Fármacos Utilizados Para a Inducao Da Anestesia

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Anestesia

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    FRMACOS ENDOVENOSOS UTILIZADOS PARA INDUO ANESTSICA Dr. Tom Lupton Dr. Oliver Pratt Salford Royal Hospitals NHS Foundation Trust, UK Traduo autorizada do ATOTW #107 realizada por Dra. Gabriela Nerone e Dra. Maria Eduarda Dias Brinhosa, Hospital Governador Celso Ramos, Brasil. Correspondncia para [email protected] QUESTES-CHAVE Este tutorial revisa a farmacologia bsica dos anestsicos endovenosos (EV) mais comuns. Ao final do tutorial, voc deve ser capaz de escolher a droga mais apropriada para usar nas situaes abaixo e justific-las:

    Um paciente com obstruo intestinal que necessita de laparotomia de emergncia. Um paciente com histria de cncer de laringe, apresentando estridor evidente e sinais de

    insuficincia respiratria, necessita de traqueostomia. Um paciente que necessita de troca de curativo para queimadura Um paciente com histria de insuficincia cardaca que necessita de anestesia geral Um paciente desidratado, hipovolmico, que necessita de anestesia geral de emergncia Um paciente com porfiria que admitido para herniorrafia inguinal e necessita de

    anestesia geral Um paciente que necessita de sedao na Unidade de Terapia Intensiva Anestesia no mbito pr-hospitalar

    O QUE SO FRMACOS PARA INDUO ANESTSICA? So frmacos que, quando administrados por via endovenosa em dose adequada, causam rpida perda de conscincia. Isso frequentemente descrito como um tempo brao-crebro, que significa o tempo necessrio para que o frmaco chegue do local de injeo (geralmente o brao) at o crebro, seu stio de ao. So utilizados:

    Para induzir a anestesia, anteriormente administrao de drogas para manuteno da anestesia.

    Como droga nica para procedimentos rpidos. Para a manuteno da anestesia para procedimentos mais longos por meio de infuso

    endovenosa contnua. Para promover sedao.

    O conceito de anestesia endovenosa originou-se em 1932, quando Wesse e Schrapff publicaram seu relato sobre o uso do hexobarbital, a primeira droga endovenosa de ao rpida. Dois anos depois, em 1934, o tiopental sdico foi introduzido prtica clnica por Waters e Lundy, e ainda muito utilizado atualmente. Alguns outros frmacos tm entrado e sado do uso habitual. As drogas mais comuns utilizadas no momento podem ser classificadas de acordo com sua estrutura qumica, e incluem:

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    Barbitricos Fenis Imidazis Fenciclidinas Benzodiazepnicos

    Os exemplos mais utilizados de cada classe sero discutidos abaixo. DA INDUO RECUPERAO DA CONSCINCIA: O QUE ACONTECE COM UM BOLUS DE DROGA EV? Ao entrar na corrente sangunea, uma porcentagem da droga se liga a protenas plasmticas e o restante permanece no-ligado ou livre. O grau de ligao proteica depende das caractersticas fsicas do frmaco em questo como por exemplo lipossolubilidade e grau de ionizao. A droga segue pelo sangue venoso at o lado direito do corao, atravs da circulao pulmonar, e atravs do lado esquerdo do corao at a circulao sistmica. A maior parte do dbito cardaco (70%) passa pelo crebro, fgado e rins (frequentemente denominados rgos ricamente vascularizados); portanto uma grande proporo do bolus inicial entregue circulao cerebral. O frmaco ento passa, atravs de um gradiente de concentrao, do sangue para o crebro. A taxa dessa transferncia depende de diversos fatores:

    A concentrao arterial de droga livre A lipossolubilidade da droga O grau de ionizao.

