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EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ COLENDA CÂMARA EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DESEMBARGADOR(A) RELATOR(A) EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) PROCURADOR(A) DE JUSTIÇA PROCESSO Nº. _______ – PROCESSO CRIME – TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33 DA LEI 11.343/2006) AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ RÉ: _______ O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ , por meio dos Promotores de Justiça que ao final assinam, vem impetrar, com fulcro no art. 5º, II, da Lei 12.016/2009 ( contrario sensu ) e no art. 92, X, do Regimento Interno do TJPR , o presente MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR contra ato coator ilegal proferido pela DOUTA JUÍZA SUBSTITUTA DA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE ______ (PR), _________, a fim de atribuir efeito suspensivo a Recurso em Sentido Estrito interposto com fulcro no art. 581, V, do CPP, tendo como interessada e litisconsorte passiva necessária a Senhora ______, brasileira, solteira, desempregada, RG _____, natural de _____, nascida em ______, filha de ______, com endereço na Rua ______, nos termos de fato e de direito que passa a expor: I – DOS FATOS 1

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ … · se trata, portanto, de pedido de conversão em prisão preventiva somente pelo fato de a custodiada ter cometido o fato típico

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EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ

COLENDA CÂMARA

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DESEMBARGADOR(A) RELATOR(A)

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) PROCURADOR(A) DE JUSTIÇA

PROCESSO Nº. _______ – PROCESSO CRIME – TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33 DA LEI

11.343/2006)

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ

RÉ: _______

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por meio dos

Promotores de Justiça que ao final assinam, vem impetrar, com fulcro no art. 5º, II, da Lei

12.016/2009 ( contrario sensu ) e no art. 92, X, do Regimento Interno do TJPR, o presente

MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR contra ato coator ilegal

proferido pela DOUTA JUÍZA SUBSTITUTA DA VARA CRIMINAL DA COMARCA

DE ______ (PR), _________, a fim de atribuir efeito suspensivo a Recurso em Sentido

Estrito interposto com fulcro no art. 581, V, do CPP, tendo como interessada e

litisconsorte passiva necessária a Senhora ______, brasileira, solteira, desempregada, RG

_____, natural de _____, nascida em ______, filha de ______, com endereço na Rua ______,

nos termos de fato e de direito que passa a expor:

I – DOS FATOS

1

Trata-se de mandado de segurança que se impetra contra ato ilegal proferido

pela douta Juíza Substituta com atuação na Vara Criminal da Comarca de ______ (PR), a qual

revogou prisão preventiva de ______, decretada a fim de garantir a ordem pública, pois presa

pela prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes (art. 33 da Lei 11.343/2006) cumulado

com a causa de aumento de pena descrita no art. 40, V, da Lei 11.343/2006, tendo em vista

que transportava 204 Kg (DUZENTOS E QUATRO QUILOGRAMAS) de substância

popularmente conhecida como maconha.

Narrou a recorrida no seu interrogatório policial que transportava tal

quantidade de drogas para a cidade de Assis (SP), evidenciando a intenção de transpor os

limites do Estado do Paraná e configurando o tráfico interestadual de entorpecentes.

Presa em flagrante por Policiais Militares que receberam denúncias

anônimas, foram promovidas as medidas legais cabíveis constantes do Inquérito Policial nº.

______. Foi elaborado auto de prisão em flagrante (mov. 1.4 do IP), foram ouvidos os

condutores e testemunhas (mov. 1.5 e 1.6), elaborado auto de exibição e apreensão da

droga (mov. 1.7), auto de constatação provisória de droga (mov. 1.9), foi interrogada a

recorrida (mov. 1.10) e lhe foi entregue nota de culpa (mov. 1.11).

O Ministério Público se manifestou pela homologação da prisão em

flagrante e conversão de tal prisão em preventiva, tendo em vista a gravidade concreta da

conduta, representada pela enorme quantidade de drogas apreendidas (mov. 9.1 do inquérito

policial).

A juíza titular da Vara Criminal da Comarca de ______ (PR) houve por

bem decretar a prisão preventiva da Recorrida, motivando seu juízo na enorme

quantidade de drogas apreendidas, que representa perigo em concreto apto a subverter

a ordem pública. A douta magistrada que decretou a prisão preventiva, inclusive,

transcreveu os termos da manifestação ministerial, decidindo o seguinte:

Em que pese a segregação cautelar seja a ultima ratio, entendo que na

espécie estão presentes os pressupostos para decretação da prisão

preventiva, porquanto há indícios suficientes de materialidade delitiva

(existência do crime) e de autoria que recaem sobre a flagranteada,

que foi detida transportando grande quantidade de substância análoga2

a “maconha” (auto de constatação provisória de droga – mov. 1.9).

Não posso deixar de observar que o crime em tese praticado pela

conduzida é grave, equiparado aos crimes hediondos, os quais

oferecem alto risco à ordem pública e ao interesse da coletividade.

Vale transcrever, por oportuno, o teor da gravidade concreta do fato

delituoso em tese cometido pela conduzida.

Colhe-se do auto de prisão em flagrante, em suma, que existiam

denúncias de que a conduzida estaria transportando entorpecentes do

Município de Umuarama em direção ao Município de Assis/SP. Por

este motivo, os policiais militares permaneceram à espera dos

veículos indicados na informação anônima, e quando estes foram

avistados obtiveram êxito na abordagem do veículo conduzido pela

autuada. Quando da abordagem policial localizaram no porta-

malas uma grande quantidade de substância entorpecente,

consistente em 154 (cento e cinquenta e quatro) tabletes da droga

vulgarmente conhecida como “maconha”, conforme auto de

constatação provisória de substância entorpecente (mov. 1.9).

