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MARKETING Do ponto de vista antropo- lógico, como se diferencia a visão de marketing e ges- tão nos Estados Unidos e na Europa, na academia e nas empresas, e como isso afeta o mundo globalizado dos negócios na prática? Os europeus enxergam marketing como pesquisa, análise, pensamento; os norte- -americanos, como vendas, ações com vista às vendas, construção de identida- de da marca. Daí se explica por que os norte-americanos tendem à ação e os europeus continuam acreditando que o dinheiro é ruim e que o Estado “baby sit- ter” deve cuidar deles. Os gestores euro- peus gastam mais tempo lidando com os sindicatos do que gerenciando. E o que dizer sobre um país fora do eixo, como o Brasil? Não ge- renciamos sindicatos, mas não agimos tanto quanto os norte-americanos... Já fiz pesquisas no Brasil, a começar por um trabalho an- tropológico no Xingu, em 1969. Conheço o código brasileiro e garanto que é muito singular, quase oposto ao vizinho argen- tino, por exemplo. Há muitos detalhes, mas posso compartilhar alguns teasers sobre ele, que, aliás, é o que explica o atual sucesso do Brasil no mundo: • É um código feminino e, por isso, opos- to ao argentino, que é masculino. • O arquétipo da cultura brasileira é a “mulher guerreira”. • O verbo é “dar um jeitinho”, o que deno- ta flexibilidade. • É muito interessante o fato de que dan- ça e música são a mesma coisa na cul- tura brasileira, simbolizando harmonia e integração. O sr. acha que a internet, as redes so- ciais online e a globalização podem subverter códigos culturais? Ao contrário! A internet reforça os códi- gos culturais. À medida que maior número de pessoas passa mais tempo no mundo virtual, elas sentem maior necessidade da dimensão real em sua vida, de uma identidade real, e isso elas encontram em seu código cultural. Veja o que está acontecendo na Bélgica, que busca a afirmação de suas raízes. A internet não apagou as diferen- ças, exacerbou-as. Sobre a globalização, chamo a atenção para o seguinte: o fato de as pessoas estarem interconectadas não significa que se comuniquem. A glo- balização não cria uma cultura global, diferentemente do que se pensa. O que a tecnologia da globalização, como a inter- net, faz é permitir que pessoas da mesma cultura sintam e reforcem sua identidade comum, seu código comum. Todos os ar- mênios do mundo podem estar ligados entre si, onde quer que estejam, e defen- der seu código cultural. O método ZMET difere de seu método? Até onde sei, nossa metodo- logia é única, ainda que mui- tas pessoas aleguem fazer algo similar. Seu último lançamento foi O Código Cultural (ed. Cam- pus/Elsevier). O sr. pode nos adiantar seu próximo livro? Decifrará o código cultural da ascensão e do sucesso, que chamamos de código UP. Quais são as culturas que estimulam as pessoas a crescer, criar, ir para cima [daí o UP, do inglês go up]? Que culturas re- primem as forças UP e mantêm as pes- soas embaixo? Entrevista de Jorge Carvalho CONTAGEM REGRESSIVA COM CLOTAIRE RAPAILLE O POLÊMICO ANTROPÓLOGO FRANCÊS CLOTAIRE RAPAILLE, QUE TRABALHOU COM CLAUDE LEVI-STRAUSS NO FINAL DA dÉcada de 1960 em pesquisas na amazônia brasileira e hOje É cOnsultOr de grande influência em Várias CORPORAÇÕES MULTINACIONAIS, REVELA QUAIS SÃO OS DIFERENCIAIS DO CÓDIGO CULTURAL BRASILEIRO HSM Management 5 4 3 2 1 DIRETO AO PONTO HSMManagement 82 • setembro-outubro 2010 hsmmanagement.com.br 8

Entrevista Dr. Clotaire Rapaille | Revista HSM Management

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O polêmico antropólogo francês Clotaire Rapaille que trabalhou com Claude Levi-Strauss no final da década de 1960 em pesquisas na amazônia brasileira e hoje é consultor de grande influência em várias corporações multinacionais, revela quais são os diferenciais do código cultural brasileiro.

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Page 1: Entrevista Dr. Clotaire Rapaille | Revista HSM Management

MARKETING

Do ponto de vista antropo-lógico, como se diferencia a visão de marketing e ges-tão nos Estados Unidos e na Europa, na academia e nas empresas, e como isso afeta

o mundo globalizado dos negócios na prática?Os europeus enxergam marketing como pesquisa, análise, pensamento; os norte--americanos, como vendas, ações com vista às vendas, construção de identida-de da marca. Daí se explica por que os norte-americanos tendem à ação e os europeus continuam acreditando que o dinheiro é ruim e que o Estado “baby sit-ter” deve cuidar deles. Os gestores euro-peus gastam mais tempo lidando com os sindicatos do que gerenciando.

E o que dizer sobre um país fora do eixo, como o Brasil? Não ge-renciamos sindicatos, mas não agimos tanto quanto os norte-americanos...Já fiz pesquisas no Brasil, a começar por um trabalho an-

tropológico no Xingu, em 1969. Conheço o código brasileiro e garanto que é muito singular, quase oposto ao vizinho argen-tino, por exemplo. Há muitos detalhes, mas posso compartilhar alguns teasers sobre ele, que, aliás, é o que explica o atual sucesso do Brasil no mundo:• É um código feminino e, por isso, opos-to ao argentino, que é masculino.• O arquétipo da cultura brasileira é a “mulher guerreira”.• O verbo é “dar um jeitinho”, o que deno-ta flexibilidade.• É muito interessante o fato de que dan-ça e música são a mesma coisa na cul-tura brasileira, simbolizando harmonia e integração.

