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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BRASÍLIA – UNICEUB FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE – FACS CURSO: ENFERMAGEM
Kátia Regina de Almeida
HOSPITAL JUSCELINO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA (HJKO): Resgate da História da Enfermagem no Distrito Federal
Brasília, DF Novembro/2007
É concedida ao Centro Universitário de Brasília (UNICEUB) permissão para reproduzir cópias somente para propósitos acadêmicos e científicos. A autora reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta monografia pode ser reproduzida sem autorização por escrito da mesma.
_________________________________
Kátia Regina de Almeida
Kátia Regina de Almeida
Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentada como requisito parcial para a conclusão do 8º semestre do Curso de Enfermagem do Centro Universitário de Brasília UniCEUB.Orientadora: Prof. Nílvia Jaqueline Reis Linhares.
Brasília, DF Novembro/2007
Kátia Regina de Almeida
Brasília, 1 de novembro de 2007
Nome: Professora MSc. Nílvia Jaqueline Reis Linhares Coordenadora do Curso
Instituição: Centro Universitário de Brasília (UNICEUB)
------------------------------------------------------- Assinatura
Professora de Monografia Instituição: Centro Universitário de Brasília (UNICEUB)
-------------------------------------------------------
Assinatura
Professora do Curso de Enfermagem Instituição: Centro Universitário de Brasília (UNICEUB)
------------------------------------------------------- Assinatura
Dedicatória
Dedico a realização deste trabalho Ao meu esposo Lenilson Marcelo pelo
apoio e compreensão; a minha filha Karol, que mesmo na
adolescência entendeu e compreendeu minha ausência;
a professora Ana Luiza Montalvão
Maia a intensa colaboração que me dispensou no decorrer do trabalho.
a todos me assistiram eu crescer com
essa graduação.
Agradecimentos
Agradeço a realização desta pesquisa em primeiro lugar a “DEUS”.
a minha Mãe Rita Maria Paz de Almeida, que com o seu exemplo me incentivou a “correr” atrás de meus sonhos;
a minha orientadora Nílvia Jaqueline Reis Linhares pela paciência e intensa colaboração que me dispensou no decorrer do trabalho.
ao professor Marcus Maciel pelo empréstimo de livros e cessão de material fotográfico e seu rico acervo; aos demais Professores que na minha companhia estiveram nessa caminhada do saber. a Dra Simone Carvalho Roza, do Posto de Medicina do Trabalho do Uniceub, pois sem seu apoio não chegaria aqui; aos muitos amigos que conquistei e aos já existentes pela força na idealização deste importante passo.
Lista de Figuras Figura 1 – Fachada do Conjunto tombado do HJKO. Pág.12
Figura 2 – “Pau de Arara” trazia os milhares de candangos. Pág.16
Figura 3 – Obras da construção do HJKO em maio 1957. Pág.17
Figura 4 – Placa de inauguração do HJKO. Pág.19
Figura 5 – O HJKO em agosto de 1957. Pág.20
Figura 6 – Exemplo de um consultório Médico do HJKO. Pág.21
Figura 7 – Fac símile de um Relatório do Dr.Florentino Pág.24
Figura 8 – Cacilda Rosa Bertoni, a primeira enfermeira de Brasília. Pág.25
Figura 9 – Cacilda Rosa Bertoni, ao completar 80 anos em 2006. Pág.29
Figura 10 – Dr.Edson Porto, à esquerda o primeiro Diretor do HJKO. Pág.30
Figura 11 – Conjunto HJKO tombado e restaurado. Pág.34
Lista de Siglas
DePHA/DF Departamento de Patrimônio Histórico e Artístico do Distrito Federal
DSN Departamento de Saúde da Novacap
GDF Governo do Distrito Federal
HJKO Hospital Juscelino Kubitschek de Oliveira
IAPAS Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social
IAPI Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários
JK Juscelino Kubitschek de Oliveira
Novacap Companhia Urbanizadora da Nova Capital
Resumo
Este trabalho pretende reconstituir parte da história de Brasília sob a ótica dos pioneiros e pioneiras da enfermagem no Distrito Federal, especialmente à época da construção da capital federal, buscando resgatar eventos relevantes para a constituição da memória de Brasília e da Enfermagem no DF, conhecendo a atuação das enfermeiras pioneiras nos atendimentos de saúde, nos acampamentos das construtoras responsáveis pela construção da nova capital, destacando o trabalho da Enfermagem no Hospital Juscelino Kubitschek de Oliveira (HJKO), desde a sua abertura. Esse estudo tem como metodologia a pesquisa de campo, com abordagem qualitativa, na massa documental do HJKO, no acervo do Arquivo Público do DF, por meio de revisão bibliográfica em livros, jornais e documentos da época. Desse modo, diante desse breve resgate, percebeu-se que é necessário incentivar a preservação da memória recente de eventos marcantes da história de Brasília, bem como a memória da Enfermagem no Distrito Federal. Palavras-chave: Enfermagem – Saúde – Brasília – HJKO
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................. 11
2 OBJETIVOS .................................................................................. 13
2.1 Geral:....................................................................................... 13
2.2 Específicos: ............................................................................. 13
3 METODOLOGIA ........................................................................... 14
4 RESGATANDO A HISTÓRIA ....................................................... 15
Capítulo I ....................................................................................... 15
Um Pouco de História ................................................................... 15
Capítulo II ...................................................................................... 18
O Primeiro Hospital: HJKO ........................................................... 18
Capítulo III ..................................................................................... 25
A Primeira Profissional de Enfermagem ....................................... 25
Capítulo IV .................................................................................... 30
O Primeiro Médico e Diretor do HJKO.......................................... 30
Capítulo V...................................................................................... 32
Tombamento e Restauração do HJKO......................................... 32
5 DIFICULDADORES DA PESQUISA ............................................ 37
6 CONCLUSÃO ............................................................................... 39
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................ 41
11
INTRODUÇÃO
Na ótica de Holston (1993, p.23), os visionários que sonharam com a
mudança da capital "deixaram a Brasília o legado de uma mitologia do Novo
Mundo em que a construção de uma capital no Planalto Central seria o meio de
desencadear o florescimento de uma grande civilização num paraíso de
abundância".
Desse modo, o projeto de Brasília deveria "exprimir a grandeza da
vontade nacional", conforme assinalava o relatório do júri do concurso. Brasília
"devia instituir um novo sistema de vida" e constituir uma mensagem capaz,
entre outras coisas, "de comunicar ideais de vida democrática" e "de auto-
identificação triunfal de um país jovem", como observou Umberto Eco (2001, p.
