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Notícias FAPESP - Ed. 43
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JUNHO 1999
PUBLICAÇÃO MENSAL DA FUNDAÇÃO DE AMPARO A PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Encarte especial
Genoma Humano: Biologia, a ciência do século 21
Nova arma contra a tuberculose Pesquisadores desenvolvem uma vacina gênica para prevenção e cura da doença
Pág. 16
Pesquisa FAPESP é uma publicação mensal da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.
Conselho Superior Prof. Dr. Carlos Henrique de Brito Cruz
(Presidente)
Dr. Mohamed Kheder Zeyn (Vice-Presidente)
Prof. Dr. Adilson Avansi de Abreu
Prof. Dr. Alain Florent Stempfer Prof. Dr. Antônio Manoel dos Santos Silva
Prof. Dr. Celso de Barros Gomes Dr. Fernando Vasco Leça do Nascimento
Prof. Dr. Flávio Fava de Moraes Prof. Dr. José Jobson de A. Arruda
Prof. Dr. Maurício Prates de Campos Filho
Prof. Dr. Paulo Eduardo de Abreu Machado Prof. Dr. Ruy Laurenti
Conselho Técnico-Administrativo Prof. Dr. Francisco Romeu Landi
(Diretor Presidente)
Prof. Dr. Joaquim J. de Camargo Engler (Diretor Administrativo)
Prof. Dr. José Fernando Perez
(Diretor Científico)
Equipe Responsável Coordenador
Prof. Dr. Francisco Romeu Landi Editora responsável
Mariluce Moura (MTB 790) Editora executiva
Maria da Graça Mascarenhas Editor assistente Fernando Cunha Editor de Arte Moisés Dorado
Capa Hélio de Almeida
Colaboradores: Carlos Fioravanti, Marcos de Oliveira, Margareth Lemos, Mário Leite Fernandes,
Mauro Bellesa, Mônica Teixeira,
Rodrigo Arco e Flexa, Thereza O. L. de Almeida, Washington Castilhos e Wilson Marini
Encarte especial: Genoma Humano 1 Planejamento gráfico: Hélio de Almeida
Produção gráfica: Tânia Maria dos Santos Fotolitos e Impressão: GraphBox Caran
Tiragem: 22.000 exemplares
FAPESP- Rua Pio XI, n2 1500,
CEP: 05468·901 -Alto da Lapa São Paulo- SP-Tel: (011) 838·4000
Fax (011) 838·4117
Este informativo está disponível na home-page da FAPESP: http://www.fapesp.br
E. mail: [email protected]
CARTAS
Direto de Miami Estamos aqui em Miami e atuamos di
retamente junto às universidades brasileiras (USP, Unicamp, Unesp, etc.), através dos nossos escritórios de São Paulo, no sentido de apoiar as pesquisas em nível de suprimento de materiais.
Na semana passada, quando em visita ao Brasil, tive a oportunidade de conhecer arevista Notícias FAPESP, a qual muito me impressionou pela qualidade das matérias.
Gostaria de parabenizá-los e aproveito o ensejo para perguntar como posso ter acesso às futuras publicações.
New Route Inc Ranulpho Masiero
Apreciação do estudante Sou estudante de Engenharia Elétrica da
EESC - USP São Carlos, e atualmente estou cursando o terceiro ano.
Sempre que posso, procuro ler a revista Notícias FAPESP, pois a considero uma das mais importantes na sua área, em razão da beleza e seriedade de suas reportagens. Não posso deixar, então, de reiterar o meu elogio à FAPESP e à sua equipe de colaboradores, que estão sempre zelando pelo progresso e crescimento de nosso país.
Leonardo V M. Teixeira
Apreciação da vereadora Com meus cordiais cumprimentos, é o
presente para acusar o recebimento do exemplar n° 42 da publicação Notícias FAPESP.
Versando sobre temas de excepcional interesse, a revista, de esmerada feitura gráfi~a, é a bela mensagem dessa respeitável Fundação.
Numa quadra em que o imprescindível trabalho de pesquisa está circunscrito praticamente a um pugilo de homens realmente voltados para a cultura, a Notícias FAPESP, como se depreende pela leitura dos artigos, abrange todos os setores da atividade.
Maria Helena Vereadora, Câmara Municipal de São Paulo
Opinião do pesquisador Parabéns pela primorosa edição do No
tícias FAPESP. A apresentação da revista demonstra que é possível disseminar, com arte, informações úteis à comunidade científica.
Carlos Rodolfo S. Stopa, Chefe da Di visão de Física Aplicada
do Instituto de Estudos Avançados, do Centro Tecnológico da A era náutica
Reportagem sobre fungos Inicialmente, gostaria de agradecer pela
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oportunidade de divulgar o trabalho de pesquisa referente ao projeto temático Estudo de fungos em ambientes terrestre e aquático: uma contribuição para a avaliação e conservação da biodiversidade, com a reportagem publicada na edição n° 41 no Notícias FAPESP.
Parabenizo o sr. Mauro Bellesa pela qualidade e precisão do artigo e o fotógrafo Eduardo César pelas fotografias. Chamo a atenção que houve urna pequena confusão com a legenda da fotografia do Rio Jacaré-Guaçu.
A publicação desse artigo teve ótimos desdobramentos. A pesquisa foi divulgada no si te da coluna de Ciência e Tecnologia do jornal O Estado de S. Paulo e incentivou uma reportagem do Repórter-Eco sobre pesquisas científicas que estariam sendo realizadas, com ênfase no sistema da Represa do Guarapiranga. Além disso, recebi da Coordenadoria de Informações Técnicas, Documentação e Pesquisa Ambiental da Secretaria do Meio Ambiente uma carta com os cumprimentos pelo artigo publicado.
Os leitores do Notícias FAPESP têm a feliz oportunidade de atualizarem os conhecimentos sobre os trabalhos que estão sendo realizados nas várias linhas de pesquisa. Pessoas bem informadas podem ser incentivadas a ampliar o intercâmbio de informações técnico-científicas e acadêmicas com a comunidade científica, resultando em novas iniciativas de investigação, como projetas temáticos, práticas políticas e desenvolvimento tecnológico.
Dra. Iracema Helena Schoenlein-Crusius Bióloga, do Instituto de Botânica de São Paulo
Tomei conhecimento da reportagem Ambiente - Funções múltiplas , ao receber a publicação mensal Notícias FAPESP N° 41, de abril de 1999. Ao lê-lo, observei que uma das fotografias publicadas consta como sendo o Rio do Monjolinho. Esclareço que a foto publicada refere-se ao Rio Jacaré-Guaçu, onde também foi coletado material para o projeto Estudo de fungos em ambientes terrestre e aquático: uma contribuição para a avaliação e conservação da biodiversidade.
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Mirna Januária Leal Godinho Professora da Universidade
Federal de São Carlos
do Rio Monjolinho, como publicado no Notícias FAPESP n' 41
Editorial .... ............ ...... .......... Pág. 4
Opinião ...................... .. ...... ... Pág. 5
Notas .... ...................... .... ... ... Pág. 7
Aids ......... ............ ....... .. .. .... Pág. 15
L' 1vro ..... .............................. Pág. 28
Otto Gottlieb, o brasileiro
indicado para o Prêmio
Nobel de Química.
Pág. 10
Um novo edital do FAP-Livros, programa
da FAPESP que financia a aquisição de livros
para bibliotecas de universidades e
institutos de pesquisa Pág. 12
O Laboratório Nacional de Luz Síncrotron vai ganhar um Centro de Biologia Molecular Estrutural, que vai abrir novas perspectivas de estudo, como o das estruturas protéicas
Pág. 13
ÍNDICE
3
Nova vacina contra a _...,~
tuberculose, de origem gênica,
desenvolvida em Ribeirão Preto, tem
ação preventiva e terapêutica
Pág. 16
Empresa formada por pesquisadores vai produzir hormônio do crescimento no Brasil
Pág.20
Pesquisadores da Unicamp, em parceria com
a Companhia Siderúrgica de Tubarão, desenvolvem simulador para testar em
laboratório novas tecnologias para a indústria siderúrgica
Página 22
Escola viva: um projeto de melhoria do ensino leva uma escola do Jardim da Saúde para
PESP
junto da comunidade e alunos reconstroem a história do bairro paulistano Página 24
EDITORIAL
Pesquisa e valorização da vida humana O anúncio de um avanço científico que pode,
contribuir decisivamente para sanar um grave problema de saúde de milhões de pessoas em todo o mundo é, sem sombra de dúvida, razão de uma alegria especial para quem se dedica a divulgar caminhos, às vezes descaminhos, e sobretudo resultados de pesquisas científicas. Mesmo num mundo que se acostumou a receber quase que diariamente notícias de novas drogas, novos tratamentos e abordagens para doenças as mais diversas, que afetam o bem-estar e põem sob risco a vida do ser humano, essa alegria persiste. E é antes de tudo com esse sentimento que publicamos nesta edição do Notícias FAPESP a matéria sobre o desenvolvimento de uma nova vacina que promete prevenir e tratar a tuberculose. Uma vacina de DNA ou gênica, ressalte-se, considerada de terceira geração, construída a partir de conhecimento e tecnologia os mais avançados hoje disponíveis.
É verdade que os pesquisadores responsáveis pela vacina precisam ainda percorrer a parte final, e quase nunca fácil , do caminho até o êxito indiscutível de seu empreendimento. An-
competentes e talentosos, rendam tanto. Queremos destacar também uma outra repor
tagem desta edição, sobre um projeto ligado ao Programa de Ensino Público, em que os pesquisadores decidiram usar como alavanca para o crescimento intelectual e cultural de um grupo de estudantes adolescentes o resgate da memória de sua comunidade. E do Jardim da Saúde, um bairro típico de classe média nesta complexa megalópole que é São Paulo, esses adolescentes puderam arrancar uma bela história da formação do agrupamento urbano no qual se enraízam - que aliás, no começo, lá pelas décadas de 20 e 30, pouco tinha de urbano. Chácaras, áreas de pastagens e matas constituíam a paisagem dominante do Jardim da Saúde. Os frutos que os estudantes colheram do mergulho nessa experiência educativa, para além de uma nova maneira de estudar Português, História, Geografia, Ciências e outras disciplinas, foram , certamente, um sentido de agregação social, de solidariedade humana, de cidadania. Porque, como bem observou o coordenador do projeto, a memó-
ria e sua recriação pedagógica são pontes de se poder afirmar que a vacina, de fato, funciona , precisa ainda ser comprovada por testes clínicos em humanos a eficácia já atestada em animais de laboratório. No entanto, o que se depreende da leitura de nossa reportagem de capa é que a pesquisa, iniciada há quase I O anos - e agora objeto de artigo já aceito pela respei-
" Vacina gênica contra tuberculose
tos de partida para a valorização da própria vida humana. Em suma, os estudantes de algum modo ampliaram nesse trabalho suas bases para o crescimento individual. Embora nem sempre se atente a isso, o investimento na pesquisa científica também traz resultados dessa natureza.
confirma de modo exemplar que investir em pesquisa sempre
vale a pena" Por fim, queremos dar um destaque particular ao encarte especial desta edição, com entrevistas exclu
sivas com três dos mais famosos especialistas norte-americanos em genômica - Leroy Hood, Craig Venter e Phil Green - e um dos poucos pesquisadores brasileiros com larga experiência em bioinformática, João Carlos Setúbal. As entrevistas foram feitas para uma série de documentários que a TV Cultura prepara sobre o projeto pioneiro da genômica no Brasil - o seqüenciamento completo da bactériaXyllelafastidiosa -, que irá ao ar na segunda semana de agosto. Gentilmente, a TV Cultura liberou para a FAPESP o texto integral das entrevistas com os especialistas estrangeiros (que ainda renderão um segundo encarte em agosto), e é com prazer que publicamos esse material, inédito, reflexões muito ricas, nem sempre convergentes, dos especialistas que definem hoje porque a Biologia, e especialmente a Biologia Molecular, desponta como a ciência do século 21.
tada revista Nature - , está no rumo certo.
Para a FAPESP, por outro lado, noticiar a vacina é oferecer à opinião pública uma confirmação exemplar de que o investimento em ciência e tecnologia vale a pena, porque, cumulativamente, ele traz sempre profundas repercussões sociais. Assim, se esta Fundação investiu R$600 mil no projeto temático que permitiu a realização da parte mais substancial do trabalho de construção da nova vacina, neste momento podemos afirmar que é simplesmente incalculável o retorno que tal investimento poderá trazer. E aqui usamos a palavra retorno em muitos sentidos, a começar pelo mais fundamental deles, que é o da proteção à vida humana, até o do incremento à credibilidade científica do país, e o retomo econômico. Projetas como esse é que nos levam a concluir que, possivelmente em nenhum campo mais do que em ciência e tecnologia, os recursos dos contribuintes, quando aplicados criteriosamente e dirigidos para pesquisadores
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OPINIÃO
A defasagem entre a ciência e a tecnologia nacionais A avaliação da produção científica e
tecnológica nacional e do seu impacto vem ganhando crescente importância, não só no âmbito das agências de fomento, que necessitam quantificar os efeitos de sua atuação no sistema nacional de ciência e tecnologia e redirecioná-la em determinadas circunstâncias, como também entre o público e a mídia, que almejam conhecer quão bem aplicados têm sido os recursos públicos. Neste ensaio apresentamos uma estimativa de indicadores dessa produção e do seu impacto.
Produção Científica Nacional Estima-se( I) que aproximadamente 70%
dos artigos científicos nacionais são "enterrados" em anais de congressos e revistas não indexadas em bases de dados eletrônicas. É razoável supor que uma parcela desses artigos atinge padrões de qualidade e originalidade similares aos publicados em revistas indexadas, mas ainda não dispomos de meios para avaliá-los sistematicamente. Tal avaliação poderá ser efetuada por meio de sua futura indexação na base de dados Scielo, recentemente criada pela FAPESP e pela Biblioteca de Referência em Medicina para a América Latina e Caribe (Bireme).
A produção científica indexada pelo Institute ofScientific Information (IS I), de qualquer pesquisador, instituição ou até de um país, pode ser avaliada através de um banco de dados recentemente adquirido pela FAPESP e disponibi lizado às instituições paulistas de ensino e pesquisa. Essa base, denominada Web-ofScience, contém aproxi madamente 5. 000 periódicos de todas as áreas do conhecimento e permite a busca ele-
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Edgar Outra Zanotto
trônica por autor, instituição de origem, ano da publicação, citação, palavras-chave, estado, país, etc. Portanto, é possível levantar a produção científica nacional e internacional de todos os pesquisadores de ciências exalas. Dessa forma, construímos a Figura I.
O crescimento da participação nacional nas ciências ex atas é claramente demonstrado pela Figura I. Em 1998, autores vinculados a instituições brasileiras contribuíram com 1,07% da produção científica mundial indexada pelo ISI. Em relação à produção científica norte-americana, esse percentual é de 2,9%. Nota-se que crescimento da produção científica brasileira tem sido superior ao do PIB.
Produção Tecnológica Brasileira Dados da UNESCO indicam que entre
65 e 75% dos investimentos de pesquisa na Europa, EU A e Japão são efetuados por empresas, enquanto no Brasil assume-se que apenas 30% desses investimentos têm origem empresarial; entretanto, estimativas mais realistas indicam que esse percentual é significativamente menor que 30%!
I 0% delas geram inovação. Portanto, construímos a Figura 2 para representar a evolução da participação brasileira no total de patentes concedidas nos EUA entre 1980 e 1998. Neste caso, a fonte de informação foi a "home-page" da USPTO- United States Patent & Trademark Office.
Brasil Mundo %Brasil Supondo que cada patente
depositada seja uma aposta do pesquisador ou empresa no potencial de inovação (geração de produto comercializável) do seu invento, uma forma indireta de se
Artigos em revistas indexadas pelo /SI 47.184 7.756.888 0,61
Patentes registradas nos EUA 751 2.198.190 0,04
Tabela I. Participação brasileira no número de artigos em revistas indexadas pelo ISI e no número de patentes registradas nos EUA entre 1980 e 1993. (Fonte: Brito Cruz 1'1)
avaliar a geração de tecnologia num paí~ é contabilizar os pedidos de patentes depositados e concedidos. A título de informação, estima-se que apenas 10% das patentes depositadas nos EUA são concedidas e que
85 ANO
95
A Figura 2 mostra que o número de patentes concedidas nos EUA a autores brasileiros atualmente atinge cerca de 0,055% do total de patentes concedidas naquele país a autores de qualquer nacionalidade, e não tem crescido nesta década. Deve-se enfatizar que esse percentual é similar ao de inventores irlandeses e mexicanos, mas é significativamente inferior ao de autores de países em estágio de desenvolvimento científico comparável ao do Brasil , tais como África do Sul, Israel e Coréia.
Adicionalmente, em detalhado relatório, Brito Cruz IZJ calcula a relação entre a participação de artigos de pesquisadores de um país no total de artigos publicados em revistas indexadas pelo ISI e a participação de patentes concedidas a autores desse país no total das patentes registradas nos EUA. No caso dos países desenvolvidos, a relação entre os percentuais de participação varia entre 0,5 e 3,0. Já ano caso do Brasil, a relação é aproximadamente 20.
Figura 1. Percentual de artigos publicados em periódicos indexados pelo ISI por autores vinculados a instituições nacionais, nos últimos 20 anos. (Fonte: webofscience.fapesp.br). A curva foi colocada para guiar os olhos.
A Tabela I mostra o percentual da participação brasileira no total de artigos em re-
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Figura 2. Percentual de patentes concedidas a autores brasi leiros em relação a patentes concedidas a autores de todas as nacionalidades nos EUA (Fonte: www.uspto.gov).
ÁREA "FATO R DE IMPACTO " ARTIGOS BRASILEIROS COLAB. EXTERIOR NUNCA CITADOS
Física 4,0 8,020%
Química 4,5 7,018%
Engenharia 3,0 7,035%
Média de todas as ciências: (1981-90)
Brasil/mundo 4,4/7,1 44 / 49 %
Tabela 11. Fator de impacto dos artigos publicados somente por autores vinculados a instituições nacionais e daqueles publicados em colaboração internacional, em periódicos indexados pelo ISI (número de citações entre 1981 e 1993 dividido pelo número de artigos publicados entre 1981 e Hl90).
vistas indexadas pelo !SI e no total de patentes registradas nos EUA entre 1980 e I 993 , evidenciando que, naquele período, o primeiro foi 15 vezes superior ao segundo.
Brito Cruz ainda observa que "o ator institucional por excelência em um sistema nacional de inovação é a empresa e seus centros de pesquisa" e demonstra a existência de uma correlação entre o número de patentes registradas nos EUA por autores de um determinado país e o investimento pela indústria desse país.
Uma análise para a área específica de vidros demonstrou situação tão crítica quanto a global. Seria interessante fazer levantamentos análogos para outras áreas de tecnologia. Entretanto, podem-se prever situações similares à descrita acima, que representa a média de todas as áreas.
não tem apresentado sinais de crescimento relativo nos últimos anos. Portanto, urge implantar a prática de pesquisa nas empresas nacionais.
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Impacto da Ciência Nacional Os fatores de impacto (FI) apresentados
na Tabela 11 foram obtidos do excelente trabalho de DeMeis e Leta(J) Dentre inúmeros levantamentos, DeMeis e Leta computaram, para várias áreas do conhecimento, o número de citações dos trabalhos científicas assinados por autores vinculados a instituições brasileiras, acumuladas entre 1981 e 1993 ( 13 anos), e o dividiram pelo número de publicações de autores brasileiros no período 1981- I 990 (I O anos). Alem disso, DeMeis e Leta contabilizaram o percentual dos artigos nacionais indexados nunca citados, nesses 13 anos ( 44% ), e demonstraram que esse percentual ésimilarao dos artigos mundiais jamais citados ( 49% ). Tal coincidência de índices poderia levar à conclusão de que a qualidade média das publicações nacionais é semelhante à qualidade média dos trabalhos internacionais.
Evitando discorrer sobre a polêmica questão de saber se a qualidade de um determinado trabalho ou periódico científico pode realmente ser avaliada pelo número de citações ou fatores de impacto (acreditamos que estes sejam indicadores relativos aceitáveis, pelo menos para comparações no interior de uma mesma área do conhecimento), apresentaremos a seguir uma análise sobre o impacto da produção científica nacional, usando dados de De Me is e Leta, além de evidências adicionais.
Significativo é o fato de que as publicações de autores radicados no Brasil em coautoria com pesquisadores estrangeiros (geralmente de países desenvolvidos) têm aproximadamente o dobro do impacto dos artigos publicados somente pelos primeiros. Por exemplo, a Tabela II mostra que o fator de impacto médio (FI) das Engenharias nacionais salta de 3 para 7 e o da Física salta de 4 para 8, quando há participação de co-autores de instituições estrangeiras.
Outra forma de se avaliar o impacto da
Em outras palavras, há óbvia defasagem entre o grau de desenvolvimento científico e o grau de desenvolvimento tecnológico no Brasil! É inegável que a geração de tecnologia no Brasil é insatisfatória e Figura 3. Percentual de artigos aceitos para publicação na revista Science em t 994 [1 ).
6 fSP
produção científica nacional seria através do percentual de aceitação de artigos submetidos a periódicos de rigorosa política editorial, tal como a Science, cujos editores são instruídos para aceitar somente novidades, com alto potencial de impacto. A Figura 3 mostra que o percentual de aceitação de artigos submetidos por cientistas de 12 países do terceiro mundo, incluindo o Brasil , é de apenas 2%, enquanto varia entre I 0% e 20% para os países industrializados. Mesmo descontando-se eventual preconceito contra os países subdesenvolvidos, nossa situação é claramente inferior à dos países do primeiro mundo.
A análise acima efetuada indica que o impacto da pesquisa científica genuinamente nacional ainda é substancialmente menor que o impacto das publicações de autores dos países mais desenvolvidos.
Conclusões A produção científica nacional tem
crescido acima da média internacional , tendo atingido aproximadamente I, I% do total mundial em 1998. Em relação à produção científica norte-americana, a brasileira representa 3%. Seu impacto ainda é menor que o impacto médio das ciências exatas de todas as nações e não foi possível avaliar sua tendência nos últimos anos.
A geração de tecnologia brasileira ainda apresenta nível insatisfatório (apenas 0,055% dos depósitos de patentes nos EUA são de autoria de brasileiros) e não cresceu nesta década. Por outro lado, a experiência internacional revela que o desenvolvimento tecnológico é função dos investimentos empresariais em pesquisa. Urge, portanto, implantar e consolidar a prática de pesquisa nas empresas nacionais. Ciente dessa carência, a FAPESP tem incentivado a interação entre universidades e empresas, através dos Programas PITE, PIPE e CEPID.
Agradecemos aos professores Luiz Nunes Oliveira, Luiz Henrique Lopes dos Santos, Rogério Meneghini e Jorge Hounie pelas valiosas críticas e sugestões.
Referências l.W.W.Gibbs- Lost Science in the
Third World, Scientific American, August ( 1995) 92-99.
2.C.H. de Brito Cruz- O Sistema de C&T como parte do Sistema Nacional de Inovação- Conselho de Ciência e Tecnologia, CCT- UNICAMP, Junho (1999).
3.L.DeMeis e J. Leta- "O Perfil da Ciência Brasileira", Tab. 12, 13 e 17, Ed. UFRJ (1996).
- Webofscience.fapesp.com - WWW.uspto.gov.us/search patents
Professor titular do Departamento de Engenharia de Materiais da UFSCar, membro titular da Academia Brasileira de Ciências, coordenador adjunto da Diretoria Científica da FAPESP.
NOTAS nTA~ nTA.SNn~Ac NOTAS )TASNOTA-=: nTASNO"T'AS
Ciência do próximo século em debate No encerramento da Conferência Mun
dial Sobre Ciência para o Século 21: um novo compromisso, realizada em Budapestede26dejunhoa I 0 dejulho,com a participação de delegações de quase 150 países, os organizadores divulgaram duas longas relações de diretrizes e de princípios para implementar o que foi chamado um novo contrato social entre ciência e sociedade. Os documentos, incluídos no boletim da revista científica britânica Nature, divulgados em 2 de julho, trazem sugestões específicas para que os países participantes da conferência, entre outras providências, aumentem seu apoio às instituições de graduação e de pósgraduação, enfatizem a capacitação de jornalistas científicos e criem mecanismos participativos adequados ao debate sobre políticas científicas.
Duas propostas mereceram destaque. A primeira foi de que a ética e a responsabilidade social devem ser parte da formação de todos os cientistas e a segunda prega o lançamento de campanhas de conscientização sobre as contribuições das mulheres para a ciência e tecnologia, recomendando a instalação de uma rede internacional de mulheres cientistas. Estas duas idéias estão entre uma série de recomendações para fortalecer a posição das mulheres na ciência, e foram incluídas depois de um lobby vigoroso dos grupos femininos. As diretrizes estabelecidas também estimulam esforços para garantir a participação de deficientes em ciência e tecnologia e sua presença em fóruns e grupos formuladores de política científica.
