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MARILI SANTOS LINHAS POÉTICAS

LINHAS POETICAS

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POEMAS E TEXTOS POETICOS

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Page 1: LINHAS POETICAS

MARILI SANTOS

LINHAS POÉTICAS

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Para tudo que pode virar poesia...

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HAICAIS

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HAICAIS DA INFÂNCIA

I

“Pé-de-lata”

No pé do menino

Saltitando pro infinito.

II

Boneca de pano

Com cabelos de lã

Jogados no chão.

III

De um estilingue,

Sai um tiro

Olha o passarinho!

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HAICAI NORDESTINO

Liteira de couro

Boizinho puxando

O pó seco range, range.

FRIAGEM

Quando está teimosa... A invernagem egoísta só traz interlúnios.

COLHEITA

Depois da outonada, o menino apanhador o tempo-será!

HAICAI DA DÚVIDA

O rio verde talvez talvegue pela tarde adormecida!

HAICAI DA CERTEZA

A tarde adormecida

despenca algures

cheiro de Sol!

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FEITOS À MÃO

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TRASANTONTEM (Para Enrique Gabriel) O marujo atraca no terceiro navio e a noite despenca no cais iluminado. Limpo a areia da perna, enquanto aproveito para me perfumar. Ainda com o cheiro do fumo e óleo nas barbas perfiladas e espessas o velho pexote, náufrago, louco me beija só com o olhar. A madrugada move as turbinas da nossa nau, em corpos que naviformes seguem brandos para nunca mais voltar!

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ENTROPIA (Para Enrique Gabriel)

Quanto mais eu penso

Naquilo que você causa

Mais me apaixono por

Toda essa desordem

Todo esse caos que

Me transforma.

Quanto mais eu sinto

O calor que me afaga

Mais eu me entrego e

Todo amor é convertido

Assim, pura energia que

Me completa.

Amor absoluto.

Quanto maior a desordem do nosso amor, maior é nossa

entropia!

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SEMPRE GABRIELA (Para Gabriela Santos)

QUEM TEM UMA

GABRIELA ASSIM

ETERNAMENTE

SABE, DE TODAS

SÓ EXISTE UMA

ÚNICA E SOMENTE

ELA DOCE MINHA

SEMPRE GABRIELA.

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INQUIETAÇÕES DO GUILHERME (Para Guilherme)

O que é quântico? Nossa como esse lugar é sombrio! O nome do Deus da morte é Anúbis. Isso que você disse é uma metáfora. Qual é o nome mesmo daquele ser unicelular? Você vem sempre aqui? Os neutrinos existem na água. Caim matou Abel, essa foi a primeira morte da história da humanidade. Gabi, eu te amo. Da onde vem a eletricidade do raio? Nossa como você é mal-educada! Isso é inércia. Não, a vovó Inês morreu, ela não virou estrelinha, estrelas são corpos celestes! Aliás, uma estrela estava orbitando outra, e aí elas causaram um efeito estilingue...

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ADEUS (Para Sérgio Mauro de Carvalho Santos)

Confesso que não consigo Sentir saudade Porque não sinto Sua morte Não entendo sua morte Sua partida assim Sem que pudéssemos Ver-nos e recolher O passado amoroso Da infância. Não sinto saudades Porque não entendo A sua ida Porque não havia feito Um poema sequer Nem mesmo dito Meu amor. Caminhamos na fina Linha do distanciamento E por fim Seu corpo inerte Ainda me sorria Cheguei ao seu lado E você me sorria. A baía da Guanabara é bem mais bonita lá de cima!

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PARNASO (Para Leandro Henrique)

Quantas escolas literárias

Rompes-te?

Quantas palavras descobertas

Escreves-te?

Quantos versos declamados

Disseste?

Parnaso o menino cresceu...

O anjo-passarinho voou.

E pousou na melódica escala das letras

Débil, bravateou, urrou

E vomitou todos os sapos.

A que escola literária pertences?

Qual classificação lhe propuseram?

Quantas virgens-santas você deturpou?

Um malandro que amealha versos,

Enlouquece a poesia.

Infanticídio e cruel, você a domina.

Qual conjugação você usou?

Que regras você recusou?

Amasio de todas você, cospe, lambuza, gasta toda a poesia.

