bruno_latour_antropologia

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    Esta ent revista foi realizada em Paris, em

    fevereiro de 2004, no gabinete de Bruno

    Latour na cole Nat ionale Suprieure des

    Mines, por Renato Sztutman e Stelio

    Marras. A cole des Mines oferece, tradi-

    cionalmente, cursos em geof sica, enge-

    nharia de materiais e energia, robtica,

    matemt ica, economia industrial, mecnica,

    reatores. Ali , Latour ensina sociologia, noquadro da formao oferecida pelo

    Centre de sociolog ie de linnovation , mas

    parece preferir no ser tomado por um

    socilogo. Sua formao em f ilosof ia,

    embora ele no se diga filsofo.

    Epistemlogo seria, ainda talvez, uma de-

    signao mais justa. Se bem que ele no

    recusaria de todo o rtulo de historiador

    das cincias. Ele prprio se define como um

    sujeito hbrido . Visto como um ant rop-

    logo, Latour seria um antroplogo da mo-

    dernidade mais especificamente, umantrop logo da cincia ou da natureza.

    Como cincia humana das coisas, esta

    antropologia da natureza no adere, con-

    tudo, seja ao realismo das cincias naturais,

    seja ao construtivismo das humanidades.

    Latour situa sua perspectiva nem de um

    lado, nem de outro, mas no meio no

    centro, precisamente onde ocorreseu obje-to de estudo por excelncia, os hbridos oumatters of concern, isto , as coisasao

    mesmo tempo naturais e domesticadas, osquase-sujeitos e quase-objetos dotados

    simultaneamente de objetividade e paixo.

    E tambm no cent ro do Ocident e e de

    seus coletivos modernos que se processa a

    produo e proliferao desses hbridos, em

    paralelo prtica, tipicamente moderna,

    de sua purif icao. por isso que os labo-

    ratrios de alta t ecnolog ia, por exemplo,

    so lugares privilegiados de investigao

    etnogrfica para uma ant ropologia das

    cincias, corao de uma ant ropologia da

    modernidade. M etodologicamente, t rata-se

    de seguir as coisasatravs das redes emque elas se transportam, descrev-las em

    seus enredos preciso estud-las no a

    partir dos plos da natureza ou da

    sociedade, com suas respect ivas visadas

    crticas sobre o plo oposto, e sim simetri-

    camente, ent re um e out ro.

    Por meio de uma dezena de livros e de

    centenas de artigos e ensaios, as idias de

    Latour vo se estendendo, tambm em

    rede, pelos continentes. Seu livro-manifestoJamais fomos modernos ensaio de

    antropologia simtr ica(publicado naFrana em 1991, no Brasil em 1994), foi

    t raduzido em 18 lnguas. Ao desmontar ali

    a iluso moderna de que possvel isolar o

    domnio da natureza (o inato) do domnio

    da polt ica (a ao humana), Latour

    reconectou a modernidade a todas as

    demais naturezas-cult uras do globo, deli-neando propostas para uma possvel con-

    vivncia in t raplanetria. Quase como um

    profetismo s avessas, o novo mundo para

    onde Latour apont a idnt ico ao mundotal qual ele sempre foi, mas que nunca os

    modernos, antes, pudemos notar.

    ENTREVISTA

    POR UMA ANTROPO LOG IA DO CEN TRO

    Bruno Latour

    MAN A 10(2):397-414, 2004

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    Sociologia da crtica, antropologia dacincia, science studies... Qual o me-lhor modo de se referir ao seu campode p esq uisa? Se ria essa aparen te inde -

    finio um sintoma da urgncia deuma redefinio dos instrumentos ca-

    pazes de iluminar os mecanismos damodernidade?

    Em termos de disciplina, o que eufao no existe. Meu trabalho se situaao lado da h istria da s cin cias, da n o-

    va histria das cincias a rea quemais atrai gente hoje no mundo uni-versitrio , daquilo que costumamoschamar de science studies, expressoque no tem corresponde nte direto emfrancs, e que a traduo em inglsda palavra grega epis temologia .Semp re colab orei com os antroplogos,e de vez em q uan do gosto de me d efi-nir como um antroplogo das cincias.

    Esse rtulo agora menos til, graasao trabalho de Philippe Descola, quevem desenvolvendo a escola da an-tropologia da natu reza (este o n omede seu curso no Collge de France), eeu fico muito contente em fazer partedela. Mas ao mesmo tempo, aqui [nacole d es M ines], eu en sino sociologia.Minha formao u nicamente em filo-

    sofia, meus diplomas so em filosofia.Assim, os rtulos n o so fceis de e s-tab elecer. Por outro lado, se d efinirmospelo objeto, o nico objeto que estudo o q ue chame i, de incio, de objetoshbridos, e que chamo agora de m at-ters of concern , em oposio aos m at-ters of fact. o que interessa tambmao pessoal dos science studies, os an-troplogos da cin cia, os historiadores

    da cincia, que convergem para esteobjeto que tem caractersticas novas eque podem os definir como segun doo antigo sentido desses termos things em ingls, choses em francs:coisas, ou seja, seres que tm n ecessi-

    dade de u ma representao, no duplosentido da palavra, como tentei preci-sar no livro Politiques de la Nature(2000). Assim, para responder ques-to, em termos de rtulo, n o disponh ode uma definio precisa para ofere-cer. No entanto, em termos de objeto,penso que meu objeto o estudo dosmatters of concern , a inveno de umcerto empirismo um segun do em pi-rismo, digamos, que no tem a ver sim-plesmente com os objetos, no sentido

    tradicional do empirismo, mas com osmatters of concern , com as coisas queconstituem causas, em oposio aosobjetos1. Eu gosto dos antroplogos,gosto dos socilogos (um p ouco me nos,talvez!), gosto dos filsofos (um poucomenos ainda!), e gosto muito dosscience studies, este o meu domnio,que, em parte, eu mesmo criei, junta-mente com amigos, e o domnio de

    pertena sempre importante. neleque encontro os colega s mais que ridos.

    Voc u tiliza a an tropologia clssica pa-ra criar instrumentos metodolgicosque permitam uma nova abordagemda cincia moderna. Isso implica, se-gun do voc, a constituio de u m a an-tropologia sim trica. Em qu e sentido a

    empresa de uma antropologia da mo-dernidade pode contribuir para reno-var a antropologia ge ral?

    Comece i pela u tilizao ba stante cls-sica da antropologia definida como et-nogra fia, como m todo etn ogrfico. Sepensarmos na formao clssica emantropologia tal como se fazia h maisou men os trinta a nos, veremos que no

    havia mu itas formas d e aplic-la ao es-tudo das atividades cientficas do cen-tro. Em troca, o m todo etn ogrfico erautilizvel. E assim alguns autores, co-mo Mike Lynch, na Califrnia, KarinKnorr, tambm na Califrnia, Sharon

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    Trawee k (uma verda deira an troplogaentre os socilogos) e eu mesmo, sem-pre n a C alifrnia, por acaso e sem n osconhecermos, utilizamos os mtodosetnogrficos. E foi apenas depois quetrouxemos o problema para a a ntropo-logia geral que nos defrontamos rapi-damen te ou rapidamente para mim com a questo Natureza/Cultura,monon atu ralismo e mu lticulturalismo.

