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200 DANO MORAL REFLEXO À MORTE E INDENIZAÇÃO REFLEX MORAL DAMAGE BY DEATH AND INDEMNIFICATION Roberta Salvático Vaz de Mello 1 Jéssica Rodrigues Godinho 2 Data de recebimento: 29/04/2018 Data de Aprovação : 16/09/2018 RESUMO O presente artigo visa aprofundar o estudo sobre a questão do dano moral reflexo e sua reparação civil. Nas linhas do presente projeto serão tra- balhados alguns conceitos concernentes aos direitos de personalidade, danos morais, responsabilidade civil, danos reflexos, danos punitivos e indenização. Ademais, pretende-se discutir qual a natureza da indenização aplicável a estes casos, se compensatória ou punitiva. Para tanto, utilizou-se da vertente meto- dológica jurídico-sociológica, pretendendo verificar se há a possibilidade de aplicação do instituto dos punitive damagens para o julgamento de demandas acerca do dano moral reflexo. Fez-se uso do raciocínio indutivo e do método teórico, para, ao final, tentar-se uma compreensão aprofundada sobre o tema. 1 Bolsista Capes-Taxa. Doutoranda e Mestre em Direito Privado pela PUC Minas. Coordenadora do Núcleo de Prática Jurídica e Cidadania da Faculdade Minas Gerais (NPJC - FAMIG) e Professora da Faculdade Minas Gerais - FAMIG. Especialista em Direito Público pelo Centro Universitário Newton Paiva. Graduada em Direito pela PUC Minas. Advogada. E-mail: [email protected]. 2 Bolsista FAPEMIG. Mestranda em Direito Privado pela PUC Minas. Especialista em Direito Civil pela PUC Minas. Graduada em Direito PUC Minas. Advogada. E-mail: [email protected].

DANO MORAL REFLExO À MORTE E INDENIZAÇÃO

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DANO MORAL REFLExO À MORTE E INDENIZAÇÃO

REFLEx MORAL DAMAGE BY DEATH AND INDEMNIFICATION

Roberta Salvático Vaz de Mello 1

Jéssica Rodrigues Godinho 2

Data de recebimento: 29/04/2018Data de Aprovação : 16/09/2018

Resumo Opresenteartigovisaaprofundaroestudosobreaquestãododanomoralreflexoesuareparaçãocivil.Naslinhasdopresenteprojetoserãotra-balhadosalgunsconceitosconcernentesaosdireitosdepersonalidade,danosmorais,responsabilidadecivil,danosreflexos,danospunitivoseindenização.Ademais,pretende-sediscutirqualanaturezadaindenizaçãoaplicávelaestescasos,secompensatóriaoupunitiva.Paratanto,utilizou-sedavertentemeto-dológica jurídico-sociológica,pretendendoverificar seháapossibilidadedeaplicaçãodoinstitutodospunitive damagens paraojulgamentodedemandasacercadodanomoralreflexo.Fez-seusodoraciocínioindutivoedométodoteórico,para,aofinal,tentar-seumacompreensãoaprofundadasobreotema.

1 Bolsista Capes-Taxa. Doutoranda e Mestre em Direito Privado pela PUC Minas. Coordenadora do Núcleo de Prática Jurídica e Cidadania da Faculdade Minas Gerais (NPJC - FAMIG) e Professora da Faculdade Minas Gerais - FAMIG.

Especialista em Direito Público pelo Centro Universitário Newton Paiva. Graduada em Direito pela PUC Minas. Advogada. E-mail: [email protected].

2 Bolsista FAPEMIG. Mestranda em Direito Privado pela PUC Minas. Especialista em Direito Civil pela PUC Minas. Graduada em Direito PUC Minas. Advogada. E-mail: [email protected].

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PalavRas-Chave Danoreflexo.Morte.Danospunitivos.Reparaçãocivil.Danomoral.

abstRaCt Thisarticleaims todeepen thestudyon thematterof reflexmoraldamage reflex and its civil reparation. In the lines of this project will beworkedsomeconceptsconcerningofpersonalityrights,moraldamages,civilliability,reflexdamages,punitivedamagesandindemnification.Inaddition,itisintendedtodiscussthenatureofthecompensationapplicabletothesecases,whethercompensatoryorpunitive.Forthispurpose,itwasusedthejuridical-sociologicalmethodologicalaspect,intendingtoverifyifthereisthepossibilityofapplicationoftheinstituteofthepunitivedamagesfortheju-dgmentofdemandsonthereflexmoraldamage.Inductivereasoningandthetheoreticalmethodwereused,inordertotrytogainadeeperunderstandingofthesubject.

KeywoRds Reflex damage. Death. Punitive damages. Civil reparation. Moraldamage.

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1 IntRoduÇÃo

Seháalgumacertezanavidaédequetodosirãomorrerumdia.Amorteéinescapáveleincomensurável.

É inegável também a dor que a morte causa em quem fica, nos parentes, amigos, nos entes queridos do falecido. E quando a morte se dá em virtude de acidente,erromédico,ouqualqueroutroeventoprovocado,adororiundadamortesealiaàrevoltapelaperdadoenteouamigoestimado.

Mas, talmorte, abruptae causadaporumeventoprovocado, seriacapazdecausardanoàpersonalidadedeumterceiro?Emcasopositivo,paraapretensãojudicial,deve-seconsiderarodanoàpersonalidadedomortoouemrelaçãoàprópriaterceirapessoa?Taldanoàpersonalidade,decunhomoral,seriapassíveldereparaçãocivil?Qualseriaanaturezadestareparação,com-pensatóriaoupunitiva?Sãoestasasquestõesqueserãodebatidasaseguir,equeesteartigosepropõearesponder.

Assim, utilizando-se da vertentemetodológica jurídico-sociológica,pretende-severificar sehánormasnoordenamento jurídicopátrioqueaco-lhamtalpretensãooriginadapelodanomoralreflexo.

Para tanto, fez-se uso do raciocínio indutivo e dométodo teórico,para,aofinal,tentar-seumacompreensãomaiscomplexasobreotema.

2 os dIReItos da PeRsonalIdade e o dano moRal

Osdireitosdapersonalidadesãoreconhecidosaoindivíduopeloorde-namentobrasileiro,exemplificadospeloCódigoCivil.Contudo,apesardeesta-remnalegislaçãocivilista,nãosãoentendidoscomotaxativosepodemexistiroutrosvisandoaproteçãodoserhumanoemtodasassuaspotencialidades.

Assim,entende-sequeessesdireitostêmsuafundamentaçãoemumprincípioconstitucional,aDignidadedaPessoaHumana.