244), em seu livro A estrutura ausente, originalmente publicado em 1968.
Segundo a wikipedia (2007), enquanto o HJKO era construído,
funcionava no local um posto médico avançado do Hospital Rossi de Goiânia.
No hospital, que chegou a ter 200 leitos, eram atendidos desde casos simples,
como controle da febre amarela (doença endêmica desta região), até
intervenções cirúrgicas. O HJKO dispunha também de maternidade, onde
foram realizados muitos partos durante o período da construção.
Inaugurado em 1957 o Hospital Juscelino Kubitschek de Oliveira, HJKO,
foi o primeiro hospital de Brasília. Sua história se vincula à construção de
Brasília e a toda a modernidade pretendida nesta proposta. Construído para
ser um hospital provisório o HJKO se inseria na fórmula máxima dos primeiros
anos, ou anos de construção, de Brasília: no momento em que o definitivo
estiver pronto desmancha-se o provisório. (PIRAJÁ, 1998)
12
Após a inauguração da cidade, a utopia de Brasília começava a se
confrontar com a Brasília real. Diz uma das principais estudiosas de Brasília, a
socióloga Bárbara Freitag (2003, p.75), que aquela cidade "recebeu em seu
espaço urbano todos os problemas da sociedade brasileira sem correções
prévias. Não é de admirar", ela acrescenta, "que neste verdadeiro laboratório
social vejamos a olho nu e convivamos de forma mais direta com os problemas
globais da sociedade brasileira como um todo".
Figura 1 – Fachada do Conjunto tombado do HJKO
Fonte: Acervo do Professor Marcus Maciel 1
De acordo com Cardoso (1978, p.94): "Juscelino desenvolveu a
ideologia do desenvolvimento", em outras palavras, o desenvolvimento servia
como pressuposto para a dominação de classe. O planejamento do plano de
metas trouxe para o presidente uma base política, tanto no mercado financeiro
quanto nas camadas populares.
Ainda nessa perspectiva, o princípio da assistência em saúde na futura
capital iniciou-se com a construção do Hospital Juscelino Kubitschek de
Oliveira (HJKO) inaugurado em Julho de 1957, além de serviços de assistência
domiciliar que já eram prestados por enfermeiras e um Centro de Saúde,
posteriormente inaugurado em Setembro de 1959.
1 Marcus Maciel é Professor, Historiador, Geógrafo e estudioso da História de Brasília.
13
É nesse sentido que este trabalho pretende reconstituir parte da História
de Brasília sob a ótica dos Pioneiros da Enfermagem no Distrito Federal,
especialmente à época da construção de Capital Federal, buscando resgatar
eventos relevantes para a constituição da memória de Brasília e da
Enfermagem no DF.
2 OBJETIVOS
2.1 Geral:
Resgatar a história recente das enfermeiras pioneiras e da Enfermagem
no Distrito Federal.
2.2 Específicos:
Levantar a atuação das enfermeiras pioneiras nos atendimentos de
saúde da Novacap desde a construção do Distrito Federal;
Destacar o trabalho da Enfermagem no Hospital Juscelino Kubitschek de
Oliveira (HJKO), desde a sua abertura;
14
3 METODOLOGIA
Este trabalho teve como método a Pesquisa bibliográfica, com
abordagem qualitativa, na massa documental do HJKO, no acervo do Arquivo
Público do DF, realizou-se uma pesquisa bibliográfica através de livros, jornais
e documentos da época, que possibilitem analisar o contexto histórico.
Num segundo momento, foi colhida a história das enfermeiras e de
médicos que trabalharam no primeiro hospital de Brasília (HJKO).
Além disso, procedeu-se a verificação da existência de Médicos,
Enfermeiros, Técnicos e Auxiliares de Enfermagem, ainda vivos que pudessem
prestar depoimentos, buscando destacar o trabalho dos pioneiros da
enfermagem no Distrito Federal bem como a relevância de seu papel para
primeiros habitantes, resgatando acontecimentos e eventos que remontam à
memória tanto do HJKO como da História de Brasília.
15
4 RESGATANDO A HISTÓRIA
Capítulo I Um Pouco de História
Já por volta de 1761, segundo dados de Brasil Turismo (2007), o
Marquês de Pombal propunha mudar a capital do império português para o
interior do Brasil Colônia. Desde a primeira constituição republicana, de 1891,
constava um dispositivo que previa a mudança da Capital Federal do Rio de
Janeiro para o interior do país, determinando como "pertencente à União, no
Planalto Central da República, uma zona de 14,40 quilômetros quadrados, que
será oportunamente demarcada, para nela estabelecer-se a futura Capital
Federal” (BRASIL TURISMO. BRASÍLIA, 2007).
Em 1891, foi nomeada a Comissão Exploradora do Planalto Central do
Brasil, liderada pelo astrônomo Luiz Cruls e integrada por médicos, geólogos e
botânicos, que fizeram um levantamento sobre topografia, o clima, a geologia,
a flora, a fauna e os recursos materiais da região do Planalto Central. A área,
ficou conhecida como Quadrilátero Cruls e foi apresentada em 1894 ao
Governo Republicano” (BRASIL TURISMO. BRASÍLIA, 2007). .
Por sua vez José Bonifácio, o Patriarca da Independência, foi a primeira
pessoa a se referir à futura capital do Brasil, em 1823, como "Brasília"
(BRASÍLIA... EM 300 QUESTÕES, 2000).
16
Figura 2 – “Pau de Arara” trazia os milhares de candangos
Fonte: Acervo Museu Vivo da Memória Candanga
Para que Brasília fosse erguida em três anos e dez meses na imensa
solidão do descampado e do cerrado do Planalto Central, foram necessárias a
determinação política, o plano moderno, o progresso econômico e ainda a
resposta dos brasileiros que vieram das diversas regiões do país atendendo à
convocação de Juscelino Kubitschek.
E foram necessários ainda os acampamentos e vilas improvisadas para
os operários, engenheiros e profissionais que chegaram com a missão de
erguer a cidade.
Para apoiar as obras de infra-estrutura na construção do Plano Piloto,
foram abertas, em 1956, as principais avenidas do Núcleo Bandeirante, que
logo ficou conhecido como Cidade Livre, porque quem abrisse um comércio
não pagava impostos (BRASÍLIA... EM 300 QUESTÕES, 2000).
