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DENYSE PEREIRA NEVES DELGADO
CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DE JUIZ DE FORA
O REFORÇO DA CENTRALIDADE COMO ESTRATÉGIA ANTI-PLANEJAMENTO REGIONAL:
estudo de caso do papel da cidade média de Juiz de Fora, MG, em seu entorno
982
8º CONGRESSO LUSO-BRASILEIRO PARA O PLANEAMENTO URBANO, REGIONAL, INTEGRADO E SUSTENTÁVEL (PLURIS 2018) Cidades e Territórios - Desenvolvimento, atratividade e novos desafios
Coimbra – Portugal, 24, 25 e 26 de outubro de 2018
O REFORÇO DA CENTRALIDADE COMO ESTRATÉGIA ANTI-
PLANEJAMENTO REGIONAL: ESTUDO DE CASO DO PAPEL DA CIDADE
MÉDIA DE JUIZ DE FORA, MG, E SEU ENTORNO (PLURIS 2018)1
D. P. N. Delgado
RESUMO
O presente trabalho apresenta a noção de “guerra entre lugares” como um dos principais
eixos de análise, na qual a centralidade das cidades médias emerge como objeto de análise
para o desenvolvimento urbano/sócio-econômico de suas regiões de influências, orientada
pelas difundidas políticas de “empresariamento urbano”. Na perspectiva crítica, a pesquisa
parte da ideia de que na dinâmica econômica atual, as ações contidas no Plano Estratégico
de Juiz de Fora, Minas Gerais/ Brasil, intensificam a centralidade exercida pelo município
em sua região de influência imediata, refletindo negativamente na dinâmica econômica e
urbana de alguns municípios sob sua influência, além do esvaziamento da questão regional
e suas possibilidades de planejamento.
1 INTRODUÇÃO
A globalização como estruturadora do espaço contemporâneo cria a dicotomia entre o
global e local, sujeitando o acirramento das disputas entre “localizações” diante a
possibilidade de grandes capitais de empresas ambulantes. Tem-se denominada a “guerra
entre lugares” (SANTOS, 1996, p.197). A preocupação de preparar a cidade com aparatos
de competitividade, visando à atração de investimento, tem alterado o caminho do
planejamento urbano stricto sensu (VILLAÇA, 2004, p. 175) para a emergência de
modelos de planejamento estratégicos, onde a dimensão social e política enquadram-se no
conceito que Harvey (1996) definiu como a passagem do gerenciamento para o
“empresariamento urbano”, ou seja, a formação de um complexo de coalizões
sociopolíticas visando à organização do espaço da cidade, com o objetivo de adequá-la à
atual dinâmica econômica, ou seja, de inseri-la no atual circuito de reprodução e
valorização capitalista, e conter possíveis fugas para outras regiões supostamente mais
lucrativas. Nas cidades médias, entre as vantagens locacionais anunciadas está o público
polarizado por elas e abrangência de sua influência, atribuindo à região, através de um jogo
de interesses – econômico e político -, a falsa noção de integração do entorno nas
estratégias “negociadas”.
1 Pesquisa desenvolvida para defesa de dissertação de mestrado e orientada pelo Prof. Dr.Glauco Bienenstein
(GPDU/ PPGAU/UFF).
Nesse viés, a presente reflexão aborda a noção de “centralidade interurbana”
(SPOSITO,1998) exercida pelas cidades médias, analisando as relações de dependência
entre a região de influência (IBGE, 2007) que se estabelece e o núcleo ao assumir o papel
de lócus ofertante de bens e serviços mais complexos e diferenciados. Além disso, examina
se tal noção é ou não reforçada quando se emerge no território uma nova maneira de
gerenciar e planejar a cidade, através de empreendimentos e equipamentos urbanos cuja
possível abrangência regional pode ou não acelerar/acirrar a polarização dos pequenos
municípios, os distanciando das premissas do planejamento regional.