Destafeita,discorrer-se-áinicialmentesobreoprincípiodaDignida-dedaPessoaHumanaesuaconexãocomosdireitosdapersonalidadepara,após,falar-seespecificamentesobreosdireitosdapersonalidadeedasconse-quênciasdesuaviolação.

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2.1 direitos da personalidade como consectários do Princípio da dignidade da Pessoa humana

OsdireitosdepersonalidadeestãotratadosnoCódigoCivil,nosar-tigos11a21,masaproteçãoaestesdireitosjáexistianaConstituiçãoFederal,atravésdaDignidadedaPessoaHumana,dispostanoartigo1o,incisoIII,daCartaMagna,equeécláusulageraldatuteladosdireitosdepersonalidade.

Nessesentido:

[...]adignidade da pessoa humana (art.1º,IIIdaCR/88)éerigidaàcondiçãodemeta-princípio (sic). Porissomesmo,esta irradia valores e vetores deinterpretação para todos os demais direitos fundamentais,exigindoqueafigurahuma-narecebasempreumtratamentomoralcondizenteeiguali-tário,sempretratandocadapessoacomofimemsimesma,nuncacomomeio(coisas)parasatisfaçãodeoutrosinteressesoudeinteressesdeterceiros.(FERNANDES,2014,p.297,gri-fosdoautor).

Assim,comonovoparadigmainstituídopelaConstituiçãoFederal,passou-seavalorizaroseremdetrimentodoter.Oserhumanoéentendidodeformadesvinculadadoseupatrimônioeédetentordedireitossimplesmenteporserhumano,conformeéatribuídopelaordemnormativabrasileira.Nestasenda,vê-seavalorizaçãodosdireitosdepersonalidade,comoformadepro-teçãoaoindivíduoetodasassuaspotencialidades.

SegundoBernardoGonçalvesFernandes (2014,p.300-301),existemparâmetrosmínimosquedevemserconsideradosparaquesepossaaferirumadequadoconceitodeDignidadedaPessoaHumana,paraquenãosebanalizeasuaaplicação.Sãoeles:i)NãoInstrumentalização,eisqueapessoanãopodesertratadacomomeio.Assim,“OrespeitoàdignidadehumanadecadapessoaproíbeoEstadodedispordequalquerindivíduoapenascomo meio para outro fim, mesmoseforparasalvaravidademuitasoutraspessoas.”(FERNANDES,2014,p.300,grifosdoautor);ii)AutonomiaExistencial,conferindoacadain-divíduoo livrearbítriodeagirconformeoplanodevidaqueentendeseromaisadequadoparasi,desdequenãoresultemempráticasilícitas;iii)Direito

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aoMínimoExistencial,conferindo-seaoserhumanoobásicoparaquepossaviverdignamente;iv)DireitoaoReconhecimento,queserefereaodireitodecadapessoade ser singular e ser respeitada em sua singularidade,visandopreservarsuadignidade.

Depreende-se,então,aestreitaligaçãoentreaDignidadedaPessoaHumanaeapersonalidadeetodososdireitosquedelaemanam.

Corrobora com essa afirmação Elimar Szaniawski, que defende aideiadeumdireitogeraldepersonalidade,sobofundamentodeque

AConstituiçãobrasileira,emvigor,edificaodireitogeraldepersonalidade a partir de determinados princípios funda-mentaisnelainseridos,provenientesdeumprincípiomatrizqueconsistenoprincípio da dignidade dapessoahumana.Osprincípiosconstitucionais,dispostosnaCartaMagna,cons-tituemumarcabouçodatuteladapessoahumanaemnívelconstitucional,comoumgrandesistemadeproteçãododirei-togeraldepersonalidade.Tendoemvistaaimportânciaeaextensãodo princípio da dignidade da pessoa humana, comoprin-cípiomatriz,doqual irradiamtodososdireitos fundamen-taisdo serhumano, vinculandoopoderpúblico comoumtodo,bemcomoosparticulares,pessoasnaturaisoujurídicasesendoodireitodapós-modernidadeumdireitoquepossuipordestinatáriofinalapessoahumana,exercendoumafun-çãosocial,todoodireitopostodeveserlidoeinterpretadoàluzdaConstituição,emespecial,segundoospostuladosdoprincípiodadignidadedapessoahumana. (SZANIAWSKI,2005,p.120-121,grifosdoautor).

Assim,adignidadehumanaécláusulageraldosdireitosdepersona-lidade,tendoassimamplaproteção.

Nestecontexto,abordando-seaquestãodosdireitosdepersonalida-desobreumaperspectivacivil-constitucional,tem-seque:

Nuncasepodeesquecerdavital importânciadoart.5.ºdaCF/1988paraonossoordenamentojurídico,aoconsagrarascláusulaspétreas,quesãodireitosfundamentaisdeferidosàpessoa.Paraaefetivaçãodessesdireitos,GustavoTepedino

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defendeaexistênciadeumacláusulageraldetutelaepromo-çãodapessoahumana.Sãosuaspalavras:“Comefeito,aes-colhadadignidadedapessoahumanacomofundamentodaRepública,associadaaoobjetivofundamentaldeerradicaçãodapobrezaedamarginalização,edereduçãodasdesigual-dadessociais,juntamentecomaprevisãodo§2.ºdoart.5.º,nosentidodenãoexclusãodequaisquerdireitosegarantias,mesmoquenãoexpressos,desdequedecorrentesdosprincí-piosadotadospelotextomaior,configuramumaverdadeiracláusulageralde tutelaepromoçãodapessoahumana, to-mada comovalormáximopelo ordenamento” (TARTUCE,2017,p.98)

Destarte, de acordo com a corrente doutrinária que entende comonovoparadigmadoDireitoCivilasuaconstitucionalização3(porexemplo,Pie-troPerlingieri,GustavoTepedinoeMariaCelinaBodinMoraes),apósaCons-tituiçãode1988,asregrasconstitucionaisconstituemumaespéciedebússolaparaaaplicaçãododireitoinfraconstitucional.Aoaplicarestedireito,deve-sesempremiraraospreceitosestabelecidospelaConstituição,queguiarãoaque-lequeestáempregandooDireitonocaminhoquesepretendeosfundamentosconstitucionais.

SegundoGustavoTepedino(2009,p.9),oordenamentojurídicotememsiduascaracterísticas,quesãoaunidadeeacomplexidade.Comoeleéconstituídodenormasdediferentesníveishierárquicos,éum“sistemahetero-gêneoeaberto;e,daíasuacomplexidadeque,sóalcançaráaunidade,casosejaasseguradaacentralidadedaConstituição,quecontématábuadevaloresquecaracterizamaidentidadeculturaldasociedade.”(TEPEDINO,2009,p.10-11).

