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NUTRIÇÃO E Ecologia Nutricional de CERVÍDEOS - AlexandreBerndt
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NUTRIO E ECOLOGIA NUTRICIONAL DE
CERVDEOS BRASILEIROS EM CATIVEIRO E NO
PARQUE NACIONAL DAS EMAS GOIS
ALEXANDRE BERNDT
Tese apresentada Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de So Paulo, para obteno do ttulo de Doutor em Ecologia de Agroecossistemas.
P I R A C I C A B A
Estado de So Paulo - Brasil
Junho - 2005
NUTRIO E ECOLOGIA NUTRICIONAL DE
CERVDEOS BRASILEIROS EM CATIVEIRO E NO
PARQUE NACIONAL DAS EMAS GOIS
ALEXANDRE BERNDT
Engenheiro Agrnomo
Orientador: Prof. Dr. DANTE PAZZANESE D. LANNA
Tese apresentada Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de So Paulo, para obteno do ttulo de Doutor em Ecologia de Agroecossistemas.
P I R A C I C A B A
Estado de So Paulo - Brasil
Junho - 2005
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) DIVISO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAO - ESALQ/USP
Berndt, Alexandre Nutrio e ecologia nutricional de cervdeos brasileiros em cativeiro e no
Parque Nacional das Emas Gois / Alexandre Berndt. - - Piracicaba, 2005. 80 p.
Tese (doutorado) - - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, 2005. Bibliografia.
1. Avaliao nutricional e animal 2. Comportamento animal 3. Composto aliftico 4. Comportamento animal 5. Digesto animal 6. Ecologia animal 7. Metabolismo animal 8. Parque nacional 9. Veado I. Ttulo
CDD 639.9797357
Permitida a cpia total ou parcial deste documento, desde que citada a fonte O autor
DEDICATRIA
s famlias Berndt e Montewka pelo apoio, amizade e amor:
Pedro (in memorian), Svetlana, Alexander, Cristina, Marcelo, Andr, Gabriela,
Michel e Ana Lcia;
Ricardo, Ftima, Andra e Ana Maria.
Em especial querida Adriana pelo amor presente em todos os momentos.
AGRADECIMENTOS
Universidade de So Paulo pela oportunidade de ingresso na primeira turma do
Programa de Ps-Graduao em Ecologia de Agroecossistemas PPGI-EA;
Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo FAPESP pela
concesso de bolsa de estudos e auxlio pesquisa;
Ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente IBAMA pelo interesse e aprovao
do projeto no Parque Nacional das Emas, GO;
Faculdade de Cincias Agrrias e Veterinrias FCAV/UNESP pela
oportunidade e apoio no experimento com cervdeos em cativeiro;
Aos doutores Dante Pazzanese Lanna, Jos Maurcio Barbanti Duarte, Marcelo
Zacharias Moreira e Dimas Estrsulas de Oliveira pela orientao;
Aos colegas do Laboratrio de Nutrio e Crescimento Animal LNCA pela
amizade e colaborao;
Aos tcnicos do IBAMA, IZ, FCAV e ESALQ pela ajuda na conduo dos
experimentos;
SUMRIO
Pgina RESUMO............................................................................................................... vii
SUMMARY........................................................................................................... ix
1 INTRODUO.................................................................................................. 1
2 REVISO DE LITERATURA........................................................................... 3
2.1 Cervdeos: aspectos gerais............................................................................... 3
2.2 Cervdeos brasileiros........................................................................................ 4
2.3 Parque Nacional das Emas............................................................................... 7
2.4 Ecologia nutricional......................................................................................... 8
2.5 Exigncias nutricionais e digestibilidade......................................................... 10
2.6 Tcnica da gua duplamente marcada............................................................. 11
2.7 Tcnica de istopos de carbono....................................................................... 14
2.8 Tcnica de n-alcanos........................................................................................ 16
3 DETERMINAO DA DEMANDA DE ENERGIA DO VEADO- CATINGUEIRO (MAZAMA GOUAZOUBIRA) EM CATIVEIRO ATRAVS DO MTODO DA GUA DUPLAMENTE MARCADA................................. 213.1 Introduo ....................................................................................................... 22
3.2 Material e Mtodos.......................................................................................... 24
3.3 Resultados e Discusso ................................................................................... 30
3.4 Concluses ...................................................................................................... 41
4 ECOLOGIA NUTRICIONAL DO VEADO-CAMPEIRO (OZOTOCEROS BEZOARTICUS) NO PARQUE NACIONAL DAS EMAS, GO....................... 43 4.1 Introduo ....................................................................................................... 45
4.2 Material e Mtodos.......................................................................................... 46
4.3 Resultados e Discusso ................................................................................... 49
4.4 Concluses ...................................................................................................... 67
5 CONCLUSES GERAIS .................................................................................. 69
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................. 71
vi
NUTRIO E ECOLOGIA NUTRICIONAL DE CERVDEOS BRASILEIROS
EM CATIVEIRO E NO PARQUE NACIONAL DAS EMAS GOIS
Autor: ALEXANDRE BERNDT
Orientador: Prof. Dr. DANTE PAZZANESE D. LANNA RESUMO
Existem poucas informaes sobre exigncias de energia de cervdeos
brasileiros, dificultando o sucesso de manejo e reproduo em cativeiro. O
conhecimento das exigncias de energia tambm importante para determinar os
recursos necessrios para sua conservao em parques e reservas. O primeiro
objetivo deste experimento foi estudar as exigncias nutricionais do veado
catingueiro (Mazama gouazoubira) em cativeiro. O segundo objetivo foi observar o
comportamento alimentar do veado-campeiro (Ozotoceros bezoarticus) no Parque
Nacional das Emas (PNE), descrevendo qualitativamente e quantitativamente as
principais espcies vegetais utilizadas para o aporte de nutrientes. A determinao
das exigncias de energia para mantena utilizou 8 veados-catingueiro de ambos os
sexos em cativeiro e foi desenvolvida atravs de dois mtodos: a)equilbrio de peso
e b)gua duplamente marcada (2H218). Os animais foram dosados com gua
duplamente marcada (111,8 mg/kgPV para 2H2O e 163,1 mg/kgPV para H218O) e
amostras de sangue foram coletadas em intervalos de 3 dias, at que 3 ou 4 meias
vidas dos istopos tenham decorrido (atingindo o limite de deteco em
aproximadamente 30 dias aps a dosificao). As curvas de desaparecimento dos
istopos em funo do tempo foram utilizadas para calcular o turnover de CO2 e
H2O. Os resultados obtidos pelos dois mtodos foram semelhantes (111,4 e 112,0
kcal/kg.75.d) comprovando que a tcnica da gua duplamente marcada pode ser
utilizada em estudos nutricionais de cervdeos. Informaes de doses (mg/kgPV) e
intervalo mximo entre aplicao e coleta de sangue (30 dias), permitem o uso desta
metodologia em estudos futuros em vida livre. No PNE, veados-campeiro j
monitorados com radio colares, permitiram a observao de seu comportamento
alimentar. O experimento foi realizado em duas pocas distintas (inverno e vero).
As espcies foram analisadas quanto composio nutricional, para estimar valores
energticos assim como consumo de minerais e protena. As contribuies das
diferentes espcies que compem a dieta dos cervdeos foram estimadas para duas
populaes em vida livre, uma com acesso apenas a espcies nativas (rea central do
parque) e outra com acesso s espcies cultivadas na periferia do PNE. Os sinais
isotpicos do carbono 13 e os perfis de n-alcanos foram utilizados para quantificar a
contribuio das diferentes espcies ingeridas. Os resultados indicaram que os
veados-campeiro utilizam uma ampla gama de partes e espcies vegetais. Sua dieta
composta por aproximadamente 78 tens, divididos em brotos (38,5%), folhas (15,4%),
flores (17,9%), botes florais (12,8%), frutos e sementes (15,4%); de 55 diferentes
espcies nativas e 7 culturas agrcolas. H grande diferena no padro de consumo entre
as populaes no interior do parque e aquelas que tem possibilidade de selecionar
plantas cultivadas pelo homem. As espcies agrcolas podem contribuir com at 46,9%
da dieta dos cervdeos da periferia do parque. Este trabalho determinou as exigncias de
energia de cervdeos brasileiros, validou o uso de uma tcnica indireta para futuros
estudos em vida livre e descreveu as espcies e partes utilizadas como aporte de
nutrientes por cervdeos em vida livre.
Palavras-chave: Exigncias Nutricionais; Cervdeos Brasileiros, Parque Nacional das
Emas, n- alcanos, gua Duplamente Marcada.
viii
NUTRITION AND NUTRITIONAL ECOLOGY OF BRAZILIAN CERVIDS
IN CAPTIVITY AND IN THE EMAS NATIONAL PARK - GOIAS
Author: ALEXANDRE BERNDT
Adviser: Prof. Dr. DANTE PAZZANESE D. LANNA
SUMMARY
There are limited data on energy requirements of brazilian cervids. Thus, it is
difficult to succeed in their management and reproduction in captivity. Knowing the
energy requirements is also important to determine the necessary nutritional
resources for their conservation in parks and reserves. The first objective was to
study the nutritional requirements of the grey-brocket deer (Mazama gouazoubira)
in captivity. The second objective was to observe the feeding behavior of the
pampas-deer (Ozotoceros bezoarticus) in the Emas National Park (ENP), describing
qualitatively and quantitatively the main vegetal species used to supply these
animals with nutrients. The determination of energy requirements for maintenance
used 8 gray-brocket deer of both sexes in captivity and was carried through two
methods: a)weight equilibrium and b)double-labeled water (2H218O). The animals
were dosed with double-labeled water (111.8 mg/kgBW for 2H2O and 163.1
mg/kgBW for H218O) and blood samples were collected with 3 days interval, until 3
or 4 half lives of isotopes had occurred (reached limit of detection at approximately
30 days after the dosage). The curves of isotopes disappearance as a function of time
were used to calculate the turnover of CO2 and H2O. The results obtained from the
two methods were similar (111.4 and 112.0 kcal/kg.75.d) proving the double-labeled
water technique may be used in nutritional studies of cervids. Information on doses
(mg/kgBW) and maximum interval between injection and blood collection (30days),
allow the use of this methodology in future studies with free ranging deer. In the
national park, pampas-deer already monitored with radio colars, facilitated the
observation of their feeding behavior. The experiment was conducted at two distinct
seasons (winter and summer). The species were analyzed for the nutritional
composition, to estimate energy values as well as mineral and protein consumption.
