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Democracia e o início da sua perda de credibilidade: Um estudo de caso da América Latina Luana Karla Andrade Macêdo 1 RESUMO: Esse artigo tem como objetivo conduzir uma análise acerca da democracia, expondo algumas contradições e pressões existentes em regimes democráticos, levando em conta as desigualdades crescentes vindas através do capitalismo e de instituições neoliberais, ademais das dificuldades existentes para chegar a uma democracia mais concreta. Também, a partir desse estudo, é tratado como foco a queda na credibilidade da democracia, demonstrando essa afirmação por um estudo visto pelo ponto de vista da América Latina, que desde a forte influência de regimes militares até a transição à democracia, sofrem com falta de apoio político e econômico em manter um regime democrático concreto. Para isso é utilizado, também, de dados em forma de tabelas e gráficos. Palavras-chave: Democracia. América Latina. Democracia plena. Movimentos antissístêmicos. Democracia capitalista. Regime político. ABSTRACT: This article aims to conduct an analysis of democracy, exposing some contradictions and pressures that exist in democratic regimes, taking into account the growing inequalities that come through capitalism and neoliberal institutions, in addition to the difficulties that exists in achieving a more concrete democracy. This study also focuses on the fall of democracy credibility, demonstrating this statement with a study from the Latin America point of view, that since the strong influence of military regimes until the transition to democracy, suffers political and economic absense of support to maintain a concrete democratic regime. For verification purposes is also used data in form of tables and graphs. Keywords: Democracy. Latin America. Full democracy. Antisystemic movements. Capitalist democracy. political regime. 1. INTRODUÇÃO O presente estudo trará um importante assunto dentro da contemporaneidade. A democracia aparece como uma instituição ideal para a 1 Graduanda em Relações Internacionais pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) [email protected]

Democracia e o início da sua perda de credibilidade: Um estudo … · 2019. 10. 18. · O terceiro e último ponto, é o crescimento da democracia após a Segunda Guerra onde essa

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Democracia e o início da sua perda de credibilidade: Um estudo de caso da América Latina

Luana Karla Andrade Macêdo1

RESUMO: Esse artigo tem como objetivo conduzir uma análise acerca da democracia, expondo algumas contradições e pressões existentes em regimes democráticos, levando em conta as desigualdades crescentes vindas através do capitalismo e de instituições neoliberais, ademais das dificuldades existentes para chegar a uma democracia mais concreta. Também, a partir desse estudo, é tratado como foco a queda na credibilidade da democracia, demonstrando essa afirmação por um estudo visto pelo ponto de vista da América Latina, que desde a forte influência de regimes militares até a transição à democracia, sofrem com falta de apoio político e econômico em manter um regime democrático concreto. Para isso é utilizado, também, de dados em forma de

tabelas e gráficos.

Palavras-chave: Democracia. América Latina. Democracia plena. Movimentos

antissístêmicos. Democracia capitalista. Regime político.

ABSTRACT: This article aims to conduct an analysis of democracy, exposing some contradictions and pressures that exist in democratic regimes, taking into account the growing inequalities that come through capitalism and neoliberal institutions, in addition to the difficulties that exists in achieving a more concrete democracy. This study also focuses on the fall of democracy credibility, demonstrating this statement with a study from the Latin America point of view, that since the strong influence of military regimes until the transition to democracy, suffers political and economic absense of support to maintain a concrete democratic regime. For verification purposes is also used data in form of tables and graphs. Keywords: Democracy. Latin America. Full democracy. Antisystemic movements. Capitalist democracy. political regime.

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo trará um importante assunto dentro da

contemporaneidade. A democracia aparece como uma instituição ideal para a

1 Graduanda em Relações Internacionais pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) [email protected]

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sociedade, mas nas últimas décadas alguns autores vêm mostrando grande

contradições vindas desse regime. Muitas das vezes apenas grandes potência

com tradições democráticas lutam tanto para conseguir implementar e espalhar

esse regime a sua maneira. O mais importante é analisar e entender qual o

principal interesse por trás dessa grande procura disfarçada de preocupação,

que as grandes potências disseminam aos países em desenvolvimento, sendo

esse a principal finalidade deste estudo.

