LE BON, Gustave. Psicologia das Multidões

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    PENSADORES

    COLEO DIRIGIDA POR GRARD LEROUX

    GUSTAVE LE BON

    Psicologia das multides

    TRADUO DE IVONE MOURA DELRAUXTtulo original PSYCHOLOGIE DES FOULES

    Presses Universitaires de France, 1895 Edies Roger Delrau,

    198!, "ara a lngua "ortuguesa

    http://groups.google.com/group/digitalsourcehttp://groups.google.com/group/digitalsource

    A

    TH. RIBOT,Diretor da Revue philosophique,

    Professor de Psicologia no Collge de France,

    Membro do Institu.

    Afetuosa homenagem, !"#T$%& '& BO(.

    http://groups-beta.google.com/group/digitalsourcehttp://groups-beta.google.com/group/digitalsourcehttp://groups-beta.google.com/group/digitalsourcehttp://groups-beta.google.com/group/digitalsource
  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    CONTRACAPA

    !"#T$%& '& BO(PSICOLOGIA DAS MULTIDES

    )&m *ue ideias fundamentais se +o basear as sociedades *ue sucedero - nossa/. Por

    en*uanto, no o 0odemos saber. Mas 0odemos 0re+er *ue tero de contar com um no+o 0oder,1ltimo 0oder soberano da idade moderna2 o 0oder das multid3es. #obre as runas de tantas

    ideias, outrora consideradas +erdadeiras e 45 mortas 6o4e, sobre os destro7os de tantos 0oderes

    sucessi+amente derrubados, este 0oder das multid3es 8 o 1nico *ue se ergue e 0arece

    destinado a absor+er ra0idamente os outros. (o momento em *ue as nossas antigas cren7as

    +acilam e desa0arecem, em *ue os +el6os 0ilares das sociedades desabam, a a7o das multid3es

    8 a 1nica for7a *ue no est5 amea7ada e cu4o 0restgio +ai sem0re aumentando. $ 80oca em *ue

    estamos a entrar ser5, na +erdade, a era das multid3es.9:

    Gustave Le Bon ;

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    INTRODUO

    A ERA DAS MULTIDES

    &+olu7o da 80oca atual. $s grandes transforma73es de ci+iliEa7o so

    conse*uGncia de transforma73es na mentalidade dos 0o+os. $ cren7a moderna no

    0oder das multid3es. &ssa cren7a modifica a 0oltica tradicional dos &stados. Como

    se +erifica a ascenso das classes 0o0ulares e como eercem o seu 0oder.

    Conse*uGncias necess5rias do 0oder das multid3es.$s multid3es s 0odem eercer

    um 0a0el destruti+o. 0or interm8dio delas *ue se com0leta a dissolu7o das

    ci+iliEa73es demasiado +el6as. IgnorJncia generaliEada da 0sicologia das multid3es.

    Im0ortJncia do estudo das multid3es 0ara os legisladores e 6omens de &stado.

    $s grandes altera73es *ue 0recedem a transforma7o das ci+iliEa73es 0arecem, -

    0rimeira +ista, determinadas 0or agita73es 0olticas de im0ortJncia consider5+el2

    in+as3es de 0o+os ou *uedas de dinastias. Mas um estudo atento destes acontecimentos

    re+ela *ue, 0or detr5s das causas a0arentes, a causa real 8, na maior 0arte das +eEes,

    uma transforma7o 0rofunda nas ideias dos 0o+os. $s +erdadeiras altera73es 6istricas

    no so as *ue nos es0antam 0ela grandeEa e +iolGncia. $s 1nicas transforma73es

    decisi+as, as *ue conduEem - reno+a7o das ci+iliEa73es, efetuam?se nas o0ini3es, nasconce073es e nas cren7as. Os acontecimentos memor5+eis so os efeitos +is+eis de

    transforma73es in+is+eis nos sentimentos dos 6omens. & se s raramente se

    manifestam 8 0or*ue o fundo 6eredit5rio dos sentimentos 8 o elemento mais est5+el de

    uma ra7a.

    $ 80oca atual constitui um da*ueles momentos crticos em *ue o 0ensamento

    6umano se encontra em +ias de transforma7o.

    Dois fatores essenciais esto na base dessa transforma7o. O 0rimeiro 8 adestrui7o das cren7as religiosas, 0olticas e sociais de onde deri+am todos os elementos

    da nossa ci+iliEa7o. O segundo 8 a cria7o de condi73es de eistGncia e de 0ensamento

    inteiramente no+as, originadas 0elas modernas descobertas da ciGncia e da ind1stria.

    Como as ideias do 0assado, embora abaladas, so ainda muito 0oderosas, e as

    ideias *ue as de+em substituir se encontram ainda em forma7o, a 80oca moderna

    re0resenta um 0erodo de transi7o e anar*uia.

    (o 8 f5cil diEer?se 6o4e o *ue 0oder5 um dia sair deste 0erodo necessariamente

    um tanto catico. &m *ue ideias fundamentais se +o basear as sociedades *ue

    sucedero - nossa Por en*uanto, no o 0odemos saber. Mas 0odemos 0re+er *ue tero

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    de contar, ao organiEarem?se, com um no+o 0oder, 1ltimo 0oder soberano da idade

    moderna2 o 0oder das multid3es. #obre as runas de tantas ideias, outrora consideradas

    +erdadeiras e 45 mortas 6o4e, sobre os destro7os de tantos 0oderes sucessi+amente

    derrubados, este 0oder das multid3es 8 o 1nico *ue se ergue e 0arece destinado a

    absor+er ra0idamente os outros. (o momento em *ue as nossas antigas cren7as +acilame desa0arecem, em *ue os +el6os 0ilares das sociedades desabam, a a7o das multid3es

    8 a 1nica for7a *ue no est5 amea7ada e cu4o 0restgio +ai sem0re aumentando. $ 80oca

    em *ue estamos a entrar ser5, na +erdade, a era das multid3es.

    H5 a0enas um s8culo, a 0oltica tradicional dos &stados e as ri+alidades dos

    0rnci0es constituam os 0rinci0ais fatores dos acontecimentos. (a maioria dos casos, a

    o0inio das multid3es nada conta+a. Ho4e, so as tradi73es 0olticas, as tendGncias

    0essoais dos soberanos e as suas ri+alidades *ue 0ouca im0ortJncia tGm. $ +oE dasmultid3es tornou?se 0re0onderante. ela *ue dita aos reis a sua conduta. Os destinos

    das na73es no se 4ogam 45 nos consel6os dos 0rnci0es, mas sim na alma das multid3es.

    $ ascenso das classes 0o0ulares - +ida 0oltica, a sua transforma7o 0rogressi+a

    em classes dirigentes, 8 uma das caractersticas mais salientes desta 80oca de transi7o.

    (o foi o sufr5gio uni+ersal, to 0ouco influente durante tanto tem0o e to f5cil de

    controlar no seu come7o, *ue determinou essa ascenso. O 0oder das multid3es

    desen+ol+eu?se a 0artir da 0ro0aga7o de certas ideias *ue, gradualmente, se a0ossaram

    dos es0ritos, e, de0ois, gra7as - associa7o cada +eE maior de indi+duos com o fim de

    0Kr em 0r5tica conce073es *ue, at8 ento, a0enas tin6am sido formuladas teoricamente.

    Foi atra+8s dessa associa7o *ue as multid3es come7aram a formar ideias sobre os seus

    interesses, *ue, embora no fossem muito 4ustas, eram decerto bastante firmesL

    come7aram ao mesmo tem0o a ter consciGncia da sua for7a. Fundam sindicatos 0erante

    os *uais todos os 0oderes ca0itulamL bolsas de trabal6o *ue, a0esar das leis econKmicas,

    tendem a reger as condi73es de trabal6o e de sal5rio. &n+iam -s assembleias

    go+ernati+as re0resentantes destitudos de *ual*uer iniciati+a e inde0endGncia, *ue se

    limitam *uase sem0re a serem os 0orta??+oEes das comiss3es *ue os escol6eram.

    Ho4e, as rei+indica73es das multid3es tomam?se cada +eE mais definidas e

    0rocuram destruir de alto a baio a sociedade atual, 0ara a reconduEirem ao comunismo

    0rimiti+o *ue foi o estado normal de todos os gru0os 6umanos antes da aurora da

    ci+iliEa7o. Tais rei+indica73es so a redu7o das 6oras de trabal6o, a e0ro0ria7o das

    minas, dos camin6os?de?ferro, das f5bricas e do solo, a distribui7o igualit5ria dos

    0rodutos, a elimina7o das classes su0eriores em benefcio das classes 0o0ulares, etc.

    Pouco dadas ao raciocnio, as multid3es mostram?se, em contra0artida, muito

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    a0tas 0ara a a7o. $ organiEa7o atual torna 0oderosa a sua for7a. Os dogmas, *ue 6o4e

    +emos surgir, de0ressa 6o de ter o 0oder dos +el6os dogmas e ficaro in+estidos da

    for7a tirJnica e soberana *ue os colocar5 ao abrigo de *ual*uer discusso. $ssim o

    direito di+ino das multid3es substitui o direito di+ino dos reis.

    Os escritores *ue goEam dos fa+ores da nossa burguesia e *ue, 0or isso, mel6orre0resentam as suas ideias um tanto estreitas, as suas +istas um tanto curtas, o seu

    ceticismo um tanto sum5rio e o seu egosmo 0or +eEes ecessi+o, sentem?se

    0erturbados com o no+o 0oder *ue se ergue diante deles e, 0ara combater a desordem

    dos es0ritos, dirigem a0elos deses0erados -s for7as morais da Igre4a, *ue dantes tanto

    tin6am desden6ado. Falam de bancarrota da ciGncia e lembram?nos os ensinamentos das

    +erdades re+eladas. &stes no+os con+ersos es*uecem, 0or8m, *ue, se a gra7a, na

    +erdade, os iluminou a eles, 45 no ter5 o mesmo 0oder sobre as almas fec6adas aosa0elos da transcendGncia. $s multid3es, 6o4e, no *uerem saber dos deuses *ue os seus

    sen6ores de ontem renegaram e a4udaram a derrubar. Os rios no correm 0ara as

    nascentes.

    $ ciGncia no sofreu *ual*uer bancarrota e nada tem a +er com a atual anar*uia

    dos es0ritas nem com o no+o 0oder *ue se ergue no meio desta anar*uia. $ ciGncia

    0rometeu?nos a +erdade ou, 0elo menos, o con6ecimento das rela73es acess+eis - nossa

    inteligGncia, nunca nos 0rometeu a 0aE nem a felicidade. #oberanamente indiferente aos

    nossos sentimentos, no ou+e as nossas *ueias e nada nos 0oder5 restituir as ilus3es

    *ue, 0or causa dela, fomos 0erdendo.

    #intomas uni+ersais re+elam?nos, em todas as na73es, o r50ido crescimento do

    0oder das multid3es. #e4a o *ue for *ue ele nos traga, seremos obrigados a su0ort5?lo.

    $s recrimina73es no 0assam de 0ala+ras +s. $ ascenso das multid3es marcar5 tal+eE

    uma das derradeiras eta0as das nossas ci+iliEa73es do Ocidente, um regresso -*ueles

    0erodos de anar*uia confusa *ue sem0re 0recedem o desabroc6ar de no+as sociedades.

    Mas como 0oderemos im0edi?lo

    $t8 a*ui, as grandes destrui73es de ci+iliEa73es en+el6ecidas constituram a

    fun7o mais e+idente das multid3es. $ 6istria ensina?nos *ue, no momento em *ue as

    for7as morais *ue so o fundamento das sociedades 0erderam o seu domnio, as

    multid3es inconscientes e brutais, 4ustamente *ualificadas de b5rbaras, encarregam?se

    de realiEar a dissolu7o final. $t8 agora, as ci+iliEa73es tGm sido criadas e guiadas 0or

    uma 0e*uena aristocracia intelectual mas nunca 0elas multid3es. &ssas, s tGm 0oder

    0ara destruir. O seu domnio re0resenta sem0re uma fase de desordem. "ma ci+iliEa7o

    im0lica regras fias, disci0lina, a 0assagem do instinti+o 0ara o racional, a 0re+iso do

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    futuro, um grau ele+ado de cultura, condi73es estas totalmente inacess+eis -s

    multid3es *uando abandonadas a si mesmas. Pelo seu 0oder unicamente destruti+o, elas

    agem corno a*ueles micrbios *ue ati+am a dissolu7o dos cor0os debilitados ou dos

    cad5+eres. #em0re *ue o edifcio de uma ci+iliEa7o est5 carcomido, so as multid3es

    *ue 0ro+ocam o seu desmoronamento. ento *ue desem0en6am o seu 0a0el. &, 0orum momento, a for7a cega do n1mero torna?se a 1nica filosofia da 6istria.

    #er5 tamb8m isto *ue +ai acontecer - nossa ci+iliEa7o o *ue 0odemos recear

    mas *ue, 0or ora, 8 im0oss+el saber.

