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Mecânica dos Solos Permeabilidade e Percolação EST/UAlg Campus da Penha 4. 1 FLUXO EM MACIÇOS TERROSOS: PERMEABILIDADE E PERCOLAÇÃO 1. Introdução A água nos solos pode ser classificada em: água de constituição (água que faz parte da estrutura molecular dos minerais que compõem a fase sólida), água adsorvida (água que envolve e adere fortemente às partículas sólidas, estando influenciada por forças eléctricas que se manifestam na superfície das partículas), água livre ou gravítica (água que ocupa os poros dos solos e que apresenta livre movimentação, sendo comandada pelas forças do peso próprio), água capilar (água que por efeito da tensão superficial entre as partículas e a água, ascende pelos interstícios capilares acima da superfície freática de água livre) e água higroscópica (água que permanece nos solos secos). No presente capítulo abordam-se essencialmente problemas de percolação, isto é, situações em que a água freática se movimenta no interior dos maciços terrosos. Sendo os solos um meio poroso, constituído por vazios e por partículas sólidas, os vazios (interstícios) dos maciços terrosos podem ser atravessados por um fluxo de água, em que esta se movimenta de pontos de nível de energia mais alto para pontos de nível de energia mais baixo. O estudo do fluxo de água nos maciços terrosos (percolação) é de grande importância na mecânica dos solos, nomeadamente, para estimar o caudal de percolação subterrânea sob várias condições hidráulicas, para estudar e resolver problemas que envolvem a bombagem de água subterrânea em grandes escavações e, ainda, na análise de estabilidade de barragens de terra, estruturas de suporte e outras que estejam sujeitas a forças de percolação. O fluxo de água através de uma coluna de solo pode ser ilustrado através Figura 4.1, em que as partículas de água se movem através dos vazios do solo, do nível A para o nível B, seguindo um caminho sinuoso à volta das partículas sólidas. A velocidade da água varia de ponto para ponto, dependendo do tamanho e configuração dos poros. No entanto, na prática pode-se considerar a massa do solo como um todo em que cada partícula de água se movimenta através de um caminho suave, designado por linha de corrente ou de fluxo. As linhas de corrente (ou de fluxo) podem ser linhas rectas ou curvas suaves, e representam o fluxo de água a uma velocidade constante, conhecida como velocidade de descarga ou aparente. 4

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4. 1

FLUXO EM MACIÇOS TERROSOS: PERMEABILIDADE E PERCOLAÇÃO

1. Introdução

A água nos solos pode ser classificada em: água de constituição (água que faz parte da estrutura molecular dos minerais que compõem a fase sólida), água adsorvida (água que envolve e adere fortemente às partículas sólidas, estando influenciada por forças eléctricas que se manifestam na superfície das partículas), água livre ou gravítica (água que ocupa os poros dos solos e que apresenta livre movimentação, sendo comandada pelas forças do peso próprio), água capilar (água que por efeito da tensão superficial entre as partículas e a água, ascende pelos interstícios capilares acima da superfície freática de água livre) e água higroscópica (água que permanece nos solos secos).

No presente capítulo abordam-se essencialmente problemas de percolação, isto é, situações em que a água freática se movimenta no interior dos maciços terrosos.

Sendo os solos um meio poroso, constituído por vazios e por partículas sólidas, os vazios (interstícios) dos maciços terrosos podem ser atravessados por um fluxo de água, em que esta se movimenta de pontos de nível de energia mais alto para pontos de nível de energia mais baixo. O estudo do fluxo de água nos maciços terrosos (percolação) é de grande importância na mecânica dos solos, nomeadamente, para estimar o caudal de percolação subterrânea sob várias condições hidráulicas, para estudar e resolver problemas que envolvem a bombagem de água subterrânea em grandes escavações e, ainda, na análise de estabilidade de barragens de terra, estruturas de suporte e outras que estejam sujeitas a forças de percolação.

O fluxo de água através de uma coluna de solo pode ser ilustrado através Figura 4.1, em que as partículas de água se movem através dos vazios do solo, do nível A para o nível B, seguindo um caminho sinuoso à volta das partículas sólidas. A velocidade da água varia de ponto para ponto, dependendo do tamanho e configuração dos poros. No entanto, na prática pode-se considerar a massa do solo como um todo em que cada partícula de água se movimenta através de um caminho suave, designado por linha de corrente ou de fluxo. As linhas de corrente (ou de fluxo) podem ser linhas rectas ou curvas suaves, e representam o fluxo de água a uma velocidade constante, conhecida como velocidade de descarga ou aparente.

4

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4. 2

Figura 4.1 - Fluxo de água através do solo

(a) caminho real das partículas de água (b) linhas de fluxo idealizadas

2. Gradiente hidráulico

De acordo com o teorema de Bernoulli, a energia mecânica total da água (ou carga total) num dado ponto é dada pela seguinte expressão:

H =u

Wγ+

vg

2

2+Z (4.1)

em que:

H - representa a energia mecânica total (carga total) por unidade de peso de líquido (o que implica que cada termo tenha as dimensões de um comprimento).

u

Wγ - representa a altura piezométrica, isto é, a energia de pressão da unidade de peso

de líquido submetido à pressão u. Um elemento de peso unitário que esteja no seio de um líquido em repouso, num ponto em que a pressão toma o valor u, tem a sua

energia de pressão, por unidade de peso, aumentada de u

Wγ em relação a um

elemento na superfície livre (pressão relativa nula), mas à custa da correspondente diminuição da energia de posição.

A

B

(a) (b)

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4. 3

vg

2

2 - representa a altura cinética e corresponde à energia cinética por unidade de peso.

Um elemento de peso P cede, quando a sua velocidade v se anula, uma energia

(Pv

g

2

2), ou seja, uma energia por unidade de peso igual a

vg

2

2.

Z - representa a cota geométrica em relação a um plano horizontal de referência, isto é, a energia de posição da unidade de peso de líquido situada à cota Z. Com efeito, a deslocação de um elemento de peso P, da cota zero para a cota Z, equivale a um trabalho por unidade de peso igual a Z.

Nos solos, a velocidade do fluxo é muito pequena, pelo que o termo vg

2

2 é muito

pequeno e pode considerar-se igual a zero (vg

2

2≅0), quando comparado com os outros

dois termos. Assim, a carga total num dado ponto pode ser adequadamente dada pela expressão:

H =u

Wγ+Z (4.2)

Na Figura 4.2 representa-se, de forma esquemática, o significado de carga total (cota piezométrica), altura piezométrica e cota geométrica. Se fosse instalado um tubo piezométrico no ponto A, a água subiria no tubo até a um nível que é a pressão estática da água no ponto A, o mesmo acontecendo com um piezómetro instalado no ponto B.

Figura 4.2 - Carga total (cota piezométrica), altura piezométrica e cota geométrica para o fluxo de água através de um solo

A altura da água no tubo designa-se por altura piezométrica (expressa em unidades de comprimento), podendo ser expressa em unidades de pressão através da relação:

Fluxo

ZA

HA

uA

γw uB

γw

ZB

HBAB

L

∆H

N. R. (Z=0)

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4. 4

u = h ρW g (4.3)

em que: u = pressão (KN/m2);

ρW = massa volúmica da água (Mg/m3);

g = aceleração da gravidade (m/s2);

γW = peso específico da água (γW = ρW g).

Logo u = γW h. (4.4)

A perda de carga entre os pontos A e B é dada por:

∆H H Hu

Zu

ZA BA

WA

B

WB= − = +

��

�� − +

��

��

γ γ (4.5)

O gradiente hidráulico pode ser expresso de forma adimensional como:

i = ∆HL

(4.6)

em que i = gradiente hidráulico;

∆H = perda de carga entre os pontos A e B (m);

L = distância entre os pontos A e B, isto é, comprimento do fluxo ao longo do qual ocorre perda de carga (m).

Regra geral, a Figura 4.3 traduz a variação da velocidade com o gradiente hidráulico. Esta figura apresenta-se dividida em três zona distintas:

1 - Zona de fluxo laminar (Zona I);

2 - Zona de transição (Zona II);

3 - Zona de fluxo turbulento (Zona III).

Quando o gradiente hidráulico aumenta gradualmente, o fluxo permanece laminar nas Zonas I e II e a velocidade, v, varia linearmente com o gradiente hidráulico. Para gradientes hidráulicos elevados o fluxo passa a turbulento (Zona III). Quando o gradiente hidráulico diminui, as condições de fluxo laminar só ocorrem na Zona I

Na maior parte dos solos, o fluxo de água através dos vazios pode ser considerado laminar, isto é, v ∝ i.

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4. 5

Em maciços rochosos fracturados (sobretudo em formação cársicas), seixos e areias muito grossas, o fluxo é turbulento e a relação v ∝ i não é válida.

Figura 4.3 - Natureza das variação da velocidade, v, com o gradiente hidráulico i

3. Lei de Darcy

A lei de Darcy (1856) para o fluxo de água através de solos saturados formula que a velocidade de descarga (ou aparente) é proporcional ao gradiente hidráulico, isto é:

v = K i (4.7)

em que:

v = velocidade de descarga (ou aparente), que é o volume de água que flui por unidade de tempo através de uma secção de solo, medida perpendicularmente às linhas de corrente (m/s);

K = coeficiente de permeabilidade do solo (m/s).

Esta equação baseia-se em observações efectuadas por Darcy para o fluxo de água através de areia limpas, em que o fluxo é laminar e não turbulento. Normalmente, estas condições são válidas para os solos com granulometria situada entre as argilas e as areias medianamente grossas, mas já não são válidas para solos de granulometria mais grosseira.

A velocidade aparente da água (v) que é considerada no fluxo através de um solo é quase invariável (velocidade de descarga) e não é igual à velocidade real e irregular (velocidade de percolação) das partículas de água através dos poros dos solos.

Zona IZona de fluxo

laminar

Zona IIZona de transição

Zona IIIZona de fluxo turbulento

Gradiente hidráulico, i

Vel

ocid

ade,

v

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4. 6

Se um volume de água Q (m3) escoa através de uma coluna de solo de área transversal A (m2- medida perpendicularmente às linhas de corrente), num tempo t em segundos, o caudal q (m3/s) é igual a Q/t e a velocidade de descarga v (m/s) é dada por:

v = Q

t AqA

= (m/s) (4.8)

A velocidade real (vr) através dos vazios (velocidade de percolação), é maior do que a velocidade de descarga (ou velocidade aparente), v, e é inversamente proporcional à porosidade (n) do solo, como a seguir se vai demonstrar.