    Nessa poca, na Califrnia, voc j

    possua alguma formao em antropo-logia?

    Sim, porque eu j havia passado doisanos na frica pela ORSTOM 2, ondetinha bons colega s, como Marc Aug .

    Voc fez o servio militar na frica,no ?

    Sim. Fiz o meu primeiro trabalho decampo l, sobre a formao de traba-lhad ores de m dio escalo em fbricasna Costa do Marfim. Eu j era, ento,um sujeito hbrido, uma vez q ue estavana C osta do M arfim, mas e studava u massunto relativo modernidade. Apli-cvamos o mtodo etnogrfico, masno ab ordvamos as grande s questes

    da antropologia. Estas encontramosdep ois, qua ndo comeam os a fazer es-tudos de cam po, e a nos demos contade q ue os antroplogos no compre en-diam na da do que fazamos, pois eramobcecados pela d is t ino Nature-za/Cultura, uma natureza e vriasculturas. Foi nesse momento que co-nheci Philippe Descola e MarshallSahlins e, em seguida, Eduardo Vivei-

    ros de C astro. Com e les, as minh as dis-cusses comearam a se aproximarrealmente da antropologia. Foi entoque p ubliquei N ous n avons jam ais tmodernes (1991), que foi um momen-to-chave para mim, quando entrei em

    contato com os antroplogos, que co-meavam a d izer ha ver ali algo de in-teressante para eles, pois, at ento,no se h aviam ap licado m todos etno-grficos distino Natureza-Cultu-ra. Penso que, desse ponto de vista,prestei um servio aos antroplogos.Mas ser que isso abalou a a ntropolo-gia como um todo? No. Porque, deincio, nada abala a antropologia e asdisciplinas acadmicas em geral, etamb m porque as cincias continuam

    a interessar apenas a pouqussimaspessoas. Assim, afora Descola e Vivei-ros de C astro, um pouco Sah lins, o im-pacto da antropologia das cincias co-mo a q ue fao sobre a antropologia g e-ral , creio, nulo. Por outro lado, hpe ssoas como Pau l Rab inow, toda u masrie de antroplogos ps-modernos,que man tm laos mais fecund os entreos science studies e a antropologia.

    Mas isso perma nece sem pre me io mar-ginal na antropologia, como vocs sa-be m mu ito be m, pois so antroplogos.

    Por que a influncia dos science stu-dies se fe z se ntir m ais nos Estados Uni-dos, e to pouco na Frana?

    Na Frana, isso no teve absolutame nte

    qualquer influncia, salvo no curso deDescola, ou na Inglate rra, um pou co porMarilyn Strathern, que estabeleceu co-ne xes muito produ tivas en tre os scien -ce studies e a antropologia. Na Alema -nha, tenho a impresso de que n o hou-ve gra nd e influn cia. Assim, a an tropo-logia continua o d eba te en tre cincia ecultura3. Sobretu do, isso no teve q ua l-quer influncia no lugar onde justa-

    men te teria d e ter tido, ou seja, nas re-laes entre a antropologia fsica e aan tropologia cultural. Era l qu e e stava e aind a e st o futuro, o impacto fu-turo dos recursos intelectua is mobiliza-dos pelos science studies. E esse traba -

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    lho ainda nem sequer comeou, apesarde ser interessantssimo. As coisas nocaminham rpido na vida intelectual.

    Qu al , para voc, a diferena m ais sig-nificativa entre a (nova) antropologiadas cincias e a assim cham ada filoso-

    fia d as cin cias?

    Aqui, o contraste total, entre a epis-temologia (ou filosofia da cincia) e osscience studies. H ainda um terceiro

    personage m, que a histria da s cin-cias, hoje em dia muito desenvolvidona Frana e muito interessante. Hmuitas coisas agora. Assim, h IanHacking, que , alis, um colega deDescola no Collge de France, um ca-so tpico dessa hibridizao entre filo-sofia, histria e sociologia d as cin cias.Mas ele no francs, canadenseDurante m uito temp o, a n ica ma neira

    de se pe nsar a cincia na Frana era aepistemologia. Mas isso mudou muito,pois h H acking no Collge de France;h, ao re dor de Dominique Pestre, his-toriadores da cincia numerosos e detima qualidade, de nvel internacio-nal. Assim, a situao agora bemma is rica. H m uitos bons trab alhos doque podemos chamar de science stu-

    dies na Fran a, sobre a Fra na, e feitospor franceses. A ligao com a antro-pologia, creio, permanece dbil, poisseria preciso que os an troplogos se in-teressassem, justamente, pelo centro.H poucos antroplogos que fazem is-so, e quando o fazem, da maneiramais superficial possvel.

    Poderam os dizer qu e e sses antroplo-

    gos que trabalham com o tem a da mo-dernidade no se interessam sen o pe-la pe riferia da cultura ocide ntal?

    Sim, isso, a pe riferia d o centro! E noo centro do centro! Ou tampouco a p e-

    riferia, alis. Agora n o sab em os muitobem onde o centro e onde a perife-ria. Os an troplogos n o se inte ressampelas multinacionais, eles no se inte-ressam pela indstria, pelas tcnicas.Ma s no posso lhe s falar sobre a a ntro-pologia na Frana. Sobre e sse assunto,seria melhor vocs entrevistarem Des-cola, pois eu n o freq e nto os antrop-logos s freqento os melhores! Euno freqento todos os outros; no es-tou habilitado a respond er a essa qu es-

    to. Mas o ponto que, de fato, meuprojeto vem mudar a antropologia emgeral. Se d eslocarmos o deba te de con-ceitos como mononaturalismo emulticulturalismo para novos con-ceitos, faremos a antropologia mudar.Qua ndo Viveiros de Castro inventa suahistria de multinaturalismo, elechuta o pau da barraca. Isso certo.Assim, de pois disso, a an tropologia de -

    ve se refazer. Mas quais so aquelesque tm conscincia desse problema,alm da s trs pessoas j me ncionada s?

    Voc apresenta o projeto, a Constitui-o Mod erna, com o algo fadad o ao fra-casso. Quais so os sign os de ste d esti-no trgico, um a vez qu e a cincia pare-ce continuar ocupando um lugar de

    centralidade na produo de nossasverdades? Se assim, por que n o po-dem os m ais ser mode rnos? N s jamais

    fomos modernos, ou fomos, uma vez,mas agora deixamos de s-lo? Retros-

    pectivamen te, de acordo com sua teo-ria, ns j no ramos, antes, moder-nos. Mas ramos mais modernos quehoje? Somos menos modernos que htrinta an os?

