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Monitoramento da ictiofauna na área de influencia da UHE Irapé entre 2008/09 Francisco de Andrade Biólogo de campo do Programa Peixe Vivo CRBio 44968/04

Monitoramento da ictiofauna na área de influencia da UHE ... · Salinas próximo ao ponto de coleta ... dos pontos está evidenciada na Figura 1. A Tabela 1 e as Figuras 2 ... Em

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Monitoramento da ictiofauna na área de

influencia da UHE Irapé entre 2008/09

Francisco de Andrade – Biólogo de campo do Programa Peixe Vivo

CRBio 44968/04

Sumário

Apresentação ................................................................................................................................. 2

Introdução ..................................................................................................................................... 3

Objetivos ....................................................................................................................................... 4

Metodologia .................................................................................................................................. 4

Nota sobre as diferenças metodológicas do trabalho realizado entre 2003-06 e o de 2008-09

................................................................................................................................................... 4

Nota sobre o processamento do material coletado ................................................................. 5

Pontos de amostragem ............................................................................................................. 5

Cronograma das amostragens .................................................................................................. 9

Métodos de coleta .................................................................................................................. 10

Cálculo da produtividade numérica ........................................................................................ 10

Medidas de diversidade, equitabilidade e similaridade ......................................................... 10

Aspectos taxonômicos ............................................................................................................ 11

Caracterização preliminar da pesca no reservatório .............................................................. 11

Resultados e discussão ................................................................................................................ 11

Composição da ictiofauna ....................................................................................................... 11

CPUE para tarrafa em P4 ......................................................................................................... 13

CPUE para redes de espera ..................................................................................................... 15

Medidas de diversidade, equitabilidade e similaridade ......................................................... 18

Abundância de peixes no canal de fuga .................................................................................. 15

Relação entre a captura de peixes e o volume útil do reservatório ....................................... 19

Caracterização preliminar da pesca no reservatório .............................................................. 20

Espécies exóticas ..................................................................................................................... 22

Bibliografia ................................................................................................................................. 22

Apresentação

A partir de 2008 o Programa Peixe Vivo (PPV) assumiu o monitoramento da ictiofauna da área

de influência da Usina Hidrelétrica de Irapé (UHIR) após o fim dos quatro anos do trabalho

(2003 – 06) realizados pelo Centro de Transposição de Peixes da Universidade Federal de

Minas Gerais (CTPEIXES – UFMG). O primeiro estudo esteve focado nos impactos do

barramento sobre a estrutura da assembléia de peixes, durante o enchimento. O presente

trabalho também continuou investigando o processo de reestruturação da ictiofauna no

reservatório. Além disso, a operação da usina e as suas relações com a ictiofauna a jusante

também foram abordadas. O surgimento de uma pequena atividade pesqueira comercial e

esportiva também foi identificado e caracterizado.

A coleta de material ictiológico foi autorizada pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF) através

da licença para pesca científica, categoria D e número 040/08.

Introdução

A UHIR está localizada na região do alto-médio rio Jequitinhonha, entre os municípios

de Berilo e Grão Mogol. Seu reservatório se estende por até 137 km2 e atinge as cidades de José

Gonçalves de Minas, Cristália, Leme do Prado, Botumirim e Turmalina, todas no estado de

Minas Gerais. Próximo à barragem, o reservatório apresenta profundidades superiores a 200

metros. A potência instalada é de 360 MWh, produzidos por três unidades geradoras do tipo

Francis.

O reservatório é considerado jovem, uma vez que a UHIR iniciou sua operação em

2006. Por isso, a assembléia de peixes ainda se encontra em fase de colonização (Agostinho et.

al 2007). Em reservatórios brasileiros essa fase é caracterizada por elevada produção biológica

resultante da liberação de nutrientes durante a decomposição da matéria orgânica que foi

submersa pelo enchimento do reservatório (Agostinho et. al 2007).