Perante a Autoridade Policial, a flagrada narra que reside na

cidade de Japurá/PR e que recebeu proposta financeira no valor

de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para transportar o entorpecente

ao Município de Assis/SP. Nota-se, a princípio, a intenção ou ao

menos anuência com a realização do tráfico interestadual de drogas.

Assim, pois, é de se constatar que a substancial quantidade da droga

apreendida, bem como a circunstância de a prisão ter sido

corroborada por denúncias precedentes exaspera a gravidade do crime

e evidencia que colocar a autuada em liberdade pode acarretar grande

prejuízo à ordem pública.

Como bem asseverado pelo I. Promotor de Justiça (mov. 9.1), “Não

se trata, portanto, de pedido de conversão em prisão preventiva

somente pelo fato de a custodiada ter cometido o fato típico descrito

no Art. 33, caput, da Lei 11.343/2006. A conduta, representada pela

elevada quantidade de droga com ela apreendida, revela gravidade

3

concreta que transbordou os limites do tipo penal em comento, cuja

reprovabilidade tem grau mais acentuado e danosidade apta a

subverter a ordem pública”.

Desta forma, tenho que a gravidade da infração, aliada à repercussão

social gerada pelo delito praticado autoriza o Poder Judiciário a

determinar a prisão cautelar da agente, como medida de garantia da

ordem pública, diante da possibilidade de que, acaso colocada em

liberdade, volte a flagrada a reincidir na prática criminosa (mov. 12.1

do Inquérito Policial).

Frise-se que a ré daqueles autos foi presa em flagrante em 16 de julho de

2015, tendo sido oferecida denúncia em 31 de julho de 2015. A audiência de instrução e

julgamento se deu em 3 de dezembro de 2015, ou seja, o processo transcorreu regularmente e

de forma célere.

A defesa, naquela oportunidade, pugnou pela revogação da prisão

preventiva, nos seguintes termos:

“MM Juíza, considerando as peculiaridades do caso é possível

conceder a liberdade provisória, taticamente concluiu a

instrução processual, trata-se de ré primária de bons

antecedentes, com endereço fixo e o tempo em que já está presa

foi o suficiente para encerrar a instrução do processo, tempo

em que já está sofrendo constrangimento ilegal e desnecessário

devido a ameaças feitos por outros detentos, tendo que

permanecer do lado de fora da cela algemada nas sextas-feiras.

Esclarecendo que já houve pedido de transferência sendo que

foi indeferido por falta de vagas, ainda a ré tem família sendo

uma filho de 08 anos que necessita de seus cuidados. Diante,

deste quadro peculiar é de se conceder o direito da mesma

responder ao processo em liberdade ou alternativamente que

seja determinada a prisão domiciliar. Termo em que pede

deferimento.”

O Ministério Público, por sua vez, manifestou-se: 4

“MM Juíza, em que pese o pedido formulado pela defesa,

sustentando a liberdade provisória da acusada em razão do

término da instrução processual e no fato de que ela

supostamente sofra ameaças na cadeia, os fundamentos não

convergem com os motivos que ensejaram a decretação da

prisão preventiva. O término da instrução criminal só é motivo

suficiente para a revogação da prisão preventiva quando

motivada na conveniência da instrução criminal, que não é o

caso dos autos. Ademais, o fato de a presa sofrer ameaças na

cadeia enseja sim cuidados por parte da administração do

cárcere e não constitui fundamento para ensejar a liberdade

provisória. Em verdade, no caso em apreço a decretação da

prisão preventiva tem fundamento na garantia da ordem

pública, lastrada na quantidade de droga apreendida, situação

que representa a gravidade em concreto do delito, apta a

subverter a ordem pública. Os 204 kg (duzentos e quatro

quilogramas) de maconha apreendidos com a acusada têm

potencial lesivo ao bem jurídico saúde pública que extrapola os

limites abstratos do tipo penal descrito no art. 33, caput, da Lei

de Drogas, demonstrando gravidade em concreto que sobressai

à simples prática da conduta delituosa. Por fim, para evitar

qualquer discussão inócua, o fato de a acusada ser primária,

ostentar bons antecedentes não é bastante para embasar a

liberdade provisória, mormente em razão da gravidade

concreta da conduta a ela imputada. Outro não é o

entendimento dos Tribunais Superiores a esse respeito, v.g.

acórdão proferido no HC 5443-PR pelo STJ. Com efeito, requer

seja mantida a segregação cautelar da acusada, pois mantidos

os pressupostos fáticos que embasaram a suya decretação,

notadamente a gravidade em concreto do delito, sendo

imperiosa a sua manutenção para a garantia da ordem pública5

e manutenção da credibilidade das instituições responsáveis

pela persecução penal. Por fim, o Ministério Público desiste da

oitiva da testemunha ______”

A Juíza Substituta, acolhendo pedido da defesa, revogou a prisão preventiva,

sob os seguintes fundamentos:

“1) A prisão preventiva configura medida excepcional e

extrema, haja vista ensejar a privação de liberdade do réu sem

que haja sentença penal condenatória. Por tal motivo, o art.

312 do CPP elenca um rol de pressupostos que devem estar

presentes para que a segregação cautelar do acusado seja

possível. No caso em apreço, muito embora a quantidade de

drogas apreendida com a ré seja realmente grande, e extrapole

o que é comumente apreendido na região, entendo que este fato

se situa na gravidade abstrata do delito, e não na gravidade

concreta, mormente pois, embora consumado o crime, a droga

não chegou ao destinatário final, evitando-se, desta forma, os

danos efetivamente provocados pelo tráfico de entorpecentes.