The contributions of the different species to the diet of the cervids were estimated
for two free ranging populations of the national park, one with access only to native
species (central area of the park) and another with access to the crop species
cultivated in the periphery of the park. The isotopic signals of carbon 13 and profiles
of n-alkanes were used to quantify the contribution of different species to supply the
energy demands. The results indicated that pampas-deer feeds on a broad spectrum
parts and vegetal species. Its diet was composed of approximately 78 different parts,
divided in sprouts (38.5%), leaves (15.4%), flowers (17.9%), floral buttons (12.8%),
fruits and seeds (15.4%); from 55 different native species and 7 agricultural cultures.
There is a great difference in the intake selection patterns between populations in the
interior of the park and those that have access to cropland and the opportunity to
choose feeding on native or cultivated plants. The agricultural species can contribute
with up to 46.9% of deer diet of the park periphery. This work determined the
requirements of energy of Brazilian cervids, validated the use of one indirect
technique for use in free ranging animals and described the species and parts used to
supply nutrients to cervids in the wild.
Key-words: Nutritional requirements; Brazilian cervids; Emas National Park; n-alkanes;
double-labeled water
x
1 INTRODUO
As espcies de cervdeos existentes no Brasil vm apresentando acentuado
declnio populacional, principalmente devido alterao e perda de habitat, doenas
e caa indiscriminada.
H um crescente interesse em estudar os cervdeos, sobretudo pela
necessidade de manuteno e preservao de reas naturais para conservao destas
espcies, bem como a possibilidade de criao em cativeiro. Conhecendo aspectos
reprodutivos, comportamentais e nutricionais destes animais, especialmente as
exigncias de nutrientes das diferentes categorias, podemos estimar a quantidade e
qualidade de habitat que precisamos reservar para preservar o veado-campeiro.
As tcnicas de alimentao controlada por longo perodo e da gua
duplamente marcada foram utilizadas no ensaio 1 para determinar as exigncias de
energia para mantena de veados-catingueiro em cativeiro.
Para identificar as contribuies parciais das diferentes espcies vegetais
ingeridas nas dietas dos veados-campeiro no PNE e verificar se os animais utilizam
culturas agrcolas na sua dieta utilizaram-se duas tcnicas: sinais isotpicos do
carbono e n-alcanos. O acompanhamento dos grupos de veados-campeiro no PNE
para a coleta de plantas ingeridas e fezes permitiu a identificao de diferentes
aspectos relacionados s reas de comportamento nutricional e aporte de nutrientes.
Este projeto insere-se num amplo estudo da biologia de cervdeos brasileiros
que pretende auxiliar na compreenso da biometria dos animais, sistemtica,
citogentica, parasitologia, reproduo, uso de habitat, entre outros. A parceria da
FCAV/UNESP com a ESALQ e CENA/USP permite a complementaridade entre
grupos de pesquisa. Estes conhecimentos multidisciplinares de cada grupo so
fundamentais para uma compreenso mais abrangente de como o comportamento
2
nutricional importante na vida e na conservao destas espcies. Os resultados
deste projeto podero ser utilizados diretamente para animais em cativeiro, como
zoolgicos e criadores conservacionistas, alm de constiturem indicadores para
estimativas de recursos necessrios nas unidades de conservao destinadas
manuteno destas espcies.
2 REVISO DE LITERATURA 2.1 Cervdeos: Aspectos Gerais
Os cervdeos so animais da ordem dos Artiodactyla, que se caracterizam
pela presena de cascos. Os cervdeos so os ruminantes selvagens mais distribudos
no mundo, sendo encontrados em quase todos os continentes, exceto na Antrtida
(Van Soest, 1994). No mundo existem 17 gneros e 45 espcies de cervdeos
distribudos nas Amricas, Europa, sia e frica (Walker, 1991).
Na maioria dos cervdeos, os machos apresentam chifres, com exceo dos
animais do gnero Moschus e da espcie Hydropotes inermis (Eisenberg, 1999). Os
chifres so formados a partir do osso frontal, sendo estes recobertos por um
velame durante sua fase de crescimento. O velame tem como funo depositar
clcio na matriz ssea do chifre durante o perodo de crescimento (Duarte, 1997). A
deposio de chifres um processo de grande demanda energtica e que gera uma
necessidade de maior aporte de nutrientes (Geist, 1991).
Sendo classificados como ruminantes, os cervdeos apresentam estmago
dividido em quatro compartimentos: rmen, retculo, omaso e abomaso. O alimento
ingerido primeiramente mastigado, passando do esfago para o rmen e retculo,
onde existem populaes de microrganismos. Em seguida o alimento pode retornar
para a cavidade oral onde remastigado e enviado de volta ao rmen e
subseqentemente para o omaso e abomaso onde sofrer ao de enzimas digestivas
do hospedeiro (Church, 1993). O principal efeito da microbiota ruminal degradar a
parede celular dos vegetais, produzindo como resultado desta fermentao os cidos
graxos volteis, que so absorvidos pela parede do rmen fornecendo energia ao
animal.
4
Embora menos numerosos do que os ruminantes domsticos, os ruminantes
silvestres tambm so importantes para os humanos e para manuteno da
estabilidade de diferentes ecossistemas. Algumas espcies esto ameaadas e seu
nmero est sendo drasticamente reduzido principalmente pela perda de habitat,
doenas e caa ilegal em ambientes fragmentados. Nem todos os ruminantes
selvagens esto em risco de extino. O veado-de-cauda-branca (Odocoileus
virginianus) coexiste muito bem com humanos, mesmo em reas suburbanas, e h
provavelmente mais indivduos desta espcie no leste da Amrica do Norte
atualmente do que em todos os tempos. Esta espcie se adapta muito bem s
transformaes do ambiente pelo homem, usando as reas agrcolas como fonte de
alimento e o mosaico destas reas agrcolas, como fragmentos e reservas de matas,
para proteo (Verme & Ullrey, 1984; Wemmer, 1982).
Embora a explorao pela caa regulada tenha aumentado o nmero de
indivduos desta espcie, outras espcies no se adaptam to bem ocupao
humana e transformao e antropomorfizao do habitat natural, exigindo proteo
total para no se extinguirem (Van Soest, 1994).
2.2 Cervdeos brasileiros 2.2.1 Veado-catingueiro Mazama gouazoubira
Os veados-catingueiro habitam predominantemente reas de floresta (Pinder,
1997). A maior parte da dieta destes animais constituda de frutos, uma vez que
em florestas com muitas espcies esses esto disponveis o ano inteiro. J as flores e
folhas podem ser eventualmente consumidas (Duarte, 1997). A disponibilidade
estacional dos diversos tipos de frutos se reflete no consumo das diferentes espcies
pelo catingueiro. Desta forma, durante a estao seca, o veado-catingueiro se
alimenta de frutos secos e fibrosos, e na estao mida de frutos suculentos e
macios. Nas florestas tropicais, as sementes de palmeiras constituem importante
fonte de energia para estas espcies tipicamente seletoras de alimentos concentrados
(concentrate selectors) ou browsers (Bodmer, 1989).
5
No h uma explicao concreta para a funo do rmen para animais
frugvoros de pequeno porte, tais como os veados-catinqueiro (Mazama
gouazoubira) e outras espcies do gnero Mazama, pois os ruminantes so menos
eficientes do que os no ruminantes quando esses se alimentam com dietas de baixas
fibras como as frutas (Foose, 1982; Demment & Van Soest, 1985; Oliveira &
Duarte, 2003). Uma das respostas para o uso do rmen nestes animais seria que
muitas das espcies de frutos consumidos possuem sementes extremamente fortes,
com seu ponto de quebra atingindo at 150 Kg. Os Mazama engolem as sementes
inteiras, capacitando assim a microbiota do rmen-retculo para amolecer e digerir
estas sementes (Bodmer, 1989). Outra funo do rmen para os Mazama seria que,
na ausncia de frutos durante as estaes mais secas em determinadas regies, eles
teriam condies de sobreviver substituindo-os por uma dieta de brotos (Branan et
al, 1985). Outra possibilidade seria a detoxificao de taninos e outros compostos
(Van Soest, 1994).
Ao contrrio da alimentao em vida livre, podemos observar que a maioria
dos veados-catingueiro encontrados em zoolgicos e parques consome uma dieta
base de gramneas e leguminosas com resultados desanimadores de mortes por
inanio ou doenas decorrentes. Por serem de tamanho reduzido tm um
metabolismo mais acelerado e, sendo ruminantes, tm uma limitao anatmica e
fisiolgica passagem de alimento. Se no conseguem comer muito de alimentos
pobres e fibrosos para suprir suas exigncias precisam ingerir alimentos densos
energeticamente e facilmente digestveis que so aproveitados ao mximo. Estas
particularidades despertaram o interesse de se estudar a capacidade de consumo e
digesto destes animais nestas condies de forma a suprir suas exigncias
energticas e contribuir para o sucesso nas criaes em cativeiro.
2.2.2 Veado-campeiro Ozotoceros bezoarticus
O veado-campeiro ocupa uma grande diversidade de ambientes e pode ser
encontrado em ambientes midos e secos, cerrado aberto e fechado, mas no em
florestas fechadas (Duarte, 1997). Redford (1987), trabalhando com o veado-
6
campeiro no Parque Nacional das Emas, pde notar a preferncia destes animais por
campos abertos.
O peso adulto nesta espcie est entre 28 e 35 kg, dependendo do sexo, da
subespcie e perodo do ano (Duarte, 1997). Seu tamanho um pouco maior que dos
veados-mateiro e catingueiro (gnero Mazama), sendo inconfundvel por possuir um
pelame baio e, assim como o cervo-do-pantanal, lanoso.
A distribuio original do veado campeiro na Amrica situava-se entre as
latitudes 5o e 41o S, em reas abertas como campos cerrados. considerada uma espcie
ameaada principalmente pela perda de habitat e pela caa indiscriminada. Nas ltimas
dcadas os campos nativos e os cerrados vm sendo destrudos para formao de
pastagens e agricultura (Braga, 1999). O veado-campeiro est na lista oficial de espcies
da Fauna Brasileira ameaada de extino, publicada em 1989 (IBAMA, 1989).
Na Argentina, assim como no Brasil, as populaes restantes de veados-campeiro
esto fragmentadas (Jackson & Langguth, 1987; Merino & Carpinetti, 1998), devido
caa e ao desenvolvimento da agricultura e da pecuria. Em 2002 existiam apenas 4
populaes isoladas de veado-campeiro na Argentina (Pautasso & Pea, 2002).
A populao de veados-campeiro no Brasil foi estimada em aproximadamente
20.000 animais em 1994 (Wemmer, 1994). No Parque Nacional das Emas a populao
foi estimada entre 1000 e 1300 indivduos (Redford, 1987; Rodrigues, 2003).
O Veado Campeiro foi considerado extinto no estado do Paran at que em 1996
foi localizada uma populao isolada numa reserva particular. Estudo realizado por
Braga et al. (2000) identificou grupos isolados no Estado.