A relação entre a velocidade de descarga (v) e a velocidade de percolação (vr), pode ser obtida através da Figura 4.4, para um solo de comprimento L e secção transversal A. Se q for o caudal de água que flui através do solo por unidade de tempo, tem-se:

q = v A = Av vr (4.9)

em que: vr = velocidade de percolação (m/s);

Av = área dos vazios na secção transversal da amostra de solo (m2).

Figura 4.4 - Relação entre a velocidade de descarga (v) e a velocidade de percolação (vr)

Sendo A = Av + As, em que As é área das partículas sólidas na secção transversal da amostra, tem-se q = v (Av + As) = Av vr , (4.10)

ou seja,

Caudal de fluxo, q

AV

L

Área de vazios

Área das partículas sólidas

AS

A

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4. 7

vr = v A A

Av A A L

A Lv V V

Vv s

v

v s

v

v s

v

( ) ( ) ( )+=

+=

+ (4.11)

em que: VV = volume de vazios da amostra;

VS = volume de partículas sólidas da amostra.

Esta equação pode, ainda, ser escrita como:

vr = v

VV

VV

ve

evn

V

S

V

S

11

+�

��

��

�����

=+�

��

��� = (4.12)

em que: e = índice de vazios;

n = porosidade.

4. Coeficiente de permeabilidade

4.1. Definição

O coeficiente de permeabilidade, k, tem as mesmas unidades da velocidade (m/s ou cm/s) e expressa a resistência que o solo oferece à passagem da água. Se considerarmos a equação de Darcy, v = k i, pode definir-se k como sendo a velocidade de descarga para um gradiente hidráulico unitário, i = 1.

O termo coeficiente de permeabilidade é utilizado, sobretudo, pelos engenheiros civis e geotécnicos, enquanto que os geólogos utilizam o termo condutividade hidráulica.

O coeficiente de permeabilidade dos solos depende de um vasto conjunto de factores, nomeadamente: da viscosidade do fluído, da curva granulométrica do solo, da distribuição e dimensão dos poros, do índice de vazios, da rugosidade das partículas sólidas, da composição mineral e do grau de saturação.

Em solos argilosos, a estrutura desempenha um papel importante na sua permeabilidade, assim como a concentração iónica.

O valor do coeficiente de permeabilidade (k) varia significativamente em função do tipo de solo. No Quadro 4.1 apresentam-se, para diferentes tipos de solos, os valores de k característicos. O valor do coeficiente de permeabilidade (k) de solos não saturados é mais reduzido, aumentando rapidamente com o grau de saturação.

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4. 8

Quadro 4.1 - Valores típicos de coeficientes de permeabilidade (k)

Tipos de solos K (cm/s)

Seixo limpo 10. - 100 Areia grossa 1.0 - 0.01 Areia fina 1×10-3-1×10-4

Silte argiloso 1×10-4-1×10-6 Argila < 1×10-7

O coeficiente de permeabilidade varia, ainda, em função do peso específico e da viscosidade da água, parâmetros que, por sua vez, variam em função da temperatura a

que o ensaio é realizado. Então, a partir da equação K KW=γη

(4.13)

tem-se K

KT

T

T

T

W T

W T

1

2

2

1

1

2=

ηη

γγ

( )

( ) (4.14)

em que:

KT1; KT2 = coeficiente de permeabilidade às temperaturas T1 e T2, respectivamente;

η1, η2 = viscosidade da água às temperaturas T1 e T2, respectivamente;

γW(T1), γW(T2) = peso específico da água às temperaturas T1 e T2;

K = permeabilidade absoluta (tem as unidade de L2, isto é, cm2 ou m2).

É prática corrente apresentar o valor de k para a temperatura de 20º C. Assumindo-se que para as temperaturas a que o ensaio é realizado γW(T1) = γW(T2), tem-se:

K20ºC = ηη

T C

CT CKº

ºº

20

��

�� (4.15)

Na Figura 4.9 apresentam-se os valores da variação de ηη

T C

C

º

º20

��

�� , quando a temperatura

do ensaio, T, varia entre 13º C e 30º C.

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4. 9

Figura 4.9 - Variação de ηη

T C

C

º

º20

��

�� com a temperatura T (Das, 1987).

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4. 10

4.2. Coeficiente de permeabilidade em solos estratificados

Em geral, os maciços terrosos apresentam-se estratificados. Se a estratificação for contínua, o coeficiente de permeabilidade equivalente para o fluxo na direcção vertical e horizontal pode ser facilmente calculado.

a) Fluxo na direcção horizontal

A Figura 4.5 representa várias camadas de solo com estratificação horizontal. Devido à estrutura anisotrópica do terreno, o coeficiente de permeabilidade de cada camada de solo pode variar em função da direcção do fluxo. Assume-se que Kh1, Kh2, Kh3,..., são os coeficientes de permeabilidade para o fluxo horizontal nas camadas 1, 2, 3,..., respectivamente.

Figura 4.5 - Determinação da permeabilidade equivalente para o fluxo horizontal em solos estratificados

O caudal do fluxo na direcção horizontal, por unidade de comprimento das camadas, é dado por:

q = q1 + q2 + q3 + ... + qn (4.16)

em que q é o caudal do fluxo através do conjunto de camadas de solo estratificadas, e q1 ,q2 ,q3 , ..., o caudal de fluxo através das camadas 1, 2, 3, ..., respectivamente.

Para o fluxo na direcção horizontal, que é a direcção da estratificação das camadas, o gradiente hidráulico é igual em todas as camadas. Então,

q1 = Kh1 i d1; q2 = Kh2 i d2; q3 = Kh3 i d3 (4.17)

e q = Kh(eq) i d (4.18)

q1

q2

qn

d1

d2

dn

kv1

kv2

kvn

kh1

kh2

khn

Largura = 1 m

ΣΣΣΣi=1

ndi

qh

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4. 11

em que: i = gradiente hidráulico;

Kh(eq) = coeficiente de permeabilidade equivalente para o fluxo na direcção horizontal;

d1, d2, d3 = espessura das camadas.

Assim, Kh(eq) d = Kh1 d1 + Kh2 d2 + Kh3 d3 + ... (4.19)

Kh(eq) = d1

(Kh1 d1 + Kh2 d2 + Kh3 d3 + ...) =

=

=n

1ii

n

1iihi

d

dK (4.20)

b) Fluxo na direcção vertical

Na Figura 4.6 estão representadas n camadas de solo com fluxo na direcção vertical. Neste caso a velocidade do fluxo é igual em todas as camadas de solo, apesar das perdas de carga parciais serem diferentes. A perda de carga total (h) é igual à soma das perdas carga existentes em cada camada. Assim, v1 = v2 = v3 = ... =vn (4.21)

e h = h1 + h2 + h3 + ... + hn (4.22)

Utilizando a lei de Darcy, pode escrever-se

Kv(eq)dh

= Kv1 i1 = Kv2 i2 = Kv3 i3 = ... = Kvn in

(4.23)

em que Kv1, Kv2, Kv3, ..., Kvn são os coeficientes de permeabilidade das camadas individuais na direcção vertical e Kv(eq) é o coeficiente de permeabilidade equivalente.

Sendo h = d1 i1 + d2 i2 + d3 i3 + ... + dn in, (4.24)

pode-se escrever Kv(eq)dh

= v � Kv(eq) =hd

v (4.25)

� Kv(eq)

vhd=

nvn

nn

33v

33

22v

22

11v

11iK

id...

iKid

iKid

iKid

d

++++= =

=

=n

1i vi

i

n

1ii

Kd

d (4.26)

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4. 12

Figura 4.6 - Determinação da permeabilidade equivalente para o fluxo vertical em solos estratificados

4.3. Determinação do coeficiente de permeabilidade em laboratório

Em laboratório, o coeficiente de permeabilidade dos solos pode ser determinado através de dois tipos de ensaios: o permeâmetro de carga constante (para solos em que K>10-4 m/s) e o permeâmetro de carga variável (para solos com 10-4<K<10-7 m/s).

Solos com coeficientes de permeabilidade inferiores a 10-7 m/s só podem, em geral, ser determinados de forma indirecta, como é o caso dos ensaios de consolidação e triaxiais.

4.3.1. Permeâmetro de carga constante

Na Figura 4.7 apresenta-se um esquema do ensaio de permeabilidade de carga constante. Neste tipo de ensaio é mantida uma perda de carga constante através da amostra de solo. São utilizados filtros ou uma pedra porosa no topo e na base da amostra, para que não haja perda de finos. Embora ocorra perda de carga nos filtros, esta não influencia a determinação do coeficiente de permeabilidade do solo, se os pontos de leitura das tensões neutras forem colocados abaixo e acima do topo e da base da amostra, respectivamente. Depois de estabelecidas as condições de equilíbrio, é medido o caudal que atravessa a amostra, por unidade de tempo (vd. Figura 4.7).

qv

qv

d1

d2

dn

kv1

kv2

kvn

kh1

kh2

khn

Largura = 1 m

ΣΣΣΣi=1

ndi

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4. 13

Figura 4.7 - Ensaio de permeabilidade de carga constante

O volume de água que atravessa a amostra é dado por:

Q = A v t = A (K i) t (4.27)

em que: Q = volume de água recolhido (m3);

A = secção transversal da amostra (m2);

t = tempo de duração da recolha de água (s).

como i = ∆HL

, tem-se que Q = A (K ∆HL

) t, (4.28)

ou seja,

K = QL

A H t∆ (4.29)

A

B

ZA

hwA

ZB

hwB

∆H=HA-HB

L

x

x

Pedraporosa

Pedraporosa

Q= const.

Q= const.

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4. 14

4.3.2. Permeâmetro de carga variável

Como a velocidade do fluxo de água através de amostras de solos finos é muito reduzida, para que o coeficiente de permeabilidade destes solos seja determinado com rigor utiliza-se o permeâmetro de carga variável (vd. Figura 4.8). Neste ensaio, a água que flui através da amostra vem de um tubo vertical de secção a e a perda de carga na amostra é dada pela diferença entre o nível de água no tubo e o nível de água no recipiente que a recebe. Embora exista perda de carga nos filtros colocados no topo e na base da amostra, como o ensaio é efectuado em solos de muito baixa permeabilidade, o seu efeito não é significativo.

