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INCLUSÃO SOCIAL DAS MULHERES - CATADORAS: ATIVIDADE RECICLÁVEL ARTESANAL COMO FORMA DE VALORIZAÇÃO DO SER HUMAMO E SEU POTENCIAL PERDUN, Fernanda – Univille [email protected] SILVA, Denise Abatti Kasper – Univille [email protected] BALDIN, Nelma - Univille [email protected] Área Temática: Diversidade e Inclusão Agência Financiadora: Prefeitura Municipal de União da Vitória - PR Resumo: O estudo tratou da implantação do trabalho voltado à confecção de material artesanal com resíduos recicláveis, junto a um grupo de catadoras da Associação dos Catadores de União da Vitória – PR, espaço onde praticam a seleção e reciclagem dos materiais coletados. Com o objetivo de analisar a situação do trabalho dessas catadoras e propor-lhes melhorias no cotidiano desenvolveu-se, com as mesmas, encontros semanais durante seis meses. Observou- se o progresso e crescimento pessoal frente às possibilidades de desenvolverem um empreendimento que geraria melhorias, proporcionando-lhes maior qualidade de trabalho e de vida. Também as condições de trabalho insalubres que grande parte dessas catadoras enfrentam foram consideradas, por estarem o tempo todo expostas à riscos de saúde devido o contato com materiais inadequados advindos da coleta diária de resíduos recicláveis. Com o estudo, proporcionou-se, às catadoras, essas melhorias, pois a determinação e força de vontade pessoal auxiliou-as a modificar a realidade e a gerar uma nova tendência nas suas condições sociais uma vez que desenvolveram novas atitudes no processo de coleta dos resíduos, conforme orientações da pesquisa. Ainda, desenvolveram novas atividades, em grupos, produzindo bolsas artesanais e superando as dificuldades quanto à elaboração do produto artesanal a ser fabricado e comercializado pelo comércio local, aumentando, assim, a motivação por perceberem novas perspectivas. Em especial, por compreenderem que são capazes de mudar as suas situações contando com o apoio da população, mediante o reconhecimento do trabalho e da aceitação do produto. Para a realização do estudo definiu-se pelo método de pesquisa científico nos parâmetros da pesquisa qualitativa, na modalidade descritiva. Trabalhou-se com esse tipo de pesquisa porque, em relação à constatação dos pontos favoráveis à serem analisados no estudo, entendeu-se que essa seria uma forma, sistemática, de melhor compreender o problema enfrentado pelas catadoras, bem como de se perceber as soluções por elas apontadas.

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INCLUSÃO SOCIAL DAS MULHERES - CATADORAS:

ATIVIDADE RECICLÁVEL ARTESANAL COMO FORMA DE

VALORIZAÇÃO DO SER HUMAMO E SEU POTENCIAL

PERDUN, Fernanda – Univille [email protected]

SILVA, Denise Abatti Kasper – Univille

[email protected]

BALDIN, Nelma - Univille [email protected]

Área Temática: Diversidade e Inclusão

Agência Financiadora: Prefeitura Municipal de União da Vitória - PR

Resumo:

O estudo tratou da implantação do trabalho voltado à confecção de material artesanal com resíduos recicláveis, junto a um grupo de catadoras da Associação dos Catadores de União da Vitória – PR, espaço onde praticam a seleção e reciclagem dos materiais coletados. Com o objetivo de analisar a situação do trabalho dessas catadoras e propor-lhes melhorias no cotidiano desenvolveu-se, com as mesmas, encontros semanais durante seis meses. Observou-se o progresso e crescimento pessoal frente às possibilidades de desenvolverem um empreendimento que geraria melhorias, proporcionando-lhes maior qualidade de trabalho e de vida. Também as condições de trabalho insalubres que grande parte dessas catadoras enfrentam foram consideradas, por estarem o tempo todo expostas à riscos de saúde devido o contato com materiais inadequados advindos da coleta diária de resíduos recicláveis. Com o estudo, proporcionou-se, às catadoras, essas melhorias, pois a determinação e força de vontade pessoal auxiliou-as a modificar a realidade e a gerar uma nova tendência nas suas condições sociais uma vez que desenvolveram novas atitudes no processo de coleta dos resíduos, conforme orientações da pesquisa. Ainda, desenvolveram novas atividades, em grupos, produzindo bolsas artesanais e superando as dificuldades quanto à elaboração do produto artesanal a ser fabricado e comercializado pelo comércio local, aumentando, assim, a motivação por perceberem novas perspectivas. Em especial, por compreenderem que são capazes de mudar as suas situações contando com o apoio da população, mediante o reconhecimento do trabalho e da aceitação do produto. Para a realização do estudo definiu-se pelo método de pesquisa científico nos parâmetros da pesquisa qualitativa, na modalidade descritiva. Trabalhou-se com esse tipo de pesquisa porque, em relação à constatação dos pontos favoráveis à serem analisados no estudo, entendeu-se que essa seria uma forma, sistemática, de melhor compreender o problema enfrentado pelas catadoras, bem como de se perceber as soluções por elas apontadas.