O monitoramento da ictiofauna não é uma condicionante ambiental para a operação da

usina. Entretanto, de acordo com o Plano de Controle Ambiental (Delphi, 2001), é necessário

monitoramento da ictiofauna na fase pós-enchimento, para acompanhamento das tendências na

dinâmica das populações (principalmente alterações dos estoques pesqueiros), servindo de base

para a indicação de intervenções que se fizerem necessárias ao manejo das populações que

forem afetadas pela formação do reservatório.

Os efeitos do barramento são, de certa forma, previsíveis para a assembléia de peixes do

reservatório, uma vez que o monitoramento de vários reservatórios brasileiros mostra padrões

nos processos de colonização ao longo do tempo (Agostinho et. al 1999). Entretanto, muito

pouco se conhece sobre a biologia das espécies de peixes da bacia. Informações básicas como

período reprodutivo, tamanho de primeira maturação, tipo de desova, são muito importantes e

certamente irão direcionar as alternativas de manejo da pesca no reservatório (Bone & Moore,

2008). No presente trabalho buscou-se adequar as demandas do PCA à realidade da bacia,

explorando-se ao mesmo tempo as dinâmicas do reservatório e algumas características da

biologia das espécies de interesse, como reprodução e dieta.

Objetivos

O monitoramento da ictiofauna na região da UHE Irapé teve como objetivo geral avaliar a

estrutura da comunidade de peixes nos trechos lóticos e lênticos do rio Jequitinhonha e em

alguns afluentes direta ou indiretamente afetados pelo barramento. Especificamente, este projeto

buscou:

Determinar a composição da ictiofauna com relação à abundância relativa e similaridade

entre os pontos de coleta;

Estimar as produtividades em número e biomassa das espécies por ponto e período

amostrados, bem como os petrechos utilizados, através da captura por unidade de esforço

(CPUE);

Avaliar ao longo do tempo, as espécies mais abundantes nas proximidades do canal de

fuga da usina e suas relações com a operação da usina.

Metodologia

Nota sobre as diferenças metodológicas do trabalho realizado entre 2003-06 e o de 2008-09

Os dois trabalhos de monitoramento seguiram a mesma base metodológica baseada em coletas

periódicas em locais previamente determinados na área de influência da UHIR. Entretanto,

algumas alterações foram propostas no presente trabalho, e que podem gerar resultados e

interpretações diferentes. As principais serão listadas abaixo e outras serão discutidas

individualmente no texto.

a) Exclusão do ponto P6 do monitoramento anterior devido à poluição da água do rio

Salinas próximo ao ponto de coleta (em Rubelita) (IGAM, 2007).

b) Inclusão de pontos a montante do reservatório, nos rios Jequitinhonha e Itacambiruçú.

c) Inclusão da tarrafa de malha 5,5 (entre nós opostos) como apetrecho de coleta em P1,

P4, P5 e P7 e sua quantificação em P4.

d) Realização de cinco amostragens no período de um ano ao invés das quatro feitas no

trabalho anterior.

Nota sobre o processamento do material coletado

Em setembro de 2008, a partir de uma parceria informal, o PPV passou a fornecer material

ictiológico do Jequitinhonha à PUC Minas para estudos de dieta e reprodução. Como a literatura

é muito escassa sobre os peixes da bacia, inicialmente todas as espécies poderiam ser utilizadas

nesses estudos. Após a avaliação das quantidades e constâncias dos peixes entre os pontos e

períodos de coleta, ficou decidido que seriam priorizados o roncador (Wertheimeria maculata),

a Maria-mole (Trachelyopterus striatulus), a curimba (Prochilodus hartii), o timburé

(Hypomasticus garmani) e a piapara (Leporinus crassilabris).

Os peixes foram diretamente enviados à PUC Minas, sem qualquer processamento em campo.

Os dados biométricos estão sendo obtidos inicialmente para as espécies priorizadas e as demais

serão processadas assim que terminarem as primeiras ou quando houver número de indivíduos

suficiente para seu aproveitamento. Desta forma, só serão mostrados aqui dados referentes ao

número de indivíduos e não haverá referência ao estádio de maturação gonadal, classe de

tamanho ou biomassa.