Figura 4.8 - Ensaio de permeabilidade de carga variável

Quando se inicia o ensaio regista-se a diferença de carga hidráulica H1, para o tempo t=t1, e a água vai fluir através da amostra de solo até à diferença de carga hidráulica final H2, para o tempo t=t2.

O caudal percolado através da amostra de solo, para um tempo t=t2-t1, é dado pela expressão:

q = K HL

A = - a dHdt

(4.30)

em que: q = caudal (m3/s);

a = secção transversal do tubo (m2);

L

Pedraporosa

Pedraporosa

Q= const.

dH

H2

H H1

a

Amostra(de secção A)

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4. 15

A = secção transversal da amostra de solo (m2).

Então dt = a LA K

dHH

−���

��� . (4.31)

Integrando esta equação para os tempos limites t1 e t2 e para as diferenças de carga hidráulica H1 e H2, tem-se:

dta LA K

dHHt t

t t

H H

H H

=

=

=

=

� �= −���

���

1

2

1

2

� (t2 - t1) = a LA K

HH

ln 1

2

��

�� (4.32)

então K = a L

A t tHH( )

ln2 1

1

2− = 2.303

a LA t

HH

log 1

2 (4.33)

4.3.3. Principais causas de erro na determinação do coeficiente de permeabilidade em laboratório

São vários os factores que podem introduzir erros na determinação do coeficiente de permeabilidade em laboratório, de entre os quais se destacam os mais importantes:

a) Amostras não representativas - Sendo o volume de solo sujeito a ensaio extremamente reduzido quando comparado com o volume de maciço terroso que se pretende caracterizar, os resultados de ensaios de laboratório obtidos a partir de amostras pequenas podem não ser representativos da permeabilidade média de um estrato.

b) Ar na amostra - Nos ensaios de laboratório o gradiente hidráulico é, em geral, muito maior que o existente in situ. A queda de pressão pode provocar que o ar dissolvido na água utilizada no ensaio fique retido nos vazios do solo, reduzindo consideravelmente a sua permeabilidade. Para minimizar este efeito, a água usada nos ensaios deve ser submetida ao vácuo, de forma a extrair o ar da solução.

c) Perturbações da amostra - Na prática, é extremamente difícil obter amostras não perturbadas de solos granulares grossos, sobretudo quando situadas abaixo do nível freático, o que obriga à execução de ensaios laboratoriais em amostras reconstituídas e compactadas em laboratório com a sua baridade in situ. No entanto, nunca se consegue reproduzir exactamente o estado das amostras in situ, nomeadamente, a sua estratificação e o arranjo e distribuição entre as partículas sólidas, factores que podem ter uma influência significativa nos resultados obtidos.

d) Anisotropia da permeabilidade - Muitos dos solos ocorrentes na natureza dispõem-se sob a forma de estratos horizontais com diferentes graus de consistência, compacidade e coeficiente de permeabilidade, havendo, muitas vezes, uma orientação preferencial das partículas segundo a horizontal. Esta anisotropia no arranjo das partículas implica que, em muitos solos, a sua permeabilidade na

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4. 16

direcção horizontal seja muito superior ao seu valor na direcção vertical (a razão entre a permeabilidade horizontal e vertical pode ser da ordem de 100:1). Os ensaios de laboratório medem a permeabilidade vertical, que pode não ter interesse para os casos práticos em que fluxo o in situ é predominantemente na horizontal.

e) Trocas de base - No caso de solos finos, a natureza dos iões adsorvidos influência a espessura da camada de adsorção e, consequentemente, a permeabilidade dos solos. De forma a impedir a substituição dos iões adsorvidos, é aconselhável usar no ensaio a água existente in situ. No entanto, esta regra raramente é cumprida na prática, sendo a água usada destilada ou tratada quimicamente, para diminuir a sua concentração em iões.

4.4 Relações empíricas

Através da utilização de expressões empíricas pode-se avaliar de forma aproximada o coeficiente de permeabilidade dos solos, sobretudo de solos arenosos.

Para areias uniformes, Hazen (1930) propôs a proporcionalidade de k relativamente ao quadrado do diâmetro efectivo das partículas:

k (cm/s) = c D102 (4.34)

em que: c = constante que varia entre 1.0 e 1.5 D10= diâmetro efectivo, em mm.

Esta equação tem por base observações efectuados por Hazen em areias limpas. Quando as areias apresentam uma pequena percentagem de silte e/ou argila, o coeficiente de permeabilidade sobre variações significativas.

Terzaghi faz depender o valor de k também do índice de vazios dos solos

k (m/s) = 20000 e2 D102 (m) (4.35)

Estas expressões baseiam-se no facto da dimensão média dos tubos de fluxo formados pelos poros dos solos estar correlacionada com as dimensões das partículas que os constituem e com o seu índice de vazios.

Importa salientar que estas expressões não são válidas para solos argilosos, uma vez que a composição mineralógica das partículas de argila afecta significativamente a sua permeabilidade, verificando-se que quanto mais activa é a argila menor é o seu coeficiente de permeabilidade.

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4. 17

4.5. Determinação do coeficiente de permeabilidade in situ através de ensaios de bombagem

No campo, o coeficiente de permeabilidade médio de solos grossos, medido na direcção do fluxo subterrâneo, pode ser determinado através da realização de ensaios de bombagem em furos ou poços.

Neste tipo de ensaios, a permeabilidade de um estrato de solo é avaliada através da medição do caudal de bombagem num furo que interessa toda a espessura do estrato que está a ser investigado. Para além do furo de bombagem são necessários, normalmente, mais dois furos de observação (piezómetros) do nível de água, localizados a distâncias radiais r1 e r2 do furo principal. A bombagem de um caudal constante induz um rebaixamento do nível piezométrico na vizinhança do furo (cone de rebaixamento), daí resultando um gradiente hidráulico que provoca o fluxo de água para o furo de bombagem. O nível piezométrico é registado nos furos de observação situados a distâncias r1 e r2 e é medida a altura a que a água ocorre em cada um deles (H1 e H2), depois de estabelecidas as condições de equilíbrio hidrodinâmico (caudal de bombagem = caudal que influi ao furo de bombagem).

Estes ensaios apresentam a grande vantagem de permitirem avaliar a permeabilidade de um solo num estado não perturbado, contrariamente ao que, normalmente, se verifica com os ensaios de laboratório. Apresentam, ainda, a vantagem de permitirem avaliar o coeficiente de permeabilidade para um fluxo horizontal, o que é importante em alguns problemas de percolação.

O valor do coeficiente de permeabilidade médio diz respeito a um volume de solo muito considerável, que é função da localização dos pontos de observação (piezómetros), não sendo possível detectar variações locais de permeabilidade que possam existir.

Durante a realização do ensaio, é importante que a água bombada não seja descarregada para uma zona próxima do furo, de forma a não influenciar a variação do nível freático e o rigor dos resultados obtidos.

Comparativamente com os ensaios de laboratório, estes ensaios in situ são bastante mais caros, não só porque requerem muitos metros de furação, mas também porque é necessário efectuar a bombagem durante um longo período de tempo (em geral, 24 horas ou mais), até se atingir as condições de equilíbrio hidrodinâmico para um caudal constante.

4.5.1. Ensaios de bombagem para condições de fluxo não confinado

Diz-se que o fluxo é não confinado quando o nível piezométrico, para qualquer ponto na zona de percolação, traduz a altura a que a coluna de água subiria de forma a estar em equilíbrio com a pressão neutra (pressão de água) naquele ponto (altura piezométrica). Assim, se não existir uma componente vertical de fluxo, isto é, se não existir gradiente vertical, o nível piezométrico coincide com o nível freático em qualquer ponto.

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4. 18

A Figura 4.10 representa um estrato de solo permeável sobrejacente a um maciço impermeável, tendo sido executado um furo de bombagem e dois furos de observação que interessam todo o estrato permeável.

Neste caso, para a determinação do coeficiente de permeabilidade, assume-se que:

- o fluxo é horizontal, isto é, em qualquer ponto o nível piezométrico coincide com o nível freático;

- a sucção pode ser desprezada e a superfície livre coincide com o nível freático:

- o gradiente hidráulico é constante à mesma distância radial e é igual à variação

do nível piezométrico com o raio (dHdr

).

Figura 4.10 - Ensaio de bombagem num estrato permeável não confinado, sobrejacente

a um substrato impermeável

Na prática, assume-se que se atingem as condições de equilíbrio hidrodinâmico quando, para um determinado caudal constante de bombagem, o nível de água nos furos de observação também permanece constante. O caudal do fluxo de água subterrânea que influi para o furo de bombagem e que é igual ao caudal de bombagem (q), sendo dado por:

q = v A = K i A = K (dHdr

) 2π r H (4.36)

então, por integração tem-se

drr

Kq

H dHr r

r r

H H

H H

=

=

=

=

� �=�

��

��

1

2

1

22π � ( )ln

rr

Kq

H H2

1

22

21

��

�� =

��

�� −

π (4.37)

H1 H2

r1

r2

Cone derebaixamento

Estrato impermeável

HEstratoPermeável

Q= const.R

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4. 19

� Kq

rr

H H=

��

��

ln

( )

2

12

221π

� Kq

rr

H H=

��

��

2 303 2

12

22

1

. log

( )π (4.38)

4.5.2. Ensaios de bombagem para condições de fluxo confinado

Na Figura 4.11 apresenta-se um furo que interessa toda a espessura de um estrato permeável, confinado no topo e na base por estratos impermeáveis. Neste caso o fluxo está limitado (confinado) ao estrato permeável, não existe superfície livre no solo que contem água e o nível piezométrico encontra-se acima do topo do estrato permeável.

Figura 4.11 - Ensaio de bombagem para um furo totalmente penetrante num estrato confinado

O coeficiente de permeabilidade médio do estrato permeável pode ser determinado através da realização de um ensaio de bombagem no furo que interessa toda a sua espessura e da medição dos níveis piezométricos em furos de observação situados a várias distâncias radiais (r1 e r2).