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Palavras-chave: Mulheres - Catadoras; atividade reciclável artesanal; Valorização do Ser Humano. Introdução

No Século XIX as mulheres reivindicaram e, com sua determinação e empenho,

transformaram paradigmas e preconceitos, modificando a visão de que não poderiam

desenvolver trabalhos profissionais, de responsabilidade, devido à delicadeza, fragilidade,

dentre outras características julgadas, então, impossibilitáveis (Sina, 2005). Nesse período, a

imagem machista tomava proporções sem limites, bloqueando as opiniões feministas e

dificultando-lhes o crescimento. Porém, o passar do tempo possibilitou vitórias às mulheres e

facilitou-se a atividade do trabalho feminino. As mulheres, então, passaram a exercer cargos

de liderança, mostrando capacidade e profissionalismo.

Atualmente, as mulheres ocupam cargos de liderança, responsáveis parcialmente ou

totalmente pelo sustento de toda a família, independente da renda que venham portar

conforme observado por Fleck e Wagner (2003).

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1991, no

país, a renda das mulheres equivalia a 63,1% à dos homens e, em 2000, a 71,5%, reduzindo,

portanto, a desigualdade entre homens e mulheres. Os dados informam, ainda, que o número

de mulheres que são indicadas como a pessoa de referência da família aumentou

consideravelmente entre 1996 e 2006, passando de 10,3 milhões para 18,5 milhões, nesse

período. Em termos relativos, esse aumento corresponde a uma variação de 79%, enquanto,

neste mesmo período, o número de homens “chefes” de família aumentou 25%.

Dentre as mais diversificadas profissões ocupadas pelas mulheres, tem-se o trabalho

de catadora de materiais (que permitem ser reciclados) o que lhes possibilita uma fonte de

geração de renda. Porém, esta atividade possui alguns pontos desfavoráveis devido as

condições insalubres vivenciadas pelas catadoras durante a atividade de coleta dos resíduos,

pois estão expostas a fatores climáticos em períodos prolongados além do contato direto com

materiais contaminados, comprometendo a saúde. E, além destes agravantes, tem-se pouca

valorização agregada nos produtos recicláveis coletados gerando, muitas vezes, uma renda

inferior aos custos necessários para administração dos gastos familiares.

Portanto, este estudo, teve como objetivo identificar os pontos favoráveis presentes na

inclusão de uma atividade artesanal voltada a um grupo de mulheres catadoras cadastradas na

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Associação dos Catadores de União da Vitoria – Paraná e, ainda, de proporcionar-lhes,

mediante implantação do trabalho de reciclagem artesanal, melhorias no dia-a-dia dessas

mulheres catadoras. Ainda, buscou-se a constatação, por parte da comunidade locus da

pesquisa, da aceitação do artesanato produzido com os materiais recicláveis coletados e do

reconhecimento da atividade de catadora. Entretanto, cabe ressaltar que embora as catadoras

de materiais recicláveis nas residenciais da cidade tenham enveredado para o campo da

atividade reciclável artesanal, elas não se desligaram da tarefa da coleta dos residuos e,

paralelamente, conseguem desenvolver as duas atividades.

