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POEMAS E TEXTOS POETICOS
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MARILI SANTOS
LINHAS POÉTICAS
2
Para tudo que pode virar poesia...
3
HAICAIS
4
HAICAIS DA INFÂNCIA
I
“Pé-de-lata”
No pé do menino
Saltitando pro infinito.
II
Boneca de pano
Com cabelos de lã
Jogados no chão.
III
De um estilingue,
Sai um tiro
Olha o passarinho!
5
HAICAI NORDESTINO
Liteira de couro
Boizinho puxando
O pó seco range, range.
FRIAGEM
Quando está teimosa... A invernagem egoísta só traz interlúnios.
COLHEITA
Depois da outonada, o menino apanhador o tempo-será!
HAICAI DA DÚVIDA
O rio verde talvez talvegue pela tarde adormecida!
HAICAI DA CERTEZA
A tarde adormecida
despenca algures
cheiro de Sol!
6
FEITOS À MÃO
7
TRASANTONTEM (Para Enrique Gabriel) O marujo atraca no terceiro navio e a noite despenca no cais iluminado. Limpo a areia da perna, enquanto aproveito para me perfumar. Ainda com o cheiro do fumo e óleo nas barbas perfiladas e espessas o velho pexote, náufrago, louco me beija só com o olhar. A madrugada move as turbinas da nossa nau, em corpos que naviformes seguem brandos para nunca mais voltar!
8
ENTROPIA (Para Enrique Gabriel)
Quanto mais eu penso
Naquilo que você causa
Mais me apaixono por
Toda essa desordem
Todo esse caos que
Me transforma.
Quanto mais eu sinto
O calor que me afaga
Mais eu me entrego e
Todo amor é convertido
Assim, pura energia que
Me completa.
Amor absoluto.
Quanto maior a desordem do nosso amor, maior é nossa
entropia!
9
SEMPRE GABRIELA (Para Gabriela Santos)
QUEM TEM UMA
GABRIELA ASSIM
ETERNAMENTE
SABE, DE TODAS
SÓ EXISTE UMA
ÚNICA E SOMENTE
ELA DOCE MINHA
SEMPRE GABRIELA.
10
INQUIETAÇÕES DO GUILHERME (Para Guilherme)
O que é quântico? Nossa como esse lugar é sombrio! O nome do Deus da morte é Anúbis. Isso que você disse é uma metáfora. Qual é o nome mesmo daquele ser unicelular? Você vem sempre aqui? Os neutrinos existem na água. Caim matou Abel, essa foi a primeira morte da história da humanidade. Gabi, eu te amo. Da onde vem a eletricidade do raio? Nossa como você é mal-educada! Isso é inércia. Não, a vovó Inês morreu, ela não virou estrelinha, estrelas são corpos celestes! Aliás, uma estrela estava orbitando outra, e aí elas causaram um efeito estilingue...
11
ADEUS (Para Sérgio Mauro de Carvalho Santos)
Confesso que não consigo Sentir saudade Porque não sinto Sua morte Não entendo sua morte Sua partida assim Sem que pudéssemos Ver-nos e recolher O passado amoroso Da infância. Não sinto saudades Porque não entendo A sua ida Porque não havia feito Um poema sequer Nem mesmo dito Meu amor. Caminhamos na fina Linha do distanciamento E por fim Seu corpo inerte Ainda me sorria Cheguei ao seu lado E você me sorria. A baía da Guanabara é bem mais bonita lá de cima!
12
PARNASO (Para Leandro Henrique)
Quantas escolas literárias
Rompes-te?
Quantas palavras descobertas
Escreves-te?
Quantos versos declamados
Disseste?
Parnaso o menino cresceu...
O anjo-passarinho voou.
E pousou na melódica escala das letras
Débil, bravateou, urrou
E vomitou todos os sapos.
A que escola literária pertences?
Qual classificação lhe propuseram?
Quantas virgens-santas você deturpou?
Um malandro que amealha versos,
Enlouquece a poesia.
Infanticídio e cruel, você a domina.
Qual conjugação você usou?
Que regras você recusou?
Amasio de todas você, cospe, lambuza, gasta toda a poesia.
“Seu modernistazinho barato”.
Acha que convence com essa prosa clássica, barroca, ode cancioneira na louca
Paulicéia?