O ensaio é executado até ser atingido um caudal de bombagem constante, para o qual o nível piezométrico nos furos de observação também permanece constante (condição de equilíbrio hidrodinâmico). Assim, o caudal de bombagem, q, é igual ao caudal que influi para o furo através do estrato permeável de espessura D.

q = v A = K i A = K (dHdr

) 2π r D (4.39)

então, por integração tem-se

H1 H2

r1

r2

Cone derebaixamento

Estrato impermeável

H

EstratoPermeável

Q= const.R

D

Piezómetros

Estrato impermeável

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4. 20

drr

K Dq

dHr r

r r

H H

H H

=

=

=

=

� �=�

��

��

1

2

1

22π � ( )ln

rr

K Dq

H H2

12 1

2�

��

�� =

��

�� −

π

� Kq

rr

D H H=

��

��

ln

( )

2

1

2 12π (4.40)

� Kq

rr

D H H=

��

��

log

. ( )

2

1

2 12 727 (4.41)

5. Caudal bidimensional em maciços terrosos

Até agora estudaram-se apenas casos de fluxo unidireccional (vertical ou horizontal), em que para calcular o caudal de percolação através de um solo bastava aplicar directamente a lei de Darcy. Contudo, existem muitas situações em que o fluxo de água através dos solos não se faz apenas segundo uma só direcção, apresentando velocidades de fluxo com uma componente segundo a direcção vertical (vz) e outra segundo a direcção horizontal (vx). Nestes casos, em geral, o fluxo de água subterrânea é calculado através de redes de fluxo. O conceito de rede de fluxo baseia-se na Equação da Continuidade, que rege as condições de fluxo uniforme para um dado ponto do maciço terroso.

No caso de fluxo bidireccional assume-se que:

- o meio é homogéneo, poroso e tem um volume médio constante;

- o fluído (água) é homogéneo e incompressível;

- o caudal está em regime estável e constante num meio poroso saturado.

Tendo em conta o elemento de solo de volume dx dy dz (dy é contado na perpendicular à figura e todos os fenómenos ocorrentes se reflectem de forma idêntica nos planos xz paralelos à figura) representado na Figura 4.12, o caudal que influi (entra) no elemento de solo é igual ao caudal que aflui (sai), pois o meio poroso e o fluído são incompressíveis. Isto é,

qInfluxo = vx dydz + vz dxdy (4.42)

qAfluxo = vvx

dx dy dz vvz

dz dxdyxx

zz+�

��

��� + +�

��

���

∂∂

∂∂

(4.43)

Page 21: Fluxo Nos Solos

Mecânica dos Solos Permeabilidade e Percolação

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4. 21

Figura 4.12 - Fluxo bidimensional num meio poroso em torno de uma cortina impermeável

Logo, vx dydz + vz dxdy = vvx

dx dy dz vvz

dz dxdyxx

zz+�

��

��� + +�

��

���

∂∂

∂∂

(4.44)

dx

dz A

Camada impermeável

H1H2

Cortinaimpermeável

H

(a)

dy

dx

dz

vz dx dy

vx dz dy(vx + dx) dz dyδvx

δx

(vz + dz) dx dyδvz

δz

Page 22: Fluxo Nos Solos

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4. 22

∂∂

∂∂

vx

vz

dxdydzx z+���

��� = 0 (4.45)

Tratando-se de um elemento de volume unitário (V= dx dy dz = 1), tem-se

∂∂

∂∂

vx

vz

x z+ = 0 (Equação da Continuidade) (4.46)

A equação (4.46) representa duas famílias de curvas ortogonais entre si, as linhas de fluxo (ou de corrente) e as linhas equipotenciais.

De acordo com a lei de Darcy (v = Ki = KHL

), as velocidades de descarga podem ser

calculadas como v K i K

Hx

v K i KHz

x x x x

z z z z

= = −

= = −

��

��

∂∂∂∂

(4.47)

Por diferenciação parcial tem-se

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

vx

KH

xvz

KH

z

xx

zz

= −

= −

���

���

2

2

2

2

(4.48)

Substituindo na equação da continuidade (4.46) tem-se − − =KH

xK

Hzx z

∂∂

∂∂

2

2

2

2 0 (4.49)

Se o solo tem uma permeabilidade isotrópica, então Kx = Kz = K, pelo que,

− − =KH

xK

Hz

∂∂

∂∂

2

2

2

2 0 (4.50)

Definindo uma função φ (x, z) tal que

∂φ∂

∂∂

∂φ∂

∂∂

xv K

Hx

zv K

Hz

x

z

= = −

= = −

��

��

(4.51)

Por diferenciação parcial relativamente a x e a z tem-se

∂ φ∂

∂∂

∂∂

∂ φ∂

∂∂

∂∂

2

2

2

2

2

2

2

2

xvx

KH

x

zvz

KH

z

x

z

= = −

= = −

���

���

(4.52)

Substituindo (4.52) em (4.46) obtém-se

Page 23: Fluxo Nos Solos

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4. 23

∂ φ∂

∂ φ∂

2

2

2

2 0x z

+ = (Equação de Laplace) (4.53)

Esta equação diferencial de segunda ordem descreve a perda de energia através de um meio poroso, em que a função φ(x, z) é definida como função de potência.

Consequentemente, φ(x, z) satisfaz a equação de Laplace, em que

φ(x, z) = -K H(x, z) + f(z) (4.54)

φ(x, z) = -K H(x, z) + g(x) (4.55)

Desde que x e z possam variar independentemente, f(z) = g(x) = cte. Então,

φ(x, z) = -KH(x, z) + cte (4.56)

pelo que, H(x, z) = [ ]1K

c x zte − φ( , ) (4.57)

Se H(x, z) é constante e igual a H1, a equação (4.57) representa uma curva no plano xz. Para esta curva, φ vai ter um valor constante φ1, que é uma linha equipotencial. Então, atribuindo a φ um conjunto de valores φ1,φ2,φ3,…, obtém-se um conjunto de linhas equipotenciais tal que H = H1,H2,H3,…, respectivamente.

Se existe uma função potencial, então o fluxo é irrotacional. Uma partícula de fluído é irrotacional se o integral da linha de velocidade tangencial, tomado ao longo do perímetro da partícula, é nulo. Para tal, considere-se o elemento dxdz representado na Figura 4.13.

Figura 4.13 - Partícula de fluído irrotacional

dx

dz

vx vz

x

z

dxx

vv z

z ∂∂+

dzz

vv x

x ∂∂+

Page 24: Fluxo Nos Solos

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4. 24

Considerando que a circulação é igual a zero, tem-se:

vz dz + vvz

dz dx v dx vvx

dx dzxx

x zz+�

��

��� = + +�

��

���

∂∂

∂∂

(4.58)

v dz v dxvz

dzdx v dx v dzvx

dxdzz xx

x zz+ + = + +

∂∂

∂∂

(4.59)

∂∂

∂∂

vz

dxdzvx

dxdzx z− = 0 (tratando-se de um elemento unitário dx dz = 1) (4.60)

− + =∂∂

∂∂

vx

vz

z x 0 (Condição de irrotacional) (4.61)

Definindo-se uma função ψ(x, z) tal que

∂ψ∂

∂∂

∂ψ∂

∂∂

zv

Hx

xv

Hz

x

z

= = −

− = = −

��

��

(4.62)

Por diferenciação parcial tem-se

∂∂

∂ ψ∂

∂∂

∂ ψ∂

vz z

vx x

x

z

=

= −

���

���

2

2

2

2

(4.63)

Substituindo na equação (4.61) obtém-se ∂ ψ∂

∂ ψ∂

2

2

2

2 0x z

+ = (4.64)

A função ψ = ψ (x, z) é definida como função de fluxo.

Comparando as duas definições de φ e de ψ, verifica-se que para a função φ = φ (x, z) vem

vx = ∂φ∂x

e vz = ∂φ∂z

(4.65)

Assim dφ = ∂φ∂x

dx + ∂φ∂z

dz = vx dx + vz dz (4.66)

Portanto, para um valor constante de φ vem dφ =0 e dzdx

vv

x

z= − (4.67)

Para a função ψ, sendo ψ = ψ (x, z):

vx = ∂ψ∂z

e vz = - ∂ψ∂x

(4.68)

Page 25: Fluxo Nos Solos

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4. 25

Diferenciando a função ψ, obtém-se:

dψ = ∂ψ∂x

dx + ∂ψ∂z

dz = - vz dx + vx dz (4.69)

Para um valor de ψ constante, tem-se dψ = 0 e dzdx

vv

z

x= (4.70)

Então, pode-se concluir que as linhas equipotenciais (linhas de φ constante) são normais às linhas de corrente (linhas de ψ constante), uma vez que o produto das suas inclinações é -1. Face ao exposto, o fluxo bidimensional através de um maciço terroso pode ser representado por uma série de linhas de fluxo e equipotenciais que são normais entre si, formando uma rede de fluxo.

A resolução de problemas de percolação bidimensional pode ser obtida: a) analiticamente (quando se trata de situações relativamente simples); b) graficamente (redes de fluxo); por métodos numéricos (diferenças finitas, elementos finitos, etc.); c) através de modelos reduzidos; d) por métodos analógicos (transmissão de energia, calor, etc.). Qualquer destes métodos requer o conhecimento da geometria das camadas, da permeabilidade dos materiais e das condições de fronteira.

6. Redes de fluxo

A equação da continuidade (4.46) num meio poroso isotrópico, conforme foi visto anteriormente, representa duas famílias de curvas ortogonais entre si, as linhas de fluxo e as linhas equipotenciais. As linhas de fluxo traduzem a trajectória das partículas de água no maciço terroso, quando estas se deslocam de montante (nível de energia mais alto) para jusante (nível de energia mais baixo). As linhas equipotenciais são linhas ao longo das quais a carga hidráulica é constante. Assim, se for colocado um piezómetro em qualquer ponto de uma dada linha equipotencial, a coluna de água no piezómetro sobe sempre até ao mesmo nível. A Figura 4.14 traduz de forma esquemática a definição de linha de fluxo e equipotencial, para o fluxo num estrato permeável e isotrópico (K = Kx = Kz), em torno de uma cortina suposta impermeável.

A combinação de um determinado número de linhas de fluxo e de linhas equipotenciais é designada por rede de fluxo. Na representação gráfica de uma rede de fluxo, as linhas de fluxo e equipotenciais são traçadas da seguinte forma:

- as linhas equipotenciais intersectam as linhas de fluxo segundo ângulos ortogonais;

- os elementos da rede de fluxo são aproximadamente quadrados.

