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Organizadores: Rogério Drago Maria Hermínia Baião Passamai Gilda Cardoso de Araujo PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO Povos Territórios Movimentos Sociais Saberes da Terra Sustentabilidade Ministério da Educação Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade Universidade Aberta do Brasil Universidade Federal do Espírito Santo Programa de Pós-Graduação em Educação\UFES

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Organizadores:Rogério DragoMaria Hermínia Baião PassamaiGilda Cardoso de Araujo

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO

PovosTerritóriosMovimentos SociaisSaberes da TerraSustentabilidade

Ministério da EducaçãoSecretaria de Educação Continuada, Alfabetização e DiversidadeUniversidade Aberta do BrasilUniversidade Federal do Espírito SantoPrograma de Pós-Graduação em Educação\UFES

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Presidente da RepúblicaLuiz Inácio Lula da Silva

Ministro da EducaçãoFernando Haddad

Secretário de Educação Continuada, Alfabetização e DiversidadeAndré Lázaro

Educação do Campo da SECAD/MECCoordenador GeralWanessa Zavarese Sechim

Universidade Aberta do BrasilCoordenador GeralCelso Costa

Universidade Federal do Espírito SantoReitorRubens Sérgio Rasseli

Coordenação da UAB/UFESMaria José Campos Rodrigues

Centro de Educação/UFESDiretoraMaria Aparecida Santos Correia Barreto

Programa de Pós-Graduação em Educação/UFESCoordenadoraDenise Meyrelles de Jesus

Programa de Educação do Campo/UFESCoordenadorErineu Foerste

Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)

P964 Projeto político pedagógico da educação do campo / organizadores, Rogério Drago, Maria Hermínia Baião Passamai, Gilda Cardoso de Araujo; colaboradores, Paulo da Silva Rodrigues, Marcelo Lima - Vitória, ES : UFES, Programa de Pós-Graduação em Educação, 2010.192 p. : il.

Inclui bibliografia. ISBN: 978-85-60050-26-0 1. Educação rural. 2. Democratização da educação. 3. Escolas rurais. 4. Ensino. 5. Aprendizagem. I. Drago Róge-rio, 1971 - II. Passamai, Maria Hermínia Baião, 1951 - . III. Araujo, Gilda Cardoso de, 1967 -.

CDU: 37.018.51

Os autores são responsáveis pelas opiniões expressas nos respectivos textos, que não são necessariamenteas do Ministério da Educação.

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PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO

PovosTerritórios

Movimentos SociaisSaberes da TerraSustentabilidade

Organizadores:Rogério Drago

Maria Hermínia Baião PassamaiGilda Cardoso de Araujo

Colaboradores:Paulo da Silva Rodrigues

Marcelo Lima

Vitória\ES - 2010

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© 2010. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação (SECAD/MEC)

Universidades parceirasUniversidade Federal de Alagoas – UFALUniversidade Federal do Espírito Santo - UFESUniversidade de Montes Claros - UNIMONTESUniversidade Estadual do Maranhão – UEMAUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMSUniversidade Federal do Paraná – UFPRInstituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará - IFPA

Coordenação Editorial – SECAD/MECMaria Adelaide Santana Chamusca

Conselho Editorial de Educação do Campo – SECAD/MECCezar Nonato Bezerra Candeias - UFALEdmílson Cezar Paglia – UFPRErineu Foerste – UFESIcléia A. de Vargas – UFMS

Equipe de Apoio – SECAD/MECDivina Lúcia BastosEliete Ávila Wolff

Equipe de Apoio – UFESAdriana Vieira Guedes HartwigAndressa Dias KoehlerArlete Maria Pinheiro SchubertAryaednyr Polmartney Lima Ferreira Borges MacêdoChristiano Athayde de OliveiraCláudio David CariJaninha Gerke de JesusJorcy F. JacobJosimara PezzinMaria PeresMarli da Penha Vieira Gomes dos SantosOzirlei Teresa MarcilinoRachel Curto Machado MoreiraRogério Omar Calliari

RevisãoElida Maria Fiorot Costalonga

Projeto Gráfico e DiagramaçãoLeandro Macêdo

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SUMÁRIOUnidade I

Projeto Pedagógico e sua Articulação com o Processo de Ensino e de Aprendizagem Integrado à Comunidade: Parcerias Possíveis ......................................... 11

Autora: Maria Hermínia Baião Passamai

Unidade II

Escolas em Comunidades Campesinas: especificidades na construção do Projeto Político Pedagógico nas diferentes áreas do saber .................................................... 45

Autora: Gilda Cardoso de Araujo

Unidade III

O Projeto Político Pedagógico como articulador do trabalho da comunidade escolar: interculturalidade, interdisciplinaridade e campesinato ......................................... 87

Autores: Rogério Drago e Paulo da Silva Rodrigues

Planejamento Educacional: em busca de uma abordagem sistêmica e regional ........... 108

Autor: Marcelo Lima

Apêndices

A construção do Projeto Político Pedagógico numa escola de Vitória-ES: relatos de um processoI ....................................................................................................................... 113

Pensando o Projeto Político Pedagógico: alguns passos necessários para a caracterização de seus sujeitos ...................................................................................................... 129

Refletindo sobre os fundamentos e concepções sócio-psico- educacionais no contexto do projeto político pedagógico ............................................................................... 134

Projeto Político Pedagógico: reflexões para a construção de uma escola participativa ................................................................................................................................ 141

Planejamento Educacional: em busca de uma abordagem sistêmica e regional ............................................................................................................................... 150

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Caros cursistas!

Neste caderno intitulado “Projeto Político Pedagógico da Educação do Campo” tra-zemos ao debate aspectos relacionados ao desenvolvimento, proposição, implementação, execução e avaliação do projeto político pedagógico como articulador e organizador das ações educacionais e voltada para o resgate e valorização dos atores da comunidade educa-tiva como sujeitos de direito e co-autores do processo sócio-educativo, tanto no contexto da educação do campo como no contexto da educação de modo geral, uma vez que tal debate pode (e deve) fazer parte do cenário educacional em todas as esferas.

O Projeto Político Pedagógico é um exercício concreto, efetivo e, por vezes, doloroso, pois envolve uma série de ações que culminam com uma visão democrática de educação. Essa dimensão democrática, que achamos ser fácil de implementar, é algo que envolve muitas vezes, o deixar de lado valores e interesses pessoais em prol do bem estar da comu-nidade local e escolar. No projeto e no processo democratizador da educação se experimen-tam as satisfações de consensos – ou mesmo debates – construídos coletivamente a partir da convivência com as diferenças e das produções advindas da diversidade que compõe o cotidiano educacional.

Nesse contexto idiossincrático, experimentam-se sensações que por vezes nos inco-modam: dores das intolerâncias, muitos descomprometimentos, individualismo, relações de poder, medo de perder poderes adquiridos – ou tomados, das dificuldades em se des-construir práticas cristalizadas e compartimentalizadas, dentre uma série de outros fatores que podem emperrar a construção de uma escola democrática e o reconhecimento de seus sujeitos como dotados de voz, saber e conhecimento que precisa ser valorizado.

O projeto político pedagógico que reconhece seus sujeitos como co-autores da dinâ-mica educativa tem como pressuposto o fato de que seu cotidiano é um cotidiano marcado pela autonomia, pela possibilidade de resgatar suas culturas, suas interculturas, a alegria do espaço escolar, resgatando a unidade que é própria da gênese do processo educativo em toda a sua amplitude.

Nesse contexto, esse caderno traz em sua primeira Unidade o texto da professora Ma-ria Hermínia Baião Passamai intitulado “Projeto pedagógico e sua articulação com o proces-so de ensino e de aprendizagem integrado à comunidade: parcerias possíveis”. Nesse texto a autora traz de modo sucinto, objetivo e coerente os aspectos considerados imprescindíveis à proposição do projeto político pedagógico em associação com o processo ensino apren-dizagem no contexto da comunidade campesina.

Na Unidade II, a professora Gilda Cardoso de Araujo nos brinda com o debate acerca da temática “Escolas em Comunidades Campesinas: especificidades na construção do proje-to político-pedagógico nas diferentes áreas do saber”. Nesse debate Gilda destaca que a te-mática desse módulo tem o desafio de discutir e articular conceitos importantes para aten-der as especificidades das escolas em comunidades campesinas. Para tanto, destaca que não bastaria realizar uma discussão técnica ou política sobre o significado e a construção do projeto político-pedagógico, mas traz à tona conceitos/abordagens relativas ao significado do planejamento, sua articulação com o conceito de trabalho em geral, bem como com os pressupostos do trabalho pedagógico nas escolas.

Por fim, na Unidade III, temos os textos intitulados “Interculturalidade, interdiscipli-

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naridade e campesinato: o projeto político pedagógico como articulador do trabalho na comunidade escolar” elaborado pelos professores Rogério Drago e Paulo da Silva Rodrigues; e o texto de Marcelo Lima focando o “Planejamento educacional: em busca de uma aborda-gem sistêmica e regional”.

A temática abordada pelo texto de Drago e Rodrigues busca mostrar a importância de se estabelecer um debate integrado e indissociável entre os elementos interculturalidade, interdisciplinaridade e campesinato para o estabelecimento de um projeto político peda-gógico voltado para a articulação da comunidade escolar como um espaço de reconheci-mento e valorização das diferenças, ao mesmo tempo em que usa essa diferença cultural e disciplinar como mola propulsora para um processo educativo inovador e ‘possibilitador’ de outra lógica escolar. Lógica, esta, que tem como princípio básico o fato de que educandos, educadores e demais membros da comunidade escolar tenham suas subjetividades valori-zadas para a produção, democratização e promoção de um conhecimento que seja produto social ao alcance de todos esses sujeitos.

Já o texto de Lima, traz um debate que pode e deve ser aprofundado a partir do texto contido neste caderno impresso e no CD-ROM que acompanha este fascículo, pois propor-ciona entender aspectos que vão além da definição dos objetivos educacionais, mostrando, dentre outras coisas que o Estado precisa prever e prover uma série de instrumentos, equi-pamentos e meios para se atingir os fins da educação, ganhando destaque o planejamento educacional por meio do qual pode-se antecipar no tempo ao nível de um plano não só o que fazer, mas o como, isto é os instrumentos, as varáveis intervenientes, os caminhos inter-mediários necessários de se percorrer para resolver problemas inerentes à oferta do serviço público educativo à população.

Em fim, que as discussões aqui tratadas possam contribuir para o aprimoramento da ação pedagógica no contexto da educação do campo de modo articulado, dialético e in-tegrando sujeitos e educação na construção de uma escola de qualidade que promova o acesso com sucesso aos bens culturais e sociais e históricos construídos pela humanidade.

Os Organizadores

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Unidade I

Projeto-pedagógico como articulador do trabalho na escola (o ensino e a aprendizagem) e

de integração entre a comunidade e a escola. Como pensar parcerias?

Meu Sonho (Cecília Meireles)

Parei as águas do meu sonhopara teu rosto se mirar.

Mas só a sombra dos meus olhosficou por cima, a procurar...Os pássaros da madrugada

não têm coragem de cantar,vendo o meu sonho interminável

e a esperança do meu olhar.Procurei-te em vão pela terra,

perto do céu, por sobre o mar.Se não chegas nem pelo sonho, por que insisto em te imaginar?

Quando vierem fechar meus olhos,talvez não se deixem fechar.

Talvez pensem que o tempo volta, e que vens, se o tempo voltar.

Maria Hermínia Baião Passamai

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Unidade I: Projeto Pedagógico e sua Articulação com o Processo de Ensino ede Aprendizagem Integrado à Comunidade: Parcerias Possíveis

UNIDADE I

Projeto Pedagógico e sua Articulação com o Processo de Ensino e de Aprendizagem Integrado à Comunidade:

Parcerias Possíveis

Maria Hermínia Baião Passamai1

Objetivo da Unidade

Discutir a integração indispensável entre o projeto pedagógi-co escolar, o processo de ensino e de aprendizagem e a integração necessária com a comunidade onde a escola se insere.

Atividade 1

Leia todo o texto anotando suas dúvidas, aspectos que consi-dera relevantes, conceitos básicos, palavras-chave, etc.

Obs.: Fique atento, pois, durante a exposição do texto, você será requisitado a realizar exercícios/outras atividades.

Vamos iniciar falando um pouco sobre o projeto pedagógico e como ele está inserido no Projeto Político-Pedagógico Escolar (PPP), documento no qual devem convergir e estar consubstanciadas as decisões de todos os participantes da comunidade escolar.

Esse documento, fruto das reflexões, das proposições, dos ca-minhos e das práticas, encontros e desencontros, enfim, das opções coletivas, torna-se, a estampa mais real do perfil da instituição escolar.

Visto dessa forma, o PPP é um documento dinâmico, fruto de um processo global, em permanente construção. Assim, os funda-mentos ideológico, moral, filosófico, cultural, ético, metodológico, relacional dos conteúdos a serem ensinados e aprendidos, a relação teoria e prática, dentre outros, devem estar postos no PPP como fruto de uma reflexão e investigação compartilhada e comprometida com a autonomia, com o debate das diferenças, com o respeito à democra-cia e, sobretudo, com a formação de cidadãos críticos e conscientes.

Como afirma Veiga,

[...] é mediante observação e análise que se caracteri-zam por um contato direto [...] com a situação [...] que

1 Professora Adjunto II do Departamento de Teorias do Ensino e Práticas Educacionais da UFES. Douto-randa em Educação pela UNICAMP.

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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vão ocorrendo ao longo de um tempo, no dia-a-dia da escola, os profissionais, do seu cotidiano, observam o que ocorre, ouvem o que é dito, lêem o que é escrito, levantam questões [...] e registram tudo. Documentam o não documentado, procurando entender como ocor-rem no interior da escola e das salas de aula as relações pedagógicas. Como é concebido, executado e avaliado o currículo escolar, quais atitudes, valores e crenças são perseguidos, quais as formas de organização do traba-lho pedagógico. Tais dados servem para classificar as questões prioritárias e propor alternativas de solu-ção (grifo nosso, Veiga, 1998, p.10).

Para melhor apreender o intricado conjunto de interações e das relações no interior da escola, entendendo, de forma mais por-menorizada, os jogos de poder, as lideranças, positivas ou negativas, declaradas ou não, os papéis desempenhados pelos atores da dinâ-mica escolar, há necessidade de amplificar vozes, visão, audição, ca-pacidade de análise, de síntese, de discussão.

Pausa para reflexão e autocrítica• Qual a ideologia abraçada pela escola em que você trabalha?• Essa ideologia é clara? Ou está subjacente a determinadas ações do

dia a dia? Que ações demonstram indícios ideológicos?• Há fundamentos filosóficos claramente explicitados? Quais são eles?• Os fundamentos culturais estão determinados nos documentos esco-

lares? Quais são?• Os fundamentos têm relevância ou destaque na rotina escolar? Onde

e como são evidenciados?

Então, é imprescindível um esforço coletivo que implique sele-ção de valores a serem consolidados, um esforço conjunto de busca e identificação dos pressupostos teóricos e metodológicos que sejam postulados por toda a escola e reflitam as aspirações das famílias e da comunidade na qual a escola se insere. Está implícito aí o significado de comunidade em que seus membros compartilham preocupação ou interesse mútuos sobre um objetivo comum.

Daí ser necessária uma consistente análise do contexto exter-no, ou seja, o estudo do meio no qual a instituição existe, além das interações e relações existentes entre a escola e a comunidade em geral. Essa análise pressupõe a identificação dos principais atores que mantêm interação com a escola; a análise das influências das di-mensões geográficas, históricas, políticas, culturais e econômicas.

Em sociedades rurais, há fatores que facilitam a identificação das características da escola, tais como: o relacionamento mais es-treito dos membros da comunidade, a interdependência em assun-tos e problemas comunitários, entre outros, mas há fatores que po-dem dificultar essa identificação, por exemplo, a distância geográfica entre o agrupamento.

Desse modo, a construção do PPP da escola não pode prescin-dir de etapas avaliativas que permitam concatenar os aspectos con-

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ceituais de sua concepção com os aspectos práticos de sua execução. Tais aspectos têm que ter sua base assentada em uma gestão parti-cipativa, no conhecimento histórico da instituição e de sua relevân-cia social para o grupo como um todo. Nas sociedades rurais, pelo compartilhamento mútuo de interesses, preocupações, intenções etc., há, possivelmente, maiores chances de participação nos objeti-vos comuns, nas destinações que são dadas às decisões em nível de importância para a comunidade em geral.

Assim, o projeto político-pedagógico de uma instituição esco-lar é um documento delineado, discutido e assumido coletivamente, que explicita fundamentos teórico-metodológicos, os objetivos, os tipos e formas de organização escolar, as possibilidades de implementação das bases organizativas, o processo de seleção e avaliação do conteúdo da ação educativa.

Conforme Veiga,

[...] a primeira ação que [...] parece fundamental para nor-tear a organização do trabalho da escola é a construção do projeto político- pedagógico assentado na concep-ção de sociedade, educação e escola que vise à emanci-pação humana. Ao ser claramente delineado, discutido e assumido coletivamente ele se constitui como processo. E, ao se constituir como processo, o projeto político- pe-dagógico reforça o trabalho integrado e organizado da equipe escolar, enaltecendo a sua função primordial de coordenar a ação educativa da escola para que ela atinja seu objetivo político pedagógico. (Veiga, 1996, p.157).

No caso das escolas do meio rural, isso se torna mais imprescin-dível ainda, visto que essas escolas costumam constituir-se em uni-dades isoladas, diferentes das redes escolares de um município. Por exemplo, mesmo que seja bem pequeno e precário, esse território possui sede, escolas no entorno dessa sede além de Secretaria res-ponsável pela educação.

Portanto, ao se focar a coordenação do processo de seleção e avaliação do conteúdo da ação educativa, será necessário que a equipe tenha claro em que consiste e como acontece o processo de ensino e de aprendizagem, Pois, conforme preceitos legais da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), Lei nº 9.394/96, corroborados por Veiga, é preciso se ter claro que

[...] proposta pedagógica ou projeto político-pedagógi-co relaciona-se à organização do trabalho pedagógico da escola; o plano de trabalho está ligado à organização da sala de aula e a outras atividades pedagógicas e ad-ministrativas. Isso significa que o plano de trabalho é o detalhamento da proposta ou projeto. (Art.13). Por-tanto, compete aos docentes, à equipe técnica (supervi-sor, coordenador pedagógico, diretor, orientador educa-cional) e aos funcionários elaborar e cumprir o seu plano de trabalho, também conhecido por plano de ensino e plano de atividades. É por esse caminho que vamos construindo o planejamento participativo e a estratégia de ação da escola (VEIGA, 1998, p.12, grifo nosso).

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Mas, para se construir um verdadeiro PPP, que englobe a real participação de todos os elementos envolvidos na ação educativa, necessário se faz ter certos critérios para sua construção. Vasconcellos (1999, p.182) diz que a primeira etapa da construção do PPP é o esta-belecimento do marco referencial, que pode ser entendido como

[...] a tomada de posição da instituição que planeja em relação à sua identidade, visão de mundo, utopia, valo-res, objetivos, compromissos. Expressa o ‘rumo’, o hori-zonte, a direção que a instituição escolheu, fundamenta-do em elementos teóricos da filosofia, das ciências, da fé. Implica, portanto, opção e fundamentação.

Pelo exposto, depreende-se que o marco referencial é a locali-zação da escola em sua visão de homem, de mundo e de sociedade. É também um modo de se ter parâmetros e critérios para a realização de uma etapa importantíssima na elaboração do PPP: o diagnóstico.

Esse mesmo autor divide o marco referencial em três partes: marco situacional (onde se está e como se vê a realidade); marco doutrinal ou filosófico (para onde se quer ir); e marco operativo (quais horizontes se quer para a ação).

Vamos delinear de modo breve cada uma dessas partes e in-dicar em qual delas precisamos estar mais atentos às questões re-lacionadas com o ensino e a aprendizagem e às possibilidades de parcerias que permitam o alcance dos ideais propostos.

Como um maior detalhamento é possível esclarecer dúvidas quanto a cada uma dessas partes.

Marco Situacional:“O Marco Situacional é um olhar do grupo que planeja sobre a

realidade em geral: como a vê, quais seus traços mais marcantes, os sinais de vida e de morte” (VASCONCELLOS 1999, p.182). É um pro-cesso macroanalítico, ou seja, busca ver a realidade na qual a escola se insere. Busca os elementos estruturais da realidade. O citado au-tor apontou uma sugestão de questões para trabalhar o marco situ-acional, tais como: [...] como compreendemos / vemos / sentimos o mundo atual? Quais são os sinais de vida? E de morte? Quais são as causas?” (p.183)

Marco Doutrinal:

O Marco Doutrinal (ou Filosófico) corresponde à dire-ção, ao horizonte maior, ao ideal geral da instituição (realidade global desejada). É a proposta de socieda-de, pessoa e educação que o grupo assume [...] são expressas as grandes opções do grupo (utopia fim). Contém os critérios gerais de orientação da instituição. (VASCONCELLOS, 1999, p.183).

Tipos de questões para a elaboração do Marco Doutrinal: qual é o tipo de sociedade que se quer construir? Que tipo de homem / pessoa humana se quer formar? Qual a finalidade que se quer para a escola?

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Que papel se deseja que a escola tenha na realidade onde se insere?Marco Operativo: “O Marco Operativo expressa o ideal especí-

fico da instituição. É a proposta dos critérios de ação para os diversos aspectos relevantes da instituição, tendo em vista aquilo que quere-mos ou devemos ser (utopia meio)” (VASCONCELLOS, 1999, p.183). Nessa fase, salienta o mesmo autor, deve-se ter o especial cuidado de articular o Marco Operativo com os demais marcos já estabelecidos e não confundi-lo com programação, que só deverá se efetivar após o estabelecimento do diagnóstico. Essa é a fase de “[...] uma tomada de posição quanto aos grandes princípios de organização da instituição [...]” (p.184).

Para Vasconcellos, é muito importante a opção por questões, pois isso dará uma melhor repercussão metodológica no momento de elaboração do diagnóstico e da programação, que terão como base os destaques elencados no Marco Operativo. Essas questões devem ter por base aspectos bem fundamentais da vida escolar, es-pecialmente em três grandes dimensões, quais sejam: dimensão pe-dagógica, comunitária e administrativa.

E aí, ao buscar o estabelecimento conceitual dessas três dimen-sões é necessário ter entendimento básico dos processos de apren-der e de ensinar a fim de indicar o quê, o como, os porquês, os para que do ensinar e do aprender em determinada escola, pois

Desde que a docência moderna existe, ela se realiza numa escola, ou seja, num lugar organizado, espacial e socialmente separado dos outros espaços da vida social e cotidiana. Ora, a escola possui algumas características organizacionais e sociais que influenciam o trabalho dos agentes escolares [...]. Esse lugar também é produto de convenções sociais e históricas que se traduzem em ro-tinas organizacionais relativamente estáveis através do tempo (TARDIF; LESSARD, 2007, p 55)

Respostas a como se deseja o processo de planejamento, o cur-rículo, os objetivos, a metodologia, a avaliação, a relação professor – aluno, a disciplina, a constância das reuniões pedagógicas estão cir-cunscritas à dimensão pedagógica. Por outro lado, estabelecer como se desejam os relacionamentos na escola, que tipo de professor é mais adequado àquela realidade, como será a relação com a família e com a comunidade; os tipos de participação e organização dos alu-nos, o enfoque que será dado às atividades esportivas e culturais, as relações com o mundo do trabalho e com os meios de comunicação, tudo isso diz respeito à dimensão comunitária. Finalmente, como se deseja a estrutura e a organização da escola, quem e como serão seus dirigentes, a equipe de serviços, as condições objetivas de trabalho; a obtenção e o gerenciamento dos recursos financeiros dizem respeito à dimensão administrativa.

Até aqui trabalhamos para mostrar onde se inserem as ques-tões do ensinar e do aprender no plano global da escola, quando ela-borado como propõe os preceitos legais, de modo a dar característi-cas próprias a cada instituição escolar.

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Atividade 2

Como está o PPP da escola onde você trabalha?• Existe um documento pronto que seja do conhecimento de toda a

comunidade escolar?• Se há, quais aspectos acredita que precisam ser alterados? Por quê?• Relate que propostas você faria para melhorar o documento?• Caso não exista o PPP na escola, que proposta faria para dar início

à elaboração do documento?• Quem você chamaria para compor o grupo de elaboração do PPP?• Que análise você faz da situação atual da escola?

Atividade 3

• Discuta as questões acima com seu grupo de estudo.

Atividade 4

• Leia o texto assinalando os aspectos que considera importantes, os conceitos básicos, as palavras-chave, os termos que desconhece.

• Analise as contribuições da ciência moderna, especialmente a neu-rociência, na explicação do processo de aprendizagem.

• Faça pequenos resumos ou esquemas conceituais que lhe permi-tam discutir posteriormente com o grupo suas dúvidas, análises e opiniões.

• Elabore, com o grupo, um texto que reflita as discussões que tive-ram sobre o assunto para posterior avaliação.

Os processos de aprender e de ensinar

Por que vamos iniciar pelo aprender? Simplesmente porque ele é o princípio. Se não há quem aprender, não haverá quem precise ensinar. Está aí a importância que tem esse verbo para nós, professo-res. Precisamos entendê-lo muito bem para fazermos nosso trabalho cada vez melhor.

O processo de aprendizagem

Para os profissionais que lidam com as questões da escola, é de extrema importância conhecer como os alunos aprendem. Somente compreendendo como os humanos aprendem é que os professores podem desenvolver todo o instrumental necessário a promover uma real aprendizagem. Mas, por que se diz que é um processo? Porque um processo supõe uma ação continuada, prolongada de alguma atividade. No caso da aprendizagem, esse processo é mental, portan-

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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to intrínseco (acontece no interior do indivíduo) e tem que considerar aspectos individuais, entre outros, como: inteligência, capacidades, aptidões, interesses, necessidades, ritmos. São, portanto, aspectos biológicos, emocionais e sociais, que compõem o indivíduo em sua totalidade, que estarão envolvidos no processo de aprender.

Para ficar mais claro, vamos detalhar um pouco mais? A começar pelos aspectos biológicos. Para se entender melhor o que é esse pro-cesso mental, estudiosos dessa questão dissecaram-no (o processo) e indicaram que ele pode ser anatomicamente analisado em cinco etapas:

1ª) Despertar da atençãoNesta primeira fase, quem ensina busca formas de despertar

o interesse, de atrair a atenção do aprendente por meio de artifícios variados, como cartazes, filmes, anúncios, discursos, gestos, imagens, figuras, modelos etc. Se os instrumentos utilizados forem suficientes para despertar a curiosidade e o interesse do aluno, sua atenção será aguçada para receber os conteúdos informativos.

2ª) Recepção de conteúdos informativosEsses conteúdos devem ser interessantes o bastante para não

só atrair, mas também manter as expectativas de quem aprende. Caso sejam desinteressantes, incompreensíveis, se forem excessivos, insuficientes ou inadequados, o processo é imediatamente interrom-pido; caso contrário, a atenção será mantida.

3ª) Sistematização dos dadosNeste estágio, há toda uma ebulição cerebral na qual se faz

um tratamento sistemático dos dados, conteúdos e informações de modo a comparar antigas aprendizagens, fatos já conhecidos, domi-nados e compreendidos com os novos dados que estão sendo en-sinados. É o momento mais crítico do processo, quando o cérebro trabalha fazendo as relações entre as antigas e as novas informações.

Esse estágio de assimilação de novos conteúdos e de confron-tação com conhecimentos já assimilados fica evidente, quando ob-servamos pessoas estudando: elas, frequentemente, param de ler, tiram os olhos do texto a fim de facilitar as conexões cerebrais na busca de associações. É uma maneira de facilitar o mecanismo de sis-tematização dos dados ou, ainda, quando percebe que conexões são feitas tempo após o término do fluxo de informações, o que com-prova que o cérebro continua processando os conteúdos e fazendo novas relações.

4ª) Entendimento ou conclusõesNesta fase, o cérebro busca as relações significativas – o todo

construído pelas partes – chamado de gestalts. Quando essas rela-ções se tornam óbvias, há, frequentemente, a emissão de sinais ver-bais de insight: Ah! Hum! Os estudiosos indicam que esse é o instante do nascimento da aprendizagem dos conteúdos que estão sendo ensinados.

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5ª) UtilizaçãoA aquisição de conhecimentos novos traz satisfação, prazer

ao aprendente, daí, como consequência, a vontade de utilizá-los, de aplicar as novas informações, gerando com isso outras possibilidades de aprendizagem (Gráfico 1).

Gráfico 1- Processo de aprendizagemFonte: Maria Herminia B. Passamai (2010)

Por ser um processo complexo, a aprendizagem envolve aspec-tos biológicos, emocionais e sociais. Vamos discutir um pouco cada um desses aspectos para que fique bem esclarecido. Vamos lá.

Aspectos biológicosToda essa atividade cerebral é explicada pela Neurociência,2

cuja contribuição vem esclarecendo como e o que acontece no cé-rebro humano em contato com novas informações, com seu proces-samento, sistematização e armazenagem de novos dados, conexões com antigas aprendizagens e posteriores aplicações possíveis.

Ao dissecarem a anatomia cerebral, os cientistas identificaram sua plasticidade,3 sua constituição física estrutural – o cérebro é for-mado por mais de 100 bilhões de neurônios4 (Gravura 1) que podem gerar quadrilhões de contatos chamados sinapses.5

Gravura 1 – Diagrama de um neurônioFonte: MACHADO, Ângelo (1998, p. 18)

2 Área da Medicina que se dedica ao estudo do sistema nervoso.3 Capacidade que tem o cérebro de modificar sua anatomia, sempre que estimulado adequadamente.4 Unidade básica do sistema nervoso, composto de corpo celular, dendritos e axônio.5 Sinapses – transmissão de impulsos nervosos de uma célula (neurônio) para outra.

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Figura 1: SinapseFonte: Revista Nova Escola (Jan./ Fev. 2005).

Como se pode visualizar no desenho do neurônio ( Figura 1), há uma área onde os dendritos de um neurônio se encontram com o axônio de outra célula nervosa formando o que se denomina de área sináptica,6 produzindo os impulsos nervosos. Os neurotransmis-sores, como facilitadores das conexões, promovem, de acordo com as informações recebidas, sinapses em cadeia, formando redes entre os neurônios que armazenam as informações, como num bem orga-nizado arquivo.

Desse modo,

[...] uma das funções mais importantes do sistema ner-voso é o processamento da informação que chega a ele, de modo que ocorram respostas mentais e motoras apropriadas. Mais de 99% de todas as informações sen-soriais são descartadas pelo cérebro como irrelevantes e sem importância. Por exemplo, geralmente, nós não temos consciência das partes do corpo que estão em contato com as nossas roupas, bem como da pressão do assento quanto estamos sentados. Do mesmo modo, nossa atenção só é despertada por objeto ocasional em nosso campo de visão, e mesmo o ruído perpétuo do ambiente é, usualmente, relegado ao subconsciente (GUYTON; HALL, 2002, p. 479, grifos nossos).

Como viram, o despertar da atenção tem um papel extrema-mente importante na aprendizagem escolar. É por esse motivo que buscamos motivar nossos alunos de modo sempre inovador ou inu-sitado. “Prender” sua atenção inicial e mantê-la é fator determinante nos demais passos do processo de sua aprendizagem.

Quando informação sensorial importante excita a mente, ela é imediatamente canalizada para re-giões integradoras e motoras apropriadas do cé-rebro, para causar as respostas desejadas. Essa canalização e processamento da informação são cha-mados de função integradora do sistema nervoso(GUYTON; HALL, 2002, p. 480, grifos nossos).

6 Não há contato físico entre um neurônio e outro. A ligação é efetuada por elementos químicos (sódio, potássio, cálcio), os neurotransmissores.

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A maior parte das informações sensoriais é armazenada para uso futuro nos processos de pensamento (Figura 2). “O armazena-mento da informação é o processo a que chamamos memória, e esta, também, é função das sinapses” (GUYTON; HALL, 2002, p. 480, grifo do autor).

Segundo os citados autores, sabe-se ainda muito pouco sobre a precisão dos mecanismos de facilitação das sinapses no processo de memória, mas, uma vez armazenadas no sistema nervoso, as me-mórias passam a fazer parte dos mecanismos do processamento ce-rebral.

Os processos de pensamento do cérebro comparam as novas experiências sensoriais com as memórias armaze-nadas; as memórias, então, ajudam a selecionar a infor-mação nova importante e a canalizá-la para as áreas de armazenamento apropriadas, para uso futuro, ou para áreas motoras, para causar respostas corporais imedia-tas (GUYTON; HALL, 2002, p. 480).

Cremos que já exploramos o suficiente para entendermos as questões biológicas/físicas do processo de aprender. E as emocio-nais? Vamos a elas!

Figura 2: Zoneamento cerebralFonte: Revista Escola ( jan./fev. de 2005).

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Aspectos emocionais

Nos dicionários, a palavra emoção tem, entre outros significa-dos, o de uma “[...] reação orgânica de intensidade e duração vari-áveis, geralmente acompanhada de alterações respiratórias, circula-tórias etc. e de grande excitação mental” (HOUAISS, 2001, p. 1122). Ou “[...] reação intensa e breve do organismo a um lance inesperado, a qual se acompanha dum estado afetivo de conotação penosa ou agradável” (AURÉLIO, 1986, p. 634-635).

Já os neurologistas costumam definir as emoções como um complexo conjunto de reações neurais e químicas que provocam alterações musculares, na cor da pele, no sistema respiratório e car-díaco acionadas pelo sistema límbico.7 Esse sistema cerebral tem um componente importante chamado hipotálamo,8 com suas estruturas associadas – tálamo, hipocampo e amígdala (Figura 3 ) – que estão relacionadas diretamente com o processamento das emoções, for-mando circuitos neuronais, com suas consequentes sinapses. Quan-do ocorrem essas sinapses, acontece também a liberação de neuro-transmissores (lembram-se daquelas substâncias químicas a que já nos referimos?). Entre essas substâncias, está a noradrenalina9 que, distribuída pelo cérebro (mais intensamente no hipocampo), favore-ce o processamento das informações, descartando aquelas conside-radas pouco importantes e armazenando as destacadas como rele-vantes, que podem se transformar em memórias de longo prazo.

Figura 3 – Partes do cérebro responsáveis pelas emoçõesFonte: Revista Nova Escola (jan./fev. de 2005).

7 “Circuito neuronal que controla o comportamento emocional e os impulsos motivacionais” (GUYTON; HALL, 2002, p. 635).8 “Parte do diencéfalo situada na base do cérebro, onde se encontram numerosos centros do sistema nervoso simpático e parassimpático (reguladores do sono, do apetite, da temperatura corporal, etc.)” (HOUAISS, 2001, p. 1540).9 Neurotransmissor químico liberado pelas fibras nervosas simpáticas, precursor da adrenalina na parte interna das suprarenais.

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Essas memórias são bases para novas e futuras aprendizagens, facilitando a relação das informações atuais (do momento da apren-dizagem) com outras já assentadas e “arquivadas”. E as emoções? Al-gumas delas favorecem a concentração da atenção, como se abris-sem as portas sensoriais para as novas informações ou conteúdos: a alegria, o humor, a surpresa, situações instigantes, a curiosidade etc. que provocam uma descarga de noradrenalina que, em última instância, promove a decisão do indivíduo de ficar atento e concen-trado. Por outro lado, não podemos esquecer que a ameaça, o medo, a angústia, a ansiedade são também emoções só que funcionam às avessas, no caso da aprendizagem, pois as substâncias químicas que são emitidas atuam no hipocampo (mais especificamente nas amíg-dalas), impedindo a formação das memórias episódicas (que guar-dam fatos, eventos, pessoas, lugares).

As situações de estresse muito prolongadas podem danificar os neurônios e bloquear a aprendizagem com as consequentes baixas de autoestima e outros sentimentos de incapacidade. Essa situação, frequentemente, cria um círculo vicioso que, às vezes, torna-se difí-cil de romper, mas nós, professores, podemos propiciar experiências diversificadas, aliadas às boas emoções, por meio da construção de imagens mentais que ativarão as regiões do cérebro e ajudarão a me-mória a lembrar fatos, palavras ou conceitos, rompendo a sensação de medo, angústia ou ansiedade. Portanto, vamos estimular a alegria e o prazer e, com essas boas emoções, provocar ou associar emoções ao ato de aprender.

Aspectos sociais

Sem querer ficar no lugar comum, não custa reafirmar a ne-cessidade humana de viver em comunidade. Talvez o homem seja o único animal que, ao nascer, exige cuidados de outrem, sem os quais não sobreviveria sequer fisicamente. Essa necessidade gregária pro-move, evidentemente, situações de aprendizagem e são essas opor-tunidades que nos interessam no momento.

Embora haja correntes que ignorem ou dão pouca importância aos aspectos sociais do desenvolvimento humano, é inegável o forte apelo da visão sociointeracionista nas teorias de aprendizagem vi-gentes na escola de hoje.

Vamos detalhar um pouco mais a questão? Os estudos referen-tes ao desenvolvimento humano enfocam, linearmente, as etapas da idade cronológica e as capacidades cognoscentes de cada uma de-las. Um exemplo claro dessa afirmativa se encontra nas teorias de Pia-get e Wallon, consideradas como “[...] as mais completas e articuladas teorias genéticas do desenvolvimento psicológico [...]”, (OLIVEIRA, 1997, p. 56), oferecendo-nos uma interpretação completa do percur-so psicológico do ser humano.

Por outro lado, Vygotsky enfatiza, em seus estudos, a importân-cia dos processos de aprendizado e desenvolvimento das funções psi-

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cológicas superiores na “formação social da mente”. O que Vygotsky queria demonstrar? Era, principalmente, o valor do ambiente social e a interação com outras pessoas como condição essencial ao desen-volvimento humano.

Para isso, ele inter-relaciona o desenvolvimento com a apren-dizagem:

Existe um percurso de desenvolvimento, em parte defi-nido pelo processo de maturação do organismo indivi-dual, pertencente à espécie humana, mas é o aprendi-zado que possibilita o despertar de processos internos de desenvolvimento que, não fosse o contato do in-divíduo com certo ambiente cultural, não ocorreriam (OLIVEIRA, 1997, p. 56).

Essa sua concepção é a base daquilo que Vygotsky denominou de zona de desenvolvimento proximal (ou zona de desenvolvi-mento potencial):

Ela é a distância entre o nível de desenvolvimen-to real, que se costuma determinar através da solu-ção independente de problemas, e o nível de de-senvolvimento potencial, determinado através de solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (VYGOTSKY, 1998, p. 112, grifo nosso).

Parece complicado, mas não é! Vamos detalhar um pouco mais: se considerarmos que uma criança pode executar determinada tare-fa sozinha, independente de qualquer interferência de outras pesso-as (adultos ou mesmo de outras crianças), supõe-se que ela já ama-dureceu as funções (físicas e mentais) necessárias para a execução daquela tarefa.

Por outro lado, se a criança depende de orientação, imitação, exemplificação, detalhamentos para fazer uma tarefa, ela demonstra uma relativa imaturidade. Essas funções, que estão em processo de maturação, que ainda se encontram em estado latente, embrionário, brotando ou florescendo (ao invés de já serem frutos do desenvol-vimento) definem o que Vygotsky chamou de zona de desenvolvi-mento proximal caracterizando um desenvolvimento mental pros-pectivo (futuro) (VYGOTSKY, 1998).

Com essa indicação, Vygotsky ( 1998,p.113) acreditava poder prover “[...] psicólogos e educadores de um instrumento através do qual se pode entender o curso interno do desenvolvimento”. O uso desse método pode dar conta, seguindo o citado autor,

[...] não somente dos ciclos e processos de maturação que já foram completados, como também daqueles processos que estão em estado de formação, ou seja, que estão apenas começando a amadurecer e a se de-senvolver. Assim, a zona de desenvolvimento proximal permite-nos delinear o futuro imediato da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento, propiciando o acesso não somente ao que já foi atingido através do

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desenvolvimento, como também àquilo que está em processo de maturação [...]. O estado de desenvolvi-mento mental de uma criança só pode ser determina-do se forem revelados os seus dois níveis: o nível de de-senvolvimento real e a zona de desenvolvimento próxima (VYGOTSKY, 1998, p. 113, grifos nossos).

Portanto, fica evidente, pelo que já discutimos até aqui, a im-portância da mediação tanto de adultos (familiares e professores) quanto dos pares (irmãos e colegas). Assim, “[...] o aprendizado hu-mano pressupõe uma natureza social específica e um processo atra-vés do qual as crianças penetram na vida intelectual daquelas que as cercam” (VYGOTSKY, 1998, p. 115).

Em resumo, é interessante perceber que o aluno aprendente deve ser o centro do processo educativo. Daí a consideração necessá-ria à sua prontidão, como condições interiores e anteriores à discus-são dos novos conteúdos ou novas informações (desenvolvimento real).

Vale destacar, também, que as novas aprendizagens ampliam diferentes áreas da personalidade humana e não apenas a área inte-lectual, com encadeamento entre antigas (pré-requisitos/desenvol-vimento real) e novas aprendizagens (desenvolvimento proximal), gerando um movimento contínuo e encadeado, o que faz da apren-dizagem um processo globalizado (por envolver as áreas cognitiva, social, comportamental, lingüística, entre outras) e cumulativo, pois ocorre de forma contínua e encadeada, dependente de outras apren-dizagens anteriores que lhes servem de base.

Mas, como os indivíduos são seres diferenciados uns dos ou-tros, é necessário ainda considerar as diferenças individuais e o ritmo de cada um. A aprendizagem é um processo cumulativo, assim, ela se torna mais reforçada quando é trabalhada em pequenas etapas com possibilidade de demonstração e aplicação em situações diversas (REIS; JOULLIÉ, 1983).

O processo de ensino

Se buscarmos conceituar o que é ensinar, encontraremos defi-nições como: “Ministrar o ensino [...]; instruir; lecionar; educar; dar a conhecer; transmitir conhecimentos” (AURÉLIO, 1986, p. 660) ou “[...] repassar ensinamentos; doutrinar; transmitir experiência prática [...] tornar conhecido, familiar; mostrar com precisão; indicar” (HOUAISS, 2001, p. 1159). Por outro lado, ensino “[...] vem de ensinar (lat. Inseg-nare) que quer dizer dar preleções sobre o que os outros ignoram ou sabem mal” (NÉRICE, 1989, p. 47). Mas, no enfoque didático, o ensino “[...] é a ação de prover circunstâncias para que o educando aprenda, podendo ser a ação do professor direta (como no caso da preleção) ou indireta (como no caso de orientar o educando para pesquisar)” (NÉRICE, 1989, p. 47). Desse modo, a ação de dirigir a aprendizagem do aluno, organizando-a, selecionando os conteúdos, as tarefas e as

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avaliações, é compreendida muito claramente como a função dos professores.

Os professores são, portanto, aqueles que professam algo que consideram verdadeiro, válido, necessário e útil para a perpetuação da cultura e alcance daqueles objetivos indicados pela sociedade para preservação de sua sobrevivência. São pessoas especializadas e habilitadas para, sistematicamente, indicar ao aluno/aprendente “[...] um conjunto de conhecimentos que o tempo e a experiência sele-cionaram da cultura universal e diz respeito à nossa vivência cultu-ral” (TOSI, 2001, p. 24). Portanto, pelo que a autora nos expõe, fica evidente que os conhecimentos acumulados ao longo da existência humana, vão ser transmitidos pelo “ensinante” ao “aprendente”, mas, para tal, é necessário que sejam selecionados conteúdos considera-dos, pela sociedade como mais relevantes às suas crianças e jovens.

Visto dessa forma, o ato de ensinar indica que

[...] a função do professor/a será facilitar o surgimento do contexto de compreensão comum e trazer instrumentos procedentes da ciência, do pensamento e das artes para enriquecer [...] espaço de conhecimento compartilhado, mas nunca substituir o processo de construção dialética desse espaço, impondo suas próprias representações ou cerceando as possibilidades de negociação aberta de to-dos e cada um dos elementos que compõe o contexto de compreensão comum (SACRISTÁN; GÓMEZ, 1998, p. 64).

Vamos detalhar um pouco mais para dirimir qualquer dúvida? O que Sacristán e Gomes (1998) propõem é que se crie, na sala de aula, um espaço de negociação aberta (espaço compartilhado) aos elementos que compõem esse contexto no qual seja possível o com-prometimento dos alunos, que trarão seus conhecimentos prévios, seus interesses e concepções, preocupações, desejos e experiências e o compromisso do professor de facilitar a compreensão em um processo aberto de comunicação, oferecendo instrumentos culturais, provocando a reflexão, o debate e a ação que redundarão no conhe-cimento.

Dessa forma,não deve haver, por parte do professor, a exage-rada preocupação em cumprir programas e vencer o livro-texto, mas de trazer aqueles conceitos e proposições da cultura pública que serão assimilados pelo aluno como instrumentos e ferramentas de análise e propostos, quando realmente tenham conexão com suas preocupações intelectuais, vitais e possam promover a transferência de conhecimentos e cultura pública dominados pelo professor. Em síntese, o que os referidos autores propõem é que a aprendizagem escolar seja considerada como um longo processo de assimilação e reconstrução por parte do aluno da cultura e do conhecimento público da comunidade social com a intenção direta do professor, num con-texto de comunicação e compreensão comprometido, designado por eles como espaço compartilhado.

Como bem salienta Weisz (2005, p. 65),

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O processo de aprendizagem não responde necessaria-mente ao processo de ensino, como tantos imaginam. Ou seja, não existe um processo único de ‘ensino-apren-dizagem’, como muitas vezes se diz, mas dois processos distintos: o de aprendizagem, desenvolvido pelo aluno, e o de ensino pelo professor. São dois processos que se comunicam mas não se confundem: o sujeito do proces-so de ensino é o professor enquanto o do processo de aprendizagem é o aluno.

Portanto, não se pode considerar que o aluno aprenda tudo que o professor queira lhe ensinar pela via do ensino, mas é o profes-sor quem precisa compreender em que ponto do caminho a apren-dizagem do aluno está no momento adequado para poder oferecer atividades que lhe permitam avançar em seus conhecimentos. “Ou seja, não é o processo de aprendizagem que deve se adaptar ao de ensino, mas o processo de ensino é que tem de se adaptar ao de aprendizagem. Ou melhor: o processo de ensino deve dialogar com o de aprendizagem” ( WEISZ (2005, p. 65).

Ao destacar o diálogo, o que a referida autora quer dizer é que cabe ao professor organizar situações de aprendizagem, mas, que para tenham valor, é preciso reunir algumas condições, respeitando alguns princípios, tais como:

[...] - os alunos precisam pôr em jogo tudo o que sabem e pensam sobre o conteúdo que se quer ensinar; - os alunos têm problemas a resolver e decisões a tomar em função do que se propõem a produzir; - a organização da tarefa pelo professor garante a máxi-ma circulação de informação possível; - o conteúdo trabalhado mantém suas características de objeto sociocultural real, sem se transformar em objeto escolar vazio de significado social (WEISZ, 205, p. 66).

É evidente que esses princípios são norteadores e é convenien-te não perdê-los de vista, mas temos que considerar que, dependen-do do conteúdo, dos objetivos que se quer trabalhar, nem sempre é possível organizar as atividades escolares respeitando todos eles.

Atividade 5

Leia os textos apresentados a seguir e proceda a uma análise da importância dos conceitos que apresentam para a(s) escola(s) de sua região indicando que ações sua escola (e as de sua comunidade) têm empreendido que permitam explicitar o desenvolvimento da “felicidadania” e do que propõe Arroyo e Fernandes, Caldart e Molina para a escola do campo.

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Texto 1No livro Compreender e Ensinar (RIOS, 2003), a autora desenvol-

veu um conceito denominado felicidadania10 e indica a escola como um dos lugares de construção dessa felicidadania.

Para isso, a autora propõe a ação docente como possibilidade des-sa construção e enumerou seis indicadores que podem favorecer esse desenvolvimento. Para ela, construir a felicidadania, na ação docente é:

a)reconhecer o outro;b) tomar como referência o bem coletivo;c) envolver-se na elaboração e desenvolvimento de um projeto

coletivo de trabalho;d) instalar na escola e na aula uma instância de comunicação criativa;e) criar espaço, no cotidiano da relação pedagógica, para a afe-

tividade e alegria;f ) lutar pela criação e pelo aperfeiçoamento constante de con-

dições viabilizadoras do trabalho de boa qualidade.

Texto 2“ Uma escola do campo é a que defende os interesses, a polí-

tica, a cultura e a economia da agricultura camponesa, que construa conhecimentos e tecnologias na direção do desenvolvimento social e econômico dessa população”( ARROYO; FERNANDES, 1999, p. 26).

Texto 3“Se a escolarização não é toda a educação a que temos direito,

ela é um direito social e humano fundamental. Mas estamos falando de uma educação e de uma escola vinculadas aos interesses e ao de-senvolvimento sociocultural dos diferentes grupos sociais que habi-tam e trabalham no campo.

Quanto mais se afirma a especificidade do campo mais se afir-ma a especificidade da educação e da escola do campo. Mais se tor-na urgente um pensamento educacional e uma cultura escolar e do-cente que se alimentem dessa dinâmica formadora. Também mais se afirma a necessidade de equacionar a função social da educação e da escola em um projeto de inserção do campo no conjunto da socieda-de” ( ARROYO; CALDART; MOLINA, 2004, p. 13).

Este texto a seguir é só um presente para sua reflexão:

Ensinar é um exercício de imortalidade.De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos

aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra.O professor, assim, não morre jamais [... ] (RUBEM ALVES, 1994, p. 2).

10 Associação de felicidade (no sentido de estar no mundo que ninguém quereria perder [...] o modo feliz de ser-no-mundo corresponde a uma sentimentalidade inteligente, criadora e livre [...] e cidadania (no sentido que implica uma consciência de pertencimento a uma comunidade acrescida de responsa-bilidade partilhada num espaço democrático (RIOS, 2003, p. 114).

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Práticas pedagógicas

Por que falar de prática pedagógica quando estamos discutin-do os processos de aprendizagem e de ensino? Simplesmente por-que é pela via da prática que podemos apresentar determinados instrumentos que nos auxiliem a interpretar o que acontece na aula; conhecer melhor o que está ao nosso alcance e alterar ou não; tomar medidas que permitam recuperar o que está funcionando; avaliar e corrigir os rumos e ações que não redundaram nos objetivos propos-tos; ter oportunidade de analisar e refletir sobre o que fazemos para que possamos até mesmo compartilhar essas experiências com ou-tros profissionais da área.

A prática pedagógica de qualquer professor estará sempre conformada (no sentido de estar em conformidade) pelas suas con-cepções e ideias que determinam suas ações. Mesmo quando o pro-fissional não tem consciência disso, haverá a presença dessas con-cepções. Elas dizem respeito ao conteúdo que o professor seleciona para ensinar (o que espera que seus alunos aprendam), como enten-de o processo de aprendizagem (como a aprendizagem acontece) e quais caminhos trilha para ensinar (como deve ser o ensino).

A seguir, vamos discutir a percepção de prática educativa de al-guns educadores, começando por Zabala (1998), que se fundamenta em aspectos sociais, passando pela visão crítica de Gasparin (2003), por aspectos tradicionais e/ou modelos variados de teóricos estran-geiros, destacados por Nérice (1987) até a percepção construtuvista discutida por Weisz (2001).

Para Zabala (1998), fica evidente que há variáveis ou indicado-res que podem nos auxiliar na análise e interpretação dos fatos vi-venciados. O citado autor nos aponta algumas variáveis que, segun-do sua visão, configuram a prática educativa, embora faça a ressalva de que tais “[...] processos educativos são suficientemente complexos para que não seja fácil reconhecer todos os fatores que os definem” (ZABALA, 1998, p. 16, grifos nosso).

Sua justificativa se assenta na complexidade estrutural da prá-tica que obedece a múltiplos determinantes, como: “[...] parâmetros institucionais, organizativos, tradições metodológicas, possibilidades reais dos professores, dos meios e condições físicas existentes, etc.” (ZABALA, 1998, p. 16). Destaca, também, a complexidade da prática (por seus múltiplos fatores – idéias, valores, hábitos) ou por sua flui-dez que dificulta suas limitações com simples coordenadas.