    Molculas livres, lipossolveis e no-ionizadas atravessam a barreira hemato-enceflica mais rapidamente. A droga exerce seus efeitos uma vez que tenha penetrado o sistema nervoso central (SNC). Assim como a maioria dos frmacos anestsicos, o mecanismo exato de ao dos anestsicos endovenosos no completamente conhecido. Estima-se que cada droga aja em um receptor especfico GABA-A, NMDA e receptores colinrgicos tm sido estudados como potenciais stios de ao. Aps a distribuio de molculas no-ionizadas para o CNS e outros tecidos ricamente vascularizados, a droga comea a se difundir para outros tecidos que no tm suprimento sanguneo to pronunciado. Essa captao secundria da droga, principalmente pela musculatura esqueltica, resulta em diminuio da sua concentrao plasmtica, permitindo que a droga se difunda para fora do SNC como resultado da reverso do gradiente de concentrao. essa redistribuio inicial do frmaco para outros tecidos que causa a recuperao rpida da conscincia vista aps dose nica de uma droga de induo. Metabolismo e clearance plasmtico tm impacto consideravelmente menor aps um bolus nico, porm so mais importantes em se tratando de infuses e doses repetidas de uma droga. O tecido adiposo contribui pouco para a redistribuio inicial de droga livre que ocorre aps um bolus, uma vez que um tecido pobremente vascularizado, como pode ser observado no diagrama abaixo. Contudo, aps doses repetidas ou infuses, o equilbrio com o tecido adiposo forma um reservatrio de droga, frequentemente resultando em atraso na recuperao da conscincia.

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    Figura 1. Distribuio do frmaco em diversos tecidos versus tempo aps um bolus endovenoso de tiopental O QUE MUDA EM ESTADOS DE DBITO CARDACO DIMINUDO? Em circunstncias com dbito cardaco diminudo (choque, idade avanada), o corpo compensa desviando uma maior proporo do dbito cardaco para a circulao cerebral, haja vista que preservao do fluxo sanguneo cerebral de suma importncia nessas situaes. Dessa maneira, maior proporo de uma determinada droga administrada atingir a circulao cerebral. Como resultado, a dose de induo deve sempre ser reduzida. Ademais, uma vez que o dbito cardaco global est diminudo, o tempo necessrio para que uma droga atinja o SNC e exera seus efeitos prolongado. A titulao lenta de uma dose reduzida da droga essencial para uma induo segura nesses pacientes. AS PROPRIEDADES DE UM ANESTSICO ENDOVENOSO IDEAL Diversas propriedades, tanto fsicas quanto farmacolgicas (farmacocinticas e farmacodinmicas) so desejveis quando da criao de um anestsico endovenoso ideal. Essas propriedades sero elencadas e, em seguida, comparadas com as drogas mais comumente utilizadas. Propriedades Fsicas

    1. Hidrossolvel e estvel em soluo 2. Estvel exposio luz 3. Passvel de longo tempo de armazenamento 4. Ausncia de dor injeo 5. Dolorosa quando injetada em uma artria 6. No-irritante quando injetada no subcutneo 7. Baixa incidncia de tromboflebite 8. Baixo custo

    Propriedades Farmacocinticas

    1. Rpido incio de ao em um tempo brao-crebro 2. Rpida redistribuio para tecidos ricamente vascularizados 3. Clearance e metabolismo rpidos 4. Ausncia de metablitos ativos

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    Propriedades Farmacodinmicas 1. Alto ndice teraputico (ndice de dose txica/dose mnima efetiva) 2. Efeitos mnimos sobre os sistemas cardiovascular e respiratrio 3. Ausncia de liberao de histamina e reaes de hipersensibilidade 4. Ausncia de efeitos emetizantes 5. Ausncia de movimentos involuntrios 6. Ausncia de pesadelos emergncia da anestesia 7. Ausncia de efeito ressaca 8. Ausncia de supresso adrenocortical 9. Segurana para uso na porfiria