A pesquisa tem como estudo de caso a experiência no município de Juiz de Fora, no estado
de Minas Gerais, e sua região de influência imediata. No ano de 2000 foi elaborado o
Plano Estratégico de Juiz de Fora ou Plano JF, sob a orientação de uma empresa catalã -
GFE Associats LTDA. Desde então, a cidade passou por transformações significativas em
sua paisagem, onde o discurso de promoção da cidade parece estar relacionado à impulsão
da cidade num cenário caracterizado por noções de globalização e competição de espaços
na economia, ocultando a complexidade da articulação regional/local.
Para a compreensão da investigação proposta, este trabalho, através da pesquisa de campo,
selecionou quatro municípios pertencentes à região de influência imediata de Juiz de Fora
para realização de entrevistas com seus gestores, para leitura qualitativa dos impactos
analisados neste trabalho. Dessa forma, este artigo está estruturado em três partes e as
considerações finais. Primeiramente, com um breve percurso sobre as questões teóricas e
conceituais a respeito das cidades médias e a centralidade interurbana; em segundo, a
apresentação do município de Juiz de Fora, seu plano estratégico e sua região de influência
imediata; e a terceira parte perpassa a pesquisa de campo que, diante as abordagens
analíticas e empíricas realizadas, finaliza-se com algumas considerações parciais sobre os
resultados encontrados, confrontando-os com o objetivo central e as ações do Plano JF.
2 AS CIDADES MÉDIAS: a centralidade como elemento estruturador de seu entorno
A busca pela integração, senão inserção, no circuito produtivo e de investimentos
capitalizado faz parte da agenda estratégica de muitas cidades médias, sendo a
intensificação da dinâmica de crescimento populacional das cidades médias e a
consequente diversificação dos papéis e funções que elas vêm passando a exercer na rede
urbana brasileira a justificação pela sua importância nos debates técnico-científica
(MOURA et al, 2011, p. 58).
A partir da década de 70 a temática sobre as cidades médias ganhou espaço no Brasil com
as políticas de desconcentração metropolitana. Tal política surge no planejamento do
território para melhor organizá-lo e as cidades médias emergem como espaços para conter
os fluxos populacionais direcionados em demasia às metrópoles brasileiras. Nas duas
décadas seguintes, com o advento das ideias neoliberais, as novas ideologias do Estado e
do planejamento, as políticas voltadas para este porte de cidades se esvaziaram e
retomaram respectivamente, de acordo com interesse do estado e às estratégias regionais.
O resgate da temática, na década de 90, acompanhou a evolução do conceito de cidade
média. Sposito (2007), em “Cidades médias: espaços em transição”, reuniu uma grande
diversidade de artigos que versam sobre a temática, observando a necessidade de atenção
quanto ao uso das expressões cidade média e cidade de porte médio. Em sua análise,
Spósito (2007) notou ser comum a utilização de ambos os termos como sinônimos, porém
lembrou que o primeiro faz referência “a espaços de intermediação entre as cidades
maiores e as menores, enquanto o segundo relaciona-se ao tamanho demográfico”
(SPOSITO apud MOURA et al, 2011, p. 63). Moura et al (2011, p. 64) coloca que outros
parâmetros poderiam ser listados nesta conceituação (fluxos de relações, séries históricas
de crescimento, entre outros), contudo o “mais fundamental ainda é esclarecer seu papel na
rede urbana” e a sua “funcionalidade”. Para Galinari et al (2006, p.203) uma das
justificativas teóricas que conferem a concentração das atividades econômicas em pontos
específicos dos espaços nacionais, considerando as externalidades urbanas e financeiras,
“(...) é a ideia da existência de forças centrípetas capazes de influenciar a geografia
econômica dos países e que se resumem no termo economias de aglomeração” ou
“economia de regionalização” (WILTGEN, 1991, p.538).
Nesse contexto, os desafios que se apresentam às cidades médias estão nas novas formas
de organização produtiva com a consequente mudança na estruturação territorial. Assim
como as metrópoles, as cidades médias, através de suas estratégias de planejamento,
buscam inserir-se no circuito da acumulação, articulando várias escalas, sobretudo, com as
redes de cidades respectivas (os municípios sob influência), objetivando uma maior
eficácia nas ações de desenvolvimento local. O sistema urbano atinge a escala regional,
assume um protagonismo crescente, passando o potencial competitivo de um território pela
sua configuração, ou seja, estas cidades tornam-se mais atrativas quanto mais polarizadoras
forem.