    Resignemo?nos e su0ortemos o domnio das multid3es, 45 *ue mos

    im0re+identes foram sucessi+amente derrubando todas as barreiras *ue ainda as

    0odiam conter.

    &ssas multid3es, de *ue 6o4e tanto se come7a a falar, con6ecemo?las ainda muitomal. Os 0siclogas 0rofissionais +i+eram afastados delas, sem0re as ignoraram e, *uando

    delas se ocu0aram, foi a0enas 0ara se debru7arem sobre os crimes *ue elas 0odem

    cometer. (o 65 d1+ida *ue eistem multid3es criminosas, mas 65 tamb8m as multid3es

    +irtuosas, as multid3es 6eroicas e tantas outras. Os crimes das multid3es so a0enas um

    caso 0articular da sua 0sicologia e, atra+8s deles, no 0odemos con6ecer a sua

    constitui7o mental, tal como no 0odemos con6ecer um indi+duo a0enas 0ela

    descri7o dos seus +cios.

    $ bem diEer, os sen6ores do mundo, os fundadores de religi3es e de im08rios, os a0stolos de

    todas as cren7as, os 6omens de &stado eminentes e, numa esfera mais modesta, os sim0les dirigentes de

    0e*uenas coleti+idades 6umanas, sem0re foram 0siclogos inconscientes *ue 0ossuam um con6ecimento

    instinti+o, mas muitas +eEes bastante eato, da alma das multid3es. & 0or a con6ecerem bem 8 *ue

    facilmente se tornaram os seus sen6ores. (a0oleo com0reendia mara+il6osamente a alma das multid3es

    francesas mas, 0or +eEes, mostra+a total ignorJncia *uanto -s multid3es dos outros 0o+os

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    im0ression5?las 0ara as seduEir. #e um legislador *uiser, 0or eem0lo, lan7ar um no+o

    im0osto, de+er5 o0tar 0elo *ue 8 teoricamente mais 4usto De maneira nen6uma. O mais

    in4usto 0ode ser, na 0r5tica, o mel6or 0ara as multid3es se for o menos 0erce0t+el e,

    a0arentemente, o menos 0esado. 0or isso *ue um im0osto indireto, mesmo *uando 8

    eorbitante, 8 sem0re facilmente aceite 0ela multido. Como 8 0ago, em 0e*uenasfra73es, nos ob4etos de consumo di5rio, no c6ega a 0erturbar os 65bitos nem causa

    im0resso. Mas se o substituirmos 0or um im0osto 0ro0orcional sobre os sal5rios, ou

    outros rendimentos, 0ara ser 0ago de uma s +eE, le+anta?se imediatamente um coro de

    0rotestos, ainda *ue o no+o im0osto se4a deE +eEes menos 0esado do *ue o outro. (este

    caso, em +eE das 0e*uenas fra73es in+is+eis, 0agas dia a dia, torna?se necess5rio

    des0ender uma no+a soma, relati+amente ele+ada, *ue, 0or isso mesmo, 0arece

    im0ressionante. # 0assaria des0ercebida se ti+esse sido 0osta de 0arte aos 0oucos, masesse 0rocedimento im0lica uma dose de es0rito de 0re+idGncia econKmica de *ue as

    multid3es so totalmente inca0aEes. O eem0lo to sim0les *ue acab5mos de dar ilustra

    bem a mentalidade das multid3es. &ssa mentalidade no esca0ou a um 0siclogo como

    (a0oleo, mas os legisladores, esses, continuam a no a com0reender 0or*ue nada

    sabem dela. $ e0eriGncia ainda no l6es ensinou *ue os 6omens no se deiam guiar

    0elas 0rescri73es da raEo 0ura.

    $ 0sicologia das multid3es 0ode a0licar?se em cam0os muito di+ersos. O seu

    con6ecimento traE uma luE imensa a numerosos fenKmenos 6istricos e econKmicos

    *ue, sem ela, 0ermaneceriam *uase totalmente inintelig+eis.

    O estudo da 0sicologia das multid3es de+e faEer?se, *uanto mais no se4a, 0or mera curiosidade,

    0ois tem tanto interesse descobrir as moti+a73es das a73es dos 6omens, como estudar um mineral ou uma

    0lanta. O estudo *ue iremos a0resentar da alma das multid3es ser5 necessariamente uma sntese, um

    sim0les resumo das in+estiga73es *ue temos realiEado. Dele a0enas se 0odem es0erar algumas ideias

    sugesti+as. Outros o le+aro mais longe. (s, 6o4e, limitamo?nos a abrir os 0rimeiros sulcos num terreno

    at8 agora ine0lorado

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    me en+iou o seu relatrio, )*ue me deram a solu7o 0ara um 0roblema *ue, at8 agora,

    considera+a insol1+el2 a es0antosa a0tido das multid3es 0ara sentirem uma obra

    musical, recente ou antiga, nacional ou estrangeira, sim0les ou com0licada, desde *ue

    se4a a0resentada numa boa eecu7o, com artistas dirigidos 0or maestro entusiasta.:

    !e+aert demonstra admira+elmente 0or*ue 8 *ue )uma obra, *ue no foi com0reendida0or m1sicos not5+eis *ue leram a 0artitura no isolamento dos seus gabinetes, 8 0or

    +eEes imediatamente a0reendida 0or um auditrio al6eio a toda a cultura t8cnica:.

    &0lica tamb8m claramente as raE3es 0elas *uais estas im0ress3es est8ticas no deiam

    *uais*uer +estgios.

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    LIVRO I - A ALMA DAS MULTIDES

    CAPTULO I

    CARACTERSTICAS GERAIS DAS MULTIDES, LEI PSICOLGICA DA SUA UNIDADE

    MENTAL

    O *ue, do 0onto de +ista 0sicolgico, constitui uma multido. "ma

    aglomera7o numerosa de indi+duos no c6ega 0ara formar uma multido.

    Caractersticas es0eciais das multid3es 0sicolgicas. Orienta7o fia das ideias e dos

    sentimentos nos indi+duos *ue as com03em e a0agamento da sua 0ersonalidade. $

    multido 8 sem0re dominada 0elo inconsciente. Desa0arecimento da +ida cerebral e

    0redominJncia da +ida medular. Diminui7o da inteligGncia e transforma7o com0leta

    dos sentimentos. Os sentimentos transformados 0odem ser mel6ores ou 0iores do

    *ue os dos indi+duos *ue constituem a multido. $ multido toma?se to facilmente

    6eroica como criminosa.

    (o sentido comum, a 0ala+ra multido significa um con4unto de indi+duos, se4a

    *ual for a sua nacionalidade, 0rofisso ou seo, e inde0endentemente das circunstJncias

    *ue os re1nem.Do 0onto de +ista 0sicolgico, a 0ala+ra multido tem um sentido totalmente

    diferente. &m determinadas circunstancias, e a0enas nessas, um agru0amento de

    indi+duos ad*uire caracteres no+os, bem di+ersos dos caracteres de cada um dos

    indi+duos *ue o com03em. $ 0ersonalidade consciente des+anece?se e os elementos e

    as ideias de todas as unidades so orientados numa dire7o 1nica. Forma?se uma alma

    coleti+a, sem d1+ida transitria, mas *ue a0resenta caracteres bem definidos. $

    coleti+idade transforma?se ento no *ue, - falta de e0resso mais ade*uada, c6amareiuma multido organiEada ou, se 0referirem, uma multido 0sicolgica. Passa a constituir

    um ser 1nico e fica submetida - lei da unidade mental das multid3es.

    O fato de muitos indi+duos se encontrarem ocasionalmente lado a lado no l6es

    confere os caracteres de uma multido organiEada. &feti+amente, mil indi+duos

    reunidos ao acaso numa 0ra7a 01blica, sem *ual*uer fim determinado, no constituem

    de modo algum uma multido 0sicolgica. Para ad*uirirem caracteres es0ecficos 8

    necess5ria a influGncia de certos ecitantes cu4a natureEa iremos determinar.O desa0arecimento da 0ersonalidade consciente e a orienta7o dos sentimentos

    e dos 0ensamentos num mesmo sentido, 0rimeiras caractersticas da multido *ue se

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    organiEa, nem sem0re im0licam a 0resen7a simultJnea de +5rios indi+duos no mesmo

    lugar. Mil6ares de indi+duos se0arados 0odem, em dado momento, sob a influGncia de

    certas emo73es +iolentas, 0or eem0lo de um grande acontecimento nacional, ad*uirir

    os caracteres de uma multido 0sicolgica. Bastar5 *ue um acaso *ual*uer os re1na,

    0ara *ue a sua conduta ad*uira imediatamente as caractersticas es0eciais dos atos dasmultid3es. &m certos momentos da 6istria, uma meia d1Eia de 6omens 0ode constituir

    uma multido 0sicolgica, ao 0asso *ue centenas de indi+duos reunidos acidentalmente

    0odem no a constituir. Por outro lado, um 0o+o inteiro, sem *ue 6a4a aglomera7o

    +is+el, 0ode 0or +eEes, em conse*uGncia de determinada influGncia, tornar?se uma

    multido.

    $ multido 0sicolgica, logo *ue se constitui, ad*uire caracteres gerais

    0ro+isrios mas bem determin5+eis. $ estes caracteres gerais +o 4untar?se caracteres0articulares, *ue +ariam conforme os elementos *ue com03em a multido e *ue 0odem

    modificar?l6e a estrutura mental.

    $s multid3es 0sicolgicas so, 0ois, susce0t+eis de classifica7o e o estudo dessa

    classifica7o ir5 mostrar?nos *ue uma multido 6eterogGnea, com0osta de elementos

    dissemel6antes, e as multid3es 6omogGneas, com0ostas de elementos mais ou menos

    semel6antes ;castas, seitas e classes, a0resentam caracteres comuns e, ao lado deles,

    caracteres 0articulares *ue 0ermitem diferenci5?las.

    $ntes de tratarmos dos diferentes ti0os de multid3es, iremos eaminar os

    caracteres *ue so comuns a todas elas. Procederemos como o naturalista *ue come7a

    0or determinar os caracteres gerais dos indi+duos de uma famlia e, s de0ois, trata dos

    caracteres 0articulares *ue 0ermitem diferenciar os gGneros e as es08cies *ue integram

    essa famlia.

    $ alma das multid3es no 8 f5cil de descre+er 0or*ue a sua organiEa7o +aria, no

    a0enas conforme a ra7a e a com0osi7o das coleti+idades, mas tamb8m de acordo com a

    natureEa e o grau dos estmulos a *ue esto su4eitas. $li5s, surge?nos esta mesma

    dificuldade *uando encetamos o estudo 0sicolgico de *ual*uer indi+duo. (os

    romances 8 *ue os indi+duos se a0resentam com um car5ter constante, mas na +ida real

    isso no acontece. # a uniformidade dos meios gera a uniformidade a0arente dos

    caracteres. N5 ti+e ocasio de 0ro+ar *ue todas as constitui73es mentais 0ossuem

    +irtualidades caracterolgicas *ue se 0odem re+elar sob a influGncia de uma brusca

    mudan7a de meio. Foi assim *ue, entre os mais feroEes )Con+encionais: da Re+olu7o

    Francesa, se encontraram inofensi+os burgueses *ue, em circunstJncias normais, teriam

    sido 0acficos not5rios ou +irtuosos magistrados. Passada a tem0estade, retomaram o

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    seu car5ter normal e (a0oleo encontrou neles os seus mais dceis ser+idores.

    Como no 0odemos estudar a*ui todas as eta0as da forma7o das multid3es,

    iremos eamin5?las sobretudo na fase da sua 45 com0leta organiEa7o. %eremos a*uilo

    *ue 0odem ser, mas no a*uilo *ue 45 so. a0enas nesta fase 45 adiantada de

    organiEa7o *ue, ao fundo in+ari5+el e dominante da ra7a, se sobre03em certoscaracteres no+os e es0ecficos *ue orientam numa dire7o 1nica todos os sentimentos e

    0ensamentos da coleti+idade. # ento se manifesta a lei 0sicolgica da unidade mental

    das multid3es, *ue 45 ti+e ocasio de mencionar. Certos caracteres 0sicolgicos das

    multid3es so comuns aos dos indi+duos isoladosL outros, 0elo contr5rio, s se

    encontram nos agru0amentos. #o esses caracteres es0eciais *ue iremos estudar

    0rimeiramente, a fim de real7armos a sua im0ortJncia.

    O *ue 65 de mais im0ressionante numa multido 8 o seguinte2 *uais*uer *uese4am os indi+duos *ue a com03em, se4am *uais forem as semel6an7as ou diferen7as no

    seu gGnero de +ida, nas suas ocu0a73es, no seu car5ter ou na sua inteligGncia, o sim0les

    fato de constiturem uma multido concede?l6es uma alma coleti+a. &sta alma f5?los

    sentir, 0ensar e agir de uma maneira diferente do modo como sentiriam, 0ensariam e

    agiriam cada um isoladamente. Certas ideias, certos sentimentos s surgem e se

    transformam em atos nos indi+duos em multido. $ multido 0sicolgica 8 um ser

    0ro+isrio, com0osto de elementos 6eterogGneos *ue, 0or momentos, se uniram, tal

    como as c8lulas *ue se unem num cor0o no+o formam um ser *ue manifesta caracteres

    bem diferentes da*ueles *ue cada uma das c8lulas 0ossui.