No preâmbulo da Agenda para a Ciência - Estrutura para a Ação, elaborado ao final do encontro - que foi patrocinado pela Organização para Educação, Ciência e Cultura das Nações Unidas (UNESCO) e Conselho Internacional para a Ciência (ICSU)os participantes declaram que uma das metas mais nobres é avançar nos objetivos de paz internacional e bem-estar da humanidade, enfatizando os efeitos desfavoráveis que muitas vezes acompanham as ciências naturais e a necessidade de entender seu impacto sobre a sociedade. Além dos objetivos apresentados na introdução, os 96 pontos do documento foram divididos em três partes: ciência e conhecimento, conhecimento para o progresso; ciência para a paz e para o desenvolvimento; e ciência na sociedade e ciência para a sociedade. Em cada item, foram valorizadas questões como o papel da pesquisa fundamental , as necessidades humanas básicas relativas ao ambiente, educação, tecnologia e política, e questões éticas vinculadas à participação, exigências sociais e dignidade humana.
Outro documento, a Declaração Sobre Ciência e o Uso do Conhecimento Cientíji-
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co, foi organizado a partir dos mesmos temas. Entretanto, inclui todos os campos da ciência em seus princípios: todas as culturas podem contribuircom conhecimento científico de valor universal. De acordo com a Declaração, redigida em 46 pontos, as ciências devem estar a serviço da humanidade, contribuindo para oferecer uma profunda compreensão da natureza e da sociedade, assim como a melhor qualidade de vida e um meio ambiente sustentável e saudável para as futuras gerações. O documento reconhece que o futuro depende intrinsecamente da manutenção dos sistemas de apoio a todas as formas de vida e convoca as nações e chama a atenção de cientistas de todo o mundo sobre a urgência em utilizar e valorizar conhecimentos adquiridos em todas as áreas, de maneira responsável, para atender às necessidades humanas.
Antes de Budapeste, a última conferência havia sido realizada em 1979, em Viena, Áustria. Mas apesar do longo intervalo de tempo decorrido, mesmo os mais céticos admitiram que valeu a pena esperar pelo encontro deste ano, na Hungria. Aqueles que esperavam o início de uma nova era na relação entre ciência e sociedade voltaram para casa decepcionados, segundo a revista; os que temiam uma discussão inútil, entretanto, foram positivamente surpreendidos pelo conteúdo de alto nível dos debates. Agora, a tarefa é transformar as diretrizes estabelecidas nos documentos em políticas eficazes.
Para os representantes de países em desenvolvimento, de acordo com o boletim da Nature, a conferência foi uma rara oportunidade de acesso direto aos formuladores de políticas científicas e às agências de financiamento de países desenvolvidos, além de uma melhorcompreensãodadiplomacia internacional. Entretanto, não foram concretizados muitos acordos de seu interesse, como a criação de um fundo global para a ciência. Um dos membros da delegação das Filipinas, por exemplo, afirmou que o novo compromisso proposto na conferência deveria ser acompanhado pela criação de um mecanismo de financiamento, a exemplo do que aconteceu no Rio de Janeiro, em 1992, e em Montreal, em 1987.
Outras delegações de países em desenvolvimento consideraram inadequada apreparação para a conferência. Eles expressaram sua preocupação com a falta de encontros oficiais preparatórios, semelhantes aos realizados nasconferênciasdas Nações Unidas. Estes encontros permitem a formação de alianças para apresentar reivindicações comuns e o planejamento prévio de uma estratégia paraatingirseus objetivos em assuntos como um sistema mais equitativo sobre os direitos da propriedade intelectual.
NOrAS NOrAS NOrAS NCY'.AS NOrAS NOrM NOTAS JTAS NOrAS NOrAS NOTAS NOTAS NO~AS NO~AS
Seqüências geradas pelo Projeto Câncer estão no Genbank Cerca de 200 seqüências
obtidas pelos pesquisadores que estão desenvolvendo o Projeto Genoma Humano do Câncer foram submetidas, na segunda semana de julho, ao Genbank, o banco de dados internacional onde estão depositadas todas as seqüências de qualidade aceitável geradas pelos vários projetos genoma em curso no mundo. Já no dia 7, podia-se conferir via Internet as identificações de algumas das seqüências geradas pelo projeto brasileiro (por exemplo, de AI795778 até Al795783), o que por si só configurava um momento marcante para as equipes envolvidas, se-
gundo Sandro de Souza, coordenador de bioinformática do Genoma Humano do Câncer.
A partir desse momento, a coordenação de bioinformática do projeto promovido conjuntamente pela FAPESP e pelo Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, e iniciado em março deste ano, vai submeter de forma rotineira, a cada semana, seqüências ao Genbank. Não serão muitas, de início, mas dentro de alguns meses o volume semanal submetido deverá ser de alguns milhares porque, na pior das hipóteses, serão geradas, por dia, de mil a 1.500 seqüências genéticas, diz Sandro de Souza.
Tratam-se de seqüências obtidas, por ora, de material retirado de cânceres de cabeça e pescoço, có lon e estômago. Mais adiante tumores de outros tipos devem ser também examinados. Para submetê-las ao Genbank, a coordenação de bioinformática do projeto deve apresentar arquivos que contenham, além das próprias seqüências, uma série de informações que o banco requisita, como o tecido de que elas são originárias e a qualidade das seqüências.
"Temos seguido uma tendência internacional de tentar melhorar a qualidade média das seqüências de EST (o tipo de seqüência gerado pelo projeto) no
Criatividade e desenvolvimento Respeitemos as diferenças.
Mais ainda: incentivemos as visões opostas, pois é por meio da cooperação entre indivíduos com modos de pensar complementares que se atingem estágios elevados de criatividade e de eficiência nas atividades científicas e tecnológicas, de acordo com as pesquisas realizadas pelo sociólogo do trabalho Domenico De Mas i, professor da Universidade de Roma La Sapienza, na Itália. Todos os grupos criativos que ele estudou, a exemplo do Instituto Pasteur de Paris, o Círculo Filosófico de Viena, o Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, a Escola de Biologia de Cambridge ou o Projeto Manhattan em Los Alamos, conciliam aspectos díspares, mantendo-se produtivos e inovadores. "A criatividade é a síntese das habilidades entre as pessoas fantasiosas e as criativas", afirmou De Masi durante a palestra O Trabalho Criativo nos Centros de Ciência e Tecnologia , proferida no dia 27 de maio no Instituto de Pesquisas Tecnológicas, como parte das comemorações docentenário do I PT, comemorado no final do mês de junho.
"Os grupos criativos são antiburocráticos e morrem quando chega a burocracia", disse. Se os criativos são movidos pela curiosidade, que leva ao conhe-
cimento, os burocratas se apóiam em atitudes de defesa, que conduz à fuga de situações que vão além da rotina. Com humor, definiu os burocratas como "seres prudentes, que se apóiam uns aos outros, e sádicos, pois adoram matar as idéias dos outros".
Segundo ele, a sociedade pós-industrial , na qual as informações, os símbolos e a estética se sobrepõem aos bens materiais da sociedade industrial, exige, sim, controle, mas, acima de tudo, motivação. Obviamente, não desaparecerão os bens industriais, mas a produção científica é que reinará, com modelos próprios de organização. Por exemplo, não há mais separação entre o trabalho e a vida. "Caem as divisões entre estudo,
trabalho e tempo livre e as separações de espaço e diferenças entre homens e mulheres", observou. Nesta etapa da civilização humana, quem inventa é quem tem o poder. "A invenção é a base da força política e econômica", disse . De outro modo, é o conhecimento que determina a hierarquia mundial: os países mais fortes monopolizam a invenção, os países emergentes ficam com a produção e aos subdesenvolvidos cabe tão-somente o consumo. De Masi acredita que os países atrelados à produção e ao consumo devem se esforçar para passar imediatamente para a fase de desenvolvimento de tecnologia e de estética, na qual a principal inovação é, justamente, a criatividade em grupo.
s PESP
Genbank", diz Sandro de Souza. Assim, continua ele, "se uma seqüência com 300 pares de base contém uma região com 50 bases de alta qualidade, nós a submetemos. Se concluímos que todos os 300 são de baixa qualidade, não os submetemos". O score de qualidade para cada base da seqüência é definido por um programa chamado Phred. Simplisticamente, o score revela a chance de que determinada base seja correta. Se o erro estimado for de I em mil bases, por exemplo, tem-se um resultado de alta qualidade. Na medida em que aumenta essa proporção de erro, cai a qualidade da seqüência.
Biblioteca virtual O Programa Prossiga do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo inauguraram no dia 7 de junho a Biblioteca Virtual de Saúde Reprodutiva (http://www. prossiga. br/fsp .usp/saudereprodutiva). O novo site é dirigido principalmente a pesquisadores e especialistas da área, mas deverá ser de grande interesse, também, para orgamzações sociais e pessoas interessadas nessa temática. A I i são encontradas informações sobre sexualidade, aborto, Aids, planejamento familiar, contracepção, direitos reprodutivos, etc.
O mecanismo de busca da biblioteca virtual integra todas as infonnações por ela veiculadas. Essas informações foram divididas por categorias e, em seguida, agrupadasem informações brasileiras, estrangeiras e intemacionais; entidades, incluindobibliotecaseserviçosde informação, órgãos de política e fomento, ONGs, programas de pós-graduação, etc; eventos; pessoas- especialistas e pesquisadores - e documentos.
A Biblioteca Virtual de Saúide Reprodutiva integra o projeto Bibliotecas Virtuais Temáticas do Prossiga, que tem o apoio da Fundação de Apoio à Pesquisa do Rio de Janeiro (FAPERJ) e Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de Goiás (FUNAPE).
NOTAS NOTAS NOTAS NOTAS NOTAS NOTA~ NOTAS
Equiparação salarial Em audiência com o gover
nador Mário Covas, em 5 de julho,adireçãoAssociaçãodosPesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) apresentou uma antiga reivindicação no sentido de restabelecera isonomia salarial entre pesquisadores científicos da universidade e dos institutos de pesquisa ligados a secretarias de estado, criada pela lei complementar 727, de 1993.
Além da equiparação, foi também discutida a situação dos recursos destinados aos 18 institutos estaduais e a criação da carreira de apoio à pesquisa - que, segundo aAPqC, viria a sanar o problema da evasão de profissionais dos institutos para as universidades devido à defasagem salarial, evitando o fenômeno ocorrido antes da criação da carreira de pesquisador científico, em 1978.
Periódicos O Conselho Superior da FA
PESP, baseado em parecer do seu Conselho Técnico-Administrativo (CTA), decidiu autorizara utilização de recursos da reserva técnica de bolsas e auxílios para o pagamento de assinaturas de periódicos de interesse para o projeto
financiadopelaFundação. Os títulos assinados deverão ser colocados à disposição da comunidade acadêmica na biblioteca da unidade a que está ligado o pesquisador. Osrecursossópoderãoserutilizados dentro do período de vigência do auxílio ou da bolsa.
JTAS NOTAS NOTAS NO~AS NOTAS NCrAS NOTAS
Livros do Biota Mais dois livros da coleção
de sete que vai apresentar a sín-
~~~tode0xis~~~~e~~~ f) 1 [\DI~ EJlt)JD~\Dt breabiodiversidade DJV J SÃOp-.o. BRASifL paulista, neste final oofSIAIJO:!-""'...-,.,.,., de século, foram lan- - _,.....-.. çados recentemente pelos coordenadores do Programa Biota FAPESP: o volume 3, relativo aos invertebrados marinhos, e o volume 5, referente aos invertebrados terrestres. Com isso, já são quatro os volumes publicados, porque em março já haviam sido lançados os volu-mes 2, sobre fungos macroscópicos e plantas, e o 6, sobre vertebrados. O Programa Biota está experimentando o
crescimento esperado e, a essa altura, !I projetos ligados a ele já estão aprovados pela FAPESP.
Quase 20 projetos no Genoma Funcional Nada menos que 19 projetos
estão aprovados na linha de pesquisa do Genoma Funcional da Xyle/lafastidiosa, que desde o final do ano passado integra o Programa Genoma FAPESP Já estão em desenvolvimento dez deles, que foram apresentados atendendo ao primeiro edital de encaminhamento de propostas à Fundação. Os outros nove, enviados por ocasião do segundo edital, com prazo de apresentação de propostas até I I de maio, foram aprovados recentemente e deverão ser iniciados em breve. Todos os projetos nessa linha investigam, a partir das abundantes informações genéticas geradas com o seqüenciamento da Xyle/la, bactéria causadora da Clorose Yariegada dos Citros (CVC) ou praga do amarelinho, aspectos da patogenicidade do microorganismo para, a partir disso, propor caminhos de controle e combate dessa doença dos citros, que afeta gravemente a citricultura paulista.
Os 19projetosaprovadossão os seguintes: Epidemiologia e Manejo da Clorose Variegada dos Citros, coordenado por Armando Bergamin Filho, da Esalq; Otimização de Sistemas de Regeneração ln Vitro e Estabelecimento de um Protocolo de Transformação Genética para Citros SP, coorde-
nado por Beatriz Madalena Januzzi Mendes, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da USP; !dentificaçãoeAnáliseMolecular de Genes PatogênicosEnvolvidos na lnteração Citros-Xyle/lafastidiosa, coordenado por Cláudia de Mattos Bellato, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da USP; Aspectos Fisiológicos da Laranja Doce 'Pêra' (Citrus sinensisL. Osb)AfetadaporCVCe sua Associação com a Patogenicidade daXyle/la fastidiosa , coordenado por Eduardo Caruso Machado, do lnstitutoAgronômicode Campinas; Investigando o Papel de um Endo-polygalacturonase na PatogenicidadedaXyle/lafastidiosa, coordenado por Elza Maria Frias Ma1tins, do Instituto Biológico, em associação com Ricardo Harakawa, do Departamento de Patologia Vegetal da Universidade da Flórida; Avaliação de Marcadores Moleculares para a Caracterização de Cepas da Xyle/la fastidiosa Associadas a CVC e a Requeima do Cafeeiro, coordenado por Gilson Paulo Manfio, da Fundação Tropical de Pesquisas e Tecnologia André Tosei! o; O Papel de Genes Associados a Goma Xantana na Patogenicidade e Virulência da Xyle/la fastidiosa e Estratégias Potenciais para Controle Biológico da CVC em Citros,
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coordenado por João Lúcio de Azevedo, da Esalq; DesenvolvimentodeMétodos Experimentais para Testes de Patogenicidade e Adesão de Mutantes de Xyle/la fastidiosa, coordenado por João Roberto Spotti Lopes, da Esalq; Proteoma deXylella fastidiosa: I. Análise Diferencial para Estudo de Patogenicidade; !!-Construção de Base de Dados 2D-PAGE, coordenado por Jos@ Camilo Noveli o, do InstitutodeBiologiada Unicamp; Identificação e Caracterização de Genes deXylella fastidiosa Expressos em Plantas deCítros Infectadas e Regulados por Sensores de Quorum, coordenado por Márcio Rodrigues Lambais da Esalq; Genes Expressos da Xyle/la fastidiosa em Condições de Crescimento Lento e Rápido, coordenado por Marcos Antônio Machado,doiAC;AnáliseFuncional do Operam Gum da Xyle/la fastidiosa e sua Relação com a C VC, coordenado por Paulo Arruda, da Unicamp; Identificação e Análise Funcional de Genes com Resposta ao Stress Oxidativo na Xyle/lafastidiosa, coordenado por Regina Lúcia Batista da Costa de Oliveira, do úcleo Integrado de Biotecnologia da Universidade de Mogi das Cruzes; Xyle/lafastidiosa - Papel de Exoenzimas (proteases, celulases, liases do pecta-
to) e da Adesão {naplantaenoinseto vetar) naPatogenicidade, coordenado por Sérgio Florentino Pascholatti, da Esalq; Relações Genéticas e Patológicas entre CepasdaXylellafastidiosa, coordenado por Sílvio Aparecido Lopes, do Centro de Ciências Exalas, Naturais e Tecnológicas da Universidade de Ribeirão Preto; A nálise do Genoma Funcional daXylella através da Identificação de Proteínas Putalivas e de Compostos de Baixo Peso Molecular Associados coma Virulência, coordenado por Siu Mui Tsai, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da USP; Estabelecimento de Condições para Divisão de Genes Potencialmente Envolvidos na Patogênese da Xylella fastidiosa, coordenado por Suely Lopes Gomes, do Instituto de Química da USP; Desenvolvimento de um Sistema ExperimentaldeTestesdePatogenicidadeda Xylella fastidiosa de CVC em Laranja Doce, coordenado por Wenbin Li, do Fundo Paulista de Defesa da Citricultura, (Fundecitrus), eAm.plified-Open Reading Frames (AMORF) Combinado a Hibridizaçào para Identificação de Genes Relacionados com a Patogenicidade daXylella fastidiosa, coordenado porYoko Bomura Rosato, da Unicamp.
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
PRÊMIO
O reorganizador da natureza O químico Otto Gottlieb, que criou uma nova forma de classificar as plantas, é indicado para o Nobel
"No próximo milênio, os países que tiverem mais florestas e culturas preservadas serão beneficiados tanto na pesquisa científica quanto na alimentação." O ensinamento, do escritor e indigenista Orlando Vi lias Boas, está afixado na parede da sala do apartamento do cientista Otto Richard Gottlieb, no bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro, e demonstra a visão ampla da Ciência e da natureza cultivada pores te químico. Tão ampla que ele está sendo indicado ao Prêmio Nobel de Química deste ano por seus estudos pioneiros propondo uma nova classificação das plantas a partir de suas características químicas. A indicação foi feita pelo químico Roald Hoffmann, que recebeu o Prêmio Nobel em 1981, mas os estudos e descobertas de Gottlieb transcendem os limites dessa Ciência. Nascido na a tua I República Tcheca em 1920 e naturalizado brasileiro, trabalhando aluaimente na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) desde que se aposentou na Universidade de São Paulo (USP) em 1990, Gottlieb criou uma nova forma de organizar e entender os vegetais, a base da vida na Terra.
Integrando a química à biologia, à ecologia e à geografia, Gottl ieb desenvolveu uma nova disciplina ou área de estudo no campo da química de produtos naturais: a sistemática bioquímica das plantas, também chamada de quimiossistemática ou taxo-
gicas", diz Gottlieb. "O que temos feito é correlacionar essas características externas com características moleculares." Portanto, não se trata de substituir um método por outro. A classificação de Lineu, relativamente simples, ampla e prática, continua indispensável. Mas o enfoquequímico resolve alguns impasses e permite entender algumas peculiaridades da natureza. Ao contrário da primeira, essa é uma abordagem dinâmica, que parte da verificação de que as plantas, até mesmo dentro de uma mesma espécie, produzem diferentes substâncias de acordo com os estágios de sua vida ou das condições ambientais em que encontram.
É o caso da Ocotea pretiosa, uma árvore da família das lauráceas conhecida
nomia química, que consiste O cientista Oito Gottlieb: pioneirismo e visão abrangente
na identificação de grupos de substâncias químicas presentes nas plantas. Quantificando as substâncias químicas das espécies, foi possível acrescentar informações valiosíssimas à habitual classificação dos vegetais, fundamentada sobretudo nos seus aspectos externos, como folhas e flores.
"Se o naturalista sueco Carl von Lineu criou um método, ainda utilizado, para organizar as plantas a partir desses aspectos externos, Otto Gottlieb mostrou como identificar as plantas por dentro, diferenciando suas micromoléculas", diz a pesquisadora Maria Cláudia Marx Young, do Instituto de Botânica de São Paulo, que teve o cientista como seu orientador no mestrado e doutorado.
"As plantas sempre foram classificadas de acordo com suas características morfoló-
como canela-sassafrás ou sassafrás, encontrada em vastas áreas do Brasil. De acordo com a região, sua composição química pode variar. No clima frio do Vale do ltajaí, em Santa Catarina, produz safrol , um óleo essencial de valor comercial. Já no ambiente tropical do Rio de Janeiro, a principal substância produzida é a nitrofeniletano, que confere a esse espécie o cheiro de canela. A presença de uma ou de outra substância esclarece as diferenças fisiológicas e as reações ao ambiente de uma mesma espécie, como fez o químico mais de uma vez, valendo-se do seu próprio método.
Otto Gottlieb graduou-se em 1945 em Química Industrial pela Universidade do Brasil e doutorou-se pela Universidade Fe-
lO
dera I Rural do Rio de Janeiro. Passou dez anos na indústria de óleos essenciais que pertencia a seu pai antes de retomar a carreira acadêmica, já com 35 anos, no então Instituto de QuímicaAgrícola, extinto alguns anos depois. Foi a partir do final dos anos 60, na USP, que estudou profundamente a química das lauráceas, a que pertencem o sassafrás e o louro, e das miristicáceas, representada pela noz-moscada. Enriqueceu a classificação botânica tradicional e identificou centenas de substâncias denominadas lignóides, uma característica marcante das plantas arbóreas. E, dentro desse grupo, descobriu as neolignanas, que, segundo ele, são sintetizadas pelos vegetais em condições diferentes das lignanas, já conhecidas.
A identificação dessas substâncias possibilitou novas pesquisas que levaram ao desenvolvimento de fármacos como o etoposídeo e o teniposídeo, sintetizados pela indústria farmacêutica e empregados como antitumorais. As neolignanas, descobriu-se mais tarde, possuem também propriedades antiinflamatórias. Outros cientistas também comprovaram seus efeitos na alteração da diurese do agente transmissor da doença de Chagas. Gottlieb lançou o modelo que levaria a essas descobertas num congresso internacional realizado em Hamburgo, na Alemanha, em 1976, e foi muito bem recebido pela comunidade científica, ven-cendo o ceticismo sobre a
possibilidade de unir a química à biologia na classificação dos vegetais.
A evolução Com a sistemática bioquímica, que o
tornou internacionalmente conhecido, Gottlieb foi ainda mais além. Medindo nos grupos vegetais a presença de conjuntos específicos de substâncias químicas, genericamente conhecidos como metabólitos secundários, ele criou uma nova abordagem para entender a evolução e a regulação das plantas, isto é, estabeleceu um paralelismo entre a evolução química e a morfológica. Os seus estudos sugerem, por exemplo, que pinheiros e plantas floríferas têm sua origem em samambaias primitivas e avançadas, respectivamente.
"Gottlieb criou um método científico para quantificar as substâncias químicas e prever a evolução das plantas superiores", conta outra de suas discípulas, a professora Vanderlan da Silva Bolzani, que coordena o Núcleo de Bioensaio, Biossíntese e Ecofisiologia de Produtos Naturais do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Araraq uara, e um dos proj e tos temáticos do programa Biota-FAPESP. "Com esse enfoque, comecei a ter uma visão mais profunda da natureza e dos significados das moléculas no estudo da evolução."
A química, sob seus cuidados, levou a uma visão ampla da Ciência. "Estudar as plantas tem nos permitido entender as regras que sustentam o funcionamento da vida, da natureza", diz o cientista. Investigar a origem da vida por meio i
rede são os ecótonos, também chamados de áreas de tensão ecológica (ver mapa), regiões de transição entre os ecossistemas, que separam, por exemplo, a Amazônia do cerrado e da caatinga. Os ecótonos são bastante semelhantes entre si e têm características comuns a todos os ecossistemas, ainda que geograficamente distantes. "Podemos encontrar em ecótonos do norte do Brasil um
do estudo das plantas pode parecer, à primeira vista, curioso. Mas é exatamente esta correlação que forma as bases da pesquisa do cientista sobre evolução, sistemática e ecologia molecular de plantas.
Como alguns ~ AreadasFoonaçOOs?iooeirascomlnfluências ~ Fluvialoolacustre
grupos específicos de animais, a exemplo dos pássaros, anfibios
0 AreadeTensãoEc:oló;liea
D RetúqioECO!ó'JiCo
e répteis, os vegetais têm mecanismos químicos de defesa. Liberando toxinas, conseguem defender -se de agressões externas. "As plantas são um paradigma de como funcionam outros grupos de seres vivos", ensina Gottlieb. Essa abordagem tem sido usada nos estudos sobre a biodiversidade dos ecossistemas brasileiros, como a FlorestaAmazônica e a Mata Atlântica. Medindo a semelhança da composição florística de diferentes ecossistemas, Gottlieb observa como as plantas interagem.
"A natureza toda é uma só, e as plantas não estão separadas umas das outras", diz o químico. De acordo com as mais recentes pesquisas mundiais, que ele acompanha atentamente, existem canais subterrâneos que unem as plantas em diversas posições. Esse modelo tem uma implicação imediata: quando se abate uma determinada área, não está se prejudicando apenas a região depredada. "Como tudo está conectado por meio de uma rede, o efeito da depredação de uma região pode ser sentido a larga distância", diz Gottlieb, cada vez mais buscando nos dados experimentais as explicações mais profundas dos ambientes naturais brasileiros.
Segundo ele, o que faz a conexão dessa
tipo de vegetação semelhante a outro tipo de vegetação típica do Sul do país, como -as araucárias", explica. Para ele, o estudo dessas regiões de fronteira é de extrema importância. "Observamos que os ecótonos mantêm o ecossistema. Se essas áreas são invadidas, quem vai sofrer são os ecossistemas que os cercam. Iniciar atividades de agricultura e pecuária nessas regiões de turbulência é extremamente lastimável", alerta Gottlieb. Ao contrário, conhecendo o desenvolvimento químico desses ecossistemas, torna-se possível intervir sobre os espaços sem que percam sua estrutura e identidade.