Entender a intervenção pedagógica exige situar-se num modelo em que a aula se configura como um microssis-tema definido por determinados espaços, uma organi-zação social, certas relações interativas, uma forma de distribuir o tempo, um determinado uso dos recursos didáticos, etc., em que os processos educativos se expli-cam como elementos estreitamente integrados nesse sistema. Assim, pois, o que acontece na aula só pode ser examinado na própria interação de todos os elementos que nela intervêm (ZABALA, 1998, p. 16-17).

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Um destaque necessário é a chamada que Zabala (1998) faz para os elementos que antecedem (planejamento) e finalizam (ava-liação) a intervenção pedagógica, destacando o momento da aula/in-tervenção como um processo que considera: expectativas, intenções, previsões e a avaliação dos resultados.

Assim, pois, partindo desta visão processual da prática, em que estão estritamente ligados o planejamento, a aplicação e a avaliação, teremos que delimitar a unidade de análise que representa este processo. Se examina-mos uma das unidades mais elementares que constitui os processos de ensino/aprendizagem e que ao mesmo tempo possui em seu conjunto todas as variáveis que in-cidem nesses processos, veremos que se trata do que se denomina atividade ou tarefa. Assim, podemos conside-rar atividades, por exemplo: uma exposição, um debate, uma leitura, uma pesquisa bibliográfica, tomar notas, uma ação motivadora, uma observação, uma aplicação, um exercício, o estudo, etc. Dessa maneira, podemos de-finir as atividades ou tarefas como uma unidade básica do processo de ensino/aprendizagem, cujas diversas va-riáveis apresentam estabilidade e diferenciação: deter-minadas relações interativas professor/alunos e alunos/alunos, uma organização grupal, determinados conte-údos de aprendizagem, certos recursos didáticos, uma distribuição do tempo e do espaço, um critério avaliador, tudo isso em torno de determinadas intenções educa-cionais, mais ou menos explícitas (ZABALA, 1998, p 17).

O que o referido autor quer destacar é que as atividades reali-zadas em sala de aula podem ter um valor relativo dependendo do lugar e do tempo a elas dedicado. Assim,

[...]. As atividades, apesar de concentrarem a maioria das variáveis educativas que intervêm na aula, podem ter um valor ou outro, segundo o lugar que ocupem quanto as outras atividades, as de antes e as de depois. É evidente que uma atividade, por exemplo, de estudo individual, terá um posição educativa diferente em re-lação ao tipo de atividade anterior, por exemplo, uma exposição ou um trabalho de campo, uma leitura ou uma comunicação em grande grupo, uma pesquisa bi-bliográfica ou uma experimentação. Poderemos ver de que maneira a ordem e as relações que se estabelecem entre as diferentes atividades determinam de maneira significativa o tipo e as características do ensino. Levan-do em conta o valor que as atividades adquirem quan-do as colocamos numa série ou seqüência significativa, é preciso ampliar essa unidade elementar e identificar, também, como nova unidade de análise, as seqüências de atividades ou seqüências didáticas como unidade pre-ferencial para a análise da prática, que permitirá o estu-do e a avaliação sob uma perspectiva processual, que inclua as fases de planejamento, aplicação e avaliação (ZABALA, 1998, p. 17-18, grifos do autor).

Portanto, seguindo esse raciocínio, há maneiras diversas de configuração das sequências das atividades e o modo como essas

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sequências encontram–se conformadas caracterizam a prática edu-cativa de determinado professor. É assim que

A maneira de configurar as seqüências de atividades é um dos traços mais claros que determinam as características diferenciais da prática educativa. Desde o modelo mais tra-dicional de ‘aula magistral’ (com a seqüência: exposição, es-tudos sobre apontamentos ou manual, prova, qualificação) até o método de ‘projetos de trabalho global’ (escolha do tema, planejamento, pesquisa e processamento da infor-mação, índice, dossiê de síntese, avaliação), podemos ver que todos têm como elementos identificadores as ativida-des que os compõem, mas que adquirem personalidade di-ferencial segundo o modo como se organizam e articulam em seqüências ordenadas.Se realizarmos uma análise dessas seqüências buscan-do os elementos que as compõem nos daremos conta de que são um conjunto de atividades ordenadas, es-truturadas e articuladas para a realização de certos objetivos educacionais, que têm um princípio e um fim conhecidos tanto pelos professores como pelos alunos (ZABALA, 1998, p. 17-18, grifos do autor).

O ponto de partida para a análise de Zabala (1998), ou seja, seu núcleo central foi o estudo das unidades didáticas (unidades de pro-gramação ou unidades de programação pedagógica) com suas sequ-ências de atividades estruturadas quer no modo tradicional, quer em metodologias mais diferenciadas no modo de ensinar.

Esse autor selecionou sete variáveis ou dimensões para pro-ceder à descrição de qualquer proposta metodológica (considerada como um agrupamento sequenciado das atividades): aula expositiva; metodologia por descobrimento, por projetos etc.; as situações de co-municação entre professores e alunos, por exemplo (diretivos, partici-pativos, cooperativos); as formas de organizar socialmente ou agrupar os alunos (grande grupo, grupos móveis ou fixos etc); maneiras de organizar e distribuir o espaço e o tempo (oficinas, aulas por áreas, can-tos etc.); a sistemática de organização dos conteúdos (em disciplinas, usando a interdisciplinaridade, globalizado etc.); uso dos materiais (livros, fichas, ensino dirigido etc.) e procedimentos avaliativos (de re-sultados, de processo, formativos) (ZABALA, 1998).

Para esclarecer melhor sua descrição, Zabala (1998) detalha as variáveis selecionadas, aplicando-as na unidade didática:

a) as sequências de atividade de ensino/aprendizagem, ousequências didáticas são uma maneira de encadear e articular as dife-rentes atividades ao longo de uma unidade didática. Assim, pois, podere-mos analisar as diferentes formas de intervenção segundo as atividades que se realizam e, principalmente, pelo sentido que adquirem quanto a uma sequência orientada para a realização de determinados objetivos educativos. As sequências podem indicar a função que tem cada uma das atividades na construção do conhecimento ou da aprendizagem de diferentes conteúdos e, portanto, avaliar a pertinência ou não de cada uma delas, a falta de outras ou a ênfase que devemos lhes atribuir;

b) o papel dos professores e dos alunos e, em resumo, das relações

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que se produzem na aula entre professor e alunos ou alunos e alunos que afeta o grau de comunicação e os vínculos afetivos que se estabele-cem e que dão lugar a um determinado clima de convivência. Tipos de comunicações e vínculos que fazem com que a transmissão do conheci-mento ou os modelos e as propostas didáticas estejam de acordo ou não com as necessidades de aprendizagem;

c) a forma de estruturar os diferentes alunos e a dinâmica grupal que se estabelece configuram uma determinada organização social da aula em que os meninos e meninas convivem, trabalham e se relacio-nam segundo modelos nos quais o grande grupo ou os grupos fixos e variáveis permitem e contribuem de uma forma determinada para o tra-balho coletivo e pessoal e sua formação;

d) a utilização dos espaços e do tempo: como se concretizam as diferentes formas de ensinar usando um espaço mais ou menos rígido e onde o tempo é intocável ou permite uma utilização adaptável às dife-rentes necessidades educacionais;

e) a maneira de organizar os conteúdos segundo uma lógica que provém da própria estrutura formal das disciplinas, ou de acordo com formas organizativas centradas em modelos globais ou integradores;

f) a existência, as características e o uso dos materiais circulares e de outros recursos didáticos. O papel e a importância que adquirem, nas diferentes formas de intervenção, os diversos instrumentos para a comunicação da informação, para a ajuda nas exposições, para propor atividades, para a experimentação, para a elaboração e construção do conhecimento ou para o exercício e a aplicação;

g) e, finalmente, o sentido e o papel da avaliação, entendida tan-to no sentido mais restrito de controle dos resultados de aprendizagem conseguidos, como no de uma concepção global do processo de ensino/aprendizagem. Seja qual for o sentido que se adote, a avaliação sempre incide nas aprendizagens e, portanto, é uma peça-chave para determi-nar as características de qualquer metodologia. A maneira de avaliar os trabalhos, o tipo de desafios, as ajudas propostas, as manifestações das expectativas depositadas, os comentários ao longo do processo, as ava-liações informais sobre o trabalho que se realiza, a maneira de dispor ou distribuir os grupos etc. são fatores estreitamente ligados à concepção que se tem, embora muitas vezes de maneira implícita, com uma forte carga educativa que a converte numa das variáveis metodológicas mais determinantes (Adaptado de ZABALA, 1998).

É interessante notar o destaque que o referido autor dá à ne-cessidade de instrumentos teóricos que nos permitam proceder à análise da prática de forma reflexiva. Aí vão estar refletidas as con-cepções de educação que os educadores tenham, incluindo a forma como concebem a função social do ensino e os conhecimentos do pro-cessamento da aprendizagem (como se aprende).

A concepção dos aspectos práticos do processo educacional é abordada por outros autores que, de certo modo, concordam com a descrição de Zabala (1998), embora não cheguem ao nível de deta-lhamento desse autor.

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Gasparin (2003, p. 107) considera que é nessa fase que a aprendi-zagem dos conceitos científicos/conhecimentos científicos, ocorre: “[...] é o momento de maior especificidade teórica, no qual se processa a re-presentação mental do objeto de estudo em suas diversas dimensões”.

Essa interação do sujeito aprendente com o objeto deve [...] possibilitar o confronto do conhecimento entre o su-jeito e o objeto, onde o educando possa penetrar no ob-jeto, compreendê-lo em suas relações internas e exter-nas, captar-lhe a essência (VASCONCELLOS, 1993, p. 42).

Mas é importante frisar que esse processo é provocado, orien-tado, coordenado, mediado pela ação do professor e sempre estará atavicamente inflado das concepções de educação e de ensino que o professor tenha.

Na sala de aula, a ação do professor tem como objeti-vo criar as condições para a atividade de análise e das demais operações mentais do aluno, necessárias para a realização do processo de aprendizagem. Depois ambos seguem juntos numa ação interativa na qual o professor, como mediador, apresenta o conteúdo científico ao educando, enquanto este vai, aos pou-cos, tornando seu o novo objeto de conhecimento(GASPARIN, 2003, p. 107, grifos nossos).

O mesmo autor destaca que esse processo

[...] consiste na reconstrução interna, subjetiva, psicoló-gica de uma operação externa, social, através do uso de signos, ou seja, por meio da palavra que designa coisas do mundo real. Nesta ação, o educando reconstrói para si, com o auxílio do professor como mediador social, o que é comum para todo um grupo (IDEM, 2003, p. 107, grifos nossos).

Desse modo, na ponte entre teoria e prática, a escola deve tornar-se um centro de experiências que faça a conexão entre os conhecimen-tos científicos e as situações vivenciadas no cotidiano da vida social e pessoal. Essa mediação pode ser efetuada pela utilização de técnicas convencionais, como: apresentação simples, tempestade mental, apre-sentação em duplas; técnicas de simulação (dramatização, estudos de caso, jogos variados); aulas práticas, estágios, visitas etc.

Assim, podem ser considerados atos didáticos peda-gógicos mediadores da aprendizagem, entre outros, os seguintes: exposição dialogada, leitura do mundo, leitu-ra orientada de textos selecionados, trabalhos em gru-po, pesquisa sobre o tema, seminário, entrevistas com pessoas-fonte, palestras, análise de vídeos ou filmes, discussões, debates, observação da realidade, painel in-tegrado, trabalhos individuais, trabalhos em laboratório ou experimentais, demonstração, tarefas de assimilação de conteúdos, tarefas de elaboração pessoal, grupo de verbalização e grupo de observação, uso de recursos au-diovisuais, ensino com pesquisa (IDEM, 2003, p. 112).

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Há, portanto, um triângulo na relação e interação do educador/mediador, o aluno e o objeto de conhecimento que pode ser expres-so no esquema a seguir.

Gráfico 2 Mediação do professorFonte: Gasparin (2003, p. 114)

Um outro ponto de vista da mediação pedagógica é também a relação entre os conceitos cotidianos e os conceitos científicos inter-mediados pelo professor gerando o crescimento e desenvolvimento intelectual do aluno.

Gráfico 3 – Conceitos científicos e cotidianos na mediação da aprendizagemFonte: Gasparin (2003, p. 119)

Como podemos verificar, há inter-relações entre conceitos (co-tidianos e científicos), o professor (mediador social e unificador do processo educativo) e o aluno.

Os conceitos científicos não passam diretamente aos alunos, nem os conceitos cotidianos são subsumidos, automaticamente, pelos científicos. É na caminhada dialógico-pedagógica que se dá o encontro das duas or-

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dens de conceitos: os conceitos cotidianos são incorpo-rados e superados pelos científicos. Realizam-se, através do trabalho coletivo e individual, a interaprendizagem e a intra-aprendizagem (GASPARIN, 2003, p. 119).

As questões da prática pedagógica vêm sendo objeto de pre-ocupação dos educadores há algum tempo. Se procurarmos em li-vros de Didática mais “tradicionais”, que tinham um enfoque da área de caráter prescritivo e instrumental, vamos encontrar os chamados modelos de processos ensino-aprendizagem. Nérice, (1987) subdivi-diu esses processos em modelos de ensino-aprendizagem:

a) coletivo – toda a classe estuda individualmente um conteúdo regido pelas mesmas normas, período e tempo;

b) em grupo – a classe é dividida em grupos para o estudo de determinado conteúdo sob as mesmas normas, período e tempo;

c) individualizado – os alunos de uma classe estudam determi-nado conteúdo no ritmo próprio de cada um;

d) socializado-individualizado – permite aos alunos atividades em grupo e também outras para serem executadas individualmente.

Esse autor apresenta, ainda, outros enfoques para modelos de ensino-aprendizagem, como:

a) modelos de Joyce e Weil – subdividido em quatro tipos de mo-delos:

• orientados para a interação social – também chamados de inte-rativos, com predominância entre indivíduos do grupo. Figuras de destaque nessa opção: Dewey e Thelen;

• orientados para o processamento da informação – há uma pre-ponderância do processamento das informações e desenvolvi-mento das potencialidades dos alunos em efetuar esse proces-samento. Seus desdobramentos podem priorizar a resolução de problemas ou o desenvolvimento da criatividade. Figuras de des-taque: Bruner, Piaget e Ausebel;

• orientados para a pessoa – enfoque nas relações interpessoais, centrado na pessoa. Principal figura: Carl Rogers;

• orientados para a modificação do comportamento – visa à mo-dificação do comportamento por meio do condicionamento ope-rante, com ênfase em prêmio e castigo. Figuras: Skinner e Gagné.

b) modelos de Diane Lapp e outros – também subdivididos em quatro tipos de modelos:

• clássico – transmissão pelo professor de ideias selecionadas e com estrutura lógica. É uma concepção orientada por dois princípios: perenealismo – baseado na preservação do passado e compreen-são do futuro como sua continuação; e essencialismo – fundamen-tado na preparação para o exercício de uma profissão;

• tecnológico – transmissão de conhecimentos que visem ao ho-mem eficiente e competente;

• personalizado – tem como centro da aprendizagem os interesses, necessidades e potencialidades do aluno. O professor é orientador

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e facilitador da aprendizagem. Valoriza a experiência pessoal e in-dividual para a interação com o meio;

• interacional – dialógico, com a pretensão de efetuar troca de ex-periências entre os professores e os alunos. Encoraja a responsabi-lidade do grupo e a análise crítica dos problemas sociais.

Já Weisz (2001) faz uma brilhante (pelo menos em nossa visão) exposição do assunto, ao discutir a teoria empirista, considerando-a como aquela que, historicamente, está mais impregnada em nossas representações do que é ensinar, aprender, como ensinar, quem é o aluno. Destaca o modelo skinneriano do “estímulo-resposta”, no qual nós, professores, pretendemos trocar respostas erradas por respostas certas.

A hipótese subjacente a essa concepção é a de que o aluno precisa memorizar e fixar informações – as mais simples e parciais possíveis e que devem ir se acumulan-do com o tempo. O modelo típico de cartilha está basea-do nisso (WEISZ, 2001, p. 55).

Como mudar essa prática?

Weisz (2001, p. 58) afirma que a mudança pressupõe

[...] reconstruir a prática a partir de um novo paradigma teórico. O exemplo que essa autora usa para demonstrar a referida possibilidade de mudança é a saída de um mo-delo de aprendizagem empirista para um modelo cons-trutivista. Ela destaca as grandes e graves dificuldades de entendimento que essa mudança ocasiona. Por quê? Porque, em [...] uma perspectiva construtivista, o co-nhecimento não é concebido como uma cópia do real, incorporado diretamente pelo sujeito: pressupõe uma atividade, por parte de quem aprende, que organiza e integra os novos conhecimentos aos já existentes. Isso vale tanto para o aluno quanto para o professor em pro-cesso de transformação (WEISZ, 2001, p. 58).

Por outro lado, a falta do domínio do novo paradigma teórico pode levar o professor a correr o risco de “[...] ficar se deslocando de um modelo que lhe é familiar para outro, meio desconhecido, sem muito domínio de sua própria prática – ‘mesclando’ o modo de ensi-nar” (WEISZ, 2001, p. 59).

Nessa mesclagem, os professores cometem vários equívocos, e o mais comum deles, segundo Weisz (2001), é julgar que alguns conteúdos podem ser construídos e outros não (devem ser ensina-dos). Em outros casos, o modelo empirista fica intocado e as ideias que as crianças constroem em seu processo de aprendizagem são distorcidas a ponto de o professor vê-las (as ideias) como o conteúdo a ser ensinado. Um exemplo disso são os professores que, encanta-dos com o que a psicogênese da língua escrita desvendou sobre o que pensam as crianças quando se alfabetizam, passaram a ensinar a

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seus alunos a escrever silabicamente. Que raciocínio leva à distorção desse tipo? Se os alunos têm que passar por uma escrita silábica para chegar a uma escrita alfabética, ensiná-los a escrever silabicamente os faria chegar mais rápido à escrita alfabética, pensam esses profes-sores. Essa perspectiva só pode caber num modelo empirista de ensi-no, cuja lógica intrínseca é a de organizar etapas de apresentação do conhecimento aos alunos. Essa lógica não faz nenhum sentido num modelo construtivista.

Vejamos mais alguns detalhes da análise apresentada pela au-tora. A opção por uma ou outra prática será determinante na concep-ção e no modo de tratar os conteúdos escolares. A forma de oferecer as informações aos alunos pode propiciar melhores usos para essas informações ou esses conteúdos.

Para os construtivistas – diferentemente dos empiristas, para quem a informação deveria ser oferecida da forma mais simples possível, uma de cada vez, para não con-fundir aquele que aprende – o aprendiz é um sujeito, protagonista de seu próprio processo de aprendizagem, alguém que vai produzir a transformação que converte informação em conhecimento próprio. Essa construção, pelo aprendiz, não se dá por si mesma e no vazio, mas a partir de situações nas quais ele possa agir sobre o que é objeto de seu conhecimento, pensar sobre ele, receben-do ajuda, sendo desafiado a refletir, interagindo com ou-tras pessoas (WEISZ, 2001, p. 60-61, grifos nossos).

Esse comportamento é bem diferente da situação em que o aluno é um receptáculo das informações, quase sempre sem um sen-tido compreensível ao aprendente.

Daí podemos perguntar: o que significa o bê-a-bá do sistema de escrita alfabética para as crianças alfabetizantes? Em que usos so-ciais esse aluno poderá vivenciar a escrita? Como poderá compreen-der as características dos diferentes gêneros textuais?

Weisz ( 2001, p. 60) aponta que o aluno, para

[...] ser capaz de ler com autonomia, é preciso compre-ender o sistema alfabético, mais isso apenas lhe confere autonomia. Qualquer um pode aprender muito sobre a língua escrita mesmo sem poder ler e escrever auto-nomamente. Isso depende de oportunidades de ouvir a leitura de textos, participar de situações sociais nas quais os textos reais sejam utilizados, pensar sobre os usos, as características e o funcionamento da língua escrita.

ATIVIDADE 6

• Leia os dois textos de Weisz (2001) que apresentaremos seguir, reflita sobre eles e escreva seu posicionamento sobre o assunto, fundamentado em sua prática docente.

• Monte experiências semelhantes à discutida no texto para poste-riormente submetê-las ao coletivo da escola para análise.

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Texto 1As cartilhas trabalham com uma concepção de língua escrita

como transcrição da fala: elas supõem a escrita como espelho da lín-gua que se fala. Seus ‘textos’ são construídos com a função de tornar clara (segundo o que elas supõem) essa relação de transcrição. Em ge-ral, são palavras-chave e famílias silábicas, usadas exaustivamente – e aí encontram-se coisas como ‘O bebê baba na babá, o boi bebe, Didi dá o dado a Dedé’. A função do material escrito numa cartilha é apenas ajudar o aluno a desentranhar a regra de geração do sistema alfabético: que b com a dá ba, e por aí afora.

Centrada nessa abordagem que vê a língua como pura fonologia, a cartilha introduz o aluno no mundo da escrita, apresentando-lhe um texto que, na verdade, é apenas um agregado de frases desconectadas. Essa concepção de “texto” para ensinar a ler está tão impregnada no imaginário do professor que, certa vez, uma professora que se esforça-va, para transformar sua prática, documentou em vídeo uma aula e me enviou, para mostrar como já conseguia trabalhar sem cartilha. A ati-vidade era uma produção coletiva de texto na lousa. O texto produzido pelos alunos e grafado pela professora era o seguinte:

O sapoO sapo é bom.O sapo come inseto.O sapo é feio.O sapo vive na água e na Terra.Ele solta um líquido pela espinha.O sapo é verde.

Como se pode observar, cada enunciado é tratado como se fosse um parágrafo independente. Exigências mínimas de coesão textual, como não repetir “o sapo” em cada enunciado, nem sequer são consideradas. Só na quinta frase aparece, pela primeira vez, um pronome para substituir “o sapo”. Mas na sexta frase, lá está ele de novo. Seria fácil concluir que a pro-fessora é que não sabe escrever com um mínimo de coerência e coesão. Mas não era esse o caso. Além de saber escrever, era uma ótima professo-ra, empenhada e comprometida com seu trabalho e seus alunos. Apenas havia interiorizado em sua prática o modelo de “texto” que caracteriza a metodologia de alfabetização expressa nas cartilhas. E de tal maneira que nem sequer tinha consciência disso: foi preciso tematizar sua prática a partir dessa situação documentada para que ela pudesse se dar conta disso (Adaptado de WEISZ, 2001, p. 56-57).

Texto 2“Não informar nem corrigir significa abandonar o aluno à pró-pria sorte

Como já vimos, diante de um corpo de ideias tão novo como a con-cepção construtivista da aprendizagem e o modelo de ensino por meio da resolução de problemas, o professor também está na posição de apren-diz. No entanto, o conhecimento pedagógico é produzido coletivamente, o que permite aos professores hoje aprenderem a partir do que outros já aprenderam e tomarem cuidado com erros já cometidos por outros.

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Um erro que precisa ser evitado por suas graves consequências é o desvio espontaneísta: como é o aluno quem constrói o conhecimento, não seria necessário ensinar-lhe. A partir dessa crença, o professor passa a não informar, a não corrigir e a se satisfazer com o que o aluno faz “do seu jeito”. Essa visão implica abandonar o aluno à sua própria sorte. E é muito importante que o professor compreenda o que significa, do ponto de vista da criança, o “vou fazer do meu jeito”.

Vamos usar a alfabetização novamente para exemplificar. Quan-do uma criança entra na escola, ainda não alfabetizada, tanto ela quanto o professor sabem que ela não sabe ler nem escrever. Ao solicitar que ela se arrisque a escrever do jeito que imagina, o que o professor, na verdade, está propondo é uma atividade baseada na capacidade infan-til de jogar, de fazer de conta. Num contrato desse tipo – que reza que o aluno deve escrever pondo em jogo tudo o que sabe e pensa sobre a escrita – o professor deve usar tudo o que sabe sobre as hipóteses que as crianças constroem sobre a escrita para poder, interpretando o que o aluno escreveu, ajudá-lo a avançar. Dentro desse contrato, quem “faz de conta” é a criança. Nesse espaço em que ela escreve “do seu jeito”, o papel do professor é delicado, mas é semelhante ao de alguém adulto que participa de uma brincadeira de faz de conta sem entrar nela. Ao professor cabe organizar a situação de aprendizagem de modo a ofere-cer informação adequada. Sua função é observar a ação das crianças, acolher ou problematizar suas produções, intervindo sempre que achar que pode fazer a reflexão dos alunos sobre a escrita avançar. O professor funciona então como uma espécie de diretor de cena ou de contrarre-gra, e cabe a ele montar o andaime para apoiar a construção do apren-diz (Adaptado de WEISZ, 2001, p. 62-63).

Possibilidades de parcerias

Atividade 7

Após a leitura do texto sobre parcerias possíveis, você deverá:• Elaborar uma listagem das ações que há em sua escola que propi-

ciem parcerias.• Fazer um elenco de outras possibilidades de parcerias além da fa-

mília.• Compartilhar suas posições com os colegas de seu polo da UAB.

Parceria é uma palavra que, embora muito utilizada em ques-tões educacionais, nem sempre tem o seu real significado conhecido por quem a usa. Segundo Houaiss (2001, p 2132), é uma “[...] reunião de indivíduos para alcançar um objetivo comum; companhia, socie-dade”. Portanto, pressupõe um grupo e o grupo inicial e mais subs-tantivo que há no processo educativo é a sala de aula, com o profes-sor e seus alunos.

Assim, a primeira parceria que deve permear o processo de es-

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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colaridade é aquela que deve ser efetuada entre o professor e seus alunos. Para isso, é necessário um profundo respeito pelas caracte-rísticas de cada aluno, suas habilidades e dificuldades, seu tempo de aprendizagem, suas motivações, seus traços culturais etc. Daí o com-partilhamento dos objetivos de aprendizagem, o esclarecimento em relação aos conteúdos que estão sendo desenvolvidos, os “contratos ou combinados” que entre si celebram professores e alunos devem ser, além da primeira, a mais essencial parceria entre todas outras possíveis no processo educativo.

A seguir, vem o relacionamento com a família, pois, por meio dessa parceria, será possível aumentar o conhecimento e a compre-ensão que a escola e o professor terá dos seus alunos. É bom nunca esquecermos que tanto a escola quanto a família têm os mesmos ob-jetivos: fazer os alunos se desenvolverem em todos os aspectos de sua personalidade e ter sucesso em suas aprendizagens. Instituições que conseguem parcerias com os pais/responsáveis conseguem di-minuir os índices de violência, evasão e repetência, melhorando sig-nificativamente o rendimento das turmas e dos alunos em particular.

Se cabe à escola o ensino dos conteúdos de Português, Mate-mática, Ciências, História ou Geografia, cabe às famílias acompanha-rem se as lições de casa foram executadas. Por outro lado, o com-partilhamento na formação de valores possibilita ao professor mais segurança no desenvolvimento desse aspecto formativo.

Tenham os pais o domínio da leitura e da escrita, sejam anal-fabetos sejam analfabetos funcionais, há possibilidades de serem requisitados para colaboração na escola/sala de aula de seus filhos. Mas, alguns cuidados são necessários para que o relacionamento com a família seja profícuo, por exemplo: aceitar as diferentes for-mas de arranjos familiares; ausência de julgamentos, principalmente precipitados; respeito aos valores familiares; abertura de canais de comunicação; boa recepção em visitas que a família faça à escola; informação relativa aos sucessos e conquistas, além de alguma pos-sível dificuldade que o aluno possa ter, entre outras.

Apesar de todas as dificuldades inerentes a encontros periódi-cos entre a família e a escola, principalmente em zona rural, devem ser envidados esforços nesse sentido, porque, com certeza, todos lu-crarão muito com o estreitamento desse laço.

A comunidade em que a escola se insere deve ser o próximo alvo. Nesse contexto, estão englobados: as empresas e o comércio, as igrejas, as bibliotecas públicas, os sindicatos, os grupos organizados, as cooperativas, as empresas/institutos de pesquisa e extensão ru-ral, as faculdades/universidades mais próximas, públicas ou privadas que são possibilidades ricas de compartilhamento e trocas.

O desencadeamento de parcerias deve ter a iniciativa das esco-las, com uma política iniciada desde a elaboração do PPP, passando por reuniões periódicas, previamente marcadas, como forma de con-tatos mais intensos e produtivos, principalmente para a comunidade escolar.

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TOSI, Maria Raineldes. Didática geral: um olhar para o futuro. 2.ed. Campinas: Alínea, 2001.

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Escolas em Comunidades Campesinas: especificidades na construção do projeto político-pedagógico nas

diferentes áreas do saber

Traze-me (Cecília Meireles)

Traze-me um pouco das sombras serenasque as nuvens transportam por cima do dia!

Um pouco de sombra, apenas,- vê que nem te peço alegria.

Traze-me um pouco da alvura dos luares que a noite sustenta no teu coração!

A alvura, apenas, dos ares:- vê que nem te peço ilusão.

Traze-me um pouco da tua lembrança,aroma perdido, saudade da flor!

-Vê que nem te digo - esperança!-Vê que nem sequer sonho - amor!

Gilda Cardoso de Araujo

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Unidade II: Escolas em Comunidades Campesinas: especificidades na construção doprojeto político-pedagógico nas diferentes áreas do saber

UNIDADE II

Escolas em Comunidades Campesinas: especificidades na construção do projeto político-pedagógico nas diferentes

áreas do saber

Gilda Cardoso de Araujo1

Objetivo da Unidade

A temática desse módulo tem o desafio de discutir e articular conceitos importantes para atender as especificidades das escolas em comunidades campesinas. Entendemos que não bastaria reali-zar uma discussão técnica ou política sobre o significado e a cons-trução do projeto político-pedagógico sem que fossem abordados conceitos/abordagens relativas ao significado do planejamento, sua articulação com o conceito de trabalho em geral, bem como com os pressupostos do trabalho pedagógico nas escolas.

Os textos seguem a lógica de partir de geral para o particular. A cada início de texto você encontra uma atividade básica, que é uma atividade de sensibilização/provocação sobre o tema s ser abordado no texto. Após a leitura do texto, temos uma atividade prática que se traduz na realização de um exercício estreitamente vinculado às experiências/vivências/conhecimentos da temática pelos cursistas e, por fim uma atividade de aplicação e compromisso social que requer do cursista a aplicação do conhecimento adquirido numa situação concreta da sua realizada.

Essa caracterização de atividade integra a metodologia de for-mação do Programa Escola Ativa, que adotamos por entender que é necessária maior articulação das políticas e programas desenvol-vidos por e para a Educação do Campo e também por partilharmos uma concepção de ensino-aprendizagem cujas bases estão nos mo-vimentos sociais e na educação popular, ou seja, a de que se aprende a partir da reflexão-ação-reflexão.

Bom Curso!!!

1 Doutora em educação. Professora do Centro de Educação da UFES e do PPGE/CE/UFES.

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Unidade II: Escolas em Comunidades Campesinas: especificidades na construção doprojeto político-pedagógico nas diferentes áreas do saber

Atividade 1

a) Leia a letra da música abaixo e ouça no seguinte hiperlink:YouTube - GUERREIRO MENINO (Fagner)http://www.youtube.com/watch?v=HZjqpampbCU

Guerreiro Menino (um Homem Também Chora)Composição: Gonzaguinha

Um homem também choraMenina morenaTambém deseja coloPalavras amenasPrecisa de carinhoPrecisa de ternuraPrecisa de um abraçoDa própria canduraGuerreiros são pessoasSão fortes, são frágeisGuerreiros são meninosNo fundo do peitoPrecisam de um descansoPrecisam de um remansoPrecisam de um sonhoQue os tornem perfeitosÉ triste ver este homemGuerreiro meninoCom a barra de seu tempoPor sobre seus ombrosEu vejo que ele berraEu vejo que ele sangraA dor que traz no peitoPois ama e amaUm homem se humilhaSe castram seu sonhoSeu sonho é sua vidaE a vida é trabalhoE sem o seu trabalhoUm homem não tem honraE sem a sua honraSe morre, se mataNão dá pra ser felizNão dá pra ser feliz

b) A partir da música responda:- Qual sua impressão e seu sentimento sobre a música?- Para você qual a parte mais importante da música? Por quê?- Qual o significado de trabalho para você?- Qual o significado de trabalho para alunos e famílias com

quem você trabalha?- Qual é a natureza do trabalho no campo?- Qual é a natureza do trabalho pedagógico na Educação do

Campo?

c) Agora leia e reflita sobre o texto a seguir:

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Texto 1

Trabalho: conceito e história

Profa. Gilda Cardoso de Araujo

O trabalho assumiu diferentes significados ao longo da his-tória. Todavia de todos esses sentidos o mais forte ainda é aquele ligado à exploração, ao esforço físico, ao castigo e à dominação. A condenação bíblica “comerás o pão com o suor do seu rosto” dirigida a Adão, permanece no imaginário social, embora a Reforma Protes-tante tenha dado outra significação ligada à lutar, esforçar-se. Com efeito, etimologicamente trabalhar é uma palavra que vem do latim “ tripaliare” e significa torturar, derivado de um instrumento chamado “tripalium”que era composto por três paus e servia para torturar, mui-to semelhante à imagem abaixo:

Na Grécia antiga, o trabalho não era considerado digno, era uma atividade que não era considerada humana e daí ser realizada por homens inferiores. Aristóteles em “A política” destaca que o tra-balho embrutecia o homem e lhe retirava a liberdade para exercitar o intelecto, para pensar2. Além de o escravo ser considerado um ob-jeto, uma propriedade, qualquer trabalho - inclusive aquele realizado pelos homens livres, como o comércio - era considerado ignóbil. O trabalho era assim considerado porque a lógica era a de que o espíri-to estaria subordinado ao corpo, não estando liberto para o exercício do pensamento.

Por isso, o trabalho, ou melhor, a ausência de trabalho, era um

2 Você pode baixar e ler essa obra gratuitamente acessando o endereço eletrônico: http://ateus.net/ebooks/geral/aristoteles_a_politica.pdf

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dos fatores determinantes para a participação no espaço público, no espaço da àgora, onde se exercia a participação política na gestão dos negócios da cidade-estado: cidadão era a condição do homem livre que pudesse prescindir do trabalho com o corpo e que tivesse tempo livre para a produção filosófica e para a atuação política. To-dos os outros seres humanos que não tivessem esta condição esta-vam excluídos do espaço público.

Na Idade Média, o trabalho também dividiu a sociedade entre exploradores e explorados. A sociedade estamental era dividida em três ordens, segundo três tipos de labores claramente delimitados: os que rezavam (clero), os que guerreavam (cavaleiros/nobres) e os que trabalhavam (servos). No regime de servidão o trabalhador não era considerado propriedade do senhor feudal, contudo, tinha o dever de retirar uma parte de sua produção para sustentar os outros esta-mentos. Progressivamente a intensificação das trocas e o aumento da circulação monetária, fizeram com que a economia de subsistên-cia dos feudos fossem substituídas pelas atividades artesanais e co-merciais. O comércio só poderia ser realizado fora dos domínios ter-ritoriais feudais e logo surgiu um grupo de intermediários que levam aos mercados a produção realizada nos feudos para troca ou venda. Surgem os burgos, territórios livres onde poderiam ser realizadas es-sas atividades e tem aí a sua gênese a burguesia.

Dos séculos XV ao século XVIII serão expressivas as mudanças sociais na Europa que assinalam a passagem do feudalismo para o capitalismo: o capital comercial passará a ter predomínio sobre a pro-priedade de terras e a produção se organiza em manufaturas, com isso o mercado se expande, fortalecendo uma burguesia com perfil mercantil e empreendedor. Todavia a sociedade ainda se organizava com base em estamentos: clero, nobreza e povo o que desencadeou conflitos cuja base era a distância entre o grande poderio econômico da burguesia e sua inexpressiva participação no poder político.

Se no período de consolidação do comércio e da manufatura, a burguesia articulou a centralização do poder em Estados Nacionais com a constituição de uma monarquia absoluta de direito divino, para enfraquecer os senhores feudais e as restrições comerciais que a divisão do território em feudos acarretava, agora importava destruir a centralização do poder político nas mãos da nobreza que onerava com pesados impostos o desenvolvimento do comércio.As revolu-ções burguesas traduzem esse movimento histórico com a vitória da burguesia sobre os valores e concepções políticas do antigo regime. No plano ideológico os valores do individualismo e da razão humana se contrapunham ao teocentrismo dominante na Idade Média e fo-ram as bases intelectuais tanto das revoluções burguesas quanto do movimento religioso que dividiu o cristianismo ocidental: a Reforma Protestante que propugnava a responsabilização do homem não só pela sua vida religiosa como pela sua vida terrena.

Todas essas mudanças trouxeram novo enfoque ao trabalho que deixará de ser considerado uma sina, um sofrimento e uma su-bordinação, para assumir os contornos ligados ao uso judicioso da

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razão humana para transformar a natureza. Contrariamente à inter-pretação da Igreja Católica de que a terra seria um bem divino cuja guarda e posse estariam destinadas aos nobres e ao clero, passou a ser difundida a idéia de que seria o trabalho, e não a vontade divina, que sustentaria o direito de propriedade.

Exemplo dessa nova interpretação é a justificativa do contrato social de John Locke, no seu livro “Segundo Tratado sobre o Governo Civil”. Para Locke (2001) o fato gerador da propriedade é o ato de to-mar uma parte qualquer dos bens que Deus oferta na terra e retirá-la do estado que a natureza a deixou mediante o trabalho. Nesse sen-tido, a interpretação de Locke antecipa a idéia de valor-trabalho de-senvolvida posteriormente pela economia política com Adam Smith (2003), David Ricardo (1982) e Karl Marx (1986). Adam Smith (2003) no seu livro “A Riqueza das Nações” se distancia da doutrina econô-mica do mercantilismo, bastante difundida pelas nações absolutistas européias, segundo a qual a riqueza das nações seria conseqüência da balança de comércio favorável e da possibilidade de acúmulo de ouro e prata. Para Smith (2003) o trabalho seria a única fonte de ri-queza das sociedades. Já David Ricardo (1982) ao distinguir valor de riqueza, destacava que o valor de um bem seria exatamente a quan-tidade de trabalho necessária à produção do mesmo.

Karl Marx ao discutir em “O capital” (livro 1 tomo 1) 3 o processo de trabalho e o processo de valorização, situa o trabalho como uma atividade essencialmente humana em que, através da ação do seu corpo e da sua mente o homem se apropria da natureza de forma útil para a sua existência. Ao atuar sobre a natureza o homem a modifica, modificando também a si próprio. O trabalho humano, ao contrário do trabalho de aranhas ou abelhas, seria dotado de intencionalidade. Dessa forma, o trabalho humano seria sempre uma atividade orienta-da para um fim. Para a concretização desses fins é preciso a matéria-prima (objeto de trabalho filtrado por meio de trabalho anterior) e os meios de trabalho (complexo de coisas que o trabalhador coloca entre si e o objeto de trabalho e que lhe serve de condutor da sua ati-vidade sobre esse objeto e também as condições objetivas para que o processo de trabalho se realize). Ao definir genericamente desta forma o trabalho e seu processo, Marx dá continuidade à tradição de pensamento que situa, do ponto de vista valorativo, o trabalho hu-mano como dotado de racionalidade e, portanto, de forma positiva.

Todavia, Karl Marx (1986), ao contrário de seus antecessores não estava preocupado apenas em desvendar o valor do trabalho ou a sua potencialidade quanto à geração de riquezas para as nações. Marx tinha o projeto de desvendar os mecanismos de exploração do homem pelo homem na sociedade capitalista. Nesse sentido, sua análise se desloca do processo geral de trabalho para a análise do processo de trabalho no capitalismo, mediante a descrição do pro-cesso de subordinação do trabalho ao capital na passagem do feu-dalismo para o capitalismo.

3 Você pode ter acesso a alguns trechos dessa obra no site: http://www.marxists.org/portugues/marx/1867/ocapital-v1/index.htm

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Marx identifica no capitalismo o processo de trabalho ao pro-cesso de consumo da força de trabalho pelo capitalista. A força de trabalho no capitalismo também é transformada em mercadoria, posto que é controlada pelo capitalista e o produto do trabalho não pertence ao produtor direto, mas ao proprietário dos meios de pro-dução. O capitalista, assim, consome o trabalhador como uma mer-cadoria. Com a aparência de relações contratuais justas, a venda da força de trabalho e os meios de produção com a forma de mercado-rias, oculta, sob o véu das relações contratuais entre capitalistas e as-salariados, as relações sociais de produção no capitalismo pautadas pela exploração do tempo de trabalho excedente (mais-valia). Com efeito, se o trabalho cria valor, e se o trabalhador recebe apenas o equivalente àquilo que é necessário à produção e reprodução da sua subsistência e à de sua família, mas trabalha mais do que o tempo necessário, o tempo de trabalho excedente (mais trabalho) cria um valor que é apropriado pelo capitalismo, constituindo o lucro (a es-sência do capitalismo). Esse processo de exploração é ocultado.

Análise marxista efetua uma ruptura nas representações sociais sobre o trabalho. Ao mesmo tempo em que se coloca na linha de continuidade da tradição que identificava o trabalho com vetor po-sitivo, posto que resultado do uso da razão humana e inerente a esta condição, rompe com as representações que o identificavam com as virtudes humanas, ao denunciar o mecanismo alienante e desuma-nizador no capitalismo: o homem está separado do seu trabalho e , além de não mais ter controle ou se identificar com ele, é confundido, ele mesmo com o que produz, se transformando em mercadoria, em coisa. Só que este mecanismo é oculto pela alienação e pela ideolo-gia, parecendo que as relações sociais de produção são justas, posto que se há compradores, há também vendedores da força de trabalho. É essa forma de exploração que distingue o capitalismo das forma-ções econômicas que o antecederam que Marx chama de “modos de produção” que são as relações sociais que os homens estabelecem para produzir aquilo que é necessário para a existência.

Referências Bibliográficas

LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo civil e outros es-critos: ensaio sobre a origem, os limites e os fins verdadeiros do go-verno civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2001.

MARX, Karl. O capital. São Paulo: Nova Cultural,1986. Livro 1. V. 1

SMITH, Adam. A riqueza das nações. São Paulo: Martins Fontes, 2003. V. 1

RICARDO, David. Princípios de economia política e tributação, com a introdução de Piero Sraffa. Apresentação de Paul Singer. Tra-dução de Paulo Henrique Ribeiro Sandroni. São Paulo: Abril Cultural, 1982. (Os Economistas).

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Atividade 2 (Prática)

a) Retome as questões iniciais e relacione-as às informações do texto, registrando suas conclusões

b) Forme grupos de estudo e faça um levantamento sobre as formas de exploração do homem pelo homem no tempo/espaço do campo brasileiro

c) Forme grupos de estudo e identifique no seu município/re-gião essas formas de exploração, registrando-as

d) Forme grupos de estudo e faça um levantamento sobre a natureza do trabalho realizado pelas famílias e alunos das Escolas do Campo do seu município/região e caracterize sua forma de se rela-cionar com o trabalho (podem ser utilizadas entrevistas, fotos, víde-os, entre outros aportes)

Atividade 3 (de Aplicação e Compromisso Social)

a) Em articulação com os demais grupos, organize um evento para divulgação das informações/registros obtidos na atividade prática.

Atividade 4

a) Assista esses trechos do filme “Tempos Modernos” de Charles Chaplin

YouTube - Charles Chaplin - Tempos Modernos (parte 1 de 9)http://www.youtube.com/watch?v=8ap7KZ_6uuU

YouTube - Charles Chaplin - Tempos Modernos (parte 2 de 9)h t t p : / / w w w . y o u t u b e . c o m / w a t c h ? v = -

u2m8sSkt4A&feature=related

b) Discuta os aspectos mais relevantes do filme, registre e dis-cuta em seu grupo de estudo

c) Agora leia e reflita sobre o texto a seguir:

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Texto 2

O trabalho no capitalismo, o planejamento e a organização do trabalho pedagógico

Profa. Gilda Cardoso de Araujo

A exploração do trabalho de um homem pelo outro não é específica do capitalismo, tendo em vista que as outras formações econômicas que o antecederam (modo de produção antigo, asiático, feudal)4 apresentam relações de produção cuja base é o antagonis-mo entre exploradores e explorados, entre opressores e oprimidos. Essa constatação pode ser encontrada no Manifesto Comunista 5 de Karl Marx e Friedrich Engels (1988), em que os autores afirmam que a história humana é a história da luta de classes. Contudo, as rela-ções de produção burguesa constituem a última forma antagônica do processo social da produção e, portanto, apresentam característi-cas mais desenvolvidas e mais variadas que as relações de produção anteriores. Nesse sentido, o pensamento de Marx e Engels pode ser traduzido com uma interpretação dos complexos processos que as-sinalam o caráter antagônico da sociedade capitalista, bem como do seu devenir histórico.

Em “Contribuição à crítica da economia política” (MARX, 2003) e em “O capital” (MARX, 1986) a unidade analítica básica da sociedade capitalista é a mercadoria que torna o processo de exploração do tra-balho de uma classe social sobre a outra, nessa formação econômica, único e original. As mercadorias servem de meios de subsistência ou de produção e se apresentam sob a forma de valor de uso e de valor de troca. As qualidades úteis de uma mercadoria determinam seu va-lor de uso, independente da existência ou da quantidade de trabalho humano que tenha sido despendido para produzi-la. Já o valor de troca das mercadorias é sempre a objetivação de uma relação social, porque sempre pressupõe a troca de diferentes bens com diferente valor de uso. Se as mercadorias são diferentes, para haver o intercâm-bio entre os consumidores, é preciso quantificar os diferentes valores dessas mercadorias, de modo a tornar possível uma relação de equi-valência entre elas. Isso só se torna possível, segundo Marx (2003, 1986), se buscarmos nas mercadorias, algo que seja comum, apesar dos seus distintos valores de uso. Esse algo comum é que daria ori-gem ao valor e a única propriedade comum a todas as mercadorias é o fato de todas serem resultado do trabalho humano. Logo o tra-balho cria valor. Mas não o trabalho geral, indistinto ... “não é o traba-lho do marceneiro, do pedreiro ou do fiandeiro ou de qualquer outro trabalho produtivo determinado” (MARX, 1986, p.62), mas sim o tra-balho humano considerado abstratamente ou o trabalho socialmen-te necessário, cujo valor é determinado pelo tempo de trabalho so-cialmente necessário para a produção de dada mercadoria que varia

4 Pesquise o significado desses modos de produção e elabore um quadro comparativo entre eles.5 Você pode ter acesso a essa obra completa em: http://www.culturabrasil.pro.br/manifestocomunista.htm

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segundo o lugar, a época, a disponibilidade de matérias-primas e as técnicas para obtê-las e transformá-las. Portanto é o caráter social do trabalho humano no capitalismo que define o valor das mercadorias.

Todavia, mesmo sendo objetivação de uma relação social, a mercadoria se apresenta dotada de autonomia o que acaba por en-cobrir o caráter social do trabalho que lhe dá origem. Esse processo de ocultação deve-se às relações contratuais entre os proprietários dos meios de produção e os que vendem a sua força de trabalho, que configuram uma aparente igualdade, com a idéia de equivalência de troca própria do mercado (em troca de salário pago pelos capitalistas os proletários vendem a sua força de trabalho por um período parcial). Contudo, não existe essa equivalência na medida em que o tempo de trabalho necessário para a produção e a reprodução das condições de subsistência do trabalhador e de sua família - que define o valor do salário- é menor do que o tempo que o trabalhador efetivamente produz. Isso significa mais trabalho, o que significa mais valor. Esse trabalho excedente ou mais-trabalho é apropriado pelos capitalistas e constituem o lucro, a essência do capitalismo, uma vez que parte desse valor do trabalho excedente passa a integrar o próprio capital, que cria assim as condições para a sua reprodução ampliada.

Se a essência do capitalismo é o lucro, advindo da exploração do trabalho daqueles que nada possuem a não ser a sua capacidade de produzir, a racionalização do processo produtivo é imprescindível para aumentar os ganhos dos proprietários dos meios de produção. Essa racionalização tem por objetivo, então, a expansão do capital mediante a ampliação da mais-valia, com o conseqüente aumento da exploração da força de trabalho. Esse aumento da exploração pode ocorrer de duas formas: pelo aumento da jornada de trabalho ou pela sua intensificação (mais-valia absoluta) ou pelo aumento da produtividade com mudanças nos processos de trabalho (mais-valia relativa).

Pelas limitações naturais da primeira forma (limitações físicas do trabalhador, quantidade de horas que tem uma jornada de traba-lho), a elevação da produtividade foi a alternativa encontrada para reduzir o tempo de trabalho necessário a produção de mercadorias, ao mesmo tempo em que se ampliava a quantidade de produtos a ser lançada no mercado. É essa alternativa que se colocou na origem da divisão técnica do trabalho que rompeu com a divisão manufa-tureira do trabalho em que “os muitos se completam mutuamente, fazendo o mesmo da mesma espécie” (MARX, 1986, p.45), mas sob o comando de um mesmo capital.

Com a divisão técnica do trabalho, a produção é dividida em numerosas operações que passam a ser realizadas por diferentes tra-balhadores, com especialização de funções. Essa especialização de funções, por sua vez, separou ainda mais o trabalhador do produto de seu trabalho, pois, se na divisão manufatureira, o produto do seu trabalho não lhe pertencia, embora todo o processo fosse realizado por ele, na divisão técnica, além de perder o produto, o trabalhador perde a referência sobre o processo de trabalho, dando lugar a uma inversão na relação homem-natureza: em vez de os meios de traba-lho servirem de mediação entre o homem e a natureza, é o próprio

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homem que serve de mediação entre os meios de trabalho e a na-tureza. Marx (2003) denuncia, assim, o processo desumanizador do capitalismo traduzido pelo conceito de alienação.

No Brasil, a Administração e o Planejamento Educacional, antes da década de 1980, apresentavam um debate com duas tendências fortemente demarcadas: a) a que defendia a reprodução da organiza-ção do trabalho empresa capitalista para a organização do trabalho pedagógico (princípios gerais da administração, eficiência e produti-vidade da escola) e; b) a negação da administração e do planejamen-to educacional como reação ao caráter autoritário das organizações nas sociedades capitalistas, propugnando o fim da autoridade e da hierarquia.

Vitor Henrique Paro (2000) apontava que ambas incorriam em equívoco, ao desconsiderar os determinantes sociais e econômicos da administração e do planejamento, tendo em vista que essas ativi-dades não se dão no vazio.

Reforçando esses argumentos o autor define a administração como utilização racional de recursos para a realização de fins deter-minados. A partir dessa definição, a administração relaciona-se, por-tanto, ao trabalho entendido como forma da relação que o homem estabelece com a natureza e como atividade orientada para um fim, destacando, a partir da matriz teórica marxista que o homem, ao transformar a natureza, também transforma a sua própria natureza.

O campo de interesse da Administração é, portanto, a raciona-lização do trabalho de uma forma geral (ainda não aquela de perfil capitalista). O homem se relaciona com a natureza em contato com outros homens. Sendo assim, a utilização racional dos recursos deve incluir também a questão do esforço humano coletivo despendido no processo de trabalho (além dos meios de produção e dos recursos conceituais). Assim, além da racionalização do trabalho a administra-ção deve levar em conta a coordenação do esforço humano coletivo. (PARO, 2000)

A questão principal é como essa coordenação do esforço hu-mano coletivo é concebida. Dessa forma o autor formula importante questão: Qual o significado do termo “recursos humanos”? Significa recursos do homem ou o homem como recurso? Em outros termos, o homem seria considerado como fim ou como meio?

Considerar o homem como fim implica, assumir a premissa bá-sica de, tê-lo como sujeito do processo, pois é a partir do domínio sobre a natureza que o homem se faz (humano). A dominação reduz o homem à condição natural (não- humana), de objeto e a relação entre os homens precisa ser de cooperação e não de dominação.