    Sim, isso certo. No tenho provas,pois todos os sign os podem ser reinter-pretados dentro de uma lgica de de-senvolvimento modernista. Eu nopossuo uma s prova o que me preo-

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    cupa mu ito, alis de qu e a histria ea flecha do temp o modernistas no se-

    jam verdadeiras. Se formos haberma-sianos, a lgica do desenvolvimentodos ltimos cinqenta anos pode serperfeitamente compreendida como oavano da modernidade, da hipermo-dernidade, como disseram alguns,com o pequeno problema da ps-mo-dernidad e, entretanto, que u m sinto-ma bastan te forte. Ento, o que eu fao simplesmente oferecer uma outra in-

    terpretao, dizendo: se olharmos ascoisas de um modo diferente, poss-vel que o que est acaban do seja um amodernidad e q ue jama is existiu d e fa-to: jamais fomos modernos. parado-xal. Mas, ali onde eu possuo as provasque os outros no possuem, porque,digam os, ma is um a vez, graas hist-ria da cincia, graas aos science stu-dies, ns nos demos conta, finalmente,

    de que o nico disparador e as nicasprovas de q ue os modernistas dispempara fazer o seu qu adro de desen volvi-mento do Homem modernista daRen ascen a at hoje so as cincias. Galileu, Newton, Pasteur, Einsteinetc. Ora, justamente isso que, junta-mente com os historiadores da cincia,meus amigos, pudemos revisar de al-

    gum modo. Porque a gora temos a his-tria de Galileu, a histria de New ton,a histria de Pasteur, a histria deEinstein. A cada vez, em lugar de en-contrar uma separao entre objetivi-dade e subjetividade, encontramos ocontrrio. Foi isso que contei na minh apequena conferncia no Collge deFrance, no quadro do seminrio deDescola. Para ns, que somos historia-

    dores da cincia, no sentido dos scien -ce studies, as provas de q ue jama is fo-mos modernos so mais fortes, poisdispomos justamente dos exemplosda s cin cias, qu e n s revisam os. Por is-so a idia de uma Grande Narrativamodernista parece hoje em dia bem

    men os crvel. Mas n o propriame nteum destino trgico no ser moderno. Oqu e seria trg ico seria o fato de se rmosmesmo modernos. Este sim seria umdestino trgico. Alis, os modernistas

    j choraram tod as as lgrima s dispon-veis para explicar que ser moderno e raterrvel, era desencantar-se etc. Entoo fato de jamais termos sido modernosno absolutamente uma tragdia.

    justamente o contrrio! Os europeusjamais aband onaram a ma triz antropo-

    lgica ordinria4. Agora temos a p rovadisso, pois Descola est m ostrand o queo modernismo um dos quatro casosde identificao com a nature za: o na-turalismo, ao lado do analogismo, dototemismo e do animismo. um casodigno de interesse, mas uma varian-te en tre outras. No ma is o horizontepara o qual evolui o resto do mundo.Isso coloca evidentemente problemas

    polticos enorme s, qu e Descola n o re-solve. Descola tem muitas qualidades,mas sua poltica completamen te cls-sica.

    M as h algo realm en te in dito, histori-camente falando, no que dizem e fa-

    zem os m odernos...

    Sim, eles s o origina is. O n atu ralismo muito original. Eles so interessantes.O modernismo uma particularidadeantropolgica interessante. Ce rtamen -te no o nego. E podemos me smo irma is longe. Essa particularida de e xpli-ca muito de seu dinamismo. porqueestivemos constantemente a imaginara pu rificao que pud emos operar a h i-bridizao. Essa hiptese , que formulei

    sem a men or prova em 1991 em Jamaisfomos m odernos, eu diria que se achahoje, no fim das conta s, razoavelme nteconfirmada. Alis, devo agradecer porisso, em pa rte, aos trabalhos dos an tro-plogos. graas ao fato de o moder-nismo no ser uma rea lidade, mas uma

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    interpretao da realidade qu e tem umefeito mu ito importan te sobre esta , qu epodem os agora fazer uma antropologiado dinamismo dos modernos. preci-samente porque eles esto constante-men te a trabalhar com a idia de puri-ficao que puderam produzir esseshibridismos, qu e os outros diramoshoje, os analogistas ou os multinatura-listas se probem. Eu falei disso al-gu ma s vezes com Sah lins e com Vivei-ros de Castro, e creio que essa no

    uma hiptese absurda, ainda que con-tinue sem poder prov-la. O dinamis-mo dos mode rnos ter feito constan te-mente outra coisa que aque la q ue p re-tendiam fazer. A comparao com aChina muito interessante, com oschineses conforme imaginados e re-construdos por Franois Jullien 5, poisl vemos muito bem a diferena de u mpen samen to que procura, ao contrrio,

    ficar o ma is prximo p ossvel da pr ti-ca. muito interessante, mas ns, dolado ocidental, no compreendemosesse pensamento, pois ele nos parecebanal. Ora, essa banalidade , segun-do Jullien, justamente a fora e o inte-resse desse pensam ento, que se recusaa dram atizar suas preocupaes.

    Ento, eu no possuo signos, pos-

    suo ndices q ue reinterpreto sob outratica. Mas se vocs me perguntamqual a p rova que e u tenho de jamaistermos sido modernos... bem, eu notenho provas! Todos os meus amigospensam q ue m inha hiptese no ver-dadeira, que a modernizao avana;mesmo aqui [no CSI] vocs podemperguntar a meus colegas ningumacredita na minha hiptese. Todos

    pensam que a modernizao continua;muitos crem que ns nos tornamosps-modernos. de se espantar, poisesse livro que e u e screvi em trs sema -na s foi pu blicad o em de zoito lngu as! uma hiptese que interessou a muita

    gente, mas que e u no consigo de ma -neira nenhuma provar.

    Para voltar a Philippe Descola, ele falade um a ontologia naturalista. Voc falade uma const i tu io moderna queoculta ou encobre, digamos, um ladono-m oderno e q ue poderia ser chama-do, para continuar com os termos de

    Descola, de animismo, totemismo ouanalogismo. Que acontece, ento, emsua prpria reflexo, com essa noo

    de ontologia?

    Essa uma questo difcil... No sei.Os naturalistas so realmente natura-listas? Sim e no. Na perspectiva deDescola, o natu ralismo de fine um certomodo de identificao. Ora, pen so queisso no ce rto no que d iz respe ito aosmodernos, pois define apenas o ladode sua e mpresa que corresponde re-

    presentao oficial que eles tm de simesmos, e da qual tm necessidadepara construir os recintos [enceintes]dos matters of fact. Mas ao mesmotem po, no inte rior desse recinto, qu e ,grosso modo, seu laboratrio, eles vi-vem de uma mane ira bastante diferen-te. Por exemplo, os tomos que, emum a ontologia na turalista, so suposta-

    me nte t o exteriores a n s, exibiro, nolaboratrio, um monte de outras onto-logias no plural , uma poro deestados ontolgicos que contradizemflagrantemente a viso pedaggica eepistemolgica oficial. Essa contradi-o no e ntre o velado e o revelado,mas e ntre o recinto e o que ele pe rmi-te. No a mesma coisa. porque osmodernos esto p rotegidos das conse-

    qncias de sua hibridizao que elesse pe rmitem tais coisas.