17
Figura 3 – Obras da construção do HJKO em maio 1957
Fonte: Acervo Arquivo Público do DF
Entre a Cidade Livre e a Candangolândia, surgiu o HJKO, hospital
mantido pelo IAPI, instituição cujo nome também foi dado a uma das invasões
surgidas na área logo atrás do hospital2.
O HJKO foi construído entre a Cidade Livre (Núcleo Bandeirante) e a
Vila Operária (Candangolândia), locais habitados pelos pioneiros que
acreditaram no sonho de JK e transformaram o projeto da capital em realidade.
A estrutura de madeira foi erguida em 60 dias e o hospital inaugurado em julho
de 1957, com 40 leitos.
A cidade ainda era um grande canteiro de obras, havia poeira e Cerrado
por todos os lados e os pioneiros precisavam de um local no qual pudessem ter
atendimento médico. Seis meses depois da inauguração, a capacidade de
atendimento foi dobrada.
Nos últimos meses de 1956, iniciaram-se as obras de
construção da Nova Capital A afluência humana foi imediata, e
desde então tem-se avolumado em medida crescente. O local
reservado para a edificação da cidade foi praticamente
desbravado pelos "pioneiros" imigrados, que já se contavam
2 Disponível em: < http://www.sc.df.gov.br/paginas/museus/museus_02.htm>. Acesso em 01 out. 2007.
18
por mais de 6 milhares no começo do segundo semestre de
1957. A contagem promovida pelo IBGE, a 20 de julho daquele
ano, atribuiu a todo o território destinado ao futuro Distrito
Federal 12.283 habitantes, dos quais 6.000 (estimativa)
radicados nas zonas 'velhas' (zona rural e cidade de
Planaltina). Oito meses depois novo inquérito censitário
computou no território de Brasília o total de 28.804 pessoas,
inclusive parcela estimada de 4.500 na zona rural. A 17 de
maio de 1959, o novo levantamento demográfico-habitacional
obteve, pela primeira vez, resultados exatos para todo o
território da Nova Capital, onde foram recenseadas 64.314
pessoas residentes. 3 (IBGE apud PIRAJÁ, 1998)
Capítulo II O Primeiro Hospital: HJKO
Segundo Silva (1997), o primeiro hospital de Brasília foi inaugurado em 6
de julho de 1957 e foi construído de madeira devido a sua condição de hospital
provisório. Localizado entre os três principais acampamentos migratórios de
pioneiros - Cidade Livre, Lonalândia (mais tarde Candangolândia) e Invasão do
IAPI, o HJKO (as siglas, nesse e em outros casos, acabava sendo o nome de
uso mais comum entre os pioneiros) esteve em atividade até 1968.
Figura 4 – Placa de inauguração do HJKO Fonte: Acervo do Professor Marcus Maciel
3 Censo experimental de Brasília. 1959. Comissão Censitária Nacional.
19
Silva (1997) destaca o momento privilegiado em que viveu e do qual
participou ativamente, o HJKO teve uma personalidade impar. Era um hospital
por inteiro, no que se refere a ter contato com os requisitos técnicos básicos
necessários para a sua atuação. Prestou atendimento de urgência e
ambulatorial permanentemente, internando, realizando tratamento clínicos e
cirúrgicos, inclusive de casos eletivos, com complementação diagnostica, tudo
numa expectativa em torno da implantação que realizava-se no Centro Oeste
do País de um projeto carregado de fortes e velhos anseios de muitos.
Construído em apenas 60 dias e inaugurado em 06 de junho de 1957, o
Hospital Juscelino Kubitschek de Oliveira foi o primeiro hospital a funcionar na
cidade. Coube ao IAPI – Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Industriários,
ligado ao DSN, a construção do HJKO.
Figura 5 O HJKO em agosto de 1957 Fonte: Acervo Arquivo Público do DF
Órgão de assistência médico-hospitalar do IAPI (Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Industriários) no Distrito Federal, inicialmente,
prestou serviços aos trabalhadores da construção civil.
20
O atendimento em saúde na Novacap dividia-se em não-institucional
(assistência prestada nos acampamentos) e institucional (desenvolvido pelo
Departamento de Saúde da Novacap – DSN).
Sendo assim, diversas profissionais de enfermagem, naturais de várias
regiões do País, destacaram-se neste contexto em ambos os atendimentos,
como Cacilda Bertoni e Luzia Farias (realizavam partos domiciliares), Martha
Margarette, Rosa Irene e Edna Chavier (trabalharam no HJKO), além de muitas
outras.
Seus 1.265 m2 de área edificada em madeira abrigavam ambulatório,
centro cirúrgico, serviços gerais, administração, residência para médicos e
funcionários com famílias e alojamentos.
Figura 6 Um consultório Médico do HJKO
Fonte: Acervo Particular do Professor Marcus Maciel
A parte hospitalar, que funcionava 24 horas por dia, era servida dos mais
modernos equipamentos e instrumentos da época, e continha 50 leitos; oito
enfermarias dispostas em duas alas, feminina e masculina; duas salas
cirúrgicas; aparelhos de raio-x; laboratório de análise clínica; sala de ortopedia;
maternidade; berçário; farmácia e gabinete dentário com raio-x, tendo como
21
primeiro diretor foi o médico goiano Edson Porto (BRASÍLIA...EM 300
QUESTÕES, 2000).
Conta Silva (1997) que o Serviço de Emergência, funcionava em tempo
integral, era atendido por um médico plantonista, o qual, sempre que
necessário, se socorria de quantos colegas fossem eventualmente solicitados,
sem dificuldades, uma vez que todos residiam nas dependências ou no
acampamento do próprio hospital. O ambulatório e os demais atendimentos
hospitalares funcionavam em dois turnos, sendo o de maior movimento o do
período da manhã quando, logo nas primeiras horas, os caminhões
basculantes das empreiteiras faziam a entrega de seus doentes.
Com a inauguração do Hospital Distrital, no Plano Piloto, em 1960, o
HJKO entrou em lento declínio e a partir de 1968, passou a funcionar somente
como posto de saúde atendendo aos moradores do Núcleo Bandeirante e das
invasões das áreas circunvizinhas ao hospital.
Em 1974, o HJKO foi totalmente desativado com a implantação dos
serviços de saúde no Núcleo Bandeirante4.