Estão envolvidos no trabalho os professores Nilo Bazzoli e Gilmar Bastos Santos, bem como

seus alunos de graduação. Para o ano de 2009 estão previstas as finalizações de monografias e a

divulgação dos trabalhos no XXVIII Congresso de Zoologia. Os resultados desses trabalhos

serão enviados e apresentados à CEMIG quando forem concluídos.

Pontos de amostragem

Ao todo foram amostrados sete pontos distantes até 160 km a montante e 60 km a jusante da

barragem. Com relação ao tipo de ambiente amostrado, dois pontos estão situados em trechos

lênticos e os demais em trechos lóticos. Três rios foram amostrados, sendo o Jequitinhonha em

quatro pontos, o Itacambiruçú em dois e o Vacaria em um. No que se refere à orientação em

relação à barragem, quatro pontos estão localizados a montante e três a jusante. A distribuição

dos pontos está evidenciada na Figura 1. A Tabela 1 e as Figuras 2, 3, 4, 5 e 6 trazem a

caracterização de cada ponto.

N

Figura 1: Pontos de coleta do monitoramento de 2008-09.

Tabela 1: Características dos pontos de coleta.

Ponto Rio Orientação em

relação a barragem

Tipo de

ambiente

Largura

(m)

Sob regime hidrológico

natural

Influencia da

operaçao de Irapé

Profundidade

máxima (m)

Tipo de Substrato

1 Jequitinhonha Montante lótico 30 Sim Nenhuma 3 cascalho, areia e algumas corredeiras

2 Jequitinhonha Reservatório lêntico 300 Não Indireta > 100 nao determinado

3 Itacambiruçú Reservatório lêntico 200 Não Indireta > 100 nao determinado

4 Jequitinhonha Jusante lótico 30 Não Muito alta 15 rochoso com corredeiras

5 Jequitinhonha Jusante lótico 50 Não Alta 10 arenoso com trechos rochosos e corredeiras

6 Vacaria Jusante lótico 15 Sim Nenhuma 2 rochoso com corredeiras

7 Itacambiruçú Montante lótico 30 Sim nenhuma 1,5 rochoso com corredeiras

Figura 2: Ponto 1, rio Jequitinhonha em agosto de 2008.

Figura 3: Reservatório visto do acesso ao povoado de Malhado, próximo ao ponto 2, em agosto

de 2008.

Figura 4: Rio Vacaria no ponto 6, visto do alto do acesso á cidade de Padre Carvalho em agosto

de 2008.

Figura 5: Ponto 7, rio Itacambiruçú em agosto de 2008.

Figura 6: Ponto 4 no rio Jequitinhonha em diferentes vazões. De A – E, canal de fuga. De F – H,

vertedouro.

Cronograma das amostragens

O trabalho foi realizado entre junho/2008 e maio/2009, cobrindo períodos de enchimento e

deplecionamento do reservatório e de vazões defluentes altas e baixas (Figura 7). Para atender

ao monitoramento do canal de fuga foram feitas coletas mensais no P4, com exceção de

setembro. O monitoramento da área de influência foi realizado em agosto e outubro/2008;

janeiro, março e maio/2009 (Figura 7). Em janeiro/2009 não foi possível utilizar redes de espera

no P7, pois o rio se encontrava muito cheio e com correntezas fortes que colocaram em risco a

segurança dos coletores. A amostragem do P1 que deveria ter sido feita em março/2009

aconteceu em abril/2009 devido à necessidade da presença da equipe em outras atividades da

UHIR.

Figura 7: Médias das vazões afluentes e defluentes durante o período de trabalho. Os meses em

que houve coletas foram indicados com (exceto P4 que teve coletas mensais).

Métodos de coleta

Para se coletar peixes no maior número de ambientes possível foram utilizadas redes de espera,

tarrafas e redes de arrasto conforme as possibilidades de cada ponto. As redes utilizadas tinham

10 metros de comprimento, altura variando de 1,5 a 3,2 metros e malhas com 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10,

12, 14 e 16 cm entre nós opostos. Utilizou-se tarrafas de malha 5,5 e tarrafinhas com 2,4 cm

entre nós opostos. Os arrastos foram feitos no reservatório com redes de malha 2,4 cm entre nós

opostos.