Objetiva-se mostrar a democracia atual, denominada Democracia dos

modernos, onde o mais levado em conta são os princípios liberais e esse por

sua vez é diretamente ligado a propriedade privada e o “ser proprietário” se torna

uma condição para ser cidadão. A democracia e o liberalismo, antes visto como

uma barreira à uma democracia plena, hoje formam a Democracia liberal

(CABRAL NETO, 1997, p. 291 – 292)

Os países em desenvolvimento passam por dificuldades que demandam

alternativas especificas por parte dos governos, mas graças a esse ideal

democrático essas alternativas se tornam distantes. Existe hoje um grande

apreço à democracia por parte das potências que não é mais tão apoiada por

uma, cada vez mais crescente, parte da população, que não acredita mais nesse

regime.

Um forte exemplo dessa situação é visto nos Estados latino-americanos

os quais ainda sofrem de grandes influências das potências e com isso acabam

por tomar decisões não tão precisas levando a uma cada vez maior fragilidade

do Estado e a perca de confiança da população, principalmente por aquelas mais

à margem da sociedade e que sofrem mais com problemas mais típicos da

desigualdade social.

O objetivo desse estudo é caracterizado pela análise do regime

democrático contemporâneo, passando inicialmente por um contexto histórico,

indo para um estudo em relação as contradições pelas quais o regime

democrático passa para tentar ser implementado de maneira plena e então, por

fim, focando na temática a partir do estudo da América Latina.

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A metodologia utilizada nesse estudo é, quanto à natureza, uma pesquisa

básica, sem uma finalidade imediata; quanto aos objetivos é descritiva,

analisando dados e apresentando o objeto de estudo; quanto à abordagem do

problema é uma pesquisa quali-quantitativa, trazendo análises e dados

relacionados ao regime democrático no mundo e na América Latina; e por fim,

esse estudo utiliza de pesquisa bibliográfica, valendo-se de estudos prontos para

enriquecer e embasar a análise, e é um Estudo de caso, trazendo situações

vividas dentro do contexto da América Latina.

O primeiro tópico do desenvolvimento desse estudo visa trazer uma

contextualização acerca do regime democrático e apresentar uma primeira forma

de erosão da democracia, o populismo antissistêmico. Visto isso, o segundo

tópico do desenvolvimento busca expor, em primeiro ponto, sobre a

consolidação da democracia no mundo, focando, principalmente em materiais

escritos por Eric Hobsbawn. E em segundo ponto, a perda de confiabilidade do

regime democrático, a partir de análises de tabelas comparativas entre os anos

de 2008 e 2017, sobre os índices de democracia por tipo de regime. Então, é

chegado no último tópico do desenvolvimento, que foca no Estudo de caso, a

América Latina, também trazendo análise de tabela e de gráfico. Por fim, a

conclusão visa trazer um desfecho e uma revisão do estudo.

2. DEMOCRACIA

Dentro da democracia existem estudiosos que a veem como um poder

direto do povo, enquanto outros estudiosos entendem a democracia como um

mecanismo para facilitar a elaboração de decisões, com a eleições de

representantes. Essas visões levaram à um conflito e originaram três modelos

da teoria democrática. O primeiro que se refere a um regime visto na Grécia

antiga e defende um modelo participativo direto. O segundo, mais conhecido

como regime moderno, defende a eleição de representantes, sendo um modelo

de democracia liberal. O terceiro, visto na união soviética, sociedades da Europa

orienta e outros, traz a democracia como um modelo unipartidário. (HELD, 1995)

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Se embasando em David Held (1995), pela década de 90 o regime

democrático liberal foi tido como o agente de prosperidade, como o regime mais

viável, em conjunto com o capitalismo como único modelo econômico possível.

Mas mesmo dentro dessa concepção existe uma ressalva sobre a democracia

liberal não ser considerada uma unidade, essa, nas sociedades contemporâneas

se baseiam no encontro entre forças nacionais e internacionais.