    A que sto diz respeito ao recinto. exatamente como se ns tivssemosuma central nuclear e , para fazer essacentral nuclear, fosse necessrio cons-

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    truir recintos slidos para proteger oque se pa ssa no ncleo do reator, sepa -rando-o muito bem d o exterior. Que ,en to, necessrio estuda r? Os recintos?O ncleo do reator? O exterior? Tudo,provavelmente. Se nos interessarmospelo recinto, diremos qu e os m odernospossuem uma ontologia naturalista isso o que diz Descola , mas se n osinteressarmos pelo que se faz dentrodos recintos, veremos algo muito dife-rente. Isso no que r dizer que eles se-

    jam animistas os modernos no po-dem ser de modo algum animistas, to-temistas ou analogistas. Bem, analo-gistas talvez seja mais provvel, poisherdamos muito do analogismo... V-se isso muito bem, alis, no belo livrode Foucault, As palavras e as coisas.Herdamos muitos aspectos do analo-gismo. O problema q ue n o sabem oscomo se passou do analogismo ao na-

    turalismo, da prosa do mu ndo, comodiz Foucault, Natureza modernista.O fato qu e h pouca an tropologia domode rnismo. Tem os muito me nos estu-dos, curiosamente, sobre as nossas on-tologias que sobre a ontologia dosAchuar, por exem plo. Ento n o temosrespostas a e ssas que stes. Pessoas co-mo Descola e Viveiros de Ca stro costu-

    mam dizer: estudo os outros e nons, e por isso no considero os na tura-listas mode rnos por aq uilo qu e e les fa-zem realmente , mas ap ena s por aqu iloque eles dizem oficialmente sobre simesmos. E assim, o paradoxo quesabemos menos sobre as ontologiasmobilizadas pelos bilogos, pelos tc-nicos de computao, pelos empres-rios, que sobre aquelas mobilizadas

    pelas prticas de caa achuar. Porquepensamos que os brancos, os habitan-tes do centro, realmen te possuem um aontologia naturalista. Isso uma ver-dade to superficial que acaba por setornar completamente falsa. (Os brasi-

    leiros so interessantes porque eles ja-mais acreditaram, no final das contas,ne ssa histria d e p urifica o. Eles pos-suem um a viso que difere da que la domodernismo dos franceses.)

    Ento, direi, para retomar os ter-mos da questo de vocs, que no setrata aqui de uma ontologia pura esimples, mas de uma ontologia queainda no conhecemos, em virtude dafalta de estudos. Mas quando estamosdiante d e a lguns bons traba lhos co-

    mo, por exemplo, o belssimo livro deHans Jorg Rheinberger sobre os seresbiolgicos em um laboratrio contem-porneo , vemos que a ontologia na -turalista d e De scola e Viveiros de C as-tro no parece descrever muito bem oque se p assa n esse laboratrio. Coisasestranha s acontecem com os seres bio-lgicos. Isso no q ue r dizer qu e os bi-logos sejam animistas, isso significa

    que acontecem coisas que a criao dorecinto modernista permite. Quan do seest no recinto modernista, possvelfazer experincias sobre as ontologiasque no se pode fazer quan do se estno terreno do animismo. essa a dife-rena crucial, essa a particularidad edo natura l ismo. Mas aqui h umaquesto tcnica que tomaria muito o

    nosso tempo.

    Tomemos a questo anterior sob um prisma diferente. Os modernos detmuma certa constituio, que lhes per-mite encobrir o que se passa realmen-te d en tro de seus recintos. Entre os pr-m ode rnos, ao contrrio, pod eramos d i-

    zer que tud o se passa de um a mane iradiferente, que eles so mais transpa-

    rentes e que jamais se enganam. Ouseja: o que eles dizem, eles fazem. Oen gano seria um atributo dos m ode r-nos. Podemos dizer que os modernosencerram uma contradio mais sriaque os dem ais? Se isso ve rdade, eles

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    se tornariam realmente diferentes dosoutros, situando-se em uma posiorealm en te assim trica.

    muito interessante essa questo. Eue Viveiros de Ca stro j discutimos m ui-to sobre e sse ponto. No absurdo d i-zer que a particularidade dos moder-nos e star em maior contradio con-sigo mesmos que os demais coletivos.O caso dos chineses , nesse sentido,extraordinrio; tomemos mais uma vez

    os chineses de Jullien, que descreveefetivamente as suas prticas. Mas nanossa perspectiva, a dos modernos,criadores de recintos no interior dosquais se faz algo diferente, o objetivoda sua filosofia [dos chineses] no descrever as suas prticas, mas criarcondies para que isso que eles sa-bem na prtica possa ser levado s l-timas conseqncias, com energias

    considerveis, pois os pressupostos econseqn cias das conexes so man-tidos em desconhecimento. Costuma-se concluir do fato de jamais termossido modernos o fato de que os mo-dernos teriam se en gan ado. No essaa qu esto sou geralmente m al com-preen dido nesse ponto. Mais uma vez:quando se est numa central nuclear,

    nunca se est dentro, mas fora; nin-gu m vai que rer entrar, pois den tro tu-do irradia, tudo qu eima, e p orque seest fora e que h um recinto de con-teno que se pode, no interior, fazercoisas com en erg ias formidve is, inco-mensurveis, com o que se passa noexterior... preciso levar em conta asenergias das experincias modernas.Se, a cada vez que comeam os a esta-

    belecer os protocolos dessas experin-cias ns nos dissermos: isso tem in-fluncia sobre a sociedade, sobre ocosmos, sobre os ancestrais, sobre oscultos e tc. se, a todo mom en to, n o ti-rarmos os olhos do fato social total da

    nossa prpria cultura, seremos obriga-dos a tomar graves precaues, tere-mos de tomar m uito cuida do. E com is-so, viveramos em uma atmosfera dedesacelerao.

    A que sto de vocs muito astucio-sa. No se trata de dizer: todos os ou-tros fazem o que dizem, e ns, moder-nos, tem os a pa rticularidad e d e m en tir,ns m en timos!. Sup erficialmen te, isso verda de . Ma s preciso fazer as du ascoisas ao mesmo tem po, sen o n o po-

    deremos nos permitir liberar energias.Essa a grande astcia dos modernos:ter um a constituio que possui dois ra-mos . O pr imeiro permite alegar :q ua ndo voc faz isso, voc pod e mis-turar o que bem quiser, e as conse-qncias no vo existir. O segundo,por sua vez, constata justamente queessas conseq n cias e xistem. Ah, sim,destrumos a floresta amaznica, trans-

    formamos completamente as grandesplancies norte-americanas. Uau, isso estranho, como isso pde acontecer?No se pode negar que haja para osmode rnos um contraste excessivo entreo que eles dizem e o qu e fazem. issoque explica sua surpresa total diantedas conseqncias inesperada s de sua saes. Eles dizem que so emancipa-

    dos, ma s ao mesmo tem po: a h, es-tranho... hoje e stamos novame nte re co-nectados atmosfera, ao ar que respi-ramos. Como isso aconteceu? Issoaconteceu porque t ivemos uma in-fluncia to grande que acabou alte-rando o prprio clima. Ns dizemos,finalmente: Olhem s, estamos real-me nte reconectados!. Pois , estam osreconectados. Os outros sabiam. Isso

    n o causa e span to aos outros. E aq ui huma verdadeira diferena. Os outrosnos dizem: Welcome b ack!. Ns lhe sperguntamos: Vocs no so emanci-pa dos?. E eles respond em : N o! Nssab amos. Ns, os outros, sab amos um

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    pouquinho das coisas. A hbris mo-derna, que foi estudada por todos osmode rnistas esse o grande tema d acrtica. H qua lquer coisa de verdad ei-ro nesse tema da hbris . De qualquermodo, se todas as q ue stes d e vocs fo-rem to difceis como esta, eu no po-derei mais responder...