Cálculo da produtividade numérica

A captura por unidade de esforço em número de indivíduos (CPUE) foi obtida para redes de

emalhar em todos os pontos e para tarrafa no P4. A CPUE para redes foi calculada dividindo-se

o número de peixes capturados em uma determinada malha, pela área coberta por todas as redes

dessa mesma malha. Em seguida o valor foi padronizado para 100 m2 de rede. A CPUE foi

calculada para cada malha e ponto de coleta. A CPUE para tarrafa calculada dividindo-se o

número de peixes capturados pelo número de lanços de tarrafa em cada amostragem no P4.

Medidas de diversidade, equitabilidade e similaridade

A matriz de dados utilizada nessas análises baseou-se na CPUE para redes em cada ponto. Os

índices de diversidade (H’) e equitabilidade (E) de Shannon foram obtidos através do programa

BioDap. Para se ter uma idéia do nível de similaridade entre os locais de amostragem, foi feita

uma análise de agrupamento pelo método de ligações completas e o coeficiente de similaridade

utilizado foi a Distância Euclidiana. Essa análise foi executada pelo software Statistica 7.0.

Aspectos taxonômicos

Existem poucos trabalhos sobre a taxonomia dos peixes do Jequitinhonha. O gênero

Hypostomus, por exemplo, não tem nenhuma espécie descrita para a bacia. Existem apenas

referências à presença de quatro morfo espécies nas partes alta e média (Godinho et al. 1999) e

duas na parte baixa da bacia (Bizerril & Lima 2005). Mesmo assim, Hypostomus será

considerado como um único grupo. Os indivíduos que não foram identificados serão enviados a

taxonomistas de acordo com a especialidade. Até o momento, amostras de tecido e indivíduos

fixados de W. maculata foram enviados ao museu de ciência e tecnologia da PUCRS que estuda

as relações filogenéticas de DORADIDAE.

Auxiliaram na identificação dos peixes coletados os trabalhos de Garavello (1979), Oyakawa

(1993), Godinho et. al (1999), Castro & Vari (2004), Bizerril & Lima (2005), Reis et. al (2006),

Sidlauskas & Vari (2008), Oyakawa & Mattox (2009).

Caracterização preliminar da pesca no reservatório

Estava prevista a aplicação de questionários aos pescadores do reservatório. Entretanto, nos

primeiros contatos, percebeu-se que os pescadores não passaram informações corretas sobre a

pesca. Isto porque a equipe de monitoramento da ictiofauna é vista como informante da polícia

ou fiscalizadora. Sendo assim, as informações foram obtidas em conversas informais e

observações durante o trabalho de monitoramento no reservatório. Os resultados mostrados aqui

foram obtidos no local de acesso à balsa de Malhada.

Resultados e discussão

Composição da ictiofauna

Ao todo foram capturados 1512 indivíduos pertencentes a mais de 24 espécies (Tabela 2). Essa

riqueza representa pelo menos 68% do total observado para a bacia do Jequitinhonha no estado

de Minas Gerais (Drummond et al. 2005). A maior parte desses indivíduos pertence a espécies

comuns à calha principal do Jequitinhonha, como o roncador e a curimba (Vide discussão

abaixo). Quatro espécies são exóticas à bacia.

Em temos numéricos brutos, P4 foi onde se coletou 47% dos peixes. Os pontos do reservatório,

P2 e P3, contribuíram com 16 e 12% das capturas respectivamente. Os pontos do Jequitinhonha

mais distantes a montante (P1) e jusante (P5) registraram as menores capturas com 3 e 6%

respectivamente. Os tributários Itacambiruçú (P7) e Vacaria (P6) contribuíram com 10 e 6%

respectivamente. Esse tipo de informação é relevante para os estudos de dieta e reprodução que

vêm sendo executados em parceria pela PUC Minas. Nesse caso, o número de indivíduos

disponíveis para dissecação e a sua constância entre as coletas e os pontos é o fator mais

importante.

