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O GRITO DO IPIRANGA: A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL DAS GALERIAS
AOS QUADRINHOS
Laura Giordani
Mestranda da Universidade Federal de Pelotas
Resumo: O quadro de Pedro Américo “Independência ou Morte!” – também conhecido
pelo nome “O Grito do Ipiranga” -, de 1888, possivelmente é a imagem mais conhecida
e reproduzida a respeito da Independência do Brasil, de modo que é difícil alguém não
estar familiarizado com ela ou nunca ter tido contato com ela. Com o tempo, a pintura foi
utilizada como base de novas interpretações ilustradas da Independência, processo
denominado “agenciamento de imagem”. Um dos casos desse agenciamento de imagem
sofrido pela pintura está presente em algumas das ilustrações da Graphic Novel brasileira
“Independência ou Mortos”, cujo roteiro se inspira nos eventos da História do Brasil que
levaram ao Sete de Setembro.
Palavras-Chave: Independência, Quadrinhos, Pintura, Imagem, Brasil
O presente trabalho trata-se de um recorte de uma pesquisa ainda em
desenvolvimento no Mestrado em História, que busca analisar as imagens presentes na
Graphic Novel1 brasileira Independência ou Mortos, que foi roteirizada por Fabio Yabu
– utilizando o pseudônimo “Abu Fobiya” - e ilustrada por Harald Stricker, sendo
publicada pela Editora NerdBooks em setembro de 2012 e disponibilizada para venda
online. A história da revista reconta os eventos ocorridos entre 1808 e 1822 – da fuga da
Família Real Portuguesa à Independência do Brasil -, sendo narrados a partir da ótica de
D. Pedro I, que faz o papel de protagonista da história. Além de se apropriar e recontar a
História do Brasil, algumas das ilustrações presentes na revista parecem ter sido baseadas
1 Ou “romance gráfico” é uma história em prosa ou romance produzida em quadrinhos. Diferente das histórias em Quadrinhos mais tradicionais, esse formato possui uma história mais longa, densa, e não é seriada, geralmente possuindo volume único
no painel de Pedro Américo Independência ou Morte!2, que reproduz a declamação da
Independência do Brasil de forma idealizada.
Visto que o quadrinho se apropria e reconta os eventos da História que levaram à
Independência do Brasil - tanto que o evento dá o nome à revista -, e possui imagens que
lembram a pintura de Pedro Américo, que possivelmente é a imagem mais conhecida e
reproduzida a respeito do Sete de Setembro, o objetivo desse trabalho é realizar um estudo
comparativo entre as duas imagens, apontando onde elas se assemelham e onde elas se
diferenciam uma da outra.
A Independência do Brasil e a Cultura Nacional
A Independência provavelmente é o tema mais estudado na historiografia brasileira,
já que a agilidade e complexidade da transição de colônia para nação do Brasil instiga a
curiosidade dos historiadores. “Veloz” é uma boa palavra para descrever o processo de
emancipação do Brasil, visto que ele se iniciou em 1808, com a chegada da Família Real
Portuguesa ao Brasil, e se encerrou em 1822, quando D. Pedro I proclama a independência
do país. Portanto, em um pouco menos de vinte anos, o Brasil desenvolveu os meios
econômicos e políticos para se tornar uma nação.
O Sete de Setembro é muito mais do que um evento político estudado por
historiadores, é um marco da história brasileira celebrado por todo Brasil. Essa data – 7
de Setembro de 1822 – é, possivelmente, o início do “ser brasileiro” para a nossa cultura,
ela que dá a base para a identidade nacional através do libertador da pátria D. Pedro I.
Apesar de ser reconhecido como um grande protagonista da história brasileira, o
protagonismo de D. Pedro I se iniciou apenas em 1821, quando ele permaneceu no Brasil
como regente após o restante da Família Real retornar à Portugal por exigência das Cortes
Portuguesas, também sendo o início da sua carreira política (MONTEIRO, 1990, p. 128).
A declaração da Independência do Brasil foi o resultado de diversas rebeldias e ações
políticas contra o governo português feitas por ele sob a influência de seus aliados
(NOVAIS & MOTA, 1996, p. 54).