    PROPRIEDADES DE ANESTSICOS ENDOVENOSOS ESPECFICOS Tiopental Sdico

    O tiopental, tambm conhecido como tionembutal e penthotal, um barbitrico, apresentado como um p amarelo-claro higroscpico (isto , que atrai umidade da atmosfera). Ampolas contm geralmente 500mg de tiopental sdico com carbonato de sdio a 6% em uma atmosfera inerte de nitrognio. Reconstitudo com 20 ml de gua destilada, resulta em uma soluo a 2.5% (25mg/ml) com um pH de 10,8. A soluo alcalina bacteriosttica e seu armazenamento seguro at 48 horas. A estrutura molecular do tiopental baseada no anel barbitrico como se pode observar acima. Um tomo sulfrico na posio do carbono R2 confere sua curta durao de ao. Uma dose de 4-5mg/kg de tiopental promove instalao suave de hipnose com critrios de avaliao definitivos dentro de 30 segundos da injeo endovenosa. A recuperao da conscincia aps dose nica ocorre rapidamente devido redistribuio da droga. A incidncia de agitao, nusea e vmitos baixa. A taxa de ligao proteica do tiopental no plasma de 65-85%. Seu metabolismo lento e ocorre no fgado, e a excreo de seus metablitos ocorre primariamente na urina. Aps doses repetidas ou infuso contnua de tiopental, o metabolismo segue a cintica de ordem zero, tambm conhecida como cintica de saturao, o que significa que uma quantidade constante de droga eliminada por unidade de tempo, independentemente da concentrao plasmtica. Algumas drogas so metabolizadas por cintica de primeira ordem; uma frao constante da droga eliminada por unidade de tempo, ou seja, depende da concentrao plasmtica. Cintica de ordem zero ocorre quando as vias metablicas se saturam, levando acumulao de droga ativa e retardo na recuperao.

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    O tiopental deprime diretamente a contratilidade miocrdica, reduzindo o dbito cardaco e presso arterial. Pode haver taquicardia reflexa. Ocorre tambm diminuio do tnus venoso, causando represamento de sangue nas veias perifricas, o que aumenta a magnitude da hipotenso, particularmente em pacientes hipovolmicos. Depresso ventilatria comum e um perodo de apnia ocorre habitualmente aps uma dose em bolus. Reflexos de via area so bem preservados em comparao com o propofol, de modo que uma droga inadequada para insero de mscara larngea, que pode resultar em tosse e laringoespasmo. Liberao de histamina pode ocorrer e precipitar broncoespasmo. O tiopental reduz o fluxo sanguneo cerebral, a taxa metablica cerebral e a demanda de oxignio. Tem tambm potentes propriedades anticonvulsivantes. Aps traumatismo crnio-enceflico, tiopental em infuso objetivando um coma barbitrico reduz a presso intracraniana e pode melhorar o prognstico neurolgico. Contudo, isso associado a acumulao significativa, que resulta em efeito prolongado com mltiplas complicaes. As porfirias so um grupo de doenas caracterizadas pela superproduo e excreo de porfirinas (compostos intermedirios produzidos durante a sntese de hemoprotenas). Episdios agudos podem ser precipitados por frmacos, estresse, infeco, lcool, gestao e jejum prolongado. O tiopental pode precipitar porfiria em pacientes suscetveis atravs da induo de enzimas hepticas, e portanto deve ser evitado. Propofol (2,6 di-isopropilfenol)

    O propofol geralmente apresentado a 1 ou 2% como emulso aquosa (gotculas de lipdio em suspenso, por isso a colorao branca) contendo leo de soja, lecitina de ovo e glicerol. isotnico em relao ao plasma e tem um pH de 7,0 a 8,5. Pode causar dor injeo em veias de pequeno calibre. Trata-se de um anestsico geral de curta durao, com latncia de aproximadamente 30 segundos. A recuperao da anestesia habitualmente rpida. Induo suave de anestesia ocorre normalmente aps uma dose de 2-2,5mg/kg. O propofol deve ser titulado conforme a resposta do paciente at que sinais