Assim a Administração e Planejamento participam das contra-dições de determinada formação histórica, pois determinam e são determinados pelas forças sociais, econômicas, políticas e culturais. No modo de produção capitalista ambos têm servido de instrumento de controle e domínio, mas podem ser instrumento de transforma-ção social.(PARO, 2000)

No capitalismo a Administração é racional apenas levando em conta os interesses das classes dominantes. No caso do planejamen-to e da organização do trabalho pedagógico e outra a natureza dos

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interesses a serem levados em conta, pois devem ser os interesses universais, ou seja, a racionalidade do trabalho deve levar em conta a função social da educação.

Uma Administração, um Planejamento e uma organização do trabalho pedagógico que tenham por princípio explícito ou implícito a dissociação entre concepção e execução típica da divisão porme-norizada do trabalho desqualificam e desumanizam todos os sujei-tos envolvidos no processo educativo (profissionais e trabalhadores da educação, pais, alunos, sociedade). Nesse modelo é importante que tanto o trabalho manual quanto o trabalho intelectual estejam submetidos ao controle do capital (gerência), com a eliminação do pensamento no processo de trabalho, ênfase na repetição e numa práxis burocratizada.(PARO, 2000)

Assim, se a organização do trabalho no capitalismo só tem fi-nalidades específicas, quais sejam o lucro e seu processo desumani-zador, não existe uma natureza ou uma especificidade do trabalho pedagógico em si mesmo, uma vez que estará ligado sempre às fina-lidades políticas e ideológicas que estiverem colocadas: dominação ou emancipação.

Marx e Engels não ficaram alheios a essa ambigüidade da edu-cação como projeto social (1992)6. O desenvolvimento da revolução industrial e o triunfo do liberalismo trouxeram a idéia do conheci-mento como condição de igualdade entre todos os cidadãos, o que determinou na Europa a institucionalização da educação mediante a atuação estatal. O Estado burguês do século XIX, para os autores, era um instrumento para a classe dominante perpetuar a sua dominação ideológica. Assim, a crítica que realizavam à educação oferecida na estreita dependência estatal, tinha relação com a possibilidade de di-fusão dos valores burgueses.

Referências Bibliográficas

MARX, Karl. O capital. São Paulo: Nova Cultural,1986. Livro 1. V. 1

MARX, Karl. Contribuição à crítica da economia política. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. O manifesto comunista. Rio de Janei-ro: Paz e Terra, 1998.(Coleção Leitura)

MARX Karl; ENGELS, Friedrich. Textos Sobre Educação e Ensino. 2. ed. São Paulo: Moraes, 1992.

PARO, Vitor Henrique. Administração escolar: uma introdução críti-ca. 9. ed. São Paulo Cortez, 2000.

6 Embora não tenham propriamente textos pedagógicos, Marx e Engels (1992) produziram textos es-parsos em suas obras sobre educação e ensino no contexto das suas críticas às situações que o capita-lismo tinha produzido. Esses textos foram traduzidos e publicados em português com o título “Textos sobre educação e ensino”.

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Atividade 5 (Prática)

a) Forme grupos e discuta e registre exemplos de organização pedagógica que reproduza, no cotidiano e nas práxis institucionali-zadas, a divisão técnica do trabalho, a dominação e a desumanização – próprias do capitalismo- nas escolas e nos sistemas de ensino.

b) Ainda em grupos discuta e registre possibilidades/alternati-vas de romper com esse modelo de organização pedagógica.

Atividade 6 (de Aplicação e Compromisso Social)

a) Elabore um roteiro de entrevista (semi-estruturada) sobre as concepções de trabalho, trabalho pedagógico, administração e pla-nejamento educacional. Entreviste diretores/pedagogos (se houver), professores e técnicos da secretaria de educação ou de superinten-dência de ensino. Categorize e analise os dados a partir das leituras realizadas.

Atividade 7

a) Forme grupos, sente em círculo, use um objeto que possa servir de “roleta”. Gire e objeto. O integrante que for apontado pelo objeto, deve responder rapidamente a uma pergunta sobre “Projeto Político-Pedagógico”, no formato “pinga-fogo”. Gire novamente o ob-jeto até que todos tenham participado da dinâmica.

b) Agora leia atentamente o texto “Pinga-Fogo” abaixo.

Texto 3

“PINGA-FOGO 7: PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO (PPP)”

Profa. Gilda Cardoso de Araujo

Em que contexto histórico (ou a partir de que concepção de escola e educação) surge a idéia de criação do PPP?

O PPP é uma forma de planejamento institucional, da escola. A atividade de planejar é antiga, mas sua sistematização se dá com

7 “Há alguns anos fez muito sucesso na televisão (TV Tupi) um programa de entrevistas com esse título. Uma personalidade era convidada para responder a perguntas sem o conhecimento prévio do conteú-do destas, porém todas dentro do campo de sua atividade ou especialidade. As perguntas pareciam, e provavelmente eram, espontâneas e não programadas, formuladas por participantes com interesse no assunto. Um caloroso debate se estabelecia mantendo vivo o interesse e que sempre terminava com o esgotamento do tempo previsto e não pelo esgotamento da material” (Extraído de http://www.grande-loja.org.br/livropingafogo.pdf acesso em 30 de março de 2010)

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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a Ciência da Administração, especificamente com a proposta de orga-nização científica do trabalho de Frederick Taylor e Henri Fayol8. Esse tipo de organização se pautava num planejamento que buscava não a melhor maneira de trabalhar, mas como controlar a força de trabalho.

Nesse sentido, o processo de trabalho se dava com a elimina-ção do pensamento e com a repetição (exemplo: filme tempos mo-dernos de Charles Chaplin). Com o surgimento do Estado interven-cionista 9, ao final da Segunda Guerra Mundial, a planificação estatal também assumirá os contornos dessa organização científica, sepa-rando o processo de elaboração do processo de execução, ou seja, se instalaram, no aparelho estatal, vários técnicos (especialistas) nos órgãos centrais e esses técnicos pensavam políticas públicas, progra-mas e projetos para os profissionais das instâncias executoras e para os usuários ( o que denominou-se de tecnocracia)10. Dessa forma, a idéia de planejamento teve (e ainda tem) uma forte associação com o lucro e com processos autoritários, verticalizados. O modelo de es-tado intervencionista entre em crise entre as décadas de 1970 e 1980 no mundo inteiro, culminando, inclusive, com a queda da maior eco-nomia planificada, a URSS. A combinação organização científica do trabalho/ economia planificada/Estado interventor passa por sérios questionamentos em âmbito mundial. O modelo de planejamento que servia de base a essa combinação também.

Assim questões importantes passam a ser debatidas: a) é pos-sível planejamento com democracia? b) o planejamento realmente interfere na realidade? c) Há possibilidade de uma participação que signifique distribuição do poder? Desses questionamentos configu-ra-se o planejamento participativo que se define pela distribuição de poder e definição conjunta de objetivos e estratégias, tendo como horizonte político a transformação pela participação e para a promo-ção da justiça social. Uma das referências pioneiras foi a da cidade de Barcelona com sua experiência de Planejamento Estratégico de Cidades – através, principalmente, do urbanista Jordi Borja.

Várias outras cidades do Brasil e da América Latina se pautaram no final dos anos 1980 e início dos anos 1990 por essa experiência de planejamento participativo, sendo que participação assume, nesse modelo, o sentido de responsabilidade coletiva não somente pelas decisões, mas também pela execução, fiscalização e avaliação.

No Brasil, do final da década de 1970 a meados da década de 1980, passávamos pelo período de abertura política após a Ditadu-ra Militar. Do contexto da campanha pelas “Diretas Já” até a promul-gação da Constituição Federal de 1988, muito se debateu sobre a excessiva centralização e planificação do Estado Brasileiro, sobre a necessidade de descentralização e democratização dos serviços pú-blicos. Nesse contexto, foi decisiva a atuação do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública para a inscrição do princípio da “gestão de-mocrática do ensino público” na CF de 1988 ( Inc. IV do Art. 206). Ges-

8 Pesquise e registre a biografia e as contribuições de Frederick Taylor e Henri Fayol. 9 Pesquise as diferenças entre Estado Liberal, Estado Intervencionista e Estado Neoliberal. Registre e organize um quadro comparativo.10 Sobre o conceito de Tecnocracia leia o Texto: HORTA, José Silvério Baia. Planejamento educacional. In: MENDES, Dumerval Trigueiro et al. Filosofia da educação brasileira. 5.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1994.

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tão democrática implica em participação e autonomia da comunidade escolar, rompendo com a lógica da centralização, da planificação, da tecnocracia e da separação entre elaboração e execução. Daí a estreita ligação entre PPP e a metodologia do planejamento participativo com um conjunto de modelos, processos, instrumentos e técnicas para a autonomia pessoal e coletiva. Foi por isso que a LDB, regulamentando o princípio constitucional da gestão democrática estabeleceu que:

Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: I - elaborar e executar sua proposta pedagógica;VI - articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola; VII - informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta pedagógica.

Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de: I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a pro-posta pedagógica do estabelecimento de ensino;VI - colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade.

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação bá-sica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I - participação dos profissionais da educação na elabo-ração do projeto pedagógico da escola; II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.

Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e admi-nistrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.

Qual é a relação entre o global e o local com o PPP?A instituição escolar integra a sociedade e ao mesmo tempo

tem suas especificidades. Professores, alunos, funcionários e pais são atores sociais que interagem com a realidade, criando e disseminan-do representações, valores, crenças e culturas, enfim, modos de ser, pensar, agir e estar no mundo. A escola é uma instituição com mar-cada função socializadora e, portanto, o tempo todo cria e difunde, com distintos níveis de consciência, valores e atitudes. Assim, ques-tões como meio-ambiente, violência, tráfico de drogas, consumismo, preconceito, cidadania, direitos humanos, entre outras circulam no ambiente escolar do mesmo modo que circulam na sociedade. O PPP permite que essa circulação aconteça com um nível de intenciona-lidade e consciência maior, possibilitando à comunidade escolar a reflexão, a escolha e a ação sobre questões sociais consideradas re-

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levantes para aquela escola, naquele determinado contexto e tempo histórico. É por isso que afirmamos que o PPP é a identidade da esco-la, pois as distintas comunidades escolares, com seus distintos atores sociais são protagonistas na definição sobre qual sociedade, qual es-cola, e que tipo de homens e mulheres queremos para o futuro.

O que deve conter o PPP?A resposta a pergunta anterior indica que o PPP é uma tomada

de posição em relação à identidade institucional da escola. Isso signi-fica que a comunidade escolar deve avaliar:

1 - a situação da instituição em seus aspectos valorativos, curri-culares e organizacionais;

2 - refletir sobre as mudanças necessárias a partir da relação teoria-prática (estabelecer metas/ideais a serem atingidos);

3 - planejar como essas mudanças acontecerão nas dimensões valorativas, curriculares e organizacionais.

Assim, o documento, sistematizado a partir da metodologia do planejamento participativo, deve conter três partes: o diagnóstico (re-lação teoria-prática/ real-ideal), a programação e avaliação com estra-tégias de re-elaboração do PPP (metas e ideais a serem alcançados).

Quem deve elaborar o PPP?A comunidade escolar. Muito genérico, não? Daí a necessidade

de conhecermos minimamente a metodologia do planejamento par-ticipativo. Como fazer? Em primeiro lugar deve surgir a necessidade (que, pela nossa cultura centralizadora, geralmente vem da direção ou dos órgãos centrais). Discutida e validada a necessidade, o gestor tem um papel estratégico de sensibilização e de preparação da co-munidade escolar para participação no processo, discutindo e pro-pagando o sentido e a relevância do PPP. Então temos o momento de decisão DA COMUNIDADE ESCOLAR, coletivamente. Se a comuni-dade não tiver vontade política de se engajar na elaboração do PPP, este não passará de mero formalismo.

Agora se o grupo manifestar essa vontade política, o início do processo é a problematização, ou seja, trazer questões teóricas e po-líticas que desequilibrem aspectos valorativos, curriculares e organi-zacionais cristalizados, sobre os quais não refletimos e que repetimos sem muitos incômodos. Essa etapa de problematização envolve três modos de trabalho: individual (participação em reuniões, respostas a questionários, respostas a perguntas ), grupal (organização das idéias expressas individualmente, juntando as respostas por perguntas e dividindo-as pelos grupos para análise) e plenário onde compartilha-se e decide-se tudo o que foi discutido e sistematizado.

É importante ter uma comissão/grupo de trabalho que orga-nize as discussões grupais antes de levá-las ao plenário. Essa mesma comissão/grupo redigirá a versão final do documento que voltará para aprovação do plenário. A versão final deve refletir o processo de de-bate, para que todos se reconheçam no documento e também deve primar por aspectos técnicos e de conteúdo, mas sem perfeccionismo, pois o projeto é dinâmico e deve estar em constante revisão.

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O PPP deve ser revisto? Quando?Pela resposta anterior, sempre!!! De que forma? As metas/ideais

(com base nos aportes teóricos discutidos) definidos pela comunida-de escolar podem ser de curto, médio e longo prazo. As de médio ou longo prazo podem ser revistas no prazo de 2 a 4 anos. O diagnóstico e a programação da escola devem ser revistos anualmente, até para a comunidade escolar dimensionar os avanços e os limites do processo.

Até que ponto vai a autonomia da escola? O PPP não tem que estar vinculado às políticas da Secretaria?

Autonomia não é soberania. Autonomia é a capacidade de governar-se a si mesmo, liberdade ou independência moral ou inte-lectual. Autonomia é sempre relativa, ao contrário da soberania que é o poder ou a autoridade sem restrição nem neutralização. O Brasil é uma federação e as escolas integram sistemas estaduais ou muni-cipais que, por sua vez, integram o sistema nacional de educação. Quanto ao sistema nacional, o PPP não pode ferir a CF de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e que são instrumentos de garantia do direito à educação dos brasileiros. Quanto aos sistemas estaduais e munici-pais, também têm que obedecer a esses instrumentos que garantem, além do direito à educação, a gestão democrática e a autonomia da escola. Assim, a escola não pode, por exemplo, definir em seu PPP que o ano letivo terá 150 dias de 3 horas ou que haverá expulsão ou recusa de matrícula de alunos. Porém, aos sistemas estaduais e municipais é vedada a imposição de políticas, programas e medidas que solapem a capacidade de autogoverno das escolas, uma vez que o princípio constitucional da gestão democrática é PARA O ENSINO PÚBLICO, ou seja, essas políticas, programas e medidas devem ser deliberadas em conferências estaduais/municipais de educação e/ou pelos conselhos estaduais/municipais de educação que contam com representantes de todos os segmentos da comunidade escolar.

Atividade 8 (Prática)

a) Forme grupos, discuta e registre as dificuldades para elaboração, implantação, acompanhamento e avaliação do PPP.

b) Com base nos textos 1, 2 e 3 desse módulo, elabore um texto (in-dividual) que justifique e sustente a importância da elaboração, im-plantação, acompanhamento e avaliação do PPP.

c) Pesquise, avalie e registre no mínimo três documentos de PPP, ana-lisando a perspectiva de reprodução ou transformação social.

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Atividade 9 (de Aplicação e Compromisso Social)

a) Faça um levantamento em sua região ou município sobre a si-tuação do PPP nas escolas. Existe? Se existe como foi formulado? É acompanhado e avaliado de que forma?

b) Em grupos proponha um evento/momento para divulgar os resul-tados do levantamento e propor junto com outros atores sociais (se-cretarias, superintendências, movimentos sociais, professores, pais, alunos) alternativas para aprimorar o incentivo e a oferta de condi-ções adequadas para a elaboração, implantação, acompanhamento e avaliação do PPP nas escolas da região ou do município.

Atividade 10

a) Leia os trechos dos artigos abaixo da LDB:

Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: I - elaborar e executar sua proposta pedagógica

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrá-tica do ensino público na educação básica, de acordo com as suas pecu-liaridades e conforme os seguintes princípios: I - participação dos profissionais da educação na elaboração do proje-to pedagógico da escola;

b) Qual a diferença entre PPP, projeto pedagógico, proposta peda-gógica?

c) O que significa PPP e PDE (Plano de Desenvolvimento da Escola)?

d) Agora leia atentamente o texto abaixo.

Texto 4

“PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO: A GRANDE ARTICULAÇÃO”

Profa. Gilda Cardoso de Araujo

Etimologicamente “projeto” é uma palavra que vem do latim “projectu” que é o particípio passado do verbo “projicere” que signifi-ca lançar para diante, plano, intento, desígnio. É o planejamento que concretiza, em planos e projetos, a idéia, os objetivos e a seqüência de ações vislumbradas. Nesse sentido, o planejamento é uma ferra-menta que permite transformar idéias em ações.

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Há diferentes tipos de planejamento que serão utilizados con-forme os objetivos que a instituição pretenda alcançar. A atividade de planejar é antiga, mas sua sistematização se dá com a emergência da ciência da administração - a partir da influência de Taylor e Fayol e seu modelo de organização científica do trabalho - e sua dissemina-ção tem origem na planificação estatal da economia levada a termo pela URSS.

Por causa dessas origens e da forma de disseminação da ativi-dade, o planejamento assim teve (e ainda tem) forte associação com o lucro e com processos autoritários (separação entre elaboração e execução). Essa predisposição empresarial e autoritária do planeja-mento fez com que houvesse na área de educação duas tendências: a incorporação acrítica dos seus pressupostos e métodos e a posição pela qual o planejamento não serviria para determinados tipos de instituições sociais como a escola

Contudo, na década de 1980 e 1990 surgem questões que re-lativizam essas tendências buscando no planejamento instrumentos para a democratização e para a transformação social. As questões que passaram a ser colocadas, segundo Danilo Gandin (1994) eram: 1- é possível planejamento com democracia?, 2-O planejamento re-almente interfere na realidade?, 3-Há possibilidade de uma participa-ção que signifique distribuição do poder?

A resposta a estas questões configurou o planejamento par-ticipativo que, junto com o planejamento estratégico e o gerencia-mento da qualidade total, representam as tendências atuais de pla-nejamento que se fazem, explícita ou implicitamente, presentes na elaboração dos projetos político-pedagógicos das escolas brasileiras.

O planejamento estratégico é bastante difundido nas empresas como forma de obtenção de lucro, produtividade e competitividade. O objetivo do planejamento estratégico é a afirmação e a estabilida-de da empresa no mercado, mediante a análise das oportunidades. Nesse sentido, os recursos da empresa são mobilizados no âmbito global visando atingir objetivos definidos previamente. Dessa forma, com a “missão” da empresa estabelecida a priori, o nível de participa-ção, embora exista, é muito baixo, porque na verdade deve servir aos objetivos ligados à lógica do capital, ou seja, não está dada a possibi-lidade de participação na definição dos objetivos nem a distribuição do poder. Da mesma forma, o objetivo do Gerenciamento de quali-dade total é a satisfação do cliente, portanto, o objetivo também é estabelecido a priori e, nesse sentido, o planejamento deve buscar alternativas para a solução de problemas, enfatizando a dimensão técnica do “como” e do “com o que fazer”, com um nível de participa-ção apenas instrumental.

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Quadro 1

Gestão da Qualidade Total Planejamento Estratégico Planejamento Participativo

finalidade do planejamento é satisfazer o cliente

afirmação e estabilidade no mercado

transformação para a justiça social

solução de problemas analisar oportunidades desenvolver processo técnico para projeto político

análise do como e com o que fazer (dimensão

técnica)

estabelecimento da missão, mas ênfase na

dimensão técnica)

referencial precede o diagnóstico que serve para

avaliação da prática

servem aos objetivos ligados à lógica do capital, o que dificulta muito a participação na definição dos objetivos

pressupõe distribuição do poder e definição conjunta de objetivos e estratégias

Elaborado pela autora

Para Gandin (1994), o planejamento participativo tem a fina-lidade de transformação e justiça social, sem prescindir do desen-volvimento de processos técnicos de planejamento para o alcance de finalidades políticas. Essas finalidades políticas não são dadas a priori, pois o planejamento participativo pressupõe distribuição do poder e definição conjunta de objetivos e estratégias. Dessa forma, o planejamento participativo tem um conjunto de modelos, proces-sos, instrumentos e técnicas para a autonomia pessoal e coletiva com a construção do referencial, a avaliação da prática, a proposição e a realização de uma nova prática (trabalho individual, em pequenos grupos e plenário).

A partir dessa caracterização, Danilo Gandin (1988) conclui, en-tão, que o planejamento estratégico e o planejamento para a quali-dade total seriam mais adequados para instituições que visam o lu-cro, a produtividade e a competitividade, enquanto o planejamento participativo seria adequado às instituições sociais. Essa não parece uma conclusão muito pertinente, porque parte do pressuposto in-gênuo que as instituições sociais não são perpassadas pela lógica do capital, mas, de toda forma, no campo valorativo, podemos nutrir esse princípio e defender para instituições sociais, como é o caso da escola, um projeto político-pedagógico com base nos princípios e na metodologia de um planejamento participativo.

Além das distintas tendências de planejamento que informam a elaboração dos projetos político-pedagógicos, existe o problema de terminologia que, em alguns casos, são apenas utilização de di-ferentes termos para o mesmo significado, mas, em outros, se trata de diferentes significados para diferentes termos, de acordo com as concepções de planejamento que estejam na base do processo de elaboração.

A variedade terminológica se apresenta na própria LDB que es-tabelece nos seus Arts. 12 e 13, respectivamente, que a escola deverá elaborar e executar a sua “proposta pedagógica” e que os docentes de-vem participar da sua elaboração e no Art. 14 , que define os princípios

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da gestão democrática nos sistemas de ensino, o “projeto pedagógico” deverá contar com a participação dos profissionais da educação.

Se a confusão de termos está na própria lei que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, no campo teórico ela é ainda mais presente, pois encontramos autores que defendem a utilização do termo projeto político-pedagógico, como Danilo Gandin (1984, 1988, 1999) ,Ilma Veiga (1995, 1998) e Celso Vasconcellos (1999), ar-gumentando que antes de um documento de definição de ações o projeto da escola é uma opção de natureza política-ideológica, há autores, como Vasco Moretto (2007), que acreditam que o político é uma redundância tendo em vista que o termo “pedagógico” já englo-baria o político, uma vez que qualquer ato ou princípio pedagógico seria em si mesmo uma opção política. Há ainda autores, como José Carlos Libâneo (2004), que defendem a utilização do termo projeto pedagógico-curricular significando aí que o currículo seria um des-dobramento do projeto pedagógico, numa interação entre finalida-des pedagógicas e concretização curricular.

Em que pese a variedade de terminologia, nos parece que a LDB e todos esses autores, em maior ou menor grau, definem o pro-jeto da escola no seu conteúdo político em estreita correlação com o pressuposto da autonomia relativa como anulação da dependência em seus vários níveis: administrativo (elaboração e gestão de planos, programas e projetos), jurídico (elaboração de suas próprias normas e orientações escolares), financeiro (condições materiais de funciona-mento efetivas , capacidade de elaborar e executar orçamento) e pe-dagógica (liberdade de ensino e pesquisa). Nesse sentido, em maior ou menor escala, se o pressuposto é a autonomia como expressão da cultura e da liberdade da escola, essas terminologias todas estariam informadas por um modelo de planejamento participativo.

Contudo, ultimamente alguns sistemas estaduais e municipais de ensino vêm aderindo ao Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE), uma das linhas centrais de atuação do FUNDESCOLA, que é um programa do Ministério da Educação, co-financiado pelo Banco Mundial. O PDE declaradamente que é um processo gerencial de pla-nejamento estratégico,cujo objetivo é aprimorar a gestão da escola para que possa melhorar a qualidade do ensino que oferece e garan-tir maior eficiência e eficácia nos processos que desenvolve. Para a elaboração do PDE, a escola conta com uma metodologia de planeja-mento detalhada em todas as suas fases no manual “Como elaborar o Plano de Desenvolvimento da Escola”. A preocupação com “o produ-to” ou com os “resultados” não é escondida, mas ainda assim observa-se grande confusão por parte de professores e técnicos dos órgãos centrais estaduais e municipais de educação ao associar o PDE com o PPP, sem se darem conta que os modelos de planejamento e, portan-to, os pressupostos de autonomia que informam o PDE e o PPP são distintos, pois o primeiro já definiu a “priori” a missão da escola (efi-ciência e eficácia), enquanto o PPP parte da cultura da escola como condicionante da autonomia da escola e esta como condicionante da autonomia escolar.

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Atividade 11 (Prática)

a) Compare um projeto político-pedagógico e um plano de desen-volvimento da escola e faça uma análise a partir das reflexões trazi-das pelo texto.

Atividade 12 (de Aplicação e Compromisso Social)

a) Pesquise sobre o PDDE campo no site no FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) www.fnde.gov.br e produza um texto sobre a distinção entre a proposta deste programa e a proposta da elaboração do projeto político pedagógico discutida no texto.

Referências Bibliográficas

GANDIN, Danilo. Escola e transformação social. 4 ed. Petrópolis : Vozes, 1988.

___. A prática do planejamento participativo. 7 ed. Petrópolis : Vo-zes, 1994.

GANDIN, Danilo, GANDIN, Luís Armando. Temas para um projeto político-pedagógico. Petrópolis : Vozes, 1999.

LIBÂNEO, José Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prá-tica. 5.ed. Goiânia: Editora Alternativa, 2004.

MORETTO, Vasco P. Planejamento: planejando a educação para o de-senvolvimento das competências. Petrópolis: Vozes, 2007.

VASCONCELOS, Celso dos Santos. Planejamento: projeto de ensino-aprendizagem e projeto político pedagógico. 5.ed. São Paulo: Liber-dad, 1999.

VEIGA, Ilma Passos A. (Org.). Projeto político-pedagógico da escola:uma construção possível. 6. ed. Campinas: Papirus, 1995.

VEIGA, Ilma Passos A., RESENDE, Lúcia Maria Gonçalves de. (Org.). Escola: espaço do projeto político-pedagógico. Campinas: Papirus, 1998

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Texto 5

UMA PARADA PARA APROFUNDAMENTO

Profa. Gilda Cardoso de Araujo

A seguir temos três exercícios de aprofundamento sobre a importância do trabalho coletivo. O primeiro requer uma sistemati-zação sobre a importância do trabalho coletivo e do projeto políti-co-pedagógico. O segundo reforça a idéia da importância do plane-jamento e da organização do trabalho pedagógico para o trabalho coletivo e para o planejmento educacional, base do projeto político-pedagógico. O terceiro indica a leitura de um texto e seu respectivo fichamento.

EXERCÍCIO DE APROFUNDAMENTO 1

Atividade 13

Leia os textos do quadro abaixo e escreva um artigo de opinião com 2.500 caracteres com o objetivo de convencer seus colegas de traba-lho sobre a importância do trabalho coletivo e do projeto político-pedagógico:

Sobre gansos e equipesQuando você vê gansos voando em formação de V, pode ficar

curioso quanto às razões pelas quais eles escolhem voar dessa forma. A seguir, apresentamos algumas constatações feitas por pesquisado-res em relação a esse fato.

Fato Verdade

- À medida que cada ave bate as suas asas, ela cria uma sustentação para a ave seguinte. Voando em formação V, o grupo inteiro consegue voar pelo me-nos 71% a mais do que se cada ave voasse isolada-mente.

- Sempre que um ganso sai da formação, ele repenti-namente sente a resistência e o arrasto de tentar voar só e, de imediato, retorna a formação para tirar van-tagem do poder de sustentação da ave à sua frente.

- Quando o ganso líder se cansa, ele reveza, indo para a traseira do V, enquanto outro assume a ponta. Os gansos de trás grasnam para encorajar os da fren-te a manter o ritmo e a velocidade.

- Quando um ganso adoece ou se fere e deixa o grupo, dois outros gansos saem da formação e o seguem, para ajudá-lo e protegê-lo. Eles o acompa-nham até a solução do problema e, então, reiniciam a jornada os três ou juntam-se a outra formação, até encontrar o seu grupo original.

- Pessoas que compartilham uma direção comum e um senso de equipe chegam ao seu destino mais depressa e facilmente porque se apóiam na confiança de cada um em relação às outras.

- Existe força, poder e segurança em grupo quando se viaja na mes-ma direção com pessoas que com-partilham um objetivo comum.

- É vantajoso o revezamento de li-deranças quando se necessita fazer um trabalho árduo. Todos precisam do apoio ativo e do encorajamento dos companheiros.

- A solidariedade nas dificuldades é imprescindível em qualquer situ-ação.

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Atividade 14 (Prática)a) Compartilhe o texto com sua turma com o objetivo de obter opi-niões sugestões.

Atividade 15 (de Aplicação e Compromisso Social)a) Divulgue seu texto em revistas da área educacional, jornal, mural de escolas, secretarias, movimentos sociais e/ou onde tiver espaço para a reflexão sobre o tema.

EXERCÍCIO DE APROFUNDAMENTO 2

Atividade 16

a) Responda e discuta: de quem é a responsabilidade pela elabora-ção do PPP?b) Leia o texto abaixo com atenção

“Todos é igual a ninguém”

Era uma vez uma escola que tinha Quatro funcionários chamados:Todo Mundo, Alguém, Qualquer Um,Ninguém.

Havia o PPP a ser feitoE Todo Mundo estava certoDe que Alguém o faria

Qualquer Um poderia tê-lo feitoMas Ninguém o fez.

Alguém ficou zangado com isso,Pois era um trabalho de Todo Mundo.

Todo Mundo pensou que Qualquer Um poderiaFazê-lo, mas Ninguém imaginouQue Todo Mundo não o faria.A história termina com Todo Mundo culpando Alguém quando realmente Ninguém poderia responsabilizar Qualquer Um.

Atividade 17 (Prática)

a) Analise essa história comparando-a com as relações cotidianas da sua escola. Como é realizado o planejamento? Como são distribuídas as tare-fas? Em sua experiência a situação da história já ocorreu? Como foi?

Atividade 18 (de Aplicação e Compromisso Social)

a) O que deve ser feito para evitar situações como essa? Como essas recomendações podem ser aplicadas ao momento de construção, acompanhamento e avaliação do PPP?

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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EXERCÍCIO DE APROFUNDAMENTO 3

Atividade 19

a) Vá até o site www.scielo.br e baixe o seguinte texto:VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Inovações e projeto político-peda-gógico: uma relação regulatória ou emancipatória?. Cad. CEDES, dez. 2003, vol.23, no 61, p.267-281. ISSN 0101-3262.b) Leia atentamente o texto e faça um fichamento das principais idéias e conceitos.

Atividade 20

a) Discuta em grupos: Como e por onde começar a elaboração do PPP? Quais expectativas podemos ter? Quais são os desafios/dificul-dades a serem enfrentados?b) Agora leia atentamente os pontos abaixo:

Texto 6

PONTO E BORDADOS: COMEÇANDO A TECER O PPP DAS ESCOLAS CAMPESINAS

Profa. Gilda Cardoso de Araujo

1 - Todo projeto possui uma intencionalidade. O PPP é definido como norteador das ações educativas escolares, que estão vincula-das a um projeto histórico social mais amplo.

2 - Refletir sobre o papel político e pedagógico da escola implica em reconhecer a educação como ato político (ou reforça a ideologia dominante ou desvela os mecanismos de dominação). A educação traz em si essa contradição. A educação tem sempre intencionalida-de, porque é uma prática social.

3 - Educação é perpassada por valores. O modo como o gestor e o educador se posicionam diante da realidade, como participam da história, como concebem o saber, a relação que estabelecem com os alunos e com a própria comunidade escolar reflete saberes, culturas e valores adquiridos ao longo de sua história de vida.

4 - O PPP traz essas marcas, uma vez que não existe neutralida-de no fazer pedagógico.

5 - O termo Projeto Político-Pedagógico nasce nos anos 80 com o intuito de se contrapor à visão burocrática e técnica do planeja-mento educacional.

6 - Três características do PPP: antecipação do futuro, dimen-são utópica e prática social coletiva. Por isso não é produto ou plano como freqüentemente é compreendido.

7 - O PPP é a relação dialética entre o instituído e o instituinte. 8 - Não deve ser compreendido, portanto, como mera formali-

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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dade que não orienta a prática efetiva da escola.9 - O PPP apresenta duas perspectivas: como ação regulatória

ou técnica ou como ação emancipatória ou edificante. 10 - O PPP numa perspectiva emancipadora traduz: democra-

tização da escola, inclusão, diálogo, cooperação, negociação, partici-pação, autonomia, legitimidade na formação da vontade geral, unici-dade e coerência no processo educativo.

11 - A construção do PPP da escola pressupõe diferentes con-cepções e metodologias de planejamento, conforme quadro abaixo:

Itens de análise Estratégico-empresarial Educação emancipatória

Escola

Bancária, cartorial e padronizada, pode ser:- mercoescola, submissa aos valores do mercado;- voltada para formar clientes e con-sumidores;- privatista;- excludente.

Emancipadora e cidadão pode ser:- estatal quanto ao seu funciona-mento;- democrática quanto à gestão; - pública quanto à destinação;- inclusiva

DesafioGarantir qualidade formal, a fim de aumentar o desempenho da escola por meio do planejamento eficaz.

Garantir a qualidade técnica e política para todos.

Pressupostos

O pensamento separado da ação.O estratégico separado do operacional.A separação dos pensadores dos concretizadores.A separação dos estrategistas das estratégias.

Unicidade da teoria e da prática.Ação consciente e organizada.Participação efetiva da comuni-dade escolar e trabalho coletivo.Articulação escola - família - co-munidade.

Gestão

Processo autoritário de tomada de de-cisões.

Construída numa relação política ver-tical Estado-direção e professores.

Baseada na separação no tempo e na posição funcional dos professores.

Autonomia decretada, palavra de or-dem e vazia de significado.

Processo democrático para construir um caminho real de qualidade do ensino.

Construída numa colaboração participativa e num projeto co-letivo gestado com a presença efetiva de toda a comunidade escolar.

Autonomia construída, social e politicamente, pela interação dos diferentes protagonistas.

Currículo e conhecimento

Currículo homogêneo é uma estra-tégia para a padronização que con-solida a exclusão.

Conhecimento como produto pron-to e acabado, podendo ser transmi-tido e arquivado por meio da repeti-ção e da memorização.

Currículo como instrumento de compreensão do mundo, de transformação social e de cunho político-pedagógico.

Conhecimento como um pro-cesso de construção permanen-te, interdisciplinar e contextuali-zado, fruto da ação individual e coletiva.

Avaliação

Visa aferir e controlar a qualidade por meio de instrumentos técnico-burocráticos e aplicados por grupos estratégicos articulados em diferen-tes níveis da esfera administrativa.

Visa à emancipação, voltada para a construção do sucesso escolar e a inclusão, como prin-cípio e compromisso social.

Fonte: VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Inovações e projeto político-pedagógico: uma relação regu-latória ou emancipatória?. Cad. CEDES, dez. 2003, vol.23, no 61, p.267-281. ISSN 0101-3262.

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12 - “... a teoria (plano) deve ser a melhor possível, não caindo, porém, na ingenuidade de imaginar que basta planejar para aconte-cer: há toda uma luta ideológica, política, econômica, social para ser enfrentada, seja consigo mesmo, com seus colegas de trabalho, com os educandos, com as famílias e com as instituições em geral.” (Celso Vasconcellos, 1999).

13 - Dificuldades na construção do PPP: a) comodismo por par-te dos sujeitos; b) imediatismo; c) perfeccionismo; d) falta de espe-rança/confiança na instituição; e) formalismo; f ) falta de experiência de trabalho coletivo; g) rotatividade das pessoas; h) falta de condi-ções objetivas de espaço-tempo para encontro i) elaboração e acom-panhamento; j) falta de exercício democrático na escola. Também há a visão burocratizada de planejamento e a desarticulação entre o projeto e as ações na sala de aula.

14 - Roteiro de planejamento para a elaboração do PPP:

1. APRESENTAÇÃOIdentificaçãoBreve históricoPPPO que é? Justificativa para a sua necessidade e exigências da LDBObjetivosComo foi construídoComo está constituído (partes e integração entre elas)

2. MARCO REFERENCIAL

2.1 Marco referencial geral2.1.1 Visão de homem, de sociedade e de mundo (ideais)2.1.2 Grandes princípios e valores humanos2.1.3 Princípios de democracia2.2 Marco referencial específico da educação2.2.1 O que se entende por educação?2.2.2 Como se define a escola? Para que e a quem ela serve? Para que ela forma?2.2.3 Qual o papel dos pais e da sociedade na educação?2.2.4 Qual a teoria de aprendizagem adotada pela escola?2.2.5 Como a escola compreende o currículo escolar?

3.DIAGNÓSTICO

3.1.1 Conjuntura (mundo, Brasil e educação)3.1.2 Município e bairro (história, situação política, econômica, social, cultural etc.)Atores da escola: alunos, professores, equipe pedagógica, funcionários,conselho etc. (número, formação, perfil sócio-econômico, interpretação sobre o trabalho realizado pela escola)Dimensão pedagógica da escola (proposta pedagógica, currículo, processo de ensino-aprendizagem e resultados)Dimensão comunitária da escolaDimensão administrativa da escolaInfraestruturaFinanciamento da escola

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4. PROGRAMAÇÃO

4.1 Metas4.2 Prioridades4.3 Detalhamento das ações (curto, médio e longo prazos)4.3.1 Justificativa4.3.2 Objetivos4.3.3 Metodologia4.3.4 Responsáveis4.3.5 Recursos4.3.6 Cronograma

5. AVALIAÇÃO DO PPP

5.1 processual e sistemática5.1.1 AcompanhamentoAvaliação do PPP em suas etapas e no final do período letivo

4 - O maior desafio é a criação de uma cultura de participação e de reflexão crítica sobre a prática. É importante compreender os pro-cessos de exclusão que a escola produz e que nós produzimos (atitu-des, comentários desrespeitosos, preconceituosos e de valor negati-vo e até agrupamento de alunos; medicalização/psicologização dos processos de ensino-aprendizagem; não sabemos/queremos lidar com as diferenças, por exemplo dos afrodescendentes, indígenas, mulheres, homossexuais, trabalhadores pobres e não escolarizados).

Atividade 21 (prática)

a) Escolha um dos pontos do texto e discorra com aprofundamento.

Atividade 22 (de Aplicação e Compromisso Social)

a) Elabore um Plano de Trabalho para a elaboração, acompanhamen-to ou avaliação do PPP da sua escola.

Atividade 23

a) Discuta com seu grupo as seguintes questões: o que deve ser en-sinado nas escolas do campo? Que tipo de cidadão ou trabalhador os alunos do campo devem ser ou devem se tornar? Utilize o texto a seguir.

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Texto 7

TRABALHO PEDAGÓGICO, FORMAÇÃO E CURRÍCULO

Profa. Gilda Cardoso de Araujo

Junto com o processo de industrialização e a ampliação da es-colarização com a inclusão de contingentes cada vez mais amplos da população iniciou-se, nos Estados Unidos dos anos 1920, um movi-mento no âmbito da administração da educação para racionalizar os resultados educacionais que deveriam ser criteriosamente especifi-cados e medidos, nos moldes da racionalização da empresa capitalis-ta e sua administração científica do trabalho propugnada por Taylor e Fayol. O pioneiro desse movimento foi Bobbitt com a publicação em 1918 do livro “The Curriculum”.

Iniciava-se toda uma história da teorização sobre o currículo cujo cerne são as questões: o que deve ser ensinado? O que os alu-nos devem ser ou devem se tornar? Dessa forma, a teorização sobre o currículo esteve estreitamente vinculada com a questão da formação de um tipo de ser humano desejável para um determinado tipo de sociedade.

Etimologicamente a palavra curriculum vem do latim e significa “pista de corrida”. As questões discutidas pelas teorias do currículo são questões relativas ao que essa pista deve ter para nos tornarmos os seres humanos desejados por determinada formação social. Ou seja, o que devemos aprender para a nossa formação.

Existem muitas classificações quanto aos tipos de currículo se-gundo a concepção de sociedade, conhecimento e homem que se quer formar. Essas concepções têm relação com a forma que lidam com as questões relativas ao poder e ao sujeito no processo de en-sino aprendizagem. Descreveremos algumas dessas tipologias, para concluir que, em linhas gerais, acabam por traduzir a ambigüidade da educação como projeto social e a bifurcação dos objetivos da es-colarização da população em duas tendências opostas: a de domi-nação (controle ou conservação) social e a de emancipação humana (democratização, participação). Em outras palavras as tipologias se dividem quanto à resposta para a questão de qual deve ser a finali-dade da educação: ajustar as crianças e os jovens à sociedade tal qual ela existe ou prepará-los para transformá-la? Preparar para a econo-mia ou para a democracia?

José Luiz Domingues, num artigo publicado em 1986 na Revista de Estudos Pedagógico intitulado “Interesses humanos e paradigmas curriculares” se apóia em Habermas para classificar os tipos de cur-rículos segundo os interesses sociais, econômicos, éticos e culturais em disputa na sociedade. Segundo o autor teríamos, então uma con-cepção objetivista de currículo com uma clara analogia entre o pro-cesso orientador da escola e o da indústria, sendo o professor sujeito do processo de ensino e o aluno considerado uma matéria bruta a ser transformada em produto útil e com preocupações voltadas para

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a dimensão técnica . Os principais representantes dessa concepção são respectivamente Bobbitt e Ralph Tyler que, em 1949, seguindo os passos de Bobbitt publica “Princípios Básicos de Currículo e Ensino”.

Domingues critica essa concepção de currículo afirmando que, embora haja uma pretensa neutralidade, o interesse subjacente é o controle, pois as decisões sobre o que ensinar são tomadas a priori e separadas das decisões sobre como deve ser ensinado.

A segunda concepção descrita por Domingues é a subjetivista, com um currículo centrado nas experiências dos alunos e nas suas necessidades latentes ou manifestas. O conhecimento nesta concep-ção seria resultado de uma comunicação intersubjetiva. Ao professor compete ir junto, mas lhe é vedado interferir, seja para estabelecer o programa, seja para exigir conhecimentos. Domingues critica essa concepção destacando que ela acaba por negar a escola como es-paço destinado à socialização do saber sistematizado, criando obs-táculos para as classes populares terem acesso à cultura e ao saber contemporâneo.

A terceira e última concepção, segundo o autor, seria a praxio-lógica em que o currículo está vinculado à totalidade social, é histo-ricamente situado e culturalmente determinado, enfatizando os atos políticos necessários para a transformação social. Nessa concepção, o professor é considerado o mediador entre o aluno e o conhecimento e não tem nem uma relação autoritária nem anárquica com os seus alunos. Também se preocupa com os aspectos relativos às experiên-cias escolares que possam reproduzir a hegemonia da classe domi-nante ou que possam se constituir em contra-hegemonia (currículo oculto).

Ilma Veiga no livro “Escola fundamental, currículo e ensino” pu-blicado no início da década de 1990, discute a face conservadora e a face progressista da escola, destacando os aspectos curriculares e da prática pedagógica em ambas as faces. Assim, para a autora a face conservadora da escola partiria de um currículo que preparasse o homem para o desempenho de papéis sociais, reforçando as desi-gualdades ao pretender igualar indivíduos desiguais. Transmite co-nhecimentos abstratos e autônomos como se fossem independentes da realidade social e política. Pressupõe uma organização extrema-mente racionalizada do trabalho pedagógico, em que o professor é apenas um executor, perdendo o controle do seu trabalho. A ênfase recai no estabelecimento de objetivos ou listas de conteúdos desvin-culados da realidade.

Já a face progressista leva em consideração o fato de a edu-cação escolar ser parte integrante da sociedade, mas colabora na divulgação de uma nova concepção de mundo, trabalhando pela emancipação. O currículo fundamentado nessa concepção conside-ra o aluno sujeito do seu processo de aprendizagem, destacando o saber a ser produzido sem desconsiderar o saber que o aluno traz. As atividades de currículo e ensino não são desvinculadas da totalidade social.

Tomaz Tadeu da Silva em publicação de 1999 (Documentos de

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identidade: uma introdução às teorias do currículo), afirma que são as questões relativas ao poder que constituem o divisor nas teorias do currículo. A partir desse divisor, o autor classifica as teorias curri-culares em três tipos: as tradicionais, as críticas e as pós-críticas. As tradicionais, seguindo as trilhas de Bobbitt e Tyler, estariam voltadas para o estabelecimento de padrões, sendo a educação entendida como um processo de moldagem e o currículo seria uma questão de organização do trabalho (desenvolvimento curricular), uma vez que os objetivos estariam dados: preparar as crianças e os jovens para as exigências tradicionais da vida adulta.

As teorias críticas de currículo surgiram no bojo do movimen-to contestatório em termos políticos e culturais da década de 1960, como crítica às teorias tradicionais de adaptação. Para essas teorias o importante não é desenvolver técnicas de fazer o currículo, mas compreender e desvendar o que o currículo faz (ideologia e poder). A partir da crítica às desigualdades dos processos educacionais ela-boradas por autores como Bourdieu e Passeron (Os herdeiros, A re-produção) e Althusser (Aparelhos ideológicos de Estado) essa teoria teve muitos desdobramentos a ponto de incorporar propostas nem sempre convergentes, como a dos marxistas, da fenomenologia e a dos neomarxistas.

Enfim, as teorias pós-críticas deslocam a questão da ideologia para a questão do discurso, ou seja, diferenciam a questão da ver-dade (ideologia) para aquilo que é considerado verdade (discurso), situando a ciência e o conhecimento como campos de luta em torno da verdade e não apenas como outros poderes. Seu pressuposto é a diversidade e a inclusão de grupos culturais dominados. Para es-ses autores as relações de poder não são dadas, estão em constante construção, sendo importante desvendar como as relações de assi-metria e desigualdades são produzidas.

Toda essa teorização sobre a questão curricular não significa que essa tipologia exista em de forma “pura” nas escolas. Primeiro porque as escolas são espaços de interação onde são definidas cul-turas particulares de acordo com as concepções e experiências in-dividuais e sociais da comunidade e, segundo, porque os próprios estudiosos do currículo admitem que são coisas diferentes aquilo que é declarado, aquilo que é vivido e aquilo que é experenciado, em outros termos, o currículo prescrito (ou formal), o currículo vivido (ou real) e o currículo oculto (práticas e experiências compartilhadas na escola ou na sala de aula).

Isso significa que o currículo extrapola modelos, teorizações e mesmo prescrição dos órgãos centrais porque para ser concretizado deverá interagir com a cultura da escola que vai influenciar os modos de agir, pensar e sentir da escola como um todo e dos integrantes da comunidade escolar de forma particular.

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Atividade 24 (Prática)

a) Em grupos, discuta e problematize: como tem sido desenvolvido o currículo nas/das escolas do campo? Essa forma de desenvolvimento atende às especificidades da cultura local? De que forma?

Atividade 25 (de Aplicação e Compromisso Social)

a) Reflita e responda às seguintes questões:• Quais são os problemas da realidade brasileira atual? • Como os problemas nacionais se manifestam no nosso Estado, Re-

gião, Município, Bairro e Escola? • Qual é a função social da Escola brasileira? • Qual é o papel da Educação Escolar na transformação da realidade

brasileira? • Como superar o “idealismo ingênuo” (“escola redentora da humanida-

de”) e o “pessimismo crítico” (escola reprodutora das desigualdades sociais)?

• Como assumir uma atitude de “realismo crítico” (“autonomia relativa” e “especificidade da Educação Escolar”)?

• Quem são e como vivem os alunos que freqüentam a nossa escola? • Quais são as necessidades e expectativas que os alunos têm a respei-

to desta escola? • Quais seriam os valores que mobilizam os nossos alunos, quando se

matriculam nesta escola? • Qual é a caracterização básica do grupo de professores da nossa es-

cola? • Quem somos, quantos somos, quais motivações dirigiram os docen-

tes para o magistério? • Quais são as características físicas e organizacionais da nossa escola? • O prédio da nossa escola tem condições mínimas para a realização de

um bom trabalho pedagógico? • Que tipo de gestão está sendo praticada na nossa escola? • De que maneira temos pensado e vivenciado a Proposta Educacional

da Escola (PPP)? • Existe uma clareza mínima acerca do tipo de cidadão que a escola

pretende ajudar a formar? • Quais são os objetivos educacionais da nossa escola? • Quais valores estão presentes nos objetivos educacionais da nossa

escola? • Qual é o papel do livro didático e dos outros meios de comunicação

no trato com os conteúdos? • Existe uma preocupação com a democratização e também com a

construção do conhecimento? • Qual (is) tendência(s) de avaliação está (ão) sendo praticadas) na nos-

sa escola? • Quais são os principais problemas percebidos pelos docentes no pro-

cesso de avaliação dos alunos? • Existe uma clareza de articulação profunda entre objetivos,

conteúdos, métodos e avaliação?

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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• Quais princípios de ensino-aprendizagem estão subsidiando o traba-lho pedagógico na nossa escola?

• O que queremos e precisamos mudar na nossa escola e nas nossas aulas?

• Quais mudanças são necessárias no coletivo dos professores e no pla-no individual de cada um?

• Quais condições mínimas necessitamos para realizar um bom traba-lho pedagógico na nossa escola?

• Como nos podemos mobilizar para conseguir condições mínimas de trabalho pedagógico?

• Os alunos avaliam a escola como um todo e em especial o processo de ensino-aprendizagem?

Atividade 26

a) Observe as fotos abaixo e discuta em grupos: que tipo de aluno as imagens retratam? Que tipo de escola? Quais são as condições de vida desses alunos? Quais são as condições de trabalho dessas esco-las? O que, como e para quê esses alunos estudam?

b) Agora leia atentamente o texto a seguir:

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Texto 8

EDUCAÇÃO E ESCOLA DO CAMPO: O PPP COMO INSTRUMENTO DE DIAGNÓSTICO E DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

Profa. Gilda Cardoso de Araujo

A Educação do Campo é uma forma de ação política e social. Não pode ser confundida com a educação rural, concebida como empobrecimento da educação oferecida nas áreas urbanas. Segun-do as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (Resolução 1/2002 CNE/CEB) a escola precisa ser reconhecida como espaço de reflexão da realidade dos povos do campo, da sua cultura, das suas formas de sociabilidade, do seu trabalho, das suas linguagens e, sobretudo, nos marcos de um novo projeto de desen-volvimento que supere o paradigma do capitalismo agrário.

Molina (2006) destaca que a educação rural está contida neste paradigma, visto que os camponeses não são protagonistas do pro-cesso, mas subalternos aos interesses do capital (por exemplo, do agronegócio), enquanto a Educação do Campo é inerente ao para-digma da questão agrária que se desenvolve na luta contra o capi-tal. Isso porque a Educação do Campo ”...vem sendo construída pelos movimentos camponeses a partir do princípio da autonomia dos ter-ritórios materiais e imaterais” (p. 10).

Sendo assim, a especificidade da Educação do Campo reside na sua indissociação com os paradigmas de desenvolvimento e com a questão do enraizamento do território.

Sob o paradigma do capitalismo agrário a educação praticada no campo é subalterna aos interesses do grande capital, e, portan-to, dissociada da realidade e das necessidades dos povos do campo. Nesse sentido, o currículo se traduz numa transposição empobrecida do currículo desenvolvido nas zonas urbanas:

A desvalorização dos conhecimentos práticos/teóricos que trazem os sujeitos do campo, construídos a partir de experiências, relações sociais, de tradições históri-cas e principalmente, de visões de mundo, tem sido ação recorrente das escolas e das várias instituições que atuam nestes territórios. Como romper com o silencia-mento destes saberes e legitimar outros processos de produção do conhecimento, trazendo-os para dentro da escola do campo, para dentro das universidades? (MOLINA, 2006, p. 9).