Na Figura 4.14- (b) apresenta-se um exemplo de uma rede de fluxo. Tendo presente as condições de fronteira, que as linhas de fluxo se cruzam ortogonalmente com as equipotenciais e que os seus elementos são aproximadamente quadrados, a rede de fluxo

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4. 26

vai sendo construída por tentativas. No caso do exemplo apresentado, as condições de fronteira podem ser descritas como:

- as superfícies horizontais do terreno, a montante e a jusante da cortina (linhas ab e de), que são equipotenciais;

- o contacto impermeável do solo com o substrato (linha fg), que é uma linha de fluxo;

- o contorno da cortina suposta impermeável (linha acd), que é uma linha de fluxo.

Figura 4.14 - (a) Definição de linha de fluxo e de linha equipotencial; - (b) Rede de fluxo completa (adaptado de Das, 1987).

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4. 27

6.1. Cálculo do caudal de percolação numa rede de fluxo

Numa rede de fluxo, o espaço percolado entre duas linhas de fluxo adjacentes é designado por canal de fluxo ou canal de corrente.

A Figura 4.15 representa um canal de fluxo com linhas equipotenciais espaçadas de modo a formar elementos quadrados. Se às linhas equipotenciais corresponderem os níveis piezométricos H1 =H2 = H3 =...= Hn e assumindo que a rede é formada por elementos quadrados, o caudal de percolação num canal de fluxo (não existe fluxo na direcção perpendicular às linhas de fluxo), por unidade de comprimento, é dado por:

∆q1 = ∆q2 = ∆q3 = ... = ∆q (4.71)

De acordo com a lei de Darcy, o caudal de fluxo é igual a KiA. Assim, tem-se

∆q KH H

ll K

H Hl

l KH H

ll=

−�

��

�� =

−�

��

�� =

−�

��

�� =1 2

11

2 3

22

3 4

33 ... (4.72)

Se os elementos da rede de fluxo forem quadrados, esta equação mostra que a perda de carga (∆H) entre duas equipotenciais adjacentes é a mesma. Assim,

H1 - H2 = H2 - H3 = H3 - H4 = H

ND (4.73)

e ∆q = K H

ND (4.74)

em que: H = perda de carga total, entre o lado de montante e o lado de jusante (m);

ND = nº de quedas de potencial.

Figura 4.15 - Percolação através de um canal de fluxo com elementos quadrados (Das, 1987)

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4. 28

Na Figura 4.14, para cada canal de fluxo, H = H1 - H2 e ND = 6.

Se NC for o número de canais de fluxo, então o caudal de percolação através de todos os canais, por unidade de comprimento, é dado por

q q N KNH

NC CD

= × =∆ (4.75)

Embora seja conveniente traçar redes de fluxo com elementos quadrados, pode ser traçada uma rede de fluxo com elementos rectangulares, de forma que a relação entre os comprimentos b/l de todos os elementos da rede seja a mesma (vd. Figura 4.16). Neste caso, o caudal de percolação através de um canal de fluxo é dado por

∆q KH H

lb K

H Hl

b KH H

lb=

−�

��

�� =

−�

��

�� =

−�

��

�� =1 2

11

2 3

22

3 4

33 ... (4.76)

Se bl

bl

bl

n1

1

2

2

3

3= = = =... (isto é, se os elementos não são quadrados), tem-se

∆q K Hn

ND=

��

�� (4.77)

em que q K HNN

nC

D=

��

�� (4.78)

Figura 4.16 - Percolação através de um canal de fluxo com elementos rectangulares (Das, 1987).

Page 29: Fluxo Nos Solos

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4. 29

6.2. Fluxo através de um meio poroso anisotrópico

Se o coeficiente de permeabilidade é independente da direcção da velocidade, o solo é considerado um meio isotrópico. Quando esta mesma condição se verifica em todos os pontos da massa de um solo, então, para além de isotrópico, o solo é homogéneo (vd. Figura 4.17). Caso a velocidade do fluxo dependa da direcção, mas com uma dependência igual em todos os pontos, o solo é anisotrópico e homogéneo, pelo que o coeficiente de permeabilidade depende da direcção da velocidade (Kx ≠ Kz), mas é independente do sistema de coordenadas.

Figura 4.17 – Propriedades da condutividade hidráulica

A anisotropia é frequente nos maciços terrosos naturais e, inclusive, nos próprios aterros das barragens de terra, devido ao efeito de consolidação produzido pela compactação, ou devido à acção de drenos horizontais.

Assim, em solos anisotrópicos (Kx ≠ Kz) a equação da continuidade para o fluxo

bidimensional é dada por − − =KH

xK

Hzx z

∂∂

∂∂

2

2

2

2 0 .

(4.79)

Nestes casos, a equação da continuidade não é Laplaciana (as linhas de fluxo não intersectam perpendicularmente as linhas equipotenciais), mas pode ser empregue um artifício de transformação de coordenadas, para converter a anisotropia em isotropia, de forma que a equação da continuidade seja Laplaciana.

kx=10 kx=10

kz=10 kz=10 kz=10 kz=10

kx=20 kx=20

kx=10 kx=5

kz=10

kz=5

kz=10

kz=5

kx=20 kx=10

1. Homegéneo/Isotrópico 2. Homogéneo/Anisotrópico

3. Heterogéneo/Isotrópico 4. Heterogéneo/Anisotrópico

Page 30: Fluxo Nos Solos

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4. 30

Partindo da equação da continuidade para solos anisotrópicos KK

Hx

Hz

x

z

∂∂

∂∂

2

2

2

2 0+ = , e

fazendo KK

Cx

z= 2 , tem-se

∂∂

2

2

2

2 0H

xC

Hz�

��

���

+ = . (4.80)

Então, para se passar de um meio anisotrópico para um meio isotrópico, é necessário

fazer a seguinte transformação de coordenadas: X = x KK

z

x. (4.90)

dX = dx KK

z

x (4.91)

dXdx

Xx

KK

z

x= =

∂∂

(4.92)

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

Hx

HX

Xx

HX

KK

z

x= = (4.93)

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

2

2

Hx x

Hx x

HX

KK X

Hx

KK

z

x

z

x= = = (4.94)

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

2

2

Hx X

HX

Xx

KK

z

x= (4.95)

∂∂

∂∂

∂∂

2

2

Hx X

HX

KK

KK

z

x

z

x= (4.96)

∂∂

∂∂

2

2

2

2

Hx

HX

KK

z

x= (4.97)

Substituindo (4.97) na equação da continuidade para um meio anisotrópico tem-se:

−�

��

�� − =K

KK

HX

KH

zxz

xz

∂∂

∂∂

2

2

2

2 0 (4.98)

− − =KH

XK

Hzz z

∂∂

∂∂

2

2

2

2 0 (4.99)

Page 31: Fluxo Nos Solos

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4. 31

Fazendo φ = - Kz H, obtém-se: ∂ φ∂

∂ φ∂

2

2

2

2 0X z

+ = (4.100)

Tem-se, assim, que uma transformação de escala na direcção horizontal, de x para

x

z

KK

xX = , transforma um meio anisotrópico num meio isotrópico, em que as linhas

de fluxo e equipotenciais se intersectam ortogonalmente.

É com base nestas transformações que se torna possível traçar graficamente redes de fluxo em meios anisotrópicos, por simples contracção ou expansão das coordenadas espaciais de uma região, efectuando-se, de uma forma fictícia, a passagem para um meio isotrópico, onde é válida a equação de Laplace. Uma vez resolvido o problema, basta aplicar a relação inversa das escalas para obter a rede correspondente ao fluxo natural.

O caudal em ambas as direcções, X e x, tem que ser o mesmo, logo qX = qx.

Na escala natural tem-se:

∆qNat = qx + qz = Kx ix dz + Kz iz dx (4.101)

Na escala transformada tem-se:

∆qTran = qX + qz = K iX dz + K iz dX (4.102)

em que: dX = dx KK

z

x e i

HX

Hx

xX

iKKX x

x

z= = =

∂∂

∂∂

∂∂

. (4.103)

qx

dx

dz

qz

qX

qz

dX

dz

Page 32: Fluxo Nos Solos

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4. 32

Assim, ∆qTran = K iKKx

x

z dz + K iz

KK

z

xdx (4.104)

Então, ∆qNat = ∆qTran se Kx = KKK

x

z e Ky = K

KK

z

x (4.105)

Logo, K = K Kx z (4.106)

Face ao exposto, o caudal de percolação num meio poroso anisotrópico, por unidade de

tempo, é dado por q KNN

H K KNN

HC

Dx z

C

D= = (4.107)

A Figura 4.18 apresenta um exemplo em que kx = 4 kz.

Figura 4.18 - Fluxo bidimensional num solo anisotrópico. (a) secção real;

Escala original, kx = 4 kz

(a)

Page 33: Fluxo Nos Solos

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4. 33

Figura 4.18 - Fluxo bidimensional num solo anisotrópico. (b) secção transformada; (c) – rede de fluxo para a secção transformada.

(b)

(c)

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4. 34

Figura 4.18 - Fluxo bidimensional num solo anisotrópico. (b) secção real.

6.3. Força de percolação por unidade de volume de maciço terroso

Do fluxo de água através de maciços terrosos resulta uma força de com a direcção e o sentido do fluxo que é exercida sobre as partículas sólidas. Para avaliar a força de percolação por unidade de volume de maciço terroso, considere-se o elemento de solo representado na Figura 4.19, o qual é limitado por duas linhas de fluxo (ab e cd) e por duas linhas equipotenciais (ef e gh). O peso (w) do elemento de solo é igual a W = γsat V = γsat L2 1.0 m. A força hidrostática no lado ef do elemento de solo é igual a h1γWL 1.0 m e no lado gh é igual a h2γW L 1.0 m. Em equilíbrio,

∆F = h1 γW L + γsat L2 sen α - h2 γW L (4.108)

Como h1 + L sen α = h2 + ∆H, então (4.109)

h2 = h1 + L sen α - ∆H (4.110)

Combinando as equações anteriores tem-se

∆F = h1 γW L + γsat L2 sen α - (h1 + sen α - ∆H) γW L (4.111)

= ( )L sen H Lsat W

peso especifico submersopor unidade de volume

W

força de percolaçao

2 γ γ α γ− +� ��� ��� � �� ��

∆ (4.112)

A força de percolação por unidade de volume é igual a ∆H γW L

= ∆ ∆H L

LHL

iWW W

γγ γ2 = = (4.113)

em que i é o gradiente hidráulico.