2 Também conhecida como “O Grito do Ipiranga”, é uma pintura a óleo produzida por Pedro Américo de Figueiredo e Melo em 1888. Atualmente exposta no Salão Nobre do Museu Paulista. Retirado de <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra1431/independencia-ou-morte>. Acessado em 20/07/2016
O interessante a respeito da Independência é que o Sete de Setembro de 1822 se
tornou feriado nacional e reconhecido como o dia da libertação do Brasil apenas no ano
de 1870, quarenta e oito anos após o ocorrido. Antes dessa data, o acontecimento não
havia repercutido ou reconhecido no país, com exceção de São Paulo, tanto que apenas
um jornal – denominado O Espelho que circulou entre os anos de 1821 e 1823 - deu
destaque ao “Grito do Ipiranga” (SCHLICHTA, 2006, p. 195). Essa falta de repercussão
a respeito da possível libertação do Brasil do controle de Portugal provavelmente se deve
pelo ato ter sido uma espécie de contragolpe por parte de D. Pedro I, um meio de evitar
que o Brasil acabasse por ser gerido por outro grupo de indivíduos ao invés dos
portugueses.
Graças às medidas tomadas por D. João VI entre os anos de 1808 e 1820 – que
permitiu o comércio internacional, produção de manufaturas, circulação de jornais e
formação de partidos políticos -, junto com a influência dos processos de independência
que estavam ocorrendo na América Espanhola, os brasileiros estavam se sentindo prontos
para tomar o país para eles e administrá-lo sem a interferência portuguesa. A presença de
D. Pedro I no Brasil, agindo como regente, era de garantir que Portugal manteria a
propriedade do país e evitaria sua independência. O comparecimento do príncipe no
Brasil acabou por se tornar uma nova rota à independência para os políticos mais
conservadores, como José Bonifácio, que agiam como os aliados de D. Pedro I. A
independência acabou por ser alcançada, mas não houve nenhum esforço por parte do
governo imperial para fazer dessa data uma grande comemoração nacional.
O feriado do Sete de Setembro, suas festividades e a figura de D. Pedro I como
herói foram resultado dos esforços do Segundo Reinado em formar uma identidade
nacional para os brasileiros, uma ação astuta visto que o Governo Regencial foi marcado
por diversas revoltas de cunho separatista que fizeram com que o governo de D. Pedro II
iniciasse focando em eliminar os conflitos que ainda persistiam. Existia a necessidade dar
uma nacionalidade aos brasileiros, de criar símbolos e heróis brasileiros para dar
sentimento de pertencimento e orgulho ao povo. Para isso, o Segundo Reinado utilizou
do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e, principalmente, da Academia
Imperial de Belas Artes (AIBA) para tal.
A Academia Imperial de Belas Artes elegeu a Pintura Histórica como uma forma
de criar uma identidade nacional através da criação da biografia visual do Brasil enquanto
o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro buscava traçar topografia brasileira e
documentar a História do Brasil para que fossem lembradas e celebradas, além de
sedimentar uma História oficial (SCHLICHTA, 2006, p. 67). As duas organizações
trabalharam juntas em seu objetivo: O IHGB elegia os momentos históricos que a
marcaram o Brasil enquanto a AIBA se encarregada de fazer com que os artistas
elaborassem obras com os temas escolhidos (PIMENTEL, 2007 p. 80).
Quando chegou o momento de ilustrar o momento da Independência do Brasil, o
artista escolhido para elaborar tal obra foi Pedro Américo, que acabou por criar a imagem
que hoje pode ser considerada a identidade visual do Sete de Setembro,
A Obra de Pedro Américo
Quando Pedro Américo de Figueiredo e Melo assinou o contrato que dava a ele o
trabalho e a responsabilidade de elaborar a imagem do Sete de Setembro, em janeiro de
1886, ele sabia o que era esperado dele, visto que ele já havia trabalhado com o gênero
de Pintura Histórica em sua carreira – a exemplo de seu quadro A Batalha de Avaí de
1877 -, portanto ele sabia do impacto que sua arte teria na historiografia brasileira, e que
precisava fazer uma pintura que alcançasse as expectativas que o AIBA, o IHGB e o
expectador tinham na obra. Adicionado a isso, os anos de 1880 foram marcados pelo
enfraquecimento da monarquia em frente as ideias republicanas, a família real e a figura
do Imperador estavam perdendo forças e aliados na política. O Império demonstrava
sinais que estava chegando ao fim. Dado esse cenário, e que seu empregador era a família
real – quem havia patrocinado por anos os seus estudos e trabalhos-, Pedro Américo
precisava fazer com que o uma imagem de D. Pedro I – o primeiro imperador, o libertador
do Brasil o pai do atual governante do país - inspirasse coragem, nacionalismo e
lembrasse o expectador do que a monarquia havia feito pelo povo.