O sr. acha que a internet, as redes so-ciais online e a globalização podem subverter códigos culturais?Ao contrário! A internet reforça os códi-

gos culturais. À medida que maior número de pessoas passa mais tempo no mundo virtual, elas sentem maior necessidade da dimensão

real em sua vida, de uma identidade real, e isso elas encontram em seu código cultural. Veja o que está acontecendo na Bélgica, que busca a afirmação de suas raízes. A internet não apagou as diferen-ças, exacerbou-as. Sobre a globalização, chamo a atenção para o seguinte: o fato de as pessoas estarem interconectadas não significa que se comuniquem. A glo-balização não cria uma cultura global, diferentemente do que se pensa. O que a tecnologia da globalização, como a inter-net, faz é permitir que pessoas da mesma cultura sintam e reforcem sua identidade comum, seu código comum. Todos os ar-mênios do mundo podem estar ligados entre si, onde quer que estejam, e defen-der seu código cultural.

O método ZMET difere de seu método?Até onde sei, nossa metodo-logia é única, ainda que mui-tas pessoas aleguem fazer algo similar.

Seu último lançamento foi O Código Cultural (ed. Cam-pus/Elsevier). O sr. pode nos adiantar seu próximo livro?Decifrará o código cultural da ascensão e do sucesso, que chamamos de código UP.

Quais são as culturas que estimulam as pessoas a crescer, criar, ir para cima [daí o UP, do inglês go up]? Que culturas re-primem as forças UP e mantêm as pes-soas embaixo?

Entrevista de Jorge Carvalho

Contagemregressiva ComCLOTAIRE RAPAILLEO POlêmiCO AnTrOPólOgO frAnCêS ClOTAirE rAPAillE, QUE TrABAlHOU COm ClAUDE lEvi-STrAUSS nO finAl DA dÉcada de 1960 em pesquisas na amazônia brasileira e hOje É cOnsultOr de grande influência em Várias COrPOrAçõES mUlTinACiOnAiS, rEvElA QUAiS SãO OS DifErEnCiAiS DO CóDigO CUlTUrAl BrASilEirO

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Direto aopONTO

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Page 2: Entrevista Dr. Clotaire Rapaille | Revista HSM Management

pONTODireto ao

uma funçãO de recursOs humanOs sOfríVel impedirá que O restO da empresa ATinJA AlTO DESEmPEnHO. SEgUnDO DOUglAS rEADy, DA lOnDOn BUSinESS SCHOOl, ela só nãO será sOfríVel se cOnseguir desenVOlVer as pessOas que estãO EnCArrEgADAS DE DESEnvOlvEr TODAS AS OUTrAS

pESSOAS

Veja os resultados de várias pesqui-sas que fizemos com executivos de empresas recentemente:

• 86% dos entrevistados acham que se pode encontrar uma oportunidade em algum lugar nestes tempos, mas a maioria não tem certeza de como aproveitar isso.• 70% afirmam que sua empresa está envolvida em reduzir o número de funcionários.• 55% das empresas que responde-

ram às pesquisas estão comprometi-das com cortes orçamentários.• 51% planejam repensar suas es-tratégias competitivas.• 45% iniciaram um congelamento nas contratações em todos os níveis.• 25% acham que sua organização não possui líderes preparados para executar o grau de mudança exigido no momento.• mais de sete de 20 gestores de rh dizem preocupar-se que o progresso significativo feito no desenvolvimento

de liderança e gestão de talentos em suas empresas na última década pos-sa se perder em decorrência do pen-samento excessivo no curto prazo e da redução não estratégica de custos.• cerca de 60% dos gestores de rh reduziram os orçamentos de treina-mento e desenvolvimento.

LíDERES DE RHdE nívEL 3

Douglas Ready é professor de compor-tamento organizacional da London Bu-siness School.

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• mais de um dentre cinco gestores de rH indicou que estaria “fora do circuito” enquanto sua empresa esti-vesse envolvida em esforços de trans-formação de toda a organização.• só 26% dos gestores de rh acha-ram que estavam equipados para ajudar a liderar a mudança ou aten-der às demandas da alta direção du-rante o período de turbulência.

Se alguém perguntar aos líderes cor-porativos se a função de rH fez avan-ços nas últimas décadas, a maioria dirá que sim e que, pelo menos até a última crise, estava à beira da pró-pria revolução. Como garantir que o rh se transforme e atinja classe mundial mesmo no contexto turbu-lento atual? Tendo profissionais que possam entregar excelência em cada um dos três estágios vinculados à operação de um negócio rentável [veja quadro ao lado].

inúmeras funções de rH estão bem avançadas em termos de seu desempenho de nível 1 e obtendo avanços marcantes quanto às metas de nível 2; contudo, poucas dentre elas estão demonstrando excelên-cia no tipo de trabalho que define o nível 3. Esse é o grande desafio das empresas atuais, porque são as con-tribuições de nível 3 que oferecem a maior esperança para que o rh seja visto como verdadeiro sócio de ne-gócio ou membro da equipe de lide-rança empreendedora da empresa.

O que ouço de inúmeras empresas é que “não temos tempo; precisa-mos desse tipo de liderança de rH agora”. faz sentido. Então, qual a melhor maneira de começar? Uma é considerar um modelo de papéis a desempenhar. Para você se tornar um líder de nível 3, é preciso:

1. Caprichar na boa execução nos niveis 1 e 2. evite avançar rápido demais. 2. Entender os principais diferenciais de sucesso para sua empresa e en-contrar modos de contribuir com va-lor singular nessas áreas.

