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Num estudo semelhante, realizado

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Num estudo semelhante, realizadoem 1999com balõesque sobrevoaram osestados de Iowa e Texas(EUA)tentou-sefazer essa análise, mas sem sucesso, se-gundo o físico norte-americano RobertHolzworth, da UniversidadedeWashing-ton e um dos coordenadores do estudoatual, financiado pela FAPESP e pelaNational ScienceFoundation (NSF),dosEstados Unidos. "Os balões ficaram amais de 300 quilômetros dos sprites.A essadistânciaé impossívelfazerasme-dições que pretendemos realizar", co-menta Holzworth, que esteve no Rio deJaneiro no início de novembro duranteo 3° Workshop Brasileiro de Eletrici-dade Atmosférica (WAE), organiza-do pelo Grupo de Eletricidade Atmos-férica do Inpe.

Se tudo correr bem, os balões da-rão pistas para reforçar as teorias queprocuram explicar como os sprites seformam e permitirão descobrir se es-ses flashes de luz, que surgem duran-te grandes tempestades, têm caracte-rísticas diferentes nos trópicos, ondeocorrem 70% dos tem-porais. Atualmente, osestudos sobre esses efei-tos luminosos se concen-tram nos Estados Unidospor um motivo simples:nove de cada dez spritesaparecem sobre o terri-tório norte-americano,especificamente no cen-tro-oeste do país, embo-ra astronautas em ôni-bus espaciais tenhamdetectado essas descar-gas elétricas em outrasregiões do planeta - in-clusive perto de SantaMaria, no Rio Grandedo Sul, em 1994.

Aviões e mísseis - Além de trazeravanços teóricos, conhecer em detalheas características dessas descargas elé-tricas pode influenciar, no futuro, aaviação comercial caso os vôos hiper-sônicos se tornem realidade, segundoPinto Iúnior, Hoje os aviões civis via-jam a cerca de 10quilômetros de altitu-de e a 900 quilômetros por hora. Comaviõeshipersônicos, pretende-se atingirvelocidades dez vezes mais altas, mas,para isso as aeronaves teriam de voara 20 quilômetros do solo. Isso se tor-na importante, uma vez que observa-

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ções recentes, feitas com câmeras maissensíveis, indicam que os sprites ocor-rem também - com intensidade menor,é verdade - em camadas muito maisbaixas da atmosfera, a altitudes inferio-res a 30 quilômetros, pouco acima dastempestades. Segundo o pesquisador doInpe, o estudo do fenômeno despertaainda interesse militar, principalmen-te nos Estados Unidos, pois se acreditaque a radiação emitida pelos sprites sejasemelhante à de mísseis nucleares.

Previstos em 1925 pelo físico esco-cês Charles Rees Wilson (1869-1959),que recebeu o Nobel em físicaem 1927,

África Central,sul do Brasile Indonésia (empreto e vermelhoescuro) sãoas regiõesdo planeta commaior incidênciade raios, enquantoos oceanos sãoas menos atingidas(em azul-escuroe violeta)

Sorites, flashes de luzque se formam a maisde 50 quilômetros dosolo durante tempestades:origem incerta

esses fenômenos sãoconsiderados recentes: aequipe do pesquisadoraposentado IackWinklerfilmou um sprite pelaprimeira vez apenas em1988, durante uma noi-te sem luar no Estado deMinnesota (EUA). Pu-blicados no início dosanos 90, os primeiros ar-

tigos científicos ainda não ligavam es-ses fenômenos aos relâmpagos. Dessemodo, a variedade de formas e de es-truturas - colunas ou águas-vivas, queatingem até 30 quilômetros de altu-ra e 40 quilômetros de extensão - de-terminou a escolha de um nome semnenhuma associação física. Hoje já sesabe que os sprites geralmente apare-cem quando ocorre uma tempestade degrande porte, associados a relâmpa-gos que partem da nuvem para o solo.