Assim,nãoéporqueumsistemapossuidiversasfontesqueperderáasuaunidade.ÉafunçãodaConstituiçãoharmonizartodasasregrassistema-tizadasparagarantiressaunidade.Exatamenteporcontadanecessidadede

3 Sobre o tema, importante ressaltar: “O processo, núcleo da metodologia conhecida como direito civil-constitucional, deu-se nos moldes propostos por Pietro Perlingieri, principal formulador desta teoria. O objetivo, na ocasião, era garantir que a onda de democracia, solidariedade e proteção à dignidade que então se iniciava atingisse também os tradicionalmente isolados campos, então verdadeiros feudos, do direito privado.” (MORAES, 2014, s.p.). Vê-se, assim, que o Direito Civil Constitucional busca, assim, a democratização e proteção da dignidade também na esfera privada.

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unidadeque,duranteaaplicaçãodasnormasaoscasosconcretosdeve-sefa-zê-lo“[...]àluzdosprincípiosemanadospelaConstituiçãodaRepública,quecentralizahierarquicamenteosvaloresprevalentesnosistemajurídico,deven-dosuasnormas,porissomesmoincidirdiretamentenasrelaçõesprivadas.”(TEPEDINO,2009,p.12).

Umdosaspectosmaisrelevantesdodireitocivil-constitucionalé

[...]aaplicaçãodiretadosprincípiosconstitucionaisàsrela-çõesprivadas,taiscomoolivredesenvolvimentodapersona-lidade,aigualdadesubstancialeodireitoàdiferença,atuteladaprivacidadeedaintegridadepsicofísicaeasolidariedadefamiliaresocial,todosreunidoseponderadosnoâmbitodoprincípiomaiordeproteçãoàdignidadedapessoahumana.(MORAES,2014,s.p.).

Tãoimportanteéapersonalidadeeosdireitosquedelaemanamquetem-secomoimportantemarcodametodologiaacimadiscutidaolivredesen-volvimentodapersonalidade,possibilitandoàpessoaoexercíciodesuaauto-nomianadireçãodesuaprópriavida.

Ressalte-sequeosdireitosdepersonalidade,aindaquetipificadosemlegislação,nãosãoconsideradostaxativos,ouseja,apenasosenumeradospeloDireito.Elesextrapolamatipificaçãoesãoconectadosaosatributosdapessoaeaformacomoessesatributossãoprojetadosnomundoreal.Assim,limitá-losseriatambémumaformadelimitaraspotencialidadesdoindivíduo.

NaIVJornadadeDireitoCivil,houveaaprovaçãodoEnunciadonú-mero274doConselhodeJustiçaFederal,quedispõequeosdireitosdeper-sonalidadesãoexpressõesdacláusulageraldetuteladapessoahumana,qualseja,adignidadedapessoahumana–art.1.º,III,daConstituição,nãoconsti-tuindoportanto,umroltaxativodeproteção,massim,exemplificativo.

Percebe-se,peloexposto,queosdireitosdapersonalidadederivamdo princípio constitucional da Dignidade da PessoaHumana, devendo serumaformadeproteçãodeindivíduo,contraaçõesquepossamferirseuidealdedesenvolvimentodapersonalidadee,assim,lhecausardanos.

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2.2 direitos da personalidade – conceituação, características e dano

Conforme a conceituação trazida por Bruno Torquato de OliveiraNaveseMariadeFátimaFreiredeSá(2017,p.18),apersonalidade,emumaperspectivaobjetiva,“[...]éumconjuntodeaspectosreferentesàpessoacon-sideradaemsimesma,ouseja,éopróprioconteúdodapersonalidadecomoqualificação.”.

Emumadefiniçãoclássica,apersonalidadeéa tidacomo“aptidãogenéricaparaadquirirdireitosecontrairdeveres.” (PEREIRA,2017,p.179).Talaptidãoéreconhecidapelaordemjurídicaatodosossereshumanos,desdeonascimentocomvida,resguardadososdireitosdonascituro.

Nomesmosentido,conceituaPontesdeMiranda(2000,p.209):“Per-sonalidade é a capacidadede ser titulardedireitos, pretensões, obrigações,açõeseexceções.”.

Apersonalidade concede ao indivíduoumaproteçãoque é funda-mentalparaaconvivênciaemsociedade.

Essaproteçãoassumeaformadedireitosdapersonalidade,quede-corremunicamentedacondiçãohumanaevisamprotegerosatributosdaper-sonalidade.

BrunoTorquatodeOliveiraNaves eMariadeFátimaFreiredeSá(2017,p.18)conceituamosdireitosdapersonalidadecomo“[...]aquelesquetêmporobjetivoosdiversosaspectosdapessoahumana,caracterizando-aemsuaindividualidadeeservindodebaseparaoexercíciodeumavidadigna.”.

Destarte,osdireitosdepersonalidadepossuemalgumascaracterísti-cas:sãoabsolutos:oponíveiserga omnes;sãogerais,ouseja,outorgadosato-dasaspessoas,pelosimplesfatodesuaexistência;sãoextrapatrimoniais,nãopossuindoconteúdopatrimonialdireto,emboraaviolaçãoataisdireitospossaserpassíveldevaloraçãoeconômica;sãoindisponíveis,jáqueemregra,nãomudamdetitularnemporvontadedoindivíduo;sãoirrenunciáveis,ouseja,otitularnãopodeabdicardeumdireitodepersonalidade;sãointransmissíveisnãosendopossívelacessãodeumdireitodepersonalidadeparaoutrosujeito,emboraestacaracterísticacomporteexceções,comonocasodacessãodedi-reitodeimagemedodireitoautoral;sãoimprescritíveis,ouseja,seuexercício

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nãoestácondicionadoaodecursodotempo,emboraapretensãodareparaçãoestejacondicionaaprazoprescricional;sãoimpenhoráveis,umavezquesãoindisponíveis,nãopodendosertambémobjetodepenhora,emboraosvaloresprovenientesdeexploraçãoeconômicadealgunsdireitos,comoodeimagem,possamserpenhorados;sãovitalícios:emregra,acompanhamseutitulardes-deonascimentoatésuamorte;sãoinsuscetíveisdeexecuçãoforçadanãode-pendendoseuexercíciodepronunciamento judicial;são limitáveispodendosofrer limitação,masestanãopodeserpermanente,nemgenérica(todososdireitos),nemviolaradignidadedeseutitular. (GAGLIANO,PAMPLONAFILHO,2016).