Formador Exigente e rigoroso, capaz de trabalhar
15 horas por dia no laboratório, sempre disposto a atender os alunos, Gottlieb criou uma geração de especialistas em química de produtos naturais no país. Formou equipes na Universidade de Brasília, Universidade F edera! de Minas Gerais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e Universidade de São Paulo. No total, formou 118 mestres e doutores, hoje grandes nomes dacomunida-
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de científica brasileira e internacional. Sua obra inclui 630 trabalhos e cinco livros publicados, entre eles o Micromolecular Evolution, Systematics and Ecology: An Essay into a Nove/ Botanical Discipline, além de 580 conferências em 26 países. Recebeu diversos prêmios, como o de Química da Academia de Ciências do Terceiro Mundo e o Pergamon, concedido pela Phytochemistry, prin
cipal revista da área. "É o maior nome
em química de produtos naturais da América Latina", diz Vanderlan. Ela conta que, num Congresso em San Diego, nos Estados Unidos, em julho de 1993, durante seu pós-doutoramento, foi muito bem recebida por eminentes cientistas ao dizer que havia sido aluna do professor Gottlieb. Ele foi também um dos fundadores do Laboratório de Produtos Naturais da USP, criado em 1967 com apoio da FAPESP e que, três anos mais tarde, passaria a fazer parte do Instituto da Química da Universidade, onde o pesquisador trabalhou como professor titular até 1990. Na Fiocruz, para onde se transferiu em seguida, desenvolve pesquisas como
bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
"Gottlieb deu um grande impulso à fitoquímica da Fiocruz", atesta o vice-presidente de pesquisa da instituição, Renato Cordeiro. "Os resultados de suas pesquisas são extraordinários", acrescenta. Para o químico Peter Seidl, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), um dos articuladores da indicação do nome do pesquisador ao Nobel, Gottlieb é um exemplo a ser seguido. "Ele é uma prova de que podemos fazer pesquisa no Brasil, apesar dos recursos limitados, sem precisar ir para um país desenvolvido", diz Sei di.
A indicação de Gottlieb ao prêmio conta comoapoiodasAcademiasBrasileiradeCiências e do Terceiro Mundo. Ele, no entanto, prefere não falar no assunto. Suas preocupações estão voltadas para problemas como a devastação das florestas e a deterioração ambiental. Gottlieb considera que a compreensão dos mecanismos da natureza será essencial para o futuro da vida no Planeta Terra no próximo milênio, e este trabalho é, em sua opinião, o mais importante desafio para os cientistas. "Apreservação do ambiente é um assunto de importância mundial a toda prova", afirma.
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
BIBLIOTECAS
Evolução no FAP-Livros Concessão de auxílios para aquisição de livros tem nova sistemática
O Programa FAP-Livros, que financia a aquisição de livros científicos e tecnológicos para bibliotecas de universidades e institutos de pesquisa, está aperfeiçoando sua sistemática. Como no Infra-Estrutura e na Reserva Técnica, o objetivo continua sendo o de sanar as deficiências do sistema de pesquisa paulista, mas, agora, segundo o critério de associar as concessões de auxílio à aquisição de livros a projetos financiados pela FAPESP. Depois da fase inicial, em que se buscou encontrar soluções emergenciais para problemas acumulados durante muitos anos, a ênfase do programa está no reforço do apoio concedido por meio de maior cobertura de custos indiretos dos projetos.
Em sua quarta chamada, que receberá solicitações até o dia 3 de setembro próximo, o FAP-Livros passa a beneficiar bibliotecas específicas, contribuindo para que elas disponham de acervos mais completos de livros, que possam propiciar o bom desenvolvimento dos projetos de pesquisa financiados pela Fundação e sua ampla utilização pela comunidade científica. Assim, o programa passa a funcionar segundo uma diretriz que sempre norteou as ações da FAPESP: não se encarregar diretamente do custeio de despesas permanentes. Para essa cobertura, foi criada a reserva técnica.
"De acordo com a nova sistemática, as bibliotecas atendidas devem ser reconhecidas como unidades do sistema de bibliotecas de uma determinada instituição de pesquisa, e o responsável pelas solicitações, um pesquisadorcom título de doutor ou qualificação equivalente, vinculado a um dos departamentos dessa instituição", explica Joaquim José de Camargo Engler, diretor administrativo da Fundação. "Esse pesquisador deverá ter recebido da FAPESP auxílios de qualquer natureza nos últimos cinco anos ou ter sido responsável, como orientador, por bolsas concedidas
pela Fundação nesse período. Seu aval para a compra será uma declaração de que cada livro solicitado é relevante para uma linha de pesquisa em que esteja o projeto sob sua responsabilidade", destaca. Como nas fases anteriores, só poderão ser solicitados livros diretamente relevantes para as atividades de pesquisa, o que exclui periódicos, que já constam do orçamento das instituições, obras de referência e livros de interesse principalmente didático.
Essa orientação reflete a fi losofia há muito tempo aplicada às outras modalidades de concessão e pode ser colocada em prática graças aos esforços da FAPESP para a inclusão do inciso XXI no artigo 24 da lei n° 8666, de 21 de junho de 1993. Esta alteração na lei tornou o FAP-Livros muito mais ágil porque permitiu a aquisição direta, sem licitação, de bens destinados exclusivamente à pesquisa científica e tecnológica, com recursos de agências financiadoras federais ou outras instituições de fomento credenciadas pelo CNPq para esse fim.
"Agora voltamos à normalidade", afirma José Fernando Perez, diretorcientífico da Fundação. "Superadas as dificuldades do passado, podemos trabalhar de fonna mais dinâmica e coerente. Se antes tivemos a vantagem da licitação, agora podemos recorrer a um mecanismomaisaperfeiçoado,queevitaosatrasosprovocados por uma compra única", explica. De fato, a aquisição de um grande pacote de livros através de licitação pode ser um processo d.emorado, em que as edições podem esgotar-se no período decorrido entre sua solicitação e a compra. Além disso, no momento da entrega dos livros, o vencedor da licitação nem sempre pode garantir o fornecimento de todos os títulos apresentados no edital.
Até 1992, as solicitações para compra de livros eram feitas diretamente pelos pesquisadores e eram aprovadas como auxílios à pesquisa. Com a definição das bases do progra-
ma, a Fundação lançou a segunda fase do FAPLivroserecebeu,entre 1992e 1993,solicitações de90.055 títulos e atendeu, naqueleano,51.222. O investimentofoide US$3, 1 milhões. Na Fase III, em 1995 - segundo ano de avaliação de projetos- , a FAPESP recebeu solicitações de 150.766 obras e aprovou a compra de exatamente 114.441 livros, no valor de R$ 7,2 milhões, o que corresponde, em valores atuais, a US$ 4, I milhões. Nesta edição, os títulos foram destinados à UNICAMP (30%), USP (24%), UNESP(24%), instituições federais de ensino e pesquisa instalados no Estado de São Paulo (I 0% ), entidades particulares de ensino e pesquisa(6,3%)e institutos de pesquisa vinculados ao governo do Estado (5,7%) (veja gráfico). As compras aprovadas foram de livros nacionais ( 17,7%) e estrangeiros (82,3% ).
As solicitações de auxílio para a quarta chamada devem ser encaminhadas segundo modelo disponível nos endereços eletrônicos http://www.fapesp.br e http://saturno.fapesp .br, acompanhado de quatro documentos: formulário de inscrição, cadastro e súmula curricular do pesquisador responsável; relação das linhas de pesquisa em que estão situados os projetos apoiados pela FAPESP no período de 1994 a 1999; lista de livros solicitados (identificados pelos nomes dos autores, título completo, editora, ano da edição e ISBN), com a indicação de seus preços cotados e de um a três pesquisadores que avalizem o pedido; e uma lista, por ordem alfabética, dos pesquisadores vinculados à instituição, unidades ou departamentos a que serve a biblioteca beneficiária. Os pesquisadores não podem aparecer em listas de diferentes solicitações, provenientes ou não da mesma instituição.
Como em todas as linhas de fomento da FAPESP, as solicitações passarão pela avaliação por pares. O Programa tem uma dotação fixa, portanto a avaliação será competitiva e a distribuição dos recursos levará em conta a
INVESTIMENTOS NO FAP-LIVROS AS AQUISIÇÕES DO PROGRAMA coerência entre os livros pedidos e as linhas de pesquisa desenvolvida s, além do peso da participação dos pesquisadores em relação ao total de auxílios e bolsas concedidos no período de 1994a 1999.AFundação espera poder concluir o processo de avaliação até o final deste ano.
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CIÊNCIA
LABORATÓRIO
Teste superado LNLS recebe elogios em sua primeira avaliação e ganha um Centro de Biologia Molecular
Duas boas notícias chegaram ao Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), de Campinas. Uma de las é a de que o Laboratório passou , com elogios, pela sua primeira avaliação científica e tecnológica , realizada em fevereiro , depois de um ano e meio de funcionamento. A outra é a conclusão dos estudos e liberação das verbas para a construção do seu novo Centro de Biologia Molecular Estrutural. O Centro, que vai abrir novas perspectivas de estudo para os pesquisadores de biologia que usam a luz síncrotron, será construído com recursos do LNLS e da FAPESP, que contribuirá com R$ 830 mil.
A inspeção foi realizada por uma comissão mista de sete cientistas, sendo quatro de fora do Brasil. O relatório final do grupo foi muito positivo com relação às contribuições que o Laboratório, atendendo pesquisadores brasileiros e estrangeiros, fez nos seus primeiros meses de funcionamento. Esse tipo de inspeção faz parte do contrato de gestão entre a Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron, que administra o LNLS, e o Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) do Ministério da Ciência e Tecnologia, órgão provedor do laboratório.
Quanto ao novo centro de biologia, a contribuição da FAPESP destina-se à sua in-
fra-estrutura, como supot1e elétrico e hidráulico, ar-condicionado e câmaras frias . Sua importância é inegáve l. "O novo laboratório vai proporcionar, por exemplo, maior capacidade de elucidação de estruturas protéicas, que podem ser úteis tanto para a compreensão de processos biológicos como para a fabricação de medicamentos", afirmou Rogério Meneghini , diretor associado da área de biologia do LNLS.
Limpeza A comissão científi ca encarregada da
avaliação do LNLS teve como presidente Yolker Saile, do Instituto Mikrostrukturtechnik, de Karlsruhe, na Alemanha, e tinha apresença do professor Yves Petroff, diretor-geral do Laboratório Europeu de Radiação Síncrotron, localizado em Grenoble, na França, um dos órgãos mais importantes do mundo na área. Os membros do comitê fizeram entrevistas com di retores, funcionários - técnicos, administradores e pesquisadores - e usuários, além de anali sar documentos financeiros, técnicos e científicos.
A organização e o programa científico do L LS foram considerados excelentes e o Laboratório recebeu até um elogio pouco comum, o de ser impecavelmente limpo, especialmente quando comparado a companhias privadas japonesas que operam com la-
13
boratórios de luz síncrotron. O relatório ressaltou também o suporte financeiro do governo federa l, através do CNPq, e as oportunidades permitidas pela FAPESP, como a compra do mais potente microscópio eletrônico da América do Sul , para o recém-inaugurado Laboratório de Microscopia Eletrônica.
A comissão assinalou que a área de biologia tem participação de 25% nos trabalhos realizados no LN LS - 326 projetos, até o final de 1998 - e continua a crescer. Por isso, a construção do novo Laboratório de Biologia Molecular também foi citado como um complemento para a capacitação do LN LS no campo da biologia. Nesse campo, destaca-se, atua lmente, a estação experimental de Cristalografia de Proteínas, uma das nove existentes no laboratório. Essas estações se situam em tangências do grande anel com circunferência de 93 metros, por onde corre, no vácuo de um tubo metálico, um feixe de elétrons a uma velocidade próxima à da luz.
Altíssima intensidade Essas partículas são produzidas por um
acelerador linear que produz I ,3 7 Ge V (gigaeletronvolts), o que equivale a I O milhões de vezes a energia de uma tomada caseira de li O volts. Quando esse feixe de partículas sofre a ação, em sua rota, do campo magnético de uma estação, ocorre uma perda de ener-
gia dos elétrons. Essa perda escapa em direção à estação e se transforma na fonte da luz de altíssima intensidade chamada síncrotron, que agrupa desde radiações ultravioletas até infravermelhas e raios X. As estações experimentais captam e filtram essa energia com
rio Plasmodiumfalciparum, agente infeccioso da malária.
Também está em estudo, sob a coordenação de Jorg Kobarg, uma proteína do vírus da hepatite B, doença que afeta 7% da população brasileira. Chamada de HX,
da pela equipe do professor Raghuvir Arni, do Departamento de Biofísica da Universidade Estadual Paulista, (UNESP), de São José do Rio Preto, essa proteína poderá fornecer a chave para acelerar ou desacelerar o amadurecimento, evitando grandes ·
r-;;c..;;~._.'ât'?nf--------r·ll perdas que ocorrem naco-1!11 l theita e na armazenagem.
g "Depois do conhecimento ~ completo dessa proteína,
:~~~;~~==~~ " será possível modificá-la geneticamente ou acionar um inibidor, colocando as frutas numa câmara com um tipo de gás, ainda não definido, capaz de impedir que essa proteína exerça suas funções.
Rogério Meneghini (esq.) e lgor Polikarpov, na Estação de Cristalografia de Proteínas
Uma área onde a demandadessetipo de pesquisa deve crescer é a do seqüenciamento de genomas, trabalho hoje realizado em todo o mundo, inclusive em São Paulo, em diversos projetas apoiados pela FAPESP. Em entre 30% e 60% dos casos de novas descrições de seqüências de DNA, não são conhecidas
o comprimento de onda apropriado ao material a ser analisado.
Na estação de cristalografia, o objetivo é descobrir e descrever a posição dos átomos que compõem uma molécula de proteína, sempre em forma de estruturas tridimensionais. Fundamentais para o funcionamento metabólico de qualquer organismo vivo, as proteínas fazem parte das células e cumprem papéis como catalisar reações químicas e reconhecer e neutralizar antígenos, formas estranhas ao corpo. As proteínas, quando desvendadas, fornecem importantes informações para a elaboração de produtos farmacêuticos. "Conhecendo a estrutura da proteína, podemos compreender como ela age e como interage com outras moléculas", explica Igor Polikarpov, coordenador da Linha de Cristalografia de Proteínas. "Hoje, o interesse maior desse tipo de estudo está nas proteínas envolvidas em processos patológicos", complementa Meneghini.
Enrijamento dos dedos Os estudos realizados na estação já le
varam às descrições das estruturas de dez proteínas, desde setembro de 1997. Duas foram extraídas de dois tipos de veneno, o do escorpião Tityus serrulatus e o da cobra Bothrops pirajai. Essas proteínas são responsáveis pelos danos causados por esses venenos ao corpo humano. "Conhecendose a estrutura da proteína, é possível combater os venenos mais facilmente", afirma Polikarpov. Há mais estudos em andamento, entre os quais um sobre uma proteína envolvida no funcionamento do protozoá-
ela confere o caráter infeccioso do vírus. Se ela for anulada, a virulência da doença será menor e, conhecendo sua estrutura, será possível desenhar uma outra molécula - um fármaco, por exemplo - que impedirá sua ação. Entre os outros trabalhos da estação de Cristalografia, também está a descoberta de como age uma proteína de um auto-anticorpo, agente de uma doença hereditária que provoca a aglutinação dos glóbulos vermelhos do sangue, levando ao enrijamento dos dedos e outras extremidades do corpo.
Outra aplicação em estudo na estação de Cristalografia é o delineamento da proteína álcool-desidrogenase, responsável pelo amadurecimento das frutas. Estuda-
as funções bioquímica e biológica das proteínas envolvidas.
A importância da cristalografia e da luz síncrotron no estudo de proteínas é demonstrada pelo fato de 12 empresas farmacêuticas de grande porte se terem unido para formar a Associação de Cristalografia Macromolecular Industrial. Elas usam, em conjunto, duas estações de luz síncrotron nos Estados Unidos. Entre essas empresas estão Glaxo Wellcome, Merck, Bristoi-Myers, Squibb e Procter & Gamble. A demanda pela utilização da luz síncrotron é tão grande que cerca de US$ I bilhão está sendo investido, hoje, em novos aceleradores, nos Estados Unidos e no Japão. O LNLS brasileiro custou, até aqui , US$ 70 milhões.
Cristais de proteína Quando o problema é determinar a estrutura da
molécula de uma proteína, ganha-se precisão com a técnica da cristalografia e rapidez com o uso da luz síncrotron, na qual o cristal da proteína é exposto à difração de raios X. Nesse processo, as ondas dos raios X interagem com os átomos da molécula e se espalham, formando imagens difragmentadas. Analisando em computadores o padrão de distribuição dos raios e os espaços resultantes, obtêm-se informações capazes de compor, em três dimensões, a estrutura do átomo da proteína.
Para esse tipo de estudo, porém, é essencial que a proteína seja cristalizada. "Ao natural, em solução, é impossível analisar corretamente a estrutura da proteína", diz lgor Polikarpov. Isso porque a
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cristalização leva a um arranjo estrutural altamente regular. Não à toa, uma das fases mais complexas do processo é a da preparação das amostras. O LNLS tem instalações especiais para isso, que também existirão no futuro Centro de Biologia MolecularEstrutural.
O primeiro passo é clonar o gene que contém a proteína que se deseja estudar. A proteína é então colocada numa bactéria específica, que entra em reprodução acelerada. Com isso, conseguem-se grandes quantidades da proteína, seja ela de origem vegetal ou animal. A proteína é purificada e submetida a um processo físico de agregação. Um aumento da concentração, obtida por agentes químicos, finalmente leva à cristalização.
CIÊNCIA
AIOS
Falta de apoio Mulheres soropositivas não recebem
orientação sobre como alimentar seus bebês
Uma pesquisa orientada por IsíliaAparecida Silva, professora associada do Departamento Matemo Infantil e Psiquiátrico da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP), revela como vem sendo encaminhado o problema da alimentação de recémnascidos, filhos de mulheres portadoras do vírus da Aids, na cidade de São Paulo.
Nessa situação, a amamentação toma-se problemática porque o leite humano é carreador do vírus. Há dez anos, antes de se descobrir essa possibilidade, as campanhas de incentivo à amamentação ressaltavam apenas seus aspectos favoráveis e não abordavam a questão daAids. Mas, na verdade, se a transmissão do vírus não ocorreu na gravidez, com a ingestão do leite da mãe portadora há um risco adicional de contágio de 14%.
"Nós queríamos saber, em um primeiro momento, se essas mulheres tiveram algum tipo de orientação, no sentido de que não poderiam amamentar", diz Isília. Segundo a pesquisadora, a partir disso se poderia verificar que suporte as mulheres tiveram da sociedade para resolver a situação.
Esse primeiro estudo resultou de um projeto de iniciação científica apoiado pela FAPESP, orientado por Isília e conduzido por ElianaFranco da Silva, alunado último ano do curso de graduação. Essa pesquisa deverá dar origem a outras que permitam um maior aprofundamento e compreensão do problema.
Para a realização do estudo, participaram 53 mulheres, que acompanhavam seus filhos,
lsíl ia Aparecida Silva: falta suporte da sociedade
os quais são tratados no ambulatório do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, das quais 7 são viúvas, tendo os maridos falecidos por causa da Aids, 34 são solteiras com companheiros ou casadas-são, portanto, mais de 50% que têm relacionamentos estáveis-, 9 são solteiras e 3 divorciadas. Entre aquelas com relacionamento estável, não foi investigada a situação dos companheiros, mas, segundo Isília, pode-se inferir que são soropositivos. Outros dados mostram que, da amostra estudada, 19 mulheres têm um único fi lho e ficaram sabendo da contaminação ou durante a gestação ou após o parto. Outras 18 têm 2 filhos e as demais têm de 3 a 5 filhos. Cerca de 50% não possuem fonte de renda, visto que 17 são donas de casa e 19 estão desempregadas.
Cuidados com os alimentos Por meio dos dados coletados, observou
se que, ao sair da maternidade e serem encaminhadas,junto com seus filhos, para algum centro de diagnóstico e tratamento de Aids, essas mulheres não receberam qualquer auxílio no sentido de suprir a alimentação da criança ou mesmo orientação sobre o preparo adequado de mamadeiras, como higienização dos utensílios e diluição do leite em pó. As próprias mães devem, então, encontrar alternativas para suprir as necessidades alimentares drrs crianças. A grande maioria consegue leite comprando-o, mesmo tendo uma base salarial bastante baixa, de 1 a 6 salários mínimos; ou em postos de saúde e ONGs, como Igrejas, gru-
pos de solidariedade e outros. Há, também, o aproveitamen
to de leite ganho nas escolas, através de programas como o Leve Leite, da Prefeitura de São Paulo (no caso de mães que possuem outros filhos já em idade escolar). Nesse caso, trata-se de produto inadequado para alimentar a criança recémnascida e, além disso, às vezes, o leite é diluído mais do que seria indicado, para que possa "render" e alimentar os outros filhos. Assim, segundo dados da pesquisa, se for considerado o gasto médio semanal de quatro a sete latas e seu correspondente em litros de leite, o custo da alimentação do lactente é de no mínimo um terço do salário mínimo, levando em conta o menor custo da lata de leite no mercado (R$
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2,50) e o menor gasto médio semanal de quatro latas de leite, referidas pelas mulheres.
Há um número significativo de mulheres - 16- que engravidaram mesmo sabendo da sua condição de portadoras do virus daAids. Esse aspecto, abordado em um estudo orientado por Eliane Chaves Correa, professora da Faculdade de Enfermagem, mostra que engravidar significa, para essas mães, uma espécie de prolongamento da vida. Além disso, enquanto não há uma manifestação claradaAids, sua realidade toma-se muito distante, como se a doença e o risco não estivessem presentes.
Pasteurização do leite Isília pretende rever esse quadro em um
novo projeto de pesquisa, assim como investigaras possibilidades de pasteurização do leite de mães contaminadas. O processo, bastante simples, inativa o vírus do HIV e deve ser feito nos bancos de leite humano, sob rigoroso controle de qualidade. Não há, no entanto, uma rede pública desses bancos suficiente para cobertura da população e, mesmo nos serviços existentes na capital, esses não dispõem de um sistema capaz de transportar o leite do domicílio para o banco de leite.
Segundo lsília, o grande problema social que pôde ser observado a partir das informações obtidas no Estudo Exploratório da Situação da Amamentação Frente à Problemática do HIV é a inexistência de programas direcionados especificamente para atender às necessidades da mulher soropositiva e da criança impossibilitada de receber o leite matemo.
Salienta-se ainda que, na proposta desse estudo exploratório, é possível identificar indicadores de fragilidade no sistema de atendimento à mulher e à criança, em sua situação de soropositividade, que resvala os aspectos de educação em saúde nos níveis de assistência pré-natal, durante o período de internação na maternidade, no acompanhamento puerperal e de puericultura, somados a uma falha no acompanhamento das mulheres soropositivas na sua prática de sexual idade e no planejamento familiar.
CIÊNCIA
TUBERCULOSE
Prevenindo e tratando Pesquisadores de Ribeirão Preto desenvolvem a primeira vacina gênica contra a doença
Desde que o alemão Robert Koch anunciou adescobertado bacilo da tuberculose, em 1SS2, a prevenção e o tratamento da doença desafiam cientistas em todo o mundo. E pela dimensão que essa doença infecto-contagiosa alcança na atualidade, torna-se particularmente importante o desenvolvimento de uma nova vacina contra a tuberculose por uma equipe de pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, coordenada pelo professor Célio Lopes Silva.
Num projeto temático com financiamento da FAPESP em torno de R$ 600 mil, e depois de vários anos de estudos e experimentação meticulosa, os pesquisadores desenvolveram uma vacina de DNA, considerada de terceira geração, que poderá ser aplicada no controle da tuberculose, caso seja comprovada em humanos a mesma eficiência já atestada em animais.
Segundo Célio Silva, o trabalho começou em 1990, quando ele foi para Londres fazer seu pós-doutoramento. Naquela época, já se sabia que a BCG (Baci lo Calmette-Guérin), uma vacina viva baseada no Mycobacterium bovis atenuada para uso humano em 1921 (vacina de primeira geração), não conferia proteção satisfatória contra a tuberculose. Os antígenos purificados da BCG (vacinas de segunda geração) também não induziam a proteção tanto desejada.
"Uma série de dificuldades impedia os estudos para desenvolver uma nova vacina", relata o pesquisador. Partindo-se do princípio de que o Mycobacterium tuberculosis, o agente causador da tuberculose, se esconde dentro das células humanas e não é atingido pela ação dos anticorpos, seria necessário estimular os linfócitos T CDS, capazes de destruir especificamente as células infectadas pelos bacilos. Esses linfócitos são estimulados somente quando os antígenos são produzidos dentro de células, como acontece nas infecções virais.