Page 35: Fluxo Nos Solos

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4. 35

Figura 4.19 - Determinação da força de percolação

6.4. Segurança ao piping e à rotura hidráulica

Quando o fluxo de água é ascendente e se verifica um gradiente hidráulico crítico i = ic, tal que σ`=0, pode ocorrer piping (erosão interna) ou rotura hidráulica (fluidificação) do maciço terroso.

Se i = ic � σ` = γ` L - ic γW L = 0 (4.114)

� icW

γ`

(4.115)

Como γ` = γsat - γW = ( )S e G

eG

er

W WW+

+���

��� − =

−+11

1γ γ

γ (4.116)

então icW

γ` ( )

=−+

Ge1

1 (4.117)

Em função dos índices físicos e e G dos solos, o ic pode variar entre 0.85 e 1.1.

De acordo com Harza (1935), que investigou a segurança de estruturas hidráulicas relativamente ao piping, o coeficiente de segurança (FS) ao piping é dado por

∆Η

h2

h1

L sen α α

F

F + ∆F

a

bc

d

e

f

g

h

Page 36: Fluxo Nos Solos

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4. 36

FSi

ic

saida= (4.118)

em que isaída é o gradiente hidráulico máximo na zona de saída.

imáx =∆H

Lmin (4.119)

Com base em ensaios realizados em modelos, Terzaghi (1922) conclui que a zona de maciço terroso mais susceptível de vir ocorrer rotura hidráulica (fluidificação), quando

existe fluxo bidimensional em torno de uma cortina, tem a largura D2

(D é o

comprimento de cortina enterrado no solo permeável). Então, a segurança à rotura hidráulica pode ser determinada estudando a estabilidade do prisma de solo a jusante da

cortina, com o volume V = D × ×D

m2

10. (vd. Figura 4.20).

O coeficiente de segurança à rotura hidráulica é dado por FSWFp

=`

(4.120)

em que W` = peso do solo submerso por unidade de comprimento de cortina, na zona

susceptível de haver rotura hidráulica ( )DD

Dsat W212

2���

��� − =

��γ γ γ` ;

Fp = força de percolação por unidade de comprimento de cortina.

A força de percolação por unidade de comprimento de cortina é dada por:

Fp = (Volume de solo)×(imédio γW) = 12

2D imedio Wγ (4.121)

em que imédio = ∆H

Dmedio , (4.122)

ou seja, é o gradiente hidráulico médio no volume de solo.

Então, o coeficiente de segurança relativamente à rotura hidráulica é dado por:

FSimedio W

γ`

(4.123)

Page 37: Fluxo Nos Solos

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4. 37

Figura 4.20 - Análise de estabilidade à rotura hidráulica (fluidificação) para o fluxo bidimensional ascendente em torno de uma cortina

EXEMPLO:

A rede de fluxo representada na Figura 4.21 traduz a percolação de água através de um estrato permeável, em torno de uma cortina suposta impermeável. Pretende-se calcular o coeficiente de segurança à rotura hidráulica, considerando que o peso específico saturado do estrato permeável é de 17.7 KN/m3.

De acordo com o comprimento da cortina enterrada, o prisma de solo a considerar tem uma secção de 6.0 m × 3.0 m, por metro de cortina. Então, o volume do prisma de solo é

de V = D × ×D

m2

10. = 18.0 m3 (vd. Figura 4.22).

Utilizando a rede de fluxo pode-se calcular a perda de carga através do prisma de solo:

- no comprimento ab ,( )

∆HH H

ab=

−36

1 2

- no comprimento dc ,( )

∆HH H

dc=

−1661 2.

Camada impermeável

H1H2

Cortinaimpermeável

(a)

D

D2

D2

D

Fp = i γw V

W`= γ`V

(b)

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4. 38

Figura 4.21 - Rede de fluxo para a percolação de água em torno de uma cortina, num

estrato permeável (Das, 1987).

A perda de carga média ∆∆ ∆

HH H

medioab dc=

+�

��

��

2 no prisma de solo é de 0.36 (H1 -

H2) e o gradiente hidráulico médio imédio = ∆H

Dmedio =

( )0 36 1 2. H HD

Figura 4.22 - Prisma de solo a jusante da cortina impermeável

Então, o coeficiente de segurança é dado por:

6.0 m

3.0 m

a

b c

d

Prisma de solo

0

0.5Média = 0.36

H1 -

H2

Page 39: Fluxo Nos Solos

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4. 39

FSimedio W

γ`

= ( ) ( )γ

γ`

.

. / .. . /

D

H H

KN m mm KN mW0 36

7 7 6 00 36 9 15 101 2

3

3−=

×− ×

= 1.7

6.5. Utilização de filtros para aumentar os coeficientes de segurança à instabilidade de origem hidráulica

Os coeficientes de segurança mínimos mencionados na bibliografia da especialidade para o piping e a rotura hidráulica são muito variáveis. No entanto, face à importância das incertezas inerentes a este tipo de análise, é prática corrente exigir que os coeficientes de segurança sejam, no mínimo, da ordem de 4 a 5.

Uma forma de aumentar o coeficiente de segurança relativamente aos fenómenos de piping e de rotura hidráulica consiste em colocar um filtro sobre a massa de solo potencialmente instável.

Em regra, os filtros devem desempenhar duas funções: a) impedir o transporte (erosão) das partículas sólidas pelas água; b) exercer um peso adicional sobre o solo a proteger, de forma a aumentar a tensão efectiva em profundidade.

Para cumprirem estas duas funções de forma adequada, os filtros a aplicar devem apresentar uma determinada granulometria, da qual resulte um material com vazios de pequeno diâmetro, que impeça a erosão do solo a proteger e, por outro lado, que ofereça uma reduzida resistência à percolação.

No exemplo representado Figura 4.23, foi colocado um filtro sobre a superfície do terreno do lado de jusante da cortina, o qual tem uma espessura D1.

O peso específico submerso do solo e do filtro na zona susceptível à rotura hidráulica, por unidade de comprimento de cortina, é igual a W` + W`F.

( ) `2

D2D

D`W2

Wsat γ=γ−γ��

���

�= (4.124)

F1

F1F `2DD

`2D

D`W γ=γ��

���

�= (4.125)

em que γ`F = peso específico submerso do filtro (KN/m3).

A força vertical ascendente, causada pela percolação através do mesmo volume de solo,

é dada por: FP = D ��

���

2D

imédio γW (4.126)

Page 40: Fluxo Nos Solos

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4. 40

Figura 4.23 - Coeficiente de segurança à rotura hidráulica (fluidificação), quando se utiliza um filtro como sobrecarga

Então, o coeficiente de segurança à rotura hidráulica é dado por:

Wmedio

F1

Wmedio

2

F1

2

P

Fi

`DD

`

i2

D

`2DD

`2

D

F`W`W

FSγ

�

���

�+γ=

γ

γ+γ=+= (4.127)

6.6. Critérios para a selecção de filtros

A importância dos filtros em obras geotécnicas é enorme, nomeadamente em barragens de aterro, estando provado que a maior parte dos problemas que têm ocorrido neste tipo de obras não teriam existido se estas tivessem sido dotadas de sistemas de filtros criteriosamente dimensionados e construídos.

O estudo dos filtros e a seu dimensionamento, constitui um tema muito vasto, que ultrapassa o âmbito da disciplina de Mecânica dos Solos leccionada na EST/UAlg, pelo que a abordagem seguinte deve ser encarada como meramente introdutória.

Tendo em conta que é necessário proteger os solos sujeitos a percolação, o material filtro a utilizar deve ser cuidadosamente seleccionado. Nos critérios de selecção de filtros o solo a proteger é designado por material de base. Para a selecção dos materiais a aplicar em filtros, Terzaghi e Peck (1948) segurem os seguintes critérios:

D

Fp = i γw V

D1

D

D1

W`

W´F

Filtro

(a)

(b)

Page 41: Fluxo Nos Solos

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4. 41

1 - D

DF

B

15

854

( )

( )< (4.128)

2 - 4D

D

)B(15

)F(15 > (4.129)

em que D15(F) e D15(B) = diâmetros do filtro e do material de base correspondentes a 15% de passados (relativamente ao seu peso total);

D85(B) = diâmetro do material de base correspondente a 85% de passados.

O 1º critério previne o transporte de partículas sólidas do material de base através do filtro, isto é, minimiza a erosão interna do material de base, enquanto que o 2º critério garante que o filtro possui um permeabilidade elevada, de forma que os gradientes hidráulicos no filtro sejam desprezáveis.

A aplicação destes critérios pode ser exemplificada através da Figura 4.24, em que a curva a representa a curva granulométrica do material de base. De acordo com o 1º critério, D15(F)<4D85(B), a abcissa do ponto A é D85(B). Então, pode-se calcular o valor de 4D85(B) e a abcissa do ponto B é 4D85(B). De forma similar, para o 2º critério, D15(F)>D15(B), as abcissas dos pontos C e D são D15(B) e 4D15(B), respectivamente. As curvas granulométricas c e b são traçadas com uma geometria similar à curva a, tendo como limites os pontos B e D.

Um solo cuja granulometria caia dentro do fuso granulométrico limitado pelas curvas c e b, é considerado um material adequado para utilizar como filtro.

Importa referir que se podem encontrar na bibliografia da especialidade muitos outros critérios para o dimensionamento de filtros, os quais têm por base resultados de experiências laboratoriais.

Nos últimos anos têm vindo a ser aplicados de forma crescente filtros de materiais sintéticos (geotêxteis) em obras geotécnicas. Os filtros sintéticos, tal como os filtros naturais, são seleccionados em função da granulometria do solo de base a proteger, constando dos respectivos documentos de homologação o fuso granulométrico para o qual são adequados.

Quando um geotêxtil desempenha a função de filtro, deve permitir o escoamento de fluídos perpendicularmente ao seu plano sem aumentar as pressões neutras (ter uma adequada permissividade), evitando em simultâneo o arrastamento de partículas sólidas (ter uma adequada distribuição e diâmetro dos poros).

Page 42: Fluxo Nos Solos

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4. 42

Figura 4.24 - Critérios para a selecção de filtros (Das, 1985).

