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Especial Balneário Camboriú, 5 de setembro de 2009 14 Verticalização da Praia Brava: caminho sem volta N essa semana foi lançado oficialmente por qua- tro grandes construtores -com coquetel para convidados e presença midiática de Amaury Jr.- o Brava Beach Internacional, empreendimento que marca de forma mais consistente a descaracterização da Praia Brava “antiga”, que vinha acontecendo lenta e progressivamente. Antigamente os estudantes de Oceano eram maioria entre os moradores fixos da Brava. Estilo “roots” de ser. Fotos Caroline Cezar Por Caroline Cezar Até pouco tempo atrás a Brava tinha muitos terrenos vazios, algumas casas, quase nenhum prédio, e grande parte dos moradores eram estudantes de oceanografia ou outras pessoas que buscavam um ar mais agreste que urbano, um refúgio. Essa realidade já vinha mudando, o público foi se diversificando e com a “lotação” de Bal- neário Camboriú, mais e mais pessoas procuravam a praia como local para moradia ou passeio. As tempo- radas de verão atraem cada vez mais gente, apesar da fiscalização de forma geral e policiamento não acom- panharem o ritmo do crescimento. Pouco mais de um ano para cá, por favorecimentos legais (e ilegais), a construção civil acelerou agressivamente, transformando aquele espaço em um grande canteiro de obras. Por todos os lados há prédios subindo, o que causa uma preocupação dos moradores nas questões básicas como segurança e tratamento de água e esgoto, ainda considerados precários naquela região. A obra de urbanização -tanto na beira mar como na Avenida Carlos Drummond, já começou há mais de ano e não tem prazo para acabar, segue a passos lentos apesar dos constantes apelos da associação de moradores. O trân- sito é outro ponto a ser observado: a Estrada da Rainha e o asfaltamento da Avenida Delfim de Pádua Peixoto já trazem grande fluxo de veículos, principalmente nas horas de pico (início da manhã, almoço e fim de tarde, além dos finais de semana), mas em muitos trechos não há calçadas, muito menos ciclovias. A bicicleta é bastante utilizada como meio de transporte por quem mora no local, e a rua como “parque de diversões”, as crianças brincam de bola, pipa e outros passatempos que a vida na “cidade” não permite mais. Hoje o ritmo das construções está acelerado, vários prédios pequenos, bem próximos uns dos outros. Os tapumes de pelo menos dois grandes empreendimentos já estão de pé e mar- cam definitivamente a transformação da Praia Brava. Na foto, onde vai subir o futuro Brava Home.

Especial Verticalização da Praia Brava

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Publicação do Jornal Página 3 do dia 5 de setembro de 2009, edição 947.

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EspecialBalneário Camboriú, 5 de setembro de 200914

Verticalização da Praia Brava: caminho sem volta

Nessa semana foi lançado ofi cialmente por qua-tro grandes construtores -com coquetel para convidados e presença midiática de Amaury

Jr.- o Brava Beach Internacional, empreendimento que marca de forma mais consistente a descaracterização da Praia Brava “antiga”, que vinha acontecendo lenta e progressivamente.

Antigamente os estudantes de Oceano eram maioria entre os moradores fi xos da Brava. Estilo “roots” de ser.

Fotos Caroline CezarPor Caroline Cezar

Até pouco tempo atrás a Brava tinha muitos terrenos vazios, algumas casas, quase nenhum prédio, e grande parte dos moradores eram estudantes de oceanografi a ou outras pessoas que buscavam um ar mais agreste que urbano, um refúgio. Essa realidade já vinha mudando, o público foi se diversifi cando e com a “lotação” de Bal-neário Camboriú, mais e mais pessoas procuravam a praia como local para moradia ou passeio. As tempo-radas de verão atraem cada vez mais gente, apesar da fi scalização de forma geral e policiamento não acom-panharem o ritmo do crescimento.

Pouco mais de um ano para cá, por favorecimentos legais (e ilegais), a construção civil acelerou agressivamente, transformando aquele espaço em um grande canteiro de obras. Por todos os lados há prédios subindo, o que causa uma preocupação dos moradores nas questões básicas como segurança e tratamento de água e esgoto, ainda considerados precários naquela região. A obra de urbanização -tanto na beira mar como na Avenida Carlos Drummond, já começou há mais de ano e não tem prazo para acabar, segue a passos lentos apesar dos constantes apelos da associação de moradores. O trân-sito é outro ponto a ser observado: a Estrada da Rainha e o asfaltamento da Avenida Delfi m de Pádua Peixoto já trazem grande fl uxo de veículos, principalmente nas horas de pico (início da manhã, almoço e fi m de tarde, além dos fi nais de semana), mas em muitos trechos não há calçadas, muito menos ciclovias. A bicicleta é bastante utilizada como meio de transporte por quem mora no local, e a rua como “parque de diversões”, as crianças brincam de bola, pipa e outros passatempos que a vida na “cidade” não permite mais. Hoje o ritmo das construções está acelerado, vários prédios pequenos, bem próximos uns dos outros.