O Campo não é apenas um espaço não urbano, é o território das florestas, da pecuária, das minas, da agricultura. É também es-paços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas. Sendo assim é um lugar que liga os seres humanos à produção de suas condições de existência. Entretanto, segundo dados oficiais ¾ (três quartos) dos pobres do planeta estão no campo. No Brasil, cerca de 20% da popu-

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lação vive no campo, onde o trabalho infantil ainda é fartamente uti-lizado e a média de anos de estudo é muito baixa em relação às zonas rurais. Nessas condições, a Reforma Agrária é uma medida imprescin-dível para diminuir as enormes desigualdades sócio-econômicas do Campo. Todavia políticas educacionais específicas para o campo são dimensões estratégicas extremamente relevantes (MEC, 2006). Para Munarim as políticas educacionais do campo tiveram origem num movimento:

que teve início antes no seio da sociedade civil organi-zada, mais propriamente, neste caso, no seio dos movi-mentos e organizações sociais do campo, em forma de experiências de educação popular na formação dos seus quadro dirigentes e de suas bases e, mais recentemente, em forma de reivindicação de escola pública de qualida-de como “direito de todos e dever do Estado” – síntese do conceito de política pública.Assim, seria mais apro-priado dizer que o MEC abre espaço na máquina estatal para as vozes desses sujeitos organizados que já vinham sedimentando as bases de uma política pública de Edu-cação do Campo. (MUNARIM, 2006, p.25)

Cultural e historicamente o campo se caracterizou pelo latifún-dio, pela monocultura, por técnicas de produção rudimentares. Essas características foram desfavoráveis às demandas pela alfabetização, que começaram a ecoar no Brasil a partir dos anos 1930 com o pro-cesso de industrialização. Somente 60 anos depois, a partir dos anos 1990, a demanda por Educação do Campo começa a se afirmar na agenda da política nacional. O problema é que esse processo vem sendo conduzido como uma simples transposição da educação da cidade para o campo, agravada, ainda, por problemas de falta de in-fra-estrutura, professores desqualificados, falta de assistência técnica e financeira dos órgãos centrais, isolamento das escolas, o deficitário transporte escolar, entre outros. Com esse quadro, as escolas do cam-po não têm preparado nem para a vida no campo nem para a vida na cidade.

Ademais, esses problemas acabaram por gerar medidas que acarretaram mais problemas. Exemplo disso são a política de trans-porte escolar e a política de nucleação das escolas isoladas do campo brasileiro, com o conseqüente estímulo ao fechamento de escolas. Ao mesmo tempo em que crianças e adolescentes são submetidos a um longo período dentro do ônibus escolar, recebem uma escolarização com um currículo completamente desvinculado de sua realidade.

Nesse sentido, pensar o projeto político-pedagógico das Es-colas do Campo requer uma reflexão sobre políticas educacionais para a Educação do Campo como a questão dos profissionais de-mandados pelas Escolas do Campo que devem, no seu trabalho, levar em conta princípios e saberes universalmente consagrados, ao mesmo tempo em que não podem prescindir da compreensão de que o campo possui especificidades que devem ser levadas em conta no processo educativo. Ao refletir sobre esses profissionais demandados pelas escolas do campo, fica evidente a necessidade

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de articulação e consolidação de políticas de formação continuada que tenham por premissa a revisão do conceito de escola e, especi-ficamente da organização e do funcionamento da Escola do Campo. Isso implica em, por exemplo, pensar nas dinâmicas de organização e funcionamento democráticos das chamadas classes multisseriadas. (MUNARIM, 2006).

É importante frisar que as escolas do campo têm suas bases nos movimentos sociais e nas lutas por escolarização dos povos do campo. Assim, a Educação do Campo não é um movimento que surge a partir da iniciativa do Estado e são exatamente essas bases que potencializam as escolas e a educação do campo no sentido de democratizar as ações do Estado no meio rural. Essa potencialidade só pode se concretizar com dois elementos fundamentais: raiz (his-tória/identidade) e projeto fundamentado na pedagogia dos movi-mentos que formaram e ainda formam os sujeitos sociais do campo (CHRISTÒFFOLI, 2006).

Assim, a gestão das escolas do campo deve levar em conta as demandas dos movimentos sociais, mediante mecanismos de gestão democrática que reforcem a autonomia das escolas, o fortalecimen-to dos conselhos escolares, a autogestão no processo de elaboração, desenvolvimento e avaliação do Projeto Político-Pedagógico a partir de uma abordagem solidária e coletiva dos problemas do campo e das escolas do campo (MEC, 2006).

A existência e o funcionamento efetivo, democrático e autôno-mo de grêmios ou colegiados estudantis, de associações de pais e mestres, de conselhos de classe participativos, de reuniões e de as-sembléias com toda a comunidade são instrumentos importantes de mobilização e de consolidação da democracia nas escolas do campo. Além disso, é fundamental que os professores das escolas do campo participem das reuniões comunitárias e dos movimentos sociais, a fim de garantir maiores possibilidades de convivência com as formas de organização e mobilização do campo: “a escola isolada da comu-nidade é só um prédio” (MEC, 2006, p. 48).

Esses instrumentos podem perder força frente ao isolamento das escolas do campo que são unidocentes e multisseriadas em sua maioria. Como não há uma equipe de gestão (secretaria, diretores, pedagogos), grande parte do trabalho administrativo funciona na prefeitura do município ou em departamentos, setores, secretarias de educação e o responsável por essa articulação entre a escola e os órgãos centrais de educação é o professor. Entretanto, essas dificul-dades têm sido superadas com medidas como a criação de núcleos de professores responsáveis pelas escolas por distrito com troca de experiências, planejamento e atuação das escolas tendo em vista o trabalho coletivo. Os próprios professores podem organizar espaços democráticos sem esperar pela iniciativa dos órgãos centrais.

Quanto à formação, atuação e participação efetiva nos/dos conselhos escolares é preciso levar em conta que a especificidade do isolamento das escolas do campo requer formas de organização que possibilitem uma participação ampliada – que não se limite à parti-

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cipação paritária por segmentos escolares, por exemplo- incluindo rezadeiras, parteiras, presidentes de associações comunitárias ou cooperativas, representantes sindicais, líderes religiosos, agentes de saúde, presidentes e/ou diretores de associações desportivas e ou-tros grupos culturais, entre outros. Assim, a gestão das escolas do campo pode potencializar uma organização coletiva que leve em conta a realidade onde estão situadas.

O Projeto Político-Pedagógico é o eixo do trabalho do Conse-lho Escolar e deve - com base nos princípios democráticos e nos ins-trumentos de participação ampliada - definir o sentido de qualidade da educação, primar por conteúdos e metodologias que dialoguem com o saber popular camponês e buscar a melhor forma de avaliar a prática social da Educação do Campo. O Projeto Político-Pedagógico também não pode desconsiderar a relação da Educação do Campo com a Educação Popular, bem como o acúmulo e construção de ex-periências pedagógicas dos movimentos sociais do campo a partir dos anos 60, a exemplo das Comunidades Eclesiais de Base e da me-todologia da alternância (Escolas de Famílias Agrícolas) sustentada pelos eixos da vivência comunitária, familiar e escolar.

Outra especificidade do Projeto Político-Pedagógico das Esco-las do Campo diz respeito ao relevo que deve ser dado à Educação de Jovens e Adultos, dada a pouca escolaridade da população rural. Dessa forma, os Conselhos Escolares devem demandar dos órgãos centrais de educação oportunidades de escolarização com qualida-de para crianças, para adolescentes e para adultos.

Contudo, não podemos ser ingênuos quanto às possibilidades dessa construção democrática do Projeto Político-Pedagógico para as Escolas do Campo. Arroyo (2008) adverte que a escola não se di-namizou no ritmo dos movimentos sociais do campo, devido às re-sistências históricas muito fortes, advindas de estruturas, culturas e valores que remontam aos séculos XV e XVI. Ainda chama a atenção para a cultura docente calcada na lógica da inserção dos alunos no mercado de trabalho:

A escola tem sua força, sua identidade, sua dureza, sua ossatura. E essa ossatura não é fácil de quebrar. Temos que pesquisá-la mais e ver, sobretudo, a ossatura de um sistema educativo encalhado, como é o sistema educa-tivo do campo, que está igual, parece que nada passa, parece que tudo parou no tempo. Escolinha cai não cai, que não acaba de decolar. (ARROYO, 2006, p. 110)

Outra observação importante do autor é quanto à necessidade de superar a lógica seqüencial e seriada das Escolas do Campo a fim de que atendam às especificidades do direito à educação de crianças, jovens e adultos:

O modelo a seguir será a organização seriada das es-colas da cidade? Superar a reação tão freqüente contra as escolas multisseriadas. As escolas do campo não são multisseriadas. São multiidades. Que é diferente! Os educandos estão em múltiplas idades. Múltiplas tem-

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poralidades. Temporalidades éticas, cognitivas, cultu-rais, identitárias. É com diversidade de temporalidades que trabalha a escola do campo. Não é com séries. [...] A pergunta: vamos acertar com uma organização da escola do campo que não seja cópia da escola seriada da cidade que queremos já destruir? Eu sou um grande defensor que esta escola seriada seja desconstruída e que se organize a partir das temporalidades humanas. Temos que pesquisar mais as formas possíveis de or-ganização do sistema educativo e da escola no campo. (ARROYO, 2006, p. 115).

Consideramos que essas reflexões são de extrema relevância para pensar, elaborar, acompanhar e avaliar o Projeto Político-Peda-gógico das Escolas do Campo. Este não deve ser apenas um docu-mento a ser formalizado e/ou entregue aos órgãos centrais de educa-ção, mas deve significar a possibilidade de repensar “a ossatura” das políticas educacionais e da organização dos sistemas de ensino e das escolas do campo. Nesse sentido, a citação abaixo nos ajuda a pensar e fazer escolhas:

Entramos no século XXI com mais incertezas do que cer-tezas do presente e, muito mais incerteza do que vem a ser o futuro que estamos construindo no presente. Às vezes, temos a sensação que não saímos do passado, pois, ao mesmo tempo em que ele se tornou distante, está muito mais perto, principalmente, quando obser-vamos práticas coloniais, a exemplo do trabalho escravo existente, ainda hoje no país. Também é verdade, que o presente parece muito mais distante porque os proble-mas da humanidade, que acompanham as lutas do pre-sente, não parecem possíveis de ter saídas. E o futuro? Estamos com o olho no futuro, mas os nossos pés ain-da pisam na sombra do passado. Quando essa sombra alimenta as nossas utopias para que possamos agir no presente e transformar o mundo em que vivemos, ela é de fato construtiva, mas quando ela nos aprisiona, corre-mos os riscos de só sermos reconhecidos como vítimas de um passado que não deixou de existir e, de um pre-sente imobilizador. (JESUS, 2006, p. 50)

A construção do Projeto Político-Pedagógico não é meramente uma tarefa técnica, mas, sobretudo, uma tarefa política e, daí a ne-cessidade de escolhas políticas. Essas escolhas têm estreita relação com as relações de poder que se estabelecem entre o poder local, os órgãos centrais de educação, as escolas, as comunidades e os movi-mentos sociais. Se os educadores do campo defendem uma constru-ção coletiva precisam defender princípios compatíveis. Como trans-formar relações de poder verticalizadas em relações de autoridade compartilhada? Eis o grande desafio para a construção de um Projeto Político-Pedagógico que afirme o direito à educação vinculado aos demais direitos de cidadania das Escolas do Campo.

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Atividade 27 (Prática)

a) Leia e fala o fichamento do Caderno 9 “ Conselho Escolar e a edu-cação do campo” disponível em:http://por tal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=ar ticle&id=12619%3Apublicacoes- dos- conselhos-escolares&catid=195%3Aseb-educacao-basica&Itemid=859

Atividade 28 (de Aplicação e Compromisso Social)

a) Tire fotografias das escolas do campo de sua regiãob) Organize em grupos um exposição fotográfica com a temática das escolas e da educação do campo, convidando autoridades, movi-mentos sociais, comunidade, imprensa.c) Organize em grupos relatos de experiências a partir de exposição foto-gráfica sobre a realidade da Educação do Campo no Espírito Santo.d) Elabore em grupos Planos de Ação 11 para a elaboração / acompa-nhamento / avaliação do Projeto Político-Pedagógico de sua escola

Referências Bibliográficas

ARROYO, Miguel Gonzalez. escola do campo e a pesquisa do campo: metas. In: MOLINA, Mônica Castagna (Org.). Educação do Campo e Pesquisa: questões para reflexão. – Brasília: Ministério do Desenvol-vimento Agrário, 2006. p. 103-132

CHRISTÓFFOLI, Pedro Ivan. Produção pedagógica dos movimentos sociais e sindicais. In: MOLINA, Mônica Castagna(Org.). Educação do Campo e Pesquisa: questões para reflexão. – Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2006. p. 94-102

JESUS, Sonia Meire Santos Azevedo de. As múltiplas inteligibilidades na produção dos conhecimentos, práticas sociais e estratégias de in-clusão e participação dos movimentos sociais e sindicais do campo. In: MOLINA, Mônica Castagna (Org). Educação do Campo e Pesqui-sa: questões para reflexão. – Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2006. p. 50-59

MEC. Conselho Escolar e a educação do campo / elaboração Re-gina Vinhaes Gracindo... [et. al.]. –Brasília : Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2006. (Programa Nacional de Fortale-cimento dos Conselhos Escolares ; 9).

11 É o planejamento de todas as ações necessárias para atingir um resultado desejado. O principal, sem dúvida, é saber o que fazer – identificar e relacionar as atividades. Um bom Plano de Ação deve deixar claro tudo o que deverá ser feito e quando. Se a sua execução envolve mais de uma pessoa, deve escla-recer quem será o responsável por cada ação. Quando necessário, para evitar possíveis dúvidas, deve ainda esclarecer, os porquês da realização de cada ação, como deverão ser feitas, e onde serão feitas.

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Unidade II: Escolas em Comunidades Campesinas: especificidades na construção doprojeto político-pedagógico nas diferentes áreas do saber

MOLINA, Mônica Castagna. Educação do Campo e Pesquisa: ques-tões para reflexão. – Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2006. Introdução, p. 9-14

MUNARIM, Antonio.. Elementos para uma política pública de Educa-ção do Campo. In: MOLINA, Mônica Castagna (Org.). Educação do Campo e Pesquisa: questões para reflexão. – Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2006. p. 15-26

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Unidade III

O Projeto Político Pedagógico como articulador do trabalho da comunidade escolar:

interculturalidade, interdisciplinaridadee campesinato

Motivo (Cecília Meireles)

Eu canto porque o instante existee a minha vida está completa.

Não sou alegre nem triste:sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,não sinto gozo nem tormento.

Atravesso noites e diasno vento.

Se desmorono ou edifico,se permaneço ou me desfaço,

- não sei, não sei. Não sei se ficoou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.Tem sangue eterno e asa ritmada.

E sei que um dia estarei mudo:- mais nada.

Rogério DragoPaulo da Silva Rodrigues

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Unidade III: O Projeto Político Pedagógico como articulador do trabalho da comunidade escolar: interculturalidade, interdisciplinaridade e campesinato

UNIDADE III

O Projeto Político Pedagógico como articulador do trabalho da comunidade escolar: interculturalidade,

interdisciplinaridade e campesinato

Rogério Drago1

Paulo da Silva Rodrigues2

Objetivo da UnidadeEste texto, busca situar o leitor naquilo que é, em nossa con-

cepção, uma das prerrogativas do projeto político pedagógico, qual seja, garantir que a escola, inserida nesse contexto globalizado/glo-balizante assuma uma postura diferenciada, integrada, politizada, fundamentada, vendo na diversidade de ações e de sujeitos a possi-bilidade de se reestruturar como ambiente de produção e transmis-são de cultura, conhecimento, história produzidos pela humanidade.

Para tanto, discute alguns dos temas que consideramos serem de extrema importância para que o projeto político pedagógico dei-xe de ser visto como um documento frio e engavetado e passe a ser encarado como uma ferramenta de mudança, de transformação dos saberes e fazeres escolares de todos os envolvidos nesse processo: pais, professores, gestores, funcionários de apoio, alunos e comuni-dade em geral.

Introdução

Entendendo que “na educação, [...], não existe nada de passivo, de inativo. Até as coisas mortas, quando se incorporam ao círculo de educação, quando se lhes atribui papel educativo, adquirem caráter ativo e se tornam participantes, ativos desse processo” (VYGOTSKY, 2001, p. 70) e que, se pensarmos que ainda temos uma escola estáti-ca, engessada e cristalizada em dogmas imutáveis, necessitamos ur-gentemente de uma educação que seja um ponto de encontro entre o estabelecido socialmente e as transformações almejadas, o Projeto Político Pedagógico que se deseja estabelecer numa perspectiva de-mocrática/democratizante de educação precisa ter objetivos claros e coesos com uma sociedade multicultural e multifacetada.

De acordo com Penin; Vieira (2002, p. 20) “a finalidade da edu-cação é o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a ci-

1 Doutor em Educação pela PUC - RJ, Professor Adjunto do Centro de Educação da UFES.2 Mestrando em Educação PPGE/CE/UFES, Professor do Sistema Municipal de Ensino de Vitória.

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dadania e sua qualificação para o trabalho. Isto significa que a missão da escola, tal como definido em lei é, justamente, promover o ple-no desenvolvimento do educando, preparando-o para a cidadania e qualificando-o para o trabalho”.

Nesse sentido, a escola que pretende avançar nesse cenário, indo além das prerrogativas legais, propondo como missão não só a valorização do educando, mas de todos os envolvidos no processo educacional, que a nosso ver é amplo, inserido na macrossociedade que circunda a microssociedade que é a escola, precisa avançar no de-bate sobre questões que se inserem no cotidiano escolar, tais como aquelas que se referem à articulação dialética e inesgotável entre o projeto político pedagógico e a interculturalidade, interdisciplinarida-de e a educação no campo, por exemplo, que é o foco deste texto.

Sugestão de FilmesAlguns filmes interessantes sobre o papel da educação para a

transformação das pessoas que podem ser usados em sala de aula são:• Nenhum a menos;• Pro dia nascer feliz;• Duelo de titãs;• O nome da rosa;• Escritores da liberdade;• O sorriso de Monalisa• A voz do coração;• Conrack; dentre outros.

Interculturalidade, interdisciplinaridade e campesinato: articulações possíveis ao projeto político pedagógico

A estruturação do projeto político pedagógico no contexto es-colar vai ganhar força com a promulgação da Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional nº. 9394 de 1996. A legislação, em si, traz a garantia legal, porém a aplicabilidade da lei ao cotidiano das comu-nidades escolares requer uma série de envolvimentos, negociações, flexibilizações e conhecimentos que precisam ser articulados, deba-tidos, aprofundados, estudados.

A escola, ao se propor estruturar um projeto político pedagógi-co com vistas ao trato da diversidade de seus sujeitos de modo equâ-nime interligando-se às temáticas advindas dessa diversidade, preci-sa romper com características excludentes e estigmatizantes e fazer uma releitura daquilo que entende por escola, sociedade, cultura, sujeito, conhecimento, processo ensino-aprendizagem, conteúdos de ensino, avaliação, currículo, formação docente, dentre uma série de aspectos, conceitos e concepções que, se não forem bem enten-didos, podem inviabilizar todo um trabalho que busque integrar o projeto político pedagógico às questões associadas à interdisciplina-ridade, interculturalidade e a escola/educação no/do campo.

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Entendemos que uma escola que deseja o sucesso de todos os seus sujeitos precisa ter como missão formar cidadãos críticos, ativos, envolvidos e transformadores da ação social, num processo de trocas in-terpessoais entre todos os envolvidos no ato educativo, almejando não somente a preparação para o trabalho e o desenvolvimento de cidadãos, mas, sim, viver o momento educacional presente em sua plenitude exer-citando a cidadania inerente a cada ser e, ao mesmo tempo em que se prepara, age para a transformação do mundo e das relações de trabalho.

A partir de uma visão clara e ampla sobre os pressupostos te-órico-filosóficos da escola em comum com um diagnóstico apurado da realidade, a organização do trabalho pedagógico no contexto de uma escola que tem no Projeto Político Pedagógico o alicerce para um trabalho democrático/democratizante precisa contemplar as-pectos que culminem com a valorização das diferenças e tenha como foco central o desenvolvimento e o incentivo às competências, par-ticularidades e especificidades dos sujeitos escolares. Nesse sentido, sugerimos que a escola tenha claro para si algumas ações que, se bem planejadas, podem levar ao alcance dos objetivos e metas esta-belecidos a partir do desenvolvimento das ações planejadas.

Partindo do pressuposto de que a escola é um espaço que hoje está chamado a ser mais do que simplesmente transmissor de co-nhecimento, mas produtor e incentivador de saberes que emergem da diversidade que é típica da condição humana e que a proposta de educação no campo não foge a essa regra, é necessário que sejam clarificados alguns conceitos acerca daquilo que acreditamos ser im-prescindível para a plena comunhão entre as várias culturas que se presentificam na escola, o diálogo sistemático entre as disciplinas – interdisciplinaridade e a construção do projeto político pedagógico para a educação do campo.

Dessa forma, apresentamos a seguir algumas dimensões do espaço escolar que precisam ser consideradas para a garantia do su-cesso no desenvolvimento das ações educativas numa perspectiva que contemple a cultura, a diversidade e o conhecimento acumula-do pela sociedade – interculturalidade e interdisciplinaridade.

a) Planejamento da ação pedagógicaPlanejar uma aula, uma unidade, um programa de ensino, isso

tudo é de extrema importância para a boa condução/execução da ação pedagógica, mas, o que seria o processo de planejamento? Como desenvolver um planejamento condizente com a proposta que se quer desenvolver? Que tipo de planejamento a realidade da esco-la pretende assumir como postura metodológica e didática? Essas e tantas outras questões povoam o imaginário educacional, quando se tem em mente que planejar é muito mais do que simplesmente preencher um formulário, uma ficha, uma norma burocrática.

Planejar seria analisar uma dada realidade sobre as con-dições existentes e prever as formas alternativas de ação para superar as dificuldades ou alcançar os objetivos de-sejados (HIDT, apud DRAGO et al, 1998, p. 29).

Indicação de Leitura CDROM

Visite o CD ROM ou leia o Apêndice-que acompanha este caderno e leia os textos 1 e 2 de Drago e Rodrigues. O texto 1 traz um relato de experi-ência muito rico do processo de im-plementação do PPP numa escola de Vitória (ES). O texto 2 traz alguns dos principais passos para se conhecer os sujeitos escolares.

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Nesse sentido, quando se fala em planejamento da ação peda-gógica, faz-se necessário que algumas considerações sejam feitas, até mesmo para tentar responder as questões acima.

O processo de planejamento, conforme estudos de Drago, Sil-ler e Moreira (1998) possui, ao menos, três níveis: planejamento edu-cacional (situado na esfera sócio-política e filosófica de um governo), planejamento curricular (é a sistematização do planejamento educa-cional, com a definição de objetivos educacionais em nível de escola) e o planejamento de ensino (aquele que se desenvolve a partir da ação do professor).

O planejamento de ensino, que a nosso ver é essencial para o bom andamento do cotidiano escolar, por sua vez, subdivide-se em plano de curso, plano de unidade e plano de aula. Essas subdivisões são partes do trabalho do professor e do pedagogo da escola, já que se realizam no dia-a-dia letivo.

O plano de curso pode ser entendido como sendo a previsão de todas as atividades escolares em uma área ou disciplina, durante um período letivo (ano, semestre, bimestre). O plano de unidade, por sua vez, envolve aqueles assuntos correlatos e que fazem parte da mesma disciplina. O plano de aula, por fim, representa o momento efetivo do processo ensino-aprendizagem.

O planejamento educacional bem conduzido e bem funda-mentado é aquele que, conforme Drago, Siller, Moreira (1998, p. 32), segue quatro etapas básicas e indissolúveis: conhecimento da rea-lidade, elaboração do planejamento, execução do planejamento e avaliação do que foi planejado. Isto pelo fato de que consideramos que “o planejamento didático não deve ser visto como uma mera for-malidade ou uma simples atividade cotidiana. Ele deve ser ativo, di-nâmico, envolvendo operações mentais (analisar, prever, etc.)”.

Sugestão de Filmes• O clube do imperador;• Sociedade dos poetas mortos;• Ao mestre com carinho;• Matilda;• Sarafina;• Vermelho como o céu.Esses filmes ajudam a pensar e refletir sobre a organização di-dático-pedagógica da escola.

b) Organização do ambiente físico/estruturalO ambiente físico da escola refere-se aos espaços utilizados para

o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem tanto de modo sistemático quanto assistemático, ou seja, de modo direto e indireto: salas de aula, pátios, cozinha, biblioteca, secretaria, sala de informáti-ca, sala de recursos, sala de vídeo, sala de artes, refeitório, dentre ou-tros que compõem os múltiplos espaços-tempos do cotidiano escolar.

Indicação de Leitura CDROM

Visite o CD ROM que acompanha este caderno e leia o texto 3 de Drago. O texto traz uma discussão teórica sobre os principais conceitos e fundamen-tos sócio-psico-educacionais, além dos pressupostos teórico-filosóficos que embasam a construção democrá-tica do projeto político pedagógico.

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Esses múltiplos espaços precisam ser pensados de modo tal que atendam aos interesses dos alunos, da comunidade e dos pro-fissionais da instituição educativa, pois dependendo do modo como são pensados e/ou organizados podem não atender aos objetivos propostos e não terem a funcionalidade desejada. Assim, espaços desnecessários precisam ser replanejados para que o ambiente esco-lar assuma o caráter educativo em todas as suas possibilidades.

Nesse sentido, as salas de aula, por exemplo, precisam ser or-ganizadas no sentido de atender ao trabalho docente/discente nos turnos/modalidades de atendimento da escola. Precisam ser limpas e atrativas para que tanto alunos e professores sintam-se bem em seu interior; receber um número de alunos compatível com sua ca-pacidade física, dentro dos padrões estabelecidos pela legislação, no que concerne ao parâmetro estabelecido. Além disso, pensando no ambiente da sala de aula, este precisa assumir uma postura interdis-ciplinar, numa perspectiva que tenha como foco central a valorização da diversidade ali representada.

A biblioteca, por sua vez, numa perspectiva interdisciplinar e vol-tada para a valorização da diversidade dos sujeitos que a utilizam tem por objetivo prestar serviços de informação às atividades de ensino, tanto da comunidade escolar quanto da comunidade onde a escola está inserida; precisa ser coordenada por funcionário capacitado para esse fim, com formação específica e contar com acervo didático, literá-rio e virtual atualizados constantemente, assim, além de livros impres-sos, precisa colocar à disposição computadores conectados à internet para alunos, docentes e comunidade em geral realizarem suas pesqui-sas e, assim, alcançar o papel que lhe cabe: propagar o conhecimento socialmente construído e acumulado pela humanidade.

A escola que se propõe democrática, pautada em objetivos que busquem a inserção de todos os indivíduos ao contexto macrossocial de forma integral, tem como pressuposto que uma gestão democrá-tica e participativa é aquela que trabalha em prol de uma prática pe-dagógica dialética, flexível e voltada para a participação de todos os envolvidos na tomada de decisões sobre o bem estar de todas as pes-soas que compõem o cotidiano educacional dessa realidade, enten-dendo que “uma sociedade não é democrática pela simples afirma-ção de valores, mas também e, sobretudo, pela construção e prática cotidiana dos mesmos, ou seja, pelos processos que os instauram e reafirmam” (PENIN; VIEIRA, 2002, p. 31), nesse sentido, pensar a or-ganização do ambiente físico e estrutural da escola e a organização de seus espaços requer um trabalho que envolva democraticamente toda a comunidade escolar, num processo de representativo e que se estabeleça através do diálogo constante e da avaliação diagnóstica como proposta para sanar os pontos falhos.

Sob esta ótica, pode-se pressupor que a comunidade escolar sentir-se-á “sujeito”, “ator do processo” o que pode levar a uma identi-ficação com o ambiente de forma autônoma, crítica, reflexiva e parti-cipativa, afinal, “o objetivo central da educação deve ser a construção de personalidades mais autônomas, críticas, que almejam o exercício

Sobre a LDB 9394/96 e o Projeto Político – pedagógico

Art. 12. Os estabelecimentos de ensi-no, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: I – elaborar e executar sua propos-ta pedagógica; (...)VII – informar os pais e responsá-veis sobre a freqüência e o rendi-mento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta peda-gógica.

Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de: I – participar da elaboração da pro-posta pedagógica do estabeleci-mento de ensino;II – elaborar e cumprir o plano de trabalho, segundo a proposta pe-dagógica do estabelecimento de Ensino.

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competente da cidadania. Para tanto, ela deve embasar-se nos prin-cípios democráticos da justiça, da igualdade, da eqüidade e da par-ticipação ativa de todos os membros da sociedade na vida pública e política” (ARAUJO, 2002, p. 41).

c) Organização da ação educativa, currículo e avaliaçãoPensar a organização da ação educativa de uma escola é pensar

a concretização de um ensino de excelência e qualidade, com garan-tia de acesso aos bens culturais e permanência, com prazer, na escola por um tempo determinado.

A escola tem que deixar de ser um ambiente frio, gelado, sem emoção, sem prazer, sem trocas para se tornar um ambiente prazeroso e enriquecedor. Para tanto, a organização da ação educativa assume um papel crucial, já que conceitos como os de currículo, avaliação, es-tratégias e conteúdos são formas de se organizar o ambiente físico e humano, tornando-os mais atraentes e facilitadores da aprendizagem.

Uma coisa é certa: a criança de hoje não é mais a mesma de anos atrás, não aprende da mesma forma, não brinca da mesma ma-neira, não vive a infância como antes. Ela está chamada a se adultizar em seus atos, pensamentos e diálogo cada vez mais cedo. A escola que tem tais pressupostos precisa propor e reavaliar constantemente aspectos como o currículo, a avaliação, suas estratégias de ensino, seus conteúdos de ensino, dentre outros aspectos.

Quando falamos em currículo, a idéia que temos e que se inter-põe como fio condutor da ação educativa numa perspectiva demo-crática de educação e a proposta de educação do campo em escolas campesinas por seu caráter não se distancia dessa proposta, é aquela que se baseia numa concepção de construção social. Não um currícu-lo engessado, com listas de conteúdos a serem ensinados, como algo abstrato, sem sentido para os alunos, mas sim, como um modo de or-ganização das práticas educativas; algo que pode ser enriquecido com fatos e acontecimentos do cotidiano e da comunidade escolar e local.

O conceito de currículo, hoje, como bem destaca Ferraço (2006), pode ser reavaliado e concebido como um conjunto de ações, logo, não teríamos um currículo, mas vários currículos inseridos e emer-gentes da cotidianidade. Os principais estudos sobre o currículo têm caminhado no sentido de mostrar que este documento precisa ter algumas características essenciais, pois são essas características que podem fazer com que a escola e/ou sistema educativa se diferencie de modo positivo. Dentre as principais características podemos citar:

• Mude o foco do documento prescrito – sem abandoná-lo – para a práxis pedagógica;

• Possibilite a participação de todos os envolvidos no currículo nas discussões realizadas sobre este;

• Considere os conhecimentos e as práticas cotidianas existentes;• Fuja da idéia de instituição de ensino como tendo caráter de vi-

gilância, punição e correção;• Valorize o que é feito, como tem sido feito e por que é feito, ao

invés do que não foi feito, do que falta, do que está errado;

Indicação de Leitura

Alguns estudos sobre currículo, or-ganização escolar e avaliação da aprendizagem para o aprimoramento da ação educativa podem ser encon-trados em autores como Jussara Ho-ffman, Carlos Eduardo Ferraço, Vera Maria Candau, Menga Lüdke, Marisa V. Costa, José Gimeno Sacristán, den-tre outros.

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• Veja o currículo como um viés crítico, pondo em evidência as re-alidades ao seu redor;

• Perceba que todos os envolvidos no processo educacional são produtores de conhecimento e cultura.

Um currículo assim concebido, dentre outras possibilidades, pode transformar os seres humanos de objetos a sujeitos da ação educacional, contribuindo para que formas de dominação sejam desestruturadas e para o desenvolvimento de processos de consti-tuição da identidade que possam levar ao inconformismo com a do-minação social e, dessa forma, possam levar todos os membros da comunidade escolar à conquista da autonomia (OLIVEIRA, 2003).

Outra dimensão organizativa é a avaliação escolar/educacio-nal. A avaliação da educação ou do processo ensino e aprendizagem, pois, constitui-se num dos grandes entraves da educação. É um nó que há anos tenta-se desatar, porém sem muito sucesso.

Porém, entra ano e sai ano e as escolas ainda insistem em dizer que não sabem avaliar, que não dá tempo para isso e para aquilo, que fazer prova dá trabalho, e uma série de desculpas que cristalizam e congelam a avaliação, tornando-a, muitas vezes, um processo que, ao invés de conduzir o aluno à aprendizagem, faz com que este se torne culpado por um fracasso que, na maioria das vezes, não é seu.

Como alertam Weber; Costa; Stange (1998, p. 139), “a avaliação no âmbito educacional está estreitamente vinculada às necessidades crescentes de controle, ordenamento e seleção social que emergiram a partir da revolução industrial, daí explica-se que contenha como elementos intrínsecos a mensuração e a comparação”.

Infelizmente, apesar de tantos estudos e debates em torno da temática nos meios acadêmicos e científicos, no cotidiano escolar a avaliação tem servido como “bastão de Moisés”, separando as águas entre aqueles que são bons alunos e aqueles que não são.

Entretanto, a escola precisa entender que o processo avaliativo pode deixar de ser algo massacrante para tornar-se algo que con-tribui para o desenvolvimento dos seres humanos inseridos numa contextualidade cidadã, como destaca com muita propriedade Ho-ffmann (1993; 1994) .

Nesse sentido, a escola inserida numa concepção democrática, interdisciplinar e multicultural precisa compactuar da concepção de que a avaliação deve ser “compreendida como um conjunto de atua-ções que tem a função de alimentar, sustentar e orientar a interven-ção pedagógica, acontecendo de forma contínua e sistemática, por meio da interpretação qualitativa do conhecimento construído pelo aluno sob orientação do professor” (BRASIL, 1997, p. 81).

Comungando dessa perspectiva, propomos como possibilida-de de construção de um processo avaliativo democrático aquele que se constitui num:

• Elemento integrador entre aprendizagem e ensino;• Conjunto de ações para que o aluno aprenda melhor;• Conjunto de ações que busca obter informações sobre o que e

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como foi aprendido;• Elemento de reflexão contínua para o professor e a escola so-

bre sua prática educativa;• Instrumento que possibilita ao aluno tomar consciência de

seus avanços, dificuldades e possibilidades futuras;• Processo que ocorre durante toda a ação de ensino e aprendi-

zagem e, não apenas, em momentos específicos;

Entendendo-se dessa forma, parte-se de uma avaliação funda-mentalmente tradicional para uma concepção crítica, dialética, pra-xiológica, onde não só o aluno é avaliado, mas também o ensino, a escola, as relações, os docentes, técnicos, em suma, todos os sujeitos da ação pedagógica.

d) Estratégias de ensinoQuando se fala em estratégias de ensino, a primeira coisa que

nos vem à mente é algo concernente ao modo como se dá a trans-missão dos conteúdos culturalmente construídos. Porém, temos ob-servado que por estratégias de ensino podemos vislumbrar uma sé-rie de outras considerações.

Segundo Rosemberg; Lima; Valladares (1998, p. 102-103) esse processo pode ser assim sintetizado:

• Considera-se a metodologia como parte indissociável do ato pedagógico, não se levando em conta a possibilidade de ela ser neutra;

• O método define o “como agir”, numa dimensão mais ampla que as estratégias, entendidas como atividades aplicáveis a di-ferentes circunstâncias do ato pedagógico, atendendo ao dire-cionamento traçado pelo método;

• As estratégias devem ser adequadas às tecnologias disponíveis no momento histórico, sem, contudo, perder sua especificida-de de ação pedagógica mediadora do contato aluno/profes-sor/conhecimento.

Nesse sentido é bom salientar que a não pode se prender a um método específico, mas, sim, a uma concepção de educação voltada para uma linha de pensamento e ação que seja identificada com o tipo de sujeito que quer formar, o tipo de ser humano que acredita, ou seja, precisa refletir de modo crítico-dialético suas concepções fi-losóficas, antropológicas, psicológicas e sociais, afinal, é a linha de ação da escola que vai fazer com que esse ambiente rompa com as mazelas tradicionais do ensino bancário e passe a ser uma via de mo-bilização social em prol de uma educação dialética que tem como foco central a libertação intelectual dos seus sujeitos. Uma educação calcada em estratégias de ensino que perpetuam a servidão, o con-teudismo e a desvalorização das experiências pessoais não pode ter lugar numa sociedade que prima pela equalização e valorização das diferenças.

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e) Conteúdos de ensinoIntimamente associado ao exposto até este momento, outro

aspecto que precisa ser discutido quando se tem em mente uma es-cola crítica e reflexiva refere-se aos conteúdos de ensino. Por conteú-dos de ensino podemos entender como sendo:

Uma parte integrante da matéria-prima é o que está contido em um campo do conhecimento. Envolve infor-mações, dados, fatos, conceitos, princípios e generaliza-ção pelas experiências do homem em relação a um âm-bito ou setor da atividade humana. [...] Os bens culturais, quando adaptados, elaborados e organizados pedagogi-camente, compõem os conteúdos programáticos. Estes constituem a fonte de onde o professor seleciona o con-junto de informações que trabalhará com seus alunos (TURRA, apud ALVES; CARARO; FIGUEIREDO, 1998, p. 73).

Os conteúdos de ensino numa escola que tem como sujeitos pessoas que possuem uma história, uma cultura, peculiaridades e particularidades tão próprias como aqueles das escolas do campo precisa assumir outra postura. Ao contrário de antes, quando eram repassados como informações a serem incorporadas e assimiladas de forma a-crítica, hoje se assume libertária, uma visão histórico-crítica, integrada e concreta.

[...] ao invés de um ensino em que o conteúdo seja visto como um fim em si mesmo, o que se propõe é um ensino em que o conteúdo seja visto como meio para que os alu-nos desenvolvam as capacidades que lhes permitam pro-duzir e usufruir dos bens culturais, sociais e econômicos (BRASIL, 1997, p. 73).

Porém, vale salientar que os conteúdos de ensino não se encer-ram em si mesmos, eles precisam ser encarados como possibilidade de mediação entre o que foi construído historicamente, o que está sendo descoberto e transformado a cada dia e aquilo que pode vir a ser proposto como novo saber, e o ser humano em plena evolu-ção. Para tanto, entendemos que os conteúdos de ensino devem es-tar articulados a fundamentos filosóficos e históricos da educação, à concepção de indivíduo e sociedade, à pressupostos teóricos acerca do desenvolvimento humano e “suas relações com a aprendizagem, expressando-se como um dos elementos da matriz pedagógica, a pressupor a seleção e organização de conteúdos, a metodologia de ensino e as diretrizes de avaliação” (MARTINS, 2009, p. 94).

De acordo com os parâmetros curriculares nacionais (BRASIL, 1997), os conteúdos de ensino precisam dar conta de, no mínimo, três categorias: conteúdos conceituais; que envolvem essencialmen-te fatos, conceitos e princípios; conteúdos procedimentais, que en-volvem a utilização consciente de procedimentos para a realização de determinadas tarefas e assimilação crítica da serventia de tais con-teúdos para a vida prática; e conteúdos atitudinais, que envolvem a abordagem de valores, normas e atitudes comportamentais para melhor adaptação às normas socialmente estabelecidas.

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f) Sobre diversidade e seus desdobramentosEntendemos que esses aspectos – currículo, avaliação, estraté-

gias de ensino e conteúdos, além do planejamento da ação pedagó-gica – é preciso observar de modo crítico e reflexivo as características dos sujeitos escolares no sentido de que injustiças e conseqüente desvalorização da diversidade e da multiculturalidade que podem ser o grande ponto positivo do grupo, não sejam realizadas e inter-nalizadas nos campos curriculares, avaliativos e cotidianos, ou seja, há que se observar atentamente quem é o grupo ao qual está se pen-sando a educação para que não caiamos nos erros típicos de uma sociedade que desqualifica seus sujeitos pelas características físicas, mentais, sensoriais, comportamentais, religiosas, étnicas, culturais, sexuais, de gênero, dentre outras.

Quando se fala nesses aspectos a primeira coisa que nos vem à mente é diversidade, exclusão, inclusão. Entendemos que enquanto falarmos sobre inclusão é porque a exclusão está acontecendo. Além disso, temos claro que a exclusão é um conceito que emerge das re-lações sociais estabelecidas historicamente entre os seres humanos no contexto da diversidade.

O conceito que temos de inclusão é aquele que parte do pres-suposto de que vivemos numa diversidade humana extremamente rica, em constante mudança e que todas as pessoas, independentes de características e peculiaridades que marcam a diversidade huma-na, são seres únicos em sua existência.

A inclusão vista sobre esta ótica é aquela que vê em todos os alunos características de seres produtores/reprodutores de história e cultura, ao mesmo tempo em que se apropriam dessa história e des-sa cultura. Assim, pensar em inclusão na escola, e consequentemen-te em sua organização, composição e responsabilidade, é pensar no bem estar e no “sucesso” do aluno incondicionalmente, pois,

A inclusão diz respeito a todos os alunos, e não somente a alguns. Ela envolve uma mudança de cultura e de orga-nização da escola para assegurar acesso e participação para todos os alunos que a freqüentam regularmente e para aqueles que agora estão em serviço segregado, mas que podem retornar à escola em algum momento no futuro. A inclusão não é a colocação de cada criança individual nas escolas, mas é criar uma ambiente onde todos os estudantes possam desfrutar o acesso e o su-cesso no currículo e tornar-se membros totais da comu-nidade escolar e local, sendo, desse modo, valorizados (MITTLER, 2003, p. 236).

Pensando e compactuando com as idéias de Mittler (2003) e de tantos outros autores, que tratam da temática, bem como tendo claro o fato de que “em educação, a diversidade pode estimular-nos à busca de um pluralismo universalista que contemple as variações da cultura, o que requer mudanças importantes de mentalidade e de fortalecimento de atitudes de respeito entre todos e com todos” (SA-CRISTAN, 2002, p. 23), cabem algumas considerações sobre alguns focos de exclusão que a escola precisa se propor a combater, propor-cionando a plena inclusão da pessoa no cotidiano escolar:

Sobre diversidade

O que é o ser humano? O que é ser humano para você? O que é diversi-dade? Falar em diversidade no con-texto escolar é falar em diferenças humanas. A diversidade humana é representada, principalmente: por origem étnico-racial ou sociocultu-ral; nacionalidade; língua; cognição; opinião política ou outra; preferência sexual ou religiosa; gênero; cor; idade e deficiência. Ou seja, é falar de ser humano, já que todos são diferentes.

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Diversidade religiosaConforme as leis da República Federativa do Brasil (BRASIL,

1988; e outras) todas as pessoas têm liberdade religiosa, sendo re-pudiada qualquer forma de discriminação. Assim, é precisa assumir e entender que todos os seus sujeitos têm liberdade de assumirem características religiosas próprias de seu meio social, não adotando atividades de cunho pedagógico-disciplinar que caracterize um tipo de religião específica, respeitando todas as preferências e não per-mitindo a incidência de uma sobre as outras. Portanto, são desacon-selhados momentos essencialmente religiosos, aulas baseadas com dogmas religiosos, assim como utilização de símbolos de qualquer espécie e que venham a desconsiderar outras formas de crenças e valores religiosos.

Comemorações como páscoa, natal, ação de graças e outras datas religiosas precisam ser cuidadosamente planejadas para que todas as crianças entendam a religião como uma forma própria, indi-vidual, inserida num determinado coletivo, de prestar homenagem àquilo que acredita ser Deus ou seu representante.

Diversidade ÉtnicaA legislação brasileira (Constituição de 1988 e outras) é clara

quando diz que todos nós somos iguais perante a lei e temos direi-tos e deveres como qualquer outra pessoa. Entretanto, temos clareza que o Brasil, em função de sua colonização portuguesa desenvolveu um ideário de cultura étnica branca, cristã (católica), Eurocêntrica e machista/paternalista que permanece enraizada como modelo a ser seguido até hoje no imaginário de muitas famílias, professores e co-munidades escolares.

Se adentrarmos para a história do Brasil perceberemos um ecletismo étnico-cultural, que não se vê em outros países de nenhum outro continente; temos italianos, alemães, portugueses, orientais, espanhóis, pomeranos, africanos de origem negra e árabe, dentre uma série de outras etnias que compõem a diversidade da popula-ção brasileira.

A escola, por sua vez, não fica à margem dessa realidade: ela funciona como uma microssociedade representativa dessa diversi-dade macro. Às vezes com prevalência de uma descendência étnica sobre a outra, mas com representação de várias.

Pensando assim, não podemos valorizar uma etnia em detri-mento de outras, já que todas têm seu papel e seu quinhão de impor-tância para a cultura, economia e sociedade brasileira, mesmo que muitas vezes não reconhecida, como a etnia negra e pomerana, por exemplo, que até hoje sofrem com a não valorização de seus costu-mes em várias áreas do Brasil.

Nesse contexto, levando em consideração essa pluralidade e observando que a valorização sócio-cultural da pessoa pode fazer com que esta se veja e se perceba como importante tanto para si quanto para os outros, e em conformidade com a legislação brasi-leira, a escola democrática que se propõe libertária, em seu Projeto

Sobre diversidade

Apesar de a Lei nº 11.645/08 tratar do ensino fundamental e médio, sugeri-mos que a temática seja trabalhada desde a educação infantil até o ensino superior, uma vez que lidamos com a diversidade étnica desde a mais ten-ra idade, e não num único período da vida. Além disso, sugerimos a in-corporação de etnias: pomeranos, japoneses, paraguaios, que também sofrem discriminação.

Lei nº 11.645/08Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezem-bro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.

Art. 26 -ANos estabelecimentos de ensino fun-damental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o es-tudo da história e cultura afro-brasi-leira e indígena.

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Político Pedagógico, precisa reconhecer o papel de todas as etnias para a consolidação da cultura, história, economia e outros aspectos da sociedade brasileira e se comprometer a não valorizar uma(s) em detrimento de outra(s), mas aproveitando aquilo que tem de melhor para assim contribuir para o enriquecimento cultural do grupo.

Pessoas com deficiência e/ou com necessidade educacionais especiais

Assim como nos itens anteriores ressaltamos que a legislação brasileira é clara quando diz que a educação é direito de todos. Em relação à educação especial, o Brasil é um dos países mais avançados no assunto quando se fala em direitos garantidos em lei. Temos a LDB 9394, o Plano Nacional de Educação de 2001, o Estudo da Criança e do Adolescente, a Resolução do Conselho Nacional de Educação 02/ 01, Decreto 5626/05 sobre LIBRAS, dentre uma série de outras que garantem os direitos à educação, saúde, assistência, trabalho, loco-moção à todas as pessoas com deficiência.

Entretanto, o que se vislumbra no cotidiano é algo muito di-ferente: pessoas com deficiência excluídas dos ambientes comuns, sem acesso à saúde, educação, assistência, assim como milhões de pessoas que, por serem diferentes do padrão estético imposto pela mídia, sofrem todas as mazelas que a sociedade impõe.

Alguns estudos (DRAGO, 2007; MANTOAN, 2003; KASSAR, 1999) têm mostrado, em realidades distintas, que os problemas en-frentados pelas pessoas com deficiência em relação à educação, por exemplo, têm sido estarrecedores. As pessoas, quando têm acesso, recebem um serviço que acabam excluindo e fortalecendo a falta, a deficiência e o defeito, ao invés de buscar/valorizar as possibilidades e potencialidades dessas pessoas.

Diante do exposto, e entendendo que de acordo com Freire (2006, p. 136) “O sujeito que se abre ao mundo e aos outros inaugura com seu gesto a relação dialógica em que se confirma como inquie-tação e curiosidade, como inconclusão em permanente movimento na História”, pensar numa escola inclusiva onde pessoas com defici-ência, com preferências sexuais diferentes, com crenças religiosas va-riadas, com culturas múltiplas advindas de sua etnia, se sintam bem aceitas é pensar numa escola que mude sua postura, que se liberte de conceitos e dogmas estéticos, que veja os seres únicos, com difi-culdades e possibilidades, pois,

A inclusão escolar envolve, basicamente, uma mudança de atitude face ao outro: que não é mais um indivíduo qualquer, com o qual topamos simplesmente na nossa existência e com o qual convivemos um certo tempo, maior ou menor, de nossas vidas. O outro, é alguém essencial para a nossa constituição como pessoa [...] (MANTOAN, 2004, p. 81).

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Sugestão de FilmesPara o trabalho com as diferenças no sentido de necessidades

educativas especiais sugerimos:• Vermelho como o céu;• Procurando Nemo;• À primeira vista;• Filhos do silêncio;• Janela da alma;• Leon e Olvido;• Meu pé esquerdo;• O homem elefante;• Rain man;• Uma mente brilhante.

g) Acompanhando à ação pedagógicaO acompanhamento à ação pedagógica compõe-se de uma sé-

rie de ações que objetivam aprimorar o processo de ensino e apren-dizagem, dar maior fluidez e dinamismo ao cotidiano e proporcionar uma qualidade superior ao serviço público prestado.

Entende-se por acompanhamento à ação pedagógica ações que envolvem a avaliação dos profissionais da escola, acompanha-mento dos alunos, recuperação paralela, conselho de classe e avalia-ção institucional.

Para o estabelecimento de estratégias de acompanhamento das ações pedagógicas torna-se imprescindível o conhecimento dos objetivos gerais da educação básica oficializados em documentos le-gais que têm tentado dar uma orientação curricular para o ensino no Brasil, (BRASIL, 1997, 1998, e outros) tais como:

• Compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e so-ciais, adotando, no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, coopera-ção e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito;

• Posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas;

• Conhecer características fundamentais do Brasil nas dimensões sociais, materiais e culturais como meio para construir progressi-vamente a noção de identidade nacional e pessoal e o sentimen-to de pertinência ao País;

• Conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação basea-da em diferenças culturais, de classe social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características individuais e sociais;

• Perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente, identificando seus elementos e as interações entre eles, contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente;

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• Desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o senti-mento de confiança em suas capacidades afetiva, física, cogni-tiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania;

• Conhecer e cuidar do próprio corpo, valorizando e adotando hábitos saudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de vida e agindo com responsabilidade em relação à sua saúde coletiva;

• Utilizar as diferentes linguagens – verbal, matemática, gráfica, plástica e corporal – como meio para produzir, expressar e co-municar suas idéias, interpretar e usufruir das produções cultu-rais, em contextos públicos e privados, atendendo a diferentes intenções e situações de comunicação;

• Saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecno-lógicos para adquirir e construir conhecimentos;

• Questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolve-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criativi-dade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação.

h) Formação continuada dos profissionais da escolaA formação de professores, hoje, tem sido alvo de debates, pes-

quisas e estudos que têm mostrado que a formação inicial – alcan-çada nos cursos de formação docente nas universidades/faculdades – não tem dado conta de formar profissionais realmente capacitados para a atuação docente de qualidade. A esse fato associa-se a baixa qualidade dos cursos de formação, instalações de ensino precárias, pouca ênfase na leitura, na exercitação prática daquilo que se vê na teoria, dentre outros aspectos. Entretanto, não se pode negar a im-portância da formação inicial, já que, como o próprio nome diz, é uma formação introdutória, inicial, pré-preparatória e que precisará ser complementada.

De acordo com Perrenoud (2002, p. 20) “a formação inicial des-tina-se a seres híbridos, estudantes-estagiários que se tornaram pro-fissionais. Ela deve formá-los para uma prática que, na melhor das hipóteses, está nascendo, ou foi sonhada”.

Nesse sentido, a formação continuada que tem como ponto de partida dar continuidade, a partir dos saberes acadêmicos dos pro-fessores, à formação docente assume caráter essencial para a condu-ção de um trabalho pedagógico de qualidade e alicerçado em bases teórico-práticas sólidas, consistentes e refletidas no conjunto da co-munidade escolar.

Afinal, como salienta Perrenoud

A formação continuada visava e sempre visa atenuar a defasagem entre o que os professores aprenderam du-rante sua formação inicial e o que foi acrescentado a isso a partir da evolução dos saberes acadêmicos e dos programas, da pesquisa didática e, de forma mais ampla, das ciências da educação. (PERRENOUD, 2002, p.21)

Indicação de Leitura

Para um aprofundamento nas ques-tões acerca da formação de professo-res tanto inicial quanto continuada, sugerimos autores como António Nóvoa, Janete Magalhães Carvalho, Bernard Charlot, Sonia Kramer, Mauri-ce Tardif, Menga Lüdke, Philippe Per-renoud, Erineu Foerste, dentre outros.