“Seu modernistazinho barato”.

Acha que convence com essa prosa clássica, barroca, ode cancioneira na louca

Paulicéia?

Não, não me usa mais,

Palavra, nem uma linha em si bemol, romântica.

Não pertence à classe nenhuma – seu merda -, és um parnaso na alma

E eu me dou por inteira!

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BELESARAH (Para Sarah)

Quem disse que essa

Moça precisa de

Vestido ou calçado

Quem falou que essa

Menina precisa de

Brinco ou penteado

Beleza Sarah tem rara

Feita assim só dela

Vestida de lua usa

Brincos de aquarela

Tem olhar de cinderela

A beleza é toda ela

Ninguém pode com

Esta donzela cujo

Príncipe amarela

Toda vez que sonha

Com ela descoberta

De toda a primavera!

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CATAMARÃ (Para Simone, Everaldo e filhos)

A brisa matinal

Recolhe o cheiro

Dos arrecifes...

Da costa saúdo

Os amigos junto

Aos escolhos e

O casco eleva

A gota salgada

Aos olhos que,

Choram com

Doces saudades.

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AMIGA É PRA ESSAS COISAS (Para Márcia Salomon)

OLHO NO OLHO SEMPRE

A RECEITA É FÁCIL

A BASE É UMA SÓ

IOGURTE E ALHO PORÓ.

OLHO NO OLHO CLARO

A CONVERSA É CERTEIRA

À QUEIMA-ROUPA, CATITA

USA VERSOS PRA FALAR.

OLHO NO OLHO FECHADO

NOSSA MUSA É FAGUEIRA

TEM A ALMA ENCANTADA

NUM CORPO DE MULHER.

MINHA DOCE AMIGA

QUE ENCANTA ALUCINA

SOBERBA E FACEIRA

ENTREGO-ME A VOCÊ.

É O PECADO DA GULA

DE TAMANHA FORMOSURA

QUE TODOS TÊM SEMPRE

MUITA FOME DE TE AMAR.

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A BABADA (Para André Aguirra)

Tem gente que

Nasceu para babar

Baba pela esposa

Por aquele que canta

Talvez pelo que declame

Baba no tal saxofone

No Baden e no clarinete.

Mas não tem nada

Melhor do que

Babar de prazer

Prazer de beber

Beber e sorrir

Cantar e grunhir

Babujar até a

Madrugada cair!

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POEMA DAS RIMAS POBRES, MAS DAS ALMAS LAVADAS

(Para Fábio Roberto)

Todo sarau é especial!

Não importa o acontecido,

é fenomenal.

Qualquer explosão,

é magistral.

Se há uma composição,

é sensacional.

Se tem uma gargalhada,

é descomunal.

Se rola uma bebida,

é original.

Se cantam uma canção,

é celestial.

Se declamam uma poesia

é labial.

Se surge uma boa história,

é vicinal.

Inexplicável, inesgotável, inescusável,

inestimável, inexaurível, inexcedível,

gozo angelical.

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A MENINA COM NOME (Para Lola)

Nem nome de música Muito menos de revista Eu leio e ouço, apenas A menina; Lola. Tantaliza a lente turva Um olhar de brandura Intensa e tamanha... A doçura; Lola. Por que ganhar a poesia? Apenas por um olhar? É que é digno de maestria Aquele olhar que sangria Meu arrevessado dia-a-dia!

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OUTRO APÓLOGO (Para Machado de Assis)

Queria incomensuravelmente ter o novelo da mesma linha, com a qual você costurou, sua literatura.

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LUGAR COMUM (Para Mário Prata)

Já que estamos aqui

pro que der e vier,

com uma imensa batata quente nas mãos

e já sabemos, que isso

tudo é para inglês ver...

Que tal então matar

a cobra e mostrar o pau?

Parar de meter os pés pelas mãos

e tirar o cavalinho da chuva, porque

para nossa vida

melhorar, é preciso

ver uma luz no fim do túnel,

entender que um dia é da caça

e outro do caçador, e mais...

Saber que é preciso

abafar a banca e

afogar o ganso!

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ESTRANHEZAS

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ENDOSSADO

Eles eram escritores infelizes,

todos eles não tinham família e

restava apenas,

a palavra torta

que saía.