Não, não me usa mais,
Palavra, nem uma linha em si bemol, romântica.
Não pertence à classe nenhuma – seu merda -, és um parnaso na alma
E eu me dou por inteira!
13
BELESARAH (Para Sarah)
Quem disse que essa
Moça precisa de
Vestido ou calçado
Quem falou que essa
Menina precisa de
Brinco ou penteado
Beleza Sarah tem rara
Feita assim só dela
Vestida de lua usa
Brincos de aquarela
Tem olhar de cinderela
A beleza é toda ela
Ninguém pode com
Esta donzela cujo
Príncipe amarela
Toda vez que sonha
Com ela descoberta
De toda a primavera!
14
CATAMARÃ (Para Simone, Everaldo e filhos)
A brisa matinal
Recolhe o cheiro
Dos arrecifes...
Da costa saúdo
Os amigos junto
Aos escolhos e
O casco eleva
A gota salgada
Aos olhos que,
Choram com
Doces saudades.
15
AMIGA É PRA ESSAS COISAS (Para Márcia Salomon)
OLHO NO OLHO SEMPRE
A RECEITA É FÁCIL
A BASE É UMA SÓ
IOGURTE E ALHO PORÓ.
OLHO NO OLHO CLARO
A CONVERSA É CERTEIRA
À QUEIMA-ROUPA, CATITA
USA VERSOS PRA FALAR.
OLHO NO OLHO FECHADO
NOSSA MUSA É FAGUEIRA
TEM A ALMA ENCANTADA
NUM CORPO DE MULHER.
MINHA DOCE AMIGA
QUE ENCANTA ALUCINA
SOBERBA E FACEIRA
ENTREGO-ME A VOCÊ.
É O PECADO DA GULA
DE TAMANHA FORMOSURA
QUE TODOS TÊM SEMPRE
MUITA FOME DE TE AMAR.
16
A BABADA (Para André Aguirra)
Tem gente que
Nasceu para babar
Baba pela esposa
Por aquele que canta
Talvez pelo que declame
Baba no tal saxofone
No Baden e no clarinete.
Mas não tem nada
Melhor do que
Babar de prazer
Prazer de beber
Beber e sorrir
Cantar e grunhir
Babujar até a
Madrugada cair!
17
POEMA DAS RIMAS POBRES, MAS DAS ALMAS LAVADAS
(Para Fábio Roberto)
Todo sarau é especial!
Não importa o acontecido,
é fenomenal.
Qualquer explosão,
é magistral.
Se há uma composição,
é sensacional.
Se tem uma gargalhada,
é descomunal.
Se rola uma bebida,
é original.
Se cantam uma canção,
é celestial.
Se declamam uma poesia
é labial.
Se surge uma boa história,
é vicinal.
Inexplicável, inesgotável, inescusável,
inestimável, inexaurível, inexcedível,
gozo angelical.
18
A MENINA COM NOME (Para Lola)
Nem nome de música Muito menos de revista Eu leio e ouço, apenas A menina; Lola. Tantaliza a lente turva Um olhar de brandura Intensa e tamanha... A doçura; Lola. Por que ganhar a poesia? Apenas por um olhar? É que é digno de maestria Aquele olhar que sangria Meu arrevessado dia-a-dia!
19
OUTRO APÓLOGO (Para Machado de Assis)
Queria incomensuravelmente ter o novelo da mesma linha, com a qual você costurou, sua literatura.
20
LUGAR COMUM (Para Mário Prata)
Já que estamos aqui
pro que der e vier,
com uma imensa batata quente nas mãos
e já sabemos, que isso
tudo é para inglês ver...
Que tal então matar
a cobra e mostrar o pau?
Parar de meter os pés pelas mãos
e tirar o cavalinho da chuva, porque
para nossa vida
melhorar, é preciso
ver uma luz no fim do túnel,
entender que um dia é da caça
e outro do caçador, e mais...
Saber que é preciso
abafar a banca e
afogar o ganso!
21
ESTRANHEZAS
22
ENDOSSADO
Eles eram escritores infelizes,
todos eles não tinham família e
restava apenas,
a palavra torta
que saía.