Contudo, permaneceram habitando a área, em situação irregular, muitos
ex-funcionários do hospital e outras famílias que foram agregando-se à
população da área, tornando-se uma das maiores invasões do DF.
Segundo Amorim &; Ricarto, (2001) em reportagem para o Correio Web,
afirmam que a origem de tudo é a carência de habitações ao redor de Brasília e
a exploração política dessa situação. E, assim, aparecem as lideranças e a
cultura da invasão. Muitas vezes, gente simples, que emerge do meio do povo
e depois se lança na política. Em outros casos, políticos que alimentam o
4 Disponível em: < http://www.sc.df.gov.br/paginas/museus/museus_02.htm>. Acesso em 01 out. 2007.
22
processo para não perder a simpatia popular e se manter no poder. Líderes de
uma verdadeira fábrica de invasões, que não se escondem e fazem
seguidores, alargando os estragos ao meio ambiente.
Segundo ainda os autores, o mapeamento das terras do Distrito Federal
revela o impacto de uma ocupação que, nos últimos 20 anos, seguiu a regra
ditada pelo invasor. Segundo a matéria, de toda a área urbana ocupada
atualmente, quase 40% é irregular. São praticamente 500 km² de terra
transformados em favelas, condomínios, assentamentos e vilas sem registro
em cartório. É mais que Taguatinga, Ceilândia e Samambaia, inteiras, na
ilegalidade (CORREIO WEB. 1º CADERNO, 2001).
Silva (1997) relata que naqueles tempos a população de Brasília era
composta, notadamente, por gente jovem, a maioria desempenhando trabalho
braçal, pelo que apresentava maior incidência de patologias próprias do grupo
etário e da atividade profissional vigentes.
Assim, era maior a casuística das doenças traumatológicas, infecciosas,
infecto-contagiosos e as venéreas pré-AIDS, hoje alçadas às sexualmente
transmissíveis. Naquela oportunidade as condições sanitárias e higiênicas dos
acampamentos, onde residia a massa trabalhadora, eram extremamente
precárias.
Suas cozinhas, refeitórios e dormitórios propiciavam constantes e sérios
casos de intoxicações alimentares agudas e disseminação das doenças
infecto-contagiosos, dentre estas ressaltando-se a tuberculose pulmonar, que
foi tratada pelo Dr. Carlos Alberto Florentino, auxiliado pelo Dr. Marcos
Snitovsky, ambos do Serviço Nacional de Tuberculose, do Ministério da Saúde.
23
O Serviço Nacional de Tuberculose instalou-se definitivamente em
Brasília, no segundo semestre de 1958, sob a direção do tisiologista Carlos
Alberto Florentino, auxiliado pelo médico Marcos Snikovsky. A tarefa constituiu
na visita a todos os canteiros de obras de Brasília usando um aparelho portátil.
Eis, em resumo, como o Dr. Florentino, em relatório de 02/02/59, define
a atividade do Serviço que dirigia:
“Após vencer as dificuldades naturais e com a cooperação
imprescindível da Novacap, e do Dr. Ernesto Silva, fora
instalado um modesto Ambulatório de Tuberculose: organismo
rudimentar, que, graças a advento dos quimo-antibióticos,
pôde, numa emergência, substituir a célula máter da luta anti-
tuberculosa, que é o dispensário. Com todas as suas
deficiências e sacrifício (naturais daquela época), o
Ambulatório vem atendendo as necessidades do cadastro
abreugráfico. No Ambulatório é feita a triagem, e elucidação
diagnostica dos portadores de sombra suspeita de lesão
pulmonar evolutiva, o tratamento e o controle da maioria dos
fimatosos, trabalho que não seria exeqüível não fôra a
permanente colaboração dos médicos do Hospital do IAPI e
dos médicos do Departamento de Saúde da Novacap.
“Com grande esforço, pelas condições existentes,
conseguimos realizar a penetração, o preparo e o fichamento
das coletividades para o senso torácico, a distribuição dos
resultados do exame abreugráfico, a chamada para reexame, a
becegeização, o controle dos focos de contágio e dos
comunicantes, as providências a serem tomadas para o retorno
dos portadores de tuberculose avançadas altamente
bacilíferas”. (o Dr. Ernesto Silva nos fornecia passagens aéreas
para transferência desses doentes e seus Estados de origem).
O Dr. Ernesto Silva (2007) em entrevista a autora deixou claro que o
laboratório, a sala de radiologia do Hospital do IAPI e todo o complexo mecanismo da
24
luta contra a “Peste Branca”, foi imprescindível, para amenizar o quantitativo de
tuberculose na cidade que acabava de nascer e crescia a passos largos.
Confirma ainda o Dr. Ernesto Silva (2007) “o pequeno Núcleo profilático e
assistencial do Serviço Nacional de Tuberculose cresceu gradativamente, até chegar a
ser, em 1960, o modelar Dispensário dinâmico da Nova Capital Federal.”
“O HJKO sem dúvidas passou a ser referência na profilaxia e controle
da Tuberculose no Centro Oeste, desde aquela época o Serviço Médico
Hospitalar de Brasília era utilizado por habitantes de cidades vizinhas oriundos
de, Goiás, Minas e Bahia”, confidenciou o Médico Pioneiro, naquela tarde que
recebeu a autora na Sede do Instituto Histórico e Geográfico de Brasília,
entidade que se orgulhava ter ajudado a fundar.
Abaixo fac símile do Relatório enviado à Novacap, pelo Dr. Florentino
que alinhavava os dados referentes ao período de 1º de novembro de 1958 a
31 de janeiro de 1959, existiram outros relatórios trimestrais, até a data de
transferência da Capital. Infelizmente esse foi o único que encontramos.
ATENDIMENTOS HJKO REFERENTE AO PERIODO DE 1º/11/1958 A 31/01/1959
1 Número de coletividade examinadas (Cias construtoras, colégios, etc)
50
2 Número de pessoas abreugrafadas 18.315 3 Número de pessoas “suspeitas” de lesão pulmonar ativa 223
4
Classificação pela extensão – Mínima 149 (NTA) – Moderada 33 Avançada 10
6 Derrame pleural 9 7 Imagem tumoral 4 8 Índice geral de suspeição 1,20% 9 Número de pessoas portadoras de alterações cárdio-vasculares 241
10 Número de pessoas vacinadas pelo BCG, na dose de 0,20, via oral
15.255
11
Suspeitos do cadastro, inscritos no Ambulatório, com diagnósticos Elucidado em tratamento e sob controle (de 18/12 a 31/01/59)
106
12 Doentes mandados pelo Hospital do IAPI 6 13 Total de pessoas fichadas no Ambulatório em 31/01/59 112
Figura 7 Fac Simile de um Relatório do Dr. Florentino. Fonte: Acervo do Arquivo Público do DF.