Vacina gênica "Esse princípio foi o ponto de partida
para iniciar o projeto", afirma Célio Silva. Foi tomado um pedaço de D A (o código genético contendo a mensagem para a célula fazer o antígeno) e inserido num retrovírus fabricado em laboratório pelas técnicas de engenharia genética. As células (macrófagos) infectadas com esse retrovírus recombinante sintetizaram os antígenos, estimularam os linfócitos T CD4 e T CDS e induziram proteção contra infecção por M. tuberculosis. "O delineamento experimental para fazer a va-
Célio Lopes Silva: entre um lerço e metade da população munida~ está infectada com o bacilo da tuberculose
cina estava estabelecido", declara o pesquisador. De volta para Ribeirão Preto, Célio Silva não mediu esforços para arranjar um sistema mais prático e seguro para fabricar os antígenos dentro das células, uma vez que o processo de infecção com retrovírus era mais um fato r de risco para a saúde da população. Por sorte os primeiros experimentos com vacinas gênicas estavam se iniciando em diversas partes do mundo.
A vacina de DNA, ou vacina gênica, que está revolucionando o campo, é baseada num pedaço do código genético do agente causador da doença. "Aplicado por meio de injeção intramuscular, esse DNA cria condições para a produção da proteína antigênica pelas próprias células do indivíduo vacinado", segundo Célio Lopes Silva e colaboradores em trabalhos publicados em várias revistas internacionais.
"As vacinas de organismos vivos e atenuados, embora funcionem muito bem para certas doenças, oferecem certa margem de risco de que a pessoa acabe contaminada pela doença
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que se pretende prevenir", afim1am os autores. "Com a vacina de DNA isso não acontece." Dessa forma, a vacina gênica é hoje a maior esperança para o combate a doenças infecciosas para as quais ainda não se tem prevenção segura, como herpes, Aids, malária, hepatite, esquistossomose, dengue e tuberculose.
Primeiros resultados Os primeiros resultados positivos da
vacina gênica brasileira contra tuberculose foram apresentados em 1994, em Genebra, numa reunião da Organização Mundial da Saúde (OMS) específica sobre tuberculose, e, desde então, os experimentos foram ampliados. De acordo com os dados da época, camundongos foram vacinados durante três meses com quatro doses de 50 microgramas de DNA por via intramuscular. Após duas semanas, foram infectados com o agente etiológico da doença, oMycobacterium tuberculosis.
O grupo que não estava vacinado registrou a presença de cerca de 1.200.000 bactérias por grama de tecido, enquanto o vacina-
do oscilou de zero a I 00 ou 1.000 bactérias - um número considerado excelente.
Depois de 1994, os pesquisadores passaram a testar DNAs que codificassem antígenos diferentes, com o propósito de verificara melhor para a vacina. Já foram testados 12 antígenos desde então, suficientes para a equipe se dar por satisfeita. Trata-se de um trabalho extremamente delicado e que leva de seis a oito meses para cada antígeno.
Do ponto de vista científico, a revelação dos brasileiros no encontro de 1994 representou um enorme êxito. "Com a apresentação dos resultados positivos, vários grupos de biotecnologia avançada se animaram a prosseguir as pesquisas na mesma direção", afirma Célio Silva. Nos Estados Unidos, diversos laboratórios estão envolvidos em projeto semelhante, com um orçamentoestimadoem US$ 800 milhões.
O próximo passo seria experimentar a vacina em outros modelos animais, como cobaias, coelhos e macacos. Depois desses experimentos, a vacina poderia ser testada em humanos em três fases distintas. Na fase I (utilizando mais ou menos 50 indivíduos) seria verificada a toxicidade; na fase 2 (em torno de 300 indiví-duos) seriam observa
dos os efeitos imunológicos; e na fase 3 (com cerca de pelo menos 150.000 pessoas) seria verificada a eficiência da vacina numa determinada população, acompanhada por pelo menos 12 anos. Ao todo, esse processo poderia levar até 20 anos e os custos para a realização de todos os testes seriam elevados.
Mudança de alvo Apesar dos bons resultados obtidos pelo
grupo coordenado por Célio Silva, as dificuldades acima apresentadas fizeram com que o grupo mudasse o seu alvo para o combate à tuberculose. "Em vez de usar a vacina de DNA como preventiva da infecção, direcionamos os trabalhos visando ao uso dessa mesma vacina no combate direto à infecção já estabelecida, como se fosse um agente terapêutico ou uma droga antimicobacteriana" diz o pesquisador.
Reforçou essa posição o fato de entre um terço e metade da população mundial já estar infectada com o bacilo da tuberculose. Em torno de 5% a I O% desses indivíduos desenvolvem a doença. Nessas condições, o uso de uma vacina não como preventiva da infecção
mas que tenha atividade terapêutica contra indivíduos infectados seria a solução.
Os resultados obtidos pelo grupo mostraram que a administração da vacina gênica em animais previamente infectados com M. tuberculosis virulenta previne o desenvolvimento da doença e elimina a infecção. Além disso, quando a vacina é administrada em estados mais avançados da doença, ou mesmo quando ela está disseminada por todo o organismo do animal, ela também tem a propriedade de curá-los. Essa cura se dá pela ativação apropriada do sistema imunitário.
Um dos problemas mais sérios relacionados com o controle da tuberculose é o aparecimento de bacilos que apresentam resistência a vários dos medicamentos utilizados no tratamento, como a isoniazida, pirazinamida, estreptomicina e rifampicina, entre outros. Já foram isolados bacilos que são resistentes não só contra um desses medicamentos como também contra combinações de dois, três e mesmo contra todos ao mesmo tempo. Esses pacientes, denominados multi droga resistentes, contam com poucas alternativas de tratamento e às vezes com nenhuma. O desenvolvimento do projeto mostrou que animais infectados com bacilos resistentes a essas drogas também são curados pela administração da vacina gênica.
Outro problema associado ao alto índice de indivíduos infectados se correlaciona com o alto grau de adaptação dos bacilos ao homem. A infecção normalmente se estabelece após inalação dos bacilos e sua entrada nas células de defesa do nosso organismo. Dentro dos macrófagos, que são células com alto potencial microbicida, os bacilos têm a habilidade de desativar os sistemas de defesa dessas células e conseguem sobreviver e se multiplicar no seu interior. O sistema de defesa imunitário do homem toma conhecimento da presença dos bacilos e estabeléce uma resposta contra eles, caracterizada por uma reação inflamatória crônica denominada granuloma e que tem a finalidade de circunscrever e delimitar a infecção.
Nessas condições, os bacilos podem sobreviver por anos em estado de latência ou dormência e o indivíduo infectado pode não manifestar a doença. A doença se manifesta quando há um desequilíbrio dessa relação
mútua e freqüentemente está associada com estados de depressão da resposta imunológica. Os casos mais comuns de imunossupressão associados com a tuberculose são os indivíduos com Aids, estressados, que tomam drogas imunossupressoras, alcoólatras e desnutridos, entre outros.
Experimentos No desenvolvimento do projeto também
foi olhado com muita atenção esse problema do estado de latência ou dormência das micobactérias que podem sofrer uma reativação e manifestar a doença em estados de imunossupressão. Foi desenvolvido um modelo experimental em camundongos que mimetiza exatamente as condições observadas no desenvolvimento da doença humana em imunodeprimidos. Nos grupos de animais controles - aqueles que foram infectados, tratados com drogas antibacterianas para estabelecer um estado de latência, a quem foi administrado corticosteróide para causar imunossupressão e que não foram vacinados - observouse a reativação da infecção e o estabelecimento da doença. Nos grupos experimentais que
Koch e a tuberculose A infecção pelo bacilo da tuberculose se dá pela
inalação de pequenas gotículas oriundas do espirro de pessoas contaminadas. Essas gotículas contendo bacilos vão para os pulmões e aí, dependendo do estado de resistência imunitária dos indivíduos, podem estabelecer a doença. O pulmão é, em geral, o órgão mais comprometido pela infecção da tuberculose.
A tuberculose é conhecida desde o Egito antigo, séculos antes de Koch ter descoberto o bacilo que hoje leva o seu nome e que lhe proporcionou o Prêmio Nobel de Medicina em 1905.
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Apesar de a tuberculose ser muito antiga, o conhecimento sobre os mecanismos relacionados com o desenvolvimento da doença é pouco entendido. Não se sabe ao certo como se estabelecem as relações quando os bacilos penetram e se multiplicam dentro das células dos indivíduos. Além disso, muitos estudos ainda são necessários para melhorar os testes de diagnóstico, descobrir novas drogas antibacterianas e desenvolver uma vacina mais eficiente para impedir a transmissão da doença.
foram vacinados com a vacina de DNA não foram observadas reativações e desenvolvimento da doença, principalmente quando foram administradas três doses da vacina. "Se a vacina em humanos funcionar da mesma maneira como foi demonstrado para os animais ela pode até erradicar a tuberculose em nosso meio", afirma o pesquisador.
Teste em humanos O tratamento da tuberculose feito com
drogas antimicobacterianas é de longa duração -demora pelo menos seis meses. O uso contínuo dessas drogas, que normalmente são tóxicas para os pacientes, leva a uma alta taxa de abandono de tratamento e tem reflexos importantes no controle da doença e aparecimento de bacilos resistentes. O uso concomitante da vacina de DNA com drogas antibacterianas permitiu uma redução significativa do período de tratamento dos animais infectados com M. tuberculosis. Isso poderá trazer ganhos significativos, tanto no bem-estar social dos doentes e infectados quanto nos aspectos econômicos envolvidos no controle da tuberculose.
é para menos. A tuberculose é um dos mais graves problemas de saúde pública do planeta, especialmente nos países pobres. O bacilo é responsável pela morte de cerca de 3 milhões de pessoas por ano. Por isso ela é classificada como "reemergente".
No Brasil, cerca de 90 mi l novos casos são notificados a cada ano, juntamente com 5 mil mortes. Os principais focos, como no Rio de Janeiro e São Paulo, estão associados a hábitos e condições de vida, promiscuidade e consumo de drogas. O aparecimento da infecção pelo HIV tomou a tuberculose uma doença ainda mais dramática, devido à associação com a Aids.
Pelo menos nas pesquisas com os camundongos, a vacina gênica foi utilizada no tratamento da doença, conceito diferente em relação às vacinas convencionais, que são utilizadas somente como prevenção à instalação da doença. "A vacina de DNA cura a infecção, cura a doença estabelecida e impede que ocorra a reativação da doença, sem perder a sua característica profilática", afirma Célio Silva. "Se der certo no homem, será uma arma poderosa contra a tuberculose."
Para a ciência, cuja escala de tempo prevê resultados a médio e longo prazo, vale a pena investir, diante dos beneficias que podem advir. Não é algo que se possa esperar para antes do ano 200 I, segundo Célio Silva. "Mas nesse período não haverá droga ou vacina que sairá em hipótese alguma", afirma. "Os beneficias práticos e estratégicos resultantes do desenvolvimento dessa vacina com atividade terapêutica contra a tuberculose são inúmeros", afirma
Vantagens da vacina gênica O que a vacina de DNA permite, segundo o cientista Célia Silva:
•Previne o estabelecimento da infecção e da doença
•Elimina a infecção causada pelo bacilo da tuberculose
•Cura casos crônicos e doença disseminada
•Resolve casos de tuberculose causada por bactérias altamente resistentes aos medicamentos usados no combate à doença
•Impede a reativação da doença quando os animaissãosubmetidosaumaimunodepressão pelo tratamento com drogas imunossupressoras
•Permite que o período de tratamento efetivo contra a tuberculose seja encurtado de oito para dois meses pela administração concomitante de medicamentos e aplicação da vacina
o cientista. "Ela é segura, eficaz, pode ser dada numa única dose, estimula amplamente a resposta imunológica, tem efeito protetor duradouro e pode contribuir significativamente para a diminuição da incidência da tuberculose", acrescenta.
O custo de produção em larga escala é baixo e são estáveis à temperatura ambiente. Todos esses fatores "facilitam o transporte, a distribuição e o estabelecimento de amplos programas de imunizações em regiões de difiei! acesso e absolutamente desejáveis no âmbito da realidade brasileira".
O próximo passo, agora, e essa é a grande novidade da equipe de Ribeirão Preto, será testar a atividade terapêutica da vacina em um grupo de pacientes que manifestam a doença e cujas bactérias são resistentes a todas as drogas existentes no mercado. Esse grupo será chamado de "resistente a multidrogas". Ao mesmo tempo, outro grupo "normal" (que responde às drogas) será estimulado pelavacina, simultaneamente à administração de drogas, com a finalidade de verificar se o tempo de tratamento é encurtado. Ambos os testes serão desenvolvidos com o apoio da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e controlados por equipes treinadas no Departamento de Moléstias Infecciosas.
O processo de obtenção da vacina Os dados científicos obtidos até o mo
mento são tão animadores que a revista Nature acaba de aceitar a publicação de trabalho do grupo sobre a terapia gênica contra a tuberculose, o que deverá ocorrer proximamente, provavelmente causando repercussão nos meios científicos em todo o mundo. Não
Para a produção da vacina, um pedaço da molécula de DNA do bacilo é retirado· e inserido em plasmídeos especiais que permitem a sua multiplicação em larga escala em bactérias Escherichia coli. No DNA fica o código genético que codifica um antígeno o qual tem a potencialidade de induzir uma res-
PROCESSO DE OBTENÇÃO DA VACINA DE DNA
CLO.NA.GHM
MICOBAcrEitlANOS
HSN5, HSP70, ESA T f, MPT7o, ML36,MT38
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VACINA DE DNA
ISOLAMENtO I>OS PL.UMIDEOS
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CIUISCDOIIlO DAS DACTtiUAS
posta imune "adequada, protetora e duradoura", segundoCélio Silva. Quandoaplicadaem animais, a vacina de DNA induz a produção da proteína antigênica dentro de células do sistema imunológico, como os macrófagos e as células dendríticas. Essas células são conhecidas como células apresentadoras de an-
ESTIMULAÇÃO DA RESPOSTA IMUNE PELA VACINA
VACINA DE DNA
INJEÇÃO INTRA MUSCULAR
d:LULA APRESENTADORA
DEANTÍGENO
PROCESSAMENTO E APRESENTAÇÃO
ANTIGtNICA
tígenos e estão diretamente relacionadas com a estimulação da produção de anticorpos e ativação de linfócitosT. Os linfócitos T são fundamentais para o controle da tuberculose.
Diversos segmentos de DNA já foram testados e alguns deles oferecem proteção de I 00% em animais infectados, sendo que em vacinas recombinantes, da segunda geração, o índice de proteção alcançado foi de I O a 15%. As análises imunológicas mostraram que, dentre todas as células estimuladas pela vacina de DNA, os linfócitos I CDS exercem papel preponderante no controle da infecção.
Os trabalhos do grupo de Ribeirão Preto mostraramqueos linfócitos I CDS estimulados pela vacina gênica são preferencialmente do tipo citotóxicos, isto é, têm tanto a capacidade de destruir as células que albergam o bacilo da tuberculose em seu interior como secretam grânulos enzimáticos que ajudam na sua eliminação. Além disso, tanto os linfócitos T CDS como os T CD4 secretam, em altas concentrações, os estimuladores do sistema imunológico (interleucinas ), como a IL-2, IL-12 e interferongama.As interleucinas ajudam a manter ativados os sistemas microbicidas dos macrófagos, que também são usados para matar as mico bactérias.
A imunidade adquirida persiste por longo período de tempo, devido tanto à constante produção do antígeno dentro da célula hospedeira como à capacidade destes estimularem linfócitos de memória imunológica, sendo desnecessárias as revacinações.
A vacina de DNA, segundo Célio Silva, é um método considerado "mais eficaz e seguro" do que o de vacinas convencionais, que inoculam vírus ou bactérias atenuadas na pessoa para obrigar o sistema imunológico a produzir anticorpos ou imunidade celular. Com a vacina de DNA não existe o risco de que a pessoa termine contaminada, ao contrário da vacina de organismos vivos como o BCG - e essa é apenas uma de suas vantagens. "As vacinas de DNA representam uma metodologia que se aproxima da infecção natural, alcançando altos níveis de proteção desejada", segun-
do relata Célio Silva em seu trabalho. A vacina gênica é uma alternativa rela
tivamente recente na ciência médica. Somente em 1992 é que foi demonstrado pela primeira vez que um gene associado a um plasmídeo poderia ser empregado como vacina, de acordo com a I iteratura médica. Logo após foi mostrado que a injeção intramusculardo gene que codifica uma nucleoproteína do vírus influenza poderia ser utilizada para imunização de camundongos contra essa virose.
O fato causou enorme repercussão nos meios científicos e tecnológicos, segundo Célio Silva. "Desde então foram desenvolvidas vacinas gênicas contra uma série de agentes patogênicos. E algumas dessas novas vacinas, principalmente aquelas contra Aids e influenza, apresentaram excelente resposta em primatas, e já se encontram em fase de testes pré-clínicos em humanos", segundo ele.
A equipe de pesquisa da terapia gênica contra tuberculose é composta por Célio Lopes Silva, do Departamento de Parasitologia, Microbiologia e Imunologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão PretoUSP (coordenador); Lúcia Helena Faccioli, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto - USP; Sylvia Cardoso Leão, da Universidade Federal de São Paulo- Unifesp; Douglas B. Lowrie, do National Institute for Medicial Research, Londres; e José Maciel Rodrigues Junior, da Faculdade de Farmácia- Universidade Federal de Minas Gerais.
Perfil: O professorCélio Lopes Silva, 46 anos, é farmacêutico, graduado pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) em 1976. Fez mestrado e doutorado na área de Bioquímica do Instituto de Química da USP, livre-docência em Microbiologia Médica na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto- USP e pós-doutoramento em Imunologia e Biologia Moleéular no Nationallnstitute for Medical Research, na Inglaterra, entre 1989 e 1990. É professor titular em Imunologia e foi chefe do Departamento de Parasitologia, Microbiologia e Imunologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP entre 1995 e 1998.
DEDNA MANEIRAS PELAS QUAIS O SISTEMA IMUNOLÓGICO ATIVADO PELA VACINA
DE DNA ATUA SOBRE MICOBACTÉRIAS
'STIMULAÇÃODE 'IESPOSTA IMIJNE
ESPECÍFICA
LlNFÓCIT05 T CDS
LINFÓCITOS T CD4
LINFÓCITOS B
ATIVAÇÃO DA
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LINFOC!TO T CDS CITOTOXICO
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A!tVAÇÃO
ATIVAÇÃO
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Laboratório poderá servi r a experimentos semelhantes
Laboratório especial Em ciência, o investimento feito em
função de uma ,Pesquisa pode servir para muitas outras. E o caso do Laboratório de Vacinas Gênicas, construído com recursos da FAPESP no Departamento de Parasitologia, Microbiologia e Imunologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto.
O laboratório permite a manipulação com segurança de microrganismos que causem doenças sérias e potencialmente letais por exposição ou inalação. Foi edificado para a pesquisa da vacina contra a tuberculose, mas poderá servir para outros experimentos equivalentes.
Esse investimento foi necessário, pois não havia em Ribeirão Preto laboratório com o grau de segurança necessário para uma pesquisa como essa. Conceitualmente, o Laboratório de Vacinas Gênicas, cujo nível de biossegurança é 3 (NB3), é considerado adequado para trabalhos com organismos geneticamente manipulados (OGM) resultantes de agentes altamente infecciosos classe 3, como é o caso do Mycobacterium tuberculosis.
Graças a esse recurso, todos os trabalhos com o bacilo da tuberculose são realizados em cabines de segurança biológica classe III. Elas permitem manipulação de culturas de células infectadas e de material clínico contaminado, cultura de microrganismos, operações de animais, cultivo de tecidos ou fluidos infectados de animais e necrópsia.
De acordo com Célio Silva, o pessoal de laboratório tem treinamento específico no manejo desses agentes patogênicos e potencialmente letais e é freqüentemente supervisionado por especialistas com vasta experiência com esses agentes .
TECNOLOGIA
BIOQUÍMICA
Fórmula para crescer Empresa formada por pesquisadores vai produzir hormônio do crescimento no Brasil
Ponha-se no lugar de membro de uma família com uma criança com deficiência de hormônio do crescimento (GH). Ela vai precisar de doses diárias do produto por anos a fio. Cada dose do medicamento, todo importado, custa entre R$ 50 e R$ 80. Se a criança está sob tratamento no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), o governo do Estado banca a despesa. Mas, se não estiver? E o que isso significa para os cofres públicos? Além disso, o hormônio não é usado só em distúrbios de crescimento e com ameaça de nanismo. Ele é recomendado para pacientes de Aids, por exemplo, ou para a recuperação de queimados, por estimular a recuperação dos tecidos. Calculou a despesa?
Existe agora, porém, a possibilidade de que esses custos sejam reduzi dos, com o início da produção do hormônio, por meio da engenharia genética, no próprio Brasil. Se tudo der certo, uma nova empresa, a Hormogen Biotecnologia, começará a fabricar, no primeiro semestre do próximo ano, o medicamento em escala pi loto. "Vamos produzir com custos mais baixos que os praticados pelas multinacionais", afirma o pesquisador Paolo Bartolini, chefe do Departamento de Bioengenharia do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), coordenadordo projeto de produção e comercialização do medicamento.
Para isso, o IPEN e a Hormogen, cujos principais acionistas são os próprios pesquisadores envolvidos na investigação, já assinaram um convênio. O projeto, por sua vez, chamado Otimização dos Rendimentos de Expressão Bacteriana, Fermentação e Purificação do Hormônio de Crescimento Humano Recombinante, Visando Viabilizar sua Produção e Comercialização, foi incluído no
Programa de Inovação Tecnológica em Pequena Empresa (PIPE), apoiado pe la FAPESP. Saíram das verbas da Fundação cerca de R$ 250 mi l para tomá-lo possível.
Pico na puberdade O hormônio do crescimento (a sigla, GH
ou hGH, vem das in iciais do nome em inglês, Human Growth Honnone) já foi, inclusive,
muito mais caro. Até a década de 1970, a única maneira de consegui-lo era extraí-lo da glândula hipófise de cadáveres de seres humanos. Só a partir de 1979 começou a ser produzido, nos Estados Unidos, por meio da modificação
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do patrimônio genético de bactérias. Atualmente, todo o hormônio usado no Brasil é importado. As principais marcas, com os fabri cantes entre parênteses, são Genotropin (Pharmacia Upjohn), Humatrope(Eli Lilly), Norditropin (Novo Nordisk) e Saizen (Serono ).
O hormônio é secretado pela glândula hipófise durante toda a vida, mas tem seu pico de produção na fase da puberdade.
"Depois,a produção vai caindo gradativamente", explica a médica endocrino logista Berenice Bilharinho de Mendonça, I ivredocente da especialidade na USP. A principal função desse hormônio é a de estimu lar a divisão das células, permitindo, assim, o aumento dos tecidos . Não se sabe exatamente quantas pessoas têm deficiência na produção do hormônio no Brasil. Mas, se for seguido o padrão internacional , de uma pessoa em cada grupo de entre lO mil e IS mil nascidos , teremos algo em torno de 15 mil pacientes.
O número de usuários em potencial , porém, não pára por aí. Nem sempre a deficiência na produção do hormônio tem causa genética. Ela pode ser conseqüência de outros fatores , como tumores na região da hipófise, um traumatismo craniano ou efeitos da radioterapia. Além disso, sua aplicação terapêutica não é útil apenas em crianças em risco de nanismo. Ela é recomendada em vários casos, como transplantes de rins e situações graves de debilitação, como pacientes de Aids, tratamentos pós-cirúrgicos e queimaduras graves.
Nos últimos anos, ainda, aplicações do hormônio vêm sendo usadas em pessoas idosas, nas quais agiria como uma espécie de elixir da juventude. Esse tipo de tratamento, porém, não tem comprovação científica.
HORMÔNIO DE CRESCIMENTO HUMANO RECOMBINANTE
a) t> Sitiosde clivagem triplica
b) 11 Número teórico de peptideo
c) _. Sitio de clivagem do peptideo Phe-Pro
d) -+ Sitio de clivagem que produz duas cadeias
e) Metionina oxidada
e Asparagina desamidada
Seqüência (b) sinalizadora Seqüência que codif~ o
bacteriana hormônio de crescimento
iniciadora Metionina 'O Modificação
Hormônio do crescimento secretado no espaço periplásmico /
dag;n~~~ / ~ ~
o- / ... _./.__
hGH 'sem
hGH liberado mediante choque osmótico
metionina ~ NH,
COOH
Proteína com seqüência idêntica à do hormônio de crescimento natural
cliva o peptideo sinalizador
O hormônio de crescimento humano recombinante (rec-hGH) foi obtido modificando o patrimônio genético da E. coli, com a introdução de um plasmideo que contém a seqüência codificadora da molécula do hormônio natural, juntamente com aquela
do peptideo sinalizador. Uma protease bacteriana especifica cliva esse peptideo, permitindo sua secreção no espaço periplásmico bacteriano onde a molécula adquire a correta estrutura tridimensional (Fig.2). Essa localização, externa ao citoplasma, permite
a extração do hormônio mediante 'choque osmótico' (incubação em meio hipertônico seguida de incubação em meio hipotônico), sem ruptura da célula (Fig 3). após a extração e várias etapas cromatográficas, o produto é obtido com alta pureza
"O hormônio acelera a recuperação das células perdidas, favorecendo a construção dos tecidos e a síntese protéica", informa a professora Berenice. O hormônio é injetado no corpo do paciente. No caso de crianças com problemas de nanismo, a dose básica é de um décimo de uma unidade internacional por quilo de peso. Assim, uma criança com20 quilos vai precisar de duas unidades internacionais de GH por dia.