Assim, desde o final de século XX o regime democrático foi presenciado

como um grande avanço ao mundo, um regime vitorioso sobre outras

alternativas possíveis e cobrado aos países que não o seguem, ademais sendo

utilizado como um pré-requisito para entrada em diversas organizações e até

mesmo para blocos econômicos, como a União Europeia, com os critérios de

Copenhague e o Mercosul, com o Protocolo de Ushuaia. Mas o surgimento de

desenvolvimentos institucionais em novas democracias, somado a populismos

antissistêmicos em antigas democracias, parece estar trazendo um pessimismo

em relação ao futuro desse regime (DIAS, 2016).

Em "Sobre <<Desconsolidação>> e Retrocesso Democrático" de António

Dias, é falado sobre a definição desses termos, retrocesso e “desconsolidação”,

em “processos de debilitação ou eliminação de uma instituição basilar para o

regime democrático protagonizados por um ator estatal.” e em como esta

consegue englobar os diferentes casos de erosão da democracia. (DIAS, 2016,

p. 31). Dentro disso, o autor traz o chamado populismos antissistêmicos como

como uma das fontes para essa erosão e como essa erosão leva a fragilização

de instituições democráticas.

O termo "movimentos antissistêmicos" foi primeiro utilizado por Immanuel

Wallerstein na segunda metade do século XX para se referir a dois movimentos

sociais que imperavam na época, o movimento socialista e os movimentos

nacionais. A partir de então, com mudanças no seio teórico, o termo foi se

alastrando dentro de grupos militantes como oposição ao capitalismo e dentro

de estudos como análise a contestação ao sistema capitalista contemporâneo.

Por fim, o termo "movimentos antissitêmicos" atualmente, engloba uma forte

crítica a atividade política do homem, indo além do anticapitalismo e indo para

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uma política classista e a democracia imposta por essa. A democracia é vista,

nessa vertente, como uma dominação de uma classe sobre outra e o poder nas

mãos da elite. (ROJAS, 2013)

3. DEMOCRACIA NO MUNDO

Foi pelo século XX que a democracia começou a criar maiores raízes e

se a consolidar no mundo. Hoje esse regime é tido como essencial e é alvo de

diversas pesquisas e estudos. Além de ser altamente defendido por diversas

correntes teóricas. Dito isso, é importante fazer uma análise acerca de tal

consolidação e tentar entender e pensar nos motivos que fizeram do Regime

democrático, uma tendência mundial, quem mais se beneficia com esse regime

e quem mais se prejudica.

3.1. Tendência a democracia

No capítulo "A política da democracia" de "A Era dos Impérios" de Eric

Hobsbawn, é possível encontrar análises importantes para o entendimento sobre

a democracia. Através delas, esse artigo traz alguns pontos importantes: o

primeiro ponto é a inevitabilidade. O processo de democratização se mostrava

cada vez mais inevitável, a confirmação disso vem, principalmente, após 1871,

quando houve a Comuna de Paris. Esse evento trouxe à tona o "problema

político fundamental da sociedade burguesa: sua democratização" (p. 140). A

partir desse fato histórico ficou claro que mesmo contra os ideais dos

governantes, a democratização já estava a um passo de ocorrer.

O segundo ponto é relacionado a primeira grande quebra do regime

democrático entre 1880 e 1914, a democracia parecia estar em uma crescente

ascensão, apesar de suas dificuldades o mundo passava por uma relativa

estabilidade política, mas a fortificação do capitalismo mostrava uma dinâmica,

onde o capitalismo utilizava das instituições democráticas como maneira de

assegurar seu poder e de se estabelecer. A primeira Guerra Mundial trouxe à

tona problemas que a democracia carregava, principalmente aquela democracia

baseada em princípios burgueses.

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O terceiro e último ponto, é o crescimento da democracia após a Segunda

Guerra onde essa passou a ser bastante defendida e utilizada justificar a invasão

de países, além de para impor comportamentos, como uma maneira de

"humanizar" os Estados não democráticos e até de reordenar o globo. Sendo

visto como única alternativa viável.