O resultado foi uma pintura bem diferente da elaborada por François-René
Moreaux3 em 1844 (fig. 1), que retrata D. Pedro I proclamando a Independência ao meio
do povo, dando um caráter popular ao acontecimento e aproximando o monarca de seus
3 A Proclamação da Independência é um quadro elaborado por François-René Moreaux, de 1844.
Atualmente está localizada no Museu Paulista. Retirado de
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/es/obra5894/a-proclamacao-da-independencia>. Acessado em
20/07/2016.
súditos. O quadro de Pedro Américo possui um tema mais militarizado, escolhendo
retratar o primeiro Imperador sobre o seu cavalo e brandindo seu sabre enquanto dá o
famoso “Grito do Ipiranga” sendo acompanhado por uma comitiva de soldados e o
acontecimento é testemunhado por alguns lavradores. Toda essa cena acontece às
margens do Riacho Ipiranga, como conta a História.
Figura 1: Quadro elaborado por François-René Moreaux mostra um
Sete de Setembro popular (Site da Enciclopédia Itaú Cultural)
O impacto causado pela obra de Pedro Américo fez muito mais do que apenas
agradar críticos de arte e os seus empregadores, Independência ou Morte! se tornou a,
imagem mais conhecida e reproduzida a respeito da Independência Brasileira através dos
anos, tanto que ela se enraizou com força dentro do imaginário social a respeito do evento.
A representatividade dessa pintura dentro da cultura visual a respeito da Independência
faz com que ela sirva como modelo visual para o evento, servindo como referência para
quando é reencenado ou reproduzido em uma mídia diferente – como por exemplo na
televisão, no cinema e no teatro. Neste presente artigo, será trabalhado o exemplo de
reprodução dessa imagem feito pela graphic novel brasileira Independência ou Mortos.
A Nova Imagem da Independência
Como o título da revista indica, o tema escolhido para a história escrita nas páginas
de Independência ou Mortos é a História do Brasil, particularmente na Independência do
Brasil. A revista possui 26,5x17,5 de dimensões com 160 páginas em papel couché e capa
dura, os desenhos são apresentados em preto e branco, com exceção da capa, e são
caricaturados. Em uma de suas páginas – mais especificamente na pág. 107 -, D. Pedro I
declara a Independência do Brasil no penúltimo quadrinho da página, e sua ilustração é
muito semelhante a retratada na pintura Independência ou Morte!.
A linha de estudos da Cultura Visual diz que a imagem é fruto do seu tempo, que
por trás de uma fotografia ou uma pintura ou de uma estátua há todo um contexto inserido
nela. Segundo Paulo Knauss, a Cultura Visual, ou os Estudos Visuais, “seria um
desdobramento de um movimento geral de interrogação sobre a cultura em termos
abrangentes” (2006, p. 107), e a define como “o estudo das construções culturais da
experiência visual cotidiana, assim como nas mídias, representações e artes visuais”
(2006, p. 108). Portanto, existe em uma imagem um posicionamento político, a expressão
de uma cultura e uma mensagem, sendo muito mais do que apenas uma alegoria ou um
movimento artístico.
O dicionário de língua portuguesa define “cultura”: “um conjunto de ideias,
comportamentos, símbolos e práticas sociais artificiais aprendidos de geração em geração
por meio da vida em sociedade”. Com isso, perceberemos que os estudos da Cultura
Visual não se limitam apenas na busca do que determinadas imagens significam para uma
sociedade – ou grupo -, mas sim como essas imagens são inseridas na cultura,
reapropriadas e reproduzidas. Esse processo de reapropriação e ressignificação da
imagem é denominado “agenciamento de imagem”.
Carlo Ginzburg caracterizou o recurso do agenciamento da imagem em seu livro
“Medo, reverência e terror: Quatro ensaios de iconografia política” (2014) ao analisar
como uma imagem é capaz de causar um impacto significativo e passar a ser a inspiração
para novas ilustrações que visam produzir o mesmo objetivo. Durante sua análise,
Ginzburg identifica o que a imagem original possuía de impactante, de como ela chamava
a atenção dos espectadores e que tipo de mensagem ela pretendia passar, de modo que
inspirava novas imagens que pretendiam comunicar uma informação igual ou semelhante
sem ser uma imitação da original, visto que a nova imagem se volta para um novo público
e, por vezes, em uma nova mídia.