Tabela 2: Lista das espécies capturadas no monitoramento da UHIR. indica espécie exótica

introduzida na bacia

Ordem Espécie Nome comum

Characiformes Astyanax bimaculatus lambari do rabo amarelo

Astyanax fasciatus lambari do rabo vermelho

Brycon sp NOVA Piabanha

Hoplias lacerdae Trairão

Hoplias malabaricus Traíra

Hypomasticus garmani Timburé

Leporinus crassilabris Piapara

Leporinus sp NOVA Piau

Leporinus steindachneri piau três pintas

Moenkhausia costae Piaba

Oligosarcus macrolepis peixe cachorro

Prochilodus hartii Curimba

Serrasalmus sp. Pirambeba

Steindachnerina elegans Sardinha

Siluriformes Harttia garavelloi Cascudo

Clarias gareipinus bagre africano

Delturus brevis Cascudo

Hypostomus spp cascudo

Rhamdia jequitinhonha bagre

Steindachneridion amblyurum surubim do Jequitinhonha

Trachelyopterus striatulus Maria mole

Wertheimeria maculata Roncador

Gymnotiformes Gymnotus carapo Sarapó

Perciformes Geophagus brasiliensis cará

Tilapia sp Tilápia

CPUE para tarrafa em P4

A tarrafa foi utilizada em P1, P4, P5 e P7. No total foram capturados 202 indivíduos

pertencentes a 13 espécies. Desses, P4 foi local de captura para 187. Ao todo foram 10

amostragens com esse petrecho.

As espécies mais abundantes em número foram a piapara (L. crassilabris , 49%), curimba (P.

hartii, 28%) e o timburé ( H. garmani, 13%). Esse resultado é bastante interessante para a

piscicultura, uma vez que a tarrafa é bastante efetiva para capturar matrizes de L. crassilabris.

Além disso, a tarrafa é um método de captura ativa, o que reduz o tempo de exposição do peixe

ao estresse e aumenta as chances de sobrevivência.

Foram feitas correlações simples para verificar se a abundância de peixes em P4 pode ser

atribuída às vazões turbinada, vertida e total. Percebe-se que as três vazões contribuem

positivamente com o aumento na CPUE (Figura 8). Entretanto, a vazão vertida é mais bem

correlacionada que as demais. A maior parte das capturas por tarrafa é de peixes de escamas,

mais especificamente CHARACIFORMES. É possível que o vertedouro exerça maior

influencia sobre essas espécies do que SILURIFORMES. A natureza dessa atração deve ser

investigada, pois pode ser de caráter reprodutivo e assim o vertedouro teria um papel importante

no estímulo para a migração reprodutiva dessas espécies.

20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220

Vazão turbinada (m3/s)

0

2

4

6

8

10

12

CP

UE

( ind

iv / ta

rrafa

da

)

-10 0 10 20 30 40 50 60

Vazão vertida (m3/s)

0

2

4

6

8

10

12

CP

UE

( ind

iv / ta

rrafa

da

)

20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220 240 260 280

Vazão total (m3/s)

0

2

4

6

8

10

12

CP

UE

( ind

iv / ta

rrafa

da

)

Figura 8: Relação entre as vazões vertida,turbinada (superior) e total (inferior) e a CPUE

numérica para tarrafa no ponto 4.

CPUE para redes de espera

Redes de espera foram utilizadas em todos os pontos de amostragem. No total foram capturados

1310 peixes de 23 espécies. Nas duas primeiras amostragens nenhum peixe foi capturado com

rede no P1 e mesmo quando houve captura, os valores foram baixos comparados com outros

pontos. P4 e P7 mantiveram as maiores capturas com redes durante todo o trabalho. Uma

característica comum aos dois pontos é a presença de uma barreira física que impede a

passagem de peixes para montante. Em P7 esse obstáculo é uma queda d`água que funciona

como barreira pelo menos durante o período seco. Em P4 o obstáculo é a UHIR. É possível que

esses locais promovam a aglomeração de peixes por serem o ponto limite para sua passagem.