Além disso, esta magistrada costuma entender que a simples

primariedade e a residência fixa não são requisitos suficientes

para a concessão da liberdade provisória, contudo, in casu,

verifico que a acusada não oferece risco à instrução processual

(que, inclusive, já se encerrou), nem a aplicação efetiva da lei

penal. É oportuno registrar que esta decisão não está pautada

na situação carcerária da ré, pois como bem pontuado pelo

Ministério Público, tal fato dá ensejo apenas a medidas

administrativas, mas sim na análise do caso concreto, em que a

prisão preventiva, em meu sentir, não atende nenhum dos

pressupostos estampados no art. 312 do CPP. Por fim, em que

pese a quantidade e a natureza da droga figurarem como

circunstâncias desfavoráveis, a ré é confessa e primária, sendo6

que sua pena, provavelmente não será compatível com o regime

fechado. Por esta razão, com mira na excepcionalidade da

prisão preventiva, e no princípio da proporcionalidade, hei por

bem acolher o pedido da defesa e conceder a liberdade

provisória a ré, que deverá comprovar ocupação lícita no prazo

de 30 (trinta) dias, sob pena de revogação da medida. Expeça-

se competente alvará de soltura se por al não estiver presa.”

Face a tal decisão, o Ministério Público interpôs em audiência o recurso em

sentido estrito, com fundamento no art. 581, V, do CPP. A juíza recebeu o recurso, que se

encontra anexo ao presente writ.

Como ficou evidente, a decisão que revogou a prisão preventiva confundiu a

motivação que ensejou a decretação da segregação cautelar. Isso porque a juíza fundou-se no

encerramento da instrução criminal e considerou que transportar 204 kg (duzentos e quatro

quilogramas) de drogas compõe o perigo abstrato do art. 33 da Lei 11.343/2006. Demais

disso, mesmo não se aplicando a regra do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas a mulas

(entendimento esposado pelo STJ), bem como que a quantidade de droga apreendida é motivo

suficiente para a imposição do regime fechado (entendimento do STJ), a juíza anteviu e

antecipou o julgamento da sentença, dizendo que provavelmente o regime inicial de

cumprimento de pena não será o fechado.

Com a devida vênia, ficou clara a erronia da douta julgadora de piso.

Denota-se, portanto, imperiosa a impetração do presente mandado de

segurança a fim de atribuir efeito suspensivo ao Recurso em Sentido Estrito, o qual não goza

de tal efeito, notadamente porque a decisão proferida foi teratológica e é apta a vulnerar de

forma severa a ordem pública, e o direito líquido e certo à segurança pública, nos termos de

direito que passa a expor.

II – DO CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA PARA

ATRIBUIR EFEITO SUSPENSIVO EM RECURSO EM SENTIDO

ESTRITO

7

Sabe-se que em regra não é possível impetrar mandado de segurança contra

decisão judicial. Contudo, há hipótese clara da Lei 12.016/2009 que admite a utilização do

writ, conforme a interpretação a contrario sensu de seu art. 5º, II, que verbera:

Art. 5o Não se concederá mandado de segurança quando se tratar:

[...]

II - de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito

suspensivo;

A lei, ao vedar a impetração de mandado de segurança para impugnar

decisão judicial da qual caiba efeito suspensivo, traz, em interpretação contrária, a

possibilidade de impetração do writ para recursos aos quais NÃO SEJA ATRIBUÍDO

EFEITO SUSPENSIVO. Desse modo, como ao Recurso em Sentido Estrito NÃO SE

ATRIBUI EFEITO SUSPENSIVO quando impugna revogação de prisão preventiva e

concessão de liberdade provisória (art. 584 do CPP, contrario sensu), cabível sua impetração

para tal fim.

Nesse sentido, Renato Brasileiro de Lima ensina:

e) atribuição de efeito suspensivo a recurso que não seja dotado

desse efeito: tem sido muito comum a utilização deo mandado de

segurança a fim de se agrgar efeito suspensivo a recurso que não o

possua.

É o que ocorre, por exemplo, com o RESE interposto contra decisão

que determina a revogação da prisão preventiva (CPP, art. 581, V).

De acordo com o CPP, esse RESE não é dotado de efeito suspensivo

(art. art. 584, interpretado a contrario sensu) o que significa que o

acusado será colocado imediatamente em liberdade. Nesse caso, de

modo a impedir que essa decisão produza efeitos de imediato, caberia

ao Ministério Público, além da interposição do recurso em sentido

estrito, impetrar mandado de segurança objetivando a concessão de

efeito suspensivo ao referido recurso.

Se, antes, essa hipótese era amplamente admitida pelos Tribunais

8

Superiores, hoje, pode-se dizer que sua utilização tem sido acolhida

apenas em situações excepcionais, desde que demonstrada manifesta

ilegalidade da decisão impugnada. Portanto, excepcionalmente, em

situações teratológicas, abusivas, que posasm gerar dano irreparável,

devido ao fato de o recurso adequado não ser dotado de efeito

suspensivo, admite-se que a parte se utilize do mandamus, levando-se

em conta, ainda, que a Constituição Federal, em seu art. 5º, LXIX,

não faz restrição quanto a seu uso, desde que presentes os seus

pressupostos que haverão de ser cumulativos.

A própria Lei nº 12.016/09 confirma qessa possibilidade ao prever

que não será concedido mandado de segurança quando se tratar de

decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo (art. 5º,

II). Ora, interpretando-se a contrario sensu esse dispositivo, é de se

concluir que é possível a impetração do mandamus quando o recurso

cabível contra a decisão judicial não for dotado de efeito suspensivo.

