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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA
ADALBERTO RIBEIRO
A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA E A PEDAGOGIA DA AÇÃO NO CONTEXTO DA REFORMA PROTESTANTE
Rio de Janeiro 2010
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ADALBERTO RIBEIRO
A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA E A PEDAGOGIA DA AÇÃO NO CONTEXTO DA REFORMA PROTESTANTE
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Pedagogia do Instituto A Vez do Mestre, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de licenciatura em Pedagogia. Orientador: Profª Fabiane Muniz
Rio de Janeiro 2010
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Dedicatória
À Deus, autor da minha vida e da minha existência. Propiciador de toda fonte de sabedoria.
Meu amigo, meu refúgio, meu Pai celestial, minha eterna fonte de inspiração.
À minha esposa, Zemilda, minha amiga amada e companheira. Por tudo que vivemos ao
longo desses anos, por tudo que fez e faz por mim. Você deu luz à minha vida, sou seu eterno
apaixonado. Sua garra, coragem e seu amor me fascinam a cada dia.
Às minhas filhas, Ingrid Bazilio Ribeiro e Íris Bazilio Ribeiro, meus orgulhos, os grandes
amores da minha vida.
Às minhas netas, Isabelle Bazilio Ribeiro Navarro, Amanda Bazilio Ribeiro Guimarães e Ana
Beatriz Bazilio Ribeiro Guimarães, minhas alegrias, seqüências da minha geração. Com
certeza, se tornarão profissionais conscientes de suas responsabilidades sociais mediante os
princípios da pedagogia, que são aplicados desde a tenra infância.
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AGRADECIMENTOS
Ao Instituto A Vez do Mestre, por possibilitar minha formação e mais que isso, a realização
de um grande sonho.
Aos mestres que contribuíram com minha formação e qualificação profissional.
À minha família, pela alegria com que compartilham o cotidiano da vida ao meu lado.
Aos meus amigos, pela compreensão da minha ausência em momentos de confraternização e
alegria. Por acreditarem no meu sonho e se alegrarem com ele.
À minha turma, por serem companheiros, amigos e parceiros nesta empreitada.
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A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA E A PEDAGOGIA DA AÇÃO NO CONTEXTO DA REFORMA PROTESTANTE
Adalberto Ribeiro
Orientadora: Profª Fabiane Muniz
Resumo da monografia submetida ao Curso de Graduação em Pedagogia do Instituto
AVM como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de licenciado em Pedagogia.
Existe uma relação entre a Reforma e Religião, a Reforma e Educação, a Reforma e Ética. A
Reforma Protestante, através dos seus valores, fornece o substrato para o desenvolvimento da
formação de um povo. A Reforma Protestante está na base da Cosmovisão Educacional de um
grupo e finalmente, a educação no contexto da Reforma Protestante procura ser o instrumento
de construção das atitudes éticas, sociais e culturais de uma sociedade através do processo
ensino-aprendizagem e da relação ensinante-aprendente. Partindo destes pressupostos, este
trabalho tem por objeto, a compreensão da pedagogia humanista no contexto da reforma
protestante. Neste sentido, traz como objetivo, compreender no contexto da educação
reformada, os princípios norteadores de uma educação, capaz de dar sustentação a formação
integral do homem para a realização total do seu desenvolvimento como pessoa e cidadão que
vive em comunidade em busca do bem comum. A metodologia utilizada consiste no
levantamento bibliográfico acerca da temática.
PALAVRAS-CHAVE: Reforma, Educação, Ética, Cidadania, Desenvolvimento e Liberdade.
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SUMÁRIO
1- INTRODUÇÃO.................................................................................................................07
2- METODOLOGIA.............................................................................................................09 3- O CONTEXTO EDUCACIONAL ANTES, DURANTE E APÓS A REFORMA PROTESTANTE: UMA ABORDAGEM DE TOMÁS DE AQUINO, LUTERO E CARL ROGERS....................................................................................................................... 11 3.1 O CONTEXTO HISTÓRICO: O SISTEMA EDUCACIONAL DO SÉCULO XVI ANTES DA REFORMA – O TOMISMO........................................................................................11 3.2 REFORMA PROTESTANTE.......................................................................................15 3.3- A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA E A VISÃO DA PEDAGOGIA DA AÇÃO NA PERSPECTIVA DA REFORMA PROTESTANTE: REFERENCIAL TEÓRICO FILOSÓFICO....................................17 4 - A PEDAGOGIA DA AÇÃO E A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA NO CONTEXTO DA REFORMA PROTESTANTE: O LEGADO PEDAGÓGICO DO PENSAMENTO REFORMADO .................................................................................19
4.1 - O LEGADO PEDAGÓGICO DO REFORMADOR JOÃO STURM.....................19
4.2 - O LEGADO PEDAGÓGICO DO REFORMADOR MARTINHO LUTERO: O AUTOR DO CONCEITO DE EDUCAÇÃO ÚTIL E ABORDAGEM CENTRADA NO ALUNO....................................................................21 4.3 - O LEGADO PEDAGÓGICO DE PHILIPP MELANCHTHON: O EDUCADOR DA ALEMANHA......................................................................................24 4.4 - O LEGADO PEDAGÓGICO DE JOÃO CALVINO: O EDUCADOR DE GENEBRA..........................................................................................25 4.5 - O LEGADO PEDAGÓGICO DE JOÃO AMÓS COMENIUS: O PAI DA DIDÁTICA MAGNA........................................................................................30 5.0 – CONCLUSÃO .............................................................................................................35 REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 37
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1- INTRODUÇÃO
A Educação e a Religião encontram-se articuladas desde seus primórdios,
estiveram entrelaçadas na construção de suas histórias. Durante a Idade Média, essa relação
era extremamente intensa, pois a Igreja era a responsável pela educação escolar.
Assim, desde o século V, a instrução escolar passa a estar estreitamente ligada às
ações da Igreja, sendo ela a responsável pela sua organização e manutenção. Paul Foulquié
(1957) afirma que a formação cristã era o essencial da Educação nesse período e os pais que
desejassem oferecer instrução aos seus filhos eram obrigados a enviá-los para as aulas que
preparavam os futuros clérigos. Por ordem do Papa e do Concílio, a Igreja passa a abrir suas
escolas também para as demais crianças e jovens e mostrando-se zelosa em proporcionar a
gratuidade do ensino e a colação de graus.
Neste contexto, surgem as primeiras escolas eclesiásticas, que além da formação
educacional e pedagógica, também tinham por objetivos formar novos cléricos e pregadores
para a Igreja.
Mediante os pensamentos de Barbosa (2007), compreende-se que no início do
século XVI tem-se a criação dos colégios secundários que ofereciam, aos jovens, estudo
preparatório para ingresso nas universidades e que se transformaram em veículos do
humanismo. Essa é a época em que os príncipes dos estados emergentes passam a apoiar a
nova forma de educação escolar, visando à estabilização de suas cortes e à formação de seus
cortesãos. Foulquié (1957) reforça essa idéia localizando no Antigo Regime, a partir do século
XVI com os movimentos da Renascença e da Reforma, o período em que os príncipes
quiseram dominar as Universidades e, de maneira geral, se ocuparam com o ensino que
começaram a considerar como público. Contudo, essa instrução escolar, como já explicitado,
se destinava ao público que teria acesso à universidade.
O movimento humanista se expandia e influenciava diretamente a Educação,
passando esta por várias mudanças, desenvolvendo características diferentes nos diversos
países. As idéias medievais vão dando lugar aos ideais do Renascimento. Entretanto, a
Educação do século XVI se desenvolve mediante os princípios cristãos.
A influência da Reforma Protestante do Século XVI, particularmente, o
Calvinismo, sobre a Educação e o desenvolvimento da Pedagogia da Ação numa Abordagem
Centrada na Pessoa, mais tarde elaborada e desenvolvida por Carl Rogers, é inegável.
8
Além de suas contribuições no campo da fé, os teólogos e Pedagogos da
Reforma incentivaram também a educação popular, formal e informal.
Este movimento religioso será um dos fatores importantes na ascensão de uma
cultura escrita em função de algumas variáveis importantes. A Reforma vai definir a religião a
partir de uma relação íntima e pessoal com Deus e esta comunhão com o Sagrado se dará
através do cristão com os textos da Bíblia, elevada pela Reforma Protestante à categoria de
revelação especial, a Palavra de Deus.
Martin Lutero, o pioneiro da Reforma, empenhou a sua vida na tradução da
Bíblia para a língua alemã, a fim de colocar o texto sagrado nas mãos do povo. Pouco ou nada
adiantava colocar a Bíblia nas mãos de um povo analfabeto, mesmo com a divulgação dos
textos escritos pela invenção da imprensa.
Para os Pedagogos da Reforma, no processo de socialização que naturalmente
expõe o indivíduo a uma diversidade de interações de comportamento, é importante a
presença do Estado Organizado garantindo os direitos individuais e os direitos sociais, dentre
eles a Educação.