    Contrariamente - o0inio de um filsofo to arguto como Herbert #0encer, no

    agregado *ue constitui uma multido no encontramos de modo algum uma soma ou

    uma m8dia dos seus elementos, mas sim uma combina7o e cria7o de caracteres no+os.

    Tal como na *umica, certos elementos, 0ostos em 0resen7a uns dos outros, as bases e

    os 5cidos 0or eem0lo, combinam?se 0ara formarem um cor0o no+o dotado de

    0ro0riedades diferentes das dos cor0os *ue entraram na sua com0osi7o.

    f5cil +erificar como o indi+duo em multido difere do indi+duo isoladoL mas 45

    as causas *ue do origem a tal diferen7a so mais difceis de determinar. Para as

    0odermos 0elo menos entre+er 8 necess5rio, 0rimeiro, ter 0resente esta obser+a7o da

    0sicologia moderna2 no 8 somente na +ida orgJnica, mas tamb8m no funcionamento da

    inteligGncia, *ue os fenKmenos inconscientes desem0en6am um 0a0el 0re0onderante. $

    +ida consciente do es0rito re0resenta a0enas uma 0e*uena 0arte com0arada com a +ida

    inconsciente. O mais 65bil analista ou o mais 0ers0icaE obser+ador no consegue

    descobrir seno um 0e*ueno n1mero de moti+a73es. Os nossos atos conscientes

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    0ro+Gm de um substrato inconsciente constitudo sobretudo de influGncias 6eredit5rias.

    &ste substrato cont8m os inumer5+eis resduos ancestrais *ue constituem a alma da

    ra7a. Por detr5s das causas confessadas dos nossos atos, encontram?se sem0re causas

    secretas, *ue ns 0r0rios ignoramos. $ maioria das nossas a73es *uotidianas so a

    conse*uGncia dos moti+os ocultos *ue esca0am - nossa consciGncia. sobretudo 0elos elementos inconscientes *ue formam a alma de uma ra7a *ue

    todos os indi+duos dessa ra7a se assemel6am, e 8 0elos elementos conscientes,

    resultantes da educa7o mas, 0rinci0almente, de uma 6ereditariedade ece0cional, *ue

    eles se distinguem. Homens com0letamente diferentes 0ela sua inteligGncia tGm

    instintos, 0ai3es e sentimentos 0or +eEes idGnticos. Mesmo os 6omens mais eminentes

    raramente ultra0assam o n+el dos indi+duos +ulgares em tudo o *ue se4a mat8ria de

    sentimento2 religio, 0oltica, moral, afei73es, anti0atias, etc. &ntre um matem5ticoc8lebre e o seu sa0ateiro 0oder5 eistir um abismo do 0onto de +ista intelectual, mas

    *uanto ao car5ter e -s cren7as de cada um a diferen7a 8 muitas +eEes nula ou muito

    0e*uena.

    Ora so estas *ualidades gerais do car5ter, regidas 0elo inconsciente e 0ossudas

    *uase no mesmo grau 0ela maioria dos indi+duos normais de uma ra7a, *ue se

    encontram em comum nas multid3es. (a alma coleti+a desa0arecem as a0tid3es

    intelectuais dos 6omens e, 0or conse*uGncia, as suas indi+idualidades. O 6omogGneo

    absor+e o 6eterogGneo e as *ualidades inconscientes 0assam a dominar.

    esta comunidade de *ualidades +ulgares *ue e0lica *ue as multid3es no

    0ossam realiEar atos *ue ei4am uma inteligGncia ele+ada. $s decis3es de interesse geral

    tomadas 0or uma assembleia de 6omens distintos, mas com diferentes es0ecialidades,

    no so sensi+elmente su0eriores -s decis3es tomadas 0or um gru0o de imbecis, 0ois

    esses 6omens s conseguem associar *ualidades medocres *ue toda a gente 0ossuiL as

    multid3es no 0odem acumular a inteligGncia mas somente a mediocridade. (o 8 toda

    a gente, como muitas +eEes se re0ete, *ue tem mais es0rito do *ue %oltaire, mas sim

    %oltaire *ue tem com certeEa mais es0rito do *ue toda a gente, se este )toda a gente:

    re0resenta as multid3es.

    Toda+ia, se os indi+duos em multido se limitassem a tornar comuns as suas

    *ualidades +ulgares, estabelecer?se?ia a0enas uma m8dia e no 6a+eria, como 45

    dissemos, a cria7o de no+os caracteres. Como se criam ento esses caracteres o *ue

    tentaremos agora descobrir.

    #o di+ersas as causas *ue determinam a a0ari7o de caracteres es0eciais nas

    multid3es. $ 0rimeira 8 *ue o indi+duo em multido ad*uire, 0elo sim0les fato do seu

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    n1mero, um sentimento de 0oder in+enc+el *ue l6e 0ermite ceder a instintos *ue, se

    esti+esse soEin6o, teria for7osamente re0rimido. & ceder5 tanto mais facilmente *uanto,

    0or a multido ser anKnima e 0or conse*uGncia irres0ons5+el, mais com0letamente

    desa0arece o sentimento de res0onsabilidade *ue sem0re ret8m os indi+duos.

    $ segunda causa, o cont5gio mental, inter+8m igualmente 0ara determinar nasmultid3es a manifesta7o de caracteres es0eciais e, ao mesmo tem0o, a sua orienta7o.

    O cont5gio mental 8 um fenKmeno f5cil de obser+ar mas *ue, at8 6o4e, ainda no foi

    e0licado e *ue 8 0reciso relacionar com os fenKmenos de car5ter 6i0ntico *ue iremos

    agora estudar. (uma multido, todos os sentimentos, todos os atos so contagiosos e

    so?no a 0onto de o indi+duo sacrificar facilmente o seu interesse 0essoal ao interesse

    coleti+o. Trata?se de uma a0tido *ue 8 contr5ria - natureEa do 6omem e de *ue ele s 8

    ca0aE *uando faE 0arte de uma multido."ma terceira causa, e de longe a mais im0ortante, o 0oder de sugesto, determina

    nos indi+duos em multido caracteres es0eciais *ue so 0or +eEes bastante o0ostos aos

    do indi+duo isolado. $li5s o cont5gio mental, 45 referido acima, no 0assa de um efeito

    desse 0oder da sugesto.

    Para com0reender este fenKmeno 8 necess5rio ter bem 0resentes algumas

    descobertas recentes da fisiologia. #abemos 6o4e *ue um indi+duo 0ode ser 0osto num

    estado em *ue, 0erdida a sua 0ersonalidade consciente, obedece a todas as sugest3es

    do o0erador *ue l6a feE 0erder e comete atos totalmente contr5rios ao seu car5ter e

    aos seus 65bitos. Obser+a73es cuidadosas 0arecem 0ro+ar *ue o indi+duo mergul6ado

    durante algum tem0o no seio de uma multido em ati+idade, e em conse*uGncia dos

    efl1+ios *ue dela se des0rendem, ou 0or *ual*uer outra causa ainda descon6ecida,

    de0ressa se encontra num estado caracterstico *ue muito se assemel6a com o estado

    de fascina7o do 6i0notiEado nas mos do 6i0notiEador.

    #endo 0aralisada a +ida do c8rebro no 6i0notiEado, ele torna?se escra+o de todas

    as suas ati+idades inconscientes, *ue o 6i0notiEador orienta como *uer. $ 0ersonalidade

    consciente desa0areceL a +ontade e o discernimento ficam anulados. Os 0ensamentos e

    sentimentos so ento dirigidos no sentido determinado 0elo 6i0notiEador.

    este, mais ou menos, o estado em *ue se encontra o indi+duo integrado numa

    multido. (o tem consciGncia dos seus atos. (ele, tal como no 6i0notiEado, ao mesmo

    tem0o *ue certas faculdades so destrudas, outras 0odem ser le+adas a um grau de

    etrema ealta7o. #ob a influGncia de uma sugesto, esse indi+duo 0ode lan7ar?se com

    irresist+el im0etuosidade na eecu7o de certos atos. Tal im0etuosidade 8 ainda mais

    irresist+el nas multid3es do *ue no indi+duo 6i0notiEado, 0or*ue, como a sugesto 8

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    igual 0ara todos os indi+duos, ao tornar?se rec0roca, am0lia?se. Os indi+duos de uma

    multido *ue 0ossuem uma 0ersonalidade bastante forte 0ara resistirem - sugesto so

    em n1mero to diminuto *ue acabam 0or ser arrastados 0ela corrente. Podem, *uando

    muito, tentar des+iar?l6e o curso faEendo uma sugesto diferente e, 0or +eEes, uma

    0ala+ra ade*uada ou uma imagem e+ocada a 0ro0sito 45 tGm conseguido e+itar *ue asmultid3es cometam atos sanguin5rios.

    O desa0arecimento da 0ersonalidade consciente, o 0redomnio da 0ersonalidade

    inconsciente, a orienta7o num mesmo sentido, 0or meio da sugesto e do cont5gio, dos

    sentimentos e das ideias, a tendGncia 0ara transformar imediatamente em atos as ideias

    sugeridas, so, 0ortanto, os 0rinci0ais caracteres do indi+duo em multido. Deia de ser

    ele 0r0rio 0ara se tornar um autKmato sem +ontade 0r0ria.

    # 0elo fato de 0ertencer a uma multido, o 6omem desce +5rios graus na escalada ci+iliEa7o. Isolado seria tal+eE um indi+duo cultoL em multido 8 um ser instinti+o,

    0or conse*uGncia, um b5rbaro. Possui a es0ontaneidade, a +iolGncia, a ferocidade e

    tamb8m o entusiasmo e o 6erosmo dos seres 0rimiti+os e a eles se assemel6a ainda 0ela

    facilidade com *ue se deia im0ressionar 0elas 0ala+ras e 0elas imagens e se deia

    arrastar a atos contr5rios aos seus interesses mais elementares. O indi+duo em multido

    8 um gro de areia no meio de outros gros *ue o +ento arrasta a seu bel?0raEer.

    $ssim se e0lica *ue certos 41ris formulem +eredictos *ue cada 4urado

    indi+idualmente re0ro+aria e *ue assembleias 0arlamentares a0ro+em leis e medidas

    *ue cada um dos membros *ue as com03em re0udiaria. Tomados se0aradamente, os

    6omens da Con+en7o eram burgueses de 65bitos 0acficos. $gru0ados em multido,

    no 6esitaram, influenciados 0or alguns c6efes, em mandar 0ara a guil6otina indi+duos

    manifestamente inocentesL mais ainda, contrariamente a todos os seus interesses,

    renunciaram - 0r0ria in+iolabilidade e diEimaram?se. (o 8 a0enas 0elos seus atos *ue

    o indi+duo em multido se torna diferente de si 0r0rio. N5 antes de ter 0erdido toda a

    inde0endGncia, as suas ideias e os seus sentimentos se tin6am transformado, faEendo do

    a+arento um 0rdigo, do c8tico um crente, do 6omem 6onesto um criminoso, do co+arde

    um 6eri. $ ren1ncia a todos os 0ri+il8gios, +otada 0ela nobreEa num momento de

    entusiasmo, na*uela c8lebre noite de > de $gosto de

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    escritores *ue tGm estudado as multid3es estritamente do 0onto de +ista criminal. #em

    d1+ida *ue as multid3es so 0or +eEes criminosas, mas tamb8m so muitas +eEes

    6eroicas. f5cil le+5?las a darem a +ida 0elo triunfo de uma cren7a ou de uma ideia,

    entusiasm5?las 0ara a glria e 0ara a 6onra, arrast5?las *uase sem 0o e sem armas,

    como no tem0o das cruEadas, 0ara libertarem o t1mulo de um Deus das mos dos infi8is,ou, como em

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    De0ois de termos indicado de um modo muito geral os 0rinci0ais caracteres das

    multid3es, +amos agora estud5?los em 0ormenor. $lguns caracteres es0ecficos das

    multid3es, a im0ulsi+idade, a irritabilidade, a inca0acidade de raciocinar, a ausGncia de

    4uEo e de es0rito crtico, o eagero dos sentimentos e outros ainda, 0odem igualmente

    encontrar?se em formas inferiores da e+olu7o, como o sel+agem e a crian7a. umaanalogia *ue assinalo de 0assagem, 0ois a sua demonstra7o ultra0assaria o Jmbito

    desta obra, al8m de *ue seria in1til 0ara *uem con6ece a 0sicologia dos 0rimiti+os e no

    c6egaria a con+encer os *ue a ignoram.