As mesmas correlações verificadas para tarrafas em P4 e aplicam às redes de espera. Porém,

nesse caso a espécie mais capturada é o roncador e a vazão total parece ser a mais relacionada

com a CPUE. É possível que a operação da UHIR produza diferentes reações nas espécies

presentes no canal de fuga. Nesse caso, a vazão total seria mais atrativa para o roncador que é

uma espécie característica de locais mais profundos.

Abundância de peixes no canal de fuga

O monitoramento com menor intervalo entre coletas no canal de fuga foi proposto para se

compreender os fatores que levam os peixes a se concentrarem nessa região. O período de um

ano oferece condições variadas sobre a operação da usina. Percebe-se que mesmo analisadas

separadamente as vazões turbinada e vertida exercem influencia sobre a abundância de peixes.

Essa relação fica mais confiável quando se agrupam essas duas vazões na total.

Como as flutuações no nível da água são mais intensas em P4 (Figura 6), períodos de maior

vazão devem proporcionar aos peixes mais habitas e alimento disponível nas áreas que são

alagadas. Por outro lado existe o risco aprisionamento em locas formadas quando a vazão

diminui, aumentando assim o risco de morte de peixes.

Figura 9: CPUE para redes de espera

Figura 10: CPUE para redes e tarrafa em P4, durante o período de estudo.

20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220

Vazão turbinada (m3/s)

2

4

6

8

10

12

14

16

18

20

22

24

26

CP

UE

(ind

iv/1

00

m2

red

e)

-10 0 10 20 30 40 50 60

Vazão vertida (m3/s)

2

4

6

8

10

12

14

16

18

20

22

24

26

CP

UE

(ind

iv/1

00

m2

red

e)

20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220 240 260 280

Vazão total (m3/s)

2

4

6

8

10

12

14

16

18

20

22

24

26

CP

UE

(ind

iv/1

00

m2

red

e)

Figura 11: Relação entre as vazões vertida,turbinada (superior) e total (inferior) e a CPUE

numérica no ponto 4.

Medidas de diversidade, equitabilidade e similaridade

Os valores de H’ e E estão sintetizados na Tabela 3. A diferença entre o maior e o menor valor é

de 0,51. Segundo Magurran (2004) os valores de H’ geralmente estão entre 1,5 - 3,5 e essa

pequena amplitude de variação dificulta a interpretação das diferenças entre os valores. O que se

pode verificar é que em geral H’ diferiu em relação aos anteriores (Godinho 2008). Em todos os

pontos que foram mantidos, os valores de H’ foram maiores na fase de operação que na de

enchimento (Figura 12).

Tabela 3: Índices de diversidade (H’) e equitabilidade (E) para cada um dos pontos de coleta,

durante o período de estudo.

P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7

H' 1,71 1,57 1,77 1,74 1,96 2,08 1,85

E 0,74 0,71 0,71 0,7 0,72 0,84 0,74

Figura 12: Valores do índice de Shannon (H’) para quatro pontos de amostragem durante a fase

de enchimento (Godinho, 2008) e operação (presente trabalho)

A similaridade ictiofaunística baseada na composição de cada ponto em todas as coletas mostra

a formação de três subgrupos (Figura 13). O primeiro subgrupo abrange P1, P6, P5 e P7, que

compreendem a maior parte dos trechos lóticos amostrados. Os pontos do reservatório (P2 e P3)

formam os segundo subgrupo. P4 está isolado dos demais, provavelmente devido ao maior

número de amostragens ali realizadas.

A proximidade de P2 e P3 no dendrograma poderia indicar certa tendência a estabilização do

reservatório. Agostinho et. al (1999) estimaram em 15 anos a estabilização do reservatório de

Itaipu a partir aumento na similaridade entre os pontos de amostragem ao longo do tempo.