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SINIMBU

ARRASTO ASSIM

A VIDA MEIO REVÉS

CAMALEOA, LEOA

LOUCA, ASSUSTADA

MUITAS DAS VEZES

DESVAIRADA PRESA

AO CONVÉS DO DIA

LARGO E FRÁGIL

QUE ME CAMUFLA

DAQUILO QUE TENTO

VERDADEIRAMENTE

SER!

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SECARRÃO

Vestiu o melhor paletó

que tinha.

Limpou os pés antes de calçar

as botinas.

Caminhou sem sujar a barra

das calças.

Arrancou florezinhas selvagens num buquezinho

sem graça.

Desapertou o passo para não suar

e cheirar.

Na praça, meio sem jeito, esticou o macinho

murcho,

para as mãos da moça que sorriu

largamente...

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INÍQUO

À revelia

dessa nova ortografia

para, já disse

pára porque eu quero

ver o vôo das palavras,

com trema e

que tremam os gramáticos!

Pelo menos largaram

o circunflexo da sequência;

que faço com as saudades do

éi- ói, terrível epopeia;

À queima-roupa arrancaram

do pé de moleque e do olho da sogra

o tal do hífen e a exceção ficou

ao deus-dará.

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HEURÍSTICA

A palavra, qual é

uma descoberta e vem

nua, vazia, sem calça.

Se junta, recria, inventa

reza, na pressa, em

forma, precisa, balança

na cabeça erudita e

solta, reinventa, nos miolos

cria um problema

e desaparece muda

na hora certa.

A cria, modela, ginga, estúpida, acha, decide e grita:

Eureca!!!

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BOSQUEJOS

A ideia que se tem da vida nunca é real,

ela vem vestida dos imprevistos.

A haplologia aniquilou o bondadoso em bondoso

e não consegue assassinar

o pleonasmo vicioso.

O descuido é a falta de cuidado

e a desculpa é evasiva.

O script de uma grande amizade

está sempre inacabado.

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TANTALIZAR ARRASTA O MAR MASTRO CAÍDO O SOL QUEIMA UM CORPO QUE BOIA.

NENHUM TEMA É TÉTRICO PARA A POESIA PUTREFATA.

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VICISSITUDES O bolo encruou A fila empacou O ônibus passou O gás acabou O sono chegou O amor acostumou A comida exagerou A grana encurtou O sol escondeu A chuva alagou A vida cessou!

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SOVIETE

Queria promover

Um conselho dentro

De mim mesma

Fechar um olho

Apenas para a tristeza

Apaziguar o trato e

Discutir, abertamente

E descobrir o que

Aflige mais hoje

Juntar minhas partes

Numa soviete solitária

Da minha alma comunista

Provocando a derrocada

Definitiva, da minha

Imensa agonia.

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ÁLGIDO

O olhar era distante... O corpo inerte não mexia Era apenas um sapo mudo No dia gelado, sobre a folha Na pele, a camada de água Orvalhada em gotas gélidas. Nem coaxa o coitado, respira E aguarda o sol do meio-dia.

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LÁBIL

O Sol foi e veio A chuva deu uma Trégua passageira Homem se enganou Passagens transitórias Tudo cai e oscila feito pêndulo Uma hora vai pra lá outra para cá.

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BRAVATA Amaré brava! Moça bravateia o rosto bravio, quer sempre ouvir os bravos, bravos!

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DEBÊNTURE

SE O TAL VERSO NÃO QUIS SALTAR PEÇO AO LEITOR ME DESCULPAR GUARDO A PENA SOBRE PROTESTO PARA UM DIA CONSEGUIR USAR!

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LINHAS POÉTICAS

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MARCA DE GADO

Ferro em brasa

Quente marca

Para sempre a

Palavra mal dita

O verbo rasgado

Fere igual boca

Do indivíduo que

Diz aquilo que lhe

Convém.

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MILISEGUNDO

Muitas das vezes o tempo não dá conta de apagar todo nosso

sofrimento. E assim fingimos que esquecemos, disfarçamos,

substituímos e até nos enganamos.

Mas...

Ali, quando nos encontramos conosco ás avessas é que

enxergamos que o tempo não foi suficiente, os segundos foram

curtos e a vida passou meio que despercebida por nós.