A noção de polarização está relacionada com o poder de centralidade de determinado local.
Para Pereira et al (2011, p. 07), a centralidade pode se expressar em duas escalas: na
“escala intra-urbana ou escala da cidade, evidenciando as transformações das relações
centro-periferia e a constituição de novas áreas centrais com conteúdos diferenciados no
espaço interno da urbe”; e na “escala interurbana, ou seja, da rede urbana e de um sistema
de cidades que está em articulação, procurando-se compreender o papel da cidade central”.
Sposito (1998, pág. 30) corrobora que a centralidade urbana “pode ser apreendida na escala
interurbana, ou seja, da rede urbana e de um sistema de cidades que está em articulação,
procurando-se compreender o papel da cidade central”.
Pode-se afirmar então, que o centro urbano está presente na maioria das cidades (pequenas,
médias e grandes), uma vez que ele é uma referência de concentração de atividades de
comercialização de bens e serviços, de gestão pública e privada, de lazer e de valores
materiais e simbólicos; enquanto a centralidade é expressão, também, daquelas que, numa
escala regional, desempenham um importante papel de oportunidades, conhecimento,
negócios, serviços e comércios, concentrando espacialmente diversas atividades e meios de
produção que interferem na dinâmica econômica de uma região.
Do ponto de vista do mercado consumidor, as cidades médias continuam a desempenhar o
papel de polos para os quais moradores de cidades menores e de áreas rurais estão
dispostos a se deslocar em virtude da diminuição do tempo para esses deslocamentos,
diante das melhorias dos transportes com o aumento de veículos próprios, bem como a
frequência das viagens propiciadas pelo sistema de transporte coletivo (SAMPAIO, 2011,
pág. 09). Esses fluxos definem assim, no âmbito da região, a existência de um espaço de
continuidade territorial cuja configuração é a de uma área – uma região de influência
(dissolução dos limites físicos territoriais). Os mesmos fatores que definem o poder de
centralidade de um local, também orientam a alocação e hierarquização dos investimentos
públicos e privados. De acordo com os resultados da pesquisa “Dinâmica Urbana dos
Estados”, dentre os critérios adotados para alocação de serviços e equipamentos, tanto
pelos atores institucionais do setor privado quanto do setor público, está o poder
polarizador de uma cidade. Além disso, esta pesquisa identificou que diversos atores
públicos reconheceram também a variável política como uma importante influência na
definição das regionalizações estaduais e da ordem de prioridades na distribuição de alguns
equipamentos públicos (PEREIRA et al, 2011, pág. 47).
No que diz respeito ao discurso, a implantação de empreendimentos é cercado de retóricas
que privilegiam o crescimento econômico como promotor do desenvolvimento regional
que, por sua vez, dá o tom à abertura para auto-regulação de suas condições de
implementação, estabelecendo acordos de viabilização que nem sempre são os adequados
para a “região”, exigindo dos governos as adaptações territoriais e normativas para sua
instalação, enquanto a esta escala de atuação está apenas na abrangência de seu público,
sem necessariamente promover qualquer “desenvolvimento” regional planejado e
pactuado.
Dessa forma, a centralidade é elemento crucial para locação de investimentos que, num
critério de exclusão, impede a competição de outros centros menores com esse elemento
tão atrativo para os atores institucionais. A centralidade, juntamente com a especialização
das cidades médias, pode reforçar a atual conjuntura onde o capital exerce transformações
territoriais ainda desconhecidas.
3 JUIZ DE FORA NO CONTEXTO DAS “100 CIDADES BRASILEIRAS COM AS
MELHORES CONDIÇÕES PARA INVESTIMENTOS”2
Juiz de Fora pertence à Região da Zona da Mata Mineira (figura 01), juntamente com
outros 141 Municípios. Esta é composta por 7 microrregiões geográficas (Cataguases, Ubá,
Muriaé, Ponte Nova, Manhauaçu, Viçosa e Juiz de Fora). A Microrregião de Juiz de Fora é
a maior da Zona da Mata, composta pela sua capital – Juiz de Fora - e mais outros 32
municípios (figura 1). Com um total de 516.247 habitantes (IBGE, 2010), o município
apresenta a migração como importante fator para o crescimento populacional do
município, sendo a ferrovia, a rodovia e a industrialização, ao longo de sua história, os
atrativos para consolidação da cidade como um importante entreposto comercial do século
XX.