    $bordarei agora sucessi+amente os di+ersos caracteres *ue facilmente se 0odem

    obser+ar na maior 0arte das multid3es.

    1. Impulsividade, mobilidade e irritabilidade das multides$ multido, como ficou dito ao estudarmos os seus caracteres fundamentais, 8

    guiada *uase eclusi+amente 0elo inconsciente. Os seus atos esto muito mais su4eitos -

    a7o da es0inal medula do *ue - do c8rebro. $s suas a73es 0odem a0resentar?se

    0erfeitas na eecu7o mas, como o c8rebro no as dirige, o indi+duo 0rocede segundo o

    acaso das ecita73es. $ multido 8 o 4oguete de todos os estimulantes eteriores e, 0or

    isso, reflete todas as suas incessantes +aria73es. &la 8, 0ois, escra+a dos im0ulsos

    recebidos. O indi+duo isolado 0ode estar submetido aos mesmos ecitantes *ue o

    6omem em multido, mas como a raEo l6e mostra os incon+enientes de ceder - sua

    a7o, ele no cede. Fisiologicamente, 0ode definir?se este fenKmeno como a ca0acidade

    do indi+duo de dominar os seus refleos, ca0acidade essa *ue a multido no 0ossui.

    Os di+ersos im0ulsos a *ue as multid3es obedecem 0odem, conforme os

    ecitantes, ser generosos ou cru8is, 6eroicos ou 0usilJnimes, mas sero sem0re to

    im0eriosos *ue, diante deles, desa0arecer5 at8 o 0r0rio interesse da conser+a7o.

    $s multid3es so etremamente m+eis 0or*ue so muitos os ecitantes ca0aEes de as

    sugestionar e 0or*ue elas l6es obedecem sem0re. $ssim, +emo?las 0assar, de um momento 0ara o outro,

    da ferocidade mais sanguin5ria - generosidade ou ao 6erosmo mais absoluto. $ multido torna?se com

    facilidade carrasco, mas com a mesma facilidade se faE m5rtir. Foi do seu seio *ue sem0re correram os rios

    de sangue eigidos 0elo triunfo de todas as causas. (o 8 necess5rio retrocedermos -s 80ocas 6eroicas

    0ara +ermos a*uilo de *ue as multid3es so ca0aEes. (unca regateiam a +ida num motim e ainda 65

    0oucos anos um general, *ue se tin6a tomado subitamente muito 0o0ular, teria encontrado, se *uisesse,

    cem mil 6omens 0rontos a morrerem 0ela sua causa

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    no+amente as deiar cair. O estudo de certas multid3es re+olucion5rias dar?nos?5 alguns

    eem0los da +ariabilidade dos seus sentimentos.

    &sta mobilidade das multid3es torna?as difceis de dirigir, sobretudo *uando 0arte

    dos 0oderes 01blicos cai nas suas mos. #e as necessidades da +ida *uotidiana no

    constitussem uma es08cie de regulador in+is+el dos acontecimentos, as democraciasno teriam 0ossibilidade de eistir. Mas as multid3es *ue *uerem as coisas

    freneticamente no as *uerem, contudo, durante muito tem0o, 0ois so to inca0aEes

    de uma +ontade dur5+el como o so de 0ensamento.

    $ multido no 8 a0enas im0ulsi+a e m+el. Tal como o sel+agem, tamb8m ela no

    admite *ue se inter0on6am obst5culos entre o seu dese4o e a realiEa7o desse dese4o, e

    admite?o tanto menos *uanto maior for o seu n1mero, o *ue l6e d5 a sensa7o de um

    0oder irresist+el. Para o indi+duo em multido a no7o de im0ossibilidade desa0arece.O 6omem isolado sabe bem *ue soEin6o no 0oder5 incendiar um 0al5cio ou roubar um

    armaE8m e, 0or isso, a tenta7o de o faEer nem se*uer l6e aflora ao es0rito. Mas, ao

    faEer 0arte de uma multido, toma consciGncia do 0oder *ue o n1mero l6e confere e

    cede imediatamente - 0rimeira sugesto de crime ou de roubo. Qual*uer obst5culo

    ines0erado ser5 derrubado com m0eto. #e fosse 0oss+el ao organismo 6umano

    0er0etuar o furor, 0oder?se?ia diEer *ue esse era o estado normal da multido

    contrariada.

    (a irritabilidade das multid3es, na sua im0ulsi+idade e mobilidade, tal como em

    todos os sentimentos 0o0ulares *ue iremos estudar, inter+8m sem0re os caracteres

    fundamentais da ra7a, *ue constituem o terreno imut5+el em *ue germinam os nossos

    sentimentos. $s multid3es so irrit5+eis e im0ulsi+as, sem d1+ida, mas em graus muito

    +ari5+eis. 0or eem0lo etraordin5ria a diferen7a entre uma multido latina e uma

    multido anglo?sanica. Os fatos recentes da nossa 6istria so bem elucidati+os

    *uanto a este 0onto. &m

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    2. Sugestibilidade e credulidade das multides

    Dissemos 45 *ue um dos caracteres gerais das multid3es 8 uma sugestibilidade

    ecessi+a e mostr5mos tamb8m como a sugesto 8 contagiosa em *ual*uer

    aglomera7o 6umana, o *ue e0lica a r50ida orienta7o dos sentimentos num sentido

    determinado.Por muito neutra *ue a 4ulguemos, a multido encontra?se *uase sem0re num

    estado de aten7o e0ectante *ue fa+orece a sua ca0acidade de se sugestionar. $

    0rimeira sugesto feita im03e?se imediatamente 0or cont5gio a todos os c8rebros e

    estabelece logo a orienta7o. (os seres sugestionados a ideia fia tem tendGncia 0ara se

    transformar em acro. Quer se trate de incendiar um 0al5cio ou de realiEar uma obra de

    abnega7o, a multido eecut5?lo?5 com a mesma facilidade. Tudo de0ender5 da

    natureEa do ecitante e no, como no indi+duo isolado, da rela7o *ue 0ossa eistirentre o ato sugerido e as raE3es *ue se o0on6am - sua realiEa7o.

    $ssim, aflorando sem0re os limites da inconsciGncia, submetendo?se a todas as sugest3es,

    animada da +iolGncia de sentimentos 0r0ria dos seres *ue no 0odem a0elar 0ara a influGncia da raEo,

    destituda de es0rito crtico, a multido no 0ode deiar de ser de uma credulidade ecessi+a. Para ela o

    in+erossmil no eiste e 8 necess5rio no o es*uecermos 0ara 0odermos com0reender a facilidade com

    *ue se criam e se 0ro0agam as mais es0antosas lendas e narrati+as

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    conse*uGncia do 0oder de cont5gio, essas deforma73es acabam 0or ser da mesma

    natureEa e ter o mesmo sentido em todos os indi+duos da coleti+idade. $ 0rimeira

    deforma7o 0ercebida 0or um deles constitui como *ue o n1cleo da sugesto

    contagiosa. $ntes de a0arecer a todos os cruEados nas mural6as de Nerusal8m, #. Norge

    foi com certeEa +isto a0enas 0or um dos assistentes e, 0or meio da sugesto e docont5gio, o milagre foi imediatamente aceite 0or todos.

    sem0re este o mecanismo das alucina73es coleti+as, to fre*uentes na 6istria e

    *ue 0arecem ter todos os caracteres cl5ssicos de autenticidade, 0ois so fenKmenos

    +erificados 0or mil6ares de 0essoas.

    $ *ualidade mental dos indi+duos *ue constituem a multido em nada contradiE

    este 0rinc0io. Com efeito, essa *ualidade no tem *ual*uer im0ortJncia neste caso. $

    0artir do momento em *ue se integram numa multido, tanto o ignorante como o s5bioficam igualmente inca0aEes de ter *ual*uer 0oder de obser+a7o.

    &sta tese 0ode 0arecer 0aradoal e 0ara a demonstrar seria necess5rio relatarmos

    numerosos fatos 6istricos, o *ue enc6eria +5rios +olumes. Mas, como no *ueremos

    deiar o leitor com a im0resso de *ue faEemos afirma73es sem termos 0ro+as, +amos

    a0resentar alguns eem0los tomados ao acaso entre todos os *ue 0oderamos citar.

    O fato *ue +amos relatar 8 um dos mais t0icos 0or*ue foi escol6ido entre as

    alucina73es coleti+as *ue grassaram numa multido onde se encontra+am indi+duos de

    todas as es08cies, ignorantes e instrudos. Foi incidentalmente narrado 0elo tenente da

    marin6a Nulien F8li no li+ro *ue escre+eu sobre as correntes do mar.

    $ fragata )'a Belle?Poule: na+ega+a com o fim de encontrar a cor+eta )'e

    Berceau:, da *ual uma +iolenta tem0estade a tin6a se0arado. &ra dia claro e o #ol

    bril6a+a. De re0ente o +igia assinalou uma embarca7o - deri+a. $ tri0ula7o ol6ou na

    dire7o indicada e todos, oficiais e marin6eiros, +iram nitidamente uma 4angada

    carregada de 6omens *ue mostra+am sinais de deses0ero. O almirante Desfoss8s

    mandou a0arel6ar uma embarca7o 0ara ir socorrer os n5ufragos. $o a0roimarem?se,

    os marin6eiros e oficiais *ue a tri0ula+am +iram )massas de 6omens agitarem?se e

    estenderem as mos e ou+iram o rudo surdo e confuso de grande n1mero de +oEes:.

    C6egados 4unto da 0retensa 4angada, encontraram a0enas alguns ramos de 5r+ores

    cobertos de fol6as *ue a tem0estade arrancara - costa 0rima. Perante um fato to

    e+idente, a alucina7o desfeE?se.

    &ste eem0lo torna bem claro o mecanismo da alucina7o coleti+a tal como ns o

    e0lic5mos. De um lado, temos a multido em estado de aten7o e0ectanteL do outro, a

    sugesto 0ro+ocada 0elo +igia, ao assinalar um barco abandonado no mar, sugesto *ue

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    foi aceite, 0or cont5gio, 0or todos os 0resentes, oficiais e marin6eiros.

    "ma multido no 0recisa de ser numerosa 0ara *ue se4a destruda a sua

    faculdade de +er as coisas corretamente e 0ara *ue os fatos reais se4am substitudos 0or

    alucina73es sem *ual*uer rela7o com eles. $lguns indi+duos reunidos constituem uma

    multido e, nem *ue se4am ilustres s5bios, ad*uirem logo todos os caracteres dasmultid3es em tudo o *ue este4a fora do Jmbito da sua es0ecialidade. $ faculdade de

    obser+a7o e de es0rito crtico, *ue cada um indi+idualmente 0ossui, desa0arece

    imediatamente.

    Da+e, um 0siclogo arguto, d5?nos um eem0lo bem curioso, 0ublicado 0elos

    $nnales des sciences 0sc6i*ues, e *ue merece ser a*ui relatado. Da+e tin6a con+ocado

    uma reunio de ilustres obser+adores, entre os *uais se encontra+a um dos mais

    eminentes s5bios de Inglaterra, Sallace, e de0ois de os deiar eaminar alguns ob4etos emarc5?los onde *ueriam, eecutou diante deles todos os fenKmenos cl5ssicos do

    es0iritismo, materialiEa7o dos es0ritos, escrita em ardsias, etc. De0ois de ter

    conseguido *ue esses not5+eis es0ectadores l6e escre+essem relatrios em *ue

    afirma+am *ue os fenKmenos obser+ados s 0odiam de+er?se a meios sobrenaturais,

    re+elou??l6es *ue eram a0enas o resultado de tru*ues muito sim0les. )O mais es0antoso

    da in+estiga7o de Da+e:, escre+e o autor do artigo, )no 8 o mara+il6oso dos tru*ues

    em si, mas a etrema fra*ueEa dos relatrios dos no iniciados.: )Portanto:, acrescenta,

    )as testemun6as 0odem faEer numerosas narra73es 0ositi+as, *ue so com0letamente

    erradas, mas *ue tGm 0or resultado, se aceitarmos as suas descri73es como +erdadeiras,

    os fenKmenos descritos 0assarem a ser ine0lic5+eis 0or ilusionismo. Os m8todos

    in+entados 0or Da+e eram to sim0les *ue at8 admira *ue ousasse utiliE5?losL mas ele

    tin6a tal 0oder sobre o es0rito da multido *ue a conseguia con+encer de *ue esta+a a

    +er o *ue na realidade no +ia.: Trata?se, como sem0re, do 0oder do 6i0notiEador sobre

    o 6i0notiEado. Mas *uando +emos esse 0oder eercer?se sobre es0ritos su0eriores e

    anteci0adamente desconfiados, a0ercebemo?nos da facilidade com *ue se 0odem iludir

    as multid3es +ulgares.