3.2. Início da perda de credibilidade

Tabela 1. Índices de democracia por tipo de regime (2008)

Fonte: Democracy Index 2008. Adaptado pela autora desse artigo

Tabela 2. Índices de democracia por tipo de regime (2017)

Fonte: Democracy Index 2017. Adaptado pela autora desse artigo

As tabelas trazem alguns pontos importantes a serem discutidos: em

relação ao número de regimes autoritários a variação foi de apenas um país para

mais entre esses 9 anos, mas por outro lado o número de países com uma

democracia plena teve uma queda de onze países. Esses países foram divididos,

principalmente, entre os de regime de Democracia falha.

A análise dos dados das tabelas nos leva para uma discussão tratada

na obra de Dias (2016), sobre uma clareza conceptual em relação a

“desconsolidação” democrática e o retrocesso democrático. Os dois conceitos

Nº de Países % de países % de População Mundial

Democracia Completa 30 18.0 14.4

Democracia Falha 50 29.9 35.5

Regime Híbrido 36 21.6 15.2

Autoritário 51 30.5 34.9

Nº de Países % de países % de População Mundial

Democracia Completa

19 11.4 4.5

Democracia Falha 57 34.1 44.8

Regime Híbrido 39 23.4 16.7

Autoritário 52 31.1 34.0

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são distintos, mas possui uma premissa em comum que é o enfraquecimento de

alguma instituição fundamental para o regime democrático protagonizados por

um ator estatal. Esse conceito consegue levar em consideração diferentes tipos

de erosões democráticas.

Assim, diferenciando, uma “desconsolidação” leva em conta uma

democracia que se enfraqueceu ou teve perdas de instituições democráticas e

se tornou mais propensa a um autoritarismo, mas ainda se enquadra dentro de

um regime democrático, mesmo que enfraquecido. Por outro lado, o retrocesso

já denota a um término do regime democrático no fim. Uma “desconsolidação”

pode levar a um retrocesso, mas não é uma via de regra. Com isso, é possível

interpretar através dos dados da tabela que, entre 2008 a 2017, houve a

“desconsolidação” de dez democracias e o retrocesso de uma.

Em “Globalização, democracia e terrorismo”, Hobsbawn discorre acerca

do ceticismo quanto ao regime democrático que os países liberais querem

implementar. O autor traz três premissas para justificar essa atual perda de

credibilidade: a primeira seria a perda do monopólio da força militar, já que essa

tem seu poder acessível aos mais diversos grupos; o segundo é a fragilização

do Estado, nesse ponto o cidadão vai perdendo sua disposição em ter uma

lealdade voluntária; e o terceiro ponto é também ligado a fragilização do Estado,

mas nesse ponto é relacionado ao mercado ultraliberais que levam a fortes

privatizações

O interesse de grandes potências liberais no aumento de países

democráticos está, em grande parte, nesse enfraquecimento do Estado. Quando

um estado se encontra enfraquecido com pouca defesa por parte da população,

fica aberto a interferências, principalmente do mercado, ocorrendo uma espécie

de "transferência" de responsabilidades. Dupas e de Assis (2017, p.405), citando

Hobsbawn (2007), traz como o Estado nessa situação é substituído pelo

mercado, perdendo sua soberania, enquanto o cidadão também perde seu

papel, passando a ser então o consumidor.

Dahl traz uma crítica a essa chamada democracia liberal, mostrando,

até mesmo, que essa não é realmente uma democracia. Para ele democracia

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seria “um sistema político que tenha, como uma de suas características, a

qualidade de ser inteiramente, ou quase inteiramente, responsivo a todos os

seus cidadãos.” (DAHL, 1997, p. 25)

4. AMÉRICA LATINA

No livro “A Transição e Consolidação da Democracia” (1999), por Linz e

Stepan, a democracia no cone sul é vista sobre um ponto de vista onde os

regimes militares foram de forte influência. Com vindas de bases militares. “[...]

todas as transições do cone sul foram procedidas por regime militar

hierarquicamente controlado” (p. 185)

O autor traz uma comparação com países da Europa mostrando como a

América Latina não possuiu pontos de apoio como alguns países Europeus,

como Portugal, Espanha e Grécia. No seu estudo o autor apresenta pontos de

comparação entre a transição democrática desses países europeus e dos países

do cone sul.