Nos últimos anos a paisagem urbana de Juiz de Fora passou por mudanças das quais,
muitas foram reflexos do aumento populacional e do desenvolvimento da economia.
Consequentemente, o planejamento urbano e estratégico, tal como é preconizado por
agências multilaterais, passou a fazer parte da cartilha municipal e as suas diretrizes e/ou
estratégias incidiram sobre a cidade. Desse modo, em 1996, surgiu o interesse da Prefeitura
de elaborar um Plano Estratégico devido à implantação de um polo automotivo na cidade,
a Mercedes Benz. A implantação de um grande empreendimento na cidade era vista como
uma oportunidade de se pensar a cidade a partir de vantagens que pudessem alavancar a
criação de empregos, gerar renda, atrair novos negócios e um reforçar seu papel de cidade
polarizadora.
A partir da consultoria especializada da empresa GFE Associats Ltda, presidida por
Manuel de Forn da cidade de Barcelona, o plano estratégico local foi elaborado seguindo a
2 O presente estudo toma emprestado o anuncio de promoção da cidade de Juiz de Fora presente no site
www.juizdeforaconvention.com.br (acesso em 02 de maio de 2012) para título deste capítulo.
mesma metodologia aplicada, por exemplo, aos planos da cidade de Barcelona e Rio de
Janeiro (OLIVEIRA, 2006, p. 75). Ao final, em 2000, foram apresentados 334 projetos que
redundaram em 93 projetos prioritários que definiram e o objetivo central do Plano JF3.
Localização da Microrregião de Juiz de Fora e a Microrregião
Fig. 1 Localização da Microrregião de Juiz de Fora e a Microrregião.
Considerando a análise4 que comparou as propostas do Plano JF com os projetos
implementados até o ano de 2010 e, ainda, considerando a diretrizes elencadas no Plano
Diretor de Desenvolvimento Urbano do município, aprovado no mesmo ano, pode-se
afirmar que enquanto a PDDU/JF trata da política social para organização territorial, o
Plano JF, por sua vez, trata da política econômica. Contudo é o documento do Plano JF
que vem orientando as ações do poder público e privado sobre o território, um modelo de
plano que reflete um novo modo de se planejar as cidades, de caráter empresarial. As
estratégias locacionais organizadas neste plano criaram condições políticas para
implantação de vários projetos de grande envergadura, configurando um município que,
hoje, apresenta “(...) uma série de investimentos em fixos territoriais para atender a
demanda local e regional por negócios, valorização do espaço, ampliação do consumo e
ofertas alternativas de emprego” (MENEZES, 2004, p. 03). Somado a isso, a qualidade de
vida, a forte estrutura do comércio varejista e a logística têm atraído cada vez mais novos
investimentos, ampliando sua rede de serviços e abrigando empreendimentos com maior
densidade tecnológica e as mais diversas corporações econômicas, cenário não assistido no
entorno que compõem sua região.
3 “Elevar Juiz de Fora a novos padrões de referência em serviços de educação e saúde, cultura, equilíbrio
social e qualidade de vida, consolidando seu papel integrador do entorno“(PMJF, 2001). 4 Ver Delgado (2012, p. 51-60).
4 RECORTE ANALÍTICO TERRITORIAL: Juiz de Fora e sua região de influência
imediata
A tarefa de estudar e identificar os impactos regionais, consequentes do “gerenciamento
empresarial” do município, busca mostrar que algumas políticas e ações estratégicas
desenvolvidas para tal município sustentam a ideia de “guerra entre lugares” (SANTOS,
1996) em sua própria região5, atribuindo-lhe o caráter da injustiça, sobretudo, quando
diante de pequenos municípios.