3. Assumir riscos e agir com cora2. 2.

3. Assumir riscos e agir com coragem.4. Conseguir ser designado para pro-jetos que visem mudar o modelo de negócio de sua empresa.5. Aceitar rotação de cargos ou expa-triação.6. Conhecer os principais clientes de sua empresa e visitá-los periodicamente.7. Ser um comunicador assertivo e articulado das contribuições do rH.

para o futuro de sua empresa.

Uma coisa é certa: se você tiver baixas expectativas quanto ao va-lor que o rH deve entregar, prova-velmente acabará com uma função de rH de segunda classe. Espere e invista.

© Douglas ready

NívEL 1:entrega de serviço do RH

NívEL 2:formação e alinhamento de capacitação

NívEL 3:impacto transformacional

Objetivos • eficiência• entrega do serviço

• alinhamento estratégico• estratégia empreendedora e da unidade

• criação de valor inovador• capital humano como veículo de transformação

Atividades centrais

• entrega do programa• centros de atendimento ao cliente• identificação e contratação de fornecedor

• desenvolvimento de capacitação apoia a estratégia• gestão do pool de talentos• integração para reforçar estratégia

• reinvenção• redefinição do mapa de criação de valor

Requisitos de capacitação de RH

• excelência técnica e administrativa• mente voltada para entrega do serviço

• tino estratégico• espírito de parceria• a experiência transacional é imperativa

• concentração na transformação e liderança empreendedora• espírito da alta direção• experiência transacional e de facilitação é imperativa

HSM Management

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Page 4: Entrevista Dr. Clotaire Rapaille | Revista HSM Management

no estudo de 2009, não faltavam motivos para euforia. As transnacionais brasilei-ras avançaram muito em direção à inter-nacionalização e o ano fechou com saldo de us$ 20 bilhões de remessas ao exte-rior, mesmo após a eclosão da crise eco-nômica mundial no quarto trimestre. no estudo de 2010, contudo, o fluxo de ca-pital do Brasil para o exterior teve saldo negativo de us$ 10 bilhões, o que signi-fica que a venda de ativos e a diminuição de operações das empresas brasileiras superaram as aquisições lá fora.

Esse é o resultado que primeiro salta aos olhos na pesquisa 2010 de transna-cionais brasileiras realizada pela funda-ção Dom Cabral, de minas gerais, o que leva a uma pergunta incômoda:

O ranking de 2011 registrará nova-mente recuos? E isso significará que a internacionalização corporativa brasilei-ra se dá mais por circunstâncias do que por uma decisão estratégica?

HSM Management procurou respostas no próprio estudo fDC e fez descobertas interessantes, destacadas a seguir.

Quase 40% das empresas ficaram mais internacionais. Ainda que a crise eco-nômica tenha sido sentida por todos os

setores em 2009, 15 empresas (38% da amostra) aumentaram seu índice de in-ternacionalização em relação a 2008. e a expectativa é melhor para 2010-2011, apesar da tendência de o mercado inter-no continuar melhor do que o externo.

Aumentou o número de funcionários internacionais. nas 23 empresas que apresentaram índice de transnacionali-dade superior a 10%, houve redução nas receitas (15,7% em relação a 2009, para r$ 488,04 bilhões) e nos ativos (12,4%, para r$ 781,57 bilhões) no exterior. no entanto, aumentou seu número de funcio-nários lá fora (13,66%), mais até do que no brasil (7,63%). houve aproximadamente 45 mil contratações de 2008 para 2009 en-tre as 23 empresas, somando 638,28 mil, o que corresponde a 31,44% do total.

Externalidades também explicam re-cuo. A redução de receitas e ativos pode

ter se dado tanto pela venda de ativos, pela diminuição nas participações e pelo fechamento das subsidiárias que mais sofreram com a turbulência financeira como pela desvalorização do dólar e do euro, pela queda dos preços dos produ-tos brasileiros em razão da competiti-vidade e pela diminuição do volume de unidades vendidas.

Menos EUA e Europa, mais o restante do mundo. O que as empresas brasi-leiras fizeram foi reduzir sua exposição ao caráter volúvel dos mercados norte--americano e europeu, intensificando os investimentos na América latina, na áfrica e na ásia. por exemplo, a ci&t Softwares iniciou operações no Japão e na China. Emergindo como nova potência mundial, a china já era explorada pela Embraer, pela randon e pela votorantim, e ainda foi alvo de novos investimentos da marfrig e da Sabó, que não só conside-ra promissor o mercado chinês, como já pensa no próximo passo –a Índia.

a áfrica desponta como continente- -alvo dos investimentos brasileiros. Des-taca-se a entrada da votorantim em cinco

O estudo foi realizado pelo Núcleo de Ne-gócios Internacionais da Fundação Dom Cabral (FDC), de Minas Gerais, por Jase Ramsey, professor e coor denador do nú-cleo, Sherban Leonardo Cretoiu, gerente de internacionalização da FDC e profes-sor do núcleo, Lívia Barakat e Luísa Cruz, pesquisadoras do núcleo.

apesar de O mercadO dOmÉsticO mOstrar-se mais atraente para nOssas empresas, estudO fdc 2010 reVela que a internaciOnalizaçãO VeiO para ficar

A MAIORIDADEdas transnacionais do brasil

LOCALIZAçãO DAS TRANSNACIONAIS BRASILEIRAS

53%15%

9%17%

5%

1%Ásia

oceania

américa latina

África

europaamérica do norte

fonte: Pesquisa fDC sobre as transnacionais brasileiras.

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Direto aopONTO

pESQUISA

Page 5: Entrevista Dr. Clotaire Rapaille | Revista HSM Management

países africanos por meio de aquisições: áfrica do sul, cabo Verde, marrocos, tu-nísia e moçambique. A randon partiu para Argélia e Quênia, enquanto a Weg iniciou operações no Sudão e na repúbli-ca do Senegal. A marfrig, a Petrobras e a Totvs também aumentaram sua presen-ça no continente.