As inquietações motivadoras do estudo foram desenvolvidas mediante à prática
teológica e estudos acerca da Reforma, porém a formação acadêmica em Pedagogia aguçou-
me ainda mais o pensamento sobre tais questões, levando-me ao interesse em desenvolver o
estudo com esta temática, não mais a partir de um só paradigma, mas sobretudo com uma
visão pedagógica deste contexto.
Desta forma, o estudo tem por objeto a compreensão da pedagogia humanista
no contexto da reforma protestante. Traz como objetivo, compreender no contexto da
educação reformada, os princípios norteadores de uma educação, capaz de dar sustentação a
formação integral do homem para a realização total do seu desenvolvimento como pessoa e
cidadão que vive em comunidade em busca do bem comum. A metodologia utilizada consiste
no levantamento bibliográfico acerca da temática.
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2- METODOLOGIA
A metodologia utilizada tratou-se da abordagem exploratória através do método
Levantamento Bibliográfico. Este foi desenvolvido através de livros, artigos científicos na
Base de dados SCIELO e artigos textuais. O período do levantamento foi de junho de 2009 a
dezembro de 2010.
O caminho metodológico traçado deu-se através dos objetivos do estudo,
compreendendo no contexto da Educação Reformada, os princípios que nortearam a
educação, sustentando a formação integral do homem para a realização total do seu
desenvolvimento como pessoa e cidadão que vive em comunidade em busca do bem comum.
Buscou-se através dos textos encontrados, identificar o que os autores traziam
como contribuições da Reforma Protestante para a Educação, assim como compreender a
partir do levantamento bibliográfico, os reflexos da Reforma Protestante no processo de
desenvolvimento da Pedagogia.
Como fio condutor deste Levantamento, foi norteado os pensamentos de Carl
Ranson Rogers, cuja abordagem se dá através da Teoria centrada na pessoa, indo ao encontro
com os princípios pedagógicos da Reforma Protestante, que foi a Tendência Renovada Não-
diretiva e na abordagem centrada na pessoa, constituindo a doutrina do Livre Exame.
O critério de exclusão foi artigo que não correspondesse aos objetivos do estudo,
não seria utilizado no Levantamento Bibliográfico.
Nesta linha de raciocínio, foram usadas duas palavras-chave no Banco de Dados
Scielo, que foram Reforma Protestante e Pedagogia. Nesta primeira busca não foi encontrado
nenhum artigo científico que tratasse deste tema. Em seguida, foi utilizada somente a palavra-
chave Reforma Protestante, foram evidenciados dois artigos. O primeiro com o título
Contando o conto de Zita: as estórias dos servos sagrados e a história dos servos, publicado
em dezembro de 2007 na Revista on line Varia história, da autora Rafaella Sarti. O segundo,
da autora Luciane Muniz Ribeiro Barbosa, com título As concepções educacionais de
Martinho Lutero, publicado na Revista Educação e Pesquisa de São Paulo, em 2007.
De acordo com o critério de exclusão, só foi mantido no estudo o segundo artigo.
Para buscar artigos que tratassem da Teoria de Carl Rogers, foi realizada uma
terceira busca, utilizando-se a palavra-chave Pedagogia Humanista. Foram evidenciados três
artigos. Todos três artigos são da autoria de Maurício Mogilka, o primeiro com o título
Educar para a democracia, publicado no Caderno de Pesquisa de São Paulo, em 2003. O
segundo, Autonomia e formação humana em situações pedagógicas: um difícil percurso,
10
publicado no mesmo periódico, mas no ano de 1999. O terceiro, com o título Educação,
desenvolvimento humano e cosmos, também no mesmo periódico, no ano de 2005.
Todos os três artigos foram incluídos no estudo pela abordagem tratada de Carl
Rogers na pedagogia, refletida nestes estudos.
Concomitantemente à pesquisa bibliográfica no Banco Scielo, também foi
realizado o levantamento bibliográfico manual, através de livros, artigos e material didático.
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DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO
3 – O CONTEXTO EDUCACIONAL ANTES, DURANTE E APÓS A REFORMA –
UMA ABORDAGEM DE TOMÁS DE AQUINO, LUTERO E CARL ROGERS.
3.1 - O CONTEXTO HISTÓRICO: O SISTEMA EDUCACIONAL DO SÉCULO XVI
ANTES DA REFORMA – O TOMISMO
A filosofia educacional dominante na Europa no Século XVI era o sistema da
Idade Média, derivado da Teologia de Tomás de Aquino, que fazia uma síntese entre a
Teologia Cristã e o Pensamento de Aristóteles. Como resultado dessa síntese, Aquino fez uma
distinção básica entre natureza e graça que veio afetar o Sistema Educacional subseqüente.
Tomás de Aquino nasceu no ano de 1225, no Castelo de Roccasecca, na
Campânia. Descendente de família feudal dos Condes de Aquino, Tomás era único pelos
laços de sangue à família imperial e às famílias reais da França, Sicília e Aragão.
Sua educação de base desenvolveu-se no grande Mosteiro de Montecassino Já
sua mocidade ocorreu em Nápoles como aluno dessa Universidade. Após estudar as Artes
Liberais, Tomás de Aquino entrou na Ordem Dominicana, renunciando a tudo, a exceção da
Ciência. Tal acontecimento determinou uma forte reação por parte de sua família.
Dedicou-se ao estudo assíduo de Teologia, tendo como mestre Alberto Magno,
primeiro na Universidade de Paris (1245-1248) e depois em Colônia. Em 1252, voltou a
Universidade de Paris, onde ensinou até 1269, quando regressou a Itália, chamado à Corte
Papal.
Em 1269, foi de novo à Universidade de Paris, onde lutou contra o
AVERROÍSMO (Doutrina criada pelo médico e filósofo árabe Averróis (1126-1198),
caracterizada por uma tendência materialista(valorização do que é material e concreto) e
Panteísta1. Em 1272, voltou à Nápoles, onde lecionou Teologia. Dois anos depois, em 1274,
viajando para tomar parte no Concílio de Lião, por ordem de Gregório X, faleceu no Mosteiro
de Fossanova, entre Nápoles e Roma. Tinha apenas quarenta e nove anos de idade. A extensa
obra de Tomás de Aquino divide-se em quatro grupos:
1 Doutrina segundo a qual “só o mundo é real”, sendo Deus a soma de tudo o que existe.
12
l- Comentário à Lógica, à Física, à Metafísica, à Ética de Aristóteles; à
Sagrada Escritura, a Dionísio pseudo-areopagita; aos quatro livros das “sentenças” de Pedro
Lombardo.
2- SUMAS: Sumas contra os gentios, baseada substancialmente em
demonstrações racionais, Suma Teológica, obra iniciada em 1265, mas inacabada devido à
morte prematura.
3- QUESTÕES: Questões Disputadas (Da Verdade, Da Alma, Do
Mal, etc.) Questões Vária.
4- OPÚSCULOS: Da unidade do Intelecto Contra Os Averroístas; Da
Eternidade do Mundo, etc.
Tomás de Aquino considera a Filosofia como uma disciplina essencialmente
teorética, para resolver o problema do mundo. Considera também a Filosofia como
absolutamente distinta da Teologia, não oposta, visto ser o conteúdo da Teologia arcano
(misterioso) e passível de revelação, o da Filosofia evidente e racional.
Segundo Tomás de Aquino, o conhecimento humano tem dois momentos: O
Sensível e o Intelectual, e o segundo pressupõe o primeiro. O conhecimento sensível do
objeto, que está fora de nós, realiza-se mediante uma espécie sensível. O conhecimento
intelectual depende do conhecimento sensível, mas transcende-o.
Para Tomás de Aquino, todos os conhecimentos sensíveis são evidentes, intuitivos,
e, por conseqüência, todos os conhecimentos sensíveis são, por si, verdadeiros.
Na esfera da natureza estava o estudo da Filosofia, da Ciência Natural e de
materiais afins, coisas estas que poderiam ser aprendidas pelo simples uso da razão, que não
havia sido afetada pela queda no Éden.
Na esfera da graça estavam as coisas ligadas à fé, a Deus, aos anjos e outros
aspectos teológicos. Para conhecer essas coisas era necessária a graça. A partir da época de
Aquino, a Teologia passou a ser considerada a Rainha das Ciências, porque trabalhava com a
esfera das coisas divinas e com o sobrenatural. As outras ciências, entretanto, tratavam das
coisas triviais e das coisas terrenas. Tomás de Aquino: O Tomismo, Teologia e Filosofia
(Aquino, 1962).
13
3.1.l - A Filosofia Educacional de Tomás de Aquino.
A Filosofia da Educação que vigorou até o final da Idade Média e, em alguns
casos, até a implantação da Reforma Protestante, foi a filosofia educacional desenvolvida por
Tomás de Aquino.