O primeiro ponto traz a Comunidade Europeia como uma marca política e

econômica importante para aspirar a Espanha, Portugal e Grécia. Enquanto para

o lado do Cone Sul não existia esse tipo de rede política e econômica. O segundo

ponto é a OTAN como marca para a facilitação da transição democrática nesses

países europeus, firmando questionamentos quanto militares e democracia,

enquanto do lado do Cone Sul, possuía somente Reagan e Bush como lado

internacional e ambos estavam preocupados com a luta antitráfico de drogas. O

terceiro ponto diz sobre o ponto econômico, onde esses países europeus não

possuíam tão fortes debates econômicos e podiam focar na parte política,

enquanto o Cone Sul passava por diversos problemas de dívidas, levando a

questão econômica a um patamar muito importante e roubando espaço das

questões políticas.

O quarto ponto afirma sobre a falta de uma Assembleia Constituinte livre

de coerções na América-latina, quando do lado desses países europeus existia.

O quinto ponto é a permanência desde o início da transição de presidentes de

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mandato fixo bloqueando outras alternativas ou grandes mudanças. Por fim, o

sexto ponto é que os problemas econômicos, conflitos entre civis e militares e os

defeitos do regime presidencialista minou ainda mais a possibilidade de uma

consolidação da democracia, com exceção do Uruguai.

Essa falta de apoio trouxe diversas crises econômicas que por vezes se

tornavam ainda mais importantes que questões políticas. Então desde a

redemocratização da América Latina, com a saída de regimes militares e a

entrada de presidentes eleitos, os mais diversos conflitos entre militares e civis

já trouxeram uma perca de credibilidade ao regime.