Nessa linha, como já se pronunciou o STJ, “não obstante a

legitimidade do Ministério Público para impetrar Mandado de

Segurança com vistas a suspender a eficácia da decisão impugnada

(obtenção de efeito suspensivo), tal só se efetiva se o ato judicial

questionado se mostrar manifestamente ilegal (teratológica) ao ponto

de ensejar tal medida extrema; se ao contrário, reveste-se de

juridicidade, como no caso sub judice, em que se deu ao pedido de

progressão de regime prisional a solução adequada, calcada, inclusive,

na orientação do clendo STF, por óbvio, não será conferido efeito

suspensivo ao Agravo”.1

Encampando o entendimento sufragado pela doutrina, o Supremo Tribunal

Federal tem entendido que:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DIREITO

PROCESSUAL PENAL. ENUNCIADO 691 DA SÚMULA DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SUPRESSÃO DE

INSTÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. MANDADO DE1LIMA, Renato Brasileiro de. Manuel de Processo Penal. Volume Único. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 1747.

9

SEGURANÇA. CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. LEGITIMIDADE.

SUPERVENIÊNCIA DE PRONÚNCIA. NEGATIVA DE DIREITO

A RECURSO EM LIBERDADE. PREJUDICIALIDADE DO WRIT.

AGRAVO DESPROVIDO. [...] 3. Reveste-se de legitimidade a�

decisão do Tribunal que, deferindo mandado de segurança

impetrado por promotor de justiça, outorga efeito suspensivo a

recurso em sentido estrito deduzido pelo ministério público

contra ato judicial concessivo de liberdade provisoria (HC�

70392, Relator (a): Min. CELSO DE MELLO, PRIMEIRA

TURMA, julgado em 31/08/1993, DJ 01-10-1993). [...] 7. Agravo

ao qual se nega provimento. (STF - HC: 108187 SP, Relator: Min.

LUIZ FUX, Data de Julgamento: 04/10/2011, Primeira Turma, Data

de Publicação: DJe-207 DIVULG 26-10-2011 PUBLIC 27-10-2011).

Tendo em vista a decisão teratológica proferida pela juíza de primeira

instância e a possibilidade de causar dano grave e irreparável, curial o recebimento do

presente writ, admitido de forma excepcional na hipótese versada.

Quanto aos pressupostos do Mandado de Segurança, tem-se que todos eles

estão presentes:

i) Ato Ilegal: O juízo determinou a revogação da prisão preventiva de

“mula” presa com 204 kg (duzentos e quatro quilogramas) de maconha, entendendo que tal

contexto configurava a gravidade em abstrato do delito, em total descompasso com o

entendimento sufragado pelo STJ, TJPR, STF e demais Tribunais pátrios;

ii) Praticado por Autoridade Coatora: A decisão foi proferida pela Juíza

Substituta da Vara Criminal da Comarca de ______ (PR), autoridade pública e, portanto,

autoridade coatora para fins de mandado de segurança;

iii) Direito Líquido e certo: De acordo com o entendimento esposado nesta

demanda, o Ministério Público entende que o direito à segurança pública da coletividade

encontra-se vulnerado, de sorte que o objeto deste writ está calcado no art. 5º, caput, art. 6º,

10

caput, e art. 144 e seguintes, todos da Constituição da República.

iv) Prova pré-constituída: As provas necessárias para a análise do caso

posto estão encartadas aos autos, sendo desnecessária qualquer dilação probatória a fim de

atribuir efeito suspensivo ao Recurso em Sentido Estrito.

Com efeito, presentes os pressupostos para a impetração do mandado de

segurança e demonstrada a teratologia da decisão impugnada, imperiosa a concessão da

segurança a fim de conceder efeito suspensivo ao recurso em sentido estrito, bem como seja

concedida liminar, sob pena de vulnerar a ordem pública e o direito à segurança pública.

III – DO ATO ILEGAL E DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO

A) DIREITO LÍQUIDO E CERTO À SEGURANÇA PÚBLICA.

IMPOSSIBILIDADE DE PERMITIR A PROTEÇÃO DEFICIENTE

O direito líquido e certo que se busca defender no presente writ é o direito à

segurança pública, insculpido nos artigos 5º, caput, 6º, caput, e 144 e seguintes da Carta

Magna. Tais dispositivos estão assim dispostos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes

no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à

segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[…]

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o

trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência

social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos

desamparados, na forma desta Constituição.

[…]

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e

responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem

pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos

seguintes órgãos:

11

Marcelo Novelino sustenta que:

A segurança pública por finalidade a manutenção e o

restabelecimento da ordem pública e a preservação da

incolumidade das pessoas e do patrimônio, sendo exercida por

meio dos órgãos de polícia federal (inclusive a rodoviária e a

ferroviária) e estadual (polícias civis, polícias militares e corpos

de bombeiros militares) (CF, art. 144).2

Evidente que não somente as forças policiais exercem e tutelam a segurança

pública. Todos os órgãos responsáveis pela persecução penal exercem papel primordial na

consecução desses direitos, não podendo se descurar das funções do Ministério Público e do

Poder Judiciário na garantia de segurança à população.

Nessa senda, a decisão combatida vulnera sobremaneira o próprio direito à

segurança pública, que vem a ser tutelado nesse writ pelo Ministério Público. A decisão

combatida por meio de RESE (o qual não goza de efeito suspensivo) pôs em liberdade

indivíduo preso com 204 kg (duzentos e quatro quilogramas) de maconha, evidenciando o

potencial lesivo da conduta que extrapola os limites abstratos do tipo do art. 33, caput, da Lei

de Drogas.