Porém, apesar de localizados em rios diferentes, P2 e P3 estão na zona lacustre do reservatório.

Isso também pode explicar a similaridade, porque os pontos estão em ambientes semelhantes.

As regiões litorâneas dos dois pontos possuem valores semelhantes para algumas variáveis

limnológicas (zona fótica e temperatura) e biológicas (riqueza e densidade de fito e

zooplâncton) (Petrel 2008).

Figura 13: Dendrograma de similaridade para os pontos amostrados.

Relação entre a captura de peixes e o volume útil do reservatório

Durante o período de estudo o volume útil do reservatório variou de 45,78% em novembro de

2008 a 94,56% em abril de 2009. Esses valores correspondem a uma amplitude de 15,8 metros

entre a cota máxima e a mínima alcançadas pelo nível da água. De forma semelhante, a captura

em P2 e P3 apresentou tendência ao incremento, com o aumento do volume do reservatório.

Nos dois pontos (P2 e P3) essa resposta foi semelhante às variações no volume do reservatório.

Apesar do número de amostragens ter sido menor em relação a P4, nota-se a tendência de

crescimento na CPUE a medida que o reservatório enche (Figura 14). Para se ter maior

confiança nessa relação serão necessárias novas amostragens nos dois pontos.

0 20 40 60 80 100

Volume útil (%)

0

2

4

6

8

10

12

14

16

CP

UE

(Ind

iv/1

00

m2

red

e)

P2

P3

Figura 14: Relação entre o volume útil do reservatório e a CPUE de P2 e P3.

Caracterização preliminar da pesca no reservatório

Antes da construção da UHIR a pesca nessa região do Jequitinhonha tinha caráter local e de

subsistência. Segundo Vono & Birindelli (2007), um dos principais e mais eficientes apetrechos

utilizados era o jequi, feito de bambus e lianas e cevado com jenipapo, milho ou minhocas.

Após a formação do reservatório a pesca comercial e esportiva começou a se desenvolver em

pelo menos dois pontos: Malhada e Posses. O acesso às balsas nesses dois locais facilita o

transito de pescadores moradores de outros povoados como Igicatu e Lelivéldia. Além disso, o

reservatório encobriu boa parte do vale que dificultava o acesso por veículos.

Para auxiliar no resgate de fauna durante o enchimento do reservatório, foram contratados

barqueiros da região de Três Marias que permaneceram instalados em Lelivéldia por períodos

superiores a um ano. Pelo menos um desses barqueiros se fixou em Lelivéldia e formou família.

O aumento na captura de peixes durante o período de enchimento atraiu esse barqueiro, que

agora é um dos principais pescadores do reservatório da UHIR. Ele atua ainda na disseminação

do conhecimento sobre as técnicas de pesca àqueles menos experientes que também passaram a

explorar o reservatório. Esses últimos trabalhavam com a agricultura antes do barramento e vem

se adaptando à nova oportunidade de renda.

A pescaria em Irapé é essencialmente embarcada. São utilizados barcos de duralumínio com até

seis metros ou canoas de madeira. O uso de motor de popa também é regra. Os mais presentes

são os de 15 hp e os de rabeta. Há pescadores que se arriscam a utilizar o gás de cozinha como

combustível, mas a maioria usa gasolina misturada com óleo dois tempos.

Os tipos de pesca identificados são a pesca com redes de espera e anzol. As redes permanecem

armadas durante a noite e a pesca de anzol é realizada durante todo o dia. Alguns pescadores

informaram que os tamanhos de rede variam de 11 a13 cm entre nós opostos. O esforço de

pesca para alguns pescadores é de 1,5 km linear. Na pesca de anzol são utilizadas

principalmente lambaris e carás como iscas, obtidas no próprio reservatório, próximo as

margens. A pesca só ocorre na região litorânea e, segundo relatos, até 10 metros de

profundidade. Os pescadores exploram locais onde a vegetação está ou foi encoberta, como

paliteiros, que oferecem refúgios aos peixes.