Tabela 3: Regimes na América Latina e Caribe 2017

Fonte: Democracy Index 2017 I Adaptado pela autora desse artigo

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Países Pontuação

Total

Rank

Global

Rank

Regional

I Processo

eleitoral e

pluralismo

II

Funcionamento

do governo

III

Participação

Política

IV

Cultura

Política

V

Liberdade

Civil

Tipo de

Regime

Uruguai 8.12 18 1 10.00 8.93 4.44 7.50 9.71 Democracia

completa

Costa Rica 7.88 =23 2 9.58 7.14 6.67 6.88 9.12 Democracia

Falha

Chile 7.84 =26 3 9.58 8.57 4.44 7.50 9.12 Democracia

Falha

Jamaica 7.29 =38 4 9.17 7.14 4.44 6.88 8.82 Democracia

Falha

Panamá 7.08 45 5 9.58 6.79 6.11 5.00 7.94 Democracia

Falha

Trinidad e

Tobago

7.04 46 6 9.58 7.14 5.56 5.00 7.94 Democracia

Falha

Argentina 6.96 48 7 9.17 5.00 6.11 6.88 7.65 Democracia

Falha

Brasil 6.86 49 8 9.58 5.36 6.11 5.00 8.24 Democracia

Falha

Suriname 6.76 50 9 9.17 6.43 5.56 5.00 7.65 Democracia

Falha

Colômbia 6.67 =53 10 9.17 6.79 4.44 5.00 7.94 Democracia

Falha

República

Dominicana

6.66 55 11 9.17 5.36 6.11 5.63 7.06 Democracia Falha

Peru 6.49 61 12 9.17 5.36 5.56 5.00 7.35 Democracia

Falha

Guiana 6.46 63 13 8.75 5.71 6.11 4.38 7.35 Democracia

Falha

El Salvador 6.43 65 14 9.17 5.36 5.56 5.00 7.06 Democracia

Falha

México 6.41 =66 15 7.83 6.43 7.22 4.38 6.18 Democracia

Falha

Paraguai 6.31 =71 16 8.75 6.07 5.00 4.38 7.35 Democracia

Falha

Equador 6.02 76 17 8.75 4.64 5.56 4.38 6.76 Democracia Falha

Guatemala 5.86 80 18 7.92 5.71 3.89 5.00 6.76 Regime

híbrido

Honduras 5.72 82 19 8.25 5.36 4.44 4.38 6.18 Regime

híbrido

Bolívia 5.49 =89 20 7.00 4.64 5.00 3.75 7.06 Regime

híbrido

Nicarágua 4.66 =105 21 3.42 3.29 3.89 5.63 7.06 Regime

híbrido

Haiti 4.03 114 22 5.17 2.21 2.22 4.38 6.18 Regime

híbrido

Venezuela 3.87 =117 23 2.17 2.86 6.11 4.38 3.82 Autoritário

Cuba 3.31 131 24 1.33 4.29 3.89 4.38 2.65 Autoritário

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Nos dados da Tabela 3 o Uruguai aparece na lista como o único país da

América Latina e Caribe com um regime democrático Pleno. Quais seriam os

fatores que trouxeram esse status? O Uruguai entra na mesma posição que

muito dos países latino americanos, inicia com um regime militar, entre 1973 e

1985, e após esse período passa a ser governado por um presidente eleito.

Linz e Stepan (1999, p.187), dizem que diferentemente dos outros países

do cone sul, o Uruguai teve um período governado por militares

hierarquicamente comandados, além de terem também permanecido durante a

transição o que não trouxe uma necessidade de governo provisório. Um outro

grande diferencial do Uruguai foi que mesmo sendo um país de forte influência

militar, os eleitores possuíam um partido o qual se identificava e “um senso claro

de um índice esquerda-direita.” (p.188).

Gráfico 1: Tipos de Regimes América Latina e Caribe 2017

Elaboração própria a partir de dados do Democracy Index 2017

Com o estudo é possível fazer uma interpretação sobre como esse

grande número de países em regimes democráticos falhos é a prova da tentativa

– equivocada – de encaixar uma democracia a moldes europeus e norte-

Democracia completa

4%

Democracia falha67%

Regime Híbrido

21%

Autoritário8%

Democracia completa Democracia falha

Regime Híbrido Autoritário

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americanos nos países do cone sul. América Latina e Caribe configura um

ambiente de muitas disputas sociais e desigualdades. Todo esse processo fica

mais claro quando é colocado os aspectos da democracia que tenta ser

implantada.

Os antigos regimes autoritários que antes configuraram na América

Latina, ainda trazem diversos resquícios nos dias atuais. A exemplo disso temos

as dificuldades dos Governos de garantir direitos básicos, como os direitos civis,

políticos e sociais. Esses regimes democráticos falhos promovem eleições, mas

acabam por violar diversos direitos e civis, além de não trazer uma maior

participação popular, acarretando em uma grande perda de credibilidade por

parte da população. (Nobrega, 2012, p.23)

5. CONCLUSÃO

A partir desse estudo é possível notar como a democracia ganhou um

papel de grande destaque nas últimas décadas, mas ao mesmo tempo, como

ela vem passando por um processo negativo a levando para uma perda de

credibilidade. A ascensão de políticas mais autoritárias e de movimentos

antissistêmicos são uma amostra do que essa falta de confiança nesse regime

tem trazido.

Essa fragilização de instituições fundamentais à democracia atinge os

países latinos americanos quase que desde o início da implementação desse

regime. A América Latina teve a Democracia imposta logo após a queda de

regimes autoritários e durante décadas foi tentado mantê-lo mesmo com todas

dificuldade explicitas, através de, principalmente, políticas públicas e políticas de

bem-estar social como maneira de “vender” a democracia. Mas as situações

atuais mostram o início da perda de credibilidade desse regime e uma

necessidade de manutenção e de se procurar alternativas para contornar os

problemas.

Resquícios do autoritarismo trazem uma fragilidade do regime

democrático do cone sul. Fragilidade essa que impede que direitos civis e

políticos sejam dados à população. Deixando essa a mercê daqueles com maior

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poderio e com maiores influências nessa democracia moderna diretamente

influenciada pelo liberalismo.

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