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Encarando dessa forma, percebe-se que hoje, diante de tantas inovações tecnológicas, tantos conhecimentos novos, tantas lingua-gens e pensamentos que surgem a cada dia, não se pode mais firmar o processo ensino-aprendizado em algo engessado e que se remete ao nosso passado como discente. Precisamos assumir uma postura inovadora, construtiva e “antenada” com a realidade sócio-cultural deste início de século.

Portanto, “a formação contínua pode desempenhar um papel importante na configuração de uma ‘nova’ profissionalidade docen-te, estimulando a emergência de uma cultura organizacional no seio das escolas” (NOVOA, 2002, p. 56).

Pensar numa proposta de formação continuada para a escola que se pretende democrática e alicerçada em bases transformadoras da sociedade e dos indivíduos que dela participam é dar continui-dade a uma prática de sucesso que vem sendo estabelecida desde o momento em que o corpo docente, técnico, pedagógico, administra-tivo e de apoio entendem que formação continuada não é participar de um evento no início e outro no final do ano letivo, mas, sim, um processo dinâmico, vivo, atuante, reflexivo e que realmente conduz à mudanças nos processos sócio-psico-educativos.

O corpo de profissionais da escola, ao se propor a estabele-cer um projeto político pedagógico integrado a uma educação in-terdisciplinar e multicultural tem, e precisa manter o entendimento de que “a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanen-te de uma identidade pessoal” (NÓVOA, 2002, p. 57). Nesse sentido, a escola e seus profissionais precisam entender que a formação não se dá somente no contexto extra-escolar, mas também no ambiente escolar, no cotidiano das relações.

Por formação continuada na escola pode-se entender como aqueles espaços de debate sobre a práxis educativa, que têm como objetivo refletir no conjunto dos profissionais da escola, sobre assun-tos específicos da realidade docente vivenciada.

Além desses espaços, entendemos como formação continua-da na escola os momentos de planejamento, diário e semanal, entre professores e pedagogos; grupos de estudo na escola; publicização dos conhecimentos produzidos; dentre outros aspectos causadores de mudanças educacionais e de transformação positiva das práticas pedagógicas dentro e fora da sala de aula/escola.

Um projeto político pedagógico que assume a característica formativa como um de seus fios condutores leva a crer que a for-mação continuada na escola siga o caminho da “dimensão coletiva”, onde todos os envolvidos no processo educativo sintam-se formado-res-formandos contribuindo para que o grupo se fortaleça de forma praxiológica.

Afinal, como salienta Nóvoa,

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Práticas de formação contínua organizadas em torno dos professores podem ser úteis para a aquisição de co-nhecimentos e técnicas, mas favorecem o isolamento e reforçam uma imagem dos professores como transmis-sores de um saber produzido no exterior da profissão. Práticas de formação contínua que tornem com referên-cia as dimensões coletivas contribuem para a emancipa-ção profissional e para a consolidação de uma profissão que é autônoma na produção de seus saberes e dos seus valores. (NÓVOA, 2002, p.58-59)

Se no contexto escolar a formação assume caráter extremamen-te importante, não descartamos, por outro lado, o papel da formação continuada oferecida por outras instituições através de cursos, even-tos, palestras, seminários e atividades similares. Isso pelo fato de en-tendemos que este também seja um caminho de construção coletiva baseado no encontro. Não que acreditemos que uma palestra ou um evento dê conta da diversidade e complexidade da escola e da ação pedagógica, mas acreditamos que desses eventos/encontros podem surgir novas propostas de trabalho, novas idéias e possibilidades de reflexão da/na/sobre a escola e a prática pedagógica.

Entendemos que esses eventos formativos na verdade são eventos desencadeadores de possibilidades de formação, de encon-tros, de conversa, de trocas, de intersubjetividades que muitas ve-zes se guardam no interior da escola, na mesma realidade. Encontros desses fazem com que os professores de diferentes escolas se vejam, troquem idéias, fortaleçam saberes fúteis ou não, mas que partem de um diálogo, pois

O diálogo ente os professores é fundamental para con-solidar saberes emergentes da prática profissional. Mas a criação de redes coletivas de trabalho constitui, tam-bém, um fato decisivo de socialização, profissional e de afirmação de valores próprios da profissão docente (NÓVOA, 2002, p. 63 – 64).

Unindo a temática... se é que se pode falar em separação

Uma Política de Pública de Educação do Campo deve respeitar todas as formas e modalidades de educação que se orientem pela existência do campo como um es-paço de vida e de relações vividas, porque considera o campo como um espaço que é ao mesmo tempo pro-duto e produtor de cultura. É essa capacidade produtora de cultura que o constitui como um espaço de criação do novo e do criativo e não, quando reduzido meramen-te ao espaço da produção econômica, como o lugar do atraso, da não-cultura. O campo é acima de tudo o espa-ço da cultura (BRASIL, 2003).

O processo de construção do projeto político pedagógico no contexto da educação de modo geral precisa abarcar uma série de

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questões e aspectos, além dos elementos vistos, que perpassam o cotidiano sócio-psico-educativo em todos os seus aspectos, incluin-do-se aí os aspectos intelectuais, morais, afetivos, sociais, antropo-lógicos, culturais, étnicos, físicos, sensoriais, atitudinais, psicológicos, históricos, lingüísticos, religiosos, comportamentais dentre tantos outros que compõem as características que diferenciam o ser huma-no dos outros animais.

Essas características comporiam aquilo que poderíamos identi-ficar como interculturalidade. A interculturalidade está estritamente associada à diversidade cultural, ao movimento migratório e ao re-conhecimento da diversidade humana como condição própria dos seres humanos em evolução. Segundo Vasconcelos (s/d), o conceito de interculturalidade tem sido “usado para indicar um conjunto de propostas de convivência democrática entre diferentes culturas, bus-cando a integração entre elas sem anular sua diversidade, ao contrá-rio, fomentando o potencial criativo e vital resultante das relações entre diferentes agentes e seus respectivos contextos”.

Sugestão de FilmesPara incrementar o debate sobre interculturalidade sugerimos:• Crash, no limite;• Babel;• O jardineiro fiel;• Quem quer ser um milionário;• Amor sem fronteiras;• Entre dois amores;• O vizinho;• Homens de honra;• Em minha terra;• Central do Brasil; dentre outros

Ao se valorizar as múltiplas características humanas presentes na cultura de cada grupo social pertencente à comunidade escolar no contexto do projeto político pedagógico em todos os seus aspec-tos, tem-se a possibilidade de se enriquecer o processo educativo na medida em que os sujeitos passam a se ver e a se identificar com a nova realidade à qual estão fazendo parte. Ou seja, pode-se pressu-por nessa valorização e identificação dos sujeitos, uma proposta que ultrapassa a mera coexistência de culturas distintas no seio escolar, aquilo que comumente chamamos de multiculturalidade, mas sim o reconhecimento e o incremento de ações que coadunem as várias culturas de modo que todos se apropriem das várias possibilidades num processo que denominamos inter. Daí a necessidade de o pro-jeto político pedagógico abarcar essas culturas e proporcionar ações que sejam propiciadoras desse reconhecimento.

Nesse processo dialético e sistemático, vale destacar que a educa-ção do campo é um dos cenários propícios para que se estabeleça um diálogo intenso entre as diferentes linguagens e diferentes manifesta-

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ções culturais a partir de outro detalhe que o projeto político pedagógi-co precisa estabelecer como fio condutor: a interdisciplinaridade.

A interdisciplinaridade enquanto aspiração emergente de superação da racionalidade científica positivista aparece como elemento de uma nova forma de institucionalizar a produção do conhecimento nos espaços da pesqui-sa, na articulação de novos paradigmas curriculares e na comunicação do processo [ao se perceber] as várias disciplinas; nas determinações do domínio das investi-gações, na constituição das linguagens partilhadas, nas pluralidades dos saberes, nas possibilidades de trocas de experiências e nos modos de realização da parceria<http://www.angelfire.com/sk/holgonsi/interdiscip3.html>

Pensar o projeto político pedagógico na perspectiva de reve-lar toda a gama cultural, a possibilidade de diálogo intercultural e um trabalho pedagógico fundamentado em pressupostos de valo-rização da diversidade própria da macrossociedade é pensar num projeto que tem como fundamento básico essa “conversação” entre os vários saberes/conhecimentos produzidos, criados, construídos, reproduzidos e repassados, sem perder de vista as disciplinas e seu corpus de conhecimento historicamente arquitetado.

Trabalhar a interdisciplinaridade não significa negar as especificidades e objetividade de cada ciência. O seu sentido reside na oposição da concepção de que o conhecimento se processa em campos fechados em si mesmo, como se as teorias pudessem ser construí-das em mundos particulares sem uma posição unifi-cadora que sirva de base para todas as ciências, e iso-ladas dos processos e contextos histórico-culturais <http://www.angelfire.com/sk/holgonsi/interdiscip3.html>

Reconhecer a importância das disciplinas e de seus saberes como possibilidade de trabalho educacional que interaja com os sa-beres construídos socialmente por cada comunidade é, sem dúvida um dos pontos chave da proposta de educação do campo e do pro-jeto político pedagógico para que a educação do campo seja reco-nhecida como um direito e não como uma forma de favor ou com-pensação.

Para tanto, o projeto político pedagógico numa perspectiva intercultural e interdisciplinar para a valorização da educação do campo precisa ser aquele que dialogue com uma proposta efetiva de “política públicas sérias que sejam elaboradas de nosso próprio lugar. Que tenham a nossa cara, o nosso jeito de ser, de sentir, de agir e de viver [...]” (HAGE, 2005).

Para a realização das atividades utilize os textos auxiliares e complementares que compõem o CDRON deste tópico.

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ATIVIDADES DIDÁTICAS

1 – Após assistir ao filme “Conrack”, estabeleça um paralelo en-tre o contexto apresentado no filme e a educação de modo geral e do campo de modo específico.

2 – A partir da leitura do material impresso e no CD ROM ar-gumente sobre as possibilidades de construção do Projeto Político Pedagógico numa escola campesina, levando em consideração a in-terculturalidade e a interdisciplinaridade, como pontos cruciais para o estabelecimento de uma relação dialética, inclusiva e democrática de educação.

3 – Após leitura dos textos sugeridos no CD ROM destaque os pontos essenciais para a construção do Projeto Político pedagógico na escola comum. Identifique possíveis semelhanças e/ou diferenças entre a educação urbana e a educação no campo.

4 – De acordo com Drago e Rodrigues, o planejamento das ações pedagógicas no contexto da educação no campo é de suma importância para que se eliminem práticas espontaneístas e impro-visadas na escola. Assim, pensando no papel que a educação tem como ferramenta de transformação social, planeje cinco ações inte-gradas entre os profissionais, a comunidade e o corpo discente que possibilitem a relação entre a cultura, as disciplinas escolares e a pro-posta de educação campesina.

5 – Com base nos estudos desenvolvidos, faça um levantamen-to em sua escola sobre as concepções de avaliação que se fazem pre-sentes. Para fazer esse levantamento organize um roteiro de questões visando colher os dados, por meio de entrevistas ou da aplicação de questionário junto aos diferentes segmentos da comunidade escolar (professores, alunos, equipe pedagógica, pais, demais servidores da escola, etc.). Eis algumas sugestões para seu roteiro:

O que você entende por avaliação?Para você, há distinção entre avaliação somativa, formativa e

diagnóstica? Comente sua resposta.Qual a importância da avaliação para o desenvolvimento da

ação educativa?Que estratégias avaliativas costuma usar?Que resultados você tem obtido com as estratégias usadas?

6 – A partir das leituras e reflexões já desenvolvidas, comente no fórum de debates virtual os pontos centrais relativos à participa-ção e democratização na/da escola:• Quais as principais dificuldades enfrentadas em sua escola para via-

bilizar a participação de professores, equipe de apoio, pais, alunos e outros segmentos na construção do Projeto Político Pedagógico?

• Quais os canais, mecanismos e estratégias que poderiam ser utiliza-dos em sua escola para viabilizar a participação dos diferentes seg-mentos na construção ou revisão do Projeto Político Pedagógico de sua escola?

• Que mecanismos são usados para valorizar as diferentes culturas e linguagens presentes na escola campesina?

Sugestão - Grupo de estudo: for-mar grupos de até quatro compo-nentes para trabalhar os textos e realizar atividades propostas. Este grupo prepara discussões para os encontros coletivos.

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Planejamento Educacional: em busca de uma aborda-gem sistêmica e regional

Marcelo Lima3

Com a democratização da sociedade e o advento mais recen-temente da gestão democrática no Brasil tornou-se cada vez mais estratégico definir o que fazer da educação e por isso todos - socieda-de, família, alunos, comunidade, profissionais, etc - querem Interferir, definir, influenciar, participar, portanto, das escolhas políticas sobre a gestão, a administração, o financiamento, o funcionamento e o uso do espaço escolar, o que toma corpo e materialidade nos dispositi-vos legais, nos recursos disponibilizados, nos currículos, na qualidade dos profissionais e, sobretudo no tipo de aprendizagem produzida no final das contas.

Para além da definição dos objetivos educacionais, como toda ação pública, o Estado precisa prever e prover uma série de instru-mentos, equipamentos e meios para se atingir os fins da educação e por isso ganha destaque aspecto que, por vezes, passa desapercebi-do: o planejamento educacional por meio do qual pode-se antecipar no tempo ao nível de um plano não só o que fazer, mas o como , isto é os instrumentos, as varáveis intervenientes, os caminhos intermediá-rios necessários de se percorrer para resolver problemas inerentes à oferta do serviço público educativo à população.

Em geral os educadores interessam-se pela definição macro, de âmbito nacional, ou local, de âmbito local-escolar, mas participar e conhecer as entranhas do planejamento educacional ao nível dos sistemas de ensino tem pouca relevância, mas vale lembrar que este constitui num método indispensável de se administrar a coisa públi-ca que pode conferir certa racionalidade ao processo de execução da política educacional.

É preciso avançar nos estudos sobre sistemas educativos esta-duais e municipais, pois abordar apenas os níveis macro e o micro impede a percepção do importante papel de mediação exercidos pelos sistemas de ensino. Alguns desses como os sistemas estaduais, no que pese a intensa municipalização do ensino, chegam a possuir milhares de unidades escolares.

Precisa-se socialmente promover a apropriação não apenas do debate dos fins da educação, mas também dos meios para promovê-la, pois a ciência dos meios, intencionalmente hermética, pela sua opacidade tornou-se pouco atraente e em alguns casos inacessível, gerando dois equívocos igualmente danosos na visão dos educado-res em geral. Por um lado, os educadores mais desavisados supervalo-rizavam os meios, no contexto do estado na sua vertente intervencio-nista, entendendo-os como matéria exclusiva dos entendidos, mas hoje, no âmbito do estado neoliberal, os educadores mais críticos te-dem a desconsiderar a importância dos meios por supervalorizarem os fins. Essa contradição denota uma espécie de superpolitização dos

3 Doutor em Educação pela UFF e Professor Adjunto do Centro de Educação da UFES

Indicação de Leitura CDROM

Para um melhor entendimento acerca das questões que envolvem a temáti-ca deste texto, sugerimos a leitura da versão completa no Apêndice ou no CD-ROM que acompanha este livro. O texto completo traz detalhadamente o Plano Estadual de Educação Profis-sional, além de outras informações essenciais para se pensar a educação profissional no contexto campesino articulada ao planejamento educa-cional de modo amplo.

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Unidade III: O Projeto Político Pedagógico como articulador do trabalho da comunidade escolar: interculturalidade, interdisciplinaridade e campesinato

educadores que preferem discutir a política, o financiamento, os sa-lários, a função da educação, etc, desapercebendo o quão pode ser estratégicos alguns processos mediadores que acabam por interferir sobremaneira nos fins. Destaca-se nessa direção, portanto, a impor-tância do planejamento, no âmbito dos sistemas de ensino que, em-bora, não sejam tão determinantes do resultado da educação escolar como as políticas macro do MEC e dos processos micro das escolas, ainda assim, possuem papel relevante na política educativa.

Em 2009, o Governo do Espírito Santo lançou um edital de con-sultoria para elaboração do Plano Estadual de Educação Profissional, exigência do Ministério da Educação, para implementar uma série de convênios que envolviam a oferta de ensino médio e de educa-ção profissional que foi elaborado por um especalista em educação profissional, sendo publicado em 2009 e lançado em 2010. Segundo esse trabalho, a oferta de educação profissional para 2010 não exclui o que tem sido feito pelas redes estadual, federal e privada, apon-tando para a ampliação dessa modalidade de ensino, respeitando os princípios de a) Sustentabilidade da Demanda Econômica e Social, b) Garantia da Oferta Pública, c) Intercomplentaridade Territorial, Seto-rial e Interinstitucional e d) Qualidade da Capacidade Instalada. Des-sa forma, tentando suprir o “vácuo” formativo gerado, por um lado, pela expansão da população de 15 a 18 anos nos diversos territórios do estado do Espírito Santo e, por outro, pela expansão econômica registrada nos diversos APLs existentes em terras capixabas.

Com o crescimento econômico do estado do Espírito Santo em pleno século XXI a formação de técnicos tornou-se ainda mais de-mandada pela economia local assim como pelos jovens que querem uma melhor inserção no mercado de trabalho e prosseguir seus es-tudos no nível superior. Para atender a essas necessidades o governo estadual, orientado pelas modalidades e localização das áreas previs-tas no PEP 2010, buscou ofertar o ensino técnico para os jovens do Espírito Santo, mas o fez sem incorporar exatamente o que fora indi-cado no documento encomendado por este mesmo governo, aban-donando a estratégia de construção de escolas técnicas estaduais.

Segundo o argumento do governo, com a implantação dos IFES do Espírito Santo integrando as agrotécnicas e o antigo CEFETES em 15 campi (Vitória, Serra, Colatina, Linhares, Cariacica, Guarapari, Ven-da Nova, Nova Venécia, Piúma, Ibatiba, Cachoeiro do Itapemirim São Mateus, Santa Tereza, Alegre e Vila Velha), e tendo em vista o custo e a efemeridade da criação de uma infra-estrutura de escolas técnicas estaduais, optou-se por priorizar quase que exclusivamente a oferta do ensino público técnico por meio da bolsa SEDU.

A bolsa SEDU consiste em comprar vagas na rede de ensino médio privado do estado do Espírito Santo para estudantes que te-nham concluído todo o Ensino Médio Regular ou EJA/EM, inclusive CEEJA na rede pública, aos alunos concluintes do Ensino Médio Re-gular, Educação Profissional Integrada ao Ensino Médio ou Educação de Jovens e Adultos na rede pública estadual, municipal ou federal, e aos alunos de entidades reconhecidas como de utilidade pública.

Saiba mais

IFES - Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Espírito Santo.

CEFETES - Centro Federal de Educação Tecnologica do Espírito Santo.

SEDU - Secretária de Educação

EJA - Educação de Jovens e Adultos

EM - Ensino Médio

CEEJA - Centro Estadual de Educação de Jovens e Adultos

PEP - Programa de Educação Profissional

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Em 24/03/2010 em evento de lançamento do PEP e aula inau-gural do programa bolsa SEDU o presidente do Sinepe-ES (sindicato da escolas particulares) reforçou a importância da parceria do Go-verno do Estado, por meio da Sedu, com a iniciativa privada. “Não podemos mais ouvir que aqui no Espírito Santo não temos mão de obra qualificada. O Governo tem se esforçado e é para isso que existe essa parceria.” (www.sedu.es.gov.br acesso em 25-03-2010). Na oportuni-dade, o governador Paulo Hartung destacou que o Plano Estadual de Educação Profissional é um documento que traz um roteiro de trabalho que contempla oportunidades como as oferecidas por meio do programa Bolsa Sedu. Segundo ele, “Para que possamos estar pre-parados para enfrentar os desafios desse novo ciclo (..) Queremos que as novas oportunidades que surgem a cada dia sejam aproveitadas pe-los capixabas”(...) Quem está pagando essa bolsa para vocês é o povo capixaba”(www.sedu.es.gov.br acesso em 25-03-2010).

Apesar da aceitação pública, política e social do programa bol-sa SEDU, ele representa uma alternativa privatista e imediatista de oferta de ensino profissional no Espírito Santo, pois não cria nenhu-ma infraestrutura em termos de prédio e de equipamentos de forma-ção técnica para a educação no estado. Além disso, essa estratégia desconecta-se do ensino médio indo contra a política nacional de integração do ensino médio com o técnico. Do que se pode concluir que o planejamento educacional feito para o sistema estadual de en-sino não foi seguido pela SEDU em função de necessidades imedia-tas e interesses político empresariais.

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Apêndice

Os textos relacionados do CDROM também se encontram a seguir para sua apreciação

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Apêndice

Texto 1A construção do Projeto Político Pedagógico numa

escola de Vitória-ES: relatos de um processo

Rogério Drago1

Paulo da Silva Rodrigues2

Introdução

Observamos, atualmente, muitos estudos e pesquisas que têm mostrado a possibilidade de uma proposta de construção demo-crática da educação alicerçada em bases teóricas e legais que vêm contribuir para que a escola deixe de ser um mero aparelho ideológi-co transmissor de um conteúdo frio e sem vida, para ser um espaço transformador das relações sociais, afetivas e cognitivas, contribuin-do, dessa forma, para que os sujeitos da educação se vejam como co-participes da produção de cultura, conhecimento e história.

Nesse sentido, este artigo objetiva apresentar algumas con-cepções teóricas e práticas sobre o projeto político pedagógico e seu processo constitutivo no cotidiano de uma escola municipal de Vitó-ria – ES, num processo que envolveu a assessoria técnica-pedagógica aliada a uma proposta de pesquisa-ação-crítico-colaborativa, como ação que emerge das relações profissionais estabelecidas e ancora-das numa perspectiva de gestão democrática da educação que cul-minou com a construção coletiva do Projeto Político Pedagógico da escola em questão.

Para tanto, na primeira parte desse estudo apresentamos algumas concepções teóricas acerca da construção coletiva do projeto políti-co pedagógico e do papel da gestão democrática da educação/escola como possibilidade de inserção dialética dos membros da comunidade escolar, bem como suas principais concepções e passos essenciais para que sua construção seja concretizada de forma democrática.

Na segunda parte apresentamos, em forma de relato a realida-de, os sujeitos/atores da ação desenvolvida, o processo desencade-ado no decurso da construção do projeto político pedagógico, suas nuances, discussões, debates, grupos de estudo, em suma, os princi-pais passos que envolveram a implementação na prática dos pontos estudados de forma teórica.

Por fim, à guisa de considerações finais, fazemos uma análise dos dados coletados à luz da teoria subjacente à gestão democrática da educação e do Projeto político Pedagógico como proposta de traba-lho que envolve os sujeitos da educação numa perspectiva subjetiva, ou seja, uma proposta de ação sócio-psico-educacional que passa a ver a escola como um lugar de produção de conhecimento a partir da prática e da ação integrada dos atores que compõem este cenário.

1 Doutor em Educação, Professor Adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo.2 Mestrando em Educação PPGE/CE/UFES, Professor do Sistema Municipal de Ensino de Vitória.

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Projeto Político Pedagógico: abrindo o foco para direcionar o processo

Temos percebido em nosso cotidiano como docentes, pesqui-sadores e assessores da educação básica que no contexto educativo atual, não é mais possível conceber uma educação desvinculada de uma perspectiva política e pedagógica. Nesse sentido, ao se propor a elaboração do projeto político pedagógico, tem-se em mente que este processo prima pela organização didática, pedagógica, me-todológica e institucional de uma práxis educativa permeada pela constância da dialética voltada para os novos paradigmas sociais que emergem da modernidade que caracterizam a sociedade deste início de século. Além disso, se pensarmos nos estudos de Sennett (2004), podemos afirmar que a construção coletiva do projeto pedagógico da escola é um modo de se respeitar as concepções, as identidades e as subjetividades dos sujeitos que integram a realidade escolar.

Diante do exposto, como podemos permitir que nossas escolas continuem desenvolvendo suas atividades sem apresentar à comu-nidade sua proposta de trabalho? E, como podemos aceitar que o projeto político pedagógico seja pensado e elaborado por pessoas alheias ao processo pedagógico cotidiano da/na escola; ou simples-mente encaminhado pelos sistemas de ensino, sem considerar o co-letivo, as especificidades e as realidades das comunidades escolares, e ainda, as expectativas que estas têm em relação à qualidade da educação que será oferecida aos alunos?

Estamos cientes que para a construção de uma proposta peda-gógica, que ao ser executada seja capaz de oferecer uma educação de qualidade é preciso muito mais do que uma legislação que obri-gue a participação de educadores neste processo. Precisamos que cada um se envolva e se conscientize que não é mais possível per-mitir que esta organização continue oferecendo uma educação que não esteja sistematizada em uma proposta pedagógica elaborada a partir do coletivo da unidade de ensino, envolvendo toda a comuni-dade escolar.

Os profissionais da educação, pais, alunos e demais membros da escola precisam entender que têm a capacidade de construir tal proposta, mesmo sabendo da complexidade da escola, da abrangên-cia do projeto e dos inúmeros obstáculos que irão surgir.

Concordando com Veiga (2004) e com Sousa; Corrêa (2002), po-demos afirmar que o projeto político pedagógico tem sido objeto de estudos para professores, pesquisadores e instituições educacionais e, vem causando muita inquietação em todos os envolvidos nesse processo, já que esses e outros estudos mostram que o projeto pode ser uma via para que a escola reveja seu papel, suas ações, seus sabe-res e suas práticas.

A  elaboração do projeto político  pedagógico em consonân-cia com a gestão democrática da educação pode constituir-se num processo muito rico que gera experiências novas e mudanças signi-ficativas  na comunidade escolar. Entendemos que o  projeto é o or-

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ganizador das ações sócio-psico-educativas e coloca em discussão o papel da escola, a concepção de educação, de homem, de  mundo, de sociedade e de gestão que queremos construir de forma coletiva, envolvendo todos os autores e atores responsáveis por esta constru-ção. Pois, de acordo com Veiga (2004, p.14), “A principal possibilidade de construção do projeto político-pedagógico passa pela relativa au-tonomia da escola, de sua capacidade de delinear sua própria iden-tidade. Isto significa resgatar a escola como espaço público, lugar de debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva”.

Sendo assim, este estudo justificou-se pela necessidade de se aprofundar as pesquisas que têm como foco analítico a construção do projeto político pedagógico na escola pela via da gestão demo-crática na educação e da pesquisa-ação-crítico-colaborativa, tendo na figura do gestor escolar e da comunidade de modo geral os sujei-tos ativos que podem contribuir através da participação – como ato-res do processo – e, ainda, através do exercício do poder que trazem subjacentes a si, a viabilização das ações necessárias para a realização das discussões que culminariam com uma proposta que atenda os anseios da comunidade escolar.

De acordo com Veiga (2003), o projeto político pedagógico de uma escola não pode ser entendido somente como um mero docu-mento contendo regras, normas e modos de ver o aluno, a escola e os conteúdos disciplinares; ou mesmo sendo somente mais um docu-mento que será engavetado e/ou encaminhado aos órgãos centrais como mais uma formalidade cumprida, mais uma norma burocrática.

Ao contrário, o projeto político pedagógico “exige profunda re-flexão sobre as finalidades da escola, assim como a explicitação de seu papel social e a clara definição de caminhos, formas operacionais e ações a serem empreendidas por todos os envolvidos com o pro-cesso educativo” (VEIGA, 2003, p. 09). Além disso, construir um pro-jeto político pedagógico requer dos envolvidos em sua elaboração/construção um envolvimento reflexivo e investigativo consistente e sistematizado de forma dialética e praxiológica.

A elaboração do projeto pedagógico deve implicar o planejamento da ação cotidiana, da prática educa-tiva, não podendo ser algo a mais ou em anexo, de-vendo estar encarnado nas relações educativas e não resultar numa mera encadernação a ser apresentada (SOUSA; CORRÊA, 2002, p. 69).

Tratar dos aspectos subjacentes à construção do projeto polí-tico pedagógico requer que se faça uma breve análise do que real-mente se constitui nestes termos. Assim, entendemos que um proje-to político pedagógico é projeto por estar em construção constante. Se observarmos etimologicamente, a palavra projeto pode ser en-tendida como um empreendimento, plano geral de edificação, ou seja, o projeto por si só já pressupõe algo em constante construção, ago que possibilita mudanças, mas que requer todo um processo de planejamento, estudo e avaliação constante e indissociável da reali-dade que se pretende modificar, gerir ou estruturar.

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O termo político, por sua vez, pode ser entendido como sendo o conjunto dos fenômenos e das práticas relativas ao estado ou a uma sociedade. Ora, entendemos que a escola é uma microssocieda-de inserida numa macrossociedade, e, dessa inserção, acaba por re-fletir seus valores e aspectos. Assim, o projeto é político por possibili-tar que a escola e a comunidade escolar de modo geral tenham mais chances de acertar na condução do processo educacional de forma democrática, uma vez que, entendemos, só se constitui um projeto político pedagógico na medida em que o termo político desmistifi-que-se e desmitifique-se, deixando de ser algo distante da realidade educacional e passe a fazer parte do cotidiano de forma crítica e, des-sa criticidade, possa contribuir para a formação de cidadãos aptos a viverem seu papel de sujeitos da ação pedagógica, seja como aluno, professor, diretor, ou outro membro da comunidade escolar.

E pedagógico, pois, se relacionado ao ato educativo, traz em sua gênese os valores próprios da educação numa perspectiva dia-lética fundamentada na práxis cotidiana destacando os objetivos da educação, as propostas de planejamento, avaliação, as visões de homem, escola, sociedade e educação que se pretende. Além disso, o pedagógico direciona, de forma crítica e democrática, em estreita associação ao político e ao projeto, os conteúdos de ensino, as pro-postas metodológicas, as estratégias de ensino, a formação dos pro-fessores, as propostas inclusivistas, possibilidades de acompanha-mento à ação pedagógica, dentre vários outros aspectos que estão intrinsecamente ligados a cada comunidade e que não podem ser generalizadas.

Entendendo, então, que o projeto político pedagógico traz subjacente a si toda uma gama de informações que ultrapassam o senso comum, é importante que se tenha claro que tanto sua con-cepção quanto sua execução precisam seguir passos que são essen-ciais para que as dimensões de projeto, de política e de pedagógico sejam postas em prática e incorporadas, não como verdades abso-lutas, mas como verdades que se ressignificam a cada dia, bimestre, semestre, ano letivo.

Seguindo os pressupostos teórico-metodológicos de Veiga (2003, p. 11), podemos destacar que quanto à concepção, um bom projeto político pedagógico precisa apresentar características como:

a) ser um processo participativo de decisões;b) preocupar-se em instaurar uma forma de organização do trabalho pedagógico que desvele os conflitos e as contradições;c) explicitar os princípios baseados na autonomia da es-cola, na solidariedade entre seus agentes educativos e no estímulo à participação de todos no projeto comum e coletivo;d) conter opções explícitas na direção da superação de problemas, no decorrer do trabalho educativo voltado para uma nova realidade específica;e) explicitar o compromisso com a formação do cidadão.

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A mesma autora, referindo-se à execução do projeto salienta que este terá qualidade quando:

a) nasce da própria realidade, tendo suporte a explicita-ção das causas, dos problemas e das situações nas quais tais problemas aparecem;b) é exeqüível e prevê as condições necessárias ao de-senvolvimento e à avaliação;c) implica a ação articulada de todos os envolvidos com a realidade da escola;d) é construído continuamente, pois, como produto, é também processo, incorporando ambos numa interação possível.

A partir da necessidade de se reconfigurar e buscar uma identi-dade própria da escola e de seu projeto de ensino é que deve emer-gir a decisão de por em prática esses pressupostos teóricos. A idéia que perpassa o Projeto Político Pedagógico, em nossa concepção, é concretizar o sonho, por em prática as características e as concep-ções, vivenciar o processo e participar do seu nascimento, execução, avaliação, significação e ressignificação no âmbito da comunidade escolar.

Pensar a organização da ação educativa, pensar seus sujeitos a partir de uma proposta pedagógica que tem fundamentos políticos, sociais, antropológicos e psicológicos de uma escola é pensar a con-cretização de um ensino de excelência e qualidade, com garantia de acesso aos bens culturais e permanência, com prazer, na escola por um tempo determinado, mas que traz contribuições indeterminadas ao desenvolvimento identitário dos sujeitos desse processo.

O projeto reconhece e legitima a instituição educativa como histórica e socialmente situada, constituída por sujeitos culturais, que se propõem a desenvolver uma ação educativa a partir de uma unidade de propósitos. Assim, são compartilhados desejos, crenças, valores, concepções, que definem os princípios da ação peda-gógica e vão delineando, em um processo de avaliação contínua e marcado pela provisoriedade, suas metas, seus objetivos, suas formas de organização e suas ações (FARIA; DIAS, 2007, p. 20).

Nesse contexto, a escola que se propõe trilhar um caminho pautado na perspectiva democrática de educação tem que deixar de ser um ambiente frio, gelado, sem emoção, sem prazer, sem trocas para se tornar um ambiente prazeroso e enriquecedor. Para tanto, a organização da ação educativa assume um papel crucial, já que conceitos como os de currículo, avaliação, estratégias e conteúdos são formas de se organizar o ambiente físico e humano, tornando-os mais atraentes e facilitadores da aprendizagem.

Uma coisa é certa: o aluno de hoje não é mais o mesmo de anos atrás, não aprende da mesma forma, não brinca da mesma maneira, não vive a vida como antes. Ele está chamado a se adultizar em seus atos, pensamentos e diálogos cada vez mais cedo e, entendemos, o Projeto Político Pedagógico tem papel ímpar nesse processo, já que

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se pressupõe que este emerge de um processo dialético e democrá-tico onde aluno e demais membros da comunidade escolar detêm papel crucial para o sucesso das propostas de ensino.

Assim, pensar a escola como um espaço de construção coletiva onde todos os seus membros são tratados como sujeitos é necessá-rio que se mantenha um íntimo diálogo com autores como Carnoy (2004), Heller (1992), Eizirik; Comerlato (1995), Penin (1995) e Olivei-ra; Isgarbi (2008), em estudos que tratam do cotidiano, da política e dos jogos de poder e saber, bem como suas relações/influências no processo educacional. Libâneo (2004), Oliveira; Rosar (2002), Paro (2005), Lück et all (2002), Gadotti; Romão (2004), Vieira et all (2002) e Araújo (2002), em estudos que tratam de forma teórica e prática da gestão escolar, construção de escolas democráticas, autonomia da escola, política e gestão da educação, além da organização da escola numa perspectiva que resgata a qualidade da educação e da escola como lócus privilegiado de produção e transmissão de conhecimen-to e cultura.

Todos esses estudos, fortalecidos pela legislação vigente que tem como premissa a construção de escolas democráticas funda-mentadas numa perspectiva descentralizadora e comprometida com uma nova visão de homem, de mundo e de sociedade interli-gados e em constante transformação: LDB 9394/96, Plano Nacional de Educação de 2001, leis relativas ao FUNDEF e FUNDEB, além de outras de cunho municipal como a Lei n. 4747 de 1998 – Lei que criou o Sistema Municipal de Ensino de Vitória, Lei n. 6794 de 2006 – que dispõe sobre a organização dos Conselhos de Escola das Unidades de Ensino como Unidades Executoras dos recursos financeiros e dá outras providências, contribuíram para o desenvolvimento do traba-lho que culminou com a construção do projeto político pedagógico da escola.

A partir da necessidade de se reconfigurar e buscar uma iden-tidade própria da EMEF Irmã Jacinta é que decidimos por em prática esses pressupostos teóricos. A idéia inicial era concretizar o sonho, por em prática as características e as concepções, vivenciar o proces-so lido e estudado. Tínhamos o sonho, sabíamos os caminhos possí-veis. Partimos para a realização.

Mãos à obra, mas também cérebro, coração, pés, braços... conhecendo a escola, seus sujeitos e o estudo desenvolvido

O desenvolvimento do estudo contou como dito anterior-mente, com um processo de assessoria técnica numa íntima ligação com os pressupostos da pesquisa-ação-crítico-colaborativa que tem como principal proposta de estudo uma intrínseca relação dialética entre o que se observa na realidade cotidiana, os pressupostos teóri-cos subjacentes a determinação do assunto e a mudança de postura por parte dos membros da comunidade estudada, visando a melho-

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ria do processo vivido. Para tanto, desenvolvemos um questionário com a totalidade dos alunos regularmente matriculados. Foram en-tregues 600 questionários, dos quais 546 retornaram respondidos pelos alunos e suas famílias, que objetivavam conhecer a realidade/sujeitos atendidos pela escola em seus aspectos sociais, econômicos, familiares e identitários, para assim, passarmos aos estudos junto aos professores tanto das respostas dos alunos quanto da teoria que da-ria sustentação ao trabalho pedagógico e de construção do projeto da escola.

A Escola Municipal de Ensino Fundamenta Irmã Jacinta Soares de Souza Lima – doravante denominada EMEF IJSSL – onde o estudo foi desenvolvido, localiza-se no maciço central da Ilha de Vitória, aos pés de um morro que até pouco tempo era chamado de Morro do Romão e que hoje se chama Bairro Romão.

No que se refere à sua estrutura física podemos dizer que se trata de um prédio antigo, com salas pequenas, sem muita ventilação e iluminação naturais, com dois pátios – um coberto e outro desco-berto – pequenos, além de outros espaços como biblioteca, refeitó-rio, secretaria, sala de vídeo e de artes, sala de pedagogos e direção. Entretanto, apesar de uma infra-estrutura muito aquém da desejada pelos padrões educacionais de qualidade, a EMEF IJSSL possui uma excelente aceitação da comunidade, uma vez que raras são as vagas existentes para novas matrículas a cada início de ano e mesmo no decorrer do período letivo, o que vem mostrar que, apesar de existi-rem outras EMEF’s próximas à região onde a escola se localiza, a po-pulação dos bairros ao seu redor tem dado preferência à matrícula e permanência nesta unidade. Segundo a direção, as poucas vagas que surgem são de alunos que mudam de bairro/residência. As vagas provenientes de evasão e/ou abandono são praticamente inexisten-tes, tanto que para 2008, apenas 11 vagas serão abertas.

Apesar da infraestrutura precária, no que se refere aos materiais permanentes para o trabalho pedagógico cotidiano, a escola conta-va, em 2008 com aparelhos de som com toca CD para as salas de aula; aparelho de televisão para sala de vídeo e para salas de aula dos dois andares; aparelhos de DVD; Videocassete; copiadoras e impressora, computadores com acesso à Internet, aparelho de retroprojetor; apa-relho de projeção de slides (Data Show), aparelho de som profissio-nal com caixa amplificada; máquinas fotográficas digitais; filmadora; telefone fixo com ramais e aparelho de fax, todos à disposição dos profissionais e alunos, além de biblioteca com um bom acervo de livros didáticos, paradidáticos e técnicos.

Em relação aos materiais didático-pedagógicos de uso diário, a escola possuía com papéis coloridos de todo tipo, cola, tesouras, pincéis, tintas, canetas hidrocor, lápis de colorir e de escrever, bor-rachas, cadernos, apontadores, dentre outros, todos em abundância e disponíveis para uso consciente de todos os professores e alunos.

Seguindo neste caminho, a organização curricular para 2008 e anos seguintes segue o pressuposto de uma educação que prima pela qualidade dos serviços prestados, conforme estabelece o Art. 2º

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da Lei Federal nº. 9.394 de 1996 que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996). Além disso, essa organização segue pressupostos curriculares tanto expressos nos Parâmetros Cur-riculares Nacionais (BRASIL, 1997) quanto nas Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental de Vitória (VITÓRIA, 2004).

No levantamento diagnóstico dos membros constituintes da comunidade atendida pela EMEF IJSSL realizado pela escola para fins de caracterização de Projeto Político Pedagógico, constataram-se al-guns dados muito interessantes e que precisavam ser observados e levados em consideração para que a proposta de um PPP realmen-te democrático, e que tivesse como ponto de chegada um trabalho educacional inclusivo de qualidade, se efetivasse.

Em relação à faixa etária dos alunos entrevistados e, por con-seguinte, matriculados na escola, estes variavam dos sete aos dezoi-to anos quando da época em que os dados foram coletados. Esses dados revelam algo um tanto quanto preocupante que é que o fato de se ter alunos com idade superior a quatorze anos que ainda não terminaram o ensino fundamental na idade proposta pela legislação educacional brasileira.

Em relação ao gênero dos respondentes, o percentual apresen-tado é muito equiparado entre o masculino e o feminino – 49% e 51% respectivamente. Essa equiparação vem salientar que a escola IJSSL possui uma boa representação referente ao quesito gênero, o que pode levar a um trabalho bem diversificado e coletivo, uma vez que não há predominância de um sobre o outro gênero.

Quando questionados sobre o quesito religião que praticavam. Os dados revelam algo que as próprias estatísticas do IBGE já confir-maram, ou seja, o número de católicos – 51%, em relação aos evan-gélicos – 37% e de outras religiões – 12% não é tão distante, ou seja, a prática pedagógica cotidiana precisa levar em conta este dado para que a diversidade religiosa seja respeitada e valorizada.

Um outro aspecto interessante é o que se refere ao fato de os alunos estarem ou não repetindo de série. Conforme pôde ser ob-servado esse dado (repetindo série) é muito pequeno – 8%, enquan-to que o percentual dos que não estão – 92% é bem superior. Esses números, talvez, possam explicar os dados referentes ao número de alunos com idade superior a quatorze anos ainda freqüentando o en-sino fundamental.

Também foi questionado aos alunos acerca dos seus horários para dormir e acordar. Observamos uma inversão muito interessante: a maioria dos alunos mostra que tem horário para acordar que varia de 6 as 10 horas. Entretanto, grande parte deles, 40% não possuem horário certo para dormir. E, 14% dormem após as 22 horas. Esses dados podem estar associados ao desempenho do aluno em sala de aluna, uma vez que ao dormir pouco o aluno tende a ter mais sono durante o dia e, assim, seu rendimento pode ficar prejudicado.

No que se refere à vida social dos alunos entrevistados, algumas perguntas girando em torno de cursos realizados; músicas, filmes, programas e esportes preferidos, dentre outras atividades realizadas;

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foram feitas. Os dados coletados nos dão um retrato muito interes-sante da realidade sócio-cultural e histórica do corpo discente da EMEF IJSSL. Ou seja, ao observarmos mais atentamente as respostas apresentadas vimos que esses alunos pertencentes em sua maioria às classes econômicas menos favorecidas ora refletem, ora refratam as imposições neoliberais da sociedade globalizada/globalizante em que vivemos neste início de século.

Também foi perguntado aos alunos se eles se alimentam an-tes de virem para a escola. Esses dados são muito interessantes, pois mostram que 43% dos alunos almoçam antes da escola, logo, são alunos do turno vespertino, enquanto que outros 42% fazem algum lanche e 15% não comem nada. Esses dados são preocupantes, pois a alimentação pode não ser fator decisivo para a aprendizagem, po-rém a criança com fome tende a ter dores de cabeça, sonolência e outros problemas de saúde que afetam e influenciam seu desempe-nho escolar.

No que se refere ao quesito família, atualmente ainda esta é culpabilizada pela maioria dos fracassos que o aluno tem na escola. É comum ouvir-se frases do tipo: “Esse menino está assim porque a mãe vive na rua” ou “Sabe o fulano, pois é, é filho daquela mãe tal”. Também é comum a escola esquecer que a maioria das mães e pais hoje tem que trabalhar quase que o dia todo para dar o mínimo de sustento a seus filhos. Além disso, outro aspecto que precisa ser en-fatizado é que o conceito da família nuclear existente no Brasil até meados da década de 1980, já não existe mais ou já não pode mais ser visto como modelo padrão a ser seguido.

Hoje temos vivenciado novos e variados tipos de família. Essa variação tem acompanhado a mudança paradigmática da sociedade capitalista pós-moderna que surge com força no cenário mundial a partir dos fins da década de 1980 e início da de 1990 e que continua até os dias de hoje.

Quando questionados sobre com quem viviam, já que o termo família hoje possui outro entendimento, os alunos mostraram que 51% vivem com os avós, 47% com os pais e apenas 2% com os tios. Esses percentuais são interessantes, pois mostram a predominância dos avós sobre os pais. Ou seja, a família muda seu foco para os avós tomando o lugar dos pais no cuidado, sustento e atenção das crianças.

Por outro lado, apesar desse índice apresentado, dos alunos que responderam ao questionário, 37% têm os pais separados e 63% dos casos, os pais continuam casados. Uma questão se faz presente: Porque será que, mesmo com tantos pais casados e juntos os filhos são criados, em muitos casos, pelos avós?

Dos entrevistados, 57% afirmaram que as famílias não têm ví-cios; apenas 26% afirmaram ter enfrentado a violência como causa de falecimento na família, enquanto que 74% identificam outras cau-sas; 65% dos alunos dizem que seus pais agem com diálogo na hora de corrigi-los, contra 20% que afirmam ficarem de castigo e 15% que dizem que os pais batem na hora de corrigir. Em relação ao fato de os pais auxiliarem ou não nas tarefas escolares, 67% dos alunos afirma-

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ram que os pais sempre ajudam, contra 21% que afirmaram às vezes, 8% não têm tempo e 4% com outras respostas; também os entrevis-tados relataram que 88% dos pais são alfabetizados contra 12% de analfabetos. Quanto ao lazer da família, as opções que mais aparece-ram foram passear na cidade, ver televisão, ir à praia, visitar parentes e ir ao shopping. Quanto ir ao teatro e ao cinema, esta opção quase não aparece.

Quantas informações! Quantos preconceitos que podem ser reavaliados e que muitas vezes interferem no modo como os alunos e suas famílias são vistos, avaliados, entendidos, trabalhados, rotula-dos e estigmatizados por professores, diretores, pedagogos e socie-dade num contexto geral.

Os dados apresentados clarificam que, apesar de receberem baixos salários, estarem desempregados ou em subempregos mal qualificados, terem muitos membros, ou outras características tão rotulados como sendo perigosos e causadores de mal estares sociais, as famílias aqui retratadas não ficam devendo em nada àquelas ditas estruturadas e pertencentes às classes sociais mais favorecidas.

Mas, o que todos esses dados revelam? Que informações esses dados nos dão para que sejam traçados objetivos e metas para uma educação pública de qualidade para que todos os alunos, indistin-tamente, possam ter acesso e sucesso às informações curriculares, sendo desse modo produtores de cultura ao mesmo tempo em que reproduzem e se apropriam dessa cultura, da história e do conhe-cimento? Que informações esses dados retratam para que se pen-se num projeto político pedagógico que tenha como pressuposto a educação como ferramenta social que quebre estereótipos e meca-nismos de exclusão?

De uma maneira geral, os dados revelam que temos crianças/adolescentes que possuem valores morais próprios da comunidade à qual pertencem; que possuem uma família – que por muitos pode ser considerada desestruturada – porém diante da pós-modernidade e situação sócio-econômica vivida hoje, o que poderia ser uma famí-lia estruturada? Mas que é a família que eles têm; que são crianças/jovens que necessitam de atenção, não por serem coitados, mas por serem seres humanos em idade escolar, com desejos, anseios, so-nhos e esperanças – bons(as) ou não – mas que necessitam de uma educação de qualidade para que, assim, possam ter uma chance de superar tantos fracassos sociais.

Esses dados, antes de revelar a realidade do aluno, re-velam a necessidade de se ter/desenvolver um proces-so educacional coerente com uma educação nova, que quebre as barreiras tradicionais impostas pela sociedade globalizante neoliberal deste início de século. Essa nova educação se dá em espaços que primam pela qualidade, já que, conforme salienta Mantoan (2003, p. 63-64),

As escolas de qualidade são espaços educativos de construção de personalidades humanas autônomas, críticas, espaços onde crian-ças e jovens aprendem a ser pessoas. Nesses ambientes educativos,

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ensinam-se os alunos a valorizar a diferença pela convivência com seus pares, pelo exemplo dos professores, pelo ensino ministrado nas salas de aula, pelo clima socioafetivo das relações estabelecidas em toda a comunidade escolar sem tensões competitivas, mas com espírito solidário, participativo.

Entendendo, então, que o projeto político pedagógico da escola não pode visar somente uma reorganização formal, mas imprimir uma qualidade, uma nova visão a todo o contexto vivido ao mesmo tempo em que res-gata a identidade da escola e a partir dessa identidade busca imprimir uma nova visão de educação, os dados coletados foram o ponto chave para iniciarmos o proces-so de debate voltado para a realidade vivenciada, pois, a importância da construção coletiva do projeto pedagó-gico da escola reside no fato de que esse processo “é a busca de construção da identidade, da organização e da gestão do trabalho de cada instituição educativa”, como alertam Faria; Dias (2007, p. 20).

O projeto reconhece e legitima a instituição educativa como histórica e socialmente situada, constituída por sujeitos culturais, que se propõem a desenvolver uma ação educativa a partir de uma unidade de propósitos. Assim, são compartilhados desejos, crenças, valores, concepções, que definem os princípios da ação pedagógica e vão delineando, em um processo de avaliação contínua e marcado pela provisoriedade, suas metas, seus objetivos, suas formas de orga-nização e suas ações (FARIA; DIAS, 2007, p. 20).

Iniciamos as atividades junto aos professores tendo como um dos pontos de pauta o desejo de construir coletivamente o projeto pedagógico levando em consideração sujeitos concretos, com so-nhos, desejos, anseios e identidades que realmente existiam. Para tanto, realizamos uma série de discussões com os profissionais da escola – professores, pedagogos, auxiliares, estagiários, pessoal de apoio e de secretaria – sobre o que era o projeto, suas etapas, suas características, concepções, elementos integradores, pressupostos norteadores, questionamentos que gerariam outras tantas indaga-ções; os dados observados na pesquisa feita com os alunos, bem como os preconceitos enraizados subjetivamente em cada profissio-nal que compunha o corpo docente, técnico, pedagógico e de apoio da escola que pudesse emperrar ou mesmo inviabilizar o processo democrático de educação que o projeto político pedagógico requer para sua plena realização.

A guisa de conclusões: algumas transformações observadas na realidade estudada

Temos observado alguns estudos (REGO, 2002) que apresen-tam a escola como o ambiente que possui três funções extremamen-te importantes: educacional, pois compartilha tanto com a família quanto com o contexto social de modo geral – igrejas, ONGs, e ou-

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tros espaços – a educação das crianças e jovens; político, na medida em que contribui para a formação de cidadãos coletivos; e pedagógi-ca, já que é o local propício, por uma série de fatores, à construção e transmissão de um conjunto significativo de conhecimentos que são parte da cultura humana.

Nesse sentido, uma das primeiras tarefas dos grupos de estudo junto aos profissionais da escola foi buscar entender, num processo contínuo de trocas intersubjetivas que a pesquisa-ação-crítico-cola-borativa permite, quais concepções de escola, alunos e conhecimen-tos se faziam presentes no imaginário daqueles profissionais. Tam-bém buscamos entender que concepções esses profissionais tinham acerca dos elementos constitutivos do projeto político pedagógico, como a concepção de homem, mundo, sociedade, escola, conhe-cimento, avaliação, dentre outros. Esses e outros elementos foram discutidos e estudados e analisados com base em estudos teóricos, legislação vigente e propostas educacionais que estão sendo postos em prática no cenário educacional brasileiro.

Nesse sentido, após a aplicação dos questionários e das visitas às casas dos alunos, os dados coletados foram computados, anali-sados e apresentados em forma de gráficos comparativos para to-dos os membros da comunidade escolar. De posse desses dados, que foram extremamente ricos e reveladores, iniciamos uma série de estudos teórico-metodológicos sobre os aspectos essenciais que o projeto político pedagógico precisa para que realmente assuma o caráter que lhe é próprio, ou seja, o de auxiliar na condução da ação pedagógica tendo como foco central a transformação das relações humanas mediadas pela escola, pelo conhecimento e pelos outros seres humanos.