A citoplasma
Figura2
B
Processo complicado Não se chega, porém, ao estágio de
produção do hormônio por engenharia genética de um momento para o outro. Bartolini , por exemplo, trabalha com a produção e caracterização de hormônios há mais de 20 anos. Ele aprendeu a técnica de clonar o gene do GH em 1988, quando fazia estudos de pós-doutorado na Itália . De volta ao Brasil , continuou suas pesquisas. Há cerca de cinco anos, a equipe do IPEN sentiu que já dominava completamente as técnicas para a obtenção do hormônio. Só isso já é um passo a ser comemorado. O grupo detém o que Bartolini classifica de "um know-how importantíssimo", que pode, no futuro, ser aplicado na obtenção de outros medicamentos.
O processo para a obtenção do hormônio do crescimento não é simples. Começa com a introdução e o controle do gene humano numa bactéria modificada. A mais usada é a Escherichia coli. Durante a fase de fermentação, a bactéria reproduz-se rapidamente e passa a produzir o G H. A multiplicação é tão rápida que uma bactéria pode dar origem a bilhões no tempo de apenas dez horas. Passa-se, então, a um processo de centrifugação das bactérias, com o qual se obtém um extrato cru de proteínas.
Começa uma longa etapa de purifica-
bactéria em meio hipertônico
Figura 3 ção, com o objetivo de obter o hormônio e separar os contaminantes. A etapa tem muitos estágios, como cromatografias e precipitações. "Só no fim conseguimos separar a proteína que nos interessa", diz Bartoli; ni. Com a proximidade do início da produção em escala piloto, ainda, as preocupações dos pesquisadores estão em outros campos, incluindo o aspecto econômico do processo. "Para colocar o produto no mercado em condições de competitividade, é preciso otimizaros rendimentos da pesquisa, tanto na obtenção de vetares de expressão mais eficientes como no processo de fermentação em bioreator, aumentando a quantidade e a produtividade por bactéria", afirma Bartolini.
Potencial de negócios Para começar a produzir o hormônio,
ainda em escala piloto, os pesquisadores aguardam agora a chegada de equipamentos importados, o que deve ocorrer no prazo de seis meses. Se não houver imprevistos, calcula o administrador da Hormogen, Antônio Eduardo de Freitas Nicodemo, a produção começa no primeiro semestre do ano 2000. Com a planta piloto em funcionamento, os pesquisadores saem em busca de parceiros para dar início à produção industrial. "Já estamos estudando as melho-
21 'SP
bactéria em meio hipotônico
res parcerias e continuamos abertos a propostas", afirma Nicodemo.
Por enquanto, a Hormogen, que foi organizada especificamente para a produção do GH e tem como principais cotistas os pesquisadores do IPEN, com 70% do capital , passa por uma fase de adequação ao espaço que vai ocupar. Trata-se de um salão com cerca de 50 metros quadrados, situado no Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec) da USP, na Cidade Universitária. O Cietec, organização destinada a apoiar empresas emergentes na área tecnológica, fornece a infra-estrutura. Quanto às possibilidades de desenvolvimento, não são pequenas. "Temos um mercado potencial para o hGH biossintético superior a 300 mil doses por ano e ele está em expansão contínua", sublinha o administrador Nicodemo.
Perfil: O professor Paolo Bartolini, de 54 anos, é chefe do Departamento de Bioengenharia do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN). Nascido na Itália, formou-se em Química pela Universidade de Pávia. Doutorou-se em Biologia Molecular pela antiga Escola Paulista de Medicina, hoje Universidade Federal de São Paulo. Tem dois pós-doutorados, um de Bioquímica de Proteínas, nos Estados Unidos, e outro de Engenharia Genética, na Itália.
TECNOLOGIA
SIDERURGIA
Modelo de aço Unicamp desenvolve simulador que vai testar em laboratório novas tecnologias para a indústria siderúrgica
Qual é a tendência da indústria siderúrgica no fim do século 20? Apresentar produtos de melhor qual idade por um custo menor, responde um especialista no assunto, Rezende Gomes dos Santos, professor titular da área de Engenharia de Materiais da F acuidade de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp ). Usar processos que consomem menos energia e provocam o mínimo de poluição ambiental, acrescenta. Ele e um grupo de pesquisadores da U nicamp estão
feitos em pequena escala, no interior do laboratório, sem prejudicara produção nonnal das usmas.
O simulador, projetado e construído por pesquisadores e técnicos do Departamento de Engenharia de Materiais da Unicamp, é o primeiro resultado do projeto de inovação tecnológica Estudo do Processo de Lingotamento Contínuo de Placas Finas, realizado em parceria pela Unicampe pela Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST), do Espírito Santo, a
maior exportadora mundial de placas de aço. O projeto se desenvolve no âmbito do Programa de Inovação Tecnológica em Parceria (PlTE).Para torná-lo possível , houve um financiamento conjunto, da FAPESP, que entrou com R$ 200 mil, e da CST, que contribuiu comR$80mil.OprofessorSantos é o coordenador do projeto.
Chumbo e estanho "A idéia partiu da CST, que
queria um equipamento capaz de simular os fenômenos ocorridos durante o processo de lingotamento contínuo de placas", lembra o professor Santos. Os estudos começaram em julho de 1997. Por ser um trabalho pioneiro no Brasil, com pouca literatura de referência, a fase inicial, de planejamento do simulador, foi a mais difícil. Muitas experiências foram feitas, com placas de liga de chumbo e estanho, atéqueo processo de lingotamento chegasse no nível ótimo no simulador. Agora, ele já está trabalhando nonnalmente, com aço. Rezende Gomes dos Santos: sintonizado com o que se faz no mundo
"Nesta primeira bateria de testes, vamos trabalhar com aço carbono-manganês, facilmente analisável", infonna o engenheirometalurgista Júlio Cezar Bellon, do grupo de engenharia de desenvolvimento de produtos da CST, participante do projeto. "O objetivo é treinar a equipe do laboratório, inclusive em aspectos de segurança, domínio do procedimento experimental e ajuste dos parâmetros de controle de processo", acrescenta.
desenvolvendo pesquisas que vão nessa direção. Desde maio, está em funcionamento na sua faculdade o primeiro simulador de lingotamento contínuo de placas de aço produzido no Brasil.
Esse equipamento de laboratório vai permitir que as siderúrgicas realizem, em menos tempo e por um custo bem menor, experiências destinadas a descobrir novos e melhores processos para fabricar placas de aço, finas e convencionais, por meio do lingotamentocontínuo. Vai pennitirtambém uma melhor capacitação dos envolvidos no setor da siderurgia. A partir de agora, testes e ensaios poderão ser
Para Bellon, a indústria ganhou, com o simulador, um equipamento versátil, capaz de obter resultados que serão aplicados na linha de produção, melhorando o desempenho, diminuindocustoseaumentandoaqualidade. "O
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equipamento pem1ite uma análise detalhada dos efeitos dos parâmetros de processo e da composição química, relativa à qualidade intema e superficial dos produtos obtidos", diz o engenheiro.
Mudança global Nesse caso, o Brasil não está sozinho.
Vários centros de pesquisa realizam estudos desse tipo em várias partes do mundo, especialmente no que se refere à tecnologia das placas finas de aço. Santos lembra que a indústria siderúrgica vem passando por uma série de transfonnações tecnológicas, em todo o mundo,justamente com o objetivo de oferecer produtos melhores por custos mais baixos.
Uma das tendências principais é justamente o desenvolvimento de processos destinados a obter produtos de aço fundido nas formas e dimensões mais próximas do possível das destinadas à comercialização. Esses produtos são conhecidos, no linguajar técnico, pela expressão inglesa Near-net-shaping-casting. Para a usina, fabricar produtos nessas condições significa racionalizar processos e integrar etapas, ou seja, gastar menos energia e reduzir o custo final.
No processo convencional, as máquinas de lingotamento contínuo, as mais usadas hoje pelas siderúrgicas, produzem primeiro as placas numa detenninada espessura. Só então as placas são laminadas, em etapas sucessivas, até chegarem às dimensões com as quais serão entregues aos clientes. O tamanho com que a placa sai da máquina tem grandes variações. A largura pode ir de 0,85 metro a 2,30 metros. A espessura, de 15 a 30 centímetros. A partir dessas espessuras, a placa é submetida a um processo de laminação para que atinja a espessura desejada.
Não é preciso dizer que o processo de laminação, por melhor que seja feito, gasta enormes quantidades de energia. "Essa energia representa uma parcela significativa do custo de produção total, razão mais do que suficiente para que as siderúrgicas estejam interessadas no desenvolvimento de processos destinados a obter peças com menor espessura", comenta Santos.
Mais finas Recentemente, houve um grande avanço,
com o aparecimento de máquinas de lingotamento contínuo que produzem diretamente placas finas, com entre 4 e 8 centímetros de espessura. Essas placas podem ser laminadas em seqüência, em laminadoras de tiras a quente, de tamanho reduzido. Para alguns especia-
I istas, a nova tecnologia tem uma enom1e vantagem, a possibilidadedeacoplar lingotamento contínuo e laminação numa única unidade. Isso economizaria tempo e gasto de energia e aumentaria a produtividade.
Santos é mais cauteloso. Para ele, é preciso fazer um bom estudo de viabi lidade antes de dar esse passo, pois ele não oferece vantagens em todos os casos. Há a questão do tipo e quantidade de produtos fornecidos pela usina. E há também o problema do efeito do tipo de processo sobre a microestrutura e, portanto, da qualidade final da placa.
Tudo isso acontece num momento de enormes transformações na indústria siderúrgica. As mudanças começaram na década de 1970, quando a crise do petróleo forçou as usinas a melhorar drasticamente o aspecto térmico de suas operações industriais. As reformas deram origem a novos desenvolvimentos tecnológicos e aumentaram a apl icação do lingotamento contínuo na produção de aço.
A competitividade aumentou, com a ampliaçãodaofertadeprodutossiderúrgicos. Sur-
Os números da CST
A Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) é a maior fornecedora de placas de aço do mercado mundial, com cerca de 19% do mercado internacional. Em 1998, comercializou 3,5 milhões de toneladas do produto. Seu fatu ramento anual é de cerca de US$1 bilhão. Responde por 15% da produção nacional de aço bruto e é a sexta colocada no ranking dos maiores exportadores brasileiros. Tem porto próprio, em Praia Mole, e é servida por duas ferrovias.
A empresa foi formada em 1976, como companhia mista com controle do Estado, e privatizada em 1992. A sede fica em Serra, no Espírito Santo, perto de Vitória. Sua especialização é a produção de placas de aço por meio de lingotamento contínuo. As placas são relaminadas em produtos planos, com diversas aplicações.
giram as miniusinas, que trabalham principalmente à base de sucata, cujo custo de instalação é de um quarto de uma usina convencional. Essas usinas, que funcionam, principalmente nos Estados Unidos, Itália e India, mostraram os problemas das instalações gigantescas que vinham dominando o setor.
Mais investimentos Os últimos anos foram caracterizados
pela maior preocupação com os aspectos ambientais e pelo aparecimento de aços de baixo peso, mas grande resistência. O setor está cada vez mais preocupado com a tecnologia e houve um aumento sensível dos investimentos em pesqutsa.
Énessequadroqueentra o projeto da Unicamp. Além do professor Santos, participam os professores Paulo Roberto Me i, vice-coordenador, e Geraldo Nunes Telles, ambos do Departamento de Engenharia de Materiais, além de dois alunos de doutorado, três de mestrado e um engenheiro. O projeto deve estar terminado no segundo semestre deste ano.
O simulador tem, entre seus elementos, um molde retangular, com parede móvel. O aço é fundido em um forno de fusão por indução e vazado para o molde, a temperaturas superiores a 1.550 graus Celsius. Nesse momento, é aplicada a defom1ação, a redução da espessura com o núcleo ainda líquido, com o objetivo de melhorara qualidade do matetial. Paralelamente, modelos numéricos são desenvolvidos num computador, para estudos posteriores.
Perfil: O professor Rezende Gomes dos Santos tem 51 anos e é professor titular na área de Engenharia de Materiais da Faculdade de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) . Formado em Engenharia Mecânica pela própria Unicamp, fez mestrado e doutorado em Solidificação de Metais na mesma universidade. Tem pós-doutorado em Simulação Numérica de Processos de Solidificação de Materiais pela Escola Politécnica Federal de Lausanne, na Suíça.
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PEQUENAS EMPRESAS
Um balanço do PIPE
Programa da FAPESP já liberou R$ 7,2 milhões para
inovação em pequena empresa
Mais 31 pequenas empresas do Estado de São Paulo inscreveram-se no quinto edital ou quinta rodada de inscrições do Programa de Inovação Tecnológica em Pequena Empresa (PIPE), encerrada no dia 30 de junho. Do total de empresas inscritas, 23 são da área de Engenharia , em suas diversas especialidades: I O projetas são de empresas de Engenharia Elétrica, 5, de Engenharia de Materiais, 3, de Engenharia Química, 2, de Engenharia Mecânica , I , de Engenharia Civi l, I , de Florestal e I , de Engenharia de Transporte. Outras áreas contempladas foram Ciências da Computação (duas empresas) , Medicina (duas empresas), Física, Geociências , Educação e Ciências e Tecnologia de Al imentos , com uma empresa cada. Os projetas inscritos serão analisados e os se leciona'dos passarão, em seguida, para a Fase I do programa, isto é, de avaliação da viabilidade técnica da pesquisa.
Até o momento, somando os inscritos nos quatro editais anteriores, 78 empresas já foram se lecionadas para a Fase I , de um total de 22 1 pequenas empresas inscritas . Os recursos liberados pela FAPESP para os estudos nesta Fase somam aproximadamente R$ 3, I milhões. Para a Fase 2, de efetivo desenvolvimento da pesqu isa, já foram aprovados 26 projetas (22 do primeiro edita l e 4 do segundo), totalizando cerca de R$ 4, I milhões.
PIPE- PEQUENAS EMPRESAS PARTICIPANTES DA FASE 1 Edital Inscritos Selecionados ValorUS$
para a Fase1 tR$tbolsas 1º 80 31 1.292.653,40
2º 66 23 940.156,71
3º 31 12 478.583,70
4º 44 12 442.787,85
Total 221 78 3.154.181 ,26
PIPE- PEQUENAS EMPRESAS PARTICIPANTES DA FASE 2 Edital Selecionados Valor
para a Fase2
1º
2º Total
22
4
26
3.474.846,01
827.864,00
4.102.910,00
ENSINO PÚBLICO
EDUCAÇÃO
Laboratório vivo Projeto leva adolescentes a resgatar a memória de bairro de São Paulo
Davi Lopes, 76 anos, morador no lugar desde que tinha 5 anos, lembra do tempo em que até onças e jaguatiricas chegavam perto de sua casa. "Tínhamos 12 cachorros perdigueiros para nos proteger", recorda. Ele morava, então, com a família em uma pequena chácara. Aliás, as chácaras, áreas de pastagens e matas formavam a maior parte da paisagem do Jardim da Saúde, até a década de 30. Foi somente a partir dos meados daquela década que surgiram os primeiros loteamentos. Alcina Rodrigues Gomes Menezes, 85 anos , veio morar ali em 1940. "Na frente da minha casa, onde antes se via um bosque com árvores frutíferas, hoje se destaca uma praça." As lembranças de dona Alcina e de seu Davi poderiam estar perdidas, e com elas boa parte da história do lugar, se não fosse por um pro-
jeto inovador para o ensino público estadual de São Paulo.
Durante dois anos, de abril de 1997 a abril de 1999, alunos e professores da Escola Estadual Raul Fonseca saíram às ruas e trabalharam nas salas de aula para resgatar a memória de seu bairro, o Jardim da Saúde, na capital de São Paulo, hoje com aproximadamente 146 mil habitantes. Para contar a sua história, os estudantes usaram cadernetas, gravadores, filmadoras, máquinas fotográficas e produziram textos, jornais, exposições, uma fita de vídeo e um CD-ROM. A opinião geral é a de que o esforço valeu a pena. "Não somos mais os mesmos depois desse trabalho", diz a professora de história Maria do Socorro Figueiredo, uma das participantes do projeto.
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Nem poderia ser de outra forma. O projeto, no começo visto com desconfiança por alunos, pais e mesmo por alguns professores, teve enorme impacto numa escola cujo curso noturno registrava enorme índice de evasão logo que os alunos conseguiam as carteirinhas para viajar de ônibus com desconto e cuja sala de computadores, com cinco aparelhos, vivia fechada porque poucos professores sabiam manejá-los e os alunos estavam proibidos de chegar perto dos equipamentos. Boa parte dessa atitude mudou. "Muitos alunos acham que estudar é só ficar sentado numa sala de aula, mas essa imagem mudou", diz a aluna Ana Clara da Conceição, de 15 anos.
Os pesquisadores que participaram do projeto também estão satisfeitos. "A memória e sua recriação pedagógica são pontos de
Estadual Raul Fonseca, por meio de entrevistas, fotografias e objetos antigos
partida para a valorização da própria vida humana", afirma o professor Luiz Roberto Alves, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), coordenador do projeto. "Transformada num valor cultural , a memória permite que a escola pense e entenda seu contexto", acrescenta. O projeto, chamado A Escola: Centro de Memória e Produção de Conhecimento/Cultura, foi realizado com o apoio da FAPESP, dentro de seu Programa de Pesquisas Aplicadas sobre a Melhoria do Ensino Público no Estado de São Paulo.
Bagres e traíras Os mal-entendidos surgidos no começo
foram logo superados. "Algumas mães chegaram a me perguntar se seus filhos não iriam mais aprender história", lembra a professora Maria do Socorro. Não durou muito, porém, para que as ligações fossem feitas e as coisas se estabelecessem. "Os moradores mais antigos lembravam sempre o início do bairro, quando boa parte da área estava coberta de mata virgem", diz a professora. Seu Davi, por exemplo, lembra que ele e outros
meninos costumavam pescar em lagoas da região. "Trazíamos traíras, bagres e lambaris", recorda.
"Procuramos fazer com que os alunos localizassem as referências dos moradores antigos no tempo e no espaço", informa a professora Maria do Socorro. Por exemplo, um morador antigo disse, certa vez, que "o doutor Getúlio" tinha passado por um lugar. Não demorou muito para que os alunos reconhecessem no personagem o presidente Getúlio Vargas, personagem de seus livros de história. Não foram só os alunos e os pais os influenciados. "Os avós se sentiram importantes, pois a escola foi até eles", diz Maria do Socorro.
Os depoimentos e dados sobre a região vêm desde a primeira metade do século 20, quando o bairro começou a ser povoado por pessoas vindas de várias partes do Brasil e imigrantes portugueses, italianos e, posteriormente, japoneses. O nome do bairro vem do fato de ele estar numa região relativamente alta o que a tornaria , pelo menos em teoria , mais saudável do que outras partes da cidade de São Paulo.
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Ovo e farinha Na pesquisa, os alunos levantaram fatos
pouco conhecidos, como o dia-a-dia das pessoas que trabalhavam no bairro, em chácaras para a produção de verduras, que eram levadas em carroças para o Mercado Municipal, na Cantareira. Era uma vida dura, na qual as pessoas trabalhavam do nascer ao pôr-do-sol. Mas o respeito ao descanso dos domingos e dias santos era sagrado. Às vezes, o pão, vindo de uma padaria no largo do Cambuci, não chegava ao bairro a tempo do café da manhã. Era substituído por uma massa de farinha de trigo, leite e ovos, frita como panqueca.
Mais coisas foram surgindo. Os alunos descobriram, por exemplo, a nascente de um córrego, a Biquinha, que servia para manifestações de devoção religiosa. Restos de imagens ainda podem ser vistos ao seu redor. Outro exemplo é um moinho de vento, usado para puxar água de um poço que servia a casa de uma família rica.
O fato é pouco conhecido, mas o Jardim da Saúde tem obras importantes, como a Capela do Cristo Operário, na rua Vergueiro,
com pinturas e vitrais de Alfredo Yolpi e jardins projetados por Roberto Burle Marx. A capela serviu de palco para a criação de wna fábrica de móveis com autogestão dos trabalhadores. O projeto não deu certo e hoje mesmo as obras de Yolpi estão ameaçadas pela deterioração. "A história e o significado dessa capela foram destacados pelo projeto e deveriam ser conhecidos por toda a comunidade de São Paulo, devido à sua importância cultural e mesmo política", diz o professor Alves.
Novo currículo O material que ia sendo recolhido pelos
alunos foi trabalhado por eles e pelos professores das disciplinas de Português, História, Educação Artística (Teatro e Artes Plásticas), Geografia, Ciências e Matemática, de uma forma integrada. Esse material constou de fotografias antigas, cedidas pelos moradores, e atuais, produzidas pelos alunos; objetos; fatos históricos, casos, lendas, etc., ouvidos dos moradores e também pesquisados em bibliotecas e arquivos públicos. Os temas abordados iam da origem e evolução do bairro ao trabalho da mulher, passando pelas tradições e religiosidade. As informações foram sistematizadas em quatro blocos, correspondendo às áreas de conhecimento do currículo escolar: linguístico-literário, plástico-visual, histórico-documental e científico-tecnológico, este último relacionado com Matemática e Ciências.
"Trabalhar o tema memória dentro da educação é oferecer ao professor e ao aluno inúmeras possibilidades de estudos e pesquisas, é reconsiderar o ambiente em que se está inserido, dispensando-lhe wn olhar mais íntimo e um tratamento mais carinhosos. Daí a estabelecer ligação com as várias ciências existentes no currículo escolar e no mundo", escreveu a professora de Língua Portuguesa, lvânia Leite Barros deAlmeida, na revista que trata do projeto e de seus resultados. E ela exemplifica: a análise de um fotografia antiga de um caçador, com sua espingarda em um
ambiente campestre, oferece inúmeras possibilidades de estudos, que vão do homem e o meio há quarenta anos, passando pelo relevo e vegetação há quarenta anos e atualmente, até a origem desse homem, sua profissão e nível de instrução.
No caso de Ciências, por exemplo, o ponto de partida para a integração da disciplina no projeto foi a discussão do tema "qualidade de vida" no bairro. Isto porque, segundo a professoraAlessandra Bartalini, o Jardim da Saúde "formou-se por famílias que procuravam, nas imensas e tranqüilas áreas verdes, a cura dos problemas respiratórios apresentados por suas crianças". Só que esse local sossegado e saudável foi sendo substituído pelos prédios, avenidas e trânsito. Fazer o paralelo entre o passado e o presente ou entre situações diferentes encontradas hoje no bairro - bolsões com ruas arborizadas e casas suntuosas contrastando com outros cpm favelas e córregos poluídos - foi o caminho encontrado pela professora para integrar sua disciplina ao projeto.
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Resultados Com o material recolhido pelos alunos,
foram produzidos doisjomais; um caderno de pesquisas, de 154 páginas; exposição de fotografias com textos explicativos, o chamado Museu de Rua; um vídeo de 24 minutos, baseado nas histórias das vidas de moradores do bairro; e um CD-ROM com imagens, depoimentos e dados sobre a região.
O uso de veículos diferentes não surgiu por acaso. "Isso abriu a possibilidade de fazer uma reflexão sobre as relações entre a mídia e a juventude", diz o professor Alves. Os computadores tiveram papel importante nesse trabalho. "Reabrimos a sala de infomlática e preparamos os professores para o uso desse recurso", informa Henry Alexandre Machado, aluno de biblioteconomia da USP e responsável pela preparação do CD-ROM.
Uma das experiências mais gratificantes para os organizadores do projeto foi pôr os alunos em contato com a Internet. Eles usaram o acesso para preparar trabalhos sobre a Bienal de Arte de São Paulo. Mas também tiveram chance de explorar a rede de acordo com seus próprios interesses. Entre os lugares mais procurados estiveram os sites do jogador de futebol Ronaldinho e de conjuntos musicais. "É fácil mexer com computadores", constatou, por exemplo, o aluno Andersen Gonçalves Ferreira, de 17 anos.