    #o in1meros os eem0los an5logos a este. H5 alguns anos, os 4ornais 0ublicaram

    a 6istria de duas meninas *ue se afogaram e foram retiradas do #ena. &ssas crian7as

    foram 0rimeiro categoricamente recon6ecidas 0or uma d1Eia de testemun6as. Perante

    afirma73es to unJnimes, no subsistiu *ual*uer d1+ida no es0rito do 4uiE de instru7o

    *ue mandou la+rar a res0ecti+a certido de bito. Mas, *uando as crian7as iam ser

    enterradas, o acaso feE descobrir *ue as su0ostas +timas esta+am +i+as e *ue a

    semel6an7a entre elas e as afogadas era muito +aga. $*ui, como nos eem0los

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    anteriormente citados, a afirma7o da 0rimeira testemun6a, +tima de uma iluso, foi o

    bastante 0ara sugestionar todas as outras.

    &m casos como estes o 0lanto de 0artida da sugesto 8 sem0re a iluso criada

    num indi+duo 0or reminiscGncia mais ou menos +agas e, em seguida, o cont5gio 0or

    meio da afirma7o da 0rimiti+a iluso. #e o 0rimeiro obser+ador 8 muito im0ression5+el,bastar5 *ue o cad5+er *ue 4ulga recon6ecer a0resente *ual*uer 0articularidade, uma

    cicatriE, um 0ormenor do fato, ca0aE de e+ocar nele a ideia de uma outra 0essoa, sem

    *ue se4a necess5rio 6a+er ou no uma semel6an7a real. &sta ideia e+ocada torna?se

    ento o n1cleo de uma es08cie de cristaliEa7o *ue in+ade o domnio do entendimento e

    0aralisa toda a ca0acidade crtica. O *ue o obser+ador +G ento 45 no 8 o ob4eto em si,

    mas a imagem e+ocada no seu es0rito. assim *ue se e0licam os recon6ecimentos

    errados de cad5+eres de crian7as, feitos 0ela 0r0ria me, tal como no caso *ue +amosrelatar a seguir, 45 antigo, mas *ue nos 0ermite +er manifestarem?se 0recisamente os

    dois graus de sugesto, cu4o mecanismo acabei de e0or.

    )$ crian7a foi recon6ecida 0or outra crian7a, *ue na realidade se enganou. $ 0artir

    da sucederam?se recon6ecimentos errados.

    )& assistiu?se a uma coisa etraordin5ria. (o dia a seguir -*uele em *ue o

    estudante o tin6a recon6ecido, uma mul6er eclamou2 Meu Deus, 8 o meu fil6oU

    )'e+aram?na 4unto do cad5+er, eaminou?o o +erificou *ue tin6a uma cicatriE na

    testa.

    )#im, 8 o meu 0obre fil6o, *ue desa0areceu em Nul6o do ano 0assado.

    Roubaram?mo e mataram?noU

    )$ mul6er era 0orteira na Rua do Forno e c6ama+a??se C6a+andret. C6amaram o

    cun6ado, *ue afirmou sem 6esita7o2 #im, 8 o 0e*ueno P6ilibert. %5rios moradores da

    mesma rua recon6eceram tamb8m a crian7a como P6ilibert C6a+andret e o mesmo

    aconteceu com o 0r0rio 0rofessor, 0ara *uem a medal6a *ue o 0e*ueno tin6a era um

    indcio seguro.

    )Pois bem, os +iEin6os, o cun6ado, o 0rofessor e a me enganaram?se todos. #eis semanas mais

    tarde foi descoberta a identidade da crian7a. &ra natural de Bord8us, tin6a sido assassinada em Bord8us e

    traEida de0ois 0ara Paris?.

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    0sicolgica menos limitada, esses 6omens saberiam *ue, ao contr5rio do *ue afirmam, 8

    na infJncia *ue mais se mente. Claro *ue a mentira 8 inocente, mas no deia 0or isso de

    ser mentira. Mais +alia condenar?se um acusado atirando uma moeda ao ar do *ue

    faEG?lo, como tantas +eEes se feE 45, tomando 0or base o testemun6o de uma crian7a.

    %oltando -s obser+a73es feitas 0elas multid3es, somos le+ados a concluir *ue asobser+a73es coleti+as so sem d1+ida as mais erradas e traduEem, *uase sem0re, a

    sim0les iluso de um indi+duo *ue, 0or cont5gio, sugestionou os outros.

    #o in1meros os fatos *ue nos mostram *ue o testemun6o das multid3es nos de+e merecer a

    maior desconfian7a. Mil6ares de 6omens assistiram - c8lebre carga de ca+alaria da batal6a de #edan e,

    mesmo assim, no 8 0oss+el saber?se *uem a comandou, de+ido a serem to contraditrios os

    testemun6os. (um li+ro recente, o general inglGs Solsele demonstrou *ue at8 6o4e se tGm cometido os

    mais gra+es erros a res0eito dos fatos mais im0ortantes da batal6a de Saterloo, fatos esses *ue, no

    entanto, foram atestados 0or centenas de 0essoas.

    $ raEo. (ulidade da sua influGncia sobre as multid3es. # se dominam agindo

    sobre os seus sentimentos inconscientes. O 0a0el da lgica na 6istria. $s causas

    secretas dos acontecimentos in+erossmeis.

    $cabamos de in+estigar os fatores remotos e 0re0aratrios *ue conferem - alma

    dos 0o+os uma rece0ti+idade es0ecial e tornam assim 0oss+el, nas multid3es, o

    desabroc6ar de certos sentimentos e de certas ideias. Resta?nos agora eaminar os

    fatores susce0t+eis de eercer uma a7o imediata e, num ca0tulo mais adiante,

    +eremos domo eles de+em ser mane4ados 0ara 0roduEirem todos os seus efeitos.

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    $ 0rimeira 0arte desta obra tratou dos sentimentos, das ideias e dos raciocnios

    das coleti+idadesL o seu con6ecimento 0oderia, e+identemente, fornecer os meios com

    *ue l6es influenciar a alma. #abemos 45 o *ue im0ressiona a imagina7o das multid3es, o

    0oder e o cont5gio das sugest3es, sobretudo *uando a0resentadas na forma de

    imagens. Mas como as sugest3es 0oss+eis so de origem muito di+ersa, os fatoresca0aEes de agir sobre a alma das multid3es 0odem ser bem diferentes. Por isso, 8

    necess5rio eamin5?los se0aradamente. $s multid3es so de certo modo como a esfinge

    da f5bula antiga2 8 0reciso saber resol+er os 0roblemas 0ostos 0ela sua 0sicologia ou

    ento resignarmo?nos a sermos de+orados 0or elas.

    1. !s imagens, as palavras e as &'rmulas

    $o estudarmos a imagina7o das multid3es, +imos como elas so im0ressionadassobretudo 0or imagens. #e nem sem0re se dis03e dessas imagens, 8 0oss+el e+oc5?las

    em0regando 4udiciosamente 0ala+ras e frmulas. Mane4adas com arte, 0ossuem

    realmente o 0oder misterioso *ue os ade0tos da magia outrora ;l6es atribuam.

    Pro+ocam na alma das multid3es as mais terr+eis tem0estades mas sabem tamb8m

    acalm5?las. Poderia erguer?se uma 0irJmide mais alta *ue a do +el6o eo0s s com os

    ossos das +timas causadas 0elo 0oder das 0ala+ras e das frmulas.

    O 0oder das 0ala+ras est5 ligado -s imagens *ue elas e+ocam e 8 com0letamente

    inde0endente do seu significado real. $s 0ala+ras cu4o sentido se encontra mais mal

    definido so 0or +eEes as *ue 0ossuem uma maior influGncia como, 0or eem0lo, os

    termos democracia, socialismo, igualdade ou liberdade, cu4o sentido 8 to +ago *ue no

    65 li+ros *ue c6eguem 0ara o definir. Contudo, -s suas bre+es slabas liga?se um 0oder

    +erdadeiramente m5gico, como se elas conti+essem em si a solu7o de todos os

    0roblemas. &ssas 0ala+ras sintetiEam +5rias as0ira73es inconscientes e a es0eran7a da

    sua realiEa7o.

    $ raEo e os argumentos lutariam em +o contra certas 0ala+ras e certas frmulas.

    com recol6imento *ue so 0ronunciadas diante das multid3es e, ao ou+i?las,

    imediatamente as fisionomias se tornam res0eitosas e as cabe7as se inclinam. Muitos

    consideram?nas como for7as da natureEa ou 0oderes sobrenaturais. &+ocam nas almas

    imagens grandiosas e +agas, e a 0r0ria indefini7o *ue as rodeia aumenta o seu 0oder

    misterioso. Podem ser com0aradas -*uelas tem+eis di+indades escondidas atr5s do

    tabern5culo e das *uais o de+oto se a0roima sem0re a tremer.

    $s imagens e+ocadas 0elas 0ala+ras so inde0endentes do seu sentido e +ariam

    de 80oca 0ara 80oca e de 0o+o 0ara 0o+o. $ certas 0ala+ras ligam?se transitoriamente

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    certas imagens e a 0ala+ra funciona como o to*ue de c6amada *ue as faE a0arecer. Mas

    nem todas as 0ala+ras e frmulas 0ossuem o 0oder de e+ocar imagensL algumas, ao

    mesmo tem0o *ue so utiliEadas 0ara essa e+oca7o, +o?se gastando e acabam 0or

    nada suscitarem ao es0rito. Passam a ser sons +aEios, cu4a 0rinci0al utilidade 8 dis0ensar

    a*uele *ue as em0rega da obriga7o de 0ensar. Com uma 0e*uena reser+a de frmulase lugares?comuns a0rendidos na 4u+entude, temos tudo o *ue 8 0reciso 0ara atra+essar a

    +ida sem a fatigante necessidade de ter *ue 0ensar.

    #e considerarmos determinada lngua, +emos *ue as 0ala+ras *ue a com03em se

    modificam lentamente com o correr dos tem0osL mas as imagens *ue elas e+ocam ou o

    sentido *ue se l6es atribui mudam constantemente. essa a raEo 0or *ue, numa outra

    obra, c6eguei 45 - concluso de *ue a tradu7o eata de uma lngua, sobretudo *uando

    se trata de lnguas mortas, 8 com0letamente im0oss+el. Quando substitumos um termolatino, grego ou sJnscrito 0or um termo francGs, ou at8 *uando tentamos com0reender

    um li+ro escrito 65 alguns s8culos na nossa 0r0ria lngua, a0enas estamos a sobre0or as

    imagens e as id8ias, *ue a +ida moderna feE 0enetrar no nosso es0rito, -s no73es e -s

    imagens totalmente diferentes *ue a +ida antiga tin6a feito surgir na alma das ra7as

    submetidas a condi73es de eistGncia *ue no se 0odem com0arar com as nossas. Os

    6omens da Re+olu7o, *ue 4ulga+am co0iar os !regos e os Romanos, no faEiam mais do

    *ue atribuir a certas 0ala+ras antigas um sentido *ue elas nunca tin6am tido. Que

    semel6an7a 0oderia eistir entre as institui73es dos !regos e a*uelas *ue 6o4e

    designamos 0elo mesmo nome (a*uele tem0o, uma re01blica no era mais do *ue uma

    institui7o essencialmente aristocr5tica, constituda 0ela unio de 0e*uemos d8s0otas

    *ue domina+am uma multido de escra+os mantidos na mais absoluta su4ei7o. &stas

    aristocracias comunais eram baseadas na escra+atura e, sem ela, no 0oderiam eistir.

    & a 0ala+ra liberdade, 0oderia significar alguma coisa *ue se 0arecesse com o

    sentido *ue 6o4e l6e damos, numa 80oca em *ue no se +islumbra+a se*uer a liberdade

    de 0ensar e em *ue no 6a+ia crime maior e mais raro do *ue discutir os deuses, as leis e

    os costumes da cidade $ 0ala+ra 05tria, na alma de um $teniense ou de um &s0artano,

    significa+a o culto de $tenas ou de &s0arta e no o da !r8cia, com0osta de cidades ri+ais

    e sem0re em guerra. Que sentido teria a mesma 0ala+ra 05tria entre os antigos !auleses

    di+ididos em tribos ri+ais, de ra7as, religi3es e lnguas diferentes, *ue C8sar +enceu com

    tanta facilidade 0or*ue entre elas sem0re contou com aliados #em ser necess5rio ir to

    longe, e recuando a0enas dois s8culos, ser5 0oss+el 0ensar?se *ue a mesma 0ala+ra

    05tria era concebida como 6o4e 0elos 0rnci0es franceses *ue, como o grande Cond8, se

    alia+am aos estrangeiros contra o seu soberano & ainda essa mesma 0ala+ra no teria

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    um sentido bem diferente do atual 0ara os emigrados *ue imagina+am obedecer -s leis

    da 6onra *uando combatiam a Fran7a e, do seu 0onto de +ista, efeti+amente l6es

    obedeciam, +isto *ue a lei feudal liga+a o +assalo ao sen6or e no - terra e a +erdadeira

    05tria esta+a onde o suserano mandasse

    #o in1meras as 0ala+ras cu4o sentido se tem alterado de 80oca 0ara 80oca, e scom um grande esfor7o conseguiremos com0reendG?las como antigamente eram

    com0reendidas. DiE?se, e com raEo, *ue 8 necess5rio ler muitos li+ros 0ara se c6egar

    a0enas a entre+er o *ue significa+am 0ara os nossos bisa+s 0ala+ras como rei e famlia

    real. #e assim 8, *ue diEer ento de e0ress3es mais com0leas

    $s 0ala+ras tGm, 0ois, um significado m+el e transitrio, *ue +aria de 80oca 0ara

    80oca e de 0o+o 0ara 0o+o. Quando *ueremos utiliE5?las 0ara agir sobre a multido, 8

    0reciso con6ecermos o sentido *ue ela l6es atribui nesse momento e no o sentido *ueelas ti+eram noutro tem0o, ou 0odero +ir a ter 0ara indi+duos de constitui7o mental

    diferente. $s 0ala+ras so seres +i+os, como as id8ias.