6.7. Condições de fronteira em barragens de aterro

Em escoamentos planos em meios porosos é frequente encontrar apenas quatro tipos de fronteiras (vd. Figura 4.25):

Figura 4.25 - Percolação através de uma barragem de aterro homogénea

a) Fronteira impermeável (A - E). Neste tipo de fronteira o fluído não pode atravessar a fronteira (maciço impermeável), sendo nula a componente da velocidade normal à fronteira. Não há fluxo na direcção perpendicular ao estrato impermeável e ψ = constante, sendo uma linha de corrente (ou de fluxo).

b) Fronteiras submersas e permeáveis (A - B e D - E). Ao longo destas fronteiras de um aterro a distribuição das pressões pode considerar-se hidrostática. Em qualquer ponto P da fronteira a pressão da água é u = γW (H1 - Z).

A

B

CD

E H2

H1P

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4. 43

Uma vez que φ = -K H + C e que H = u

ZWγ

+ , tem-se que φ = -

K ( Zu

W+

γ) + C =

( )−

−+

���

+KH Z

Z CW

W

γγ

1 = -KH1 + C. (4.130)

Como K, H1 e C são constantes, resulta φ = constante e, portanto, a fronteira A - B é uma linha equipotencial, o mesmo se passando com a fronteira D - E.

c) Superfície de ressurgência (C - D). Esta superfície representa a fronteira onde o fluído deixa de percolar através do aterro e sai para uma superfície onde não existe nem solo nem água. Como a pressão nessa superfície é constante e atmosférica e como a superfície não é uma equipotencial nem uma linha de fluxo, tem-se:

φ = -K H + C = - K (u

ZWγ

+ ) + C = - KZ + C (4.131)

Logo φ + K Z = constante. Se ∆φ = constante, as linhas equipotenciais encontram esta superfície a intervalos constantes.

d) Superfície livre do fluxo ou linha de saturação (B - C). A linha de saturação delimita a superfície superior do fluxo através do solo. Esta linha separa a região saturada, ao longo da qual ocorre fluxo, da região do meio poroso ao longo da qual não existe fluxo. Para além da condição da linha de saturação ser uma linha de fluxo (ψ = constante), a pressão neutra ao longo dela é constante e igual à pressão atmosférica (u = 0). Assim, tal como na superfície de ressurgência φ + K Z = constante, isto é, o potencial varia linearmente com a carga. Logo, exige intersecções constantes verticais (∆Z = constante) nos pontos de intersecção da linha de saturação com sucessivas linhas equipotenciais de intervalos(∆φ = -K∆Z) de variação iguais (vd. Figura 4.26).

Figura 4.26 - Intersecções constantes verticais nos pontos de intersecção da linha de saturação com sucessivas linhas equipotenciais de intervalos de variação iguais (Das, 1985)

NC = 2.3 ND = 10

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4. 44

6.8. Cálculo do caudal de percolação através de barragens de terra homogéneas

Foram propostas por diversos autores soluções para o cálculo do caudal de percolação através de barragens de terra homogéneas, sob uma fundação impermeável. Nesta secção são apresentadas algumas dessas soluções.

Solução de Dupuit

A Figura 4.27 representa o perfil de uma barragem de terra homogénea em que a linha ab traduz a superfície freática, isto é, traduz a linha de fluxo superior que delimita a zona saturada do aterro. De acordo com a lei de Darcy, o caudal de percolação por unidade de comprimento (perpendicular à secção da barragem) é dado por q = K i A.

Figura 4.27 - Solução de Dupuit para o fluxo através de uma barragem de terra homogénea

Para o cálculo do caudal de percolação, a solução de Dupuit (1863) assume que:

- a localização do ponto de saída da água (b - intersecção da superfície livre com a face do talude) coincide com o nível de água H2;

- o gradiente hidráulico é constante ao longo de uma linha vertical (isto é, é independente do caudal), o que é verdade se o fluxo for praticamente horizontal;

- o gradiente hidráulico idzdx

=���

��� é praticamente igual à inclinação da

superfície livre (vd. Figura 4.28).

H2

H1

dxdy

a

b

z

x

Linha de saturação

d

z

Page 45: Fluxo Nos Solos

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4. 45

Figura 4.28 - Gradiente hidráulico segundo a solução de Dupuit

As hipóteses assumidas por Dupuit alteram as equações que regem o fluxo bidireccional num meio poroso. Uma vez que o gradiente hidráulico é constante ao longo de uma

linha vertical, dHdz

= 0 e qz = 0 (vd. Figura 4.29).

Figura 4.29 - Hipótese de Dupuit, dHdz

= 0 e qz = 0

Assume-se que i = dHdx

e que H = espessura da zona saturada.

Então, qAfluxo = qInfluxo + ∂∂qx

dx

Como qAfluxo = qInfluxo � qInfluxo - qAfluxo = ∂∂qx

dx

β dx

dH=dz dL

i = dzdx

dHdx

= = tag β

H

qx

dx

x

z Linha de saturação

Page 46: Fluxo Nos Solos

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4. 46

Logo ∂∂qx

dx = 0

( )∂∂

∂∂

qx x

Ki A= = 0

∂∂

∂∂

∂∂

qx x

KHx

H m= ���

��� =10 0.

HHx

Hx

∂∂

∂∂

= =12

02

∂∂

∂∂

∂∂

qx x

KHx

=�

��

�� =

12

02

∂∂

∂∂

qx

KHx

= =12

02 2

2

∂∂

2 2

2 0Hx

= (Equação de Dupuit - Forchheimer)

Por dupla integração:

H2 = C1 x + C2

Para as condições de fronteira:

- x = 0; H = H2 � H22 = C2

- x = d; H = H1 � H21 = C1 d + C2

Então H21 = C1 d + H2

2 � CH H

d1

21

22=

Substituindo C1 e C2:

H2 = H H

d

21

22−

+ H22

H =H H

dH

21

22 2

2−

+

Calculando o caudal de percolação q, tem-se:

Page 47: Fluxo Nos Solos

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4. 47

q = K i A e i = ∂∂Hx

de H2 = H H

d

21

22−

+ H22, vem

( )2

21

22

HHx

H H

d∂∂

=−

( )∂∂Hx

H H

Hd=

−21

22

2

q = K ( )H H

Hd

21

22

2

−(H × 1.0 m)

q = K ( )H H

d

21

22

2

ou seja,

q = K [ ]dzdx

z m× 10. = K dzdx

z

q dx K z dzd

H

H

0 1

2

� �=

q d = ( )KH H

22

12

2−

q = ( )Kd

H H2

21

22−

Esta equação representa uma superfície de saturação (superfície livre) parabólica. No entanto, na derivação da equação não foram tidas em conta as condições de entrada e saída da água. Note-se que quando H2 = 0 a superfície de saturação pode intersectar a superfície impermeável.

Solução de Schaffernak

Para o cálculo do caudal de percolação através de barragens de terra homogéneas, Schaffernak (1917) propôs que a superfície freática seja igual à linha ab representada na Figura 4.30, em que esta intersecta a face do talude de jusante da barragem à distância l da base impermeável.

Page 48: Fluxo Nos Solos

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4. 48

Figura 4.30 - Solução de Schaffernak para o fluxo através de uma barragem de terra homogénea

O caudal de percolação por unidade de comprimento pode, então, ser calculado considerando o triângulo bcd representado na Figura 4.30, em que

q = k i A e A = ( )bd m l sen× =10. β

De acordo com o pressuposto por Dupuit, o gradiente hidráulico é dado por

idzdx

tg= = β .

Então, q = K dzdx

z = K (tg β) (l sen β)

( )( )z dz tg l sen dxl sen

H

l

d

β ββ β� �=

cos

( ) ( )[ ]l sen

H

ldz

tg l sen xβ

ββ β2

2

��

= cos

( ) ( )( )( )12

2 2 2H l sen tg lsen d l− = −β β β βcos

( ) ( )12

2 2 22

H l sen lsen

d l− = −βββ

βcos

cos

( ) ( )12 2

2 2 2 2coscos

ββ

β βsen

H l sen dl l− = −

H1

dxdy

a

b

z

x

Linha de saturação

parabólica

d

cd

l

Fundação impermeável

Page 49: Fluxo Nos Solos

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4. 49

Hsen

ldl l

2

2

22

2 2cos cos

cosββ

ββ− = −

Hsen

ldl

2

2

2

2 20

cos cosββ

β+ − =

l dlHsen

22

22 0coscos

ββ

β− + = (polinómio de 2º grau)

l

d dHsen

=− − ± − −

��( ) ( ) cos

cos

cos

2 2 4

2

22

2ββ

ββ

ld

dHsen

= ±−

cos

cos

cosβ

ββ

β

44

4

22 2

2

2

ld d H

sen= − −

cos cosβ β β

2

2

2

2

Sendo o valor de l conhecido, o caudal de percolação pode ser calculado através da equação q = K (tg β) (l sen β).

Para determinar o de l, Scheffarnak sugeriu o procedimento gráfico representado na Figura 4.31, que tem por base os seguintes passos:

1. Prolongar a linha dc do talude de jusante;

2. Traçar a linha vertical ae, passando pelo ponto a. Esta, intersecta o prolongamento da linha dc no ponto f;

3. Com centro em e e raio fc, traçar o semicírculo fhc;

4. Traçar a linha horizontal ag;

5. Com centro em c e raio cg, traçar o arco de círculo gh;

6. Com centro em f e raio fh, traçar o arco de círculo hb;

7. O comprimento bc é igual a l.

Page 50: Fluxo Nos Solos

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4. 50

Figura 4.31 - Construção gráfica para a solução de Schaffernak

Casagrande (1937) demonstrou que a parábola ab representada na Figura 4.30 deve começar no ponto a`, conforme se representa na Figura 4.32, em que aa` .= 0 3∆ . Então,

com esta modificação, o valor de d utilizado na equação ld d H

sen= − −

cos cosβ β β

2

2

2

2

deve ser igual à distância horizontal entre os pontos a` e c.

Figura 4.32 - Distância d modificada para a utilização da equação

ld d H

sen= − −

cos cosβ β β

2

2

2

2

Solução de Casagrande

Page 51: Fluxo Nos Solos

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4. 51

A equação ld d H

sen= − −

cos cosβ β β

2

2

2

2 foi obtida com base no pressuposto por Dupuit,

em que o gradiente hidráulico i é igual a dzdx

. Casagrande (1932) sugere que esta relação

é apenas uma aproximação da realidade, uma vez que idzds

= (vd. Figura 4.33). Quando

o ângulo do talude de jusante (β) é superior a 30º, os desvios em resultado do assumido por Dupuit tornam-se mais significativos (vd. Quadro 4.2).