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    clnicos demonstrem o incio da anestesia. O melhor parmetro de avaliao a perda de contato verbal com o paciente. Aps um bolus endovenoso, h equilbrio rpido entre o plasma e o tecido ricamente vascularizado do crebro, conforme descrito anteriormente. Os nveis plasmticos caem rapidamente como resultado da redistribuio e posteriormente se segue um perodo mais prolongado de metabolismo heptico e clearance renal. A meia-vida de redistribuio inicial est entre 2 e 4 minutos. Disfunes hepticas ou renais leves no alteram a farmacocintica do propofol. Dentre todos os anestsicos endovenosos, o propofol causa a reduo mais proeminente na presso arterial. Isso ocorre devido vasodilatao sistmica que provoca. Pode haver discreto aumento reflexo da frequncia cardaca. A diminuio na presso arterial dose-dependente e acontece com maior magnitude em idosos e pacientes em choque. Esse efeito pode ser minimizado pela injeo lenta da medicao, evitando supradosagem inadvertida. Com exceo da ketamina, todos os agentes de induo anestsica agem sobre o centro respiratrio causando depresso ventilatria. Esse efeito mais pronunciado com o propofol, portanto geralmente se observa um perodo de apnia. Alm disso, o propofol reduz marcadamente os reflexos farngeos e de via area, caracterstica que o torna ideal para a insero de mscara larngea. H relatos de associao do propofol com a ocorrncia de movimentos epileptiformes durante a induo e recuperao, porm esses movimentos no devem ser confundidos com atividade epilptica verdadeira em doses habituais, o propofol anticonvulsivante. Demonstrou-se tambm reduo no fluxo sanguneo cerebral, na taxa metablica cerebral e na presso intracraniana. O propofol comumente utilizado em infuso contnua para sedao de pacientes adultos para procedimentos de pequeno porte, bem como na Unidade de Terapia Intensiva. tambm a droga mais empregada para anestesia intravenosa total, Total Intravenous Anaesthesia (TIVA). Existem diversos regimes de infuso, porm uma discusso detalhada est fora do escopo deste tutorial. A infuso de propofol est contraindicada para sedao em crianas devido a questionamentos quanto sua segurana. Uma sndrome da infuso de propofol foi descrita, crianas afetadas desenvolveram acidose metablica, hiperlipidemia, arritmias cardacas e aumento na mortalidade. As evidncias sugerem que o propofol seguro para uso em pacientes suscetveis a porfirias. Etomidato

    O etomidato um ster imidazlico. Sua apresentao geralmente como emulso lipdica ou como soluo cristalina contendo propilenoglicol numa concentrao de 2mg/ml. Dor injeo comum e a taxa de tromboflebite no perodo ps-operatrio alta. A dose-padro para induo 0,3mg/Kg, e a recuperao rpida devido redistribuio para msculos e tecido adiposo. A induo da anestesia pode ser acompanhada de movimentos involuntrios que podem ser confundidos com atividade epileptiforme generalizada. A recuperao normalmente desagradvel e acompanhada de nuseas e vmitos. O etomidato rapidamente metabolizado por esterases hepticas e plasmticas, formando compostos inativos. A excreo predominantemente urinria e a meia-vida de eliminao varia de 1 a 5 horas.

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    O etomidato causa o menor grau de depresso miocrdica entre os anestsicos endovenosos, com reduo mnima no dbito cardaco e na presso arterial. No passado, o etomidato era utilizado amplamente para a induo anestsica em pacientes chocados, idosos ou com comprometimento da funo cardiovascular. Todavia, essa droga tem se tornado menos popular recentemente. Acontece apnia transitria com o uso do etomidato, porm em menor grau do que com outros frmacos. Podem ocorrer tosse ou soluos. Devido a isso, o etomidato, assim como o tiopental, no ideal para a insero de mscara larngea. Nuseas e vmitos ps-operatrios so comuns aps a administrao de etomidato. O etomidato inibe a 11--hidroxilase, uma importante enzima na via de produo esteroidal adrenal. Uma dose nica de induo bloqueia por 4 a 8 horas o aumento na sntese de cortisol que ocorre como resposta normal ao estresse e esse tempo pode se prolongar at 24 horas em pacientes idosos ou debilitados. H evidncia de aumento na mortalidade com o uso de infuso contnua de etomidato para sedao em pacientes criticamente enfermos. Apesar de no ter sido demonstrado aumento de mortalidade aps dose nica para a induo anestsica, o uso do etomidato tem diminudo nos ltimos anos devido percepo de morbidade aumentada. Ketamina