Pode-se dizer que, após uma preparação e um desenvolvimento promissor, a
Escolástica chega ao seu ápice com Tomás de Aquino, adquire plena consciência dos poderes
da razão e proporciona ao pensamento cristão uma filosofia.
A gnosiologia de Tomás de Aquino (a teoria geral do conhecimento humano,
voltada para uma reflexão em torno da origem, natureza e limites do ato cognitivo,
frequentemente apontando suas distorções e condicionamentos subjetivos – erros causados
pelo sujeito humano - segundo um ponto de vista tendendo ao idealismo, ou sua precisão e
veracidade objetivas, conforme uma perspectiva realista) é empírica e racional, sem inatismo
e iluminações divinas.
Para Tomás de Aquino, o conhecimento humano tem dois momentos: (Aquino,
1962)
(1) – O Sensível
(2) – O Intelectual.
O segundo pressupõe o primeiro. O conhecimento sensível do objeto, que está fora
de nós, realiza-se mediante uma “espécie sensível”.
O conhecimento intelectual depende do conhecimento sensível, mas transcende-o.
Em se tratando da espécie sensível, que representa o objeto material na sua individualidade,
temporalidade, espacialidade, etc, mas sem a matéria, o inteligível, o universal, a essência das
coisas é contida apenas implicitamente, potencialmente. Para que tal “inteligível” se torne
explícito, atual, é preciso extraí-lo, abstraí-lo, isto é, desindividualizá-lo das condições
materiais. Tem-se, deste modo, a espécie inteligível, representando precisamente o elemento
essencial, a forma universal das coisas. Pelo fato de que o inteligível é contido apenas
potencialmente no sensível é necessário um intelecto agente que abstraia, desmaterialize,
desindividualize o inteligível daquilo que o torna ocultado sob a forma de um “fantasma” ou
imagem ilusória vinculado ao que existe na realidade: os objetos que conhecemos pelos
sentidos, ou seja, os objetos sensíveis.
Este Intelecto Agente é como que uma luz espiritual da alma; esta é capaz de
iluminar o mundo sensível para conhecê-lo. O intelecto que propriamente entende o
inteligível, a essência, a idéia, feita explícita, desindividualizada pelo intelecto agente, é o
14
intelecto passivo, a que pertencem as operações racionais humanas: conceber, julgar,
raciocinar, elaborar das ciências à filosofia.
É necessário salientar que, na Pedagogia de Tomás de Aquino, a “espécie
inteligível” não é a coisa entendida, quer dizer, a representação da coisa, pois, neste caso,
conheceríamos não as coisas, mas os conhecimentos das coisas, acabando, deste modo, no
Fenomenismo2. Tomás de Aquino alerta para o fato de que conhecer um fenômeno vinculado
a uma “coisa” que existe na realidade não significa que tenhamos alcançado o conhecimento
da própria coisa.
A “espécie inteligível” é o meio pelo qual a mente entende as coisas extramentais,
que estão fora da mente. E isto corresponde perfeitamente aos dados do conhecimento, que
nos garante conhecermos coisas e não idéias. Mas, segundo Tomás de Aquino, as coisas
podem ser conhecidas apenas por meio de informações que obtemos pelo conceito de
“espécies” e pelas “imagens”: elas não podem entrar fisicamente no nosso cérebro.
Neste sentido, a verdade lógica não estaria nas “coisas” e nem sequer no mero
“intelecto”, mas na adequação entre coisa e o intelecto. E tal adequação é possível pela
semelhança entre o intelecto e as coisas, que contém um elemento inteligível, a essência, a
forma, a idéia. O sinal pelo qual a verdade se manifesta à nossa mente é a evidência. E, visto
que muitos conhecimentos nossos não são evidentes ou intuitivos, tornam-se verdadeiros
quando levados à evidência mediante a demonstração pelo pensamento.
Segundo Tomás de Aquino a “demonstração” é um processo dedutivo, isto é, uma
passagem necessária daquilo que é universal (como a beleza) para o particular(por exemplo,
as coisas belas). No entanto, os universais (conceitos ou idéias) não são inatos na mente
humana. A ciência tem como objeto a busca desta essência das coisas, universal e necessária.
No que se refere a Metafísica, esta se divide em (Aquino, 1962):
(1) Geral (ontologia) tem como objeto o “ser” em
geral.
(2) Especial: Estuda o ser em suas grandes
especificações: Deus, o espírito, o mundo. Daí termos a Teologia
Racional, assim chamada, para distingui-la da Teologia Revelada; a
Psicologia Racional (racional, porquanto é filosofia e se deve
distinguir da moderna psicologia empírica, que é a ciência
experimental); a cosmologia ou filosofia da natureza, que estuda a
2Doutrina baseada no princípio de que só podemos conhecer fenômenos.
15
natureza em suas causas primeiras, ao passo que a ciência
experimental estuda a natureza em suas causas secundárias.
Considerado um Aristóteles cristianizado, o pensar de Tomás de Aquino se
consagra também por retomar uma das teses básicas de Aristóteles – anima-forma corporis – a
da unidade corpo e alma.
Em oposição ao pensamento de Santo Agostinho e a um Cristianismo puramente
espiritualista, no qual a alma apresentando-se como verdadeiramente importante, veria o
corpo como um estorvo para a elevação espiritual, Tomás de Aquino introduz uma outra
concepção de homem: O homem como Uno (holístico). Pensando a partir da unidade entre
espírito e matéria, em que a alma é a forma substancial, em intrínseca união com a matéria, o
homem é afirmado como tal.
Este conceito do homem integral será trabalhado no desenvolvido pela Pedagogia
da Ação da Reforma Protestante e pela Abordagem Centrada na Pessoa de Carl Rogers.
Na Suma Teológica (1962), Tomás de Aquino assevera que a aptidão da alma para
unir-se a um corpo, deve-se ao fato de a alma possuir um princípio racional que a faz ter
necessidade de um corpo para exercer suas próprias operações.
A rica e abrangente obra de Tomas de Aquino o fizeram ser reconhecido como o
“Príncipe dos príncipes da Escolástica” e um precursor do Pensamento da Reforma
Protestante no Século XVI e da Abordagem Centrada Na Pessoa desenvolvida por Rogers, no
Século XX.
Com sua teoria do Conhecimento, convocando a vontade e a iniciativa de cada um
na direção do aperfeiçoamento e da liberdade, deixou como legado à Pedagogia a idéia de
autodisciplina.
O pensamento de Tomás de Aquino não foi abraçado pelas rígidas hierarquias do
sistema eclesiástico vigente, favorecendo que sua monumental obra fosse enfraquecida,
quando não diluída ou mesmo esquecida.
3.2 – REFORMA PROTESTANTE
Compreendermos o significado dos grandes acontecimentos históricos, os
personagens e os paradigmas que deram suporte pedagogia educacional. Ao mesmo tempo,
possibilita-nos a incorporação de outros saberes: o empírico, o mítico, o teológico, o
filosófico, no processo de produção do conhecimento, como formas diferenciadas de saber,
16
são fundamentais para o homem assim como para a ciência, ou seja, saberes tão necessários
para o enfrentamento dos desafios postos pelas atuais mudanças sociais e pela visão
globalizada.
A Reforma Protestante possibilitou um legado aos Paradigmas norteadores da
pedagogia. Quando se fala de Paradigma da Reforma, refere-se ao exemplo, ao modelo, ao
padrão, ao modelo teórico: modo de explicação, construção teórica, idealizada, que serve para
a análise ou avaliação de uma realidade concreta.
A definição de Paradigma como modelo e deste como uma construção teórica que
possibilita a análise de uma realidade concreta, já nos permite vislumbrar a complexidade da
tarefa e o esforço enorme que demanda, quando se pretende tratar da Religião, da Filosofia,
da Pedagogia e da Ciência.
A Teologia Reformada, desde a sua gênese, tem se caracterizado por uma
amplitude que se manifesta em sua preocupação por temas que não são explicitamente
“religiosos”. Para a Teologia Reformada, todas as áreas da existência humana devem ser para
glorificar ao Criador, e não apenas o “religioso” ou “sagrado” (Fischer, 1987)
É preciso resgatar a riqueza, a amplitude e a beleza da Tradição Teológica
Reformada. É exatamente este o ponto forte da forma de pensar teológica reformada que se
manifesta as áreas do conhecimento humano. Daí a grande influência do Calvinismo em áreas
tão diversas quanto a Filosofia, a Ética, a Economia, a Ciência Política, a Pedagogia, a
Cultura em geral. (Bettenso, 1963)
Para o ponto de vista reformado, o homem é um ser integralmente holístico,
unificado. É inegável, ainda, a influência da Reforma Protestante no incentivo ao
desenvolvimento educacional em geral, que culminou na criação das conhecidas
Universidades Harvard e Yale, nos Estados Unidos e sua enorme influência na história das
Universidades de Oxford e Cambridge, na Inglaterra, inclusive o impulso às ciências humanas
e à tecnologia proporcionado por pensadores reformados (Fischer, 1987).