25
Capítulo III A Primeira Profissional de Enfermagem
Figura 8 – Cacilda Rosa Bertoni, a primeira enfermeira de Brasília.
Fonte: Acervo particular Cacilda Bertoni.
A história a seguir resgata eventos da vida profissional e pessoal da
primeira enfermeira no Distrito Federal, revelando curiosidades e fatos
pitorescos dos primeiros habitantes de Brasília e do cotidiano no HJKO:
‘‘Viver para servir’’. Antes de contar o que a trouxe ao Distrito
Federal, a paulista de Piracicaba Cacilda Rosa Bertoni faz
questão de ressaltar o lema da turma onde se formou em
enfermagem, na Escola Ana Nery (Universidade do Brasil —
Rio de Janeiro). Ajudar às pessoas fez bem para esta senhora
de 84 anos, que, em 1957, pela disposição em servir ao
próximo, se tornou a primeira enfermeira da nova capital.
A decisão do marido, Afonso Bertoni (falecido), de abandonar
tudo em Juiz de Fora (MG) e viajar para o Planalto Central a
pegou de surpresa. Com a vida estabilizada e um casal de
filhos pequenos, venderam tudo para empreender-se na
viagem. ‘‘Ele trabalhava com obras e achava que aqui teria
grandes oportunidades’’, conta Cacilda. ‘‘Eu viria primeiro para
26
arrumar um lugar para ficarmos, depois buscaria as crianças’’,
completa. Dessa forma fizeram. Cacilda chegou em dezembro
de 1957 à Cidade Livre (Núcleo Bandeirante) com o endereço
da Casa Pastoral da Igreja Metodista. Encontrado o lugar, lá
seria a moradia provisória da família. A enfermeira voltou a Juiz
de Fora e retornou com os filhos de avião. O marido deixara a
cidade na mesma hora e com a mesma direção a seguir, só
que a bordo de um caminhão carregado com a mudança e o
material necessário para a construção de um barracão de
madeira para morarem. O medo da empreitada só apareceu
nos dias em que Cacilda esperava pelo marido, sem notícias.
Bertoni demorou oito dias para chegar devido às péssimas
condições das estradas do Centro-Oeste naquela época. Fora
isso, Cacilda não se assustava com nada. Antes, vivera por
quatro anos na Amazônia, junto ao Serviço Especial de Saúde
Pública (SESP). Na Amazônia, participara da inauguração do
Hospital de Santarém, em 1946. A Casa Pastoral, como tudo
na Cidade Livre, funcionava em um grande barracão de
madeira. Lá também ficava a primeira escola primária de
Brasília. De manhã, a esposa do pastor dava aulas e à noite o
próprio pastor era o professor. No lugar onde estava a Casa
Pastoral hoje está instalado o Corpo de Bombeiros do Núcleo
Bandeirante. Nos planos do casal Bertoni, o local serviria de
abrigo apenas por alguns dias, até que o barraco de madeira
da família fosse construído. Mas a forma que as decisões eram
tomadas aqui prolongou a permanência no local. Concentrado
nas construções do Plano Piloto, que acabavam de começar,
Israel Pinheiro, presidente da Novacap, não permitia que
ninguém construísse nada na Cidade Livre sem sua
autorização. Enquanto esperavam, Bertoni nada podia fazer.
Por sorte, Cacilda recebia o salário de enfermeira
normalmente. Estava de licença prêmio por ter trabalhado dez
anos seguidos sem nenhuma falta, justificada ou não. O lote da
Novacap foi cedido para a família após três meses de espera.
Bertoni pôde então construir um pequeno barraco na Segunda
Avenida da Cidade Livre e dar início aos trabalhos com as
obras das construtoras que estavam instaladas aqui.
27
Partos
Não demorou muito para Cacilda ser descoberta na Cidade
Livre. Andando nas ruas da pequena vila, a enfermeira
encontrou uma ex-colega do SESP, com quem trabalhara na
Amazônia. ‘‘Noêmia, não me recordo o sobrenome, estava
grávida e pedia que eu fizesse seu parto’’, conta. O único
hospital que existia em toda a região era do Instituto de
Pensões e Aposentadoria dos Industriais (IAPI), que só atendia
casos de urgência e emergência. ‘‘Havia muitos acidentes de
trabalho nos acampamentos’’, justifica. Fora isso, havia uma
parteira na cidade e mais nada. Depois do primeiro parto feito
por Cacilda, centenas de outros se seguiram até 1960. ‘‘A
necessidade me levou a realizá-los. No curso de enfermagem
tínhamos aula de obstetrícia’’, conta. ‘‘Rapidamente fiquei
conhecida em toda Brasília’’, conta. ‘‘Os maridos das mulheres
grávidas dos acampamentos das construtoras vinham me pedir
ajuda”. Quando os partos eram feitos na Cidade Livre, Cacilda
era auxiliada pelo marido. Quando eram nos acampamentos,
os maridos precisavam preencher uma ficha onde colocavam
suas descrições físicas e a previsão do mês em que a criança
nasceria. ‘‘Quando chegava o dia, meu marido atendia a porta
e identificava o pai pela descrição na ficha’’, diz. ‘‘Era preciso
fazer isto porque eu teria que sair sozinha com desconhecidos
numa terra cheia de aventureiros’’, explica. Para realizar o
parto, Cacilda levava todo o material necessário em uma
maleta, como agulha, pinças, luvas e fios esterilizados. Quando
os partos eram na Cidade Livre, levava até água fervida,
porque as estruturas das casas eram muito precárias. ‘‘Os
homens me ajudavam a carregar’’, conta. As mulheres que
viviam nos acampamentos eram poucas, viviam com os
maridos. Por causa disso, elas terminavam ficando
encarregadas dos serviços domésticos de todo o
acampamento, como lavar roupas e cozinhar. ‘‘Mulher era
coisa rara em Brasília naquele tempo’’, diz Cacilda. ‘‘Os
homens nos olhavam com surpresa, mas sempre com muito
respeito’’, garante. O trabalho como enfermeira fazia com que
28
Cacilda não pensasse duas vezes em abrir mão do próprio
conforto em benefício de suas pacientes. Em uma
oportunidade, após realizar o parto de uma francesa casada
com um espanhol, Cacilda terminou por abrigar o casal
estrangeiro, uma filha pequena e a criança recém-nascida em
sua casa para não deixá-los na rua. Eles haviam se casado na
Argélia e vieram para cá em busca de oportunidades. Mas a
empresa para a qual o marido trabalhava falira, fazendo com
que perdessem tudo. ‘‘Terminei comprando uma máquina de
costura e outros bens que possuíam para ajudá-los a irem
embora’’, recorda-se. Além dos candangos, Cacilda realizou
inúmeros partos de esposas de engenheiros e autoridades,
como o deputado Paulo Freire. ‘‘Fiz o parto do menino Paulo
Francisco às vésperas das eleições de 1960’’.