    A ketamina um derivado da fenilciclidina, uma droga dissociativa utilizada no passado como agente anestsico que exibia efeitos alucingenos e neurotxicos. Droga dissociativa aquela que reduz as sinapses vindas de outras reas cerebrais, principalmente as sensoriais, para a mente consciente. A ketamina existe na forma de dois estereoismeros, R (dextro) e S (levo) ketamina, conforme a figura acima. Estereoismeros so molculas em que os mesmos tomos esto ligados entre si na mesma ordem, porm mostram diferentes arranjos tridimensionais, resultando em imagens em espelho uma da outra, que no podem ser superpostas. A ketamina apresentada normalmente como uma mistura racmica dos dois estereoismeros, porm tem-se disponibilizado a ketamina S devido ao seu perfil farmacolgico mais vantajoso, conforme ser explicado adiante. Trata-se de uma soluo levemente cida (pH 3,5-5,5) contendo 10, 50 ou 100mg de ketamina por ml. Ampolas padronizadas tambm contm um conservante que impede o uso subaracnide ou epidural. Est disponvel, ainda, como p liofilizado para reconstituio. A ketamina apresenta propriedades hipnticas, analgsicas e de anestsico local. Seus efeitos so mediados principalmente pelo antagonismo no-competitivo dos receptores N-metil-D-aspartato (NMDA) no crebro e medula espinhal. Outros mecanismos de ao da ketamina podem incluir interao com receptores opiides, contudo, o naloxone no antagoniza os efeitos analgsicos da ketamina em humanos. A anestesia produzida pela ketamina denominada anestesia dissociativa. Esse estado clnico nico exemplificado pela catalepsia, em que os olhos permanecem abertos com olhar fixo com nistagmo e os reflexos corneanos e fotomotor permanecem intactos. Podem ocorrer graus variveis de hipertonia e ocasionalmente movimentos intencionais no relacionados a estmulos dolorosos, mesmo durante anestesia cirrgica adequada. Sensaes psquicas que incluem alteraes de humor, sensao de flutuao, sonhos vvidos e alucinaes so comuns durante a emergncia da anestesia com ketamina.

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    Geralmente, esses efeitos desaparecem com a recuperao completa da conscincia. A pr-medicao com benzodiazepnicos diminui essa sndrome confusional aguda durante a emergncia. Como mencionado anteriormente, a molcula de ketamina existe em dois estereoismeros ketamina S e R. Esses ismeros exibem diferenas farmacolgicas e clnicas. A ketamina-S trs vezes mais potente que a ketamina-R e o tempo de recuperao e sequelas psicomimticas so reduzidos. No entanto, isso pode ser consequncia da reduo na dose necessria com o uso da S-ketamina, que mais potente. A ketamina nica entre os agentes de induo anestsica por ser passvel de administrao endovenosa, intramuscular, oral, nasal, renal e epidural (na sua formulao sem conservante). A dose depende da via de administrao e do efeito teraputico desejado. Para induo da anestesia, uma dose de 0,5 a 1,5mg/Kg pode ser administrada EV, ou 4 a 10mg/Kg IM. A latncia maior que a das outras drogas de induo (inconscincia em 1-2 minutos para uso EV) e o parmetro clnico de avaliao pode ser difcil de determinar em pacientes com o olhar fixo por curtos perodos de tempo. A durao de ao de uma dose nica aproximadamente 5 a 10 minutos. A ketamina metabolizada no fgado, e metablitos conjugados so excretados na urina. A meia-vida de eliminao aproximadamente 2,5 horas. A combinao de efeitos cardiovasculares da ketamina nica. A sua administrao, ao contrrio dos outros agentes, associada a taquicardia, aumento da presso arterial e aumento do dbito cardaco. Esse perfil torna a ketamina til no paciente chocado. O efeito da ketamina sobre o drive respiratrio mnimo, apesar de poder ocorrer diminuio transitria na ventilao aps administrao em bolus. Isso, combinado ao fato de que os reflexos de proteo da via area permanecem relativamente preservados, torna a ketamina o anestsico ideal para uso no mbito pr-hospitalar. H aumento da salivao, que pode levar a obstruo de via area superior, porm esse efeito pode ser diminudo pela pr-medicao com antimuscarnicos como por exemplo o glicopirrolato. A ketamina um relaxante da musculatura lisa bronquial e, portanto, tem um papel especial no manuseio da asma grave. No passado, pensava-se que a ketamina aumentasse o fluxo sanguneo cerebral e a presso intracraniana, consequentemente limitando seu uso em pacientes com traumatismo crnio-enceflico. Contudo, assegurando-se que hipoventilao e hipercapnia sejam evitadas, isso no ocorre e h alguma evidncia de que a ketamina pode ter efeitos neuroprotetores devido sua ao nos receptores NMDA. A ketamina parece ser segura para uso nas porfirias. Midazolam