A prática pedagógica nos tem apontado diferentes formas de trabalhar com vistas
ao desenvolvimento do conhecimento. Neste processo, tem ficado cada vez mais evidente a
necessidade de uma abordagem histórico-pedagógico-filosófico do desenvolvimento do
conhecimento que nos possibilita discutir sua importância para nossa cultura.
O trabalho não pretende esgotar a temática proposta. O que se pretende é assimilar,
a partir da história os momentos e autores que consideramos relevantes para a compreensão
desta temática, buscando trazer elementos que possam contribuir para o entendimento de
17
como o Processo Pedagógico foi se construindo, apontando suas principais características no
contexto histórico da Reforma Protestante.
3.3 - A ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA E A VISÃO DA
PEDAGOGIA DA AÇÃO NA PERSPECTIVA DA REFORMA PROTESTANTE:
REFERENCIAL TEÓRICO FILOSÓFICO.
O Referencial Teórico Filosófico do trabalho ora apresentado é a Abordagem
Centrada Na Pessoa, de Carl Rogers.
Carl Ranson Rogers, psicopedagogo americano, nasceu no dia 08 de janeiro de
1902, em Oak Park, Chicago, Estados Unidos, numa família cristã cuja religiosidade era
rigorosamente fundamentalista. Sua infância foi limitada pela crença e atitude de seus pais, e
pela solidão, durante este período até o fim da adolescência, segundo ele mesmo, não havia
em sua vida relacionamento que hoje ele definiria como saudável.
No colegial tornou-se um excelente aluno, com ávidos interesses científicos.
Estudou na Universidade de Wisconsin, tendo lá as suas primeiras experiências de
relacionamentos significativas e recompensadoras, contudo, ainda norteadas com muitas
regras. Em seu segundo ano de faculdade começou a aprofundar-se em assuntos religiosos.
Durante o Curso de Pós Graduação, embora já cada vez mais distante dos cursos
acadêmicos de religião, passou por algumas experiências que o ajudaram a modelar a sua
maneira de se relacionar com os outros, e a perceber que trabalhar com as pessoas poderia se
tornar sua profissão (Bill e Forisha, 1978).
Como Psicólogo, trabalhou primeiramente com crianças em Rochester, Nova
York, num centro de orientação infantil, onde permaneceu por doze anos, os quais os
ajudaram a compreender formal e diretamente para o que ele iria denominar mais tarde de
Abordagem Centrada Na Pessoa, que foi aprimorada através de suas experiências de
Magistério na Universidade de Ohio e depois como diretor de um novo centro de
aconselhamento baseado em suas idéias na Universidade de Chicago onde publicou Terapia
Centrada No Cliente (1951), que continha sua primeira teoria formal sobre terapia, sua teoria
da personalidade e algumas pesquisas que reforçaram sua conclusão.
Carl Rogers tornou-se um dos mais influentes pensadores e psicopedagogos
americanos. Foi o principal representante da tendência “Renovada Não-Diretiva”, que
influenciou um número expressivo de educadores e professores, mas, principalmente,
18
Orientadores Educacionais e Psicólogos Escolares que se dedicam ao aconselhamento
(Rogers, 1978)
Um fator determinante na construção dos princípios pedagógicos da Reforma
Protestante, como mais tarde, vamos encontrar na Tendência Renovada Não-Diretiva e na
Abordagem Centrada na Pessoa, foi a Doutrina do Livre Exame.
Os Pedagogos da Reforma Protestante defendiam que o papel do educador era
facilitar a aprendizagem do aluno através de dinâmicas que permitam ao aluno aceitar-se
como pessoa, sentindo-se confiável e receptível, tendo neste sentido, plena convicção na
capacidade de auto-desenvolvimento do aluno. Ajudar o aluno a se organizar, a partir da
exposição livre de sentimentos.
Esta concepção encontra-se na base da construção do moderno conceito de
consciência de liberdade no pensamento de Carl Rogers e em sua Abordagem Centrada na
Pessoa: A Liberdade nas Nossas Vivências (Rogers, 1991)
Tal concepção de Rogers pode ter sido influenciada pelo pensamento pedagógico
da Reforma, pois a abordagem centrada na pessoa vai ao encontro da cosmovisão protestante
Calvinista proporcionando um modo particular de ver a realidade educacional. Esta era
considerada como uma necessidade premente para a própria sobrevivência desta cosmovisão.
A Fé Reformada, sua Liturgia, seus Ritos e Cultos estavam todos calcados na Cultura de
Tradição Escrita, na Leitura e Interpretação das Escrituras Sagradas e esta não prescindia da
educação dos fiéis. A fé impulsionava o Sistema Pedagógico, o qual fornecia os pilares para a
sustentação daquela, numa perfeita simbiose legitimadora (Campos, 2000).
O crescimento de cada indivíduo, tanto na visão dos Reformados como na visão de
Rogers, nem sempre depende apenas da satisfação das necessidades interiores, porque existem
situações de vivências coletivas que estão associadas ao atendimento das necessidades dos
outros indivíduos. Por sua vez, no processo de socialização que naturalmente expõe o
indivíduo a uma diversidade de interações de comportamento, é importante a presença do
Estado Organizado garantindo os direitos individuais e os direitos sociais.
A idéia da Escola Pública e para todos, organizada em três grandes ciclos:
Fundamental, Médio e Superior, e voltada para o saber útil nasce da Abordagem Educacional
de Lutero (Barbosa, 2007).
O Sistema Pedagógico da Reforma Protestante, decantada por Marx Weber em
sua obra A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo (1994) e a Doutrina do Livre Exame
atenuava as tensões suscitadas pelos embates científicos entre a fé e a razão(psique)
facilitando a aquisição de novas tecnologias e novos saberes.
19
A Abordagem Protestante, derivada da sua racionalidade metódica, desenvolveu
uma Educação voltada para aplicações práticas como a Educação Para o Comércio e Industria
contribuindo para a formação de homens capazes de contribuir para o desenvolvimento social,
científico e tecnológico (Barbosa, 2007).
Tanto para os Reformadores como para Rogers, o sentir-se livre é uma sensação
interior que está vinculada a um estado psíquico de realização pessoal plena. Para ambos, todo
indivíduo nasce e existe para ser livre.
O estudo da liberdade é fascinante e diversificado. O livre exame pode ser
analisado sob uma perspectiva social, política, filosófica, jurídica e religiosa.
Merece atenção, a conquista do direito a liberdade e a sua atuação no processo de
socialização em que, segundo os Pedagogos da Reforma e segundo Rogers, os fatores sociais
e econômicos, podem irromper o crescimento do indivíduo, apesar de sempre existir, em
qualquer situação, uma “tendência” direcionada para esse crescimento (Rogers, 1991).
4 - A PEDAGOGIA DA AÇÃO E A ABORDAGEM CENTRADA NA
PESSOA NO CONTEXTO DA REFORMA PROTESTANTE: O LEGADO
PEDAGÓGICO DO PENSAMENTO REFORMADO.
É inegável a influência da Reforma Protestante no incentivo ao desenvolvimento
educacional, culminando com a criação das Universidades de Harvard e Yale, nos Estados
Unidos , bem como,sua influência na história das Universidades de Oxford e Cambridge, na
Inglaterra, assim como o impulso às ciências humanas e à tecnologia proporcionado pelos
Pedagogos da Reforma (Campos, 2000)
4.1 - O LEGADO PEDAGÓGICO DO REFORMADOR JOÃO STURM.
A Educação Reformada foi portadora de grandes ideais. Um dos pioneiros da
Pedagogia Protestante foi JOÃO STURM, humanista, pedagogo e reformador alemão. Nasceu
em 1507, na cidade de SCHLEIDEN e faleceu no ano de 1589 em ESTRASBURGO. Dirigiu,
a partir de 1537, o Ginásio de Estrasburgo, que se tornou em Academia em 1566 e serviu de
modelo para numerosas escolas protestantes.
Sturm formulou e realizou um plano de ensino que compreendia três instituições
diferentes:
(1) A Família
20
(2) O Ginásio
(3) E a Academia
Para ele, a educação devia propor-se a três objetivos:
(1) A Piedade
(2) O Saber
(3) E a Eloqüência
João Sturm é considerado o gênio organizador do humanismo na Europa
Setentrional. Como nenhum outro educador, ele vislumbrou claramente o objetivo da
instrução clássica, consequentemente soube propor métodos e currículos adequados ao seu
intento e a forma de organização que melhor permitiria o alcance dos objetivos ensejados
pelos novos tempos. Suas reformas educacionais estabeleceram, como vimos,o modelo para o
ginásio clássico.