As populaes de veado campeiro que habitam fragmentos preservados de
campos nativos ou campos cerrados em reas particulares esto associadas a fazendas
que desenvolvem atividades de agricultura ou pecuria e oferecem uma maior
disponibilidade de alimento durante praticamente todo o ano. Nestes casos as reas
preservadas servem de abrigo e local de descanso (Braga, 2002).
Segundo Rodrigues & Monteiro-Filho (1999) estudando a composio de
forragem disponvel no PNE, as gramneas constituem o grupo mais abundante nas
amostragens, seguidas por herbceas e arbustos. Flores foram responsveis pela menor
7
frao disponvel no perodo. As categorias mais ingeridas foram herbceas e flores,
seguidos por arbustos e gramneas. Apesar da diversidade de itens disponveis os
animais ingeriram preferencialmente as partes mais tenras e suculentas, como folhas,
brotos e flores.
O veado campeiro prefere flores, folhas e brotos de dicotiledneas ao invs de
gramneas. Embora as populaes de veado campeiro da Argentina se alimentem
preferencialmente de gramneas (Jackson & Giulietti, 1988; Merino & Carpinetti, 1998)
no PNE estas so raramente ingeridas, apesar de sua grande abundncia. O veado
campeiro no PNE apresenta comportamento caracterstico de browser segundo a
classificao proposta por Bodmer (1990), ingerindo preferencialmente espcies
herbceas, buscando as pores mais nutritivas das plantas.
2.3 Parque Nacional das Emas
O Parque Nacional das Emas, localizado no municpio de Mineiros, sudoeste do
Estado de Gois, entre as latitudes 17o50 e 18o23S e longitudes 52o43 e 53o09W,
Planalto Central do Brasil a maior reserva federal de Cerrado compreendo 131.868
ha. As propriedades circunvizinhas ao parque so voltadas pecuria e agricultura
intensiva de soja, milho, algodo e sorgo, intercaladas com milheto, girassol,
amendoim e outras culturas. O clima caracteriza-se por uma marcante estao seca
de abril a setembro com registros de baixas temperaturas e eventuais geadas. No
vero as temperaturas so elevadas assim como a precipitao anual que alcana em
mdia 1.500mm (Frutuoso, 1999).
No Parque Nacional das Emas todas fisionomias vegetais do cerrado esto
representadas sendo que aproximadamente 60% do parque composto por campos
cerrados (Batalha, 2001; Batalha & Martins, 2002). Incndios naturais so comuns,
especialmente nas primeiras tempestades com raios aps a estiagem. Em agosto de
1994 um incndio destruiu mais de 90% da rea do Parque matando animais
(Silveira et al, 1999) e reduzindo drasticamente a disponibilidade de alimento
(Rodrigues, 1996c). Aps as queimadas a vegetao do cerrado apresenta intensa
8
rebrota e as reas recm queimadas atraem os veados-campeiro devido alta
disponibilidade de alimento. Esta atrao pode persistir por alguns meses aps o fogo
(Rodrigues, 1996c).
O Parque servido de vrias estradas internas e perifricas, paralelas aos aceiros,
que delimitam extensas reas contnuas de vegetao tpica de cerrado. A presena de
aceiros, constantemente queimados pelos funcionrios do Ibama e Brigada de Incndio
evita a disperso descontrolada de incndios e facilita significativamente a visualizao
de grupos de veados pois a intensa rebrota atrai os animais.
O Parque Nacional das Emas possui uma das maiores populaes de veados-
campeiro do cerrado e foi estimada em 1994, logo aps o grande incndio, em cerca de
1300 indivduos (Rodrigues, 2003) pouco acima dos 1000 indivduos estimados por
Redford (1987).
2.4 Ecologia Nutricional
Ecologia nutricional a cincia que relaciona um animal com seu habitat atravs
de interaes nutricionais (Parker, 2003). As estratgias que os cervdeos usam para
atender s exigncias nutricionais variam de acordo com a espcie animal e com
aspectos geogrficos e sazonais do habitat.
Um esforo considervel foi feito na ltima dcada para quantificar
especificamente as exigncias de energia de cervdeos buscando compreender as inter-
relaes entre consumo de forragem, uso de habitat, estaes do ano e balano
energtico. A maioria dos estudos foi conduzida com espcies de clima temperado onde
as estaes do ano so acentuadas e as baixas temperaturas so marcantes
(Adamczewski et al., 1993; Cook et al., 1998; Gotaas et al., 2000a e 2000b; Haggarty et
al., 1998; Midwood et al., 1993; Parker et al., 1999).
O consumo de alimentos e o incremento calrico associado fermentao
ruminal durante o inverno podem reduzir o custo da termoregulao e reduzir o
catabolismo de tecido corporal em cervdeos de clima temperado (Jensen et al., 1999).
Para o veado-de-cauda-branca (Odocoileus virginianus) pastando em ambiente natural, o
9
incremento na produo de calor resultante da ingesto de forragem reduziu a
temperatura de stress em aproximadamente 10oC. Dietas com alta digestibilidade e
elevado consumo de matria seca esto relacionadas com maior produo de calor
(Robbins, 1993). A faixa adequada de termoneutralidade para diferentes espcies de
cervdeos depende tambm da idade, peso e pelagem. A maioria dos estudos
desenvolvidos buscou definir o limite crtico inferior de temperatura e no o superior,
justamente pelo maior esforo de entendimento para as espcies temperadas.
O impacto de invernos rigorosos no balano energtico das espcies de cervdeos
de climas temperados marcante mas tambm preciso reconhecer que a abundncia de
forragem de qualidade no vero fundamental para a reposio e acmulo de reservas
corporais (Adamczewski et al., 1993; Cook et al., 1998). Nas espcies de cervdeos
tropicais este fato tambm pode ser inferido, embora de forma mais sutil, entre as
estaes seca e chuvosa.
Nas regies tropicais, especialmente nas savanas e no cerrado a grande restrio
no inverno a escassez de chuvas que determina os ciclos de desenvolvimento das
espcies vegetais e conseqentemente dos herbvoros relacionados.
Em qualquer continente, regio ou espcie a forma com que os animais percebem
seu ambiente e tomam decises de forrageamento so importantes para o entendimento
das interaes entre animais e plantas (Parker, 2003). O comportamento alimentar das
espcies dependente da distribuio espacial e da disponibilidade quantitativa e
qualitativa do alimento. Em ruminantes as principais restries ao consumo de alimento
so a qualidade da forragem que afeta o tempo de reteno no rmen; e a disponibilidade
da forragem que determina a velocidade de enchimento do rmen.
Diversos estudos procuram entender as alteraes no comportamento alimentar e
a forma com que as espcies determinam o local de pastejo e a biomassa ideal de
forragem. Duas teorias principais so discutidas: a da maximizao do consumo de
energia e a da minimizao do tempo de pastejo. Segundo Bergman et al. (2001) estas
duas teorias no so necessariamente excludentes mas se ajustam a diferentes
caractersticas do ambiente. O consumo acelerado em ambientes com alta biomassa
reduz o tempo de pastejo mas tambm reduz a taxa de passagem no rmen pois a
10
forragem ingerida de baixa qualidade devido falta de seleo. Uma seleo de
alimentos mais digestveis com maior contedo celular e menos fibra estrutural (parede
celular) permite um maior aproveitamento da forragem e maior consumo de energia,
porm demanda maior tempo de pastejo. Bergman et al. (2001) propem que o animal
pasteja tempo suficiente para suprir as exigncias de energia e utiliza o resto do tempo
em outras atividades importantes como termoregulao (pastejo deprimido sob stress
trmico), reproduo, comportamento social (machos dominantes defendem mais o
territrio e copulam com mais fmeas) e viglia a predadores (animais vigilantes
levantam mais a cabea e consequentemente pastejam menos).
A eficincia energtica do comportamento alimentar dos cervdeos, isto , a
relao entre a energia ingerida e a energia gasta na busca de alimento determina a
ligao entre a disponibilidade de recursos do habitat e a condio corporal do animal
(Parker et al. 1996).
2.5 Exigncias Nutricionais e Digestibilidade
As exigncias de energia podem ser arbitrariamente divididas em exigncia
lquida para mantena e exigncia lquida para crescimento (Lofgreen & Garret,
1968). As exigncias de mantena podem ser definidas como aquelas necessrias
manuteno dos processos vitais (manuteno dos gradientes das membranas,
sntese de macromolculas, manuteno da homotermia) e atividade fsica mnima
necessria sobrevivncia (busca de alimento). As exigncias para crescimento so
aquelas destinadas s funes de reproduo, lactao, fuga de predadores ou
crescimento.
A energia o mais importante elemento em termos nutricionais. Os dois
fatores determinantes da eficincia de utilizao da energia pelos ruminantes so
perda nas fezes e produo de calor. A perda nas fezes est relacionada a
caractersticas de digestibilidade dos alimentos e consumo de alimento. A produo
de calor, por sua vez, est relacionada exigncia de energia lquida para mantena
11
e ineficincia dos processos de sntese e deposio de protenas e gordura (Lanna,
1997).
A determinao das exigncias de energia para mantena e crescimento de
cervdeos importante pois a maior parte da energia bruta obtida pelo animal
utilizada em funes de mantena. Quando um animal est crescendo ou em fase
reprodutiva, a ingesto de energia precisa ser aumentada para suprir o incremento da
demanda destes processos. A forma como um animal age para suprir essa demanda
determina sua estratgia de uso dos recursos do habitat. Para ingerir mais energia o
animal pode: 1) ingerir maior quantidade de alimento ou 2) ingerir alimentos mais
densos energeticamente em menor quantidade.
Os cervdeos por serem ruminantes tm peculiaridades que afetam
diretamente seu comportamento alimentar. O rmen apresenta vantagens pois
possibilita a extrao de nutrientes de alimentos fibrosos atravs da associao com
microrganismos. Por outro lado tambm tem limitaes, principalmente quanto ao
tempo de reteno e taxas de passagem dos alimentos.
Se o animal precisa ingerir mais energia e no pode obt-la de alimentos
excessivamente fibrosos (que tem baixo valor nutricional e baixa taxa de passagem)
ele buscar alimentos mais digestveis e ricos. Neste caso ele optar por brotos,
ramos suculentos, frutos ou flores (Rodrigues, 1996a). A estratgias nutricionais e o
comportamento vo variar em funo da demanda de energia nas diferentes fases da
vida (crescimento, gestao, lactao, crescimento de chifres, defesa de territrio) e
da disponibilidade de recursos (estao do ano, diversidade vegetal, gua, abrigo).