Hospital Distrital
Em 1960, Cacilda foi descoberta por uma colega da escola de
enfermagem. Aidê Dourado, como se chamava, era a primeira
de um grupo de dez enfermeiras contratadas para trabalhar no
Hospital Distrital (Hospital de Base) a chegar a Brasília. ‘‘Ela
soubera que eu estava aqui e foi me procurar na Cidade Livre’’,
diz. ‘‘Quando ela me encontrou, estava lavando roupa com a
baiana Ernestina no córrego Vicente Pires, que era muito limpo
na época’’, completa. No Hospital Distrital, inaugurado em
1960, Cacilda foi contratada para organizar o centro cirúrgico.
As dificuldades deste trabalho eram inúmeras, a começar pela
falta de infra-estrutura do lugar. A sala de operações só tinha
um foco de luz, o assoalho do piso ainda não estava fixado e
tudo tinha que ser esterilizado com formol, pois ainda não havia
material descartável. ‘‘Um baiano que nunca houvera
trabalhado em hospital me ajudava a organizar tudo nas caixas
para cada tipo de cirurgia’’, revela. As roupas também tinham
que estar limpas com freqüência e, como não havia lugar para
higienizá-las no hospital, eram enviadas para o hospital São
Vicente, que começava a funcionar em Taguatinga.
‘‘Mandamos muitas peças e elas nunca retornaram, então
29
decidi mudar o esquema’’, conta a enfermeira. Cacilda solicitou
então à construtora Pederneiras, responsável pela obra do
hospital, que enviasse tambores cortados ao meio, que
passaram a servir de tanques improvisados. Para fazer o
serviço, contratou três lavadeiras que conhecia da Cidade
Livre. Como varal, usava os arames farpados no fundo do
hospital. ‘‘Mas tudo era feito com muita responsabilidade e
cuidado, tanto é que nunca tivemos um caso de infecção’’,
garante. Depois do Hospital Distrital, Cacilda trabalhou durante
um tempo no hospital da Universidade de Brasília, que
funcionava onde hoje está o Cine Dois Candangos, e na
organização do primeiro posto de saúde de Brasília, na 508
Sul. Como funcionária do Hospital Distrital, teve direito a morar
em um apartamento na Asa Norte, na antiga quadra 46, que
corresponde hoje à 405 Norte. Ficou lá até 1968, quando o
prédio precisou ser interditado para manutenção. Na ocasião,
terminou recebendo um apartamento na 112 Sul, que a
Novacap cedeu para uso dos funcionários do hospital.Em
1960, também foi responsável pela fundação da Associação de
Enfermagem do Distrito Federal, na Avenida L2 Norte —
primeira associação de classe a ter sede na nova capital
(CHIAVICATTI, CORREIO BRAZILIENSE. CADERNO
PIONEIROS, 21 ABR. 2005)
Figura 9 – Cacilda Rosa Bertoni, ao completar 80 anos em 2006.
Fonte: Acervo particular Cacilda Bertoni.
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Como se pode perceber, os pioneiros e as pioneiras da enfermagem
puderam vencer as dificuldades com todas as deficiências e limitações daquela
época, e, assim atender s necessidades do povo de um lugar recém-criado,
mas nem por isso deixaram de honrar a profissão.
Capítulo IV O Primeiro Médico e Diretor do HJKO
Figura 10– Dr. Edson Porto, à esquerda o primeiro Diretor do HJKO
Fonte: Acervo Arquivo Público do DF
O primeiro Diretor do HJKO foi o médico goiano Dr. Edson Porto. Antes
da abertura oficial, entretanto, o doutor Isaac foi obrigado a fazer uma cirurgia
de emergência que marcou sua vida.
Naquele ano, as chuvas haviam aberto uma grande cratera na Avenida
Central, o que acabou provocando um acidente com um português. O jipe que
ele dirigia perdeu o freio e, desesperado, ele pulou do carro antes que o veículo
caísse na cratera. Quando ele caiu, um caminhão, que vinha logo atrás, passou
por cima de uma de suas pernas, dilacerando-a.
31
Sem alternativa a não ser operar o paciente, Isaac Barreto levou o
homem para o HJKO e junto com Edson Porto, que atuou como anestesista, e
do então estudante de medicina Cláudio Costa, salvou a vida do português.
‘‘A única opção foi amputar a perna. Foi como uma cirurgia de guerra.
Ou fazíamos isso ou o paciente morreria’’, justificou. Foi assim a primeira
grande cirurgia realizada no cerrado.
Nascido em Barra do Rio Grande, no interior da Bahia, o doutor Isaac é
casado e tem quatro filhos, um deles o ex-piloto de Fórmula 1 Alex Dias
Ribeiro. Formado também em direito, Isaac dedica-se hoje ao trabalho de
perícia médica e a defender casos na área criminal. Ele foi o primeiro
presidente da Associação Médica de Brasília, inaugurada em 1959, na época
uma regional da Associação Médica de Goiás.