O objetivo do curso era, a partir da infância, levar o aluno a alcançar a eloqüência
ciceroniana. Para tanto foram projetadas inicialmente nove classes, em 1565 acrescentou-se a
décima, com aulas obrigatórias e contínuas. As classes eram estreitamente articuladas e
deveriam seguir-se de um colégio ou curso universitário de cinco anos com aulas públicas e
livres. Cada classe tinha objetivo claramente definido: O ensino era graduado de acordo com a
idade e o desenvolvimento intelectual do aluno. O trabalho, a ser realizado durante o ano,
era estabelecido pormenorizadamente; os métodos de instrução e os conselhos eram também
formulados, em detalhes para cada professor. Sturm influenciou grandemente a Pedagogia do
Século XVI (Gouveia, 2002).
21
4.2 - O LEGADO PEDAGÓGICO DO REFORMADOR MARTINHO
LUTERO: O AUTOR DO CONCEITO DE EDUCAÇÃO ÚTIL E ABORDAGEM
CENTRADA NO ALUNO.
Martinho Lutero (1483-1546) é um dos grandes personagens que marcaram
profundamente o curso da história moderna do Ocidente. Abalou os fundamentos medievais
de seu mundo e abriu novos horizontes a seus contemporâneos. Já foi colocado, com boas
razões, ao lado dos famosos navegadores Cristóvão Colombo e Vasco da Gama, bem como de
João Gutenberg, o célebre inventor da impressa com tipos móveis.
A influência de Lutero, Teólogo, monge alemão, não se restringiu à vida
religiosa, o campo que lhe era familiar por tradição e educação. Fez-se sentir também nos
setores como educação, política, economia e outros. O impacto de sua obra sobre cultura e
costumes foi grande em todas as camadas da população. Já em sua época era impossível não
tomar posição frente à causa que ele colocara no centro das reflexões e discussões. Também
500 anos após o seu nascimento, Lutero não perdeu nada de seu significado histórico, como
mostram as solenidades comemorativas realizadas em 1983.
A produção literária de Lutero é vastíssima: prédicas, interpretações bíblicas,
escritos teológicos e eruditos, polêmicas e pastorais, a tradução da Bíblia para o alemão,
pareceres sobre as mais diversas questões, cartas e muito mais. A edição completa de suas
obras abrange mais de 100 volumes. (“Martinho Lutero, Obras Selecionadas, Volume 1,
Editora Sinodal, São Leopoldo-RS, 1987, pg.13)
4.2.1 - A FORMAÇÃO TEOLÓGICA/FILOSÓFICA DE MARTINHO
LUTERO
Na Universidade de Erfurt, Lutero foi educado segundo os padrões filosófico-
teológicos do Occanismo (Guilherme de Occam – Ordem Franciscana - 1285/1349). Cedo,
porém, começou a ficar insatisfeito com a maneira escolástica de fazer teologia. Como
professor de Hermenêutica (princípios de interpretação), desde 1512, na recém fundada
(1502) Universidade de Wittenberg, aprofundou-se no estudo da Sagrada Escritura. Em busca
de alternativas, encontrou importante ajuda nos escritos de Agostinho, bispo de Hipona, na
África do Norte, um dos maiores pensadores de toda a história da Teologia Cristã.
Agostinho era patrono da Universidade de Wittenberg, à qual Lutero pertenceu. A
partir de critérios tomados da Bíblia e de Agostinho, Lutero percebeu que a Teologia estava
22
acorrentada no cativeiro da escolástica, impossibilitada de articular adequadamente a questão
essencial da Fé Cristã: A Liberdade (Funck-Brentano, 1968)
Lutero tornou-se o mentor intelectual da nova maneira de fazer Teologia e
Pedagogia. Na Universidade de Wittenberg havia regularmente debates públicos sobre séries
de teses formuladas. Quem pretendia adquirir qualquer grau acadêmico precisava demonstrar
sua capacidade intelectual participando de tal debate (Funck-Brentano, 1968).
Para o debate de seu discípulo Francisco Gunther, pretendente ao título de
bacharel em Estudos Bíblicos, Lutero resumiu, em 95 teses claras e radicais, sua crítica a todo
o sistema da Teologia Escolástica.
Pelas teses abaixo responderá, em local e data a serem determinados ainda,
Francisco Gunther, de Nordhausen, para obtenção do grau de bacharel em Estudos Bíblicos,
sob a presidência do Reverendo Padre Matinho Lutero, agostiniano, decano da Faculdade de
Teologia de Wittenberg.
O debate realizou-se em 4 de setembro de 1517, o título de bacharel em Estudos
Bíblicos foi conferido a Francisco Gunther por unanimidade. (Fischer, 1987)
Em 31 de outubro de 1517 Lutero fixou suas 95 teses na porta da Igreja do
Castelo de Wittenberg, Alemanha.
Lutero mandou as teses também para Erfurt e Nurenberg. Estava ansioso para
conhecer a reação de outros. Chegou a se prontificar a ir pessoalmente a Erfurt para defender
publicamente seu ataque aos fundamentos da Escolástica. Seus ex-professores, no entanto,
não lhe responderam diretamente. Entre os jovens, porém, as críticas de Lutero foram
recebidas com um ato de libertação.
Em 1521 o Papa Leão X excomungou Lutero e ele foi classificado como um
foragido, o que significava que poderia ser assassinado sem que o assassino fosse punido.
Neste período foi protegido pelo Príncipe da Saxônia, que como vários outros do norte da
Europa, apoiavam suas críticas.
4.2.2 – A PEDAGOGIA DE MARTINHO LUTERO: EDUCAÇÃO PARA
TODOS E A IMPORTÂNCIA DO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO
Lutero tornou-se o mentor intelectual não somente da nova maneira de fazer
Teologia, como também de fazer Pedagogia. Convenceu seus colegas da Faculdade de
Teologia da necessidade de substituir as matérias tradicionais por outras, mais adequadas para
conduzir o aluno ao conhecimento.
23
A educação proposta por Lutero pressupunha a leitura da Bíblia, o que tornaria a
alfabetização uma prioridade básica em seus projetos. Por isso não organizados apenas os
colégios de grau médio mas também a escola primária pública. Por colocarem o poder secular
acima do poder religioso, competia ao Estado a gerência da educação de sua população, o que
levará à Educação Pública.
Lutero pede em sua famosa “Carta Aos Regedores de Todas as Cidades da Nação
Alemã” para manterem e estabelecerem Escolas Cristãs com comprometimento dos
governantes com a Educação Pública e de qualidade: “Portanto suplico a todos, estimados
governantes e amigos, pela graça de Deus e pela juventude pobre e abandonada, não
considerar isto como assunto sem importância(isto é, a criação de escolas), como fazem
alguns que, em sua cegueira, menosprezam os ardis do inimigo. Pois é um grande e solene
dever que nos está imposto, um dever de imensa importância para Cristo e o mundo, prestar
auxílio e conselho à juventude”.(Martinho Lutero:Obras Selecionadas, Volume l, Editora
Sinodal , São Leopoldo-RS, 1987, pg.127) .
No final do Século XVI havia se constituído uma Educação Pública na
Alemanha, que se dividiu em:
(l) Escolas Primárias: Ensino Popular, Alfabetização e Ensino Religioso
(2) Escolas Secundárias: Mais voltadas para a burguesia, que juntava a Tradição
Humanista e a Religião, preparando cléricos e profissionais liberais.
(3) Escola Superior ou Universidades.
“Os sistemas de Escolas Públicas dos Estados Alemães foram os primeiros do tipo
moderno. Em 1565 é aprovada uma lei que instituiu uma Escola Elementar vernácula em
cada aldeia com o intuito de ensinar a leitura, escrita, religião e música sacra.
Em 1773 o ensino obrigatório estendeu-se dos cincos aos catorze anos e foi
efetivado. O ano escolar tinha a duração de dez anos e as crianças eram obrigadas a freqüentar
a escola todos os dias úteis da semana, de 9 às 12 horas e de 13 às 16 horas. Os pais eram
inclusive multados pela falta de freqüência dos filhos.” ( Monroe, 1983, pg.209,Apud).
Lutero, em sua Pedagogia da Ação e na Abordagem Centrada Na Pessoa enfatizava
que a tarefa da educação não era uma prerrogativa exclusiva da Igreja, a família e o Estado
tinham responsabilidade sobre a formação de suas crianças e juventude. Afirmava que o
ensino além de ser estatal e gratuito, deveria ser obrigatório. A escola deveria ter um caráter
24
prático, útil, no sentido de preparar a criança para viver em sociedade, aprendendo ofícios ou
a economia doméstica para as mulheres.
A idéia da Escola Pública e para todos, organizada em três ciclos, Fundamental,
Médio e Superior e voltada para o saber útil, nasce em Lutero.
A Pedagogia de Lutero produziu uma reforma global do sistema de ensino alemão,
que inaugurou a Escola Moderna. Seus reflexos se estenderam pelo ocidente e chega aos dias
de hoje. (Um olhar Sobre Educação, Ética e Cidadania, Universidade Presbiteriana
Mackenzie-SP Coleção Reflexão Acadêmica, Volume I, 2002).
4.3 - O LEGADO PEDAGÓGICO DE PHILIPP MELANCHTHON: O
EDUCADOR DA ALEMANHA.