Aquisições ainda são a forma de entra-da preferencial. O ritmo de aquisições se manteve em geral, lembrando que essa

forma de entrada envolve dispêndio de capital e comprometimento com os mer-cados externos particularmente eleva-dos. Para futura expansão, é a preferên-cia de 40% das empresas da amostra.

Aquisições se verificaram até nos EUA e na Europa. Por exemplo, o ibope, que aparece na terceira posição, adquiriu uma empresa norte-americana, a zogby international. O Bradesco, o Banco Espí-rito Santo, de Portugal.

Os desempenhos operacional e de efi-ciência pesam quase tanto como o fi-nanceiro. embora, nesse cenário, 37% das empresas tenham dado mais impor-tância para o desempenho baseado em índices financeiros como vendas, cresci-mento das vendas, lucratividade –afinal, o foco do momento é na geração de caixa e manutenção do capital de giro–, é interes-sante notar que seus executivos continu-am a atribuir pesos quase iguais para as

outras duas dimensões (32% para o ope-racional e 31% para a eficiência geral).

Aumentou a satisfação com a lucrativi-dade internacional. As transnacionais apresentaram-se ligeiramente mais sa-tisfeitas com a lucratividade obtida lá fora em 2010 do que em 2009. em uma escala crescente de 1 a 5, o grau de satisfação em 2010 foi de 2,91, ante 2,83 em 2009.

pERMANENTE, Só QUE FLEXívELnos últimos dois anos, 20 empresas –ou 50% da amostra– aumentaram seu grau de presença no exterior e, no levanta-mento de 2010, sua principal estratégia foi manter ou melhorar sua posição no mercado mundial. isso parece indicar que a internacionalização é estrategica-mente permanente.

RANKING FDC 2010 DAS TRANS BRASILEIRAS

1 JBS-Friboi (produtos alimentícios) 2 Gerdau (siderurgia e metalurgia)3 Ibope (pesquisa de mercado)4 Metalfrio (máquinas e materiais elétricos)5 Odebrecht (obras de infraestrutura)6 Marfrig (produtos alimentícios)7 vale (extração de minerais metálicos)8 Sabó (autopeças)9 Tigre (material de construção)10 Suzano papel e Celulose (celulose e papel)11 Artecola (produtos químicos)12 Lupatech (máquinas e materiais elétricos)13 Camargo Corrêa (obras de infraestrutura)14 Ci&T Software (tecnologia da informação)15 Marcopolo (veículos automotores e carrocerias)16 Weg (máquinas e materiais elétricos)17 Stefanini IT Solutions (tecnologia da informação)18 votorantim (produtos de minerais não metálicos)19 América Latina Logística (transporte terrestre)20 Tam(serviço de transporte aéreo)21 Embraer (equipamentos de transporte)22 Natura (cosméticos e higiene pessoal)23 petrobras (extração de petróleo e gás natural)

1 Gerdau 54%2 Ibope 51%3 vale 46%4 Tigre 43%5 Metalfrio 41%6 JBS-Friboi 37%7 Artecola 30%8 Marfrig 23%9 Odebrecht 20%10 Sabó 19%11 Weg 17%12 Stefanini IT Solutions 16%13 Camargo Corrêa 15%14 votorantim 15%15 Lupatech 13%16 Embraer 13%17 Ci&T Software 11%18 petrobras 10%

1 JBS-Friboi 84%2 Suzano papel e Celulose 70%3 Marfrig 51%4 Gerdau 48%5 Odebrecht 46%6 Ci&T Software 37%7 Metalfrio 36%8 Sabó 34%9 vale 33%10 Ibope 32%11 Tam 31%12 Artecola 28%13 Weg 21%14 Lupatech 20%15 Tigre 20%16 Camargo Corrêa 17%17 votorantim 17%18 Embraer 15%19 Andrade Gutierrez 12%20 Marcopolo 12%21 Bematech 12%22 petrobras 11%23 Stefanini IT Solutions 11%

1 JBS-Friboi 64%2 Ibope 54%3 Metalfrio 54%4 Odebrecht 49%5 Gerdau 46%6 Marfrig 35%7 Sabó 34%8 América Latina Logística 31%9 Marcopolo 29%10 Lupatech 25%11 vale 24%12 Tigre 23%13 Natura 23%14 Artecola 21%15 Camargo Corrêa 21%16 Stefanini IT Solutions 17%17 Spoleto 15%18 Weg 11%19 petrobras 10%20 votorantim 10%

fonte: fundação Dom Cabral. Obs.: nas quatro colunas aparecem empresas que tiveram percentual de transnacionalidade superior a 10%. a primeira à esquerda traz o índice de transnacionalidade, que

combina três indicadores empresariais: valor dos ativos no exterior sobre valor total dos ativos da empresa (2ª coluna), receita de subsidiárias no exterior sobre receitas totais (3ª coluna) e número de funcionários

no exterior sobre o nacional (4ª coluna).

pOR íNDICE DE TRANSNACIONALIDADE

pOR % DE ATIvOS NO EXTERIOR

pOR % DE RECEITAS NO EXTERIOR

pOR % DE FUNCIONáRIOS NO EXTERIOR

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HSM Management

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não há dúvida de que a globalização tem exercido forte influência sobre empresas familiares e não familiares no Brasil, uma vez que elas vêm ven-dendo, produzindo, entregando ser-viços e comprando mais no mercado internacional do que há dez anos. O principal impacto da globalização é observado no aumento da importação de matéria-prima para a produção e no crescimento da concorrência es-trangeira no mercado brasileiro.

no entanto, há uma diferença entre a internacionalização de empresas fa-miliares e a de não familiares. Como mostra a tabela 1, na página ao lado, empresas não familiares ainda tendem a ser mais internacionais, na média, do que as familiares, levando em conta todos os parâmetros do estudo. O que está por trás desse retrato?

foi investigado como a família in-fluencia o processo de internacionali-zação e como é impactada por ela. As famílias empresárias das companhias pesquisadas têm dado muito apoio à expansão internacional, o que, porém, vem gerando algumas tensões internas sob três aspectos principalmente:

• expectativas de retorno sobre os in-vestimentos;• estratégia de negócios;• percepções e preferências em rela-ção aos riscos.