As temáticas dos estudos teóricos desenvolvidos seguiram uma dinâmica metodológica que envolvia o trabalho em grupo, onde cada grupo de profissionais ficava responsável por um grupo de estudo/assunto, além de algumas palestras. Essas palestras abar-cavam os temas que precisavam de um olhar mais técnico, aprimora-do, apurado. Esses grupos de estudo aconteciam periodicamente no interior da própria escola.

Das temáticas trabalhadas destacam-se: gestão da educação; legislação educacional; as tendências pedagógicas da prática escolar; disciplina e indisciplina na escola; alfabetização e letramento; corren-tes filosóficas; teorias do conhecimento; estrutura organizacional da escola; concepções epistemológicas: comportamentalista, cognitiva, histórico-cultural; fundamentos didático-pedagógicos; princípios e objetivos da escola democrática; organização econômica e adminis-trativa escolar; projetos educacionais e setoriais; avaliação do proces-so ensino-aprendizagem; dentre outros temas recorrentes.

O processo de estudo fez com que o corpo docente, técnico, pedagógico, administrativo e de apoio da EMEF se propusesse a es-tudar, pesquisar, interagir com o conhecimento cientificamente pro-duzido, de forma dialética e tendo como ponto de chegada a trans-formação da docência passando de mero transmissor a produtor de conhecimento e cultura. Esse aspecto fez com que os profissionais do

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corpo docente da escola conseguissem se perceber como professo-res-pesquisadores de sua prática, o que provocou mudanças positi-vas no modo como conduziam o processo educativo.

Essa mudança paradigmática, entendemos, refere-se ao fato de o professor ter começado a se ver e se perceber como parte de um processo, ou seja, o professor deixa de ser simples executor para ser transformador de ações, ao mesmo tempo em que se autotransfor-ma, numa dialética que envolve o professor como pesquisador de sua prática.

Durante o processo de desenvolvimento do estudo que culmi-nou com a construção do projeto da escola vários problemas foram enfrentados. Assim como Cavagnari (2003), identificamos alguns en-traves que dificultaram o avanço dos trabalhos e, conseqüentemen-te, a demora na elaboração, análise e divulgação dos dados coleta-dos e dos estudos realizados. Esses entraves estão intrinsecamente associados à falta de intimidade que muitos profissionais da educa-ção têm com o processo de criação e democratização da educação, implementados por anos de opressão e por modelos econômicos e sociais que não permitiam uma visão democrática de educação, além de imprimirem uma idéia de gestão baseada e fundamentada na au-tocracia, tendo a figura do diretor e seus subordinados – supervisor, orientador e coordenador – não parceiros do processo, mas fiscaliza-dores do cotidiano escolar.

Também as políticas públicas de educação e os sistemas de en-sino têm parcela considerável de culpa para que a escola enfrente tantos problemas em seu cotidiano: as primeiras por denotarem falta de compromisso do poder público e os segundos por não cumpri-rem, em grande parte, os preceitos legais referentes à educação, o que pode levar a um descaso em relação à educação e o não cumpri-mento do papel profissional que essa ação exige.

Dentre os principais entraves, destacamos a alta rotatividade de professores, que de certa forma engessavam o processo, uma vez que não só a cada início de ano letivo tínhamos uma troca grande de professores, como mesmo durante o ano esta rotatividade per-manecia; horário de estudos e horários de trabalho incompatíveis, principalmente quando a maioria dos professores têm jornada tri-pla de trabalho; pouca experiência e dificuldade de viver a gestão democrática e a descentralização das ações técnicas, pedagógicas e administrativas; dificuldades entre o meio docente de se libertar dos preceitos tradicionais da didática e enveredar por uma concepção de professor como produtor de conhecimento junto com os alunos; falta de sistematização dos dados coletados, principalmente em re-lação à escrituração e organização dos dados; estes e outros fatores aliados aos destacados por Cavagnari – falta de espaço coletivo para estudos e discussão periódica entre os professores e fragilidade dos conceitos teóricos.

Apesar dos pontos negativos, ao final do processo de trabalho exaustivo de coleta e análise dos questionários aos alunos, dos gru-pos de estudo e debate com os profissionais da escola, começamos a perceber várias mudanças que contribuiriam para o entendimento

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de que “não é qualquer escola nem qualquer prática pedagógica que proporcionará ao indivíduo a possibilidade de desenvolver funções psíquicas mais elaboradas” (REGO, 2002, p. 52).

Dentre as mudanças detectadas podemos destacar que na escola onde o trabalho foi desenvolvido, o processo de elaboração do Proje-to Político Pedagógico de forma coletiva, contribuiu significativamente para que os segmentos que compunham a comunidade escolar enten-dessem a importância de sua participação na gestão da escola e na to-mada de decisões coletivas sobre o conteúdo, a avaliação, os projetos de formação continuada em serviço, os mecanismos de inclusão/exclu-são, as concepções de homem/mundo/sociedade, assim como no modo como a educação se estabelece e qual o papel que cada sujeito tem para que se possam vislumbrar ações que garantam o acesso à escola e ao conhecimento e o sucesso das práticas educativas.

Cabe ressaltar, que quando falamos em participação não esta-mos nos referindo apenas à presença desses segmentos em reuni-ões de pais, plantões pedagógicos, conselhos de classes, conselho de escola e outras, mas sim, de participação na tomada de decisões/gestão compartilhada das ações, já que

O trabalho educativo a ser considerado pelo projeto pe-dagógico configura-se por meio de uma dialética de con-tinuidade-ruptura, na qual é necessária a introdução de elementos novos, visando a obtenção de avanços signi-ficativos, a partir da reflexão coletiva das potencialidades de transformação que o trabalho escolar pode oferecer. (SOUSA e CORRÊA, 2002, p. 51)

Sendo assim, é fundamental que os sistemas de ensino promo-vam ações com finalidade de conscientizar, incentivar e mobilizar a comunidade escolar para a construção de uma proposta pedagógica da escola que atenda as expectativas dos sujeitos envolvidos no pro-cesso, permitindo que todos tenham a oportunidade de receber um atendimento diário de qualidade, pois, “o projeto pedagógico precisa partir da realidade de cada escola, uma vez que não há escolas iguais, mas instituições educativas que se constroem a partir de dinâmicas específicas” (SOUSA; CORRÊA, 2002, p. 57).

O trabalho desenvolvido com alunos, pais, professores e demais profissionais lotados na escola revelou que o planejamento curricu-lar, de aula, de curso e/ou de disciplina e da ação pedagógica a partir de dados concretos da realidade cotidiana e dos sujeitos envolvidos contribui para que “o inusitado apareça, é poder deparar-se com o indeterminado sem medo, permitir-se ocupar espaços e intensificar afetos [...], é refletir com experiência, confrontando fatos, aconteci-mentos e nossas verdades com as teorias existentes, nosso ideal de criança com, com a criança concreta com a qual nos deparamos todo o dia em toda a sua intensidade” (REDIN, 2007, p. 88).

A Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmã Jacinta Soa-res de Souza Lima tem experimentado esse processo de mudança movido por este sentimento poderoso, tanto é que conseguimos implementar um processo de debate, estudo, discussões que agora

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encontram-se reunidos no projeto político pedagógico.Projeto este que reflete os desejos, anseios e perspectivas de

alunos, pais, professores, comunidade escolar, em torno de uma es-cola aberta à diversidade, inserida numa conjuntura sócio – política – educacional que não se pauta em dogmas tradicionais, mas prima pela educação para a cidadania.

A elaboração do projeto político pedagógico proporcionou mudanças de posturas no que tange à formação continuada dos professores, que passaram a se ver e se perceber como parte dessa formação; nova visão acerca do processo ensino-aprendizagem por meio de uma nova forma de encarar o currículo, a avaliação e as re-lações interpessoais que passaram a ser trabalhados como forma de valorização do trabalho pedagógico e institucional como ferramen-tas de construção da cidadania e apropriação consciente dos bens culturais produzidos pela humanidade, vinculados à realidade viven-ciada por todos os sujeitos do processo.

Em suma, podemos considerar que esta iniciativa possibilitou a melhoria na qualidade da educação oferecida pela EMEF Irmã Jacinta e acreditamos que a participação dos sujeitos/atores nesse processo contribuiu de forma significativa para o alcance dos objetivos propos-tos para uma educação pública de qualidade, ao mesmo tempo em que incidiu sobre novas maneiras de se conceber a ação educativa.

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Texto 2 Pensando o Projeto Político Pedagógico: alguns passos

necessários para a caracterização de seus sujeitos

Rogério Drago1

Paulo da Silva Rodrigues2

Nada grandioso pode-se fazer na vida sem sentimento poderoso (VIGOTSKI, 1996).

Pensando nas palavras de Vygotsky de que tudo de grande que fazemos tem que vir de um sentimento poderoso e, logo, grandioso, podemos dizer que pensar um projeto político pedagógico para uma escola nada mais é do que ter um sentimento poderoso – o de uma educação democrática, de qualidade, viva e vibrante. E é esse senti-do que nos faz refletir sobre uma escola que não se contenta com o mínimo, com pouco, mas que busca a cada dia o melhor para seus sujeitos.

A Escola, como representativa da macrossociedade, precisa achar caminhos e mecanismos para experimentar esse processo de mudança movido por este sentimento poderoso, para tanto é neces-sário implementar um processo de debate, estudo, discussões que culminariam com a identidade da escola, com seu projeto político pedagógico. Projeto este que deve refletir os desejos, anseios e pers-pectivas de alunos, pais, professores, comunidade escolar, em torno de uma escola aberta à diversidade, inserida numa conjuntura sócio-político-educacional que não se pauta em dogmas tradicionais, mas prima pela educação para a cidadania.

Assim, este texto busca resgatar os principais passos a serem seguidos para que o projeto político pedagógico deixe de ser um so-nho e passe a ser uma realidade construída por todos – ou ao menos representantes desse todo – os envolvidos no processo educacional.

Para tanto, tentamos abordar o máximo possível de aspectos que não podem faltar em nenhuma proposta educacional que enten-da a educação como ferramenta política de transformação social e que o projeto não tem um fim em si mesmo, mas é uma possibilidade de mudança, de transformação, de gestão democrática, flexível e cidadã, em suma, de respeito aos atores/sujeitos do cotidiano escolar.

Dentre os passos necessários à concretização do projeto polí-tico pedagógico entendemos que a caracterização da escola, da co-munidade escolar, do meio onde a instituição está localizada é de suma importância para que sejam traçados os objetivos, as metas, as propostas curriculares, avaliativas, calendário acadêmico, comemo-rações dentre uma série de outras ações pertencentes ao cotidiano organizacional da escola, pois se trata de mostrar, deixar vir à tona a

1 Doutor em Educação, Professor Adjunto do Centro de Educação da UFES.2 Mestrando em Educação PPGE/CE/UFES, Professor do Sistema Municipal de Ensino de Vitória.

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identidade da escola e de seus sujeitos.É a caracterização que vai dar uma radiografia daquilo que se

tem em mãos, daquilo que compõe o corpo estrutural da clientela atendida por uma determinada escola/comunidade. Uma das princi-pais formas de pesquisa para se reconhecer e identificar, bem como traçar esse mapa sócio-cultural-econômico que culminará com ações voltadas para o acesso, sucesso e permanência desse alunado nas ações pedagógicas é o desenvolvimento de um questionário diag-nóstico (RODRIGUES; DRAGO, 2008), contendo questões abertas e fechadas que contemplem a realidade dos alunos, suas famílias, seus lares, sua comunidade, além de outras de cunho mais geral.

Essas informações, colhidas, trarão a base para que os profissio-nais da escola construam e pensem em ações que contribuam para a superação de desigualdades, ao mesmo tempo em que a diversida-de pode ser considerada como ponto de partida para um trabalho verdadeiramente democrático, em que cada sujeito tenha respeitada sua individualidade, porém inserido na coletividade típica da comu-nidade escolar que é espelho da macrossociedade ao seu entorno.

Dentre uma série de questões/quesitos a serem investigados/reconhecidos/identificados, sugerimos:

Quanto aos alunos• Faixa Etária dos alunos matriculados na escola• Gênero• Religião Praticada• Tarefas de casa• Se já repetiram de série• Como consideram seu relacionamento com a Família• Se há orientação a Hábitos de Higiene em casa• Escovação Dentária• Horário de Acordar• Horário de Dormir• Cursos realizados em outras instâncias – igrejas, ONGs, dentre

outros• Toca algum instrumento Musical• Atividades de lazer fora da Escola• Se gosta ou não de ler• Tipo de Leitura favorita• Tipo de Filme preferido• Estilo Musical Preferido• Programa de TV Favoritos• Prática Esportiva• Diversão Favorita• Alimentam-se antes da escola• Outras questões específicas de cada realidade

Estes dados podem dar um retrato muito interessante da reali-dade sócio-cultural e histórico-econômica do corpo discente da es-cola contribuindo, quem sabe, para que se desconstruam pensamen-

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tos homogeneizantes cristalizados no imaginário social como senso comum, de que determinados grupos de alunos não gostam de ler, praticam todos a mesma religião e por isso têm que participar das mesmas comemorações religiosas, dentre outras concepções.

Quanto à família/responsáveis pelo aluno• Com quem o aluno vive• Profissão da mãe• Profissão do pai• Renda Familiar• Desemprego• Tempo de desemprego• Se trabalha com carteira assinada• Se possuem imóvel próprio ou alugado• Grau de instrução da família• Vícios na família• Causas de falecimento na família• Como os pais corrigem os filhos• Auxílio nas tarefas escolares• Lazer da família• Outras questões específicas

No que se refere ao quesito família, consideramos esse item de suma importância para a construção de um Projeto Político Pedagó-gico realmente democrático pelo fato de que atualmente ainda esta é culpabilizada pela maioria dos fracassos que o aluno tem na escola.

É comum ouvir-se frases do tipo: “Esse menino está assim por-que a mãe vive na rua” ou “Sabe o fulano, pois é, é filho daquela mãe tal”. Também é comum a escola esquecer que a maioria das mães e pais hoje tem que trabalhar quase que o dia todo para dar o mínimo de sustento a seus filhos. Além disso, outro aspecto que precisa ser enfatizado é que o conceito da família nuclear existente no Brasil até meados da década de 1980, já não existe mais ou já não pode mais ser visto como modelo padrão a ser seguido.

Hoje temos vivenciado novos e variados tipos de família. Essa variação tem acompanhado a mudança paradigmática técnica da sociedade capitalista pós-moderna que surge com força no cenário mundial a partir dos fins da década de 1980 e início da de 1990 e que continua até os dias de hoje.

Quanto ao local onde esse aluno reside – bairro, comunida-de, localidade

• Maiores problemas de infraestrutura• Recolhimento de Lixo• Rede de esgoto• Iluminação Pública• Calçamento na rua• Tratamento de água• Geração de renda/emprego

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• Acesso à saúde• Espaços de lazer• Outras questões específicas

No que tange ao quesito bairro/comunidade/localidade, os da-dos apresentados podem contribuir para a promoção e implementa-ção de políticas públicas educacionais, sociais, assistenciais e de infra-estrutura que venham a contribuir para o resgate da cidadania tanto dos alunos quanto das pessoas que residem no entorno da escola.

Quanto à moradia do aluno• Número de cômodos da casa• Se cada um possui seu quarto• Se possui banheiro dentro de casa• Se a casa é de madeira, alvenaria, ou outro material• Se é casa própria, alugada, emprestada, ou outra forma• Se é ventilada, arejada• Se fica em área segura ou de risco• Outras questões específicas

Todas essas informações podem contribuir para que se reava-liem aspectos estigmatizantes e excludentes tanto da escola quanto da comunidade, e que muitas vezes interferem no modo como os alunos e suas famílias são vistos, avaliados, entendidos, trabalhados, rotulados e estigmatizados por professores, diretores, pedagogos e sociedade num contexto geral.

De uma maneira geral, esse levantamento de dados pode reve-lar, dentre uma série de informações imprescindíveis ao Projeto Po-lítico Pedagógico, que as escolas, independente do local onde está instalada, pode ter crianças/adolescentes que possuem valores mo-rais próprios da comunidade à qual pertencem; que possuem uma família – que por muitos pode ser considerada desestruturada – po-rém diante da pós-modernidade e situação sócio-econômica vivida hoje, o que poderia ser uma família estruturada? Mas que é a família que eles têm; que reside num local que possui violência, problemas estruturais, físicos, de saneamento comuns a várias regiões do Bra-sil e do Mundo; porém, são crianças/jovens que necessitam de uma educação de qualidade.

Outra medida a ser tomada é o resgate histórico da escola. A comunidade escolar precisa conhecer como surgiu essa escola, o motivo de ter determinado nome, quem era a pessoa homenagea-da (quando tem um nome de um vulto histórico ou não), que lutas fizeram com que aquele espaço fosse estabelecido como espaço de educação, se surgiu por mutirão da comunidade, se o terreno é pró-prio, emprestado, se a construção é pública, por comodato, enfim, o máximo de informações possível que possa fazer com que a comuni-dade escolar se veja e se reconheça naquela instituição.

Para tanto, sugerimos que sejam feitas entrevistas com pesso-as mais velhas da comunidade e que estavam presentes nesses mo-

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mentos de construção; análise documental junto aos órgãos públi-cos – ou outros responsáveis – para que se trace esse perfil; resgate fotográfico, bibliográfico, dentre outras formas de coleta de dados.

Nesse contexto, esses dados – econômicos, familiares, pessoais, históricos, culturais – antes de revelar a realidade do aluno, podem revelar a necessidade de se ter/desenvolver um processo educacional coerente com uma educação democrática, que quebre as barreiras tradicionais impostas pela sociedade globalizante neoliberal deste início de século. Essa nova educação se dá em espaços que primam pela qualidade, já que, conforme salienta Mantoan (2003, p. 63 – 64),

As escolas de qualidade são espaços educativos de cons-trução de personalidades humanas autônomas, críticas, espaços onde crianças e jovens aprendem a ser pesso-as. Nesses ambientes educativos, ensinam-se os alunos a valorizar a diferença pela convivência com seus pares, pelo exemplo dos professores, pelo ensino ministrado nas salas de aula, pelo clima socioafetivo das relações es-tabelecidas em toda a comunidade escolar sem tensões competitivas, mas com espírito solidário, participativo.

Em sua estruturação, o projeto político pedagógico pode assumir características variadas, porém entendemos que essa variação precisa conter elementos que coadunem as proposições aos sujeitos e realida-des existentes. Assim, não se pode pensar em objetivos se não se tem em mente que concepção de mundo, sujeito, sociedade, escola se tem e se quer. Não se pode pensar em atividades extracurriculares como passeios e festas, por exemplo, se não se sabe o que essa comunidade conhece e pode realizar. Não se pode pensar em comemorações religiosas sem saber respeitar aquilo que é parte da comunidade.

Em suma, resgatar os sujeitos escolares e representá-los no contexto do projeto político pedagógico pode ser uma maneira de transformar a escola para que esta assuma uma característica inter-cultural, interdisciplinar e inclusiva, ou seja, como lócus promotor de cidadania. O Projeto Político-pedagógico define, então, uma posição da escola, como ferramenta política e cultural, no que se refere à me-lhoria do processo de ensino e de aprendizagem. Ao conter no seu currículo, suas estratégias de ensino para cada disciplina ou conjunto de disciplinas, seus recursos didáticos a serem utilizados, seus pla-nos de avaliação, sua visão de mundo e de sociedade, afirma-se nele o seu conteúdo de cidadania e pluralidade cultural e, consequente-mente, de reconhecimento dos sujeitos escolares como sujeitos cog-noscentes.

Referências Bibliográficas

MANTOAN, M. T. E. Inclusão escolar: o que é? Por quê? Como fazer? São Paulo: Moderna, 2003.

RODRIGUES, P. da S.; DRAGO, R. Projeto político pedagógico: juntos construindo uma nova escola. Vitória: Aquarius, 2008.

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Texto 3Refletindo sobre os fundamentos e concepções

sócio-psico- educacionais no contexto do Projeto Político Pedagógico

Rogério Drago1

Paulo da Silva Rodrigues2

Este artigo tem como objetivo central discutir de forma teórica, porém com embasamento prático, alguns aspectos que considera-mos serem essenciais para a implementação de um projeto políti-co pedagógico realmente democrático, que leve em consideração a comunidade escolar como sujeitos ativos do processo educacional. Para tanto, este estudo discute os fundamentos filosóficos, sócio-antropológicos e psico-pedagógicos que, entendo eu, precisam ser assumidos por uma escola que tem como foco o desenvolvimento de seres humanos inseridos na coletividade, sem deixar de lado sua identidade.

Fundamentos Filosóficos

De acordo com Duarte (2000, p. 209) “o processo de formação do indivíduo humano é um processo de apropriação dos produtos da atividade social, isto é, produtos que são objetivação da atividade humana. A relação entre o indivíduo e o mundo é inteiramente me-diatizada por essa atividade acumulada nas objetivações humanas”.

Nesse sentido, pensar filosoficamente o processo educacio-nal e a proposta filosófica assumida no projeto político pedagógico requer que tenhamos em mente essa relação dialética e constante entre o homem, a cultura, a história e os processos de objetivação/ subjetivação decorrentes dessa relação.

Assim, a filosofia da EME IJSSL, no que concerne à sua concep-ção de mundo, de sociedade, de ser humano e de educação pode ser assim entendida e conceituada:

De MundoO mundo hoje tem passado por transformações rápidas, ora

benéficas, ora extremamente perversas: benéficas em virtude dos avanços científicos, tecnológicos e intelectuais; perversos em virtu-de da exclusão social, fome, miséria e pobreza que se alastra pelo mundo. No entanto, entendemos que o mundo é onde se dão as in-terações intersubjetivas entre os seres humanos, caracterizadas, pela diversidade tipicamente humana e pelo conhecimento. Devido a es-

1 Doutor em Educação, Professor Adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo.2 Mestrando em Educação PPGE/CE/UFES, Professor do Sistema Municipal de Ensino de Vitória.

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sas transformações cotidianas e a diversidade própria que a globali-zação transpôs, torna-se necessário proporcionar aos seres humano em processo de transformação, pela via da educação formal, que se aproprie de um mundo calcado em valores materiais, políticos, cul-turais, espirituais, econômicas e morais, para que sejam superadas as injustiças, diferenças, divisões e distinções típicas do mundo capita-lista, neo-liberal e globalizante que vivemos neste início de século.

De SociedadeEntendendo que, como afirma Santos (2000, p. 41-42) “[...] as

sociedades são a imagem que têm de si vistas nos espelhos que cons-troem para reproduzir as identificações dominantes num dado mo-mento histórico. Os espelhos da sociedade são instituições, normati-vidades, ideologias que estabelecem correspondências e hierarquias entre campos infinitamente vastos de práticas sociais”; cabe afirmar que somos uma sociedade capitalista, competitiva, que baseia suas ações em resultados quantificáveis, por isso precisamos construir um ideário que, apesar de tudo isso, contribua para o repensar e a ins-tauração de uma sociedade crítica, liberta, reflexiva, igualitária, de-mocrática e inclusiva, fruto da análise sócio-histórica típica de uma cultura e de uma sociedade tão rica e diversificada como a nossa.

De Ser Humano“O homem é uma criatura social, e as condições socioculturais

o modificam profundamente, desenvolvendo toda uma série de no-vas formas e técnicas em seu comportamento” (VYGOTSKY, 1996a, p. 220). Concebendo o homem dessa forma vamos ao encontro daqui-lo que vivenciamos hoje, que o ser humano é competitivo e indivi-dualista, resultado das relações impostas pelo modelo econômico e social em vigor. Entretanto, assim como Vygotsky e todos os seus pressuposto, acreditamos que o ser humano é, essencialmente, so-cial. Acreditamos num ser humano capaz de modificar-se pela apro-priação, produção e reprodução da linguagem e das ferramentas simbólico-culturais ao mesmo tempo em que modifica a sociedade ao seu redor, num movimento ininterrupto e dialético, tornando-se sujeito e objeto da história. O ser humano, sob essa ótica, ultrapassa meras convenções de gênero e passa a ser visto como ser único, com identidade, inserido na coletividade e, dessa coletividade, se abaste-cendo e se humanizando.

De Educaçãoo processo educacional, assim como o entendimento de edu-

cação da EMEF IJSSL, é aquele que contempla um tipo de ensino e aprendizagem que ultrapassa a mera reprodução de atos e conhe-cimentos cristalizados e tidos como verdades inabaláveis. É aquele que possibilita um processo de produção e de apropriação de conhe-cimento, contribuindo assim, para que o indivíduo torne-se cidadão crítico de seu cotidiano e de sua realidade exercendo sua cidadania, refletindo sobre as questões sócio-culturais e buscando alternativas de superação das dificuldades impostas pela modernidade.

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A educação, nessa perspectiva, precisa ser entendida e trabalha-da como uma forma de “ensinar atendendo às diferenças dos alunos, mas sem diferenciar o ensino para cada um, depende entre outras con-dições, de se abandonar um ensino transmissivo e de se adotar uma pedagogia ativa, dialógica, interativa, integradora, que se contrapõe a toda e qualquer visão unidirecional, de transferência unitária, indivi-dualizada e hierárquica do saber” (MANTOAN, 2003, p. 71).

Uma educação fundamentada nestes princípios requer uma escola que não se prenda a dogmas, conceitos e preconceitos este-reotipados, mas sim, uma escola moderna, inovadora, que valoriza as pessoas que dela fazem parte, ao mesmo tempo em que contribui para a felicidade, fortalecimento e socialização desses seres huma-nos únicos em sua existência.

Fundamentos sócio - antropológicos

A construção social da realidade escolar é um processo perme-ado por aspectos macrossociais de modo geral, ou seja, a escola ao mesmo tempo em que reflete, refrata a sociedade à qual faz parte e/ou está inserida. Neste sentido, quando se trata dos fundamentos sócio-antropológicos específicos da comunidade escolar da EMEF IJS-SL, tem-se que levar em consideração o contexto sócio-cultural das crianças e de suas famílias; as concepções sobre as relações sociais es-tabelecidas no contexto familiar, comunitário e institucional; a partici-pação na/da comunidade em projetos sociais públicos, filantrópicos, não-governamentais e confessionais; além da participação de outras secretarias municipais envolvidas. A observância desses e de outros aspectos possibilitará entender o contexto no qual nossos alunos es-tão inseridos, os projetos que vivencia, a sociedade que faz parte, para assim propormos novas formas de trabalho pedagógico que contribu-am para o desenvolvimento pleno desse ser humano como cidadão de seu tempo, de sua cultura e de sua sociedade/realidade.

Somente uma visão sócio-antropológica que perceba o ser hu-mano como alguém que, independente de classe social, origem ét-nica, preferência sexual, grau de instrução, preferência religiosa, seja capaz de produzir história, cultura e sociabilidade, dará conta de de-senvolver um processo educacional desvinculado de preconceitos e estereótipos que congelam e engessam o processo educacional im-pedindo que se vejam as reais possibilidades do aluno.

Isso posto, cabe ressaltar que a escola, como lócus privilegiado de transmissão dos conhecimentos sócio-culturalmente construídos, “poderia e deveria ser um espaço que se preocupasse em tornar os alunos mais humanos. Assim entendida, ela [escola] representa um lugar favorável a que todos que a procuram sejam bem-vindos para colaborar no trabalho realizado” (FERREIRA; GUIMARÃES, 2003, p. 42).

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Fundamentos psicopedagógicos

A escola, para grande parte dos alunos é um dos únicos (se-não o único) lugares onde este pode ter acesso aos conhecimentos socialmente construídos de forma sistemática. É na escola, também, que nossos alunos passam grande parte de sua infância e adoles-cência: 800 horas anuais – dessa, ao menos 5 horas por dia; 200 dias letivos – desses, ao menos 5 semanais. Esse total de dias e horas na escola, em muitos casos, é maior do que o tempo em que passa com os pais/mães e/ou outros familiares. Nesse sentido, o modo como a escola concebe o processo ensino aprendizagem, a construção do conhecimento, o desenvolvimento humano, os objetivos da ação pedagógica, será de extrema importância para que o ser humano em desenvolvimento no cotidiano escolar se veja e se perceba como parte integrante desse processo. Ou, em outras palavras, como mais um dos SUJEITOS da educação.

Para tanto, algumas concepções precisam ser debatidas e en-tendidas:

Desenvolvimento infanto–juvenil – falar do desenvolvimen-to infanto-juvenil é falar do processo de desenvolvimento humano de modo feral. Assim, tanto a criança quanto o adolescente são seres que, antes de estarem no ambiente escolar, já participam da vida so-cial de forma plena: na rua, em casa, na igreja, nas feiras, nas praças; andam, falam, correm, se comunicam por meio eletrônicos; fazem uso de materiais simbólicos, compram, vendem, são afetados pela ideologia dominante, ou seja, são cidadãos imersos no contexto so-cial amplo.

A criança, como todo ser humano, é um sujeito social e histórico e faz parte de uma organização familiar que está inserida em uma sociedade, com uma determinada cultura, em um determinado momento histórico. É pro-fundamente marcada pelo meio social em que se desen-volve, mas também o marca (BRASIL, 1998, p.21).

Porém, a escola geralmente se esquece disso e tende a achar que a criança quando chega à escola precisa de ser moldada, refor-matada, como um computador que pode ser reprogramado; deixa-se de lado tudo o que a escola considera ruim e nocivo e inicia-se um trabalho considerado ideal. Aí reside o grande erro em relação à concepção do desenvolvimento infanto-juvenil: achar que a crian-ça é um ser acabado e, portanto, precisa ser reprogramado para ser alguém na vida, para ter um futuro. Ora, a criança não será alguém, ela é alguém que está em processo de desenvolvimento, assim como todos os seres humanos; ou como diria Vygotsky (2001, p. 289-290)

A criança não é um ser acabado, mas um organismo em desenvolvimento, e consequentemente o seu compor-tamento se forma não só sobre a influência excepcional da interferência sistemática no meio, mas ainda em fun-ção de ciclos ou períodos do desenvolvimento do pró-

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prio organismo infantil, que determinam, por sua vez, a relação do homem com o meio. [...] o processo de desen-volvimento da criança, como tudo o demais na natureza, também se realiza pela via dialética de desenvolvimento e da transformação da quantidade em qualidade.

E isso que a EMEF IJSSL não pode perder de vista: uma concep-ção de desenvolvimento infanto juvenil que veja o ser humano em plena e permanente mudança, algumas boas outras más, dependen-do da concepção que se tenha, mas ambas inseridas num contexto de transformação constante e ininterrupta, tipicamente humana.

O processo ensino-aprendizagem – entendendo que a aprendizagem da criança começa muito antes dela entrar na escola e que a criança aprende no contato social estabelecido com os outros membros da espécie humana através de trocas mediatizadas pelos signos lingüísticos construídos social e historicamente, não mais é possível conceber um processo ensino-aprendizagem unilateral e vertical, ou seja, onde somente o professor ensina e a criança/aluno age como um mero receptáculo de informações, muitas vezes vazias, descontextualizadas e sem sentido algum para a criança, como pre-coniza uma tendência educacional tradicional.

Mas, se ao contrário disso, entendermos que o processo ensi-no-aprendizagem é algo dinâmico, vivo, horizontal e multifacetado, entenderemos que a educação não se dá no vazio e que tanto aluno quanto professor e comunidade escolar como um todo são sujeitos do processo de conhecimento.

Afinal, a verdadeira educação não é aquela que abastece a criança de informações, mas, “a verdadeira educação consiste em despertar na criança aquilo que tem já em si, ajudá-la a fomentá-lo e orientar seu desenvolvimento em uma direção preestabelecida” (VYGOTSKY, 1996, p. 62).

Uma escola nessa perspectiva assume as características da pe-dagogia crítica, tendo na tendência pedagógica crítico-social dos conteúdos, e seus defensores, o alicerce para a condição de um tra-balho educacional que ao mesmo tempo em que possibilita movi-menta e impulsiona o desenvolvimento do ser humano.

Nesse contexto, o processo ensino aprendizagem precisa ser entendido como sendo “aquilo que é apropriado e internalizado nas relações sociais estabelecidas, só ocorrendo, convém ressaltar, quan-do os instrumentos e as pautas de interação são possíveis de serem apropriados” (DAVIS, 2005, p. 48).

Para tanto, a escola precisa rever seus conceitos e paradigmas, almejando recriar seus processos, ou como diria Candau (2002, p. 14), a escola precisa ser reinventada para dar lugar a esta outra vida que esta fora dela e que precisa fazer parte de seu cotidiano, já que “a escola está chamada a ser, nos próximos anos, mais do que um lócus de apropriação do conhecimento social relevante, e científico, um es-paço de diálogo entre diferentes saberes-científicos, social, escolar, etc. – e linguagens. De análise crítica, estímulo ao exercício da capa-

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cidade reflexiva e de uma visão plural e histórica do conhecimento, da ciência, da tecnologia e das diferentes linguagens”.

Construção do Conhecimento – quando falamos em cons-trução do conhecimento não falamos no sentido de agir no vazio e estabelecer algo totalmente novo, até então inexistente. Falamos em transformação, apropriação, recriação, produção e reprodução daquilo que já existe, já foi criado e inventado, mas que precisa ser ressignificado. É nesse sentido que pensamos a construção do co-nhecimento no contexto das relações estabelecidas na escola.

Isto posto, enfatizamos que entendemos o conhecimento como algo dinâmico; com fundamento e utilidade prática; com base social, cultural e histórica; que se desenvolve a partir do momento em que o ser humano se relaciona com os outros seres de sua espé-cie; ou seja, “na medida em que internaliza os sistemas de signos pro-duzidos culturalmente, a consciência do indivíduo sobre a realidade vai se transformando, os processos mentais mudam, sua capacidade crítica vai sendo construída, sua ação orientada” (KRAMER, 2002, p. 91) e, nesse processo dialético, a construção do conhecimento se dá.

O objetivo disto é deixar claro que não desejamos ter na EMEF IJSSL um processo de mera transmissão de conteúdos, frios, desvin-culados, supérfluos, de forma insipiente e superficial entre profes-sor e aluno. Mas, sim, um processo que reconheça, a partir de uma perspectiva crítica de educação, que a construção do conhecimento é algo ativo, profundo, que deixa marcas e que se baseia em trocas ininterruptas. Afinal, como afirma Góes,

[...] os processo humanos têm sua gênese nas relações sociais e devem ser compreendidos em seu caráter his-tórico-cultural. O homem significa o mundo e a si pró-prio não de forma direta, mas por meio da experiência social. Sua compreensão da realidade e seus modos de agir são mediados pelo outro, por signos e instrumentos, isto é são constituídos pela mediação social-semiótica. Assim, a formação do funcionamento subjetivo envolve a internalização (reconstrução, conversão) das experiên-cias vividas no plano intersubjetivo.(GOES, 2002, p. 99)

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Referências Bibliográficas

BRASIL, Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998 – V.1.

CANDAU, V. M. F. (Org.). Reinventar a escola. Petrópolis: Vozes, 2002.

DAVIS, C. Piaget ou Vigotsky: uma falsa questão. Viver mente & cé-rebro. Coleção Memória da Pedagogia – Lev Semenovich Vygotsky: uma educação dialética. Rio de Janeiro: Ediouro; São Paulo: Segmento Ducto, 2005.

DUARTE, N. Vigotski e o “aprender a aprender”: crítica às apropria-ções neoliberais e pós-moderna da teoria Vigotskiana. São Paulo: Autores Associados, 2000.

FERREIRA, M. E. C.; GUIMARÃES, M. Educação Inclusiva. Rio deJaneiro. DP&A, 2003.

GOÉS, Maria C. R. de Relações entre desenvolvimento humano, defi-ciência e educação: contribuições da abordagem histórico-cultural. In: OLIVEIRA, M. K. de; SOUZA, D. T. R; REGO, T. C. (Orgs.). Psicologia, educação e as temáticas da vida contemporânea. São Paulo: Mo-derna, 2002.

KRAMER, S. Por ente as pedras: arma e sonho na escola. 3. ed. São Paulo: Ática, 2002.

MANTOAM, M. T. E. Inclusão escolar: O que é? Como fazer? SãoPaulo. Moderna, 2003

SANTOS, B. de S. (2000).

VYGOTSKY, L. S. Psicologia pedagógica. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

VYGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R. Estudos sobre a história do compor-tamento: o macaco, o primitivo e a criança. Porto Alegre: ArtesMédicas. 1996.

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Texto 4 Projeto Político Pedagógico: reflexões para a

construção de uma escola participativa

Rogério Drago1

Paulo da Silva Rodrigues2

Introdução

O presente artigo tem como objetivo principal mostrar que é possível construir, através da participação, o Projeto Político Peda-gógico da escola com o intuito de organizar as ações pedagógicas, administrativas e financeiras de uma unidade de ensino.

Para tanto, partimos3 de um trabalho que envolveu uma pes-quisa qualitativa participativa entre os envolvidos no processo edu-cativo no cotidiano da EMEF Irmã Jacinta Soares de Souza Lima – doravante denominada EMEF IJSSL – associado a um levantamento bibliográfico e documental que embasasse e fundamentasse de for-ma teórica a prática de pesquisa e análise de dados que fundamenta-ria todo o processo de elaboração do PPP.

A EMEF IJSSL localiza-se no município de Vitória, numa comuni-dade que fica bem próxima ao centro da capital. Atende a uma comu-nidade que possui vários problemas de infra-estrutura. Em relação à comunidade onde a escola está instalada, trata-se de um bairro loca-lizado na Ilha de Vitória e que possui uma parte plana, porém a maior parte dos moradores localiza-se nas encostas e no alto do morro.

É uma escola que está num prédio antigo, com salas de aula pe-quenas, pouco arejadas e com ventilação natural insuficiente; pátios externo, interno e refeitório também pequenos para o número de alunos atendidos – sendo uma matrícula que gira em torno de 320 alunos por turno. Além disso, não permite o acesso de crianças e/ou outras pessoas com determinados tipos de deficiência, pelo fato de não possuir rampas de acesso e por ser constituída de três andares.

Atende crianças e adolescentes de sete a quatorze anos, nas turmas de 1ª a 8ª séries, sendo que no turno matutino têm-se doze turmas de 1ª a 4ª e no vespertino 12 turmas de 4ª a 8ª séries. A clien-tela é pertencente às classes econômicas menos favorecidas da so-ciedade, onde grande parte das famílias desempenha profissões que não necessitam de qualificação e/ou atuam em atividades considera-das como subempregos.

Entretanto, apesar do exposto, as famílias são presentes ao cotidiano escolar, participam das atividades e demonstram muita preocupação com o desenvolvimento educacional dos filhos matri-

1 Doutor em Educação, Professor Adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo.2 Mestrando em Educação PPGE/CE/UFES, Professor do Sistema Municipal de Ensino de Vitória.3 Opto por usar a primeira pessoa do plural por acreditar que este texto não foi desenvolvido por uma única pessoa, mas sim por um coletivo composto por estudiosos da área e pelos profissionais da EMEF IJSSL.

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culados na EMEF. Esse fato acarreta uma participação política muito positiva na gestão da escola por parte da comunidade.

Apesar disso, possui um corpo docente, técnico, pedagógico e de apoio muito participante, com boa formação técnica e pedagógi-ca dentro de suas funções, e que está na escola há um tempo consi-derável – em média cinco anos para os efetivos.

Isso tudo faz com que esta escola goze de um certo prestígio nas comunidades ao seu entorno, uma vez que não apresenta pro-blemas consideráveis referentes à indisciplina, violência, drogas e outros casos que a mídia veicula diariamente.

A ELABORAÇÃO COLETIVA DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA ESCOLA: REFLEXÕES PERTINENTES

Neste início de século, em um país que a todo instante se apre-senta como democrático, não é mais possível pensar nesta organiza-ção tão complexa chamada escola, sem que os sujeitos pertencentes a ela – pais, alunos e educadores – tomem a iniciativa e assumam a responsabilidade de construir, de forma participativa, uma proposta pedagógica com a finalidade de organizar todo o trabalho a ser reali-zado na escola para que esta esteja apta a oferecer uma educação de qualidade a todas as crianças e jovens da sociedade.

De acordo com Veiga (2004, p.12)

Ao construirmos os projetos de nossas escolas, planeja-mos o que temos intenção de fazer, de realizar. Lança-mo-nos para diante, com base no que temos, buscando o possível. É antever um futuro diferente do presente.

Concordando com Veiga (2004), o projeto político pedagógico tem sido objeto de estudos para professores, pesquisadores e insti-tuições educacionais e, vem causando muita inquietação em todos os envolvidos nesse processo. Cabe ressaltar, que a grande maioria das escolas de nosso país, por razões diversas, ainda não conseguiu elaborar este documento tão importante, que quando bem entendi-do e quando construído a partir do coletivo da escola, poderá orga-nizar e direcionar todas as ações a serem desenvolvidas através de um trabalho em equipe, para que os objetivos e metas pretendidos sejam alcançados.

No contexto educativo atual, não é mais possível conceber uma educação desvinculada de uma perspectiva política e pedagógica. Nesse sentido, ao se propor a elaboração do projeto político pedagó-gico, tem-se em mente que este processo prima pela organização di-dática, pedagógica, metodológica e institucional de uma práxis edu-cativa permeada pela constância do diálogo e voltada para os novos paradigmas sociais que emergem da modernidade que caracterizam a sociedade deste início de século.

Mas o que é um projeto da escola? Analisando a autonomia da escola pública pela via do enfoque operacional, Neves (2004), faz

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uma série de considerações sobre o projeto político pedagógico e seu processo de elaboração, implementação, concretização e ava-liação no contexto educacional. Para tanto, destaca que o projeto é uma possibilidade de aprimoramento da educação em todos os lu-gares onde se torna realidade.

Segundo a autora (2004, p. 112) o Ministério da Educação da França, por exemplo, valoriza o projeto da escola e o resume da se-guinte forma:

• A colocação em prática dos objetivos nacionais, levando em conta as situações locais e as necessidades específicas da clien-tela;

• Um conjunto de objetivos concretos e realistas;• Um plano preciso de ações coerentes, articuladas entre si, reu-

nidas em torno de objetivos e cujos efeitos são avaliáveis;• O trabalho de uma equipe responsável decidida a trabalhar em

conjunto;• Um programa plurianual, um calendário com uma programa-

ção e prazos precisos para cada fase;• Um conjunto de ações concebidas para os alunos e, se possível,

com eles.

Nesse sentido, concordamos com Neves (2004, p.112-113) quando diz que “para a escola, um projeto ilumina princípios filosó-ficos, define políticas, racionaliza e organiza ações, otimiza recursos humanos, materiais e financeiros, facilita a continuidade administra-tiva, mobiliza os diferentes setores na busca de objetivos comuns e, por ser de domínio público, permite constante acompanhamento e avaliação”.

Diante do exposto, como podemos permitir que nossas escolas continuem desenvolvendo suas atividades sem apresentar à comu-nidade sua proposta de trabalho? E, como podemos aceitar que o projeto político pedagógico seja pensado e elaborado apenas por diretores, pedagogos ou simplesmente encaminhado pelos sistemas de ensino, sem considerar o coletivo, as especificidades e as realida-des das comunidades escolares, e ainda, as expectativas que estas têm em relação à qualidade da educação que será oferecida aos alu-nos?

Precisamos assumir nossas responsabilidades e sabemos que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) é clara em seu Art. 13. Inciso l quando destaca que:

Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;

Estamos cientes que para a construção de uma proposta peda-gógica, que ao ser executada seja capaz de oferecer às classes popu-lares uma educação verdadeiramente de qualidade é preciso muito mais do que uma legislação que obrigue a participação de educado-res neste processo. Precisamos de verdade que cada um se envolva

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e se conscientize que não é mais possível permitir que esta organi-zação continue oferecendo uma educação que não esteja sistemati-zada em uma proposta pedagógica elaborada a partir do coletivo da unidade de ensino, envolvendo toda a comunidade escolar.

Para Hora (1994) a consolidação de uma gestão democrática da escola, não é um processo espontâneo e fácil. A dinâmica das relações de poder pode dificultar o sucesso (avanço) do processo, fazendo com que seja necessário que se faça um grande esforço, seja ele coletivo e encaminhado em função de decisões de grupo e não de indivíduo, dessa forma, Hora (1994) acata a afirmação de Arroyo que diz:

Democratização da administração não significa eliminar a presença do estado nos serviços públicos, mas buscar mecanismos para submeter às decisões do estado ao debate e ao controle pela opinião pública, pais, grupos e partido. (ARROYO, 1979, apud HORA, 1994, p. 4).

Nós, educadores, precisamos acreditar que temos a capacidade de construir tal proposta, mesmo sabendo da complexidade da es-cola, da abrangência do projeto e dos inúmeros obstáculos que irão surgir. Profissionais da educação não desistem, o que precisamos é colocar em discussão e, a partir do coletivo, apontar as dificuldades e apresentarmos sugestões para solução das questões.

Na Escola Municipal de Ensino Fundamental “Irmã Jacinta” o processo de elaboração do Projeto Político Pedagógico de forma coletiva, contribuiu significativamente para que os segmentos que compõem a comunidade escolar entendessem a importância de sua participação na gestão da escola. Cabe ressaltar, que quando falamos em participação não estamos nos referindo apenas à presença des-ses segmentos em reuniões de pais, plantões pedagógicos, conse-lhos de classes, conselho de escola e outras, mas sim, de participação na tomada de decisões.

A gestão democrática que se pretende exercitar é aquela que se pauta no fato de que “o objetivo central da educação deve ser a cons-trução de personalidades mais autônomas, críticas, que almejam o exercício competente da cidadania. Para tanto, ela deve embasar-se nos princípios democráticos da justiça, da igualdade, da eqüidade e da participação ativa de todos os membros da sociedade na vida pú-blica e política” (ARAUJO, 2002, p. 41).

Sendo assim, é fundamental que os sistemas de ensino promo-vam ações com a finalidade de propiciar o entendimento acerca da ação democrática da educação, incentivando e mobilizando a comu-nidade escolar para a construção de uma proposta pedagógica da escola. Proposta esta que, além de ir ao encontro das expectativas dos sujeitos envolvidos no processo, acaba permitindo que todos te-nham a oportunidade de receber um atendimento diário de qualida-de ao mesmo tempo em que participa da gestão da educação num processo coletivo de tomada de decisões.

De acordo com Esteban (2006, p.15);

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Pensar e fazer uma escola pública de qualidade para as classes populares tem sido um grande desafio para os educadores comprometidos com a construção de uma sociedade verdadeiramente democrática. Em períodos de transformações tão profundas como o que estamos vivendo, este desafio parece tornar-se ainda mais com-plexo, pois a incerteza acompanha cada passo.

Na EMEF “Irmã Jacinta” o processo de construção do seu projeto teve inicio em 2002 e só conseguimos sistematizar esta proposta no final do ano 2007. Durante nossa caminhada encontramos muitos obstáculos e dentre eles podemos citar: a rotatividade dos profissio-nais, a pouca experiência em participação dos envolvidos neste pro-cesso e, ainda a falta de tempo-espaço para realização dos estudos necessários para a construção do Projeto Político Pedagógico.

É preciso ressaltar, que em virtude dos obstáculos encontrados interrompemos essa construção por várias vezes e a partir de 2005, com um grupo que já não se modificava tanto, retomamos o proces-so e conseguimos vencer as seguintes etapas: caracterização da co-munidade escolar, estudos sobre tendências pedagógicas, correntes filosóficas, teorias do conhecimento, alfabetização,  currículo, avalia-ção, disciplina, e ainda,  por inúmeras vezes, em virtude da rotativida-de dos profissionais, tivemos que socializar as etapas já vivenciadas para aqueles que estavam chegando.

Após vivenciar as etapas citadas acima é que conseguimos ter, de fato, a dimensão da abrangência do projeto e ainda, quais os al-cances possíveis que este trabalho em equipe pode proporcionar. Por várias vezes chegamos a pensar que não seria possível a conclu-são deste trabalho.

Um dos fatores que contribuíram para a concretização do PPP foi quando, a partir de fevereiro de 2004, o Ministério da Educação e Cultura, enviou às unidades escolares, o material Indicadores da Qualidade na Educação (BRASIL, 2004a) e podemos afirmar que este material veio contribuir, de forma significativa, com o processo de elaboração do projeto político pedagógico da Escola Municipal de Ensino Fundamental “ Irmã Jacinta soares de Souza Lima”.

Durante o período de realização do diagnóstico, tivemos a oportunidade de observar e discutir as dimensões abordadas no ma-terial citado, que orientaram o nosso fazer, nesta etapa de elaboração da proposta pedagógica escolar.

O material enfatiza que a escola precisa ser um ambiente edu-cativo, alegre, onde a amizade e a solidariedade estejam presentes e, através da construção de regras claras de convivência procura com-bater a discriminação, respeitando o direito das crianças e dos ado-lescentes.

Neste sentido, a prática pedagógica deve ser realizada diante de uma proposta elaborada coletivamente e apresentada a todos os sujei-tos da comunidade escolar, valorizando o planejamento e o trabalho em equipe, procurando contextualizar os conteúdos e diversificar as estraté-gias e recursos de ensino-aprendizagem, e ainda, respeitando as diferen-ças e toda a diversidade cultural presente no interior da escola.

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No que tange a avaliação, o material destaca que esta é parte fundamental do processo educativo, onde a escola, através de vários instrumentos, possa investigar e acompanhar o aluno no seu desen-volvimento, oferecendo o suporte necessário para a superação das dificuldades apresentadas.

Outra importante dimensão abordada nos Indicadores da Qualidade na Educação é a gestão democrática, como mecanismo propulsor da participação, que possibilita que poder da direção seja descentralizado e as decisões tomadas considerando o coletivo. Vale lembrar, que além desse material, o Ministério da Educação, através da Secretaria de Educação Básica, publicou também, em novembro de 2004, o material do Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares (BRASIL, 2004b), e através dele as escolas tive-ram a oportunidade de organizar e fortalecer este importante cole-giado e, a partir daí, iniciar um verdadeiro processo de democratiza-ção da escola pública e construção da cidadania.

Não podemos deixar de falar na formação e condições de tra-balho dos profissionais, pois de acordo com o material, nesta dimen-são é fundamental que cada profissional dê continuidade a sua for-mação inicial, onde a unidade de ensino deve promover e viabilizar a participação dos educadores com o objetivo e melhorar a sua práxis e também a prática pedagógica realizada na escola.

O material traz, ainda, a preocupação com o ambiente físico es-colar, que deve ser um espaço organizado, limpo, arejado, agradável, com materiais adequados à realidade da escola, com recursos que permitam a prestação de serviços de qualidade.

Outra dimensão abordada no documento trata do acesso, per-manência e sucesso na escola, que são os principais desafios de uma instituição de ensino, que precisa pensar em uma escola que contri-bua para o sucesso escolar de todos os alunos matriculados na uni-dade de ensino.

Diante do exposto, podemos afirmar que o material, Indicado-res da Qualidade na Educação, está muito bem organizado, abordan-do dimensões que precisam ser observadas, debatidas e utilizadas no cotidiano escolar, e ainda, podemos afirmar que este instrumento poderá contribuir significativamente no processo de realização do diagnóstico da escola para a construção da sua proposta pedagógica.

A  elaboração do projeto político pedagógico é um processo muito rico e esta experiência  provocou mudanças significativas  na comunidade escolar. Entendemos que o  projeto é o organizador das nossas ações e coloca em discussão o papel da escola, a concepção de educação, de homem, de  mundo e de sociedade que queremos construir de forma coletiva, envolvendo todos os autores e atores responsáveis por esta construção.

De acordo com Veiga (2004, p.14),

A principal possibilidade de construção do projeto polí-tico-pedagógico passa pela relativa autonomia da esco-la, de sua capacidade de delinear sua própria identidade. Isto significa resgatar a escola como espaço público, lu-gar de debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva.

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Entendemos que não foi nada fácil, pois sabemos que a direção da unidade de ensino tem um papel fundamental neste processo de elaboração, e concordando com Veiga (2004), reafirmamos que esco-la é lugar de diálogo,  discussão, planejamento, estudo e, é lógico, de muito trabalho; e tudo isso fica muito difícil de ser feito, nesta organi-zação, respeitando uma legislação que prevê um calendário com um mínimo de duzentos dias letivos.