    Ento, se a constituio moderna ofi-cial, mas no oficiosa, podemos voltara falar em uma ontologia de base e

    por que no d izer un iversal? ligadas prticas de traduo ou hibridi-

    zao, essas que tornam impossveistodos os esforos de purificao? Vocdefen de a idia de que todos os coleti-vos so hbridos. isso que tornaria

    possvel a simetrizao e a com paraoen tre os m odernos e os outros?

    A questo do universal no me parece

    apropriada. No um m odo idea l parase falar do m und o. O problema : serque p odemos viver no mesmo plane ta,saben do qu e tem os definies comple-tamen te diferente s sobre o planeta, so-bre o que viver e o qu e estar junto?E, nesse ponto, a compa rao deixa deser intelectual, para ser uma compara-o que podem os chamar, com Isabe l-

    le Stenge rs, de cosmopoltica, ma s nono sentido de Ulrich Beck ou de Kant.Talvez fosse necessrio falar, como Pe-ter Sloterdijk, em domo ou envelope.Qu al o domo no interior do qu al se faza comparao? Esta , em si, umaquesto importantssima. A soluoclssica dos antroplogos dizer quens sabemos o que esse domo, ele o conhecimento, a natureza, a nature-

    za humana, essa manso da moderni-zao para onde se encaminham asculturas, sob uma forma geralmentetriste tristes trpicos, eis a frmu-la que resume todo um passado. Elasentram na manso, ns as honramos,

    elas se mode rnizam e se dissolvem e mtodos sentidos. O imaginrio da antro-pologia uma esttua cuja encarnaofoi Lvi-Strau ss.

    Ora, a situao atual completa-mente diferente, pois no h mais odomo da natu reza, e men os ainda o te-ma do desaparecimento das culturas,pois h a formao de novas culturascompletamente bizarras, hbridas, maneira de Appadurai, feitas de mer-cado mun dial, de m arke ting, de a rcas-

    mo, de folclore etc. E a asse mb lia quepe rmitiria essa conex o no existe. Porisso, a situao se torna realmente in-teressante, pois agora a comparaodeixa de ser somos todos de diferen-tes culturas, sobre o p ano d e fundo d euma m esma natureza, para ser o quenos espera?. E assim essas questesvo ficando cada vez ma is interessan-tes. isso que e u q ueria dizer sobre o

    tema da nova forma de auto-apresen-tao dos europeus. Os europeus se re-presentam e se apresentam novamen-te aos outros, de modo agora polido,dizendo: no sabem os em que mundoestamos. Tomemos a famosa disputade Valladolid. Vallad olid ve rsava sobreos ndios. E, como lembram Lvi-Strauss e Viveiros de Castro, ser que

    os brancos estavam de acordo comeles? Antes, a qu esto e ra simples, eraa do u niversal local, tal a controvrsiade Valladolid. Mas... e se dissermos:qual a diplomacia necessria paraque haja um mundo comum entre es-ses que dizem Em Valladolid, experi-mentam-se almas; em Porto Rico, ex-perimentam -se corpos? No h m aismun do comum a ab rigar estes dois ex-

    tremos. De fato, e estamos mesmo as-sim e nga jados ora em uns, ora em ou-tros, obrigad os a estar em g uerra p arapoder fazer a paz. E assim as coisasvo ficando interessantes.

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    Retom em os, antes d e p rossegu ir, a suanoo d e hibridiz ao...

    Hibridizao no u m b om termo. Seo empreguei, foi simplesmente paratest-lo. Hbrido j todo um mu ndoda gentica. Usei o termo hbridopara comear a discusso, ele d escrevebem o fato de que qua ndo voc fala emgarrafas de gua mineral, por exem-plo, voc vai en contrar a legislao, osproblemas de p oluio e a gu a vai se

    pr a diferir, a se complicar, deixandode estar situada como um matter of

    fact. S que hoje eu n o utilizaria ma iso termo hbrido, pois, a rigor, s h h-bridos, em toda parte. Se assim fosseno poderamos mais fazer a distinoentre animismo, totemismo etc.. Masns produzimos um tipo de hbrido qu e muito interessante: o ato da hibridi-zao neg ado em seus recintos. Se o

    recinto exibe m atters of fact, seu inte-rior codificad o. Essa a n ossa inven-o. uma coisa en graada . E ns, nons antroplogos, mas ns que faze-mos a cosmopoltica, ns dizemos quea tarefa da poltica abrir o recinto emostrar o que e le e o que p ermite, ouseja, os m atters of concern . Essa oposi-o est um pouco em toda parte: so-

    bre a guerra no Iraque, por exemplo,diremos: esta vai ser rpida, vai dartudo certo, ns controlamos tudo . Mastudo d errado, como vamos sair dessa,estamos enrascados. . . Ns vivemosneste momento uma oposio particu-larmente dramtica. Temos as provasabsolutas de que h armas de destrui-o em ma ssa, e ento, de repente, da-mo-nos conta de q ue n o as temos, es-

    tvamos en gan ados. Essa oposio es-t por toda parte. Fatos indiscutveisso su bstitudos por fatos d iscutveis.

    Com o de finir essa noo de cosmop ol-tica?

    H muitas definies, mas eu prefiroaqu ela de Isabelle Steng ers. Ou seja, ade q ue a poltica so os huma nos, eque o cosmos so as coisas: nen humdos dois sozinho o bastante. A pala-vra cosmopoltica u ma palavra qu epermite dizer que se fizermos a polti-ca ape nas entre hu manos, vamos aca-bar nos fechando em uma esfera ex-gua dem ais, feita de interesses de boavontade. Se tivermos apenas cosmos,iremos nos encerrar sozinhos na velha

    idia dos naturalistas, que definem apriori um m und o comum q ue os outrosdevem compartilhar. A cosmopolticapermite imped ir que os dois se fechem :o cosmos est l para impedir que apoltica se fech e, e a p oltica, pa ra im-pe dir que o cosmos se feche. O cosmosno mononaturalizado, ele a ex-presso de uma poltica. Acredito quepodemos dizer hoje que temos uma

    prova para esse fenmeno, e esta muito difcil de ser ne gad a. O n me rode fatos, que aparece ainda sob a for-ma mode rnista de m atters of fact, dimi-nuiu muito em relao aos fatos queaparecem agora sob a forma de m at-ters of concern . Ns no podem os ain-da quantificar a mud ana, mas h umagrande mudana. Podemos tambm

    interpretar isso alegando que, no, simplesmen te o modernismo que tentaavanar, mas esse tipo de interpreta-o acab a p arecend o com os epiciclosptolomaicos. Enfim, no se d eve acres-centar epiciclos a epiciclos. No ummodo honesto de pe nsar.