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DECÍDUO

O que faz um poeta quando o seu tempo acabou? Quando o cotidiano engole vorazmente o seu ócio criativo? Quando seus papéis sociais são trocados e ele, um qualquer, sufocado pelo dia-a-dia? O que faço com a poesia trancada, guardada, pulvurulenta? Onde está minha rede, a madrugada, o silêncio, o café, longas baforadas, amigos do meu lirismo, agora dormente. -Tragam meus versos, para eu lavá-los e passá-los! A vida deu uma breve parada, eu sei! É o fim do horário de verão, e, certamente, o fim do horário da minha poesia...

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PEQUENAS CONSIDERAÇÕES PARA QUANDO O

CARNAVAL CHEGAR

Abre alas que a porta-estandarte da alma

girou a bandeira do pensamento

e sambou.

Recesso de carnaval

para rasgar a fantasia.

Esperei a resposta-repente

carnavalesca e nada.

O samba-enredo desfilou

com a bateria na ponta da língua.

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MAS É CARNAVAL

É sempre carnaval; só trocamos as fantasias. Vai me dizer que não está agora em cima do carro alegórico, prestes a cair. Ou ainda, está assistindo a escola passar antes ou depois do tempo estipulado por Deus. Cuidado ou a bateria atropela-te.

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TAUTOLOGIA

O chão seco e quente queima os pés das crianças lavradoras no caminho longo para a escola... E mais de dez poesias são escritas sobre esse tema nesse exato momento. Salve-se da criança esperança!

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DAS INTERROGATIVAS, EXCLAMATIVAS E

ESPARRELAS

O que te fazes gostar tanto assim da vida? Por que te alegras tanto em retirar todos os caroços da melancia a ser comida? Como consegues rir para o beija-flor? Com que olhares submissos te entregas à lua cheia? Você nem em Deus acredita! O buraco é enorme! A água evaporou! Seu time não foi campeão! E as mulatas não sambam mais! A música não é mais honesta! A poesia é cega-e-surda! ... Pare de sorrir, esconde esse dente, hão de te chamar de hipócrita. E a cada novo sorriso teu, o amanhã reage diferente e provavelmente eu quero estar contigo.

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QUE COISA!

Recolhi no jardim de minha casa alguns fragmentos do medo que havia enterrado por lá, outrora, e que hoje brotaram verdes e prontos para crescerem novamente.

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SURPRESA

A surpresa é efêmera, dura apenas o tempo de não sabê-la. A surpresa é um acaso, sobrevive apenas da duração da conspiração. A surpresa é a morte, perdura na esperança remota da lembrança.

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RENDA

O entremeio entre a vida e a morte não são as besteiras, são sim as tentativas!

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OS CENS

Sem vergonha

Cem palavras

Sem escrínio

Cem paixões

Sem amor

Cem notas

Sem roupa

Cem casos

Sem fome

Cem versos

Sem verbos

Os cens escrevinhos!

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QUARK

Divido-me em partes

combinadas no infinito,

cada pedaço exportado ou

importado de mim

é um fractal que se

despedaça.

Minha ínfima matéria

quer ser um quasar,

quase líquido e embebido

que quando pulsado,

jorra uma luz colorida

no universo.

Quantum de mim está

aqui, ali ou acolá?

Se o que resta desse

fragmento de energia é

simplesmente a pura

magia do meu quark!

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MELANCOLIA

Com os pés descalços Subi a colina inteira Arregaçava a calça E caminhava sem parar Olhava o fim do céu Queria tocá-lo e acelerei O passo, no desejo sempre Há cansaço e cada angústia Que disfarço, se acomoda Feito um pássaro que no Ninho, em descompasso Esconde a cria num chumaço Para ninguém poder ver ... No fim da colina Há sempre um pássaro.

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ÁTIMO

Não quero

Não almejo

Não vejo

Não necessito

Não desejo

Não beijo

Não bebo

Não minto

Não omito

Não culpo

Não aspiro

Não aspiro a

Não discrimino

Não descrimino

Não sonho

Não sei

Não arrisco

Penso, penso!

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ALÍSIOS

SOPRA E VARRE

TODA A POEIRA

QUE GUARDADA

CARREGA A SAUDADE

DA MINHA INFÂNCIA

QUE SE PERDEU.