Para fins didáticos, constituem objeto de proteção dos direitos depersonalidade:avidaeaintegridadefísica(corpovivo,corpomorto,voz);aintegridadepsíquicaeascriaçõesintelectuais(liberdade,criaçõesintelectuais,privacidadeesegredo)eaintegridademoral(honra,imagem,identidadepes-soal).(GAGLIANO,PAMPLONAFILHO,2016)

Atutelajurídicadosdireitosdepersonalidadesedivideempreven-tiva(fazercessaraameaçaoulesão),e/oureparatória(habilitaotitularaplei-tearperdasedanos).

Atutelapreventivatrata-sedetutelainibitória,quevisaaremoçãodoilícito,sendodadosamplospoderesaojuiz.Destamaneira,“Consideraremoscomotutelainibitóriatodososinstrumentosquepermitamimpedirquealesãoadireitodapersonalidadeseconcretiza,serepitamoutenhamcontinuidade”(NAVES;SÁ,2017,p.47).Jáatutelareparatóriatrata-sedetutelacompensa-tória,notadamente,naindenizaçãopordanomoral.“Umdosefeitosdatutelarepressiva,juntamentecomaremoçãodoilícito,éareparaçãodosdanoscau-sados.Trata-sederesponsabilizarcivilmenteaquelequeviolouasituaçãosub-jetivadepersonalidade,causandoprejuízofísicoemoralaotitular.”(NAVES;SÁ,2017,p.49).

Nesta conjuntura,necessário conceituarodanoque,paraCavalieriFilho,seriaa“[...]lesão a um bem ou interesse juridicamente tutelado,qual-querquesejaa suanatureza,querse tratedeumbempatrimonial,quersetratedeumbemintegrantedapersonalidadedavítima,comoasuahonra,aimagem,aliberdadeetc.”(CAVALIERIFILHO,2015,p.103,grifosdoautor).

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Assim,qualquerlesãoabemjurídicoseriaumdano.Quandoesteafe-tadiretamenteosdireitosdepersonalidadededeterminadosujeito,teríamosodanomoral.

Conformepreceituaoartigo186doCódigoCivil“Aqueleque,poraçãoouomissãovoluntária,negligênciaouimprudência,violardireitoecau-sardanoaoutrem,aindaqueexclusivamentemoral,cometeatoilícito”(BRA-SIL,2002).

Nestesentido,necessáriosefazaconceituaçãodeatoilícito.ParaCa-valieriFilho:

Emsentido estrito,oato ilícitoéoconjuntodepressupostosdaresponsabilidade–ousepreferirmos,daobrigaçãodein-denizar.[...]Em sentido amplo, o ato ilícito indica apenas a ilicitude doato,acondutahumanaantijurídica,contráriaaoDireito,semqualquerreferênciaaoelementosubjetivooupsicológico.Talcomooatoilícito,étambémumamanifestaçãodevontade,umacondutavoluntária,sóquecontráriaàordemjurídica.(CAVALIERIFILHO,2015,p.25,grifosdoautor).

Atoilícito,assim,constituiacondutahumanacontra legem.Amorteabrupta,emrazãodeeventoprovocado,constituiatoilíci-

to,eportantoindenizável,vindoaprovocarareparaçãododanomoral.ParaMariaCelinaBodindeMoraesodanomoralconsistiriana“lesãoàdignidadehumana–emseusprincipaissubstratos,istoé,aliberdade,aigualdade,ain-tegridadepsicofísicaeasolidariedade.”(MORAES,2009,p.165).NaveseSá(2017,p.51),porsuavez,conceituamodanomoralcomo“alesãoadireitosdapersonalidadeeadireitosdefamíliapuros,aindaquedestespossamnãoadvirdor,sofrimentoouangústia.”.

Destarte, importante ressaltar quenão équalquer eventovivencia-doqueseriaconsideradodanomoral,massim,umaverdadeiraviolaçãoaosdireitosdepersonalidade.Merosaborrecimentosedissaboresfazempartedavidaedavivêncianasociedade.Nãosepoderiaimputaràessascausasostatus dedano,sobpenadebanalizaçãododanomoral.Também,adorouoaborre-cimentopodemnemestarpresentesparaaconfiguraçãododanomoral.

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Seconceituarmosdanomoralapartirdessavertentepsico-lógicaficamosàmercêdapermeabilidadesubjetivadapes-soaaosentimentonegativo.Pessoassensíveispoderiamfa-cilmente sentir-se lesadas em razãoda frequência comquesurgemsensaçõesruins.Poroutrolado,nessalinhaderacio-cínio,pessoasemcomanãosofreriamdanomoralàhonra,poisnelasnãosedespertariaosofrimentoouahumilhaçãodaofensa.(NAVES;SÁ,2017,p.51).

Assim,nosdizeresdeCahali,odanomoralseria:

Tudoaquiloquemolestagravementeaalmahumana,ferin-do-lhegravementeosvalores fundamentais inerentesà suapersonalidadeou reconhecidospela sociedade emque estáintegrado, qualifica-se, em linha de princípio, como danomoral; não há como enumerá-los exaustivamente, eviden-ciando-senador,naangústia,nosofrimento,natristezapelaausênciadeumentequeridofalecido;(...)nadepressãoounodesgastepsicológico,nassituaçõesdeconstrangimentomo-ral.”(CAHALI,2005,p.22-23.)

Entende-sepordanomorallesãoqueatingeopsíquicodavítima,le-sãoqueatingebensevalorespessoaisquesãoprotegidospeloordenamentojurídicocomoosdireitosdepersonalidade(aimagem,obomnome,aintimi-dade,privacidade,liberdade,saúde,integridadepsicológica).

JáAdriano StanleyRocha Souza,AndréaMoraesBorges eAndréaGouthierCaldaspreceituamque:

Odanomoralé,dentretodos,talvezoquetragaaohomemmaiordor.Sejapormaculadaasuahonra,abaladooseucré-dito,sejapelaimagemveiculadaemsituaçõesvexatórias,sejapeladecorrênciadedeformidadefísicacapazdecolocá-loemdesconfortojuntoàsociedade.Todasessashipótesesgeramaohomemtodaasortedesentimentosquemaisoatemori-zam.E,nãoraro,odanomoralseprolongaatéaesferamate-rial,causandoàvítimademaisprejuízos.(SOUZA;BORGES;CALDAS,2013,p.1)

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Sendoassim,odanomoralnãopodesermensuradoporsimplescál-culomatemáticoobtidonasubtraçãodoquesetinhaantesdodanoeoquesetemapósodano,vezquenãosepodemensurarmatematicamenteador,osofrimentoeodesconfortosentidopelavítima.