23
SINIMBU
ARRASTO ASSIM
A VIDA MEIO REVÉS
CAMALEOA, LEOA
LOUCA, ASSUSTADA
MUITAS DAS VEZES
DESVAIRADA PRESA
AO CONVÉS DO DIA
LARGO E FRÁGIL
QUE ME CAMUFLA
DAQUILO QUE TENTO
VERDADEIRAMENTE
SER!
24
SECARRÃO
Vestiu o melhor paletó
que tinha.
Limpou os pés antes de calçar
as botinas.
Caminhou sem sujar a barra
das calças.
Arrancou florezinhas selvagens num buquezinho
sem graça.
Desapertou o passo para não suar
e cheirar.
Na praça, meio sem jeito, esticou o macinho
murcho,
para as mãos da moça que sorriu
largamente...
25
INÍQUO
À revelia
dessa nova ortografia
para, já disse
pára porque eu quero
ver o vôo das palavras,
com trema e
que tremam os gramáticos!
Pelo menos largaram
o circunflexo da sequência;
que faço com as saudades do
éi- ói, terrível epopeia;
À queima-roupa arrancaram
do pé de moleque e do olho da sogra
o tal do hífen e a exceção ficou
ao deus-dará.
26
HEURÍSTICA
A palavra, qual é
uma descoberta e vem
nua, vazia, sem calça.
Se junta, recria, inventa
reza, na pressa, em
forma, precisa, balança
na cabeça erudita e
solta, reinventa, nos miolos
cria um problema
e desaparece muda
na hora certa.
A cria, modela, ginga, estúpida, acha, decide e grita:
Eureca!!!
27
BOSQUEJOS
A ideia que se tem da vida nunca é real,
ela vem vestida dos imprevistos.
A haplologia aniquilou o bondadoso em bondoso
e não consegue assassinar
o pleonasmo vicioso.
O descuido é a falta de cuidado
e a desculpa é evasiva.
O script de uma grande amizade
está sempre inacabado.
28
TANTALIZAR ARRASTA O MAR MASTRO CAÍDO O SOL QUEIMA UM CORPO QUE BOIA.
NENHUM TEMA É TÉTRICO PARA A POESIA PUTREFATA.
29
VICISSITUDES O bolo encruou A fila empacou O ônibus passou O gás acabou O sono chegou O amor acostumou A comida exagerou A grana encurtou O sol escondeu A chuva alagou A vida cessou!
30
SOVIETE
Queria promover
Um conselho dentro
De mim mesma
Fechar um olho
Apenas para a tristeza
Apaziguar o trato e
Discutir, abertamente
E descobrir o que
Aflige mais hoje
Juntar minhas partes
Numa soviete solitária
Da minha alma comunista
Provocando a derrocada
Definitiva, da minha
Imensa agonia.
31
ÁLGIDO
O olhar era distante... O corpo inerte não mexia Era apenas um sapo mudo No dia gelado, sobre a folha Na pele, a camada de água Orvalhada em gotas gélidas. Nem coaxa o coitado, respira E aguarda o sol do meio-dia.
32
LÁBIL
O Sol foi e veio A chuva deu uma Trégua passageira Homem se enganou Passagens transitórias Tudo cai e oscila feito pêndulo Uma hora vai pra lá outra para cá.
33
BRAVATA Amaré brava! Moça bravateia o rosto bravio, quer sempre ouvir os bravos, bravos!
34
DEBÊNTURE
SE O TAL VERSO NÃO QUIS SALTAR PEÇO AO LEITOR ME DESCULPAR GUARDO A PENA SOBRE PROTESTO PARA UM DIA CONSEGUIR USAR!
35
LINHAS POÉTICAS
36
MARCA DE GADO
Ferro em brasa
Quente marca
Para sempre a
Palavra mal dita
O verbo rasgado
Fere igual boca
Do indivíduo que
Diz aquilo que lhe
Convém.
37
MILISEGUNDO
Muitas das vezes o tempo não dá conta de apagar todo nosso
sofrimento. E assim fingimos que esquecemos, disfarçamos,
substituímos e até nos enganamos.
Mas...
Ali, quando nos encontramos conosco ás avessas é que
enxergamos que o tempo não foi suficiente, os segundos foram
curtos e a vida passou meio que despercebida por nós.