O corpo técnico administrativo, ou seja, diretor, pedagogos e coordenadores, formam o grupo que ficou  com a responsabilidade de articular todo esse trabalho, garantindo a participação dos sujei-tos que precisam se envolver com essa construção. 

No início de 2007, a partir de uma discussão com o grupo de educadores, em virtude da importância e necessidade da elaboração do projeto, conseguimos assegurar que os dias previstos em calendá-rio escolar para Formação Continuada na Escola, fossem destinados ao processo de elaboração do projeto, o que possibilitou um avanço significativo nesta caminhada.

Então começamos a trabalhar com o Marco Referencial – que se constitui na junção dos marcos situacional, teórico e operativo. Para tanto realizamos um encontro onde conseguimos reunir todos os funcionários da escola: professores, coordenadores, pedagogos, merendeiras, auxiliares de serviços gerais, assistentes administrati-vos, bibliotecária, estagiárias e diretor e, através de pequenos grupos, aplicamos um questionário que trata do Marco Situacional – que visa conhecer aspectos da situação sócio-econômico-político-cultural- educativo da comunidade onde a escola está inserida. Depois  socia-lizamos no grupão.

Em seguida, realizamos um encontro para tratarmos do Marco Teórico – buscando identificar a visão de mundo, ser humano, socie-dade e educação presentes no imaginário do grupo de profissionais – e o Marco Operacional, onde utilizamos questionários para pe-quenos grupos de profissionais contendo questões que proporcio-nariam um profundo debate sobre aspectos teórico-metodológicos da educação e da sociedade de modo geral, para depois discutirmos coletivamente os dados coletados.

Em reunião, o corpo técnico administrativo apontou algumas  preocupações com o processo de elaboração do PPP, pois estáva-mos chegando ao final do cronograma que construímos no coleti-vo, contendo as etapas que consideramos importante vivenciar e aí nos perguntamos: O que faremos com tantos dados e informações? Quem ficará responsável pela organização de todos esses dados e informações para sistematização do PPP? Quais serão os elementos constitutivos do nosso projeto? Como garantir a execução dessa pro-posta tão abrangente?

Diante do exposto, apresentamos para a Secretaria de Educa-ção todo o conjunto de dados colhidos e discutidos no coletivo da escola, para, a partir daí, buscarmos respostas às questões acima des-tacadas. Solicitamos então, a Secretaria de Educação um profissional com disponibilidade de tempo e capacidade para sistematizar em

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forma de texto todos os dados produzidos. Em outubro de 2007, nossa solicitação foi aceita e em dezem-

bro do mesmo ano já estávamos com o Projeto Político Pedagógico da EMEF “Irmã Jacinta” sistematizado. Este, por sua vez foi submeti-do à apreciação do grupo onde novas questões foram levantadas, críticas foram feitas e, assim, conseguimos chegar ao início de 2008 com o projeto estruturado, tanto no que se refere ao texto quanto no que tange às discussões numa perspectiva democrática e dialética de educação.

Como gestor desta Unidade de Ensino, é preciso destacar que esta experiência já provocou mudanças significativas na comunida-de escolar, não só na organização da escola como um todo, mas na forma como as relações são estabelecidas, na integração da equipe, no crescimento e aprimoramento profissional de cada educador pro-vocando mudanças positivas na condução do processo educacional e, podemos afirmar que fez com que esta organização se tornasse um local prazeroso para alunos, educadores, pais e toda a comuni-dade local.

Com uma proposta já sistematizada, passamos agora a outra tarefa muito difícil, a de colocar em prática tudo o que foi elaborado a partir do coletivo, ou seja, a implementação do projeto, acompa-nhando no interior da escola o desenvolvimento de todas as ações, verificando quais têm contribuído ou não para a melhoria da prática educativa e através de um processo de avaliação coletiva, realizar as modificações que se fizerem necessárias para garantirmos a realiza-ção de um trabalho que permita à escola a cumprir o seu papel: dar sentido ao processo educacional.

De acordo com Penin & Vieira (2002, p. 20) “a finalidade da edu-cação é o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a ci-dadania e sua qualificação para o trabalho. Isto significa que a missão da escola, tal como definido em lei é, justamente, promover o ple-no desenvolvimento do educando, preparando-o para a cidadania e qualificando-o para o trabalho”, daí a importância do envolvimento de representantes de todos os setores da escola e da comunidade escolar de modo geral.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmã Jacinta Soa-res de Souza Lima tem experimentado esse processo de mudança movido por este sentimento poderoso, tanto é que conseguimos implementar um processo de debate, estudo, discussões que agora encontram-se reunidos no projeto político pedagógico.

Projeto este que reflete os desejos, anseios e perspectivas de alunos, pais, professores, comunidade escolar, em torno de uma es-cola aberta à diversidade, inserida numa conjuntura sócio – política – educacional que não se pauta em dogmas tradicionais, mas prima pela educação para a cidadania.

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A elaboração do projeto político pedagógico proporcionou mudanças de posturas no que tange à formação continuada dos pro-fessores, nova visão acerca do processo ensino-aprendizagem, além de uma nova forma de encarar o currículo, a avaliação e as relações interpessoais.

Em suma, podemos considerar que temos certeza que com esta iniciativa demos um passo importante para a melhoria na qualidade da educação oferecida pela EMEF Irmã Jacinta e acredito que a parti-cipação nesse processo, como gestor, contribuiu de forma significa-tiva para alcançarmos sucesso na elaboração desta proposta e, se é verdade que a escola tem a cara do diretor, precisamos ficar atentos, pois sua escolha irresponsável pode arruinar o ensino.

Referências Bibliográficas

ARAUJO, V. F. A construção de escolas democráticas: histórias sobre comunidades, mudanças e resistências. São Paulo: Moderna, 2002.

BRASIL. Indicadores da qualidade na educação. Brasília: MEC, 2004a.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDB 9394. Brasília: Câmara dos Deputados, 1996.

BRASIL. Conselhos Escolares: democratização da escola econstrução da cidadania. Brasília: MEC/SEB, 2004b.

ESTEBAN, M. T. O que sabe quem erra? 4.ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

HORA, D. L. Gestão democrática na escola. Campinas: Papirus, 1994.

NEVES, C. M. de C. Autonomia da escola pública: um enfoque operacional. In: VEIGA, I. P. A. Projeto político-pedagógico daescola: uma construção coletiva. 17.ed. São Paulo: Papirus, 2004.

VEIGA, I. P. A. Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. In: ______. Projeto político-pedagógico da escola: uma construção coletiva. 17. ed. São Paulo: Papirus 2004.

PENIN, S.; VIEIRA, S.L. Refletindo sobre a função social da escola. In: VEIRA, S. L. (Org.). Gestão da escola: desafios a enfrentar. Rio de Ja-neiro: DP & A, 2002.

VYGOTSKY, L. S. La imaginación e el arte en la infancia. Madri: Akal, 1996.

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Texto 5 Planejamento Educacional: em busca de uma

abordagem sistêmica e regional

Marcelo Lima 1

Introdução

A educação escolar é uma prática social intencional e sistemá-tica e como tal se realiza por meio da materialização e do funciona-mento de uma política educacional que contém em si estratégias, intencionalidades e técnicas educativas.

A forma de se fazer educação em cada época e em cada contex-to é produto de uma constelação de condicionantes que tem como ponto de partida um projeto de sociedade e de homem que se quer formar e isso determina o projeto educativo a ser pensado, delinea-do, esboçado e realizado por inúmeros sujeitos que planejam, que intervém e que executam nos espaços escolares a função social es-perada da escola. Produto este que no final das contas não reflete, pela complexidade do cotidiano escolar, pelas falhas estruturais e au-sência de meios adequados e pelas contradições inerentes a escola, exatamente o que fora previamente estabelecido.

A busca pela determinação dos destinos da escola e pela defi-nição última do processo educativo tornou-se elemento de disputa no interior das várias instâncias da sociedade e do Estado, de sorte que com o desenvolvimento do Estado democrático de direito e a consolidação dos direitos sociais, sobretudo o direito à educação, a política educacional ganhou mais e mais visibilidade em vista de sua importância na determinação dos elementos constitutivos funda-mentais da oferta e da qualidade dos serviços públicos tipicamente escolares.

Com a democratização da sociedade e o advento mais recen-temente da gestão democrática no Brasil tornou-se cada vez mais estratégico definir o que fazer da educação e por isso todos - socieda-de, família, alunos, comunidade, profissionais, etc - querem Interferir, definir, influenciar, participar, portanto, das escolhas políticas sobre a gestão, a administração, o financiamento, o funcionamento e o uso do espaço escolar, o que toma corpo e materialidade nos dispositi-vos legais, nos recursos disponibilizados, nos currículos, na qualidade dos profissionais e, sobretudo no tipo de aprendizagem produzida no final das contas.

Para além da definição dos objetivos educacionais, como toda ação pública, o Estado precisa prever e prover uma série de instru-mentos, equipamentos e meios para se atingir os fins da educação e pro isso ganha destaque aspecto que, por vezes, passa desapercebi-do: o planejamento educacional por meio do qual pode-se antecipar no tempo ao nível de um plano não só o que fazer, mas o como , isto

1 Doutor em Educação pela UFF e Professor Adjunto do Centro de Educação da UFES

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é os instrumentos, as varáveis intervenientes, os caminhos interme-diários necessários de se percorrer para resolver problemas inerentes à oferta do serviço público educativo à população.

Em geral os educadores interessam-se pela definição macro, de âmbito nacional, ou local, de âmbito local-escolar, mas participar e conhecer as entranhas do planejamento educacional ao nível dos sistemas de ensino tem pouca relevância, mas vale lembrar que este constitui num método indispensável de se administrar a coisa públi-ca que pode conferir certa racionalidade ao processo de execução da política educacional.

1. O Planejamento Educacional

A planificação, produto ao mesmo tempo das políticas keyne-sianas dos países capitalistas e dos socialistas do início do século XX, criou certa ilusão quanto à capacidade da ciência e da tecnologia e do Estado em tudo prever e administrar. Na esteira deste movimento se fez surgir uma classe de tecnocratas que em nome do interesse comum produziram simultaneamente a especialização do planeja-mento educacional auto-referido, pretensamente neutro, e a apatia da participação popular na definição do delineamento da política pública, pois o Estado legítimo teria o conhecimento suficiente e de-finitivo para fazer valer esse direito social mais elementar da socieda-de moderna: a educação escolar.

O planejamento, segundo Raymond Aron, é um processo de ho-mogeneizar coisas heterogêneas, de unificar perspectivas, de fundir a ciência com a práxis, de converter qualidade em quantidade, de nivelar diferentes temporalidades (apud Mendes, p.42). A pretensão política dos planos não deve se imposta à realidade, mas procurar moldá-la anteven-do sua resistência por meio de técnicas e estratégias adequadas à apro-ximação mais razoável entre a intenção e a realização.

No auge de seu surgimento, porém, o planejamento assim como a administração científica, revelou cada vez mais uma ten-dência de centralização e normalização, segundo essa lógica quanto mais macro-determinante for o plano, menos interferências houver na sua formulação, melhor será sua execução, pois aos executores cabe fazer o estritamente previsto e se não for eficaz é porque não se cumpriu com exatidão o que foi determinado.

Discordando veementemente deste ponto de vista, Dumerval Trigueiro Mendes (eminente educador brasileiro, falecido nos anos 1980, de quem no ano 2000 foi publicada pela EDUERJ, importante obra intitulada “O Planejamento Educacional”),

o planejamento será irreal sem a participação dos ór-gãos executores e estes ficam condenados ao puro mecanicismo se não tomarem consciência plena dos propósitos que devem animá-los, pois (...) os fins só geram uma política quando se tem a idéia precisa de sua viabilidade e dos métodos capazes de assegurá-la (MENDES, 2000, p. 101).

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Segundo Mendes (2000, p. 64), a crença no discurso dos especialistas

(...) estimulou a ideologia dos meios e o uso inebriante destes passa a substituir e mascarar a política dos fins. A ciência dos meios, com a pretensão de se imunizar na pura racionalidade, serviu como fator de alienação.

Por isso como afirma Miliband, cabe revelar que

a burocracia estatal não constitui um elemento impes-soal não-ideológico ou apolítico na sociedade, mas um elemento crucialmente engajado na manutenção e de-fesa da estrutura de poder. Assim, os tecnocratas, não se ocupam apenas com atividades puramente técnicas e não ideológicas, mas têm como objetivo global, no tra-balho que realizam, o fortalecimento e a consolidação das estruturas econômicas existentes e a racionalização e a adaptação das mesmas às necessidades da empresa capitalista (MILIBAND, 1972, p. 159).

Para Horta,

A tecnocracia, por suas próprias características, é incom-patível com qualquer forma de regime que privilegie a luta política como método para a resolução das ques-tões que dizem respeito ao funcionamento e ao desti-no da sociedade. A pretensão ao conhecimento puro, objetivo e essencial oferece ao tecnocrata a justificativa para o seu arraigado desejo de exclusão dos outros. A tecnocracia é autoritária na medida em que se pretende o princípio organizador de uma ordem justa, perfeita e imperfectível, tendo, portanto, o direito de reclamar por uma autonomia ilimitada e absoluta, que só um regime autoritário pode garantir (HORTA, 1987, p. 229).

No Brasil, a tradição, por um lado autoritária da gestão e, por outro privatista da educação, afastou os educadores e a sociedade em geral da participação no planejamento educacional, sendo este privilégio dos técnicos. Cabe, porém, uma adequada relativização da importância dos meios e dos fins. O planejamento visa à articulação entre metas e instrumentos, mas para Mendes (2000), isso

só se torna possível no momento em que se compreende que o fim é quem determina o meio, que a teoria nasce da práxis e que só à medida que as pessoas que possuem os fins tenham a perspectiva da práxis, isto é de como os fins se desdobram e se alongam na ordem prática, como vão encarnando e se tornando ação com apoio em algumas ins-trumentalidades bastante precisas, só nessa medida poder-se-ia saber concretamente como juntar meios e fins. Neste sentido, uma autonomia absoluta da ordem instrumental é uma espécie de alienação (IDEM, p. 145).

Analisando-se, os últimos 30 anos, é possível perceber que a educação brasileira foi sendo definida não só por uma tecnocracia emsimesmada e encastelada no poder central, mas sobretudo por uma tecnocracia estrangeira dos acordos MEC-USAID, em 1970, aos

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ditames do receituário do banco mundial, nos anos 1990, que por meio do escudo da cooperação técnica fez submergir a inteligent-sia brasileira e participação popular que mais recentemente vem to-mando o seu espaço na luta democrática pela educação.

Esse descolamento não só no nível local, mas também no ní-vel nacional ao invés de mostrar a sua inabilidade operacional ganha ainda mais legitimidade já revestida por uma validação ainda mais ampla: a dos organismos multilaterais (ONU, UNICEF, UNESCO, PNUD, FMI e BIRD), pois segundo Mendes,

Os meios isolados dos fins se afirmariam exclusivamente em virtude de sua tecnicidade, e os especialistas na po-lítica dos meios poderiam ser utilizados para realizar em qualquer parte a política dos fins, o que demonstra uma cilada alienante (p.146). Admite-se a existência de uma teoria pura, e por conseqüência de uma tecnologia pura, assim como a existência de uma categoria de especialis-tas na política dos meios, desligada de uma política dos fins. Os técnicos estrangeiros só podem ensinar os meios dos seus fins, que são distintos dos meios dos nossos. Os técnicos estrangeiros quando não trazem presos organi-camente à estrutura de seu pensamento os fins de sua sociedade e de sua cultura, aplicam os seus instrumen-tos ao status quo do país com o qual colaboram, sem dis-cuti-lo, o que equivale como homologação pura e sim-ples dos fins que esse status quo já representa (p. 147). Razão pela qual, os técnicos estrangeiros trazem objeti-vos de outras sociedades embutidos nas ferramentas ou se tornam cúmplices do imobilismo social, oferecendo armas para a sobrevivência do status quo. Só uma cons-ciência dos fins pode ligar o problema da escolaridade à realidade nacional ou regional. A tecnicidade dos meios só é autônoma numa máquina. No universo humano, toas as técnicas são transcendidas pelos fins que elas não controlam de forma absoluta, e toda teoria participa um pouco da natureza e da arte (MENDES, 2000, p.147).

Deste modo, garantir que o espaço de elaboração dos rumos da educação seja permeável às demandadas sociais e os conflitos políticos para a educação se realizar como espaço de participação da sociedade é possibilitar que a educação esteja na sua elaboração mais próxima daquilo que espera a sociedade no seu conjunto, mes-mo que em princípio se construa um mapa aberto sem muitos deta-lhes como garantiria a tecnocracia de plantão.

Hoje a política educacional assim como a gestão escolar tem sido exaustivamente discutida pela literatura produzida por educa-dores e pesquisadores das universidades brasileiras, com destaque para o GT de política educacional da ANPED e, sobretudo após, a LDBEN nº 9394 de 1996.

Com advento da gestão democrática, muitos autores tem se debruçado sobre questões que envolvem a democratização do aces-so, do funcionamento e da permanência nas escolas. Do ponto de vista micro, temas como a eleição de dirigentes, a participação da comunidade escolar, a estrutura necessária à escola, autonomia nos projetos políticos pedagógicos e a divisão do trabalho, por exemplo,

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vem sendo objeto de inúmeros artigos teses e dissertações [BARRO-SO (2005); CURY (2008); FERREIRA (2007); OLIVEIRA (2000); ADRIÃO (2001); SAVIANI (2007); TEODORO (2008); CUNHA (1997); DOURADO (2007); HORTA (1998); KUENZER (2001); NEVES (2009)], por outro lado, do ponto de vista macro, a discussão que considera a política educa-cional, o financiamento, as relações entre os órgãos multilaterais e entre entes federativos como estados, municípios e união também são objetos importantes de estudos no Brasil.

É preciso, no entanto, avançar também nos estudos sobre siste-mas educativos estaduais e municipais, pois abordar apenas os níveis macro e o micro impede a percepção do importante papel de me-diação exercidos pelos sistemas de ensino. Alguns desses como os sistemas estaduais, no que pese a intensa municipalização do ensino, chegam a possuir milhares de unidades escolares.

Precisa-se socialmente promover a apropriação não apenas do debate dos fins da educação, mas também dos meios para promovê-la, pois a ciência dos meios, intencionalmente hermética, pela sua opacidade tornou-se pouco atraente e em alguns casos inacessível, gerando dois equívocos igualmente danosos na visão dos educado-res em geral. Por um lado, os educadores mais desavisados superva-lorizavam os meios, no contexto do estado na sua vertente interven-cionista, entendendo-os como matéria exclusiva dos entendidos, mas hoje, no âmbito do estado neoliberal, os educadores mais críticos te-dem a desconsiderar a importância dos meios por supervalorizarem os fins. Essa contradição denota uma espécie de superpolitização dos educadores que preferem discutir a política, o financiamento, os sa-lários, a função da educação, etc, desapercebendo o quão pode ser estrtégicos alguns processos mediadores que acabam por interferir sobremaneira nos fins. Destaca-se nessa direção, portanto, a impor-tância do planejamento, no âmbito dos sistemas de ensino que, em-bora, não sejam tão determinantes do resultado da educação escolar como as políticas macro do MEC e dos processos micro das escolas, ainda assim, possuem papel relevante na política educativa.

Uma política para o ensino médio e para a educação profis-sional, por exemplo, precisa de uma infraestrutura física, financeira e de pessoal e uma proprota pedagíca adequada que decorrem de escolhas tanto nacionais, como locais, emcada unidade escolar. No entanto, isso não é suficiente, entre o ministro da educação e a dire-tora da escola, existem muitas decisões intermediarárias que acabam por interferir mais do que se tem discutido nos destinos da educa-ção brasileira. E o planejamento dos sistemas municipais e estaduais expessam esse campo político menos debatido pelos educadores. Para poder debater este tema toma-se a experiência de construção do Plano Estadual de Educação Profissional para 2010 da secretaria estadual de educação do Espírito Santo.

Em 2009, o Governo do Espírito Santo lançou um edital de con-sultoria para elaboração do Plano Estadual de Educação Profissional, exigência do Ministério da Educação, para implementar uma série de convênios que envolviam a oferta de ensino médio e de educação profissional que foi elaborado por um especalista em educação pro-fissional, sendo publicado em 2009 e lançado em 2010.

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2. Plano Estadual de Educação Profissional do Estado do Espírito Santo - 2010

2.1. HistóricoNos anos de 1990, o estado Espírito Santo, como também o res-

tante do Brasil, vivia um movimento de “desprofissionalização” do ensino médio, gerado pelas políticas dualistas do Governo Federal, cujo instru-mento principal foi o Decreto nº 2.208/97, que divorciou o ensino médio da educação profissional, teve resultantes diretas no Estado.

Além disso, no governo FHC, houve o chamado processo de ce-fetização, que diminuiu sobremaneira a oferta de ensino médio por parte das Escolas Técnicas Federais quando da Portaria Ministerial que proibia a oferta de novas matrículas do ensino médio2 . Também com a desarticulação com o ensino técnico o antigo 2º grau reduziu sua oferta federal. O Governo Estadual, por sua vez, com base na le-gislação vigente, á época, na mesma direção da “desprofissionaliza-ção” do ensino médio, pelo artigo 9º, da Portaria nº 502, de 03 janeiro de 1998, extinguiu a oferta do ensino profissionalizane 3.

O resultado desse processo pode ser observado no Quadro 01 - Matrícula no Ensino Médio por Modalidade de Curso e Dependência Administrativa ESPÍRITO SANTO - 1997-2001

Fonte: SEDU/GEIA/SEE

2 Os efeitos desse processo só não foram mais graves porque a sociedade civil entrou na justiça e asse-gurou a oferta de uma quantidade de vagas desse nível de ensino, caso, aliás, inédito no Brasil.3 Artigo 9. As unidades escolares que oferecem o curso de 2º grau, na modalidade não profissionalizan-te, nos termos da lei nº 7.044 (extinta) deverão adaptar-se ao que preceitua a lei nº 9.394/96, a resolução nº 03/98 da câmara da educação básica do CNE e à resolução do nº 120/98 do Conselho Estadual de Educação do Espírito Santo. Artigo 10. Os cursos profissionalizantes nos termos da lei nº 5.692/71 (ex-tinta) e dos pareceres que a regulamentam, inclusive os cursos de habilitação para o exercício do magis-tério em 1º grau, serão encerrados gradativamente, a partir de 1999, tendo em vista as normas dispostas na lei nº 9394/96. Parágrafo 1º Fica assegurado aos alunos que iniciaram os cursos profissionalizantes de que trata o caput deste artigo, inclusive os que ingressaram no ano de 1998, o direito de concluírem pelo regime de vigência à época do seu ingresso. Parágrafo 2º É vedado às unidades escolares da rede pública estadual abertura de novas turmas e efetivação de matrículas novas para a 1º série dos cursos profissionalizantes, nos termos da lei nº 5.692/71 (extinta) Secretária de Educação Rosângela Maria Lu-chi Bernardes (Diário Oficial de 4/12/1998, p.5).

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As instituições privadas até os anos 1990, por sua vez, foram recalcitrantes quanto aos objetivos de terminalidade do ensino mé-dio profissionalizante (desde a 5.692/71, quando pressionaram pela promulgação da 7.044/82, que as liberou da profissionalização com-pulsória), ficaram numa situação ainda mais confortáveis 4.

A partir dos anos 1970, com a lei n° 5.692/71, a profissionaliza-ção compulsória no ensino médio provocou uma oferta desordena-da dos cursos profissionalizantes nas diferentes redes de ensino, em especial na rede pública, que não recebeu o necessário apoio para oferecer essa modalidade de ensino de forma compatível com as exi-gências do desenvolvimento do País no Espírito Santo. Essa situação não foi diferente. Até o ano de 2000, era o seguinte o número de alunos matriculados no ensino médio profissionalizante, por rede de ensino:

ANO DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA

TOTAL FEDERAL ESTADUAL MUNICIPAL PARTICULAR

1998 92.087 3.732 73.468 4.623 10.264

1999 69.667 3.209 55.891 2.696 7.871

2000 35.130 909 29.025 570 4.626

Fonte – Censo Escolar

Considerando a oferta por rede de ensino, observa-se que o go-verno do estado era o responsável por grande parte das matrículas do ensino profissionalizante com cursos técnicos para o setor terciá-rio especialmente os de habilitação técnica em contabilidade, admi-nistração e secretariado. Entretanto, a partir do ano 2000, houve uma inversão dessa tendência, verificando-se uma redução deste tipo de oferta de ensino não só do estado como em todas as redes de ensino, o que se explica pela extinção da oferta integrada de ensino médio e ensino técnico permitida pela Lei de Diretrizes e Bases nº 9.94/96 e regulamentada no decreto n° 2.208/97.

Apesar disto, algumas escolas estaduais que ainda prosse-guiam na oferta de educação profissionalizante, buscavam se arti-cular com outras instituições a fim de profissionalizar seus alunos do ensino médio e aqui ganham destaque os esforços da EEM Anulpho Matos que sem as condições apropriadas buscava estabelecer convê-nios que viabilização suas pretensões formativas.

A história demonstra que os convênios estabelecidos entre es-colas da SEDU/ES (Escolas Estadual e Arnulpho Mattos) e ETFES (hoje CEFETES) nos anos de 1976, 1983, 1984, 1985, 1987, 1988, 1990 e 1996 repetiram aranjos pedagógicos justapostos. Cada lado do convênio ETFES e SEDU assumia tarefas obrigações de maneira seqüenciadas sem um projeto pedagógico unificado. E é possível perceber que as vagas eram uma deliberação condescendente do nível federal para o nível estadual. Pelo menos é o que fica patente no Ofício nº 008 do dia 8/1/88, onde o diretor de ensino da ETFES (Herbert Barbosa

4 Isso só vai mudar um pouco quando elas vão perceber que a profissionalização do 2208/97 se tornou um filão de mercado, o que só comprova o interesse dos alunos por esta modalidade ensino.

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Carneiro) informa que

a ETFES não ofertará vagas no ano que segue para a es-cola de Arnulpho Mattos nos cursos de Mecânica e Ele-trotécnica em face de mudanças das grades curriculares.

Isso fica muito claro no ofício enviado por Roberto Sergio Ser-vino em 19/1/90, então chefe de departamento de ensino, que dizia:

Vimos pelo presente informar a V.Sa. que cabe a ETFES de acordo com a cláusula terceira do convênio ETFES/SEDU-ES se pronunciar quanto ao número de vagas. Isto posto, como, até o momento, tal fato não ocorreu, é de se presumir, que a ETFES não tem vagas a oferecer.

Em Ofício de 26/5/1998 fica claro o pouco interesse da ETFES em manter ou renovar o convênio com a SEDU/ES. São termos do Ofício citado:

[...] informamos da impossibilidade do atendimento en-tre outras coisas porque a grade do curso de Eletrotécni-ca está em extinção em função do Decreto nº 2.208, por estar o convênio entre SEDU e ETFES com o prazo venci-do desde março de 1998. E que, por estar passando por um processo de eleição de Diretor, isso acarreta o máxi-mo de prudência na condução de ações não amparadas.

Mas não era só a ETFES que iniciava os convênios sem muita von-tade de mantê-los; o SENAI, em 15 de agosto de 1997, no Centro Técni-co de Instrumentação Industrial “Arivaldo Fontes” recusou-se em con-tinuar com essa prática e disse, na pessoa do Diretor Robson Cardoso:

[...] considerando a crescente demanda da empresa e comunidade pelos cursos especiais oferecidos por este centro técnico e a implantação do curso técnico noturno de instrumentação industrial, neste semestre, a continui-dade do uso de nossas dependências pelos seus alunos.

Como podemos observar, a história recente documentada, en-tre 1976 e 1998, processos de justaposição em que convênios firma-dos entre SEDU-ES e outras instituições [ETFES e Sistema S (Senai, Senac, Sebrae, Senar)] não funcionaram adequadamente, embora a legislação não resolvesse a questão. A partir daí foram elaboradas as diretrizes curriculares da educação profissional, consolidando a legis-lação básica para essa modalidade de ensino (Parecer n° 16 e Reso-lução n°04 do CNE). Para implantar a reforma do ensino profissional no País o MEC aprovou o Programa de Expansão da Educação Profis-sional (PROEP), oficialmente lançado em março de 1998, com o apoio financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e com a parceria de outros organismos internacionais.

Visando à implantação dessa reforma no Espírito Santo, no pri-meiro governo Paulo Hartung, algumas ações foram desenvolvidas a partir de 1999, quais sejam: a) elaboração do Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Médio (PEM) e do Plano Estadual de Educação Profissional (PEP), em convênio com a UNESCO, por meio das quais

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foram definidas as diretrizes para a educação profissional no Espírito Santo, o que incluiu a realização de seminários estaduais, regionais e locais para discutir as políticas a serem implementadas; b) aprova-ção do PEP e assinatura de convênio com o MEC para a construção de sete centros de referência de educação profissional, em diferentes municípios e regiões, de acordo com as vocações econômicas iden-tificadas por estudo e diagnóstico técnico; c) publicação da Portaria 502/98 vedando às escolas de ensino médio e de educação profissio-nal a abertura de novas turmas e efetivação de matrículas novas para a primeira série dos cursos profissionalizantes nos termos da Lei nº 5.692/71 (extinta); d) desativação gradativa das escolas onde seriam instalados os futuros centros de referência de educação profissional, o que só se realizou na Escola Estadual de Ensino Médio “Vasco Cou-tinho”; e) elaboração dos projetos arquitetônicos para os centros de referência, priorizando os municípios de Vila Velha e Colatina e d) Edição no Conselho Estadual de Educação da Resolução n° 29/2000, que normatiza as diretrizes curriculares da educação profissional do sistema estadual de ensino.

No entanto, apesar dessas medidas, muitas dificuldades foram enfrentadas pela Secretaria de Estado da Educação (SEDU) para a formalização de parcerias e convênios, especialmente aqueles que envolviam a liberação de recursos como contrapartida, possivelmen-te pela crise política instalada no Estado que já se tornava pública. Além disso, nos anos de 2001 e 2002, o PROEP experimentou uma continuada paralisia decisória referente principalmente à definição do modelo de gestão e à contratação de serviços para a construção e/ou reforma dos centros de referência.

Até 2006, tais pretensões não se verificaram durante as gestões dos secretários estaduais de educação José Eugênio Vieira e Weling-ton Coimbra, sendo retomadas no segundo governo Paulo Hartung, na gestão de Haroldo Correa Rocha na SEDU.

A partir de 2009, então o Governo Estadual, retoma em novos moldes suas pretensões de ofertar educação profissional de nível médio eencomenda a formulação de um novo PEP para 2010.

2.2. JustificativaO governo estadual na perspectiva de gerar um desenvolvi-

mento econômico viável, socialmente inclusivo e ambientalmente sustentável, tem como meta incluir toda a sociedade capixaba nas oportunidades econômicas geradas pela terceira onda de desenvol-vimento da economia capixaba.

Nesse sentido, desde 2005, a SEDU (Secretaria de Estado da Educação), dentro do escopo nacional de ampliação da oferta de educação profissional, passou a oferecer essa modalidade de edu-cação, organizada em quatro diferentes tipos de oportunidades formativas: a) Educação Profissional, em escolas de Ensino Médio, com a oferta de modalidade subseqüente para fins de atendimen-to às demandas imediatas e sazonais das comunidades; b) criação e implantação de CEETs (Centros Estaduais de Educação Técnica) para

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atender por meio da Modalidade subseqüente, utilizando estruturas complexas de laboratórios e equipamentos; c) Ensino Médio Integra-do - conveniado com o MEC em que os alunos cursam o Ensino Mé-dio Integrado à Educação Profissional durante quatro anos e d) oferta da Bolsa SEDU que consiste na concessão de bolsas em instituições cadastradas para cursos na área industrial.

Em 2007, estavam matriculados 10.102 alunos em cursos nas áreas de Gestão, Agropecuária, Turismo, Informática, Saúde, Meio Ambiente, Comércio, Comunicação, Secretariado Escolar, Mineração e Construção Civil. Esses números são considerados como insuficien-tes para dar conta dessa nova etapa da economia capixaba, e a Edu-cação Profissional passou a ser vista como política pública prioritária para uma viabilidade social do crescimento da economia capixaba. Desse modo, a Educação Profissional tornou-se uma diretriz gover-namental, figurando entre os dezesseis projetos prioritários do Go-verno do Estado para o período 2007-2010 e compondo, no Plano Estratégico denominado “Nova Escola”, um dos projetos estruturan-tes do Governo Estadual.

O objetivo central deste debate é orientar o aumento da ofer-ta da Educação Profissional, a fim de garantir que os cursos técnicos tenham qualidade e estejam voltados para o desenvolvimento das potencialidades econômicas do Espírito Santo. Para concretizar o projeto de expansão dessa modalidade de educação e assim modifi-car a fisionomia da Educação Profissional nos próximos anos, a fim de incluir os capixabas nas inúmeras oportunidades econômicas gera-das pela nova etapa de desenvolvimento do Espírito Santo, o gover-no estadual destinará o montante de R$ 49.535.749,00. Trata-se de uma estimativa inicial que certamente deverá ser redimensionada, levando-se em conta os custos decorrentes da nova estrutura edu-cativa necessária, tanto no Ensino Médio quanto no Ensino Técnico, para formar os novos profissionais locais que construirão o futuro do Espírito Santo.

2.3. Referencial TeóricoDe modo geral, cremos que à educação deve servir a economia

e que a escola deve preparar as pessoas, sobretudo os jovens, para se inserirem na vida produtiva. Mas os horizontes do processo educati-vo vão muito além do emprego. A educação visa à formação humana, o que inclui, é claro, o trabalho e a participação na vida econômica. A Educação coloca-se para o indivíduo como instrumento mediato e não imediato, isto é, consiste numa mediação para a inserção na vida produtiva e para a construção da cidadania, transformando-se, portanto, numa conquista de direito do indivíduo. Por isso é neces-sário não subordinar o processo educativo ao processo econômico, sob pena de submeter o homem à produção e não a produção ao homem. Mais do que isso, fazer uma educação como efeito reflexo do mercado é também não atender as demandas de médio e longo prazo. E educar é sempre educar para o amanhã.

A transmissão do conhecimento faz-se necessária porque do

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processo produtivo resultam não apenas novos objetos, mas tam-bém novos conhecimentos, que precisam ser apropriados pelas no-vas gerações. Mas essas novas gerações não são reféns desses sabe-res. Elas próprias são produtoras de novos saberes, e este talvez seja o principal papel da educação: transformar as novas gerações em sujeitos do conhecimento.

O cidadão deve ser o sujeito do trabalho e, para tanto, deve ser o sujeito do conhecimento. O trabalho e o conhecimento estão inti-mamente ligados à atividade laboral do gênero humano. O trabalho e o gênero humano co-produzem-se reciprocamente no trabalhador. Ao produzir, o homem gera um novo homem que produzirá novas tecnologias, novos saberes e novos processos produtivos. Desse modo, o fazer do homem é o seu auto-fazer-se. Isso porque a pro-dução estabelece uma relação ontológica do homem com os seus produtos. O trabalho estabelece uma relação ontológica do homem com a natureza, na qual fazer e conhecer são imbricados e simultâ-neos. É isso que estrutura a objetivação humana e caracteriza a práxis do gênero humano, pois a realização de um trabalho é também uma forma de aprendizagem e de produção de conhecimento, mas, so-bretudo, a produção de um novo homem. Portanto, uma educação deve sempre ter em mente a formação de um produtor não só de coisas, mas principalmente de novos saberes tecnológicos e produti-vos, o que corrobora a densa e complexa interligação entre educação e economia.

Nos anos de 1970, na época da divulgação na América Latina da Teoria do Capital Humano, foi muito comum a associação entre crescimento econômico e construção de escolas. Isso significa que há uma relação entre investimento em educação e desenvolvimen-to econômico? Segundo um dos grandes especialistas na matéria, é possível afirmar que, se

[...] controlarmos, estatisticamente, os efeitos do “status” familiar e da inteligência sobre o nível de renda, podem ocorrer taxas de retorno consideráveis à educação, e que, no caso dos indivíduos considerados como educá-veis, a educação se torna a chave da mobilidade social e também a maneira mais eficiente de aumentar a produ-tividade do trabalho (CASTRO, 1976, p. 32).

Outros autores, como Rossi (1980) e Ferreti (1988), no entan-to, vão polemizar essa funcionalidade da educação no percurso dos indivíduos ao afirmar que o ambiente familiar, as habilidades cogni-tivas, as aquisições educacionais e o status ocupacional são insufi-cientes para justificar as variações nas rendas dos indivíduos, o que é importante para o trabalhador como classe social, já que a via educa-cional se mostra inadequada à explicação do processo de obtenção de maior igualdade social e que o alcance dessas formulações estaria no indivíduo e não na categoria de “classe”.

Ou seja, a mobilidade social, quando muito, reduz-se ao plano dos indivíduos, sem observar, fundamentalmente, as estruturas de classes sociais. Além disso, reforça a ideologia dominante de que, se

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os indivíduos se empenharem em estudar, podem ter esperanças na obtenção de avanços na escala social.

A Teoria do Capital Humano apresenta vários limi-tes, permanece na superfície dos fenômenos, pro-duzindo uma inversão na relação de causa e efeito, pois há casos em que o crescimento econômico é que gera o investimento em educação e não o contrário (MACHADO, 1982, p.127).

O economista Cláudio Salm (1980), em Escola e Trabalho, diz que as empresas, no curto prazo, não precisam das escolas: elas mes-mas podem treinar o seu pessoal e com isso aumentar sua produtivi-dade. Mas é Gaudêncio Frigotto (1984), em A Produtividade da Escola Improdutiva, que afirmar que a escola é uma mediação que interfere de modo não direto na relação entre investimento e desenvolvimen-to. A mediação (em questão) dá-se pelo fornecimento de um saber geral, que se articula com o específico e o prático, um saber que se desenvolve no interior do processo produtivo. Além disso, mediante a dotação de traços de comportamentos dominantes e convergentes com a lógica aquisitiva, acumulativa, dócil e individualista, necessá-ria ao capital, restabelece-se um vínculo não imediato, mas mediato, com a produção material, o que é reiterado, em outros termos, por Acácia Z. Kuenzer (1992), em A Pedagogia da Fábrica. Kuenzer foi ao setor produtivo e constatou que os saberes tácitos eram de impor-tância relevante para a produção, e que a escola desempenhava inú-meros papéis dentro do sistema produtivo, dentre os quais a função de legitimadora das posições na divisão interna do trabalho.

Haveria, entre economia e educação, a primazia do vínculo me-diato da educação, em relação ao vínculo imediato, com o processo produtivo, de modo que o primeiro diria respeito a objetivos mais amplos e de longo prazo, enquanto o segundo estaria mais afeito a objetivos específicos e de curto prazo. Portanto, tendo em vista as especificidades do processo de formação humana, seria o vínculo mediato capaz de fornecer maior densidade educativa do que o vín-culo imediato. Está claro que um modelo educativo se traduz numa opção pela formação humana, e o outro, pela formação do capital. Além disso, a educação, que é imediatamente improdutiva para o ca-pital, pode ser mediatamente produtiva, tornando-se mais produtiva no sentido mais no longo prazo. Simplificando, ao máximo, quase no limite dos conceitos aqui utilizados, poderíamos dizer que o vínculo indireto pode tornar-se qualitativamente mais direto do que o vín-culo que recebe esse nome. Nesse sentido, o melhor jeito de formar para a realidade do trabalhador não é formar os alunos, relacionan-do-os imediatamente com o mercado; é fazer isso de modo mediato, não imediato, de maneira indireta; formá-los, no caso, com os funda-mentos técnico-científicos da tecnologia e não apenas para o uso da tecnologia que se apresenta nesse instante, pois o melhor modo de errar um alvo que é móvel é considerá-lo como fixo e instantâneo, descolado de sua historicidade técnico-cultural.

Desse modo, estratégias imediatistas tendem a descolar a for-

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mação profissional da escolarização mais abrangente, constituindo um enorme equívoco, pois uma ação mediadora competente pode ser mais eficiente que uma conexão direta e utilitarista entre edu-cação e produção, e isto quer dizer que a leitura daquilo que é útil e do que é inútil no processo educativo para a produção pode compor o mesmo currículo de uma escola que eleja o homem como o seu objetivo e objeto de formação. Além da utilidade ou inutilidade, um saber pode variar no tempo e no espaço, Há entre essas dimensões articulações recíprocas bastante complexas, pouco perceptíveis ao olho nu do economicismo.

2.4. Base Legal: mudanças legais e conceituiais da Educação Profissional (do Decreto nº 2208 / 97 ao Decreto nº 5154 / 2004)

2.4.A - Governos FHC (Fernando Henrique Cardoso)Durante os mandatos do presidente FHC, o Governo passou

a se desfazer das conquistas que vinham, desde os anos de 1940 e 1950, ampliando o direito de acesso à Formação Profissional, no ní-vel médio. Mais especificamente, no que diz respeito à educação e à Formação Profissional, a conseqüência foi o redirecionamento das políticas públicas – que, desde os anos de 1940 aos de 1970, se de-senvolveram na direção de conquistas progressivas no grau de uni-versalidade do acesso à educação em todos os níveis – no sentido da eqüidade que, em última instância, tentou generalizar níveis de educação mais sustentáveis (leia-se mais baratos, mais rápidos e mais rentáveis), portanto, menos seletivos. Essas ações constituíram-se num retrocesso no campo das políticas públicas, que caminhou, des-de meados do século XX, no sentido da universalização do direito à educação, da maior integração entre teoria e prática e da articulação do nível médio com os demais níveis de ensino.

Nesse sentido, os governos neoliberais, na sua busca incessan-te de enxugamento dos custos com políticas públicas, inclusive no setor educacional, atacaram os nichos de maior drenagem de recur-sos, quebrando assim o ciclo histórico de investimento, estabelecen-do uma nova etapa da história da rede das escolas técnicas, promo-vendo rupturas na sua gestão, na sua identidade bem como no seu funcionamento e, por conseqüência, mas não por contingência, nos seus custos.

Essas mudanças articularam-se aos mecanismos da racionali-dade financeira que, entre outras coisas, promovia o movimento de des-keyneisação da economia e da sociedade como um todo, servin-do, na prática, aos propósitos de diminuição de custos gerais do Es-tado com a reprodução da força de trabalho. Além disso, essas idéias mantinham coerência com a baixa inclusão ocupacional do estágio atual do processo produtivo, visível na progressiva redução do nú-mero de empregos. Embora viessem a ser propostas sob o discurso modernizante, não mantinham muita coerência com o processo de

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des-taylorização do processo de trabalho, que exigia maior inter-relação entre teoria-prática preconizada pela politecnia, cujas expe-riências mais importantes estavam no modelo integrado de ensino profissional praticado no âmbito das ETFs.

Como se pode notar, apesar do discurso modernizante, essas ações no campo educativo, típicas do padrão da acumulação flexí-vel, também, retomaram a concepção taylorista-fordista, que supõe a ruptura entre o saber acadêmico e o saber para o trabalho, o que reinventa 5 a dualidade estrutural, tal como ocorria antes de 1961, e deteriora a equivalência, negando muitos dos avanços ocorridos nas legislações de 1961 e 1971, que buscaram a construção de modelos pedagógicos mais integrados (KUENZER, 1999).

Sob o pretexto da valorização do sistema de formação profis-sional brasileiro e com o discurso da necessidade da elevação do seu status e modificação do seu papel no novo contexto de revolução tecnológica, realizou-se a reforma do ensino profissional no País. Em que pesem as justificativas e sua sustentação ideológica, o funciona-mento da EP engrenou-se na lógica do Estado de que se deve gastar menos com soberania tecnológica e mais com solvência financeira. Alvo privilegiado para redução de custos do Estado, numa perspec-tiva de piora ou diminuição dos processos de apropriação de novos padrões de TSNP6 (tempos socialmente necessários de produção) de mercadorias, foi a rede de escolas técnicas federais que, uma vez to-madas como perdulárias, seletivas e defasadas tecnologicamente, fo-ram transformadas em modelos de auto-sustentabilidade do Estado gestor. No entanto, a ilusória valorização dessa rede de escolas téc-nicas, supostamente viabilizada pela tentativa de ampliação de seu alcance em termos tanto de clientela quanto de modalidades de en-sino e escolaridade relativa, caracterizada, no governo Sarney, pelo Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Técnico em 1985/89, no governo Collor, pelo Programa Brasileiro de Qualidade e Produtivi-dade, e, no governo de Itamar Franco, pela tentativa de instituir o Sistema Nacional de Educação Tecnológica e de transformar as ETFs em CEFETs, ou pelo Decreto n.º 2.208/97 e pela criação da SEMTEC, no governo de FHC, não atingiu o objetivo de manter e melhorar a qualidade da Educação Profissional do País.

As ETFs foram transformadas em CEFETs. Essas iniciativas não são gratuitas; dizem respeito a propostas pedagógicas distintas, além de refletir momentos históricos diferentes, bem como contex-tos técnico-produtivos e políticos muito específicos. Cada modelo pedagógico praticado por essas instituições educativas decorre, em grande medida, do tipo de papel exercido pelas instâncias de poder na mediação entre os processos produtivos e os educativos.

O ponto de partida de todo esse processo que demarcou a nova fase do sistema brasileiro de reprodução da força de trabalho

5 Este termo está sendo usado no sentido de que a história não se repete, portanto, a dualidade é rein-ventada pela legislação da reforma, e não repetida. Vale também ressaltar que essa idéia está sujeita a várias interpretações, mas aqui nossa opção de análise se coaduna com a perspectiva de Kuenzer (1999).6 Ver tese de Lima (2004).

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está na promulgação da Lei Federal n.º 8.948 de 1994, que dispõe so-bre a instituição do Sistema Nacional de Educação Tecnológica, bem como dos instrumentos normativos dela decorrentes, criados para a sua regulamentação, aplicação e transição, como o “Decreto-Lei n.º 2.406 de 1997, o Decreto n.º 3.462 de 2000, o Decreto-Lei n.º 3.741 de 2001, as Portarias do MEC 646 de1997, 1.005 de 1997 e 1.647 de 1999, além da Portaria do MEC e MTb n.º 1.018 de 1997” (NEY, 2001, p. 24-25). Vale lembrar que no período que vai da criação do Serviço de Remodelação do Ensino Industrial nos anos de 1930, até a criação da SEMTEC nos anos de 1990, é possível perceber que, nas vezes em que ocorreram mudanças substanciais na história dessa modalidade de ensino, uma nova institucionalidade lhe foi conferida e uma nova posição na estrutura do Estado foi por ele assumida. Por isso a Lei Federal n.º 8.948 assumiu essa importância, pois sinalizou, como em outros momentos da história, que o sistema de formação profissional brasileiro se tornara instrumento de política não só educacional, mas também econômica, seja pelo que fazia, seja pelo que deixava de fa-zer nos cursos que oferecia.

Em 1994, a rede de escolas técnicas basicamente oferecia cur-sos de Ensino Médio e Técnico integrado de reconhecida qualidade, ainda sob orientação do Parecer n.º 45/72, do CFE, com mais de trinta anos de vigência. Mas, a partir daí, as conseqüências mais intensas do movimento mais amplo de reorganização do processo de acumu-lação começaram a gerar a desestatização das práticas educativas, processo que se tornou mais explícito em maio de 1995, quando o primeiro governo de FHC,

[...] por meio do seu planejamento político-estratégico para o período 1995/1998, já sinalizava e necessida-de e intenção de separar a parte profissional da parte acadêmica do sistema técnico de educação, o que se pode verificar na mensagem enviada pela Secretaria de Educação Média e Tecnológica aos diretores das escolas técnicas da rede federal, em agosto de 1995 (CUNHA, 2000, p. 252).

Essa mensagem, enviada aos diretores das escolas da rede pú-blica de Formação Profissional, destacava o princípio da dissociação entre o Ensino Médio e Profissional, corroborando aquilo que foi ga-rantido pela Lei n.º 9.394 de 1996, e pelo Decreto-Lei n.º 2.208 de 1997. Nessa mesma direção e para viabilizar a aprovação do Projeto de Lei n.º 1.603, em sua exposição de motivos n.º 37 o então ministro Paulo Renato Souza afirmou, entre outras coisas, que esse ramo de ensino deveria ter uma nova estrutura e compor-se de três níveis: o básico, o técnico e o superior, o que mudaria, ainda em tese, o papel das escolas, diversificando tanto a modalidade de ensino quanto a clientela.

No fim de 1996, foi promulgada a nova LDBEN, Lei n.º 9.394, que, depois de quatro meses, foi seguida pelo Decreto-Lei n.º 2.208 de 1997, compondo assim os principais instrumentos normativos das transformações do sistema de formação profissional brasileiro,

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cujos objetivos se afinavam ao processo de diminuição dos custos com a reprodução da força de trabalho. Para cumprir de modo mais efetivo a diminuição dos gastos e atingir o objetivo de aumento da produtividade da rede de escolas técnicas,

[...] foi baixada a Portaria Ministerial n.º 646 do MEC, de 14 de maio de 1997, que regulamenta a implantação do disposto nos artigos 39 a 42 da nova LDB, no sentido de radicalizar ainda mais a separação entre ensino médio, chamado “acadêmico”, onde as escolas técnicas pode-riam, no máximo, oferecer a metade de vagas de 1997 para o ensino médio e cada escola deveria aumentar, em cinco anos, em 50%, o número de vagas oferecidas nos cursos técnicos e médios (CUNHA, 2000, p. 255).

O saldo desse processo está numa progressiva (e lesiva) vincu-lação entre os processos produtivos e educativos, no sentido da mer-cantilização do processo de formação profissional.

2.4.B - Governo LulaAinda no primeiro mandato do governo Lula, mais especifica-

mente em 2004, o novo contexto político estadual e nacional e as intensas discussões sobre as questões relativas à Educação Profissio-nal e sua relação com o mundo do trabalho pressionaram o Governo Federal para uma alteração nas disposições legais. Foi promulgado o Decreto nº 5.154 de 2004, que regulamentou os artigos da LDBEN referentes à relação do Ensino Médio com a Educação Profissional Técnica. Com essa legislação, o aluno poderia fazer, de forma inte-grada, o Ensino Médio e o Ensino Técnico, respeitadas as respectivas diretrizes curriculares nacionais.

Essa nova proposta opõe-se à desvinculação teoria–prática da antiga LDBEN e pretende resgatar os vínculos entre SABER, FAZER E SER, constitutivos de uma prática educativa cidadã. Dessa forma, para elaborar uma proposta de Ensino Médio integrado 7 à formação técnica, nesse mesmo nível de ensino, devemos ressaltar os víncu-los entre os campos da formação geral e da formação específica, da ciência e do trabalho, da teoria e da prática. Mas esses vínculos não precisam ser fabricados numa espécie de montagem ou justaposição teoria + prática, formação geral + formação específica, ou ciência + trabalho, como se eles já não existissem. Na verdade, não é neces-sário estabelecer esses vínculos. Eles já existem e são inerentes ao processo de objetivação humana que eclode das necessidades gera-doras do impulso teleológico-cognoscente da consciência humana, que plasma na matéria-prima os objetos de uso humano. Portanto a indissociabilidade, a unidade, a unitariedade entre a ação e o saber-intenção fazem parte do movimento de produção (e autoprodução) da existência humana.

Assim, as formas históricas de divisão e subdivisão do trabalho e os processos de profissionalização buscaram definir-se, distancian-

7 O dicionário indica-nos que integração decorre do ato ou efeito de integrar. Diz-se [também] de cada uma das partes de um todo que se completam ou se complementam. [ou ainda se pode dizer daquilo que se ] torna inteiro [ou do que se pode] juntar ou incorporar (FERREIRA, 1980, p. 1.123).

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do-se epistemologicamente em campos distintos de atuação. O en-sino, na sua vertente histórica mais profissionalizante, orientou-se no Brasil numa noção de trabalho, cujos conteúdos práticos e teóricos e cuja metodologia (à luz dos ideais psicotécnicos de Roberto Mange 8) se baseavam na análise ocupacional.

