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P & B 85 indústria da moda movimenta todos os anos milhões de dólares e seja qual for a estação do ano é improvável, para não dizer impossível, ver um desfile de algum estilista de peso em que não estejam presentes o preto, o branco, ou ambos. Básico ou lu- xuoso, do popular e menos sofisticado prêt-à-porter à alta cos- tura, separados ou em uma mesma composição, o preto e o branco sempre foram ótimas opções. Se você não consegue pensar no seu armário sem aquele “pre- tinho básico” ou aquela blusa branca “coringa”, fica difícil supor que o uso do preto e do branco como cores-chave da moda seja uma realidade muito recente. A idéia da cor branca associa- da à pureza e, por isso mesmo, usada exclusivamente em ce- rimônias religiosas cristãs, como as de casamento ou batismo, ou ecumênicas, como o réveillon j u n- to ao mar até o amanhecer, tem como referência a luz natural, em que a cor branca é aquela que incorpora todas as outras c o res. Já a cor preta, relacionada à obscuridade, à morte e à su- perstição, re p resenta, neste mes- mo re f e rencial, a total ausência de luz. Por esse motivo, antes dos anos 1920, o preto só era usado em ocasiões específicas, como enter- ros e velórios. As jovens não podi- am usar trajes pretos e as senho- ras vestiam essa cor apenas no período de luto. Os sacerd o t e s católicos eram os únicos que fazi- am uso da cor negra como sinal de negação da vaidade material. Apesar de algumas tradições se manterem, como o branco usado nos vestidos de noiva, por exem- plo, a verdade é que o preto e o branco incorporaram ares de Bom gosto e elegância CAROLINA ROBERTY , CHRISTIANE DIAS, MARIANNA CATÃO E LUCIANA VOLKOV Criação de Coco Chanel: tailler preto com cetim branco (1956) A moda no século XX

CAROLINA ROBERTY, CHRISTIANE DIAS, MARIANNA CATÃOE …puc-riodigital.com.puc-rio.br/media/23%20-%20bom%20gosto%20e%… · Tranchesi, dona da Daslu, loja de luxo em São Paulo, tro

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  • P & B85

    indústria da modamovimenta todos osanos milhões de dólarese seja qual for a estação

    do ano é improvável, para nãodizer impossível, ver um desfilede algum estilista de peso em quenão estejam presentes o preto, obranco, ou ambos. Básico ou lu-xuoso, do popular e menossofisticado prêt-à-porter à alta cos-tura, separados ou em umamesma composição, o preto e obranco sempre foram ótimasopções.

    Se você não consegue pensarno seu armário sem aquele “pre-tinho básico” ou aquela blusabranca “coringa”, fica difícilsupor que o uso do preto e dobranco como cores-chave damoda seja uma realidade muitorecente.

    A idéia da cor branca associa-da à pureza e, por isso mesmo,usada exclusivamente em ce-rimônias religiosas cristãs, comoas de casamento ou batismo, ouecumênicas, como o r é v e i l l o n j u n-to ao mar até o amanhecer, temcomo referência a luz natural,em que a cor branca é aquelaque incorpora todas as outrasc o res. Já a cor preta, re l a c i o n a d aà obscuridade, à morte e à su-perstição, re p resenta, neste mes-mo re f e rencial, a total ausênciade luz.

    Por esse motivo, antes dos anos1920, o preto só era usado emocasiões específicas, como enter-

    ros e velórios. As jovens não podi-am usar trajes pretos e as senho-ras vestiam essa cor apenas noperíodo de luto. Os sacerd o t e scatólicos eram os únicos que fazi-am uso da cor negra como sinal

    de negação da vaidade material.Apesar de algumas tradições se

    manterem, como o branco usadonos vestidos de noiva, por exem-plo, a verdade é que o preto e obranco incorporaram ares de

    Bom gosto e elegânciaCAROLINA ROBERTY, CHRISTIANE DIAS, MARIANNA CATÃO E LUCIANA VOLKOV

    Criação de Coco Chanel: tailler preto com cetim branco (1956)

    A moda no século XX

  • glamour. O que hoje conhecemoscomo “pretinho básico” surg i uem 1926, ano em que a revistaVogue publicou uma ilustraçãodo vestido criado por CocoChanel – o primeiro entre váriosque a estilista iria criar – queviraria, mais tarde, sinônimo decharme e elegância.

    Coco Chanel: glamourGrabrielle Bonheur Chanel ou

    Coco Chanel nasceu em Saumur,na França, em agosto de 1883.Ela se interessou pela moda desde1910 e, em poucos anos, já eradona de duas lojas de acessórios.Começaram então, suas pri-meiras criações em roupas, quecaracterizavam a nova mulherdo século XX: jovem, indepen-dente, flexível e atlética. Dosvestidos c h e m i s i e r s soltos, aostwinsets, passando pelo “pretinhobásico”, suas coleções priori-zavam o conforto, a simplicidadee o funcionalismo.

    Chanel libertou a mulher doscorpetes apertados, das saias debabados franzidos, e das cintas.