Os tapumes de pelo menos dois grandes empreendimentos já estão de pé e mar-cam defi nitivamente a transformação da Praia Brava. Na foto, onde vai subir o futuro Brava Home.

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Prós e contras: alto padrão de construção e torres

Quem frequenta a Praia Brava se admira com os metros e metros de tapume de dois grandes empreendimentos que surgiram nos últimos dois meses, sem dúvida o que de maior (em tamanho e inves-timento) já foi feito no bairro. Um deles é o Brava Beach Internacional, que ocupa 131 mil metros quadrados, dividi-dos em duas áreas: em frente ao mar e da Delfim de Pádua em direção ao morro. Serão 20 prédios (divididos em condo-mínios), mais um hotel-resort, provavelmente o mais luxuoso da região, além de lojas (“open shopping”) e um espaço público (“boulevard”), uma espécie de rua que será aberta entre os condomínios. Os

arquitetos Leonildo Soares da Silva e Juliana Marodin, que assinam o projeto, afirmam que trabalharam um conceito diferente dos prédios de Bal-neário Camboriú, buscando mais espaço, mais verde, mais áreas de lazer. “Foi utilizado o mínimo do potencial cons-trutivo do terreno, podíamos usar bem mais, mas a idéia é justamente essa, de inte-grar à natureza e não de fazer uma caixa onde a pessoa fica enfurnada, será um grande clube privativo”, explicou Leo-nildo. Sua sócia Juliana com-plementa que os apartamen-tos foram todos desenhados privilegiando a iluminação e ventilação natural e que aten-derão a diferentes perfis.

A área em frente ao mar terá 50 metros de recuo, com pis-cinas e área de lazer, só então começam os prédios: ali serão dois condomínios, térreo mais nove andares, dois aparta-mentos por andar. Os outros condomínios ficam na 3ª qua-dra (da Delfim de Pádua para trás), térreo mais 13 andares, e têm quatro apartamentos por andar. A área comercial e o hotel, que terá heliponto e deve ser categorizado como 5 estrelas, ficam “nos fun-dos” do terreno, próximos ao morro. A área livre, passa em toda extensão, da beira mar até a metade, para pedestres, depois até o hotel, para cir-culação de carros. Qualquer pessoa poderá transitar. Cada

condomínio terá um portal e eles serão cercados por vidro e jardinagem. “Penso que a Praia Brava tem dois momentos, um antes e um depois desse empreendi-mento, porque ele marca um novo padrão de construção. Hoje aquele local está abando-nado, isso vai obrigar a prefei-tura a trazer infra-estrutura. A evolução sempre vem, mas tem que ser ordenada”, acha Léo. Ele pensa que o “lado de cá” da Brava “já está con-solidado”, mas da lagoa para lá, no Canto do Morcego, se posiciona contrário à explo-ração imobiliária. “Deviam fazer um grande parque verde, deixar intacto, não pode cons-truir lá também”.

Os arquitetos garantem que há uma estação de tratamento de esgoto prevista na obra, mas acreditam que não será necessária, porque até lá, pre-vêem que a rede de esgotos feita pela prefeitura deve estar concluída, com verba do PAC (Programa de Aceleração de Crescimento, federal).

O Brava Beach é uma parceria entre FG Procave, Ciaplan, J.A. Russi e Riviera. A previsão é que em cinco anos a primeira etapa estará concluída. O pro-jeto total deve levar 12 anos para ficar pronto. Serão cerca de 700 apartamentos, sem contar com o hotel-resort.