A decisão, além de passar uma mensagem de estímulo à criminalidade,

estímulo à utilização de mulas pelo tráfico ilícito de entorpecentes, deixa a sociedade

desguarnecida, ao passo que permite que crimes com a gravidade concreta como o caso em

análise recebam um tratamento sobremaneira brando das instituições responsáveis pela

persecução penal.

Nessa senda, imperioso destacar que a justiça penal se guia pelo princípio da

proporcionalidade em toda a sua extensão, sob pena de ser inconstitucional. A par da

concepção clássica do princípio da proporcionalidade relativa à proibição do excesso, que

impede o Poder Totalitário do Estado, tem-se a perspectiva da proibição da proteção

deficiente, insuficiente ou infraproteção.

2NOVELINO, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 9ª ed. São Paulo: Método, 2014, p. 1011.12

O STF tem verberado a utilização e enfrentamento do princípio da

proporcionalidade pela vertente da proibição da proteção deficiente quando de suas decisões,

notadamente a decisão que entendeu ser pública incondicionada a ação penal para apurar

crime de lesão corporal praticado no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher

(ADI 4424).

Do mesmo modo, a juíza de primeira instância conferiu proteção

insuficiente à sociedade, na medida em que libertou indivíduo preso com 204 kg de

maconha, causando intranquilidade social, descrédito absoluto do Poder Judiciário e

das instituições responsáveis pela persecução penal e um clima patente de impunidade

em toda a sociedade, com uma clara mensagem de estímulo à utilização de mulas para a

prática de crimes de tráfico por organizações criminosas.

Com efeito, o direito líquido e certo deve ser pautado como aquele que

independe de prova para a sua demonstração, previsto que está em uma norma cuja subsunção

possa ser constatada de plano. José dos Santos Carvalho Filho vaticina que: “Domina,

porém, o entendimento de que o direito líquido e certo é aquele que pode ser comprovado de

plano, ou seja, aquela situação que permite ao autor da ação exibir desde logo os elementos

de prova que conduzam à certeza e liquidez dos fatos que amparam o direito.”3

Dessa maneira, demonstrada a existência do direito líquido e certo

consistente na segurança pública (art. 5º, caput, art. 6º, cpaut, e artigos 144 e seguintes da CF)

e a consequente lesão pela proteção deficiente conduzida pela autoridade coatora, estão

perfeitamente contemplados os pressupostos do mandado de segurança e evidenciada a

necessidade de concessão da segurança para tutelar o direito à segurança pública da

sociedade.

B) PERIGO CONCRETO DA CONDUTA. QUANTIDADE DE DROGAS QUE

EXTRAPOLA OS LIMITES EM ABSTRATO DO TIPO PENAL. ORDEM PÚBLICA

VULNERADA. ENTENDIMENTO UNÂNIME DA JURISPRUDÊNCIA

Em primeiro lugar, a juíza de primeiro grau considerou que o fato de a

Recorrida ter sido apreendida com 204 kg (duzentos e quatro quilogramas) de substância

3CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 28ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 1071.

13

entorpecente conhecida como maconha não representa periculosidade concreta da conduta,

mas sim a simples gravidade em abstrato que se tipifica no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006.

Com a devida vênia do entendimento esposado pelo juízo vergastado, ele

está em desencontro com o entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência.

Quanto ao entendimento doutrinário, valiosas são as lições de Guilherme de

Souza Nucci, doutrinador e Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

12-A. Outros fatores demonstrativos de periculosidade: ainda no

contexto da garantia da ordem pública, outros elementos podem ser

apontados, em variados julgados, analisando casos concretos, para dar

base à periculosidade do agente.São eles: o modo de execução do

delito, que pode evidenciar extrema crueldade; a quantidade de

coautores e partícipes, mesmo não figurando associação criminosa; o

número e a potencialidade lesiva das armas; a quantidade

exorbitante de drogas ou a sua manifesta variedade; a lida com

explosivos e outros meios capazes de gerar perigo comum; a

minuciosa premeditação para diminuir, consideravelmente, as chances

de defesa da vítima, a visível disparidade de forças entre o agente e a

fraqueza da vítima, dentre outros. (grifos)4

Seguindo a trilha do entendimento doutrinário, a jurisprudência dos

Tribunais Superiores tem verberado que:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. LIBERDADE

PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. ORDEM PÚBLICA.

GRAVIDADE CONCRETA. APREENSÃO DE VULTOSA

QUANTIDADE DE DROGA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE

MANIFESTA. VIA INDEVIDAMENTE UTILIZADA EM

SUBSTITUIÇÃO A RECURSO ORDINÁRIO. NÃO

CONHECIMENTO. 1. Mostra-se inadequado e descabido o manejo

de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário cabível. 2. É

4NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 14ª ed. São Paulo: Forense, 2015, p. 728.

14

imperiosa a necessidade de racionalização do writ, a bem de se

prestigiar a lógica do sistema recursal, devendo ser observada sua

função constitucional, de sanar ilegalidade ou abuso de poder que

resulte em coação ou ameaça à liberdade de locomoção. 3. "O habeas

corpus é garantia fundamental que não pode ser vulgarizada, sob pena

de sua descaracterização como remédio heróico,e seu emprego não

pode servir a escamotear o instituto recursalprevisto no texto da

Constituição" (STF, HC 104.045/RJ). 4. Hipótese em que não há

flagrante ilegalidade a ser reconhecida. A prisão provisória é

medida odiosa, reservada para os casos de absoluta

imprescindibilidade, demonstrados os pressupostos e requisitos

de cautelaridade. Na hipótese, estando a prisão fundamentada na

gravidade concreta dos fatos, cifrada na significativa quantidade

de droga apreendida com o paciente (428gramas de maconha),

evidencia-se o risco para ordem pública. 5. Habeas corpus não

conhecido. (STJ - HC: 255636 MG 2012/0206305-0, Relator:

Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de

Julgamento: 27/11/2012, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação:

DJe 06/12/2012).