Este trabalho buscou critérios que permitissem realizar mediações teórica – pesquisa já
realizada – e histórica – análise de dados – que melhor determinassem e especificassem
uma “região”. O reconhecimento desses impactos antecedeu, necessariamente, a
identificação da área de influência da cidade média em estudo e, posteriormente, pela
identificação dos municípios que possuem relações mais estreitas com Juiz de Fora, no que
tange às ligações espaciais já estabelecidas pelos moradores de outros municípios com as
funções desempenhadas por tal município - educação, serviços, renda, lazer e cultura – e as
articulações intermunicipais existentes, tais como consórcios e associações.
Nesse sentindo, primeiramente, esta análise partiu da delimitação da região de influência
definida na pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA -,
intitulado “Rede de Influência das Cidades”– REGIC (IBGE, 2007), que fundamenta o
ponto de partida para um recorte espacial mais aproximado. Posteriormente, a análise
avançou para identificação das articulações intermunicipais existentes entre Juiz de Fora e
outros municípios. Foram identificadas quatro articulações intermunicipais com a
participação direta ou indireta – apenas como sede – de Juiz de Fora: Consórcio
Intermunicipal da Zona da Mata e Campos das Vertentes de Minas Gerais, Consórcio
Intermunicipal para Proteção e Recuperação Ambiental da Bacia do Rio Paraibuna –
CONPAR -, Consórcio Intermunicipal de Saúde Pé da Serra e Associação dos Municípios
Micro Região Vale Paraibuna – AMPAR. Além desses, considerou-se como relevante para
o trabalho as atividades desempenhadas pela EMATER – Empresa de assistência técnica e
extensão rural -, que, apesar de não se configurar como uma associação ou consórcio,
apresenta importante papel no setor agrícola dos municípios do entorno juiz-forano e tem a
sua unidade regional instalada em Juiz de Fora.
A partir dessas identificações, foi realizada a sobreposição das diversas articulações
espaciais encontradas, somada com a delimitação primária definida a partir da análise da
Região de Influência de Juiz de Fora. Desta sobreposição, o resultado da intersecção dos
municípios – apenas aqueles que participam da maioria, senão, todas as articulações -
mostrou-se como o que melhor representa a “região” de maior interatividade com Juiz de
Fora ou de influência imediata, uma vez que as ações entre estes municípios e a cidade
média os aproximam e estreitam relações que se estendem a população, desvendando,
assim, a ambivalência que envolve o caráter relacional do espaço regional, destituindo a
simples caracterização dele através dos limites físicos e políticos, e estendendo-o para
perspectiva do espaço das ações.
O “recorte espacial”, definido por este resultado, demonstra, assim, o espaço que, nas
práticas do desenvolvimento de políticas e ações dos mais diversos interesses, está
efetivamente regionalizado por Juiz de Fora, definindo assim, a região imediata que
5 Não foi objeto do trabalho aprofundar a discussão sobre o uso do termo “Região”, o uso do termo indica os
“recortes espaciais” que serão identificados de acordo com a metodologia proposta.
permitiu a seleção dos municípios para leitura qualitativa dos impactos regionais. Tal
região de influência imediata conta com cidades muito pequenas, que se caracterizam pela
extrema dependência do quórum regional e, em sua maioria, pela expressiva perda de
recursos econômicos e de população nos últimos anos (MACHADO, 2007, p. 02).
O expressivo crescimento de Juiz de Fora não é o mesmo encontrado em seu entorno.
Analisando os dados relativos aos censos de 1991, 2000 e 2010, dos municípios
identificados como pertencentes à região de influência imediata de Juiz de Fora (tabela 1 -
Fonte: dados do IBGE 1991, 2000 e 2010), observa-se que 3 (três) deles apresentaram
taxas negativas de crescimento – Belmiro Braga, Rio Preto e Chácara - e 5 (cinco)
apresentaram taxas positivas de crescimento, mas menores do que a identificada em Juiz de
Fora – 33%.
Tabela 1 Crescimento populacional de acordo com os censos de 1991, 2000 e 2010. Em
vermelho os municípios que tiveram o crescimento populacional negativo.