38
DECÍDUO
O que faz um poeta quando o seu tempo acabou? Quando o cotidiano engole vorazmente o seu ócio criativo? Quando seus papéis sociais são trocados e ele, um qualquer, sufocado pelo dia-a-dia? O que faço com a poesia trancada, guardada, pulvurulenta? Onde está minha rede, a madrugada, o silêncio, o café, longas baforadas, amigos do meu lirismo, agora dormente. -Tragam meus versos, para eu lavá-los e passá-los! A vida deu uma breve parada, eu sei! É o fim do horário de verão, e, certamente, o fim do horário da minha poesia...
39
PEQUENAS CONSIDERAÇÕES PARA QUANDO O
CARNAVAL CHEGAR
Abre alas que a porta-estandarte da alma
girou a bandeira do pensamento
e sambou.
Recesso de carnaval
para rasgar a fantasia.
Esperei a resposta-repente
carnavalesca e nada.
O samba-enredo desfilou
com a bateria na ponta da língua.
40
MAS É CARNAVAL
É sempre carnaval; só trocamos as fantasias. Vai me dizer que não está agora em cima do carro alegórico, prestes a cair. Ou ainda, está assistindo a escola passar antes ou depois do tempo estipulado por Deus. Cuidado ou a bateria atropela-te.
41
TAUTOLOGIA
O chão seco e quente queima os pés das crianças lavradoras no caminho longo para a escola... E mais de dez poesias são escritas sobre esse tema nesse exato momento. Salve-se da criança esperança!
42
DAS INTERROGATIVAS, EXCLAMATIVAS E
ESPARRELAS
O que te fazes gostar tanto assim da vida? Por que te alegras tanto em retirar todos os caroços da melancia a ser comida? Como consegues rir para o beija-flor? Com que olhares submissos te entregas à lua cheia? Você nem em Deus acredita! O buraco é enorme! A água evaporou! Seu time não foi campeão! E as mulatas não sambam mais! A música não é mais honesta! A poesia é cega-e-surda! ... Pare de sorrir, esconde esse dente, hão de te chamar de hipócrita. E a cada novo sorriso teu, o amanhã reage diferente e provavelmente eu quero estar contigo.
43
QUE COISA!
Recolhi no jardim de minha casa alguns fragmentos do medo que havia enterrado por lá, outrora, e que hoje brotaram verdes e prontos para crescerem novamente.
44
SURPRESA
A surpresa é efêmera, dura apenas o tempo de não sabê-la. A surpresa é um acaso, sobrevive apenas da duração da conspiração. A surpresa é a morte, perdura na esperança remota da lembrança.
45
RENDA
O entremeio entre a vida e a morte não são as besteiras, são sim as tentativas!
46
OS CENS
Sem vergonha
Cem palavras
Sem escrínio
Cem paixões
Sem amor
Cem notas
Sem roupa
Cem casos
Sem fome
Cem versos
Sem verbos
Os cens escrevinhos!
47
QUARK
Divido-me em partes
combinadas no infinito,
cada pedaço exportado ou
importado de mim
é um fractal que se
despedaça.
Minha ínfima matéria
quer ser um quasar,
quase líquido e embebido
que quando pulsado,
jorra uma luz colorida
no universo.
Quantum de mim está
aqui, ali ou acolá?
Se o que resta desse
fragmento de energia é
simplesmente a pura
magia do meu quark!
48
MELANCOLIA
Com os pés descalços Subi a colina inteira Arregaçava a calça E caminhava sem parar Olhava o fim do céu Queria tocá-lo e acelerei O passo, no desejo sempre Há cansaço e cada angústia Que disfarço, se acomoda Feito um pássaro que no Ninho, em descompasso Esconde a cria num chumaço Para ninguém poder ver ... No fim da colina Há sempre um pássaro.
49
ÁTIMO
Não quero
Não almejo
Não vejo
Não necessito
Não desejo
Não beijo
Não bebo
Não minto
Não omito
Não culpo
Não aspiro
Não aspiro a
Não discrimino
Não descrimino
Não sonho
Não sei
Não arrisco
Penso, penso!
50
ALÍSIOS
SOPRA E VARRE
TODA A POEIRA
QUE GUARDADA
CARREGA A SAUDADE
DA MINHA INFÂNCIA
QUE SE PERDEU.