A maioria das empresas participantes acredita que essas questões serão re-solvidas sem nenhum impacto negati-vo duradouro nas relações familiares. Em outras palavras, tudo indica que as empresas familiares estão se tornando mais transnacionais e adaptando-se bem ao mercado cada vez mais globa-lizado, já que, no que diz respeito à glo-balização, a pesquisa comprovou que elas possuem mais semelhanças do que diferenças com as não familiares.

As multinacionais geralmente com-petem com base em preços menores, oferecendo maior gama de produtos e sendo mais agressivas quanto à marca. As empresas familiares locais tendem a responder com melhores

serviços e mais diferenciação de pro-dutos, da mesma forma que as não familiares.

As empresas familiares aparente-mente desfrutam tantas vantagens de atuar fora do país como as não fami-liares. muitas das que participaram do estudo relataram que cresceram e se tornaram mais competitivas ao ofere-cer novas habilidades a seus funcioná-rios, por exemplo.

Outras diferenças dignas de nota são:

• as empresas familiares parecem re-correr a alianças de distribuição mais frequentemente do que as não familia-res, como retratado na tabela 6. • as empresas familiares se concen-tram no reinvestimento de lucros como fonte de capital para a expansão inter-nacional, enquanto as não familiares tendem a recorrer também a inves-tidores externos e a abrir seu capital para isso (veja tabela 7).

PESQUiSA DE JOHn DAviS mOSTrA QUE AS COmPAnHiAS familiares brasileiras tambÉm se internaciOnalizam, pOrÉm mais cOm alianças de distribuiçãO

pESQUISA

saiba mais SOBRE A AMOSTRAA amostragem foi de 1,1 mil empresas, a maioria aproveitável do ponto de vis-ta metodológico, entre as quais 59% familiares e 41% não familiares. enquanto 60% das empresas familiares tinham vendas abaixo de us$ 50 milhões em 2009, somente 4% das não familiares se encaixavam nesse grupo. no outro extremo, apenas 7% das empresas familiares registravam vendas acima de us$ 1 bilhão, ante 23% das não familiares. as empresas que participaram da pesquisa fazem parte de uma gama diversa de setores de atividade.

A empresA fAmiliAr

A pesquisa foi conduzida por John A. Davis, professor da Harvard Business School, Jon I. Martínez, da Harvard University, e Florence Tsai, do Cam-bridge Institute for Family Enterprise, em parceria com a HSM do Brasil.

do BrAsil e AGLOBALIZAçAO

Direto aopONTO

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Page 7: Entrevista Dr. Clotaire Rapaille | Revista HSM Management

resultados da internacionaliZaÇÃode que forma sua empresa foi bem-sucedida na internacionalização?

Respostas Empresas familiares

Empresas não familiares

aumento do volume de vendas 87% 87%redução de custos 45% 43%expansão para outros mercados, distribuindo riscos 61% 61%

aumento do retorno sobre investimentos 57% 61%

mÉtodo de internacionaliZaÇÃo de que forma a empresa se internacionalizou

ou foi impactada pela internacionalização?

Respostas Empresas familiares

Empresas não familiares

Vendas feitas no exterior 80% 78%Produção no exterior 33% 38%serviços no exterior 48% 51%Fornecedores no exterior 67% 58%

alianÇas estratÉGicas na eXPansÃo eXterna sua empresa possui alguma aliança estratégica

significativa com empresas do exterior?

RespostasEmpresas familiares

Empresas não familiares

2009 1999 2009 1999distribuição 50% 24% 37% 20%marketing (por exemplo,marca conjunta, licenciamento) 35% 11% 38% 16%

tecnologia 54% 29% 55% 31%Compras 40% 21% 37% 15%manufatura 29% 7% 30% 14%

HSM Management

Grau de internacionaliZaÇÃodas emPresas brasileiras

Empresas familiares

Empresas não familiares

Brasil Exterior Brasil Exterior

onde vendem?1999 90% 10% 85% 15%2009 87% 13% 81% 19%

onde produzem?1999 87% 13% 73% 27%2009 83% 17% 72% 28%

onde seus funcionários estão?

1999 92% 8% 84% 16%2009 91% 9% 80% 20%

de onde compram?1999 80% 20% 63% 37%2009 70% 30% 64% 36%

de onde são seus principais concorrentes?

1999 62% 38% 45% 55%

2009 51% 49% 33% 67%

estratÉgia FinanCeiracomo sua empresa obteve o capital utilizado

nos esforços internacionais nos últimos dez anos?

Respostas Empresas familiares

Empresas não familiares

reinvestimento dos lucros 96% 88%empréstimos 59% 49%Venda de ativos 8% 15%investidores externos 11% 28%investimento adicionaldos membros da família 31% 6%

abertura de capital 10% 26%

mudanÇas orGaniZacionais Quais mudanças organizacionais significativas ocorreram para que sua empresa pudesse se internacionalizar de forma bem-sucedida

nos últimos dez anos?