Posicionamentos Teóricos - Os benefícios gerados por meio de trabalhos artesanais às catadoras

A atividade artesanal pode oportunizar mudanças de paradigmas, pois para Velloso

(2005), o potencial de criação do sujeito está relacionado a um ambiente propício, ou seja, um

ambiente onde ele possa ter espaço para fazer aflorar a sua singularidade e reintegrá-lo à

realidade externa por meio de atividades culturais, sociais e políticas.

Assim que a catadora percebe sua colaboração na renda familiar, podendo

proporcionar a aquisição de novos produtos e serviços à família, percebe também o quanto é

capaz e como pode modificar as situações de dificuldades que enfrenta. Seus objetivos

acabam sendo delineados para então serem executados, devido a motivação e força de

vontade que surgem em busca de resultados positivos, proporcionando, assim, um

crescimento e mudanças de paradigmas.

Ao homem, quando lhe é possibilitado desenvolver o seu potencial de criatividade,

não é preciso copiar soluções estabelecidas por outras realidades divergentes da sua. Assim,

imbuído da sua capacidade inata de criação, e vencendo a angústia, o homem pode ordenar e

formatar suas idéias e criar o seu universo, suas leis e seu lugar no mundo, de acordo com seu

desejo (Velloso, 2005).

A criação de atividades, voltadas às catadoras, possibilita a motivação, antes

inexistente e agora fortalecida por princípios e desejos de melhoria, voltados ao trabalho,

onde a criatividade inicia um processo de reconstrução, moldando-se de acordo com o

objetivo principal da catadora: desenvolver alternativas para melhoria, tanto na qualidade de

vida como na geração de renda. Rodrigues (1976) descreve que a motivação esta constituída

nos motivos que o ser humano desenvolve para aprender qualquer coisa, seja escrever, dançar,

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fazer um bolo ou construir um foguete, sendo profundamente interiores, onde acabam

trazendo os benefícios e interesses desejados.

Trabalhando com as catadoras, temos como impacto, o resultado refletido em toda a

família, devido à mulher, esposa, mãe, participar ativamente da base familiar. Dela surge o

apoio, incentivo, motivação, educação e princípios éticos que influenciarão no grupo por toda

a vida, pois as responsabilidades de administração no lar ainda continuam na sua maioria

sendo exercidas por elas mesmas. Fleck e Wagner (2003) relatam que apesar das mulheres

saírem do âmbito do lar para trabalhar, contribuindo com a maior parte da renda, os homens

não assumiram as responsabilidades pela esfera doméstica da mesma forma, que as mulheres,

passaram a assumir. Tornaram-se na condição de principal provedora do sustento do lar, mas,

é importante ressaltar que as responsabilidades familiares antes assumidas pelas mulheres,

ainda continuam sendo administradas por elas.

Isso demonstra o quanto o papel da mulher é importante para o desenvolvimento da

família e como são necessários trabalhos voltados a este publico, para geração de

oportunidades. Com a inclusão de atividades artesanais pode-se objetivar a oportunização de

melhoria de renda e, ao mesmo instante, fatores relacionados ao bem-estar devido às

atividades elaboradas no processo de produção. Com a renda do artesanato e da coleta dos

materiais recicláveis na comunidade as mulheres catadoras acabam desenvolvendo um

trabalho informal, porém demonstrando a capacidade e o interesse que possuem para

melhorias de vida. Com isso, estas atividades tornam-se fontes profissionalizantes. “O

artesanato faz com que passem a acreditar em sua capacidade de trabalhar e criar. É também

uma forma de capacitação em ofícios alternativos, que ajudam a complementar a renda

familiar” (FAJARDO, CALAGE e JOPPERT, 2002, p. 20).

Com a prática da atividade artesanal aparecem os benefícios, dentre tais, a inclusão

social caracterizada por meio da divulgação dos trabalhos artesanais desenvolvidos que

demonstram o potencial das catadoras, juntamente com a força de vontade que exprimem.

Esse trabalho inclui-as na sociedade alterando a percepção de integrantes da população que,

desestruturados, não buscam oportunidades de melhorias para as situações críticas

vivenciadas.