A indenizaçãodevidapeloagenteéumacompensaçãopelaofensaaobem jurídicoprotegido.Comoé impossível retornarao status quo ante, a reparaçãoseriaimpossível,cabendo,apenasacompensaçãopelodanosofrido.

Namedidaemquenãosetemumcálculoexatodadimensãododanomorale,comoaindenizaçãomede-sepelodano,suacompensação,deveobe-decer ao princípio da equidade onde a reparação não deve ser tão grave apontode fazer comqueoofensorpague alémdo razoável e concretizandoenriquecimentosemcausadoofendido;enemtãobrandaapontodoofendidonãosesentirressarcidocomacompensaçãopecuniária.

Mas,umavezqueodanomoralseriaperpetradocontraapersonali-dadededeterminadapessoa,surgeumaquestão:estedanocontracertapes-soa, seria capazde atingir outraspersonalidadesquenão adodiretamenteatingido?Éoqueserávistoaseguir.

3. dano ReFleXo Pela moRte – ConCeIto e leGItImaÇÃo

ConformeoCódigoCivil,osdireitosdepersonalidadeiniciamcomonascimentocomvidaeterminamcomamorte.Nestecontexto,quemsofreriaentãoodanodamorte:ofalecidoouseusparentes?

Osdireitosdapersonalidadecontinuamasertuteladosmesmoapósamorte.Obviamente,nãoháquesefalaremdanoapersonalidadedomorto,poisestemorreuenãopossuimaispersonalidade.NaveseSálecionamque“Não se tratamaisdeumdireitodapersonalidade,propriamente, já que amortepôsfimàpersonalidadeecomelaaodireitodapersonalidade.”(NA-VES;SÁ,2017,p.54).Econtinuamosautores,mencionando:“Há,noentanto,uma repercussão importante socialmente e resguardada pelo ordenamento,queconsistenumaesferadedeverdeabstençãoe,seinfringida,mereceprote-ção”.(NAVES;SÁ,2017,p.54).

Saliente-seaindaquesetrataaquidedestacaramorteviolenta,abrup-

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ta,quefogeàscausasnaturais.Considerandoestasituação,seriapossíveldizerqueamorterepentinaeprovocadaporoutremécapazdecausardanoaparen-teseamigosdomorto?

Arespostaésim,atravésdodanoreflexo.

3.1. Conceito de dano reflexo

Noschamadosdanos reflexos, tambémconhecidospor“danosporricochete”,tem-seaofensadiretaaumbemjurídicoeofensaindiretaabemjurídicodeterceiro.

Assim,conformedestacaCavalieriFilho:

Osefeitosdoato ilícitopodemrepercutirnãoapenasdire-tamente sobre a vítima,mas também sobrepessoa interca-lar,titularderelaçãojurídicaqueéafetadapelodanonãonasuasubstância,masnasuaconsistênciaprática.[...]somen-teodanoreflexocertoequetenhasidoconsequênciadiretae imediatada conduta ilícitapode serobjetode reparação,ficando afastado aquele que se coloca como consequênciaremota,comomeraperdadeumachance.(CAVALIERIFI-LHO,2015,p.148).

Assim,ter-se-ianodanoreflexo,nomínimo,trêspartes:“a)oagentecausadordedano;b)avítimaatingidadiretamentenapráticadoatoilícito;c)terceirapessoa,queseviuprejudicada,diantedealgumtipodeincapacidadesofridapelavítima.”(NADER,2015,p.84).

Exemplifica-se:AcausouumdanoaB.Cseviuprejudicadoemvir-tudedodanocausadoporA,quenãoatingiudiretamenteaC.Csofreuumdanoreflexo.ÉcomoseodanosofridoporBrefletisseemC,ou,ainda,odanosofridoporBricocheteoueatingiuC.

DeacordocomCahali,odanoreflexoàmorteéplenamentejustifica-do,umavezque:

Seria até mesmo afrontoso aos mais sublimes sentimentoshumanosnegar-sequeamortedeumentequerido,familiarou companheiro, desencadeia naturalmente uma sensação

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dolorosade fácileobjetivapercepção.Porserdesensoco-mum, a verdade desta assertiva dispensa demonstração: amorte antecipada em razãodoato ilícitodeumserhuma-no de nossas relações afetiva, mesmo nascituro, causa-nosumprofundosentimentodedor,depesar,defrustração,deausência,de saudade,dedesestímulo,de irresignação. Sãosentimentos justoseperfeitamente identificáveisdamesmaforma que certos danos simplesmente patrimoniais, e queserevelamcommaioroumenorintensidade,masqueexis-tem.No estágio atual de nosso direito, com a consagraçãodefinitiva, até constitucional, do princípio da reparabilida-dedodanomoral, não mais se questiona que esses sentimentos feridos pela dor moral comportam ser indenizados; não se trata de ressarcir o prejuízo material representado pela perda de um familiar economicamente proveitoso, mas de reparar a dor com bens de natureza distinta,decarátercompensatórioeque,dealgumaforma,servemcomolenitivo”(CAHALI,2005,p.111).

ConformeSilviodeSalvoVenosa, apenasosdanos reflexosprove-nientesdamorteseriamindenizáveis:“[...]Emprincípio,osdanoscausadosreflexamentenãodevemserindenizados.Aúnicaexceçãoabertapelaleiéaindenizaçãodecorrentedemorte,admitindo-sequesejapleiteadaporaque-lesqueviviamsobsuadependênciaeconômica(art.948,II;antigo,art.1.537,II).[...].(VENOSA,2003,p.31.).ÉnessemesmosentidooposicionamentodePauloNader(2015,p.84),quemencionaque“Ajurisprudênciaépacíficaaoreconhecerapossibilidade,quandoavítimaeraresponsávelpelosustentodeoutrem.”.Contudo,oautorfazumaacautela:“Oqueésuscetíveldediscussão,emjuízo,éaexistênciaounãododanoreflexonocasoconcreto,istoé,seodanodiretamentecausadoàvítimacaracteriza,também,umdanonahipótesesub judice.”(NADER,2015,p.84,grifosdoautor).