Figura 4.33 - Solução de Casagrande para o fluxo através de uma barragem de terra

Quadro 4.2 - Comparação entre os gradientes hidráulicos assumidos por Casagrande e por Dupuit, respectivamente.

β dx

dH=dz dL = ds

i = dzdL

dHds

= = sen β

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4. 52

β (graus) i = dzds

sen= β i = dzdx

tag= β

0º 0 0 5º 0.087 0.087

10º 0.174 0.176 20º 0.342 0.346 30º 0.500 0.577 40º 0.643 0.839 50º 0.766 1.192

O caudal de percolação é igual a q = K i A e assume-se que idzds

= . Considerando o

triângulo bcd representado na Figura 4.33, tem-se:

idzds

sen= = β e A = (bd) × (1.0 m) = l sen β.

Então, q = K dzds

z = Kl sen2 β

( )z dz l sen dsl senH

ls

β β� = � 2 (o comprimento da curva a`bc = s)

( )[ ]l sen

H

lsz l sen s

ββ

12

2 2�

��=

( ) ( )( )12

2 2 2 2H l sen l sen s l− = −β β

H2 - l2 sen2 β = 2ls sen2 β - 2l2 sen2 β

H2 + l2 sen2 β -2ls sen2 β = 0

l slH

sen2

2

22 0− + =β

A solução desta equação é l s sH

sen= − −2

2

2 β

Com um erro de 4 a 5%, pode-se assumir que s tem o comprimento a`c, em linha recta.

Então, s = d H2 2+ , pelo que

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4. 53

l d H d HH

senl d H d H

sensen

= + − + − � = + − +−�

��

��2 2 2 2

2

22 2 2 2

2

2

ββ

� = + − −l d H d H2 2 2 2 2cot β

A determinação da localização do ponto onde a linha de saturação atinge a face do talude de jusante, pode ser feita através do ábaco de Gilboy (1934), que evita a

aproximação introduzida pela equação s = d H2 2+ . O ábaco é utilizado da forma seguinte (vd. Figura 4.34):

1 - Determinar dH

;

2 - Determinar o valor de m em função de dH

e β;

3 - Calcular m Hsen β

;

4 - Calcular q = K l

sen2 β;

6.9. Traçado da linha de saturação para a percolação através de uma barragem de terra homogénea

Para a construção de redes de fluxo representativas da percolação de água através de barragens de terra, é necessário começar por estabelecer a linha de saturação. O traçado aproximado da linha de saturação é, normalmente, feito pelo método proposto por Casagrande (1937), que se apresenta na Figura 4.35-a.

Na Figura 4.35-a, a linha aefb representa a linha de saturação (superfície freática). A curva a`efb`c` é uma parábola com foco em c (no pé do talude de jusante), em que a linha de saturação coincide com esta parábola, apenas apresentando alguns desvios nas faces de montante e de jusante dos taludes da barragem. No ponto a, a linha de saturação começa por fazer um ângulo de 90º com a face de montante da barragem e aa` = 0.3∆.

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4. 54

Figura 4.34 - Ábaco para a solução de Casagrande, com base no método de Gilboy (1934)

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4. 55

Figura 4.35 - Determinação da linha de saturação numa barragem de terra homogénea

A parábola a`efb`c` pode ser construída do seguinte modo:

1. A distância cc` deve ser igual a p. Então, relativamente à Figura 4.35b, Ac = AD

(com base nas propriedades da parábola), em que Ac = x z2 2+ e AD = 2p + x.

Para x = d e z = H, tem-se

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4. 56

x z2 2+ = 2p + x � p = ( )12

2 2d H d+ −

Conhecendo d e H, o valor de p pode ser calculado.

2. Da equação x z2 2+ = 2p + x, resulta

x2 + z2 = 4p2 + x2 + 4px

xz p

p=

−2 244

Conhecendo p, os valores de x correspondentes aos vários valores de z

podem ser calculados através da equação xz p

p=

−2 244

, construindo-se assim

a parábola.

Para completar a linha de saturação, o troço ae pode ser traçado à mão, de forma aproximada. Quando β<30º, o valor de l pode ser calculado pela equação

ld d H

sen= − −

cos cosβ β β

2

2

2

2 .

Na Figura 4.35a l é igual a bc. Uma vez localizado o ponto b, a curva fb pode ser traçada à mão.

Se β≥30º, Casagrande propõe que o valor de l seja determinado através do gráfico apresentado na Figura 4.36, em que bb` = ∆l e bc = l. Após a localização do ponto b na face do talude de jusante, a curva fb pode ser traçada à mão.

Figura 4.36 - Localização de ∆

∆l

l l+ para um dado ângulo (β) do talude de jusante

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4. 57

NOTA: No caso de barragens de terra homogéneas com tapete drenante, sobre uma fundação impermeável, a linha de saturação corresponde, aproximadamente, a uma parábola com foco no início do tapete drenante. O traçado da parábola é

igual ao atrás exposto, tendo por equação xz p

p=

−2 244

.

Exemplo

A Figura 4.37 representa a secção de uma barragem de terra homogénea, em que Kx = Kz. Pretende-se traçar a linha de saturação correspondente à percolação da água através desta secção da barragem.

Figura 4.37 - Exemplo de aplicação do traçado da linha de saturação numa barragem de terra homogénea.

Resolução:

tg β = 1

15.� β = arc tg

115

3369.

. º���

��� =

∆ = 21.3 m cot 45º = 21.3 m

aa` = 0.3 ∆ = 0.3 (21.3) = 6.39 m

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4. 58

d = (21.3 + 3.0) cot 33.69º + 4.6 m +3.0 cot 45º + 6.39 = 50.44 m

p = ( )12

2 2d H d+ − = 12

50 44 213 50 44 2162 2. . . .+ − = m

Utilizando a equação xz p

p=

−2 244

determinam-se as coordenadas de vários pontos da

parábola a`efb`c`:

z (m) x (m)

21.3 50.35 20 44.14 18 35.34 16 27.47 15 23.9

Utilizando os valores de x e de z correspondentes, calculados no quadro anterior, traça-se a parábola de base (vd. Figura 4.37).

A equação da linha cb` é dada pela equação z = x tg β e a equação da parábola é

xz p

p=

−2 244

. As coordenadas do ponto b` podem ser determinadas através da

resolução das duas equações anteriores.

( )x

z pp

x tg pp

=−

=−2 2 2 24

44

4px - x2 tg2 β + 4p2 = 0

Então, 4 (2.16) x - x2 tg2 33.69 + 4 (2.16)2 = 0

0.444 x2 - 8.64 x - 18.66 = 0

x =± − − × −

×=

±×

8 64 8 64 4 0 444 18 662 0 444

8 64 10 3822 0 444

2. ( . ) ( . ( . )).

. ..

A solução da equação dá x = 21.42 m.

cb` = ( )2142 214 33692 2 2. . .+ tg = 25.74 m = l + ∆l

A partir do gráfico de Casagrande, para β = 33.69º, tem-se ∆

∆l

l l+= 0 366.

∆l = (0.366) × 25.74 m = 9.42 m

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4. 59

∆l = (l + ∆l) - ∆l = 25.74 m - 9.42 m = 16.32 m

Logo l = cb = 16.32 m

Os troços de curva ae e fb podem ser traçados à mão de forma aproximada, completando, assim, a linha de saturação aefb.

6.10. Casos singulares da rede de fluxo

No fluxo com superfície livre, quando a permeabilidade de dois meios adjacentes é muito diferente, ocorre uma deformação da rede de fluxo na interface (fronteira) dos dois materiais.

Casagrande (1937) analisou as condições de entrada, saída e de fronteira para linhas de fluxo através de barragens de terra. Quando o fluxo passa de um material de drenagem livre (coeficiente de permeabilidade muito elevada, K2 ≈ ∞) para um material de permeabilidade k1, tal é designado por entrada. De forma similar, quando o fluxo passa de um material de permeabilidade K1 para um material de drenagem livre (K2), tal é designado por descarga. As condições de fronteira mostram a natureza da deflexão da linha de percolação quando o fluxo passa de um material de permeabilidade k1 para um material de permeabilidade K2.

Na Figura 4.38 apresentam-se diversas situações de condições de entrada, saída e de fronteira de linhas de percolação de uma rede de fluxo (Casagrande 1937).

Sempre que na região percolada existe mais do que um meio com características de permeabilidade diferente, há que ter em conta o que se passa na fronteira entre esses meios. As linhas de fluxo que atingem a fronteira através de um dos meios e que dela se afastam já inseridas no outro meio, obedecem a uma lei semelhante à da incidência e refracção em óptica, em que o caudal percolado através do espaço definido por duas linhas de fluxo adjacentes é o mesmo dos dois lados da fronteira.

Na Figura 4.39, a rede de fluxo do lado esquerdo da fronteira foi traçada formando elementos quadrados. Designando por ∆H a perda de carga entre duas equipotenciais consecutivas, obtém-se a seguinte relação:

∆q = KHa

a KHb

c1 2∆ ∆

= ou KK

cb

1

2=

Para os triângulos DGK e DG1J, tem-se:

DGa

senc

sen1 = =α β

, então c = asensen

βα

DG2 = a b

cos cosα β= , então b = a

coscos

βα

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4. 60

Pelo que cb

sensen

tagtagtag

= = =βα

αβ

β αβα

coscos

cot

Logo KK

tagtag

1

2=

βα

Assim, a refracção ocorre de forma que a tangente dos ângulos de intersecção das linhas de fluxo com a fronteira é inversamente proporcional aos coeficiente de permeabilidade.

Figura 4.38 - Casos singulares de redes de fluxo

As relações anteriores mostram que quando o fluxo passa de um solo de baixa permeabilidade para um de alta permeabilidade, há um alongamento dos elementos da rede, pois, é necessário uma área e um gradiente hidráulico menor para “acomodar” o mesmo caudal. Se o fluxo passa de um solo de alta permeabilidade para um solo de baixa permeabilidade, aumenta o espaçamento entre as linhas de fluxo e diminui o espaçamento entre equipotenciais, uma vez que são necessários gradientes hidráulicos elevados e uma área relativamente maior para “acomodar” o mesmo caudal (vd. Figura 4.40).

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4. 61

Figura 4.39 – Refracção de linhas de fluxo

Figura 4.40 - Condições de fronteira entre solos de diferente permeabilidade (Casagrande, 1937)