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. LIBERDADE

PROVISÓRIA.INDEFERIMENTO. ORDEM PÚBLICA.

POSSIBILIDADE DE REITERAÇÃO DELITIVA.GRAVIDADE

CONCRETA. APREENSÃO DE VULTOSA QUANTIDADE DE

DROGA.AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. ORDEM

DENEGADA. 1. A prisão provisória é medida odiosa, reservada

para os casos deabsoluta imprescindibilidade, demonstrados os

pressupostos erequisitos de cautelaridade. 2. Na hipótese, a prisão

preventiva da paciente foi decretada para agarantia da ordem

pública em razão da concreta possibilidade dereiteração delitiva,

tendo em vista que, apesar de tecnicamenteprimária, não é a

primeira passagem policial que ela possui pelaprática, em tese, do

crime de tráfico de drogas e associação para otráfico. 3. Ademais,

15

a prisão foi fundamentada na gravidade concreta dosfatos,

cifrada na significativa quantidade de droga apreendida com

apaciente (150 pedras de crack, 5 sacolas contendo cocaína e 18

pinosde cocaína). 4. Habeas corpus denegado. (STJ - HC: 255149

MG 2012/0201724-7, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE

ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 04/12/2012, T6 - SEXTA

TURMA, Data de Publicação: DJe 11/12/2012).

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO.

DESCABIMENTO. COMPETÊNCIA DAS CORTES SUPERIORES.

MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. MODIFICAÇÃO DE

ENTENDIMENTO DO STJ, EM CONSONÂNCIA COM O STF.

TRÁFICO DE DROGAS. LIBERDADE PROVISÓRIA.

FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA E SUFICIENTE PARA

JUSTIFICAR O INDEFERIMENTO DO PLEITO. EXCESSO DE

PRAZO JUSTIFICADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO

EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. O

Superior Tribunal de Justiça, adequando-se à nova orientação da

Suprema Corte quanto à restrição da admissibilidade da impetração de

habeas corpus, tem entendido pelo seu descabimento como sucedâneo

de recurso. 2. Hipótese em que o Paciente foi preso em flagrante

em 29/11/11, mantendo em depósito 8,470g de cocaína e 12,620g

de crack, para fins de comércio, sem autorização ou em desacordo

com determinação legal. 3. A negativa do pedido de liberdade

provisória do Paciente possui fundamentação idônea, uma vez

que apontou fatos suficientes para demonstrar o abalo à ordem

pública, a saber, a quantidade e a qualidade do entorpecente

comercializado, bem como a forma como estava acondicionado, o

que evidencia a prática do crime de tráfico de drogas em larga

escala. 4. Não há que se falar em excesso de prazo para formação da

culpa. Na espécie, trata-se de feito complexo, com pluralidade de réus

e que, mesmo assim, vem tramitando de forma regular, não havendo

qualquer desídia do aparelho estatal. Aplicação do princípio da

16

razoabilidade. 5. Ademais, o processo, com instrução criminal

encerrada, será concluso para sentença. Apreciação da Súmula nº 52

do Superior Tribunal de Justiça. 6. Ausência de ilegalidade flagrante

que, eventualmente, ensejasse a concessão da ordem de ofício. 7.

Habeas corpus não conhecido, com recomendação de urgência na

conclusão do feito. (STJ - HC: 253783 SP 2012/0190284-6, Relator:

Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 04/04/2013, T5 -

QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/04/2013).

Esses e um sem número de julgados do STJ e do próprio TJPR conflitam

com o entendimento esposado pela autoridade coatora, o que indica a necessidade de se

atribuir efeito suspensivo ao recurso em sentido estrito interposto com fulcro no art. 581, V,

do CPP, tendo em vista que o fato de a Ré ter sido presa em flagrante com 204 kg (duzentos e

quatro quilogramas) de maconha, que seriam conduzidos ao Estado de São Paulo,

representa gravidade concreta significativa, apta à subversão da ordem pública e não se

limita, como entendeu a julgadora de piso, aos estritos termos do tipo penal,

extrapolando em muito a sua gravidade em abstrato.

B) IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE CAUSA DE DIMINUIÇÃO

DE PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. QUANTIDADE

DE DROGAS QUE AUTORIZA A IMPOSIÇÃO DE REGIME INICIAL FECHADO

PARA O CUMPRIMENTO DE PENA

A douta juíza de piso fundamentou a revogação da prisão preventiva da

Recorrida no fato de ela ser primária e confessa, de modo que sua pena provavelmente terá

como regime inicial de cumprimento o semiaberto.

Entrementes, infere-se que além de antever o julgamento a ser proferido

quando da prolação da sentença, a julgadora deixa de levar em consideração notadamente a

gravidade em concreto da conduta que impede a imposição de regime semiaberto para o caso

em comento.

17

Em primeiro lugar, impossível conceder à Recorrida os benefícios atinentes

à causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006. Isso porque o fato

de ela ser utilizada como “mula do tráfico” indica clara e evidente participação em

organização criminosa que dedica sua vida ao crime. Se é a primeira ou segunda ou centésima

vez que a recorrida se presta a transportar drogas como mula, o fato é irrelevante, pois sua

anuência à associação criminosa é patente.