Mattos,citadoporQueirozNeto,esclareceaindaque:

Tratam-seosdanosmoraisreflexosdeespéciediferenciada,vez que enquanto os danosmorais são, em regra, ofensasdiretas à integridade física oupsíquicadapessoahumana,hipóteseshádeseatingir,porviareflexa,indiretamente,ter-ceirapessoa,impingindo-lhedanosmorais,porversuainte-

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gridademoralnotoriamenteabaladadiantedaofensaàbemjurídicodequeguardarelação,consubstanciando-se,noqueadoutrinafrancesachamadeparricochete,ouseja,danosàricochete,danosindiretos,reflexos,ondehádoisbensjurídi-cosofendidos,sendoodano diretamenteocorridoda lesãodeum,quegeraooutro[...],gerandoaobrigaçãodereparartodososdanoscausadosatítulopróprio,como,naliteraturapátria, lembra-nossobreosdanosreflexosotratadistaCaioMáriodaSilvaPereira.[...]deve-seconsiderar,queapesardedanoreflexo,talhipóteseédelegitimidadepordano quelheécausadodiretamente,porofensaasuapazmental,tratando-se,portanto,de‘prejuízodi-reito’àsuasaúdemental,comosepodeverificarclaramente,porexemplo,nocasodedanomoralcausadoaumamãeporverserofilhoatropelado,sofrendoumadepressãonervosa”(MATTOSapudQUEIROZNETO,2009,p.147/157).

Assim,alguémquenão tenhasofridodiretamenteuma lesãoasuapersonalidade,pode,noentanto,alegarqueofatodanosonelesereflete.Des-taque-se ainda que o direito de açãodo indiretamente lesado é distinto dodiretamentelesionado.

3.2. legitimação

Háquementendaqueareparaçãododanonãoestásubmetidaane-nhumaregrasucessóriaouprevidenciária.Ésabidotambémquemuitasvezeslaçosdeamizadesuperamlaçosdeparentesco,vezqueosentimentonãoestáligadoaosangue,masaumasériedefatoresemocionais.Entãosurgeoproble-ma:quaisseriamoslegitimadosparapleitearaindenizaçãopelosdanossofri-doporricochete?Entende-sequenafaltadedispositivolegalespecífico,pelautilizaçãodoroldoCódigoCivil,artigo948,II4;artigo125,parágrafoúnicoe

4 Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:I - no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;II - na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima. (BRASIL, 2002).

5 Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau. (BRASIL, 2002).

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artigo20,parágrafoúnico6.Poresteentendimento,haveriaapresunçãododanoefetivamenteso-

fridocomamortedeparente,causadaporato ilícito,sendodesnecessáriaaprovaefetivadodanomoralsofrido.Talentendimentoé,noentanto,relativi-zadoemdeterminadoscasos,comoporexemplo,noscasosemqueoscônjugesestãoseparadosdefato,quandodamorteabruptadeumdeles.Osdemaisquesesentiremlesadospelamortededeterminadapessoa,causadaporatoilícito,deverãoprovarodanoefetivamentesofridoemvirtudedamorte.

Nessesentido,odanoreflexodecorredoprejuízoqueemanadireta-mentedodano.Ademais,“osatingidosporricocheteagemporcontaprópriaenãoemnomedavítimaparaoressarcimentodosprejuízospessoaisqueso-freram.Assuasaçõessãointeiramentediversasdasaçõesatribuídasàvítimainicialouaseusherdeiros.”(MAZEAUD;MAZEAUD;TUNC,1961).

EoSuperiorTribunalde Justiçacorroboracomesteentendimento,conformesepodeextrairda leiturado julgadoabaixo, referenteaoRecursoEspecialnº530.602/MA:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃOAO ARTIGO 535, II, DO CPC NÃO CARACTERIZADA..AÇÃO REPARATÓRIA. DANOS MORAIS. LEGITIMIDA-DEATIVAADCAUSAMDOVIÚVO.PREJUDICADOIN-DIRETO.DANOPORVIAREFLEXA.I–[...].II-Emsetratandodeaçãoreparatória,nãosóavítimadeumfatodanosoquesofreuasuaaçãodiretapodeexperimentarprejuízomoral.Tambémaquelesque,deformareflexa,sen-temosefeitosdodanopadecidopelavítimaimediata,amar-gandoprejuízos,nacondiçãodeprejudicadosindiretos.Nes-sesentido,reconhece-sea legitimidadeativadoviúvoparaproporaçãopordanosmorais,emvirtudedeteraempresa

6 Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibi-das, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. (Vide ADIN 4815)Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. (BRASIL, 2002).

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rénegadocoberturaaotratamentomédico-hospitalardesuaesposa,queveioafalecer,hipóteseemquepostulaoautor,emnomepróprio,ressarcimentopelarepercussãodofatonasuaesferapessoal,pelosofrimento,dor,angústiaque indi-vidualmenteexperimentou.Recursoespecialnãoconhecido.(BRASIL,2003).

Sobre o tema, é importantedestacar o ensinamentodeCaioMarioPereira“[...]todasessassituaçõespodemserenfeixadasnumafórmulaglobalounumprincípiogenérico:têmlegitimidadeativaparaaaçãoindenizatóriaaspessoasprejudicadaspeloatodanoso.”(PEREIRA,2003,p.241).

Ademais,nocasododanodamorte,nãosepodepleitearemnomepróprio,direitoalheio.Naverdade,pleiteia-sea lesãosofridapessoalmente,emvirtudedamorteabruptadeumentequerido,causadaporatodeterceiro.ConformelecionaTheodoroJúnior”[...]alegitimaçãoativacaberáaotitulardointeresseafirmadonapretensão[...]”.(THEODOROJÚNIOR,2000,p.51).

Destafeita,odanoreflexoépleiteadoparacompensaroprejuízoqueaprópriapessoateveemvirtudedoatodanosocometidocontraoutrem.

4 RePaRaÇÃo CIvIl ou vInGanÇa? natuReZa da IndenIZaÇÃo PoR danos moRaIs ReFleXos à moRte - ComPensaÇÃo VERSUS PunIÇÃo

Areparaçãocivildodanomoralreflexoamortetemsidocadavezmaisdiscutida,principalmentenosTribunais.Todososdias,milharesdepes-soasingressamjuntoaojudiciáriocomaçõespleiteandoindenizações,comoargumentodequetiveramseudireitodepersonalidadelesadoindiretamenteporcontadamorterepentinadeumentequerido,causadaporumacidentedetrânsito,aquedadeumavião,dentreoutrosincidentes.

OSuperiorTribunaldeJustiçavemreconhecendoodireitoàspessoasquepleiteamessasações.Veja-sedecisãorecente:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.AÇÃODEINDENIZAÇÃOPORDANOMORAL PURO.