    Tomemos, como exemplo, o caso dasdescobertas sobre o genoma humano.

    Fala-se muito, nos termos de Viveirosde Castro, em multinaturalismo, ouseja, mltiplas naturezas. Ora, as des-cobertas recentes sobre a biotecnolo-gia genm ica insistem sobre u m a basebiolgica certamente universal, que

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    nos reenvia forosamente ao monona-turalismo. O que encoberto nesse

    processo? Ou, dito de outro modo: noteria a antiga constituio m ode rna e n-contrado, ali, a sua realizao?

    Este o gn ero importante de que sto,pois estamos aqu i no cruzame nto entreantropologia fsica e antropologia cul-tural, social. Esse cruzamento deverser, no futuro, o cern e d a a ntropologia.Mas reflexes como essas no foram

    praticamente realizadas. Mas h ummodo tpico de re sponder que sto devocs. Podem os, e h g ente que o faz,saudar a genmica como o grandeevento dos ltimos vinte anos. Pode-mos efetivamente repetir a narrativado mode rnismo com a b iologia no cen -tro. Ao mesm o temp o, en tretan to, veri-fica-se uma proliferao de definiesdo gene, das influncias dos genes,

    que reduziu a nada a universalidadedo discurso biolgico. Este tipica-mente um problema modernista. Todomundo tem o mesmo genoma, estamostodos finalmente unificados sob o tetoda manso da gentica. Sim, mas, si-multanea men te, as definies do gen e,das influncias do gene que serviampara unificar essa manso, explodiram

    em uma multiplicidade de definies.Por exemplo, muita gente tem sndro-me de mongolismo, mas n o ma nifestao mong olismo. Pierre Sonigo, que u mgrand e bilogo francs e q ue escreveu,no an o passado, um livro apaixonan tesobre o gene, oferece uma definiocompletam ente oposta 6. Ele diz no, ogene no algo que transporta as in-formaes, mas algo que come . J no

    a mesma coisa. Todas as conseq n-cias que voc pode tirar de um e de ou-tro para a unificao do comportame n-to so diferentes. Evelyn Fox Kellerpub licou, no ano pa ssado, The cen turyof the g ene , onde argumenta que o dis-

    curso sobre a a o do gene uma pe-quena frao, agora, do que se passana gen tica7. H a qui gente que e stu-da as questes relativas s doenasque so devidas a um gene apenas, emesmo assim observamos diferenasenormes. Sem falar do fato de qu e a go-ra um gene uma e mpresa, so paten-tes, um jogo geopoltico enorme co-mo vemos com o caso dos transgni-cos. por isso que a relao entre a an-tropologia fsica e a a ntropologia cultu-

    ral tornou-se to interessante de umponto d e vista poltico. Estamos dian tede um lugar de controvrsias, pois po-dem os dizer: Olha, temos razo de fa-zer a ntropologia fsica, p ois a gora isso

    j est u nificad o. E, ao me smo tem po:Olha, temos uma rica antropologiasocial digamos assim dos genes,porque a gentica assunto das maisvariada s controvrsias . Isso norm al,

    pois no h u ma nica ma neira de umcorpo existir no mundo. Os geneticis-tas no sabem o que fazem. que oproblema do gene complicado. Umgene mltiplo e os seus modos deao so mltiplos. No h um s dis-curso sobre o ge ne que possa unificar agentica.

    A que sto de vocs mu ito interes-

    sante e a minha resposta a essa ques-to : eis porque p reciso uma antro-pologia da cin cia. preciso conseg uircompre en de r as dua s coisas: o discursounificador triunfalista dos geneticistas qua ndo estes dizem que o genoma, finalmen te, o fim da difere na cultu-ral, porque temos agora um s genepa ra tud o, e o seu contrrio, ou seja, aidia de que o gene no explica tudo:

    fazemos ge nmica, agora te mos o Ge-noma, e nos damos conta de qu e n o isso que explica tudo, preciso olharpara as protenas etc. O objetivo da an -tropologia n o opor o d iscurso oficialao discurso oficioso, mas estudar os

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    dois. E explicar por que o primeiro per-mite um a pa rte do segund o ao mesmotempo em qu e impede o seu d esenvol-vimento. Hoje o desenvolvimento dagentica est paralisado por um dis-curso que no corresponde, de modoalgum, quilo que o ser deve fazer,presa como est estranha ontologiado an tigo ge ne codificante e informan -te, algo como a imitao de um livro,algo que se assemelha linguag em.

    Voc fala da crise da represe ntao po-ltica com o parte d a crise da m oderni-dade. Em que sentido voc pode dizerque a dem ocracia ao m esmo tem poo m elhor e o pior sistem a poltico, pararetomar a frase de Churchill que vocm encionou em um a conferncia recen-te d ev e ser estend ida s coisas?

    A poltica sempre foi, de fato, uma po-

    ltica das coisas. A questo foi sempreconstruir cidades, definir fronteiras epaisagens. Foi a filosofia poltica queinventou, em meados do sculo XVII,uma teoria da representao unica-men te do mun do social hum an o, ao co-locar a e conomia e a s cincias do outrolado. Isso significa que, do ponto devista da atividade que chamamos pol-

    tica, sem pre se tratou d e q uestes is-sues, como dizem os ingleses , queso preocupaes no simplesmentemateriais, mas preocupaes em rela-o a be ns e coisas. A me lhor de mons-trao disso u m a fresco muito conhe-cido de Lorenze tti, em Sien a, Do bom edo mau governo. A diferena entre obom e o mau governo que no mau go-verno h coisas que so destrudas, ao

    passo que no bom governo as coisasso coeren tes. N o fui eu qu em inven -tou a poltica das coisas (a democraciadas coisas, sim). a filosofia polticaque a esqueceu e que durante algunssculos definiu a poltica como u m p ro-

    blema de representao dos humanos,de tomadas de posio dos humanos,ma s no como um a cosmopoltica. Ago-ra que jamais fomos modernos, com oproblema que expliquei h pouco, co-me a a ficar claro por qu e o sen hor Lu-la tem de se ocupar d o aque cimento doglobo, do milho hbrido, da pob reza , dahabitao, da crise do abastecimentode gua etc. eviden te por qu.

    Podem os dizer que o problema d a eco-

    logia esteve sempre no centro da pol-tica?