Philipp Melanchthon (Bretten, 16 de fevereiro 1497 - Wittenberg, 29 de abril de
1560) foi um reformador alemão, colaborador de Lutero, redigiu a Confissão de Augsburgo
(1530) e converteu-se no maior líder do Luterianismo após a morte do próprio Lutero.
Melanchthon teve educação esmerada e distinguiu-se nos estudos de grego e
latim. Um de seus mestres (tio-avô) foi o humanista Johannes Reuchlin. Reuchlin obteve que
fosse na Universidade de Heidelberg aos doze anos de idade. Terminou ali seus estudos no
ano de 1511, como bacharel em Artes.
Reuchelin o recomendou ao Príncipe-eleito Frederico da Saxônia para a recém-
fundada Universidade de Wittenberg; ali, sua aula inaugural, em 1518, intitulou-se “Reforma
da Instrução dos Jovens”. (Philipp Melanchthon, Wikipédia, a enciclopédia livre).
Melanchthon é considerado o primeiro sistemático da Reforma. Publicou trabalhos
não apenas na Teologia, mas também na Psicologia, Física (escreveu um trabalho sobre o
Sistema Solar proposto por Copérnico) e Filosofia. Tudo isso contribuiu para que ele tivesse
um respaldo no meio universitário. (Wikipédia.org/wiki/philipp mellanchton).
Melanchthon foi o mais ativo reformador de seu tempo no campo da educação.
Daí ser conhecido como o “Preceptor da Alemanha”. Preparou muitos professores escolares e
escreveu vários livros didáticos.
Melanchthon fundou o Ginásio de Nurenberg em 1526 e criou os Regulamentos
Escolares Para a Saxônia que será amplamente adotado em todo o país. Melanchthon
mantinha correspondência com 56 escolas em toda a Alemanha, orientando e aconselhando
sobre diretrizes de ensino e modelos administrativos, por isto foi reconhecido como um
25
educador incansável. Ele estava desgostoso com a pobreza da instrução nas escolas alemãs
durante a idade Média o que exprime em seu De Miserus Paedagogorum no que relata o triste
estado da instrução em escolas. Melanchthon instalou em sua própria casa uma escola
experimental onde fez experiência pedagógicas por dez anos. Até o Século XVIII os manuais
acadêmicos e escolares de Melanchton foram usados por todos os lados, inclusive em
institutos ligados à Roma. Seus conceitos de Direito Natural e razão tiveram influência sobre
a Filosofia Iluminista.
Melanchton, antes de sua morte, foi reconhecido pelo seu trabalho de reforma e
expansão do sistema universitário alemão, que produziu principalmente intelectuais,
servidores públicos e pregadores ilustres, todos bem preparados. (Caderno de História da
Educação do Instituto a Vez do Mestre).
4.4 - O LEGADO PEDAGÓGICO DE JOÃO CALVINO: O EDUCADOR
DE GENEBRA.
Foi nesse período de conflitos e de mudanças na Filosofia da Educação das
escolas e universidades européias que João Calvino (Noyon, Oise, 1509 – Genebra,1564)
entrou em cena.
Calvino teve a sua educação superior na Universidade de Paris, onde adquiriu,
como ele próprio testificou, uma boa noção da diferenças entre velhas e novas idéias
educacionais.
Da Universidade de Órleans, onde estudou Direito, recebeu forte influência do
Humanismo do seu tempo, humanismo esse que sempre o acompanhou. Mesmo como um
convertido ao Protestantismo, ele sempre procurou estimular o estudo dos Clássicos, da
Retórica e das Línguas Originais
Calvin (1950) cita que: “Calvino é sempre, mais ou menos, o humanista que era
em 1532, quando escreveu sua primeira obra completamente Humanista, um
Comentário do Tratado de Clementia, de Sêneca.”
Enquanto Calvino estudava em Paris, sob o antigo sistema de Tomás de Aquino,
percebeu os benefícios da nova abordagem da Pedagogia Educacional, Pedagogia da Ação,
com uma abordagem centrada na pessoa do aluno, ao estudar com Melchior Wolmar,
Guilherme Budé e Lefivre D’ Étaples. De um grupo de jovens formados aos pés desses
mestres surgiram vários educadores que posteriormente vieram a dar o melhor de si no
sentido de implantar os novos métodos e técnicas pedagógicas.
26
Dentre esses estudantes destaca-se Johannes Sturm, que em 1536 foi para
Estrasburgo a fim de dirigir a Academia daquela cidade. Foi ali que Calvino, em seu exílio de
Genebra (1538-1541), adquiriu uma experiência prática dos novos métodos de lecionar, sob a
orientação de Sturm. (João Calvino- wilkipédia, a enciclopédia livre – pt
wilkipédia.org/wiki/joão calvino).
Calvino passou a ensinar no sistema educacional de Estrasburgo, que possuía a
seguinte conformação:
(1) Jardim da Infância: Para crianças abaixo de 6
anos
(2) Gymnasium: Para estudantes entre 6 e 15 anos
Obs) No Gymnasium, os estudantes concentravam-se em estudos lingüísticos,
particularmente no domínio do Latim.
(3) Hochschule- Escola Superior ou Academia: Para
estudantes de 16 anos em diante.
Obs) Os alunos da Academia estudavam grego, hebraico, Filosofia, Matemática,
Física, História, Direito e Teologia. (Apud- Reid, “Calvin and the Founding”).
Foi esse modelo educacional que Calvino aprendeu de Sturm e aplicou em
Genebra. Grande parte das energias de Calvino foi gasta na obra educacional de Genebra,
onde dedicou-se à criação de escolas. Por essa razão, foi na área da educação que Calvino
desfrutou de seus sucessos mais duradouros. Moore afirma:
“Está claro em seus escritos que Calvino
estava perspicazmente cônscio da
importância do ministério de ensino para
a concretização de sua obra em Genebra.
Por exemplo, essa consciência se vê
Claramente manifesta em sua carta
Ao leitor apresentando a edição de 1559
De suas Institutas. Nela ele descreve
sua ida para Genebra em termos educacionais,
sendo a natureza de sua própria obra
cumprir o ofício de mestre.” (Os Princípios Educacionais de João
Calvino – www3.mackenzie.br/editora/index)
27
A EDUCAÇÃO EM GENEBRA ANTES DA ACADEMIA: Antes de Calvino, a
educação em Genebra era extremamente precária. Só havia um colégio em Genebra até à
época da chegada de Calvino.
Quando Calvino chegou pela segunda vez em Genebra, em 1541, esse colégio, que
estava decadente e prestes a desaparecer, foi reorganizado e passou a oferecer ensino gratuito.
Quando Calvino iniciou as suas atividades em Genebra, convenceu-se de que a
educação era a grande solução para tirar o povo das trevas da ignorância.
A EDUCAÇÃO EM GENEBRA COM A CHEGADA DE CALVINO: Quando
assumiu o seu trabalho na Igreja de Genebra, em 1536, Calvino apresentou um plano ao
Conselho Municipal que incluía uma escola para todas as crianças, na qual as crianças pobres
teriam ensino gratuito. A seguir, ele começou a trabalhar com as crianças da cidade,
escrevendo um Catecismo para elas.
Os esforços de Calvino para a implantação dessa escola foram insistentes. O
resultado desta proposta foi o Collège de La Rive. Os planos para a escola continuara até
1538, quando Calvino foi expulso de Genebra. Com sua saída, a causa educacional sofreu um
golpe mortal e a escola quase foi à falência. Somente foi reerguido com o retorno de Calvino
a Genebra em 1541.
“Assim, o Collège de La Rive foi revivido
para continuar as sua atividades por vários anos” (Apud. “Calvin
and the Fording”-8)
Foi somente em janeiro de 1558 que surgiu a oportunidade que Calvino tanto
esperava para abrir a sua Escola Modelo.
Todavia, antes que a Academia iniciasse, as escolas primárias foram inspecionadas
e reorganizadas. Elas foram reduzidas a quatro e distribuídas pelas quatro paróquias
existentes. Agora, elas eram dirigidas principalmente pelos ministros dessas paróquias. As
aulas começavam às seis da manha no verão e às sete no inverno, e terminavam às quatro da
tarde. (Apud- McNeill, History and Character of Calvinism,192).
Nessas escolas, os alunos principalmente, os da classe 7, passava do alfabeto à
leitura do francês fluente e já saboreavam algo do Latim. A classe 6 era instruída na gramática
28
latina e se exercitava numa composição simples em Latim. Virgílio, Ovídio e Cícero eram
estudados. A gramática grega começava na classe 4. As classes 3 a 1 tinham abundância de
Latim e Literatura Grega. Aos sábados, os alunos ouviam por uma hora a leitura de porções
do Novo Testamento Grego, juntamente com noções de retórica e dialética, com base nos
textos clássicos.