Tem-se como requisito impeditivo da concessão da causa de diminuição de

pena a integração de organização criminosa (art. 33, § 4º, da Lei de Drogas). Renato

Brasileiro de Lima, com bastante propriedade, explica tal entendimento:

Prevalece, todavia, o entendimento de que se trata de pessoa dedicada

à atividade criminosa e integrante de organização criminosa, o que

acaba por inviabilizar a aplicação da referida minorante. A propósito,

em caso concreto referente a uma “mula” que foi flagrada

transportando 951,2 g (novecentos e cinquenta e um gramas e dois

miligramas) de cocaína, a 2ª Turma do Supremo concluiu que, por

mais que se trate de cidadão primário, com bons antecedentes, e que

não se dedicasse à atividade criminosa, seria inviável a aplicação da

causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, já

que tais pessoas geralmente integram organizações criminosas, na

medida em que seu trabalho é condição sine qua non para a

narcotraficância internacional.5

Nessa trilha, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que:

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE

DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA. AUSÊNCIA DE

PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. PACIENTE QUE

INTEGRA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. "MULA". REGIME

PRISIONAL FECHADO. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS

DESFAVORÁVEIS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO

CONFIGURADO. TESES SUSCITADAS APENAS NO AGRAVO

REGIMENTAL. INDEVIDA INOVAÇÃO RECURSAL. 1. Deve ser

5LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação Criminal Especial Comentada. 2ª ed. Salvador: Juspodivm, 2014, p.745.

18

mantida por seus próprios fundamentos a decisão monocrática que

negou seguimento ao habeas corpus, porquanto o paciente, enquanto

no exercício da função de "mula", integra organização criminosa

e, portanto, não preenche os requisitos exigidos para a aplicação

da causa de diminuição de pena descrita no art. 33, § 4º, da Lei n.

11.343/2006. Ademais, o regime prisional fechado foi justificado

com base nas circunstâncias judiciais desfavoráveis. 2. Não tem

cabimento inovar em sede de agravo regimental, pleiteando-se a

abordagem de temas não ventilados na inicial do habeas corpus, o que

acontece quanto à alegada necessidade, para que seja negada a

aplicação da minorante contida no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006,

de caracterização da organização criminosa prevista na Lei n.

12.850/2013 ou na Convenção das Nações Unidas contra o Crime

Organizado Transnacional. 3. Agravo regimental improvido. (STJ -

AgRg no HC: 253194 SP 2012/0185961-6, Relator: Ministro

SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Julgamento: 24/04/2014, T6 -

SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/05/2014)

Seguindo a trilha dos Tribunais Superiores, imperioso reconhecer a

possibilidade de imposição do regime inicial fechado para casos desse jaez, notadamente

quando a quantidade de drogas apreendidas representa circunstância desfavorável a ser

considerada na primeira fase de dosimetria de pena e também na cominação do regime inicial

aplicável. Com a força do art. 42 da Lei 11.343/2006, vem entendendo o STJ, in verbis:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL.

TRÁFICO INTERNACIONAL. QUANTIDADE E NATUREZA DA

DROGA. PREPONDERÂNCIA. VETORES UTILIZADOS PARA A

ESCOLHA TANTO DA PENA-BASE QUANTO DO REGIME

INICIAL PRISIONAL. POSSIBILIDADE. 1. É pacífico no âmbito

deste Sodalício o entendimento de que, no momento da fixação da

reprimenda, o julgador deve valorar, com preponderância sobre as

demais circunstâncias judiciais, a natureza e a quantidade da droga,

nos termos do previsto no art. 42 da Lei n. 11.343/2006. 2. Logo,

considerando-se a apreensão, na espécie, de mais de 11 kg de cocaína,

19

afigura-se legítima a elevação da pena-base, bem assim a escolha do

regime inicial fechado. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE

PENA. ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. REDUTOR

AFASTADO NA ORIGEM. ACUSADO QUE INTEGRA

ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, NA QUALIDADE DE MULA.

REEXAME DE PROVAS. SÚMULA N. 7 DO STJ. 1. Rever a

premissa firmada nas instâncias a quo no sentido de que o ora

agravante integrava organização criminosa exigiria o reexame de fatos

e provas, vedado na via especial, nos termos do verbete n. 7 da

Súmula desta Corte. 2. Ademais, esta Corte possui precedentes no

sentido de que o indivíduo que exerce a função de "mula" integra a

organização criminosa, o que impede a concessão da benesse legal. 3.

Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no REsp:

1435928 SP 2014/0036227-3, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data

de Julgamento: 09/09/2014, T5 - QUINTA TURMA, Data de

Publicação: DJe 17/09/2014)

Com efeito, a decisão combatida está em evidente descompasso com a

jurisprudência dos Tribunais Superiores e traz premissas equivocadas quanto à garantia da

ordem pública na espécie, razão pela qual merece ser reformada, a fim de ser restabelecida a

segregação cautelar da Ré. Nesse compasso, imperiosa a concessão da segurança, a fim de

atribuir efeito suspensivo ao Recurso em Sentido Estrito.

C) QUANTIDADE ELEVADA DE DROGAS. 204 KG DE MACONHA. PERIGO

CONCRETO. VULNERAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA

Por todo este arrazoado ficou evidenciado que a quantidade de drogas

apreendida com a ré foi extremamente elevada, de modo a permitir a decretação da prisão

preventiva a fim de garantir e manter a ordem pública, fundando-se em um dos pressupostos

do art. 312 do CPP.