    Apesar de no ser um agente de induo endovenoso propriamente dito, o midazolam pode ser utilizado para induzir anestesia devido sua farmacocintica. Trata-se de um benzodiazepnico hidrossolvel que apresentado em soluo cristalina, geralmente na concentrao de 2mg/ml. O midazolam exibe a forma isomrica conhecida como tautomeria. Na ampola, numa soluo cida, a molcula existe na forma ionizada. Em pH fisiolgico, a molcula se torna um anel no-ionizado altamente lipossolvel, o que explica seu rpido incio de ao. No h dor injeo.

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    Assim como outros benzodiazepnicos, o midazolam age especificamente sobre receptores intimamente ligados ao receptor GABA-A. A ativao do receptor benzodiazepnico aumenta o influxo de cloreto para as clulas neuronais atravs do receptor GABA-A, causando hiperpolarizao neuronal e os efeitos observados clinicamente. O midazolam geralmente utilizado para sedao em doses de 0,05 a 0,1mg/kg EV. Suas vantagens nesse contexto so sua curta durao de ao e suas propriedades amnsticas. Em crianas, til como pr-medicao 30 minutos antes da cirurgia, em dose oral de 0,5mg/kg. Pode ser utilizado como agente endovenoso nico, na dose de 0,3mg/kg, porm a velocidade de instalao lenta, limitando seu uso. A durao de ao aproximadamente 30 minutos, maior do que aquela dos outros agentes de induo. Sofre metabolismo heptico e eliminao renal. Em idosos, o fluxo sanguneo heptico e a atividade metablica diminudos podem resultar em meia-vida significativamente prolongada. O midazolam tem efeito depressor moderado sobre os sistemas cardiovascular e respiratrio, portanto a monitorizao importante durante sedao. Quando usado como agente nico de induo, o midazolam causa apnia em at 70% dos pacientes. Os efeitos do midazolam podem ser revertidos com flumazenil, um antagonista benzodiazepnico competitivo. Deve ser administrado por injeo endovenosa em incrementos de 100g e seu incio de ao de aproximadamente 2 minutos. O flumazenil deve ser utilizado com cautela, uma vez que pode causar agitao e convulses. RESPOSTAS S QUESTES-CHAVE Tendo revisado a farmacologia dos frmacos endovenosos de uso comum, tente responder s questes apresentadas no incio do tutorial.

    1. Paciente com obstruo intestinal que necessita de laparotomia de emergncia. Que agente de induo voc usaria?

    Qualquer paciente com obstruo intestinal deve ser considerado como tendo estmago cheio. Tradicionalmente, uma induo em sequncia rpida seria realizada com pr-oxigenao, presso sobre a cartilagem cricide, tiopental e suxametnio. O tiopental escolhido devido ao incio de ao rpido e bem definido com uma dose pr-determinada. Esse tambm o mtodo de induo de escolha para cesariana. 2. Paciente com histria de cncer de laringe, com estridor evidente e sinais de insuficincia

