologia trabalhadas na tríade CTS não foram totalmente esgotadas, podendo ser abordados
uma maior relação com a tecnologia, no que se refere a influência da mídia na prevenção ao
uso de drogas, atecnologia para explicar as substâncias que compõem as drogas e o
mecanismo de ação das drogas no organismo entre outros.
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