Segundo Pirajá (1998), o HJKO apesar de possuir equipamento de
primeira linha para a época, não podia deixar de contratar pessoas sem grande
experiência na área de saúde, conforme o depoimento a seguir:
Não tinha, num chegava e quanto mais aparecesse gente ...
por que naquela época tinha muito desastre de carro, muito
desastre... olha era só gente cortada era só gente, era uma
loucura ... aí quando nós chegamos lá esse meu compadre,
levou esse bilhetinho nesse doutor, quando chegou lá aí a
enfermeira chefe falou assim pro meu esposo: - “'cê’ vai
começar hoje?”' E o pior é que nós tinha deixado no Rio
Grande do Norte o sapato dele branco ... era... e ninguém ia
saber que ia chegar aqui e vinha chegar aqui e encontrar, por
que no pau-de-arara pagava até a bagagem que se trazia, e
nós ‘truxemos’ muito pouca coisa. Aí ela entrou prá dentro do
armário pegou um jaleco branco, pegou uma calça branca aí
disse: - 'O senhor vai trabalhar hoje’. Aí o senhor vai ficar no
32
alojamento de solteiro.5 (erros gráficos foram mantidos do
original)
Capítulo V Tombamento e Restauração do HJKO6
Em 1983, ocorrem tentativas de desocupação e demolição das
edificações por parte do IAPAS, então proprietário da área. As casas já
estavam bastante deterioradas.
Desse modo, vem um período de intensos protestos e organização
comunitária em favor do tombamento do espaço.
A seguir alguns fragmentos de entrevistas realizadas por Pirajá (1998),
mantendo-se a grafia original e variação lingüística:
“De tombar, não tinha idéia de tombar, escuta bem... eu queria
era ficar ali. Entendeu. Todos os moradores ficar ali e ser assim
restaurada as casas, ser arrumado tudo e todo mundo ficar ali”.
“(...) Foi então que nem eu tô dizendo prá você. Um crescia e
botava um ‘botequinho’ ali, outro crescia e botava um parente,
outro crescia e virou uma anarquia. Virou uma bagunça. Por
que aí crescia e não crescia no original prá ficar a coisa
bonitinha. Botava uma puxada prá trás, outro fazia, botava e
fazia. Por que ‘despois’ que desativou ninguém era dono de
nada Eu nem ‘teconto’ como eu tirei essa idéia (do
tombamento) por que já tinha repórter... e eles ‘tavam’ doidos
por reportagem que nem uns urubus na carniça, quando a
gente chamava eles já corria fui procurar um rapaz que já tava
mexendo... o José Everaldo prá ele dar sugestão por que ele
era mais maduro, como é que a gente deveria agir aí ele disse
assim:
5 Entrevista com D. Sebastiana Silva de Lima. 6 Disponível em: <http://www.museus.gov.br>. Acesso em: 04 out. 2007.
33
“D. Sebastiana a única solução que tem para o hospital ficar lá
do jeito que a senhora quer é haver o tombamento." - Então
vamos lutar pelo tombamento, por que se a única solução é
esta, nos temos que fazer isso prá não ser arrancado e não
tirar mas nenhuma ‘táuba’... muito desgaste ... a gente ficava
que não trabalhava mais, já não fazia mais comida em casa ...
aí quando dava fé: - "D. Sebastiana corre aqui! D. Sebastiana,
já chegou o caminhão." Aí eu chegava lá e fazia o caminhão
voltar ... o negócio deles era demolir ... muito desgaste, então
eu já tava muito desgastada foi quando eu procurei o Nilton
(Rosa)... foi aí fizemos uma reunião lá na Maria Benedita, na
irmã dele ... e eu falei”
(...) - "Nilton, você quer assumir isso aqui?” Mas é assim, assim
e assim... Nilton nós não pode sair da área do HJKO. Você vai
brigar debater, nós ‘tamo’ cadastrados para ir para a
Candangolândia, mas nós não queremos ir para a
Candangolândia.7 Aí ele veio prá casa da irmã, morava num
quartinho e topou... passei os documentos tudo... tinha uns
documentos e era muita papelada... "tá aqui Nilton, tudo
mastigadinho" ... ‘touxe’ ele aqui umas duas vezes ou três,
reunião na Candangolândia, na associação de moradores para
ele ficar a par de como era o movimento ... o meu desejo era
isso, os filhos da gente os filhos da gente cresce ali. Então
quando ele chegou com a notícia pra mim assim: - "D.
Sebastiana de jeito nenhum vai poder ficar aqui dentro... aí eu
fiquei puta da vida com ele e falei: - "você não soube, você tem
interesse próprio, você quer botar o seu pessoal prá
Candangolândia." E quando acaba veio um monte de gente,
olha veio irmão dele, veio irmã, veio prima, veio tudo prá
Candangolândia... por que se eu tivesse tomado a frente
ninguém ia ter saído ia ter ficado que nem os outros lugares.8
Quando saiu o tombamento nós já tava na Candangolândia, no
assentamento da Candangolândia... nós já tinha tudo se
mudado”.9
7 Cidade Satélite que começava a ser assentada. 8 D. Sebastiana parece se referir ao movimento de fixação e tombamento da Vila Planalto 9 Entrevista com D. Sebastiana Silva de Lima.
34
Em 13 de novembro de 1985, o conjunto arquitetônico do HJKO foi
tombado sendo mais tarde restaurado pelo GDF, através do decreto número
9.036, sendo considerado patrimônio histórico e artístico da cidade.
Figura 11 – Conjunto HJKO tombado e restaurado
Fonte: Acervo do Professor Marcus Maciel
Os moradores foram transferidos para a Candangolândia, a partir de
1987, inicia-se o processo de restauração das edificações do conjunto de
acordo com um projeto de restauro e revitalização do espaço proposto pelo
DePHA, Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico do DF.
Em 1990, o lugar passa a abrigar o Museu Vivo da Memória Candanga,
com seu amplo projeto ocupando toda a área do conjunto. De acordo com
estudos do Fórum Nacional /Fórum Brasília (2005) hoje, este espaço
representa uma das últimas referências arquitetônicas características do
35
período inicial de construção da cidade. Planejada para uma população de
apenas 500.000 habitantes.
Entretanto, Brasília viu sua população crescer muito além do esperado.
Sucessivas cidades satélites foram sendo criadas ao longo dos anos para
acomodar a população extra. A população total de Brasília (incluindo as
cidades satélites) já é de mais de 2 milhões de habitantes, sendo o Distrito
Federal dividido em 28 Regiões Administrativas (FÓRUM NACIONAL /FÓRUM
BRASÍLIA, 2005).
Desse modo, Brasília foi registrada, no ano de 1987, como Patrimônio
Histórico e Cultural da Humanidade. Porém, Brasília é muito mais do que um
patrimônio histórico ou um marco arquitetônico. É uma cidade viva e única,
uma cidade amada pela maioria dos seus habitantes (FÓRUM NACIONAL
/FÓRUM BRASÍLIA, 2005).