Para uma imagem passar pelo processo de agenciamento da imagem, ela precisa ter
causado um forte impacto e ter atingido um grande número de pessoas com sua estética
e significado por trás do que ela ilustra. O exemplo mais famoso de uma imagem que
sofreu com esse processo é o retrato de Che Guevara tirado por Alberto Korda em 1960,
intitulado “Guerrilheiro Heroico”. O retrato foi apropriado e reproduzido por diversas
maneiras e mídias, de modo que mesmo que alguém não saiba quem foi Che Guevara ou
em que ocasião a foto foi tirada essa imagem será familiar por ela estar inserida na cultura
global e visual.
A pintura de Pedro Américo se encaixa muito bem nessas condições, visto que entre
todas as reproduções visuais da Independência do Brasil:
“Foi a criação do Pedro Américo, talvez por força de sua difusão sob diferentes
formados e nuanças a [imagem] que mais profundamente enraizou-se no
imaginário social, tornando-se parte integrante de nossas heranças culturais
tanto quanto o episódio que procurou perpetuar” (OLIVEIRA, 1999, p. 64)
O quadro está enraizado com força no imaginário social a respeito do evento e muito
presente nas páginas de livros didáticos de história. Sua influência é tão grande que faz
com que sirva como identidade na cultura visual a respeito da Independência, sendo usado
diversas vezes como referência quando o momento do Sete de Setembro é reproduzido
em uma mídia diferente, como o cinema, a novela, o teatro e – no caso desse estudo - nos
quadrinhos.
Desse modo, conclui-se nessa pesquisa que a imagem que foi elaborada para a
graphic novel foi inspirada na pintura de Pedro Américo, tratando-se do resultado do
processo de agenciamento da imagem feito pelo ilustrador
Considerando que a ilustração elaborada por Harald Stricker (fig. 3) foi inspirada
pelo quadro de Pedro Américo (fig. 2), buscou-se encontrar como as duas imagens se
assemelham, assim como os pontos onde elas se tornam diferentes uma da outra, afinal,
os dois artistas buscavam ilustrar um mesmo evento para diferentes públicos e mídias em
contextos históricos distintos um do outro.
Figura 2: “Independência ou Morte!”, 1888 por Pedro Américo (Site da Enciclopédia Itaú
Cultural)
Figura 3: Ilustração do penúltimo quadro da pág. 107 da graphic novel “Independência ou
Mortos” (Editora NerdBooks)
Ao observar as imagens, apontam-se as seguintes semelhanças:
D. Pedro encontra-se no centro do quadro e é o personagem mais destacado,
de modo que o olhar se direciona imediatamente para ele. Esse recurso faz
com que ele seja facilmente reconhecido como o protagonista da cena.
Todos os personagens presentes nas cenas estão com sua atenção
direcionada ao Imperador. Esse recurso, apesar de simples, indica que há o
reconhecimento dos expectadores do ato que D. Pedro está protagonizando.
O público principal nas duas imagens é de soldados. Segundo a narrativa da
história do Sete de Setembro, D. Pedro estava acompanhado por uma
pequena comitiva de soldados quando declarou a Independência do Brasil,
portanto, se o objetivo é recriar uma imagem o mais fiel possível da história,
se faz necessário adicionar esse elemento à ilustração.
Se não está evidente na imagem, a inspiração da ilustração da graphic novel aponta
para o quadro de Pedro Américo, indicando que o artista do quadrinho teve a pintura
como referência para traçar a o momento da declaração da Independência do Brasil na
narrativa da revista. No entanto, como se trata de um agenciamento de imagem e não de
uma cópia, existem diferenças.