O projeto foi mais além. Em diversas representações, os alunos dramatizaram as vidas dos primeiros moradores do bairro e mostraram, em trajes típicos, as diversas origens dos habitantes do Jardim da Saúde. Uma "festa do talento" deu oportunidade para que alguns deles mostrassem suas habilidades. Quando se levantou o problema da gravidez na adolescência, um grupo de médicos foi à escola debater a questão com os estudantes. "Muitos alunos se sentiram motivados porque as avaliações também levavam em conta conhecimentos que, antes, não eram valori-
zados", diz a professora Maria do Socorro. Uma prova do sucesso da experiência
é o fato de a escola, mesmo depois da apresentação dos trabalhos finai s, estar interessada em continuar o projeto. Seus resultados, por outro lado, podem servir para novas experiências. Para o professor Alves, o trabalho do Jardim da Saúde foi um piloto que poderá ser aproveitado por outras escolas da rede pública, transformando o trabalho com a memória numa atividade regular. "Até agora, vem existindo uma fa lta de comunicação entre a escola e seu entorno", diz o professor da USP. "O trabalho nos mostrou como
a memória comunitária é fundamental para a compreensão do processo de adaptação das pessoas à metrópole e para a criação das raízes da vida social."
Perfil: Luiz Roberto Alves é professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). Tem doutorado em Teoria Literária pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Estudou as relações entre a literatura e a cultura na Itália e em Israel. Sua experiência como professor de português em escolas públicas auxiliou o projeto. É autor de Culturas do 7i'abalho: Comunicação para Cidadania, publicado este ano pela Editora Alpharrabio.
Volpi Um dos maiores nomes da pintura brasileira, Al
fredo Volpi nasceu em Lucca, na Itália mas veio residir em São Paulo antes de completar 1 anodeidade.Amaior parte de sua vida viveu nobairrodoCambuci.Aos 18anos realizou sua primeira obra artística, mas foi somente a partir de 1951 que passou a dedicar -se exclusivamente à pintura-antes disso, trabalharacomoencanador, entalhador e carpinteiro. No ano seguinte, recebeu o Prêmio Aquisição na Bienal deVeneza e no Salão Nacional de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
As obras do pintor na Capela Cristo Operário datam aproximadamente de 1955, quando ela surgiu. Ali, na Rua Vergueiro, existia um antigo armazém de secos e molhados, transformado em capela pelo frade João Batista Pereira dos Santos. Ele mandou erguer uma torre e convidou artistas para criar as imagens e realizar as pinturas internas do templo. Um deles foiVolpi, que pintou os painéis Cris-
to Operário, A Sagrada Faml7ia e SantoAntônioPregan- • do aos Peixes, além de produzir quatro vrtrais, mostrando os evangelistas. A capela abriga ainda esculturas e painéis de outros artistas plásticos, todos necessitando
restauração. O projeto paisagístico dos jardins da capela foi ferto por Burle Marx. O projeto paisagístico original foi completamente alterado ao longo do tempo.
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"A memória é a história viva e revivida." Felipe Augusto Santos Oliveira, íf série A
"Aqui estou eu olhando para você, Aí está você, querendo me ensinar.
Não sei de nada, você sabe de tudo. Venha! Me ensine!
Estou querendo aprender! Faço-me mil perguntas, todas sem respostas ... Fale mais um pouco,
estou gostando de te escutar. Conte outra história,
diga o que era aqui, o que aconteceu. Estou querendo resgatar a memória do meu bairro. Aí está você, a me contar muitas e muitas histórias. Como você se chama?
Acho que já sei: Projeto da Memória."
"Este projeto ajudou na descoberta de nossos antepassados. A
compreendermos a evolução do bairro. Através dele soubemos como viviam
nossos avós e pais, de suas dificuldades e problemas contemporâneos.
Algumas casas, praças, igrejas ainda permanecem firmes entre nós.
Entrevistas e fotografias antigas contaram a nós, alunos, o começo do bairro.
Sabemos hoje que o lugar mudou muito, mas que houve, nos bastidores, mulheres
e homens com garra para viver e transformar, sonhar e realizar:
nossos bisavós, avós, tios e vizinhos. Parabéns, Jardim da Saúde!
Parabéns a sua gente!" Joyce Cristina Rodrigues Maschi, íf série A
"Num lugar vazio construiu-se uma casa singela para gente honesta. No silêncio intenso, um simples barulhinho parecia grande ruído. Ao ouvirem uma moita se mexer, eles não faziam a pergunta que hoje é costumeira: será um ladrão? Acordava-se bem cedinho e ouvia-se o sininho da charrete do leiteiro, que trazia o leite fresquinho. Depois chegavam os pãezinhos bem quentinhos. Naquela época não havia clubes e
sim cachoeiras e muitos peixinhos. Sinceramente, eu preferia
um sem modernização, a este, que é só destruição."
Joana B. da Costa, 6' série
LIVRO
Uma contribuição essencial para o debate do positivismo O velho, mas sempre atual, polêmico e
mal conhecido positivismo continua sendo objeto de debates. E constitui mérito de Lelita Oliveira Benoit, com sua Sociologia Comteana (FAPESP/Discurso Editorial, São Paulo, 1999), contribuir decisivamente para o conhecimento desta filosofia. Com clareza e elegância, ela revela uma leitura em profundidade, atenta aos detalhes e às gran-des linhas de condução de um pensamento desafiador para o intérpre-te, dada sua complexidade. É que no sistema comteano entrecruzam-se de modo inextrincável te-mas cruciais da cultura modema, como a ciência, a política, a filosofia, a moral, e a religião.
Paciente e sóbria, rigorosamente fiel aos textos, Lelita Benoit entusiasma o leitor com seu aparato crítico e erudição. Suas fontes bibliográficas oferecem informações indispensáveis à compreensão dos textos comteanos, sejam elas referentes às circunstâncias da produção do texto ou exaustivas indicações das filiações filosóficas e históricas do autor. Mas esse verdadeiro trabalho de formiga está longe de ser seu maior mérito - que é o de construir um brilhante desenvolvimento da interpretação marcuseana de Comte, como aponta Isabel Loureiro no prefácio.
Na primeira parte ("Da Economia PolíticaàHistória"),LelitaBenoitanalisaoconjunto de textos do jovem Comte,já orientados para a fundação de uma ciência social modema. Trabalhando em parte com textos de difícil acesso, com problemas de estabelecimento da verdadeira autoria, mas rastreando tudo o que diz respeito aos anos 1817-1819, ela renova as interpretações mais ou menos consagradas pela exegese acadêmica, ao mostrar que as teses sobre a existência de um período prépositivista devem ser, no mínimo, revistas. Em sua interpretação, jamais houve adesão completa de Com te ao pensamento econômico nem uma fase pré-positivista. Já em 1817, Comte "propõe que se reflita mais seriamente sobre a organização da modema sociedade européia, de modo a superar o estado de anarquia instaurado após a Revolução Francesa, e começa fazendo um apelo ao consenso político", dirigido aos homens influentes da Europa. E aqui já estão sendo colocados alguns dos termos-chave que irão mapear sua trajetória: sociedade modema, Revolução, organização, consenso, todos de cunho acentuadamente político que revelam a lacuna essencial do pensamento
econômico: a crise atual, por ser de "natureza política e moral" (p. 39), exigiria um instrumento intelectual novo que somente se cons-
tituirá com o surgimento da sociologia como ciência. Atenuando a tese da adesão à economia po lítica, Lelita dá o primeiro passo para propor a tese da profunda unidade e continuidade de todo o pensamento comteano.
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Perseguindo o ideal de uma ciência do social mais ampla que a economia política, restrita ao cálculo do interesse privado, Comte vai encontrar na história o h o rizonte que contemplaria também os interesses coletivos. É assim que Lelita inicia a parte II de seu livro ("Sob o Paradigma da História") com uma
reconstituição da teoria comteana do tempo social e histórico que secaracterizaria, conforme a observação da marcha da civilização, pela estrita continuidade, rítrno lento, linearidade e aversão natural pelas rupturas abruptas e revolucionárias. O tempo social é o tempo da transição gradativa. O tempo histórico impõe, portanto, a resignação como virtude política primeira.
Com essas premissas, Lelita realiza, no capítulo VI de seu livro, apaixonada comparação entre Condorcet e Comte, que considerava aquele filósofo como "seu verdadeiro pai espiritual". Faz uma leitura cerrada dos textos de Condorcet, cujo Esboço de um quadro histórico dos progressos do espírito humano se concentra em "três pontos ali considerados os mais importantes: a destruição da desigualdade entre as nações; os progressos da igualdade de um mesmo povo; o aperfeiçoamento do homem real"( p. 177 ). E mostra como "é contra essa filosofia da história de Condorcet, que privjlegiaem absoluto a igualdade e a liberdade, que se revoltará Com te" ( p. 165), em nome de uma suposta tendência natural dos homens à boa ordem, à obediência e à resignação.
A seguir, concentra-se na sociologia propriamente dita, cujo texto inaugural seria o famoso Opúsculo Fundamental de 1822. A expressão imediata da ciência sociológica é a famosa lei dos três estados. Segundo Com te,
SECRETARIA DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO
o espírito humano, começando pelo estado teológico inicial e transitando pelo estado metafisico intermediário, chega ao estado positivo ou científico a tua I e definitivo.A ordem toma-se categoria teórico-prática fundamental do pensamento comteano, fundado em parte na objetividade do pensamento científico e, em parte, pela necessidade de pôr freio à revolução. Do ponto de vista subjetivo, ordem é submissão, obediência, disciplina, que têm de aparecer como tendências naturais, necessárias e universais. Dentro dessa perspectiva, Lelita desenvolve a parte III de seu livro, "Sob o Paradigma da Biologia", realizando uma exegese inédita em língua portuguesa de textos rarissimamente trabalhados e, no entanto, indispensáveis para a compreensão do positivismo. Ela afirma que "nas "lições" de sociologia, as categorias histórico-sociológicas se enraízam profundamente nas categorias biológicas, encontrando nestas últimas sua própria gênese" (p. 331 ). Mas o que interessa a Comte é o que a biologia pode fornecer, na verdade, para uma teoria da natureza humana (pouco importando que o estudo de qualquer natureza seja por definição "metafisico" e não positivo). Partindo do esfacelamento da unidade metafisica da alma e do eu, elaborado pelas mais recentes conquistas da modema biologia, Comte propõe a fremologia como ponto de partida para o estudo do homem. Como os homens não foram feitos para pensar, mas p~a sentir e ter emoções, é necessário sempre um guia que possa conduzi-los nos duros caminhos da vida. E como "na maior parte dos homens existe uma disposição natural à obediência"( p. 356 ), trata-se de organizar essa tendência natural. Esta será a função social da religião, objeto de estudo da última partedoliv o, "SoboParadigmadaReligião", em que Lelita trabalha especialmente o conceito de pacto social positivista, ou seja, aquele estabelecido não mais "entre indivíduos, mas entre classes sociais: o proletariado e os "ricos ati vos". Mas o que caracteriza sobretudo o pacto positivista é que exclui explicitamente o ponto de vista da vontade geral (p. 379). Há superiores e inferiores: eis o fato social por excelência, inelutável, indestrutível, eterno!
Investigação rigorosa, mas apaixonada e instigante, o trabalho de Lelita Benoit traz o debate sobre o positivismo a um nível de qualidade raras vezes alcançado.
José Carlos Bruni
GOVERNP DO ESTADO DESAOPAULO
en ma uman~
ESPECIAL BIOLOGIA, A CIÊNCIA DO SÉCULO 21
Cientistas prevêem que as novas tecnologias tornarão cada vez maiores suas possibilidades
de compreender e modificar os processos da vida
Já é quase um lugar comum: o século 20 foi o século da Física,
mas a ciência que vai mudar a face do mundo no século 21 é a Biologia. No catálogo de novidades anunciadas para o próximo milênio, a Biologia -mais precisamente, a Biologia Molecular - oferece as promessas mais apreciadas pelo público, que vão do sempre almejado controle do câncer, até a possibilidade de duplicar o animal de estimação, com o objetivo de poupar o dono da dor de sua morte. A fonte primordial de tantas renovadas esperanças é um conjunto de tecnologias e ferramentas que deu aos cientistas a capacidade de estudar, fora da célula, a muito complexa maquinaria bioquímica que rege as interações entre moléculas - notadamente, as que envolvem os ácidos nucléicos e as proteínas- e de pretender intervir para modificá-la. Ao tornar-se arauto do terceiro milênio, esta nova Biologia transformou-se a si própria. O Programa Genoma-FAPESP descende da recentíssima tradição engendrada a partir da década de 50, com a descoberta de Crick e Watson, a estrutura molecular do DNA, e que ganhou impulso definitivo com a estratégica decisão dos governos norte-americano e britânico, especialmente, de financiar o seqüenciamento completo do material genético da espécie humana.
Os entrevistados dos encartes de junho e julho do Notícias FAPESP são cientistas que vivem essa metamorfose. Esta condição fez deles personagens da série de documentários que a TV Cultura prepara sobre o projeto pioneiro da genômica no Brasil- o seqüenciamento com-
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pleto da bactéria Xyllela fastidiosa-, e que irá ao ar para 16 estados na segunda semana de agosto. As questões que a equipe da jornalista Mônica Teixeira- autora de todos os textos que se .seguem- levou a pesquisadores brasileiros e norte-americanos visavam conhecer suas opiniões sobre o momento privilegiado em que se desenrolam suas carreiras, seu fazer científico. Que Biologia é esta, que não seria possível sem computadores? O seqüenciamento de um genoma dará mesmo a chave para fechar todos os compartimentos por onde passa a dor humana? Restará alguma atividade de pesquisa em Biologia que prescinda das informações obtidas através do seqüenciamento de genes? Quais os limites da ciência? Neste mês, contam o que pensam o imunologista Leroy Hood, do grupo de cientistas americanos que montaram a logística e puseram de pé o projeto Genoma Humano; Craig Venter, biologista molecular, fundador de empresas de genômica, o homem que quer ser o primeiro a decifrá-lo completamente; Phillip Green e João Carlos Setúbal, cientistas da computação -os novos parceiros dos biólogos-, sobre quem recai a difícil e delicada tarefa de colocar a informática a serviço dos mistérios da vida. Todos eles são, a um só tempo, realizadores e testemunhas de um marco anunciado da história da ciência. No mês que vem, tem mais.
GENOMA HUMANO I
A Biologia tornou-se inform.ação
Acarreira de Leroy Hood marca-se pelo interesse em desenvolver novas
ferramentas para apressar o passo da Biotecnologia. Desde os anos 60, participou do desenvolvimento de máquinas para automatizar muitas das tarefas ligadas à área - inclusive os seqüenciadores de DNA e de proteínas atualmente em uso nos laboratórios. Como conta na entrevista, Leroy nunca teve nenhuma restrição a trabalhar com a indústria - e tornou-se, ele mesmo, um fundador de empresas do ramo, como a Applied Biosystems (comprada pela Perkin-Eimer) ou a Amgen. Em 1992, mudou-se do Caltech para a Universidade de Washington, em Seattle, onde criou o Departamento de Biotecnologia Molecular, e também onde organiza, agora, a criação de um novo instituto de pesquisa, para o qual prevê um orçamento de US$ 100 milhões. Leroy gosta de escalar montanhas, nasceu em Montana, e tem dois filhos. Em março, quando o vice presidente dos Estados Unidos, AI Gore, anunciou uma verba adicional de US$ 81 milhões para apressar o seqüenciamento do genoma humano, o centro ao qual Leroy está ligado não recebeu suplementação.
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Leroy Hood
• Em 1991, o senhor disse que seria fundamental a ampliação da capacidade de seqüenciamento para o sucesso do projeto Genoma Humano. O senhor está satisfoito com o que foi atingido até agora?
- Bem, nós chegamos ao previsto. As máquinas mais recentes, que estão sendo testadas agora, 1 já têm capacidade três a quatro vezes maior do que as máquinas que os labora-tórios estão usando neste momento.
As novas máquinas podem ler centenas de milhares, meio milhão de pares de bases em um ano ... Esta é uma das razões pela qual o projeto Genoma Humano muda toda uma série de paradigmas da Biologia, e já começa a mudar também os paradigmas com os quais a Medicina trabalhou até aqui. Essas mudanças têm a ver com a idéia de que, agora, Biologia tornou-se informação. E a informação está em nossos cromossomas. O desafio, daqui para a frente, para a Biologia e para a Medicina, será entender não como funciona um gene, ou uma proteína, mas como um sistema de genes ou de proteínas funciona. Agora, pela primeira vez, e em parte por causa do projeto Genoma Humano, nós temos o que eu chamo de "ferramentas globais" - com as quais se pode olhar não para um só gene de cada vez, mas para mil genes, dez mil genes ou cem mil genes de uma só vez. Isto transforma como pensamos a Biologia. O que é interessante nos seres humanos está codificado em sistemas biológicos, não em genes isolados. E se você aplica esta idéia de olhar os sistemas ao estudo das doenças, isto também vai mudar o que pensamos das doenças. É o projeto Genoma quem gera estas mudanças.
• Entre as descobertas realizadas desde que o projeto começou a ser engendrado, qual a que o excitou mais, qual delas o senhor achou mais interessante?
- Se for preciso escolher. .. Como penso que o projeto Genoma é um projeto gerador de informação, informa-
' Refere-se aos seqüenciadores automáticos com tubos capilares, lançados em 98 (phamarcia) e 99 (Perkin Elmer). Há seis destas novas máquinas já em uso no projeto brasileiro Genoma Humano do Câncer.
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ção que a Biologia vai usar para fazer novas perguntas, então as duas descobertas mais excitantes foram técnicas -a invenção do seqüenciador automático de DNA, que nos permitirá terminar o genoma humano vários anos antes do que nós imaginávamos inicialmente; e os chips de DNA2
, através dos quais pequenos fragmentos de DNA em chips podem ser usados para olhar a informação expressa numa célula tumoral, ou numa célula normal. Nós desenvolvemos essa tecnologia e ela está disponível para câncer, por exemplo. São tecnologias que permitem analisar o DNA muito rapidamente, uma das ferramentas globais de que falei. Outra dessas ferramentas vai per-
GENOMA H UMANO I
tindo na pesquisa fundamental, há ainda algumas áreas em que o dinheiro da indústria é benvindo para tornar as coisas mais fáceis.
• Qual sua posição frente ao problema das patentes?
-Sou contra patentear ESTs- aquela situação em que você seqüencia uma pequena parte de um fragmento de gene, e patenteia isto-, eu penso que isso é um terrível engano, espero que não se torne a prática. Deve-se permitir patentes de seqüências de genes completos, desde que se
conheça ao menos uma de suas funções biológicas, de tal maneira
mitir a rápida tipagem de genomas. Já estamos trabalhando com empresas para desenvolver uma nova tecnologia, baseada no uso de fibras óticas, para analisar marcadores genéticos milhares de vezes mais depressa do que fazemos hoje. Dessa maneira, podemos olhar grandes populações e correlacionar variações genéticas com a fisiologia, com as doenças preva-
''O que é interessante nos seres humanos
está codificado
que, se outro pesquisador descobrir uma função completamente diversa do mesmo gene, isto possa também ser patenteado. Hoje não é assim. Quem tem a patente de um gene tem direito sobre tudo o que for descoberto ligado àquele gene. A legislação de patentes vem dos séculos 18 e 19 - o que havia a ser patenteado eram máquinas.
em sistemas biológicos, nao em genes
isolados''
lentes, por exemplo. No projeto genoma, trata-se de descobrir todos os elementos que estão presentes no genoma humano. Não fazemos muitas perguntas neste projeto, simplesmente porque não queremos fazê-las. Quando nós tivermos essa enciclopédia com toda a informação, o resto da Biologia vai trabalhar por centenas e centenas de anos até descobrir cada detalhe contido neste "livro da vida". Não será o fim da Biologia, ao contrário; isto vai enriquecê-la enormemente.
• Esta nova ciência vai criar ou jd criou um novo cientista?
Houve uma arrogância por parte da academia, de que trabalhar com a indústria comprometia o cientista. Nunca me senti assim, e trabalhei com a indústria de biotecnolgia desde o fim dos anos 70. Agora as pessoas estão se apercebendo da utilidade de trabalhar com a indústria que, ao tornar disponíveis seus recursos e suas tecnologias, implementa o trabalho científico. É preciso tomar muito cuidado para que a obrigação do cientista de publicar seja garantida. Mas a interação entre indústria e academia vai se tornar mais e mais comum, e em escala cada vez maior. Apesar das enormes somas de dinheiro que o governo norte americano está inves-
2 dna arrays. A tecnologia mais conhecida resulta da associação entre a Affimetrix e Hewlett Packard - GeneChip ™.
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Não se pode olhar a Biologia como uma máquina. Compreen
der que a Biologia é informação permite pensar com mais precisão sobre a questão das patentes.
• Qual sua opinião sobre a estratégia anunciada por Craig Venter para seqüenciar o genoma humano? Qual o impacto dele sobre o projeto financiado por fondos federais?
- Embora as. pessoas estejam se perguntando sobre como este shot gurfl poderá funcionar, a proposta dele foi excelente, porque fez os laboratórios pensarem como as coisas poderiam ser feitas mais eficientemetne. Tudo o que nos empurre para a frente é bom. Quase certamente, a decisão de apressar o projeto genoma nunca teria sido tomada se Craig não tivesse anunciado que iria terminar em três anos. Competição é bom, para os dois lados. Se o projeto de Craig Venter e da Celera funcionar como eles dizem que vai funcionar, com os dados sendo publicados a cada quatro meses, então o projeto federal vai se beneficiar muito. Este primeiro esboço da seqüência do genoma humano que o National Imtitute of Health propôs é complementar ao que aCelera se propõe a fazer. É muito boa competição.
' Método em que se monta uma sequencia depois de "picar" o DNA em pedaços de cerca de 700 pares de bases. Para o caso de um genoma da complexidade e do tamanho do humano, poderá haver obstáculos de ordem técnica, relacionados com a falta de ferramentas computacionais eficazes para a montagem precisa e correta das leituras obtidas.
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GENOMA H UMANO I
• Em que linhas de pesquisa seu laboratório trabalha no momento?
-Além de termos nos comprometido a seqüenciar grande parte do cromossoma 14 do genoma humano, estamos também seqüenciando o genoma do rato. O interesse de seqüenciar e comparar genomas diferentes é que as regiões dos cromossomas que tem informação são conservadas. Quando você compara o rato com o homem, as regiões altamente conservadas em ambos indicam que há informação nelas. A análise comparativa aponta quais são as partes realmente interessantes do cromos-somo em ambas as espécies. Já se
mente cuidadosos por causa de todas as implicações éticas. Absolutamente não estamos fazendo isso agora. No futuro, acho que os cientistas trabalharão nisso, inicialmente para lidar com genes defeituosos, que vão curar famílias inteiras de determinadas doenças. Chegará um momento em que poderemos usar o mesmo procedimento para acentuar traços como inteligência, atração, estabilidade emocional e coisas como essas.
• O senhor acredita que o conhecimento pormenorizado do material genético nos dard todas as respostas a respeito da
condição humana?
sabe que as regiões que tem as informações mais importantes nos cromossomas mudam menos do que todas as outras regiões. A razão para isto é que elas não podem mudar porque se elas mudassem muito perderiam a habilidade de codificar aquela informação. De 70% a 80% dos genomas não estão envolvidos com estas funções mais importantes, e essas regiões podem mudar
''No princípio, havia muito ceticismo
em torno do projeto Genoma Humano.
- O projeto genoma nos dará a tabela periódica da vida, todos os genes definidos, as regiões regulatórias, mutações, polimorfismos, e o que eles causam. O que o projeto genoma não vai nos contar é como estes 100 mil genes trabalham juntos para formar organismos humanos. Este será um passo gigantesco - partir da informação
Biologia sempre tinha sido sma/1 science ''
rapidamente, o que não afeta o or-ganismo. Mas as partes que realmente codificam, uns 100 mil genes no caso dos seres humanos, se as compararmos entre as duas espécies, encontraremos tipicamente 70% delas similares entre si, enquanto se compararmos quaisquer duas regiões não relacionadas a genes encontraremos apenas 30% ou 40% de similaridade, ou ainda menos.
Uma área em que temos interesse especial é o estudo de stem cells4
• Queremos entender como estas células "avós" atuam para diferenciar-se nas células Te células B do sistema imune, usando chips de DNA para estudá-las precocemente e descobrir quais são as moléculas importantes e o que elas fazem. Também estamos interessados em saber como fabricar stem cells. Elas podem vir a ser muito úteis: pode-se transplantá-las para pessoas que foram irradiadas porque têm câncer, e também se pode usá-las em alguém que tem um defeito genético. Se você colocar um gene "bom" em suas stem cells, e devolver a célula para a pessoa, o defeito genético estará reparado. Há todo um novo tipo de engenharia genética, no qual vai se modificar o ovo fertilizado - uma germline engineering. Se você realiza essas modificações, elas se tornarão parte permanente do genoma humano. Isto é alguma coisa sobre a qual devemos ser extrema-
• stem ce/Is, as células mais primordiais de uma linhagem, as que dão origem a outras, mais diferenciadas.
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do genoma para a informação do sistema do organismo humano.
Entender os problemas realmente mais difíceis, como consciência, rememoração, funções cerebrais mais fundamentais, isto pode levar ainda centenas de anos. De fato , há uma tendência a glamurizar e dizer que o genoma vai conter todas as resposstas. O genoma é o melhor dos começos para o entendimento da complexidade humana.