2.6 Tcnica da gua Duplamente Marcada
A determinao das exigncias de energia de um animal pode ser obtida
atravs de trs metodologias consideradas bsicas: 1) pela medio da produo de
calor; 2) atravs de abates comparativos ou 3) alimentar o animal por longos
perodos de tempo acompanhando peso e composio corporal. A medio da
produo de calor pode ser diretamente determinada por calorimetria ou
12
indiretamente com a tcnica da gua duplamente marcada. Este mtodo menos
invasivo baseia-se no princpio de que animais consomem oxignio para liberar
energia dos alimentos atravs da oxidao gerando gua e gs carbnico. Medindo-
se o total de O2 consumido (ou CO2 produzido) determinamos indiretamente o gasto
de energia (Lifson et al., 1955; Speakman e Racey, 1988). Este quarto mtodo
mais prtico, principalmente pela relativamente fcil coleta de amostras para
determinao do contedo de O2 e CO2 . Tambm um mtodo no invasivo de
amostragem, adequado quando se trabalha com espcies ameaadas de extino
como os cervdeos. A maior dificuldade no uso desta tcnica o alto preo da gua
enriquecida com os istopos estveis, especialmente o oxignio 18 18O (US$
150,00 por grama).
Para determinar a produo de calor podemos utilizar a produo de CO2
estimada partir do mtodo da gua duplamente marcada que baseado nas taxas
relativas de decrscimo nas concentraes de gua enriquecida com oxignio 18
(H218O) e gua enriquecida com deutrio (2H2O) no total de gua corporal
(Holleman et al., 1982). O princpio bsico de se enriquecer o total de gua corporal
com gua duplamente marcada est fundamentado no fato de que a taxa de
desaparecimento (turnover) do 18O maior que a do 2H porque ambos elementos
so perdidos do corpo atravs da gua, mas apenas o 18O tambm perdido na
expirao de CO2 (Torien et al., 1999).
O O2, no balano respiratrio com o CO2, se equilibra com o O2 da gua
corporal sob influncia aceleradora da anidrase carbnica. A taxa de
desaparecimento da H218O da gua relacionada perda combinada de CO2 e de
gua corporal, enquanto a perda de 2H2O relacionada apenas perda de gua. A
produo de CO2 calculada pela diferena (dividida por dois) entre as taxas
fracionais de desaparecimento dos istopos de oxignio e hidrognio (Figura 1) e
por estimativa do volume total de gua corporal do animal (Nagy, 1980). A
diferena entre as taxas dos istopos precisa ser dividida ao meio pois dois tomos
de oxignio de duas molculas de gua se unem para formar uma molcula de gs
carbnico.
13
Figura 1 - Alteraes no enriquecimento dos istopos de hidrognio (2H) e oxignio (18O) ao longo do tempo, em um experimento de dosificao com gua duplamente marcada (adaptado de Speakman e Racey, 1988)
O mtodo de anlise de dois pontos tem sido recomendado mais
freqentemente em estudos com pequenos animais, sendo particularmente
apropriado para uso em animais de vida livre, mantidos em seu habitat, onde a
coleta de numerosas e peridicas amostras seria impraticvel (Midwood et al.,
1994). O ponto inicial para utilizao da regresso (ti) ocorre aps o equilbrio na
diluio dos istopos e o ponto final corresponderia de 2 a 4 vidas-mdias dos
istopos. Dez dias de perodo experimental equivalem a cerca de 3 vidas-mdias
destes istopos.
Existem alguns ajustes necessrios para o uso da tcnica da gua duplamente
marcada em ruminantes pois no correto assumir que 100% do hidrognio e do
oxignio eliminado exclusivamente atravs da gua (H2O) e do gs carbnico
(CO2). O hidrognio tambm pode ser seqestrado no tecido adiposo do animal
quando em crescimento ou lactao (Midwood et al., 1993). Tambm podem ocorrer
perdas significativas de hidrognio nas fezes (Gotaas, 2000a). A produo de
metano tem relao direta com a ingesto de forragem e tambm pode remover
hidrognio do pool de hidrognio corporal (Midwood et al., 1989; Parker, 2003).
Tempo
Enriquecimento de 2H e 18O.
Hidrognio
Oxignio
t0 ti ti + 10d
14
Em algumas pocas do ano o CO2 pode ser seqestrado durante o crescimento de
ossos e chifres, afetando o turnover do oxignio (Nagy, 1980; Parker, 2003).
Considerando os adequados fatores de correo a tcnica da gua duplamente
marcada possibilita o nico mtodo prtico para estimar o gasto de energia de
animais em vida livre por longos perodos de tempo.
Apesar de ser considerado o mtodo mais preciso para determinao direta
dos gastos de energia em animais em vida livre em seus ambientes naturais (Parker,
2003), este mtodo foi utilizado em apenas 3 espcies de cervdeos: Rangifer
tarandus (Fancy et al., 1986, Gotaas et al., 2000b), Odocoileus hemionus (Parker et
al., 1999) e Cervus elaphus (Haggarty et al., 1998).
Este mtodo tem sido amplamente utilizado em estudos de metabolismo
energtico tanto em humanos (Schoeller & VanSanten, 1982; Schoeller et al. 1986)
como em bovinos no Brasil (Lanna, 1985; Leme, 1994) e espcies de animais
domsticos de pequeno porte semelhante aos utilizados neste projeto (Midwood et
al., 1994; Speakman e Racey, 1988 e Torien et al., 1999). Este mtodo foi validado
em ruminantes por Fancy et al. (1986).
2.7 Tcnica de Istopos de Carbono
O principal mtodo utilizado para estimar a composio da ingesta em
ruminantes baseado na anlise botnica ou microhistologia, do contedo ruminal e das
fezes. O processo de fermentao no rmen durante a digesto e a diversidade de plantas
ingeridas pelos ruminantes torna difcil determinar uma relao direta entre cada
componente da dieta e sua contribuio para o atendimento s exigncias nutricionais.
Alteraes nos nveis de fibra da dieta e conseqentemente na relao entre carboidratos
estruturais e contedos celulares afetam diretamente a populao microbiana do rmen,
alterando a quantidade e a qualidade dos produtos finais da fermentao. O aumento no
consumo de forragens fibrosas normalmente causa depresso da digestibilidade
enquanto o consumo de pores suculentas como brotos, flores e frutos apresentam
maior digestibilidade. Estas alteraes de digestibilidade afetam as anlises botnicas do
15
contedo ruminal e das fezes com o objetivo de caracterizao da dieta, comprometendo
parcialmente a preciso do mtodo.
Os istopos estveis funcionam como marcadores naturais que fornecem
informaes sobre diferentes dietas e locais de alimentao. Animais forrageando e se
movendo sobre reas diferentes carregam consigo sinais isotpicos distintos das espcies
e reas previamente pastejadas.
A estimativa de composio botnica da dieta de ruminantes utilizando a relao
entre os istopos de carbono 13C e 12C foi inicialmente utilizada por Minson et al. (1975)
que demonstraram que os sinais isotpicos (13C) do leite o dos plos de vacas pastando
eram determinados pelo tipo de planta (C3 ou C4) consumido. Este mtodo baseado na
diferena que existe na concentrao de 13C entre plantas com ciclo fotossinttico C3
(13C 28) e C4 (13C 11).
Jones et al. (1979) determinaram as regresses entre os sinais isotpicos do 13C
de fezes e plantas oferecidas para coelhos, caprinos, ovinos e bovinos. Esses autores
tambm identificaram que existe pequena contaminao endgena nas fezes, oriunda de
tecidos marcados com sinais isotpicos de plantas previamente ingeridas, especialmente
se elas pertencerem ao grupo de ciclo fotossinttico C3, cujo sinal mais negativo. Em
bovinos que tiveram dietas alteradas de leguminosas para gramneas o novo equilbrio
foi atingido aps 6 dias de ingesto exclusiva da nova dieta.
No Brasil, Loureno et al. (1984) estudaram os efeitos de dietas exclusivas de
gramneas ou consorciadas com leguminosas sobre os sinais isotpicos nas fezes, leite e
sangue de vacas e identificaram diferentes nveis de consumo de soja perene
(Neonotonia wightii) em diferentes pocas do ano.
Os sinais isotpicos das plantas C3 e C4 tambm podem ser utilizados em estudos
de digestibilidade de diferentes dietas, com nveis distintos de mistura entre gramneas e
leguminosas, em cativeiro (Bruckental, et al., 1985) ou condies controladas de pastejo.
Em ambientes naturais onde a diversidade botnica elevada esta metodologia no seria
adequada para estudos de digestibilidade.
16
A principal desvantagem deste mtodo que no possvel distinguir o sinal
isotpico do 13C de diferentes espcies de ciclo C3 ou C4, impossibilitando a segregao
precisa das plantas ingeridas.
2.8 Tcnica de n-alcanos
Um marcador da digesto permite estimar indiretamente o consumo e a
digestibilidade de um alimento. O marcador ideal deve ser indigestvel,
completamente recuperado nas fezes, comportar-se no trato digestivo exatamente como
a mdia da digesta (e.g. mesma taxa de passagem), no prejudicar a digesto ou o animal
e ser facilmente analisado no laboratrio tanto nas fezes como no alimento. Quando este
marcador j esta presente na composio do alimento, chamado de marcador natural
ou marcador interno. Nas ceras das plantas pode-se encontrar marcadores naturais que
tem grande potencial de utilizao para estudos com ruminantes e outros herbvoros
selvagens. Marcadores no naturais ou marcadores externos podem ser utilizados
principalmente para determinao de digestibilidade e consumo (Schneider, 1975).
Nas ceras das plantas encontram-se substncias que podem ser usadas como
marcadores, tais como alguns cidos graxos de cadeia longa (Grace & Body, 1981) e
hidrocarbonetos alifticos saturados, os n-alcanos (Mayes & Lamb, 1984). Os n-alcanos
so compostos orgnicos que possuem em sua estrutura tomos de carbono e hidrognio.
Quando apresentam mais de 20 tomos de carbono em sua cadeia podem ser
classificados como parafinas (Morrison & Boyd, 1972).
Significativos avanos no estudo dos alcanos ocorreram com o desenvolvimento
de tcnicas de cromatografia gasosa e anlise do espectro infravermelho, que
contriburam, para identificar com mais exatido as diferentes molculas. Usando estes
componentes indigestveis das plantas, tm se vrias vantagens sobre outros mtodos
para determinar o consumo e a digestibilidade em ruminantes (Mayes et al., 1986).