Um dos modelos teóricos atuais su-gere que os sprites decorrem do campoelétrico gerado entre os dois pólos

que se formam dentro de uma nuvemde tempestade - o positivo, próximoao topo da nuvem, e o negativo, nabase - e a conseqüente ionização dacamada isolante, formada logo acimada nuvem. Quando ocorre um raiopositivo, esse pólo é temporariamen-te esvaziado e, como conseqüência, ascargas restantes geram um campo elé-trico na mesosfera - eis o sprite. Maspode não ser assim. Seo campo elétricosozinho não for capaz de gerar a ioni-zação e criar o fenômeno, ganha for- .ça o outro modelo, segundo o qual ocampo elétrico apenas aceleraria elé-trons oriundos dos raios cósmicos,que então ionizariam o meio e cria-riam o sprite. Caso os experimentoscom os balões detectem a emissão deraios X, ganhará força esta última hi-pótese, já que esses elétrons emitemessa forma de radiação quando frea-dos pela atmosfera.

Calor e poluição - O encontro no Riode Janeiro não se restringiu aos sprites.Cerca de 200 físicos e engenheirosdiscutiram ainda outro fenômenopara o qual não há respostas claras: aincidência de raios dez vezes maiorsobre os continentes do que sobre osoceanos, conforme os levantamentos

feitos nos últimos anos com auxílio dosatélite Tropical Rainfall MeasuringMission (TRMM), da Nasa, a agênciaespacial norte-americana. Há outra coi-sa intrigante: formam-se duas vezesmais raios sobre as cidades do quesobre as áreas desertas, de acordo comlevantamentos recentes realizados porcentros distintos, como o Inpe e a Uni-versidade do Texas.Duas hipóteses ten-tam explicar essasdiferenças: a poluiçãoou o perfil de temperatura e umidadeda atmosfera.

Embora não exista consen-so' os indícios sugerem quea maior umidade sobre osoceanos seja responsávelpela menor ocorrência de

raios, enquanto a maior capacidade deretenção de calor dos solos - principal-mente nos centros urbanos com maisde 100 mil habitantes, onde há concen-tração de asfalto e concreto - favorece-ria a formação de correntes de ar quen-te ascendentes, as termais, responsáveispor conduzir vapor d'água para a me-sosfera, onde se condensa em nuvenseletricamente carregadas sobre os con-tinentes, onde se originam os raios.

A equipe do Inpe, após cruzar asinformações dos satélites com dados de

sensores de raios instalados em solo,produziu o primeiro mapeamento ri-goroso de descargas elétricas que atin-gem o solo no Brasil. Esse novo mapa,segundo Pinto Iúnior, poderá substi-tuir o atualmente adotado pelas normasbrasileiras de proteção contra descargaselétricas (NBR5419),feito com precisãobem menor: um observador anotavasomente os trovões que ouvia duranteuma tempestade, o que não correspon-de ao número de raios que efetivamen-te caíam na região.

Apresentado pela primeira vez noevento do Rio, o novo mapa coloca oBrasilcomo um dos campeões mundiaisde ocorrência total de raios por ano. Cal-cula-se que entre 50 milhões e 70 mi-lhões de descargas elétricas atinjam opaís anualmente - o dobro do totaldetectado nos Estados Unidos, um paísde dimensões semelhantes. Mesmo nocômputo do número relativo de descar-gas elétricas por quilômetro quadradopor ano (raios/kmvano), o Brasil nãofica muito atrás dos campeões, as na-ções centro-africanas, muito menores,mas onde a taxa de raios que caem nosolo ultrapassa 20 raios/kmvano (vejamapa). Por aqui, esse índice atingeaté 16 raios/kmi/ano, o que não é nadabom, por causar prejuízos anuais deaté US$ 200 bilhões, além de 100 a150 mortes.

O trabalho traz outra novidade.Os mapas anteriores indicavam aAmazônia como a região do país ondeocorre a maior incidência de descar-gas elétricas por área durante o ano.Agora não mais. De acordo com onovo mapa, as áreas mais atingidassão o sul do Mato Grosso do Sul e aporção oeste do Rio Grande do Sul -com índices de 16 raios/kmi/ano. Jus-tamente para prevenir os danos causa-dos pelas descargas elétricas, a equipedo Inpe desenvolveu nos três últimosanos um detector de relâmpagos.Com o tamanho de uma caixa de 40centímetros, o equipamento, produzi-do e patenteado pela empresa Inde-leth, financiadora de parte da pesqui-sa, dispara um alarme sonoro e visualquando detecta tempestades distantesaté 60 km. Apresentado no encontrodo Rio, começa a ser vendido este mêspor R$ 1.500, metade do preço dosimportados. Instalado em parques eindústrias, poderá ajudar a salvar vi-das e reduzir acidentes. •

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