    Julho/Dezembro 200686

    Eclética - Por que o preto e o branco nunca saem demoda?Carla - Por serem neutros. E não é uma verdade

    que nunca saiam de moda, se pensarmos destaforma, nenhuma cor sai de moda. O que existe sãoas fases de auge. Tenho a impressão que eles sempreressurgem quando as paletas de cor começam aficar muito vibrantes, como atualmente ou nadécada de 1980, eles chegam para dar algumamoldura às coleções e realçar as linhas. Na décadade 1990, por exemplo, o cinza assumiu a neutrali-dade, junto a uma paleta mais pastel.

    Eclética - Qual a importância da Chanel para a con-solidação dessas cores no guard a - roupa feminino?Carla - Chanel era sem dúvida uma estilista de

    out lines, ou seja, suas criações tinham um traço

    fortemente slim, e nenhuma cor é tão perfeita pararealçar isto quanto esta dupla, além de toda ainfluência art déco em seu trabalho. A consoli-dação, creio, está na associação imediata que setem hoje a esta elegância slim quando se fala depreto e branco.

    Eclética - Hoje, um grande número de pessoas jádeixou de lado o branco no réveillon, algumas atémesmo na hora de casar. Você acha que a moda ga-nhou mais espaço na vida das pessoas do quetradições e superstições? Por quê?

    Carla - Pessoalmente, não creio que a moda,como evento isolado, tenha influência neste fato;talvez ela ajude oferecendo sempre novos conceitos.Acredito mais em quebra de paradigmas, que éuma tendência natural da evolução das culturas.

    Entrevista com a estilista Carla Costa

    Inés de la Fressange, manequim-símbolo da Chanel, com uma criação de KarlLagerfeld

  • Nos cortes e nas construções desuas roupas, a estilista revelavasua fixação obsessiva na aco-modação da forma feminina, jáque a intenção dela era nuncadeformar a silhueta da mulher.Segundo Chanel, os contornos damulher deveriam sempre apare-cer naturalmente.

    A marca de Coco estava nocorte impecável das roupas e emsuas cores preferidas: o preto e obranco e, também, o cinza, oazul-marinho e o bege. Mas, foi avisão revolucionária e feministade Chanel que pontuaram seuestilo. No “pretinho básico”,vestido simples, que, segundo

    Chanel, é a elegância para qual-quer situação; no suéter masculi-no; ou ainda, nas calças masculi-nas para mulheres – invençãoinspirada nas calças de bocalarga usadas por marinheiros –Coco ultrapassa pre c o n c e i t o s ,retoca a silhueta feminina etorna imortal o seu estilo reno-vador.

    Chanel tornou-se um ver-d a d e i ro ícone, com seguidore sem todo o mundo. São homens em u l h e res que não deixam dereconhecer nas suas criações aelegância, a classe e o perf e c-cionismo. A estilista criou amoda da mulher do século XX e

    continua no auge da moda atéhoje no mundo inteiro. E o Brasilnão fica de fora. Em 1996, ElianeTranchesi, dona da Daslu, lojade luxo em São Paulo, tro u x epara o Brasil a elegância deCoco Chanel e foi a primeirashop in shop i n t e rnacional dab u t i q u e .

    P & B87

    ProfissõesAntes do século XX, os médicos optavam pelo uso de roupas escuras e sérias,

    como qualquer outro intelectual ou nobre da época. Isso porque a limpeza e asantidade não eram necessariamente associadas à saúde. Mas foram adescoberta dos germes e a incorporação de hábitos higiênicos que fizeram comque esse costume se modificasse. A partir de então, os profissionais da área desaúde passaram a utilizar roupas brancas. O que era sinônimo de limpeza pas-sou a ser visto como regra na área de saúde, e a cor branca conquistou seuespaço, e se tornou popularmente usada.

    RéveillonSegundo a consultora de moda Glória Kalil, foram os brasileiros que inventaram o uso de

    roupas brancas na passagem do ano. “O branco é uma cor associada ao verão e nos outroshemisférios faz frio nesta época”, lembra. A simbologia acompanha o otimismo dosbrasileiros de começar o ano como uma página em branco, onde se pode escrever umanova história. A palavra réveillon é derivada do verbo francês se reveiller, que significa le-vantar-se, e por isso a cor branca é associada ao Ano Novo.

    O preto e o branco no verão 2007A temporada de desfiles brasileiros para o Verão 2007 deixou registradas as

    palavras de ordem da próxima estação: azul marinho, salopetes, macacões eminissaias, curtíssimas. O preto e o branco aparecem com força total nos des-files. Leve, o branco deixa o visual sofisticado e cai bem tanto no calor como nofrio brasileiro, que é mais ameno. Para quem torce o nariz para a explosão decores do verão, uma alternativa é apostar no preto. A cor veio com força e apare-ceu em todos os desfiles nos mais variados visuais: pretinho básico, preto total,preto e branco, em listras, em pois, tecidos geométricos ou nas sobreposições: topcom top, legging com saia, bermuda com short, etc. Sempre, usando o preto e obranco como base. Nos pés, a explosão do preto e do branco apareceu em tonsmetalizados e no verniz.

    Coco Chanel num café em Paris

    Moda em Século

    Cultura e tendências