Na natureza os alcanos predominantes nas plantas se encontram entre o C25 a C35
(Hawke et al., 1973). Em estudos recentes Oliveira et al., (1997) encontraram em vrias
espcies de gramneas n-alcanos de C20 a C37, sendo os C29, C31 e C33 mais abundantes
17
do que os outros. Esses estudos demonstraram predominncia dos alcanos mpares sobre
os pares. Em 1965, Or et al., verificaram a similaridade dos alcanos encontrados nas
fezes de bovinos com os da forragem consumida pelos animais. Nas anlises das fezes,
esses autores encontraram alcanos de C18 a C35 com predominncia do C29, C31 e C33, e
verificaram que quanto maior a cadeia de carbono nos alcanos, mais completa era a
recuperao destes nas fezes. Notaram tambm a grande similaridade entre o perfil de
alcanos encontrados nas folhas e aqueles observados nas fezes. Isto seria explicado pelo
fato de que a frao de folhas ingeridas era a mais consumida pelos animais. A partir
disto, comearam estudos sobre a eficincia de se usar os alcanos para se estimar o
consumo e a digestibilidade em ruminantes.
A utilizao dos alcanos como indicadores internos de digestibilidade, tm uma
relao direta com o nmero de carbonos encontrados em sua cadeia, e quanto maior a
cadeia, maior a recuperao destes (menor a perda no trato digestivo). Mayes & Lamb
(1984), trabalhando com ovinos, recebendo dietas de azevm e trevo branco, sugeriram
que alcanos de cadeia longa poderiam ser usados para determinar a digestibilidade das
forragens e concluram que quanto maior a cadeia de carbono dos alcanos, maior a sua
recuperao nas fezes. A utilizao dos alcanos como indicadores para estimar o
consumo de forragens, requer o uso da tcnica do duplo-alcano, ou seja, usa-se um
alcano de cadeia mpar, natural da forragem e um alcano de cadeia par, sinttico
fornecido aos animais (Gedir & Hudson, 2000). Dotriacontano - C32 e hexatriacontano -
C36 so marcadores externos ideais e podem ser facilmente obtidos na forma pura e so
encontrados relativamente em pequenas concentraes nas plantas. Uma nica anlise
cromatogrfica permite observar as concentraes nas fezes e alimentos de todos os
diferentes alcanos. Portanto, esta tcnica de marcadores tem sido alvo de grande
interesse para muitos ruminantes domsticos.
Muitos mtodos de marcadores requerem o seu fornecimento vrias vezes ao dia,
atravs de cpsulas de gelatina ou pellets de papel, que resultam num trabalho
intensivo e podem causar uma variao diurna da liberao dos marcadores, bem como
interferir no comportamento ingestivo dos animais (Dove & Mayes, 1991). Este no o
caso dos n-alcanos fornecidos via cpsulas.
18
Trabalhando com girafas em cativeiro, Hatt et al., (1998) concluram que o
mtodo de alcanos tem a vantagem de ser no invasivo e foi vlido para o estudo da
cintica da digesta em girafas e, possivelmente, poderia ser com outros herbvoros no
domsticos. Os resultados obtidos por esses autores para as estimativas da ingesto e da
digestibilidade foram muito promissores, ainda que no totalmente similares com as
medidas diretas. Ainda neste mesmo trabalho, as variaes diurnas na concentrao de
alcanos nas fezes foram um problema devido ao uso de n-alcanos de cadeia par dosados
com pellets de papel que deveriam ter sido administrados mais vezes durante o dia. Os
referidos autores, observaram ainda que o uso de alimentos com baixa concentrao de
alcanos (
19
(Dove et al., 1996). Se diferentes plantas tm perfis de n-alcanos semelhantes difcil
distinguir nas fezes as espcies ingeridas (Smith et al., 2001). Espcies com altas
concentraes de n-alcanos tm uma influncia desproporcional no perfil de alcanos das
fezes pois ocultam espcies com baixas concentraes (Mayes e Dove, 2000).
Uma alternativa para distinguir diferentes plantas com perfis semelhantes o
agrupamento de diferentes espcies com perfis semelhantes, reduzindo entretanto o
nmero de grupos a serem discriminados (Mayes e Dove, 2000). Outra possibilidade
combinar a tcnica de n-alcanos com outros mtodos como microhistologia, em busca de
restringir o nmero de espcies a serem includas nos clculos (Dove et al. 1996). Nesse
experimento as espcies includas nos clculos foram aquelas efetivamente ingeridas
pelos animais nos diferentes perodos, cujas partes vegetais foram coletadas
acompanhando-se os indivduos e simulando o pastejo.
Smith et al. (2001) demonstraram que diferentes partes da mesma espcie tm
perfis de alcanos significativamente diferentes e devem ser consideradas separadamente
nos clculos de composio da dieta.
Valiente et al. (2003) utilizaram com sucesso a tcnica de n-alcanos para
determinar as fraes de diferentes partes de aveia (Avena sativa), gros, folhas e hastes,
fornecidas a ovelhas na forma de rao misturada com diferentes propores de gros e
forragem verde. As diferenas nos perfis de alcanos das diferentes fraes da mesma
espcie vegetal permitiram a precisa identificao das propores constituintes das
dietas.
Boadi et al. (2002), estudando o perfil de n-alcanos de espcies nativas e
cultivadas em diferentes regies do Canad determinaram que no houve efeito
significativo da localidade e da cultivar nas concentraes de n-alcanos das espcies.
Dove et al. (1996) identificaram que as diferenas entre espcies contribuem muito mais
para a variao de concentrao dos n-alcanos do que diferentes locais ou pocas do ano.
As diferenas nas concentraes dos alcanos da mesma espcie em locais diferentes
podem ser atribudas a diferentes condies climticas, ambientais e de solo (Boadi et
al., 2002).
20
Os estudos deste projeto procuraram basicamente usar as metodologias de n-
alcanos descritas por Mayes & Dove (2000), especificamente para determinar a
digestibilidade e os tipos de alimentos selecionados pelo animal.
3 DETERMINAO DA DEMANDA DE ENERGIA DO VEADO-
CATINGUEIRO (MAZAMA GOUAZOUBIRA) EM CATIVEIRO ATRAVS
DO MTODO DA GUA DUPLAMENTE MARCADA
Resumo
Existem poucas informaes sobre exigncias de energia de cervdeos
brasileiros, dificultando o sucesso de manejo e reproduo em cativeiro. O objetivo
deste experimento foi estudar as exigncias nutricionais do veado catingueiro
(Mazama gouazoubira) em cativeiro. A determinao das exigncias de energia para
mantena utilizou 8 veados-catingueiro de ambos os sexos em cativeiro e foi
desenvolvida atravs de dois mtodos: a)equilbrio de peso e b)gua duplamente
marcada (2H218). Os animais foram dosados com gua duplamente marcada (111,8
mg/kgPV para 2H2O e 163,1 mg/kgPV para H218O) e amostras de sangue foram
coletadas em intervalos de 3 dias, at que 3 ou 4 meiasvidas dos istopos tenham
decorrido (atingindo o limite de deteco em aproximadamente 30 dias aps a
dosificao). As curvas de desaparecimento dos istopos em funo do tempo foram
utilizadas para calcular o turnover de CO2 e H2O. Os resultados obtidos pelos dois
mtodos foram semelhantes (111,4 e 112,0 kcal/kg.75.d) comprovando que a tcnica
da gua duplamente marcada pode ser utilizada em estudos nutricionais de
cervdeos. Informaes de doses (mg/kgPV) e intervalo mximo entre aplicao e
coleta de sangue (30 dias), permitem o uso desta metodologia em estudos futuros em
vida livre. Este trabalho determinou as exigncias de energia do veado-catingueiro em
cativeiro e validou o uso de uma tcnica indireta para futuros estudos em vida livre.
22
Summary
There are limited data on energy requirements of brazilian cervids. Thus, it is
difficult to succeed in their management and reproduction in captivity. The objective
of this experiment was to study the nutritional requirements of the grey-brocket deer
(Mazama gouazoubira) in captivity. The determination of energy requirements for
maintenance used 8 gray-brocket deer of both sexes in captivity and was carried
through two methods: a)weight equilibrium and b)double-labeled water (2H218O).
The animals were dosed with double-labeled water (111.8 mg/kgBW for 2H2O and
163.1 mg/kgBW for H218O) and blood samples were collected with 3 days interval,
until 3 or 4 half lives of isotopes had occurred (reached limit of detection at
approximately 30 days after the dosage). The curves of isotopes disappearance as a
function of time were used to calculate the turnover of CO2 and H2O. The results
obtained from the two methods were similar (111.4 and 112.0 kcal/kg.75.d) proving
the double-labeled water technique may be used in nutritional studies of cervids.
Information on doses (mg/kgBW) and maximum interval between injection and
blood collection (30days), allow the use of this methodology in future studies with
free ranging deer. This work determined the requirements of energy of grey-brocket
deer in captivity and validated the use of one indirect technique for use in free
ranging animals.
3.1 Introduo O experimento em cativeiro foi conduzido na FCAV/UNESP, Jaboticabal,
em duas etapas: a primeira nos meses de setembro, outubro e novembro de 2001 e a
segunda em janeiro e fevereiro de 2004. Na primeira etapa foram utilizados 8
veados-catingueiro (Mazama gouazoubira) adultos de ambos os sexos (4 machos e
4 fmeas) pertencentes ao rebanho em cativeiro experimental da UNESP
Jaboticabal. Nenhum dos machos estava sendo utilizado para reproduo e nenhuma
das fmeas estava gestante ou lactante. Desta forma os animais estariam utilizando
energia apenas para execuo das funes de manuteno como manuteno dos
23
gradientes das membranas, sntese de macromolculas, manuteno da homotermia
e atividade fsica mnima necessria sobrevivncia - busca de alimento e gua.
Por serem animais sensveis ao manejo, as atividades experimentais do 1o
ensaio foram conduzidas de forma a no estressar os animais, fato que alteraria seu
aporte e demanda de energia. As atividades de manejo mais crticas, como pesagens,
foram sempre acompanhadas por um tcnico responsvel e experiente do Setor de
Animais Silvestres da FCAV/UNESP. Os animais mostraram-se bastante dceis
durante a conduo do experimento, se acostumando com nossa presena diria no
fornecimento de gua e rao.
A segunda etapa do Ensaio I, o experimento com gua duplamente marcada,
foi realizada na mesma estao do experimento inicial mas em virtude de atrasos na
importao do material s foi possvel inici-la em janeiro de 2004, dois meses
aps o previsto mas ainda sob condies climticas semelhantes de temperatura e
umidade relativa do ar.
O rebanho experimental da FCAV/UNESP foi parcialmente alterado neste
intervalo e estavam disposio para a segunda etapa 9 animais, 2 machos e 7
fmeas, sendo que 6 destes participaram do experimento inicial. As baias utilizadas
foram as mesmas de 8 m2 do experimento inicial.
Apesar dos animais mostrarem certa tolerncia ao manejo intensivo do
cativeiro, o ensaio com gua duplamente marcada demandaria conteno manual e
muitas coletas consecutivas de sangue que poderiam estressar os animais. Para
minimizar o estresse da conteno tanto no momento da aplicao da gua
duplamente marcada quanto nas coletas de sangue novamente houve
acompanhamento de um tcnico experiente, responsvel pelo Setor de Animais
Silvestres da FCAV/UNESP.