Seguindo a mesma tendência de condomínio de alto padrão, a construtora Procave também já cercou o espaço onde será o Brava Home Resort, que inclui 14 torres, área de lazer, pisci-nas, praças, parque, hortas. Serão 324 apartamentos, em alguns prédios um por andar, em outros dois. As torres terão térreo, mais 12 pavimentos, mais subsolo. O proprietário Nivaldo Pinheiro ressalta que o empreendimento poderia, por lei, ter 300 mil m2 de área construída, e que fará menos de um terço, 75 mil m2. “Na minha opinião, quando redis-cutirem o Plano Diretor de Itajaí, deviam reduzir ainda mais a taxa de ocupação para quem quer fazer prédios, aliás, só deviam permitir prédios em terrenos de 1000 m2 para cima, isso atrairia apenas empreendimentos altamente qualificados, que priorizam o espaço, os grandes recuos. Evitaria que se fizesse como em Itapema, por exemplo, que está cheia de prédios baixos, de 3 ou 4 andares, mas um colado no outro”.Nivaldo comenta que os imó-veis na Praia Brava valori-zaram bastante, o preço está

altíssimo, o que favorece que grandes investidores tomem a frente das construções. A idéia principal, segue ele, é atrair famílias, de Balneário Camboriú e Itajaí, que procu-rem mais espaço para criar os filhos, mais qualidade e con-tato com a natureza.Os condomínios, segundo Nivaldo, estão seguindo con-ceitos de sustentabilidade, todos os prédios vão ter rea-proveitamento de água da chuva, que vai abastecer sani-tários e a jardinagem, e aque-cimento solar em luminárias de uso comum e piscinas aquecidas. Na separação do lixo, o orgânico será compos-tado e reaplicado nas hortas. Claro que o sistema comum de água e iluminação também será feito e utilizado em caso de necessidade. “Esse tipo de proposta combina com a Praia Brava, o foco é o ambiente saudável”, colocou.Sobre a falta de estrutura da Praia Brava para comportar esse aumento populacional, Nivaldo acha que vai melho-rar. “Aquela urbanização na praia até o primeiro semestre de 2010 deve estar concluída, porque é feito com verba que

nós investidores pagamos para o Plandetures. A Delfim de Pádua tem um calçamento péssimo, a beira mar é muito estreita, tudo isso vai sendo revisto aos poucos. Penso que essa valorização da Praia Brava tem enorme importân-

cia econômica para Itajaí, que sofreu muito desde novembro, a situação do porto, tudo isso. Vai crescer muito, está pre-visto um novo acesso pela BR 101, teria que ser pensado um novo sistema viário. E se redu-zirem a taxa de ocupação para

quem quer fazer prédios vai melhorar ainda mais, trazer qualidade, melhorias ambien-tais, porque somos obriga-dos a dar a contra-partida na área pública, 10% em projetos ambientais”.

Brava Home Resort

Os tapumes que cercam a área do futuro Brava Beach Internacional e o projeto: serão cerca de 700 apartamentos, sem contar com o hotel-resort.

O projeto do Brava Home Resort, “o foco é o ambiente saudável”, disse Nivaldo.

Caroline Cezar Divulgação

Divulgação

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“Em primeiro lugar não somos contra a urbanização em si, sabemos que é um caminho sem volta. É necessário, mas não pode ser feito de qualquer jeito, é o que está acontecendo, dessa forma vamos sempre c o n t i n u a r a discutir os remen-dos”, opi-nou Cláudia Severo, da ONG Uni-brava. Ela afirma que muitas obras que estão surgindo na Praia Brava não respei-tam o recuo, o número de andares per mit ido, e principal-mente não passam por estudos técnicos de impacto ambiental ou de vizinhança. “Não importa se é grande ou pequeno, todos teriam que ser fiscalizados, mas o poder público é omisso, continua tripudiando toda uma comunidade em benefí-cio da minoria. Só gostaríamos que as leis fossem cumpridas”.A lei municipal 144, de Itajaí, continua suspensa pelo Minis-tério Público, mas o Plan-detures não. “É uma ironia, porque ele também é incons-titucional. Nós queremos que

seja uma discussão aberta, pública, com observância cri-teriosa de suportes técnicos, é o que reza a constituição. Isso não está acontecendo. Se está tudo certo, se estão obe-decendo os critérios, por que

não ser trans-p a r e n t e ? ” , s u g e r e Cláudia.Ela afirma que a Praia Brava tem p r o b l e m a s seríssimos de d r e n a g e m , saneamento, as tubula-ções são frá-geis, as ruas são estreitas. “Somos con-tra à maneira como tudo está sendo e n c a m i -

nhado, é uma minoria que dita as normas como bem entender. É um absurdo, um desrespeito à sociedade não haver essa dis-cussão. E lamentamos, porque a Brava tem toda uma caracte-rística ambiental. Nossa espe-rança é o Ministério Público”, disse Cláudia. Desde janeiro a ONG Unibrava está tentando marcar uma audiência com o prefeito de Itajaí Jandir Beline, sem sucesso. A ONG atua através de voluntários, infor-mações ou denúncias pelo 9606-2581.