Entretanto, o que se constata é uma imensa dificuldade da sociedade para efetivar suas proposições, verificando-se a necessidade de uma constante revisão de suas práticas inclusivas, por vezes excludentes e discriminatórias. Não basta estar dentro - da escola, das instituições, da empresa, dos espaços públicos e privados - para

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haver inclusão. Os princípios da exclusão encontram-se imbuídos nas relações. (QUINTAO, 2005, p. 76)

Devido o constante processo de globalização e exigência de mercado perante a

qualificação profissional, as catadoras tornam-se excluídas deste processo, pois não possuem

as qualidades necessárias para acompanhar os avanços tecnológicos e sociais.

Desde o final do século passado, a globalização, a introdução de novas tecnologias e a constante qualificação da mão-de-obra têm proporcionado a evolução do processo produtivo. Por outro lado, os cidadãos que não têm acesso a essas melhorias tornam-se marginalizados e excluídos da sociedade, sem acesso aos bens de consumo e serviços básicos, sem oportunidade de emprego formal, ficando subordinados ao subemprego ou ao emprego informal. (SILVA e BRITO, 2006 p. 545)

“As práticas de inclusão social também proporcionam ao carroceiro e a sua família a

possibilidade de lazer, convívio social, além de expectativas quanto ao futuro dessas famílias.

Trata-se de uma prática com a qual se ampliam as possibilidades de vivenciar a cidadania.”

(SILVA e BRITO, 2006, p. 552).

Procedimentos Metodológicos

Para o alcance dos objetivos propostos, este estudo foi aplicado no período de outubro

de 2008 a abril de 2009, buscando-se uma primeira aproximação com as integrantes da

pesquisa por meio dos encontros mensais da Associação dos Catadores. O número de

participantes no trabalho representou 20% do universo de mulheres catadoras, tendo por

referência o cadastro existente no Serviço Social da Prefeitura Municipal de União da Vitória.

Para o desenvolvimento da proposta, cumpriram-se procedimentos metodológicos conforme

as seguintes etapas:

• Inicialmente, efetuou-se divulgação a todos os integrantes da Associação convidando-

os a participar no estudo, relatando o propósito da implantação do trabalho que visa por meio

da inclusão social a elaboração de produto artesanal pelas catadoras, trabalhando em equipe

durante três tardes na semana, reunindo-se nas comodidades da própria Associação;

• Após confirmação da participação, realizaram-se os primeiros encontros, onde a

pesquisadora relatou os procedimentos a serem adotados, ministrou palestras de

sensibilização sobre a importância em produzir artesanatos com qualidade e bem acabados,

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higiene e economia solidária. Com isso, as catadoras perceberam a importância da produção

de artesanatos com qualidade, e a real necessidade de interpretação dos propósitos deste

estudo;

• Após conclusão da primeira fase da pesquisa, deu-se a implantação do artesanato,

produzindo Bolsas com material PET. Os custos com matéria-prima para as primeiras 10

unidades foram financiados pelo setor de Ação Social da Prefeitura Municipal. Assim, com a

venda dos primeiros produtos artesanais obteve-se dinheiro em caixa para compra das demais

matérias-primas. Durante o aprendizado ainda houveram dicas de acabamentos, pois todas as

integrantes tiveram dificuldades durante o processo de fabricação e criação das Bolsas, e por

não estarem familiarizadas com aquela situação, tudo era novo, havendo a necessidade de

mudança de atitudes. E isto verificou-se pois, anteriormente, somente coletavam os resíduos

recicláveis e agora, além de continuarem a coletar, também produziam artesanato com parte

dos materiais, onde é necessária a percepção e a sensibilidade no manuseio e criação do

produto;

• Assim que foram produzidas as primeiras Bolsas Artesanais, houve a divulgação ao

comércio local, mediante visitas nos estabelecimentos mostrando o artesanato e o propósito

do trabalho. Com isto, surgiu a possibilidade de comercialização à comunidade,

oportunizando melhoria de renda as catadoras, gerando por meio deste procedimento, mais

um diferencial a ser alcançado com o estudo;

• Durante a implantação do trabalho analisou-se, por meio do contato direto da pesquisa

com as participantes, o progresso individual, comparando o inicio com o término do estudo,

mediante as informações relatadas pelas participantes e percepções das pesquisadoras para

conclusões do estudo.