O objetivo deste experimento foi testar a tcnica de gua duplamente
marcada em pequenos cervdeos, obtendo informaes importante e essenciais para
um futuro estudo em vida livre com cervdeos de mdio porte.
24
3.2 Material e Mtodos No havia na literatura nenhuma pesquisa de exigncias nutricionais para
esta espcie de cervdeo brasileiro. Para balancearmos uma rao que satisfizesse as
exigncias de manuteno destes animais utilizamos dados obtidos para outras
espcies de cervdeos (Brown, 1995; Haigh & Hudson, 1993; Holter et al., 1979;
Ulrey et al., 1967, 1970; Van der Eems et al.,1988) e de ruminantes domsticos de
pequeno porte: ovinos e caprinos (Nutrient requirement of sheep, 1985; Nutrient
Requirements of Goats: Angora, Dairy, and Meat Goats in Temperate and Tropical
Countries, 1981).
A rao experimental foi formulada com a seguinte composio (Tabelas 1 e 2): Tabela 1. Ingredientes da dieta experimental
Ingredientes: (%)
Feno de Alfafa 63,9 Amido de Milho
16,9
Levedura desidratada
14,7
Melao 2,5
Suplem. Mineral 1,0 Suplem. Vitamnico
0,5
Cloreto de Sdio
0,5 Tabela 2. Composio nutricional da dieta
Composio da dieta: (%) Matria Seca 87,9 Matria Orgnica 90,8 Matria Mineral 9,2 Protena Bruta 19,4 Extrato Etreo 1,2 FDN 29,5 Hemicelulose 6,0 Celulose 17,7 Lignina 5,1 Energia Bruta (Mcal/kg) 4,25
25
A rao deveria conter uma nica fonte de fibra vegetal para evitar diferentes
origens dos n-alcanos presentes na dieta total. Por este motivo optamos em utilizar
amido de milho puro como fonte de energia e levedura desidratada como fonte de
protena.
Uma batida inicial de rao foi feita enquanto realizaram-se as anlises de
laboratrio para confirmar a composio nutricional dos ingredientes indicada nos
rtulos dos produtos. Foram avaliados os teores de Matria Seca (MS), Matria
Mineral (MM), Protena Bruta (PB), Energia Bruta (EB), Extrato Etreo (EE), Fibra
em detergente neutro (FDN), Fibra em detergente cido (FDA) segundo
metodologias descritas por Van Soest (1994). Isto foi necessrio para evitar
desbalanceamento da rao experimental devido imprecises nas informaes dos
fornecedores e fabricantes. Depois de verificada a composio real dos ingredientes,
foram ajustadas as percentagens dos mesmos para a mistura da rao experimental.
A rao inicial foi utilizada nas duas primeiras semanas de adaptao enquanto a
rao experimental foi utilizada no perodo final de adaptao e durante todo
perodo experimental.
Os animais foram alimentados vontade com esta rao por 54 dias aps um
perodo de adaptao de 25 dias. Este perodo de adaptao foi essencial para
permitir que os animais passassem a ingerir apenas a rao experimental, sem outra
fonte de capim, feno ou rao de eqinos, que normalmente constitua sua dieta. A
quantidade oferecida foi ajustada a cada dois dias de forma a manter uma sobra de
5% do oferecido, reduzindo o desperdcio de rao. Os animais tinham acesso
irrestrito gua.
Diariamente foram determinados os valores de oferta e sobra de gua e rao.
Os consumos dirios foram determinados diminuindo-se a quantidade de sobra do
total oferecido. Os volumes de gua (oferta e sobra) foram determinados com
proveta plstica de 1.000 mL e os pesos da rao (oferta e sobra) em balana de
preciso. As amostras de alimento oferecido, sobras e fezes tambm foram
analisadas para as variveis descritas anteriormente. Para a determinao precisa do
26
consumo de gua foi considerada a evaporao do perodo, medida atravs de um
bebedouro referncia.
Para determinao da digestibilidade da dieta elaborada foi conduzido um
experimento que comparou valores obtidos atravs de coleta total de fezes e atravs
de n-alcanos como indicadores (Barbosa, 2003). As coletas de fezes foram
realizadas durante 24 horas por dia, em 5 dias consecutivos, para determinao da
digestibilidade da rao atravs da coleta total. As baias foram vistoriadas a cada 30
minutos para verificar se os animais haviam defecado, pois as fezes deveriam ser
coletadas o mais breve possvel para evitar pisoteio e contaminao com urina.
Nestes 5 dias de coleta as baias ficaram sem cama (feno de coast-cross) para evitar
ingesto e contaminao de n-alcanos externos dieta experimental. A
digestibilidade estimada foi obtida atravs do mtodo de n-alcanos segundo
metodologia descrita por Oliveira (2004).
Por estarem em condio de cativeiro e alojados em baias individuais de 8m2
julgamos interessante obter alguns parmetros climticos, principalmente
temperatura e umidade relativa do ar e verificar sua relao com o consumo de gua
e alimento. Estes parmetros foram determinados diariamente s 15:00hs,
registrando os valores mximos e mnimos das ltimas 24 horas, com o auxlio de
um termohigrmetro digital. Foram realizadas regresses simples entre consumo de
gua e rao com URmed, URmax, URmin, Tmed, Tmax e Tmin utilizando-se o
procedimento Regr do SAS (SAS, 1999).
Para verificar a manuteno dos pesos individuais, foram realizadas pesagens
a cada 21 dias. Os animais eram direcionados a uma caixa de madeira com peso
previamente determinado e posteriormente pesados numa balana eletrnica. Por ser
um momento delicado buscamos sempre realiz-las no perodo da manh, com
temperatura mais amena e sob superviso do responsvel tcnico do Setor de
Animais Silvestres da FCAV/UNESP. O escore corporal foi observado visualmente
a cada 7 dias, durante os 54 dias de experimento para verificao da manuteno da
composio corporal, verificando se o animal estava ganhando ou perdendo massa
muscular e/ou gordura.
27
Os resultados de exigncias de energia metabolizvel obtidos no ensaio de
alimentao controlada por longo perodo de tempo com manuteno do peso e da
condio corporal dos animais foram comparados com os resultados obtidos atravs
do mtodo da gua duplamente marcada.
Como no h na literatura nenhum trabalho realizado utilizando-se a
metodologia da gua duplamente marcada com esta espcie (Mazama gouazoubira)
buscamos comparaes com ruminantes domsticos (ovinos) e outros cervdeos de
espcies diferentes, chegando aos valores de 150mg/kg de peso vivo de H218O e
100mg/kgPV de 2H2O a serem aplicados nos animais. A quantidade de H218O
aplicada, material mais caro, deveria ser maior pois o oxignio marcado perdido
tanto na forma de CO2 quanto de H2O, premissa bsica da metodologia da gua
duplamente marcada.
No experimento inicial com n-alcanos, foram realizadas pesagens dos
animais e estas foram comparadas com pesagens posteriores para determinar a
quantidade de gua duplamente marcada a ser aplicada por animal. De forma geral
os pesos foram mantidos pois os machos no estavam reproduzindo, as fmeas no
estavam prenhes nem lactando e o manejo se manteve bastante homogneo desde o
experimento inicial. O experimento com gua duplamente marcada foi idealizado
para ser executado simultaneamente ao experimento com n-alcanos. Devido a
dificuldades para aquisio deste caro produto, o experimento com a gua
duplamente marcada foi realizado posteriormente, dois anos depois do experimento
inicial na mesma poca do ano.
As coletas de sangue foram programadas de forma a obter uma curva de
desaparecimento dos istopos bastante clara e precisa, identificando o acentuado
aumento na concentrao dos istopos no momento inicial e sua queda gradual com
o desaparecimento. Por este motivo foram realizadas mais coletas nos primeiros dias
aps a aplicao conforme Figura 2.
28
Figura 2 - Cronograma de coleta de sangue
Para controlar de forma bastante precisa a quantidade de gua aplicada por
animal as seringas foram pesadas vazias e cheias com gua marcada at o volume
aproximado desejado. Foram utilizadas seringas independentes para aplicao da
H218O e da 2H2O para maior controle da quantidade injetada. As aplicaes foram
feitas por injeo direta em na veia jugular com o auxlio de um catter. Para evitar
que parte da gua marcada ficasse retida no interior do catter foi feita lavagem da
seringa sugando e reinjetando sangue por trs vezes. Ao final deste processo o
restante do catter foi lavado injetando-se mais 2 mL de soro fisiolgico.
Antes da aplicao da gua marcada foi retirada uma amostra de sangue para
determinao da concentrao basal natural do 18O e do 2H. As coletas subseqentes
foram estipuladas com base em curvas de desaparecimento destes istopos
encontradas na literatura (Fancy et al, 1996; Haggarty, 1991; Midwood et al, 1994).
As coletas de sangue foram feitas utilizando-se tubos de 9ml com vcuo (Vacuette)
sem anti-coagulante pois as amostras permaneceriam congeladas at o momento da
No. de coletas/dia
0
1
2
3
4
5
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26dias
no. d
e co
leta
s
0, 2, 6, 12 hs aps a aplicao
24 e 36 hs aps a aplicao
29
destilao da gua do sangue. As anlises das concentraes dos istopos de
hidrognio e oxignio foram realizadas na ordem inversa da seqncia de coletas.
Isto se fez necessrio porque as primeiras amostras de sangue eram muito ricas nos
istopos e poderiam enriquecer a coluna do cromatgrafo, superestimando a
concentrao dos istopos nas amostras finais menos concentradas.
A partir das curvas de desaparecimento do 18O e do 2H calculamos a
produo de CO2 pois a curva do 2H representa a perda de H atravs da H2O e a
curva do 18O representa a perda de O atravs da H2O e CO2.
A produo de calor, equivalente exigncia de energia metabolizvel para
mantena dos animais foi calculada partir da produo de CO2, utilizando-se a
equao de Brouwer (1965), descontando 8% de perda de 2H no Metano e 1% na
urina (Midwood et al., 1989 e 1993). A perda nas fezes no foi considerada
significativa. Como os animais no estavam crescendo nem engordando as perdas
hidrognio seqestrado no tecido adiposo tambm foram desconsideradas (Midwood
et al., 1993). O quociente respiratrio foi considerado 0,80 (Blaxter, 1964).
PC (kcal) = 3,866 * rCO2/QR + 1,2*rCO2 (0,518*rCH4 + 1,431*N).