Respostas Empresas familiares

Empresas não familiares

novos gestores seniores 49% 47%novas divisões de negócios 68% 65%novas áreas funcionais 62% 57%mudou quem se reporta a quem 48% 41%mudança no modelo de negócio 54% 50%aquisição ou desenvolvimentode novas capacidades 79% 78%

treinamento e desenvolvimento de novos funcionários 91% 84%

obJetiVos ao atuar no mercado GlobaliZadoPor que sua empresa decidiu atuar no mercado internacional?

Respostas Empresas familiares

Empresas não familiares

aumentar o nível de vendas ou a taxa de crescimento 88% 81%

alavancar know-how, eficiências ou sinergias para conquistar maior faturamento

74% 67%

ter acesso a tecnologia mais avançada 65% 61%

ter acesso a mercados menos competitivos, com maiores margens de lucro

60% 63%

TABELA 1 TABELA 4

TABELA 5

TABELA 6

TABELA 7

TABELA 2

TABELA 3

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Page 8: Entrevista Dr. Clotaire Rapaille | Revista HSM Management

Direto aopONTO

Houve um tempo em que, se você soubes-se o setor de atividade de uma empresa, já conseguiria definir as tecnologias que seriam utilizadas ali. Editoras estavam re-lacionadas com papel e tecnologia de im-pressão; gravadoras, com discos de vinil ou fitas magnéticas. fabricantes de má-quinas fotográficas remetiam a química e física. Esse tempo acabou, todos sabem. E o que pode ser aprendido com as em-presas que alcançaram o sucesso no novo tempo da convergência intersetorial?

1. ESQUEçA A CONvERGêNCIAnossas pesquisas mostram que as apti-dões necessárias para as três facetas do mundo dos produtos digitais são inerente-mente diferentes e divergentes:

• produção de conteúdo, que inclui ge-renciamento dos artistas, criatividade, busca de novas ideias e marketing de conteúdo;• gerenciamento da rede de telecomu-nicações, que abrange cobertura, qua-lidade, confiabilidade da rede e atendi-mento ao cliente;• desenvolvimento de tecnologia da

informação e de bens eletrônicos de consumo, envolvendo pesquisa e de-senvolvimento, teste de novas tecnolo-gias, design industrial e do processo de manufatura.

Apesar de cada vez mais a estrutura de tecnologia básica ser comum a vários se-tores, não se conhece nenhuma empresa que se tenha destacado nas três áreas.

na indústria de mídia, por exemplo, as tecnologias digitais afetam a estru-tura tecnológica dos conteúdos e as maneiras como esse conteúdo pode ser produzido, distribuído e desfrutado, mas não afetam o conteúdo bruto em si. Daí ser difícil para as empresas de software

produzir somente conteúdo, como um programa de notícias ou de entreteni-mento para a televisão.

Criam-se barreiras que impedem uma convergência intersetorial que seja sustentável de ponta a ponta. A recente venda da endemol (empresa de produção de conteúdo) pela telefonica (empresa de

TENDêNCIAS

OS ESPECiAliSTAS Em estratÉgia jamie AnDErSOn E giAnviTO lanzOlla discutem A nOvA rEAliDADE DE EmPrESAS QUE OfErECEm PrODUTOS DigiTAiS SOBrEPOSTOS

REvOLUçãO DIGITAL pArte 2

Jamie Anderson é membro do Centre for Management Development da Lon-don Business School, de Londres, além de sócio da firma de consultoria Global-praxis. Gianvito Lanzolla é professor de estratégia da Cass Business School, também de Londres.

Ilust

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HSM Management

telecomunicações) e o anúncio da venda de parte da aOl (serviços de internet) pelo grupo time Warner (mídia) forne-cem provas concretas para sustentar essa conclusão.

2. CONSTRUA A pREDOMINâNCIAAo analisar o mundo digital, identificamos duas esferas de capacidades: uma de tec-nologia, outra de conteúdo.

• a esfera das capacidades de tecnolo-gia é formada por seis tipos de empre-sas, que podem distribuir, transportar ou atuar como provedoras de acesso ao conteúdo (veja quadro ao lado).• a esfera das capacidades de conteúdo está repleta de empresas como Disney, Emi e fox; são as criadoras de música, shows de Tv, filmes, programas espor-tivos, videogames, mapas ou conteúdo para web 2.0 (comunidades online cus-tomizadas, wikis, blogs e outros).

conforme o leitor já deve ter notado, pode haver sobreposição nas categorias, como no caso da Sony, que fabrica equipamen-tos analógicos e digitais.

nossas pesquisas mostram que duas estratégias podem ser utilizadas para construir tal predominância:

• Controlar os canais de distribuição. Por exemplo, dentro do espaço tecnológico, as empresas estão se tornando “o” portal in-terativo digital, numa tentativa de assumir o controle dos canais de distribuição. Os portais interativos digitais podem assumir muitas formas, por exemplo: uma rede de comunicação, um equipamento digital ou um portal de acesso à internet. Diferentes players no mercado, provenientes de in-dústrias de eletrônicos, empresas de Ti ou de serviços de telecomunicações, também estão competindo para assumir o controle dos canais de distribuição.

• Construir confiança. Textos ficcionais, notícias, música, esportes ou filmes, qualquer dado digitalizado pode ser facil-mente copiado e repassado. Ao mesmo tempo que o crescimento de conteúdo gerado pelos usuários é importante, ser-viços confiáveis que exijam a veracidade

do conteúdo são o sustentáculo para que as empresas ganhem e mantenham a confiança dos clientes.