“Dessa forma vamos sempre discutir os remendos”

Estão previstos na Praia Brava quatro ou cinco empreendi-mentos ligados ao Plandetures (o secretário de Urbanismo Paulo Praun não soube con-firmar o número com exati-dão), todos aprovados na ges-tão anterior. O Plandetures é o Plano de Desenvolvimento Econômico Turístico e Eco-lógico, específico para a Praia Brava e aprovado em 2007. É uma espécie de fundo, depo-sitado por proprietários de imóveis do local, que retor-naria em forma de obras em prol da comunidade. O Plan-detures permite modificações dos índices e carcaterísticas do parcelamento do solo, ou seja, o construtor estaria teoricamente, comprando o direito de fugir das regras pré-estabelecidas.A lei municipal 144, que está suspensa, permite que sejam construídos prédios de até seis andares (térreo + 5 pavi-mentos) na primeira quadra do mar; 9 andares na segunda quadra e 13 andares na ter-ceira. A ocupação do terreno diminuiu de 50 para 33% e os recuos foram aumentados. Isso serviu de justificativa para os seis andares em frente ao mar (antes só podiam ser feitos três): o recuo é maior, o espaço entre os prédios fica

mais ventilado, prédios de seis andares exigem normas mais severas dos bombeiros, inclusive elevador. Também haveriam mais recursos para a urbanização.Na prática, nem todos os novos prédios estão seguindo essas regras, percebem-se constru-ções praticamente em cima de casas (não respeitando o recuo), e projetos de prédios de muito mais andares do que os previstos por lei. Em para-lelo a urbanização segue lenta. O secretário de Urbanismo Paulo Praun afirma que não há previsão da obra ser con-cluída, “o que dá o prazo é o recolhimento dos valores do Plandetures”. Praun defende os empreen-dimentos de luxo que estão surgindo na Brava: “ali onde eles estão sendo construídos é vegetação rasteira, e a ocupa-ção é restrita, acho que é uma discussão inglória, o ótimo não existe, a ocupação racio-nal sim e até certo ponto, é. De qualquer forma em volta todo mundo está construindo e nin-guém está preservando nada, há muita crítica em cima dos grandes, mas as pessoas vão lá, constróem uma casa e não plantam uma árvore, não pro-curam manter uma área verde dentro do terreno”, opinou.

O tal do Plandetures

“N ó s q u e -

r e m o s q u e

s e j a u m a d i s -

c u s s ã o

a b e r t a ,

p ú b l i c a , c o m

o b s e r v â n c i a

c r i t e r i o s a

d e s u p o r t e s

t é c n i c o s , é

o q u e r e z a a

c o n s t i t u i ç ã o .

Na entrada da Brava, estação de bombeamento da Semasa, a descoberto, e em cima da restinga. Em direção ao mar, corre uma água escura que ninguém sabe dizer o que é. Faz quase um ano.

....e muita esculhambação: terra de ninguém, sem fiscalização.

A casa que reinava absoluta foi espremida por um vizinho invasivo.

Fotos Caroline Cezar

Obras por todo o lado...

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A urbanização que está sendo feita na beira mar surgiu de uma ação civil pública, quando ocorreu a derrubada dos quiosques e bares da orla. O projeto foi debatido durante dois anos entre técnicos e representantes da comuni-dade, que não participou ati-vamente. O maior problema da obra é a drenagem, bastante dificuldades pelas condições do solo. Está sendo feita, além da drenagem, a pavimenta-ção (que não é asfáltica e sim com “pavers”, uma espécie de tijolinho, como na Rua Her-cílio Luz, em Itajaí) e a parte elétrica. Não estão previstos quiosques, e aqueles que estão hoje na orla, foram instalados provisoriamente. O secretário Paulo Praun ainda não sabe como vai ficar essa questão. A obra tem custo estimado de quatro milhões e meio e já para estar concluída. Em toda extensão ela tem seis modelos diferentes de corte, e prevê passeio, dos dois lados, ciclovia e estacionamento em alguns trechos.

No Canto do Morcego tam-bém há um projeto de con-domínio (foto), desde 2004 em idas e vindas judiciais e ainda embargado. “Parece que eles vão fazer 50% do que estava previsto, e está para ter a liberação”, disse uma fonte ligada ao governo. O secre-

tário de Urbanismo Paulo Praun garantiu que hoje não está liberado nenhum tipo de construção naquela área. “O canto norte é muito mais preservado, na área sul é mais aquele lado do morro mesmo que restou”, descreveu.

Urbanização em passos vagarosos O Canto do Morcego

Foto de março de 2009 do Canto do Morcego.

Moacir Kienast (quersurfar)Fotos Caroline Cezar

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