Evolução do crescimento populacional
Município 1991 2000 2010
%
Crescimento
de 1991-2010
Belmiro Braga 3.975 3.427 3.403 -14,3
Ewbank da Câmara 3.286 3.608 3.753 14,2
Pedro Teixeira 1.593 1.787 1.785 12,0
Rio Preto 6 7.271 5.142 5.292 -27,2
Santana do Deserto 3.417 3.774 3.860 12,9
Simão Pereira 2.414 2.479 2.537 5,1
Matias Barbosa 10.955 12.323 13.435 22,6
Chácara 3.257 2.370 2.792 -14,2
Juiz de fora 385.996 456.796 516.247 33
De acordo com a Fundação João Pinheiro, a presença de taxas negativas de crescimento
populacional se deve, sobretudo, pela emigração de moradores para, no caso de Minas
Gerais, destinos dentro do próprio estado. Para Machado (1997, p.126), a maior parte dos
municípios da Microrregião de Juiz de Fora vem, historicamente, sofrendo um processo de
diminuição sensível de suas populações que buscam por melhores serviços na cidade polo.
Contudo, esse enfraquecimento populacional tem grandes consequências para economia
local: diminuição do mercado consumidor interno e, também, da atração de investidores
privados; diminuição da arrecadação municipal advinda do Fundo de Participação dos
municípios - FPM, bem como a advinda dos tributos internos – IPTU, ISS -;
enfraquecimento do comércio local; entre outros.
Nesse sentido, considerando importante o desempenho demográfico para o
desenvolvimento econômico e social, sobretudo, dos pequenos municípios, foram
selecionados quatro municípios, sendo dois com as maiores taxas positivas de crescimento
populacional7 – Matias Barbosa e Ewbank da Câmara - e dois com as maiores taxas
6 A perda da população de Rio Preto entre 1991 e 2000 se deu por conta da emancipação de um de seus
distritos em 1995. 7 Para se evitar afirmações absolutas nos resultados das entrevistas, buscou-se selecionar 4 municípios que se
sobressaíram quanto às taxas de crescimento populacional (positivas e negativas), considerando os índices
censitários dos intervalos de 1991 a 2000 e de 2001 a 2010, tendo como marco intermediário desse período a
aprovação do Plano JF.
negativas – Belmiro Braga e Chácara - (figura 2 - Fonte: montagem realizada pela autora),
para leitura dos impactos advindos da gestão estratégica em Juiz de Fora.
Municípios da Região de influência imediata de Juiz de Fora selecionados para análise
Fig. 2 Municípios da Região de influência imediata de Juiz de Fora selecionados para
análise.
5 PLANO JF X RESULTADOS ENCONTRADOS: O reforço da centralidade
programada
Para leitura dos impactos regionais da gestão estratégica sobre o território juiz-forano e de
sua articulação com a retórica do “empresariamento urbano”, foram consideradas algumas
questões que pudessem ser averiguadas e relacionadas aos efeitos desta prática à região de
influência imediata de Juiz de Fora. Tais questionamentos desta política estratégica e dos
empreendimentos a ela relacionados resultam dos efeitos produzidos, dentre outros, pelo
reforço da centralidade de Juiz de Fora evidenciada pelo enfraquecimento econômico do
seu entorno.
Neste viés de desequilíbrios, fica exposta a ausência de articulação ou a desarticulação
entre os municípios imediatamente influenciados por tal cidade média, pois, uma vez que
os empreendimentos urbanos foram concebidos para estruturar economicamente os
interesses locacionais e locais, visando impulsionar a cidade num cenário nacional - senão
internacional, conforme os objetivos do Plano JF -, estariam assim, ignorando o seu
entorno enquanto unidade de planejamento e extraindo dele as vantagens que dinamizam o
seu funcionamento: público e mercado consumidor.
Com efeito, a questão envolve a “guerra entre lugares” na escala regional vista, aqui, de
maneira injusta, uma vez que nem todos os envolvidos possuem as mesmas vantagens
locacionais para lutar de forma igualitária neste contexto. Associado a isso, tem-se as
relações políticas e o poder decisório que uma cidade média – e a sua escala de eleitores –
apresenta para, definitivamente, sair vitoriosa nesta guerra sem, necessariamente, ter
lutado, apenas apresentado as suas armas.