• Do ponto de vista de sua carreira científica, o que significa para o senhor viver neste momento de transformação?
-O que há de mais interessante na minha carreira é que eu ajudei essa revolução a acontecer. Participei criando instrumentos para que isso pudesse acontecer, e também informando as pessoas, ajudando a persuadir o Congresso. No princípio, havia muito ceticismo em torno do projeto Genoma Humano. Biologia, até ali, não era big science. Biologia sempre tinha sido small science. As pessoas não suportam mudanças, porque mudanças ameaçam. Por essa razão tão simples é que o projeto enfrentou tanta resistência e ceticismo no começo. Agora, estou interessado em dar impulso a idéias que tenham a ver com sistemas biológicos, porque esta é a fronteira para o século 21.
• Na sua opinião, como deve ser conduzida a discussão sobre os problemas éticos levantados pelo projeto genoma?
- A sociedade é que deve decidir sobre eles, não os cien-
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tistas individualmente. As questões devem ser resolvidas racionalmente, e terão a ver com privacidade genética, com o fato de que nós poderemos saber se alguém vai ou não manifestar determinada doença hereditária. Uma questão é que quase certamente genes determinam certos aspectos do comportamento; neste caso, quais os limites para o livre arbítrio e para as responsabilidades individuais? Qual a natureza da nossa responsabilidade? Há tantas questões fascinantes e, para cada uma delas, temos que pensar qual a melhor maneira de lidarmos com elas. Há quem diga que o melhor a fazer para lidar com esses problemas é parar a ciência. Mas, se fizermos assim, tal-vez não nos tornemos capazes de
G E NOMA H UMANO I
nas estrelas, e agora percebemos que nosso destino está em nossos genes. Isto é especialmente verdadeiro se pensarmos da seguinte maneira: há algumas características que são quase inteiramente genéticas. Mas há uma característica que não funciona assim. Se você toma dois gêmeos idênticos, e tira as impressões digitais dos indicadores deles, vai ver que são inteiramente diferentes- e eles têm precisamente os mesmos genes. Isto significa que, neste caso particular, o ambiente é o maior determinante desse padrão. Então, para cada uma das características, você terá que perguntar: ela é genética? Ou ela é principalmente ambien-
tal, ou está entre ambas? A triste verdade é que não temos as ferra
livrar de 3% a 4 % de nossa população da cadeia, porque há prisioneiros com defeitos que nós poderemos descobrir como reverter. A humanidade tem a responsabilidade fundamental de fazer isso. Ao fazê-lo, vamos levantar todos esses novos desafios éticos, legais, sociais. Temos que ter maturidade para lidar com eles. A chave é dar para nossas crianças uma educação
''Temos que educar as cnanças para
que elas percebam que a ciência
mentas para decidir em que extensão cada traço é determinado geneticamente, ou pelo meio ambiente. No caso de uma coisa como a felicidade, acredito que o fator ambiental é muito preponderante.
é o caminho para • O senhor parece otimista em relação ao futuro ...
a I i berdade ''
apropriada, para que elas possam pensar analiticamente e ter suficiente conhecimento para não se assustarem com a ciência. A ciência é alguma coisa que não se entende bem, muito do que é feito é visto como mau. Nós temos que educar as crianças para que elas percebam que a ciência é o caminho para a liberdade. É o caminho para que as pessoas possam ser o que elas são, e escaparem de viver aprisionadas pelos seus genes, com doenças mentais, ou com diabete, ou com outras doenças. Nós usamos, aqui, bastante tempo com o programa de educação de ciência dos alunos do ensino médio. Ensinamos os estudantes a seqüenciar DNA. Ao mesmo tempo, propomos "cenários". Um grupo de quatro estudantes age como se fosse uma família com doença de Huntington. Damos a eles diagnósticos hipotéticos, caso eles tenham ou não o gene defeituoso. Ensinamos como pensar eticamente sobre o assunto. Assim, quando eles terminam de seqüenciar, entendem os desafios da Biologia e as oportunidades que a Biologia dá. Os jovens gostam bastante.
• O senhor acredita que o conhecimento de .fronteira em biologia molecular vai ser capaz de responder a questões como o que é a felicidade, ou explicar porque razão Brahms compôs tão bem, coisas assim?
-A resposta, provavelmente, é não, mas deixe eu responder usando um raciocínio de James Watson. Ele disse que nós nos acostumamos a pensar que nosso destino estava
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- Sou otimista, e é preciso ser muito determinado para ser e per
manecer otimista. Fui criado numa pequena cidade do estado de Montana, numa escola de apenas 140 alunos. Então, o que podia faltar de instrumentos e sofisticação, sobrava em atenção, se você fosse um bom aluno. Ao mesmo tempo, eu era olhado com atenção pelos professores, e tratado como um igual. Isto traz muita autoconfiança. Então, quando ":ocê sai para o mundo, mesmo que não tenha todas as ferramentas, sente-se capaz de fazer qualquer coisa que você queira. Há muitas pessoas que não conseguem fazer o que desejam só porque não acreditam que vão conseguir chegar onde querem. Penso que fui afortunado de viver no exato momento da história em que uma pessoa com os meus talentos é útil. Meu talento é principalmente reunir pessoas, gente muita diferente entre si. No novo instituto que estamos criando, metade das pessoas vão ser matemáticos, e físicos e cientistas da computação e químicos - não biólogos. Nós precisamos de todas essas ferramentas juntas, e um dos desafios vai ser quebrar a barreira das linguagens diferentes com que cada um desses cientistas olha o mundo. É como falar com o público leigo: há cientistas que estão tão presos no jargão de suas especialidades que não sabem falar em linguagem simples para os não cientistas. Isto também é verdade entre biólogos e matemáticos. Não podemos sequer usar as mesmas palavras, porque palavras iguais podem significar coisas diferentes para um matemático e para um biólogo. Superar essa barreira vai ser excitante.
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GENOMA HUMANO I
A protnessa de seqüenciar o genotna até o ano 2000
E ntre os cientistas do mundo da genômica, Craig Venter é dos mais
famosos - pela importância de suas contribuições técnicas, e pelo fato de ter anunciado, em maio de 98, a criação de uma nova empresa que, por US$ 200 milhões, e em três anos, realizaria o seqüenciamento completo do genoma humano. A Celera, situada em Rockville, Maryland, resultou de sua associação com a Perkin Elmer, uma das duas principais fabricantes de seqüenciadores automáticos; e o anúncio de seu objetivo quase paralisou o projeto Genoma Humano, que havia custado, até ali, quase US$ 1 bilhão, e prometia a seqüência completa apenas para 2005. Mas os participantes do projeto financiado com verbas públicas reorganizaram-se; e o resultado da formação da nova companhia foi um encurtamento geral de prazos. Agora, ambos os times - o público e o de Craig - pretendem alcançar suas metas dentro de aproximadamente um ano. Na entrevista, realizada em março último, o doutor Venter compara seu trabalho ao do grupo que seqüenciou o genoma da C. elegans. Suas observações, e sua personalidade, poderão ser melhor apreciadas quando cotejadas às palavras de Robert Waterston, um dos coordenadores do grupo, que serão publicadas no encarte de agosto.
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Craig Venter
• Muita gente com quem conversei sobre o senhor, nos Estados Unidos e no Brasil, expressam ceticismo e dúvida sobre o anúncio de seu projeto de seqüenciar o genoma humano dentro de 18 meses. Eles têm razão?
- Para entender a questão, é necessário que se compreenda a tecnologia, e mesmo cientistas da área não entendem os novos passos da tecnologia. Quando Hamilton Smith e eu decidimos seqüenciar o
primeiro genoma da história, em 94, e pedimos ao NIH para financiar o projeto, houve esse mesmo ceticismo.Os assessores que analisaram a proposta disseram que seria impossível, que nunca poderia ser feito, que não se conseguiria montar, que os dados não seriam acurados - enfim, que ia ser terrível. No entanto, em 1995, nós publicamos o primeiro genoma na história, e foi a seqüência mais acurada e precisa jamais publicada. Todas as proteínas foram re-seqüenciadas pela indústria farmacêutica, e é notável a precisão que obtivemos. O método que desenvolvemos ali é o método que vamos usar para fazer o genoma humano. A TIGR seqüenciou até agora 1 O genomas completos, incluindo os mais relevantes para a saúde mundial: tuberculose, cólera, malária, sífilis, doença de Lyme, tudo isso foi realizado com o método que desenvolvemos para o Haemophilus influenzae, aquele mesmo que diziam que não ia funcionar, que era impossível. Há dúzias de genomas completamente seqüenciados agora, o que as pessoas imaginavam que não seria feito nem nas próximas décadas; tudo por causa da tecnologia que eles disseram que não ia funcionar.
O genoma da C. elegans acaba de ser publicado\ e não se pode dizer que seja muito completo, ou muito preciso. Custou dez anos, centenas de milhões de dólares, e envolveu centenas e centenas e centenas de cien-
' A sequência completa do genoma da Caenorhabditis elegans (com cerca de I 00 "gaps"), a primeira de um animal, foi publicada em dezembro de
98 pela revista Science (colocar referência?). Os dois principais pesquisadores envolvidos no trabalho são John Sulston, do Sanger Center, Inglaterra; e Robert Waterston, da Washington University, que gentilmente nos recebeu
para uma entrevista, cuja integra sera publicada no próximo Encarte.
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tistas. Pois nós vamos agora fazer a Drosophila em alguma coisa entre três e seis meses, e o seu genoma é maior do que o da C. elegans. Vamos fazer com mais precisão e mais completo. Há três mudanças que nos permitem cumprir esta meta. A primeira é o novo seqüenciador2. Por exemplo: a Tigr está seqüenciando o primeiro cromossoma de planta, o cromossoma 2 da Arabidopsis thaliana. Duas semanas atrás, decidimos ajudar com os novos seqüenciadores da Celera. Pois nas duas semanas, fizemos 25% do que a TIGR havia feito antes, e com a mesma precisão de qualquer outro genoma já sequenciado pela TIGR. Agora nós vamos para a Droso-
GENOMA HUMANO I
ganismo. Por exemplo: quando começamos o genoma do Plasmodium folciparum, todos os pesquisadores em malária disseram que seria impossível de fazer por causa da percentagem muito alta de adeninas e timinas e que não se conseguiria sequer clonar o material. Como você sabe, publicamos no ano passado o primeiro cromossoma de malária da história. De fato, saiu mais fácil do que muitos outros genomas de bactérias. Não posso dizer que não há mais nada impossível, porque pode haver ainda alguns problemas. Mas o genoma humano é muito mais simples do que o da malária
como código genético, então, nós não estamos mesmo preocu
phila e o homem. A outra peçachave disso são os computadores. A Celera já tem o maior centro computacional de Maryland. Quer dizer: temos mais "potência de computadores" do que todo o NIH. Vamos gerar na Celera uma quantidade de dados a cada 30 dias que corresponderá a tudo o que foi seqüenciado até hoje e é de domínio público.
'' Se não houver pados. Haverá áreas muito difíceis, que são difíceis para qualquer um dos métodos utilizados. O método tradicional em uso, que gasta muito dinheiro, não torna essas regiões mais fáceis. A C.elegans provou isto, foi feito no método tradicional, e há milhares de buracos. Então, isto não tem a ver com o método pro-
a patente de genes, novas drogas não poderão ser
desenvolvidas. E isto é funda menta I mente
imoral''
Grosso modo, há 2 bilhões de le-tras de código genético no GeneBank; nós temos que gerar 30 bilhões para o homem apenas nos próximos dezoito meses. Por isso, precisamos dessa massa em computadores. Cinco anos atrás, não havia sequer computadores capazes de fazer isso. O terceiro componente são os novos algorítmos que nós desenvolvemos. Por que a TIGR foi capaz de fazer o primeiro genoma? Por causa dos algorítmos de montagem dos dados no computador. Nós temos os maiores especialistas do mundo na arte da montagem. Agora eles expandiram 100 vezes os programas da TIGR para o genoma humano na Celera. O fato é que nós temos todos os componentes necessários para fazer a proposta funcionar, e todos os testes feitos até agora mostram que o resultado vai ser muito acurado, muito completo. Mas como isto nunca foi feito antes, presume-se então que não pode ser feito. Ok.. Vamos mostrar que pode ser feito, nós já temos essa experiência e estamos extremamente confiantes de que o faremos até mesmo antes do que havíamos previsto.
• O senhor acha que a precisão é fUndamental?
- Bem, o código genético varia de organismo para or-
2 os mesmos referidos por Leroy Hood.
NOTÍCIAS FAPESP
priamente, é verdade que eles não tinham um bom mapa, mas
o problema tem a ver com a falta de uma técnica melhor para seqüenciar essas regiões. Há regiões assim em qualquer genoma, todo mundo está usando o método de Sanger, se você não chega a uma região, tanto faz se você tem máquinas grandes ou pequenas, isto não muda. Daí porque, quando anunciamos o projeto, nós dissemos que haveria pequenos buracos - tentávamos ser bastante ·honestos a respeito disto. Na C. elegans, eles tentaram fingir que não havia buracos, e na verdade há milhares ...
• O senhor tem dito que seu projeto é complementar ao projeto de financiamento público. Como assim?
- É que como todo o genoma vai estar sendo seqüenciado ao mesmo tempo, qualquer dado gerado em outro centro poderá ser útil para nós. Nós não precisamos desses dados, não estamos confiando neles. Pensamos, aliás, que é um enorme desperdício de fundos públicos. Existem literalmente bilhões de dólares sendo gastos entre os Estados Unidos e a Inglaterra nos próximos anos, apenas para duplicar o que a Celera está fazendo e vai dar ao mundo de graça. Eu pretendo utilizar só a parte boa dos dados, há dados que não são efetivamente bons; pretendemos utilizar a parte boa para fazer nosso projeto ir ainda mais rápido. Assim, quanto mais eles fizerem, é como se fosse uma onda e um bote, eles nos em-
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GENOMA H UMANO I
purram, mas não podem nos alcançar, apenas nos empurram mais depressa.
• O seu movimento para a formação da Celera fiz o governo dos EUA gastar ainda mais ...
- Isso não foi o ideal, eles de fato aumentaram o dinheiro, mas às custas do programa de pesquisa em câncer. O orçamento de ciência na Grã-Bretanha de fato está sofrendo por causa do dinheiro gasto para duplicar a seqüência que nós vamos gerar e oferecer aos bancos públicos de dados. Penso que é mais uma questão do ego de al-
ver casos, como o da insulina, em que se veja com clareza uma droga capaz de tornar-se um medicamento de alto impacto. A Celera vai pedir menos patentes do que o NIH. Patentes não são uma peça-chave no plano de negócios da Celera. Poderíamos não patentear nada; mas há a responsabilidade social de patentear novos genes muito relevantes, que podem resultar em tratamento de câncer ou de outras doenças. Se não houver a patente, a droga não poderá ser desenvolvida e isto, do meu ponto de vista, é fundamentalmente imoral.
• O Brasil tem, neste momento, digumas das agências financiadoras e do Wellcome Trust, eles querem investir seu dinheiro em alguma coisa que seja visível em vez de realmente financiar mais ciência.
• Como vai a discussão sobre patentes?
''Quero destacar que ainda não
entendemos como 300 genes trabalham
em uma única célula''
versos projetas genoma em curso. Que lugar pode caber a um país subdesenvolvido no contexto da genômica?
Penso ser crucial que eles tenham um programa de genômica, porque assim estarão na melhor posição para usar as seqüencias geradas pela Celera e por outros, porque obter as se-
-Meu entendimento é de que haverá patentes sobre alguns ge-nes importantes, e para alguns genes é extremamente importante que a patente exista. Deixe-me lembrar o exemplo da insulina. Os diabéticos tiveram um problema no passado, porque a insulina foi isolada do pâncreas dos porcos. Depois, eles passaram a dar insulina de pâncreas de pombo, e eles desenvolveram anticorpos. A resistência ficou maior e as pessoas morriam muito cedo se tinham anticorpos para insulina, porque não havia outro tratamento. Então, quando pesquisadores conseguiram clonar o gene da insulina humana, eles tiveram a patente e puderam fazer uma célula produzir a insulina humana. Isso salvou milhares de vidas em todo o mundo. É um caso que mostra que, se não houvesse a patente, não haveria a droga. Dá-se o mesmo com outras drogas, como as que beneficiam os doentes dos rins que estão em diálise e submetidos a quimioterapia. São drogas dirigidas, que vieram dos genes; se os genes não estivessem protegidos por patente, não haveria a droga. Quer dizer: se não há patentes, todos sofreremos porque não haverá drogas para tratar nossas doenças. Por outro lado, há aqueles que querem patentear tudo. Eles querem depositar dezenas, centenas de patentes onde não têm a menor pista de uma droga, e isso está errado. Assim, se você ler o nosso anúncio cuidadosamente, de 80 mil genes humanos (e nós teremos todos eles em nosso banco de dados), dizemos que talvez patenteemos de 100 a 3.000, se hou-
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qüencias é apenas o primeiro passo. Há quem pense que isto é o
fim das coisas, o que os leva a gastar um monte de dinheiro do governo no que é apenas o começo para o entendimento da biologia humana e das doenças humanas. Por isso, o que de mais importante um país pode fazer é desenvolver sólidos programas científicos para tentar entender o câncer, para tentar entender as doenças que afetam sua população.
Nós apoi;mos com firmeza a expansão de projetas assim.
• A midia fala sobre genômica e biologia molecular como uma espécie de caminho para a imortalidade. O que o senhor pensa sobre isto?
-Tenho certeza de que muitos cientistas vêem assim, por razões diversas. Sabemos muito pouco sobre a biologia humana e sobre o genoma humano, e estou absolutamente certo que as seqüências que vou gerar nos próximos 18 meses ainda estarão em estudo no final do século que vem. Novas descobertas serão feitas sobre a biologia humana. Em suma, penso que estamos bem no começo do caminho até a imortalidade, e não sabemos bem se isto será produtivo para o mundo. Se você puder melhorar a qualidade de vida em uma vida de duração normal, isso já será um objetivo muito valioso. Não estou certo se prolongar ou dobrar a duração da vida é a melhor coisa para este planeta.
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• O senhor acredita que a genômica poderá responder à pergunta: por que Brahms compunha tão bem? Ou decifrar o sofrimento humano?
-Vou fazer uma analogia. Nós estamos tentando caracterizar o genoma mínimo de uma pequena bactéria que a equipe da doutora Fraser seqüenciou, o Mycoplasma genitalium. Há somente 300 genes que são essenciais para a vida, de acordo com o que pensamos no momento; deles, 100 são completamente novos para a ciência, não sabemos o que eles fazem. O que quero destacar é que ainda não entendemos como 300 genes trabalham em uma
GE N O M A H U M ANO I
Estamos eliminando genes entre os 300 de seu genoma para ver os que não são essenciais à vida, e entender qual é esse conjunto mínimo. Note-se que crescemos o organismo no laboratório, o que é muito diferente do que é necessário no ambiente. O próximo passo será tentar sintetizar o cromossoma com apenas esses genes mínimos. Decidimos parar aí, e começamos uma discussão ética com um grupo de líderes religiosos, cientistas e gente comum na Universidade da Pensilvânia, para ver se é apropriado ir em frente e sintetizar a vida.
única célula; se não entendemos ainda isto, como vamos entender 80 mil genes trabalhando juntos, em dez trilhões de diferentes células e em diferentes combinações, que é o que nos forma? Isto está muito além da compreensão científica para os próximos séculos. Nós vamos precisar de muita inovação tecnológica para chegar até lá. Obviamente, há uma base ge-
''O código genético nos dá potenciais
para a vida.
Por isso a TIGR parou, nós não continuaremos os experimentos enquanto a discussão estiver em curso. Vamos publicar um artigo para descrever o trabalho num futuro próximo; depois da discussão pública, decidiremos o que fazer. Não há determinismo
que diga que serei um bom cientista''
• O senhor acha que merece ganhar um Prêmio Nobel?
nética para a personalidade, e há bases genéticas para a memória e para o pensar, mas ainda não temos como medí-los. Por que pais famosos nem sempre têm filhos famosos? A realidade da vida nos afeta a todos. Nós nunca poderemos predizer se alguém virá a ser um notório cientista, ou um bom compositor; isso está baseado também no ambiente onde vivemos ou crescemos e trabalhamos e todas as oportunidades que temos. Tome-se o caso dos gêmeos idênticos, com o mesmo código genético: algumas vezes, eles crescem com personalidades muito diferentes, vidas muito diferentes. Isso depende de quanto você enfatizar o que têm de diferenças entre si, e o que têm em comum. Se você vê gêmeos vestidos iguais, tende a ver o que têm em comum; mas se eles crescem separadamente, vão construir vidas diversas entre si. O que o código genético nos dá são potenciais para a vida; não há determinismo genético que diga que você vai ser boa jornalista e eu, um bom cientista. No período de evolução, esses trabalhos sequer existiam, de forma que não há maneira de haver um componente genético para sua determinação. Poderá determinar uma certa quantidade de inteligência e uma habilidade para lidar com o ambiente, no máximo.
• O entendimento da evolução também está fortemente relacionado à genômica, não?
- Você tem razão. Veja o exemplo do M. genitalium.
NOTICIAS FAPESP
Tenho mais sobre o que pensar no momento. Estou saindo da
TIGR para formar a Celera e seqüenciar o genoma humano. Decidi que prefiro passar à história como o seqüenciador do genoma humano do que ganhar o Prêmio Nobel. Validação pública é sempre bom; se acontecer, muito bem, mas não é meu objetivo na vida.
• O senhor pensa que poderia ficar rico se a genômica não existisse? •
- Sou freqüentemente retratado como um milionário ocasional. Ficar rico não era meu objetivo. Não criei a TIGR ou a Celera com esse objetivo. Mas fica claro, com o caso da recusa do governo em financiar o H . injluenzae, que é preciso ter recursos próprios. Esta é a primeira razão para se montar uma companhia de biotecnologia. Por ter parte de uma companhia, ganhei alguns milhões de dólares. Agora, de novo, o governo diz que é impossível seqüenciar o genoma humano segundo minha proposta; e, felizmente, a Perkin Elmer está investindo centenas de milhões de dólares nisso, e tanto eu quanto a TIGR somos sócios da Celera. Você não precisa sofrer para ser cientista. O fato de trabalharmos às vezes 18 horas por dia mostra que somos dedicados ao que fazemos. Não há incompatibilidade entre a dedicação e ter dinheiro que me permita sair velejando e descansar minhas células cerebrais. É uma questão de motivação.
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GEN OM A H UMANO I
Os com.putadores estão revolucionando a Biologia
Phil Green, matemático, 48 anos, trabalha em Seattle, na Universidade
de Washington, como Leroy Hood; e é o nome mais importante entre os pesquisadores de bioinformática - a nova especialidade inerente à transformação da Biologia numa ciência que lida com grandes quantidades de dados, produzidos em massa por seqüenciadores automáticos de grande capacidade. Doutor Green e seus colaboradores criaram a maior parte das ferramentas em uso nos programas genoma. Das soluções que conseguirem encontrar, daqui para a frente, para tornar automáticas mais e mais tarefas típicas do seqüenciamento de moléculas de DNA, depende a rapidez com que os resultados serão alcançados e sua precisão. A profundidade da nova ligação entre as ciências da computação e a Biologia, e a forma pela qual ela se dá, são o assunto da conversa com o professor norte-americano.
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Phil Green
• Um dos desafios da biologia molecular contemporânea é ligar duas linguagens - a da biologia e a das ciências da computação. O senhor pensa que este é realmente um dos problemas importantes da área?
- Sim. Vou exemplificar com o meu caso. Fui treinado como matemático, mas desde a escola secundária me interesso por genética- um dos aspectos mais matemáticos da Biologia. O que está acontecendo
agora na Biologia é que ela está se tornando um disciplina mais quantitativa, como a Química e a Física. Esta tendência já se delineava há algum tempo, mas acelerouse bastante nos últimos dez anos, quando seqüenciar o DNA tornou-se mais e mais importante. Muito mais informação biológica tem sido gerada, e de muitos tipos. Um novo problema emergiu: como analisar os dados, qual o método quantitativo adequado para fazê-lo. Se olharmos para o futuro desde esse ponto de vista, nós estamos no começo do caminho que vai tornar a Biologia, de fato, uma ciência quantitativa. Nos projetas genoma, tentamos identificar diferentes componentes moleculares presentes nas células - as proteínas em particular. Quando dispúsermos dessa lista de componentes, então o desafio - aliás, muito maior do que o desafio de seqüenciar o DNA- será entender como esses componentes interagem entre si para fazer um organismo. Para isso, será preciso usar não só as idéias da ciência da computação, mas modelamento matemático, modelamento estatístico, e desenvolver métodos inteiramente novos para entender como funciona a interação entre as moléculas. Até agora, muitos biólogos chegavam à Biologia porque queriam ser cientistas, mas sentiam-se um tanto desconfortáveis com os métodos quantitativos. A Biologia foi o campo ideal para alguém que não queria trabalhar com números ou computadores, mas agora, tudo mudou. É um dado cultural.
• Mas o senhor também não é um matemático no sentido clássico ...