Observando a ilustração de Independência ou Mortos, notam-se as seguintes
diferenças entre ela e a pintura Independência ou Morte!:
O Brado do Ipiranga na fig. 3 ocorre no interior de uma floresta, oposto do
descampado da fig. 2. Com isso, conclui-se que o evento ocorreu afastado
do Riacho Ipiranga, que está ilustrado no canto direito inferior da fig. 2
O cavalo de D. Pedro está com as patas elevadas na fig. 3. Nas duas imagens,
D. Pedro está com seu sabre erguido enquanto está proclamando a
Independência, porém o seu cavalo na fig. 2 mantém as quatro patas no
chão, não compartilhando da emoção do momento em oposto à fig. 3
Na fig. 2, alguns dos soldados que acompanham D. Pedro reagem à
proclamação feita por ele e erguem suas espadas em apoio ao ato. Na fig.3,
todos os presentem não apresentam reação.
As vestimentas de D. Pedro na fig. 3 são humildes se comparadas com a
fig.2. Na segunda imagem, D. Pedro não apresenta trajes que o
caracterizariam como um indivíduo de classe social elevada.
Tanto o quadro de Pedro Américo como o quadrinho de Yabu e Stricker
pressupõem que o espectador possui conhecimento prévio da História do Brasil quando
entra em contato com seu trabalho, utilizando o inspiração o brado que D. Pedro I
declamou ao declarar a Independência do Brasil - “Independência ou morte!” - para
informar que se trata de uma obra que conta a história do Sete de Setembro. Porém, para
um revista em quadrinhos, o título nem sempre é suficiente para informar o leitor de seu
conteúdo.
Quando se trata de uma peça de arte como uma pintura, o título geralmente é
suficiente para situar o espectador sobre o que ele está vendo, sendo toda a informação
que ele precisa para entender o que está sendo comunicado pela obra e possibilita a
interpretação e a crítica da arte, mas o quadrinho é uma forma de arte completamente
diferente. Em uma revista em quadrinhos, o título passa a informação inicial sobre a
história – como gênero e tema – e sobre o personagem principal, sendo complementado
pela imagem da sua capa. O verdadeiro significado de seu título é contado dentro de suas
páginas.
O estilo de arte e narrativa dos quadrinhos é chamada de “arte sequencial”, termo
criado por Will Eisner em 1989 com sua obra “Quadrinhos e a Arte Sequencial”. Essa
definição foi expandida por Scott McCloud em seu livro “Desvendando os Quadrinhos”
(2005) para “Imagens pictóricas e outras justapostas em sequência deliberada destinadas
a transmitir informações e/ou a produzir uma resposta ao espectador” (McCLOUD, 2005,
p. 9). Essa definição diz que o quadrinho não se trata de uma única imagem, é uma
narrativa que utiliza de várias imagens com o auxílio da narração do texto para formar
uma história, para desenvolver e chegar à proposta que o seu título apresenta ao leitor.
Com isso, apesar do quadro da página 107 (fig. 3) ilustrar o momento que o Brasil se
torna independente e possuir a ilustração que é o agenciamento da imagem de Pedro
Américo, não é o momento que dá o nome a revista. A revista teve outras 106 páginas
para chegar até chegar ao momento da Independência e possui mais 53 páginas que
podem chegar ao momento do “Independência ou Mortos!”.
A diferença entre mídias faz com que a apresentação entre a imagem original – a
pintura de Pedro Américo – e a imagem agenciada – a ilustração de Harald Stricker –
fazem com que o significado delas sejam diferentes dentro de seus meios ao mesmo
tempo em que elas ilustram o mesmo evento. Isso indica que ao se estudar o agenciamento
da imagem quando há a mudança de mídia, não se deve presumir que a imagem-resultado
do agenciamento é o ponto principal da obra.
Conclusão
Mesmo com as duas imagens ilustrando um mesmo acontecimento, o destaque dado
as duas são muito diferentes e deve ser levado em consideração quando estudadas. O
Independência ou Morte! foi elaborado para ser a imagem oficial da Independência do
Brasil; enquanto a imagem presente em Independência ou Mortos ilustra o momento em
que a Independência é declamada em sua narrativa, porém não é o ponto principal da
revista.
Graças à capacidade mutável da Cultura Visual, duas imagens produzidas por
artistas diferentes mais que um século de diferença uma da outra conseguiram apresentar
semelhanças. A forte representatividade que o quadro Independência ou Morte! adquiriu
dentro da cultura visual da Independência do Brasil influenciou a arte de uma narrativa
literária baseada no mesmo evento o qual ela ilustra. O ilustrador da graphic novel
Independência ou Mortos não deixam evidente a influência que a imagem produzida por
Pedro Américo em sua ilustração, mas a inspiração está manifestada em sua composição.
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