    Por outro lado, *uando as multid3es, a0s certas 0erturba73es 0olticas ou

    altera73es de cren7as, mostram sentir uma anti0atia 0rofunda 0elas imagens *ue certas

    0ala+ras e+ocam, o 0rimeiro de+er do +erdadeiro 6omem de &stado 8 mudar essas

    0ala+ras sem, e+identemente, tocar nas coisas em si, 0or*ue estas esto

    demasiadamente ligadas a uma constitui7o 6eredit5ria 0ara 0oderem ser

    transformadas. O criterioso Toc*ue+ille salientou *ue o trabal6o do Consulado e do

    Im08rio consistiu sobretudo em +estir de 0ala+ras no+as a maior 0arte das institui73es

    do 0assado, *uer diEer, em substituir 0ala+ras *ue e+oca+am imagens desagrad5+eis 0or

    outras cu4a no+idade e+ita+a e+oca73es desse gGnero. $ taille 0assou a ser contribui7o

    0redialL a gabela, im0osto de salL as a4udas, contribui73es indiretas e direito, tudo

    reunidoL a taa dos mestrados e 4urandos 0assou a c6amar?se 0atente, etc.

    "ma das fun73es mais im0ortantes dos 6omens de &stado consiste em batiEar

    com nomes 0o0ulares, ou 0elo menos neutros, as coisas *ue, sob os nomes antigos,

    eram detestadas 0elas multid3es. O 0oder das 0ala+ras 8 to forte *ue bastam alguns

    termos bem escol6idos 0ara *ue as coisas mais odiosas se4am aceites. Taine refere

    0recisamente *ue foi in+ocando a liberdade e a fraternidade, 0ala+ras ento muito

    0o0ulares, *ue os 4acobinos conseguiram )instalar um des0otismo digno do Daom8, um

    tribunal semel6ante ao da In*uisi7o, 6ecatombes 6umanas idGnticas -s do antigo

    M8ico:. $ arte dos go+ernantes, como a dos ad+ogados, consiste 0rinci0almente em

    saber mane4ar as 0ala+ras. $rte difcil 0or*ue, em *ual*uer sociedade, 0ala+ras iguais

    tGm sentidos diferentes 0ara as di+ersas camadas sociais, *ue em0regam

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    a0arentemente as mesmas 0ala+ras mas no falam a mesma lngua.

    (os eem0los *ue acab5mos de referir fiEemos inter+ir o tem0o como 0rinci0al

    fator na mudan7a do sentido das 0ala+ras. #e fiE8ssemos tamb8m inter+ir a ra7a,

    +eramos *ue, na mesma 80oca, em 0o+os igualmente ci+iliEados mas de ra7as di+ersas,

    0ala+ras idGnticas corres0ondem muitas +eEes a id8ias etremamente diferentes. &stasdiferen7as no se 0odem com0reender sem *ue se ten6am feito numerosas +iagens, e,

    0or isso, no insisto neste 0onto e limito?me a faEer notar *ue so 0recisamente as

    0ala+ras miais usadas as *ue +ariam de sentido de 0o+o 0ara 0o+o, como 0or eem0lo as

    0ala+ras democracia e socialismo, to fre*uentemente utiliEadas 6o4e em dia.

    (a realidade, estes termos corres0ondem a id8ias e imagens com0letamente o0ostas na alma dos

    'atinos e na dos anglo?sa3es. Para os 'atinos, democracia significa sobretudo o anular da +ontade e da

    iniciati+a do indi+duo diante do &stado, o *ual cada +eE mais tem a seu cargo dirigir, centraliEar,

    mono0oliEar e 0roduEir. Para ele a0elam, constantemente e sem ece7o, todos os 0artidos, radicais,

    socialistas ou mon5r*uicos. Para o $nglo?#ao, nomeadamente o da $m8rica, a mesma 0ala+ra

    democracia significa, 0elo contr5rio, um desen+ol+imento intenso da +ontade do indi+duo, a diminui7o

    do 0a0el do &stado, ao *ual, al8m da 0olcia, do e8rcito e das rela73es di0lom5ticas, nada se deia 0ara

    dirigir, nem se*uer o ensino. Deste modo se +G como a mesma 0ala+ra 0ossui, 0ara estes dois 0o+os,

    sentidos totalmente contr5rios

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    son6os da 6umanidade: escre+e um autor *ue sintetiEa nessa 0ergunta as nossas

    doutrinas. )Dar aos 6omens a 0arte de es0eran7a e de ilus3es sem a *ual eles no

    0odem eistir, tal 8 a raEo de ser dos deuses, dos 6eris e dos 0oetas. $ ciGncia 0areceu

    assumir, durante algum tem0o, esta fun7o. Mas o *ue a com0rometeu, 0erante os

    cora73es sedentos de ideal, foi 45 no ousar 0rometer bastante e no saber mentir osuficiente.:

    Os filsofos do s8culo _%III consagraram?se com fer+or - destrui7o das ilus3es

    religiosas, 0olticas e sociais de *ue os nossos 0ais +i+eram durante s8culos.

    Destruindo?as, secaram as fontes de es0eran7a e de resigna7o e, 0or detr5s das

    *uimeras assim sacrificadas, de0araram?se?l6es as for7as cegas da natureEa *ue,

    ineor5+eis 0ara com a fra*ueEa, no con6ecem a 0iedade. $ filosofia, com todos os seus

    0rogressos, no conseguiu ainda oferecer aos 0o+os um ideal ca0aE de os seduEir. Maseles, como no 0odem +i+er sem ilus3es, dirigem?se instinti+amente, como os insetos

    atrados 0ela luE, 0ara os retricos *ue l6as a0resentam. O grande fator da e+olu7o dos

    0o+os sem0re foi, no a +erdade, mas o erro, e se o socialismo +G atualmente aumentar

    o seu 0oder 8 0or*ue constitui a 1nica iluso ainda +i+a. $s demonstra73es cientficas

    no im0edem de modo algum o seu crescimento incessante, 0or*ue a sua 0rinci0al for7a

    consiste em ser defendido 0or es0ritos *ue ignoram a realidade das coisas o bastante

    0ara se atre+erem a 0rometer a felicidade aos 6omens. $ iluso socialista reina 6o4e

    sobre as runas amontoadas do 0assado e o futuro 0ertence?l6e. $s multid3es nunca

    ti+eram sede de +erdade. Diante de e+idGncias *ue l6es desagradam, +iram as costas e

    0referem di+iniEar o erro, se ele as seduEir. Quem as souber iludir, facilmente ser5 seu

    sen6orL *uem as tentar desiludir, ser5 sem0re a sua +tima.

    3. ! experi(ncia

    $ e0eriGncia constitui tal+eE o 1nico 0rocesso eficaE de estabelecer solidamente

    uma +erdade na alma das multid3es e destruir as ilus3es *ue se +erificou serem

    demasiado 0erigosas. Mas de+e realiEar?se em grande escala e ser muitas +eEes re0etida.

    $s e0eriGncias feitas 0or uma gera7o so geralmente in1teis 0ara a gera7o seguinte,

    e 8 0or isso *ue os acontecimentos 6istricos, in+ocados como elementos de

    demonstra7o ou como li7o, de nada 0odem ser+ir. $ sua 1nica utilidade 8 0ro+ar at8

    *ue 0onto as e0eriGncias de+em ser re0etidas em cada 80oca 0ara eercerem alguma

    influGncia e conseguirem abalar um erro solidamente instalado.

    O nosso s8culo e o anterior sero sem d1+ida citados 0elos 6istoriadores do

    futuro como uma era de e0eriGncias curiosas. &feti+amente, em nen6uma outra 80oca

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    se c6egou a tanto.

    $ e0eriGncia gigantesca foi a Re+olu7o Francesa. Para se c6egar a descobrir *ue

    no se reconstri uma sociedade 0e7a 0or 0e7a - luE da raEo 0ura, foi necess5rio

    massacrar alguns mil63es de 6omens e, durante +inte anos, assolar de guerras a &uro0a

    inteira. Para faEer a 0ro+a e0erimental de *ue os c8sares custam caro aos 0o+os *ue osaclamam, foram necess5rias duas ruinosas e0eriGncias realiEadas durante cin*uenta

    anos e ainda assim, 0or mais e+identes *ue ten6am sido, no foram suficientes. (o

    entanto, a 0rimeira custou trGs mil63es de 6omens e uma in+aso, e a segunda, um

    desmembramento e o recurso a e8rcitos 0ermanentes. Terceira e0eriGncia este+e

    0restes a ser realiEada 65 0oucos anos e seguramente o +ir5 a ser um dia. Para *ue se

    acreditasse *ue o 0oderoso e8rcito alemo no era, como se diEia nas +8s0eras de

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    a linguagem, consoante o efeito 0roduEido no momento em *ue se fala, torna desde

    logo im0otentes e in1teis os discursos estudados e 0re0arados. #e seguir os seus

    0r0rios 0ensamentos, e no os dos auditores, o orador 0erde toda a ca0acidade de

    influenciar.

    $s min6as 0rimeiras obser+a73es sobre a arte de influenciar as multid3es e sobreos fracos recursos *ue oferecem, neste as0ecto, as regras da lgica, datam do cerco de

    Paris, do dia em *ue +i conduEir ao 'ou+re, onde ento se instalara o go+erno, o

    marec6al %., *ue uma multido ululante afirma+a ter sur0reendido a roubar o 0lano das

    fortifica73es 0ara o +ender aos Prussianos. "m membro do go+erno, !. P., orador

    famoso, a0areceu 0ara falar - multido *ue reclama+a a imediata eecu7o do

    0risioneiro. &u esta+a - es0era *ue o orador demonstrasse o absurdo da acusa7o e

    afirmasse *ue o marec6al acusado era, 0recisamente, um dos construtores dessasfortifica73es cu4o 0lano, ali5s, esta+a - +enda em todas as li+rarias, Com grande es0anto

    meu eu era ento muito 4o+em o discurso foi com0letamente diferente. $+an7ando

    0ara o 0risioneiro, o orador gritou2 )#er5 feita 4usti7a, e uma 4usti7a im0iedosa. Deiem

    ao cuidado do go+erno de Defesa (acional le+ar at8 ao fim o +osso in*u8rito.

    &ntretanto, +amos encarcerar o acusado.: Com esta a0arente satisfa7o, a multido

    imediatamente acalmou, dis0ersando?se tran*uilamente, e, um *uarto de 6ora de0ois, o

    marec6al 0odia recol6er a casa. Teria sido ine+ita+elmente massacrado se o seu defensor

    ti+esse a0resentado - multido em f1ria os argumentos lgicos *ue eu, na ingenuidade

    da min6a 4u+entude, 4ulga+a serem con+incentes.

    Os es0ritos lgicos, 6abituados - sucesso rigorosa e deduti+a dos raciocnios,

    no 0odem deiar de recorrer ao seu modo certo de 0ensar *uando se dirigem -s

    multid3es 0ara as 0ersuadir. Ficam, de0ois, sur0reendidos ao +erificarem *ue os seus

    argumentos no ti+eram *ual*uer efeito. )$s se*uGncias matem5ticas e as dedu73es

    silogsticas, ou se4a, as associa73es de identidade escre+e um lgico 0ossuem um

    car5ter de necessidade *ue obriga - sua aceita7o at8 0or uma massa inorgJnica *ue

    fosse ca0aE de com0reender e seguir uma associa7o de identidade.: #em d1+ida.

    #im0lesmente, acontece *ue uma multido no tem mais ca0acidade do *ue uma massa

    inorgJnica 0ara com0reender, seguir ou a0enas ou+ir uma associa7o de identidades.