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DIVULGAÇÃODENOTÍCIAEMPROGRAMADETELE-VISÃO.MATÉRIAJORNALÍSTICADECUNHOOFENSI-VOÀVÍTIMADIRETA.DANOMORALREFLEXO.POSSI-BILIDADE.RECURSOESPECIALIMPROVIDO.1.Conquantoalegitimidadeparapleitearareparaçãopordanosmoraisseja,emprincípio,dopróprioofendido,titu-lardobemjurídicotuteladodiretamenteatingido(CC/2002,art.12;CC/1916,arts.75e76),tantoadoutrinacomoajuris-prudênciatêmadmitido,emcertassituações,comocolegiti-madastambémaquelaspessoasque,sendomuitopróximasafetivamenteaoofendido, se sintamatingidaspelo eventodanoso,reconhecendo-se,emtaiscasos,ochamadodanomo-ralreflexoouemricochete.2.Odanomoralindiretoourefle-xoéaqueleque,tendo-seoriginadodeumatolesivoaodireitopersonalíssimodedeterminadapessoa(danodireto),nãoseesgotanaofensaàprópriavítimadireta,atingindo,deformamediata,direitopersonalíssimodeterceiro,emrazãodeseuvínculoafetivoestreitocomaquelediretamenteatin-gido.3.Mesmoemsetratandodedanomoralpuro,semne-nhumreflexodenaturezapatrimonial,épossívelreconhecerque,nonúcleofamiliarformadoporpai,mãeefilhos,osen-timentodeunidadequepermeiataisrelaçõesfazpresumirqueaagressão moral perpetrada diretamente contraumdelesrepercutirá intimamentenosdemais,atingindo-osemsuaprópriaesferaíntimaaoprovocar-lhesdoreangústiadecorrentes daexposiçãonegativa,humilhanteevexatóriaimposta,diretaouindiretamente,atodos.4.Recursoespecialimprovido.(BRASIL,2017).

Oassuntoemvogamerecediscussõesmaisaprofundadas,vezqueemborapraticamentepacificadojuntoaosTribunaisqueodanomoralreflexoamorteépassíveldereparaçãonaesferacivil,háqueseanalisarseoqueestásendopleiteadopormeiodoDireitoCiviléacompensaçãododanodamorte,ouumapuniçãodoagentecausadordodano,travestidadecompensação.

Daanálisedosfundamentosatuaisdaconcessãodeindenizaçõesnaesferacível,nítidoéocaráterpunitivodareferidaindenização,conformesepercebeatravésdaexpressão“caráterpunitivo-pedagógicodaindenizaçãopordanosmorais”,amplamentedifundidonosacórdãosdosTribunaisEsta-

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duais, Federais e Superiores nopaís. Emuitosdoutrinadoresdesfrutamdomesmoentendimento,comoéocasodePereira,quepreceituaquenocasodaindenizaçãopordanosmorais,dois são os aspectos a serem observados:

a)Deumlado,aidéiadepuniçãoaoinfrator,quenãopodeofenderemvãoaesferajurídicaalheia[...];b)De outro lado proporcionar a vítima uma compensaçãopelo dano suportado, pondo-lhe o ofensor nas mãos umasomaquenãoépretium doloris,porémumaensanchaderepa-raçãodaafronta.(PEREIRA,2003,p.242).

Ora,a indenizaçãopordanosmorais,enocasodopresenteartigo,pelosdanosmoraisreflexosamorte,nãoseprestaapunir.Comoasdemais,serveapenasparacompensarodano,principalmentenocasododanodamor-te, irreversívelpornatureza.Comonãoépossívelarestituiçãodostatus quo ante,nãorestaoutraalternativa,senãoafixaçãodeindenizaçãocomoobjetivodecompensaroincompensável.

Migliore, assevera sobreaquestãoda reparaçãododanodamorteque:

[...]searesponsabilidadecivilbuscareparar,istoé,corrigir,restabelecer[...],épreciso lembrarquetal indenizaçãoédetodoimpossível,umavezqueesseéofatopornaturezairre-versível,pelomenosaosolhoscéticoseracionaisdalei,quenãoconhececrençasourituaissobrenaturaisdoalém-túmu-lo.Emoutraspalavras,trata-sededanoevidentementeirre-parávelpornatureza,afinal,conquantodesejássemosmuitoterdomíniosobreodesconhecidoelixirdavida,nãosetemcomo,umavezconsumadoodanodamorte,retornaraostatu quo ante,peloquesuareparaçãoserásemprecompensatória,pecuniária,comoformaalternativadeindenizarumaperdaque não pode, verdadeiramente ser avaliada. (MIGLIORE,2009,p.19).

Assim,acredita-sequeofundamentoparaareparaçãodeveserodi-reitodepersonalidadevioladoporvia reflexa e, emvirtudedo caráterqueassume os danos morais, de natureza extrapatrimonial, não existiria outra

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formadeseretornaraostatus quo ante senãomediantereparaçãopecuniária.Entretanto,háquesefrisarquetalindenizaçãonãoseprestaapunir,mastãosomenteacompensarodano,comojátratadoanteriormente.Mas,nemsem-preestainterpretaçãoprevalecenostribunais,quefrequentementeelevamasindenizaçõescomonítidointuitodebscarumapunição.

ParaumamelhorcompreensãodocaráterpunitivoquevemsendoutilizadonoDireitoCivilBrasileiro comoargumentopara elevar as indeni-zaçõespordanosmorais,importantedestacaroconceitodedanospunitivos,conformeliçãodeAdrianoStanleyRochaSouza:“Punitive damages,oudanospunitivos,sãoaspuniçõesqueodireitoanglo-saxãoimpõeaocausadordeumdano.Nãoprecisaserestedano,necessariamentemoral.Oseu fundamentonãoéoutrosenão,comodizopróprionome,servirdepuniçãoaoofensor.”(SOUZA,2017,p.5).

Continuando seus ensinamentos, Souzamenciona que o institutodospunitive damages foi importadodoDireitonorte-americano,ondeé co-mumocorrerosdanospunitivos,comumasentençadecaráterdúplice–civilepenal:

Os punitive damagesocorremnoDireitonorte-americano.Umsistemajurídicobemdiferentedonosso.[...]Osistemajurí-diconorte-americanoadmitealgoabsolutamenteimpensávelparaonossosistema:conjugaremumamesmasentença,umacondenaçãodecarátercivil(reparação)eumacondenaçãodecaráterpenal(punição).(SOUZA,2017,p.6).

Seguindoomesmoraciocínio,MariaCelinaBodindeMoraesexpli-caque:

[...]hádanosquesãopassíveisdeindenizaçãoemdetermina-dospaísesenãoosãoemoutros,emborasetratedesistemasjurídicosdamesmafamíliaemuitosemelhantesentresi.Éoqueocorre,porexemplo,comochamado“danodamorte”ou“danoàperdadavida”,emrelaçãoaoqualnãohá,entrenós,qualquercompensação[...].(MORAES,2009,p.21).