A educação das escolas elementares e colegiais de Genebra já refletia o
humanismo, a Pedagogia da Ação e a abordagem centrada no aluno do seu principal mentor
dentro do Protestantismo, João Calvino. Ele insistia que os alunos das escolas genebrinas,
semelhantemente aos de Estrasburgo, fossem hábeis tanto no falar quanto no escrever em
latim à moda de Cícero. Não é sem razão que, diante da sua capacitação no latim, se dizia que
“meninos de Genebra falavam como os doutores da Sorbonne” (Fides Reformata, Revista,
vol.V nº 1 pg.49)
O ESTABELECIMENTO DA ACADEMIA DE GENEBRA: Em cerimônia
formal, uma grande assembléia reuniu-se na Catedral de Saint Pierre no dia 5 de junho de
1559, para dar início à solenidade de inauguração da Academia de Genebra. Toda a cerimônia
foi presidida por Calvino. Ele invocou a bênção de Deus sobre a instituição educacional
nascente, que foi dedicada sempre para o estudo das Ciências e da Religião. Todavia, o
principal discurso foi proferido em latim por Beza, que ali foi reitor, destacando de maneira
erudita os pontos altos da história da educação e congratulando-se com a cidade de Genebra
por tão importante empreitada.
Um dos pontos mais altos da cerimônia foi a leitura das leis e dos regulamentos da
Academia, tendo Calvino como seu autor. Então, discretamente, o reformador fez um breve
discurso em francês e terminou a cerimônia com uma oração. É notável que Calvino não
tenha procurado para si a posição de presidente da Academia, entregando-a ao seu novo
colega Teodoro Beza.
O Teólogo Anglicano brasileiro Robinson Cavalcanti lembra que:
“Apaixonado pela cultura, Calvino estabeleceu
Um sistema escolar modelo em todos os níveis,
tornando a Academia de Genebra um dos mais
respeitáveis estabelecimento de instrução superior
de seu tempo, A Pedagogia Calvinista, dentro do
Protestantismo, é a mais abrangente e voltada para
a presença de Cristo no mundo. (Cavalcanti, 1985, p. 124-125)
29
A Academia tinha um princípio de Gestão bem articulado. A primeira pessoa no
“comando” era o Reitor, nomeado por dois anos. Ele possuía assistentes: No Colégio ele tinha
o Diretor (um dos professores), que acumulava as tarefas de observar se o trabalho dos
departamentos estava sendo desenvolvido adequadamente. O diretor também contava com
regentes, que eram professores dos vários graus do Colégio responsáveis por executar as
determinações do diretor nos assuntos referentes à instrução.. Ainda sob a imediata supervisão
do reitor estavam os professores de hebraico, grego, artes e teologia, que eram os responsáveis
pelos estudos daqueles que haviam alcançado o nível universitário. Com esse regulamento da
estrutura da escola, João Calvino foi um dos primeiros educadores a estabelecer um sistema
de fácil entendimento e execução.
O SUCESSO DA ACADEMIA DE GENEBRA: O sucesso da Academia foi
extraordinário. Ela foi o berço de grande parte do ministério protestante da Europa naquela
época.
Não somente Genebra, mas outras regiões da Europa foram diretamente afetadas
pela criação da Academia e das outras escolas de Genebra. É perfeitamente justo dizer que
não somente a Academia, mas todo o contexto acadêmico, político, social, litúrgico e
teológico afetaram positivamente toda a Europa e, posteriormente, o continente americano.
João Calvino produziu um grande impacto como teólogo, Pastor e Educador. Sua
influência foi magistralmente descritas nas palavras de Willian Monter:
“Esse pregador, educador e conselheiro havia se tornado
Uma força moral extraordinária em Genebra, e sua influência
difundiu-se em muitas áreas além do ministério pastoral.
Quando ele morreu em 1564, Genebra perdeu o homem que lhe
havia dado o suprimento de homens, instituições e idéias que a
capacitariam a sobreviver como um território isolado no meio de
terras católicas, como uma pequenina cidade-estado cercada pelo
absolutismo dos príncipes, e como um modelo para todas as
comunidades reformadas e igrejas de seu século” (Willian Monter,
Calvinismo em Genebra, 1975, p.119-1209)
O pensamento pedagógico de Calvino ecoa com firmeza até os dias de hoje e está
no fundamento de toda a cultura ocidental.
30
A sua filosofia de auto-perpetuação da educação em Genebra teve tanto êxito que
permaneceu ao longo do tempo. Mais tarde aquela desprezada Academia tornou-se a famosa
Universidade de Genebra, mundialmente reconhecida.
4.5 - O LEGADO PEDAGÓGICO DE JOÃO AMÓS COMENIUS: O PAI
DA DIDÁTICA MAGNA.
A Reforma protestante rompeu com as instituições escolásticas sobre a educação,
posto que suas origens encontram-se no humanismo renascentista e deu impulso decisivo a
uma Pedagogia da Ação, a uma Abordagem Centrada na Pessoa, a afirmação do princípio da
instrução universal e laica.
A partir do Século XVII, alguns teóricos desenvolveram uma Filosofia
Educacional Protestante que desejavam adequar o espírito dos reformadores para o campo
educativo. Com o objetivo de transformar esta filosofia numa prática, criaram procedimentos
metodológicos capazes de fazer com que todas as crianças aprendessem.
O maior expoente da Pedagogia da Ação Protestante, contudo, foi Comenius,
considerado o Pai da Didática e fundador da Pedagogia enquanto área do conhecimento
específico. A área da Pedagogia que tem por objetivo de estudo o ensino é a Didática.
Enquanto adjetivo, o termo “didática” , “didático”, é conhecido desde a Grécia,
significando uma ação de ensinar presente nas relações entre os mais velhos e os jovens,
crianças e adultos, na família e nos demais espaços sociais e públicos. Essa didática implícita
na ação de ensinar de um Sócrates, por exemplo, começará a ganhar contornos de campo
específico e autônomo a partir do Século XVII, com o reformador protestante João Amós
Comenius (I562-1670), que escreve, entre 1627 e 1655, a obra Didática Magna, tratado de
arte universal de ensinar tudo a todos. Esse subtítulo é revelador do caráter revolucionário
dessa obra e do projeto educacional implícito nela, fruto da atuação de seu autor nos países da
Europa Central, onde havia se instalado a Reforma Protestante.
Comenius, pautado por ideais ético-religiosos, desenvolveu o que acreditava ser
um método único para ensinar tudo a todos. Especialmente a ler e a escrever, começando pela
língua materna, numa época em que predominava o latim. E ensinar a toda a população, de
modo que ela tivesse acesso direto às Escrituras, sem a intermediação da então poderosa
hierarquia religiosa predominante.
31
Com sua Didática, Comenius pretende que a didática seja um processo seguro e
excelente de instituir, em todas as comunidades de qualquer reino cristão, cidades, aldeias,
escolas tais que toda a juventude de um e de outro sexo, sem excetuar ninguém em parte
alguma, possa ser formada nos estudos, educada nos bons costumes, impregnada de piedade,
e, desta maneira, possa ser, nos anos da puberdade, instruída em tudo o que diz respeito à vida
presente e à vida futura, com economia de tempo e de fadiga, com agrado e com solidez
(Comenius in Cortez, 2002).
Imbuído da Pedagogia da Ação Protestante, e querendo efetuar uma verdadeira
reforma no sistema escolar de seu tempo, Comenius propõe a regeneração dos costumes, a
organização de um cenário social da época. Pretendia-se pela escola, trabalhar aspectos
atinentes à moralização da vida social, à civilização dos costumes, à racionalidade da vida
pública e, até mesmo, a institucionalização de uma ética do trabalho. Sua proposta educativa,
como já vimos, era universal, pragmática e buscava a rapidez em todo o processo de ensino-
aprendizagem, tornando esta tarefa um prazer para o mestre e para o aluno (Comenius in
Cortez, 2002).
Comenius procurava formar homens sábios, piedosos e prudentes. Em seu modelo
educacional contemplava já naqueles tempos a primazia da inteligência, memória e vontade,
na formação do homem.
Sem sombra de dúvida, encontramos em Comenius as bases para a generalização
da escola a toda a população, requisito e demanda do desenvolvimento comercial, da
constituição das cidades e, bem mais adiante, do capitalismo industrial no final do Século
XIX (Comenius in Cortez, 2002).
O ensino da didática comeniana, tem seu fundamento na própria natureza; perfeita
enquanto criação divina, fornece em seu processo evolutivo as bases para o ensino: do simples
para o complexo, cada etapa a seu tempo, todo fruto amadurece, mas precisa de condições
adequadas. Sua verdade é demonstrada com exemplos paralelos das artes mecânicas (criações
do homem com base no funcionamento da natureza). O curso dos estudos é distribuído por
anos, meses, dias e horas; e, enfim, é indicado um caminho fácil e seguro para pôr essas
coisas em prática com bom resultado (Comenius in Cortez, 2002).