3. INGRESSE EM NOvAS CADEIASAinda que a convergência entre as esferas da tecnologia e do conteúdo não seja viá-vel, nossa pesquisa mostra que há áreas em que a difusão de novas tecnologias abriu significativas oportunidades na cria-ção de cadeias de valores que aparecem no fornecimento de serviços, que são a espinha dorsal do mundo digital. Serviços analógicos tradicionais estão destinados a se tornar digitais, e as oportunidades de negócio para o desenvolvimento de novas cadeias de valores são virtualmente ilimi-tadas. Dentre essas oportunidades, três merecem destaque:

• fornecimento de serviços digitais para possibilitar a publicidade online;

• fornecimento de serviços digitais para gerenciar direitos autorais;• fornecimento de serviços digitais para transações financeiras.

projeções indicam que o valor gasto em publicidade nos canais digi-

tais aumentará drastica-mente. O jornal financial

Times estima que em 2010 o mercado de publicida-

de online mundial alcançará a marca de us$ 64 bilhões.

Por sua vez, a digitalização de con-teúdo tornou mais difícil a proteção da propriedade intelectual e novos sistemas digitais para gerenciamento de direi-tos autorais (em inglês, drm, de digital rights management) se tornam neces-sários para auxiliar empresas nessa ati-vidade-chave para a apropriação de valor. Sistemas Drm influenciarão de maneira decisiva o futuro modelo de negócio das empresas produtoras de conteúdo.

E, por fim, o crescimento de negócios digitais aumentou a necessidade de uma infraestrutura para pagamentos online.

4. FORNEçA O HARDWARE, O SOFTWARE E OS SERvIçOSPara uma empresa de Ti que tenha visão de longo prazo, também existe a opor-tunidade de fornecer ao mundo digital ferramentas para construí-lo. Com o projeto android, por exemplo, o google está visando o fornecimento de um am-biente de desenvolvimento completo, para dar aos desenvolvedores de sof-tware as ferramentas necessárias pa- ra que eles possam criar aplicativos para a internet.

Desenvolvedores de tecnologias digi-tais, como Cisco, motorola e microsoft (em parceria com o Yahoo!), também tentam estabelecer sistemas e aplica-tivos populares, ganhando assim o con-trole do mercado para essas ferramen-tas de desenvolvimento. Outras em-presas, como iBm, HP e Ericsson, vêm criando produtos sofisticados que têm a capacidade de integrar sistemas.

TIpOS De empresasa) Tradicionais distribuidores de con-teúdo –locadoras de DvDs como Blockbuster ou livrarias.b) fabricantes de equipamentos analógicos –empresas como Sony.c) Provedores de acesso a conteúdo –empresas como google e youTube.d) fabricantes de equipamentos digitais –como Apple e nokia.e) Operadores de redes de teleco-municações –como vodafone e Sky.f) Desenvolvedores de tecnologias digitais –como Ericsson, microsoft, Siemens e iBm.

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Direto ao

O leitor certamente já sentiu na pele paradoxos da gestão como a avalia-ção de desempenho do indivíduo vis-à-vis à da equipe. Ou a força versus a fraqueza da coesão organizacional. A intensidade de tais paradoxos, assim como sua inter-relação, varia confor-me a cultura da empresa, mas eles es-tão presentes no ambiente de negócios como um todo, em constante mutação. Disso emergem contradições, com implicações profundas para a gestão e o desempenho das empresas. Em outras palavras, a competência para administrar os paradoxos é o que pode construir o futuro da organização.

nenhum lugar do mundo ocidental (além de partes significativas do oriental)

escapa ao fenômeno, mas como isso vem ocorrendo no Brasil especificamente?

Se a cultura brasileira matizou com cores ainda mais intensas o modelo hie-rárquico ao estabelecer suas relações de poder –ainda altamente verticais, mesmo que disfarçadas pela proximidade pes- soal e pela flexibilidade, que, a sua manei-ra, amenizam a rigidez no cumprimento das regras–, é indiscutível que esse mo-delo hierárquico de governança está em xeque também aqui. seja pelas recentes mudanças sociais, que levam as pessoas a buscar maior autonomia profissional e a priorizar seu desenvolvimento indivi- dual em detrimento da lealdade à orga-nização, seja pela forte demanda de de-sempenho, o questionamento é evidente.

hoje está em construção um modelo que aumenta a complexidade das rela-ções organizacionais e requer processos horizontais de coordenação no trato com parceiros, tanto internos como externos. O líder deixa de ser controlador para se tor-nar orientador estratégico. Passa de es-pecialista funcional a facilitador da rede. A gestão é aprimorada pela mensuração e pela mobilização, não mais pelo controle.

O resultado de tanto debate e transfor-mação é uma nova lógica de gestão or-ganizacional, especialmente desafiadora

para a cultura tradicional brasileira.

GOvERNANçA =EQUIpE + INDIvíDUOas empresas já percebidas como vence-doras, em qualquer parte do planeta e no Brasil também, revelam significativa con-sistência entre elementos fundamentais para seu equilíbrio e desenvolvimento. Elas vão além de estratégia, estrutura e processos organizacionais, combinando- -os com cultura, liderança e pessoas, tudo isso magnetizado pelo que denomi-namos “visão de futuro”.

A interação entre essas dimensões, que são cada vez mais horizontalmente coordenadas, têm de ser revisitada à luz de uma importante tendência atual: va-lorizar a coesão e a descentralização, o indivíduo e a equipe –características an-tagônicas que precisam coexistir.

O investimento mais clássico, e mais crítico, nessa horizontalidade é o reali-zado no desenvolvimento de equipes. E isso nos remete ao tema desempenho, que nos leva de volta aos traços da cul-tura brasileira: concentração de poder, relações e flexibilidade. Durante muitos anos esses traços favoreceram mais a “harmonia” e a lealdade entre as pessoas do que seu desempenho.

pONTO

TEnSõES rESUlTAnTES DE PArADOXOS DA gESTãO COmO O DOS COnfliTOS CAmUflADOS SãO UmA rEAliDADE inquestiOnáVel. a sOluçãO para issO É gerenciar Os paradOxOs, COnfOrmE PrOPõEm OS ESPECiAliSTAS BETAniA TAnUrE E PAUl EvAnS

TENDêNCIAS

Betania Tanure é professora de pós- -graduação em administração da pUC Minas/FDC e professora convidada do francês Insead e da London Business School, além de consultora de empre-sas e autora de vários livros, como Es-tratégia e Gestão Empresarial, escrito com Sumantra Ghoshal, e Gestão de pessoas, com paul Evans e vlado pucik (ed. Campus/Elsevier). paul Evans é professor do Insead e consultor.