As características das mulheres catadoras

Quanto ao perfil do grupo, pode-se dizer que são mulheres, adultas, na faixa etária

entre 20 e 56 anos, a maioria (75%) concluiu somente o ensino primário até 4ª. Série. O índice

daquelas que nunca estudaram é de 12,5% enquanto que 12,5% concluíram o Ensino

Fundamental.

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Todas as catadoras são naturais da região. O principal local de moradia (62,5%) está

situado em perímetro urbano no Bairro Limeira e 37,5% moram próximos ao Rio Iguaçu

distribuídos na configuração geográfica da cidade (Ilustração 1).

Ilustração 1: Mapa da cidade de União da Vitória – Pr. – Localização das regiões onde as catadoras residem

Legenda:

Associação dos Catadores de União da Vitória

Bairro Limeira

Residências Próximas ao Rio Iguaçu

Fonte: http://maps.google.com.br/

As mulheres catadoras participantes vivem a mais de 10 anos no mesmo local. São

proprietárias das residências, construídas na grande maioria pela própria família, porém

nenhuma em áreas de posse/invasão. Apesar das condições precárias de infra-estrutura

ambiental a maioria não gostaria de mudar para outra localidade, alegando a satisfação da

localização geográfica e vizinhança que possuem.

Nesse sentido, as catadoras consideram o trabalho como meio de sobrevivência,

independência e a única forma de conseguir as coisas com honestidade. A maioria começou a

trabalhar ainda quando criança, colaborando na atividade da família, cuidando dos irmãos

mais novos ou ainda desenvolvendo profissões como gari, ajudantes de pedreiro, dentre

outras, visto que todas são mulheres. Com o passar do tempo foram deixando um número sem

fim de profissões e ingressando na atividade da coleta dos resíduos recicláveis. O desemprego

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foi um dos motivos mais significativos, entretanto a necessidade de colaborar em casa com o

sustento familiar mereceu destaque.

A grande maioria dessas catadoras trabalha há mais de 8 anos com a coleta. Em

termos de rendimentos mensais, durante a implantação da pesquisa encontramos uma variação

de R$ 100,00/mês a R$ 560,00/mês. Cabe destacar também que usufruem do Bolsa Escola e

Vale Gás (Programas Governamentais) que contribuem na renda familiar. Havendo uma

participante aposentada.

Todas as catadoras participantes consideraram que sua vida melhorou nos últimos

cinco anos, visto que a interpretação foi baseada no ingresso dos filhos à escola, encontro de

empregos pelos integrantes da família, nenhum problema grave de saúde e ingresso neste

trabalho de grupo orientado pela pesquisa. Apesar das dificuldades enfrentadas durante o dia-

a-dia, todas alegaram possuir sonhos, dentre eles uma residência melhor e equipada com

eletrodomésticos ou a possibilidade de conseguir novo emprego para melhoria de renda e de

vida.

Com a implantação deste trabalho as catadoras tiveram um aumento na renda média

em aproximadamente R$ 45,00/mês, visto que a quantidade de vendas do artesanato não é

fixa, alterando-se em cada mês, dependendo da procura pela população. Porém a

oportunização na melhoria de renda não foi o principal objetivo do estudo, com isso as

catadoras contribuíram no sustento das famílias, mas o fator principal foi o reconhecimento

do trabalho pela sociedade local. E isto foi um fator importante, visto que pessoas da

população foram até o local onde eram desenvolvidos os encontros para conhecer o trabalho,

o que proporcionou melhor aceitação desse esforço das catadoras pela sociedade e a

respectiva inclusão social. Fator, este, descrito por algumas dessas mulheres, como ponto

favorável na interpretação do trabalho de coleta reciclável que desenvolvem. Outra questão

positiva da pesquisa foi à valorização e percepção, pelas catadoras, da capacidade pessoal que

possuem, suas qualidades e características que as tornam pessoas especiais, capazes de

conquistar seus objetivos.

Durante a implantação do trabalho todas as situações negativas que no dia-a-dia são

vivenciadas pelas participantes foram exploradas. Cada integrante apoiava a outra e, com base

nos resultados alcançados e a motivação incentivada pela pesquisa, começaram a desenvolver

forças para “encarar” as dificuldades, tentando resolvê-las.