Também em Comenius encontramos uma atenção especial à natureza dos
conhecimentos a serem ensinados:
(1) As Línguas
(2) A Matemática
32
(3) As Ciências
(4) A Filosofia
que requeriam particularidades no seu ensino.
Na Didática Magna, Comenius realiza uma racionalização de todas as ações
educativas, indo da Teoria Didática até às questões do cotidiano da sala de aula. A prática
escolar, para ele, deveria imitar os processos da natureza. Nas relações entre professor e
aluno, seriam consideradas as possibilidades e os interesses das crianças. O professor passaria
a ser visto como um profissional, não um missionário, e seria bem remunerado por isso. E a
organização do tempo e do currículo levaria em conta os limites do corpo e a necessidade,
tanto dos alunos quanto dos professores, de ter outras atividades (Nova Escola, Edição 170,
março de 2004).
Segundo Comenius, o fim último do homem é a felicidade eterna. Assim, o
objetivo da educação é ajudar o homem a tingir essa finalidade transcendente e cósmica,
desenvolvendo o domínio de si mesmo através do conhecimento de si próprio e de todas as
coisas. Comenius concordava com os educadores medievais na concepção dos fins da
educação, mas diferenciou-se deles na concepção dos meios através dos quais a educação e
avaliação se processaria:
(1) No respeito ao estágio de desenvolvimento da criança no
processo de aprendizagem.
(2) Na construção do conhecimento através da experiência,
da observação e da ação
(3) Na educação sem punição, mas com diálogo, exemplo e
ambiente adequado. (Comenius in Cortez, 2002).
Comenius pregava ainda a necessidade da interdisciplinaridade, da afetividade do
educador e de um ambiente escolar arejado, bonito, com espaço livre e ecológico.
Estão ainda entre as ações propostas pelo educador tcheco:
(1) Coerência de propósitos educacionais entre família e
escola
(2) Desenvolvimento do raciocínio lógico e do espírito
científico
(3) Na formação do homem religioso, social, político,
racional, afetivo e moral.
33
Comenius valorizava o processo indutivo como sendo a melhor forma de se
chegar ao conhecimento generalizado, e aplicou-o na sua prática instrucional. Ele afirmava
que o método indutivo estava mais de acordo com a natureza propunha a inclusão do estudo
dos fenômenos físicos nos currículos e nos livros escolares (Cortez, 2002).
Em Comenius havia uma crítica à Francis Bacon no sentido de que seu método de
busca do conhecimento verdadeiro só se aplicava sobre os fenômenos naturais. Para
Comenius haveriam três fontes de conhecimento:
(1) Os Sentidos
(2) O Intelecto
(3) A Revelação Divina
Para evitar o erro deve-se buscar uma harmonia entre estes três modos de
conhecimento. Comenius era um crítico dos axiomas típicos da educação medieval mas
o seu método, como exposto na Didática Magna também parte, muitas vezes de modos de
classificação do mundo que não passam pela tão comentada observação direta do objeto.
Quando apresenta os estudos de física afirma que o mundo é constituído por três
“qualidades”:
(1) Consistência
(2) Oleosidade
(3) Aquosidade
Uma típica classificação proto-científica. Ainda assim ele pode ser considerado um
dos precursores da introdução de métodos científicos na educação, o que pode ser observado
em suas idéias sobre o Método:
1- Aquilo que é para ser aprendido deve ser ensinado, isto
é, o objeto ou a idéia apresentada diretamente à criança, e não por meio de
sua forma ou símbolo.
2- Tudo o que se ensina deve ser ensinado tendo em vista a
sua aplicação prática na vida diária e a sua utilidade específica.
3- Tudo o que se ensina deve ser ensinado abertamente e
não de modo obscuro e complicado.
4- Tudo o que se ensina deve ser ensinado com referência à
sua verdadeira natureza e origem, quer dizer, através de suas causas.
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5- Para se aprender qualquer coisa deve-se primeiro
explicar os seus princípios gerais. Os detalhes são considerados depois.
6- Todas as partes de um objeto ou matéria, mesmo a
menor, sem uma única exceção devem ser aprendidas na sua respectiva
ordem, posição e relação com as demais.
7- Todas as coisas devem ser ensinadas em sua devida
ordem e nunca mais de uma coisa de uma só vez.
8- Não devemos deixar nenhum assunto antes de vê-lo
completamente compreendido.
9- Devem-se acentuar as diferenças entre as coisas, a fim de
que qualquer conhecimento delas possa ser claro e distinto (Monroe, 1958).
Em 1631, Comenius publicou Porta Aberta das Línguas, que passou a ser usado
como um manual de línguas, substituindo antigos autores como Donato. Em 1657 fez uma
adaptação deste livro em que utilizava gravuras ilustrativas como instrumento da
aprendizagem. Foi o primeiro livro didático ilustrado para crianças. Os objetos eram
apresentados pelas gravuras e não por símbolos ou palavras. Cada objeto da gravura era
numerado e ao lado se apresentavam textos explicativos (Comenius in Cortez, 2002).
Para Comenius a linguagem e a inteligência são leis imutáveis do método, a
marcha incessantemente paralela do entendimento e da linguagem: tantas idéias adquiridas,
tantas palavras para exprimi-las. Idéias, sem palavras para representá-las, é o mesmo que uma
estátua muda; palavras, sem idéias em que se baseiam, é o caso do papagaio.
As palavras são os sinais das coisas: se ignorarmos as coisas, que significam as
palavras? Se uma criança sabe recitar milhares de palavras, sem ser capaz de aplicá-las às
coisas, para que lhe serve todo esse aparato? Esperar que as palavras isoladas formem o
discurso por si mesmas é esperar que os grãos de areia se disponham, sozinhos, em montes,
ou que pedras, sem nenhum auxílio, formem um muro” (Comenius in Cortez, 2002).
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5 - CONCLUSÃO
Na Pedagogia da Ação Protestante, a educação passou a ser entendida como meio
de realização humana. Ela deve preparar a pessoa não só para uma habilitação profissional,
mas também, e muito mais, para a própria vida, oferecendo as condições mínimas de
convivência social.
A educação, na visão da Pedagogia da Ação e Abordagem Centrada Na Pessoa, é
uma arte e a mais difícil entre todas porque a matéria-prima é o ser humano em formação e
crescimento.
Os valores a serem transmitidos e aprendidos devem preparar o educando para a
vida qualificada e dignificada no exercício da cidadania consciente.
A Pedagogia Moderna, à luz da abordagem pedagógica da ação centrada na
pessoa, não deve somente transmitir conhecimento, porque não passa de um exercício de
memorização, ela deve levar à reflexão e à descoberta de valores que respondam às
necessidades básicas da vida humana.
A Pedagogia da Ação numa abordagem centrada na pessoa, coloca a primazia da
inteligência sobre a memória, fato que a escola brasileira, pela média, desconhece até hoje. O
estímulo da inteligência propicia o desenvolvimento da consciência crítica e esta é capaz de
gerar as transformações que a humanidade carece para o seu desenvolvimento e
aperfeiçoamento em sua caminhada.
O trabalho visa uma Pedagogia para o amor ao próximo que se expressa de forma
objetiva em ações concretas e participação responsável na construção da cidadania e do bem
estar da coletividade e da comunidade, considerando as mais importantes expressões de
justiça social: justiça para a igualdade, justiça pela necessidade e, justiça pela
proporcionalidade, sendo que está última é a grande mediadora das tensões econômicas e
sociais no mundo ocidental.
Reconhece-se desta forma a estreita ligação existente entre princípios éticos,
religiosos e educacionais. O interesse universal em despertar o ser humano para os valores
essenciais da vida permite que as diferentes culturas e povos busquem seus próprios valores.
Todavia, princípios éticos e educacionais sempre definem os valores, porque visam alcançar
objetivos comuns: Formar hábitos, costumes, comportamentos para a convivência social, e ao
mesmo tempo informar o cidadão e faze-lo consciente de seu compromisso social como
participante solidário.
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A escola torna-se o instrumento hábil que oferece as condições para o
desenvolvimento dos talentos individuais. Toda a metodologia ou projeto de ensino-
aprendizagem tem como fim último oferecer condições adequadas para a educação almejada.
É responsabilidade primordial da educação discutir os valores culturais, religiosos
e éticos, que estabelecem as diretrizes comportamentais da convivência social. Os valores
definem as ações, portanto, a prática da cidadania.
A educação, na visão da Pedagogia da Ação numa Abordagem Centrada Na
Pessoa, deve ser julgada não tanto pelo que o homem possui em conhecimento, especialmente
no contexto da Sociedade da Informação, mas sim pelo que é e pelo que faz. Capacidade para
uma cidadania eficiente e honesta é mais importante do que a intelectualidade de líderes
teóricos. A cidadania se efetiva em ações que demonstram responsabilidade social,
sustentabilidade e ética no respeito ao ser humano e à sua dignidade e identidade pessoal. Eis
a essência do nosso trabalho.
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