    Sempre esteve no centro da poltica,ma s nem semp re no cen tro da filosofiapoltica. Agora o prob lema q ue a filo-sofia poltica d eve a bsorver de novo ascoisas que e stavam an tes nas m os ex-clusivas dos experts cientficos osgenes de que acabamos de falar so

    um timo exem plo disso , e qu e a go-ra migram pa ra o centro da a teno co-mum. E a, a democracia das coisas uma outra histria. o parlamentodas coisas. Este o problema da ex-posioM aking Th ings Pub lic [Tornaras coisas p blicas], que estou prep a-rando e m Karlsruhe, na Aleman ha. Re-tomando, portanto, a q uesto de vocs:

    no se trata apenas da representaodos centros da vida poltica em tornoda eleio e da autoridade, mas a re-presentao tambm no sentido bemconhecido dos instrumentos que re-presentam as coisas de que falamos.Assim, a questo da democracia atualno apenas saber se ns votamos ouno, se estamos ou n o autorizados pe-las pessoas que nos elegeram, o que

    a primeira pa rte da represen tao, mastamb m a de sab er como, qua ndo fala-mos do milho transgnico, essa coisade que falamos representada, destavez no interior do recinto. Por isso, ademocracia das coisas quer dizer,

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    justamente, o duplo interesse pelosdois sistemas d e re presenta o: repre-sentao dos humanos que falam dascoisas, e representao das coisas deque os huma nos falam, em seu s recin-tos. Um caso tpico de ma u exe mp lo derepre senta o o do M r. Collin Powe llquando diz ONU: Olha, eu tenho aprova de que h armas de destruioem m assa, e posso exibi-las na tela . Eele nos mostra p ssima s ima ge ns falsi-ficadas e tc. H uma carncia de rep re-

    sentao. No estou dizend o que Bushno autorizado, ele foi eleito. Mas oque ele faz no represen tativo. A de-mocracia das coisas transportar deum m odo confivel as coisas de qu e fa-lamos e, por outro lado, estar a utoriza-do para falar delas por meio de umprocedimento social. Trata-se de umaquesto extremamente simples, masque a filosofia poltica no abordou,

    pois ela fez uma separao completaentre, de u m lado, as coisas qu e so re-presentadas pelos cientistas, mas forado proced imen to poltico, e a re pre sen-tao dos hum anos. Mas no me io dissotudo havia a retrica, que era justa-mente uma forma de comunicao eman ipulao, uma esp cie de relaespblicas, e no o trabalho pblico so-

    bre as provas incompletas. A retricajama is foi a n o se r en tre os gre gos,certamente pensada como sendo omeio essencial de reconduzir as coisasaos recintos ocupa dos por aqu eles quefalam delas. Assim, essa questo tocade fato no problema da inveno deum a re trica p oltica.

    porque a retrica uma tcnica...

    Sim, mas q ue foi mu ito importante du -rante vinte e quatro sculos e que de-sapareceu completamente no fim dosculo XIX. Desapareceu, pois a cin-cia n o pode ria ser, supostamen te, uma

    retrica. Mas claro que necessrioque ela seja uma. necessrio ser ca-paz de dramatizar, verificar, encontrar,expressar, convencer, ser compreens-vel por um grande nm ero de pessoas.E isso corresponde exatamente s ar-ma s e s gran de zas da retrica clssica.

    Parece que o que nos falta, hoje emdia, no a retrica em si m esm a, m as

    justame nte um a esp cie d e rigor ret-rico...

    Podemos falar de rigor retrico, vocstm razo. Infelizmen te, opomos retri-ca e rigor. be la essa e xpresso d e vo-cs... Vejam s, por exe mp lo, Collin Po-we ll em u m e pisdio muito interessan teem q ue ele foi obrigado a d izer: Theseare not obsessions, my friends, these

    are facts. Ele foi obrigado a dizer issoperante o Conselho de Segurana da

    ONU. Eviden temen te, no se tratava defatos indiscutveis. Ele bem sabia. Seele tivesse segu ido o rigor retrico, eletalvez pudesse ter dito: Eu no sei oque se pa ssa de fato, eu possuo provasmu ito pouco claras. Mas elas s o imp or-tantes demais para que deixemos deagir imediatamente. Aqui sim tera-mos um a retrica rigorosa. Ele pode ria,

    talvez, nesse caso, ter convencido al-gu m, mas a oposio entre fatos e re-trica (These are not obsessions, myfrien ds, the se a re facts) torna imposs-vel o rigor retrico. O que eu quero fa-zer nessa e xposio justamen te dizerque h um duplo fenmeno de repre-sentao: representao do lado dascoisas, e represen tao do lado da s pes-soas, e que precisamente isso o que

    chamo de d emocracia.

    Voc disse, no seminrio de PhilippeDescola, em novem bro de 2003, que preciso que o Ocidente mude o seucontraste com os outros para que ele

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    ENTREVISTA410

    possa, enfim, fazer uma oferta de paz.Os antroplogos teriam , assim , um pa-

    pel cen tral nessa m isso, e isso im plicaa definio da antropologia como di-

    plom acia. Voc pode ria falar um poucomais desse papel que o antroplogodev e assumir?

    J falam os um p ouco disso. A difere na q ue o diplomata n o possui princpiosupe rior comum , ele n o conta com u mrbitro indiscutvel acima dele prprio

    para definir as posies e os papis,porque seno no haveria gue rra e n ohaveria conversaes de paz, tampou-co necessida de de diplomatas. A diplo-macia a busca dessas condies co-mun s em am bos os lad os. Assim, esta a gran de d iferen a entre o antroplogocomo diplomata e o an troplogo comoerudito [savant]: o antroplogo savantren e e m seu escritrio, no Collge de

    France, o conjunto de culturas que soconvocadas, de certa maneira, semdramas seno o drama do conheci-mento e ele a s compa ra uma s com a soutras reunindo-as num quadro, aopasso que o antroplogo diplomata n odispe de um lugar particular para ex-por sua oferta de pa z, ele pode ser con-siderado a qualquer momento como

    um traidor, pois no possui um princ-pio sup erior comum a pa rtir do qu al po-deria arbitrar as diferentes posies.Ele n o sabe o que aceitvel para aspessoas que o enviam, as pessoas desua p rpria cultura, e tampouco o que aceitvel para os outros. Ento h u magrande diferena entre o antroplogosavante o a ntroplogo diploma ta. Mases te um tema de debate com meus

    eminentes colegas.

    Para alm de um problema antropol-gico, a diplomacia seria tambm umasoluo para o problema ocidental,m ode rno d a globalizao?

    Os mode rnos sero simplesmen te obri-gad os a pe nsar assim, porque eles noso mais os donos do mu ndo. Essa adiferena. Antes, eles no precisavamser d iploma tas. Antes, como d isse Slo-terdijk, todo mun do a chava formidvela globalizao, quando ns ramos osnicos a globalizar. Do sculo XVII aosculo XX, pensvam os que a globali-zao era tima. Era o mundo, era anaturalizao, era a modernizao.Agora, todo o mun do globa liza. Os Ka-

    yap globalizam, pois participam domercado m und ial com seus produtosO problema que os europeus agoraso obrigados a serem polidos, poiseles no so ma is os donos do mund o,e tm sorte de no m ais o serem. Elespodem retomar as questes da antro-pologia clssica e concluir: Agora n oestamos mais na situao de antrop-logos savants convocando o m und o to-

    do simplesmente porque temos o po-der indiscutvel de faz-lo em n ome d aNatureza; pois entramos em uma ta-refa diplomtica arriscada, a de dizeraos outros, aos brasileiros, por exem-plo: Eis o que ns, fran ceses ou eu ro-peus, pensamos que devemos defen-der como nossa definio de existn-cia, e se vocs nos tirarem isso, vocs

    brasileiros, ns morreremos. Isso ,portanto, muito interessante. Assim, odiplomata uma figura que me inte-ressa de mais, pois acredito que ele se-

    ja uma figura ma ldita. O diplomata otraidor. Ele uma figura mais forte emais antiga que a figura do savant.Havia d iplomatas bem antes de haversavants. O diplomata aquele que seenga ja e m q uestes sem saber a o cer-

    to em que coisas crer antes d e iniciadaa discusso. Assim, ele obrigado atrabalhar de ambos os lados, tanto odaqueles para quem ele trabalha, co-mo o daqueles a quem ele se enderea.Em uma antropologia diplomtica, so-

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    mos obrigados a nos engajar entre aqu mica, os ndios etc.