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Em vista do comprometimento social e trabalho em equipe que desenvolveram, devido

a elaboração do artesanato e que foi reconhecido e vendido pelo comércio local, as catadoras

perceberam esse processo como um estimulo à auto-estima. Considerando que o valor

agregado no produto artesanal é maior que o adquirido com a coleta e venda dos resíduos e

que essa atividade exige menor esforço físico se comparado com a atividade de coleta diária

de resíduos que exercem nos bairros vizinhos onde residem, mais a oportunidade de criarem

um empreendimento e conviverem em laços de amizade com as demais participantes, a

tendência é de que entre essas mulheres catadoras a balança “pese” mais para o lado da

atividade reciclável artesanal.

Considerações Finais

Com a realização do presente estudo pode-se proporcionar uma melhor condição de

trabalho para que as catadoras desenvolvessem atividades profissionais e comerciais estando

em um local limpo, seguro, e que não provocam problemas de saúde. E, devido a produção

das Bolsas Artesanais com garrafas PET (material reciclável coletado), pode-se influenciar na

criatividade pessoal, por meio dos trabalhos manuais que foram desenvolvidos e a

necessidade de modelos diferenciados, conforme solicitado pelos clientes (Ilustração 2).

Modelo 1: Porta objeto (48cm, 32cm, 32cm) Modelo 2: Porta objeto (32cm, 16cm, 16cm)

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Modelo 3: Bolsa (32cm, 16cm, 32cm) Modelo 4: Bolsa (32cm, 8cm, 32cm)

Ilustração 2 - Modelos das Bolsas e Porta Objetos Artesanais produzidos pelas mulheres catadoras com material reciclável coletado (garrafas PET)

Em vista de caracteristicas exploratórias e qualitativas, o presente estudo aponta para a

existencia de problemas comuns entre as catadoras como necessidade de oportunidades, que

encontram inexistentes devido fatores, tais como a baixa escolaridade, como a mais relevante.

Devido essas condições desfavoráveis e as necessidades que vivenciam diariamente,

essas catadoras acabam se desmotivando e com isso perdem a força de vontade para mudar as

situações negativas e críticas que vivenciam. Outro fatornimportante a considerar e que

interfere nas relações das mulheres catadoras é o machismo existente de parte dos maridos,

que visualizam a figura mulher com capacidade somente para tarefas domiciliares, educação

dos filhos e, no máximo, como mão de obra de contribuição na atividade dos catadores em

geral, no sentido de desenvolverem a atividade de coleta e zelarem pelo bem-estar do grupo

ou da família. Com a implantação do projeto da pesquisa, as catadoras identificaram o poder

que possuem, fizeram novas amizades, criaram forças para reenvindicar e argumentar o que

consideravam incorreto quanto à educação dos filhos e de participarem ativamente na decisão

dos investimentos familiares ou de grupos associados.

As palestras que foram desenvolvidas pela pesquisa com temas de empreendedorismo,

economia solidaria, aparência e higiene possibilitaram às mulheres catadoras, identificar as

reais necessidades para melhorias. Como a população local visitava este grupo para conhecer

o trabalho, as catadoras frequentavam os encontros com aparência agradável, roupas limpas,

unhas feitas, pois sabiam, conforme relato de uma das integrantes do grupo, “que a primeira

impressão é a que fica”.

Conclui-se, assim, que para este grupo de mulheres catadoras faltam somente

oportunidades para melhorias, pois devido a falta de qualificação profissional são excluidas

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do mercado de trabalho. Algumas integrantes do grupo, após término da pesquisa

continuaram a desenvolver o artesanato nas próprias residências, utilizando esta técnica como

fonte de renda, deixando a atividade de coleta para os esposos. Com isto, percebe-se a força

de vontade que possuem para mudar as situações críticas que vivenciam. O crescimento da

atividade dessas catadoras frente ao trabalho desenvolvido foi percebido pela modificação de

suas atitudes, formas de pensar e entusiasmos, onde foi possível construir uma nova

concepção de ver a vida... Uma das integrantes relatou durante a realização dos encontros,

que o trabalho desenvolvido em grupo trouxe-lhe ânimo e força para “encarar” os problemas

que vivencia diariamente em sua família, direcionando-a para um novo conceito de vida.

Referências

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