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brasil, em sociedade com o fundador da arisco, júnior. ela escreve seu segundo livro, novamente pioneira porque é a primeira a se dirigir ao público masculino: como viver mais e melhor – só para homens (ed. xxx, já esgotou, com xxx exemplares vendidos). é eleita “personalidade do ano de 2006” pelo governo do estado de são paulo toma posse na academia brasileiraPor outro lado, a palavra “accounta-

bility” tem sido cada vez mais usada em nossas empresas na perspectiva de es-timular a responsabilização do indivíduo pelos resultados de seu trabalho. Os atuais instrumentos de avaliação de de-sempenho, bem como de remuneração e reconhecimento, têm em sua base uma filosofia que estimula o indivíduo, até por-que a maioria deles foi criada nos Estados Unidos, país fortemente individualista.

mas o fato é que, para atingir a exce-lência, tanto as empresas como as pes-soas precisam harmonizar as duas di-mensões, equipe e indivíduo.

pROpóSITOS E RESULTADOSO que distingue uma equipe de um amontoado de pessoas são seus propósitos e seus resultados tangíveis. As tarefas e os propósitos devem ser muito claros para o sucesso do grupo e de cada um de seus membros. Além disso, se a liderança não tiver visão de futuro e os propósitos não forem compartilhados entre os líderes, é grande o risco de ocorrer o chamado “subdesempenho satisfatório”.

Também é fundamental que os propó-sitos sejam mobilizadores; precisam ge-rar brilho nos olhos das pessoas.

GERENCIAMENTO DE CONFLITOSDisputas e conflitos são inerentes às re-lações nas empresas. As organizações

que estimulam o desempenho individual tendem a lidar com isso de forma mais aberta, a exemplo dos Estados Unidos. Já nas que enfatizam a perspectiva da equi-pe, o conflito pode ser tanto aberto como camuflado, caso da maioria das empre-sas brasileiras.

no entanto, as maiores dificuldades têm origem no excesso de conflitos, que leva a equipe à explosão pela violência, ou na escassez, que conduz o time à implo-são pela apatia. Por isso, a capacidade de explicitar os conflitos, cognitivos ou emo-cionais, e de administrá-los está entre as habilidades mais importantes do gestor. isso envolve, diga-se de passagem, va-lorizar a diversidade –de opiniões, de ideias, de possibilidades–, deixando de lado a habitual busca da homogeneidade. A adequada gestão de desempenho não pode ignorar isso.

GESTãO DE DESEMpENHOO ciclo de desempenho –estabelecimen-to de objetivos, avaliação, feedback e re-compensas– se alimenta e se fecha com base na relação mútua entre o desempe-nho do indivíduo e o da equipe.

A conexão entre avaliação e recom-pensas deve ser o componente final da gestão dos paradoxos proposta neste ar-tigo. Constitui o indicador mais claro da ênfase dada ao indivíduo ou à equipe. A consistência e o comprometimento das pessoas que estão no poder com o mo-

delo são críticos para o sucesso de uma execução adequada.

A busca de novas formas de recom-pensar profissionais no contexto de uma economia global está relacionada, ou de-veria estar, à cultura da empresa e aos valores que a compõem (ou que a direção gostaria que a compusessem).

CULTURA FORTE + CULTURA FRACAOs mecanismos de integração normativa são as normas, as premissas, os valores, a linguagem e os conceitos compartilha-dos na empresa, ou seja, o “jeito de ser” e o “jeito de fazer” de uma organização. gerenciá-la leva a uma dualidade impor-tante: manter a coesão adequada, mes-mo em culturas excessivamente fortes ou excessivamente fracas, de forma a evitar as deficiências de cada uma.

A socialização, pela qual o indivíduo aprende procedimentos e regras e inter-naliza a cultura da empresa, é produto da integração normativa. Se é excessiva, a capacidade de desafiar o status quo ou de pensar em formas de inovação acaba sendo desencorajada ou até suprimida. Se faltam normas e valores comparti-lhados, isso faz com que as pessoas “re-mem” para diferentes lados.

O mundo complexo requisita men-tes complexas; a gestão de paradoxos, como o curto e o longo prazo, ou o indi-víduo e a equipe, é o grande desafio das organizações.

COLUNISTAS CONvIDADOSBETANIA TANURE & pAUL EvANS

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e a cultura Fraca poDe ACABAR FORTE...a crença corrente na década de 1980 era que as culturas corporativas fortes eram realmente mais eficientes do que a média. Entretanto, ela não se comprovou na prática. Ao contrário, culturas muito fortes tendem a dificultar a percepção de mu-danças do meio externo e a consequente necessidade de transformação interna.

uma cultura corporativa fraca também é prejudicial, porque torna qualquer iniciativa difícil de implementar, entre outras coisas. Para conseguir alinhar pes-soas em uma cultura fraca, é necessária uma liderança particularmente forte, que inspire todos a seguir o mesmo caminho. Esse é um processo demorado, que vai se consolidando aos poucos, com a própria cultura. E há que se tomar o cuida-do de não cair na armadilha da então cultura fraca e agora forte. Está aí a arte de gerenciar esse paradoxo. (b.t. e p.e.)

Betania Tanure

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