Econtinua:

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Umadessasfunçõesédeserreconhecidaaosdistintivos“pu-nitivo”,“exemplar”ou“punitivo-pedagógico”,que,comoénotório,têmpairadonamotivaçãodassentençasedosacór-dãosreferentesàindenizaçãopordanomoral.Édeseressal-tarqueestas funçõesdecorrem,unicamente,da construçãojurisprudencialacercadamatéria,semembasamentonorma-tivoespecífico.[...]Alémdisso, em sistemas como o nosso, reconhecer a exis-tênciadeumcaráterpunitivorepresentariaumaimportanteexceçãoaoprincípiodaequivalênciaentredanoereparação.[...]Afunçãopunitivanareparaçãododanomoral,todavia,in-sere-senumaproblemáticamais específica e tortuosa: adaavaliaçãoeliquidaçãododanomoral.[...]Nãoseconsidera,comumente,quesejaatribuívelaoDireitoCivilumafunçãopunitiva,pertinenteapenasaoDireitoPe-

nal.(MORAES,2009,p.25,29,36).

Anteoexposto,pode-seobservarqueodebateacercadanaturezadaindenizaçãopordanosmoraisreflexosàmorteestáemaberto,emuitoaindaprecisa ser construídopelosoperadoresdodireitoparaesclarecer institutosquevêmsendoutilizadosdemaneiraequivocada,semqualquerembasamentoteóriconoDireitoCivilBrasileiro.

5 ConsIdeRaÇÕes FInaIs

Atravésdodebatedotemaexpostonesteartigo,torna-senítidaane-cessidadedaconstruçãodebasesteóricasparaafundamentaçãoeexplicaçãode institutosquevêmsendo interpretadospela jurisprudênciaeporalgunsdoutrinadoresdemaneiraequivocada.

Quandoocorre amorte, nãohá como se restituir o status quo ante.Nesta situação,a indenizaçãopelosdanosmorais reflexoscausadosserviriaapenasparacompensarador,atenuarosofrimento.Talindenizaçãonãopo-deriaserutilizadacomoumapena,umapuniçãoaoagentecausadordodano.

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Istoacabadeturpandoanaturezajurídicadoinstituto.Noordenamentopátriovigente,háumaseparaçãoentreoDireitoPenal,quetemcaráterpunitivo,eoDireitoCivil,quetrata,porexemplo,dasrelaçõesexistenciais,direitospa-trimoniais,posseepropriedade.Muitoemboraoativismojudicialestejaemevidênciaatualmente,nãosepodeperderdevistaopapeldopositivismo,quetrazsegurançajurídicaparaasociedade.Entretanto,oquesevêatualmentesãopessoas,queingressamcomaçõesdecunhocivilbuscandoindenização,pleiteandonaverdade,umapuniçãodeordemfinanceira,aoagentecausadordodanomorte,queatingiudiretamenteumentequeridoseu,eacabouporatingi-loindiretamente,ouseja,porricochete.

Neste contexto, a justificativa para o pagamento de indenizaçõespordanomoral,assumeumafundamentaçãodissociadadoDireitoPátrio,atravésdaimportaçãodeinstitutosdoDireitoAmericano,notadamente,ospunitive damages.

Assim,osTribunaisconstruíram,pormeiodesuasprópriasdecisões,justificativasparaembasaras indenizaçõesconcedidas,eadoutrina, secalaacercadotema.Algunsdoutrinadores,surpreendentemente,concordamcomasjustificativasjurisprudenciais,fortalecendoassimapopularmentechamada“IndústriadoDanoMoral”.

SeaoDireitoPenalfoidadaafunçãopunitiva,oDireitoCivildeveapenassepreocuparcomquestõesnão-penais.Entretanto,oqueseobserva,équemuitasaçõespordanomoralreflexoàmorte,assumemocaráterdever-dadeirasvinganças, comnítidapretensãopunitiva, semembasamento legalpátrioparatanto.

Destarte,aimportaçãoequivocadadeinstitutosdoDireitoAmerica-no,sendoincorporadossemqualquercuidadoaoDireitoPátrio,eaaceitaçãoporpartedadoutrina,quesecalaemuitasvezesconcordacomasjustificativasapresentadasparaembasaras condenaçõesnoâmbito civilpelosTribunais,notadamente no que se refere aodanomoral, trazemmuita instabilidade àsociedade.

Oquesepretendenaacademia,éaconstruçãodeteoriasqueserãoaplicadasnaprática.Entretanto,oquesevêatualmente,éumainversãototal,emqueaprática,muitasvezesequivocada,substituiateoria,criando“anoma-

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liasjurídicas”,jogandoporterra,doutrinaelegislação.Esteartigovisadefenderaindenizaçãopordanosmoraisreflexosa

morte comomeramente compensatória, sem qualquer caráter punitivo, emquepeseainterpretaçãocontráriaaplicadaprincipalmentepelajurisprudên-cia.Ora,nãosepodeperderdevistaaessênciadaindenização,vistoqueemsentidoinverso,poderiahaververdadeirobis in iden,compuniçãodupla,naesferacívelepenal.

6 ReFeRÊnCIas

BRASIL. Constituição (1967). Constituição da República Federativa do Brasil de1967(RedaçãodadapelaEmendaConstitucionalnº1,de17.10.1969).Diário Oficial da união,Brasília,20out.1969.Disponívelem:<http://www.planalto.gov.br/cci-vil_03/constituicao/constituicao67emc69.htm>.Acessoem:25abr.2018.

BRASIL.Leinº10.406de10dejaneirode2002.InstituioCódigoCivil.Diário Ofi-cial da união,Brasília,11jan.2002.Disponívelem:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm>.Acessoem:08abr.2018.

BRASIL.SuperiorTribunaldeJustiça.RecursoEspecial530.602/MA.Relator:Mi-nistroCastroFilho.diário da Justiça,Brasília,17nov.2003.

BRASIL.SuperiorTribunaldeJustiça.RecursoEspecial1119632/RJ.Relator:Minis-troRaulAraújo–QuartaTurma.diário de Justiça eletrônico,Brasília,12se.2017.

CAHALI,YussefSaid.dano moral.3.ed.rev.,ampl.eatual.SãoPaulo:RevistadosTribunais,2005.

CAVALIERIFILHO,Sérgio.Programa de responsabilidade civil.12ed.RiodeJa-neiro:GrupoGEN,2015.[e-book]

FERNANDES,BernardoGonçalves.Curso de direito Constitucional. 6. ed. rev.,ampl.eatual.Salvador:Juspodivm,2014.

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