Em 1960, a inauguração do Hospital Distrital provocou o lento declínio
do HJKO. E, em 1968, o hospital foi desativado
Na década de 80, iniciou-se no Distrito Federal intenso processo de
erradicação de invasões. A área do HJKO era uma das invasões a serem
erradicadas. Em meados de 1983, o IAPAS, proprietário da área, tentou iniciar
a demolição das edificações. Os moradores mais antigos solicitaram, então, o
tombamento do antigo hospital, como estratégia para sua manutenção no local.
O tombamento ocorreu em 13 de novembro de 1985, mediante o Decreto nº
9.036, mas os moradores do HJKO foram transferidos para a Candangolândia,
local onde estavam sendo assentados moradores de várias invasões
erradicadas (WIKIPEDIA. NÚCLEO BANDEIRANTE, 2007).
36
37
5 DIFICULDADORES DA PESQUISA
O fascínio despertado ao visitar o Museu Vivo da Memória Candanga,
quando se observou um consultório médico autentico da época da construção
de Brasília, foi se perdendo com o desenrolar deste trabalho, pois a falta de
referencias bibliográficas da História recente da cidade e da enfermagem e
lamentável. Sem falar que muitas fontes são extremamente repetitivas, talvez
ate por conta da falta de material.
Angerami & Boemer (1984) estudaram a especificidade do uso das
teorias de Enfermagem na pesquisa. Numa busca exaustiva, que cobriu os
quatro periódicos de maior circulação no país, procuraram desvendar nos
artigos publicados, as teorias de Enfermagem explicitadas pelos autores ou
implícitas nos seus discursos. Os resultados revelaram que a utilização das
teorias de Enfermagem como suporte teórico é inexpressiva, sendo que o mais
citado é o uso de processo de Enfermagem de Horta, em sua primeira fase: -
identificação do problema.
Batey (1977) já havia demonstrado estes achados referentes ao Brasil,
que não diferem muito dos apontados por em sua revisão dos 25 anos de
pesquisas de Nursing Research. Para essa autora, as pesquisas de
enfermeiros têm sérias limitações, principalmente devido à falta de
conceitualização e referências bibliográficas.
Se a construção do saber é um processo sempre inacabado, se o
conhecimento é sempre provisório, e se a emissão de uma resposta sempre
suscitará nova pergunta, um fato novo poderá provocar mudanças que devem
ser analisadas.
38
Guido Zucconi (1997) Afirma que diferentemente de outros países, o
vínculo entre estudos visando práticas operativas no campo da preservação e
estudos históricos sobre a cidade pouco relevo teve no Brasil até o momento.
Apesar do desenvolvimento das questões relativas ao patrimônio, os estudos
históricos sobre as cidades brasileiras como base para planos e projetos
tiveram, no geral, pouco fôlego intelectual. Partes integrantes de projetos, neles
se inseriam de forma quase burocrática, apenas compondo os famosos
antecedentes históricos ou fazendo o pano de fundo de uma determinada
proposta, sem conseguirem atingir uma dimensão metodológica ou teórica
mais aprofundada.
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6 CONCLUSÃO
Vários profissionais de saúde, inclusive profissionais da enfermagem
que imigraram para o Planalto Central, em busca de novas perspectivas, com o
espírito de aventura e desprendimento, pois a carência de especialistas e os
acampamentos com condições precárias conjugavam ambientes desfavoráveis
à saúde pública, exigindo destes profissionais, que com seu trabalho árduo,
dedicação e conhecimentos se prestavam ao combate de doenças, para conter
as epidemias.
Nesse sentido, o contexto social-econômico da década de vinte, do
século XX, exigiu uma transformação na saúde pública do DF, de modo a
disseminar novas formas de conduta quanto à higiene e hábitos de vida, o
exigiu muito mais dos profissionais de enfermagem que estiveram em Brasíl ia
desde o princípio da construção.
Hoje, temos consciência que Brasília foi sonho e proposta de várias
gerações de brasileiros, ao longo de quase dois séculos. Porém, foi o
presidente Juscelino Kubitschek quem materializou este sonho ao propor a
transferência da sede do governo situado no Rio de Janeiro para a região do
Planalto Central (57º CONGRESSO DE ENFERMAGEM, 2005).
Sabemos também que diversos operários empenhavam-se na
construção durante dia e noite, havendo a necessidade de proporcionar
assistência médica aos candangos principalmente com relação às lesões que
pudessem ocorrer no ambiente de trabalho.
Desse modo, na atualidade, sabe-se que o princípio da assistência em saúde
na futura capital iniciou-se com a construção do HJKO, além de serviços de
40
assistência domiciliar que já eram prestados por enfermeiras e um Centro de
Saúde, posteriormente inaugurado em Setembro de 1959 (57º CONGRESSO
DE ENFERMAGEM, 2005).
(...) é necessário incluir no patrimônio histórico, outros campos
artísticos (pintura, escultura, música etc.), objetos cotidianos
(utensílios domésticos, instrumentos de trabalho, vestimentas, etc.),
materiais de diferentes arquivos, acervos bibliográficos, falas e
práticas de múltiplos agentes sociais.
Esta ampliação não se confunde com a simples diversidade de
"objetos" ou "temas" abordados pelos historiadores: está-se diante de
fazeres sociais. Para cada material interpretado, há um contato com
lutas, acordos, potencialidades, limites. 10
Portanto, é dever dos habitantes de Brasília resgatar sua memória bem
como a memória da Enfermagem no Distrito Federal, destacando a atuação
das enfermeiras pioneiras nos atendimentos de saúde da Novacap, mais
especificamente as que trabalharam nos acampamentos e no Hospital
Juscelino Kubitschek de Oliveira.
10 Silva Marcos, 1995.p 40 e 41
41
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BATEY, N. V. – Conceptualization: knowledge and logie guiding empirical research. Nurs. Res., v. 26, n. 5, p. 09-324, 1977. BRASIL. (DESCONHECIDO). Brasília... em 300 questões. Brasília: Edições Dédalo, 2000. CARDOSO, Miriam Limoeiro. Ideologia e desenvolvimento, Brasil. 2a edição.
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do Brasil moderno. Universidade Estadual de Campinas - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas: Unicamp, 2001. PIRAJÁ, Juliano de Almeida. HJKO: A Comunidade vai a luta. Monografia de
Graduação. Universidade de Brasília – Departamento de História. Brasília, 1998.
42
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