As principais espécies em ordem de importância são as traíras (H. malabaricus e H.

brasiliensis), curimba (P. hartii), roncador (W. maculata) e paibalha (Brycon sp). Segundo os

pescadores, o quilo da traíra é vendido por sete reais. Sobre essa espécie, um dos maiores

temores de alguns pescadores é a sua diminuição no reservatório. Uma de suas solicitações é a

realização de peixamentos com traíras.

A rotina dos pescadores é baseada em viagens durante a semana que podem durar até cinco dias.

São improvisados acampamentos nas margens, na zona de deplecionamento do reservatório ou

nos barcos. Os peixes são mantidos em caixas de isopor com gelo e depois transferidos para

freezers, caso o pescador os tenha. Alguns transportam os peixes de carro para venda em outras

cidades.

Algumas atitudes dos pescadores demonstram a queda no rendimento da pesca. Pode-se citar a

diminuição na malhagem e o deslocamento até as partes finais do reservatório. Inicialmente os

pescadores faziam uso de redes com pelo menos 11 cm entre nós opostos. Em março de 2009

foi possível presenciar um pescador confeccionando uma rede de malha 9. Segundo ele, a

justificativa é a redução dos peixes de maior porte e a possibilidade de capturar o roncador (W.

maculata) que é bastante apreciado na bacia pela sua carne forte e como uma fonte de proteína

animal (Vono & Birindelli 2007). Alguns pescadores estão se dirigindo ao terço final do

reservatório, no braço do rio Itacambiruçú. Estima-se que o tempo decorrido entre a saída da

balsa de Malhada e a chegada ao local da pesca seja superior a duas horas. A zona fluvial e tida

como a de maior diversidade no reservatório (Agostinho et. al 1999) por apresentar

características mais próximas do ambiente natural (Agostinho et. al 2007). A CPUE em

biomassa e número também é maior nessa zona nos primeiros anos após o represamento

(Agostinho et. al 1999).

A pesca esportiva também vem se desenvolvendo e atrai turistas de Araçuaí, Montes Claros,

Teófilo Otoni e até outros estados como Bahia e Rio de Janeiro. O foco dessa pescaria é a traíra

capturada no anzol da mesma forma da pesca comercial. Alguns turistas mantêm barcos

ancorados às margens do reservatório, o que indica seu uso recorrente. Alguns moradores já

relatam a soltura de tucunarés jovens, por turistas. Entretanto a espécie ainda não foi registrada

pelo monitoramento ou pescadores.

Espécies exóticas

Foram coletadas pelo menos quatro espécies exóticas à bacia do Jequitinhonha: a tilápia

(Tilapia sp), bagre africano (Clarias gareipinnus), pirambeba (Serrasalmus sp) e a piaba

(Moenkhausia costae) . A última é registrada pela primeira vez nesse trabalho. Ela esteve

presente em várias amostragens com tarrafinha em P4 e compôs, em minoria, cardumes com

outras espécies como Astyanax bimaculatus e A. fasciatus. É possível que essa espécie tenha

sido introduzida por aquariofilia.

Serrasalmus sp havia sido registrada em P4 (Godinho 2008) e teve sua distribuição ampliada

para P5. Nesse mesmo ponto, foram coletados Tilapia sp e o único exemplar de C. gareipinnus.

A jusante de P5 aparecem mais áreas espraiadas no e o rio tem oportunidades de

extravasamento lateral. Depois das cheias essas áreas de alagadiço são aproveitadas para o

plantio do arroz. Há relatos de ribeirinhos que encontram tilápias e bagres africanos nesses

locais, mesmo quando o terreno está quase seco e restam poucas poças de lama.

A pouca literatura sobre a ictiofauna do Jequitinhonha já registrava na década de 80 a presença

de tilápias nas regiões média e baixa da bacia (Weitzman et. al 1986). Bizerril & Lima (2005)

atualizam a registram quatro espécies exóticas para o baixo Jequitinhonha. Além desses

Godinho (2008) relata a presença do surubim ponto e vírgula (cruzamento de Pseudoplatystoma

corruscans com P. fasciatum).

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