Sendo:
PC : Produo de Calor (kcal)
QR : Quociente Respiratrio
rCO2 : Produo de CO2 (L)
rCH4 : Produo de CH4 (L)
N : Nitrognio na urina (L)
30
3.3 Resultados e Discusso Os resultados dos efeitos das condies climticas no cativeiro sobre os
consumos de gua e rao esto descritos abaixo. Os valores mdios dos parmetros
climticos do perodo experimental esto na Tabela 3:
Tabela 3. Valores mdios de parmetros climticos do perodo
experimental (54 dias) Parmetro Mdia Desvio
Padro T 14:00 (o C) 32,0 4,0
T mx (o C) 34,4 3,0
T min (o C) 19,6 2,1
T md (o C) 27,0 1,8
UR 14:00 (%) 44,4 19,9
UR mx (%) 95,0 6,1
UR min (%) 32,6 10,5
UR md (%) 63,8 7,5
T: Temperatura (oC), UR Umidade relativa (5) Seria esperado que o consumo de gua fosse maior nos dias mais quentes e
de menor umidade relativa do ar. Analogamente o consumo de rao poderia ser
deprimido nos dias mais quentes e midos. Estas relaes no foram observadas
atravs de regresses lineares (P>0,01) mesmo tendo sido observadas amplas
variaes de temperatura (14,3 a 38,2 oC) e umidade relativa do ar (17 a 100 %).
Os resultados mdios dos consumos de gua e rao no perodo experimental
esto na Tabela 4.
31
Tabela 4. Mdias dos consumos de rao e gua no perodo experimental
Animal Rao
(g MS/kg.75.d)Desvio Padro
gua (mL/ kg.75.d)
Desvio Padro
1 45,5 8,4 134,2 29,3 2 54,4 4,9 150,0 22,3 3 44,7 7,3 106,7 19,3 4 57,1 5,3 186,2 29,0 5 49,4 7,7 144,8 22,0 6 49,9 5,3 134,0 19,1 7 54,2 8,5 160,4 28,6 8 48,5 4,8 127,7 25,0
Mdia 50,7 3,5 143,5 12,2
Os valores dirios dos parmetros climticos e de consumo esto
apresentados graficamente na Figura 3.
Variao diria
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
1 6 11 16 21 26 31 36 41 46 51
Dias
T(o C
) e U
R(%
)
0,0
50,0
100,0
150,0
200,0
250,0
300,0
gu
a e
Ra
o (g
)
T(oC) md UR(%) md Cons. rao Cons. H2O
Figura 3 - Valores dirios dos parmetros climticos e de consumo
32
Podemos observar que as variaes dirias de umidade relativa (%) e de
consumo de gua (mL/d) foram mais acentuadas. Nenhuma relao entre parmetros
climticos e consumo de gua ou rao foi observada. Utilizando-se o procedimento
Regr do SAS (SAS, 1999), determinamos que nenhuma regresso foi significativa
(P>0,05). Realizamos tambm regresses mltiplas entre consumo de gua e Tmax
e URmin mas nenhuma correlao significativa foi observada (P>0,05).
As regresses simples obtidas esto graficamente representadas nas Figuras 4
e 5.
0
20
40
60
80
100
100 110 120 130 140 150 160 170 180
Cons gua (mL/kg.75.d)
Tmax
, Tm
in, U
rmax
, Urm
in
T max T min UR max UR min Figura 4 - Consumo de gua (mL/dia) relacionado aos parmetros climticos: Tmax (oC), Tmin (oC), URmax (%), URmin (%)
33
0
20
40
60
80
100
40,0 45,0 50,0 55,0 60,0Cons Rao (g/kg.75.d)
Tmax
, Tm
in, U
Rm
ax, U
Rm
in
T max T min UR max UR min
Figura 5 - Consumo de rao (g/dia) relacionado aos parmetros climticos: Tmax (oC), Tmin (oC), URmax (%), URmin (%) Os animais foram pesados a cada 21 dias conforme procedimento descrito
anteriormente. Os resultados das pesagens esto na Tabela 5. Podemos observar que
o animal 3 apresentou ligeira reduo de peso na segunda pesagem. Este fato
ocorreu devido a uma infeco bacteriana causada por agente desconhecido que
provocou ligeira depresso de consumo de rao. O animal foi acompanhado por
veterinrios do Setor de Animais Silvestres da FCAV/UNESP, medicado com
antibiticos, recuperando-se aps alguns dias e permanecendo no experimento.
34
Tabela 5. Resultados das pesagens individuais dos animais Pesagens Pesos (kg) Peso metablico
Animal 1 2 3 Mdia DP (kg 0,75)
1 17,0 17,0 16,2 16,7 0,45 8,27
2 19,6 20,0 19,6 19,7 0,20 9,36
3 17,6 15,6 18,5 17,2 1,48 8,45
4 16,2 16,3 15,5 16,0 0,42 7,99
5 19,5 18,3 19,2 19,0 0,65 9,09
6 18,2 18,8 19,4 18,8 0,63 9,02
7 15,1 15,4 15,1 15,2 0,14 7,69
8 14,8 14,5 14,4 14,6 0,22 7,45
Mdia 17,2 17,0 17,2 17,1 0,16 8,42
Uma vez determinados o consumo de rao e os pesos dos animais passamos
a analisar o consumo de energia propriamente dita para satisfazer as exigncias dos
animais. Os teores de energia bruta (Mcal) do alimento oferecido e das sobras foram
determinados em bomba calorimtrica no Laboratrio de Bromatologia da
FCAV/UNESP. Para calcular a energia digestvel disponvel utilizamos o valor de
digestibilidade da energia obtido atravs da metodologia de coleta total de fezes
(63%) obtido por Barbosa (2002a). O valor da energia metabolizvel foi estimado,
considerando-se o fator de 82% de eficincia (Van Soest, 1994).
ED (kcal/kg)=EB (kcal/kg) * 0,63
EM (kcal/kg)=ED (kcal/kg) * 0,82
Com esta forma de clculo chegamos ao consumo de energia metabolizvel
por dia por animal (Tabela 6). O consumo de energia metabolizvel por dia por
quilo de peso metablico (kcal/kg0,75.d) outra forma de expressar o consumo e nos
fornece parmetro para comparao entre diferentes espcies.
35
Tabela 6. Consumo de energia metabolizvel por animal Consumo (Mcal/dia) Consumo (Mcal/kg0,75.dia)
Animal Mdia DP Mdia DP
1 0,827 0,152 0,100 0,018 2 1,118 0,101 0,120 0,011 3 0,830 0,135 0,098 0,016 4 1,002 0,093 0,125 0,012 5 0,987 0,153 0,108 0,017 6 0,989 0,106 0,110 0,012 7 0,916 0,143 0,119 0,019 8 0,794 0,078 0,107 0,010
Mdia 0,934 0,065 0,111 0,008
Uma vez que os animais no se encontravam em estgio reprodutivo nem em
crescimento considerado que toda energia metabolizvel foi utilizada para
realizao das atividades de manuteno. A mdia dos 8 animais em todo perodo
experimental foi calculada chegando ao valor da exigncia de energia metabolizvel
para mantena: 111,4 7,7 kcal/kg 0,75.d.
Este valor determinado atravs da alimentao controlada por longo perodo
de tempo e manuteno de peso e condio corporal pode ser comparado
metodologia da gua duplamente marcada, cujos resultados esto descritos abaixo.
Nas Tabelas 7 e 8 podemos observar os pesos dos animais e das seringas,
permitindo a precisa determinao da quantidade de gua injetada por animal.
Para a 2H2O seriam necessrios 100,0 mg/kg de peso vivo e foram injetados em
mdia 111,8 mg/kg. Analogamente foram injetados 163,1 mg/kg de H218O enquanto o
necessrio eram 150,0 mg/kg.
36
Tabela 7. Peso dos animais, das seringas e quantidade de gua marcada (2H2O) injetada por animal 2H2O (100 mg/kg de peso vivo)
Animal Peso da Seringa Injetado no. Peso Vazia Cheia g mg/kg 1 17 3,09 4,97 1,88 110,6 2 16 3,06 4,87 1,81 113,1 3 18 3,17 5,18 2,01 111,7 4 15 3,09 4,71 1,62 108,0 5 18 3,06 5,17 2,11 117,2 6 15 3,15 4,8 1,65 110,0 7 16 3,05 4,85 1,8 112,5 8 18 3,12 5,14 2,02 112,2 9 18 3,06 5,06 2 111,1
Mdia 16,8 3,1 5,0 1,9 111,8
Tabela 8. Peso dos animais, das seringas e quantidade de gua marcada (H218O) injetada por animal
H218O (150 mg/kg de peso vivo) Animal Peso da Seringa Injetado
no. Peso Vazia Cheia g mg/kg 1 17 3,13 5,83 2,7 158,8 2 16 3,11 5,65 2,54 158,8 3 18 3,1 5,93 2,83 157,2 4 15 3,1 5,53 2,43 162,0 5 18 3,15 6,02 2,87 159,4 6 15 3,06 5,54 2,48 165,3 7 16 3,09 5,76 2,67 166,9 8 18 3,07 6,09 3,02 167,8 9 18 3,11 6,17 3,06 170,0
Mdia 16,8 3,1 5,8 2,7 163,1
As coletas de sangue foram programadas de forma a obter uma curva de
desaparecimento dos istopos bastante clara e precisa, identificando o acentuado
aumento na concentrao dos istopos no momento inicial e sua queda gradual com
o desaparecimento. Por este motivo foram realizadas mais coletas nos primeiros dias
aps a aplicao da gua duplamente marcada.
37
Estabelecer precisamente a curva de desaparecimento dos istopos para esta
espcie contribuir significativamente para o planejamento de um futuro
experimento em vida livre, quando sero realizadas apenas duas coletas devido
dificuldade de recaptura dos animais. A determinao dos melhores pontos para
coleta do experimento em vida livre ser feita com base do grfico obtido neste
ensaio em cativeiro.
Os resultados das concentraes dos istopos estveis, ajustados para a
frao da concentrao inicial (100%) esto apresentados nas Tabelas 9 e 10. O
animal n 04 foi excludo do experimento por ser um ponto outlier na
determinao do pool size e no consta dos clculos.