- É verdade. Há uma transição a ser feita também para os matemáticos. Nós tendemos a idealizar os problemas
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GENOMA HUMANO I
e sua formulação. Mas quando mos. Penso que, de fato, os orgavocê começa a falar de dados reais, de organismos reais na natureza, moléculas reais, há toda uma série de complicações para as quais você realmente não foi treinado como matemático. É muito mais difícil do que eu pensava, para alguém que vem da matemática ou das ciências da computação, desenvolver uma compreensão de como os dados são coletados no
''A biologia foi nismos obedecem às leis da física e da química. Quando entendermos o que eles são nos termos dessas leis, chegaremos a entender, então, os sistemas complexos de moléculas. Como eles se organizam, quais seus componentes, que interações se dão - sempre haverá algum mistério nisto. Talvez a complexidade seja grande demais para ser entendida. Orga-
o campo ideal para alguém que
não queria trabalhar com números.
Agora, tudo mudou''
laboratório, para aprender como pensar os problemas biológicos que de fato importam, e dar espaço às imperfeições do mundo real. Não é fácil. Como se vê, há pontes culturais que devem ser atravessadas de ambos os lados.
• A especificidade e a abstração da linguagem da matemática e das ciências da computação não trazem riscos, quando aplicadas à Biologia?
-É difícil levar em conta todas as complexidades. Nós, da matemática e das ciências da computação, costumamos simplificar os problemas, tentando extrair aqueles que parecem ser os elementos-chaves, e com eles construir algorítmos e procedimentos para calcular. Quando se trata de organismos biólogicos, lidamos com sistemas extremamente complexos. Mesmo os biólogos têm que super-simplificar, têm que escolher um aspecto particular do organismo e pensar sobre ele numa forma simplificada, por causa da extrema complexidade. São bilhões de partículas interagindo entre si - a simplificação é necessária. O risco que o ponto de vista da matemática traz é a tentação de olhar para o organismo, para algum aspecto da seqüência, e tentar pensar sobre isso de uma maneira particular, que esteja relacionada com um problema matemático particular que já se conheça. Isto é muito perigoso porque não estamos estudando objetos; na Biologia, são realmente siste-
nismos vivos são sistemas complexos de moléculas, interagindo entre si, e que têm a possibilidade de fazer coisas surpreendentes, coisas maravilhosas. É preciso ser capaz de compreender os organismos nestes termos.
• Mas esses não são uma abordagem e um ponto de vista reducionistas?
- Esta é uma critica pertinente, e minha resposta é sim. Quando se trata de tentar entender qualquer sistema complexo, não é apenas uma questão de identificar o que são as partes. Há questões de mais alto nível, quando se deseja detalhar a operação do sistema. Certamente, interagimos com o meio ambiente. O ambiente é feito de moléculas, ele próprio um sistema complexo, nós somos um componente do complexo meio ambiente. Mas, ainda assim, continuamos a obedecer às leis da física e da química. Há um reducionismo extremo que pode ser criti.cado -a visão de que, para entender a natureza, basta saber quais são suas partes. Para entender qualquer aspecto da natureza, é necessário entender quais as interações que ocorrem- interações governadas pelas leis da química e da física. O problema principal é o entendimento dos sistemas complexos. Nós podemos determinar quais são os componentes moleculares de um sistema, mas é muito mais difícil entender como es-
ses componentes interagem com mas complexos, que têm muitos aspectos que nós não suspeitamos; é preciso, portanto, manter-se de mente aberta para eles.
'' Sempre haverá algum mistério
o sistema de moléculas. Apesar das dificuldades, acredito que seremos capazes de fazê-lo no futuro.
• Como o senhor se sente como o criador das ferramentas mais largamente usadas nos projetos genoma?
• O senhor pensa que, a partir desses esforços, vai ser possível responder à questão: o que é a vida?
-Sim, acho que, em determinado momento, vamos ser capazes de entender o que são os organis-
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em como os sistemas biológicos se organizam.
A complexidade é grande demais''
Um pouco ambivalente. Quando comecei a me debruçar sobre esses assuntos, cinco ou seis anos atrás, eu realmente pensava
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que seria simples. Ingenuidade te aleatórias. Então, ao olhar a seminha. Também não via esse assunto como alguma coisa em que eu quisesse trabalhar a longo prazo, porque os problemas me pareciam técnicos: há pouca ou nenhuma biologia envolvida no desenvolvimento de novas ferramentas, por exemplo. Meu propósito ao escolher esse campo era o de gerar conhecimento biológico novo; estou muito mais inte-
'' Nos projetas genoma tentamos identificar
diferentes componentes moleculares presentes
nas células - as proteínas em particular''
qüência genômica de dois organismos diferentes, e tentar entender em que são similares e porque são diferentes, deve-se levar em conta essas diferenças aleatórias. Daí a necessidade da teoria das probabilidades. Então, o que tem sido feito é desenvolver modelos probabilísticos que prevejam como deve ser cada tipo particular de seqüência. Um exemplo: a par-
ressado no problema da interpre-tação das seqüências. Quer dizer: uma vez que tenhamos uma seqüência, tentar identificar nela detalhes biológicos importantes. Assim, ficar centrado no que tem relação com a montagem e com a determinação das bases me afasta, na verdade, desse meu interesse. Nosso software tem sido bem sucedido; há muitos grupos que dependem de nós para aperfeiçoá-los. Só vamos considerálo inteiramente bom quando estivermos num estágio em que não tenhamos mais que melhorá-lo em nada, porque ele vai lidar com todos os problemas automaticamente. Então, gosto de ver nossos softwares em uso, mas é um pouco frustrante que isso me tire do caminho onde estão os problemas mais interessantes.
• De que se trata, interpretar seqüências?
-Interpretar seqüências envolve problemas de mais longo prazo, e mais interessantes. É importante identificar genes, saber dizer onde começam, onde terminam, e identificar os diferentes sinais que estão associados com eles. Há muita gente trabalhando nisto. Mas, presumivelmente, há outro tipo de informação na seqüência, além dos genes. Esta é uma área interessante- identificar esses outros detalhes biológicos na seqüência - e pouco progresso tem sido feito nela. Para enfrentar a questão, é preciso buscar idéias da teoria das probabilidades e da estatística. É preciso desenvol-
te do gene que codifica a proteína tem certas tendências estatísticas que advêm simplesmente do fato de codificar a proteína. Além disso, há fatos estatísticos bastante interessantes, que são apenas parcialmente entendidos. Não sei se não estou ficando muito técnico ... O código genético que converte triplas de DNA em aminoácidos é degenerado- há vários codons diferentes para um dado aminoácido. O caso é que eles não são usados com igual freqüência em um dado organismo. Qualquer que seja o organismo que você estuda, se você toma um aminoácido particular que é codificado por mais de um codon, e conta quão freqüentemente cada um desses codons é usado, você encontrará que eles não são usados com a mesma freqüência. À5 vezes, há um grande viés nisso. É útil tentar criar modelos estatísticos para classificar determinada seqüência codificadora com o propósito de identificar genes e seqüências. Quando você conhece esses vieses, "viés de uso de codons sinônimos", é assim, que são chamados, então você pode elaporar um modelo estatístico e levá-lo em conta. É realmente muito interessante descobrir, do ponto de vista biológico, porque esses vieses ocorrem. Até agora, isto é entendido apenas parcialmente. Parece que alguns desses codons, em organismos primitivos, são traduzidos mais eficientemente que outros. Como a seqüência protéica é construída a partir do RNA mensageiro, alguns dos codons se reorganizam mais rapidamente
e codificam seu aminoácido com ver modelos probabilísticos para tentar entender as seqüências. Basicamente, a razão pela qual a teoria das probabilidades é necessária é que a seqüência de um genoma é produto de bilhões de anos de evolução, e a evolução tem um grande componente aleatório. Muitas das mudanças nas seqüências que ocorreram ao longo do tempo não têm nenhuma implicação funcional, elas são basicamen-
''É preciso desenvolver
modelos probabilísticos para tentar entender
mais rapidez e precisão. Parece, então, ter havido alguma seleção durante a evolução para favorecer certos codons. Mas há outros aspectos que não entendemos. Quando se começa a fazer análise estatística de seqüências genômicas, é excitante notar que você começa a notar padrões, aspectos não-aleatórios da seqüência. Então, a questão é: o que isto signifi-
as seqüências'' ca do ponto de vista biológico? Há
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muitas observações já feitas que não compreendemos. Novos experimentos devem ser tentados para esclarecer o assunto.
• O senhor publicou um paper em que afirma seu ceticismo em relaçao à estratégia proposto pela Celera e por Craig Venter para sequenciar o genoma humano. O senhor poderia nos folar disso?
'' Presumivelmente, há outro tipo de informação na
seqüência, além dos genes. Outros
detalhes biológicos''
relação ao cronograma do projeto Genoma Humano ...
- Também acho um desafio. O que me preocupa é que os prazos pressionam as pessoas a baixar o padrão de qualidade das seqüências. Acho que haverá pressão para que se gere menor quantidade de dados, um número menor de reads em cada região, para permitir que se avance mais rapida-
-A questão central são as repeti-ções, as seqüências repetidas do genoma humano. Na estratégia em uso atualmente, os grupos tomam clones de 150 mil pares de bases, quebram esses clones em pedaços, seqüenciam, e depois montam. Pois mesmo nessa escala, com clones desse tamanho, os grupos encontram problemas com as seqüências repetidas. Na maior parte das vezes, os programas de montagem conseguem lidar com os repeats; mas há casos realmente difíceis, especialmente quando você tem repetições relativamente longas, que ocorrem em vários lugares com seqüências quase idênticas. Isso quando você vê o problema em pequena escala, na escala desses clones de 150 mil pares de bases. Quando você aumenta a escala, o problema simplesmente cresce de magnitude. Quanto maior o pedaço de DNA, maior a probabilidade de você ter repetições nele. Portanto, eu sou cético: não é factível realizar a montagem na escala do genoma humano inteiro. Por outro lado, acho que aCelera na verdade não vai fazer a montagem de todo o genoma a partir dos seus próprios dados. Eles não precisam fazer isto, porque o projeto público está gerando dados que não são finalizados imediatamente, o que quer dizer que os dados parciais ficam disponíveis. O que aCelera fará, acho, é combinar os dados que eles vão obter com o shot-gun com os dados do projeto público. Isto vai permitir que aCelera localize as seqüências dentro do genoma e tornará o problema de montagem muito mais
mente. Se isto acontecer, não haverá dados suficientes para obter a seqüência toda corretamente. Talvez se conseguirmos automatizar a fase de finalização, possamos ajudar. Mas, com menos dados, é provável que haja regiões em que a seqüência não será precisa, pois a pressão vai desestimular as pessoas a buscar em mais dados. Então, o que me preocupa é que o produto, a seqüência final que vai emergir daqui a cinco anos, ou daqui a dois, no projeto da Celera, poderá conter muitos erros. Haverá regiões montadas de maneira errada; haverá outras regiões em que a montagem estará certa, mas com trechos errados na seqüência, o que pode comprometer o trabalho dos biólogos. Não é realista pensar que vamos obter seqüências perfeitas. O objetivo com o qual concordamos no Genoma Humano é de admitir um erro a cada 10 mil pares de bases. Quando os biólogos ouvem esse número, eles sentem que é excessivo. Para mim, não soa excessivo, porque o comprimento de uma região codificadora dentro de um gene é talvez mil ou mil e quinhentos pares de bases, o que garante que ap~nas uma minoria dos genes contenha erros em sua seqüência. Queremos que pelo menos as regiões codificadoras tenham alto grau de precisão, porque haverá um grande número de estudos biológicos das proteínas criadas por elas, e será necessário também comparar as seqüências codificadoras de proteínas entre diversos orgamsmos, para analisar aspectos relacionados à evolução.
Então, a precisão é necessária, quafácil. Ainda assim, é um grande desafio. Apesar de estarmos sempre tentando aperfeiçoar os softwares, mesmo assim, há regiões que são extremamente difíceis, há muitas seqüências repetidas e elas são muito similares umas às outras. Não haverá como realizar a finalização de forma completamente automática.
'' O que me preocupa é que os prazos
pressionam as pessoas a baixar o padrão
de qualidade
se sempre. Se viermos a admitir um erro a cada mil pares de bases, isto significa que praticamente todo gene terá pelo menos um erro. Uma parcela importante deles vai resultar em conclusões erradas a respeito do aminoácido codificado, o que é muito sério. Assim, um erro em 1 O mil bases é razoável. Seria possível aumentar a precisão, mas, então, o custo se tor-
das seqüências'' • Mas o senhor não está cético em naria talvez alto demais.
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GENOMA H UMANO I
O risco da confiança . , . excesstva nas lllaqutnas
No Programa Genoma Fapesp, quem fala em bioinformática, fala
nos dois "Joões", jovens livre-docentes do Instituto de Computação da Unicamp, e fundadores do laboratório que é um talismã da rede
• A ligação das metodologias em uso no seqüenciamento de genomas com a informática é muito grande. Gostaria que o senhor precisasse que contribuição as ciências da computação aportam à Biologia.
de seqüenciamento ONSA (do inglês, Organization João Carlos Setúbal
- Vou tentar sistematizar. A primeira coisa é o volume de dados. O volume de dados que está sendo gerado mundo afora pelos laboratórios de biologia molecular é inimagi-
for Nucleotide Sequencing and Analysis). João Carlos Setúbal é um dos dois "Joões"; e deve ao outro, João Meidanis, o encontro com a biologia computacional. Ex-paulistano (deixou a cidade em que nasceu há mais de 1 O anos), João Carlos, 42 anos, também é um ex-engenheiro mecânico que, ao escolher se doutorar nas ciências da computação, achou um caminho que o levou de volta ao interesse, presente desde a adolescência, pelo estudo dos organismos. Doutor Setúbal entregou-se com prazer a essa discussão sobre o impacto de sua especialidade no fazer científico contemporâneo; e usou, ao expor suas idéias, a precisão que é uma sua marca registrada. Sua reflexão complementa e enriquece os pontos de vista de Phil Green, expostos na entrevista anterior. Casado com "a linda Teca"- as aspas são do marido-, João é pai de Caio, Claudia e Tomás.
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navelmente grande. Também é inimaginável tratar esses dados sem o auxílio dos computadores. Nos tempos heróicos da biologia molecular, o número de seqüências era tão pequeno que Russell Doolitde podia pedir ao filho para ajudá-lo a datilografar as seqüências para ordená-las na parede. Hoje, isso é impossível. A quantidade de seqüências geradas no mundo é tão grande, que só com computadores você é capaz de lidar com ela. A segunda coisa é a capacidade de análise desse volume. Os computadores desempenham o papel fundamental de realizar tarefas de forma automática sobre esse grande volume de dados. De novo, podemos fazer uma analogia com a época pioneira: desde os primórdios, foi necessário pegar pedaços do DNA e juntálos para formár seqüências maiores. Isto era feito no olho: as pessoas escreviam as seqüências e começavam a tentar ajustar umas com as outras e montavam- era um processo manual, que foi completamente automatizado. Quase completamente: ainda é necessária a supervisão humana; você tem que ver se a montagem está boa. Mas, em grande medida, o processo foi automatizado. No projeto da Xylella, por exemplo: quem poderia ser capaz de olhar todos esses dois milhões de bases e confirmar se elas estariam corretamente montadas? A grande virtude do computador, desde que os programas sejam bons, é a capacidade de tomar conta muito bem, e velozmente, da parte mecânica, repetitiva. Aliás, isso acontece com qualquer máquina. O computador filtra, permite que a gente se concentre naquilo em que somos necessários.
• De que maneira a informática mudou o jeito pelo qual os biólogos aproximam-se de seu objeto de estudo?
Não sou a pessoa mais indicada para dar essa respos-
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ta, porque eu nunca tive uma prática de biologia que eu possa comparar com a prática atual. Mas posso generalizar a partir de experiências de outras áreas. O mais óbvio a falar, nesse caso, é que a pessoa passa a confiar mais nos resultados da máquina que na sua própria intuição, em sua própria experiência. Há um exemplo disto acontecendo agora na Xylella: surgiu a necessidade de fazermos uma certificação das montagens feitas pelos laboratórios. Quem faz a montagem é um programa, que às vezes não chega a uma conclusão, mas, sim, mostra uma ambigüidade. Para darmos conta do volume de trabalho, essa certificação pre-cisou ser automatizada. Estabe-
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aos biólogos formular perguntas antes jamais imaginadas, e essas perguntas e suas respostas estão sendo uma das principais alavancas do atual progresso da biologia molecular. O exemplo mais simples é o seguinte: um biólogo seqüencia um novo gene, mas não tem idéia de sua função. Aí, ele compara (por meio de um programa de computador) a seqüência do gene com as seqüências de outros genes armazenadas num banco de seqüências (isto é, armazenadas em computadores). Supondo que haja uma seqüência muito parecida depositada no banco, e que essa seqüência corresponda a um gene bem
estudado, o pesquisador terá, em questão de segundos, uma pista
lecemos alguns critérios, e foi possível criar um programa que automatizou a verificação desses critérios. Claro, o programa obedece a certas regras: o cosmídeo não pode apresentar posições não confirmadas em dupla fita, não pode ter discrepâncias de alta qualidade e assim por diante. O programa simplesmente verifica isso e devolve para você uma lista, que diz: este cosmídeo não está pron-
''A tendência de descrever o genoma e os mecanismos de geração
de proteínas como programas de computador
tem que ser brecada''
muito boa para a função do gene que ele seqüenciou. Antes dessa revolução ocorrer, o pesquisador poderia passar anos para conseguir essa pista. Esse exemplo é útil também para mostrar um dos principais desafios da biologia molecular atual: o de formular perguntas "certas". Com tantos dados acumulados, não tenho dúvidas de
to, porque tem tais pos1çoes com problemas. O que acontece normalmente é que a vasta maioria das posições problemáticas é resolvida através de novas experiências. Mas, algumas vezes, os responsáveis pelos laboratórios nos procuram e dizem: "olha aqui, apesar de o seu programa estar dizendo que há um problema, na verdade não há nenhum problema". Aí, olhamos juntos o cromatograma, vemos que de fato não há problema, e tudo se resolve. Só que, outras vezes, as coisas não são tão simples assim, nem tão objetivas ...
• Quer dizer: as ferramentas deixam pouco espaço para a subjetividade do pesquisador. ..
Exatamente. E isso representa uma perda. Diferentes pessoas, olhando o mesmo cromatograma, podem chegar a conclusões diferentes ... Quando eu vejo uma dúvida desse tipo, gostaria de ter o traquejo de conhecer os cromatogramas e falar para o pesquisador: "você tem razão, isso de fato comprova que o que o programa diz que é um problema não é de fato um problema". Mas eu não tenho esse traquejo. Imagino que biólogos também não tenham esse traquejo, porque está todo mundo confiando demais nessas ferramentas automatizadas, o que é inevitável: em qualquer domínio da informática, sempre vai haver essa dualidade. Por outro lado, é fundamental dizer também o seguinte: a informática está permitindo
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que existem muitas coisas a serem descobertas, desde que as pergun
tas certas sejam feitas. E a informática fornece as ferramentas para que essas perguntas possam ser respondidas.
• O senhor acha que a linguagem da informdtica impôs-se à Biologia, que ela conforma a Biologia às regras, modelos, métodos da computaçao?
- É que antes das abstrações da informática, vêm as abstrações que estão na cabeça dos biólogos. A informática só concretiza os modelos e as abstrações que os próprios biólogos julgam apropriados. Então, a pergunta deveria ser formulada primeiro em termos desses modelos dos biólogos. Por exemplo: a pesquisa atual em cima dos projetas genoma centra-se muito no conceito de gene. Naturalmente, vem a pergunta: o que é um gene? Se você pegar um livro-texto qualquer, vai ver: um gene é um pedaço de DNA que é constituído de uma parte central que codifica uma proteína; também tem um promotor, que permite o reconhecimento por parte da enzima que vai fazer a cópia daquele pedaço etc e tal. Mas quanto mais se conhece o DNA e o genoma, percebe-se que esse conceito talvez seja ultrapassado. O conceito de conjuntos de genes está ficando cada vez mais importante ... Então, o conceito de gene é um exemplo de modelo abstrato que os biólogos têm e que condiciona a forma pela qual eles fazem a pesquisa. A informática traduz as abstrações, os conceitos. Existem programas que acham genes. É claro
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GENOMA H U M ANO I
que esses programas embutem as regrinhas que os biólogos acham importantes para localizar genes. Se o conceito de gene mudar, é obvio que o programa também vai ter que mudar. Acho que sua pergunta pode ser vista da seguinte forma: será que, após a colocação dos modelos e das abstrações dos biólogos, de sua concretização através da informática, será que a própria informática não introduz algumas coisas que são próprias dela, e que acabam direcionando de alguma forma os resultados? Minha resposta é: sem sombra de dúvida. Mas, é difícil para eu diferenciar até onde vai o modelo dos biólogos, as abstrações deles, e onde começam a aparecer coisas que são inerentes à informática. Posso dizer que, para nós da informática, é muito fácil tratar o DNA como uma cadeia de caracteres. As cadeias de caracteres são objeto da informática. O risco é fazer abstrações sempre num determinado sentido. Existe uma tendência muito forte a encarar o DNA como uma seqüência de letras.
• E isto não induz a equívocos?
-O equívoco principal é se esquecer que o DNA é uma molécula de dupla fita. Me lembro de ter estado em conferências e ouvido os biólogos dizerem: "vocês, não-biólogos, ficam procurando padrões no DNA; de repente, descobrem que a molécula apresenta um padrão de determinado jeito, super interessante, e anunciam aquilo como uma grande descoberta, e quando você vai ver, o padrão que parecia tão interessante é mera conseqüência do fato de o DNA ter duas fitas enroladas em hélice, cada vez que ele dá uma volta, vai aparecer tal coisa". Quer dizer, não tinha nada de revolucionário, era óbvio que tinha de ser assim, visto que o DNA é uma molécula tridimensional enrolada. O fato de o DNA ser um código discreto de quatro letras casa-se maravilhosamente bem com os modelos, as idéias e os conceitos fundamentais da ciência da computação. A tendência, então, é descrever o genoma e os mecanismos de geração de proteínas como se fossem programas de computador, e esta é uma tendência que tem que ser brecada.
Existe uma distância bárbara entre uma coisa e outra. É uma comparação útil num primeiro instante, para o pessoal de computação entender a biologia, como funciona a replicação, esses conceitos. Mas essa metáfora tem um limite muito claro. A falta da consciência desse limite pode levar a trabalhos que acabam indo para o lado errado, porque estão entendendo o DNA de um jeito que ele não deve ser entendido. O lado mais errado para onde se pode ir é pensar que um organismo é determinado pelo seu DNA, da mesma forma que um computador é determinado pelos seus programas ou um disco é determinado pelas músicas que estão nele gravadas.
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• Pelo foto de simplificar demais?
- Exatamente.
• Há uma concepção dominante entre pesquisadores que vou resumir na fase: ''o destino de cada um é seu DNA ·: O senhor
concorda com isto?
-A ciência deveria ser uma maneira de adquirir conhecimento que, a certa altura, vai nos mostrar a vida como ela é - vida aí no sentido biólogico. Então, eu não sei, você não sabe, ninguém sabe hoje o quanto de nosso patrimônio genético determina aquilo que somos. Existem correntes ideológicas - algumas acham que somos vastamente determinados pelo nosso patrimônio genético; outras, acham que não ...
• O senhor acha que é ideólogico?
-Acho que tem muito de ideologia, neste momento. A pesquisa nesta área vai contribuir para lançar um pouco mais de luz sobre isso e, por conseguinte, tornar um pouco menos ideólogico esse debate.
• O ponto de vista hegemônico entre os cientistas envolvidos nessas áreas de pesquisaé o ponto de vista de que somos "vastamente" determinados pelos genes ...
-É verdade. Mas aí vem a ciência. Sabemos que a ciência é uma atividade humana determinada pelos valores de uma época, pela ideologia de uma época e assim por diante. Mas h~ um valor intrínseco na ciência: de alguma forma, com o passar dos anos, quando existe uma verdade natural, ela acaba emergindo, de um jeito ou de outro. A verdade pode ficar escondida durante um certo tempo, por causa da ideologia, por causa dos valores da época etc; mas tudo indica que a ciência, da forma que vem sendo exercida desde o século 17, acaba sendo imune a esse tipo de coisa. Pode levar um certo tempo mas a ciência acaba vencendo, por assim dizer. Assim, se houver uma verdade biológica de que nós somos determinados largamente pelo nosso patrimônio genético, então não vai haver como escapar disto. Ou o contrário: se, apesar de o establishment científico atual ser dominado por pessoas que acham que somos determinados pelo nosso patrimônio genético, a verdade for oposta a isso, num primeiro momento, talvez as conclusões levem a confirmar a ideologia do establishment cientifico; mas, mais cedo ou mais tarde, isso vai acabar caindo por terra. Se não cair, há algo de profundamente errado com a ciência, certo? E o consenso geral é que, por mais defeitos que a ciência tenha, ela acaba descobrindo as verdades.
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