As identidades profissionais derivadas dessa percepção da ati-vidade produtiva no âmbito do capital e suas formas de ensino cor-relatas não cindiram o processo de objetivação humana. O trabalho, sob a égide da análise ocupacional (leitura taylorista da atividade produtiva), foi decomposto em fragmentos, num processo analítico de esgarçamento da totalidade que o constitui, síntese da autopro-dução humana. A perspectiva de trabalho que não vai à sua essência, que o vê como mero fenômeno, naturaliza uma cisão que nunca hou-ve e toma-o como absoluta alienação. A formação profissional que se fragmenta dissocia no abstrato aquilo que na prática é unitário.

Nesse sentido, propor uma formação que perceba esses cam-pos, dicotomizados pelo processo histórico de trabalho e de ensino no âmbito do capitalismo, como partes aproximadas, justapostas, in-terligadas, unificadas, integradas, articuladas ou orgânicas, não é um exercício de abstração, mas um processo de captação da concretici-dade do trabalho. Esse processo viabiliza-se na busca do trabalho na condição de totalidade histórica eivada de saberes objetivados, de teorias praticadas, de intenções realizadas e de ciências materializa-das, numa relação parte com parte, que se coagula reciprocamente no todo.

Portanto, se superarmos a propalada análise ocupacional (pon-to de partida histórico para a constituição dos currículos formativos das áreas técnicas) e construirmos uma releitura dialética do proces-so de objetivação humana, perceberemos o afastamento teoria–prá-tica como produto da alienação humana no processo de produção que rebateu, por conseqüência, no processo de ensino.

Assim, não cabe à profissionalização que se pretende integrada uma reunificação das partes decompostas do fazer humano como síncrese9 (ajuntamento), e sim como síntese 10(fusão), para que o mo-vimento de integração que constituirá o novo currículo não redunde em fórmulas do tipo 3 + 1 ou 2 + 2, típicos do esquema teoria + práti-ca, formação geral + formação específica ou ciência + trabalho.

Cada parte do currículo deve ganhar sua identidade na sua rela-ção com o todo educativo, que é a EPTN (Educação Profissional Técnica Integrada ao Ensino Médio). Para tanto, devemos superar a mecanicida-de típica das justaposições de conteúdos estanques e desarticulados. O princípio de continuidade dialética parte-parte e parte-todo deve presi-dir o currículo, cujas etapas se conectam reciprocamente no movimento

8 Grande intelectual hegemônico do processo de industrialização, bastante influente nas instituições de formação profissional no Brasil.9 Sincretismo é uma tendência de unificação de idéias e doutrinas diversificadas e, por vezes, até mes-mo irreconciliáveis, [também pode ser tomado como] amálgama de doutrinas ou concepções hetero-gêneas, fusão de elementos culturais diferentes, ou até mesmo antagônicos, em um só elemento[...] (FERREIRA, 1980 , p. 1.859).10 Segundo Japiassu e Marcondes (1995, p. 225), síntese é o ato de reunir ou combinar em um todo elementos dados separadamente; [ou ainda] é o momento de fusão e de superação.

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ontológico de produção e autoprodução humana.Um passo nessa direção talvez seja abandonar os dualismos

institucionalizados pelo Decreto nº 2.208/97, caminharmos no senti-do de resgatar aquilo que aponta o novo Decreto, a fim de construir um novo projeto político-pedagógico que reconstrua democratica-mente, com a participação de toda comunidade escolar, essa nova possibilidade histórica de des-alienação do processo de formação humana.

O Decreto nº 5.154 de 2004, no seu artigo 4º, estabelece:

A educação profissional técnica de nível médio [...] será desenvolvida de forma articulada com o ensino médio [...]. Parágrafo 1º A articulação entre a educação pro-fissional técnica de nível médio e o ensino médio dar-se-á de forma: I - Integrada [...] na mesma instituição de ensino, contando com matrícula única; II – Concomi-tante, na qual a complementaridade entre a educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio pressupõem a existência de matrículas distintas para cada curso, podendo ocorrer: a) na mesma instituição [...]; b) em instituições de ensino distintas [...] ou c) em instituições de ensino distintas, mediante convênios de intercomplementaridade, visando ao planejamento e ao desenvolvimento de projetos pedagógicos unificados; III – Subseqüente, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino médio.

Muitas são, portanto, as formas de des-fragmentação da forma-ção humana nessa nova institucionalidade, e elas podem ser deno-minadas (do ponto de vista conceitual) de justapostas, interligadas, unificadas, integradas, articuladas ou orgânicas. Cada uma delas apresenta suas especificidades, que precisam ser elucidadas, sob pena de se tornarem meros eufemismos dos esforços praticados no sentido de des-dicotomizar teoria - prática, formação geral - forma-ção específica ou ciência - trabalho.

2.4.C - Distribuição das Cargas Horárias Com novo marco regulatório constituído pelas normatizações

constantes na Lei Nº 9.394/96 (LDBEN), no Parecer CNE/CEB Nº 15/98, na Resolução CNE/CEB Nº 3/98 (EM), no Parecer CNE/CEB Nº 16/99, na Resolução CNE/CEB Nº 4/99 (EPTNM), no Parecer CNE/CEB Nº 11/00, na Resolução CNE/CEB Nº 1/00 (EJA), no Decreto Nº 5.154/04, no Pa-recer CNE/CEB Nº 39/04, no Parecer Nº CNE/CEB nº 39/04 e na Reso-lução CNE – CEB Nº 01/05, estabeleceu-se, entre outras coisas, um total de carga horária que varia em função número de horas inerente à parte técnica.

Desse modo, os cursos de EPTNM realizados de forma integrada com o Ensino Médio terão suas cargas horárias totais ampliadas para:

a) 3.000 horas, no caso das habilitações profissionais que exi-gem um mínimo de 800 horas, entre as quais, de acordo com Catálo-go Nacional de Cursos produzido pela SEMTEC, se enquadram os cur-sos técnicos Aeroportuário, Agenciamento de Viagens, Arte Circense, Arte Dramática, Artes Visuais, Artesanato, Biblioteconomia, Canto,

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Composição e Arranjo, Comunicação Visual, Confeitaria, Conserva-ção e Restauro, Contabilidade, Controle Ambiental, Cooperativismo, Cozinha, Dança, Design de Calçados, Design de Embalagens, Design de Interiores, Design de Jóias, Design de Móveis, Documentação Musical, Eventos, Fabricação de Instrumentos Musicais, Guiamento, Hospedagem, Instrumento Musical, Lazer, Manutenção de Aerona-ves, Manutenção Metro-Ferroviária, Meio Ambiente, Modelagem do Vestuário, Multimídia, Operações Administrativas, Operações Co-merciais, Operações de Comércio Exterior, Operações de Marketing, Operações Financeiras, Operações Logísticas, Paisagismo, Panifica-ção, Processos Fotográficos, Produção de Áudio e Vídeo, Produção de Moda, Publicidade, Qualidade, Rádio e Televisão, Recursos Humanos, Regência, Secretariado, Serviços Condominiais, Serviços de Restau-rante e Bar, Serviços Públicos, Transações Imobiliárias, Trânsito, Trans-porte Aquaviário, Transporte de Cargas, Dutoviário, Transporte Rodo-viário e Vendas;

b) 3.100 horas, no caso das habilitações profissionais que exi-gem um mínimo de 1.000 horas, entre as quais, de acordo com Catá-logo Nacional de Cursos produzido pela SEMTEC, se enquadram os cursos técnicos em Geodésia e Cartografia, Geomensura, Geoproces-samento, Informática, Informática para Internet, Manutenção e Su-porte em Informática, Meteorologia, Pesca, Processamento de Pes-cado, Produção Aqüícola, Programação de Jogos Digitais, Recursos Pesqueiros e Redes Locais;

c) 3.200 horas, no caso das habilitações profissionais que exi-gem um mínimo de 1.200 horas, entre as quais, de acordo com Catá-logo Nacional de Cursos produzido pela SEMTEC, se enquadram os cursos técnicos em Açúcar e Álcool, Agente Comunitário de Saúde, Agricultura, Agroecologia, Agroindústria, Agronegócio, Agropecuá-ria, Alimentação Escolar, Alimentos, Análises Clínicas, Análises Quími-cas, Apicultura, Automação Industrial, Biocombustíveis, Biotecnolo-gia, Calçados, Celulose e Papel, Cerâmica, Cervejaria, Citopatologia, Construção Naval, Curtimento e Couro, Desenho de Construção Ci-vil, Edificações, Eletroeletrônica, Eletromecânica, Eletrônica, Eletro-técnica, Enfermagem, Equipamentos Biomédicos, Estética, Estradas, Fabricação Mecânica, Farmácia, Geologia, Gerência de Saúde, He-moterapia, Hidrologia, Higiene Dental, Imobilizações Ortopédicas, Impressão Gráfica, Impressão Offset, Infra-Estrutura Escolar, Manu-tenção Automotiva, Massoterapia, Mecânica, Mecatrônica, Metalur-gia, Mineração, Móveis, Multimeios Didáticos, Nutrição e Dietética, Óptica, Petróleo e Gás, Petroquímica, Plásticos, Podologia, Pré-im-pressão Gráfica, Prótese Dentária, Química, Radiologia, Reabilitação de Dependentes Químicos, Refrigeração e Climatização, Registros de Saúde, Saneamento, Secretaria Escolar, Segurança do Trabalho, Sis-temas a Gás, Sistemas de Comutação, Sistemas de Transmissão, Te-celagem, Telecomunicações, Terapias Integrativas e Complementa-res, Vestuário, Vigilância em Saúde, Visagismo, Viticultura e Enologia, Zootecnia, Florestal e Recursos Minerais.

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2.4.D - Princípios Orientadores da Oferta e Estrutura da Educa-ção Profissional

Entendemos que o quadro institucional, tanto público quan-to privado que hoje atua na Educação Profissional deve constituir-se no ponto de partida para definição dos cursos a serem ofertados nas escolas estaduais. Além disso, a escolarização não deve ser vista descolada da educação profissional, de sorte que ambas precisam integrar-se na estratégia gerar novas e melhores oportunidades de inclusão ocupacional para jovens capixabas de todas as cidades do Espírito Santo para todos os setores da economia local, dos mais simples para os mais complexos, entrecortando grandes e pequenas empresas de setores tradicionais e mais recentes.

1º Princípio – Sustentabilidade da Demanda Econômica e SocialÉ muito importante que a oferta de cursos esteja em sintonia

com as necessidades reais da economia e da comunidade locais e que essas necessidades não sejam efêmeras, isto é, que os setores econômicos tenham capacidade de se manter, pelo menos no médio prazo, como demandadores de força de trabalho em nível técnico. E, mais, que a população a ser atendida queira e esteja em condições de usufruir e participar, matriculando os seus jovens como futuros educandos dos cursos.

Nesse aspecto, ganha destaque a oferta de ensino médio de qualidade nas proximidades das moradias dos alunos, que é a maior demanda econômica e social do Espírito Santo, além, é claro, do chamado ensino médio integrado, que deverá ser o modelo mais adequado de se ofertar qualificação e escolarização de modo arti-culado. Isso, certamente, não só representará enorme demanda por parte dos jovens como também tornará irrisórias as taxas de evasão, haja vista que esse modelo supre tanto o propósito da continuidade quanto o princípio da terminalidade inerentes ao ensino médio.

2º Princípio – Garantia da Oferta PúblicaA oferta pública de ensino médio-técnico deve impor-se à ofer-

ta privada de modo a democratizar as oportunidades de aprendiza-gem tecnológica, sobretudo para aqueles que mais precisam, tanto porque dispõem de poucas condições de obter sucesso no processo seletivo para ingresso numa instituição pública de ensino superior e não podem custear uma instituição particular quanto porque preci-sam ingressar o mais cedo possível no mercado de trabalho.

Essa questão não é de responsabilidade exclusiva da rede esta-dual, podendo também ser suprida pela rede federal. Por outro lado não é resolvida apenas pela via direta, uma vez que poder ser atendi-da por meio de subsídios a setores que recebem recursos do Estado para fins de prover a Educação Profissional.

3º Princípio – Intercomplentaridade Territorial, Setorial e Inte-rinstitucional

A oferta de educação profissional de nível médio deve ter em

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mente o arranjo institucional existente no estado do Espírito Santo. Vários são os aspectos a analisar para definição não só dos cursos, mas também de sua localização. Inicialmente é preciso levar em con-ta todos os setores da economia capixaba, destacando as atividades mais intensas em uso de mão-de-obra técnica.

O setores secundário, primário e terciário têm especificidades no que diz respeito a relação entre oferta e demanda (econômica e social) de Educação Profissional. O setor primário, por exemplo, dis-põe de algumas ofertas de educação profissional de natureza pública federal, que têm sua base nas Agrotécnicas localizadas nos municí-pios de Santa Teresa, Colatina e Alegre, as quais tiveram, em 2000, 901 matrículas de alunos para cursos técnicos. No setor secundário, por sua vez, as coisas são muito diferentes. Há duas redes, o SENAI e o CEFETES, que atendem de maneira ainda mais extensa às demandas de formação profissional. O SENAI atua de modo muito residual no nível técnico com apenas dois cursos na capital, nas áreas de Manu-tenção e Instrumentação com um número pequeno de egressos por ano (cerca de 100 formandos). Já o CEFETES vem assumindo uma ca-pilaridade maior com cursos, atualmente, em Vitória, Cachoeiro, Co-latina, São Mateus, Cariacica e, futuramente, em Vila Velha, Linhares, Aracruz, Guarapari e Nova Venécia. Hoje o CEFETES oferece cursos de nível técnico e de nível médio integrado com o técnico nas áreas de Construção Civil, Eletrotécnica, Geomática, Mecânica, Metalurgia e Materiais, Química, Segurança do Trabalho, Transportes, Informática, Automação Industrial, Eletromecânica, Mineração, Ferrovias e Portos.

A nosso ver, a oferta de cursos para a Educação Profissional do Estado deve priorizar locais e setores econômicos pouco explorados por outras instituições e suas redes, e, quando for possível, estabele-cer ações conjuntas para ampliar as possibilidades de uma escolari-zação média e técnica 11.

4º Princípio – Qualidade da Capacidade InstaladaHá muitas urgências a serem respeitadas para a instalação de

uma unidade escolar de nível médio, dentre as quais destacamos as condições básicas de infra-estrutura. Além da localização e da pro-posta pedagógica que devem ter em conta a realidade da comunida-de escolar e as necessidades sociais e econômicas da cidade e região onde a unidade for instalada, é necessário que se observem previa-mente as condições físicas e de equipamentos disponíveis para que o ensino público cumpra o seu papel, sobretudo quando se propõe, além da oferta do ensino médio, a educação profissional. Nesse sen-tido, para efeito do Plano de Educação Profissional (PEP), as escolas consideradas em condição de receber o ensino técnico e o ensino médio integrado ao técnico devem ter como condições mínimas: 25 salas, refeitório, cozinha industrial, laboratórios (Informática, Biolo-gia, Química, Física, Matemática), salas ambientes de Desenho, Artes, História e Geografia, auditório, quadra poliesportiva e biblioteca, de

11 Torna-se necessário, ainda, considerar os Centros Vocacionais Tecnológicos que serão implantados até 2010 na Grande Vitória e região norte do Estado.

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sorte que para a instalação da EPTN o prédio escolar deve possuir pelo menos 1. 000 metros quadrados de área construída. As escolas da rede estadual que estiverem fora dessas condições não deverão ser elencadas como potenciais unidades educativas para implanta-ção e expansão da educação profissional 12.

2.4.E - MetodologiaObservando os princípios norteadores, procedemos a uma aná-

lise territorial e setorial das necessidades de oferta pública de Educa-ção Profissional, relacionando os APLs com a realidade da oferta de Educação Profissional nas doze microrregiões do Espírito Santo.

Nesse sentido, com base na territorialização da oferta e da de-manda social e econômica de cursos técnicos, buscamos configurar o mapeamento das necessidades nas 12 microrregiões (Microrregião 1 – Metropolitana, Microrregião 2 – Pólo Linhares, Microrregião 3 – Me-trópole Expandida Sul Microrregião 4 – Sudoeste Serrano, Microrre-gião 5 – Central Serrana, Microrregião 6 – Litoral Norte, Microrregião 7 – Extremo Norte, Microrregião 8 – Pólo Colatina, Microrregião 9 – Noroeste 1, Microrregião 10 – Noroeste 2, Microrregião 11 – Pólo Cachoeiro e Microrregião 12 – Pólo Caparaó) para os seus APLs mais relevantes, de acordo com o trabalho realizado pela FCAA/UFES/SE-BRAE sobre a competitividade sistêmica das atividades econômicas em regime de aglomeração.

Desse modo, as demandas por mão-de-obra qualificada no nível técnico dos arranjos produtivos locais do Espírito Santo (Me-talmecânico13 , Construção Civil, Turismo, Rochas Ornamentais, Mo-veleiro, Confecções, Fruticultura e Cafeicultura) serão consideradas na nova classificação de cursos produzida pelo Catálogo Nacional de Cursos, excluídas as ofertas públicas de Educação Profissional que já ocorrem. Essa definição não detalhar os aspectos quantitativos que estabeleçam o número de matrículas para cada curso que deverá ini-ciar com um número mínimo de uma turma de 40 alunos por ano para cada escola.

A ênfase aqui é mais qualitativa que quantitativa e prioriza a construção de um delineamento do quadro de demanda para 2010, sem perder de vista seu recorte setorial predominante, pois se faz necessário que a oferta de cursos técnicos a ser propiciada direta-mente pela rede estadual tenha uma identidade sócioeconômica, permitindo assim que rede da SEDU tenha um perfil definido e, ao mesmo tempo, articulado com o das outras redes públicas e privadas de formação.

12 Felizmente o Governo Estadual sinalizou a reforma e reconstrução de todas as escolas polivalentes existentes no Estado, o que deve ampliar as possibilidades de atendimento a este princípio na oferta de Educação Profissional13 Consideramos que o setor emergente de petróleo e gás siga a lógica dos setores de construção civil, rochas ornamentais e, sobretudo, metalmecãnico, e que por isso não está aqui diretamente referenciado.

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3. Diagnóstico da demanda de Educação Profissional no Espírito Santo

3.A - Contextualização Sócio-econômicaDepois de amargar quase duas décadas (1980 -1990) de reces-

são econômica, com o PIB em franco processo de estagnação, a eco-nomia brasileira vem dando mostras de que alcançou, sobretudo a partir de 2002, estágios cada vez mais seguros de crescimento eco-nômico, com expansão no nível de emprego. Setores como Constru-ção Civil, Indústria de Transformação, Serviços e Agronegócios, entre outros, sinalizam a diversidade, a complexidade e a extensão dos no-vos postos de trabalho gerados em todo o País.

De acordo com o DIEESE (2008), o emprego formal no Brasil, na última década (1998 – 2007), teve um crescimento bastante expres-sivo, sendo que no primeiro qüinqüênio (1998-2002) o acumulado chegou a 19,0% com um crescimento anual de 3,5%; e no segundo qüinqüênio (2003 -2007) teve um crescimento acumulado de 30% com um aumento anual de 5,4%. Esse contexto tem pressionado as instituições de formação profissional e o poder público em geral a aumentar a oferta de Educação Profissional para gerar e aproveitar oportunidades de emprego, reduzindo assim também a exclusão so-cial e o desemprego no País. No entanto, sabe-se que a inserção no mercado de trabalho não depende apenas de qualificação profissio-nal, Escolaridade e experiência profissional são outros determinantes do acesso ao mercado de trabalho formal. Além disso, dada a estrutu-ra piramidal das qualificações nas empresas, qualificação que é mé-dia e baixa para muitos e alta para poucos, nem todos os empregos formais gerados exigem que o candidato a tenha e, se exigem não o fazem do mesmo modo e nos mesmos níveis, a exemplo da constru-ção civil, que requer em geral 1X de arquitetos, engenheiros e admi-nistradores, 3X de técnicos e mestres de obras e 10X de carpinteiros, pedreiros, pintores, entre outros, de modo que podemos afirmar que os setores não demandam de modo linear e absoluto a qualificação profissional inicial dos novos trabalhadores.

É adequado problematizar a relação existente entre número de empregos gerados (e repostos) e necessidade de qualificação pro-fissional, visto que nem sempre o crescimento econômico implica a criação de empregos de qualidade na implantação e na operação dos empreendimentos, ou, ainda, que esses empregos não demandam do mesmo modo escolaridade, experiência, formação profissional.

De acordo com as últimas projeções (setembro de 2007) do IPEA, feitas a partir de microdados derivados do CAGED, da RAIS e da PNAD de 2006/2007, as demandas por mão-de-obra nos diversos setores devem estabelecer para os candidatos ao mercado de traba-lho um incremento de idade e de escolaridade, em média nacional e inter-setorial, de 33,8 anos de idade para 9,3 anos nos bancos es-colares, com destaque para mais nos setores da indústria / serviços urbanitários (37,5 - idade e 10,8 – escola) e para menos nos de co-mércio / serviços de reparação de produtos (30,8 - idade e 9,7 – es-

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cola). Isso podemos observar na Tabela 1: as atividades econômicas e seus segmentos demandam de modo diferenciado os requisitos para a inserção produtiva, remunerando também, diferenciadamente, as diversas ocupações.

De todo modo, o índice de novos empregos formais no Brasil, no último biênio (2007-2008), tem ultrapassado os 3 milhões. Uma parte considerável desses novos empregos, até em função da intensa incorporação tecnológica nas empresas, exige pessoal mais escola-rizado e mais qualificado. Esse quadro, portanto, reitera a demanda por qualificação / escolarização da mão-de-obra. Importante, porém, frisar que a expansão da estrutura nacional de educação profissional não pode ser feita sem critério, sob pena de se investirem equivoca-damente os recursos públicos e não se atingirem os seus objetivos que são gerar oportunidade de inserção produtiva para todos, im-pulsionar o desenvolvimento tecnológico e alavancar o crescimento econômico do País, incluindo suas diversas áreas econômicas.

A literatura especializada sobre o tema [ver ANPED (Associação nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Educação), GT-09] sinaliza dois movimentos: um, que data de 1994, quando o sistema S iniciou (crise de suas bases financiamento e quadro econômico recessivo) uma progressiva redução da oferta de matrículas gratuitas (em cur-sos de média e longa duração); outro, que ocorreu a partir de 1997, quando a Rede Federal passou a reduzir suas matrículas nas chama-das ETFs e CEFETs. Esse movimento de amesquinhamento na ofer-ta de educação profissional no Brasil, cujo método foi redução dos tempos formativos / elitização (no caso dos CEFETs) e privatização (no caso do sistema S), estagnou as possibilidades de formação pro-fissional, sobretudo dos jovens que concluíam o ensino fundamental.

O fato é que a relação entre emprego e qualificação se apresen-ta complexa, situando-se para muito além da análise simplista (muito recorrente), segundo a qual empregar e contratar depende somente da aritmética oferta X demanda. Não basta analisar apenas o merca-do de trabalho, é necessário também avaliarmos geograficamente o “mercado” da formação nos seus aspectos qualitativos e quantitati-vos.

De acordo com o Anuário Nacional 2006 da qualificação social e profissional do MTE/DIEESE, o Brasil tinha, nesse ano, 3. 294 esta-belecimentos de educação profissional (de nível médio) distribuídos da seguinte forma: 97 (2,9%) na Região Norte, 285 (8,7) Na Região Nordeste, 2. 073 (62,9%), na Região Sudeste, 718 (21,8%) na Região Sul e 121 (3,7%) na Região Centro-Oeste, o que demonstra que talvez a Geografia possa ajudar-nos mais que a matemática para orientar a política de Educação Profissional.

A Educação Profissional é um recurso a que todos os cidadãos que fazem parte da PEA devem ter acesso, sob pena de serem excluí-dos do mercado de trabalho. A maneira mais universal de acessá-la é por meio da oferta pública de Profissionalização. Entretanto, segun-do o Anuário Nacional mencionado, a oferta privada dessa modali-dade de educação de nível médio, no Brasil, em 2005, correspondia

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a 57,2 % das matrículas e a 71,3% do número de estabelecimentos, o que demonstra o grau de privatização desse tipo de serviço for-mativo. Logo, para garantir uma sociedade mais democrática e um desenvolvimento econômico com inclusão social, é preciso saber se a oferta de qualificação profissional é pública ou privada, pois, sem a garantia de uma educação profissional gratuita, muitos problemas ocorrerão, não só na inserção no mercado de trabalho, mas também em questões que envolvem a mobilidade social e a violência urbana.

3.B - Demanda de Formação Profissional no Espírito SantoO processo de industrialização no Espírito Santo iniciou-se nos

anos de 1960 com a criação de incentivos que possibilitaram o cresci-mento e a modernização das atividades tradicionais do setor secun-dário capixaba: produtos alimentícios, têxteis, minerais não metálicos e madeira. Posteriormente, foram realizados maciços investimentos na criação de empresas de siderurgia e celulose, portos, aeroportos, rodovias e ferrovias.

Na década de 1960 com a aplicação da política de erradicação de cafezais, quando a inclusão dos cafeicultores do Espírito Santo foi uma das mais altas do País, a conseqüência, entre outras, foi a ace-leração da urbanização do Estado, isso porque um grande contin-gente populacional do campo migrou para a Região Metropolitana, estimulando a criação de novas atividades econômicas (A população rural do Estado, em 1960, era de 71%, em 1970, de 55%, em 1980, de 33% e, em 2000, de 20,48%).

A década de 1970 foi marcada pelo nascimento do Sistema BANDES/GERES (Decreto-lei Nº 880), que, por meio do FUNRES, criou um conjunto de mecanismos de incentivos fiscais que estimulou a industrialização do Estado. Do início da década de 1970 até meados da década de 1980 foi ampliada mais ainda a centralidade de Vitória, com a implantação de grandes projetos industriais, que conjugou a participação de capitais nacionais e estrangeiros. Na última década do século XX, verificou-se a intensificação das atividades relaciona-das ao Comércio Exterior e a finalização da implantação dos grandes projetos, além da fixação de expressivo contingente de mão-de-obra não qualificada vis-á-vis a grande demanda por qualificação.

O processo de desenvolvimento econômico do Espírito Santo, atualmente, está baseado em três vetores principais: a) ampliação dos grandes projetos (celulose, mineração e siderurgia); b) desenvol-vimento e fortalecimento dos arranjos produtivos locais – adensa-mento de cadeias produtivas locais e c) exploração e produção de petróleo e gás. Esses setores vão impactar a economia local de modo inédito, com repercussão nos seus aspectos ambiental e educacional.

Segundo os dados do CAGED e da RAIS do MTE no Espírito Santo o mercado de trabalho cresce a olhos vistos, mas além de es-tar expandido-se, tornou-se mais exigente, elevando pré-requisitos de entrada e de permanência no emprego. Embora tenhamos nas empresas um cem número de funções que requerem conhecimen-to (escolaridade), habilidade (experiência), competências (formação

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profissional) e atitudes (formação moral e ética do trabalho) para as pessoas se inserirem no mercado, inegável é que os novos processos tecnológicos exigem pessoal mais bem preparado.

As necessidades de formação profissional devem ser supridas pela enorme rede de instituições que fazem formação profissional no Brasil, em particular no estado do Espírito Santo. Cabe, de modo não exclusivo, ao MTE, às Secretarias de Estado e dos Municípios, em colaboração com instituições como os CEFETs e o sistema S, ofertar o ensino profissional de nível básico, que prepara a mão-de-obra para as funções mais simples, como as de eletricistas, pedreiros, armado-res, mecânicos, soldadores, carpinteiros, entre outros. Fica reservado, também de modo não exclusivo, ao sistema federal, como os CEFETs, as Universidades públicas e privadas, ofertar o ensino profissional de nível tecnológico com os cursos de formação específica, de tecnólo-gos, de graduação e pós-graduação.

O ensino técnico de nível médio é o nível de formação em que mais instituições atuam. O setor público é responsável por mais de 40% das matrículas, o que deveria ser ampliado. Mas não basta ofertar apenas o ensino técnico; é muito importante que se amplie a quantidade e a qualidade do ensino médio, além de integrá-lo ao técnico.

Várias pesquisas são unânimes em afirmar que hoje em dia não é possível uma razoável inserção no mercado de trabalho sem conhecimentos de informática, domínio de uma língua estrangeira, um comportamento pró-ativo e, sobretudo, sem ensino médio. Esse nível de ensino é a encruzilhada de muitos jovens, sobre a qual se colocam duas possibilidades: a continuidade de estudos e a termi-nalidade. Para os jovens que precisam trabalhar, a inserção nos curso técnico é a forma mais adequada de inclusão produtiva tanto para si mesmos quanto para suas famílias.

3.C - Demanda dos Arranjos Produtivos do Espírito SantoCom base nos dados da pesquisa da FCAA/UFES/SEBRAE, Com-

petitividade Sistêmica dos Arranjos Produtivos Locais, de 2006, po-demos afirmar que, em relação ao grau de escolaridade da força de trabalho no conjunto dos APLs, 21,4% dos trabalhadores concluíram o ensino médio, 11,4% não completaram o ensino médio e 20,9% concluíram o ensino fundamental. O percentual da força de trabalho com ensino superior completo é de 2,2%. Os arranjos de Confecções, Metalmecânico e Turismo são os que apresentam os melhores resul-tados quanto ao nível de escolaridade. Cerca de 41% e de 7% dos trabalhadores ligados ao arranjo Metalmecânico concluíram, respec-tivamente, o ensino médio e o superior. Nos APLs de Confecções e Turismo, respectivamente, 28,9% e 29,9% da força de trabalho com-pletaram o ensino médio. No outro extremo, a Cafeicultura e a Fru-ticultura, respectivamente, com 7,1% e 7,4% de trabalhadores anal-fabetos, apresentam os piores resultados quanto à escolaridade do pessoal ocupado entre todos os APLs.

O indicador da faixa de rendimento mensal revela que, para o

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conjunto dos APLs, apenas 9,6% dos trabalhadores têm uma renda superior a quatro salários mínimos mês e cerca de 64% da força de trabalho têm rendimento mensal entre um e dois salários mínimos. Resta-nos concluir que, no conjunto dos APLs, cerca de 20% dos tra-balhadores devem estar em funções técnicas. Logo, faz-se necessário repor anualmente, para dar conta do crescimento anual de 7% do PIB estadual, considerando, ainda, a aposentadoria e a morte de técnicos, um valor relativo que varie de 2% a 10 % nas áreas, ou seja, uma re-posição anual de 10% para Metalmecânico, 8% para Construção Civil, 7% para o Turismo, 6% para Rochas Ornamentais, 5% para Moveleiro, 4% para Confecções, 3% para Fruticultura e 2% para Cafeicultura

4. Diagnóstico da Oferta de Educação Profissional no Espírito Santo

No estado do Espírito Santo, temos um longo trajeto a ser per-corrido para que possamos igualar-nos aos principais estados da Fe-deração, como os da Região Sudeste que, juntos com outros da Região Sul são responsáveis por 60 % da oferta de qualificação profissional de nível técnico nos mais diversos níveis e áreas. Pelo menos é o que deixa claro o Anuário Nacional da qualificação social e profissional do MTE/DIEESE de 2006, segundo o qual, a oferta de oportunidades não é só tímida em si, mas, sobretudo, no comparativo com a de outros estados e em nível nacional. De acordo com o Anuário, o Brasil teve, somando-se todas as redes (pública e privada), em 2006, 747. 892 matrículas. A Região Sudeste, por sua vez, foi responsável por 457. 972 (61,2%) delas, com os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, preenchendo, respectivamente, 264. 926 (35,4%), 88. 373 (11,8%) e 93. 728 (12,5%) vagas. Já o Espírito Santo realizou 10. 945 matrículas, o que correspondeu a apenas 1,5% da oferta de Educação Profissional do País.

Todos esses dados mostram que o que ocorre no âmbito da Re-gião Sudeste (oferta de qualificação maior que a demanda por quali-ficados) não acontece no estado do Espírito Santo, onde é mais pro-vável que haja, em decorrência também da aceleração da economia capixaba, uma carência de técnicos. Carência que poderá ser suprida por técnicos de estados vizinhos, fazendo com que o capixaba tenha inúmeras desvantagens na disputa por melhores empregos gerados pela nova onda de desenvolvimento do Estado.

Mas o que é relevante para efeito deste trabalho é a oferta de escolarização em nível médio e sua correlação com a oferta de ensino técnico no Espírito Santo. E de acordo com o censo SEDU/MEC/2005, no que diz respeito à taxa de escolarização da população de 15 a 17 anos, que deveria estar cursando o ensino médio, o estado do Espíri-to Santo, somando-se a todas as redes (pública e privada), alcançou apenas 74,1% dos jovens nessa faixa etária, enquanto que o Brasil, a Região Sudeste e o estado de Minas Gerais atingiram, respectiva-mente, 78,5%, 81% e 75,1%, de seu público-alvo.

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Além disso, os dados do censo escolar SEDU/MEC/2001-2006 demonstram uma tendência de estagnação e redução da oferta de matrículas para o ensino médio e técnico não só na rede pública es-tadual como nas redes federal e privada. No período 2001 – 2006, o total de matrículas caiu de 173.670 para 158.427. Nas redes privada e federal variaram, respectivamente, de 25.645 para 27.758 e de 3.070 para 3.151. A rede estadual reduziu as matrículas de 143.955 para 126.362.

Se tomarmos por base os censos escolares SEDU/MEC/1998-2002, veremos que esse quadro é ainda mais grave do ponto de vista da con-traposição das matrículas nas redes estadual, federal e privada no ensino profissional de nível técnico, no período 1998/2002. O total de 92.087 matrículas reduziu-se drasticamente para 3. 795; na rede privada, a ma-trícula caiu numa escala de 10 para 1 (10.264 para 1.073), e nas redes públicas federal e estadual, despencou, respectivamente, de 3. 732 para 158 e de 73. 468 para 2.552 nos chamados cursos técnicos.

Em 2004, o novo contexto político estadual e nacional e as in-tensas discussões sobre as questões relativas à Educação Profissional e sua relação com o mundo do trabalho pressionaram o Governo, em nível nacional, para uma alteração nas disposições legais. Foi promulgado o Decreto Nº 5.154/04, que regulamentou os artigos da LDB referentes à relação do ensino médio com a Educação Profissio-nal Técnica. Com essa legislação, o aluno poderia cursar/concluir, de forma integrada, o ensino médio e o ensino técnico, respeitadas as diretrizes curriculares nacionais. Depois de muitos anos de esvazia-mento, o ensino médio, na sua vertente profissional, ganhou novos horizontes. Desde a Portaria que proibiu a matrícula de novos alunos no chamado ensino profissionalizante no âmbito da rede estadual de ensino, houve um processo rápido e progressivo de corrosão dessa modalidade de educação no Estado. No entanto, com a promulgação do Decreto Nº 5.154/04, e os esforços do Governo atual de retomar o projeto dos CEET(s), renovaram-se as esperanças quanto à oferta do ensino profissional(izante). Essa possibilidade renova-se numa nova perspectiva, bem diferente da Lei 5.692/71, que é a articulação orgâ-nica entre educação geral, educação técnica e educação tecnológica. No âmbito da SEDU, isso já é uma realidade.

Hoje, observamos um movimento de retomada da oferta de Educação Profissional: já em 2007, foram matriculados 10.102 alunos em cursos nas áreas de Gestão (33%), Agropecuária (14%), Turismo (11%), Informática (10%), Saúde (7%), Meio Ambiente (6%), Comércio (6%), Comunicação (5%), Secretariado Escolar (4%), Mineração (2%) e Construção Civil (2%). Tal fato demonstra que a Educação Profissio-nal voltou a tornar-se uma prioridade estratégica, o que não poderia ser diferente dentro do intenso crescimento que o Estado vem ex-perimentando. Ofertando, no entanto, apenas 36,4% das vagas para matrículas na Educação Profissional, a rede pública estadual, mesmo somada com a rede federal e o setor privado, até o ano de 2007, não ultrapassou a casa dos 35 mil egressos do ensino técnico.

Dessa forma, o Governo Estadual pretende, sem querer substi-

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tuir ou superpor a oferta existente, para a 2010, 3.900 bolsas SEDU, matricular 8.900 jovens em cursos nos CEETs, ofertar 2.900 matrículas no ensino médio integrado e 17.000 matrículas em escolas de ensino médio, praticamente dobrando a matrícula no ensino técnico de 10 mil para 20 mil por meio de diversas estratégias, como implantação de um Órgão Gestor da Educação Profissional; ampliação da oferta de Ensino Médio Integrado, construção de dois CEET’s e concessão de bolsas de estudo.

5. Planejamento Educacional para o Ensino Médio e Profissional - 2010

5.A - Estratégia em CursoPara poder ofertar cursos técnicos de modo a atender os vários

segmentos da economia capixaba, articulando o fortalecimento do ensino médio e a expansão do ensino técnico nas várias áreas pro-fissionais, o Governo Estadual, como já afirmamos, sem pretender substituir o superpor a oferta de cursos técnicos existente para 2010, ofertará 3.900 bolsas SEDU, matriculará 8.900 jovens em cursos nos CEETs (Serra, Cariacica e Vila Velha), ofertará 2.900 matrículas no ensi-no médio integrado e 17.000 matrículas em escolas de ensino médio. Para tanto, é necessário definir as escolas, sua localização, as unida-des escolares que receberão o ensino médio integrado, as escolas que farão concomitância com outras redes ou com os CEETs, as áreas profissionais, o quantitativo de alunos a ser matriculado, os cursos que deverão ser ofertados na modalidade de bolsa SEDU.

No que diz respeito às áreas profissionais, vale retomar as aná-lises dos ALPs. Os setores da Cafeicultura, Fruticultura, Confecções, Móveis, Metal-Mecânico, Construção Civil, Rochas Ornamentais e Tu-rismo indicam (em ordem alfabética) os cursos de Automação, Co-mércio, Contabilidade, Corretagem de Imóveis, Decoração, Design de Móveis, Edificações, Eletrônica, Eletrotécnica, Estilismo, Gastrono-mia, Gestão da Produção Industrial, Gestão de Agronegócio, Informá-tica, Instrumentação, Irrigação, Manutenção Industrial, Manutenção de Máquinas Agrícolas, Marketing, Mecânica, Metalurgia, Química, Segurança no Trabalho, Têxtil e Transportes.

Do ponto de vista Macroregional, segundo o IPES, setores como Energia, Comércio/Serviço e Lazer, Sistema Portuário/Aeroporto e de Armazenagem, Meio Ambiente, Educação e Saúde também devem ser tomados como pontos de partida para a construção de um de-senho do quadro de demanda de técnicos, o que sinaliza (além da-queles já mencionados na abordagem por APLs) cursos (em ordem alfabética) de Administração, Comunicação, Enfermagem, Estradas, Geomática, Hospitalidade, Radiologia e Saneamento Ambiental.

Quanto à localização, as cidades citadas com as atividades rela-tivas aos setores econômicos foram (em ordem alfabética) Água Doce do Norte (rochas ornamentais), Águia Branca (rochas ornamentais), Alto Rio Novo (cafeicultura), Anchieta (construção civil, metalmecâ-

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nico e turismo), Aracruz (construção civil, metal-mecânico e turismo), Atílio Vivacqua (rochas ornamentais), Baixo Guandu (cafeicultura), Barra de São Francisco (rochas ornamentais), Brejetuba (cafeicultura), Cachoeiro do Itapemirim (metalmecânico e rochas ornamentais), Ca-riacica (construção civil, metalmecânico e moveleiro), Castelo (rochas ornamentais), Colatina (confecção e moveleiro), Conceição da Barra (fruticultura e turismo), Domingos Martins (turismo), Dores do Rio Preto (moveleiro), Ecoporanga (rochas ornamentais), Fundão (cons-trução civil), Governador Lindenberg (moveleiro), Guarapari (cons-trução civil e turismo), Ibatiba (cafeicultura), Ibiraçu (construção civil), Irupi (cafeicultura), Itapemirim (rochas ornamentais), Itarana (cafei-cultura), Iúna (cafeicultura), Jaguaré (cafeicultura e fruticultura), João Neiva (metalmecânico), Linhares (cafeicultura, fruticultura e movelei-ro), Marataízes (turismo), Marechal Floriano (cafeicultura), Marilândia (cafeicultura, confecção e moveleiro), Montanha (cafeicultura), Muniz Freire (cafeicultura), Nova Venécia (cafeicultura e rochas ornamen-tais), Pedro Canário (fruticultura), Pinheiros (fruticultura), Rio Bananal (cafeicultura), Rio Novo do Sul (rochas ornamentais), Santa Teresa (ca-feicultura), São Domingos do Norte (confecção), São Gabriel da Palha (confecção), São Mateus (fruticultura, turismo), São Roque do Canaã (moveleiro), Serra (construção civil, metalmecânico, turismo), Soore-tama (fruticultura e cafeicultura), Vargem Alta (rochas ornamentais), Vila Pavão (rochas ornamentais), Vila Valério (cafeicultura), Vila Ve-lha (confecção, construção civil, metalmecânico e turismo) e Vitória (construção civil, metalmecânico e turismo).

Essa distribuição por cidade é uma referência muito fragmenta-da, sobretudo porque, no estado do Espírito Santo, existem municí-pios muito pequenos com uma demanda por ensino médio que não necessariamente tem seu equivalente em termos de ensino técnico. Desse modo, é necessário reagrupar esses municípios na base na sua microrregião.

5.B - Proposta final de Oferta de Educação ProfissionalA oferta de educação profissional para 2010 não exclui o que

tem sido feito pelas redes estadual, federal e privada, apontando para a ampliação dessa modalidade de ensino, respeitando os princípios de a) Sustentabilidade da Demanda Econômica e Social, b) Garantia da Oferta Pública, c) Intercomplentaridade Territorial, Setorial e Inte-rinstitucional e d) Qualidade da Capacidade Instalada. Dessa forma, tentando suprir o “vácuo” formativo gerado, por um lado, pela expan-são da população de 15 a 18 anos nos diversos territórios do estado do Espírito Santo e, por outro, pela expansão econômica registrada nos diversos APLs existentes em terras capixabas, é que se propõe o conjunto de cursos conforme Quadro Nº 27:

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As estratégias de oferta da Educação Profissional nos cursos, ora definidas, deverão seguir dois caminhos básicos: - a oferta direta por meio das escolas ou CEETs da rede estadual e a oferta por meio da bolsa técnica e a bolsa SEDU.

Os cursos de infra-estrutura muita cara e cujo Know How é do-minado por outras instituições, como sistema S, CEFETES, Agrotéc-nicas, CEDITEC e Universo, entre outras, deverão ser oferecidos por meio da bolsa técnica e da bolsa SEDU, sendo esta uma estratégia adequada para os seguintes cursos: 1) Móveis, 2) Edificações, 3) Au-tomação Industrial, 4) Metalurgia, 5) Agricultura, 6) Agroindústria, 7) Mecânica, 8) Geologia, 9) Mineração e 10) Florestal.

Para a oferta direta por meio das escolas da rede estadual e CEETs, restam os cursos técnicos de 1) Conservação e Restauro, 2) Transações Imobiliárias, 3) Manutenção e Suporte em Informática, 4) Design de Móveis, 5) Eventos, 6) Processos Fotográficos, 7) Design de Calçados. 8) Áudio e Vídeo, 9) Cozinha, 10) Agronegócio, 11) Móveis, 12) Design de Interiores, 13) Guiamento, 14) Química, 15) Móveis. 16) Hospedagem, 17) Modelagem do Vestuário, 18) Tecelagem e Vestu-ário, 19) Alimentos, 20) Secretariado, 21) Informática, 22) Segurança do Trabalho e 23) Contabilidade.

Dentre esses, os mais adequados para se incorporarem ao en-sino médio integrado são aqueles que têm a duplicidade de função de terminalidade e continuidade do ensino médio, pois situam-se na interface ciência e tecnologia, propiciando pela sua natureza tanto a formação para o trabalho quanto a fundamentação científica, de sor-te que as escolas que os implantarem devem integrá-los ao ensino

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médio. Esses são cursos adequados para esse fim: 1) Conservação e Restauro, 2) Áudio e Vídeo, 3) Química, 4) Informática, 5) Segurança do Trabalho, 6) Secretariado e 7) Contabilidade.

Os demais cursos técnicos, pelas suas características de mais ter-minalidade que de continuidade, deverão ser ofertados pelas escolas nos regimes subsequentes ou concomitantes, sendo mais adequados aos formatos dos CEETs. São os cursos de 1) Agronegócio, 2) Alimentos, 3) Cozinha, 4) Design de Calçados, 5) Design de Interiores, 6) Design de Móveis, 7) Eventos, 8) Guiamento, 9) Hospedagem, 10) Manutenção e Suporte em Informática, 11) Modelagem do Vestuário, 12) Processos Fotográficos, 13) Tecelagem e Vestuário e 14) Transações Imobiliárias.

Para a implantação dos cursos técnicos na rede estadual, é ne-cessário que as escolas tenham uma capacidade física para receber a infra-estrutura dos cursos técnicos. Para tanto é preciso que as unida-des escolares tenham como condições mínimas uma estrutura inicial com 25 salas, refeitório, cozinha industrial, laboratórios (Informática, Biologia, Química, Física, Matemática), salas ambientes de Desenho, Artes, História e Geografia, auditório, quadra poliesportiva e biblio-teca, de sorte que ao prédio escolar deve possuir pelo menos 1 000 metros quadrados de área construída.

As escolas que mais se aproximam dessas condições são: a) EE-EFM DES. CARLOS XAVIER PAES BARRETO (Microrregião 01 – Metro-politana), b) EEEFM GERALDO VARGAS NOGUEIRA (Microrregião 08 – Pólo Colatina), c) EEEFM LICEU MUNIZ FREIRE (Microrregião 11 – Pólo Cachoeiro), d) EEEFM JOAO BLEY (microrregião 11 – Pólo Cachoeiro), e) EEEFM JERONIMO MONTEIRO (microrregião 11 – Pólo Cachoeiro) e f ) EEEFM ARISTEU AGUIAR ( microrregião 12 – Pólo Caparaó). Dessa forma, nas microrregiões em que não existam escolas nestas condi-ções, novas unidades escolares devem ser construídas ou ampliadas.

6. Conclusão - Desdobramentos e Implementação do PEP-2010

Com o crescimento econômico do estado do Espírito Santo em pleno século XXI a formação de técnicos tornou-se ainda mais de-mandada pela economia local assim como pelos jovens que querem uma melhor inserção no mercado de trabalho e prosseguir seus es-tudos no nível superior. Para atender a essas necessidades o governo estadual, orientado pelas modalidades e localização das áreas previs-tas no PEP 2010, buscou ofertar o ensino técnico para os jovens do Espírito Santo, mas o fez sem incorporar exatamente o que fora indi-cado no documento encomendado por este mesmo governo, aban-donando a estratégia de construção de escolas técnicas estaduais.

Segundo o argumento do governo, com a implantação dos IFES do Espírito Santo integrando as agrotécnicas e o antigo CEFETES em 15 campi (Vitória, Serra, Colatina, Linhares, Cariacica, Guarapari, Ven-da Nova, Nova Venécia, Piúma, Ibatiba, Cachoeiro do Itapemirim São Mateus, Santa Tereza, Alegre e Vila Velha), e tendo em vista o custo e

Saiba mais

IFES - Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Espírito Santo.

CEFETES - Centro Federal de Educação Tecnologica do Espírito Santo.

SEDU - Secretária de Educação

EJA - Educação de Jovens e Adultos

EM - Ensino Médio

CEEJA - Centro Estadual de Educação de Jovens e Adultos

PEP - Programa de Educação Profissional

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a efemeridade da criação de uma infra-estrutura de escolas técnicas estaduais, optou-se por priorizar quase que exclusivamente a oferta do ensino público técnico por meio da bolsa Sedu.

A bolsa SEDU consiste em comprar vagas na rede de ensino médio privado do estado do Espírito Santo para estudantes que te-nham concluído todo o Ensino Médio Regular ou EJA/EM, inclusive CEEJA na rede pública, aos alunos concluintes do Ensino Médio Re-gular, Educação Profissional Integrada ao Ensino Médio ou Educação de Jovens e Adultos na rede pública estadual, municipal ou federal, e aos alunos de entidades reconhecidas como de utilidade pública.

Em 2008, foram ofertadas 1.200 vagas distribuídas nos municípios de Linhares, Aracruz, Santa Teresa, São Mateus, Cachoeiro de Itapemirim, Serra, Vitória, Cariacica, Vila Velha e Guarapari nos cursos de Logística; Química; Mecânica; Edificações; Eletrônica; Eletrotécnica; Automação In-dustrial; Enfermagem; Petróleo e Gás e Design de Móveis.

Em 2010, este programa aumentou a oferta para 1700 vagas disputadas por nada menos do que 17 000 indivíduos, benefician-do instituições privadas como a ESFA, o CEDTEC, a MASTER, o SAO-CAMILO, o CEA, a FACE, o UNIVERSO, o SENAI, a CONTEC, o ISJB e o CRISTO-REI com repasse anual de cerca de dois milhões de reais.

Em 24/03/2010 em evento de lançamento do PEP e aula inau-gural do programa bolsa SEDU o presidente do Sinepe-ES (sindicato da escolas particulares) reforçou a importância da parceria do Gover-no do Estado, por meio da Sedu, com a iniciativa privada. “Não pode-mos mais ouvir que aqui no Espírito Santo não temos mão de obra qualificada. O Governo tem se esforçado e é para isso que existe essa parceria.” (www.sedu.es.gov.br acesso em 25-03-2010)

O governador Paulo Hartung destacou que o Plano Estadual de Educação Profissional é um documento que traz um roteiro de tra-balho que contempla oportunidades como as oferecidas por meio do Bolsa Sedu. O governador salientou, ainda que “Nosso desenvol-vimento foi muito tardio. O primeiro ciclo de desenvolvimento só aconteceu a partir de 1850, com a monocultura do café”. Segundo Hartung,

o Espírito Santo só começou a diversificar sua economia a partir da década de 1960, com a implantação dos gran-des projetos industriais ligados à mineração, siderurgia e celulose. “Agora, estamos vivendo um novo ciclo em nossa economia, com o advento das descobertas de pe-tróleo e gás. Para que possamos estar preparados para enfrentar os desafios desse novo ciclo estamos fazendo, desde 2003, o maior investimento de nosso orçamento em Educação. Queremos que as novas oportunidades que surgem a cada dia sejam aproveitadas pelos capixa-bas”. (www.sedu.es.gov.br acesso em 25-03-2010).

Ao se dirigir aos alunos da rede pública que foram aprovados no programa bolsa SEDU, o governador parabenizou a todos os apro-vados e frisou que os novos alunos venceram mais uma etapa e que agora precisam manter o esforço demonstrado até agora para conti-nuar evoluindo nos estudos e na vida profissional.

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Segundo Hartung,

“Quem está pagando essa bolsa para vocês é o povo capi-xaba. Por isso, vale a pena se esforçar e agarrar essa opor-tunidade com as duas mãos. Vocês estão tendo a chance de construir o patrimônio mais importante que existe nos dias de hoje, que é o patrimônio do conhecimento e do saber”. Estamos promovendo um verdadeiro mutirão para qualificar e preparar jovens e trabalhadores, pois nossa in-tenção é fazer com que os capixabas e aqueles que vivem aqui sejam inseridos nesse novo ciclo de desenvolvimen-to. Meu sonho é que o Espírito Santo possa dar conta de todas as demandas locais de mão de obra e ser um expor-tador de gente qualificada para o Brasil e para o mundo”. (www.sedu.es.gov.br acesso em 25-03-2010).

Apesar da aceitação pública, política e social do programa bol-sa SEDU, ele representa uma alternativa privatista e imediatista de oferta de ensino profissional no Espírito Santo, pois não cria nenhu-ma infraestrutura em termos de prédio e de equipamentos de forma-ção técnica para a educação no estado. Além disso, essa estratégia desconecta-se do ensino médio indo contra a política nacional de integração do ensino médio com o técnico. Do que se pode concluir que o Planejamento educacional feito para o sistema estadual de en-sino não foi seguido pela SEDU em função necessidades imediatas e interesses político empresariais.

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