    O diplomata chega no final de u maguerra que esgotou a todos. Assim, preciso haver, antes de tudo, uma de-clarao de gue rra: primeiro a gu erra,de pois o esgotam en to; por fim, a d iplo-macia. O diplomata n o ap arece n o co-meo, mas no fim. Se n o h g uerra epartes dispostas a neg ociar, no h d i-plomata s. Estamos em u ma situao deguerra.

    M as o que exatam ente faze r no fim daguerra?

    Na maior parte das frentes, a guerraainda n o comeou. No houve de cla-rao de gu erra. Este um p onto mui-to importante, o que eu chamo deguerras pedaggicas. Na maior par-te dos casos, no h a inda g uerra, pois

    os modern os no faziam g ue rra, faziampedagogia. Assim, quando eles dizemsaber racional e saber irracional,no se trata de g uerra, mas de p edag o-gia. E aos irracionais dizem: No sua culpa, no estamos em gue rra con-tra vocs, ns gostamos muito de vo-cs, mas vocs so irraciona is e ns so-mos racionais. Isso no uma situa-

    o de guerra, e por qu? Porque su-pe-se qu e h aja um princpio supe riorcomum que define essas duas posi-es, racional e irraciona l. N o est e mdiscusso o que seja o racional e oirracional. Ao passo que quando sediz: para que haja guerra, precisohaver declarao de guerra, e nadade rbitros, ou de princpio superiorcomum. preciso dizer qu e a moderni-

    zao desapareceu, que o mononatu-ralismo desap areceu, e assim p or dian-te. Isso nos coloca muitas condies.Por isso, no apenas no estamos nofim da guerra, mas no chegamos se-qu er, em m uitos casos, de clara o de

    gue rra. Para a ma ior parte das pe ssoas,no estamos nem mesmo em guerra,estamos no d esenvolvimen to de t cni-cas que fazemos convergir para o m es-mo mercado mundial. O diplomata de fato a figura que chega depois queas pessoas j esto esgotadas pelaguerra, que as conversaes j come-aram, e que a s pessoas se perguntam:no fundo, no que acreditar?. E entoo diplomata refaz seu trabalho de re-definio de valores e diz: Penso que

    ns acreditamos nisso. E agora eu mevolto aos me us, e lhe s digo: Ns a cre-ditamos nisso. Voc est d e a cordo quens aceitemos isso para n o retomar agu erra? E a as pessoas pod em d izer:De m odo algum. Esse diplomata umtraidor! Fomos vend idos pelo diploma-ta por um p eda o de p o. Eu fiz essaexperincia. Fui aos cientistas euro-peus e lhes disse: No se defende a

    racionalidad e. O que se de ve defende rso os hbridos etc. Vocs esto deacordo? Eles no estavam mesmo deacordo! De fato, pod em os fracassa r nasrelaes diplomticas. Mas a diploma-cia algo muito interessante.

    N esse dom nio, o que pode m os pen sardos con flitos atuais en tre os pases oci-

    de ntais e os p ases islm icos?

    De qual guerra estamos falando? Tra-ta-se de uma guerra dos modernoscontra o arcasmo? No, eviden temen -te no. Trata-se de uma guerra entredois mode rnismos, dois fun da me nta lis-mos. No mais, h uma srie de assun-tos sobre os quais os antroplogos notm nada a dizer. Aqui eles deviam

    aprender com os islamlogos, e h al-guns excelentes. O que certo queno estamos diante de um conflito damodernizao contra o religioso, masde u m mode rnismo extremo, que u mfundamentalismo, e que se assemelha

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    muito ao nosso modernismo. Ficamossurpre sos com essa consta tao, pois omodernismo era timo qua ndo ram osns que o praticvamos, ou seja, qua n-do era indiscutvel, direto, quando nohavia med iao. O funda men talismo algo muito interessante. Ele u m m o-de rnismo. Mas ns, os modern os ns

    jamais fomos modernos! , ns sem-pre fizem os o contrrio. Assim, qua nd ovemos os verdadeiros modernis tasdiante de ns, ficamos horrorizados!

    No porque eles tenham barba e vis-ta m djellabas , mas porque esta aimagem que ns mesmos demos aomundo! Isso extraordinrio. comoum re torno. Semp re vimos a na tureza ea cincia de modo indiscutvel, cons-trumos laboratrios etc. Mas vende-mos o mode rnismo aos outros, aos pra-ticantes. Este o paradoxo. Agora, osoutros dizem: Mas ns tamb m somos

    modernos. Ah bom! Mas ento mo-derno significa o qu? Significa queas coisas so indiscutveis, que no hmediao, no h histria. E isso sermodernista! Recuo horrorizado doseuropeus, que exclamam: No, no isso, n o pode se r isso!. O fun da me n-talismo o modernismo amputado deseus hbridos, que agora se volta con-

    tra os mod ern os e os ate rroriza comrazo.

    Traduo de Rena to Sztutman

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    ENTREVISTA 413

    Notas

    1 No original, des choses qu i ont p ris chose en opposition lobjet. Latourusa o conceito de chose no duplo sentido arcaico de res ou ding , isto , de coisa-causa (causa jurdica ou p oltica) qu e remete [] a um assunto levantado e m u maassemblia, na q ual se trava discusso que exige um julgame nto passado em co-mum (Politiqu es de la nature, p. 351) [N.E.].

    2 Office de Recherche Scien tifique de s Territoires d Ou tre-Me r, atu al IRD Institut de Recherch e p our le Dveloppe me nt [N.E.].

    3 possvel que tenha havido aqui um lapso, e que Latour estivesse que ren-do dizer Assim, a a ntropologia continua o deb ate entre natu reza e cultura [N.E.].

    4 Entend a-se, a matriz ou a condio hum ana , o modo de n ossa esp cie ha -bitar o real a ve lha ma triz antropolgica, como a cha ma Latour em Jam ais fo-m os modernos [N.E.].

    5 Sinlogo e filsofo francs contemporneo, autor de importantes trabalhossobre diversos aspectos e figuras do pe nsame nto chins. Ver o ba lano de sua obrarecenteme nte pub licado em Pen ser dun Deh ors: la Chine (F. Ju llien e T. March ais-

    se, Paris: Seuil, 2001) [N.E.].

    6 Ver P. Sonigo e I. Sten ge rs, Lvolution . Paris: Edp Science s, 2003 [N.E.].

    7 Ver E. Fox Ke ller e L.L. Winsh ip, The Century of the G ene. Ca mbridge, MT:Harvard University Press, 2002 [N.E.].