Tabela 9. Fraes (%) da concentrao inicial do oxignio 18 (18O) em funo dos dias do experimento
Animais dias 1 2 3 5 6 7 8 9 mdia
0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 0,17 99,2 99,7 99,3 99,2 98,9 98,9 99,6 98,5 99,2 0,5 98,6 97,9 97,9 98,7 97,9 97,6 98,5 97,7 98,1 1,5 95,9 95,5 95,2 96,2 95,4 94,0 95,9 95,3 95,4 4 91,0 91,4 91,1 93,3 91,8 88,9 91,8 91,9 91,4 7 84,2 81,7 81,5 82,5 8 84,6 81,3 77,3 81,2 82,0 81,3 9 79,3 76,8 75,3 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 77,1
11 77,9 73,9 69,5 72,0 74,3 73,5 15 70,0 65,4 59,4 62,9 64,3 64,4 16 61,2 58,4 56,2 58,6 21 57,5 46,9 37,9 50,0 46,7 47,8 30 39,8 27,4 11,2 0,0 27,0 26,3
38
Tabela 10. Fraes da concentrao inicial do deutrio (2H) em funo dos dias do experimento
Animais dias 1 2 3 5 6 7 8 9 mdia
0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 0,17 99,1 99,6 99,0 99,4 99,5 99,3 100,0 98,4 99,3 0,5 98,7 97,7 97,5 98,8 98,5 98,1 98,8 97,7 98,2 1,5 96,1 96,0 95,3 96,7 96,4 95,5 96,6 95,3 96,0 4 91,8 92,4 91,8 94,5 93,6 90,4 93,2 92,5 92,5 7 85,5 84,1 83,8 84,5 8 87,2 84,5 80,4 84,3 84,0 84,1 9 81,5 80,2 78,6 80,1 11 81,8 78,4 73,6 77,0 77,3 77,6 15 75,1 71,3 64,7 68,6 68,1 69,6 16 64,2 64,6 62,2 63,6 21 65,2 57,3 49,6 59,4 52,8 56,9 30 49,8 41,6 24,5 0,0 32,9 37,2
As curvas de decaimento dos istopos do oxignio 18 e deutrio para os 8
animais experimentais esto ilustradas na Figura 6.
Tabela 11. Produo de CO2 calculada a partir das constantes de decaimento (kd) e do Pool size (N)
Animais 1 2 3 5 6 7 8 9
N 728,4 545,5 621,1 625,7 568,6 662,8 703,7 714,6
kd*N 76,4 62,1 76,1 52,9 55,0 79,3 69,2 77,2
N(ko-kd)/2.08 6,4 6,6 6,7 7,0 8,9 10,5 10,3 7,5
rCO2 (L) 5,2 5,7 5,6 6,2 8,0 9,4 9,2 6,3
39
Curvas de decaimento dos istopos
y = -2,0996x + 100R2 = 0,9965
y = -2,4656x + 100R2 = 0,9982
0
20
40
60
80
100
0 5 10 15 20 25 30 35Dias
Fra
o d
a C
onc.
Inic
ial
Oxignio 18 Deutrio
Figura 6 - Curvas de decaimento do 18O e 2H para os 8 animais
A produo de CO2 foi calculada pela diferena entre as taxas fracionais de
desaparecimento dos istopos de oxignio e hidrognio e por estimativa do volume
total de gua corporal do animal (Nagy, 1980). As constantes de decaimento foram
obtidas a partir das curvas e o pool size foi calculado pelo intercepto destas
curvas. Os resultados de produo de CO2 dos 8 animais esto apresentados na
Tabela 11.
A determinao da demanda de energia (kcal/d) foi obtida a partir da equao
de Brouwer (1965) considerando que, como os animais estavam sob condio de
mantena, a produo de calor por dia equivale exigncia de energia para
mantena (Tabela 12).
40
Tabela 12. Produo de calor calculada a partir da equao de Brouwer, (1965)
Animais 1 2 3 5 6 7 8 9 mdia Produo CO2
rCO2 (L) 117,2 126,7 125,7 140,0 180,0 209,8 206,5 141,9 156,0
Perdas estimadas
8% como CH4(L) 9,4 10,1 10,1 11,2 14,4 16,8 16,5 11,4 12,5
1% como Nurina(L) 1,2 1,3 1,3 1,4 1,8 2,1 2,1 1,4 1,6
Produo de calor
HP (kcal/d)* 700,3 757,1 751,2 836,8 1075,9 1253,8 1234,3 848,3 932,2
Gasto energtico metablico
En (kcal/d. bw.75) 83,6 94,6 85,9 95,7 141,0 156,6 141,1 97,0 112,0* HP = 3,866 * rCO2/QR + 1,2*rCO2 (0,518*CH4 + 1,431*N), (Brouwer, 1965).
A mdia dos 8 animais em todo perodo experimental foi calculada chegando
ao valor da exigncia de energia metabolizvel para mantena: 112,0 29,2
kcal/kg0,75.d.
Os resultados da demanda de energia metabolizvel para mantena, obtido
atravs do mtodo de alimentao controlada por longo perodo (111,4 7,7 kcal/kg 0,75.d) e atravs do mtodo da gua duplamente marcada (112,0 29,2 kcal/kg 0,75.d)
foram semelhantes.
Na Tabela 13 esto listados alguns trabalhos que determinaram as exigncias
de energia para mantena de outras espcies de ruminantes domsticos e selvagens.
Podemos observar que, apesar das espcies citadas serem predominantemente de
clima temperado, as exigncias de energia so relativamente semelhantes.
41
Tabela 13. Exigncias de energia para mantena (kcal/kg.75.d) de outras espcies de ruminantes
Espcie Nome cientfico Kg Kcal EM/kg.75.d Referncia
Fallow deer Dama dama 25 155,3 Ru & Glatz, 2004
Ovinos 45 121 Torien et al, 1999
Sambar deer Cervus unicolor 45 113,3 Semiadi, 1998
Black tailed deer Odocoielus hemionus 50 95 Parker et al, 1996
Black tailed deer Odocoielus hemionus 50 120 Parker et al, 1999
Caprinos 57 101,4 Torien et al, 1999
White tailed deer Odocoielus virginianus 70 80,1 Pekins, 1998
White tailed deer Odocoielus virginianus 80 94 DelGiudice, 2000
Nos resultados obtidos neste experimento houve maior diferena entre
indivduos para o mtodo da gua duplamente marcada do que entre animais no
mtodo da alimentao controlada. Uma justificativa para esta observao pode ser
a diferena de comportamento entre os animais. O animal 04, excludo dos clculos,
consumiu mais gua que a mdia, fato que pode ter causado interferncia no
turnover de gua corporal. O animal 07, que apresentou a maior demanda de
energia, era o animal mais inquieto e arisco, sempre causando transtornos nos
momentos de coleta de sangue.
O experimento com alimentao controlada por longo perodo estressou
menos os animais pois apenas uma vez ao dia a rao e a gua eram trocados.
Nenhuma interveno mais intensa, exceto 3 pesagens, foi realizada. No
experimento com gua duplamente marcada todos os animais eram contidos
manualmente pela equipe durante as freqentes coletas de sangue.
Apesar desta variao entre indivduos a tcnica da gua duplamente
marcada pode ser utilizada para determinar a demanda de energia de animais em
vida livre. Acreditamos inclusive que as diferenas das variaes entre animais
sero menores pois o ambiente livre condiciona os animais a um estado constante de
42
viglia e busca de alimento que equilibra a demanda de energia pelo nvel mais alto.
As diferenas neste caso sofrero mais influncia de outros fatores como
comportamento social, perodo reprodutivo, poca do ano ou disponibilidade de
alimento.
3.4 Concluses
A dieta peletizada desenvolvida para o experimento em cativeiro atendeu s
exigncias nutricionais do veado-catingueiro (Mazama gouazoubira) e pode ser
utilizada para manuteno desta espcie em cativeiro.
A exigncia de energia para mantena do veado catingueiro em cativeiro foi
determinada atravs do mtodo da gua duplamente marcada, obtendo valor mdio
de 112,0 29,2 kcal/kg 0,75.d. Este valor estimado foi validado atravs da medio
nos mesmos animais pelo mtodo padro (de equilbrio de peso). Apesar da variao
entre indivduos a tcnica da gua duplamente marcada um mtodo no invasivo
com grande potencial para determinar a demanda de energia de animais em vida
livre. Com enriquecimento semelhante ao do experimento em cativeiro, 111,8
mg/kgPV de 2H2O e 163,1 mg/kgPV de H218O, a coleta de sangue final poder ser
realizada at 30 dias aps a aplicao, permitindo o uso em vida livre.
4 ECOLOGIA NUTRICIONAL DO VEADO-CAMPEIRO (OZOTOCEROS BEZOARTICUS) NO PARQUE NACIONAL DAS EMAS, GO
Resumo
Existem poucas informaes sobre exigncias de energia de cervdeos
brasileiros. O conhecimento das exigncias de energia tambm importante para
determinar os recursos necessrios para sua conservao em parques e reservas. O
objetivo deste experimento foi observar o comportamento alimentar do veado-
campeiro (Ozotoceros bezoarticus) no Parque Nacional das Emas (PNE),
descrevendo qualitativamente e quantitativamente as principais espcies vegetais
utilizadas para o aporte de nutrientes. No PNE, veados-campeiro j monitorados
com radio colares, permitiram a observao de seu comportamento alimentar. O
experimento foi realizado em duas pocas distintas (inverno e vero). As espcies
foram analisadas quanto composio nutricional, para estimar valores energticos
assim como consumo de minerais e protena. As contribuies das diferentes
espcies que compem a dieta dos cervdeos foram estimadas para duas populaes
em vida livre, uma com acesso apenas a espcies nativas (rea central do parque) e
outra com acesso s espcies cultivadas na periferia do PNE. Os sinais isotpicos do
carbono 13 e os perfis de n-alcanos foram utilizados para quantificar a contribuio
das diferentes espcies ingeridas. Os resultados indicaram que os veados-campeiro
utilizam uma ampla gama de partes e espcies vegetais. Sua dieta composta por
aproximadamente 78 tens, divididos em brotos (38,5%), folhas (15,4%), flores (17,9%),
botes florais (12,8%), frutos e sementes (15,4%); de 55 diferentes espcies nativas e 7
culturas agrcolas. H grande diferena no padro de consumo entre as populaes no
interior do parque e aquelas que tem possibilidade de selecionar plantas cultivadas pelo
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homem. As espcies agrcolas podem contribuir com at 46,9% da dieta dos cervdeos
da periferia do parque. Este trabalho descreveu as espcies e partes utilizadas como
aporte de nutrientes por cervdeos em vida livre.
Summary
There are limited data on energy requirements of brazilian cervids. Knowing
the energy requirements is also important to determine the necessary nutritional
resources for their conservation in parks and reserves. The objective of this
experiment was to observe the feeding behavior of the pampas-deer (Ozotoceros
bezoarticus) in the Emas National Park (ENP), describing qualitatively and
quantitatively the main vegetal species used to supply these animals with nutrients.
In the national park, pampas-deer already monitored with radio colars, facilitated the
observation of their feeding behavior. The experiment was conducted at two distinct
seasons (winter and summer). The species were analyzed for the nutritional
composition, to estimate energy values as well as mineral and protein consumption.
The contributions of the different species to the diet of the cervids were estimated
for two free ranging populations of the national park, one with access only to native
species (central area of the park) and another with access to the crop species
cultivated in the periphery of the park. The isotopic signals of carbon 13 and profiles
of n-alkanes were use