    #e tentarmos con+encer 0elo raciocnio os es0ritos 0rimiti+os, os sel+agens ou as

    crian7as, de0ressa %erificaremos o 0ouco +alor *ue 0ossui 0ara eles este modo de

    argumenta7o. Mas no 8 0reciso descer at8 aos seres 0rimiti+os 0ara constatar a total

    im0otGncia dos raciocnios *uando tem de lutar contra sentimentos. Basta

    lembrarmo?nos como, durante s8culos, 0ersistiram certas su0ersti73es religiosas

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    contr5rias - lgica mais sim0les. Durante *uase dois mil anos, os gGnios mais luminosos

    cur+aram?se 0erante essas su0ersti73es e foi 0reciso c6egar aos tem0os modernos 0ara

    se 0Kr em causa a sua +eracidade. $ Idade M8dia e o Renascimento ti+eram muitos

    6omens esclarecidos, mas no ti+eram um 1nico ao *ual o raciocnio l6e ti+esse 0odido

    mostrar o *ue 6a+ia de infantil em tais su0ersti73es e ti+esseU suscitado a mais le+ed1+ida sobre os malefcios do Diabo ou a necessidade de *ueimar as feiticeiras.

    Cabe agora 0erguntar2 ser5 de lamentar *ue a raEo no se4a o guia das

    multid3es (o nos atre+emos a res0onder afirmati+amente. (o 65 d1+ida de *ue a

    raEo 6umana nunca teria conseguido encamin6ar a 6umanidade 0elas +ias da ci+iliEa7o

    com o ardor e a ausGncia *ue as suas *uimeras l6e ins0iraram. Fil6as do inconsciente *ue

    nos comanda, essas *uimeras tero sido, 0ro+a+elmente, necess5rias. Cada ra7a traE

    consigo, na sua constitui7o mental, as leis do seu destino, e a obediGncia a essas leister5 sido tal+eE um instinto inelut5+el, at8 *uando su4eito a im0ulsos a0arentemente

    irracionais. $figura?se, 0or +eEes, *ue os 0o+os esto submetidos a for7as #ecretas,

    semel6antes -*uelas *ue obrigam a bolota a transformar?se em car+al6o ou o cometa a

    seguir a sua rbita.

    O 0ouco *ue 0odemos 0ressentir dessas for7as de+e ser 0rocurado no car5ter

    geral da e+olu7o do 0o+o *ue a elas est5 su4eito e no em fenKmenos isolados *ue

    0are7am, embora, manifestar essa e+olu7o. #e a0enas se considerarem esses

    fenKmenos isolados, a 6istria afigurar?se?5 regida 0or acasos absurdos. Tornar?se?5

    in+erossmil *ue um ignorante car0inteiro da !alileia ten6a sido durante dois milGnios

    um Deus oni0otente, em nome de *uem se fundaram as mais im0ortantes ci+iliEa73es.

    In+erossmil se tornar5 tamb8m *ue algumas 6ordas de 5rabes 0ossam ter con*uistado a

    maior 0arte do +el6o mundo greco?romano, fundando um im08rio mais +asto do *ue o

    de $leandre. In+erossmil ainda *ue, numa &uro0a en+el6ecida e 6ierar*uiEada, um

    sim0les tenente de artil6aria consiga reinar sobre uma multido de 0o+os e reis.

    Deiemos, ento, a raEo 0ara os filsofos e *ue ela no inter+en6a demasiado no

    go+erno dos 6omens. (o 8 com a raEo, antes muitas +eEes contra ela, *ue se tGm

    desen+ol+ido sentimentos como a 6onra, a abnega7o, a f8 religiosa, o amor da glria e

    da 05tria, *ue foram, at8 6o4e, os grandes fatores de todas as ci+iliEa73es.

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    CAPTULO III

    OS CONDUTORES DE MULTIDES E OS SEUS MEIOS DE PERSUASO

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    0essoais, famlia, tudo sacrificam. $t8 o instinto de conser+a7o diminui neles a tal 0onto

    *ue c6egam a 0edir 0or 1nica recom0ensa o martrio.

    &sta intensidade de con+ic7o confere -s suas 0ala+ras um grande 0oder

    sugesti+o. $ multido escuta sem0re o 6omem dotado de uma +ontade forte, 0or*ue,

    reunidos em multido, os 6omens 0erdem toda a +ontade 0r0ria e +iram?seinstinti+amente 0ara a*ueles *ue a 0ossuem.

    (unca faltam condutores aos 0o+os, mas nem todos 0ossuem a fortaleEa de

    con+ic73es *ue faE deles a0stolos. (a maior 0arte dos casos, so 65beis oradores

    mo+idos 0elos seus interesses 0essoais e com um 0oder de 0ersuaso assente na lison4a

    dos instintos mais baios. $ influGncia *ue, deste modo, eercem 8 sem0re efGmera. Os

    grandes obstinados, os *ue arrebataram a alma das multid3es, Pedro o &remita, 'utero,

    #a+onarola, os 6omens da Re+olu7o, s conseguiram fascin5?las 0or*ue eles 0r0riosesta+am sub4ugados 0or uma cren7a. Puderam criar nas almas esse 0oder formid5+el

    c6amado f8, *ue faE de todo o 6omem um escra+o do seu son6o.

    Criar a f8, se4a ela religiosa, 0oltica ou social, a f8 numa obra, numa 0essoa ou

    numa ideia, esse 8 o 0a0el dos grandes condutores. De todos os 0oderes de *ue a

    6umanidade dis03e, a f8 8 um dos mais consider5+eis, e com raEo o &+angel6o l6e

    atribui a for7a de mo+er montan6as. Dar ao 6omem uma f8 8 multi0licar 0or deE as suas

    for7as. Muitos dos grandes acontecimentos da 6istria foram realiEados 0or crentes

    obscuros *ue nada mais tin6am seno a f8. (o foi com intelectuais e filsofos, muito

    menos com c8ticos, *ue se edificaram as religi3es *ue go+ernaram o mundo e os +astos

    im08rios alargados de um 6emisf8rio ao outro.

    Mas estas obser+a73es s se a0licam aos grandes condutores, e esses so to

    raros *ue a 6istria 0ode ra0idamente enumer5?los. Constituem a c10ula de uma s8rie

    contnua *ue +ai descendo desde o 0oderoso mani0ulador de 6omens at8 ao o0er5rio

    *ue, entre os fumos de uma taberna, acaba 0or conseguir fascinar os seus camaradas

    remoendo intermina+elmente algumas frmulas *ue mal com0reende, mas *ue,

    segundo 4ulga, daro cor0o, ao serem a0licadas, a todos os son6os e a todas as

    es0eran7as.

    (o 65 esfera social, da mais ele+ada - mais 6umilde, em *ue o 6omem, caso no

    este4a isolado, no acabe 0or cair sob a al7ada de um condutor. $ maioria dos indi+duos,

    sobretudo os das camadas 0o0ulares, no 0ossuem, fora da sua restrita es0ecialidade,

    *ual*uer ideia clara e 0onderada e so, 0ortanto, inca0aEes de se orientarem 0or si

    0r0rios. &ntregam?se nas mos de um condutor. &ste 0oder5 ser substitudo 0elas

    0ublica73es 0eridicas *ue so f5bricas de o0ini3es 0ara os seus leitores adotarem e

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    l6es oferecem frases feitas *ue os dis0ensam de refletir. Trata?se, 0or8m, de uma

    substitui7o inferior.

    e tem de ser des0tica a autoridade dos condutores, 0ois s esse des0otismo os

    consegue im0or -s multid3es. %imos 45 como eles se faEem obedecer facilmente,

    embora no 0ossuam *ual*uer a0oio concreto 0ara a sua autoridade entre as maisturbulentas camadas de trabal6adores. #o eles *uem fia as 6oras de trabal6o, o n+el

    dois sal5rios, a marca7o das gre+es, a 6ora certa em *ue elas de+em come7ar e

    terminar.

    W medida *ue os 0oderes 01blicos se deiam 0Kr em causa e enfra*uecer, os

    condutores substituem?nos. !ra7as ao des0otismo *ue eercem, estes no+os sen6ores

    btGm das multid3es uma docilidade muito mais com0leta do *ue a *ue *ual*uer

    go+erno conseguiria. Quando, em conse*uGncia de algum acidente, o condutordesa0arece e no 8 imediatamente substitudo, a multido +olta a ser um agru0amento

    sem coeso nem resistGncia. Durante uma gre+e de autocarros em Paris, bastou 0render

    os dois cabecil6as *ue a comanda+am 0ara *ue ela imediatamente terminasse. (o 8 o

    anseio de liberdade, mas o da ser+ido *ue sem0re domina a alma das multid3es. $ fome

    de obediGncia *ue elas tGm le+a?as a submeterem?se instinti+amente a *uem se

    0roclamar seu sen6or.

    0oss+el distinguir com bastante rigor diferentes ti0os de condutores. H5 os *ue

    so 6omens en8rgicos, de +ontade forte mas momentJnea. &, muito mais raros, 65 os

    *ue 0ossuem uma +ontade simultaneamente forte e constante. Os 0rimeiros

    mostram?se +iolentos, cora4osos e audaEesL so sobretudo a0tos 0ara lan7arem um

    gol0e de sur0resa, 0ara arrastarem as massas em momentos de 0erigo, 0ara

    transformarem em 6eris os recrutas da +8s0era. #o eem0los deste ti0o os marec6ais

    (e e Murat, durante o 0rimeiro Im08rio, e, 45 mais recentemente, o italiano !aribaldi,

    a+entureiro sem talento mas audaE e en8rgico, *ue conseguiu, - frente de um 0e*ueno

    gru0o de 6omens, a0oderar?se do antigo reino de (50oles, *ue era defendido 0or um

    e8rcito disci0linado.

    #endo 0oderosa, a energia deste ti0o de 6omens 8, no entanto, momentJnea e

    no sobre+i+e - ecita7o *ue a 0ro+ocou. "ma +eE regressados ao curso normal da +ida,

    os 6eris animados 0or essa energia do, muitas +eEes, 0ro+a, como a*ueles *ue 65

    0ouco citei, de uma es0antosa fra*ueEa. Ficam inca0aEes de refletir e agir nas

    circunstJncias mais sim0les, de0ois de to bem terem sabido conduEir os outros, e s

    conseguem eercer a sua fun7o se forem, 0or sua +eE, conduEidos e 0ermanentemente

    im0ulsionados, se sentirem acima de si um 6omem ou uma ideia, se l6es for tra7ada bem

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    claramente uma certa lin6a de a7o.

    O outro ti0o de condutores, o dos 6omens de +ontade forte e constante, eerce,

    embora de modo menos es0etacular, uma influGncia muito mais consider5+el. a *ue se

    encontram os +erdadeiros fundadores de religi3es ou de grandes obras2 #o Paulo,

    Maom8, Crist+o Colombo, 'esse0s. Pouco im0orta *ue se4am inteligentes ou dementalidade limitada, 0or*ue o mundo ser5 sem0re deles. $ +ontade 0ersistente *ue

    0ossuem 8 uma faculdade etremamente 0oderosa e rara *ue tudo faE dobrar. (em

    sem0re se a+alia suficientemente a*uilo de *ue 8 ca0aE uma +ontade assim forte e

    constante. (ada l6e resiste, nem a natureEa, nem os deuses, nem os 6omens.

    O mais recente eem0lo deste ti0o 8?nos dado 0elo ilustre engen6eiro 'esse0s,

    *ue, abrindo o Canal de #ueE, se0arou dois mundos e assim realiEou a obra *ue, em +o,

    desde 65 trGs mil anos, tantos grandes soberanos 0ro4etaram realiEar. Mais tarde, fal6ounuma tentati+a semel6ante, mas esta+a 45 +el6o e, 0erante a +el6ice, tudo se a0aga, at8

    a +ontade.

    Para demonstrar o 0oder da +ontade, bastaria re+elem 0ormenor a 6istria das

    dificuldades *ue foi necess5rio +encer durante a abertura do Canal de #ueE. "ma

    testemun6a, o Dr. CaEalis, resumiu em bre+es lin6as a narrati+a *ue o 0r0rio autor

    desta imortal fa7an6a l6e feE2 )Conta+a?nos ele, dia a0s dia, em e0isdios, a e0o0eia da

    abertura do Canal. Conta+a?nos tudo o *ue te+e de +encer, todos os im0ass+eis *ue ele

    tornou 0oss+eis, todas as resistGncias, coliga73es, dissabores, contratem0os e derrotas

    *ue nunca o conseguiram desencora4ar nem abater. Recorda+a como a Inglaterra o tin6a

    combatido, atacando?o sem descansoL como os go+ernos do &gito e da Fran7a se

    mostraram sem0re 6esitantes e o cKnsul francGs, mais do *ue ningu8m, se o0Ks ao incio

    dos trabal6osL como l6e resistiam recusando?l6e o fornecimento de 5gua doce e faEendo

    os o0er5rios 0assarem sedeL como o minist8rio da Marin6a e os engen6eiros, todos os

    6omens de e0eriGncia e ciGncia com s8ria re0uta7o, l6e foram naturalmente 6ostis e

    se declara+am cientificamente certos do ine+it5+el fal6an7o, anunciando?o e

    calculando?o como se anuncia e calcula um ecli0sei do #ol 0ara tal dia e tal 6ora.:

    O li+ro *ue descre+esse a +ida de todos estes grandes condutores no reuniria

    muitos nomes, mas os *ue reunisse seriam os dos 6omens *ue esti+eram - frente dos

    mais im0ortantes acontecimentos da ci+iliEa7o e da 6istria.