    respiratria, necessita de traqueostomia. Que agente de induo voc usaria? Agentes de induo endovenosa e bloqueadores neuromusculares devem ser evitados nesse caso devido sua ao depressora sobre a ventilao. Pode no ser possvel realizar ventilao sob mscara facial caso esse paciente entre em apnia. Induo inalatria com halotano ou sevoflurano deve ser empregada. 3. Paciente que necessita de troca de curativo para queimadura. Que agente de induo voc

    usaria? A ketamina a droga ideal para ser usada em procedimentos de pequeno porte. Para troca de curativos de queimadura, uma dose sub-anestsica pode ser utilizada. Essa dose promover sedao e analgesia, preservando os reflexos de proteo da via area. A ketamina comumente associada pr-medicao com benzodiazepnicos para reduzir a dose necessria e as reaes psicomimticas quando da emergncia da anestesia; eventualmente pode-se utilizar um anti-sialogogo (glicopirrolato, brometo de glicopirrnio) para reduzir as secrees na via area. 4. Paciente com histria de insuficincia cardaca necessita de anestesia geral. Que agente de

    induo voc usaria? Essa uma pergunta difcil para a qual no h necessariamente uma resposta correta. Para muitos clnicos, o etomidato seria a droga de escolha devido ao seu efeito limitado sobre o sistema cardiovascular. Contudo, outros anestesistas evitariam por completo o uso do etomidato devido

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    sua ao sobre a sntese esteroidal. A ketamina poderia tambm ser considerada como consequncia da sua estabilidade cardiovascular relativa. O propofol e o tiopental tambm so opes, porm causam potencialmente mais depresso cardiovascular. A questo essencial que qualquer agente de induo que seja escolhido deve ser utilizado na menor dose possvel, administrado lentamente e titulado conforme seu efeito. Monitorizao invasiva da presso arterial deve ser considerada, se disponvel. 5. Que agente de induo seria mais apropriado para um paciente desidratado, hipovolmico,

    necessitando de anestesia geral de emergncia? Nessa situao, vasodilatao excessiva comprometeria mais a presso arterial e a perfuso de rgos. Ketamina ou etomidato poderiam ser considerados, j que so mais estveis sobre o sistema cardiovascular, porm como na questo de nmero 4, para qualquer droga que seja usada, a titulao fundamental. 6. Paciente com porfiria que admitido para herniorrafia inguinal e necessita de anestesia geral.

    Que agente de induo voc usaria? As porfirias so um grupo de doenas caracterizado por superproduo e excreo de porfirinas (compostos intermedirios produzidos durante a sntese de hemoprotenas). Episdios agudos podem ser precipitados por frmacos, estresse, infeco, lcool, gestao e jejum prolongado. O propofol seria a droga ideal para a induo nesse caso, uma vez que seguro para uso em pacientes com porfiria. O tiopental e o etomidato devem ser evitados, j que podem precipitar uma crise. 7. Paciente que necessita de sedao na Unidade de Terapia Intensiva. Que agente de induo

    voc usaria? Uma infuso de propofol seria uma boa escolha. O midazolam pode ser administrado concomitantemente, ou como uma alternativa ao propofol. O tiopental deve ser evitado devido ao acmulo, e o etomidato deve ser evitado devido supresso da sntese esteroidal adrenal. 8. Qual agente de induo se presta adequadamente para anestesia no mbito pr-hospitalar? A ketamina o agente mais utilizado no ambiente pr-hospitalar e em campos de batalha. Sua estabilidade hemodinmica se adequa bem ao uso em pacientes chocados, e a ventilao e os reflexos de via area esto bem preservados quando equipamentos avanados de suporte via area no esto disponveis ou no so prticos. Outra vantagem o seu potente efeito analgsico.

    LEITURA COMPLEMENTAR Peck T, Hill S, Williams M. Pharmacology for anaesthesia and intensive care. Greenwich medical media, 2003. Fryer M. Intravenous induction agents. Anaesthesia and intensive care medicine; 5(9): 317-32. Pinnock C, Lin T, Smith T. Fundamentals of anaesthesia. Greenwich medical media, 2003.