A participação nas entrevistas contou, principalmente com a colaboração dos atuais
gestores dos municípios selecionados8. Os resultados apurados nas entrevistas avançam,
inicialmente, por questões sobre o reconhecimento ou não do cenário de influência e
centralidade em estudo, e, posteriormente, sobre como as articulações regionais favorecem
ou não o diálogo do planejamento na macroescala juntamente com a cidade média de Juiz
de Fora. Para todos os entrevistados, os municípios, os quais eles representam, sofrem
influência de Juiz de Fora devido a fatores como a economia, serviços e equipamentos,
localização, influência política e oferta de empregos.
Quanto às vantagens e desvantagens da influência de Juiz de Fora, a facilidade de
transporte coletivo foi apontada como importante elemento que viabiliza o acesso a cidade
média, sobretudo para aqueles municípios que estão ao longo da BR 040 – Matias Barbosa
e Ewbank da Câmara, onde a oferta de transporte intermunicipal é superior: “O nosso
comércio é fraco e como temos transporte de meia em meia hora, as pessoas não querem
investir aqui para atender apenas 13.000 moradores contra 600.000 de Juiz de Fora. (...)
A facilidade de transporte é uma desvantagem para o nosso comércio” (Prefeito de Matias
Barbosa).
Como consequência da procura por diversos equipamentos em Juiz de Fora, bem como
disponibilidade de linhas de transporte intermunicipal, todos os entrevistados acusaram o
enfraquecimento do comércio local como uma grande desvantagem da influência de tal
cidade média. De acordo com os participantes, o setor terciário local é instável e fraco,
uma vez que seus moradores constantemente vão à Juiz de Fora buscando atendimento em
outros setores e optam por investir na diversidade do comércio encontrada por lá.
Contudo, apesar da proximidade com Juiz de Fora e a disponibilidade de acesso a ela
surgir como uma desvantagem para o desenvolvimento local, por vezes os mesmos fatores
foram apresentados como positivos no que tange ao acesso ao setor de saúde. Nesse
sentindo, ficou claro um conflito de relações, uma vez que Juiz de Fora é causa para o
enfraquecimento do comércio local, mas também é a grande protagonista para aliviar o
setor de saúde dos municípios de sua região.
Durante o exercício de refletir sobre a influência ou não provocada pelos municípios em
análise, entre os entrevistados, observou-se que a linearização do discurso acompanhava
como consequência do tímido desenvolvimento local o esvaziamento do Estado enquanto
promotor e regulador de políticas públicas. De acordo com todos os entrevistados, os
investimentos são orientados para as cidades com representatividade eleitoreira e o Estado
se ausenta diante as demandas dos municípios de pequeno porte: “Não se pode pensar só
em Juiz de Fora, mas todas as decisões são políticas. Quem tem mais eleitores? O que tem
500.000, 400.000 eleitores ou que tem 12.000 eleitores como nós?” (Prefeito de Matias
Barbosa)
Nesses termos, nota-se que Juiz de Fora tem suas funções definidas, não apenas pela
posição geográfica ou mercado econômico, mas também pela importância política e
administrativa que desempenha, compreensão que justifica, para os entrevistados, a
presença de investimentos públicos estaduais nesta cidade, pois consideram o grau de
polarização exercida por ela como estratégica para instalação novos empreendimentos.
8 Luiz Carlos Marques - Prefeito de Matias Barbosa-MG-, Paulo Mendes Soares - Prefeito de Ewbank da
Câmara-MG, Paulo Fernando de Barros – Prefeito de Belmiro Braga-MG – e Jucélio Fernandes de Oliveira –
Prefeito de Chácara-MG.
Quanto às perspectivas, por parte dos entrevistados, no que tange o papel dinamizador e
capitalizador (SAMPAIO, 2011) desempenhado por Juiz de Fora perante a sua região,
buscou-se, sobretudo, a identificação das carências existentes na relação de subordinação
que impera entre os municípios da região de influência imediata da cidade média em
questão. Nesse sentindo, foram colocadas em pauta as articulações regionais existentes, e
quais as ações pactuadas ou em desenvolvimento que consideram a região como unidade
de planejamento.