    2. "s meios de a$%o dos condutores* a a&irma$%o, a repeti$%o, o cont+gio

    Quando se trata de arrastar subitamente uma multido, de a con+encer a cometer

    um ato decidido 0il6ar um 0al5cio, deiar?se massacrar numa barricada, 8 0reciso

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    atuar sobre ela 0or meio de sugest3es r50idas, sendo o eem0lo a mais eficaE. Mas 8

    0reciso tamb8m *ue a multido 45 este4a 0re0arada 0or certas 9circunstJncias e *ue

    a*uele *ue a +ai arrastar 0ossua uma *ualidade, *ue mais adiante estudarei, com o nome

    de 0restgio.

    Diferentes so, toda+ia, os m8todos dos condutores *uando se trata delentamente incutir, no es0rito das multid3es, id8ias e cren7as, como, 0or eem0lo, as

    modernas teorias socialistas. (este caso, recorrem sobretudo a trGs 0rocessos2 a

    afirma7o, a re0eti7o, o cont5gio. $ atua7o destes 0rocessos 8 demorada, mas os seus

    efeitos so duradouros.

    $ afirma7o 0ura e sim0les, li+re de *ual*uer raciocnio e de *ual*uer 0ro+a, 8 um

    instrumento seguro 0ara faEer 0enetrar uma ideia no es0rito das multid3es. Quanto

    mais concisa for a afirma7o, e mais des0ro+ida for de 0ro+a e demonstra7o, tanto maisautoridade ter5. Os li+ros religiosos e os cdigos de todas as 80ocas sem0re 0rocederam

    0or sim0les afirma7o. O +alor da afirma7o 8 bem con6ecido 0elos 6omens de &stado

    c6amados a defender uma causa 0oltica e 0elos industriais ao faEerem a 0ro0aganda

    dos seus 0rodutos.

    Toda+ia, a afirma7o s ad*uire +erdadeira influGncia se for constantemente

    re0etida e, o mais 0oss+el, nos mesmos termos. (a0oleo diEia *ue s eiste uma figura

    s8ria de retrica2 a re0eti7o. $*uilo *ue se afirma acaba, mediante a re0eti7o, 0or

    0enetrar nos es0ritos e ser aceite como uma +erdade demonstrada.

    Com0reender?se?5 claramente a influGncia da re0eti7o sobre as multid3es se se

    obser+ar o 0oder *ue ela eerce sobre os es0ritos mais esclarecidos. &feti+amente, a

    afirma7o re0etida acaba sem0re 0or se gra+ar nas regi3es 0rofundas do inconsciente

    onde se geram os moti+os das nossas a73es. $o fim de algum tem0o, es*uecido 45 o

    autor dela, acabamos 0or l6e dar total credibilidade. $ssim se e0lica a for7a es0antosa

    da 0ublicidade. De0ois de lermos ou ou+irmos cem +eEes *ue o mel6or c6ocolate 8 o

    c6ocolate da marca _, imaginamos *ue isso nos foi demonstrado fre*uentemente e

    acabamos 0or estar con+encidos de *ue isso 8 +erdade. Persuadidos 0or mil maneiras de

    *ue a farin6a curou de doen7as gra+es as mais c8lebres 0ersonalidades, sentimo?nos

    tentados a e0eriment5?la *uando contramos uma doen7a do mesmo gGnero. W for7a

    de +ermos re0etida num 4ornal a afirma7o de *ue $ 8 um 0atife e B um 6omem

    6onesto, acabamos 0or ficar con+encidos disso, a menos *ue, bem entendido, no

    ten6amos lido 45 muitas +eEes noutro 4ornal a o0inio contr5ria. # a afirma7o re0etida

    tem 0oder bastante 0ara combater outra afirma7o re0etida.

    #em0re *ue uma afirma7o 8 suficientemente re0etida com unanimidade ;isto 8,

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    sem *ue 6a4a a re0eti7o da afirma7o contr5ria, como acontece com certas em0resas

    financeiras *ue 0odem com0rar todos os meios de comunica7o, forma?se a*uilo a *ue

    se c6ama uma )corrente de o0inio:. nessa altura *ue inter+8m o 0oderoso

    mecanismo do cont5gio. $s id8ias, os sentimentos, as emo73es ou as cren7as 0ossuem,

    entre as multid3es, um 0oder contagioso to forte como o dos micrbios. umfenKmeno *ue se obser+a at8 nos animais logo *ue eles se re1nem em multido. $

    mania de um ca+alo numa estrebaria 8 imediatamente imitada 0or todos os outros

    ca+alos da mesma estrebaria. "m gesto de terror, um mo+imento de desorienta7o de

    algumas o+el6as 8 logo 0ro0agado a todo o reban6o. O cont5gio das emo73es e0lica a

    ra0ideE dos 0Jnicos. Tamb8m as desordens cerebrais, como a loucura, se 0ro0agam 0or

    cont5gio. #abe?se como so fre*uentes os casos de aliena7o entre os m8dicos

    alienistas. & citam?se, at8, formas de loucura, como a agorafobia, *ue se transmitem dos6omens aos animais.

    O cont5gio no eige a 0resen7a simultJnea dos indi+duos contagiados no

    mesmo lugar. Pode eercer?se - distJncia sob a influGncia de certos acontecimentos *ue

    orientam os es0ritos num mesmo sentido e l6es conferem os atributos caractersticos

    das multid3es, sobretudo *uando esses es0ritos esto 45 0re0arados 0elos fatores

    remotos a *ue me referi 65 0ouco. Foi deste modo *ue, 0or eem0lo, a e0loso

    re+olucion5ria de =, iniciada em Paris, se estendeu bruscamente a grande 0arte da

    &uro0a e feE estremecer +5rias monar*uias.U milh+es de vias ")rreas sem qualquer interesse geral. E h' ainda outras despesas n%o menos importantes paranecessidades eleitorais. 2 lei sore a re"orma dos oper'rios ir' custar dentro em pouco o mnimo anual de 16? milh+essegundo o minist)rio das Ginan$as e 5UU milh+es na opini%o do acadmico 0eroy-4eaulieu. 2 contnua progress%o detais despesas ter' como consequncia inevit'vel a "alncia. Wuitos pases europeus como 9ortugal# Or)cia# Espanha eTurquia *' l' chegaram e outros para l' caminham. Was n%o vale a pena preocuparmo-nos# pois o plico tem

    sucessivamente aceito# sem grandes protestos# a redu$%o de quatro quintos no pagamento dos cup+es dos diversospases. Estas engenhosas "alncias permitem reequilirar de um momento para o outro os t%o aalados or$amentos. 2sguerras# o socialismo# as lutas econmicas preparam-nos# ali's# muitos outros desastres e na )poca de desagrega$%ouniversal# em que nos encontramos# ) preciso resignarmo-nos a viver o momento sem nos preocuparmos com o amanh%.

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    O segundo 0erigo a *ue nos referimos, a restri7o for7ada das liberdades 0elas

    assembleias 0arlamentares, embora a0arentemente menos +is+el, 8 contudo bastante

    real. Resulta das numerosas leis sem0re restriti+as, cu4as conse*uGncias os 0arlamentos,

    com o seu es0rito sim0lista, no sabem +er e se 4ulgam obrigados a +otar.

    &ste 0erigo de+e ser, de fato, ine+it5+el, 0ois at8 a Inglaterra, onde eiste semd1+ida o ti0o mais 0erfeito de regime 0arlamentar e onde o re0resentante consegue ser

    mais inde0endente do seu eleitorado, no conseguiu e+it5?lo. Herbert #0encer, num

    trabal6o 45 antigo, tin6a demonstrado *ue o aumento da liberdade a0arente era

    acom0an6ado de uma diminui7o da liberdade real. "tiliEando a mesma tese no seu li+ro

    O %ndiv(duo Cont'a o "stado, escre+e o seguinte acerca do 0arlamento inglGs2

    )$ 0artir dessa 80oca a legisla7o seguiu o camin6o *ue 45 referi. Medidas

    ditatoriais, ra0idamente multi0licadas, tGm mostrado uma tendGncia contnua 0ararestringir as liberdades indi+iduais de duas maneiras2 estabelecendo anualmente

    regulamentos cada +eE mais numerosos, *ue im03em restri73es ao cidado em coisas

    em *ue os seus atos eram dantes com0letamente li+res, e for7ando?o a 0raticar atos *ue

    anteriormente tin6a a liberdade de 0raticar ou no. #imultaneamente, os encargos

    01blicos, cada +eE mais 0esados, 0rinci0almente os regionais, restringiram?l6e ainda

    mais a liberdade, diminuindo?l6e a 0arte dos lucros *ue 0ode gastar - +ontade e

    aumentando a *uantia *ue l6e 8 retirada 0ara ser gasta conforme a0raE aos agentes

    01blicos.:

    &sta redu7o 0rogressi+a das liberdades manifesta?se em todos os 0ases, de uma

    forma es0acial, *ue Herbert #0encer no mencionou, e *ue se traduE na cria7o de

    in1meras medidas legislati+as, todas em geral de car5ter restriti+o, *ue le+am

    necessariamente a aumentar o n1mero, o 0oder e a influGncia dos funcion5rios

    encarregados de as a0licarem. &stes funcion5rios tendem assim a transformar?se n2os

    +erdadeiros sen6ores dos 0ases ci+iliEados e o seu 0oder 8 tanto maior *uanto 8 certo

    *ue nas incessantes mudan7as de go+erno a casta administrati+a, a 1nica *ue esca0a a

    essas mudan7as, 8 tamb8m a 1nica a 0ossuir irres0onsabilidade, im0ersonalidade e

    0er0etuidade. Ora no 65 des0otismo mais forte do *ue a*uele *ue se a0resenta

    re+estido desta tri0la forma.

    $ cria7o contnua de leis e regulamentos restriti+os, *ue rodeiam de

    formalidades ridculas os mnimos atos da nossa +ida, tem como conse*uGncia fatal

    limitar cada +eE mais o crculo em *ue os cidados se 0odem mo+er li+remente. %timas

    da iluso de *ue a igualdade e a liberdade ficam mel6or asseguradas com a multi0lica7o

    das leis, os 0o+os +o dia?a?dia aceitando entra+es cada +eE mais 0esados. & no 8

  • 8/13/2019 LE BON, Gustave. Psicologia das Multides

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    im0unemente *ue o faEem. Habituados a su0ortar todos os 4ugos, acabam 0or

    0rocur5?los e 0erdem toda a es0ontaneidade e energia. (o 0assam de sombras +s, de

    autKmatos 0assi+os, sem +ontade, sem resistGncia e sem for7a. O 6omem +G?se ento

    for7ado a 0rocurar no eterior o im0ulso *ue 45 no encontra em si 0r0rio. $

    indiferen7a e inca0acidade crescente dos cidados faE com *ue o 0a0el dos go+ernosse4a for7osamente aumentado. $ssim, os go+ernos tGm de ter o es0rito de iniciati+a, de

    em0reendimento e de conduta *ue os indi+duos 0erderam. TGm de em0reender tudo,

    dirigir todo, 0roteger tudo, e o &stado torna?se ento um deus todo?0oderoso. Mas a

    e0eriGncia ensina?nos *ue o 0oder de tais di+indades nunca foi nem forte nem

    duradouro.

    $ 0rogressi+a restri7o de todas as liberdades *ue se 0ode obser+ar em certos

    0o+os, a0esar de uma 0ermissi+idade *ue l6es cria a iluso de as 0ossurem, 0arece serconse*uGncia tanto do seu en+el6ecimento como da a7o de um regime *ual*uer, e

    constitui um dos sintomas 0recursores da*uela fase de decadGncia a *ue nen6uma

    ci+iliEa7o 0Kde at8 6o4e esca0ar.

    $ a+aliarmos 0elas li73es do 0assado e 0elos sintomas *ue 0or todo o lado se

    manifestam, algumas das nossas ci+iliEa73es atingiram o 0erodo de etremo

    en+el6ecimento *ue antecede a decadGncia. H5 certas e+olu73es *ue 0arecem

    ine+it5+eis 0ara todos os 0o+os, 0ois tantas +eEes as +emos re0etirem?se na 6istria.

    f5cil determinar resumidamente as di+ersas fases destas e+olu73es, e 8 com esse

    resumo *ue concluiremos esta obra.

    #e encararmos nas suas grandes lin6as a gGnese da grandeEa e da decadGncia das

    ci+iliEa73es anteriores - nossa, *ue +emos

    (a aurora dessas ci+iliEa73es, uma nu+em de 6omens, de origens di+ersas,

    reunidos 0elo acaso das migra73es, das in+as3es e das con*uistas. De sangue diferente,

    de lnguas e cren7as tamb8m diferentes, estes 6omens s tGm em comum a lei

    semi?recon6ecida de um c6efe. (essas aglomera73es confusas 0ode