A esse respeito, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que

20

quantidades muito menores do que a apreendida com a Recorrida (2kg, por exemplo)

fundamentam a prisão preventiva pela gravidade em concreto apta a subverter a garantia da

ordem pública. No caso, a Ré foi apreendida com 204 kg (duzentos e quatro quilogramas) de

maconha enquanto conduzia um veículo automotor que lhe foi entregue por traficantes

organizados. A sua tarefa era sair de Japurá (PR) e conduzir o veículo até Assis (SP), onde

receberia a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo serviço, como ela própria afirmou

perante a autoridade policial e referendou em juízo.

Decisões como a combatida estimulam e reforçam a utilização de

“mulas” pelo crime organizado, na medida em que estas são presas por pouco tempo e

estão posteriormente livres para abastecer e servir ao tráfico de entorpecentes, enchendo

os bolsos com dinheiro vil que ceifa vidas e destrói milhares de famílias por este país.

Atento a esse reclamo, o Superior Tribunal de Justiça reforça que:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO.

DESCABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. RÉ PRESA

CAUTELARMENTE DURANTE TODA INSTRUÇÃO

CRIMINAL. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA

CONDENATÓRIA. MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA.

GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRANDE QUANTIDADE

DE DROGAS E PERICULOSIDADE DOS AGENTES. AUSÊNCIA

DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL .ORDEM NÃO

CONHECIDA. - O Superior Tribunal de Justiça, seguindo o

entendimento da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal,

passou a inadmitir habeas corpus substitutivo de recurso próprio,

ressalvando, porém, a possibilidade de concessão da ordem de ofício

nos casos de flagrante constrangimento ilegal. - Na hipótese, a

segregação antecipada está devidamente fundamentada na garantia da

ordem pública. A diversidade e expressiva quantidade de droga

encontradas (100 kg de cocaína e cerca de 500g de maconha) ,

bem como aparelhos, maquinários e outros instrumentos, revelam a

gravidade em concreto do delito em tese cometido e a real

periculosidade do agente, que ao que tudo indica não faz do tráfico

21

ilícito de drogas uma atividade eventual. Dessa forma, persistindo os

motivos ensejadores da custódia cautelar, a ré, que permaneceu presa

durante toda a instrução criminal, não tem o direito de recorrer em

liberdade. Precedentes. Habeas corpus não conhecido. (STJ - HC:

240428 SP 2012/0083298-4, Relator: Ministra MARILZA

MAYNARD (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/SE),

Data de Julgamento: 05/03/2013, T5 - QUINTA TURMA, Data de

Publicação: DJe 08/03/2013)

Dessa maneira, a juíza, ao fundamentar a liberdade da agente no fato de a

instrução ter se encerrado descura-se do real motivo fático encampado pela juíza titular

daquela Vara para impor a segregação cautelar, qual seja: a gravidade em concreto do delito,

que representa periculosidade social apta a subverter a ordem pública e ensejar a segregação

cautelar com espeque no art. 312 do CPP.

IV – DA LIMINAR

De tudo quanto foi sustentado, verificam-se presentes os pressupostos

necessários à concessão da liminar.

O fumus boni iuris está presente, na medida em que é evidente que a Ré nos

autos do processo principal terá imposta pena privativa de liberdade em regime fechado e sua

participação em organização criminosa, como mula do tráfico é evidente. Dessa forma, o

recurso em sentido estrito tem todas as condições de ser provido, mormente porque o

entendimento nele encartado é calcado no entendimento pacífico dos Tribunais Superiores.

O periculum in mora, por sua vez, é patente, uma vez que aguardar o

julgamento do mérito do Recurso em Sentido estrito é o mesmo que permitir que a Sociedade

fique vulnerada por longo período de tempo, por mais célere que seja o trâmite processual

perante o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

Com efeito, deve ser conferida liminar, a fim de atribuir efeito suspensivo

ao Recurso em Sentido Estrito interposto, sob pena de permitir vulneração à ordem social e à

garantia da ordem pública.

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V - CONCLUSÃO

Ante do exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO

PARANÁ requer:

1. Seja CONCEDIDA LIMINAR, a fim de atribuir efeito suspensivo ao

recurso em sentido estrito interposto nos autos de nº ______, sob pena de perpetuar a ofensa

ao direito à segurança pública (artigo 5º, caput, art. 6º, caput, e artigos 144 e seguintes, todos

da CF), ao passo que a decisão da juíza de primeiro grau conferiu proteção deficiente a tal

direito e causou clima de absoluta intranquilidade social e sentimento de impunidade na

sociedade;

2. Seja NOTIFICADA a autoridade coatora para se manifestar no prazo de

10 (dez) dias;

3. Seja citada a interessada ______, como litisconsorte passiva necessária

(art. 47 do CPC) para se manifestar acerca do presente mandado de segurança, no prazo legal;

4. Seja intimado o Estado do Paraná, na pessoa do Procurador-Geral do

Estado (art. 12 do CPC) para, querendo, integrar o feito;

5. SEJA, AO FINAL, CONCEDIDA A SEGURANÇA, a fim de

ATRIBUIR EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO

interposto nos autos de Nº ______, resguardando-se o direito líquido e certo à segurança

pública, que ficou vulnerado pela decisão vergastada.

Atribui-se à causa, para efeitos fiscais, o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

______, 7 de dezembro de 2015.

MARCO FELIPE TORRES CASTELLO VERA DE FREITAS MENDONÇA

Promotor Substituto Promotora de Justiça

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