De acordo com os entrevistados, não existe nenhuma política de planejamento regional,
apesar dos consórcios e associações existentes. Segundo os participantes, de fato, não
existem articulações que visem o desenvolvimento conjunto de ações em prol do
desenvolvimento econômico e social de Juiz de Fora e sua região, seja ela compreendida
como os municípios limítrofes, influenciados, do entorno próximo ou da microrregião:
“Juiz de fora não se articula. Ela olha para si e não pensa no desenvolvimento do entorno.
Ou seja, Juiz de fora cresce, mas a região encolhe” (Prefeito de Ewbank da Câmara).
Com relação ao Plano JF, pode-se afirmar, de acordo com a reflexão dos entrevistados, que
a ausência da cidade média se materializou como uma ação estratégica sobre o território.
Apesar do Plano JF apresentar premissas que envolvem a preocupação com a melhoria da
qualidade de vida de seus moradores e a integração com os municípios do entorno, pode-se
afirmar que, quanto às prioridades de execução de projetos, a municipalidade focou nas
ações que conferem a Juiz de Fora uma posição de competitividade perante sua região.
Constatação reiterada através das entrevistas aplicadas aos gestores dos municípios
analisados anteriormente. A perspectiva da oportunidade de crescimento econômico para
Juiz de Fora desconsidera, de acordo com os entrevistados, a dinâmica própria do espaço
social interno e, ainda mais, a dinâmica do território enquanto região.
Além disso, a inexistência de articulações entre Juiz de Fora e o seu entorno – seja ela com
os limítrofes, com a microrregião ou com qualquer outra configuração que considere os
municípios imediatamente relacionados com a sua dinâmica econômica – revelam os
interesses e o consenso negociado no Plano JF, onde suas premissas dão a ordem subjetiva
aos seus objetivos, mas são os projetos propostos, ora contraditórios, que dão sentindo às
reais intenções do planejamento estratégico.
Quanto ao desenvolvimento regional pactuado, pôde-se concluir que a ausência de
articulações regionais, onde Juiz de Fora coopere nos debates, é, para os participantes, o
principal motivo para o desequilíbrio econômico da região, apontando o planejamento
regional como o principal caminho para mudança de tal cenário. Contudo, para os
entrevistados, a recorrente forma de gestão do território de Juiz de Fora – “estratégias
individualizadas” (Prefeito de Ewbank da Câmara) - demonstra o desinteresse da cidade-
polo em integrar-se à região.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho foi abordada uma importante consequência da globalização no âmbito do
planejamento urbano e regional: o reordenamento dos espaços em busca de capitais e,
como efeito, o crescimento econômico de algumas cidades e o declínio de outras.
A intensificação da dinâmica do crescimento populacional e diversificação dos papeis e
funções que as cidades médias vêm passando a exercer, na rede urbana brasileira, parece
justificar a sua inserção no circuito produtivo e de investimentos capitalizado, além da
priorização de agendas estratégicas. Nesse sentindo, para as cidades médias e sua região
polarizada, a competição entre lugares é travada de forma injusta, diante à incomparável
importância política e econômica que as cidades médias desempenham em seu entorno e a
para o Estado.
Diante dessas condições, a adequação das cidades médias às dinâmicas econômicas atuais
resulta, geralmente, no estabelecimento de estratégias que extraem do entorno polarizado
apenas as vantagens que possam aperfeiçoar seus aparatos competitivos, na indiferença das
complexidades de relações regionais existentes e no consequente distanciamento de sua
função integradora do entorno – e do planejamento regional.
Nesse sentido, pode-se afirmar que dimensão regional da gestão estratégica está
diretamente relacionada, sobretudo para a cidade média de Juiz de Fora e sua região de
influência imediata, à intensificação da desarticulação regional já existente, através do
reforço de sua centralidade que, num primeiro momento, os impactos direcionam-se, nas
diversas ordens, para a economia e à população dos municípios por ela influenciados.
Ressalta-se que o reforço da centralidade não emerge como o único elemento
desestruturador da região, mas como mais um fator que, somado a centralidade histórica de
Juiz de Fora à sua grande importância política na região e a recente gestão estratégica
individualizada sobre o território, faz com que, cada vez mais, Juiz de Fora trilhe o
caminho de desenvolvimento desarticulado do restante da sua região.
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